universidade do estado do rio de janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 ·...

197
Universidade do Estado do Rio de Janeiro Centro de Ciências Sociais Faculdade de Serviço Social Gisele Martins Horta NO MEIO DA TRAVESSIA. A PRÁTICA DOS ASSISTENTES SOCIAIS NOS SERVIÇOS DE SAÚDE DA AERONÁUTICA/RJ Rio de Janeiro 2009

Upload: duongnguyet

Post on 22-Nov-2018

215 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

0

Universidade do Estado do Rio de Janeiro

Centro de Ciências Sociais

Faculdade de Serviço Social

Gisele Martins Horta

NO MEIO DA TRAVESSIA.

A PRÁTICA DOS ASSISTENTES SOCIAIS NOS SERVIÇOS DE SAÚDE DA AERONÁUTICA/RJ

Rio de Janeiro 2009

Page 2: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

Livros Grátis

http://www.livrosgratis.com.br

Milhares de livros grátis para download.

Page 3: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

1

GISELE MARTINS HORTA

NO MEIO DA TRAVESSIA.

A PRÁTICA DOS ASSISTENTES SOCIAIS NOS SERVIÇOS DE SAÚDE DA AERONÁUTICA/RJ

Dissertação apresentada, como requisito

para obtenção do Título de Mestre, ao

Programa de Pós-Graduação em Serviço

Social, da Universidade do Estado do Rio

de Janeiro. Área de concentração:

Trabalho e Política Social.

Orientadora: Profª. Drª. Ana Maria de Vasconcelos

Rio de Janeiro 2009

I

Page 4: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

2

HORTA, Gisele Martins

No Meio da Travessia. A prática dos Assistentes Sociais nos serviços de saúde da Aeronáutica/RJ Gisele Martins Horta, Rio de Janeiro: UERJ/CCS, 2009. 183 páginas Dissertação – Universidade do Estado do Rio de Janeiro, CCS. 1. Assistentes Sociais/Aeronáutica. 2. Prática Profissional Saúde. 3. Dissertação (Mest.-UERJ/CCS). I. Título.

II

Page 5: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

3

GISELE MARTINS HORTA

NO MEIO DA TRAVESSIA.

A PRÁTICA DOS ASSISTENTES SOCIAIS NOS SERVIÇOS DE SAÚDE DA AERONÁUTICA/RJ

Dissertação apresentada, como requisito

para obtenção do Título de Mestre, ao

Programa de Pós-Graduação em Serviço

Social, da Universidade do Estado do Rio

de Janeiro. Área de concentração:

Trabalho e Política Social.

Aprovado em: ______________________________________________________ Banca Examinadora: Profª. Drª. Ana Maria de Vasconcelos (Orientadora)

Faculdade de Serviço Social da UERJ

Profª. Drª. Yolanda Aparecida Demetrio Guerra

Faculdade de Serviço Social da UFRJ

Profª. Drª. Maria Inês de Souza Bravo

Faculdade de Serviço Social da UERJ

Rio de Janeiro

2009 III

Page 6: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

4

A meus pais Gilson e Irma,

com amor e gratidão.

Aos meus irmãos Fred e Luís, cunhadas e sobrinhos

pelo apoio, carinho e compreensão.

A amiga Rosenária,

apoio incondicional e sempre presente no processo de construção do conhecimento.

A amiga Ozana,

uma luz que iluminou as decisões nos momentos mais difíceis.

Aos Assistentes Sociais

dos serviços de saúde da Aeronáutica,

pela contribuição para avançarmos no debate da profissão.

IV

Page 7: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

5

AGRADECIMENTOS

Fácil é ser colega, fazer companhia a alguém, dizer o que ele deseja ouvir.

Difícil é ser amigo para todas as horas e dizer sempre a verdade quando for preciso.

E com confiança no que diz (Carlos Drummond de Andrade).

Agradeço a todos os amigos que de perto e de longe torceram e colaboraram

de alguma forma.

Às queridas amigas do tempo miúdo do trabalho cotidiano, Lúcia, Márcia,

Bernadete e Asenate, que compreenderam as minhas mudanças de humor e

deram forças para continuar essa caminhada.

À nova amiga Giselle

pelo apoio incondicional na reta final deste trabalho.

Às minhas queridas amigas, Fafá, Lu e Ycrad

que, acima de tudo, compreenderam minha ausência.

Às amigas do CRESS/MG, Rosa Helena, Denise Donizette e Graça Sampaio,

que acompanharam e torceram na caminhada ao mestrado.

Às amigas Adrianyce e Daniela

por participarem da gestação deste trabalho.

À amiga Lucimar Grizendi com a qual compartilho alegria, respeito e

admiração.

À minha orientadora Ana Vasconcelos por ter acreditado e confiado em mim

e por haver me inspirado com sua coerente trajetória profissional de luta e atitude

crítica.

Aos professores doutores

que aceitaram participar da banca de qualificação e defesa da dissertação – Yolanda

Guerra e Maria Inês Bravo,

agradeço a fecunda contribuição, atenção e disponibilidade.

Não precisa correr tanto; o que tiver de ser seu às mãos lhe há de ir.

(Machado de Assis)

V

Page 8: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

6

Digo: o real não está na saída e nem na chegada: ele se dispõe para a gente

é no meio da travessia.

Guimarães Rosa, Grandes Sertões: Veredas.

VI

Page 9: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

7

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 Formas de Admissão

Tabela 2 Função Exercida

Tabela 3 Utilização dos Aparatos Legais

LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 Faixa Etária

Gráfico 2 Estado Civil

Gráfico 3 Ano de Formação

Gráfico 4 Natureza da Instituição formadora X Assistentes Sociais civis/militares

Gráfico 5 Tempo de exercício profissional

Gráfico 6 Tempo de exercício profissional na instituição

Gráfico 7 Função que exerce

Gráfico 8 Participação em Entidade da Categoria

Gráfico 9 Trocaria de emprego

Gráfico 10 Carga Horária cumprida

Gráfico 11 Possui outro vínculo empregatício no Serviço Social

Gráfico 12 Satisfação com a profissão

Gráfico 13 Satisfação com a profissão X Possui outro vínculo empregatício

Gráfico 14 Necessidade de preparação especial para supervisionar

Gráfico 15 Conhece o Código de Ética

Gráfico 16 Código de Ética – da Relação com os usuários

Gráfico 17 Autores de Referência

Gráfico 18 Autores de Referência

Gráfico 19 Constituição de 1988 - Importância para a prática

Gráfico 20 Concepção de Saúde

Gráfico 21 Projeto Ético-Político no âmbito militar

Gráfico 22 Conhece o Código X Viabilidade do Projeto Ético-Político VII

Page 10: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

8

Gráfico 23 Projeto de Prática

Gráfico 24 Conhece o Código X Tem projeto na Instituição

Gráfico 25 O Serviço Social tem projeto na Instituição

Gráfico 26 Especificidade do Serviço Social na Aeronáutica

Gráfico 27 Quanto à Qualificação Profissional

Gráfico 28 Especialização/Capacitação Profissional

Gráfico 29 Conhecimento necessário para uma atuação qualificada

VIII

Page 11: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

9

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AAB

ABESS

ABEPSS

AFA

AI

AIS

AMAN

AMH

AMHC

ANAS

ARENA

CBAS

CBCISS

CFAS

CFESS

CGABEG

CIAAR

CNBB

COMAER

COMAR

CONASEMS

COSEMS

CRESS

DIRINT

DIRSA

EAOT

ECA

EEAR

ENESSO

Aliança Anticomunista do Brasil

Associação Brasileira de Ensino em Serviço Social

Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social

Academia da Força Aérea

Ato Institucional

Ações Integradas de Saúde

Academia Militar de Agulhas Negras

Assistência Médico Hospitalar

Assistência Médico Hospitalar Complementar

Associação Nacional de Assistentes Sociais

Aliança Renovadora Nacional

Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais

Centro Brasileiro de Cooperação e Intercâmbio em Serviços Sociais

Conselho Federal de Assistentes Sociais

Conselho Federal de Serviço Social

Casa Gerontológica de Aeronáutica Brigadeiro Eduardo Gomes

Centro de instrução e Adaptação da Aeronáutica

Conferência Nacional de Bispos do Brasil

Comando Maior da Aeronáutica

Comando Aéreo Regional

Conselho Nacional de Secretarias Municipais Saúde

Colegiado dos Secretários Municipais de Saúde de Minas Gerais

Conselho Regional de Serviço Social

Diretoria de Intendência

Diretoria de Saúde

Exame de Admissão de Oficiais Temporários

Estatuto da Criança e do Adolescente

Escola de Especialidades de Aeronáutica

Executiva Nacional dos Estudantes de Serviço Social

IX

Page 12: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

10

EPCAR

FAB

FAS

FFAA

FIOCRUZ

FUNSA

COMGEP

HAAF

HCA

HFAG

HIV

HU

ICA

INAMPS

ITA

LOAS

LOS

MDB

NOB/SUS

NOS

NPA

NUGG

OAB

OM

OSA

PASIC

PDS

PSDB

PDT

PP

Escola Preparatória de Cadetes do AR

Força Aérea Brasileira

Fundo de Assistência Social

Forças Armadas do Brasil

Fundação Oswaldo Cruz

Fundo de Saúde da Aeronáutica

Comando Geral de Pessoal da Aeronáutica

Hospital de Aeronáutica dos Afonsos

Hospital Central da Aeronáutica

Hospital de Força Aérea do Galeão

(Sigla em inglês) do Vírus Humano da Imunodeficiência

Hospital Universitário

Instrução do Comando da Aeronáutica

Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social

Instituto Tecnológico de Aeronáutica

Lei Orgânica da Assistência Social

Lei Orgânica da Saúde

Movimento Democrático Brasileiro

Norma Operacional Básica do SUS

Norma Operacional de Saúde

Norma Padrão de Ação

Núcleo de Geriatria e Gerontologia

Ordem dos Advogados do Brasil

Organização Militar

Organização de Saúde

Programa de Promoção Familiar

Partido Democrático Social

Partido Social Democrático Brasileiro

Partido Democrático Trabalhista

Partido Progressista

X

Page 13: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

11

PT

PTB

PUC

QCOA

QFO

SAD

SARAM

SAS

SDEE

SESSUNE

SISAU

SSA

SUDS

SUS

UFJF

UFRJ

UFRN

UGF

UVA

UGG

UNATI

UNE

UTI

Partido dos Trabalhadores

Partido Trabalhista Brasileiro

Pontifícia Universidade Católica

Quadro de Oficiais Temporários da Aeronáutica

Quadro Feminino de Oficiais

Serviço de Atendimento Domiciliar

Subdiretoria de Aplicações dos Recursos para Assistência Médico-Hospitalar

Sistema de Assistência Social

Subdiretoria de Encargos Especiais

Subsecretaria de Estudantes de Serviço Social da UNE

Sistema de Saúde da Aeronáutica

Serviços de Saúde da Aeronáutica

Sistema Único Descentralizado de Saúde

Sistema único de Saúde

Universidade Federal de Juiz de Fora

Universidade Federal do Rio de Janeiro

Universidade do Rio Grande do Norte

Universidade Gama Filho

Universidade Veiga de Almeida

Unidade de Gerontologia e Geriatria

Universidade Aberta da Terceira Idade

União Nacional dos Estudantes

Unidade de Tratamento Intensivo

XI

Page 14: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

12

RESUMO

O presente trabalho analisa a realidade da prática dos assistentes sociais

nos serviços de saúde da Aeronáutica/RJ, tendo como referência o projeto ético-

político profissional do Serviço Social expresso no Código de Ética do Assistente

Social, na Lei nº 8.662/1993 que regulamenta a profissão, bem como nas Diretrizes

Curriculares da ABEPSS. O interesse em realizar este estudo em um espaço

profissional, pouco debatido no meio acadêmico, define-se pela necessidade de uma

investigação teórica que possibilite analisar, revelar e divulgar um segmento da

categoria, muitas vezes desconhecido e estranho ao conjunto dos profissionais do

Serviço Social. Entendemos que este estudo apresenta um caráter

predominantemente exploratório. Para uma melhor compreensão do universo militar

da Aeronáutica, tornou-se imprescindível, captarmos na realidade concreta, os

limites e as possibilidades do movimento do real na sua historicidade. Para tanto,

tivemos como alicerce o referencial teórico marxista crítico-dialético que possibilita ir

para além da aparência dos fatos. É certo que uma instituição cujo funcionamento se

aproxima do modelo de instituição ―fechada‖ e conservadora, fundamentada nos

princípios da hierarquia e da disciplina, sinalize, a priori, uma inviabilidade real de

um projeto profissional emancipatório. Ao realizarmos uma análise dos depoimentos

das assistentes sociais entrevistadas, buscamos considerar a cotidianidade da

prática profissional, que revela presenças e ausências, aponta problemas imediatos

desvela/oculta, caminhando do particular para o universal. Este estudo teve com

lócus de investigação os Hospitais da Aeronáutica do Rio de Janeiro: HAAF, HCA e

HFAG. Tem-se nesses espaços, uma atuação desafiante para aqueles profissionais

que buscam romper com práticas burocráticas e conservadoras e que visam

fortalecer práticas democráticas e coletivas de atendimento às demandas no

contexto institucional.

Palavras-chave: Prática Profissional; Assistentes Sociais, Saúde; Aeronáutica;

Projeto Ético-Político do Serviço Social.

XII

Page 15: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

13

ABSTRACT

This paper examines the reality of practice of social workers in the health services of

the Air / RJ, with reference to the ethical-political project of professional social

services, expressed in the Code of Professional Ethics, the Law which regulates the

profession, and as guidelines for curriculum ABEPSS. The interest in performing this

study in professional areas, little discussed in academic circles, defined by the need

for theoretical research that enables analyze, develop and disseminate a segment of

the class, often unknown and alien to all those working in Social Service . We believe

that this study presents a predominantly exploratory nature. For a better

understanding of the universe's military Air Force, it is essential to receive "in reality,

the limits and possibilities of the real movement of its historicity. To this end, we had

the foundation to the theoretical critical-Marxist dialectic that allows to go beyond the

appearance of facts. It is true that an institution whose function is close to the model

institution "closed", positivist and conservative, based on the principles of hierarchy

and discipline, signal, a priori, an impossibility of a real professional emancipatory

project. When we conduct an analysis of the statements of social workers

interviewed, we tried to consider the everyday professional practice, which reveals

presence and absence points to the immediate problems reveals / hides, moving

from the particular to the universal. This study aimed to research the locus of the Air

Force Hospital in Rio de Janeiro: HAAF, HCA and HFAG. It is in these spaces, an

action challenging for those professionals who seek to break bureaucratic practices

and conservative and aimed at strengthening democratic practices and collective

fulfillment of the demands in the institutional context.

Keywords: Practical Professional; Social Workers; Health; Aeronautics; Project

Ethical-Politician of the Social Service.

XIII

Page 16: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

14

SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO .................................................................................................... 15

INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 17

CAPÍTULO I – ESTADO, SAÚDE E SERVIÇO SOCIAL .......................................... 23

1.1 Os militares e o Estado: o significado do golpe de abril de 64 ...................................................24

1.2 O processo de redemocratização do Estado: os movimentos sociais e o Serviço Social .....37

1.3 A interface do Serviço Social com a Saúde: breve histórico .......................................................47

CAPÍTULO II – A PRÁTICA PROFISSIONAL DOS ASSISTENTES SOCIAIS NA

SAÚDE ...................................................................................................................... 65

2.1 A prática dos assistentes sociais e o projeto ético-político profissional: desafios e

polêmicas postos na atualidade ..............................................................................................................65

2.2 A configuração da prática profissional dos assistentes sociais na saúde ...............................72

CAPÍTULO III – A PRÁTICA PROFISSIONAL DOS ASSISTENTES SOCIAIS NOS

SERVIÇOS DE SAÚDE DA AERONÁUTICA/RJ ..................................................... 79

3.1 Aeronáutica: uma instituição militar das Forças Armadas do Brasil .........................................79 3.1.1 A profissão militar ........................................................................................................................84 3.1.2 O Sistema de Saúde da Aeronáutica .........................................................................................89

3.2 O lócus de investigação e o seu cenário: os serviços de saúde da Aeronáutica/Rio de

Janeiro ..........................................................................................................................................................97

3.3 Os assistentes sociais inseridos nos serviços de saúde da Aeronáutica no Rio de

Janeiro/RJ .................................................................................................................................................. 104

3.3.1 Perfil profissional ........................................................................................................................ 104 3.3.2 Referências de conhecimento .........................................................................................135

3.3.3 Prática Profissional .................................................................................................................... 146 3.3.4 Aperfeiçoamento Profissional .................................................................................................. 157

CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 164

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................................................... 173

ANEXOS ................................................................................................................. 184

Page 17: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

15

APRESENTAÇÃO

“Este é tempo de divisas, tempo de gente cortada...

É tempo de meio silêncio, de boca gelada e

murmúrio, palavra indireta, aviso na esquina.”

Carlos Drummond de Andrade

Era então fevereiro de 2004, quando, como assistente social, entrei pela

primeira vez em uma unidade militar da Aeronáutica, na capital mineira, no Centro

de Instrução e Adaptação da Aeronáutica – CIAAR.

Em meio a toda agitação, correria e falação dos concursados (ao todo

formávamos 147 profissionais, distribuídos nas áreas de exatas, humanas e saúde),

o inusitado: um militar munido de um megafone ordena a todos que entrem em

formação para marchar. Assim, começa o dia no Centro de Instrução e Adaptação

da Aeronáutica em Belo Horizonte (MG).

Durante 13 semanas de curso e adaptação à vida militar, foram ministradas

aulas de armamento, munição e tiro; segurança militar; treinamento físico; legislação

e instrução militar; educação cívico-militar; poder aeroespacial, entre outras

disciplinas.

Segui o curso até 30 de abril de 2004 quando, enfim, recebi o diploma e a

nomeação de Segundo-Tenente Assistente Social do Quadro Complementar de

Oficiais da Aeronáutica, sendo designada a atuar no Hospital de Força Aérea do

Galeão/HFAG, no Rio de Janeiro (RJ). Surgiu, então, uma grande inquietação: E o

Serviço Social?

Como disse célebre personagem de Guimarães Rosa: “o real não está na

saída e nem na chegada ele se dispõe para gente é no meio da travessia” 1.

1. ROSA, J. Guimarães. ―Grande Sertão: veredas‖ In: João Guimarães Rosa. Ficção Completa. Vol. 2. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994. p. 46.

Page 18: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

16

Destarte, minha inserção na Aeronáutica se deu pela formação profissional,

como a maioria dos profissionais que lá estavam, e não por uma vinculação cívico-

militar.

Afinal, a conjuntura atual2 coloca desafios mais complexos ao mundo do

trabalho. O assistente social como trabalhador só se realiza quando sua força de

trabalho é vendida no mercado por intermédio de determinações das condições e

relações de trabalho, meios e mediações3·.

Aliás, segundo Costa (2000), a atividade do profissional de Serviço Social,

como tantas outras profissões, está submetida a um conjunto de determinações

sociais inerentes ao trabalho na sociedade capitalista, quais sejam: o trabalho

assalariado; o controle da força de trabalho e a subordinação do conteúdo do

trabalho aos objetivos e necessidades das entidades empregadoras.

Ora, ao término do curso de formação militar, o que de relevante se colocou

foi a constatação de que, desde o ano de 1998, a Aeronáutica vem requisitando,

anualmente, através de Concurso Público para o Quadro Complementar de Oficiais

Temporários da Força Aérea Brasileira, um número expressivo de assistentes

sociais4.

Ante tal circunstância, nos pautamos na assertiva de Netto (1992, p. 68) ao

afirmar que:

um mercado não se estrutura para o agente profissional mediante as

transformações ocorrentes no interior do seu referencial ou no marco de

sua prática; antes, estas transformações expressam exatamente a

estruturação do mercado de trabalho, posto que uma profissão não se

constitui para criar um dado espaço na rede sócio-ocupacional, mas é

a existência deste espaço que leva à constituição profissional”. (grifos

nossos)

2 Nunca é demais notar que as transformações operadas nos países capitalistas (centrais e periféricos) nos últimos trinta anos, oriundas da crise estrutural do capital, produzem alterações no mundo do trabalho. 3 Cf. GUERRA, Yolanda. O projeto profissional crítico: estratégia de enfrentamento das condições contemporâneas da prática profissional. In Serviço Social e Sociedade nº 91. Ano XXVIII. Cortez Editora, São Paulo, 2007. 4 Atualmente, 67% dos assistentes sociais inseridos na Aeronáutica são provenientes dos Quadros de Oficiais - QCOA (Quadro Complementar de Oficiais Temporários) e QFO (Quadro Feminino de Oficiais de Carreira); 33% dos assistentes sociais são servidores civis concursados e contratados. FONTE: Subdiretoria de Encargos Especiais/SDEE da Diretoria de Intendência/DIRINT do Comando da Aeronáutica, 2009.

Page 19: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

17

INTRODUÇÃO

A crítica arrancou as flores imaginárias que enfeitavam as cadeias,

não para que o homem use as cadeias sem

qualquer fantasia ou consolação, mas para que

se liberte das cadeias e apanhe a flor viva.

Karl Marx

A presente dissertação tem como objetivo analisar a prática dos assistentes

sociais nos serviços de saúde da Aeronáutica no município do Rio de Janeiro. Tem

como referência o projeto ético-político profissional do Serviço Social expresso no

Código de Ética profissional, na Lei que regulamenta a profissão (nº 8.662/93), bem

como nas diretrizes curriculares da ABEPSS.

O interesse em realizar um estudo junto aos assistentes sociais inseridos nos

serviços de saúde da Aeronáutica (RJ) define-se pela necessidade de uma

investigação teórica que possibilite analisar, revelar e divulgar um segmento da

categoria, muitas vezes desconhecido e estranho ao conjunto dos profissionais do

Serviço Social.

Destarte, percebermos ser esta temática ainda pouco debatida no meio

acadêmico. Chegamos a esta conclusão através da busca pela bibliografia sobre o

tema – prática profissional dos assistentes sociais nas instituições das Forças

Armadas, em específico, na Aeronáutica.

Entendemos que este estudo apresenta um caráter predominantemente

exploratório. Desse modo, faz-se pertinente nutrir o debate atual do Serviço Social,

principalmente, se levarmos em consideração que: a prática profissional no campo

militar ainda não é uma área discutida e publicizada no interior do Serviço Social,

não tendo, portanto, destaque nos debates atuais da profissão.

Para uma melhor compreensão desse espaço, torna-se imprescindível,

captarmos na realidade concreta, os limites e as possibilidades do movimento do

real na sua historicidade. Para tanto, faz-se necessário uma reflexão tendo por

alicerce o referencial teórico marxista crítico-dialético que possibilite ir para além da

aparência dos fatos.

Page 20: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

18

Com aporte em Behring, podemos dizer que a investigação marxista

caracteriza-se, assim, por não se deixar enganar por aspectos e semelhanças

superficiais presentes nos ―fatos‖, procurando chegar à essência do fenômeno.

(MARX in BEHRING, 2006:39).

De acordo com Vasconcelos (1995):

―(...) as tendências, limites e possibilidades estão na realidade e não na

cabeça dos homens e, para chegar a reconhecê-las é necessário um

método que dê conta do movimento da realidade, ou seja, que capte a

verdade desse movimento‖.

Para Vasconcelos (2007), o método é uma relação necessária entre sujeito

que pesquisa e objeto pesquisado, possibilitando ao sujeito reproduzir o movimento

do objeto (realidade social); relação necessária na medida em que é a única que

permite ao sujeito conhecer realmente o que se passa com o objeto.

Assim, ao analisar a prática dos assistentes sociais nos serviços de saúde da

Aeronáutica/RJ, buscamos considerar que o momento atual vivenciado pela

categoria dos assistentes sociais defronta-se com o desafio de uma determinada

cultura profissional calcada no ressurgimento do conservadorismo profissional, sob a

forma de um neoconservadorismo – como é destacado na produção teórica de

diversos autores, a exemplo de Iamamoto (1998) e Netto (1996), bem como

apontado pelas entidades da categoria como o Conjunto CFESS / CRESS5,

ABEPSS e ENESSO.

Portanto, acreditamos que a ação de pesquisar está situada entre as

exigências postas ao Assistente Social na contemporaneidade e que imprime uma

necessidade de romper com a prática espontaneísta, superando a dicotomia entre

investigação e intervenção.

É certo que uma instituição cujo funcionamento se aproxima do modelo de

instituição ―fechada‖ e conservadora, fundamentada nos princípios da hierarquia e

5 O Conselho Regional de Serviço Social - 7ª Região e o Programa de Pós - Graduação da Faculdade de Serviço Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) trouxeram a público a discussão do Serviço Social Clínico - um dos temas polêmicos do debate profissional na atualidade - em junho de 2002. A reflexão acerca do Serviço Social Clínico, entretanto, não se inicia aí. Ela remonta ao protagonismo do Conjunto CFESS/CRESS, desde 1996, na condução das discussões quanto às atribuições profissionais do assistente social.

Page 21: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

19

da disciplina6, sinalize, a priori, uma inviabilidade real de um projeto profissional

que traga contribuição em processos emancipatórios.

Será mesmo? Não podemos cair numa postura fatalista da profissão7, de que

nada pode ser feito dentro das ―amarras das instituições ‗fechadas‘ e burocráticas‖.

Para alguns autores, essas interpretações fatalistas têm levado uma parcela dos

assistentes sociais a minimizar a dimensão operativa e política da sua prática,

reduzindo-as a uma questão de subordinação e até de desvalorização profissional.

Vasconcelos in Mota (2007), ao analisar a viabilidade do projeto hegemônico

no debate teórico da categoria profissional através da pesquisa realizada junto aos

assistentes sociais da Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro8 afirma:

―(...) É pelo conjunto da prática dos assistentes sociais que a profissão de Serviço social é reconhecida ou não, valorizada ou não, respeitada ou não, conquistando sua autonomia e espaços ou não. (...) Assim, explicitamos o grave momento por que vem passando a prática profissional dos assistentes sociais. (...) a fratura entre prática profissional realizada pelos assistentes sociais e as possibilidades de prática contidas na realidade objeto da ação profissional.” (grifo no original).

Nesse marco, situamos a importância da perspectiva de historicidade que nos

permite compreender a dialética relação passado/presente.

Suscitada então, pela realidade complexa e contraditória da prática

profissional do assistente social na saúde/Aeronáutica/RJ, questionamentos e

inquietações vieram à tona, delimitando o objeto de pesquisa. Ante tal circunstância,

nos atentamos para a assertiva de Otávio Cruz (apud, Minayo,1994), ao falar sobre

a postura do pesquisador em relação à problemática a ser estudada. Para o autor,

às vezes o pesquisador entra em campo considerando que tudo que vai encontrar

serve para confirmar o que ele considera já saber, ao invés de compreender o

campo como possibilidade de novas revelações.

Assim, a pesquisa e análise sobre a prática dos assistentes sociais tiveram

como objetivos específicos, quais sejam:

6 Para hierarquia (leia-se: ordenação da autoridade em níveis diferentes dentro da estrutura das Forças Armadas) e para disciplina (leia-se: condição necessária ou conjunto de regras, mantendo-se submissa a elas o militar). Cf. Estatuto dos Militares - Lei nº 6.880 de 9/12/80. 7 Para Iamamoto, o fatalismo é ―inspirado em análises que naturalizam a vida social, traduzido numa visão ‗perversa‘ da profissão. Como a ordem do capital é tida como natural e perene, apesar das desigualdades evidentes, o Serviço Social encontrar-se-ia atrelado às malhas de um poder tido monolítico, nada lhe restando fazer. No máximo, caberia a ele aperfeiçoar formal e burocraticamente as tarefas que são atribuídas aos quadros profissionais pelos demandantes da profissão‖. Cf. Iamamoto, 1992:115. 8 Para maiores informações consultar Vasconcelos, Ana Maria. A prática do Serviço Social, cotidiano, formação e alternativas na área da saúde. Cortez Editora, São Paulo, 2002.

Page 22: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

20

Identificar o perfil dos assistentes sociais que atuam nos serviços de saúde da

Aeronáutica/RJ;

Identificar as referências de conhecimento teóricas e ético-políticas dos

assistentes sociais;

Identificar se os assistentes sociais buscam aperfeiçoamento e/ou

aprimoramento profissional, visando uma capacitação que possa responder

as demandas do Serviço Social.

Inicialmente, foi realizado o levantamento bibliográfico sobre a temática

prática dos assistentes sociais nos serviços de saúde das Forças Armadas

(Aeronáutica, Marinha e Exército), com ênfase no município do Rio de Janeiro, bem

como o aprofundamento teórico sobre a prática dos assistentes sociais na saúde,

com ênfase em hospitais.

Esse levantamento desenvolve-se através de pesquisa em distintas

bibliotecas: UERJ, UFRJ, UFJF, PUC-RJ; pelas ferramentas de busca da internet

(Scielo); pelo banco de teses do site www.assistentesocial.com.br.

Contudo, não foi encontrado nenhum estudo voltado à temática prática dos

assistentes sociais nos serviços de saúde da Aeronáutica, assim como da Marinha

e/ou do Exército; foram encontrados estudos no tocante à Política de Assistência

Social da Marinha (PUC-RJ) e no que se refere à temática do Idoso e de sua

internação em uma instituição geronto-geriátrica: estudo realizado na Casa

Gerontológica de Aeronáutica Brigadeiro Eduardo Gomes (UNATI/UERJ).

No tocante ao procedimento de pesquisa, colhemos e analisamos os dados

sobre a prática dos assistentes sociais, através do instrumento formulário de

entrevistas9, na busca de dados qualitativos e quantitativos. Para tanto, foi solicitado

prévia autorização junto ao Serviço Social da Subdiretoria de Encargos Especiais

(SDEE) da Diretoria de Intendência (DIRINT), do Comando da Aeronáutica10, bem

como utilizado o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, devidamente datado

e assinado pelas profissionais entrevistadas, e pesquisadora.

9 Formulário ANEXO I. 10

Autorização para aplicação de formulário de entrevistas junto às assistentes sociais dos serviços de saúde da Aeronáutica/RJ, através de documento fax destinado a SDEE em 25/03/2009.

Page 23: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

21

Portanto, as entrevistas foram anotadas e gravadas com o consentimento

prévio das entrevistadas, posteriormente, digitadas em um banco de dados da

pesquisa, em programa que permite a análise detalhada dos dados.

Ressalta-se que somente a partir do mês de dezembro de 2009, que a

Comissão de Ética e Pesquisa (CEP) do Hospital de Força Aérea do Galeão,

(unidade na qual esta pesquisadora encontra-se inserida), efetivou devido

credenciamento junto ao Conselho Nacional de Ética e Pesquisa (CONEP), com

previsão de atuação para o ano de 2010.

Este estudo teve com lócus de investigação os serviços de saúde da

Aeronáutica/RJ, junto aos assistentes sociais que atuam nessas instituições, em

específico, nos Hospitais do município do Rio de Janeiro, quais sejam:

Hospital de Aeronáutica dos Afonsos/HAAF (localizado no Bairro

Sulacap);

Hospital Central da Aeronáutica/HCA (localizado no Bairro Rio

Comprido);

Hospital de Força Aérea do Galeão/HFAG (localizado no Bairro Ilha do

Governador).

Ao realizarmos uma análise dos depoimentos dos assistentes sociais

entrevistados, buscamos considerar a cotidianidade da prática profissional, que

revela presenças e ausências, aponta problemas imediatos, desvela/oculta,

caminhando do particular para o universal. Embora a prática cotidiana do assistente

social se efetive por aproximações, desvios, soluções para resolver dificuldades

imediatas, isso não significa que o saber necessário para a ação no serviço social se

restrinja ao cunho utilitarista ou imediatista. Significa, sim, que, seja qual for seu

objeto, direta ou indiretamente, o profissional poderá procurar encaminhar suas

reflexões e seus resultados em um sentido histórico, social, político e técnico de

produção de conhecimentos que tem em vista uma prática mais conseqüente

(BAPTISTA, 2006).

Visando subsidiar a etapa de análise empírica do nosso objeto, valemo-nos,

também, de um roteiro de observação (técnica de observação direta11), que

possibilita captar o movimento das unidades de saúde; identificar as demandas – 11 A técnica da observação direta, ou pessoal, consiste, portanto, na verificação in loco de tudo o que acontece no ambiente em que se desenvolve o processo em estudo, de forma sistemática e planejada.

Page 24: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

22

institucionais e da população usuária e as possibilidades de prática para o Serviço

Social. Ao realizarmos uma análise dos depoimentos das assistentes sociais

entrevistadas, buscamos considerar a cotidianidade da prática profissional, que

revela presenças e ausências, aponta problemas imediatos desvela/oculta,

caminhando do particular para o universal.

Tem-se nesses espaços, uma atuação desafiante para aqueles profissionais

que buscam romper com práticas burocráticas e conservadoras e que visam

fortalecer práticas democráticas e coletivas de atendimento às demandas no

contexto institucional.

Este estudo configurou-se da seguinte forma:

No Capítulo 1, buscamos fazer um resgate do período sócio-histórico do

regime ditatorial (1964 a 1985), até a retomada das bases federativas do Estado

brasileiro, apresentando as análises feitas sobre a significação do golpe militar de 64

e a implantação da ditadura no país e as conseqüências desta na configuração do

Estado brasileiro. Em seguida, abordamos o processo de redemocratização no país

com a vital participação dos movimentos sociais, bem como a histórica interlocução

do Serviço Social brasileiro, com estes, em específico, com o movimento sindical-

operário. Abordamos, também, a trajetória da política de saúde no Brasil e o

processo de descentralização da saúde ante ao conjunto de reformas político-

institucionais iniciadas na década de 80, com destaque para a constituição de um

Sistema Único de Saúde ao final dos anos 80.

No Capítulo 2, objetivamos refletir sobre a política de saúde nos anos 90 e no

governo Lula, culminando nos desafios atuais postos para esta, bem como para o

projeto ético-político do Serviço Social. Em seguida, apresentamos a configuração

da prática profissional dos assistentes sociais na saúde.

No Capítulo 3, destacamos, inicialmente, os procedimentos metodológicos

utilizados para a conformação deste estudo. Em seguida, apresentamos as análises

suscitadas a partir das respostas das assistentes sociais entrevistadas.

Page 25: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

23

CAPÍTULO I – ESTADO, SAÚDE E SERVIÇO SOCIAL

“Dormia a nossa Pátria mãe tão distraída

sem perceber que era subtraída em

tenebrosas transações”.

Chico Buarque de Hollanda

Neste capítulo, mergulhamos nos determinantes sócio-históricos do regime

ditatorial com a instauração do golpe de abril de 64, procurando apreender seu

sentido e significado, pois, embora o Brasil celebre 24 anos de democracia depois

de 21 anos de ditadura militar, podemos dizer que o regime militar brasileiro marcou

profundamente a todos, sejamos contemporâneos ou não, protagonistas ou não de

um processo doloroso e assustador da história do país. Na verdade, os resquícios

desse período ainda se fazem sentir.

Isto nos permite compreender que a instauração da ditadura militar no pós-64

expressou a derrota das forças democráticas no Brasil. O Estado vai intervir na

questão social por meio do binômio repressão – assistência, burocratizando e

modernizando a máquina estatal com a finalidade de aumentar o poder de regulação

sobre a sociedade, de reduzir as tensões sociais e de conseguir legitimidade para o

regime (BRAVO e MATOS, 2004).

Percorremos pelo movimento de redemocratização do país com a vital

participação dos movimentos sociais e do Serviço Social. Posteriormente,

discorremos sobre a interface do Serviço Social com a Saúde através de um breve

histórico. Vamos encontrar uma política de saúde no período de 1964 a 1974, que

privilegia o setor privado, articulada às tendências da política econômica implantada.

Nesse marco, situamos que o Serviço Social no pós-64 sofreu profundas

transformações, que tiveram rebatimento na prática profissional do assistente social

na área da saúde. É o que veremos mais adiante.

Page 26: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

24

1.1 Os militares e o Estado: o significado do golpe de abril de 64

De acordo com D‘Araújo (2001, p. 325), definir o papel e os limites da ação

dos militares no Brasil é sempre uma questão importante e por várias razões. Em

primeiro lugar, desde a Proclamação da República, as Forças Armadas são uma

instituição central na definição dos rumos políticos do país. Em segundo, porque os

militares desenvolveram projetos próprios acerca de segurança e desenvolvimento

nacionais, o que ficou expresso em movimentos como o Tenentismo em 1920, o

Nacionalismo dos anos 50 e o Anticomunismo dos anos 60. Em terceiro, porque

sempre fizeram parte do cálculo político de partidos e grupos políticos que

permanentemente viram nas Forças Armadas um aliado importante para a conquista

e manutenção do poder ou a derrubada de grupos concorrentes.

Assim, as Forças Armadas Brasileiras efetivaram a dominação autoritária do

Estado em nome de um denominado projeto de ―Brasil Futuro‖, que buscava a

aceleração do desenvolvimento capitalista e a incorporação do Brasil ao espaço

econômico, cultural e político das nações capitalistas centrais. Sinalizam, assim, um

padrão de desenvolvimento econômico associado subalternamente aos interesses

imperialistas, com uma integração mais dependente do sistema capitalista.

Para Netto (1996), nunca escapou aos analistas da ditadura brasileira que

sua emergência inseriu-se num contexto que transcendia largamente as fronteiras

do país. Movendo-se na moldura de uma substancial alteração na divisão

internacional capitalista do trabalho, os centros imperialistas sob o hegemonismo

norte-americano patrocinaram, especialmente nos anos sessenta, uma

contrarrevolução preventiva12, principalmente no chamado Terceiro Mundo, onde se

desenvolviam, diversamente, amplos movimentos de libertação nacional e social.

Segundo o historiador e militar da reserva Nelson Werneck Sodré13, que

apresenta em sua obra uma análise crítica quanto às condições para a implantação

da ditadura no país (denominada pelo autor de regime fascista14), a influência do

12 Cf. NETTO, José Paulo. Ditadura e Serviço Social: uma análise do Serviço Social no Brasil pós-64. São Paulo: Cortez, 1996. (p. 16-25). 13 Cf. SODRÉ, Nelson Werneck. Vida e Morte da Ditadura. São Paulo: Vozes, 1984. 14 Regime político de caráter totalitário que surge na Europa no entre-guerras (1919-1939). Originalmente é empregado para denominar o regime político implantado pelo italiano Benito Mussolini entre 1919 e 1943. O fascismo nasce oficialmente em 1919, em Milão, quando Mussolini funda o movimento intitulado Fascio de Combatimento, cujos integrantes, os camisas pretas (camicie nere), se opõem à classe liberal. Pretendem tomar

Page 27: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

25

imperialismo dos Estados Unidos na constituição e consolidação do golpe de abril de

64 arraiga profundas marcas na história do regime militar como parte de uma tríplice

aliança entre as Forças Armadas brasileiras, a burguesia nacional e a burguesia

estrangeira.

Fernandes (1987), através de uma interpretação sociológica da Revolução

Burguesa no Brasil e de um exame detalhado do processo que culminou no golpe de

abril de 1964, teceu sua análise na perspectiva de entender o movimento histórico

das transformações econômicas, políticas e sociais desde o início da consolidação

da hegemonia burguesa na sociedade brasileira.

O período do regime militar apresentou considerável crescimento econômico,

concentração de riqueza, empobrecimento relativo dos trabalhadores em geral e

empobrecimento absoluto do operariado. Foi marcado, ainda, pela implantação de

um amplo e complexo sistema de gestão e regulação estatal dos conflitos sociais em

que a política social integra o conjunto das estratégias do governo.

De um lado, o estímulo à produção e à concentração de riquezas e, de outro,

a legitimação de um modelo de desenvolvimento apresentado como o melhor para a

nação, sob o lema da segurança nacional contra as ameaças internas e externas de

instauração, no país, de outro modo de pensar e de organizar a sociedade, que

fosse contrário aos interesses capitalistas dominantes (SILVA, 1999, p. 63).

Segundo Bravo (2007), o Estado utilizou para sua intervenção o binômio

repressão - assistência, sendo a política assistencial ampliada, burocratizada e

modernizada pela máquina estatal com a finalidade de aumentar o poder de

regulação sobre a sociedade, suavizar as tensões sociais e conseguir legitimidade

para o regime, como também servir de mecanismo de acumulação do capital.

De acordo com a assertiva de Netto (1996, p.17), “a significação do golpe de

abril, sem menosprezo da contextualidade internacional da contrarrevolução

preventiva, deve ser buscada na particularidade histórica brasileira”.

Sublinha o autor,

As linhas de força que mais decisivamente contribuíram para perfilar esta

particularidade são conhecidas: a construção, desde o período colonial [...]

de atividades econômicas básicas internas cujo eixo de gravitação era o

mercado externo, o mercado, mundial em emergência e, ulteriormente, em

consolidação (PRADO Jr., 1963 e 1965); a ausência de uma nuclear e

o poder militarmente e ocupam prédios públicos e estações ferroviárias, exigindo a formação de um novo gabinete.

Page 28: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

26

radical ruptura com o estatuto colonial (FERNANDES, 1975), [...] (NETTO,

1996, p.17).

De acordo com Fernandes (1982, p. 10), a busca no passado recente da

história do Brasil torna-se a chave explicativa para as origens da atual configuração

do Estado brasileiro. Como afirma:

[...] não se pode dissociar o Estado, o governo e a sociedade; se isso fosse feito, não se poderia entender as origens, os limites e as funções do Estado e como este é determinado socialmente e se transforma historicamente e como o governo surge e cresce como uma forma política destinada a reproduzir, a defender e a impulsionar a evolução progressiva (ou regressiva) de certo tipo de Estado.

O autor parte do pressuposto de que o regime político brasileiro teria duas

caras, dois lados de uma mesma moeda: a democracia burguesa e a república

institucional.

Para Fernandes (1982), o que explicaria a existência da "república

institucional" seria a incapacidade de a "classe burguesa" manter o poder por si

mesma. Esta incapacidade derivaria do caráter predatório e parasitário do

capitalismo brasileiro, uma característica comum aos países periféricos de

desenvolvimento tardio. Portanto, tímida, assustada e muito preocupada, a

burguesia nacional não assumiria seu papel de levar à frente uma revolução

burguesa profunda, que implicaria a sua independência em relação ao capitalismo

monopolista internacional e o estabelecimento de uma democracia de massas com

ampla participação dos sindicatos e partidos de esquerda.

Fernandes (ibidem) afirma que, devido ao seu temor e pânico, a burguesia

nacional terminaria por pedir a ajuda aos militares, os quais implantaram um regime

repressivo e autoritário.

O Golpe

Podemos dizer que o início da década de 60 foi marcado por uma ampla

efervescência dos grupos de esquerda15 e dos movimentos culturais. O governo

João Goulart era visto com receio: temido por apresentar uma direção política mais

15 O movimento estudantil da época era reconhecido por ser ativo e bem articulado, com grande impacto na opinião pública. Igualmente, o movimento operário se destacava por sua autonomia sindical – através do CGT (Comando Geral dos Trabalhadores), um tipo de diretório central, que organizava greves, bem como reivindicava, constantemente, a ampliação dos direitos trabalhistas. Cf. José Murilo de Carvalho. Forças Armadas e Política no Brasil. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editora, 2005.

Page 29: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

27

afinada com as bases de esquerda, despertando um significativo número de

oposicionistas, e (re)considerado por alguns um governo populista e reformista

burguês, sem reais preocupações com transformações de ordem econômico-social.

Como informa Carvalho16 (2005, p.118):

[...] Era grande a politização do mundo estudantil. Em consonância com o que passava na política nacional. Muitos de nós acreditávamos ingenuamente que o país caminhava para o socialismo e queríamos fazer parte da jornada. O presidente João Goulart era visto com suspeita, mas acreditávamos que o movimento popular, os operários, os estudantes, os camponeses, operariam a mudança com ou sem ele

Aos 13 de março de 1964, no Rio de Janeiro, o ―Comício das Reformas‖

realizado por Jango, juntamente com o apoio do Comando Geral dos Trabalhadores

(CGT), em praça pública, foi o assombro para a burguesia nacional. A eclosão de

movimentos organizados da sociedade civil terrificava cada vez mais a burguesia

nacional, que não demorou a se manifestar.

Em 19 de março, os inimigos do presidente - com o intento de criar uma

atmosfera favorável à intervenção militar, bem como de incitar as Forças Armadas

ao golpe de Estado - reuniram cerca de 500 mil manifestantes que saíram pelas ruas

de São Paulo, em favor da ―Marcha da Família com Deus pela Liberdade‖.

Incentivados por políticos do Partido Social Democrata – PSD e da União

Democrática Nacional - UDN (representantes dos grandes proprietários de terras e

setores conservadores da Igreja Católica), os setores da classe média e da

burguesia, em defesa da propriedade, da moral cristã, da fé religiosa e a favor do

anticomunismo, saíam às ruas nas maiores capitais do país contra o governo

Goulart.

Em 1º de abril de 1964, já não havia mais dúvidas, o golpe fora consolidado,

fruto do triunfo de um movimento histórico que vinha se estruturando desde a

década de 50.

Segundo relato de Carvalho (2005),

Contemplávamos, perplexos, a alegria dos que celebravam a vitória e

assistíamos, assustados, ao início da violência contra os derrotados. Alguns

16 O autor José Murilo de Carvalho era aluno em 1964 do curso de Sociologia e Política da Faculdade de Ciências Econômicas, da antiga Universidade de Minas Gerais e militava na Ação Popular, grupo de esquerda católica. Cf. José Murilo de Carvalho (idem).

Page 30: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

28

alunos da faculdade, partidários do golpe, andavam armados pela cidade

caçando os colegas de esquerda. O sonho do socialismo esboroava-se

como um castelo de areia.

De acordo com Netto (1996, p. 25), o desfecho de abril foi a solução política

que a força impôs:

a força bateu o campo da democracia, estabelecendo um pacto contrarrevolucionário e inaugurando o que Florestan Fernandes qualificou como “um padrão compósito e articulado de dominação burguesa” 17 [...], expressou a derrota das forças democráticas, nacionais e populares; todavia, o seu significado histórico-social era de maior fôlego: o que o golpe derrotou foi uma alternativa de desenvolvimento econômico social e político que era virtualmente a reversão do já mencionado fio condutor da formação social brasileira. (grifos nossos).

Para o autor, o fulcro dos dilemas brasileiros no período 1961-1964 pode ser

sintetizado na constatação de uma crise da forma da dominação burguesa no Brasil,

gestada fundamentalmente pela contradição entre as demandas derivadas da

dinâmica do desenvolvimento embasado na industrialização pesada e a modalidade

de intervenção, articulação e representação das classes e camadas sociais no

sistema de poder político. Conforme afirma o autor:

[...] sabe-se em que sentido os setores burgueses resolveram os seus dilemas: deslocaram-se para o campo da antidemocracia. Tal deslocamento, como ocorreu em abril de 1964, implicou, em relação ao passado recente da formação social brasileira, um movimento simultaneamente de continuidade e ruptura. (NETTO, 1996, p.26).

A continuidade se expressa no resgate das piores tradições da sociedade

brasileira – a heteronomia18 e a exclusão. Entretanto, as dimensões principais do

sistema autocrático que se ergue a partir do golpe de 64 são as que transcendem a

pura reiteração dos traços consagrados na formação brasileira – são exatamente as

que determinam os traços que caracterizam a novidade do que se constituiu

precisamente em centro articulador e meio coesionador da autocracia burguesa, o

seu Estado. Continuando o autor afirma:

[...] O Estado que se estrutura depois do golpe de abril expressa o rearranjo político das forças sociais econômicas a que interessam a manutenção e a continuidade daquele padrão de acumulação que garante a prossecução de tal padrão, mas, isto é crucial, readequando-o às novas condições internas

18 Heteronomia: Condição de pessoa ou grupo que receba de um elemento que lhe é exterior, ou de um princípio estranho à razão, a lei a que se deve submeter.

Page 31: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

29

]e externas que emolduravam [...]. O Estado erguido nos pós-64 tem por funcionalidade assegurar a reprodução do desenvolvimento dependente e associado, assumindo, quando intervém diretamente na economia o papel de repassador de renda para os monopólios, e politicamente mediando os conflitos setoriais em benefício estratégico das corporações transnacionais [...]. (1996, p.28).

O golpe militar de 1964 não apenas representou um contramovimento às

transformações culturais e políticas, mas também apresentou, clara e nitidamente,

um objetivo muito específico: implantar legitimamente no país uma política de terror

com vistas ao aprofundamento do capitalismo monopolista.

Carvalho (2005) menciona que foram estabelecidas diversas tentativas de

atribuir ao golpe de 1964 a sua inevitabilidade. Para o autor, a maioria dessas

tentativas surgiu no seio da própria esquerda, como uma justificativa para seus

―erros políticos‖. Ainda de acordo com Carvalho, a explicação mais difundida foi a de

que o golpe resultou de uma conspiração por parte do imperialismo norte-americano.

Assim, no que se refere à interferência norte-americana, deve-se notar que a

documentação sobre ela só foi conhecida muito depois, quando foram abertos os

arquivos do presidente norte-americano Lyndon Johnson19. Soube-se, então, que a

operação Brother Sam20 consistia em plano de interferência a ser posto apenas no

caso de haver guerra civil em que os golpistas necessitassem de apoio21.

Carvalho (2005) não desconsidera que os Estados Unidos estavam

interessados na derrota do presidente João Goulart, pois havia dinheiro americano

no Instituto Brasileiro de Ação Democrática (IBAD) e a CIA22 não descansava. Para

19 Lyndon Baines Johnson (1908- 1973) foi o trigésimo sexto presidente dos Estados Unidos da América, de 1963 a 1969. 20 A Operação Brother Sam foi desencadeada pelo governo dos Estados Unidos da América, sob a ordem de apoiar o golpe de 1964 caso houvesse algum imprevisto ou reação por parte dos militares que apoiavam Jango, consistindo de toda a força militar da Frota do Caribe, liderada por um porta-aviões da classe Forrestal da Marinha dos Estados Unidos e outro de menor porte, além de todas as belonaves de apoio requeridas a uma invasão rápida do Brasil pelas forças armadas americanas. Cf. Endereço eletrônico. http://pt.wikipedia.org. Acesso em 13/12/2008. 21 Em 1997, foi oficialmente divulgada nos EUA a transcrição de fitas gravadas de conversas do presidente Lyndon Johnson, a respeito do Brasil. Em uma delas, no dia 20 de dezembro de 1963, o presidente Johnson diz para o senador Mike Mansfield (líder do governo): "Preciso sentar e conversar com você sobre o que está acontecendo no Brasil. Preciso contar o que está acontecendo no Vietnã. Acho que você não sabe. Não creio que você saiba como é séria a situação". Em outra, na noite de 30 de março de 1964, com o assessor George Reedy, o presidente afirma: "Com certeza, se explodir nesta noite, você saberá amanhã de manhã". E Reedy: "É verdade. E então vamos precisar de uma reação. Mas, se não explodir nesta noite, acho que devemos ficar no já previsto‖. (...) Outro trecho, já pós-golpe (em 3 de abril), mostra diálogo do presidente com o subsecretário de Estado para Assuntos Interamericanos, Thomas Mann. "Espero que você esteja tão feliz com o Brasil quanto eu", diz Mann. "Estou", responde o presidente. "Creio que é a coisa mais importante que aconteceu no hemisfério nos últimos três anos", torna Mann. E o presidente: "Espero que nos dêem crédito, em vez de nos infernizarem". Cf. Veja on-line: http://veja.abril.com.br. Acervo Digital. “O embaixador e o golpe”, de Eurípedes Alcântara em 15/10/1997. 22 Central Intelligence Agency (CIA), em português Agência Central de Inteligência, é um serviço de inteligência (serviço de informações) dos Estados Unidos da América.

Page 32: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

30

o autor (ibidem, p.121): “tudo isso no máximo encorajou os golpistas, mas a

conspiração foi interna como internas as causas de seu êxito”. Nas palavras de

Carvalho:

[...] Para os golpistas, foi boa notícia, para a esquerda, foi um choque. Como fora possível uma vitória tão fácil? Onde estavam os sindicatos, os estudantes, o movimento popular, os generais do povo, o dispositivo militar? [...] O presidente denunciava o golpe da oposição de direita, que denunciava o golpe do presidente; a esquerda radical, liderada por Brizola e seus Grupos dos Onze23, denunciava o golpe do presidente e da direita, era acusada por ambos de preparar o próprio golpe. Mas ninguém esperava um desfecho tão rápido (2005, p.119).

Para Dreifuss (1981), a implantação do golpe teria por objetivo a conquista da

hegemonia, da fração multinacional e associada da burguesia. Ou seja, segundo o

autor, as elites foram capazes de assegurar o poder econômico e administrativo,

transformando o aparelho do Estado em um objeto dos interesses monopolistas.

O autor assevera:

O poder de classe dos interesses multinacionais e associados foi expressado, depois de abril de 1964, através da hegemonia para eles estabelecida dentro do aparelho de Estado, do controle direto das agências de formulação de diretrizes políticas e de tomada de decisão e da presença pessoal dos representantes desses interesses econômicos na administração em geral (1981, p.419).

Segundo o autor, a queda do governo do presidente João Goulart ocorreu não

por um golpe das Forças Armadas Brasileiras, mas sim em decorrência de um

movimento civil-militar. Os articulistas do golpe seriam as classes dominantes, os

latifundiários, os grandes empresários e banqueiros, liderados por associações de

classe sob a coordenação e a cobertura ideológica do Instituto Brasileiro de Ação

Democrática (IBAD) e do Instituto de Pesquisas Econômicas e Sociais (IPES).

Em contraponto, Carvalho (2005, p.126) considera que o desfecho do golpe

de 64 se deu muito mais pelas ações e omissões de agentes políticos, do que pelas

grandes causas sociais. Segundo o autor, explicadas ou não as surpresas de 1964,

a responsabilidade principal pelo golpe foi dos que o deram e não dos que o

sofreram. Como afirma: “os vencedores contaram, no entanto, com a ajuda dos

perdedores”. 23 Brizola, em fins de novembro de 1963, pregava a formação de "grupos de onze companheiros" ou "comandos nacionalistas". O ―Grupo dos Onze‖ tinha como objetivo lutar pela implantação das reformas e a libertação do Brasil da espoliação internacional. O movimento previa o lançamento de um periódico denominado ―Panfleto‖, que só teve o seu primeiro número impresso. Brizola continuava sua caminhada pela esquerda radical, despontando como o principal líder rebelde no Brasil. Cf. Endereço eletrônico: (http://www.pdt.org.br ) Link Memória trabalhista/nossos lideres/LeonelBrizola.

Page 33: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

31

Ao explicitar sua tese, o autor utiliza-se de expressões de Maquiavel24: como

virtù (para designar a predominância das ações) e fortuna (para os fatores não

controláveis). O golpe e sua rápida vitória não foram determinados pela presença da

fortuna, mas pela ausência de virtù: “não me parece que o processo democrático

que se construía às duras penas tenha sido interrompido por fatores independentes

da ação humana” (idem, p.127).

Na assertiva de Carvalho, os militares tinham e têm interesses próprios.

Desse modo,

―havia um interesse corporativo e um interesse nacional, industrializante,

que se combina com o projeto de algumas elites civis. Havia uma aliança,

sem dúvida, mas não só. Tanto que, logo depois do golpe, vários aliados de

véspera começaram a romper‖ (2005, p.127).

Carvalho (ibidem) apresenta uma análise centrada na valorização do papel do

militares. Menciona que suas apreciações se distanciam das demais análises da

intervenção militar. Nesses termos, o autor dialoga com as análises marxistas que,

segundo o autor, atribuem às intervenções militares o papel de instrumento da

burguesia industrial para ganhos econômicos e políticos, haja vista os fatores

estruturais da sociedade tais como a posição do país no sistema capitalista; a

natureza da luta de classes; o tipo de modernização em vigor.

Pois bem. Com base nas análises aqui apresentadas, podemos dizer que o

golpe de 1964 é oriundo de vários fatores, de precedência política, econômica,

ideológica. As estratégias de legitimação da larga duração da ditadura militar foram

implacavelmente atinentes ao aprofundamento do capital internacional no país.

É fato que inúmeras interpretações para o ―fenômeno‖ do golpe de 64 foram

exaustivamente trabalhadas no debate político-social do país. De acordo com a

literatura, as principais e mais sólidas teses explicativas do fenômeno podem ser

agrupadas em três correntes, quais sejam: as tentativas de teorização da Ciência

Política, as análises marxistas e a valorização do papel dos militares.

Reiteramos que a perspectiva teórica que nos orienta é o materialismo crítico-

dialético, o que nos permite compreender o regime político ditatorial como um

processo e resultado de relações complexas e contraditórias que se estabelecem

entre Estado e sociedade no âmbito do conflito de classes.

24 Cf. MAQUIAVEL, Nicolau. O Príncipe. Escritos Políticos. Edição Os Pensadores. Editora Nova Cultural Ltda: Tradução Olívia Baudh. São Paulo, 2004.

Page 34: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

32

As disparidades, desigualdades e contradições colocam-se, desde o começo,

como momentos nucleares das relações, processos e estruturas de dominação

política e apropriação econômica que produzem e reproduzem a sociabilidade

burguesa. A contestação está implantada em nível das estruturas, do funcionamento

e das transformações dessa sociedade de classes, nascida do capitalismo industrial

(IANNI, 2004).

Fernandes (1982) menciona que o regime ditatorial e a vinculação dos

militares aos setores sociais dominantes - tendo em vista as muitas intervenções

realizadas por eles no decorrer da história do país - não foram iniciativas isoladas de

certos membros da Forças Armadas. A intervenção militar se deu em vários

momentos após a realização de contatos e articulações com determinados setores

da esfera civil, como os políticos conservadores e certos grupos do empresariado

nacional e multinacional.

O autor em outra obra de 1987 considera que a revolução burguesa

desenvolve-se de forma lenta e contraditória, sempre pelo alto, excluindo ou

limitando bastante as conquistas democráticas que possam representar a presença

do trabalhador da cidade e do campo nos diferentes círculos em que organiza o

poder.

Para Netto (1996), na verdade, a ditadura militar reeditou a modernização

conservadora como via de aprofundamento das relações sociais capitalistas no

Brasil, de natureza claramente monopolista. Para o autor, o Estado ditatorial e o

regime político que o expressa haveriam de se constituir num processo dinâmico e

contraditório, plasmado pela intercorrência dos conflitos e tensões entre os parceiros

do pacto contrarrevolucionário, pelas formas de oposição e resistência que

encontrariam na afirmação do novo bloco dominante e suas políticas e das novas

colisões derivadas das suas iniciativas econômicas e sociais. Assim, o ciclo

autocrático burguês recobre três momentos nitidamente diferenciados, quais sejam:

de abril de 1964 a dezembro de 1968; de dezembro de 1968 a 1974 (envolvendo

basicamente o fim do governo Costa e Silva, o intermezzo da Junta Militar e todo o

governo Médici); e o governo Geisel (1974-1979).

O primeiro momento (1964-1968) é singularizado, ainda de acordo com Netto

(ibidem), pela inépcia da ditadura legitimar-se politicamente, em articular uma ampla

base social de apoio que sustentasse as suas iniciativas. Portanto, a aceleração do

Page 35: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

33

processo político foi potencializada por dois fenômenos: o movimento operário e

sindical retomou ações significativas e o movimento estudantil, expressão

privilegiada da pequena burguesia urbana, assumiu ruidosamente a frente da

contestação à nova ordem.

Logo, os militares reagiram. O novo governo passou a governar por decreto, o

chamado AI (Ato Institucional). O presidente baixava o AI sem consultar ninguém e

todos tinham de obedecer. O AI-1 determinava que a eleição para presidente da

República fosse indireta. Posteriormente, o AI-2 acabava em definitivo com as

eleições diretas para presidente da República, bem como com os partidos políticos

tradicionais. O PSD, o PTB, a UDN foram proibidos de funcionar, podendo existir

somente dois partidos políticos: a Arena (Aliança Renovadora Nacional), o partido do

governo e o MDB (Movimento Democrático Brasileiro), o partido da oposição.

A partir do ano de 1968, o que fora, até então, uma ditadura reacionária, que

conservava, segundo Netto (1996), ―um discurso coalhado de alusões à democracia

e uma prática política no bojo da qual ainda cabiam algumas mediações de corte

democrático parlamentar, converte-se num regime político de nítidas características

fascistas25”.

O começo do ano de 1968 foi palco de mobilização estudantil; os estudantes

tinham conseguido rearticular um centro de resistência, a União Nacional dos

Estudantes (UNE), que, após a morte do estudante Edson Luís26, manifestou o

repúdio às ações repressivas dos militares com a passeata dos ―Cem Mil‖ no Rio de

Janeiro, a qual mobilizou a Igreja Católica e a classe média.

As passeatas de estudantes passaram a ser violentamente reprimidas pelas

próprias Forças Armadas e muitos estudantes foram feridos. O congresso secreto da

UNE, em Ibiúna (SP), foi dissolvido e, como resultado, 1.240 estudantes presos.

Nesse marco, situamos, no âmbito da esquerda, que a militância em oposição

à ditadura militar brasileira não foi homogênea; diferentes projetos societários se

articulavam e se confrontavam, dando origem a inúmeros partidos políticos e

25 Arendt faz uma importante diferenciação entre os regimes ditatoriais e os totalitários. A autora considera que nas ditaduras se tem a supressão da liberdade política, enquanto que a vida privada não é afetada. Nos governos totalitários, todas as esferas da vida são afetadas; logo, a dominação não se estende somente à esfera da política. Cf. ARENDT, Hannah. Responsabilidade e Julgamento. 1º. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2004. 375 p. 26 Em 28 de março de 1968, o estudante secundarista, filho de operários, foi morto durante uma passeata perto da Igreja da Candelária (RJ), onde a polícia atirara indiscriminadamente contra uma multidão de manifestantes que protestavam contra o fato de o governador haver retirado os subsídios para a alimentação dos estudantes no Restaurante do Calabouço (RJ).

Page 36: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

34

movimentos de diversas orientações político-ideológicas.

Vamos encontrar na literatura, a análise de que o ano de 1968 tornou-se um

ano enigmático porque foi o ponto de partida para uma série de transformações

políticas, ideológicas e culturais que afetaram as sociedades da época de uma

maneira irreversível – tanto nos países sob regime autoritário, como em nações

formalmente democráticas.

É possível então, baseando-nos na historiografia do ano de 1968, afirmar que

trabalhadores e estudantes se levantaram no mundo inteiro. Em Paris, os operários

fizeram greve geral e os estudantes entraram em combate com a polícia. Nos muros

da capital francesa, os grafites anunciavam o novo mundo: ―É proibido proibir‖, ―A

imaginação no poder!‖, ―Amor e revolução andam juntos‖.

Nos Estados Unidos da América, atacava-se o racismo. Tempos de Martin

Luther King e de Malcolm X, grandes líderes negros. Os estudantes norte-

americanos também sonhavam com socialismo e milhares deles protestariam contra

o absurdo de a máquina de guerra ianque agredir o povo do Vietnã. Na América

Latina, sonhava-se com guerrilhas libertadoras. A Cuba revolucionária de Fidel

Castro e Che Guevara mostrava o caminho para os jovens latino-americanos:

guerrilha, revolução popular e socialismo.

No Brasil, a esquerda voltava a crescer e a luta era contra a ditadura militar e

o aprofundamento de um capitalismo monopolista. Segundo a historiadora Maria

Aparecida de Aquino27, o engajamento era maior entre os jovens. E, nesse caso,

grande parte era formada por estudantes. A atividade política nas universidades já

acontecia antes mesmo do golpe de 196428.

Nesse contexto, surge, em 13 de dezembro de 1968, o Ato Institucional nº 5

(AI-5), principal instrumento de arbítrio da ditadura militar e descrito como a mais

abrangente e mais repressora das medidas de segurança interna do governo até

aquela data. Tavares (1999) afirma que o AI-5 representou a perda da vergonha da

ditadura. Na verdade, muitos analistas políticos brasileiros encararam o AI-5 como

“um golpe dentro do golpe”.

O ano de 1969 foi marcado por um período de exacerbada violência e

27 Professora da USP (Universidade de São Paulo), em entrevista a Folha On-Line em 30/04/2008, às 17h57. Cf: Endereço eletrônico: http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/. 28 De acordo com a professora Maria Aparecida de Aquino (USP), ―um ano antes, José Serra foi interrogado na CPI sobre a UNE (União Nacional dos Estudantes). A entidade que ele presidia era acusada de subversão e de receber financiamento da então União Soviética‖. Cf.: Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/. Acesso em 17/12/2008.

Page 37: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

35

repressão que se seguiu durante mais cinco anos. Nesse percurso, foi engendrado

um movimento de resistência contra as práticas violentas e repressoras

protagonizadas pelos militares, tendo como fio condutor a transformação da

sociedade vigente naquele período.

A literatura destaca que, desde 1968, já existiam no Brasil ações guerrilheiras

com diferentes objetivos e estratégias29. Contudo, foi entre 1969 e 1973 que grupos

e organizações de luta armada apresentaram-se mais proeminentes, a saber: o VPR

(Vanguarda Popular Revolucionária), o MR-8 (Movimento Revolucionário Oito de

Outubro), a ALN (Ação Libertadora Nacional), o PCBR (PCB Revolucionário), o PC

do B, a VAR- Palmares.

A maioria dos guerrilheiros foi presa antes de começar a luta armada no

campo e que a guerrilha se restringiu ao espaço urbano sem maior repercussão. No

início dos anos 1970, a ditadura acaba com as guerrilhas; a repressão do governo

agia com muita eficácia e rapidamente os grupos foram desmantelados, o que

obrigou os estudantes a mudarem de métodos. No entendimento de alguns autores,

a única tentativa que teve alguma consistência foi a Guerrilha do Araguaia, que se

desenvolveu mais ou menos entre 1972 e 1974, organizada pelo PC do B30.

Fernandes (1982) considera que o processo de violência na ditadura,

“violência que vem de cima”, é legitimado no âmbito do direito positivo e da ação

unificadora do Estado. Segundo o autor, a civilização industrial moderna possui uma

sociedade na qual a massa de violência passa a ser ―rotinizada‖ e concentrada nas

instituições-chave de dominação direta e indireta de classes e, reciprocamente, nas

29 Vide por exemplo que para alguns autores, apesar de sonharem com a revolução proletária, havia poucos operários ou camponeses no interior dessas organizações. Os líderes geralmente eram antigos comunistas, rompidos com o Partidão, porque o PCB estava contra a luta armada. Ainda tinha um grupo importante de militares desertores do Exército Brasileiro. 30 No começo dos anos 70, as grandes empresas do Sudeste e multinacionais investiram em pecuária extensiva na região do Tocantins-Araguaia. Quando chegaram lá, já havia pequenas roças na mão de camponeses posseiros que não tinham documentos legais da propriedade da terra, apesar de trabalharem nelas havia muitos anos. As empresas passaram a fazer grilagem das terras tomar ilegalmente. As lutas de classes entre os grileiros e os posseiros tornaram-se muito fortes. O PC do B quis aproveitar esse potencial de revolta e chegou na região para montar uma base de treinamento. Foram descobertos pelo Exército, que deslocou para região milhares de soldados contra uns 60 guerrilheiros. Numa região isolada do país e com a imprensa censurada, a sociedade só sabia alguma coisa através de boatos. Na região do Araguaia, até hoje, as pessoas humildes se recordam do que aconteceu. Muitos militares abusaram do poder e espancaram brutalmente os trabalhadores rurais para que revelassem os esconderijos dos guerrilheiros. Os prisioneiros eram torturados de forma bárbara e muitos encontraram a morte depois que o corpo virou uma massa de pedaços de carne e sangue. Os guerrilheiros mortos foram enterrados em cemitérios clandestinos e até hoje as famílias procuram seus corpos. Em 1974, a guerrilha do Araguaia estava destruída. Cf.: Disponível em: http://www.culturabrasil.pro.br/ditadura.htm. Acesso em 12/04/2009.

Page 38: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

36

instituições de autodefesa - órgãos criados para regular ou conciliar os conflitos de

classes em escala individual e coletiva.

Todo o processo civilizatório da nossa sociedade contribui, lamentavelmente,

mas não surpreendentemente, com a revitalização de uma sociedade estamental,

que aposta na idealização da paz social ligando-a à violência. Assim, Fernandes

com aporte em Marx, pontua:

[...] o regime de classes é o mais violento de todos, tudo está ligado ao modo de produção, que coloca nas mãos da burguesia quase toda a riqueza, prestígio e poder [...]

a burguesia necessita de uma forte

institucionalização da dominação, visto que a massa de violência é funcional para a preservação da ordem inerente à sociedade de classes (1982, p.p 127-133).

Segundo Netto (1996, p. 34), o ciclo autocrático burguês recobre três

momentos nitidamente diferenciados. Se o ano de 1968 marcou uma inflexão para

cima do ciclo autocrático burguês, o ano de 1974 marcou-o para baixo, devido ao

aprofundamento da crise do ―milagre econômico‖, potencializada inicialmente pela

conjuntura internacional e a crise estrutural do capitalismo no Brasil. É no governo

Figueiredo que o projeto de autoreforma do regime ditatorial e a sua mais ambiciosa

proposta de institucionalização fracassam. Diz o autor:

[...] nele a resultante do confronto entre a estratégia aberturista do regime e

as aspirações e tendências à democracia, que operavam no seio da

sociedade brasileira, é a impossibilidade de o regime impor as suas regras.

É apenas neste sentido que tomamos o início do governo Figueiredo como

o marco derradeiro do ciclo autocrático burguês. (NETTO, 1996, p. 35).

O fim do ciclo autocrático burguês não corresponde à emergência de um

regime político democrático. Segundo o autor, o que o governo Figueiredo

demarcou, claramente e de modo inédito, no bojo dos instantes finais do ciclo

autocrático, foi a incapacidade de a ditadura reproduzir-se como tal, em face do

acúmulo de forças da resistência democrática e da ampla vitalização do movimento

popular, devido ao reingresso da classe operária urbana na cena política.

(NETTO, ibidem).

Fernandes (2006), ao analisar o processo de transição democrática, afirma:

―(...) a fantasia é como a mentira, ela pode ser usada à vontade. No Brasil, com

frequência a fantasia serve para encobrir a mentira‖. Segundo o autor, “um bom

Page 39: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

37

exemplo procede da chamada conciliação conservadora, que foi entendida como

uma transição democrática”. Assinala o autor:

[...] De fato, ela nunca passou de uma feia nefasta negociação política, pela

qual a distensão e a abertura dos generais Geisel e Figueiredo ganharam

foros civis. [...] Os fatos reais não transpiram. [...] Na verdade, foi feita uma

conspiração, pela qual os senhores fardados do poder cederam uns passos

a mais na liberalização progressiva, para evitar uma ―conturbação social‖; e

compuseram um ―governo de transição‖, no qual teriam mais poder e

capacidade de decisão que antes. Só que com uma visibilidade reduzida e

tendo à frente um ―presidente‖ que endossa com prazer o cronograma

político-militar da ―transição lenta, gradual e segura‖ (2006, p.38).

1.2 O processo de redemocratização do Estado: os movimentos sociais e o

Serviço Social

Na análise de Fernandes (1982) e (1987), a transição democrática no Brasil

se deu de forma gradual e longa, diferentemente dos países que viveram na época a

mesma situação de ditadura militar. No Brasil, esta se caracterizou por avanços e

retrocessos que visavam conter demandas democráticas mais ousadas. E mais, a

transição brasileira foi liderada pelos militares no poder, o que configurou uma

situação conhecida pela literatura como ―transição pelo alto‖.

Embora existam concepções de Estado desvinculadas das classes sociais,

partimos do pressuposto de que o Estado deve ser entendido como uma instituição

que se manifesta e se realiza devido à existência de classes sociais distintas e

antagônicas. Nesse sentido, o Estado pode ser entendido como um mediador entre

as classes sociais, levando em conta os interesses de suas respectivas frações.

Assim, ao exercer sua função ou tarefa mediadora no decorrer da história, o Estado

se insere na dinâmica da produção e expropriação do sistema capitalista de

produção.

A continuidade da autocracia burguesa, sob nova forma, tornava-se mais

imperiosa. Para o autor, com um olhar mais atento para o ―começo do fim‖ da

ditadura, descobre-se um ardor democrático tardio e epidérmico das elites, que

Page 40: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

38

indicaria uma articulação burguesa para novas oportunidades de assalto ao poder

do Estado e ao comando da Nação (FERNANDES, 1982).

Não obstante, a possibilidade de retomada das bases federativas do Estado

brasileiro – a ―abertura‖ – consistia, na verdade, em conceder determinados direitos

à população, mas sem abrir deliberadamente o acesso às esferas políticas do

regime.

Trata-se da ―liberalização outorgada‖, que, metaforicamente, segundo

Fernandes (1982), seria algo como ―abrir as porteiras e soltar o gado no pasto‖.

Seria conduzir o país a uma “volta à democracia”, sem revolução, sustentando as

coisas como estavam apesar dos aparentes rumos libertários que a nação parecia

tomar.

Destarte, a ditadura solapou a evolução natural dos partidos e incutiu um

fictício quadro institucional dominado por dois pilares da ordem: um oficial e outro de

―oposição consentida‖; contudo, ambos sem forças para tocar na influência inibidora

de outra debilidade orgânica do país: a relação entre capital estrangeiro e capital

nacional, sendo esta submissa ao modelo de desenvolvimento do capitalismo

monopolista.

Na crítica de Fernandes (1982), o futuro da democracia no Brasil não

dependeria da ―abertura democrática‖. A ordem burguesa só abrirá à democracia de

participação ampliada, se ela for transformada nesse sentido pela atividade política

organizada e independente das classes trabalhadoras. Portanto, tudo depende de

que como a classe trabalhadora se constitua em partidos próprios, deixando de ser

caudatárias e instrumentais dos partidos burgueses. Dito de outro modo, os partidos

operários não podem nascer como partidos alternativos ao ―radicalismo burguês‖ e

muito menos ―partidos da ordem‖. O autor aponta a necessidade de uma clara

associação com o socialismo proletário: “uma transparente vinculação com a luta de

classes nas condições concretas existentes”. Sem conteúdos socialistas nítidos,

afirma o autor, os partidos “oscilariam facilmente para a submissão dócil, o

„aburguesamento‟ das lideranças e a conciliação política como recurso de

sobrevivência, deixando as classes trabalhadoras entregues a si próprias e sem

bússola política” (1982, p.82).

As greves de 1978-1979 foram o elemento essencial de desgaste acelerado

da ditadura militar. A esse respeito, Moisés (1985) assinala: era inevitável a

Page 41: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

39

emergência, especialmente no Rio de Janeiro e na região metropolitana de São

Paulo, de novas formas de participação social e política dos setores das classes

populares urbanas.

Com efeito, é na conjuntura do final da década de 1970, início da década de

1980, que os movimentos sociais foram reconhecidos como sujeitos do processo de

democratização, seja por suas lutas específicas por melhores condições de vida e

atendimento de suas necessidades básicas, seja pelo papel mobilizador de amplas

parcelas da população nas manifestações de resistência e enfrentamento ao regime

militar.

Os setores combativos no interior do movimento operário, juntamente com

outros setores da classe trabalhadora e setores progressistas da sociedade,

empreendem a luta de resistência contra a ditadura e pelas liberdades democráticas.

Neste processo, dirigentes sindicais são perseguidos, sindicatos são fechados, ou

sofrem intervenção direta do Ministério do Trabalho. A classe trabalhadora constrói

um movimento que vai ampliando a sua organização. Retoma-se o processo de

implantação da democracia sindical que vem a se constituir em um dos elementos

básicos da organização sindical. Haja vista o forte impacto do golpe militar de 1964,

que lhe havia deixado pouco espaço de ação para reivindicações formais – a não

ser tentativas pontuais de contestação.

Surgiu, então, uma nova fase da ação sindical no país, com o denominado

―novo sindicalismo‖ de corte progressista, cobrando a ampliação dos espaços

públicos para a representação dos interesses da classe trabalhadora. Este

movimento teve início como uma crítica dos sindicatos dos metalúrgicos da região

do ABC31 paulista sobre a política social e econômica do governo federal, bem como

uma ruptura com os sindicatos corporativistas e burocráticos dos pós-45. Assim

sendo, um ―novo sindicalismo‖ surge a partir de 1978, como um marco na vida

histórica e de luta da classe trabalhadora do país.

O ―novo sindicalismo‖, no Brasil, foi uma resposta e uma oposição ao

sindicalismo populista e burocrático vigente na época. Esse sindicalismo combativo

de massas se contrapõe ao sindicalismo ―oficial‖ de cunho corporativista, herdado do

31 O ABC Paulista é uma região tradicionalmente industrial do Estado de São Paulo (parte da região metropolitana de São Paulo), porém, com identidade própria. A sigla vem das três principais cidades da região: Santo André (A), São Bernardo do Campo (B) e São Caetano do Sul (C). Ocasionalmente, a região também é referida como ―ABCD‖, pois o município de Diadema, contíguo a São Bernardo do Campo, é também um populoso e importante centro industrial.

Page 42: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

40

período getulista, caracterizado como ―pelegos‖, cujas bases ideológicas eram

atreladas ao Estado e sob seu controle, sem organização de ―base popular‖. Assim,

esse ―novo sindicalismo‖ vai se construindo na perspectiva de romper com o

atrelamento do sindicato ao Estado, bem como na organização independente dos

trabalhadores, o que recoloca na ordem do dia o sindicato como instrumento de luta

dos trabalhadores.

De acordo com Sader (1988), o impacto dos movimentos sociais, em 1978,

levou a uma revalorização de práticas sociais presentes no cotidiano popular,

ofuscadas pelas modalidades dominantes de sua representação, ou seja, novos

atores/sujeitos sociais coletivos começavam a ocupar os espaços públicos.

Com esse panorama, a anistia política configurou o primeiro passo para o

alívio da pressão social. A lei foi promulgada em 1979, como resultado de longas

negociações com a oposição. O setor duro das Forças Armadas viu nela um

retrocesso, uma demonstração de desmerecimento pelo ―trabalho‖ realizado em prol

do ―saneamento‖ da política nacional e temia que servisse de brecha para a

exploração dos excessos do regime.

De acordo com D‘Araujo in D‘Incao (2001), para controlar esses temores, os

militares chegaram a um entendimento com a frente das oposições no sentido de

que a anistia deveria ser ampla, geral e irrestrita, ou seja, deveria ter o dom de

passar uma borracha no passado, "virar uma página da história‖.

Deu-se início, na década de 80, à estruturação de um partido de forte

enraizamento nos movimentos sindicais e populares, impulsionado pela

popularidade do movimento operário do ABC paulista – com as greves de 1978-

1979 –; pelo retorno de diversos militantes de esquerda em exílio, com a Política da

Anistia, em 1979; e pela ascensão do movimento de base da Igreja Católica,

inspirado na Teologia da Libertação32. Nasce em fevereiro de 198033, em São Paulo,

o Partido dos Trabalhadores (PT), que reuniu grande parte da esquerda brasileira.

32 A Teologia da Libertação foi desenvolvida na América latina; no Brasil, destacaram-se os irmãos Leonardo e Clodóvis Boff. A partir das orientações do Concílio Vaticano II, de 1964, e do Congresso de Medelín, na Colômbia, em 1968, a Teologia reorganizou as práticas religiosas católicas. O cotidiano das pessoas passou a ser discutido à luz dos ensinamentos da Bíblia. Alguns princípios da análise marxista relativos às estruturas de dominação foram incorporados à Teologia da Libertação. Cf. Gohn (2000). 33 De acordo com o Manifesto de Fundação do PT - Aprovado pelo Movimento Pró-PT, em 10 de fevereiro de 1980, no Colégio Sion (SP), e publicado no Diário Oficial da União de 21 de outubro de 1980. Cf. Manifesto de Fundação do Partido dos Trabalhadores/Diretório Nacional, 2009.

Page 43: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

41

Teve como berço as primeiras grandes manifestações populares no país

desde o fim dos anos 60 em São Bernardo do Campo, onde aconteciam as

assembléias do sindicato dos metalúrgicos do ABC, cujo líder sindical, Luiz Inácio

Lula da Silva - o Lula liderava os metalúrgicos em suas greves. O PT cresceu e o

mesmo ocorreu com partidos ideológicos de esquerda, como o PCB, o PC do B,

PSB e o PDT (FERNANDES, 2006).

Para o autor, a estigmatização, como técnica de aniquilamento desses

partidos, dissolveu-se no limbo, a função de Luiz Inácio Lula da Silva ganhou

saliência, inclusive como galvanizador do processo político no plano eleitoral. A sua

imagem e a sua linguagem dificultarão ―retrocessos conservadores‖ e ―recaídas

populistas‖, pois a sua presença será central para impregnar o debate político de

conteúdo ideológico proletário e socialista naquela data.

O movimento sindical retoma a discussão sobre a unidade ou unicidade de

sua organização. Seguindo os influxos de conflitos operários e sindicais que,

naquela década, agitaram os principais centros urbanos do país, surgem as centrais

sindicais – a exemplo da Central Geral dos Trabalhadores/CGT e a Central Única

dos Trabalhadores/CUT, embasadas no novo sindicalismo classista – que ocuparam

o cenário público brasileiro, debatendo questões cruciais à conquista e ampliação

dos direitos de cidadania.

Telles e Paoli (2000) consideram que, para além desse registro estritamente

político e sindical, os movimentos sociais se ampliaram e diversificaram, trazendo

para o debate público um amplo leque de temas e questões das mais diversas

dimensões da vida social: questões relativas às discriminações de gênero, raça e

etnia; ecologia e meio ambiente; violência e direitos humanos.

Estas passaram a compor, no decorrer da década de 80, a agenda pública de

debates, projetando, na esfera política, concepções ampliadas de direitos e

cidadania que incorporam as exigências de equidade e justiça nas dimensões

societárias e culturais que afetam identidades, existências e formas de vida.

De acordo com Gohn (2000), surgiram concepções diferenciadas para definir

os movimentos sociais. Assim, dessas concepções, formulou-se uma definição

ampla para o conceito de movimento social, a saber:

movimentos sociais são ações coletivas de caráter sociopolítico, construídas por atores sociais pertencentes a diferentes classes e camadas sociais. Eles politizam suas demandas e criam um campo político de força

Page 44: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

42

social na sociedade civil. Suas ações estruturam-se a partir de repertórios criados sobre temas e problemas em situações de: conflitos, litígios, disputas. As ações desenvolvem um processo social e político-cultural que cria uma identidade coletiva ao movimento, a partir de interesses em comum. Esta identidade decorre da força do princípio da solidariedade e é construída a partir da base referencial de valores culturais e políticos compartilhados pelo grupo. (GOHN, 1997 in GOHN, 2000).

De acordo com Gohn (1999), o autor espanhol Manuel Castells34 redefiniu os

movimentos sociais no Brasil, como “ações coletivas propositivas as quais resultam,

na vitória ou no fracasso, em transformações nos valores e instituições da

sociedade” (CASTELLS, 1997, apud, GOHN, 1999).

O ano de 1984 foi um marco na história sociopolítica do Brasil com o

movimento Diretas Já: a sentença de morte para o regime militar. Contudo, a

realização das eleições diretas para Presidente da República só veio a acontecer em

1989.

Nesses termos, diversos movimentos populares foram surgindo para

reivindicar políticas públicas referentes à habitação, saneamento, saúde, ensino,

entre outros. Destinados a atender seus direitos sociais e de cidadania e que os

tornaram, naquele período, sujeitos políticos, construtores da sua própria história,

merecem destaque: o movimento contra a carestia; a luta dos moradores de favelas

por ligação de água e luz em seus barracos e pela posse de terra dos já ocupados; o

movimento das mulheres por creches públicas.

Um segmento da vanguarda do Serviço Social descobre nos movimentos

sociais, uma espaço alternativo de atuação. Segundo Matos (2007, p. 41), o trabalho

dos assistentes sociais junto aos movimentos sociais se deu, na sua maioria, por

meio da criação de campos próprios de estágio para graduandos em Serviço Social.

Entretanto, neste processo de encontro do Serviço Social com os movimentos

sociais, é ratificada uma negação com o desenvolvimento de comunidade35. Tal

negação, segundo Matos (2007), é justificável, pois, naquela época, a possibilidade

de um trabalho com comunidades pautado em outros pressupostos que não seja o

34 O autor é radicado nos Estados Unidos e tornou-se a principal influência teórica nos estudos produzidos sobre os movimentos sociais no Brasil, nos anos 70 e 80. Cf. ibidem. 35 O desenvolvimento de comunidade é introduzido, no Brasil, por organismos norte-americanos de cooperação nos anos 1940, mas é a partir da década seguinte, com o fim da 2ª Guerra Mundial, que o mesmo passa a ser disseminado pela ONU de maneira sistemática. Entendido como uma estratégia de controle ideológico da população contra a possibilidade do comunismo.

Page 45: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

43

de ajustamento social inexistia; o que expressava o anverso do que buscava o

Serviço Social36.

Segundo a literatura, os Assistentes Sociais que atuavam junto à população

pobre da periferia das grandes cidades foram vítimas de desconfiança e de

perseguição dos agentes da ditadura, que os vigiam no ambiente de trabalho e, em

alguns casos, foram punidos com demissão.

Em entrevista à Revista Em Pauta37, a ex-prefeita de São Paulo pelo PT Luiza

Erundina de Souza38 assinala: ―(...) os „olheiros‟ do regime militar sabiam da

influência e da força desses profissionais junto ao povo, conscientizando-o sobre

seus direitos e estimulando-o a lutar por eles”. Luiza Erundina ainda ressalta:

(...) ao mesmo tempo em que participavam ativamente de todas essas lutas

e movimentos, enquanto trabalhadores e como cidadãos, os Assistentes

Sociais organizavam politicamente a própria categoria, criando associações

profissionais e sindicatos para lutar por seus direitos e conquistar espaço de

ação política na sociedade. (Revista EM PAUTA, nº19, 2007).

Os movimentos populares e sindicais avançaram em suas lutas. Ampliam-se

os caminhos para a classe trabalhadora construir seu projeto político de

transformação da sociedade.

Ante a esses desafios, a categoria dos assistentes sociais, como parte da

classe trabalhadora inserida neste processo, compreende o Serviço Social como

uma profissão historicamente determinada na divisão social e técnica do trabalho, a

qual possui um caráter interventivo no âmbito da questão social. Avança

significativamente, através de suas instâncias organizativas e sindicatos, no

processo de reflexão e aprofundamento do debate sobre questões estruturais e

conjunturais da sociedade brasileira, bem como na articulação com as lutas dos

trabalhadores contra o processo de dominação da acumulação capitalista.

36 Para uma melhor compreensão, ver Matos, Maurílio de Castro e Bravo, Maria Inês. Assessoria Consultoria & Serviço Social. Rio de Janeiro: 7 Letras. FAPERJ, 2007, p. 40-44. 37 Entrevista Coletiva, coordenada pela Prof.ª Dra. Rose Serra, membro do Comitê Editorial da Revista EM PAUTA, Profª Adjunta da faculdade de Serviço Social da UERJ. Artigo Democracia e Serviço Social. Revista EM PAUTA número 19, ano 2007, p.181-201. 38 Deputada Federal do PSB (Partido Socialista Brasileiro), 2007/2010; 2003/2006 e 1999/2002. Presidente da Associação Profissional dos Assistentes Sociais do Estado de São Paulo (APASSP), 1978/198, Coordenação da Comissão Executiva Nacional das Entidades Sindicais de Assistentes Sociais, 1979/1981. Prefeita de São Paulo pelo PT, 1989/1992. Deputada Federal do PT, 1995/1998.

Page 46: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

44

Assim, o Serviço Social inscreve-se, através do movimento sindical dos

assistentes sociais, entre os ―novos sujeitos‖ que – no dizer de Eder Sader – entram

em cena no Brasil neste período.

Recorreremos a Abramides e Cabral (1995), para elucidarmos sobre a

relação entre a categoria de assistentes sociais e o movimento sindical-operário no

país. As autoras nos revelam que o processo de análise da organização político-

sindical dos assistentes sociais compreende o período de 1978 a 1988, o qual

encerra um ciclo da trajetória dessa categoria.

Os segmentos combativos da categoria profissional trazem para o interior da

profissão as lutas concretas e os embates políticos e ideológicos vividos pelo

conjunto da sociedade brasileira e conquistaram a hegemonia dos movimentos dos

assistentes sociais. Os assistentes sociais, como parte da classe trabalhadora,

reiniciam a sua organização por meio da reativação de suas entidades e pré-

sindicais em todo o país a partir de 1977.

O rebatimento desse novo sindicalismo na organização da categoria dos

assistentes sociais é a criação, estruturação e solidificação das entidades sindicais

da categoria nos estados e, em nível nacional, com a criação da Comissão

Executiva Nacional de Entidades Sindicais de Assistentes Sociais – CENEAS (1978

a 1983) e da Associação Nacional dos Assistentes Sociais – ANAS (1983 a 1988),

mostrando-nos a trajetória de luta e organização dessa categoria profissional no

marco do novo sindicalismo no Brasil (ABRAMIDES E CABRAL, 1995).

Nesse percurso, a CENEAS e a ANAS atuam juntamente com o movimento

sindical de forma a dar repostas organizadas à situação de exploração e miséria da

classe trabalhadora. A CENEAS recebe influência direta do novo sindicalismo na

construção da sua concepção e toda a sua configuração.

As lutas específicas da categoria na década de 80 foram bastante

significativas em todo o país, sempre com a presença marcante das entidades

sindicais de base, da CENEAS e da ANAS, e com a participação da categoria no

processo de luta por suas reivindicações.

Contudo, a trajetória emblemática da organização político-sindical dos

assistentes sociais do Estado de São Paulo encerra-se em 1992, data em que o

Sindicato de Assistentes Sociais deixa de existir por deliberação da assembleia da

categoria no mês de maio do referido ano. Outras entidades sindicais deixaram de

Page 47: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

45

existir neste período por um processo de esvaziamento e de distanciamento junto à

base dos assistentes sociais. Cabe ainda registrarmos que muitos sindicatos

estaduais vivenciaram direção única, com os CRAS - Conselhos Regionais de

Assistentes Sociais.

Portanto, no que se refere à organização política dos assistentes sociais, o

despontar de um Serviço Social crítico e renovado remonta ao III Congresso

Brasileiro de Assistentes Sociais ocorrido em São Paulo, em 1979 –, marco histórico

da profissão com a ruptura pública e coletiva da prática conservadora - quando, de

forma organizada, uma vanguarda profissional destituiu a mesa de abertura

composta por nomes da ditadura, trocando-a por nomes advindos do movimento dos

trabalhadores.

Conhecido como ―Congresso da Virada39‖, é o marco histórico de

compromisso político e coletivo da categoria com a classe trabalhadora. O

Congresso significou, portanto, um momento de ruptura da categoria, sob a direção

das entidades sindicais, com as posições conservadoras que estavam à frente do

evento e, há muito, detinham as direções do então conjunto CFAS – Conselho

Federal de Assistentes Sociais/CRAS – Conselho Regional de Assistentes Sociais

(ABRAMIDES E CABRAL, 1995).

Nesse sentido, as entidades sindicais, ao intervirem organizadamente,

captaram a insatisfação dos profissionais e estudantes presentes, que repudiaram

com veemência os representantes da ditadura militar que compunham painéis nas

mesas de abertura e encerramento.

De acordo com Abramides e Cabral (ibidem), a forma autoritária e elitista de

organização do Congresso é quebrada quando da realização de assembléias

permanentes, - fóruns de discussão do significado social da profissão e do

profissional naquela conjuntura -, o que deu um novo rumo ao Congresso.

Assim sendo, as autoras definem o novo caráter do Congresso, deliberado

soberanamente junto à categoria, com propostas que contextualizaram e

explicitaram claramente o momento histórico nacional, bem como a inserção da

categoria na luta mais ampla da classe trabalhadora, colocando a questão

democrática como elemento crucial para a organização da categoria.

39 Em novembro de 2009 nos dias 16 e 17, a categoria dos Assistentes Sociais realizou evento comemorativo dos 30 anos do Congresso da Virada, no sentido de analisar os determinantes do mesmo e seus desdobramentos.

Page 48: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

46

O III CBAS se transformou em um marco histórico da categoria, espaço vivo

de debates, rupturas com posturas conservadoras e expressão do processo da luta

política e social que fora travado na sociedade brasileira naquele período em que os

trabalhadores como sujeitos coletivos ocuparam o cenário nacional em grandes

mobilizações e greves a partir da região do ABC paulista (ABRAMIDES E CABRAL,

1995).

Nesta direção, a categoria de assistentes sociais, ao afirmar seu

compromisso histórico com as classes trabalhadoras, dá um passo decisivo para

fortalecer a construção do seu projeto profissional, uma vez que, no seio

profissional, emerge a condição necessária para romper com o quase monopólio do

conservadorismo no Serviço Social.

Ora, em uma retrospectiva histórica do Serviço Social brasileiro, encontramos,

explicitamente, um Serviço Social pautado por uma ética liberal burguesa, que toma

a ordem social capitalista como um dado natural e inquestionável e que põe, como

objetivos profissionais a adaptação e o ajustamento dos indivíduos a ela40.

Este fato nos é revelado na gênese do Serviço Social brasileiro, dada a

relação entre o Serviço Social e o ideário católico, que irá imprimir à profissão o

caráter de apostolado, fundado em uma abordagem da questão social como

problema moral e religioso numa intervenção que prioriza a formação da família e do

indivíduo na solução de problemas e atendimento de suas necessidades materiais,

morais e sociais (YAZBEK, 2000).

No nosso entendimento, a interlocução do Serviço Social brasileiro com o

movimento sindical-operário, através da organização política e sindical dos

assistentes sociais, é igualmente significativa e rica. Posto que se insere na história

de organização e luta da classe trabalhadora, sob a orientação política do novo

sindicalismo, plasmada na trajetória histórica dos movimentos sociais nas décadas

de 70 e 80.

40 O tradicionalismo profissional no Código de Ética de 1947 é muito evidente. Entre seus princípios e diretrizes ético-morais, encontramos o ―respeito à lei de Deus‖, ao ―bem comum‖ e à ―dignidade da pessoa humana‖. Como função social do Serviço Social, o mesmo preconizava o ―tratamento de pessoas desajustadas‖. O compromisso com o bem comum aparece também no Código de Ética de 1965. Não muito distante desta perspectiva está o Código de 1975 que adiciona ao velho tradicionalismo profissional uma matriz teórica moderna – estrutural-funcionalista – que defende uma postura aparentemente asséptica ao preconizar que o assistente social deve agir como ―um perito, com isenção de ânimo e imparcialidade‖. Cf. BONETTI, Dilsea Aldeodata et alii (orgs.). Serviço Social e Ética: convite a uma nova práxis. São Paulo: Cortez/CFESS, 1995.

Page 49: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

47

Diríamos que a gênese do projeto profissional do Serviço Social é produto,

também, da ascensão das forças democrático-populares (manifestações de

organização política de sujeitos coletivos), no cenário político nacional, desde a

segunda metade dos anos 70 até fins dos anos 80.

De acordo com o CFESS, o então conjunto CFAS/CRAS (Conselho Federal

de Assistentes Sociais e Conselho Regional de Assistentes Sociais), ingressa, na

década de 90, numa outra fase, em que foram superadas as suas características

iniciais, tipificadas no corporativismo e no burocratismo no que se refere à condução

do aparato político-institucional dessas entidades.

Nesse sentido, o atual conjunto CFESS/CRESS (Conselho Federal de Serviço

Social e Conselho Regional de Serviço Social), informa cumprir sua atribuição

precípua de fiscalização do exercício profissional, que a partir da década de 90,

tenta potencializar sua inserção e intervenção junto aos profissionais ao investir na

qualificação teórico-prática.

Sinalizamos, portanto, que a relação do Serviço Social brasileiro com o

movimento sindical-operário contribuiu, sobremaneira, para uma nova perspectiva

para a categoria dos assistentes sociais que pretendia uma ruptura com o

conservadorismo profissional.

1.3 A interface do Serviço Social com a Saúde: breve histórico

Cremos que, agora, após apresentarmos um resgate do período sócio-

histórico do regime militar até o processo de redemocratização do país com a vital

participação dos movimentos sociais e do Serviço Social, estamos aptos a discorrer

sobre a interface do Serviço Social com a Saúde.

Portanto, ao retornarmos um pouco na trajetória histórica do Brasil, podemos

Page 50: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

48

dizer que o desenvolvimento do capitalismo conhecido pela sociedade brasileira no

pós-1930 e, de forma mais específica, após a industrialização que se inicia em

meados dos anos 50, fora acompanhado pelo surgimento de uma série de

contradições sociais e políticas que insidia sobre a sobrevivência da população e

conduziu um deslocamento do pólo da economia para os centros urbanos e gerou

uma massa operária que deveria ser atendida pelo sistema de saúde.

Isso permite compreender por que a inserção dos assistentes sociais na área

da saúde se dá de forma expressiva desde os primórdios da profissão no Brasil. De

acordo com Bravo e Matos (2004), é no bojo do processo histórico-econômico e

político que marcou a conjuntura dos anos 30 que ocorre a formulação da política de

saúde, de caráter nacional, como as demais políticas sociais e organizada em dois

subsetores: o de saúde pública e o de medicina previdenciária. O subsetor de saúde

pública foi predominante até meados de 60 e centralizou-se na criação de condições

sanitárias mínimas para as populações urbanas e, restritamente, para as do campo.

O subsetor de medicina previdenciária só virá a sobrepujar o de saúde pública a

partir de 1966 (BRAVO, 1991, apud, BRAVO E MATOS, 2004).

Com a formulação da política nacional de saúde nos anos de 1930, a

requisição por profissionais de Serviço Social foi expressiva, com a inserção destes,

inicialmente, em espaços institucionais como hospitais e ambulatórios. Diríamos,

então, que, gradativamente, a área da saúde tornou-se a que mais emprega

assistentes sociais.

Bravo e Matos (2004), principais interlocutores no que se refere às pesquisas,

estudos e publicações sobre a temática Serviço Social e Saúde, sinalizam que, a

partir de 194541, a ação profissional nesta área expandiu-se significativamente e

transformou-se no campo que mais absorveu os assistentes sociais. Para os

autores, tal expansão ocorreu devido a adoção de um conceito ampliado de saúde

cunhado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 1948, dando enfoque ao

trabalho em equipe multidisciplinar, o qual requisitou a atuação de diversos

profissionais, entre eles, os assistentes sociais.

Coube, então, ao Serviço Social enfatizar ―a prática educativa com

intervenção normativa no modo de vida da ‗clientela‘, com relação aos hábitos de

41 Dada às exigências e necessidades de aprofundamento do capitalismo no Brasil e às mudanças que ocorreram no panorama internacional, em função do término da Segunda Guerra Mundial.

Page 51: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

49

higiene e saúde‖, e atuar em programas estabelecidos pelas normatizações da

política de saúde (BRAVO e MATOS, 2004, p. 29).

Vale enfatizar que a Política Nacional de Saúde vigente naquele período não

era de caráter universal, acarretando em um processo de seletividade e exclusão

nos atendimentos, haja vista a incongruência entre demanda e oferta de serviços. A

seu turno, o Serviço Social tem por escopo viabilizar o acesso dos usuários aos

serviços de saúde e benefícios da previdência, em que o assistente social é

demandado para atuar em hospitais, interpondo-se entre a instituição e a população

usuária.

Apesar de surgirem nos Estados Unidos, nas décadas de 1950 e 1960, a

medicina integral, a medicina preventiva e a medicina comunitária influenciaram os

rumos da saúde no Brasil. Os assistentes sociais prosseguiram trabalhando em

hospitais e ambulatórios, concentrando suas ações prioritariamente no nível curativo

e hospitalar.

As condições políticas para a hegemonização de um novo modelo de sistema

de saúde ocorreram a partir do movimento de 1964. Do ponto de vista político,

incrementou-se o papel regulador do estado e a expulsão dos trabalhadores do

controle da Previdência Social. O autoritarismo militar rompeu com o padrão de

proteção social construído nos anos 30.

Segundo Vianna (1998, p.142), antes de 64, a manipulação dos benefícios

oferecidos pelo Estado se restringia a uma clientela que, embora pequena e

estratificada, estava incorporada ao universo da cidadania, participando,

politicamente, inclusive de decisões importantes através de suas lideranças. A

modernização iniciada com a criação do Instituto Nacional da Previdência

Social/INPS desmontou os mecanismos de integração e inibiu a trajetória alemã do

sistema previdenciário42.

O modelo médico-assistencial privatista que se consolida nos anos 70 inicia-

se a partir da previdência social brasileira com a organização dos Institutos de

Aposentadoria e Pensões, estruturados por categorias profissionais. Esse momento

42 Na Alemanha, Otto Von Bismarck criou uma série de seguros sociais, objetivando, na verdade, amenizar a tensão existente entre as classes trabalhadoras. Assim, em 1883, foi instituído o seguro-doença. Tal benefício previdenciário era custeado pelas contribuições dos empregados, dos empregadores e pelo Estado. Em 1884, fora instituído o seguro contra acidentes do trabalho, através do financiamento por parte dos empresários. Em 1889, criaram-se os seguros de invalidez e velhice, custeados pelos trabalhadores, empregadores e pelo Estado.

Page 52: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

50

é determinado por um modelo de cidadania regulada43, uma vez que a garantia dos

direitos sociais dependiam, fundamentalmente, da inserção dos cidadãos no

mercado de trabalho.

Contudo, ao mesmo tempo em que se ampliava a ação da Previdência Social,

revelava-se o caráter discriminatório da política de saúde, enquanto ficavam claras

as desigualdades, tanto quantitativas, como qualitativas, entre as diferentes

clientelas urbanas e entre estas e as rurais.

Observa-se, no período burocrático-autoritário, que apesar das modificações

ocorridas, também se excluem parcela significativa de brasileiros ao direito à saúde,

pela vinculação deste direito à contribuição previdenciária, afetando àqueles que não

estavam inseridos formalmente no mercado de trabalho. Nota-se ainda que neste

período desenvolvem-se ações individuais e médico-hospitalares que privilegiam o

setor privado da assistência médica.

Desse modo, o país apresentava um projeto hegemônico: o modelo médico-

assistencial privatista, que se constituía de quatro subsistemas, quais sejam:

subsistema de alta tecnologia; subsistema privado de atenção médica supletiva;

subsistema privado contratado e conveniado e subsistema estatal.

Em 1975, a Lei Nº. 6.229 institucionalizava o modelo médico-assistencial

privatista, definindo as competências das instituições públicas e privadas e propunha

mecanismos de integração e coordenação.

A seu turno, somente no ano de 1975 é que os assistentes sociais foram

inseridos na equipe formada por médicos, enfermeiros e visitadores. Para Bravo e

Matos (2004, p. 30), tal fato os levou a seguinte indagação: Por que os assistentes

sociais na saúde priorizam suas ações no nível curativo e hospitalar? Para

responder à questão, os autores trabalharam algumas hipóteses, quais sejam:

a exigência do momento concentrava-se na ampliação da assistência médica hospitalar e os profissionais eram importantes para lidar com a contradição entre a demanda e o seu caráter excludente e seletivo. Nos centros de saúde, os visitadores conseguiam desenvolver as atividades que poderiam ser absorvidas pelo assistente social. Outro componente relaciona-se à pouca penetração da ideologia desenvolvimentista no trabalho profissional na saúde. Uma ação considerada importante para os assistentes sociais é a viabilização da participação popular nas instituições e programas de saúde. Esta atividade, entretanto, só teve maior repercussão na profissão nos trabalhos de desenvolvimento de comunidade. O Serviço Social Médico, como era denominado, não

43 A cidadania está embutida na profissão e os direitos do cidadão restringem-se aos direitos do lugar que ocupa no processo produtivo, reconhecido por lei. Aqueles cuja ocupação a lei desconhecem, tornam-se pré-cidadãos.

Page 53: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

51

atuava com procedimentos e técnicas do Desenvolvimento de Comunidade, mas sim, e prioritariamente, com o Serviço Social de Casos, orientação inclusive da Associação Americana de Hospitais e da Associação Americana de Assistentes Médico-Sociais. A participação só era visualizada na dimensão individual, ou seja, o engajamento do “cliente no tratamento”. (grifos nossos).

Segundo ou autores, o Serviço Social sofreu profundas transformações, no

pós-1964, que tiveram rebatimento no trabalho do assistente social na área da

saúde. Até aquela data, a profissão seguia direcionamentos estabelecidos pelo

chamado bloco conservador hegemônico que dominava a produção do

conhecimento, as entidades organizativas44 da profissão e o trabalho profissional.

Contudo, esta situação começou a se modificar, ao surgir debate na profissão que

questionava o seu conservadorismo.

Os assistentes sociais com posicionamentos progressistas, questionadores

do Serviço Social conservador, começam gradativamente a produzir debates

respaldados pelas ciências sociais e humanas. O tema dessas discussões estava

pautado no desenvolvimento e nas repercussões do Serviço Social na América

Latina, cujo eixo do debate centrava-se na constatação do Serviço Social importado

com práticas assistenciais e ajustadoras (BRAVO E MATOS, 2004).

Concomitantemente ao movimento iniciado pelos assistentes sociais com o

objetivo de repensar a profissão no Brasil, outro movimento - na área da saúde -,que

também tinha cunho de mudança e luta por direitos, ganha corpo e materialidade na

sociedade, qual seja: o Movimento Sanitário.

Assim, a configuração do modelo médico-assistencial privatista – já esgotado

– muda de forma a reciclá-lo num contexto de luta política entre projetos sanitários

alternativos. Assim, nos anos 80, a partir da instalação do governo de transição

democrática, o país passa a vislumbrar a retomada de suas bases federativas.

Nesse percurso, a crise da Previdência Social na década de 80 será marcada

por propostas de políticas alternativas para o sistema de saúde, movimentos

grevistas dos profissionais, análises e divulgação da política previdenciária de

assistência médica e pelo bloqueio a qualquer proposta de mudança que viesse

penalizar os setores capitalistas envolvidos. Ou seja, o modelo implantado na

Previdência Social atendia prioritariamente às necessidades de reprodução do

44 Bravo e Matos (2004) se referem à entidade da categoria - Associação Brasileira de Assistentes Sociais (ABAS), criada em 1940, e a Associação de Ensino (ABESS), criada em 1946.

Page 54: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

52

capital em detrimento das reais necessidades de saúde da população, portanto, a

atividade médica estava inserida no contexto da lógica capitalista.

Emergem, portanto, na arena sanitária, novos sujeitos sociais portadores de

ideais diferenciados e que conformam dois projetos político-sanitários alternativos: o

contra-hegemônico (Reforma Sanitária) e o hegemônico (Projeto neoliberal). Assim,

todo o movimento organizado pelo projeto contra-hegemônico (Reforma Sanitária)

seja nos níveis político, ideológico e institucional, desde o início dos anos 70, vai

confluir na VIII Conferência Nacional de Saúde, realizada em Brasília em março de

1986.

Essa Conferência, marco histórico na trajetória da política de saúde pública

de saúde neste país, traduziu o corte epistemológico da concepção de saúde,

assegurando-a como direito. O relatório desta Conferência, transformado em

recomendações, serviu de base para as negociações dos defensores da Reforma

Sanitária na formulação da Constituição Federal de 1988 (BRAVO e MATOS, 2004,

p. 32).

O estabelecimento de novas relações do Estado com os sujeitos sociais

consegue assegurar na Constituição de 1988 os princípios essenciais da Seguridade

Social voltados à universalidade, equidade, irredutibilidade nos valores dos

benefícios, uniformidade, equivalência, gestão democrática descentralizada e

participativa. A partir desse momento, estes princípios, norteadores da Seguridade

Social, que englobam as áreas da saúde, previdência e assistência social, são

tomados como questão pública e de responsabilidade do Estado.

Diante dos avanços obtidos neste período, a área da saúde passa a ser vista

como um processo de convergência das políticas sociais e assegurada como direito

de cidadania.

A Constituição de 1988 incorpora de fato um conjunto de princípios, diretrizes,

conceitos e propostas dentro do ideal da Reforma Sanitária. Com relação à questão

da saúde, a Constituição ressalta aspectos fundamentais, a saber: o conceito de

saúde concebido como perspectiva de uma articulação de políticas sociais e

econômicas; a compreensão do conceito saúde como um direito social universal

derivado de uma cidadania plena: as ações e serviços de saúde como serviços de

relevância pública; a criação do Sistema Único de Saúde, organizado segundo

diretrizes de descentralização e atendimento total, sendo imprescindível a

Page 55: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

53

participação da comunidade e a integração de saúde no espaço amplo da

Seguridade Social.

Assim, os principais pontos constitucionais incorporam: a saúde, como um

direito de todos e dever do Estado; a ampliação do conceito de saúde; o Sistema

Único de Saúde – entendido como universalizado e comportando em seu bojo a

integralidade da atenção, igualdade, direito à informação, incorporação do modelo

epidemiológico, participação da comunidade e descentralização político-

administrativa. A Constituição de 1988, no entanto, não consegue abarcar

dispositivos reguladores do setor privado.

Ora, o Serviço Social recebe influências dessa conjuntura; porém está voltado

ao processo interno de revisão e negação do Serviço Social Tradicional (anterior à

década de 80). O processo de renovação da profissão está interligado com as

questões postas na conjuntura daquele período e tinha por escopo a busca por uma

mudança nos rumos societários a serem seguidos. No entanto, destaca-se o fato de

que o processo de renovação voltou-se completamente para uma revisão interna,

não permitindo sua articulação com outras questões de grande relevância na

sociedade. Bravo e Matos (2004, p. 34) asseveram:

O processo de renovação do Serviço Social no Brasil está articulado às questões colocadas pela realidade da época, mas, por ter sido um movimento de revisão interna, não foi realizado um nexo direto com outros debates, também relevantes, que buscavam a construção de práticas democráticas, como o movimento pela Reforma Sanitária. Na nossa análise, esses são os sinalizadores para o descompasso da profissão com a luta pela assistência pública na saúde.

De acordo com a assertiva de Bravo (1996), apud Bravo e Matos (2004, p.

34), esses são os sinalizadores para o descompasso da profissão de Serviço Social

com a luta pela assistência pública na saúde. Assim, admite a autora:

É importante identificar como se deu a relação do Serviço Social com o Movimento de Reforma Sanitária, na década de 1980. É impossível falar do Serviço Social sem referenciar aos anos 80. Estes são fundamentais para o entendimento da profissão hoje, pois significa o início da maturidade da tendência atualmente hegemônica na academia e nas entidades representativas da categoria – intenção de ruptura – e, com isso, a interlocução real com a tradição marxista.

Eis aí a chave da questão. Os profissionais desta vertente se inserem, na sua

maioria, nas Universidades, onde, dentro do processo de renovação da profissão,

pouco efetivamente intervêm nos serviços, ou seja, a nova base teórico-

Page 56: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

54

metodológica aderida oficialmente pela profissão não se refletiu ou não se fez ativa

no plano dos serviços (NETTO, 1994 e BRAVO, 1996).

Assim, Bravo e Matos (2004) destacam a intenção de superar tais

disparidades ocorridas nos anos de 1980, nos quais o Serviço Social cresceu na

busca de fundamentação e consolidação teóricas, apresentando poucos resultados

na intervenção; é necessário voltar-se para a ação profissional cotidiana e fazer dela

prioridade. Para os autores, este fato repercute na atuação do Serviço Social na

área da saúde; como ressaltado o maior campo de trabalho para os assistentes

sociais.

Contudo, apesar das lacunas no fazer profissional, Bravo e Matos (ibidem)

avaliam que ocorreram algumas mudanças de posições, a saber: a postura crítica

dos trabalhos em saúde apresentados nos Congressos Brasileiros de Assistentes

Sociais de 1985 a 1989; a apresentação de alguns trabalhados nos Congressos

Brasileiros de Saúde Coletiva; a proposta de intervenção formulada pela então

ABESS, ANAS e CFAS no Serviço Social do INAMPS; e a articulação do então

CFAS com outros conselhos federais da área da saúde (BRAVO, 1996, apud

BRAVO e MATOS, 2004, p. 34).

São mudanças consideradas insuficientes pelos autores, pois, o Serviço

Social adentra a década de 1990 com incipientes alterações da prática institucional;

continua como categoria desarticulada do Movimento da Reforma Sanitária e, com

isso, sem nenhuma explícita e organizada ocupação na máquina do Estado pelos

setores progressistas da profissão; e insuficiente produção sobre ―as demandas

postas à prática em saúde‖.

Simultaneamente ao início dos anos 90, um novo governo, portador de um

discurso aparentemente modernizante e articulado com as grandes massas - sem

sustentação política em partidos tradicionais -, acaba por instalar-se em março de

1990. Era o fim da Nova República e o início do Governo Collor de Mello, o qual

remexia no ―entulho sanitário‖ que, por ora, fora substituído pelo aparato legal:

Constituição Federal de 1988; Constituições Estaduais e Leis Orgânicas Municipais;

Lei nº. 8.142/90 e Lei nº. 8.080/90 – na qual fica também garantida a implantação

legal do Sistema Único de Saúde.

Configura-se, assim, a trajetória do Sistema de Saúde na década de 80,

sendo que um novo caminho começa a se consolidar ao longo dos anos 90, em que

Page 57: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

55

é imponente a presença de um projeto neoliberal de saúde, reciclando a proposta

conservadora de um modelo médico assistencial privatista adequado à lógica

capitalista.

A reestruturação mundial do capitalismo acompanhada de uma ruptura do

“compromisso social” entre capital e trabalho assumidos pelo Estado, especialmente

nos países centrais, desfaz o Welfare State - pacto que implicava como tendência o

pleno emprego, o expressivo sistema de políticas sociais, a proteção dos direitos

trabalhistas, a regulação das condições de trabalho.

Desse modo, segundo Iamamoto, as transformações no mundo do trabalho

vêm acompanhadas de profundas mudanças,

(...) na esfera do Estado, consubstanciadas na Reforma do Estado, exigidas pelas ―políticas de ajuste‖, tal como recomendadas pelo Consenso de Washington. Em função da crise fiscal do Estado em um contexto recessivo, são reduzidas as possibilidades de financiamento dos serviços públicos; ao mesmo tempo, preceitua-se o ―enxugamento‖ dos gastos governamentais, segundo os parâmetros neoliberais. (1998, p. 34).

Nesses termos, o Brasil, não tendo experimentado o Welfare State ou Estado

de Bem-Estar Social na sua completude, viveu o que Oliveira já denominou de

Estado do Mal - Estar Social (IAMAMOTO, 1998, p. 30).

Portanto, nos marcos da reestruturação dos mecanismos de acumulação do

capitalismo globalizado, terreno fértil para o avanço da regressão neoliberal – a qual

erodiu as bases dos sistemas de proteção social e redirecionou as intervenções do

Estado, em relação à questão social –, as políticas sociais vêm sendo objeto de um

processo de reordenamento subordinado às políticas de estabilização da economia

e a opção neoliberal. Na área social, passa pelo apelo à filantropia e à solidariedade

da sociedade civil e por programas seletivos e focalizados de combate à pobreza no

âmbito do Estado.

Portanto, as políticas sociais, nesta década, se circunscrevem num cenário de

estabilização e ajustes neoliberais, remetendo ao trinômio: privatização,

descentralização e focalização.

Assim, a decorrente privatização dos serviços sociais e, em particular a

saúde, remete a regulação a mecanismos de mercado, penalizando os que menos

podem. Dito de outra forma, as transformações operadas globalmente no mundo do

trabalho, na esfera do Estado, na sociedade civil e na cultura – impulsionadas

política e ideologicamente pelo neoliberalismo – acirram na sociedade brasileira a

Page 58: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

56

desigualdade social que é sentida pela população no não acesso aos bens e

serviços, principalmente no que se refere à saúde, assistência e previdência,

rompendo com o ―pacto social‖ assegurado pela Constituição Federal Brasileira de

1988.

A descentralização propõe a redução do Estado em busca de um Estado

Mínimo para o social e máximo para o capital. Isso nos remete a dois aspectos

cruciais: o aspecto de fragilização do papel reitor do Estado sobre as políticas

sociais e da diminuição de seu papel redistributivo.

A focalização, por outro lado, é decorrente do fato de que os gastos sociais

públicos chegam, em pequena e reduzida proporção, aos setores mais pauperizados

da sociedade, mas, para eles, deveriam ser dirigidos, prioritariamente, os recursos

para os programas sociais. Assim, com destaque para a área da saúde, a

focalização aparece, com clareza, nas propostas de atenção primária seletiva em

suas diferentes versões.

A emergência do projeto neoliberal dá-se num contexto de dificuldades

econômicas e de abertura política, tendo como ―pano de fundo‖ uma profunda crise

orgânica do Estado. A universalização consagrada na Constituição de 1988, quando

se instituía o preceito da Seguridade Social, consolidava-se nas tendências das

políticas redistributivas, com as quais pretendia a inclusão de todos nos benefícios

do sistema público de saúde.

A eliminação da contribuição previdenciária como condição para o acesso aos

serviços públicos de saúde provoca uma ruptura com o modelo corporativo do

benefício como direito de quem paga por ele e viabiliza uma efetiva redistribuição de

recursos, ainda que limitada ao interior da população assalariada.

Porém, essa expansão da universalização do sistema de saúde vem

acompanhada de racionamento e queda de qualidade dos serviços públicos, que

expulsa do sistema público segmentos sociais de camadas médias e do operariado

mais qualificado, capturados pelos planos de saúde.

Todavia, a constituição de um Sistema Único de Saúde, ao final dos anos 80,

foi a mais importante decisão de reforma na área social daquela década. Não

somente por ser a única das políticas sociais em que se reuniram condições

institucionais para que se tomassem decisões em favor de uma reforma efetiva, mas

também pelo conteúdo desta reforma, pela natureza, importância e extensão das

Page 59: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

57

decisões tomadas (ARRETCHE, 2000).

Costa (2000) sinaliza que, com a implementação do SUS, a partir da década

de 90, mudanças de ordens tecnológica, organizacional e política passaram a exigir

novas formas de organização do trabalho em saúde, determinadas pela

hierarquização, descentralização e democratização do sistema, imprimiram novas

características ao modelo de gestão e aos processos de trabalho, vindo a compor

novas modalidades de cooperação, qualificadas por Nogueira45 ―de cooperação

horizontal e vertical‖.

Congrega-se a isso, o verdadeiro ―desmonte da nação”, orquestrado pelo

governo Fernando Henrique Cardoso46, onde, nos anos 90, assiste-se ao

redirecionamento do papel do Estado, influenciado pela Política de Ajuste Neoliberal.

A reforma do setor de saúde seguiu a proposta do Banco Mundial, que subordina os

princípios de equidade aos de eficiência, efetividade e economia nos gastos

públicos. Segundo Lesbaupin e Mineiro (2002, p.43), ―é a partir desta lógica que está

inserida a preocupação com seletividade e focalização das políticas de proteção

social‖.

Na perspectiva do Banco Mundial, a saúde não é vista como um direito ao

qual todos devem ter acesso gratuitamente. Para esta instituição, é preciso

―aumentar a focalização do gasto público (em direção aos mais pobres), incluindo a

cobrança dos que podem pagar por certos benefícios e o estímulo à oferta pelo setor

privado de certos serviços‖ (COSTA, 1996; CARVALHO, 2002, apud LESBAUPIN e

MINEIRO, 2002, p. 43).

A lógica do ajuste fiscal penetrou também a política de saúde; aqui, também,

a saída para uma suposta crise é a privatização. De acordo com Lesbaupin e

Mineiro (2002), na ótica neoliberal, o mercado cuida melhor de tudo: tanto de

empresas siderúrgicas, petrolíferas como da previdência, da educação e da saúde.

Para os autores, ao longo dos seus dois mandatos, o governo de Fernando

Henrique Cardoso conseguiu realizar uma façanha que nenhum de seus

antecessores havia conseguido até então: destruir ou atingir seriamente parte

45 Cf. NOGUEIRA, Roberto Passos. O trabalho em serviços de saúde. Adaptação do texto apresentado no seminário ‖O choque teórico‖, promovido pela Escola Politécnica Joaquim Venâncio. Rio de Janeiro, Fiocruz, 1991. (Mimeo). 46 Fernando Henrique Cardoso foi o trigésimo quarto presidente da República Federativa do Brasil, cargo que exerceu por dois mandatos consecutivos, de 1° de janeiro de 1995 a 1° de janeiro de 2003. Foi também o primeiro presidente reeleito da história do país. É cofundador e, desde 2001, presidente de honra do PSDB (Partido da Social Democracia Brasileira)

Page 60: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

58

considerável do que havia sido construído ao longo de 60 anos de história

republicana brasileira, dos anos 30 ao fim dos anos 80. Desde serviços públicos até

a legislação trabalhista e a Constituição Federal de 1988, promovendo um

verdadeiro desmonte da nação. Apesar de tudo, asseveram os autores: “este

governo não conseguiu destruir o Brasil, não conseguiu destruir o povo brasileiro”

(LESBAUPIN E MINEIRO, 2002).

Não obstante, o SUS, visto como um modelo de política pública de saúde vive

um processo de ataques da mídia e da política neoliberal, que o responsabiliza pela

má situação da saúde pública e pelos decorrentes males pelos quais passa a

população. Tal crítica isenta as autoridades de suas responsabilidades.

Aliam-se a este quadro: a falta de recursos; o uso político clientelista das

políticas de saúde por parte das esferas federais, estaduais e municipais; a intensa

campanha neoliberal para desmoralizar qualquer ação competente por parte do

setor público em que impera a máxima: “tudo que é público é ruim e não presta”,

além da ausência de uma legislação adequada à importância das políticas sociais e

da frágil estrutura tributária dos governos municipais, que convivem com uma grande

retração dos gastos federais e estaduais no setor.

Ressaltamos que o Sistema Único de Saúde/SUS tem sido marcado por

intensos debates que refletem a presença de interesses antagônicos em relação a

sua consolidação, tanto como política pública calcada na universalidade, equidade,

integralidade, participação da população e dever do Estado, quanto no que se refere

às dificuldades para construir modelos assistenciais ancorados na concepção

ampliada de saúde que foi a base do processo de proposição do próprio SUS

(NOGUEIRA E MIOTO, 2007).

A categoria dos assistentes sociais – como parte da classe trabalhadora

inserida neste processo, compreendendo-se o Serviço Social como uma profissão

historicamente determinada na divisão social e técnica do trabalho (a qual possui um

caráter interventivo no âmbito da questão social) – ao romper com uma visão

endógena da profissão, prisioneira em seus muros internos, alarga os horizontes

para o movimento das classes sociais e do Estado em suas relações com a

sociedade, não para perder ou diluir as particularidades profissionais, mas, ao

contrário, para iluminá-las com maior nitidez; extrapolar o universo do Serviço Social

para melhor apreendê-lo na história da sociedade da qual ele é parte e expressão

Page 61: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

59

(IAMAMOTO, 2007).

Isso nos permite compreender que a discussão a política pública de saúde e o

SUS está presentes no Serviço Social através de produções bibliográficas, segundo

Nogueira e Mioto (2007), apreendidas sob duas perspectivas: uma que pauta o

debate de forma mais intensa no eixo ético-político e outra que direciona análise

para a prática profissional no âmbito do SUS.

No que se refere ao eixo-político, destacam-se os estudos de Bravo (1996) e

de Nogueira (2002, 2004, 2007), os quais relacionam os riscos quanto às

possibilidades da ação profissional no sentido da garantia de direitos universais ao

analisarem o cenário atual, sinalizando as ameaças presentes no confronto entre o

projeto privatista de cuidados de saúde e o projeto da reforma sanitária.

A concepção ampliada de saúde assumida na Constituição de 1988, através

da determinação da implantação do SUS, foi um importante passo para uma

mudança significativa no modelo assistencial e na tradução das necessidades de

saúde da população brasileira. Ou seja, verifica-se que o atendimento das

necessidades de saúde remete ao atendimento das necessidades humanas

elementares, dentre as quais se destacam o trabalho, a alimentação, a habitação, o

acesso à água potável, aos cuidados primários de saúde e à educação.

A partir do exposto, postula-se que não é possível apreender ou definir as

necessidades de saúde sem levar em conta que elas são produtos das relações

sociais e destas com o meio físico, social e cultural.

Isso permite compreender que a adoção dos determinantes sociais como

estruturantes dos processos saúde-doença possibilita que as ações profissionais

dos assistentes sociais tenham maior centralidade, assinalando um novo estatuto ao

Serviço Social no campo da saúde.

Há que se considerar nessa breve apreciação a situação adversa às

propostas de democracia social, decorrentes dos ajustes macroeconômicos da

década de 90 no Brasil: as políticas de redução do Estado, as privatizações e o novo

papel desempenhado pelo mercado como provedor das necessidades de saúde.

Nas palavras de Nogueira e Mioto (2007, p.233), “foram a pedra de toque para as

dificuldades que ora se apresentam”.

Nesse marco, situamos a importância da eleição de Luiz Inácio Lula da Silva,

em 2002, para a Presidência da República, como resultado da reação da população

Page 62: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

60

brasileira às medidas implantadas no período anterior. Sem dúvida, a eleição de

Lula47 significou um marco político na história do país.

Isto posto, alguns aspectos devem ser abordados. Para tanto, recorremos a

Braz (2004) que ao analisar o governo Lula e os rebatimentos deste no projeto ético-

político do Serviço Social, aborda sobre três grandes questões a serem salientadas

quando pensamos a natureza do governo Lula: A primeira diz respeito ao significado

político da eleição de Lula; marco político indiscutível na história do Brasil, primeiro

represente legítimo da classe operária brasileira com forte experiência de

organização política.

Como asseverou Coutinho (2003, p. 23), apud Braz (2004, p. 49):

[...] foi a vitória de um projeto político, representado, sobretudo, por um

partido que soube crescer nos quadros de um processo de

redemocratização do qual foi, de resto, um dos maiores protagonistas.

Para Braz (2004, p. 49), a vitória de Lula tem significado mais que simbólico:

ela só foi possível a partir de um nível ampliado de articulação política que

envolveu os mais distintos estratos da classe trabalhadora em torno de um

projeto. [...] venceu pela primeira vez, o projeto que não representava em

sua origem e em sua totalidade os interesses hegemônicos das classes

dominantes no Brasil [...] envolveu, também, espectros amplos da

sociedade civil organizada.

A segunda questão refere-se ao contexto nacional e internacional das lutas de

classes, sobretudo ao perfil da classe trabalhadora que se encontra numa postura

defensiva frente à ofensiva do capital, em que as formas organizativo-políticas

encontram-se cada vez mais recortadas em ―identidades‖ fragmentárias (BRAZ,

2004).

Quanto à terceira questão, Braz (ibidem) esclarece que esta se relaciona

diretamente à segunda. Envolve o giro à direita dado pelo governo, aproximando o

PT a setores conservadores, de forma a torná-lo palatável às classes dominantes,

embora encontremos elementos que fomentem a conclusão de que este processo

de direitização se configurara bem antes da chegada de Lula no poder.

47 Luiz

Inácio Lula da Silva é um político e ex-sindicalista brasileiro, trigésimo quinto e atual presidente da

República Federativa do Brasil, cargo que exerce desde o dia 1º de janeiro de 2003. Lula, forma hipocorística de "Luiz", é sua alcunha desde os tempos em que era representante sindical. Posteriormente, este apelido foi oficialmente adicionado ao seu nome legal para poder representá-lo eleitoralmente.

Page 63: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

61

Tais pontos supracitados corroboraram uma vitória das tendências mais

"moderadas", que negaram o projeto político do PT, que, na sua gênese

,representava, nas palavras de Braz (2004, p. 53), "o polêmico 'socialismo

democrático' para um reformismo sequer social-democrata".

É possível, então, com aporte em Bravo (2008), afirmarmos sem ilusões que

as propostas e reformas defendidas pelo governo Lula, após o seu primeiro governo,

dão sequência à contrarreforma do Estado iniciada na gestão de FHC, encolhendo o

espaço público democrático dos direitos sociais e ampliando o espaço privado – não

só nas atividades ligadas à produção econômica, mas também no campo dos

direitos sociais conquistados.

No entanto, no programa do governo Lula, a saúde é entendida como um

direito fundamental e há o compromisso em garantir o acesso universal, equânime e

integral às ações e serviços de saúde.

Segundo Bravo (2007), o Ministério da Saúde tem apontado como principais

desafios: a incorporação da agenda ético-política da Reforma Sanitária; a

construção de novos modelos de fazer saúde com base na integralidade, a

intersetorialidade e a atuação em equipe; o estabelecimento da cooperação entre

ensino-gestão-atenção; controle e a supressão dos modelos assistenciais verticais e

voltados somente para a assistência médica.

De acordo com a autora, algumas estratégias também têm sido ressaltadas

para a viabilização dos objetivos e metas a serem alcançados, cabendo destacar: a

política de educação para o SUS (mudança na prática e formação); a capacitação

continuada de conselheiros de saúde; o acesso à informação; a ênfase na educação

de saúde e a efetivação de outras contratações profissionais; e o fortalecimento do

Programa de Saúde da Família (BRAVO, 2007).

A análise que Bravo (2007) faz, ante o exposto, é que, após esses anos de

governo, a política macroeconômica do governo anterior foi mantida. As políticas

sociais continuam fragmentadas e subordinadas à lógica econômica.

Ainda que não seja o objetivo deste capítulo traçar um panorama detalhado

das políticas sociais no Governo Lula, não podemos deixar de apresentar alguns

aspectos fundamentais da estratégia governamental na área social.

Machado (2007) afirma que a grande prioridade conferida no primeiro governo

Lula é o combate à pobreza, inicialmente por meio do Programa Fome Zero e, logo a

Page 64: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

62

partir de 2004, pela priorização de um imenso programa de transferência direta de

renda, com condicionalidades, o Programa Bolsa Família.

É certo que as estratégias de combate à pobreza em nada colidem – muito

pelo contrário – com as agendas de reforma de inspiração neoliberal, o grande

destaque do Programa Bolsa Família no Governo Lula gera críticas de vários tipos,

como acusações de ser ―assistencialista‖, ―populista‖ e ―eleitoreiro‖ (MACHADO,

2007). Todavia, faz-se necessário ponderarmos que, no contexto atual do

capitalismo mundial, os programas de transferência de renda podem exercer um

papel relevante na proteção social, dadas as concretas dificuldades de expansão

maciça nos níveis de emprego e renda, bem como as perversas tendências de

aumento da exclusão social (MACHADO, 2007).

Em que pesem alguns avanços, a questão que se coloca é o risco de certo

esgotamento desse efeito de redução das desigualdades e o alerta de que a

potencialização dos efeitos sociais desse tipo de programa passa, necessariamente,

segundo Machado (2007), pela valorização de outras políticas sociais, com inserção

em um sistema mais abrangente e integrado de proteção social.

Para autora, nenhum outro programa social teve destaque comparável ao do

Bolsa Família, ainda que, no interior de algumas áreas sociais, seja possível

identificar estratégias prioritárias que apresentaram avanços. Houve restrições de

financiamento de várias políticas sociais e situações de contingenciamento de

orçamentos de algumas áreas em prol da expansão de outras – particularmente da

expansão do programa Bolsa Família.

A política de saúde não constitui uma exceção, embora possam se observar

iniciativas de mudanças e esforços de superação de problemas em áreas

estratégicas, anteriormente apontadas por Bravo (2007).

No que concerne ao conteúdo das políticas, um movimento relevante de

mudança, segundo Machado (2007), é a conformação de duas novas secretarias: a

de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos; a de Gestão da Educação e do

Trabalho em Saúde. Ainda que represente mudanças de caráter administrativo, a

criação dessas secretarias tem significado como esforço de maior institucionalização

de dois campos estratégicos de atuação do Estado na saúde: o de insumos e o de

recursos humanos.

Nesse aspecto, as iniciativas mais importantes se deram no fomento à

Page 65: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

63

pesquisa em áreas relevantes para a saúde, sendo as ações da nova secretaria no

âmbito do apoio ao desenvolvimento e provisão de insumos estratégicos para a

saúde mais tímidas no período (MACHADO, 2007:12)

No que se refere à segunda secretaria, registram-se esforços na formação de

recursos humanos, em que já existiam iniciativas anteriores, mas que foram

expandidas por meio de parcerias e novas articulações com gestores locais,

universidades e setores do Ministério da Educação. Outra subárea que representou

uma nova vertente de ação mais coerente foi a de regulação do trabalho em saúde.

Embora com dificuldades e resultados ainda incipientes no primeiro governo Lula

(MACHADO, ibidem). Abordando, ainda, esse aspecto de possíveis mudanças, a

autora considera que um importante movimento foi a elaboração de um Plano

Nacional de Saúde, lançado em 2004, visto que, durante toda a década de 1990,

não havia sido feito nenhum plano abrangente e de longo prazo pelo Ministério da

Saúde.

Todavia, ainda que avanços institucionais tenham sido observados na política

de saúde, em 2002, ainda persistiram distorções estruturais do sistema e graves

lacunas de atuação federal.

Para Machado (2007), a análise da política nacional de saúde no primeiro

Governo Lula permite identificar elementos de continuidade e mudança em relação

aos anos 1990. Assim, a política de saúde no período 2003-2006 não representou

em seu conjunto uma prioridade do governo federal, ainda que tenha havido

esforços e iniciativas de mudança em alguns âmbitos estratégicos para a

implantação do SUS, com destaque: a escolha de José Gomes Temporão para

Ministro de Saúde, no período de transitoriedade (2007), um nome de peso do

movimento sanitário brasileiro (principal legado desse período de transitoriedade).

Contudo, Bravo e Menezes (2008) identificam uma mudança de discurso dos

protagonistas do projeto de Reforma Sanitária, construído nos anos 80,

principalmente, a partir de 2007, com a escolha do Ministro da Saúde. As autoras

asseveram:

Há uma flexibilização de suas proposições pautada nas possibilidades de ação no atual contexto brasileiro. Diversos sujeitos sociais do Movimento Sanitário não têm enfrentado a questão central do governo que é a subordinação da Política Social à política macroeconômica. [...] Os defensores da Reforma Sanitária e do Projeto Democracia de Massas só conseguirão contribuir para reverter as profundas desigualdades existentes na atual conjuntura brasileira aliando-se a um amplo movimento de massas que exija a redução do fosso entre a política macroeconômica e as políticas

Page 66: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

64

sociais com a elaboração de uma agenda que defenda a garantia nas esferas da economia, da política e da cultura (2008, p. 21).

O que se pretende destacar aqui é a atual disputa de dois projetos existentes

na saúde: o projeto da Reforma Sanitária versus o Projeto Privatista. Segundo Bravo

(2007), o atual governo ora fortalece o primeiro projeto e ora mantém focalização e o

desfinanciamento, características do segundo.

Assim, refletir sobre a ação profissional do assistente social no campo da

saúde implica fazer opções sobre os recortes a serem abordados, uma vez que o

caminho percorrido e os desdobramentos atuais da interface do Serviço Social com

a saúde são amplos e diversificados.

Nogueira e Mioto (2007) consideram que esse recorte permite reconhecer a

tradição do Serviço Social e a riqueza do arsenal teórico e técnico da experiência

acumulada na interface com a área da saúde e, partindo desse patamar, contribuir

para a densidade teórico-metodológica das ações desenvolvidas. Isso contribui para

delimitar, de forma mais explícita, o espaço profissional do assistente social,

inscrevendo a profissão igualmente no campo da saúde, face ao adensamento

desse campo nos últimos anos.

Page 67: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

65

CAPÍTULO II – A PRÁTICA PROFISSIONAL DOS ASSISTENTES SOCIAIS NA SAÚDE

“A prática é o fundamento e limite do conhecimento e

do objeto humanizado que, como produto da ação,

é objeto do conhecimento”.

Adolfo Sanches Vázquez

Tendo como referência os aspectos anteriormente discutidos, neste Capítulo,

procuraremos apresentar a configuração da prática dos assistentes sociais na área

da saúde. Buscaremos apreender o seu sentido e a sua direção na

contemporaneidade, bem como sinalizar os desafios e as polêmicas postos na

atualidade para uma prática dos assistentes sociais mediada pelo projeto

profissional hegemônico do Serviço Social brasileiro.

2.1 A prática dos assistentes sociais e o projeto ético-político profissional:

desafios e polêmicas postos na atualidade

As profundas mudanças operadas na profissão nas últimas décadas,

capitaneadas em seu projeto ético político profissional, são resultado de um

processo histórico da sociedade brasileira de lutas e resistência à ordem dominante.

Na verdade, uma resposta “à exigência da sociedade brasileira, em sua luta pela

democracia e pela cidadania: o reconhecimento, pelo serviço social, do usuário e

dos seus direitos” (CFESS, 2004, p. 45).

Como sublinha Iamamoto

o projeto profissional é histórico e dotado de caráter ético-político, que eleva

esse projeto a uma dimensão técnico-profissional. Isto porque ele

estabelece um norte, quanto à forma de operar o trabalho cotidiano,

impregnando-o de interesses da coletividade (2007, p. 227)

Page 68: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

66

Logo, o projeto profissional do Serviço Social brasileiro é construído

coletivamente ao longo das últimas três décadas, assumindo um claro vínculo com

um projeto societário cujos valores e pilares estão expressos no Código de Ética

Profissional de 1993, na Lei de Regulamentação da Profissão e nas Diretrizes

Curriculares aprovadas em 1996 pela ABESS (Associação Brasileira de Ensino em

Serviço Social), hoje ABEPSS (Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em

Serviço Social).

Assim, este projeto é fruto de uma ampla discussão operada dentro do

espectro profissional – pois expressa interesses particulares de um determinado

grupo social, como o dos assistentes sociais – se relacionando com as diversas

particulares que envolvem vários interesses sociais presentes na sociedade

brasileira.

Através de sua direção social o projeto ético-político do Serviço Social

brasileiro coloca-se vinculado a um projeto de transformação da sociedade. Essa

vinculação se dá pela própria exigência que a dimensão política da intervenção

profissional impõe. Além disso, o projeto ético-político é bem claro e explícito quanto

aos seus compromissos éticos profissionais. Nas palavras de Netto (1999):

Ele tem em seu núcleo o reconhecimento da liberdade como valor ético central - a liberdade concebida historicamente, como possibilidade de escolher entre alternativas concretas; daí um compromisso com a autonomia, a emancipação e a plena expansão dos indivíduos sociais. Conseqüentemente, o projeto profissional vincula-se a um projeto societário que propõe a construção de uma nova ordem social, sem dominação e/ou exploração de classe, etnia e gênero (pp.104-105).

Cumpre ressaltar as concepções que fundamentam o Código de Ética de

1993. Duas preocupações nortearam a análise e a produção do Código de 93 quais

sejam: torná-lo um instrumento efetivo no processo de amadurecimento político da

categoria, bem como um aliado na mobilização e qualificação dos assistentes

sociais diante dos enormes desafios e demandas da sociedade brasileira, ou seja,

urgia transformá-lo num mecanismo efetivo de defesa da qualidade dos serviços

prestados pelos assistentes sociais; e constituí-lo como um instrumento eficaz de

defesa do exercício profissional, fornecendo respaldo jurídico à profissão

(BARROCO, 2001).

De acordo com a autora, buscou-se, pois, na elaboração do Código de Ética

Profissional de 93, através de um esforço coletivo, a tradução e materialização de

Page 69: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

67

diversas situações inerentes ao processo de trabalho do assistente social, no intuito

de abranger os dilemas éticos. Houve, neste âmbito, um empenho para melhor

definir e precisar a objetivação dos valores e princípios éticos universais no seio do

cotidiano da profissão. Nas palavras da autora48

(...) O Código de 93 obteve um salto de qualidade muito grande, pois,

possui uma fundamentação ética e filosófica e consegue operacionalizar de

forma objetiva os onze princípios fundamentais que balizam o projeto e os

compromissos ético-profissionais.

O Código de Ética Profissional, além da parte normativa — necessária em

qualquer código profissional —, apresenta um projeto de profissão e de sociedade.

Ou seja, além das normas, elege valores e princípios a serem defendidos pelos

profissionais na sua prática cotidiana. Ao definir-se como um projeto — que implica

meios e instrumentos para sua realização —, o Código de Ética de 93 rompe com as

funções tradicionais de um Código de Ética profissional, pois estabelece valores e

princípios que ultrapassam as normas geralmente impostas para o exercício

profissional propriamente dito49.

O Código de 93 representa a superação das debilidades teóricas e políticas

do Código de Ética de 198650, ao explicitar o compromisso profissional a favor da

emancipação humana e da construção de uma sociedade pautada na liberdade e na

justiça social. Expressa também o grau de apropriação da teoria social marxista pela

profissão. Portanto, fundamentado na ontologia social de Marx, o Código de 1993

48 Palestra proferida por Maria Lúcia Barroco com a temática, ―10 anos do Código de Ética de 93”. Realizada em agosto de 2003, na cidade de São Paulo (SP), no Encontro Descentralizado Sudeste - encontro preparatório para o XXXII Encontro Nacional CFESS/CRESS. 49 Cf. Vasconcelos [et al.] Profissões de saúde, ética profissional e seguridade social.In: Bravo (orgs).Saúde e Serviço Social. São Paulo: Cortez; Rio de Janeiro:UERJ, 2004. 50 O Código de Ética de 1986 foi elaborado ao longo de aproximadamente três anos, a partir de um processo de discussão envolvendo os segmentos representativos da categoria e, posteriormente, homologados pelo Conselho Federal de Serviço Social. Superando a concepção do ―técnico imparcial‖, o Código de 86 buscou garantir a ação profissional pautada nos parâmetros de capacitação, para pesquisar, elaborar, gerir e decidir a respeito das políticas sociais e programas institucionais. Assim, o Código de 86 representa um avanço, inserindo-se no âmbito das discussões éticas contemporâneas na busca de uma ética que pudesse responder aos desafios da sociedade. Dessa forma, há três dimensões de mudanças colocadas no Código de 1986 – a negação à neutralidade, aos pressupostos metafísicos e idealistas e ao papel profissional tradicional – com vistas a uma prática que tenha como pressuposto o real, e não modelos ideais abstratos. O Código de Ética de 86 alarga os horizontes éticos do Serviço Social, na medida em que se afirma o caráter do homem enquanto ser histórico, social, prático e criador. Tem-se, a partir de tal construção ética e normativa, um posicionamento a favor da classe trabalhadora. Todavia, apesar do avanço, o Código de 86 apresenta resquícios de uma visão estática e unilateral ao explicitar uma vinculação profissional a determinada classe social (no caso a classe trabalhadora) e, com isto, perdendo em eficácia ao não atentar para a totalidade da prática profissional do assistente social. Cf. BONETTI, Dilsea Aldeodata et alii (orgs.). Serviço Social e Ética: convite a uma nova práxis. São Paulo: Cortez/CFESS, 1995.

Page 70: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

68

concebe, nas palavras de Ortiz (2009, p.131), “a liberdade como um dos resultados

da práxis humana, e, por conseguinte, não consistindo em um fenômeno natural,

mas um produto histórico gerado a partir do trabalho”.

Com efeito, o Projeto Ético Político do Serviço Social não pode ser

compreendido somente como uma decorrência de fatores internos da profissão;

posto que, por uma ótica, é fruto de um processo de organização política da

categoria dos assistentes sociais e, por outra, é também produto da ascensão das

forças democrático-populares no cenário político nacional - marcado pela reativação

do movimento operário-sindical e pela efervescência dos movimentos populares que

contribuíram, sobremaneira, para uma nova perspectiva àqueles assistentes sociais

que pretendiam uma ruptura com o conservadorismo profissional (PACHECO in

SOUZA, 2007).

Cabe lembrarmos que entre as vertentes presentes no circuito de Renovação

do Serviço Social (Ortiz, 2009), é a chamada ―intenção de ruptura‖, conforme Netto

(1996), que abriu a radical possibilidade, pela primeira vez na trajetória do Serviço

Social, da superação com o histórico conservadorismo. Entretanto, o autor sinaliza

que a consolidação do movimento de ruptura não significa a superação do

conservadorismo no interior do Serviço Social, ao contrário:

(...) significa, apenas, que – graças aos esforços que vinham, pelo menos, de finais dos anos setenta, e no rebatimento do movimento da sociedade brasileira – posicionamentos ideológicos e políticos de natureza crítica e/ou contestadora em face da ordem burguesa conquistaram legitimidade para se expressar abertamente. É correto afirmar-se que, ao final dos anos oitenta, a categoria profissional refletia largo espectro das tendências ídeo-políticas que tencionam e animam a vida da sociedade brasileira (NETTO,1999, p.111).

É sabido que o conservadorismo no Brasil tem seu perfil marcado pela

inserção periférica da economia brasileira no mercado mundial. Este fato determina

a forma própria de desenvolvimento do conservadorismo nas diversas esferas

sociais e, particularmente, na produção dos saberes.

O Serviço Social, por sua vez, tem no conservadorismo um elemento central

da sua constituição ídeo-teórica e histórica, torna-o um terreno fértil para

proposições antimodernas e conservadoras, que se expressam na

contemporaneidade no pensamento pós-moderno.

O pensamento pós-moderno dá por suposto e de forma simplicista – que lhe é

peculiar – o fracasso das promessas da modernidade. De acordo com Sousa (2005,

Page 71: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

69

p.23), este pensamento coloca em questão as noções clássicas de verdade, razão,

identidade e objetividade, a idéia de progresso ou emancipação universal e a

liberdade dos homens.

Logo, para a autora, trata-se de uma mistificação elaborada pelos autores

pós-modernos que não são capazes de perceber na atualidade o desenvolvimento

das contradições próprias da moderna sociedade burguesa.

Ressaltamos que o novo impulso do conservadorismo profissional com base

no neoconservadorismo pós-moderno tem especificidades derivadas não só do

momento histórico – leitura fragmentada e epistemologista da realidade

contemporânea –, mas, sobretudo, do enfrentamento posto pelo movimento

realizado no Serviço Social, de ruptura com o conservadorismo. Ou seja, o

conservadorismo irá se fortalecer no processo de desqualificação da vertente crítico-

dialética e o faz do ponto de vista teórico, incorporando as críticas pós-modernas ao

marxismo; e do ponto de vista ídeo-político, na deslegitimação do projeto-ético-

político-profissional, expressão da direção social estratégica que aponta a ruptura

com o conservadorismo.

Portanto, nas respostas dadas pela profissão às necessidades sociais

oriundas da relação entre capital e trabalho, as vertentes teórico-profissionais

interpelam na atualidade um confronto ideo-político, que fora sinalizado por Netto

(1996), e aparecem configuradas nas seguintes linhas de desenvolvimento:

1. manter a continuidade da vertente que se iniciou com a intenção de ruptura com influência da tradição marxista e no marco da direção social estratégica explicitada na abertura dos anos 90; 2. registrar um novo alento de uma vertente de cariz tecnocrático, herdeira daquela que foi a ―perspectiva modernizadora‖ dos anos sessenta e setenta, mas renovada pela ofensiva neoliberal e reciclada por outras teorias sistêmico-organizacional... 3. a persistência (...) da vertente do conservadorismo tradicional, que recorreu, nos anos setenta e oitenta, à fenomenologia; 4. o desenvolvimento de uma vertente neoconservadora, inspirada fortemente na epistemologia pós-moderna, afinada com as tendências da nova moda das chamadas ciências sociais e tendo seu gume crítico apontando para a revisão dos substratos das conquistas anticonservadoras dos anos oitenta, muito provavelmente promovendo, por um lado uma retronização das práticas tradicionais, oferecendo-lhes um discurso legitimado de natureza cultural, e por, outro, estimulará, respaldando o apelo à sociedade civil e a cidadania ações focais de no marco de petições solidárias e parcerias de todos os níveis; 5. o florescimento de vertentes aparentemente radicais, abertamente desqualificadoras da teorização sistemática e da pesquisa rigorosa fundada num anticapitalismo romântico de inspiração católica, seja na repulsa anarcoide ao universalismo da modernidade, seja no irracionalismo aberto, seja no relativismo mais primário (pp.126-127).

Page 72: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

70

Percebemos que passados treze anos dessa afirmação, há possibilidade

regressiva em termos da profissão e da ligação desta com a nova forma de

conservadorismo que está representada na teoria pós-moderna se faz presente nas

relações fragmentadas do capitalismo, que ganhando novas nuances na

contemporaneidade.

Nesse marco, o contexto neoconservador contemporâneo, objetivamente

expresso no processo de crise do grande capital e seus desdobramentos no âmbito

público-estatal (marcado pelo progressivo processo de contrarreforma do Estado),

econômico e sociocultural, as tendências conservadoras - sempre presentes, ainda

que subliminares nas últimas décadas - na profissão se fortalecem e se ampliam

aquecendo a chamada ―luta dos contrários51‖ (ORTIZ, 2009).

Conforme assevera a autora: é neste cenário que o Serviço Social entra no

século XXI, no qual se torna imprescindível, não apenas o reconhecimento das

ameaças possíveis, mas, principalmente, sob pena de francos retrocessos, a

reafirmação do caminho da “‟intenção de ruptura” percorrido por esta profissão até

aqui (ORTIZ, 2009, p. 134).

Do exposto, tomemos aqui as polêmicas e os desafios que se objetivam na

atualidade para a prática dos assistentes sociais mediada pelo projeto profissional

hegemônico do Serviço Social brasileiro.

De início, podemos dizer que, diante desse contexto de incertezas, alguns

autores do Serviço Social têm nutrido o debate acerca da existência e permanência

da hegemonia do projeto ético-político, a exemplo de Netto (2007) e Braz (2007)52.

Contudo, ainda que a indagação se o projeto ético-político é (ainda) hegemônico ou

não esteja sobre a mesa de debates (Ortiz, 2009), alguns aspectos dessa discussão

tendem a impactar, sem dúvida, o projeto ético profissional53.

Segundo Bravo (2007), a crítica à tendência da intenção de ruptura não se

apresenta como antimarxista e sim afirmando que o marxismo não apresenta

respostas para o conjunto dos desafios postos à profissão pela contemporaneidade.

51 A autora sinaliza a existência de traços renovados conviverem dialeticamente com aqueles vinculados às chamadas ―marcas de origem‖ da profissão. Esses traços renovados e tradicionais fundados em claros e antagônicos valores e princípios éticos-políticos. Colidem entre si cotidianamente numa aberta ―luta dos contrários‖. Cf. ORTIZ, 2009. 52 Os autores apresentam argumentação nos respectivos artigos. Netto. ―Das ameaças à Crise, pp.37-40 e Braz‖. ―A hegemonia em xeque‖. Projeto ético-político do Serviço Social e seus elementos constitutivos, pp.5-10. CFESS, Revista Inscrita - Ano VII – nº novembro de 2007. 53 Cf. ORTIZ, Fátima Grave. Serviço Social e Ética: a Constituição de uma Imagem Social Renovada. In Forti e Guerra et alii (orgs.). Ética e Direitos: ensaios críticos – Coletânea Nova de Serviço Social, Editora Lumen Juris. Rio de Janeiro, 2009,pp.133-136.

Page 73: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

71

Como nos mostra Netto (1996), ao realizar uma análise prospectiva da profissão.

A inflexão neoconservadora pós-moderna tem fortes influências acadêmicas e

no próprio Serviço Social, geralmente voltado à desqualificação do marxismo,

através de críticas formais e assumi dois compósitos:

1) uma crítica à ortodoxia (que, para os críticos, é sinônimo de dogmatismo) dos marxistas brasileiros no Serviço Social; 2) uma crítica às lacunas (e não aos equívocos) existentes nos seus trabalhos. No primeiro caso, a crítica se dirige no sentido de ―ampliar‖, ―abrir‖, ―flexibilizar‖ a perspectiva teórica, incorporando os autores que sejam do gosto crítico (Habermas para uns, Foucault para a maioria) e as tendências mais prestigiadas e mais up to date nos círculos acadêmicos e na indústria cultural (os pós-modernos). No segundo, constatando-se que a elaboração nos anos oitenta não lavrou sobre um amplo rol de objetos (questões de gênero, de cultura, de minorias etc.) insinua-se que isso se deve a uma espécie de inépcia imanente às correntes marxistas para enfrentá-los (1996, p. 114).

Na saúde, onde esse embate claramente se expressa, assegura Bravo (2007,

p. 211):

a crítica ao projeto hegemônico da profissão passa pela reatualização do discurso da cisão entre o estudo teórico e a intervenção, pela descrença da possibilidade da existência de políticas públicas e, sobretudo, na suposta necessidade da construção de um saber específico na área da saúde, que caminha tanto para a negação da formação original em Serviço Social ou deslancha para um trato exclusivo de estudos na perspectiva da divisão clássica da prática médica.

No texto acima a autora sinaliza três expressões que merecem destaque, a

saber: a primeira é a constatação de que ainda existe na categoria segmentos de

profissionais que, ao realizarem a formação em saúde pública, passam a assumir

uma auto-reapresentação de sanitaristas, não se identificando mais como

assistentes sociais; a segunda tendência mais expressiva na atualidade é resgatar

no exercício profissional o privilégio da intervenção no campo da subjetividade dos

sujeitos, autodenominada pelos seus executores como Serviço Social Clínico54.

Finalizando, percebe-se gradativamente o discurso da necessidade de

fóruns/entidades de capacitação dedicados à importância da produção do

conhecimento sobre o Serviço Social nas diferentes áreas de especialização da

prática médica.

Nas palavras de Netto (1999, p. 95), o projeto profissional do Serviço Social:

54 Esta proposta é decorrente de um movimento composto de um grupo de assistentes sociais com formação especializada em diversas abordagens clínicas: holística, bioenergética, psicodrama, terapia familiar sistêmica, transpessoal. É um grupo heterogêneo que reivindica das entidades da categoria e unidades de ensino o reconhecimento do caráter clínico ou terapêutico do exercício profissional. Cf. Parâmetros para a atuação de Assistentes Sociais na Saúde, versão preliminar, CFESS, Brasília, março de 2009.

Page 74: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

72

(...) É entendido como conjunto de valores que a legitimam socialmente, delimitam e priorizam seus objetivos e funções, formulam os requisitos (teóricos, institucionais e práticos) para o seu exercício, prescrevem normas para o comportamento dos profissionais e estabelecem as balizas de sua relação com os usuários de seus serviços, com as outras profissões e com as organizações e instituições sociais.

Compreendemos que não existem fórmulas prontas na construção de um

projeto democrático e a sua defesa, nas palavras de Bravo e Matos (2007, p. 214),

“não pode ficar acuada frente aos obstáculos que se apresentam na atualidade e

nem desconsiderar que há um leque de pequenas, mas não menos importantes

atividades e alternativas a serem desenvolvidas pelos profissionais de Serviço

Social”.

Mais do que nunca, os assistentes sociais são provocados a enfrentar a

defesa da democracia, das políticas públicas e consubstanciar um trabalho, no

cotidiano e na articulação com outros sujeitos que compartilhem destes princípios,

que faça frente ao projeto neoliberal, já que este macula direitos e conquistas

defendidos pelos seus fóruns e pelas legislações normativas da profissão.

2.2 A configuração da prática profissional dos assistentes sociais na saúde

Cumpre ressaltar que, ao falarmos de prática profissional, nos remetemos à

concepção cunhada pela tradição marxista. Ou seja, a de que a prática profissional é

uma especialização da práxis social55. Marx, ao apresentar suas Teses sobre

Feuerbach, afirma na I Tese que

o principal defeito de todo materialismo até aqui (incluindo o de Feuerbach)

consiste em que o objeto, a realidade, a sensibilidade só são apreendidos

sob a forma de objeto ou de intuição, mas não como atividade humana

sensível, como práxis, não subjetivamente.

Na perspectiva apontada por Vázquez (1977, p. 154), ―a práxis é o

fundamento e limite do conhecimento e do objeto humanizado que, como produto da

ação, é objeto do conhecimento‖, ou seja, a práxis é o ponto de partida e o alicerce

55

Embora o objetivo deste capítulo, não consiste em discutir se o Serviço Social é considerado trabalho ou não. Cabe-nos informar sobre a existência dessa polêmica teórica posta ao Serviço Social.

Page 75: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

73

para aferir e validar o conhecimento, bem como estabelecer o critério de sua

verdade, necessitando, para tanto, ―plasmar-se, adquirir corpo na própria realidade,

sob a forma de atividade prática‖. Portanto, a atividade teórica em si não é práxis,

ela só adquire plenitude na prática concreta dos homens (VÁZQUEZ, 1977).

Segundo Vázquez (ibidem), a práxis pode apresentar-se sob diversas formas:

produtiva, criativa e social ou revolucionária. Mas todas elas são concordantes no

fato de se tratar da transformação (...) e da criação de um mundo de objetos

humanos ou humanizados.

Nas palavras do autor,

A matéria-prima da atividade prática pode mudar, dando lugar a diversas formas de práxis. O objeto sobre o qual o sujeito exerce sua ação pode ser: produtos de uma práxis anterior que se convertem, por sua vez, em matéria de uma nova práxis, com os materiais já preparados com que trabalha o operário ou com que cria o artista plástico; o humano mesmo quer se trate da sociedade como matéria ou objeto da práxis política ou revolucionária, quer se trate de indivíduos concretos. Em alguns casos, como vemos, a práxis tem por objeto o homem e, em outros, uma matéria não propriamente humana: natural nuns casos, artificial nos outros (VÁZQUEZ, 1977, pp.194 -195).

Baptista (2006, pp. 28-29) considera que o que particulariza o

conhecimento produzido pelo Serviço Social é a inserção de seus profissionais

em práticas concretas

O assistente social se detém frente às mesmas questões que os outros

cientistas sociais, porém o que o diferencia é o fato de ter em seu horizonte

certo tipo de intervenção: a intervenção profissional. Sua preocupação é

com a incidência do saber produzido sobre a sua prática: em serviço social,

o saber crítico aponta para o saber fazer crítico.

Tomemos aqui a pesquisa realizada por Vasconcelos (2002) com os

assistentes sociais da Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro (RJ). Esta

demonstrou, nas palavras da autora: ―uma fratura entre a prática profissional

realizada pelos assistentes sociais e as possibilidades de prática contidas na

realidade objeto da ação profissional.”

De acordo com Baptista (2006), é importante entender que o saber que deriva

da prática profissional não se coloca imediatamente de modo pronto e acabado, mas

é um conhecimento que se constrói: desenvolve, traduz, codifica e decodifica um

conjunto de questões que se colocam à prática profissional em determinado

momento e delas extrai um saber.

Page 76: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

74

Vasconcelos (2002) considera que a prática dos assistentes sociais inseridos

na Secretaria Municipal de Saúde do Município do Rio de Janeiro (RJ) ainda

permanece atrelada aos ideais conservadores e tradicionais, os quais colaboram

para manutenção de práticas reiterativas e burocratizadas no meio profissional. A

compreensão e o entendimento da direção social da profissão pelos profissionais

ainda são substancialmente reduzidos.

No tocante à prática propriamente dita, a autora nos esclarece que os

assistentes sociais da Secretaria Municipal de Saúde/RJ a organizam através de

plantões, programas e projetos; entretanto, esta organização se processa

(...) independentemente do tipo de unidade de saúde, das diferenças entre os usuários e das demandas dirigidas ao Serviço Social, os assistentes sociais da SMS seguem uma lógica de organização do trabalho – estratégia de ação – que pode ser percebida nas ações mais ou menos padronizadas que realizam, tanto no conjunto das equipes profissionais quanto individuais.(...). (VASCONCELOS, 2002, p. 160). (grifo no original).

O plantão é a configuração comum de trabalho dos assistentes sociais na

Secretaria Municipal de Saúde, conforme sinaliza Vasconcelos (2002, p. 165):

O que chama a atenção (...) é a prioridade dada às atividades no plantão em todas as unidades pesquisadas e o número expressivo de assistentes sociais que afirmam trabalhar a partir de uma inserção majoritária em plantão, independentemente do tipo de unidade de saúde e dos usuários. Esta questão é crucial tendo em vista as características dos serviços prestados no plantão, características estas que, freqüentemente, determinam a respeitabilidade, a subalternidade, a aceitação, a força e/ou a influência que o Serviço Social possa ter na unidade como um todo, na direção das suas ações e na qualidade dos serviços prestados.

Nos Serviços de Saúde da Aeronáutica/RJ, os plantões do Serviço Social são

espaços para resolução imediata dos problemas e das demandas dos usuários;

neles, a demanda se apresenta sob variados contornos: pedidos de orientações

diversas; acesso aos serviços da unidade; reclamações quanto à dificuldade de

marcação de consultas; encaminhamentos para consulta médica; orientações sobre

o SARAM e FUNSA; solicitação de ambulância/viatura para transporte de usuário

acamado para consulta e/ou tratamento e internação; solicitação de apoio e

orientação quanto aos cuidados e tratamento de paciente acamado e restrito ao

leito; solicitação de ressarcimento de fisioterapia domiciliar; solicitação de inscrição

de paciente idoso no Serviço de Atendimento Domiciliar/SAD; solicitação de

Alojamento para familiares e acompanhantes (sem vínculo familiar) de pacientes

Page 77: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

75

oriundos de outros estados e que não podem permanecer no leito quando os

pacientes encontram-se internados em UTI56; orientação quanto aos procedimentos

no que se refere à Junta Regular de Saúde, bem como isenção de desconto do

imposto de renda, auxílio invalidez acidente de trabalho; orientação quanto à pensão

militar, exclusão de dependentes do SARAM; encaminhamento para recebimento de

passagens terrestres ou aéreas após alta hospitalar e retorno para a unidade de

origem57; orientação previdenciária; inserção na rotina da unidade; apoio, ficha

social, laudo social, conhecimento da rotina e/ou recursos da unidade, acesso aos

serviços da unidade/externos, visita domiciliar, espaço para falar, mediar conflitos,

asilamento, relacionamento/conflito familiar, cesta de alimentos, atenção à família do

paciente psiquiátrico; declaração de atendimento realizado/ comparecimento na

unidade; agilização de atendimentos de emergência; orientações a familiares de

dependentes químicos e de idosos portadores de Alzheimer.

Assim, o plantão é uma atividade desenvolvida por todos os assistentes

sociais dos serviços de saúde da Aeronáutica/RJ. Em sua maioria, a prática no

plantão não segue uma sistematização, não possui uma estatística de atendimento e

um perfil de público alvo, não é uma atividade pensada, planejada ou organizada.

De acordo com Vasconcelos (2002, p.518):

―A questão decisiva que se coloca para os assistentes sociais, diante da

complexidade da realidade, é conhecer sob quais condições o Serviço

Social tem possibilidade de contribuir na construção de formas de acesso

aos recursos e informações sociais e culturais tendo em vista uma nova

forma de produção e reprodução social. Para que isso se torne possível, os

assistentes sociais terão de avançar para além das medidas paliativas e/ou

imediatas, destinadas somente a ‗quebrar galho‘, fazer remendos,

solucionar momentaneamente o que não tem solução: a questão social

produto da economia capitalista‖.

Dessa forma, a autora sinaliza que a prática profissional no plantão, exige

uma apreensão crítica e criteriosa da realidade social, bem como captar o que

56 É norma e rotina institucional que, no ato de transferência de paciente do leito para UTI, que os acompanhantes não permaneçam no leito. Portanto, os familiares e acompanhantes residentes no Rio de Janeiro, retornam aos seus domicílios acompanhando o paciente somente no horário de visitas. Já aqueles familiares e acompanhantes de fora do Rio de Janeiro não têm para onde se encaminhar, utilizando os serviços de Alojamento feminino e masculino dos Hospitais ou, os Hotéis de Trânsito para militares sediados nas Bases Aéreas. Na falta de vaga nestes, é o assistente social que se articula para alojá-los. 57 É de responsabilidade da Unidade de Saúde que recebe o paciente (de fora do Rio), após alta hospitalar o encaminhar para a Unidade de origem.

Page 78: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

76

não está aparente nas demandas trazidas pelos usuários. Assim como, exige uma

prática coletiva no atendimento às demandas, rompendo com práticas

burocráticas e pontuais que fragmentam as ações profissionais do Serviço Social.

Nesse marco, situamos que o projeto privatista na saúde é radicalmente

opositor não somente ao projeto da Reforma Sanitária como ao projeto ético-

político do Serviço Social, por requisitar dos profissionais ações como: seleção

socioeconômica dos usuários; atuação psicossocial por meio de aconselhamento;

ação fiscalizadora aos usuários dos planos de saúde; assistencialismo através da

ideologia do favor e predomínio de abordagens individuais.

Ora, em contraponto, o projeto de Reforma Sanitária apresenta como

demandas para o assistente social que este trabalhe com as seguintes questões:

busca de democratização do acesso às unidades e aos serviços de saúde;

atendimento humanizado; estratégias de interação da instituição de saúde com a

realidade interdisciplinar; ênfase nas abordagens coletivas; acesso democrático

às informações e estímulo à participação cidadã.

Bravo (1999, p. 113) considera que:

A universalidade do direito – um dos fundamentos centrais do SUS e contido no projeto de Reforma Sanitária é um dos aspectos que tem provocado resistência dos formuladores do projeto Saúde Voltada para o Mercado. Esse projeto tem como premissa concepções individualistas e fragmentadoras da realidade, em contraposição às concepções coletivas e universais do projeto contra-hegemônico.

No entendimento de Bravo e Matos (2007), o trabalho do assistente social na

saúde deve ter como eixo central a busca criativa e incessante da incorporação dos

conhecimentos e das novas requisições à profissão, articulados aos princípios dos

projetos da reforma sanitária e ético-político do Serviço Social. Segundo os autores,

é sempre na referência a estes dois projetos que se poderá ter a compreensão se o

profissional está de fato dando respostas qualificadas às necessidades

apresentadas pelos usuários.

Pensar hoje uma atuação competente e crítica do Serviço Social na área da

saúde requer segundo Bravo e Matos (2007, p. 214):

- Estar articulado e sintonizado ao movimento dos trabalhadores e usuários que lutam pela real efetivação do SUS.

Page 79: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

77

- Facilitar o acesso de todo e qualquer usuário aos serviços de saúde da Instituição, bem como de forma compromissada e criativa não submeter a operacionalização de seu trabalho aos rearranjos propostos pelos governos que descaracterizam a proposta original do SUS de direito, ou seja, contido no projeto de Reforma Sanitária. - Tentar construir e/ou efetivar, conjuntamente com outros trabalhadores da saúde, espaços nas unidades que garantam a participação popular e dos funcionários nas decisões a serem tomadas. - Elaborar e participar de projetos de educação permanente, buscar assessoria técnica e sistematizar o trabalho desenvolvido, bem como temáticas relacionadas à saúde.

A citada a pesquisa na Secretaria Municipal de Saúde/RJ de Vasconcelos

(2002), demonstra que, apesar do avanço teórico-político engendrado pelo Serviço

Social brasileiro, nas décadas de 80 e 90, este não tem encontrado ressonância na

prática profissional dos assistentes sociais no cenário atual. Segundo a autora, o

trabalho do Serviço Social na Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro

mantém-se atrelado a uma perspectiva tradicional e conservadora do fazer

profissional.

Cumpre ressaltar que, embora Vasconcelos (2002, p. 238) tenha identificado

práticas que não reproduzem o ethos conservador da profissão, no entanto, elas

envolvem uma parcela imperceptível ante ao conjunto dos assistentes sociais

entrevistados. A autora nos esclarece:

(...) passados mais de vinte anos do processo de Reconceituação do Serviço Social, que, pela primeira vez no Brasil, aponta para a possibilidade de ―um projeto de intervenção social respaldado em forças sociopolíticas inscritas nos movimentos populares de massa...‖ e quinze anos da primeira proposta de formação profissional engendrada pela ABESS, calcada nos fundamentos deste projeto, podemos caracterizar o trabalho realizado pelos assistentes sociais da SMS como ―tradicional‖, no sentido indicado por José Paulo Netto: ―uma prática empiricista, reiterativa, paliativa e burocratizada, que, na sua vontade/intenção, aspira a uma articulação com as necessidades e interesses da sociedade brasileira, mas, na sua ação, está parametrada por uma ‗ética liberal burguesa‘, sua teleologia consistindo na correção — numa ótica claramente funcionalista — de resultados psicossociais considerados negativos ou indesejáveis, sobre o substrato de uma concepção (aberta ou velada) idealista e/ou mecanicista da dinâmica social, sempre pressuposta a ordenação capitalista da vida como um dado factual ineliminável‖ (grifo no original).

É neste cenário problemático e contraditório que se configura a prática dos

assistentes sociais na saúde. De acordo com Vasconcelos (2002, p. 113),

Page 80: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

78

amaterialização/efetivação dos princípios e valores do projeto ético-político

profissional— na prática profissional dos assistentes sociais — sinaliza a condição

sine qua non para sua manutenção no plano teórico-político. Nas palavras da autora:

(...) a prática, tendo em vista a condição de profissão do Serviço Social, é determinante na mudança de direção e legitimação dessa direção — não só o debate teórico, que hoje contribui, rebate e conta com mais legitimidade e reconhecimento acadêmico e no campo das Ciências Sociais do que no meio profissional.

Page 81: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

79

CAPÍTULO III – A PRÁTICA PROFISSIONAL DOS ASSISTENTES SOCIAIS NOS

SERVIÇOS DE SAÚDE DA AERONÁUTICA/RJ

Não é o caso interado em si,

mas a sobrecoisa, a outra coisa

Guimarães Rosa, Grande Sertão: veredas.

3.1 Aeronáutica: uma instituição militar das Forças Armadas do Brasil

A Força Aérea Brasileira (FAB) - Aeronáutica Militar ou, simplesmente,

Aeronáutica - é a maior Força Aérea da América Latina em contigente, número de

aviões e poder de fogo. Componente aérea das Forças Armadas de um país que

são constituídas, também, pelo Exército e pela Marinha.

Foi criada em 20 de janeiro de 1941, quando o então presidente Getúlio

Vargas assinou o Decreto nº 2961, criando o Ministério da Aeronáutica e

estabelecendo a fusão das Forças Aéreas do Exército e da Marinha numa só

corporação denominada Forças Aéreas Nacionais. Pouco depois, em maio de

1941, um novo decreto mudou o nome da recém-nascida Força Aérea para Força

Aérea Brasileira (FAB), nome que permanece até os dias de hoje.

Nos anos seguintes houve um crescimento do setor aeronaútico brasileiro,

tendo sido criada uma significativa infra-estrutura por todo o país, o que

possibilitou o aumento da capacidade tecnológica e organizanizativa de toda a

aviação civil e militar.

O Ministério da Aeronaútica manteve-se atuante até 10 de junho de 1999,

quando foi criado o Ministério da Defesa. A partir de então, passou a ser

denominado Comando da Aeronáutica.

Ao Comando da Aeronáutica cabe: formular e conduzir a política

aeronáutica nacional, civil e militar; propor a constituiição, organização dos

efetivos, bem como aparelhar e preparar a Força Aérea Brasileira; contribuir para

Page 82: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

80

a fomulação e condução da política nacional de desenvolvimento das atividades

aeroespaciais; operar o Correio Aéreo Nacional; orientar, coordenar e controlar as

atividades de aviação civil; incentivar e realizar atividades de pesquisa e

desenvolvimento relacionadas com as atividades aeroespaciais; estimular a

indústria nacional; prover a segurança da navegação aérea; formular o

planejamento estratégico e executar ações relativas à defesa do país, no campo

aeroespacial.

O Comando Militar da Força é exercido pelo Comando Maior da

Aeronáutica/COMAER, ao qual estão subordinados quatro Comandos-Gerais,

dois Departamentos e diversos outros órgãos relacionadas com o funcionamento

e administração da aviação brasileira, tanto civil como militar, e da pesquisa e

desenvolvimento aeroespacial.

Os quatro Comandos Gerais são: o Comando-Geral de Operações Aéreas;

o Comando-Geral de Apoio; o Comando-Geral de Pessoal; o Comando-Geral de

Tecnologia Aeroespacial sendo este, composto pelo Departamento de Controle

do Espaço Aéreo e pelo Departamento de Ensino da Aeronáutica.

Assim, as Unidades Aéreas são as organizações militares que reúnem os

meios operacionais da força. Cada unidade possui uma função específica além de

aeronaves, pessoal e instalações que assegurem o seu funcionamento. As Bases

Aéreas, por sua vez, estão organizadas através de uma divisão regional do

território brasileiro, onde cada região (num total de sete) fica subordinada a um

Comando Aéreo Regional (COMAR). São eles:

I COMAR - com sede em Belém e jurisdição sobre os estados

do Pará, Amapá e Maranhão.

II COMAR - com sede em Recife e jurisdição sobre os estados

do Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco,

Alagoas, Sergipe e Bahia.

III COMAR - com sede no Rio de Janeiro e jurisdição sobre os

estados do Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo.

IV COMAR - com sede em São Paulo e jurisdição sobre os

estados de São Paulo e Mato Grosso do Sul.

Page 83: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

81

V COMAR - com sede em Canoas e jurisdição sobre os

estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná;

VI COMAR - com sede em Brasília e jurisdição sobre o Distrito

Federal e os estados de Goiás, Mato Grosso e Tocantins.

VII COMAR - com sede em Manaus e jurisdição sobre os estados do Amazonas, Roraima, Acre e Rondônia.

No último levantamento estatístico de 200558, a Força Aérea Brasileira

contava com o efetivo de 73.500 pessoas, sendo 66.020 militares e 7480 civis. O

efetivo militar era assim distribuído:

- Homens: 61.880 (93,74%)

- Mulheres: 4.140 (6,26%)

Deste quantitativo temos:

- Oficiais: 8.416 (12,75%)

- Suboficiais e Sargentos: 25.437 (38,53%)

- Cabos, Soldados e Taifeiros: 29.064 (44,02%)

- Alunos: 3.103 (4,7%)

No que se refere ao efetivo, é interessante ressaltar que no ano de 1982 foi

permitido o ingresso de mulheres na Aeronáutica, através da criação do Quadro

Feminino de Oficiais (QFO).

De acordo com o estudo apresentado pela autora Lauciana Rodrigues ao

discutir a participação das mulheres nas Forças Armadas Brasileiras59, a principal

razão para a implantação deste corpo fica claro nas palavras do coronel60, primeiro

comandante do curso de formação dos oficiais e dos graduados:

A meu nível de conhecimento há um órgão na Aeronáutica, o Comando Geral de Pessoal (CGP) que assessora o Ministro da Aeronáutica em assunto de pessoal. Nesse órgão, há um grupo de trabalho de recursos humanos que, a pedido do Ministro, elaboraram uma forma de aumentar o efetivo da Aeronáutica sem alterar a

58 Os levantamentos estatísticos são realizados em longos intervalos, haja vista as especificidades da área militar, como: promoção de oficias, baixas, militar indo para a reserva ou reforma, processos de admissão, data de praça dentre outros. 59 As Forças Armadas Brasileira teve a inserção feminina tardiamente na década de 80, uma vez que boa parte dos exércitos ocidentais passou a admitir mulheres em suas fileiras a partir da década de 1970. A Marinha do Brasil, dentre as três Forças, foi à primeira em aceitar mulheres em seu Corpo. Em 1982 ocorre o ingresso das mulheres na Aeronáutica. No Exército, a entrada das mulheres só ocorre em 1992 na Escola de Administração do Exército. Cf. SANTOS, Lauciana Rodrigues. A Participação da Mulheres nas Forças Armadas Brasileiras: um debate contemporâneo. In: III Encontro Nacional da Associação Brasileira de Estudos de Defesa (ABED), 2009, Londrina. Anais Online, 2009. Disponível em:<http://www.abed-defesa.org/files/programaenabed-iii.pdf.> 60 A autora em questão não cita o nome do Coronel.

Page 84: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

82

Lei de Fixação da Força Militar. Somente por necessidade e se aprovado pelo Congresso é que pode haver o crescimento da Força através dessa Lei. Assim sendo, os sistemas militares usam um artifício, que são elementos que permanecem nas Forças Armadas por um tempo menor, e que se destinam à reserva da Aeronáutica. O Corpo Feminino foi aproveitado nessa brecha. O estudo inicial previa que nós, em cerca de quatro anos, teríamos 2.000 mulheres na Aeronáutica, 400 oficiais, e 1.200 sargentos. Este foi o projeto inicial; o corpo feminino seria então uma força de reserva com a permanência máxima de 8 anos na ativa e podendo haver renovação de contrato. O grupo achou que, para atender às necessidades da Aeronáutica, a mulher seria mais eficiente, dado o tipo de trabalho que ela exerceria e devido às condições de entrada para o setor militar e também porque, baseado nos estudos da Marinha, de que o Corpo Feminino estava dando certo. Em síntese, o corpo feminino aumentou o efetivo da Força (2.000 mulheres de 1981 a 1984), sem extrapolar os recursos disponíveis, além de suprir as deficiências nas áreas administrativas e técnicas. (p. 4 e 5, grifos da autora.)

Para a autora, fica evidente que a mulher foi requisitada buscando suprir a

deficiência de pessoal nas áreas técnicas e administrativas e que há uma

reprodução no interior do espaço militar da divisão sexual e social dos papeis

desempenhados por homens e mulheres fora do âmbito militar.

Segundo Carvalho (1990) in Santos (2009), havia domínios bem delimitados e

estabelecidos para homens e mulheres militares no interior da caserna e um

discurso legitimador para isso seria a criação de mecanismos legais através de Leis,

decretos e portarias.

Diante desse contexto a autora chega à conclusão de que não se deve

considerar a instituição militar como um novo espaço de atuação da mulher, pois

apesar da nova configuração, esta se apresenta com papéis tradicionalmente

exercidos por homens e mulheres na sociedade contemporânea.

Em 1996, a Aeronáutica admite mulheres como cadetes na Força Aérea

Brasileira (FAB) no quadro de Intendência, carreira administrativa da FAB, passando

a ter a mesma formação masculina. Desta forma, na primeira turma, ocorre o

ingresso de 17 cadetes femininos na AFA – Academia da Força Aérea

(Pirassununga/SP) para o quadro de Intendência, área administrativa e financeira da

FAB61.

Em 2006 formou-se a primeira turma de aviadoras do país. O quadro de aviação é

a ―atividade fim‖ dessa instituição, uma vez que cumpre a destinação primordial, que

é voar. Vale dizer que, apesar desses avanços, há ainda muitas restrições, já que o

61 Os cursos de formação de oficiais na AFA se dividem em três: Curso de Oficiais Aviadores (CFOAv); Curso de Oficiais Intendentes (CFOInt) e Curso de Oficiais de Infantaria (CFOInf) todos com duração de quatro anos.

Page 85: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

83

quadro de Infantaria da Aeronáutica é o único da Academia da Força Aérea (AFA)

que ainda não conta com a presença feminina.

Atualmente, profissionais formados em diversas áreas do conhecimento

podem ingressar na FAB como oficiais temporários ou de carreira, por meio dos

seguintes exames de admissão: Curso de Adaptação de Médicos, Dentistas e

Farmacêuticos (CAMAR/CADAR/CAFAR); Estágio de Adaptação de Oficiais

Engenheiros (EAOEAR); Estágio de Instrução e Adaptação de Capelães (EIAC);

Estágio de Adaptação de Oficiais Temporários (EAOT);

O EAOT62 admite, para compor o Quadro Complementar de Oficiais da

Aeronáutica (QCOA), conforme a necessidade do Comando da Aeronáutica,

profissionais com nível superior nas especialidades sinalizadas no quadro abaixo.

ESPECIALIDADES DO EAOT/QCOA

Administração Biblioteconomia

Agronomia

Ciências Contábeis

Análise de Sistemas

Comunicação Social,

Arquitetura

Educação Física

Arquivologia

Economia,

Enfermagem,

Engenharia Cartográfica

Engenharia Civil

Engenharia Clínica

Engenharia de Telecomunicações

Engenharia Elétrica

Engenharia Eletrônica

Engenharia Mecânica

Engenharia Metalúrgica

Engenharia Química

Estatística

Fisioterapia

Fonoaudiologia

História

Museologia

Nutrição

Psicologia

Serviços Jurídicos Serviço Social

Fonte: Portaria DEPENS Nº 216-T/DE-2, de 04 de agosto de 2009.

No que se refere à formação militar, a Força Aérea Brasileira mantem as

seguintes instituições de ensino:

62 O candidato, no momento da matrícula, mediante ato do Comandante do CIAAR, será designado Segundo-Tenente Estagiário do EAOT, designação essa a ser mantida durante o Estágio de Adaptação. O estagiário que concluir com aproveitamento o EAOT será nomeado, mediante ato do Comandante da Aeronáutica, Segundo-Tenente da Reserva, integrará o Quadro Complementar de Oficiais da Aeronáutica (QCOA) e será convocado a servir, obrigatoriamente, por um período de dois anos, como Oficial Temporário. O Segundo-Tenente do QCOA, caso demonstre interesse em permanecer na ativa após a conclusão do período inicial de dois anos obrigatórios, poderá ter o tempo de sua convocação prorrogado anualmente, a critério do Comando da Aeronáutica, até completar oito anos de efetivo serviço, quando, então, será licenciado (dispensado). O Segundo-Tenente ou o Primeiro-Tenente que não obtiver prorrogação do tempo de convocação será licenciado do serviço ativo e incluído na Reserva não Remunerada da Aeronáutica, no mesmo posto em que se encontrava. Cf. Portaria DEPENS Nº 216-T/DE-2, de 04 de agosto de 2009.

Page 86: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

84

- Escola Preparatória de Cadetes do Ar- EPCAr (Escola de ensino médio pronta

para receber futuros cadetes da AFA);

- Academia da Força Aérea - AFA – (Instituição de Ensino Superior especial que

forma Aviadores, Intendentes e oficiais de Infantaria da FAB);

- Instituto Tecnológico de Aeronáutica – ITA (Instituição de Ensino Superior que

forma Engenheiros militares e civis em diversas especialidades);

- Centro de Instrução e Adaptação da Aeronáutica - CIAAR – (Centro de

planejamento, coordenação, controle e execução dos planos e programas de ensino

relativos à adaptação militar de pessoal para a Aeronáutica);

Escola de Especialistas de Aeronáutica - EEAR – (Escola de preparação de

Sargentos especialistas da Aeronáutica63).

3.1.1 A profissão militar

Reportando-nos a gênese da profissão militar, encontramos o entendimento

de profissão como: ―um tipo peculiar de grupo com características altamente

especializadas‖. Tendo como característica o tipo de desempenho de que ela se

incumbe, sendo estas: capacidade, responsabilidade, corporatividade, permanência,

retribuição, atividade, caráter social e espírito cívico. Porém, a atividade profissional

militar versará, prioritariamente, na capacidade, responsabilidade e corporatividade.

Os militares profissionais se distinguem dos civis, por terem uma capacidade

fundamental: ―participação no manejo, no emprego ou na administração da força que

constitui monopólio do governo nacional‖. A função de uma Força Armada é o êxito

no combate. (LIVI ILHA, 1988).

De acordo com a doutrina militar64, quanto maiores e mais complexas forem

às organizações de força que um militar seja capaz de dirigir e quanto maior for o

63 Com sede na cidade de Guratinguetá (SP). Prepara Sargentos Especialistas em várias áreas como Controle de Tráfego Aéreo, Mecânica de Aeronaves, Eletrônica, Música, Enfermagem, Infantaria, dentre outras. 64 Essa afirmação encontra respaldo no documento didático elaborado pelo Departamento de Ensino da Aeronáutica, material de suporte da disciplina ―A Profissão Militar‖, constante dos currículos dos Cursos ou Formação de Estágios de Adaptação Militar. (1988) elaborado pelo Coronel Aviador Reformado Hélio Livi Ilha.

Page 87: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

85

número de situações e condições sob as quais ele possa ser empregado, mais

elevada será a sua competência profissional. Portanto, a capacidade do militar

profissional impõe-lhe uma responsabilidade social.

Segundo a visão militar65, enquanto todas as profissões são, até certo ponto,

reguladas pelo Estado, a profissão militar é monopolizada pelo Estado.

Quanto ao caráter corporativo, a profissão militar tem aspectos de um serviço

público burocratizado. O direito legal de desempenhar-se ou exercer a profissão está

limitado aos membros de cada Força Armada. Esses membros são cuidadosamente

selecionados, definidos e distribuídos pelos Corpos de Oficiais e de Graduados66 da

respectiva Força.

Historicamente, a profissão militar tem sido uma característica da cultura

ocidental e produto da sociedade moderna. O surgimento do Corpo de Oficiais

ocorreu por volta do ano de 1900, tendo como as três maiores potências que

influenciaram o seu surgimento: a Prússia, França e a Inglaterra. (LIVI ILHA, 1988).

Embora se saiba que os exércitos e armadas já eram comandados antes de

1.800, por oficiais mercenários67 (tipo dominante desde o fim do feudalismo - séc.

XVII). As mudanças evolutivas desses foram acompanhadas pelo desenvolvimento

de uma ética profissional que foi proporcionado explicação e justificação racional

para o novo tipo de militar – oficial aristocrata68 (exércitos e armadas permanentes

como resultado da consolidação do poder das monarquias nacionais) e suas

instituições profissionais, com destaque somente a partir de 1900.

A profissionalização militar teve seu maior desenvolvimento em dois períodos

do século XIX, a saber: durante e imediatamente após as Guerras Napoleônicas; e

entre 1850 a 1875, quando se ajustaram os processos de seleção e promoção,

organizaram-se Estados Maiores e criaram-se instituições educacionais militares

avançadas.

As instituições militares brasileiras, encarregadas de preparar oficiais, são

bastante antigas. Segundo Ludwing (1998), a Escola Naval surgida em 1886,

65 Cf. Estatuto dos Militares – Lei nº 6.880 de 9/12/80. Reproduzido na Subdivisão de Instrução do CIAAR (MG), 2004. 66 Referindo-se aos soldados, taifeiros cabos e sargentos. 67 Sob o sistema mercenário, o oficial podia possuir ou não alto grau de competência, o êxito não era referido a padrões profissionais e sim à realidade de serviços que mereciam maior ou menor recompensa pecuniária. Era essencialmente um empresário que preparava militarmente um grupo de homes, cujos serviços punha à venda. 68 Para conseguir os oficiais, os monarcas recorriam à nobreza feudal, que ainda estavam submetendo à sua vontades. Os nobres eram compelidos (como na Prússia) ou subornados (como na França) para entrar a serviço do rei.

Page 88: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

86

recebeu muito antes dessa data as denominações de Academia Real dos Guardas-

Marinha, Academia Imperial dos Guardas-Marinha e Escola de Marinha. A Academia

da Força Aérea só aparece com esse nome na década de setenta, mas já existia

com o nome de Escola de Aviação desde 1919. Entre esses dois períodos recebeu

também a denominação de Escola de Aeronáutica. A Academia Militar de Agulhas

negras (exército), por sua vez, tem sua origem no ano de 1810, porém com o nome

de Real Academia Militar.

Para o autor, a história do Brasil, há muitos decênios, mantém-se atrelada à

conduta dos ―funcionários fardados‖, haja vista os vários momentos em que os

militares saíram dos quartéis para se envolverem em problemas de ordem política,

conferindo às Forças Armadas um papel intervencionista por tradição (1998, p.07).

Segundo Ludwing (1998), o processo de formação dos militares, no

decorrer da história brasileira, tem contribuído para forjar um tipo de profissional das

armas com tendências interventoras. Para o autor, tal suposição se aplica,

principalmente, ao segmento mais elevado das Forças Armadas: o corpo de oficiais,

pois são elementos desse grupo que geralmente participam das articulações

golpistas, mobilizam contingentes de apoio aos conspiradores e lideram subalternos

no combate aos movimentos perturbadores da ordem social.

De acordo com o autor, não se trata a partir dessa suposição, desconsiderar

fatores conjunturais ou estruturais ligados a situações política e econômica do país,

e sim incluir o processo da oficialidade da profissão militar, como uma importante

variável elucidadora do fenômeno intervencionista.

As considerações aqui sinalizadas permitem algumas inferências quanto à

formação da oficialidade brasileira, do Exército, Marinha e Aeronáutica. A prática

pedagógica castrense, além de apregoar no psiquismo dos alunos a ideologia

arbitrária da corporação bélica, introjeta, simultaneamente, Ludwing (1998), ―a

ideologia da classe hegemônica, isto é, as concepções e valores desse segmento

social‖.

O autor considera que o ensino militar, hoje, agrega um conjunto de

atividades capaz de solidificar no cadete (aluno) a ideologia dominante. Essas

atividades que incluem a tarefa de planejamento, processo de administração, ensino

de determinadas matérias, sistema de avaliação, uso de tecnologia educacional etc.,

são responsáveis pela transmissão das idéias que prevalecem na sociedade. De

Page 89: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

87

acordo com o autor, por meio dessas atividades o aluno assimila os valores de

obediência, submissão, dependência, paternalismo, assiduidade, pontualidade,

racionalidade e meritocracia. Adquire também a concepção de mundo e de vida em

sociedade eminentemente estável e harmoniosa, isto é, uma visão de mundo

determinista-funcionalista. (1998, p.22-23).

Ludwing (1998) considera que a profissão militar confere certo status ao

indivíduo: proporciona-lhe um salário razoável, mantém a estabilidade empregatícia,

cria oportunidades para viagens de estudo e de trabalho tanto no país quanto no

exterior. Portanto, o apego à idéia de mobilidade social é muito forte nesse

segmento, e a estrutura hierárquica, baseada no mérito, vigente na instituição militar,

viabiliza esse desejo de ascensão.

Podemos considerar que, a educação militar vista pelo ângulo histórico, tem

contribuído para formar um quadro de oficiais alinhado aos setores dominantes da

sociedade. (LUDWING, 1998).

No tocante ao campo dos valores institucionais das Forças Armadas, os

princípios da disciplina e da hierarquia são os dois elementos de sustentação da

estrutura militar. Quando atingidos, por menor que seja o dano sofrido, provoca o

desencadeamento de todo um mecanismo de autodefesa, que se consubstancia no

Poder Punitivo, seja penal, seja disciplinar.

Mas afinal em que consiste esse binômio – hierarquia e disciplina – muito

falado e nem sempre compreendido?

O Regulamento Disciplinar da Aeronáutica (RDAER), aprovado em 1975, pelo

então presidente Ernesto Geisel versa sobre como o militar deve manter sua

conduta nas relações com seus superiores hierárquicos e pares no interior da

instituição e na vida social em geral. Este regulamento prevê também que atos e

omissões que caracterizem inadequação ao meio militar ou transgressão disciplinar

sejam passíveis de punição.

O respeito à hierarquia é consubstanciado no espírito de acatamento à

seqüência de autoridade. Segundo o Estatuto dos Militares, ―a hierarquia militar é a

ordenação da autoridade em níveis diferentes, dentro da estrutura das Forças

Armadas69‖. O dispositivo estatutário abrange todos os componentes do organismo

69 Lei nº 6880, de 9 de dez 1980, § 1º do art.14.

Page 90: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

88

militar, do soldado ao general. Assim, não só a autoridade, mas também, a

responsabilidade cresce com o grau hierárquico.

Institucionalmente vinculada à hierarquia, a disciplina se constitui em

condição necessária ao perfeito funcionamento da organização militar. Disciplina é a

rigorosa observância e o acatamento integral das leis, regulamentos, normas e

disposições que fundamentam o organismo militar e coordenam seu funcionamento

regular e harmônico, traduzindo-se pelo prefeito cumprimento do dever por parte de

todos e de cada um dos componentes desse organismo.

Contudo, novas configurações se fazem presentes no interior dos quartéis. O

aumento na procura do Judiciário por militares que buscam a anulação de punições

disciplinares, o que passou a ser encarada como um problema para a administração

militar.

O acesso dos militares à Justiça tem evoluído rapidamente, em especial após

a Constituição Federal de 1988; apesar de o Estatuto dos Militares ainda prever que

o militar só poderá recorrer ao Judiciário depois de esgotados todos os recursos

administrativos, esse dispositivos há muito não é observado. (Arruda, 2007).

As reivindicações atuais se restringem à insatisfação com o que os graduados

e praças (soldados, cabos e sargentos), consideram excessos por parte de alguns

oficiais, ao aplicar-lhes as punições disciplinares: transferências repentinas, sendo

estas justificadas como interesse do serviço; anotações negativas nas avaliações

para promoções entre outros excessos.

As ferramentas utilizadas pelas praças, através da Associação Nacional de

Praças das Forças Armadas/ ANPRAFA são as mesmas permitidas e ao alcance do

cidadão sem farda: Ministério Público e Judiciário. Contudo, o rigor com que são

tratados os integrantes das associações de praças mostra que a reação não visa a

defender a disciplina, pois essa também é atingida quando a manifestação parte dos

clubes de oficiais.

A diferença é segundo Arruda (2007, p.39), que as manifestações da

oficialidade incomodam o governo, enquanto as críticas feitas pelas praças

perturbam os comandantes. Nas constatações do autor70, atualmente, para cada

70 Estudo sobre ―Valorização do Subtenente e do Sargento‖, com comparativo de escolaridade realizado por Arruda em 2004.

Page 91: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

89

oficial (tenente/capitão) – existem dois sargentos freqüentando ou, já possuidores de

curso superior (principalmente o Curso de Direito).

De acordo com Arruda (2007), os oficiais têm como foco prioritário o

aprendizado e ao seu redor uma atmosfera permanentemente voltada para a

obediência; os sargentos respiram o ar da liberdade que estimula a pesquisa, a

controvérsia e o diálogo. Portanto, maior qualificação gera outro problema para a

administração: a saída prematura de militares de carreira em busca de atividades

civis.

Para o autor, merece reflexão o conteúdo da formação acadêmica de cada

um dos segmentos – oficiais e sargentos. Os oficiais após quatro anos de Escola

Militar de nível superior são bacharéis em Ciências Militares (apreendendo os

valores, atitudes e comportamentos apropriados à vida militar). Os sargentos, por

outro lado, com curso superiores ou egressos das faculdades públicas e privadas –

grande parte da área das ciências sociais e humanas - salvo quando estão de

serviço e pernoitam no quartel, mantêm contato diário com o chamado “mundo dos

paisanos” (ARRUDA, 2007).

As questões acima suscitadas visam contextualizar a atual configuração do

espaço institucional da Aeronáutica. Conhecer os nexos, as relações históricas,

influências e como essas questões repercutem na prática dos assistentes sociais

nos serviços de saúde.

Estas questões tornam-se pertinentes uma vez que o Serviço Social se

constrói e se reconstrói historicamente, tendo sua prática relacionada com a

realidade cotidiana.

3.1.2 O Sistema de Saúde da Aeronáutica

O Sistema de Saúde da Aeronáutica (SISAU) atende aos militares e seus

dependentes em todo o território nacional e obedece a um modelo de autogestão.

Possui uma rede própria, composta de Hospitais de Força Aérea, Hospitais de Área,

Hospitais de Base, Odontoclínicas; uma Casa Gerontológica e um Laboratório

Químico e Farmacêutico. Disponibiliza, também, ao usuário do sistema uma rede

Page 92: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

90

complementar contratada, (com hospitais, clínicas, laboratórios e médicos) na falta

ou indisponibilidade de procedimentos e especialidades da rede própria. Além disso,

efetua ressarcimento de despesas médicas e odontológicas ao usuário em situações

específicas – quando a rede própria e a rede contratada não disponibilizam os

recursos necessários ao usuário e, sempre com autorização prévia da Subdiretoria

de Aplicações dos Recursos para Assistência Médico-Hospitalar (SARAM).

O SISAU também se vale da estrutura de apoio à saúde da Marinha e do

Exército, nas localidades desprovidas de serviços de saúde da Aeronáutica, de

acordo com a necessidade e o interesse da instituição e dos usuários, num tratado

de reciprocidade entre as forças71.

Os beneficiários do SISAU são os militares da ativa e da inativa e os

pensionistas dos militares que, nas condições definidas em Instrução específica,

contribuem com percentuais sobre o seu soldo, ou cota parte do soldo (pensionista)

e de acordo com o número de seus dependentes, como beneficiários da Assistência

Médico-Hospitalar Complementar (AMHC).

Em linhas gerais, se o militar for da ativa, terá seu tratamento médico-

hospitalar custeado integralmente pelo SISAU. Quanto aos seus dependentes, estes

terão seus tratamentos custeados através do Fundo de Saúde da Aeronáutica

(FUNSA), desde que sejam declarados beneficiários pelo militar.

Os soldados de 1ª e 2ª classe não contribuem para o FUNSA, assim como

também não contribuem os cadetes, os alunos da Escola Preparatória de Cadetes

do Ar (EPCAR), dentre outros alunos de Escolas Preparatórias da Aeronáutica.

Estes não têm direito ao custeamento de seus exames e/ou tratamento externo e

seus dependentes não estão sujeitos à assistência médica do SISAU.

Da mesma forma, não terão suas despesas médicas custeadas, os

pensionistas que deixarem de contribuir.

Ressalta-se que o Fundo de Saúde (FUNSA) é mantido pela contribuição dos

militares, variando de acordo com o posto ou graduação. A contribuição é obrigatória

a todos os militares da ativa, para os da reserva, reformados e pensionistas a

contribuição é facultativa.

É importante destacar que o SISAU qualifica duas formas de vinculação dos

dependentes ao sistema, quais sejam:

71 Cf. Subdiretoria de Aplicações dos Recursos para Assistência Médico-Hospitalar (SARAM), Rio de Janeiro, 2009.

Page 93: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

91

A AMHC72 que é a assistência médico-hospitalar complementar parcialmente

indenizável pelo Comando da Aeronáutica com recursos financeiros de arrecadação

própria, oriunda de contribuições obrigatórias dos militares da ativa e na inatividade,

e dos pensionistas de militares. São eles:

O cônjuge ou o(a) companheiro (a) do militar;

Filho(a), enteado(a), tutelado(a) do militar contribuinte, menor de 21 (vinte e um )

anos ou menor de 24 (vinte e quatro anos), desde que não receba remuneração;

Menor que esteja sob guarda, sustento e responsabilidade do militar;

Os pensionistas;

A mãe do militar, desde que viúva e não receba remuneração;

A mãe soleira do militar, desde que viva exclusivamente sob sua dependência

econômica e sob o mesmo teto físico e não receba remuneração

O custo do atendimento é (80%) financiado pelo FUNSA e (20%) pelo

usuário, com base em tabelas pré-estabelecidas. Entretanto, não estão sujeitos à

co-participação:

Casos de acidente em serviço;

Casos de doença profissional;

Inspeção por Junta de Saúde, realizadas por interesse da administração;

O militar da ativa e da inativa quando hospitalizado em Organização de Saúde da

Aeronáutica. (OSA)

O AMH é a vinculação dos demais dependentes. Neste caso não há

contribuição para o FUNSA, o qual, não ampara suas despesas. O militar

responsável assume a integralidade dos gastos. Consideram-se dependentes, para

o FUNSA, aqueles que vivem sob a dependência econômica e sob o mesmo teto

físico do militar e ser expressamente declarados e comprovados na sua Unidade de

Vinculação. São eles:

A filha, a enteada e a tutelada, nas condições de viúvas, separadas judicialmente ou

divorciadas, desde que não recebam remuneração;

A mãe separada judicialmente ou divorciada, a sogra viúva, ou soleira, a madrasta

viúva, desde que não recebam remuneração;

O pai maior de 60 (sessenta anos) e seu respectivo cônjuge desde que ambos não

recebam remuneração;

72 Cf. ICA 160-24 – Instruções Reguladoras da Assistência Médico-Hospitalar e Portaria nº 41/GM3, de abr. 1975, e Art. 14 do Regulamento do Fundo de Saúde da Aeronáutica pela Portaria nº 506/GM6, de 29 mai. de 1987.

Page 94: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

92

A irmã, a cunhada e a sobrinha, solteiras, viúvas separadas judicialmente ou

divorciadas, desde que ambos não recebam remuneração;

A pessoa que viva no mínimo há cinco anos, sob a exclusiva dependência econômica

do militar, comprovado judicialmente.

De acordo com a Subdiretoria de Aplicações dos Recursos para Assistência

Médico-Hospitalar (SARAM), também é considerada beneficiária da AMH a ex-

esposa com direito à pensão alimentícia estabelecida por sentença, enquanto não

contrair novo matrimônio.

O FUNSA é administrado pela Diretoria de Saúde (DIRSA), por intermédio da

SARAM, a qual determina como os atendimentos irão ser cobertos com os recursos

financeiros disponíveis, Nesse sentido, cabe a SARAM estabelecer normas e

delimitar uma rede complementar necessária para atender a todos os seus

beneficiários.

É de competência da DIRSA assegurar a diretriz de atendimento aos usuários

do SISAU, bem como padronizar procedimentos, equipamentos, material de saúde e

as instalações médico-hospitalares da Aeronáutica e Sistema Nacional de Saúde;

suprimir material de saúde as OSA‘s; incentivar a pesquisa e o desenvolvimento

tecnológico, na área da saúde, que sejam de interesse do Comando da Aeronáutica

e efetuar a ligação de outras Organizações ao Comando da Aeronáutica nos

assuntos de saúde. É responsável, também, pelo processo de aquisição de veículos

adequadamente equipados para o transporte de pacientes, em especial nos casos

de emergência, contribuindo para a sobrevida de doentes e acidentados.

Quanto à ação "Manutenção dos Serviços Médico-Hospitalares e

Odontológicos a Cargo da Aeronáutica", a DIRSA é a responsável pela ação e pela

destinação dos recursos a serem aplicados na aquisição de material de consumo,

equipamentos e utensílios médico, odontológico, laboratorial e hospitalar, bem como

na contratação de serviços de pessoas físicas e jurídicas, todos diretamente

decorrentes do atendimento aos pacientes e beneficiários do SISAU.

Destacamos do Estatuto dos Militares - Lei nº 6.880/80 do Art. 50, inciso IV a

seguinte alínea:

e) A assistência médico-hospitalar para si e seus dependentes, é assim

entendida como o conjunto de atividades relacionadas com a

prevenção, conservação ou recuperação da saúde, abrangendo serviços

profissionais médicos, farmacêuticos e odontológicos, bem como o

Page 95: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

93

fornecimento e a aplicação de meios, cuidados e demais atos médicos e

paramédicos necessários. (grifos nossos)

Ressaltamos que o SISAU difere significativamente de um modelo privado de

saúde por não ser comercializável e ter administração pública, além de não

considerar faixas etárias no estabelecimento dos valores dos serviços (o valor

da contribuição é vinculado ao respectivo soldo do contribuinte responsável73). Difere

substancialmente da proposta do SUS, pois, este representa um grande avanço no

tocante às políticas públicas, apresenta propostas e práticas claras de controle

social, transparência administrativa, gestão participativa e democratização

(conselhos de saúde foram criados e consolidados em praticamente todos os

municípios do país), além de assegurar a universalidade do acesso e a

integralidade da atenção. Contudo, é percebida uma real distância entre o direito

legal e sua expressão no cotidiano.

É inconteste que o SUS é um marco jurídico no contexto da seguridade social

brasileira e um instrumento apto a promover, preservar e recuperar a saúde

individual e coletiva. Entretanto, a possibilidade de efetiva concretização das

propostas do SUS tem sido tensionadas pela disputa entre dois projetos: o da

Reforma Sanitária e o Privatista, anteriormente mencionados.

No que se refere ao Sistema de Saúde da Aeronáutica, segundo diretriz da

DIRSA, busca-se: proporcionar a adequada assistência médico-hospitalar aos

militares (ativos e inativos) e aos seus dependentes, assegurando o acesso e a

humanização do atendimento na saúde e efetuar o controle das condições de

saúde de aeronavegantes militares.

Em 2002, por orientação da DIRSA foram realizadas pesquisas74 nas

Organizações de Saúde da Aeronáutica e constatou-se que as queixas foram se

reduzindo e a satisfação com o atendimento crescendo, a cada pesquisa feita. As

pesquisas foram realizadas de duas formas. A primeira consistiu na "Busca Ativa"

que é a entrevista com os pacientes ambulatoriais, com os internados e seus

acompanhantes. A outra consistiu na "Busca Passiva" que é a coleta de opiniões em

caixas específicas.

73 Cf. Lei Nº 6.880, de 9 de dezembro de 1980 - Estatuto dos Militares. 74 Disponível em acesso on-line <http//:www.abrasil.gov.br/avallpa/site/conten/av//>. Acesso em 21/10/09.

Page 96: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

94

Através dessa pesquisa, foi observada a inadequação dos recursos humanos.

O efetivo de médicos, dentistas e farmacêuticos do quadro da ativa está aquém das

necessidades. Destaca-se o aumento do efetivo de oficiais em enfermagem e de

graduados de várias especialidades de saúde para guarnecer e suprir as

necessidades das Organizações de Saúde da Aeronáutica e dos beneficiários do

SISAU.

Em relação ao efetivo do SISAU, a pesquisa realizada pela DIRSA mostra

que é significativa a participação de oficiais temporários (R2): 55% dos médicos,

70% dos dentistas e 55% dos farmacêuticos, causando uma distorção em relação

aos profissionais disponibilizados ao atendimento aos usuários, em função da alta

rotatividade e da qualificação do início de carreira.

O Comando da Aeronáutica implantou em 2002 o Sistema Integrado de

Planejamento e Gestão - SIPG, que possibilita a captação de dados gerenciais de

forma padronizada e abrangente, atingindo todas as unidades que compõem sua

estrutura organizacional. O objetivo do sistema é aumentar a qualidade,

homogeneizar o tratamento e tornar confiável e tempestivo o acesso às informações

gerenciais administrativas, logísticas, orçamentárias, financeiras e operacionais,

visando à eficácia na aplicação e no controle dos seus recursos humanos, materiais

e financeiros.

Todavia, embora a pesquisa mencionada linhas atrás, realizada no ano de

2002, aponta a satisfação do usuário quanto ao atendimento do SISAU, destaca-se

que em 2004, em página da internet voltada aos militares da inativa, - usuários do

sistema75 - a insatisfação quanto ao atendimento do SISAU se fazia presente.

Perguntou-se: Os serviços de saúde da Marinha, Exército e Aeronáutica atendem a

você e a sua família de forma conveniente? Por quê? Seguem alguns depoimentos:

“Que o serviço de saúde está precário para determinadas enfermidades, é fato

notório. Os "excelentes profissionais” aqui citados, certamente não estão lotados

fora do eixo Rio de Janeiro/Brasília. Entretanto, o maior pecado, o que nos magoa

mais, é o fato dos Comandantes Militares não denunciarem de público, não

protestarem, o fato do contingenciamento de cerca de 40% das contribuições para os

fundos de saúde das três Armas que vão para o tesouro nacional. Afinal, esse

dinheiro é nosso! Notadamente, é um heroísmo manter ainda em funcionamento o

serviço, mas a omissão é uma doença mais grave e letal”. (01/11/2004, J. O -

Natal/RN).

75 Disponível em http://www.reservaaer.com.br/megafone/arquivo, acesso em 11 de novembro de 2009.

Page 97: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

95

“A FAB tem excelentes profissionais na área de saúde. O grande problema é

simplesmente a militarização e a confusão burocrática que as organizações médicas

tem. O médico tem muitas funções extras que o atrapalham na dedicação ao

atendimento. O médico deveria pensar mais como tal e menos com os”galões" o que

infelizmente mais acontece, como já presenciei um interromper o atendimento ao

último paciente somente porque o diretor o estava chamando em sua sala, não seria

mais ético dizer para o chefe, que também é médico, que assim que terminasse o

último atenderia ao seu chamado? (coisas de milico). Mas são bons profissionais,

tanto que eu sempre sou bem atendido por eles no Hospital da Base e minha esposa

que tem UNIMED faz questão de ser atendida por muitos deles em seus consultórios

particulares, evidentemente fugindo da complicação de ter que madrugar na fila da

base ou aguardar dias e mais dias para ser atendida. Eu me submeto a isso mas para

ela prefiro dá-lhe mais conforto, afinal a penar basta um... (21/10/2004, J.M. M,

Natal/RN)”.

“Acredito que o sistema de saúde das FFAA

76 esta inadequado ao fim que se destina.

Acho que as três forças deveriam ter um único sistema abrangente e que daria um

atendimento em qualquer localidade que houvesse uma das três forças. Ao passar

para reserva o atendimento se complica devido à saturação nos centros onde existe

atendimento. O militar na reserva é obrigado a permanecer vizinho as

organizações para ter possibilidade de usar o sistema de saúde. Após passar

30 ou mais anos contribuindo e com o avançar da idade é quando tornasse

maior a necessidade de uso do atendimento e mais precário está o

atendimento, não devido à qualidade de seus médicos e sim a quantidade. Se

as três Forças se unissem em um só sistema ampliaria o atendimento, e se aos

reservistas fosse oferecido um atendimento no tipo dos convênios médicos, mas

criado e independente desses existentes, destinados a atender localidades distantes

das organizações militares, liberaria os reservistas da necessidade de permanecer

vizinhos e saturando os órgãos de saúde. (...) Não tenho os dados para comprovar

mais acredito que o percentual de atendimento destinado aos reservistas deva ser

entorno de 70%, com a descentralização de atendimento, melhoria tanto para os

órgãos de saúde com para seus usuários. Nos dias atuais em que os grandes centros

estão cada vez mais violentos seria muito vantajoso que o pessoal da reserva

pudesse viver em pequenas cidades, provavelmente as de origem ou escolha onde

teriam um padrão de vida mais saudável e seguro. Quero deixar claro que não estou

trabalhando em causa própria porque a cidade em que moro a 8 anos, no interior de

SC, possui um SUS que funciona e atende perfeitamente as minhas

necessidades a exemplo de todo o estado de Santa Catarina, só lamento que os

outros estados da União não ajam da mesma forma, e que o estado SC seja

uma exceção no contexto nacional”. (23/10/2004, N.C, Timbó/SC).

Apesar de não termos conhecimento de pesquisa mais recente sobre o

Sistema de Saúde da Aeronáutica e/ou o nível de satisfação do usuário, ante o

exposto, algumas questões se colocam: existe uma aplicação privilegiada de

76 FFAA é a abreviatura de Forças Armadas, a repetição do "F" e do "A" indica o plural, mesmo que não seja previsto na normatização da língua portuguesa, é uma forma empregada em Leis e normas para indicar o plural, no Estatuto dos Militares, por exemplo, é constante o emprego do termo FFAA, então repete-se o F para indicar Forças e A para indicar Armadas.

Page 98: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

96

recursos de custeio nos níveis de maior complexidade, em detrimento da atenção

primária? Será que a atenção primária do SISAU é ampliada, é eficaz? Atende aos

problemas de saúde individuais e coletivos, cuidando da qualidade da saúde, e não

apenas sendo capaz de tratar das doenças e acometimentos graves com risco à

vida?

Temos como parâmetro os princípios assistenciais do SUS (LOS, Art. 7º),

como a universalidade de acesso em todos os níveis de assistência e a participação

da comunidade, através dos Conselhos nas suas diferentes instâncias. Destaca-se,

além desses princípios: a equidade, com vistas a garantir a igualdade da assistência

à saúde, sem preconceitos ou privilégios de qualquer espécie; e a integralidade da

assistência. Apesar do texto constitucional não utilizar a expressão integralidade;

mas “atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem

prejuízo dos serviços assistenciais” (Brasil 1988, art.198). O termo integralidade tem

sido utilizado para designar exatamente essa diretriz. Apreendemos, que a integralidade, no contexto do Sistema Único de Saúde,

pode ser vista como uma crítica: a atitude médica fragmentária; a um sistema que

privilegia a especialização e segmentação; a atitude médica reducionista; bem como

a busca em compreender o conjunto das necessidades de ações e serviços de

saúde que um paciente apresenta para além da atenção individual curativa, mas, a

incorporação de ações de promoção e prevenção na atenção à saúde e articulação

com ações curativas e reabilitadoras - tomada a partir do referencial da Medicina

Preventiva. Ou seja, sinaliza um modo de organizar o processo de trabalho em

saúde, de modo a otimizar o seu impacto epidemiológico – articular atenção à

demanda espontânea coma oferta programada de atenção à saúde.

Pois bem. Enfatiza-se que as ações de saúde na Aeronáutica para estarem

em consonância com o SUS, devem ser conjugadas e voltadas ao mesmo tempo

para prevenção e a cura. De acordo com o texto do Estatuto dos Militares a saúde:

“(...) é entendida como o conjunto de atividades relacionadas com a prevenção,

conservação ou recuperação da saúde” (Lei 8.668/80).

Percebemos que, as ações de promoção, proteção e de recuperação formam

um todo indivisível que não podem ser fragmentadas. E a integralidade, não é

apenas uma diretriz do SUS definida constitucionalmente. Ela é uma “bandeira” de

luta dos sujeitos sociais.

Page 99: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

97

Os usuários do SISAU contribuem para o Fundo de Saúde da Aeronáutica77 e,

portanto, têm direito não só à complementação de suas despesas pelo Fundo, como

também, o acesso integral aos serviços por ele oferecido.

Inferimos que a existência de um direito social não determina que se tenha

acesso a ele como tal. Nas de palavras de Vasconcelos (1997):

O direito existe formalmente, mas, dependendo da forma como se usufrui

dele, transforma-se num objeto de favor, doação, constrangimento, troca...

O acesso a um recurso por um cidadão – um sujeito social – crítico,

consciente, é que transforma o direito formal em direito real. (p.134).

Aliás, importa considerar que entre os pressupostos contidos no Código de

Ética do Assistente Social, na Lei de Regulamentação da Profissão que

consubstanciam o Projeto Ético- Político do Serviço Social, podemos observar

princípios que se articulam à garantia dos direitos sociais: ampliação e consolidação

da cidadania e gestão democrática de serviços, programas e políticas sociais;

defesa do aprofundamento da democracia enquanto socialização da participação

política. Do mesmo modo, com em relação aos deveres do assistente social com

relação aos usuários, destaca-se o contribuir para a viabilização da participação

efetiva da população usuária nas decisões institucionais (CFESS, 1993).

3.2 O lócus de investigação e o seu cenário: os serviços de saúde da

Aeronáutica/Rio de Janeiro

No que concerne aos procedimentos metodológicos, temos como norte o

método histórico e dialético, o qual possibilita estabelecer aproximações sucessivas

com a realidade na qual nos inserimos, bem como captar a verdade desse

movimento através das devidas mediações para uma melhor apreensão do real e

suas contradições.

77 Vide o exemplo: um militar no posto de 1º tenente da ativa, com um soldo mensal de R$ 4.584,00, contribui ao FUNSA, ao final de 12 meses, com um valor aproximado de R$ 972,00.

Page 100: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

98

Isto permite compreender que há que se pensar a prática a partir de uma

metodologia que seja capaz de aprendê-la em suas articulações e em sua dinâmica,

considerando que esse movimento é operado pelo assistente social, tomado como

um ser de relações.

Portanto, elaborar categorias analíticas que permitam analisar a intervenção

profissional, como produto humano, um processo dialético, contínuo de (re)

construção, inserida num contexto sócio-histórico e cultural, produto das relações

sociais concretas existentes em cada sociedade e do patrimônio de conhecimentos,

saberes e práticas construídas pela categoria profissional, em articulação ativa e

crítica com a realidade social (BAPTISTA, 2006).

De acordo com Marx, capturar o movimento do objeto não é tão simples como

retratar a realidade. Se a aparência dos fenômenos coincidisse com a sua essência,

não precisaria de conhecimento nem de teoria, bastaria olhar a realidade que se

conheceria. Assim, a aparência tanto revela quanto oculta, tanto mostra quanto

esconde, necessitando de um esforço intensivo da razão para, partindo da

aparência, ir além dela e capturar o movimento interno dos fenômenos.

Nesses termos, não concebendo o real como algo estático, mas em contínuo

movimento, nos debruçarmos sobre a prática dos assistentes sociais nos serviços de

saúde da Aeronáutica - RJ, em específico, nos Hospitais do município do Rio de

Janeiro, quais sejam:

Hospital de Aeronáutica dos Afonsos/HAAF (localizado no Bairro

Sulacap);

Hospital Central da Aeronáutica/HCA (localizado no Bairro Rio

Comprido);

Hospital de Força Aérea do Galeão/HFAG (localizado no Bairro Ilha do

Governador).

No que se refere à caracterização geral dos Hospitais da Aeronáutica/RJ, faz-

se necessário, destacar que, segundo a Diretoria de Saúde da Aeronáutica/DIRSA,

sediada no prédio do antigo Ministério da Aeronáutica, na cidade do Rio de Janeiro

(RJ), são subordinados a ela todas as 15 (quinze) Organizações de Saúde da

Aeronáutica/OSA78.

78 Dados da DIRSA. Disponível em: <http: // www.dirsa.aer.mil.br> Acesso em 10 de outubro de 2009.

Page 101: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

99

O HCA é o hospital mais antigo (criado em 1942), seguido pelo HAAF

(inaugurado em 1950) e HFAG (inaugurado em 1980). A estrutura destes permite

fornecer assistência hospitalar de média e alta complexidade79.

O HCA e o HFAG possuem uma média de efetivo de 1.000 (mil)

trabalhadores entre servidores civis contratados e estatutários e militares da ativa,

temporários, além de residentes e estagiários de diversas especialidades. Já o

HAAF possui uma média de efetivo de aproximadamente 650 civis e militares.

Os hospitais HCA e HFAG dispõem em média 160 leitos hospitalares cada, o

HAAF é o hospital que disponibiliza o menor número de leitos. Entretanto, os

hospitais oferecem serviços de emergência, ambulatório e internação, Unidade de

Tratamento Intensivo, Centro de Tratamento de Queimados (HFAG), Maternidade

(HCA) e ala de pacientes crônicos (HAAF), Unidade de Geriatria e Gerontologia

(HAAF), Núcleo de Geriatria e Gerontologia (HCA). Os atendimentos prestados são:

Alergologia, Anestesiologia, Angiologia, Cardiologia, Cirurgia Cardíaca, Cirurgia

Cabeça e Pescoço, Cirurgia Geral, Cirurgia do Tórax, Cirurgia Maxilofacial, Cirurgia

Pediátrica, Cirurgia Plástica, Cirurgia Vascular, Clínica Médica, Dermatologia,

Doenças Infecto-Parasitárias, Endocrinologia, Enfermagem, Epidemiologia,

Fisioterapia, Fonoaudiologia, Gastroenterologia, Geriatria e Gerontologia,

Ginecologia, Hematologia e Hemoterapia, Infectologia, Nefrologia, Neurocirurgia,

Neurologia, Nutrição e Dietética, Oftalmologia, Oncologia, Ortopedia e

Traumatologia, Otorrinolaringologia, Pediatria, Pneumologia, Proctologia,

Psiquiatria/Psicologia, Reumatologia, Serviço Social, Terapia Ocupacional e Urologia

No que concerne às necessidades de saúde da população atendida, esta se

caracteriza pela predominância de problemas relacionados à hipertensão, às

doenças crônico-degenerativas, tais como: neoplasias e cardiopatias, assim como

79 Conjunto de procedimentos que, no contexto do SUS, envolve alta tecnologia e alto custo, objetivando propiciar à população acesso a serviços qualificados, integrando-os aos demais níveis de atenção à saúde (atenção básica e de média complexidade). As principais áreas que compõem a alta complexidade do SUS, e que estão organizadas em ―redes‖, são: assistência ao paciente portador de doença renal crônica (por meio dos procedimentos de diálise); assistência ao paciente oncológico; cirurgia cardiovascular; cirurgia vascular; cirurgia cardiovascular pediátrica; procedimentos da cardiologia intervencionista; procedimentos endovasculares extracardíacos; laboratório de eletrofisiologia; assistência em traumato-ortopedia; procedimentos de neurocirurgia; assistência em otologia; cirurgia de implante coclear; cirurgia das vias aéreas superiores e da região cervical; cirurgia da calota craniana, da face e do sistema estomatognático; procedimentos em fissuras lábio palatais; reabilitação protética e funcional das doenças da calota craniana, da face e do sistema estomatognático; procedimentos para a avaliação e tratamento dos transtornos respiratórios do sono; assistência aos pacientes portadores de queimaduras; assistência aos pacientes portadores de obesidade (cirurgia bariátrica); cirurgia reprodutiva; genética clínica; terapia nutricional; distrofia muscular progressiva; osteogênese imperfeita; fibrose cística e reprodução assistida. Cf. Ministério da Saúde. O SUS de A a Z, 3ª edição, Brasília (DF), 2009.

Page 102: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

100

as denominadas ―causas externas‖ que estão atreladas à violência urbana e social

(acidentes de trabalho, de trânsito), bem como as doenças relacionadas ao processo

de envelhecimento da terceira idade (doenças cardiovasculares, diabetes,

demências, Alzheimer).

Os usuários atendidos são encaminhados pelos Esquadrões de Saúde

(pequenas unidades de saúde de atendimento ambulatorial) e dos demais Hospitais

de Força Aérea, Hospitais de Base, Esquadrões de Saúde distribuídos pelos

estados brasileiros que compõem a rede de atendimento do SISAU.

Assim, para alcançarmos o objetivo de analisar a prática profissional dos

assistentes sociais na saúde da Aeronáutica/RJ, foram entrevistados 10 (dez)

profissionais do universo de 13 (treze) assistentes sociais80, distribuídas nos

Hospitais: HAAF, HCA e HFAG.

No intuito de cumprir os objetivos aqui propostos, nos valemos de algumas

estratégias durante o processo de investigação. Inicialmente, realizamos uma busca

nas produções teóricas dos assistentes sociais arquivadas nas unidades de saúde,

bem como nos trabalhos apresentados em Congressos, Simpósios, Encontros,

Seminários e publicações de artigos.

No que se refere ao levantamento de produções teóricas foram encontrados

parcas produções, sendo estas, voltadas para a discussão na área da assistência

social como:

De Amélia Maria de Souza Casqueiro – Cap.QFO ASS.

Síntese da Trajetória Histórica da Assistência Social e do

Serviço Social no Sistema de Assistência Social da

Aeronáutica, 2001. Discussão voltada para a Política de

Assistência Social. A autora faz um resgate histórico da

sistematização da Assistência Social na Aeronáutica, assim

como a criação do Sistema de Assistência Social /SAS, sem

maiores questionamentos teóricos acerca do Serviço Social na

Aeronáutica.

80 O processo de pesquisa de campo, através das entrevistas, foi realizado entre março a setembro de 2009. Portanto, nesse período, o quantitativo de assistentes sociais nos serviços de saúde do Rio de Janeiro era de 13 (treze) assistentes sociais. Atualmente, são 14 (quatorze) assistentes sociais, Nov.2009.

Page 103: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

101

De Nádia Regina O. Q. de Souza [et al.] (orgs.). Política

de Assistência Social no Brasil: desafios para o assistente

social, 2007. Na verdade, esta publicação é uma

sistematização dos conteúdos discutidos no II Simpósio do

Serviço Social do COMAER em 2007, dando origem à

publicação de uma coletânea de artigos, dirigida ao público em

geral e, especificamente, aos assistentes sociais do COMAER,

cujo conteúdo é nutrido pelos artigos de intelectuais do Serviço

Social como: Elaine Rossetti Behring; Mavi Pacheco Rodrigues

e Sara Nigri Goldman dentre outros.

De Deolinda P. da Silva [et al.] . Construindo o Projeto

Profissional do Serviço Social na Casa Gerontológica de

Aeronáutica Brigadeiro Eduardo Gomes In O Desafio

Multidisciplinar: um modelo de instituição de longa

permanência para idosos, 2006. Trata-se de uma publicação

com uma concepção multidisciplinar sobre a Casa

Gerontológica da Aeronáutica/CGABEG, onde o Serviço Social

integra-se ao modelo assistencial desta instituição. Apresenta o

trabalho realizado junto aos cuidadores de Idosos e propõe

uma discussão sobre o Projeto Profissional do Serviço Social

na CGABEG. É importante mencionarmos que, tal artigo

apresenta algumas colocações equivocadas no que se

refereao entendimento por parte dos profissionais quanto aos

preceitos do Código de Ética Profissional dos Assistentes

Sociais. É mencionado por este, que o trabalho em texto (pp-

157) baseia-se em princípios éticos e científicos, na busca

da melhoria da qualidade de vida dos idosos e de seus

familiares. “(...) tendo como premissas básicas a autonomia e

a busca de melhor qualidade de vida e bem-estar social.

(...) a busca e consecução dos objetivos baseando-se no

acolhimento, respeito da pessoa humana, à procura de

novos horizontes, perspectivas e referenciais para o

crescimento pessoal de cada um. (pp -187-188). Ora, o

Page 104: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

102

Código de Ética Profissional dos Assistentes Sociais, em vigor,

não visa a melhoria da qualidade de vida dos idosos e

familiares. Além do mais, o perfil do assistente social para

atuar nas diferentes políticas sociais, de acordo com o código,

deve afastar-se das abordagens tradicionais funcionalistas e

pragmáticas, que reforçam as práticas conservadoras que

tratam as situações sociais como problemas pessoais que

devem ser resolvidos individualmente (CFESS, 2009). De

forma sucinta, e, não desconsiderando o caráter plural e

heterogêneo da categoria, sinalizamos nossa preocupação

sobre um possível descompasso entre a direção social inscrita

no projeto ético-político e profissional do Serviço Social e

prática profissional desenvolvida nesse espaço ocupacional.

De Altair Silva Moreira – assistente social civil (a qual

implementou o Serviço Social no HFAG). Visão Teórica do

Serviço Social no HFAG, 1981. Época, aliás, em que vigorava

o Código de Ética de 1975, onde o valor central de fundamento

ao Serviço Social é a pessoa humana; concepção personalista

que permita ver a pessoa humana como centro, objeto e fim da

visa social (ORTIZ, 2009:127). Altair S. Moreira apresenta uma

análise detalhada do Hospital de Força Aérea do Galeão, seus

setores, suas finalidades, funcionamento e apresenta os

objetivos do Serviço Social na instituição: dar atendimento

integral à população de clientes e funcionários; promover uma

melhor identificação da Organização Militar com interesses

sociais da comunidade externa. E quanto às finalidades: (...)

objetiva trabalhar com o homem isolado ou em grupos, para

remoção de bloqueios, liberação de potencialidades, utilização

de seus próprios recursos e do meio, tendo em vista o

aperfeiçoamento dos servidores desta Organização Militar,

bem como o da clientela que recorra ao Serviço Social, visando

alcançar atendimento de suas necessidades sociais.

Page 105: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

103

E de uma forma mais geral, tece considerações gerais sobre o

Serviço Social no campo da saúde, ancorada no conceito de

saúde preconizado pela Organização Mundial de Saúde (criada

em 1948), que definiu a saúde como o bem estar integral –

físico, mental e social – e não uma mera ausência de doença.

De forma sucinta, podemos dizer que, naquele momento, a ação profissional

refletia a forte influência do pensamento conservador e da Doutrina Social da Igreja

Católica. Destaca-se entre os postulados advindos do neotomismo, bem como do

positivismo que comparecem nos Códigos de 1947, 1965 e 1975 o trato da ―pessoa

humana‖ com um ente abstrato, a-histórico, portadora de direitos naturais.

Durante o processo de levantamento de produções teóricas, encontramos,

também, publicações em Anais de Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais dos

anos de 2004 e 2007 abordando as temáticas de Seguridade Social/Assistência

Social, Velhice, Relações de Trabalho e Espaços Sócio-Ocupacionais do Assistente

Social, com destaque para o trabalho que apresenta a participação do assistente

social em um Programa de Obesidade Mórbida e Cirurgia Bariátrica de um Hospital

da Aeronáutica.

Na reconstrução empírica do objeto, utilizamos o instrumento formulário de

entrevista (Anexo 01), contendo perguntas abertas e fechadas sobre o perfil

profissional, referências de conhecimento, prática profissional e aperfeiçoamento

profissional, buscando uma abordagem qualitativa e quantitativa das questões. A

preocupação que nos moveu na elaboração do formulário foi a de realizar uma

reflexão que faça ponte entre as questões cruciais com as quais se debatem os

assistentes sociais e os aspectos que, de uma forma ou de outra, vêm balizar, direta

ou indiretamente, o conjunto de noções que afetam a prática cotidiana naquele

espaço.

Page 106: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

104

3.3 Os assistentes sociais inseridos nos serviços de saúde da Aeronáutica no

Rio de Janeiro/RJ

3.3.1 Perfil profissional

Apresentamos a seguir os dados capturados da realidade daqueles

profissionais que atuam nos Serviços de Saúde da Aeronáutica /RJ (SSA/RJ) a partir

do nosso referencial empírico, ou seja, do conjunto das assistentes sociais

entrevistadas.

De um total de 13 (treze) profissionais atuando na saúde, foram entrevistadas

10 (dez) assistentes do sexo feminino81. Não foram identificados homens atuando

nos SSA/RJ. Confirmando a tendência histórica da profissão, a categoria dos

assistentes sociais, ainda é predominantemente feminina82.

GGrrááffiiccoo 11-- FFaaiixxaa EEttáárriiaa Assistentes Sociais SSA/RJ

Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.

O Gráfico 1 mostra que as assistentes sociais estão numa faixa etária que

varia entre 27 e 55 anos de idade. No entanto, são 40% que têm mais de 50 anos e

30% têm entre 41 e 50 anos. Apenas 20% têm entre 31 e 40 anos de idade. As

81 Das três assistentes sociais não entrevistadas: (01) uma encontrava-se em processo de desligamento da

Aeronáutica; 01 (uma) em período de férias e 01 (uma) optou em não participar da entrevista. 82 Cf. Edição virtual, da pesquisa ―Assistentes sociais no Brasil: elementos para o estudo do perfil profissional” realizada no ano de 2004 e publicado em maio de 2005 em edição impressa. A presente pesquisa é o resultado do convênio firmado entre o Conselho Federal de Serviço Social – CFESS e a Universidade Federal de Alagoas – UFAL, que por meio do grupo de pesquisa Serviço Social, Trabalho e Direitos Sociais desenvolveu este trabalho contando com a colaboração de todos os 24 Conselhos Regionais na coleta dos dados. A pesquisa teve a coordenação geral do CFESS. Disponível em : <http: www.cfess.org.br/pdf/perfilas_edicaovirtual2006.pdf.

10%

20%

30%

40%

até 30 anos entre 31 e 40 anos entre 41 e 50 anos mais 50 anos

Page 107: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

105

profissionais entrevistadas são, em sua maioria (40%), formadas há mais de 20

anos: Vide (Gráficos 3 e 5).

GGrrááffiiccoo 22 -- EEssttaaddoo CCiivviill Assistentes Sociais SSA/RJ

Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.

Os dados mostram que 40% das assistentes sociais são casadas, 20%

solteiras e 40% declaram estar divorciadas83. Com relação ao ano de formação, o

Gráfico 3 mostra que 70% das assistentes sociais se formaram entre os anos de

1977 a 1995 e apenas 30 % se formaram entre os anos de 1996 a 2002.

GGrrááffiiccoo 33 -- AAnnoo ddee FFoorrmmaaççããoo PPrrooffiissssiioonnaall Assistentes Sociais SSA/RJ

Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.

83 As entrevistadas que declararam estarem divorciadas, confirmam terem passado pela etapa anterior a esta, ou seja, a separação judicial.

10%

30%

30%

0%

30%

1977 1981 - 1988 1989 - 1995

1996 - 2002

20%

40%

40%

solteira

casada

Divorciadas

Page 108: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

106

O Gráfico 3 mostra que 40% das assistentes sociais se formaram entre os

anos de 1977 a 1988 e 60% se formaram entre os anos de 1989 a 2002. Isso

sinaliza que parcela significativa das profissionais entrevistadas teve como

referência, no seu processo de formação acadêmica, os princípios e as diretrizes

contidas nas novas Diretrizes Curriculares para o Curso de Serviço Social, sob a

coordenação da Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social –

ABEPSS. Com apoio das outras entidades categoria e oriundo de um amplo debate

realizado pelas Unidades de Ensino a partir de 1980, este processo culminou com

sua a primeira proposta de Currículo publicada na Revista Serviço Social e

Sociedade nº 14/Editora Cortez. Uma proposta que passa por reformulações em

1993 e 1996, quando são aprovadas as Diretrizes Curriculares para o Serviço

Social.84

A partir daí vem ocorrendo, em todo o país, a revisão dos currículos de

Serviço Social sob essas novas diretrizes, que aprofundam as bases do processo

de revisão curricular de 198285, quando a formação profissional do assistente

social rompeu com suas bases conservadoras, assumindo uma perspectiva

histórico-crítica de profissão. Assim, a ABEPSS, em 1996, estabelece um perfil

profissional indicando que o assistente social

―(...) atua nas expressões da questão social, formulando e implementando

propostas de intervenção para seu enfrentamento, com capacidade de

promover o exercício pleno da cidadania e a inserção criativa e propositiva

dos usuários do Serviço Social no conjunto das relações sociais e no

mercado de trabalho‖ (Diretrizes curriculares para o curso de Serviço

Social/2002).

84

Atualmente as Unidades de Ensino vêm se deparando com duas Diretrizes Curriculares para o Serviço Social: as Diretrizes Curriculares da Comissão de Especialistas, que representa o pensamento da ABEPSS, e as Diretrizes oficiais aprovadas pelo MEC que, esvaziadas de conteúdo, têm favorecido o ensino privado e a implantação de Cursos à Distância no Serviço Social. 85

O projeto curricular de 1982, cujo referencial foi a pesquisa sobre a formação profissional realizada pela então ABESS – Associação Brasileira de Ensino em Serviço Social. Em consonância com o debate profissional dos anos 80 – pontuada por uma ―grave crise econômica, acompanhada de rearticulação política da sociedade civil‖ - a pesquisa aponta para uma determinada perspectiva de análise da realidade e do próprio Serviço Social. Cf. ABEPSS. Proposta básica para p Projeto de Formação profissional. In: Serviço Social e Sociedade nº 50, Ano XVIII, São Paulo: Cortez, abril de 1996.

Page 109: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

107

Na verdade, o processo de discussão desencadeado nacionalmente pela

então, Associação de Ensino em Serviço Social (ABESS), teve como ponto de

partida o projeto de formação profissional construído e implantado a partir do início

dos anos 80. O marco da redefinição do projeto profissional dos anos 80 foi o

tratamento dispensado ao significado social da profissão, enquanto especialização

do trabalho coletivo, inserido na divisão social e técnica do trabalho.

Assim, o primeiro projeto de formação profissional da ABEPSS é do ano de

1982, o qual começa a ser viabilizado pelas Unidades de Ensino -, a exemplo da

UERJ e da UFRJ - por volta dos anos de 1985. A partir de 1989, têm-se as

primeiras turmas já com a nova proposta da ABESS/ABEPSS.

O Gráfico 3 mostra que 60% das assistentes sociais entrevistadas, tiveram

formação entre os anos de 1989 a 2002, o que sinaliza que estas podem ter sido

atingidas pelo projeto de formação da ABEPSS.

Enfatiza-se que as universidades públicas, após 1980, sempre tiveram uma

formação mais progressista em relação às universidades particulares.

GGrrááffiiccoo 44 -- NNaattuurreezzaa ddaa IInnssttiittuuiiççããoo FFoorrmmaaddoorraa XX AAssssiisstteennttee SSoocciiaall cciivviill//mmiilliittaarr Assistentes Sociais SSA/RJ

Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.

UFRN

UFRJ

UFF UVA

UGF

0

1

2

3

4

5

militar

civil

Page 110: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

108

Tabela 1 -- Assistentes Sociais dos Serviços de Saúde da Aeronáutica/RJ Formas de Admissão

ASSISTENTES

SOCIAIS

SSA/RJ

CONCURSO

QFO

CONCURSO

QCOA

CONCURSO*

CIVIL

CIVIL**

EFETIVADA

ENTREVISTADA 1

UNIDADE DE

ENSINO

---- ---- UGF ----

ENTREVISTADA 2

UNIDADE DE

ENSINO

---- UFRN ---- ----

ENTREVISTADA 3

UNIDADE DE

ENSINO

---- ---- ---- UGF

ENTREVISTADA 4

UNIDADE DE

ENSINO

---- UFRJ ---- ---

ENTREVISTADA 5

UNIDADE DE

ENSINO

---- ---- ---- UGF

ENTREVISTADA 6

UNIDADE DE

ENSINO

---- ---- UVA ----

ENTREVISTADA 7

UNIDADE DE

ENSINO

---- ---- ---- UGF

ENTREVISTADA 8

UNIDADE DE

ENSINO

---- UFRJ ---- ----

ENTREVISTADA 9

UNIDADE DE

ENSINO

UFRJ ---- ---- ----

ENTREVISTADA 10

UNIDADE DE

ENSINO

---- UFF ---- ----

FONTE: HORTA. GM. No meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.

* Concurso após Lei 8.112/90

** Contrato CLT (servidor interino) – efetivação após Constituição Federal de 1988.

Com relação à unidade de formação profissional (Gráfico 4 e Tabela 1),

podemos observar que todas as assistentes sociais civis entrevistadas tiveram

formação em Instituição Privada de ensino, com destaque para a Universidade

Gama Filho, enquanto as entrevistadas militares tiveram formação em Instituição

Pública Federal de ensino.

Page 111: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

109

Algumas questões se colocam, a saber: podemos dizer que, nos limites do

levantamento realizado, a maioria das assistentes sociais civis são provenientes do

município do Rio de Janeiro, tal fato corrobora para que estas procurem formação

em instituições de ensino de sua localidade. Alia-se a este, o fato de que após a

Reforma Universitária de 1968, acentuou-se a expansão do ensino superior,

sobretudo do ensino privado, organizado sobre a forma de estabelecimentos

isolados, sendo introduzida a lógica empresarial na condução da vida acadêmica

através dos procedimentos de burocratização e racionalização. Vejamos a análise

realizada por Netto (1996, p. 62), ao se referir à política educacional no período

ditatorial:

(...) transformou, pela primeira vez na história brasileira, o ensino superior

num setor para investimentos capitalistas privados extremamente rentáveis,

- a educação superior, sob a autocracia burguesa, transformou-se num

grande negócio.

Essa privatização, em casos muito significativos, foi operada, também, no

nível médio por grupos econômicos simultaneamente à ação no ensino superior,

como foi à típica trajetória que, no Rio de Janeiro, levou do Colégio Piedade à

Universidade Gama Filho. (NETTO, 1996, p.63).

Residem, portanto, nesse momento histórico, as bases que solidificaram o

ensino superior privado no País, de forma que se chega ao inicio da década de 80

com uma parcela significativa de estudantes matriculados nessas instituições86.

Assim, a inserção de assistentes sociais civis coincide com a lógica de

expansão da assistência social na Aeronáutica, marcada pela criação do Sistema de

Assistência Social da Aeronáutica/SAS em 1985, numa conjuntura de

redemocratização do país e na luta pela efetivação de direitos.

Na época, a Aeronáutica contava apenas com as assistentes sociais do

Quadro Feminino de Oficias/QFO87, oriundos da primeira turma de mulheres militares

nas Forças Armadas em 198288.

86 Cf. Cardoso, M.F.M.L. A mediação do Estado na fronteira público-privado no processo de interiorização do ensino superior privado na zona da Mata Mineira: O caso FAMINAS, em Muriaé-MG. Rio de Janeiro: Universidade Federal do Rio de Janeiro, Tese de Doutorado, 2006. 87 Segundo o relato de uma capitão da reserva - assistente social militar da 3ª turma do extinto QFO – em 1984, das 64 mulheres militares admitidas pela Aeronáutica, somente 02(duas) eram assistentes sociais. As demais 62 (sessenta e duas) oficiais eram pertencentes às categorias profissionais de psicólogas, fonoaudiólogas, nutricionistas, fisioterapeutas e enfermeiras (sendo este com o maior número de profissionais). 88 Para um aprofundamento dessa questão. Cf. MATHIAS, Suzeley Kalil. As mulheres chegam aos quartéis. Disponível em: <http://www.resdal.org/producciones-miembros/art-kalil.html> acesso em: 17/03/2009. Mathias propõem analisar o contexto do ingresso das mulheres no espaço viril do quartel. Conclui a autora que a

Page 112: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

110

Entretanto, as assistentes sociais civis formadas em unidades particulares

(vide: quadro 1), foram admitidas de duas formas: através de concurso público para

servidores civis; e por CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas) na condição de

servidor interino. Expliquemos melhor:

Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, extinguiu-se a

ascensão funcional, então vigente no serviço público federal para os seus servidores

civis. A referida ascensão funcional estabelecia os critérios para a mudança de

categoria funcional dos servidores (por exemplo: de um servidor agente

administrativo para procurador federal, fiscal ou outro cargo de nível superior).

Assim, a partir da Constituição, qualquer alteração da categoria do servidor

somente se dará mediante concurso público.

Na verdade, eliminou com a dualidade de admissão no serviço público, seja

pelo ingresso por concurso público, seja pelo ingresso sem concurso. Portanto, com

a consolidação da Constituição, foram agregados os funcionários celetistas (CLT)

que já tinham 5 (cinco) anos de serviço público embora, admitidos interinamente

(temporariamente), estes foram efetivados. Como podemos observar nos seguintes

depoimentos:

“Não fiz concurso, na época, em 1982 fui indicada por um oficial militar esposo de uma amiga, com a Lei (não sei qual) fui ficando, hoje sou efetivada.” “Entrei em 1981, por indicação, na época isso existia, hoje não”. “Fiz estágio aqui, depois por indicação (1984) entrei, sou servidora federal estabilizada”.

Em 11 de dezembro de 1990 foi aprovada a Lei 8.112, que dispõe sobre o

Regime Jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das

fundações federais. Esta lei institui no seu Art.10 que:

―(...) Art. 10 – A nomeação para cargo de carreira ou cargo isolado de

provimento efetivo depende de prévia habilitação em concurso público de

provas e títulos, obedecidos a ordem de classificação e o prazo de sua

validade‖.

integração das mulheres foi marcada por três fatores: o primeiro está relacionado às premissas da democracia e do estado de direito que exigem posturas mais igualitárias entre diferentes, incluindo homens e mulheres; o segundo diz respeito às mudanças na forma de fazer a guerra, na tecnologia e na administração das instituições militares; o último diz respeito à crise da profissão militar, com o desprestígio da profissão, levando a um afastamento do público masculino.

Page 113: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

111

Duas das assistentes sociais civis entrevistadas informaram terem sido

admitidas através de aprovação em concurso público para as Forças Armadas

sendo, posteriormente, designadas para a Aeronáutica. Vejamos os depoimentos:

“Prestei concurso para assistente social em 1992 para as Forças Armadas fui designada para o Hospital da Aeronáutica”. “Fiz concurso na década de 90 (não me recordo da data) para a Marinha, e as outras Forças requisitaram servidores, como faltou vaga na Marinha, fui designada para a Aeronáutica”.

No que se referem às assistentes sociais militares, estas, só podem ser

admitidas através de concurso público89 de abrangência nacional, como já

apontamos, o que sinaliza uma maior diversidade de instituições formadoras e uma

competição acirrada na busca de aprovação nestes concursos e inserção no quadro

de oficiais.

Destacamos da análise de Guerra (2007, p.08) a seguinte argumentação que

nos parece pertinente para conjeturarmos sobre esse assunto:

―No capitalismo monopolista, face ao padrão de produção atual denominado por alguns autores como flexível

90, acirra-se a luta de classes, mas também

a luta intraclasses, a fragmentação, a competitividade, o individualismo, a razão instrumental que opera uma ruptura entre fins e meios, estimulando saídas individualistas e o salve-se quem puder. Não é demasiado dizer que essa lógica acirra a fragmentação das classes e entre segmentos profissionais, dentre os quais dos assistentes sociais‖.

Portanto, uma questão se coloca: embora, atualmente, exista uma crescente

e expressiva demanda por assistentes sociais na instituição, esta se dá de forma

precarizada, haja vista o processo de substituição de um quadro efetivo de

assistentes sociais (QFO), que foi extinto na década de 90 e gradativamente

substituído (a partir de 1998) por um quadro de assistentes sociais militares

temporários.

A precarização das relações profissionais estabelecidas no âmbito do Estado

sinaliza uma tendência de apropriação, pelos assistentes sociais temporários, da

lógica dos trabalhadores terceirizados, embora sejam concursados91. Como se

evidencia nos seguintes depoimentos:

89 Referindo-se ao extinto concurso para Admissão de Oficiais do Quadro Feminino (QFO) e ao atual Concurso de Admissão para Oficiais Temporários (QCOA). 90 Cf. Harvey. David. A Condição Pós - Moderna, São Paulo, Ed. Loyola, 1994. 91 Os candidatos a admissão ao Quadro Complementar de Oficias Temporários da Aeronáutica (QCOA), realizam o mesmo concurso que os oficias efetivos de carreira, bem como passam pelas mesmas fases de

Page 114: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

112

“(...) Apesar de tudo vivemos um retrocesso desse avanço (...) falta recursos humanos, aqui em um hospital desse tamanho, somos apenas 03 (três) assistentes sociais”. “(...) Prefiro estudar para outros concursos, esse quadro não vai ser efetivado, meu tempo está acabando”. “(...) Você está aqui e não está ao mesmo tempo, de certa forma, afeta o nosso cotidiano (...) quando atendo aos usuários, lógico que não fico pensando nessa situação”. “(...) O tempo de QCOA passa muito rápido, acho que temos que deixar nossa marca (...) penso que tenho que me qualificar mais. Sei lá! Pode ser que efetivem o nosso quadro. E se for uma seleção interna. Ao mesmo tempo, fico pensando que trabalho como uma “louca” para daqui a 08 (oito) anos a FAB me mandar embora, não interessa o quanto e o que fiz”. “(...) Eu sei que quando prestei o concurso era temporário, mas quando você está aqui pensa diferente, quando você começa a desenvolver um trabalho legal, está na hora de ir embora (...) o meu concurso é igualzinho ao dos médicos e dentistas, e eles são de carreira, acho isso injusto com o assistente social e com os outros profissionais nessa situação”.

Podemos observar através dos depoimentos que a questão da precariedade

de admissão das assistentes sociais (oficias temporários) afeta o cotidiano

profissional. A preocupação é que essa questão possa se tornar um entrave para o

desenvolvimento das atividades, influenciando as decisões das profissionais e que

estas, limitem sua prática na esfera da execução burocrática das atividades.

GGrrááffiiccoo 55 - TTeemmppoo ddee EExxeerrccíícciioo pprrooffiissssiioonnaall Assistentes Sociais SSA/RJ

10%

20%

10%

20%

40%

até 5 anos

entre 6 e 10 anos

entre 11 e 15 anos

entre 16 e 20 anos

mais 20 anos

Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.

seleção: prova de conhecimento específico, português e redação, prova de títulos, exame físico, médico e psicológico. Motivo de descontentamento dos QCOA com a FAB.

Page 115: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

113

O Gráfico 5 mostra que as profissionais entrevistados em sua maioria (70%)

apresenta mais de 10 anos de exercício profissional e apenas 10% possuem até 5

anos de exercício profissional. Um grupo de 40% das profissionais tem mais de 20

anos de profissão, o que indica estarem próximas da aposentadoria. Como podemos

observar nos depoimentos:

“(...) não tenho ânimo para mais nada, até pela condição que nós funcionários civis

nos encontramos, estou no fim de carreira. Eu não vou a lugar nenhum”.

“(...) já deu no que tinha que dar. Estou indo embora daqui a pouco”.

“(...) Ainda tenho que esperar uns 5 anos para não ter perda salarial, se pudesse

me aposentava hoje”.

“(...) A gente vai desanimando, tenho mais de 25 anos de serviço neste hospital”.

GGrrááffiiccoo 66 -- TTeemmppoo ddee EExxeerrccíícciioo pprrooffiissssiioonnaall nnaa IInnssttiittuuiiççããoo

Assistentes Sociais SSA/RJ

30%

10%

10%10%

40%

até 5 anos

entre 6 e 10 anos

entre 11 e 15 anos

entre 16 e 20 anos

mais 20 anos

Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de Saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.

A pesquisa buscou saber ainda, há quanto tempo as assistentes sociais

trabalham na instituição. A maioria das profissionais formados na década de 1980

tem na Aeronáutica sua primeira inserção como assistente social. Portanto, trata-se

de um grupo que não tem uma formação e atuação muito recente no Serviço Social.

Observamos através das entrevistas e da dinâmica das instituições, assim

como da relação do Serviço Social com estas, que o trabalho do Serviço Social

acabou sendo agregado às requisições da instituição de ―resolver‖ os problemas.

Percebemos que na sua maioria as atividades realizadas pelas assistentes sociais

são ―soltas‖, desconectadas de um planejamento maior do setor, sem buscar atingir

Page 116: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

114

um objetivo predeterminado. Ou seja, não se trata de uma prática planejada e

avaliada nas suas conseqüências. Relatos a seguir exemplificam essa situação:

“O Serviço Social é muito solto aqui nos hospitais da Aeronáutica”. “Trabalhamos muito com o apagar de incêndio, atendimento imediato, resolver aquela situação momentânea que já chega ao extremo para nós”.

“Aqui não se trabalha em equipe multidisciplinar ou indisciplinar, ninguém se articula”. “(...) Fazemos reuniões no início do ano para planejarmos as ações, mas não conseguimos colocar em prática”.

“(...) Aqui, quando não querem “resolver” o problema dos usuários, jogam para o Serviço Social. Muitas vezes você deixa de fazer um relatório social ou, um estudo social para “resolver” um problema que é do setor que encaminhou o usuário; você vai deixar um usuário idoso, com dificuldade de caminhar ficar andando sem rumo? Vou ao setor porque por telefone, ninguém atende, e explico ao “indivíduo” o que pode ser feito, ou seja, explico o serviço que ele deveria saber e fazer e não o faz; eu penso é no usuário”.

Outro dado relevante é a predominância, na área da saúde, de assistentes

sociais civis mais de 20 anos de inserção. O que sinaliza que apesar da Aeronáutica

requisitar, anualmente, desde 1998, através de Concurso Público um número

expressivo de assistentes sociais temporários, um número reduzido de profissionais

tem sido alocado nas unidades de saúde92.

Cabe informar, que é Comando-Geral do Pessoal (COMGEP), o órgão

responsável pela política de pessoal do Comando da Aeronáutica. Este órgão tem

como principais objetivos realizar o levantamento das necessidades concretas da

Aeronáutica quanto ao efetivo, quantitativamente e qualitativamente e o

dimensionamento das necessidades de pessoal. Assim, através do subprograma

"Tabela de Lotação de Pessoal‖, estabelece o somatório das Tabelas de Lotação de

cada Organização. Tal fato, segundo o COMGEP, o possibilita planejar as

necessidades de recrutamento em prazos adequados. Esses subprogramas são, a

rigor, um Plano de Classificação de Cargos.

Entretanto, o Órgão Central do Sistema de Assistência Social/SAS do

COMAER é a diretoria de Intendência/DIRINT que, por intermédio da Subdiretoria de

Encargos Especiais/SDEE; planeja, normatiza e controla o trato dos assuntos

relacionados aos profissionais de Serviço Social do COMAER.

92 Atualmente, são 96 (noventa e seis) assistentes sociais na Aeronáutica, entre civis e militares. Desse total, são 23 (vinte e três) assistentes sociais distribuídas nos 09 (nove) hospitais da Aeronáutica, quais sejam: HCA, HAAF, HFAG, HFAB, HABE, HASP, HARF, HAMN, HACO. Cf. SDEE, agosto de 2009.

Page 117: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

115

A SDEE a cada ano de concurso público informa e solicita ao COMGEP o

quantitativo de assistentes sociais93 necessário para o desenvolvimento das ações

de Serviço Social e Assistência Social.

Destaca-se que o Plano de Assistência Social/PASIC do COMAER94 prevê

cinco programas focados nas áreas de: promoção familiar; proteção à terceira idade;

benefícios sociais; recursos humanos e lazer e cultura. Tomando como base legal,

para o desenvolvimento dos programas, a Lei Orgânica de Assistência Social

(LOAS) e os desdobramentos legais advindos, tais como: NOB/SUAS, Estatuto do

Idoso, Estatuto da Criança e do Adolescente, entre outros dispositivos legais que

possam auxiliar na compreensão da matéria.

Em linhas gerais, é competência da SDEE: propor estudos e pesquisas para

fundamentar as estratégias de ação do Serviço Social; planejar, normatizar e

controlar as ações vinculadas às atividades de Assistência Social; articular com

os órgãos responsáveis pelas políticas de saúde, previdência social e

educação, no âmbito do COMAER, ou fora dele, visando à elevação do patamar

mínimo de atendimento das necessidades básicas da população alvo;

promover as atividades de aperfeiçoamento dos recursos humanos no campo da

Assistência Social; coordenar as ações da Assistência Social, para a

consecução de seus objetivos, no que concerne ao planejamento, à programação, à

execução e ao controle das atividades administrativas orçamentárias e financeiras,

dentre outras competências95.

Destaca-se, também, a direção dada pela Política de Assistência Social das

Forças Armadas/FFAA (Marinha, Exército e Aeronáutica), aprovada pelo Ministério

da Defesa em setembro de 2006 no I Seminário de Assistência Social das Forças

Armadas. Para elucidarmos tal afirmativa, destacamos do anexo da Portaria

Normativa nº. 1173, que aprova a Política de Assistência Social das FFAA os

seguintes objetivos:

(...) Objetivo nº. 2. Aprimorar os recursos humanos necessários à condução das atividades de assistência social nas Forças Armadas (FFAA). Diretrizes: a) assegurar de forma coordenada o ingresso de pessoal graduado em Serviço Social e áreas afins, bem como o aperfeiçoamento e a especialização de recursos

93 A título de exemplo, os concursos EAOT/2007/2008/2009 e 2010, ofereceram juntos, 29 vagas para o quadro de assistentes sociais. Entretanto, 2 (dois) hospitais do Rio de Janeiro, desde 2004, não recebem profissionais de Serviço Social em seu quadro. Cf. SDEE, 2009. 94 ICA 163-1 de 22 de fevereiro de 2006/COMAER.

95 Instrução Reguladora das Ações da Assistência Social/ICA 163-1 de 22 de fev. de 2006, reeditada em dez. de 2008.

Page 118: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

116

humanos necessários ao desempenho das atividades de assistência social, por meio da participação de componentes das FFAA em cursos e estágios ministrados em estabelecimentos de ensino militares e civis no Brasil, e no exterior; b) estimular a permanência do pessoal qualificado em assistência social das FFAA no exercício de atividades afins; c) promover o contínuo aperfeiçoamento da equipe técnica responsável pela assistência social das FFAA por meio de participação em cursos de pós-graduação, seminários, simpósios e atividades correlatas no Brasil e no exterior; d) incentivar o desenvolvimento de trabalhos literários (monografias, dissertações, teses, estudos, ensaios e outros) voltados para a área de assistência social das FFAA; e) estimular o aproveitamento de militares e civis graduados em Serviço Social e áreas afins, em funções de assessoria e planejamento da assistência social das FFAA; f) promover o estágio curricular no âmbito das FFAA, de alunos que têm a assistência social como objeto de sua formação profissional.

De acordo com a diretriz da SDEE, a Política de Assistência Social no âmbito

do COMAER visa romper com uma prática desarticulada e conservadora e

procura adequar as ações sociais do COMAER ao enfoque da assistência social

como política pública, na busca pela garantia de direitos. No que se refere à atuação

do assistente social a ICA 163-1/2006/COMAER afirma:

(...) a atuação do assistente social se dá nas expressões cotidianas da

questão social, a serem atendidas pelas políticas sociais (...) o assistente

social possui uma ampla diversidade de formas de inserção sócio-

institucional, que vai desde a execução da rede de serviços sociais à

elaboração e o gerenciamento de Políticas Setoriais (pp.09-10).

Entretanto, as indicações nos levam a supor que tem sido requisitada para

atuar na área da assistência social, parcela significativa de assistentes sociais

temporários. Ou seja, há uma tendência na Aeronáutica, de priorizar a Política de

Assistência Social em detrimento das demais políticas.

Deparamo-nos, portanto, com uma tendência apontada na década de 90 por

Mota (1995 e 2006), da ampliação da assistência social, transformando-a num novo

fetiche de enfrentamento à desigualdade social. Instala-se uma fase na qual a

assistência social, mais do que uma política de proteção social, se constitui num

―mito social‖. Além disso, postula-se uma intenção de reduzir a profissão à

assistência social, ou seja, uma assistencialização do Serviço Social.

Page 119: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

117

GGrrááffiiccoo 77 -- FFuunnççããoo qquuee eexxeerrccee Assistentes Sociais SSA/RJ

60%

40%

Assistente Social

Chefe de Setor

Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.

Tabela 2 -- Assistentes Sociais dos Serviços de Saúde da Aeronáutica/RJ

Função Exercida

ASSISTENTES SOCIAIS

SSA/RJ

CIVIL MILITAR

ENTREVISTADA 1

ASSISTENTE

SOCIAL

----

ENTREVISTADA 2

---- CHEFE

DO SS

ENTREVISTADA 3

CHEFE

DO SS

----

ENTREVISTADA 4

ASSISTENTE

SOCIAL

ENTREVISTADA 5

ASSISTENTE

SOCIAL

----

ENTREVISTADA 6

ASSISTENTE

SOCIAL

----

ENTREVISTADA 7

ASSISTENTE

SOCIAL

---

ENTREVISTADA 8

---- CHEFE

DO SS

ENTREVISTADA 9

---- ASSISTENTE

SOCIAL

ENTREVISTADA 10

---- CHEFE

DO SS

FONTE: HORTA. GM. No meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de saúde da Aeronáutica/RJ 2009.

Quanto à função assumida, das profissionais entrevistadas 40% assumem o

cargo de chefia no Serviço Social, desempenhada, significativamente, por

profissionais militares e 60% entre militares e civis têm o cargo de assistente social.

Page 120: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

118

No tocante a atribuição da chefia do Serviço Social compete96: planejar,

organizar, coordenar a controlar as atividades de Serviço Social; assessorar a

Direção do hospital em assuntos de sua especialidade; colaborar nos estudos e

projetos de reforma, adaptação e ampliação das áreas físicas do Serviço Social;

solicitar material necessário para as atividades propostas; planejar, dirigir, coordenar

programas de ensino, pesquisa, treinamento e capacitação para o pessoal de

Serviço Social subordinado à seção; apresentar estatística e relatórios das

atividades desenvolvidas; elaborar o Programa de Trabalho Anual da seção e

supervisionar a execução do mesmo; elaborar a Norma Padrão de Ação (NPA)

sobre as atividades do setor de Serviço Social ou Assistência Social; coordenar a

seleção e a supervisão de estagiários do Serviço Social; preconizar o zelo pelo

cumprimento do Código de Ética dos Assistentes Sociais. É ainda responsável pela

gestão dos recursos orçamentários do Fundo de Assistência Social (FAS) de sua

unidade, assumindo a função de gestor social97.

No que se referem as atribuições das demais assistentes sociais das

unidades de saúde98, a estas cabem: assessorar e auxiliar a chefia nos assuntos

técnicos e administrativos; realizar atendimento aos usuários e ao efetivo nos

setores de (ambulatório, internação, emergência e UTI); participar de reuniões,

seminários, grupos de estudo e pesquisas científicas; manter-se atualizado quanto

aos conhecimentos científicos e técnicos; garantir a privacidade do atendimento

realizado; participar de equipes multidisciplinares e interdisciplinares; efetuar e

atualizar registros estáticos de procedimento relativos à sua atividade; viabilizar por

intermédio de serviços e aquisição de bens para os usuários dos programas e

projetos de ações sociais, no sentido de proteção e prevenção de situações de

vulnerabilidade social.

Diante do exposto, uma questão se apresenta: a relação entre as assistentes

sociais civis e as assistentes sociais militares se dá de forma conflituosa frente à

questão da chefia do Serviço Social Como demonstra os depoimentos que se

seguem:

96 Instrução Reguladora do Serviço Social no SISAU/DIRSA (ICA 160-39/2008) e ICA 163-1/2006/SDEE. 97 Gestor Social é o assistente social ou agente social responsável pela elaboração, implementação e avaliação dos programas e projetos de ações sociais, bem como pela gestão dos Recursos da Assistência Social da Diretoria de Intendência nas Organizações Militares (OM), Cf. ICA 161-1/2008, p.07. 98 ICA 160-39/2008/DIRSA.

Page 121: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

119

“(...) Com certeza existe um “mal estar” mesmo que velado, entre as Assistentes Sociais civis e as Assistentes Sociais militares, e a questão da chefia e tudo mais, não foi superado”. “(...) Os militares temporários, é terrível. Quando entrei não existia esse quadro. Então o militar temporário quando começa a se comprometer com a instituição “veste a camisa” ele vai embora, são 8 a 9 anos somente. Acho prejudicial para o Serviço Social”. “(...) Para mim, é muito complicado, porque sempre a chefia tem que ser de uma assistente social militar? Então a pessoa acabou de sair de uma faculdade, presta um concurso passa e se torna um oficial tenente para chefiar obrigatoriamente, nós com mais de 20 anos de prática profissional. Mesmo nós com toda a nossa experiência e ela vai ser nossa chefe? Isso só acontece aqui. Não tenho estímulo para propor nada”. “(...) Porque não uma civil com mais tempo de experiência não pode ser chefe? São os choques, não necessariamente negativos, pois a questão não é pessoal, mais que dificultam a prática e acarretam em uma falta de estímulo”. “O civil sofre injustiças, o foco para tudo é sempre para o profissional militar”.

O que nos interessa questionar é de que forma essa relação explicitamente

conflituosa afeta o cotidiano da prática profissional do assistente social99 e as

respostas profissionais ante a demanda dos usuários.

A preocupação aqui, é que as assertivas das assistentes sociais civis

sinalizam que as profissionais vinculam a realização de uma prática de qualidade e

articulada aos interesses dos que demandam seus serviços a um espaço de

trabalho ideal (Vasconcelos, 1997), a uma instituição ideal, sem problemas e sem

contradições. Apreendemos que o cotidiano profissional é permeado por conflitos e

contradições, não sendo, portanto, uma particularidade da prática profissional do

assistente social na Aeronáutica, nem somente do assistente social da Aeronáutica.

Recorremos a um exemplo: os Programas de Residência em Serviço Social

nos Hospitais Universitários /HU100. Nestes, os ―recém-chegados‖ assistentes sociais

residentes, são direcionados para atividades determinadas, dando cobertura a

setores-chave dos Hospitais Universitários. Ou seja, profissionais de formação

99

Ressaltamos que as demais categorias profissionais como: médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, psicólogos, nutricionistas; contam com pouco ou nenhum profissional civil em seu quadro funcional. Em sua maioria, os civis são residentes ou, militares da inativa (da reserva remunerada) que retornam como contratados. 100 Como estagiária do Serviço Social do Hospital Universitário da Universidade Federal de Juiz de Fora – HU/UFJF. Vivenciamos, em 1998, um processo de transição entre uma Supervisão de Campo permeada por traços conservadores, para uma Supervisão de Campo emancipatória; plasmada pelo Programa de Residência em Serviço Social do Hospital Universitário da UFJF, onde se onde se reconhecia a autonomia e a plena expansão dos indivíduos sociais. Nesse espaço, com a criação em 1997 do referido Programa, os residentes (denominados R1) assumiriam a responsabilidade pela supervisão de campo dos estagiários da Faculdade de Serviço Social. O que gerou um conflito com as assistentes sociais (servidoras civis, com mais de 20 anos de inserção) que até então, eram as responsáveis pela supervisão de estágio.

Page 122: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

120

recente em Serviço Social assumem atividades, até então, atribuídas aos

profissionais mais antigos como101: a supervisão de estagiários de Serviço Social; a

responsabilidade em participar de projetos existentes nos ambulatórios dos

hospitais. O que possibilita a troca de experiências; o amadurecimento e a

construção de novas práticas e saberes da profissão.

Ainda que esse exemplo não faça parte do conflito apresentado pelas

assistentes sociais da Aeronáutica, este nos esclarece quanto à complexidade das

questões que permeiam o cotidiano da prática profissional.

Porém, não podemos desconsiderar que ao ingressar no quadro de oficiais

temporários, as assistentes sociais passam a assumir, ainda que por tempo

determinado, as prerrogativas da profissão militar. Preconiza o Art.36 do Estatuto

Militar: O oficial é preparado, ao longo da carreira, para o exercício de funções de

comando, de chefia e de direção.

Na verdade, o conflito está posto pela instituição. É fato, que uma instituição

fundamentada nos princípios da hierarquia e da disciplina com um funcionamento

que se aproxima do modelo de instituição ―fechada‖, positivista e conservadora,

diversas contradições e limites estão presentes na ação profissional imanentes à

inserção do Serviço Social nas relações sociais capitalistas inscritas na divisão

sociotécnica do trabalho. Entretanto, o assistente social não pode cair numa postura

fatalista da profissão, de que nada pode ser feito dentro das ―amarras das

instituições ‗fechadas‘ e burocráticas‖.

Reportando-nos à questão da chefia do Serviço Social, encontramos um

duplo e contraditório movimento, a saber: nas disposições gerais da ICA 163-

1/2006/COMAER/SDEE “os setores de Serviço Social ou de Assistência Social

deverão ser chefiados por Assistentes Sociais militares ou civis”. Portanto,

neste documento, a chefia não é considerada exclusiva ao assistente social militar

(vide quadro 2). No entanto, contrariando esta, a ICA 160-39/2008/COMAER/DIRSA

informa que “o Serviço Social é constituído de pessoal militar e civil com graduação

em Serviço Social, sendo a chefia cargo privativo de oficial assistente social de

maior grau hierárquico do efetivo da OSA”.

Ante o exposto, faz-se necessário, o assistente social (re)pensar a forma de

organização do Serviço Social nos serviços de saúde da Aeronáutica/RJ,

101 Programa de Residência em Serviço Social da Faculdade de Serviço Social da Universidade Federal de Juiz de Fora (MG).

Page 123: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

121

impulsionando e tornando-se em um desafio aos assistentes sociais (civis ou

militares) comprometidos com a efetivação do Projeto Profissional do Serviço Social,

e que buscam alargar os horizontes e apreender a profissão no movimento das

classes e da própria sociedade capitalista. Como sublinha Iamamoto (2007, p. 227):

―(...) O projeto profissional é histórico e dotado de caráter ético-político, que

eleva esse projeto a uma dimensão técnico-profissional. Isto porque ele

estabelece um norte, quanto à forma de operar o trabalho cotidiano,

impregnando-o de interesses da coletividade‖.

Não podemos deixar de enfatizar que, o Código de Ética Profissional do

Assistente Social se destaca dos demais102 na “opção por um projeto profissional

vinculado ao processo de construção de uma nova ordem societária, sem

dominação-exploração de classe, etnia e gênero.

Ora, sublinhamos que para além da discussão da chefia e o status deste

cargo, entendemos que é fundamental para o assistente social o aprimoramento

profissional103 constante (ultrapassando os anos de formação acadêmica). Para que

este esteja munido de um referencial teórico-metodológico (Sant‘ana, 2000) que lhe

permita apreender a realidade numa perspectiva de totalidade, e construir

mediações entre o exercício profissional comprometido e os limites dados pela

realidade de atuação.

Na assertiva de Guerra (2005)104, no âmbito instrumental da profissão há que

se ter uma racionalidade (inclusiva, ontológica e crítica) que inspire nos profissionais

a coragem para não retroceder, e proporcione a qualificação necessária para o enfrentamento das reformas (neoliberais social-democratas); para isto o estabelecimento de alianças a democracia e os direitos humanos na sua expressão mais radical e o amplo acesso aos bens e serviços sociais, enquanto aspirações das classes trabalhadoras. Mas deve ser também uma racionalidade que possibilite conhecer os fundamentos da ordem burguesa e suas metamorfoses; as demandas emergentes, os objetos de intervenção (para o que a atitude investigativa é condição); estabelecer os meios mais adequados para intervir sobre eles; avaliar a correlação de forças do momento, a fim de evitar incorrer em falsos dilemas quanto investir em falsas alternativas. Para tanto, há que

102 Para a discussão sobre os Códigos de Ética dos profissionais de saúde, cf. Vasconcelos [et al]. Profissões de saúde, ética profissional e seguridade social In: Bravo. Maria Inês [et al], (orgs). Saúde e Serviço Social. São Paulo: Cortez Editora; Rio de Janeiro: UERJ, 2004. 103 O Código de Ética Profissional do Assistente Social no Título II – Dos direitos e das responsabilidades gerais do Assistente Social - Art. 2º informa que constitui direito do assistente social o aprimoramento profissional de forma contínua, colocando-o a serviço dos princípios estabelecidos pelo Código. 104 Para um maior aprofundamento veja GUERRA, Y.O Serviço Social frente à crise contemporânea: demandas e perspectivas. In Revista Ágora: Políticas Públicas e Serviço Social, Ano 2, nº 3, dezembro de 2005. Disponível em <http://www.assistentesocial.com.br> acesso em 29 de novembro de 2009.

Page 124: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

122

se ultrapassar a racionalidade formal-abstrata das correntes tecnocráticas, a visão tarefista-burocrática, bem como combater os subjetivismos, dos quais as vertentes pós-modernas são legatárias, que visam psicologizar as respostas profissionais. Ambos são produtos do pensamento conservador burguês e dele se sustentam.(grifos nossos).

GGrrááffiiccoo 88 -- PPaarrttiicciippaaççããoo eemm eennttiiddaaddeess ddaa CCaatteeggoorriiaa Assistentes Sociais SSARJ

30%

70%

sim

não

Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de

saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.

Frente a essas questões, fomos saber sobre a participação das assistentes

sociais em entidades da categoria. Das profissionais entrevistadas, 70% informam

não participar de entidades da categoria e apenas 30% declaram participar.

Destaca-se que o baixo percentual de participação política das assistentes

sociais não se apresenta como uma particularidade da Aeronáutica. Os dados

apresentados dos nos permitem traçarmos um paralelo com a pesquisa realizada

pelo CFESS em 2005105. A pesquisa mostra que a região Sudeste encontra-se com

um menor percentual de profissionais que participam de atividades políticas.

105 Disponível em: <http: www.cfess.org.br/pdf/perfilas_edicaovirtual2006.pdf> acesso em 29 de novembro de 2009.

Page 125: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

123

GGrrááffiiccoo 99 -- TTrrooccaarriiaa ddee eemmpprreeggoo Assistentes Sociais SSA/RJ

10%

90%sim

não

Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de

saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.

Quando perguntadas sobre a hipotética possibilidade de trocar de emprego

tendo o mesmo salário, 90% das assistentes sociais responderam que não trocariam

de emprego. Alegam conhecer a rotina institucional; estar acostumado com a

instituição, gostar do trabalho; ter qualidade de vida no trabalho; ambiente

profissional; local de trabalho de qualidade. E, apenas uma assistente social

respondeu que trocaria de emprego por considerar ser necessária a experiência em

outra área de atuação do Serviço Social. Vejamos alguns depoimentos:

“Sim, trocaria de emprego, não pela Aeronáutica, mas pela possibilidade de vivência em outra área de atuação do Serviço Social, por exemplo, o judiciário”. “Não trocaria, gosto do que faço. (...) Aqui é um hospital de grande porte, tem tecnologia de ponta, bons profissionais, tem qualidade de vida no trabalho, e porque eu gosto da área da saúde, na verdade, eu adoro”. “Não, permaneceria aqui. Já conheço a rotina da instituição”. “Não. O ambiente de trabalho é seguro, tranqüilo e organizado, não sei se em outro local de trabalho seria assim”. “Não tem problema nenhum em trabalhar aqui, muito pelo contrário , aqui é um ambiente profissional de qualidade”.

É interessante observarmos que as questões mais singulares que vigoram no

cotidiano das instituições militares como: a racionalidade burocrática; a autoridade

militar; a disciplina e a hierarquia, não comparecem nos depoimentos como

elementos negativos e de estímulo a troca de emprego.

Page 126: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

124

GGrrááffiiccoo 1100 -- CCaarrggaa HHoorráárriiaa ccuummpprriiddaa Assistentes Sociais SSA/RJ

70%

30%

20 horas

30 horas

Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.

No tocante à carga horária, a maioria das assistentes sociais entrevistadas

(70%) tem uma carga de 20 horas semanais e apenas 30% tem uma carga horária

de 30 horas semanais. As profissionais estão inseridas na instituição trabalhando em

média 4 horas diárias entre 4 e 5 vezes por semana106, em constante contato com

os usuários, o que pode contribuir para a realização de uma prática planejada e

avaliada nas suas conseqüências, comprometida com os interesses dos usuários.

GGrrááffiiccoo 1111 -- PPoossssuuii oouuttrroo vvíínnccuulloo eemmpprreeggaattíícciioo nnaa áárreeaa ddee SSeerrvviiççoo SSoocciiaall Assistentes Sociais SSA/RJ

30%

70%

sim

não

Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.

106 Para as assistentes sociais militares é obrigatório concorrer a uma escala mensal de Oficial de Dia, atribuição aos tenentes e aspirantes a oficial de todos os quadros profissionais, conforme prevê Art.41 do Estatuto dos Militares. Nessa atribuição de 24 horas de serviço, dentro da instituição, é proibido ausentar-se da unidade até o final do serviço, caso ocorra à saída da unidade, configura-se como crime militar. O então Oficial de Dia (seja o assistente social ou a psicóloga, por exemplo) é o responsável pela segurança da organização e representante do Comandante na ausência deste e do seu substituto. É um serviço armado, de segurança e disciplina, realizado por uma equipe de sargentos, cabos e soldados ao comando do Oficial de Dia.

Page 127: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

125

Os dados do gráfico mostram que 70% das profissionais entrevistadas

informaram não ter e 30% informam ter outro vínculo empregatício. Esse resultado

remete a algumas questões, principalmente, se cruzarmos os dados com a questão

da carga horária, indicada linhas atrás: num primeiro aspecto, podemos sinalizar

que, apesar de serem profissionais de saúde e, poderem acumular dois cargos na

saúde, conforme Resolução CFESS nº383/1999, as profissionais não o fazem. O

que remete à questão salarial satisfatória, bem como satisfatória a cobertura do

sistema de seguridade social da Aeronáutica.

GGrrááffiiccoo 1122 -- SSaattiissffaaççããoo ccoomm aa pprrooffiissssããoo Assistentes Sociais SSA/RJ

40%

30%

30%

sim

não

sim/não

Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de

saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.

O gráfico 12 mostra que 40% das entrevistados estão satisfeitas com a

profissão, 30% diz não estarem satisfeitas e 30% apresentam informações

contraditórias, sim e não. Observemos como as profissionais se manifestam a

respeito disso:

“(...) Hoje posso dizer que estou satisfeita como assistente social, eu faço o que eu quero, posso atender aos usuários elucidando-os quanto as seus direitos. Enfim, tenho tempo para isso. Antigamente eu tinha que fazer muita coisa junto, como prestação de contas, estatísticas, ambulatório”. “(...) Sinceramente, hoje posso dizer que sim, não tenho dificuldade de exercer minha prática porque, tenho liberdade para atuar, tenho espaço físico satisfatório”. “Sim. È a profissão que escolhi, nunca tive crise quanto a isso”. “Sim. Enquanto eu puder colocar meu exercício para intervir nas questões sociais, buscando formas e alternativas para garantir direitos, se puder estar realizando isso, sim estou satisfeita com a profissão”.

Page 128: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

126

“Não estou satisfeita com Assistente social, o salário é baixo, não compensa se comparado ao que a gente desempenha no meu caso, todas as formações que fiz na psicanálise e na terapia sistêmica. É uma insatisfação muito grande”. “A minha cota de Assistente Social terminou, isso não faz com que eu atenda mal, se pudesse optaria por me aposentar hoje e trabalhar em outra área, mas terei perda salarial. Já deu o que tinha que dar, são 25 anos de prática”. “Atualmente, eu gostaria de mudar de área, estou desestimulada, até pela condição que nós servidores civis nos encontramos, você está no final de carreira. Eu não vou a lugar nenhum mais, há 10 anos em final de carreira. Não existe estímulo no cotidiano”. “Sim e não. Se eu pensar no campo profissional diria que sim, conquistei aqui no hospital uma imagem muito positiva do Serviço Social, me sinto realizada, principalmente no contato com os usuários. Mas se eu pensar no pessoal, diria que não estou satisfeita. Fico esgotada, você depende de tudo, da resposta do outro setor para dar andamento a sua requisição. Saio daqui sem querer fazer mais nada, esse hospital suga a gente, eu tenho casa, marido e filho, acabo por não ter paciência pra eles, financeiramente não preciso trabalhar. “Sim e às vezes não, depende. Não sei explicar muito bem, gosto do eu faço, mas a burocracia daqui me irrita profundamente”.

As indicações nos possibilitam refletir que, as profissionais que responderam

positivamente partem de sua experiência pessoal vinculando-a de forma implícita a

questão da autonomia profissional. Essa autonomia pode ser percebida quando a

profissional relata, de forma satisfatória que, no interior das unidades de saúde,

direciona suas ações a partir das demandas que ele considera suas. As que se

expressaram tanto positiva como negativamente: o positivo é colocado na

experiência pessoal, e o negativo na racionalidade burocrática.

Cabe enfatizar, que a questão da autonomia profissional está expressa no

Código de Ética Profissional do Assistente Social no Capítulo II – Das relações com

as Instituições Empregadoras, conforme sinaliza o Artigo 7º, em alguns de seus

incisos. Vejamos:

a) dispor de condições de trabalho condignas seja em entidade pública

ou privada, de forma a garantir a qualidade do exercício profissional;

b) ter livre acesso à população usuária;

c) ter acesso as informações institucionais que se relacionem aos

programas e políticas sociais , e sejam necessárias ao pleno exercício das

atribuições profissionais;

d) integrar comissões interdisciplinares de ética nos locais de trabalho

do profissional, tanto no que se refere à avaliação da conduta profissional,

como em relação às decisões quanto às políticas institucionais.

Page 129: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

127

GGrrááffiiccoo 1133 -- SSaattiissffaaççããoo ccoomm aa pprrooffiissssããoo XX OOuuttrroo vvíínnccuulloo eemmpprreeggaattíícciioo Assistentes Sociais SSA/RJ

20%

40%

20%

20%

satisfeita com a

profissão/ tem outro

vínculo empregatício

satisfeita com a

profissão/ não tem

outro vínculo

empregatício

insatisfeita com a

profissão/ tem outro

vínculo empregatício

insatisfeita com a

profissão/ não tem

outro vínculo

empregatício

Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.

Ao cruzarmos os dados do gráfico 11 com o gráfico 12, podemos observar

que 40% das profissionais estão satisfeitas com a profissão e não possui outro

vínculo empregatício. Por vezes, durante a entrevista107, a maioria das as assistentes

sociais consideraram que o Serviço Social na Aeronáutica, possui uma boa e

adequada infra-estrutura para o desenvolvimento das atividades, dispondo de

recursos e materiais (computadores com acesso a rede internet; aparelhos de fax;

materiais de escritório; telefones para ligações externas; materiais diversos de

escritórios, móveis adequados), bem como um espaço físico que propicia o

atendimento sigiloso aos usuários.

Iamamoto (1998, p. 94), ao falar em prática profissional, considera que ela

não deve ser considerada isoladamente, mas em seus condicionantes sejam eles

internos – os que dependem do desempenho do profissional – ou externos –

determinados pelas circunstancias sociais nas quais se realiza a prática do

assistente social. Os primeiros são geralmente referidos as competências do

assistente social (acionar estratégias e técnicas); capacidade de leitura da realidade

conjuntural, a habilidade no trato das relações humanas, a convivência numa equipe

interprofissional. Os segundos condicionantes abrangem um conjunto de fatores que

não dependem exclusivamente do sujeito profissional, desde as relações de poder

institucional, os recursos colocados à disposição para o trabalho pela instituição; as

107 Vide ANEXO 2, Roteiro de Observação.

Page 130: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

128

políticas sociais específicas, a realidade social da população usuária dos serviços.

Em síntese, para a autora, a prática profissional é vista como a atividade do

assistente social na relação com o usuário, os empregadores e os demais

profissionais.

Destacamos que das (10) dez assistentes sociais entrevistadas, uma

profissional vincula sua negativa à questão do não reconhecimento por parte da

instituição quanto ao seu aprimoramento profissional dada a sua formação

especializada na abordagem clínica e na prática terapêutica, autodenominada

pelos seus executores como Serviço Social Clínico108. O que sinaliza, a priori, que

essa questão parte somente desta profissional. Contudo, ao falar sobre os projetos

desenvolvidos pelo Serviço Social, a profissional informa participar do Projeto de

atendimento em terapia de casal e de família.

Sobre essa questão, cabem algumas reflexões. O envolvimento de um

pequeno segmento de assistentes sociais no campo das terapias, inscritas na zona

limítrofe entre o Serviço Social e a Psicologia - que vêm se dedicando à terapia

familiar, terapia organizacional, ao psicodrama, à bioernegética, e mesmo à

psicanálise -, insistem no reconhecimento do campo terapêutico enquanto ampliação

do espaço ocupacional do assistente social. Como assevera Iamamoto109

―(...) Qualificado como Serviço Social Clínico, é anunciado como re-significação do Serviço Social de Casos, apoiado numa ―visão holística do ser humano‖, que possibilita adquirir novos instrumentos que permitem compreender e atuar com grupos de famílias, considerando que essa atuação beneficiará os indivíduos (...) Essa esteira semelhante tem-se a ‗Socioterapia‘, apresentada por parte de seus divulgadores como uma ‗nova perspectiva para o Serviço Social‘ (...) antiga proposta, que ressurge hoje com uma nova maquiagem, do velho Serviço Social dos anos 1970, derrotado e superado nas décadas de 1980 e 1990, pelo movimento de renovação crítica do Serviço Social latino-americano, o qual se encontra na base do projeto ético-político atual da profissão (...)o que supõe minar o projeto profissional nas suas bases teóricas, éticas e políticas, por parte de um movimento contra-hegemônico que hoje marca presença na categoria profissional‖ (pp.43-44).

108 Esta proposição é decorrente de um movimento composto de um grupo de assistentes sociais com formação especializada em diversas abordagens clínicas: holísitca, bioenergética, psicodrama, terapia familiar sistêmica, transpessoal. É um grupo heterogêneo que reivindica das entidades da categoria e unidades de ensino, o reconhecimento do caráter clínico ou terapêutico do exercício profissional. Cf. Parametros para a atuação de Assistentes Sociais na Saúde (versão preliminar), Brasília, março de 2009. Disponível em http://www.cfess.org.br Acesso em 20/06/2009. 109 A autora apresenta artigo, no qual realiza uma abordagem sobre Projeto Profissional, Espaços Ocupacionais e Trabalho do Assistente Social na Atualidade na publicação “Atribuições Privativas do (a) Assistente Social - Em Questão, COFI/CFESS, 2002, pp.13-46.

Page 131: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

129

Cabe enfatizar que, em Parecer JURÍDICO N.º 16/ 08 o CFESS considera

que as Práticas Terapêuticas ou o Serviço Social Clínico, não estão situados no

objeto da profissão, sendo conseqüentemente, matérias estranhas a profissão de

Serviço Social.

GGrrááffiiccoo 1144 -- NNeecceessssiiddaaddee ddee pprreeppaarraaççããoo eessppeecciiaall ppaarraa ssuuppeerrvviissiioonnaarr eessttaaggiiáárriioo Assistentes Sociais SSA/RJ

80%

20%

sim

não

Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de

saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.

Outro dado relevante a ser considerado é a atual inexistência de campos de

estágio de Serviço Social nas instituições pesquisadas. As profissionais argumentam

estarem assoberbados e sem tempo disponível para prestar supervisão. Frente a

essa questão, fomos saber se as assistentes sociais consideram ser necessária uma

formação específica para prestar supervisão em Serviço Social.

Os dados mostram que grande parte das profissionais entrevistadas (80%)

considera que é necessária uma preparação específica para supervisionar; já outro

grupo de 20% considera não ser necessário. Vejamos como as profissionais se

expressaram:

“Tem que ter uma atualização, é muito complexo prestar supervisão”.

“Tem que estar qualificado se aprimorando”.

“(...) Acho muito positiva a troca com o estagiário, mais já aconteceu de não saber o que discutir com ele, por isso acho necessário se preparar melhor”.

“(...) Precisa de uma metodologia específica, não é tão simples assim”.

“(...) Aqui é muito complicado ter estagiário, a demanda é muito grande e ainda você tem que ter tempo para tomar conta de estagiário, às vezes fazer tudo de novo, pois

Page 132: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

130

eles fazem errado e você tem explicar e esmiuçar tudo. Acho que deveria ter um assistente social que goste de supervisionar e ficar só por conta disso”.

“Acho que não. Lógico que demanda mais atenção, tempo, paciência e disponibilidade, mas se você é assistente social o aluno é do Serviço Social, como você não vai saber supervisionar? È inerente, não é?”

“Não, não precisa de nenhuma preparação especial, talvez atualização. Acho que você não deve se intimidar tem estagiário que gosta de te colocar na parede. Eles estão mais fresquinhos da teoria, mas sou eu que tenho a prática”.

Destacamos que as profissionais não mencionam sobre o significativo papel

do estágio no processo de formação profissional que representa essencialmente ao

aluno uma possibilidade de aproximação da realidade cotidiana da instituição e dos

indivíduos sociais e a investigação mediada por conhecimentos teórico-

metodológicos que orientam o exercício profissional do assistente social. As

assistentes sociais entrevistadas não vislumbram a possibilidade de uma profícua

articulação entre instituição - unidade de ensino, através do estágio supervisionado.

A supervisão de estágio em Serviço Social é uma das atribuições do

profissional assistente social (Código de Ética) . Exige, portanto, profissionais cada

vez mais comprometidos com a contínua indagação da realidade, desenvolvendo

um senso crítico.

O grupo de assistentes sociais alega vivenciar entraves burocráticos e

administrativos decorrentes do processo em firmar convênio com as unidades de

ensino, devido a falta de incentivo das próprias instituições em que atuam,

inviabilizando uma proposta de política de estágio. Expliquemos melhor: as

instituições de saúde da Aeronáutica através de convênio com as Unidades de

Ensino oferecem vagas para estágio obrigatório, porém, o estágio não é

remunerado, não disponibiliza alimentação ou transporte. No entanto, observa-se

que, apesar das dificuldades apresentadas pelas instituições de saúde, outras áreas

profissionais (a exemplo da Psicologia, Nutrição, Fisioterapia, Odontologia,

Enfermagem e Medicina) possuem estagiários em atuação.

Não desconsideramos que há uma tendência de identificar o estagiário como

o profissional da instituição - campo de estágio, ficando assim responsável pela

condução de atividades que nem sempre são condizentes com a sua condição de

aluno. Ou, em algumas realidades, considerar o estagiário como mão-de-obra

barata, fazendo parte do quadro funcional da instituição e, portanto, sendo

subordinado às suas exigências.

Page 133: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

131

Porém, no Art.4 do Código de Ética dos Assistentes Sociais é vedado:

(...) permitir ou exercer a supervisão de aluno de Serviço Social em

Instituições Públicas ou Privadas que não tenham em seu quadro

assistente social que realize acompanhamento direto ao aluno estagiário.

Entendemos, portanto, que a abertura de campos de estágios em Serviço

Social, deverá considerar: a existência de um assistente social responsável no

campo; e a existência de um plano de trabalho do Serviço Social na instituição; e a

qualidade do trabalho desenvolvido.

A participação na formação profissional através da criação de campo de

estágio e a supervisão de estagiários permitem um enriquecimento profissional

através da troca de saberes entre discentes e supervisores, além de possibilitar uma

articulação com as unidades de formação acadêmica, fundamental para o

desenvolvimento destas atividades.

GGrrááffiiccoo 1155 -- CCoonnhheeccee oo CCóóddiiggoo ddee ÉÉttiiccaa PPrrooffiissssiioonnaall ddoo SSeerrvviiççoo SSoocciiaall Assistentes Sociais

Serviços de Saúde da Aeronáutica/RJ

50%50%

sim

não

Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.

Ao serem perguntados se conhecem o Código de Ética de 93, podemos

perceber (Gráfico 15), que metade das assistentes sociais possui, conhece e

manuseia, ainda que eventualmente, o Código de Ética Profissional. Há que se

considerar que a outra metade das assistentes sociais, desconhece ou não tem o

Código como referência.

Page 134: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

132

Ora, considera-se que as atribuições e competências dos(as) assistentes

sociais, sejam aquelas realizadas na saúde na Aeronáutica ou em outro espaço

sócio-ocupacional, são orientadas e norteadas por diretos e deveres constantes no

Código de Ética Profissional e na Lei de Regulamentação da Profissão e que

requisitam do(a) profissional algumas competências gerais que são fundamentais à

compreensão do contexto sócio-histórico em que se situa sua intervenção, a saber:

Apreensão crítica dos processos sociais de produção e reprodução das relações sociais numa perspectiva de totalidade; Análise do movimento histórico da sociedade brasileira, apreendendo as particularidades do desenvolvimento do capitalismo no país e as particularidades regionais; Compreensão do significado social da profissão e de seu desenvolvimento sócio-histórico, nos cenários internacional e nacional, desvelando as possibilidades de ação contidas na realidade; Identificação das demandas presentes na sociedade, visando a formular respostas profissionais para o enfrentamento da questão social, considerando as novas articulações entre o público e o privado (ABEPSS, 1996).

São essas competências que permitem ao profissional realizar a análise

crítica da realidade, para, a partir daí, estruturar seu trabalho e estabelecer as

competências e atribuições específicas necessárias ao enfrentamento das situações

e demandas sociais que se apresentam em seu cotidiano. (CFESS, 2009).

Ademais, duas preocupações nortearam a análise e a produção do Código de

Ética de 1993, a saber: torná-lo um instrumento efetivo no processo de

amadurecimento político da categoria, bem como um aliado na mobilização e

qualificação dos assistentes sociais diante dos enormes desafios e demandas da

sociedade brasileira, ou seja, urgia transformá-lo num mecanismo efetivo de defesa

da qualidade dos serviços prestados pelos assistentes sociais e constituí-lo como

um instrumento eficaz de defesa do exercício profissional, fornecendo respaldo

jurídico à profissão. Com atesta Barroco (2004, p.34):

(...) a ética não se esgota na afirmação do compromisso ético-profissional. É

preciso que o compromisso seja mediado por estratégias concretas,

articulando à competência teórico/técnica e à capacidade de objetivá-las

praticamente por meio dos direitos sociais.

Page 135: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

133

GGrrááffiiccoo 1166 -- CCóóddiiggoo ddee ÉÉttiiccaa -- DDaa rreellaaççããoo ccoomm ooss uussuuáárriiooss

RReeccoommeennddaaççããoo qquuee jjuullggaa mmaaiiss iimmppoorrttaannttee Assistentes Sociais SSA/RJ

36%

36%

14%

7%7%

sigilo

profissional

democratizar

informações

não discriminar

Não sabe

responder

respeito a

dignidade

Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.

Com relação às recomendações do Código de Ética de 93 que os

entrevistados atribuem maior importância na relação do assistente social com os

usuários, 36% assinalam a questão do sigilo profissional, 36% destacam a

democratização de informações, 14% pontua a não discriminação e 7% destacam o

respeito à dignidade, somente 7% não soube responder (Gráfico15).

Destaca-se que, no momento da entrevista, nenhum profissional consultou o

Código de Ética ao apontar as recomendações, apesar de algumas interpretações

confusas no tocante aos direitos e deveres profissionais. Dois assistentes sociais, ao

justificarem sua opção, apresentam um descompasso com aquelas constantes no

Código em vigor. Vejamos os depoimentos:

“(...) A questão da Ética e do sigilo, basicamente isso, estar bem consigo para atende bem o outro”. “Procuro respeitar a dignidade da pessoa humana, defendendo seus direitos”. “Procuro democratizar as informações junto aos usuários e seus familiares tendo em vista o acesso aos serviços de saúde”.

“Acho que é importantíssimo democratizar as informações que tenho acesso para os usuários, procuro estimular a participação deles nos programas da instituição, do bairro que moram, das políticas voltadas para os idosos”.

“Indico a não discriminação; às vezes nos centramos somente na questão do sigilo, e esquecemos-nos de não discriminar. Às vezes atendo usuários que trazem á questão do HIV, da homossexualidade. A questão do sigilo está lá, mas tem profissional que discrimina evita falar com aquele usuário, diz que está ocupado, ou atende rápido. Já ouvi profissional dizer que „fulano‟ está infectado porque é „sem vergonha‟”.

Page 136: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

134

“Democratizar as informações e o acesso aos programas com a devolução de informações obtidas em pesquisa junto ao usuário”.

É interessante observarmos que, apesar de 50% dos assistentes sociais

informarem desconhecer ou não manusear o Código de Ética (gráfico 16), apenas

7% das entrevistadas (gráfico 17), não soube responder sobre as recomendações

do Código na relação com os usuários. Ora, será que a prática das assistentes

sociais se objetiva em ações espontâneas e instintivas, partindo da experiência

pessoal do profissional, sem referências teórico-metodológicas?

Destaca-se que 36% das assistentes sociais (gráfico 17) assinalam a questão

do sigilo profissional como uma das recomendações do Código que julgam

importantes. No Código, o sigilo profissional é uma questão que está para além do

dever profissional, pois, é considerado um direito no sentido de proteger o usuário

de tudo aquilo que o profissional tenha conhecimento, que só poderá ser quebrado

quando trouxer prejuízo aos usuários ou à coletividade.

Quanto à democratização de informação, 36% das entrevistadas (gráfico 17)

afirmam sua importância. No entanto, o Código de Ética considera como dever do

assistente social democratizar as informações e o acesso aos programas

disponíveis no espaço institucional, como um dos mecanismos indispensáveis à

participação dos usuários. A socialização da informação é determinante numa

prática que priorize as demandas da população usuária. E socializar a informação

implica uma competência teórica, política, ética e técnico –operativa.

Uma importante contribuição é dada por Vasconcelos (1997) para pensarmos

sobre prática reflexiva. A autora informa que uma prática é reflexiva quando esta

envolve dois sujeitos sociais – usuário/profissional -, e que contribui na politização

das demandas apresentadas ao Serviço Social, ao socializar informações

necessárias e fundamentais quando da viabilização dessas demandas, na busca da

superação da práxis cotidiana, a partir de sua análise, desvendamento, explicação,

interpretação, fortalecendo os envolvidos no processo enquanto sujeitos políticos

coletivos.

Page 137: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

135

3.3.2 Referências de conhecimento

GGrrááffiiccoo 1177 -- AAuuttoorreess ddee RReeffeerrêênncciiaa Assistentes Sociais SSA/RJ

6%

6%

3%

6%

9% 6% 3%

9%

3%

3%

3%

9%11%

9% 14%

M ARILDA IAM AM OTO

LUDM ILA CAVALCANTI

JOSE PAULO NETTO

ILM A REZENDE

ANITA LIBERA NERY

M ARIA DO CARM O CARVALHO

SPOSATI

YOLANDA GUERRA

ANA VASCONCELOS

ELAINE BHERING

ANA ELIZABETH M OTA

M ARIA LÚCIA BARROCO

ANDRE DARTIGUES

M ARIA DO CARM O BRANT

M ARIA INES BRAVO

Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.

GGrrááffiiccoo 1188 -- AAuuttoorreess ddee RReeffeerrêênncciiaa Assistentes Sociais SSA/RJ

0 1 2 3 4 5

M ARILDA IAM AM OTO

LUDM ILA CAVALCANTI

JOSE PAULO NETTO

ILM A REZENDEANITA LIBERA NERY

M ARIA DO CARM O

SPOSATI

YOLANDA GUERRAANA VASCONCELOS

ELAINE BHERING

ANA ELIZABETH M OTAM ARIA LÚCIA

ANDRE DARTIGUES

M ARIA DO CARM O

M ARIA INES BRAVO

Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.

O estudo buscou identificar quais são os autores de referência para a prática

das assistentes sociais entrevistadas. Podemos observar que 91% dos profissionais

têm como referência autores progressistas110 do Serviço Social, 3% tem como

110 Pautamos-nos na assertiva de Vasconcelos (2002), que considera Autores Progressistas, aqueles que buscam uma ―ruptura com o histórico conservadorismo do Serviço Social‖. Como afirma Netto, essa ruptura não significa como estamos vendo, superação do conservadorismo/reacionarismo no interior da categoria profissional, mas que ―posicionamentos ideológicos e políticos de natureza crítica e/ou contestadora em face da

Page 138: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

136

referência autor de outra área do saber e apenas 3% indica o autor André Dartigues

que propõe a discussão da fenomenologia na contemporaneidade. O interessante é

que esse autor foi citado como referência por um profissional formado no ano de

1996 em unidade de ensino pública.

Contudo, os dados indicam que a maioria dos assistentes sociais busca um

aprofundamento do debate a respeito da questão social, da prática profissional e de

uma leitura crítica da realidade social. Por vezes, durante a entrevista, alguns

profissionais mostram preocupação com o “como fazer” e de forma implícita

demonstram buscar autores que apresentem a famosa “receita do bolo” da prática

profissional. Outros sinalizam buscarem autores dos quais tiveram contato na

graduação. Vejamos os depoimentos:

“Gosto de autores que são objetivos e discutem a prática, para que eu possa realmente ter uma base”. “Atualmente procuro autores que trazem a discussão de estudo social, laudo e parecer social”. “(...) No momento, não tenho nenhuma referência, já tive (...) Iamamoto. “Tenho gostado muito de ler o André Dartigues, ele discute fenomenologia, acho que é uma leitura de fácil compreensão, mas quando penso em referência, Marilda (...) a faculdade tende a rotular o aluno, tem que ler esse ou aquele autor (...) tenho a Marilda como norte”.

Destaca-se que das profissionais entrevistadas 14% tem como referência de

conhecimento Marilda Iamamoto, 11% tem como referência José Paulo Netto e 9%

Maria Inês Souza Bravo (gráfico 18 e 19).

Vasconcelos (2002, p. 36), a partir da leitura e apropriação da produção

teórica disponível, prioriza as contribuições de Iamamoto e de Netto como principais

referências teóricas, considerando estes, dentre os autores de Serviço Social, os

que desde o início de suas produções, tomaram a teoria social de Marx como

referência, sem se afastarem dos seus aspectos fundantes: a teoria valor trabalho, o

materialismo histórico e dialético e a perspectiva da revolução. Na saúde, a autora

recorre a Bravo como a única produção de peso do Serviço Social.

O que não significa, necessariamente, que as profissionais entrevistadas ao

afirmarem ter como referência autores progressistas do Serviço Social, assumem um

compromisso ético-político proposto pela direção estratégica da profissão.

ordem burguesa conquistaram legitimidade para se expressarem abertamente‖ com democratização das relações no interior da categoria e legitimação do direito à diferença ideo-política (Netto, 1996, p.111).

Page 139: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

137

GGrrááffiiccoo 1199 Assistentes Sociais SSA/RJ

IImmppoorrttâânncciiaa ddaa CCoonnssttiittuuiiççããoo FFeeddeerraall ddee 11998888 ppaarraa aa pprrááttiiccaa

70%

30%

sim

não

Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de

saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.

A pesquisa buscou saber ainda, se os profissionais consideram a Constituição

Federal de 1988, importante para a prática do assistente social. A maioria, 70% dos

entrevistados assinala a importância da Constituição para a prática do assistente

social enquanto um instrumento legal, marco na conquistas de direitos e destaca a

adoção da assistência social como política pública. Apenas 30% não a consideram

importante ou não souberam responder. Seguem os depoimentos:

“Considero a Constituição de 88 um marco dos direitos”.

“Sim. trabalhamos com a viabilidade de direitos, a Constituição é a lei fundamental do país”.

“Penso que sim. Consagrou o direito a ter direitos.

“Com certeza. Elevou a política de assistência social ao patamar de política pública”.

“Sim. (...) na época da aprovação da Constituição, foi um movimento de muita força no país, trouxe muitas mudanças importantes, mais que nem sempre são respeitadas (...) para o assistente social que trabalha com os usuários, trabalhadores, sem acesso a determinados direitos, é fundamental”.

“Sim. Junto com a saúde e a previdência social a assistência social, com a Constituição de 88 passou a compor o tripé da seguridade social. Não é caridade é política pública”.

“Tem sua importância sim. Garantiu uma série de direitos, embora alguns não sejam respeitados, mais é um instrumento de defesa dos cidadãos”.

“Não me lembro de nada da constituição. Sinceramente, a resposta é não me recordo e não sei responder”.

“Eu acho que muito pouco”.

“Não sei responder sobre isso”.

Page 140: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

138

GGrrááffiiccoo 2200 -- CCoonncceeppççããoo ddee SSaaúúddee Assistentes Sociais SSA/RJ

70%

30%

Como direito - Constituição de 1988 OrganizaçãoMundial de Saúde

Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.

No que se refere à concepção de saúde, identificamos que 70% expressa à

saúde como um direito e dever do Estado, resultante da qualidade e condição de

vida e de trabalho dos cidadãos, conforme postula a Constituição de 1988, enquanto

30% assumem de forma explícita e confusa a concepção da Organização Mundial

de Saúde/OMS. Observemos como se expressam:

“Não somente a ausência de doença, mais também a condição em que o cidadão vive”. “Promoção da saúde”. “Saúde é tudo, são vários fatores, um conceito ampliado, não é simplesmente ausência de doença, é o mental, o físico, o social, o afetivo, o emocional”. “É tudo. não ter doença, ter qualidade de vida, de moradia, saneamento básico, segurança”. “É qualidade de vida, de trabalho, de habitação”. “Um conceito ampliado, conforme firmado na Conferência de Saúde de 86, não só centrado no conceito biológico (...) ênfase não só no biológico mais nas condições sociais em que o indivíduo vive os aspectos demográficos”. “(...) União do bem-estar físico e mental”. “É o bem-estar físico, o estar bem em todos os sentidos”. “É o desenvolvimento do bem-estar físico e mental, não só não estar doente”.

Durante a entrevista, observamos que as assistentes sociais apresentam uma

análise e discussão muito incipiente sobre a política pública de saúde, sobre o SUS

e o movimento sanitário. As profissionais, quase na totalidade, se detêm em

Page 141: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

139

questões de saúde referentes ao sistema de saúde da Aeronáutica, assim como as

necessidades de saúde identificadas no cotidiano da população usuária, sem uma

maior articulação com as questões mais gerais que envolvem a discussão da saúde

no Brasil.

A questão não é somente a falta de conhecimento mais substancial quanto ao

texto constitucional referente ao SUS ou ao processo histórico do movimento

sanitário, mas, sobretudo, a ausência de mediação, de debate, de reservas críticas.

A adoção da saúde como direito de cidadania e dever do Estado opera um

deslocamento teórico conceitual do tema saúde do campo biológico para o campo

político e histórico da construção dos direitos sociais. O assistente social, em sua

prática profissional, cabe facilitar o acesso da população às informações e ações

educativas para que a saúde possa ser percebida como produto das condições

gerais de vida e da dinâmica das relações sociais, econômicas e políticas do país

(CFESS, 1999).

Portanto, a atuação do assistente social na área da saúde pressupõe o

domínio da discussão no campo das políticas públicas, particularmente do SUS, e

de como o acesso a este sistema é garantido aos cidadãos. Isso implica um

conjunto de saberes que envolvem o processo saúde-doença, a trajetória da política

de saúde brasileira, a reforma sanitária e as mudanças advindas da Constituição

Federal de 1988.

GGrrááffiiccoo 2211-- OO PPrroojjeettoo ÉÉttiiccoo PPoollííttiiccoo PPrrooffiissssiioonnaall ddoo SSeerrvviiççoo SSoocciiaall nnoo ââmmbbiittoo mmiilliittaarr Assistentes Sociais SSA/RJ

70%

10%

20%

sim

não

não sabe responder

Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de

saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.

Page 142: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

140

Quando perguntadas sobre a viabilidade do Projeto Ético-Político do Serviço

Social no âmbito militar, 70% das assistentes sociais responderam positivamente,

10% de forma negativa e 20% informam desconhecer os princípios do projeto.

Do grupo que respondeu de forma positiva (70%), na justificativa se dividem

em dois grupos: metade das assistentes sociais entrevistadas apresenta, em seu

discurso, uma orientação ético-política em consonância com o projeto da categoria.

A outra metade do grupo, apesar de concordar na viabilidade do projeto, aponta

limitações para a materialidade deste.

GGrrááffiiccoo 2222-- CCoonnhheeccee oo CCóóddiiggoo ddee ÉÉttiiccaa XX VViiaabbiilliiddaaddee ddoo PPrroojjeettoo ÉÉttiiccoo--PPoollííttiiccoo Assistentes Sociais SSA/RJ

40%

10%

20%

30%

sim/com

limitação

sim / é

referência

não/ com

limitação

não/ é

referência

Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.

Ao cruzarmos dos dados dos gráficos 17 e 21, podemos observar (gráfico 22)

que 40% das assistentes sociais afirmam conhecer o Código e postulam a

viabilidade do projeto ético-político do Serviço Social, porém, com limitações; 30%

das profissionais declaram não conhecer o Código, contudo, afirmam que o projeto é

referência para a prática profissional; 20% informam não conhecer o Código e afirma

limitações para a viabilidade do projeto profissional, e somente 10% das assistentes

sociais declaram conhecer o código e afirmam que o projeto ético-político do Serviço

Social é viável no âmbito militar. Ou seja, as assistentes sociais têm uma postura

comprometida em nível do discurso, mas não garantem essa perspectiva na prática

realizada.

As indicações nos levam a apreender uma contradição: nos limites da

pesquisa realizada, que a hegemonia do Projeto Ético-Político do Serviço Social não

Page 143: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

141

se expressa nos serviços de saúde da Aeronáutica, apesar do alto percentual (70%)

de profissionais sinalizarem a viabilidade do projeto ético-político do Serviço Social.

Ora, o compromisso ético-político da profissão ultrapassa os marcos

normativos do Código de Ética Profissional, pois, apresenta um projeto de profissão

e de sociedade. Isto é, além das normas, elege valores e princípios a serem

defendidos pelos profissionais na sua prática cotidiana. Ao definir-se como um

projeto — que implica em meios e instrumentos para sua realização —, o Código de

Ética, em vigor, está para além das funções tradicionais de um Código de Ética

profissional, pois estabelece valores e princípios que ultrapassam as normas

geralmente impostas para o exercício profissional propriamente dito.

Portanto, a efetivação dos princípios e valores postos no Código de Ética na

prática profissional dos assistentes sociais implica em assumir uma nova postura

profissional; que requer dos profissionais a capacidade de compreender e decifrar a

realidade social em sua complexidade e totalidade, ou seja, requer um profissional

que detenha

(...) o conhecimento das totalidades mais ou menos complexas nos seus múltiplos aspectos e determinações: sua estrutura e determinantes históricos e primordialmente seu movimento: o movimento conjuntural, na imbricação das relações entre realidade nacional e regional e local possibilitando, assim, estabelecer as mediações necessárias para o desvendamento das particularidades e singularidades da realidade dos sujeitos que demandam ou são atingidos pelas ações profissionais e, principalmente, do cotidiano que os envolve. (Vasconcelos, 2002:124).

Observamos que uma minoria das assistentes sociais entrevistadas

evidenciou uma perspectiva mais crítica quanto à sua intervenção profissional e

quanto à realidade da instituição militar, estando mais próximos do projeto

profissional hegemônico da categoria. É o que podemos observar através dos

seguintes depoimentos:

―(...) Não tem como desvincular o Projeto Ético Político da prática na Aeronáutica, ele que dá direção a nossa prática profissional (...) não tem lógica existir um projeto profissional diferenciado para a área militar”.

“(...) Dificulta, pois temos Assistentes Sociais com muito potencial, mas as antigas Assistentes Sociais do QFO não têm a mesma discussão. Na verdade, a FAB não tem esse profissional que efetivamente articula os princípios éticos do PEP no cotidiano profissional”.

Page 144: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

142

Outra preocupação que se coloca é a necessidade de sujeitos históricos

individuais e coletivos não caírem no possibilismo, flexibilizando os princípios

defendidos no projeto ético - político profissional e na proposta de Reforma

Sanitária, questões que estão postas na saúde, nos movimentos sociais e têm

repercutido no Serviço Social. (CFESS, 2009).

TTaabbeellaa 44 -- Assistentes Sociais dos Serviços de Saúde da Aeronáutica/RJ

UUttiilliizzaaççããoo ddooss AAppaarraattooss lleeggaaiiss

Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de saúde da

Aeronáutica/RJ, 2009.

NPA* - Norma Padrão de Ação ICA ** - Instrução Reguladora das Ações

No que se referem aos aparatos legais que utilizam na prática cotidiana,

observamos que todas as entrevistadas afirmam terem como aparato o Estatuto do

Idoso. Das assistentes sociais entrevistadas, uma utiliza a Legislação Militar como

aparato legal; 04(quatro) assistentes sociais apontam a NPA e a ICA (assistência

social e a da saúde); uma profissional inclui como aparato a Política da Pessoa

Portadora de Deficiência; e 06 (seis) assistentes sociais indicam o Código de Ética

como aparato legal para o desenvolvimento das ações profissionais cotidianas.

Quanto à documentação utilizada para registro da prática das assistentes

sociais, foi observado que as profissionais utilizam no ambulatório: ficha de triagem;

folha de evolução, que e anexada ao prontuário, quando o paciente retorna ao

Serviço Social; folha de encaminhamento; relatório; livro de ocorrência, no qual um

assistente social deixa relato do seu dia de trabalho para que o outro profissional

tenha conhecimento dos atendimentos realizados e dar os encaminhamentos

necessários e livro de recursos institucionais e extra-institucionais.

Estatuto do Idoso Código de Ética Assitente Social

Política da pessoa Portadora de

deficiência Legislação Militar NPA * ICA **

Entrevistado 1 SIM NÃO NÃO NÃO NÃO NÃO Entrevistado 2 SIM SIM NÃO NÃO SIM SIM Entrevistado 3 SIM SIM NÃO NÃO SIM SIM Entrevistado 4 SIM SIM NÃO NÃO NÃO NÃO Entrevistado 5 SIM NÃO SIM NÃO NÃO NÃO Entrevistado 6 SIM NÃO NÃO NÃO NÃO NÃO Entrevistado 7 SIM SIM NÃO NÃO NÃO NÃO Entrevistado 8 SIM SIM NÃO NÃO NÃO NÃO Entrevistado 9 SIM NÃO NÃO SIM SIM SIM Entrevistado 10 SIM SIM NÃO NÃO SIM SIM

10 6 1 1 4 4

Page 145: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

143

No tocante aos instrumentos profissionais utilizados pelas assistentes sociais

podemos dizer que a entrevista é um dos instrumentos mais utilizados.

Segundo as profissionais é utilizada nos atendimentos aos usuários que participam

de Programas no interior da unidade, no plantão111 e nas visitas domiciliares. Tem

como objetivo dialogar com os usuários sobre a situação apresentada e obter dele

informações que auxiliem na compreensão desta.

A visita domiciliar é a realização da entrevista na residência do usuário e tem

como objetivo conhecer a realidade deste, as condições (residência, bairro) em que

este vive e apreender aspectos do cotidiano das suas relações e do contexto familiar

não percebido nos atendimentos do plantão. De acordo com as assistentes sociais a

visita domiciliar é um instrumento comumente utilizado no atendimento ao público

idoso e aos usuários do Programa de Serviço de Atendimento Domiciliar (SAD)112.

Cabe ressaltarmos que o instrumento da visita domiciliar não é de emprego

exclusivo do assistente social, contudo, é um dos instrumentos relevantes e

necessário a ser utilizado pelos assistentes sociais a favor dos sujeitos, na

perspectiva da garantia de seus direitos

As reuniões em grupo são geralmente realizadas pelas assistentes sociais

que integram as equipes multidisciplinares no interior das unidades de saúde e tem

como objetivo atender aos usuários dos Programas da instituição.

Destaca-se que as assistentes sociais entrevistadas mencionaram que o

Serviço Social utiliza de forma incipiente os registros estatísticos dos atendimentos

realizados, pois, nem sempre estes, são efetuados na íntegra. O que sinaliza que as

111 Cabe informar que o plantão nas unidades de saúde da Aeronáutica/RJ se caracteriza por ser uma atividade receptora, Vasconcelos (2002), de qualquer demanda da unidade/usuários; funciona na maioria das unidades em local adequado (tamanho e localização) que possibilita o sigilo do atendimento. Geralmente, 01(uma) assistente social utiliza a sala para atendimento aos usuários que procuram espontaneamente ou são encaminhados ao Serviço Social sendo que, as assistentes sociais desenvolvem outras atividades rotineiras do Serviço Social, portanto, as profissionais não ficam exclusivamente no plantão, aguardando serem procuradas; atendem aos usuários conforme prioridade do setor. O trabalho com os pacientes internos e seus familiares é realizado no quarto duplo ou nas enfermarias ao lado do leito do próprio usuário. Portanto, as atividades desenvolvidas pelo Serviço Social nas enfermarias são as mesmas do plantão. 112 No Sistema de Saúde da Aeronáutica, a assistência domiciliar foi iniciada em 1999 com a criação do SAD-HAAF, com objetivo de oferecer um período de transição entre a internação e a alta nos hospitais de 4º escalão(alta complexidade - HFAG e HCA), tornou-se de grande valia, segundo a DIRSA, no que diz respeito à liberação de leitos para novas internações. Este serviço é regulamentado pela ordem técnica da DIRSA nº 005/DIRSA/2000 de 12 de dezembro de 2000. Atualmente, o SAD é um serviço implementado por todas as Organizações de Saúde da Aeronáutica (OSA). É composto por uma equipe multidisciplinar (assistentes sociais, médicos geriatras, fisioterapeutas e enfermeiros), atende aos usuários e dependentes do SISAU, prioritariamente, ao idoso acamado e restrito ao leito e/ou pacientes com patologias estáveis, quase sempre portadores de doenças crônicas, como doenças neurológicas degenerativas e músculo-esqueléticas. Tem como objetivo minimizar as internações hospitalares e a exposição aos riscos infectológicos, propiciando o convívio do acamado no contexto familiar.

Page 146: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

144

profissionais não percebem a importância, para a prática profissional, do estudo da

demanda atendida.

Enfatiza-se que, a ausência de um registro qualificado das atividades

profissionais acarreta em uma imagem negativa da profissão de que esta não

desenvolve nenhum tipo de atividade, ficando sua ação como um trabalho perdido,

pois não existe registro, no Serviço Social, dos atendimentos realizados e atividades

implementadas.

Outros instrumentos profissionais mencionados por 03(três) assistentes

sociais (duas militares e uma civil) foram as palestras, a organização de eventos e

01(uma) relatou a pesquisa do perfil dos usuários.

Ante o exposto, ressalta-se que a utilização de instrumentais permite ao

assistente social atingir a finalidade da sua ação, possibilitando que as realidades

sejam desveladas e apreendidas adquirindo materialidade através das intervenções

profissionais.

A partir dos dados mencionados linhas acima, nos valemos da análise de

Braz (2004, p. 462) para pensarmos sobre a materialidade do projeto ético-político

do Serviço Social nos serviços de saúde da Aeronáutica. O autor ao discorrer sobre

o projeto ético-político do Serviço Social, nos esclarece que o este pode se

concretizar nas ações profissionais cotidianas dos assistentes sociais e, que

mecanismos políticos, instrumentos/documentos legais e referenciais teóricos

emprestam não só legitimidade como também operacionalidade prático–política e

prático-normativa ao projeto.

Para o autor, os elementos constitutivos que emprestam materialidade ao

projeto podem ser observados sob três dimensões articuladas entre si, quais sejam:

a) a dimensão da produção de conhecimentos no interior do Serviço Social; b) a

dimensão político-organizativa da categoria; c) dimensão jurídico-política da

profissão. Vejamos cada uma delas.

a) Dimensão da produção de conhecimentos no interior do Serviço Social: É a esfera de sistematização das modalidades práticas da profissão e os processos reflexivos do fazer profissional. Esta dimensão investigativa da profissão tem como parâmetro a afinidade com as tendências teórico-críticas do pensamento social. Dessa forma, não cabem no projeto ético-político contemporâneo, posturas teóricas conservadoras, presas que estão aos pressupostos filosóficos cujo horizonte é a manutenção da ordem. b) Dimensão político-organizativa da profissão: Aqui se assentam tanto os fóruns de deliberação quanto as entidades representativas da profissão. O conjunto

Page 147: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

145

CFESS/CRESS (Conselho Federal e Regionais de Serviço Social) a ABEPSS (Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social) e as demais associações político-profissionais, além do movimento estudantil representado pelo conjunto de CA‘s e DA‘s (Centros e Diretórios Acadêmicos das escolas de Serviço Social) e pela ENESSO (Executiva Nacional de Estudantes de Serviço Social). Assim, subentende-se que o projeto ético-político (como uma projeção) pressupõe, em si mesmo, um espaço democrático, aberto, em construção e em permanente tensão e conflito. Esta constatação indica a coexistência de diferentes concepções do pensamento crítico, ou seja, o pluralismo de idéias no seu interior. c) Dimensão jurídico-política da profissão: Temos aqui o aparato jurídico-político e institucional da profissão que envolve um conjunto de leis e resoluções, documentos e textos políticos consagrados no seio profissional. Há nessa dimensão duas esferas diferenciadas, porém articuladas, são elas: um aparato político-jurídico de caráter estritamente profissional; e um aparato jurídico-político de caráter mais abrangente. No primeiro caso, temos determinados componentes construídos e legitimados pela categoria tais como: o atual Código de Ética Profissional, a Lei de Regulamentação da Profissão (Lei 8662/93) e as novas Diretrizes Curriculares recentemente aprovadas pelo MEC. No segundo, temos o conjunto de leis advindas do capítulo da Ordem Social da Constituição Federal de 1988 que, embora não exclusivo da categoria, foi fruto de lutas que envolveram os assistentes sociais

113

e, por outro lado, faz parte do cotidiano profissional de tal forma que pode funcionar como instrumento viabilizador de direitos através das políticas sociais que executamos e/ou planejamos (grifos nossos).

Braz (2004, p. 464) adverte que “neste conjunto de leis e resoluções atinentes

à profissão e ao seu projeto ético-político encontram-se realizados, direta ou

indiretamente, valores que contornam o projeto”.

Ora, sendo o profissional de serviço social, capaz de identificar a realidade

social, como determinada historicamente e, portanto, passível de transformações é

necessário que se tenha atenção para sua instrumentalidade. Para que o

profissional em sua práxis possa responder às demandas sociais advindas das

expressões da questão social, ele deve ser capacitado para identificá-las como um

processo sócio histórico, que é produzido e reproduzido socialmente. E no qual são

determinadas exigências que pressupõe ―(...) preparo técnico e intelectual e o

assistente social como aquele que vende a sua força de trabalho, e junto com ela

um conjunto de procedimentos de natureza instrumental socialmente reconhecido

(GUERRA, 2000, p. 23).

A partir dos dados apresentados pelas as assistentes sociais dos serviços de

saúde da Aeronáutica, percebemos que estas carecem de uma apropriação mais

acurada dos elementos constitutivos da prática do assistente social, onde a

113

O autor refere-se, especialmente, à construção da LOAS (Lei Orgânica da Assistência Social).

Page 148: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

146

dimensão técnico/operativa deve ser pensada, a partir da categoria

instrumentalidade.

De acordo com Guerra (2000, p.29), instrumentalidade é a categoria reflexiva

capaz de apontar as diversas formas de inserção da profissão nos espaços sócio-ocupacionais e as competências e requisições profissionais, de modo a demonstrar o concreto particularizado das formas de operar da profissão, ou as ―mediações particularizadoras que conferem existência real‖ (Lessa, 1995:119) à profissão em contextos e espaços sócio-históricos determinados.

3.3.3 Prática Profissional

GGrrááffiiccoo 2233 - PPrroojjeettoo ddee PPrrááttiiccaa Assistentes Sociais SSA/RJ

40%

60%

sim

não

Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de

saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.

O Gráfico mostra que 60% não têm projeto na instituição e somente 40%

declaram ter projeto escrito na instituição.

Page 149: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

147

GGrrááffiiccoo 2244 – CCoonnhheeccee oo CCóóddiiggoo ddee ÉÉttiiccaa XX TTeemm PPrroojjeettoo nnaa IInnssttiittuuiiççããoo Assistentes Sociais SSA/RJ

30%

20%

40%

10%

conhece código

de ética/ tem

projeto

conhece código

de ética/ não tem

projeto

desconhece

código de ética/

tem projeto

desconhece

código de ética/

não tem projeto

Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.

Podemos observar que 40% das entrevistadas afirma desconhecer o Código

e ter projeto na instituição; 30% declara conhecer o Código e ter projeto; 20%

assinala conhecer o Código e não ter projeto e 10% das assistentes sociais declara

desconhecer o Código e não ter projeto por escrito na instituição (vide gráfico 24).

Destaca-se que das profissionais entrevistadas que declaram desconhecer o

Código de Ética profissional, 40% afirma ter projeto próprio na instituição em que

atua. Duas assistentes sociais declaram ter projeto por escrito na instituição (Grupo

de Discussão de Cuidadores Formais de Idosos); uma assistente social apresenta o

projeto (Encontro de Casais e Grupos de Vivência) e uma apresenta a proposta de

projeto a ser implementado (Educação Física para o Efetivo).

As assistentes sociais que expressaram desconhecer o Código apresentam

habilidade técnica no sentido de garantir o espaço ocupacional do Serviço Social na

instituição e uma preocupação em atender de forma qualificada os usuários no

acesso aos seus direitos, bem como em priorizar um atendimento de escuta e

acolhimento.

Entretanto, como já mencionado anteriormente, além das normas o Código de

Ética dos Assistentes Sociais elege valores e princípios a serem concretizados pelos

profissionais na sua prática cotidiana, o que implica em assumir uma nova postura

profissional que requer do assistente social a capacidade de compreender e decifrar

a realidade social em sua complexidade e totalidade.

Page 150: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

148

GGrrááffiiccoo 2255 –– PPrroojjeettoo ddoo SSeerrvviiççoo SSoocciiaall Assistentes Sociais SSA/RJ

70%

30%

sim

não

Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.

Quando indagados sobre a existência de projetos do Serviço Social

desenvolvidos na Instituição, os dados mostram que 70% dos entrevistados

informam que o Serviço Social desenvolve projetos na instituição, contudo,

identificamos que as profissionais quantificam os projetos desenvolvidos pelo

Serviço Social e os Programas desenvolvidos no interior das unidades em que o

Serviço Social participa como uma questão única. Vejamos os projetos

desenvolvidos pelo Serviço Social nos 03(três) hospitais pesquisados:

Projeto de Orientação a Gestantes

Projeto de Orientação sobre Planejamento Familiar

Projeto de Convivência com os Idosos

Projeto com Cuidadores Formais de Idosos

Projeto de Orçamento Doméstico

O Serviço Social tem participação em Programas e ações desenvolvidas no

interior das 03 (três) unidades de saúde, são elas:

Programa de Assistência Domiciliar – SAD

Programa de Atendimento ao Paciente Diabético

Programa de Cirurgia Bariátrica114

Programa de Apoio ao Paciente HIV/AIDS

114 A Cirurgia Bariátrica, também chamada de Gastroplastia ou ainda de Cirurgia de redução do estomago, é uma cirurgia indicada para pessoas com sobrepeso, os chamados obesos mórbidos.

Page 151: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

149

Unidade de Geriatria e Gerontologia – UGG

Núcleo de Geriatria e Gerontologia – NUGG

Destaca-se que os objetivos dos Programas, ainda que destaquem o

diagnóstico precoce, relacionam atividades que, a partir de demandas restritas ao

interior das unidades de saúde, resume-se ao trabalho com a doença instalada.

Dentre as ações mais comuns das assistentes sociais são:

- realizar entrevistas, tendo como objetivo aprofundar as questões suscitadas nos grupos

pertinentes à situação social e de saúde apresentadas pelo usuário;

- informações relativas à rotina institucional dos programas;

- estimular, caso necessário, o comparecimento de familiares que incentivem e possibilitem a

adesão do usuário/paciente ao tratamento;

- identificar e mobilizar os recursos institucionais internos e externos, observando as

demandas dos usuários dirigidas ao Serviço social;

- organizar material (filmes, cartaz, folders, folhetos) a respeito dos direitos na atenção à

saúde do usuário, em específico do agravo em questão;

- avaliar as condições sociais e da residência dos pacientes a serem incluídos nos Programas

de atendimento domiciliar;

- realizar entrevista inicial e preencher ficha de cadastro do paciente;

- providenciar documento via fax de solicitação de dispensa, retorno e transporte aéreo para

usuários de outros estados (pacientes da cirurgia bariátrica);

- orientar e encaminhar usuário para pedido de ressarcimento de despesas médicas através

de relatório analítico;

- solicitar a equipe médica a elaboração de relatório analítico para ressarcimento;

- elaborar listagem de presença;

- realizar contato com usuário ausente no Programa;

- acompanhar o usuário no pré e pós - operatório (pacientes da cirurgia bariátrica);

- orientação quanto á hospitalização de gestante do pré-natal e familiar;

- realização de grupos de convivência com os usuários idosos inscritos nos programas da

UGG e NUGG;

- entrevistas com os casais e com o militar do efetivo no planejamento familiar;

- participação na discussão dos resultados dos testes do vírus HIV, sensibilização, orientação

quanto aos direitos do paciente infectado, acesso a transporte gratuito, apoio e discussão de

questões que envolvem trabalho, família, saúde e contaminação.

Ainda, que nem todos os Programas sigam a mesma rotina, grande parte das

assistentes sociais realiza entrevistas e reuniões com os usuários: entrevista de

triagem, cadastramento avaliação de inscrição nos Programas e entrevistas

Page 152: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

150

periódicas para orientação e/ou viabilização de recursos e benefícios sociais do

COMAER. Entendemos ser essencial para as assistentes sociais a apropriação da

abordagem de Vasconcelos (1997, p. 150) sobre a prática reflexiva, nesse sentido

trabalhar a abertura de espaços, possibilidades e condições para que os usuários,

problematizem as questões de seu cotidiano procurando desvendá-las , a

partir dos conhecimentos e informações acumulados nas experiências de

vida, em articulação com novas informações/conhecimentos que possam

vir de seus iguais e/ou dos profissionais.

GGrrááffiiccoo 2266 -- EEssppeecciiffiicciiddaaddee ddoo SSeerrvviiççoo SSoocciiaall nnaa AAeerroonnááuuttiiccaa Assistentes Sociais SSA/RJ

Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de

saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.

A pesquisa buscou saber das assistentes sociais o que elas consideram como

especificidade do Serviço Social na Aeronáutica. Das entrevistadas, 30% qualificam

como específico da Aeronáutica a Política de Assistência Social contributiva; 20%

das profissionais consideram que o usuário e a demanda trazida por este é

característico dos serviços de saúde da Aeronáutica; um grupo de 20% das

entrevistadas atribui à dificuldade de trabalho em equipe115 como uma peculiaridade

do Serviço Social nessa instituição; 20% não responderam a questão e na assertiva

de 10% das assistentes sociais entrevistadas não existe nenhuma especificidade do

Serviço Social na Aeronáutica que o diferencia de outro espaço sócio-ocupacional.

115 Aqui, as profissionais entrevistadas referem-se não só a equipe multidisciplinar como também, a equipe formada pelas próprias assistentes sociais da Aeronáutica.

30%

20% 20%

20%

10% Assistência Social contributiva Usuários

Dificuldade de trabalho em Equipe Não sabe responder

Nada

Page 153: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

151

As assistentes sociais ao manifestarem sobre a especificidade da Aeronáutica

assinalam três questões centrais, a saber: o caráter contributivo da Política de

Assistência Social do COMAER; a peculiaridade do usuário e da demanda nessa

instituição; e a dificuldade de trabalho em equipe. A nosso ver, essas questões se

articulam.

Interessa-nos inferir se essas questões afetam, prejudicam ou determinam a

prática profissional realizada por elas nesse espaço sócio-ocupacional, a priori,

podemos dizer que é inconteste que o assistente social se depara com fatores

institucionais e conjunturais que provocam dificuldades para a realização de suas

atribuições e competências profissionais. O projeto ético-político-profissional do

Serviço Social, não apresenta congruência com as funções do Comando Maior da

Aeronáutica materializadas no Estatuto dos Militares, o qual possui um forte apelo

moral no trato das questões da vida concreta, perpassada por concepções

filosóficas assentadas no neotomismo, afirmando valores abstratos e metafísicos.

Verifica-se, portanto, que são áreas que não se complementam. No entanto, as

demandas que são dirigidas ao assistente social exigem uma atuação com

aprofundamento teórico-metodológico consolidando suas atribuições privativas, ou

seja, exclusivas de sua formação profissional, tanto quanto em qualquer outro

espaço profissional.

Encontramos em Guerra (2009, p.30), uma importante contribuição em que a

autora discute a questão da instrumentalidade do serviço social, ao considerar

também a construção histórica da profissão, na assertiva da autora

Há algo que precede a discussão de instrumentos e técnicas para a ação

profissional, que no nosso entendimento refere-se à instrumentalidade, ou

melhor, à dimensão que o componente instrumental ocupa na constituição

da profissão. Para além das definições operacionais (o que faz, como faz),

necessitamos compreender as conseqüências que no nível ―mediato‖ que

as nossas ações profissionais produzem. (2009, p.30).

Assim, tomamos como pressuposto de que o espaço sócio-ocupacional em

que o assistente social se insere, seja ele privado, público ou militar, trabalha com as

demandas que lhe são próprias. Ou seja, as atribuições e competências dos

profissionais de Serviço Social, sejam aquelas realizadas na saúde ou em outro

espaço sócio-ocupacional, são orientadas e norteadas por direitos e deveres

Page 154: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

152

constantes no Código de Ética profissional e na Lei de Regulamentação da

Profissão116.

Embora no cotidiano profissional as complexas ações e intervenções

implementadas pelos assistentes sociais favoreçam a interesses sociais distintos e

contraditórios, os profissionais podem imprimir uma determinada direção social ao

fazer profissional, sendo este iluminado, ou não, pelo compromisso ético-

profissional e pelas referências teórico-metodológicas necessárias.

Entendemos que esse cotidiano é permeado de possibilidades e limites para

a prática profissional, bem como constantes dilemas e entraves ao compromisso

ético-político profissional. Todavia, o que não podemos perder de vista é que esse

cotidiano de limites e dilemas são impostos por uma sociedade capitalista que

perpetua a lógica da exclusão, da desigualdade social e do desrespeito aos direitos

humanos. Donde se conclui que, a questão social é constantemente perpassada por

correlações de força e confrontos de interesses opostos, os quais irão se reproduzir

nas políticas sociais correspondentes.

No tocante a Política de Assistência Social da Aeronáutica, o COMAER

informa que a assistência social é uma política contributiva e tem por atribuição

garantir o bem-estar do efetivo e de seus dependentes. Este bem-estar compreende:

a saúde, o ambiente de trabalho, a família, a alimentação e o lazer.

A preocupação aqui, é que o assistente social, na sua prática, viabilize o

acesso do usuário a um direito social. Ora, se na Aeronáutica, a assistência social e

a assistência médica são políticas contributivas, portanto, é direito do usuário o

acesso a essas.

Uma análise fragmentada e reducionista da realidade, que desconsidera as

contradições imanentes de uma sociedade capitalista, não só fragmenta as ações

profissionais ante as demandas apresentadas como também, limita o exercício

profissional ao mero cumprimento burocrático de tarefas preestabelecidas.

Como mencionado anteriormente, o Plano de Assistência Social (PASIC) do

Comando da Aeronáutica tomando como base legal a Lei Orgânica de Assistência

Social (LOAS) e os desdobramos legais advindos (ECA, Estatuto do Idoso,

116

A Lei de Regulamentação da Profissão estabelece no seu artigo 4º as competências do assistente social e no Artigo 5ª apresenta as atribuições privativas deste. Quanto às competências; são qualificações profissionais para prestar serviços, que a Lei reconhece, independentemente de serem, também, atribuídas a profissionais de outras categorias (Parecer Jurídico nº 27/98, de Sylvia Helena Terra, assessora jurídica do CFESS. No que se refere as atribuições privativas, também são competências, porém exclusivas, decorrentes, especificamente, da formação profissional. Cf. Parâmetros para a Atuação de Assistentes Sociais na Saúde. CFESS, 2009.

Page 155: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

153

NOB/SUAS) viabiliza recursos financeiros para que sejam desenvolvidos programas

e projetos pelo Serviço Social das Organizações Militares direcionados aos usuários

do Sistema de Assistência Social que deverão ter um caráter eminentemente

educativo, preventivo e promocional, e prevê cinco Programas focados nas áreas

de:

Promoção familiar;

Proteção à Terceira Idade;

Benefícios Sociais;

Recursos Humanos;

Lazer e Cultura

Reportando-nos a Iamamoto (2007, p.207), a autora assevera que:

o exercício profissional é uma ação de um sujeito profissional que tem

competência para propor, para negociar com a instituição os seus

projetos, para defender o seu campo de trabalho, suas qualificações e

funções profissionais. Para a autora, uma prática mediada pelo projeto

ético-político do Serviço Social requer ir além das rotinas institucionais,

requer buscar apreender as possibilidades de ação, passíveis de serem

impulsionadas pelo assistente social.

Frente a essas questões, fomos saber se as profissionais entrevistadas

acham a prática profissional na saúde/Aeronáutica diferente da prática de

assistentes sociais que atuam em outros espaços profissionais. Destacamos que

todos as entrevistadas responderam sim para essa pergunta. É o que podemos

observar nos depoimentos:

“(...) Não diria uma diferença e sim uma peculiaridade, o usuário e a demanda”.

“Na Aeronáutica, o assistente social não trabalha somente com o viés da desgraça, como em outros hospitais”.

“(...) Bastante diferente, a demanda e a realidade do usuário da Aeronáutica é outra, bem ou mal, todos tem uma renda, melhor do que a de muito brasileiro, muito diferente da realidade dos usuários do SUS”.

“(...) Existe uma diferença sobre a ótica da demanda, do usuário, somente por isso”.

“O sistema militar é terrível, de 2 em 2 anos muda tudo, todo o comando, a direção, os profissionais vão embora, chegam outros, acaba afetando o cotidiano da nossa prática”.

“Aqui não se trabalha em equipe multidisciplinar ou indisciplinar, ninguém se articula, na verdade não querem prestar um bom atendimento ao usuário”. “Em outros lugares, existem vários grupos, projetos, programas; como no Inca, no Fundão”.

Page 156: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

154

“É diferente sim. Principalmente o usuário dos serviços sociais, ele sempre terá uma renda”.

“Com certeza, aqui a demanda é outra (dificuldade financeira momentânea, conflitos familiares envolvendo a pensão do militar, abandono de incapaz), em hospitais do Estado, como o Getúlio Vargas, o Serviço Social atende familiares de traficantes feridos e mortos, trabalhador arrimo de família vitimado pela guerra do tráfico, aqui não temos essa realidade. E se acontecer, a família terá pensão, auxílio-funeral, enfim, é muito diferente”.

“Sim, tem uma diferença (...) o hospital não fica em área de risco é de fácil acesso é seguro (...) a demanda do usuário é diferente, para começar todos que tem acesso ao hospital tem soldo/renda, por maior a dificuldade financeira que estejam passando, e têm acesso aos benefícios sociais como medicamentos com ressarcimento parcial, ou até integral, dependendo do caso”.

“Diria que sim, tenho uma amiga que trabalha em um Hospital público em área carente e de risco, e olha! É bem diferente. (...) o usuário é outro a demanda é outra a carência é muito extrema. Aqui não é assim”.

Do público alvo, usuário dos serviços e que procuram por atendimento ao

Serviço Social, destacam, sobretudo, da ativa: os soldados de 1ª e 2ª classe, os

taifeiros117 e sargentos, suboficiais, tenentes e os servidores civis. Da inativa,

destacam-se as viúvas pensionistas, as filhas solteiras dependentes de militares, os

suboficiais e sargentos reformados e da reserva e os servidores civis aposentados.

Reportando-nos, todavia, as demandas sociais e de saúde da população

usuária, as profissionais entrevistadas informam que essas giram em torno de

questões relacionadas à: hipertensão, tabagismo, alcoolismo, dependência química,

diabetes, cardiopatias, doenças oncológicas, doenças originárias do processo de

envelhecimento, doenças psiquiátricas, doenças infecto-parasitárias e agravos de

saúde decorrentes de violência urbana e acidentes de trabalho.

Não obstante, as demandas sociais encaminhadas ao Serviço Social, de uma

forma geral, referem-se a questões de: abandono de idosos; conflitos familiares

decorrentes de apoio a incapazes e pensão militar; violência contra a mulher e

idosos; dependência química; desemprego na família e aproximação de período

117 Taifeiro é um posto ou patente militar, antigo, sendo de forma geral superior ao posto ou patente de soldado ou marinheiro "razo ou zero ou ainda grumete(esse último nas marinhas); em algumas organizações militares"; é portanto considerado historicamente o primeiro posto ou patente após o básico ou zero ou ainda raso; geralmente e historicamente é o soldado ou marinheiro que já entra na organização militar com alguma profissionalição ou tem talento para tal, e como tal nas diversas organizações militares de diversas nações, são os motoristas, cozinheiros, alfaiates, barbeiros, copeiros, mensageiros, "ordenansas(secretários ou ajudantes - de - ordens)".

Page 157: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

155

desligamento de militar (soldado)118 arrimo de família; conflitos no trabalho; dívidas

financeiras e acúmulo de empréstimos e dificuldades econômicas momentâneas.

Frente a essas demandas os assistentes sociais informam privilegiar junto

aos usuários, ações sociais de caráter sócio – educativo, preventivo e promocional,

através dos projetos e programas, anteriormente apresentados, e não apenas na

concessão de benefícios sociais (aquisição de medicamentos, próteses, órteses,

aparelhos auditivos, cesta básica), conforme diretriz do Sistema de Assistência

Social/SAS.

No entanto, para que possam utilizar a prerrogativa de determinar e priorizar

as demandas dos usuários e, conseqüentemente, de organizar e planejar suas

ações de forma que possam interferir nos determinantes sociais do processo

saúde/doença no resgate da saúde enquanto direito social, a prática na saúde, em

contraposição a uma prática espontânea e/ou instintiva, exige toda uma complexa

série de requisitos. Estratégias e ações que pensadas e realizadas, nas suas

relações e conexões, possam fomentar uma prática na saúde que contribua no

acesso dos usuários aos seus direitos (VASCONCELOS, 2007, p. 258).

Aliás, importa considerar que, segundo as assistentes sociais entrevistadas,

os usuários, a equipe de saúde e a direção das unidades ante as condições de

trabalho e/ou falta de conhecimento das competências do assistente social, tem

demandado e requisitado diversas ações as profissionais que não são atribuições

das mesmas. Descrevem as profissionais como: a marcação de consultas e exames;

a solicitação de ambulância para remoção e alta e o gerenciamento da equipe

responsável pela consecução da ação (motorista e auxiliar de enfermagem); a

identificação de vagas em outras unidades nas situações de necessidade de

transferência hospitalar; a convocação do responsável para informar sobre alta

hospitalar; a emissão de declaração de comparecimento na unidade quando o

atendimento for realizado por quaisquer outros profissionais que não o Assistente

Social; a confecção de documento de autorização para tratamento em rede

conveniada; o preenchimento de formulários para viabilização de medicação de alto

custo mediante autorização por parte de autoridade competente; a mediação de

conflitos entre usuários e profissionais decorrentes de extravio de documentos e

prontuário médico; a ―resolução‖ de problemas que envolvem os usuários,

118 Os soldados (reservistas) prestam serviço por um período de quatro anos, após esse período serão desligados do serviço ativo, caso não consigam aprovação em concurso (extremamente concorrido) para Cabo.

Page 158: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

156

decorrentes da falta de articulação entre as unidades de saúde que encaminham

pacientes de outros estados para internação nos hospitais do Rio de Janeiro, que

não contavam com vaga disponível para internações dos mesmos; a ―resolução‖ de

problemas entre os pacientes que dividem leitos nas enfermarias (discussão em

função de: ar condicionado, televisão com volume alto, desentendimentos diversos);

a solicitação de coleta de material de laboratório para pacientes acamados não

inscritos no Programa de Atendimento Domiciliar; e o acompanhamento junto ao

setor de Licitações na compra de medicamentos, cesta básica, vacinas para

dependentes (benefícios sociais) por Pregão Eletrônico119 e a apreensão das

terminologias que envolvem o processo licitatório.

As indicações sinalizam que as assistentes sociais, mesmo não

reconhecendo que essas demandas não são exclusivas da intervenção profissional

do assistente social, aceitam realizar todas as atividades ―possíveis‖ para dar

atenção a todas as demandas, em detrimento de um estudo do conjunto de

demandas dirigidas ao Serviço Social nos serviços de saúde da Aeronáutica. Não

comparece nas entrevistas com as profissionais, nenhum estudo da demanda dos

usuários dos serviços, como também, não comparece indicativo por parte das

entrevistadas, em priorizar o mesmo.

Não obstante, no que se refere às demandas dos usuários, uma importante

contribuição é dada por Vasconcelos (2002). Segundo a autora, o assistente social

trabalha com as requisições institucionais (do seu contratante) e com as demandas

dos usuários (para quem desenvolve sua ação profissional), concomitantemente,

devendo entendê-las e diferenciá-las, com objetivo de desenvolver uma prática

profissional e não somente uma tarefa burocrática. Com relação a demanda

apresentada pelo usuário, pode-se dizer que se traduzem de duas formas: a

demanda explicita e a demanda implícita (VASCONCELOS, 2002, pp. 179-180).

A demanda explícita, ou aparente, diz respeito aquilo que o usuário informa;

aquilo que se traduz, de forma clara e imediata ao profissional.

A demanda implícita exige analise, para além da aparência dos fenômenos; e

aquela que implica, de um lado, em um atencioso exame por parte do profissional,

119 A modalidade licitatória chamada pregão eletrônico, utilizada pelo governo brasileiro para realizar contratos administrativos de bens e serviços comuns, independentemente do valor estimado, foi criada através da Lei Federal 10.520/2002. Esta lei também criou o chamado "pregão presencial", que obrigava os contendentes à comparecerem à negociação, liderada por um pregoeiro devidamente designado pelo órgão da administração pública licitante. O pregão eletrônico foi criado visando, basicamente, aumentar a quantidade de participantes e baratear o processo licitatório.

Page 159: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

157

dos motivos que fundamentam as demandas explícitas e, de outro, em uma leitura

da realidade social, de cuja dinâmica emergem demandas. Nesse ponto, mostra-se

a importância de um profissional atualizado acerca da realidade, para desvendá-la,

entendendo as múltiplas determinações que incidem sobre cada problema

apresentado pelo usuário e investigando, junto a este último todas as condicionantes

que podem ocasionar o tipo de problema que ele esta enfrentando; ou seja, o que

gera o motivo pelo qual ele procurou o Serviço Social.

De acordo com a autora, identificar e priorizar as necessidades sociais e de

saúde e demandas dos usuários requer ir pra além das demandas espontâneas,

sem negar as requisições institucionais, historicamente, fruto do mau funcionamento

da rede de saúde, aqui incluímos os serviços de saúde da Aeronáutica. Significa,

portanto,

(...) pensar profissão, não para atuar junto a indivíduos, mas junto a

grupos e segmentos da classe trabalhadora que tem interesses e

necessidades individuais que expressam interesses e necessidades

coletivas que só serão de fato enfrentadas (diferente de resolvidas) se

identificadas, publicizadas e submetidas á organização dos usuários e ao

controle social. (pp.423-424

3.3.4 Aperfeiçoamento Profissional

Quando questionadas sobre o aperfeiçoamento profissional, inicialmente,

perguntamos as assistentes sociais se a instituição, de alguma forma, incentiva o

aperfeiçoamento das mesmas. A maioria do grupo estudado relata que, atualmente,

as unidades em que trabalham, viabilizam a capacitação dos profissionais, seja

mediante dispensa ou, por troca de horário. Porém, alegam dificuldades pessoais,

assim como: falta de estímulo, pouco tempo para se dedicar, cansadas, priorizam

outras atividades de caráter pessoal. Ressalta-se que duas assistentes sociais civis

e uma militar têm como planejamento imediato a realização de mestrado em Serviço

Social. Uma assistente social civil faz mestrado profissional em Avaliação de

Page 160: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

158

Programas Sociais do Programa de Pós-Graduação da Universidade Castelo

Branco.

As indicações apontam para a uma questão de escolha das assistentes

sociais em se qualificarem ou não, haja vista o indicativo da instituição no tocante à

possibilidade de liberação do profissional para estudo e aprimoramento.

No que se refere ao aspecto financeiro, que não comparece nas respostas

das entrevistadas, encontramos na ICA 163-1/2006 a seguinte diretriz da SDEE:

formular Política de Recursos Humanos para qualificação sistemática e continuada

dos profissionais de Serviço Social. Segundo a SDEE, cabe ao profissional de

Serviço Social o envio de solicitação, devidamente fundamentada (tipo de

qualificação e objetivo da mesma, instituição de ensino, custo da qualificação), para

que esta seja apreciada pela SDEE, no intuito de viabilizar o custeamento da

mesma.

Este órgão, ainda oferece, anualmente, aos assistentes sociais do Rio de

Janeiro (RJ), o custeamento de qualificação através do Curso de Extensão de

Planejamento e Gestão de Políticas Públicas, ministrado pelo Instituto Superior de

Administração Estadual/FESP.

GGrrááffiiccoo 2277 -- QQuuaannttoo àà QQuuaalliiffiiccaaççããoo PPrrooffiissssiioonnaall Assistentes Sociais SSA/RJ

60%

40%

sim

não

Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.

A pesquisa procurou saber das profissionais se estas consideram importante

atualizar-se para o desenvolvimento de sua prática profissional. Das entrevistadas,

60% afirmaram que sim, que precisam de um suporte teórico, que as possibilite

Page 161: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

159

conhecer a realidade em que atuam; e 40% informam que não. Todas informam já

haver realizado algum tipo de curso, após a formação na graduação. Como

podemos observar no gráfico a seguir.

GGrrááffiiccoo 2288 -- EEssppeecciiaalliizzaaççããoo//CCaappaacciittaaççããoo PPrrooffiissssiioonnaall Assistentes Sociais SSA/RJ

50%50%

sim

não

Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.

Do grupo estudado, 50% têm algum tipo ―curso‖ e 50% informa não ter. Em

contrapartida, das dez entrevistadas, apenas uma retornou a academia, como já

apontamos, para fazer mestrado.

“O nosso quadro funcional está praticamente em extinção. Não adianta para nós fazer um mestrado, não existe uma motivação profissional a não ser a nossa própria interna e pessoal. È complicado sabe?” “(...) Muitas vezes seu objetivo não é compreendido pouca valorização da profissão, qualificar pra que? Aqui não faz diferença”. “(...) Sei que é necessário, tenho essa compreensão, mas fica muito difícil, não tenho tempo, estímulo interno, sabe?” “(...) Prefiro me qualificar na minha área de psicanálise, como tenho feito, quando me aposentar, é com essa formação que irei atuar. Não vou trabalhar como AS então pra que?”

As indicações permitem apreendermos uma contradição da prática das

assistentes sociais nesse espaço, qual seja: apesar de elencarem (60%) o

conhecimento da realidade como ferramenta para a realização do trabalho

Page 162: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

160

profissional, e indicarem reconhecer que, para que conheçam a realidade, precisam

de um suporte teórico, 40% das profissionais não tem esse posicionamento.

Ou seja, ao mesmo tempo em que metade das profissionais afirma terem uma

―qualificação‖, quase que na mesma proporção (40%), alega não ser importante para

a prática profissional priorizar a formação continuada, vide os depoimentos acima.

É oportuno enfatizar a presença de dois grupos de profissionais nesse espaço,

a saber: as profissionais com formação mais recente, entre os anos de 1996 a 2002,

e as profissionais que se formaram entre os anos de 1977 a 1995 (vide Gráfico 3).

Isso mostra que esse grupo de assistentes sociais não teve como referência, na

formação acadêmica, os princípios e diretrizes contidos no projeto da ABEPPSS,

como já indicado. Assim, não passaram por uma formação que conforme indica a

ABEPSS busca um profissional que “(...) atue nas expressões da questão social,

formulando e implementando propostas (...) dotado de formação intelectual e cultural

generalista crítica, competente na sua área (...) comprometido com os valores e

princípios norteadores do Código de Ética do Assistente Social” (Diretrizes

curriculares para o curso de Serviço Social).

A capacidade de apreender o movimento da realidade social originário de uma

formação generalista e crítica do assistente social imprime a necessidade de um

contínuo processo de formação profissional, com garantia da capacitação dos

profissionais já formados.

Portanto, um profissional qualificado teoricamente, propositivo, comprometido

com a atualização permanente e que invista em sua formação intelectual e cultural,

atento ao movimento dos processos sociais na conjuntura contemporânea, pode

extrair potenciais propostas de trabalho, ali presentes, como possibilidades –

transformando-as em alternativas profissionais. (IAMAMOTO, 1998, p. 145).

Ademais, a pesquisa está situada entre as exigências postas ao Assistente

Social na contemporaneidade, na busca de superar a dicotomia entre investigação e

intervenção. Segundo Setubal (2009), o Serviço Social não deve parar na prática

interventiva, mas buscar, na concretude dos procedimentos da pesquisa, apoio para

uma ação profissional mais dinâmica, questionadora e que caminha passo a passo

com os diferentes movimentos emergentes da sociedade.

O estudo buscou, ainda, identificar qual tipo de conhecimento o assistente

social tem que ter para atuar de forma qualificada na Aeronáutica. Observamos que

Page 163: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

161

70% dos entrevistados assinalam a atualização profissional e somente 30% aponta

a especialização em áreas da prática médica (gerontologia e geriatria, doenças

infecto-parasitárias, oncologia e doenças cardíacas). Vejamos alguns depoimentos:

“(...) Legislação, políticas públicas, direito previdenciário etc...”.

“(...) Atualização e qualificação, aquele profissional qualificado que consegue intervir bem, mostra diferença e conquista seu espaço”.

“(...) Uma constante atualização, aí o assistente social pode direcionar melhor o seu trabalho”.

GGrrááffiiccoo 2299 -- CCoonnhheecciimmeennttoo nneecceessssáárriioo ppaarraa uummaa aattuuaaççããoo qquuaalliiffiiccaaddaa

Assistentes Sociais SSA/RJ

30%

70% Áreas de

especialização da

prática médica

Atualização

Profissional

Fonte: HORTA, G.M. No Meio da Travessia. A prática das assistentes sociais nos serviços de saúde da Aeronáutica/RJ, 2009.

O estudo buscou identificar qual tipo de conhecimento o assistente social tem

que ter para atuar de forma qualificada na Aeronáutica. Observamos que 70% dos

entrevistados assinalam a atualização profissional e somente 30% aponta a

especialização em áreas da prática médica (gerontologia e geriatria, doenças

infecto-parasitárias, oncologia e doenças cardíacas). Vejamos os depoimentos

“(...) Legislação, políticas públicas, direito previdenciário etc...”.

“(...) Atualização e qualificação, aquele profissional qualificado que consegue intervir bem, mostra diferença e conquista seu espaço”.

“(...) Uma constante atualização, aí o assistente social pode direcionar melhor o seu trabalho”.

Page 164: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

162

De uma maneira geral, verificamos que, apesar da maioria dos entrevistados

dizer que é importante ter um conhecimento teórico para desenvolvimento do

trabalho, as leituras realizadas, na realidade são parcas e pontuais.

Os assistentes sociais colocam como elementos que dificultam a prática

cotidiana, a falta de pessoal, a falta de apoio da direção das unidades, a

desvalorização do papel do assistente social, a alta demanda, o desconhecimento

dos profissionais acerca do papel do Serviço Social. Na ótica dos assistentes

sociais,estes fatores inviabilizam o planejamento das ações e acabam por priorizar

as demandas imediatas. Observemos os depoimentos:

“Trabalhamos muito com o apagar de incêndio, atendimento imediato, resolver aquela situação momentânea que já chega ao extremo para nós”.

“(...) Qualquer pessoa que se dirige à recepção, lá eles não sabem responder sobre qualquer coisa,e encaminham direto para o Serviço Social”.

“(...) Sempre digo: não sou bombeiro, não apago incêndio”.

“(...) Os grandes problemas que o hospital enfrenta não são solucionados, quem sofre é o usuário. Porque então a Direção não nos chama para ouvir nossas sugestões, ouvir o que o serviço social pode fazer para o usuário. Chega tudo aqui, ou seja, nós que sabemos das grandes dificuldades dos usuários”.

Apesar da postura passiva em que se coloca uma das profissionais

entrevistadas: ―Porque então a Direção não nos chama para ouvir nossas

sugestões”. Percebemos que, em sua maioria, as assistentes sociais apresentam

em seu discurso, uma postura propositiva no sentido de defender o seu campo de

trabalho, suas qualificações e atribuições profissionais. Contudo, ao propor e

negociar com a instituição os seus projetos, as assistentes sociais assumem uma

postura passiva no sentido de direcionar suas ações (vide gráfico 23).

Pois bem. Será que o cotidiano institucional não deixa patente a existência de

um conjunto de demandas que revela a utilidade da profissão na dinâmica dos

processos coletivos de trabalho nos serviços de saúde (COSTA, 2007).

Será que os assistentes sociais subestimam a utilidade e o conteúdo das

suas práticas?

Os assistentes sociais não podem desconsiderar de que a atividade do

profissional do Serviço Social, como tantas outras profissões está submetida a um

conjunto de determinações sociais inerentes ao trabalho na sociedade capitalista,

quais sejam: o trabalho assalariado, o controle da força de trabalho e a

Page 165: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

163

subordinação do conteúdo do trabalho aos objetivos e necessidades das entidades

empregadoras. De acordo com a autora o trabalho dos assistentes sociais não se

desenvolve independentemente das circunstâncias históricas e sociais que o

determinam de fato. A inserção do Serviço Social nos diversos processos de

trabalho encontra-se profunda e particularmente enraizado na forma como a

sociedade brasileira e os estabelecimentos empregadores do Serviço Social

recortam e fragmentam as próprias necessidades do ser social e a partir desse

processo como organizam seus objetivos institucionais que se voltam à intervenção

sobre essas necessidades. (COSTA, 2007, p.306).

O assistente social só consegue obter sentido e significado para a sua prática

entendendo-a como participe da realidade social na qual esta inserida e situada nas

relações entre as classes sociais e nas relações destas com o Estado tendo em

vista dar respostas das demandas colocadas para o Serviço Social, de maneira a

romper

(...) com práticas que reproduzem ou mantém o status quo (negação de

praticas conservadoras que utilizam conscientemente ou não e/ou

privilegiam técnicas de marginalização, atomização, controle, exclusão,

punição). (VASCONCELOS, 1998, p.117-118, grifo no original).

Page 166: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

164

Considerações Finais

Nosso esforço neste estudo é apresentar a prática das assistentes sociais

que atuam nos serviços de saúde da Aeronáutica (RJ).

É de uma riqueza muito grande a complexidade inerente a esse espaço

profissional. Ao iniciarmos a pesquisa, não poderíamos imaginar o quanto instigante

e difícil seria estudar esse universo.

Também consideramos que este esforço foi arriscado, pois nos encontramos

inseridas nesse espaço e conjugamos a prática interventiva com a reflexão

sistemática sobre a mesma. Destarte, nossa inserção na Aeronáutica se deu pela

formação profissional e não por uma vinculação cívico-militar.

O interesse, portanto, em realizar um estudo junto às assistentes sociais

inseridas nos serviços de saúde da Aeronáutica (RJ) se definiu pela necessidade de

uma investigação teórica que possibilite analisar, revelar e divulgar um segmento da

categoria, muitas vezes desconhecido e estranho ao conjunto dos profissionais do

Serviço Social.

Acreditamos que a ação de pesquisar está situada entre as exigências postas

ao Assistente Social na contemporaneidade e que imprime uma necessidade de

romper com práticas espontaneístas, superando a dicotomia entre investigação e

intervenção.

Consideramos que para uma melhor compreensão desse espaço, torna-se

imprescindível captarmos, na realidade concreta, os limites e as possibilidades do

movimento do real na sua historicidade. Portanto, o referencial teórico marxista

crítico-dialético nos orientou em ir para além da aparência dos fatos.

Partimos de um resgate do período sócio-histórico do regime ditatorial (1964

a 1985), até a retomada das bases federativas do Estado brasileiro, sendo este

essencial para que possamos compreender as análises feitas sobre a significação

do golpe militar de 64 e os determinantes históricos que permitiram a implantação da

ditadura no país e as conseqüências desta na configuração do Estado brasileiro.

Em seguida, abordamos o processo de redemocratização no país com a vital

participação dos movimentos sociais, bem como a histórica interlocução do Serviço

Social brasileiro com estes, em específico, com o movimento sindical-operário.

Page 167: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

165

Sinalizamos que a relação do Serviço Social brasileiro com o movimento sindical-

operário contribuiu, sobremaneira, para uma nova perspectiva para a categoria dos

assistentes sociais que pretendia uma ruptura com o conservadorismo profissional.

Nesse percurso, destacamos a trajetória da política de saúde no Brasil e o

processo descentralização da saúde ante ao conjunto de reformas político-

institucionais iniciadas na década de 80, com destaque para a constituição de um

Sistema Único de Saúde ao final dos anos 80. Objetivamos refletir sobre a política

de saúde nos anos 80 e 90, culminando nos desafios atuais desta, no governo Lula.

Tendo como referência os aspectos anteriormente discutidos, apresentamos a

configuração da prática dos assistentes sociais na área da saúde, sinalizando os

desafios e as polêmicas postas na atualidade para uma prática mediada pelo projeto

profissional hegemônico do Serviço Social brasileiro.

Ao falarmos de prática profissional, nos remetemos à concepção cunhada

pela tradição marxista. Ou seja, a de que a prática profissional é uma especialização

da práxis social. Na perspectiva apontada por Vázquez (1977, p. 154), ―a práxis é o

fundamento e limite do conhecimento e do objeto humanizado que, como produto da

ação, é objeto do conhecimento‖, ou seja, a práxis é o ponto de partida e o alicerce

para aferir e validar o conhecimento, bem como estabelecer o critério de sua

verdade, necessitando, para tanto, ―plasmar-se, adquirir corpo na própria realidade,

sob a forma de atividade prática‖. Portanto, a atividade teórica em si não é práxis,

ela só adquire plenitude na prática concreta dos homens.

Nesse sentido, consideramos que tratar da prática profissional das

assistentes sociais na saúde/Aeronáutica implica em retratar especialmente o

Sistema de Saúde, assim como o Sistema de Assistência Social dessa instituição.

Isso nos permite evidenciar que o SISAU difere significativamente de um modelo

privado de saúde por não ser comercializável e ter administração pública, além de

não considerar faixas etárias no estabelecimento dos valores. Por outro lado, como

visto, difere substancialmente da proposta do SUS, pois, está apresenta propostas e

práticas concretas de controle social, transparência administrativa, gestão

participativa e democratização, além de assegurar a universalidade do acesso e a

integralidade da atenção, apesar da real distância entre o direito legal e sua

expressão no cotidiano.

Page 168: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

166

Os serviços de saúde da Aeronáutica visam a assistência médico-hospitalar

aos militares (ativos e inativos) e aos seus dependentes. Informa, portanto,

assegurar o acesso e a humanização do atendimento na saúde.

Questionamos, porém, se existe uma aplicação privilegiada de recursos de

custeio nos níveis de maior complexidade, em detrimento da atenção primária e se

esta atende aos problemas de saúde individuais e coletivos, cuidando da qualidade

da saúde e não apenas sendo capaz de tratar das doenças e acometimentos graves

com risco à vida.

Entendemos que as ações de promoção, proteção e de recuperação formam

um todo indivisível que não podem ser fragmentadas. Assim, a integralidade não é

apenas uma diretriz do SUS definida constitucionalmente. Ela é uma “bandeira” de

luta dos sujeitos sociais. Os usuários do SISAU ao contribuírem para o Fundo de

Saúde da Aeronáutica asseguram o direito não só à complementação de suas

despesas pelo Fundo como também o acesso integral aos serviços de saúde por ele

oferecidos.

Ao considerarmos os pressupostos contidos no Código de Ética do Assistente

Social, na Lei de Regulamentação da Profissão e no Projeto Ético- Político,

destacamos, em especial, os princípios concernentes à ampliação e consolidação da

cidadania e à gestão democrática de serviços, programas e políticas sociais, à

defesa do aprofundamento da democracia enquanto socialização da participação

política. Ressaltamos do Código, o dever do assistente social com os usuários:

―contribuir para a viabilização da participação efetiva da população usuária nas

decisões institucionais” (CFESS, 1993).

Diante disso, ao entrarmos em contato com os assistentes sociais,

constatamos que na intervenção das profissionais, nos limites da pesquisa realizada,

a hegemonia do projeto ético-político do Serviço Social não se expressa.

É oportuno enfatizar a presença de dois grupos de profissionais nesse

espaço, a saber: as assistentes sociais militares temporárias, com formação mais

recente, entre os anos de 1996 a 2002; e as assistentes sociais militares do extinto

quadro feminino, juntamente, com as servidoras civis, que se formaram entre os

anos de 1977 a 1988. Identificamos que este grupo não tem uma formação e

atuação muito recente no Serviço Social, o que deveria contribuir para a existência

Page 169: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

167

de um planejamento de suas atividades. Ou seja, uma prática planejada e avaliada

nas suas conseqüências.

O Serviço Social acabou sendo agregado às requisições da instituição de

―resolver‖ problemas. Percebemos que na sua maioria as atividades realizadas pelas

assistentes sociais são ―soltas‖, desconectadas de um planejamento maior do setor,

sem buscar atingir um objetivo predeterminado.

Desse modo, parcela significativa das profissionais entrevistadas não teve

como referência, no seu processo de formação acadêmica, os princípios e as

diretrizes contidas nas Diretrizes Curriculares da ABEPSS (1996). Importa

considerarmos que a questão da precariedade de admissão das assistentes sociais

(oficias temporários) afeta o cotidiano profissional, influenciando as decisões das

profissionais; estas acabam por limitar sua prática na esfera da execução

burocrática das atividades.

Parcela significativa de assistentes sociais temporários tem sido requisitada

para atuar na assistência social. Ou seja, há uma tendência, na Aeronáutica, assim

como no executivo, nos seus diferentes níveis (Vide Mota, 2008), de priorizar a

Política de Assistência Social em detrimento das demais políticas.

Consideramos que a relação explicitamente conflituosa entre as assistentes

sociais civis e militares afeta o cotidiano da prática profissional e as respostas

profissionais ante a demanda dos usuários. Na verdade, o conflito está posto pela

instituição.

É interessante observarmos que as questões mais singulares que vigoram no

cotidiano das instituições militares - como a racionalidade burocrática; a autoridade

militar; a disciplina e a hierarquia - não comparecem nos depoimentos das

assistentes sociais como um elemento negativo e de estímulo para o egresso da

instituição.

As assistentes sociais consideram que o Serviço Social na Aeronáutica possui

uma boa e adequada infra-estrutura para o desenvolvimento das atividades,

dispondo de recursos e materiais (computadores com acesso a rede internet;

aparelhos de fax; materiais de escritório; telefones para ligações externas; materiais

diversos de escritórios, móveis adequados), bem como um espaço físico que

propicia o atendimento sigiloso aos usuários.

Page 170: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

168

Por outro lado, as assistentes sociais entrevistadas não vislumbram a

possibilidade de uma profícua articulação entre instituição e unidades de ensino,

através do estágio supervisionado. Isso é confirmado com a atual inexistência de

campos de estágio de Serviço Social nas unidades pesquisadas.

A metade das assistentes sociais possui, conhece e manuseia, ainda que

eventualmente, o Código de Ética Profissional. Há que se considerar que a outra

metade das assistentes sociais desconhece ou não manuseia o Código. Ora, este

fato e a quantidade e qualidade de leituras realizadas pelas profissionais nos remete

a pensar que a prática das assistentes sociais se objetiva em ações espontâneas e

instintivas, partindo da experiência pessoal do profissional, sem referências teórico-

metodológicas.

Embora, as assistentes sociais tenham elencado com referência para pensar

a prática profissional, autores progressistas do Serviço Social, não significa,

necessariamente, que as profissionais entrevistadas, assumem um compromisso

ético-político proposto pela direção estratégica da profissão. Algumas assistentes

sociais mostram preocupação com o “como fazer” e de forma implícita demonstram

buscar autores que apresentem a famosa “receita do bolo” da prática profissional.

Podemos captar que tem repercutido nesse espaço, ainda que de forma

incipiente, a formação especializada na abordagem clínica e na prática

terapêutica, autodenominada pelos seus executores como Serviço Social Clínico.

Apesar de parte das assistentes sociais afirmarem conhecer o Código e

postularem a viabilidade do projeto ético-político do Serviço Social nos serviços de

saúde da Aeronáutica /RJ, acreditam nesta viabilidade com limitações. O que nos

levou a apreender uma contradição no alcance da pesquisa realizada: a hegemonia

do Projeto Ético-Político do Serviço Social não se expressa nos serviços de saúde

da Aeronáutica, apesar do alto percentual (70%) de profissionais sinalizarem a

viabilidade do projeto. Ou seja, as assistentes sociais têm uma postura

comprometida em nível do discurso, mas não garantem essa perspectiva na prática

realizada.

Aquelas profissionais que demonstraram uma perspectiva mais crítica quanto

à sua intervenção profissional e quanto à realidade da instituição militar, estando

mais próximas do projeto profissional hegemônico da categoria, não fazem frente ao

Page 171: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

169

conjunto das assistentes sociais da Aeronáutica que não coadunam com a

perspectiva emancipatória do projeto ético-político do Serviço Social.

Por outro lado, constatamos que as assistentes sociais que expressaram

desconhecer o Código apresentam habilidade técnica no sentido de garantir o

espaço ocupacional do Serviço Social na instituição e uma preocupação em atender

as demandas dos usuários de forma qualificada na garantia do acesso desses aos

seus direitos, bem como em priorizar um atendimento de escuta e acolhimento.

Mesmo reconhecendo que determinadas requisições e demandas não são

exclusivas da intervenção profissional do assistente social, aceitam realizar todas as

atividades ―possíveis‖ para dar atenção ―o apagar de incêndio‖ em detrimento de um

estudo do conjunto de demandas dirigidas ao Serviço Social nos serviços de saúde

da Aeronáutica.

Sinalizamos a ausência de estudo da demanda dos usuários dos

serviços e da própria dinâmica institucional, como também, não comparece

indicativo por parte das entrevistadas, em priorizar o mesmo.

Entendemos como uma questão de escolha das assistentes sociais em não

se qualificarem, haja vista o indicativo da instituição no tocante à possibilidade de

liberação do profissional para estudo e aprimoramento. Identificamos a contradição

dessa escolha, pois, ao mesmo tempo em que metade das profissionais afirma ter

uma ―qualificação‖, quase que na mesma proporção (40%), alega não ser importante

para a prática profissional priorizar a formação continuada.

Assim, se pensarmos no motivo pela qual o projeto ético-político do Serviço

Social não é hegemônico na Aeronáutica, encontramos, na análise de Vasconcelos

(2002), dentre outros motivos, que, apesar do discurso progressista, boa parte dos

assistentes sociais continua atuando de uma forma conservadora, havendo um

distanciamento entre a proposta de formação profissional, o debate teórico -

critico e a prática profissional.

Entendemos que a crítica pela crítica não suscita modificação alguma. De

acordo com Marx, a crítica está a serviço de algo que não ela mesma. De igual modo,

para ele a interpretação não transforma a realidade, assim como também não é

suficiente tomar consciência.

Page 172: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

170

No entanto, apesar da insuficiência de toda interpretação e da tomada de

consciência, estes momentos não deixam de ser necessários. Valemo-nos, portanto,

das palavras de Marx:

A crítica colheu nas cadeias as flores imaginárias, não para que o homem suporte as cadeias sem capricho ou consolação, mas para que lance fora as cadeias e colha a flor viva. A crítica [...] liberta o homem da ilusão, de modo que pense, ative e configure a sua realidade como homem que perdeu as ilusões e reconquistou a razão, a fim de que ele gire em torno de si mesmo e, assim, à volta do seu verdadeiro sol (1989:78).

Com base na proposta do CFESS - Parâmetros para a Atuação de

Assistentes Sociais na Saúde (2009) – assinalamos perspectivas e alternativas para

a prática dos assistentes sociais nos serviços de saúde, a saber:

a) Que as profissionais estabeleçam prioridades. O conjunto de demandas

emergenciais, se não for direcionado para os setores competentes por

meio do planejamento coletivo elaborado na unidade, vai

impossibilitar ao assistente social o foco no desenvolvimento de

suas competências e atribuições. A elaboração de protocolos que

definem o fluxo de encaminhamentos para os diversos serviços na

instituição é fundamental.

b) Que as assistentes sociais priorizem a avaliação socioeconômica dos

usuários com o objetivo der ser um meio que possibilite a mobilização dos

mesmos para a garantia de direitos e não um instrumento que impeça o

acesso aos serviços. Ou seja, superar a avaliação socioeconômica que

funcione somente como critério de elegibilidade e/ou seletividade

estrutural. (somente para os benefícios sociais do SAS).

c) Que as assistentes sociais não se pautem no atendimento

psicoterapêutico a indivíduos e familiares, pois, este não potencializa

a orientação social com vistas à ampliação do acesso dos indivíduos e

da coletividade aos direitos sociais.

d) Os Programas da Instituição e os trabalhos em equipe merecem ser

refletidos pelas profissionais. As atribuições do assistente social precisam

ficar especificadas e divulgadas para os diversos profissionais. O

Page 173: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

171

assistente social, ao participar de trabalho em equipe na saúde, dispõe de

ângulos particulares de observação na interpretação das condições de

saúde do usuário e uma competência também distinta para o

encaminhamento das ações, que o diferencia do médico, do enfermeiro,

do nutricionista e dos demais trabalhadores que atuam na saúde.

Conforme assevera Iamamoto (2002, p.41) ―o trabalho coletivo não dilui as

competências e atribuições de cada profissional, mas, ao contrário, exige

maior clareza no trato das mesmas”. A atuação em equipe, desse modo,

vai requerer do assistente social a observância dos princípios ético-

políticos, explicitados nos diversos documentos legais (Código de Ética

Profissional e Lei de Regulamentação da Profissão, ambos datados de

1993 e Diretrizes Curriculares da ABEPSS).

e) Há que se apreender as ações socioeducativas como orientações

reflexivas e socialização de informações realizadas através de

abordagens individuais ou coletivas ao usuário, família e população de

determinada área programática.

f) Que as profissionais priorizem as ações de mobilização, participação e

controle social voltadas prioritariamente para a inserção dos usuários,

familiares e trabalhadores de saúde nos espaços democráticos de controle

social e construção de estratégias para fomentar a participação e defesa

dos direitos pelos usuários/trabalhadores.

g) Que as assistentes sociais nas ações de investigação, planejamento e

gestão, tenham como perspectiva o fortalecimento da gestão democrática

e participativa capaz de produzir, em equipe e intersetorialmente,

propostas que viabilizem e potencializem a gestão em favor dos usuários e

trabalhadores de saúde, na garantia dos direitos sociais.

h) Uma prática mediada pelo projeto ético-político profissional exige

assessoria e qualificação teórica; ou seja, formação permanente. As

atividades de qualificação profissional consistem em treinamento,

preparação e formação de recursos humanos voltados para a educação

permanente de funcionários; qualificar os trabalhadores de saúde na

Page 174: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

172

esfera operacional da unidade, além de instrumentalizar a formação de

equipes. Estas ações devem ser realizadas com a participação de outros

profissionais e não isoladamente. A formação profissional pode ser

potencializada através da criação de campos de estágio, supervisão de

estagiários, bem como a criação e/ou participação nos programas de

residência multiprofissional. A articulação com as unidades de formação

acadêmica é fundamental para a garantia da qualidade da formação

permanente.

Reconhecemos que o trabalho em instituições militares é complexo,

contraditório e limitador. Contudo, há que se considerar que não comparece nas

repostas das profissionais fatores insatisfatórios quanto as suas condições de

trabalho nesse âmbito institucional. Ainda que limitações se façam presentes, o que

merece destaque aqui é que não são as condições de trabalho que impedem

uma prática mediada pelo projeto profissional hegemônico do Serviço Social

na Aeronáutica. Dito de outro modo, o que dá materialidade a esse projeto são as

ações interventivas das assistentes sociais, ou seja, o projeto só pode se

concretizar nas ações profissionais cotidianas.

Ante o exposto, acreditarmos sim na viabilidade do projeto profissional do

Serviço Social na Aeronáutica. É necessário demonstrar nas situações singulares

em que as profissionais se defrontam na prática profissional a viabilidade do projeto

ético-político do Serviço Social, seu potencial renovador da profissão na afirmação

dos direitos sociais dos cidadãos, bem como na atenção e no respeito às suas

necessidades e interesses que, por inúmeras mediações, se transmutam em

demandas e profissionais (IAMAMOTO, 2007).

(...) Ora, são muitas conquistas da nossa profissão para nós, aqui na Aeronáutica,

recuarmos, logo agora. Para então, cruzarmos os braços e dizermos que não nos

resta nada a fazer...

(Assistente Social dos Serviços de Saúde da Aeronáutica).

Page 175: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

173

Referências Bibliográficas

ABRAMIDES, Maria Beatriz Costa e CABRAL, Maria do Socorro. O novo sindicalismo e o serviço social: trajetória de luta de uma categoria: 1978-1988. São Paulo: Cortez, 1995.

___________. Desafios do projeto profissional de ruptura com o conservadorismo. Serviço Social e Sociedade. São Paulo: Cortez, Ano XXVIII Especial, nº. 91, setembro de 2007. AMIN, Samir e HOUTART, François. Mundialização das Resistências - O estado das lutas. São Paulo: Cortez Editora, 2003. ANTUNES, Ricardo. Adeus ao trabalho? Ensaios sobre as metamorfoses e a centralidade do mundo do trabalho. São Paulo: Cortez – Unicamp, 1995.

___________. A dialética do Trabalho: escritos de Marx e Engels. São Paulo:

Expressão Popular, 2004. ARENDT, Hannah. Responsabilidade e Julgamento. 1º. ed. São Paulo:

Companhia das Letras, 2004. 375 p.

ARRETCHE, Marta Teresa da Silva. Estado Federativo e Políticas Sociais: Determinantes da Descentralização. Rio de Janeiro: Revan; São Paulo: FAPESP,

2000. ___________. Políticas Sociais no Brasil: Descentralização em um Estado Federativo. In: REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS – Nº 40. Volume 14,

RBCS, junho de 1999. ARRUDA. João Rodrigues. O Uso Político das Forças Armadas e outras questões militares. Rio de Janeiro: Mauad X, 2007.

BAPTISTA. Myrian.V. A investigação em Serviço Social. São Paulo: Veras

Editora: Lisboa [Portugual]:CPIHTS, 2006. BARROCO, Mª.Lúcia.S. Ética e Serviço Social: fundamentos ontológicos. São Paulo: Cortez, 2001. ___________. Os Fundamentos sócio-históricos da ética. In Capacitação em

Serviço Social e política social: Módulo 2: Reprodução social, trabalho e Serviço Social. Brasília: CFESS/APEPSS/CEAD/UnB, 1999. ___________. Informe: o novo Código de Ética Profissional do Assistente Social. Revista Serviço Social e Sociedade, n. º 41, 1993, p. 158-62.

Page 176: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

174

___________. Ética e Sociedade: Curso de Capacitação Ética para Agentes

multiplicadores. 2ª edição Brasília: CFESS, 2004

BASTOS, Elide Rugai (org.). Intelectuais; sociedade e política, Brasil/França. São

Paulo Cortez, 2003. BEHRING, Elaine Rossetti. Brasil em contra-reforma: desestruturação do Estado e perda de direitos. São Paulo, Cortez, 2003.

BEHRING, Elaine Rossetti e BOSCHETTI, Ivanete. Política social: fundamentos e história. São Paulo: Cortez, 2006(Biblioteca Básica de serviço social; v.2). BONETTI, Dílsea. A. [et al.] (org.). Serviço Social e Ética: convite a uma nova práxis. São Paulo: Cortez /CFESS, 1996.

BOTTOMORE, Tom (org.). Dicionário do Pensamento Marxista. Rio de Janeiro:

Jorge Zahar, 1988. BRAVO. Maria Inês Serviço Social e Reforma Sanitária: Lutas Sociais e Práticas Profissionais. São Paulo: Cortez; Rio de Janeiro: UFRJ, 1996.

____________. O Serviço Social na Saúde na década de 90. In: Superando Desafios - Cadernos do Serviço Social do HUPE (03). Rio de Janeiro: UERJ, 1998. ____________. Política de Saúde no Brasil in Serviço social e saúde, formação

trabalho profissional, Ana Elizabete Mota [et al.] (orgs). – Cortez Editora, 2 ed. – São

Paulo, 2007.

BRAVO, Mª Inês e MATOS, Maurílio Castro de (orgs.). Reforma Sanitária e projeto

ético-político do Serviço Social: elementos para o debate In: Saúde e Serviço

Social. São Paulo: Cortez; Rio de Janeiro: UERJ, 2004.

BRAVO. Maria Inês [et al.] (org.). Saúde e Serviço Social. São Paulo: Cortez; Rio de Janeiro: UERJ, 2004. _____________. Projeto Ético-Político do Serviço Social e sua relação com a

Reforma Sanitária: Elementos para o debte in Serviço social e Saúde, Formação

Trabalho Profissional, Ana Elizabete Mota [et al.] (orgs). – Cortez Editora, 2 ed. –

São Paulo, 2007. pp.197-217.

BRAVO, Mª Inês e MATOS, Maurílio Castro de (orgs.). Assessoria, Consultoria &

Serviço Social. Rio de Janeiro. 7 Letras, FAPERJ, 2007.

BRAVO, Mª Inês e MENEZES, Juliana S. Bravo. Política de Saúde no Governo Lula. In Política de Saúde na atual conjuntura: modelos de gestão e agenda para a saúde, BRAVO,M. Inês [et al]. 2ª ed.Rio de Janeiro: Rede Sirus/Adufrj-SSind, 2008.

Page 177: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

175

____________. NOTAS EM AULA. Disciplina Eletiva -. Professora Dra. Maria Inês Souza Bravo. Tópicos Especiais em Serviço Social: Saúde, Movimentos Sociais e Serviço Social. Semestre 2009.1

BRAZ, M.M.R. Notas sobre o Projeto ético-político do Serviço Social. In:

Coletânea de Leis e Resoluções. Assistente Social: Ética e direitos. CRESS 7.ª Região. Rio de Janeiro, 2004. ____________. O Governo Lula e o projeto ético-político do Serviço Social In:

Revista Serviço Social e Sociedade, nº 78, 2004, pp.49-67. _____________. A hegemonia em xeque. Projeto ético-político do Serviço Social e seus elementos constitutivos In: Revista Inscrita, nº 10, 2007, pp.5-10 BURIOLA, M. A. F. Supervisão em serviço social: o supervisor, sua relação e seus

papéis. São Paulo: Cortez, 1996. CARVALHO, José. Murilo. Forças Armadas e Política no Brasil. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editora, 2005. CASTRO PINTO, Sílvia. P.L. [et al.]. O Desafio multidisciplinar: um modelo de instituição de longa permanência para idosos. Casa Gerontológica de Aeronáutica Brigadeiro Eduardo Gomes. São Caetano do Sul (SP): Yendis Editora, 2006. CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL. Código de Ética Profissional do Assistente Social /1993 e Lei 8.662/1993,que regulamenta a profissão de Serviço

Social. Brasília, 1993. CFESS/ABESS/ENESSO. O Serviço Social a caminho do século XXI: o protagonismo ético-político do conjunto CFESS/CRESS, In: Serviço Social &

Sociedade, Ano XVII, nº. 50, São Paulo: Cortez, 1996. CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL. Assistente social: ética e direitos. Coletânea de leis e resoluções. Belo Horizonte: Cress 6ª região, maio de 2003.

CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL. Curso de capacitação ética para agentes multiplicadores: ética e práxis profissional. 2. ed. Módulo II. Brasília: CFESS, 2004. ___________. Relatórios das sessões temáticas. IX Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais – “O Serviço Social rumo ao século XXI: trabalho e projeto ético-político profissional‖. Goiânia: CFESS/ABESS/ENESSO, 1998. ___________. Parâmetros para Atuação de Assistentes Sociais na Saúde

(versão preliminar). Grupo de Trabalho Serviço Social na Saúde, DF: Conselho Federal de Serviço Social, 2009. COSTA, M. D. H. O trabalho nos serviços de saúde e a inserção dos assistentes sociais. In: Serviço Social e Sociedade. n.º 62. São Paulo: Cortez, 2000.

Page 178: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

176

___________. O trabalho nos serviços de saúde e a inserção dos assistentes sociais. In: MOTA. A. E. [et al], (orgs).Serviço Social e saúde, formação e trabalho profissional, 2ª ed, Ed. Cortez, 2007, p. 304. COUTINHO, C. N. Crise e redefinição do Estado brasileiro. In Lesbaupin, I. e

Peppe, A. Revisão constitucional e Estado democrático. São Paulo: Loyola, 1993. D‖ARAUJO. Mª Celina. As forças armadas na Nova República In: D‘INCAO, Maria Ângela. (org.). O Brasil não é mais aquele... Mudanças após a Redemocratização. São Paulo: Cortez, 2001. pp.325-340. D‘INCAO, Maria Ângela. (org.). O Brasil não é mais aquele... Mudanças após a Redemocratização. São Paulo: Cortez, 2001.

DRAIBE, Sônia Miriam. As políticas sociais e o Neoliberalismo: reflexões suscitadas pelas experiências latino-americanas. Revista USP,1993. p.86-101. DEIFRUSS, René Armand. 1964: A Conquista do Estado – Ação Política, Poder e Golpe de Classe. Petrópolis: Vozes, 1981. 814 p. DURKHEIM, Émile. Da divisão do trabalho social. 2ª ed. São Paulo: Martins

Fontes, 2004. FERNANDES, Florestan. A Ditadura em Questão. São Paulo: T. A Queiroz, 2ª edição, 1982. ___________. A Revolução Burguesa no Brasil: uma interpretação sociológica,

5ª edição. São Paulo: Editor Globo, 1987. ___________. Pensamento e Ação: o PT e os rumos do socialismo. Ed. Globo, São Paulo, 2006. GOHN, Maria da Glória. Classes Sociais e Movimentos Sociais in Capacitação em

Serviço Social e Política Social: Módulo 2: Crise Contemporânea, Questão Social e

Serviço Social – Brasília: CEAD, 1999, p.37-54.

GORENDER, Jacob. Combate nas Trevas – A Esquerda Brasileira: Das Ilusões

Perdidas à Luta Armada. Editora Ática, 1984. GUERRA, Yolanda. A instrumentalidade do Serviço Social. São Paulo: Cortez, 1999. ___________. O projeto profissional crítico: estratégia de enfrentamento das condições contemporâneas da prática profissional. Serviço Social e Sociedade.

São Paulo: Cortez, Ano XXVIII Especial, nº 91, setembro de 2007. ___________. O Serviço Social Frente à crise contemporânea: demandas e

perspectivas. In: Revista Ágora: Políticas Públicas e Serviço Social, Ano 2, nº 3, dezembro de 2005. Disponível em:<http//:www.assistentesocial.com.br> Acesso em novembro de 2009.

Page 179: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

177

HARVEY, David. Condição pós-moderna: uma pesquisa sobre as origens da

mudança cultural. São Paulo, Ed. Loyola, 2003, 12ª ed, p. 257-276 HORTA, Gisele M. A Universalização da Atenção à Saúde: A real distância entre o direito legal e sua expressão no cotidiano. Trabalho de Conclusão de curso,

MG, UFJF: mimeo,1999 a. HUGGINS, Martha K. Política e Polícia: relações Estados Unidos/América Latina. São Paulo: Cortez, 1998.

IAMAMOTO, Marilda.V; CARVALHO, R. Relações Sociais e Serviço Social no Brasil. São Paulo: Cortez/CELATS, 1985. ___________. Renovação e Conservadorismo no Serviço Social no Brasil. Ensaios críticos. São Paulo: Cortez, 1995. ___________. O Serviço Social na Contemporaneidade: trabalho e formação profissional. São Paulo: Cortez, 1998.

___________. O trabalho do assistente social frente às mudanças do padrão de acumulação e de regulação social. In: Capacitação em Serviço Social e política social: Módulo I: crise contemporânea questão social e Serviço Social. Brasília: CFESS/APEPSS/CEAD/UnB, 1999. ___________. Serviço Social em tempo de Capital Fetiche: capital financeiro, trabalho e questão social. São Paulo: Cortez, 2007.

IANNI, Octavio (org). Florestan Fernandes: sociologia crítica e militante. 3ª edição. São Paulo: Expressão Popular, 2004. ILHA, Livi, Hélio. A profissão militar. Documento didático do Curso de Formação e

Estágios de Adaptação Militar. CIAAR, Belo Horizonte: DEPENS/COMAER, 1988.

LAURELL, A.C. (org). Estado e Políticas no Neoliberalismo. São Paulo: Cortez,

1995.

LESBAUPIN, Ives. O Desmonte da Nação: balanço do governo FHC. Petrópolis:

Vozes, 2002. LUDWIG, Antonio Carlos Will. Democracia e Ensino Militar. São Paulo: Cortez, 1998. (Coleção questões da nossa época, v. 66).

MACHADO. Cristiani V. Política de Saúde no Governo Lula: continuidades e

mudanças. DAPS/ENSP/FIOCRUZ, Meeting of the latin American Studies

Association. Montreal, Canadá, september 5-8, 2007.

MACHADO, Leila. E. O Conservadorismo Clássico – elementos de

caracterização e crítica. Rio de Janeiro: ESS/UFRJ mimeo, 1997.

Page 180: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

178

MARSIGLIA, Regina Mª Giffoni. Orientações Básicas para a Pesquisa. In MOTA,

Ana Elizabete (org.). Serviço Social e Saúde: formação e trabalho profissional. 2º edição, São Paulo : OPAS, OMS, Ministério da Saúde, 2007. MARX, Karl. Crítica da Filosofia do Direito de Hegel. Portugal: Editorial Presença,

1989. ___________. Manifesto do Partido Comunista. São Paulo: Paz e Terra, 1998.

___________. O Capital: crítica da economia política / Karl Marx. São Paulo:

Abril Cultural, 1983. ___________. Introdução à Crítica da Economia Política. In: Marx. Col. Os Pensadores. São Paulo, Abril Cultural, 1983.

MENDES, E.V. Uma agenda para a saúde. 2ª ed. São Paulo: Hucitec, 1996.

MINAYO, Maria Cecilia et alli (org.). Pesquisa social: teoria, método e

criatividade. Petrópolis, RJ: Vozes, 1994.

MOISÉS, José Álvaro. Cidade, Povo e Poder. Petrópolis: Vozes; São Paulo:

CEDEC, 1982. MONTÂNO, Carlos. A natureza do Serviço Social: um ensaio sobre sua gênese, a

―especificidade‖ e sua reprodução. São Paulo: Cortez, 2007.

MOTA, Ana Elizabete. Cultura da Crise e Seguridade Social. 3ª edição: São

Paulo, Cortez, 2005.

MOTA. Ana Elizabete [et al.] (org.). Serviço Social e Saúde. 2.º ed. – São Paulo:

OPAS, OMS, Ministério da Saúde, 2007. MOREIRA. Altair da Silva. Visão Teórica do Serviço Social no Hospital de Força Aérea do Galeão/HFAG. mimeo, agosto de 1981.

NETTO, José Paulo. Notas sobre marxismo e Serviço Social: suas relações no

Brasil e a questão do seu ensino. In: Cadernos ABESS n.°4. São Paulo: Cortez,

1991.

___________. Ditadura e Serviço Social: uma análise do Serviço Social pós-64. 3ª Ed. São Paulo: Cortez, 1994. __________. Transformações Societárias e Serviço Social – notas para uma análise prospectiva da profissão no Brasil. Serviço Social e Sociedade. São Paulo: Cortez, Ano XVII, n. º 50, abril de 1996. ___________. A construção do projeto ético-político do Serviço Social frente à crise contemporâneo In: Capacitação em Serviço Social e política social. Módulo 1: Crise contemporânea, questão social e Serviço Social. Brasília: CFESS/APEPSS/CEAD/UnB, 1999.

Page 181: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

179

___________. A conjuntura brasileira: O Serviço Social posto à prova. Serviço

Social e Sociedade. São Paulo: Cortez, Ano XXV, n. º 79 - setembro de 2004. ___________. Capitalismo Monopolista e Serviço Social. São Paulo, Cortez,

1992.

___________. Das Ameaças à Crise In: Revista Inscrita, nº 10, 2007, pp. 37-40. NOGUEIRA, Vera. M. R. e MIOTO,Célia. D. Desafios Atuais do Sistema Único de

Saúde – SUS e as Exigências para os Assistentes Sociais In: Serviço Social e

Práticas Democráticas na Saúde. In: MOTA, A. E; BRAVO, M.I. de S.; UCHÔA, R.;

et al., (orgs). Serviço Social e Saúde. Formação e trabalho profissional. São

Paulo: OPAS, OMS, Ministério da Saúde, ABEPSS. Editora Cortez, 2007.

ORTIZ, Fátima Grave. Serviço Social e Ética: a Constituição de uma Imagem

Social Renovada In: FORTI, Valéria e GUERRA, Yolanda (orgs.). Ética e Direitos: Ensaios Críticos. Coletânea Nova de Serviço Social. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2009, pp. 123 – 138. QUIROGA, Consuelo. Invasão Positivista no marxismo: manifestações no ensino

da metodologia no Serviço Social, São Paulo: Cortez, 1991. RODRIGUES, Mavi.P. Assistencialização da seguridade e do Serviço Social no Rio de janeiro: notas críticas de um retrocesso. In Serviço Social e Sociedade. São

Paulo: Cortez, Ano XXVIII - Especial n. º 91 de setembro de 2007.

ROSA. João Guimarães. Grande Sertão Veredas. Ficção completa em dois

volumes. Rio de Janeiro: Ed. Nova Aguilar, 1994, v.I.

SADER, Eder. Quando Novos Personagens entram em Cena. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988. SANT‘ANA, Raquel Santos. O desafio da implantação do projeto ético-político

do Serviço Social. In Revista Serviço Social e Sociedade nº 62 – Ano XX, São

Paulo: Cortez, março de 2000.

SANTOS, Wanderley Guilherme. Cidadania e justiça: a política social na ordem

brasileira. Rio de Janeiro: Campus, 1979.

SERRA, Rose [et al.] (org.). Trabalho e reprodução: enfoques e abordagens. São

Paulo: Cortez, Rio de Janeiro: PETRES - FSS/UERJ, 2001.

SETUBAL. Aglair A. Pesquisa em Serviço Social: utopia e realidade. 4ª edição.

São Paulo: Cortez, 2009.

SIMÕES, Carlos. Curso de Direito do Serviço Social. São Paulo: Cortez, 2007.

(Biblioteca básica de serviço social).

Page 182: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

180

SILVA, Ademir Alves. As relações Estado-sociedade e as formas de regulação

social in Capacitação em Serviço Social e Política Social: Módulo 2: Crise

Contemporânea, Questão Social e Serviço Social – Brasília: CEAD, 1999, p.55-71.

SOARES, Laura Tavares Ribeiro. Ajuste neoliberal e desajuste social na América

Latina. Petrópolis: Vozes, 2001.

SOARES, Samuel Alves. Controle e autonomia: As Forças Armadas e o sistema político brasileiro (1974 – 1999). São Paulo: Editora UNESP, 2006. SODRÉ, Nelson Werneck. Vida e Morte da Ditadura. São Paulo: Vozes, 1984. SOUSA, Adrianyce. A.S. Pós-Modernidade: fim da modernidade ou mistificação da realidade contemporânea. In: Temporális, nº 10, Recife, ABEPSS, 2005.

SOUZA, A.M.C. A ética e o trabalho cotidiano do assistente social. In: Presença

Ética. Ética Política e Emancipação Humana. Revista Anual do GEPE/UEPE. N. º 2, Vol. 2: Pernambuco, novembro de 2002. SOUZA, Nadia R. O. Queiroz [et al.] (org.). Política de Assistência Social no Brasil: desafios para o assistente social. In: Coletânea de Artigos: II Simpósio do Serviço Social do COMAER, 1 ª edição. Rio de Janeiro: Public Editora e Publicidade Ltda., 2007. TAVARES, Flávio. O golpe de 1964, início de 1968. CARDOSO, Irene. Há uma herança de 1968 no Brasil? In: VIEIRA, Maria Alice; GARCIA, Marco Aurélio (Org.). Rebeldes e Contestadores. 1968 – Brasil, França e Alemanha. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 1999. TELLES, Vera da Silva e PAOLI, Maria Célia. Direitos sociais conflitos e negociações no Brasil contemporâneo in Alvarez, Dagnino e Escobar (orgs). Cultura e Política nos movimentos sociais latino-americanos: novas leituras. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2000. VASCONCELOS, A. M. A Questão do método na teoria social. Pós-Graduação. ESS/UFRJ, mimeo, set. 1995. ____________. Serviço Social e Pratica Reflexiva. Em Pauta: Revista da

Faculdade de Serviço Social da UERJ, Rio de Janeiro, nº10, p.131-181, 1997. ____________. Relação teoria/pratica: o processo de assessoria/consultoria e o Serviço Social. Serviço Social e Sociedade, nº 56, p 114-133, São Paulo: Cortez,

1998. ____________. A prática do Serviço Social: Cotidiano, formação e alternativas na área da saúde. São Paulo: Cortez, 2002.

Page 183: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

181

____________. Serviço Social e Práticas Democráticas na Saúde. In: MOTA, A.

E; BRAVO, M.I. de S.; UCHÔA, R.; et al., (orgs). Serviço Social e Saúde.

Formação e trabalho profissional. São Paulo: OPAS, OMS, Ministério da Saúde,

ABEPSS. Editora Cortez, 2007.

VASCONCELOS, Ana Maria [et al]. Profissões de saúde, ética profissional e

seguridade social In: Saúde e Serviço Social. São Paulo: Cortez; Rio de Janeiro:

UERJ, 2004.

VÁZQUEZ. A. S. Filosofia da Práxis. Trad. Luiz F. Cardoso. 2º ed. Rio de Janeiro:

Paz e Terra, 1977.

VENTURA, Zuenir - 1968, o ano que não acabou. Rio de Janeiro: Editora Nova

Fronteira 1988.

VIANNA, M.L.W. Americanizaçao (perversa) Da Seguridade Social Estratégias De Bem-Estar E Políticas Públicas, IUPRJ/UCAM. Rio de Janeiro:Editora Revan,

1998. YAZBEK, M ª. C. Os fundamentos do Serviço Social na contemporaneidade In: Capacitação em Serviço Social e política social. Módulo 4: Trabalho do Assistente Social e as políticas sociais. Brasília: CFESS/APEPSS/CEAD/UNB, 2000.

Endereços da Rede Internet www.assistentesocial.com.br www.abepss.ufsc.br www.cfess.org.br www..cgabeg.aer.mil.br www.cress-mg.org.br www.cress-rj.org.br www.dirsa.intraer.br www.fab.aer.mil.br www.haaf.aer.mil.br www.hca.aer.mil.br www.hfag.aer.mil.br www.pessoal.sercomtel.com.br/colman www.saude.gov.br www.wikipedia.org www.pt.org.br www.folha.uol.com.br/folha/brasil www.culturabrasil.pro.br/ditadura

Page 184: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

182

Documentos, portarias e trabalhos

ABEPSS. Diretrizes Curriculares para o Curso de Serviço Social, 2002.

ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE ASSISTENTES SOCIAIS. Serviço Social: as respostas da categoria aos desafios conjunturais: IV Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais Congresso Chico Mendes. São Paulo: Cortez. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Da ordem social, título

VIII. Brasília: Centro Gráfico, Senado Federal, 1988.

BRASIL. Ministério da Aeronáutica. Estatuto dos Militares. RMA 35-1. Brasília

(DF), Lei 8.080 de 09 de dez. de 1980. ___________.Ministério da Aeronáutica. Portaria Nº 614/GM3, de 16/08/92. Reformula o Sistema de Assistência Social do COMAER. BMA 113-8 de 31/08/92. ___________. Ministério da Aeronáutica. Instrução Reguladora das Indenizações de Assistência Médico – Hospitalar do COMAER. IMA 160-28 de 10/05/1995. ___________.Ministério da Aeronáutica. Ordem Técnica do Serviço de Atendimento Domiciliar nº005/DIRSA/COMAER de 12 de dezembro de 2000.

___________.Ministério da Aeronáutica. Instrução Reguladora das Ações Sociais

do COMAER. ICA 163-1 de 22 de fevereiro de 2006. ___________.Ministério da Aeronáutica. Instrução Reguladora das Ações do Serviço Social no SISAU do COMAER. ICA 160-139 de 19 de setembro de 2008.

___________.Ministério da Defesa. Portaria Normativa Nº. 1173/MD, de 06 de set. de 2006. Aprova a Política de Assistência Social das Forças Armadas. ___________.Ministério da Saúde. Gestão municipal de saúde: textos básicos.

20ª ed., Rio de Janeiro, 2001.

____________.Ministério da Saúde.Sistema Único de Saúde. Lei nº. 8.080 de 19

de setembro de 1990.

____________.Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde.

Departamento de Gestão da Educação na Saúde. Curso de formação de

facilitadores de educação permanente em saúde: unidade de aprendizagem-análise

do contexto da gestão e das práticas de saúde, Brasília, DF, 2005.

Page 185: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

183

PARTIDO dos Trabalhadores. Manifesto de Fundação. Partido dos Trabalhadores.

Diretório Nacional, 2009.

Artigo de Revista

CABRAL, Otávio. Radiografia dos militares: O que pensam os militares. Revista

Veja. São Paulo: Editora Abril, Ano 40; nº. 2036 de 28 nov.2007. p.130, edição

especial.

Page 186: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

184

ANEXOS

Page 187: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força
Page 188: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

ANEXO I

PESQUISA NOS SERVIÇOS DE SAÚDE DA AERONÁUTICA

Serviços de Saúde: HAAF, HCA e HFAG no Rio de Janeiro (RJ).

Coordenação: Gisele Martins Horta

Formulário de Entrevistas: Assistentes Sociais *

Entrevista nº Instituição:

Duração:

1- PERFIL PROFISSIONAL:

1.1. A - Idade:_________ B - sexo:_______ C – Estado civil:__________

1.2. A - Ano de sua formação: _________ B- Instituição ____________________________________

1.3. A- Tempo de exercício da profissão? _______________________

1.4. A- Quadro funcional: A - QCOA ( ) ano ________ B - QFO ( ) ano ________ C - Civil: concursado ( )

Contr. ( ) ano de ingresso:___________________

1.5. A - Quanto tempo nesta unidade: _____________________

1.6. Carga horária: ____________

1.7. Qual sua função: Assistente Social ( ) Chefe do setor ( )

1.8. Participa de entidades da categoria: ( ) sim ( ) não

1.9. Se pudesse ter outro emprego com o mesmo salário, pediria baixa/demissão? (S) (N)

1.10. Tem outro vínculo empregatício? (S) (N) Onde? _____________________________________

1.11. Você tem estagiários atualmente? (S) (N) - Se sim de quais faculdades? _________________

1.12. Se não, porque parou? _________________________________________________________

1.13. No seu entender, quais são as recomendações mais importantes do Código de Ética sobre as

relações do Assistente Social com os usuários?___________________________________________

Page 189: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

______________________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

1.14. Você está satisfeita como Assistente Social? (S) (N)

1.14.1. Por quê? ___________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________

2. REFERÊNCIAS DE CONHECIMENTO

2.1. Quais autores são referência para a sua prática? ______________________________________

_________________________________________________________________________________

2.2. Você considera a Constituição de 1988 importante para a prática do Assistente Social? (S) (N) Por quê?

_________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________

2.3. O que é SUS para você?_________________________________________________________

_________________________________________________________________________________

2.4. O que é saúde para você? ________________________________________________________

_________________________________________________________________________________

2.5. Em sua opinião qual a contribuição trazida pela Reforma Sanitária? _______________________

_________________________________________________________________________________

2.6. O que você acha da Política de Seguridade Social da Aeronáutica? _______________________

_________________________________________________________________________________

2.7. Você acha ser viável articular os princípios do projeto ético-político do serviço social no âmbito militar?

(S) (N)

2.7.1. Por quê? ____________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________

2.8. Na sua prática diária, qual (is) aparato (s) legal (is) se pauta: ( ) Código de Ética Profissional dos

Assistente Social /Lei que Regulamenta a profissão (8.662/93) ( ) Diretrizes Curriculares da ABEPSS ( )

Page 190: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

Estatuto dos Militares ( ) RDAER ( ) NPA do Serviço Social de sua OSA ( ) ICA 161/163 ( ) ICA

Saúde no SISAU ( ) LOAS ( ) Constituição de 1988 ( ) Estatuto do Idoso ( ) ECA

( ) Política Nacional para Integração da pessoa Portadora de Deficiência

Outros:___________________________________________________________________________

2.9. Quais as necessidades sociais e de saúde você identifica no cotidiano da população usuária da

Aeronáutica?

A- Sociais_________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________

B- Saúde. ________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________

2.10. O que os usuários demandam do Serviço Social? ____________________________________

_________________________________________________________________________________

2.11. O que os usuários demandam da OSA? ____________________________________________

_________________________________________________________________________________

3. PRÁTICA PROFISSIONAL

3.1. Qual o objetivo do Serviço Social na instituição? _______________________________________

_________________________________________________________________________________

3.2. Você concorda? (S) (N) Por quê?___________________________________________________

3.3. Seu chefe imediato é assistente social (S) (N) Se não, qual é a formação dele________________

3.4. Assinale em grau de importância o que mais dificulta sua prática profissional: ( ) hierarquia e disciplina

militar ( ) Hegemonia médica ( ) caráter subalterno da profissão ante as atividades fins-instituição ( )

fragilidades ou indefinições da prática profissional ( ) falta de qualificação técnica

( ) Outros: ________________________________________________________________________

3.5. O Serviço Social tem algum projeto na instituição por escrito ? (S) (N)

3.6. Você tem projeto por escrito? (S) (N)

Page 191: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

3.7. Você trabalha em equipe? (S) (N) – Com quem? ______________________________________

_________________________________________________________________________________3.8.Vo

cê acha que sua prática profissional é diferente das AS que trabalham em hospitais públicos / privados, (S)

(N)? Em quê?___________________________________________________________

_________________________________________________________________________________

3.9. Você realiza com os usuários prioritariamente entrevistas ( ) reuniões ( )

3.10. No hospital, você participa do processo de alta hospitalar? S ( ) N ( ) Com qual objetivo?

_________________________________________________________________________________

3.11. Você comunica óbito? S ( ) N ( )

3.12. Qual (is) os princípio (s) do Código de Ética você procura concretizar no cotidiano institucional?

_________________________________________________________________________________

3.13. A seu ver, quais as atividades do Serviço Social são mais requisitadas na sua OSA: (numere em

ordem de grandeza) A – ações de caráter emergencial ( ) B- educação e informação em saúde ( ) C-

planejamento e assessoria ( ).

3.14. Em sua opinião, o que é específico do Serviço Social na Aeronáutica? ____________________

_________________________________________________________________________________ 3.15.

Qual a documentação utilizada no registro de sua prática: 1.( ) ficha de cadastro 2.( ) evolução de

entrevistas 3.( ) livro de registro de plantão ou livro de ocorrências 4.( )prontuário único 5.( ) prontuário

social 6. ( ) registro de reuniões 7.( ) ficha social 8.( ) relatório social 9.( ) parecer social

outros:____________________________________________________________________________

3.16. Quais as maiores dificuldades encontradas no cotidiano de sua prática? ___________________

_________________________________________________________________________________

3.17. O que mais contribui para facilitar o cotidiano de sua prática? ___________________________

_________________________________________________________________________________

3.18. Qual a relação dos demais serviços da OSA com o Serviço Social: ignoram ( ); usam quando

precisam para desafogar seus afazeres ( ); recorrem para prestar melhor atendimento ao usuário ( );

reclamam ( ); procuram para discutir questões relacionadas aos usuários ( ); escutam ( ); trocam ( );

aceitam participar de equipes ( ); outros ( ).

Page 192: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

3.19. Como, em ordem de grandeza, chegam os usuários ao Serviço Social? A- ( ) encaminhados pela

rotina dos programas/projetos B- ( ) que procuram espontaneamente C- ( ) encaminhados pelos demais

profissionais de saúde D- ( ) Encaminhados pelas assistentes sociais de outras unidades E ( ) –

encaminhados pela Direção F-( ) encaminhados pelo comandante da unidade G- ( ) encaminhados pela

recepção H- ( ) encaminhamento extra-institucional

4. APERFEIÇOAMENTO

4.1. Você é incentivado pela instituição para se aperfeiçoar profissionalmente? (S) (N)

Como?___________________________________________________________________________

4.2. Qual tipo de qualificação a instituição oferece? _______________________________________

4.3. Que tipo de conhecimento o profissional de Serviço Social tem que ter para atuar de forma qualificada

na Aeronáutica? __________________________________________________________

4.4. Você acha que para prestar supervisão a alunos o assistente social precisa ter preparação especial? S

( ) N ( ) Por quê? _________________________________________________________

4.5. Em que você sente maior necessidade A - priorizar o aperfeiçoamento profissional (pós- mestrado –

doutorado) (S) (N) B - estudar para outros concursos (S) (N)

4.6. Você tem projeto de realizar algum tipo de aperfeiçoamento em breve (S) (N) Se sim qual e onde ?

___________________________________________________________________________

4.7. Gostaria de acrescentar algum outro comentário?_____________________________________

_________________________________________________________________________________

Observações:

______________________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________

Page 193: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

ANEXO II

ROTEIRO DE OBSERVAÇÃO

OSA: ____________________ Nº de AS: _____________________ Civis: Concursados ( ) Efetivado ( )

Militares: ( ) QCOA ( ) QFO Efetivo de : ________________ civis/militares

1. Quem freqüenta a OSA (público predominante). De onde vem? São soldados, sargentos, oficiais de alta patente?

2. A OSA é de fácil acesso? Transporte/área de risco/facilidade de marcação/informação/telefone/demanda reprimida.

3. Quais programas e serviços que oferece? Em quantos e quais programas o Serviço Social atua?

4. O setor de Serviço Social está localizado aonde? Ambulatório? Área diferenciada? No Andar?

5. E O Serviço Social encontra-se bem sinalizado (placas) para facilitar o acesso dos usuários? Ou somente o efetivo sabe de sua localização?

6. Qual o movimento de chegada dos usuários? Rotinas de atendimento? Horário de chegada na unidade; média de espera de atendimento; utilização do tempo de espera.

7. Quais as características do espaço profissional dos assistentes sociais (tamanho, privacidade, sala para atendimento, sala de chefia, infra-estrutura. Se for negativa a avaliação, existe algum movimento por parte dos A.S e chefia para alterar a qualidade no espaço.

8. Qual o horário de trabalho? Tem plantão sistematizado.

9. O Serviço Social registra a sua prática? Tem conhecimento da demanda real, aparente, oculta? Tem dados no que se refere o número de atendimentos diários, mensais?

10. Quanto às reuniões multiprofissionais e ou de equipes. Anotar ou gravar o que e como discutem.

Realizar as observações antes de fazer as entrevistas com os Assistentes Sociais.

Page 194: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

UERJ/Pós-Graduação FSS

Pesquisa: A prática dos assistentes sociais nos serviços de saúde da Aeronáutica – RJ

Pesquisadora: Gisele Martins Horta

Coordenadora: Ana Maria de Vasconcelos

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE e ESCLARECIDO Pesquisa: A prática dos assistentes sociais nos serviços de saúde da Aeronáutica/RJ.

Este estudo tem como objetivo conhecer o perfil profissional desses assistentes

sociais: saber quem são esses profissionais, o que eles fazem qual o trabalho desenvolvido

por eles e de que forma estão inseridos na instituição. Acreditamos, portanto, o quanto será

elucidativo para a categoria de assistentes sociais e entidades representativas da profissão,

bem como para as Faculdades de Serviço Social, o desvelar de um cotidiano profissional,

gestado no universo militar da Aeronáutica.

A participação da instituição nesta pesquisa consistirá em permitir que sejam feitas

observações, anotações, consultas a documentos, projetos e/ou gravação de entrevistas e

reuniões realizadas com usuários (entrevistas para elaboração de laudos ou pareceres, em

plantões, enfermarias, visita domiciliar, etc. ou reuniões – salas de espera, grupo com

mulheres, grupos de pais, grupos de trabalhadores, grupos de jovens, etc.,) e entrevistas

com os assistentes sociais sobre a contextualização das atividades realizadas e sobre o

projeto que desenvolve. Toda atividade só poderá ser observada/gravada com o

consentimento prévio dos usuários participantes.

Os benefícios decorrentes do consentimento da instituição e assistentes sociais

estão relacionados à contribuição no estudo para nutrir o debate atual do Serviço Social,

principalmente, se levarmos em consideração que o campo militar ainda não é uma área

discutida e publicizada no interior do Serviço Social.

As informações obtidas através da pesquisa serão confidenciais estando assegurado

o sigilo quanto à identificação dos assistentes sociais, da instituição e dos usuários. Assim,

não haverá risco algum com a participação na pesquisa, pois será mantido sigilo não só

sobre a Instituição, mas quanto aos nomes e dados de qualquer pessoa envolvida no

processo.A Instituição/profissional receberá uma cópia deste termo onde consta o telefone e

o endereço do pesquisador responsável pelo estudo, onde poderão ser tiradas dúvidas

sobre a pesquisa, sobre a participação na pesquisa. Os resultados da pesquisa serão

Page 195: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

divulgados através de produção bibliográfica e eventos dos quais representantes da

Instituição ou o profissional poderão participar.

________________________________ Nome e assinatura do pesquisador

Instituição Responsável: Universidade do Estado do Rio de Janeiro/ Pós-Graduação em Serviço Social.

Programa de Mestrado em Serviço Social. Rua São Francisco Xavier, 524- 9º andar- Bloco D do Pavilhão João

Lyra Filho –Campus Maracanã.

Pesquisadora: Gisele Martins Horta

Telefone: (21) 39086000 – celular: (21) 9157 - 4339 (21) 9493 - 6639

Declaro que entendi os objetivos, riscos e benefícios do consentimento para a realização da pesquisa e

concordo em participar.

________________________________________

Instituição/Assistente social, sujeito da Pesquisa

Data :___________

Page 196: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

Livros Grátis( http://www.livrosgratis.com.br )

Milhares de Livros para Download: Baixar livros de AdministraçãoBaixar livros de AgronomiaBaixar livros de ArquiteturaBaixar livros de ArtesBaixar livros de AstronomiaBaixar livros de Biologia GeralBaixar livros de Ciência da ComputaçãoBaixar livros de Ciência da InformaçãoBaixar livros de Ciência PolíticaBaixar livros de Ciências da SaúdeBaixar livros de ComunicaçãoBaixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNEBaixar livros de Defesa civilBaixar livros de DireitoBaixar livros de Direitos humanosBaixar livros de EconomiaBaixar livros de Economia DomésticaBaixar livros de EducaçãoBaixar livros de Educação - TrânsitoBaixar livros de Educação FísicaBaixar livros de Engenharia AeroespacialBaixar livros de FarmáciaBaixar livros de FilosofiaBaixar livros de FísicaBaixar livros de GeociênciasBaixar livros de GeografiaBaixar livros de HistóriaBaixar livros de Línguas

Page 197: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp146961.pdf · 2016-01-26 · Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social Academia da Força

Baixar livros de LiteraturaBaixar livros de Literatura de CordelBaixar livros de Literatura InfantilBaixar livros de MatemáticaBaixar livros de MedicinaBaixar livros de Medicina VeterináriaBaixar livros de Meio AmbienteBaixar livros de MeteorologiaBaixar Monografias e TCCBaixar livros MultidisciplinarBaixar livros de MúsicaBaixar livros de PsicologiaBaixar livros de QuímicaBaixar livros de Saúde ColetivaBaixar livros de Serviço SocialBaixar livros de SociologiaBaixar livros de TeologiaBaixar livros de TrabalhoBaixar livros de Turismo