universidade de sÃo paulo faculdade de filosofia, … · como morador do bairro do belém desde...

61
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA RICARDO DIAS SANDOVAL A VERTICALIZAÇÃO DO BAIRRO DO BELÉM: Mudanças estruturais e sociais. THE VERTICALIZATION OF BELÉM NEIGHBORHOOD: Structural and social changes. SÃO PAULO 2018

Upload: others

Post on 23-Jul-2020

0 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS

DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA

RICARDO DIAS SANDOVAL

A VERTICALIZAÇÃO DO BAIRRO DO BELÉM: Mudanças estruturais e sociais.

THE VERTICALIZATION OF BELÉM NEIGHBORHOOD: Structural and social

changes.

SÃO PAULO

2018

Page 2: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

RICARDO DIAS SANDOVAL

A VERTICALIZAÇÃO DO BAIRRO DO BELÉM: Mudanças estruturais e sociais.

Trabalho de Graduação Individual (TGI)

apresentado ao Departamento de Geografia

da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências

Humanas, da Universidade de São Paulo,

como parte dos requisitos para obtenção do

título de Bacharel em Geografia.

Área de Concentração: Geografia Humana

Orientadora: Profa. Dra. Simone Scifoni

SÃO PAULO

2018

Page 3: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua
Page 4: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

AGRADECIMENTOS

Gostaria de agradecer a todas pessoas envolvidas na execução deste

trabalho. Poucos souberam do real significado em terminar esta etapa da minha

vida.

Aos meus pais e ao meu irmão pela paciência, pelo apoio e por terem me

proporcionado todas as condições de ingressar na Universidade de São Paulo.

À minha namorada Priscila, por todo incentivo e suporte emocional para que

conseguisse finalizar o presente trabalho.

Aos meus amigos e colegas de faculdade, que contribuíram direta ou

indiretamente no processo de elaboração.

Aos meus amigos: John, Bruna, Larissa, Carol, Maialú, Francisco, Raquel,

Josiane, entre muitos outros.

À Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, por ter me

proporcionado a oportunidade de realizar um intercâmbio em Portugal e por todo o

conhecimento adquirido.

Aos amigos que fiz no intercâmbio: os "porreiros" e os "putos".

Aos moradores e comerciantes do Belém, pelo tempo e pela simpatia ao

relatar as mudanças do bairro. Em especial, a Clóvis Querubim e a Eduardo Pitta

pelas entrevistas e pelos dados fornecidos.

Em especial, agradeço à minha professora e orientadora Simone Scifoni pela

impecável orientação deste trabalho, pela paciência e por todo conhecimento

compartilhado para que tornasse possível a realização desta monografia.

Page 5: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

Canto de regresso à pátria

Oswald de Andrade

Minha terra tem palmares

Onde gorjeia o mar

Os passarinhos daqui

Não cantam como os de lá

Minha terra tem mais rosas

E quase que mais amores

Minha terra tem mais ouro

Minha terra tem mais terra

Ouro terra amor e rosas

Eu quero tudo de lá

Não permita Deus que eu morra

Sem que volte para lá

Não permita Deus que eu morra

Sem que volte pra São Paulo

Sem que veja a Rua 15

E o progresso de São Paulo

Page 6: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

RESUMO

SANDOVAL, Ricardo Dias. A Verticalização do bairro do Belém: Mudanças

estruturais e sociais. 2018. 61 f. Trabalho de Graduação Individual (TGI) –

Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo,

São Paulo, 2018.

Esta monografia pretende discutir o processo urbanização, industrialização e

verticalização do bairro do Belém, na cidade de São Paulo. Através de um

levantamento bibliográfico e documental, analisamos as mudanças geográficas

ocorridas durante a história do bairro e a sua recente verticalização.

Sendo um bairro inicialmente composto por chácaras e pomares no final do século

XIX, o Belém se tornou, até a metade do século seguinte, um dos bairros mais

industriais da capital paulista. Com a desconcentração industrial de São Paulo

durante a década de 1980, os grandes terrenos das antigas fábricas foram

abandonados e se tornaram ruínas. Tal cenário foi a oportunidade perfeita para o

mercado imobiliário verticalizar a região.

Além da bibliografia utilizada, fizemos trabalhos de campo pelo bairro e utilizamos

imagens aéreas a fim de mapear a evolução dos terrenos e galpões das antigas

fábricas que se tornaram condomínios. Com conversas informais e entrevistas,

analisamos os impactos sociais e comerciais da recente verticalização.

Com este trabalho, levantamos a hipótese de que o processo de verticalização do

Belém, que ocorreu em meados dos anos 2000, seguiu a lógica capitalista de

ocupação e transformação geográfica com o objetivo de especulação imobiliária,

impactando diretamente a vida dos moradores e comerciantes do bairro.

Palavras-chave: Industrialização. Desconcentração Industrial. Verticalização.

Urbanização. Belenzinho. São Paulo. Geografia Urbana.

Page 7: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

ABSTRACT

SANDOVAL, Ricardo Dias. The Verticalization of Belém Neighborhood: Structural

and social changes. 2018. 61 p. Final Graduation Work (Trabalho de Graduação

Individual – TGI) – School of Philosophy, Languages and Human Sciences,

University of São Paulo (Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas,

Universidade de São Paulo), São Paulo, 2018.

This paper intends to discuss the urbanization, industrialization and verticalization

process of Belém neighborhood in São Paulo. By means of a bibliographical and

documentary survey we analyze the geographic changes that occurred in the

neighborhood over time and its recent verticalization.

Belém is a district initially composed of small farms and orchards in the late 19th

century, which became, by the middle of the following century, one of the most

industrial districts of São Paulo. With the industrial sprawl in the city during the

1980's, the old factories large properties were abandoned and became ruins. Such

scenario was the perfect opportunity for the real estate market to verticalize the

region.

In addition to the bibliography used, field search was established in the neighborhood

and aerial images were used to map the evolution of old factories properties and

industrial sheds that later became condominiums. With informal conversations and

interviews, we analyzed the social and commercial impacts of the recent

verticalization.

The hypothesis presented by this paper is that the Belém verticalization process,

which occurred in the mid-2000's, followed the capitalist logic of occupation and

geographic transformation aimed at real estate speculation, directly impacting the

lives of the people who live and own businesses in the neighborhood.

Keywords: Industrialization. Industrial Sprawl. Verticalization. Urban Landscaping.

Belenzinho. São Paulo. Urban Geography.

Page 8: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

IRFM Indústrias Reunidas Francesco Matarazzo

RMSP Região Metropolitana de São Paulo

II PND II Plano Nacional de desenvolvimento

Page 9: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ........................................................................................................................... 1

1. BELÉM: DO RURAL AO INDUSTRIAL ............................................................................. 4

1.1. Belém do final do século XIX: refúgio rural da elite paulistana ..................................... 4

1.2. O início da urbanização: a expansão ferroviária traz transformações no Belém ........ 5

1.3. A expansão urbana na cidade de São Paulo: implementação das vilas operárias .. 11

1.4. A vida do trabalhador: as condições de trabalho nas indústrias da época ................ 17

2. A DESINDUSTRIALIZAÇÃO DO BAIRRO ..................................................................... 20

2.1. Movimentos do desenvolvimento: tendências à desconcentração da indústria em São

Paulo ............................................................................................................................................... 21

2.2. A interferência do governo estadual no processo de dispersão da indústria ............ 26

2.3. A influência da desconcentração industrial do estado de São Paulo na configuração

urbana do Belém ........................................................................................................................... 29

3. A VERTICALIZAÇÃO DO BELÉM .................................................................................. 30

3.1. As transformações físicas ................................................................................................ 31

3.2. Transformações no imaginário: a percepção da mudança pela população .............. 46

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................. 49

BIBLIOGRAFIA ........................................................................................................................ 51

Page 10: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

1

INTRODUÇÃO

A cidade de São Paulo simboliza progresso. Palco de inúmeros

acontecimentos históricos que ajudaram a modelar o Brasil, São Paulo é a capital

financeira do país e carrega a fama de abrigar inúmeras culturas por conta de seus

moradores tão plurais. Ao mesmo tempo, a forte imagem de "Cidade do progresso"

também é a das contradições e das desigualdades trazidas pela expansão do

capitalismo. Tal progresso, segundo o ponto de vista do capitalismo, acaba por

alimentar as desigualdades, negando o convívio entre classes sociais e diferentes

grupos.

Dentro da cidade, o bairro do Belém se destaca por sua história tão envolvida

na evolução econômica e urbana da cidade: de região campestre de veraneio,

passando por polo industrial, a região tomada por cortiços e então a área de forte

especulação imobiliária. Nascido em torno da capela de São José do Belém

(ANDRADE, 1991, p. 29), o bairro acompanhou – e acompanha – o intenso fluxo

econômico e cultural de São Paulo, resguardando a essência de transformação que

a cidade carrega.

Não existe uma divisão oficial de bairros no Brasil, o que existe é uma divisão

de distritos, previamente delimitada pelo Estado para facilitar a gestão pública.

Sendo assim, não é uma unidade administrativa mapeada e delimitada pelo Estado.

Para isso, levamos em consideração a discussão de bairro feita por Andrade (2004,

p. 181) ao considerar o estudo de Henri Lefebvre (1969) em entender o bairro como

uma unidade da vida urbana, "partindo da Cidade como uma totalidade, portanto, da

sociedade". Para o autor, a apologia da paróquia e da vida paroquial sustenta uma

ideologia do bairro, tomando-o como essência da vida urbana. Os limites dos bairros

estão no imaginário de seus moradores de acordo com sua própria identificação

como cidadão.

Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento,

pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua vida urbana. Tudo sempre

girava em volta do Largo São José do Belém, desde o começo do século XX,

considerado lugar de flerte para os jovens e passeio para os mais velhos, como

retrata Andrade (2004). Levando em conta as mudanças por mim observadas pela

minha vivência, pelos trabalhos de campo, a importância do Largo São José do

Belém para o bairro e a localização das grandes indústrias, delimitei a área de

Page 11: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

2

estudo (Mapa 1) a Sul pela linha do trem, a Oeste pelas ruas: Bresser, Vinte e Um

de Abril e São Leopoldo, a Norte pela avenida Celso Garcia, englobando a região

das indústrias Matarazzo, e a Leste pela rua Redenção:

Mapa 1 - Área de Estudo. (fonte: geosampa.prefeitura.sp.gov.br. Organizado por: Ricardo Dias Sandoval)

Este trabalho justifica-se à medida que representa uma contribuição para o

estudo da cidade de São Paulo do ponto de vista da urbanização e das

transformações geográficas, políticas e econômicas, que tanto são relevantes para a

vida na capital paulista. Foi levado em conta o conteúdo das disciplinas de

Planejamento e Geografia Urbana I, ministradas respectivamente pela Profa. Dra.

Isabel Aparecida Pinto Alvarez e pela Profa. Dra. Simone Scifoni, sendo esta a

orientadora deste trabalho.

Pretendemos, para além de oferecer uma discussão do tema com a retomada

da literatura mais relevante sobre os processos mencionados, compreender os

processos urbanos que impactaram e impactam a vida dos moradores da região do

Belém.

Page 12: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

3

No capitulo 1, fomos buscar informações sobre o processo de formação do

bairro e sua região em artigos e na tese de doutoramento da Profa. Dra. Margarida

Maria de Andrade, e no livro de Jacob Penteado, nos sendo muito úteis para

compreender o cotidiano e os processos urbanos ali sofridos.

Buscamos, para o Capitulo 2, referências sobre o processo de

Industrialização e Reestruturação Urbano-Industrial da cidade de São Paulo em

autores como o Dr. Barjas Negri e a Profa. Dra. Sandra Lencioni, que através de

gráficos e discussões, demonstraram o processo de desconcentração industrial da

cidade e, posteriormente, a desindustrialização do bairro.

Para compreender melhor as mudanças ocorridas no bairro, no Capitulo 3,

nos baseamos no Livro "A cidade vertical e o urbanismo", da Profa. Dra. Nadia

Somekh, que traz uma discussão de todo o processo de verticalização e suas

consequências. Através de 2 trabalhos de campo na área de estudo, em março e

abril, foi possível caminhar pela região, além de identificar os grandes condomínios

verticais de arquitetura recente. Foi possível também colher duas entrevistas, com

Clóvis Querubim, frequentador do bairro desde a década de 60 e dono da Majestic

Óptica de Precisão, fundada em 1954 e herdada por ele em 1976, e com Eduardo

Pitta, nascido e criado no bairro e dono da Calçados Pitta, casa de sapatos fundada

em 1923 por seu pai, Manoel Pitta. As duas entrevistas foram feitas nas respectivas

lojas.

Durante o trabalho, também foram utilizadas imagens aéreas do Google

Earth, do site GEOSAMPA da prefeitura de São Paulo e do LASERE da

FFLCH/USP, para verificar a mudança do uso do solo em diversos períodos através

de ferramentas GIS.

Partindo da assunção da importância do bairro do Belém para a cidade de

São Paulo, o objetivo deste trabalho é discutir o processo de urbanização do bairro.

Temos por objetivo compreender a origem histórica do bairro, famoso por ser

destino de veraneio da elite paulistana; posteriormente, os processos de

industrialização e desindustrialização que possibilitaram a configuração que hoje o

bairro tem; e, finalmente, o processo de verticalização que hoje permeia a região.

Page 13: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

4

1. BELÉM: DO RURAL AO INDUSTRIAL

Neste capítulo, apresentaremos brevemente a história da evolução urbana do

Belém (Mapa 2), na cidade de São Paulo, desde o final do século XIX até o fim do

período de forte desenvolvimento industrial, em meados do século XX. O objetivo

deste capítulo é situar o Belém no processo evolutivo de urbanização da cidade de

São Paulo, de maneira a contextualizar e possibilitar a compreensão dos processos

que nortearam seu desenvolvimento até os dias de hoje.

Mapa 2 – Distrito do Belém (Fonte: geosampa.prefeitura.sp.gov.br. Organizado por Ricardo Dias Sandoval).

1.1. Belém do final do século XIX: refúgio rural da elite paulistana

Até o final do século XIX, o modesto núcleo urbano de São Paulo era rodeado

por pomares e chácaras pertencentes à alta sociedade paulistana. Muitos desses

Page 14: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

5

pomares se encontravam no atual bairro do Belenzinho, na zona leste da cidade. O

bairro e sua região eram o destino preferido para fins de semana e férias da camada

mais alta da sociedade devido à sua altitude elevada, de 750 metros, ao ar limpo e

ao clima agradável. Situado próximo ao rio Tamanduateí, o Belenzinho só foi

incorporado à cidade por volta de 1870 por causa de grandes transformações que se

desencadearam na região, segundo ANDRADE (2004, p. 174). Atualmente, o bairro

é chamado apenas de “Belém”, pois na implantação do bonde que passava no Largo

São José, o nome “Belenzinho” era muito grande, então no bonde era apenas

exibida a alcunha “Belém”. Penteado descreve as características do bairro à época:

[...] o Belém, devido à sua altitude, ar puro, vastos arvoredos, era procuradíssimo pelas opulentas famílias de uma São Paulo que vive, hoje, apenas na memória dos velhos. Sua altitude é, em média, de 750 metros, atingindo o máximo na Vila Gomes Cardim, 775 metros. Inúmeras quintas e pomares, estâncias de cura e chácaras para fins de semana ali se encontravam, pertencentes a vultos importantes da vida paulistana. [...] (PENTEADO, 2003, p. 57)

1.2. O início da urbanização: a expansão ferroviária traz transformações no

Belém

A paisagem do bairro começa a mudar com a construção da ferrovia São Paulo

Railway1, ou "Inglesa", como era conhecida no passado. Inaugurada em 1867 nos

terraços que delimitavam as várzeas do rio Tietê e Tamanduateí, a estação do Brás

ligava o porto de Santos a Jundiaí e servia para escoar a grande produção agrícola

do estado (café, em sua maioria), que seria então vendida no porto de Santos.

Transformando, assim, a região de subúrbio de chácaras em espaço propriamente

urbano (ANDRADE, 1991). Essa estação pode ser vista, como era na época, na

Figura 1.

1 A ferrovia foi fragmentada ao longo dos anos, tendo trechos abandonados ou desativados. As atuais linhas 7 Rubi (Jundiaí - Luz) e 10 Turquesa (Brás - Rio Grande da Serra) da CPTM se utilizam dos trilhos da antiga ferrovia que passam pela Região Metropolitana de São Paulo.

Page 15: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

6

Figura 1 - Estação original do Brás, 1867 (Fonte: www.estacoesferroviarias.com.br)

Em 1877, outra estrada de ferro foi construída, a Estrada de Ferro do Norte,

que ligou São Paulo à cidade do Rio de Janeiro. Com a ferrovia foi construída uma

segunda estação ferroviária, ao lado da primeira, também no Brás, denominada de

Estação do Norte, conforme exemplifica a Figura 2.

Figura 2 - Estação do Norte ou Estação Roosevelt, 1900 (Fonte: www.estacoesferroviarias.com.br)

Page 16: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

7

O rio Tamanduateí e o constante alagamento de suas margens formavam um

dos principais entraves para a expansão da cidade para leste. A sua canalização e a

drenagem de suas margens abriram caminho para a expansão urbana no sentido

leste. A elite paulista, detentora das chácaras da região do Belém, passa a retalhar

suas propriedades em lotes, iniciando uma “produção de terras”, já que a terra

começa a ser vista como uma mercadoria, com valor de compra e venda. Como

podemos verificar no Mapa 3, a área urbana a leste da cidade se limitava às

margens do rio Tamanduateí. Podemos também visualizar, as duas estações do

bairro do Brás (Parada Brás e Estação Roosevelt).

O café brasileiro, em alta no mercado internacional, alavancou a construção de

ferrovias no país, principalmente no estado de São Paulo, onde a produção de café

no interior era a maior do país2. Com o advento da mão de obra livre, em

substituição do trabalho escravo, o governo brasileiro incentivou uma grande onda

de imigração para suprir as necessidades da lavoura cafeeira, através do

custeamento das viagens e do estabelecimento dos imigrantes (ANDRADE, 1991, p.

66-88).

Nesse sentido, o desenvolvimento da ferrovia e na sequência a vinda do alto

número de imigrantes estrangeiros foram essenciais para a urbanização da cidade

de São Paulo. Por ter terras planas e desocupadas, a região do Belém passou a

atrair interesses na implantação de uso residencial e, posteriormente, industrial,

esses fatores contribuíram para acelerar a ocupação do bairro. (LANGENBUCH,

1968)

Segundo ANDRADE, estas estações ferroviárias tiveram grande importância

para o impulso da urbanização, e na formação dos primeiros núcleos urbanos da

cidade:

Embora a grande maioria dos imigrantes tivesse como destino as fazendas de café, muitos estabeleceram-se na cidade (seja retornando das fazendas, seja optando diretamente pela cidade). A presença de duas estações ferroviárias no Brás foi responsável pelo estabelecimento de imigrantes nas suas imediações [...] (1994, p. 98)

2 (DEAN, 1991, p. 9-22)

Page 17: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

8

Mapa 3 - Planta da Cidade de São Paulo 1881 (fonte: Arquivo Histórico Municipal)

Estação Roosevelt

Estação do Brás

Rio Tamanduateí

Page 18: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

9

As particularidades desses núcleos eram tão grandes que, segundo Andrade

(1994, p. 2), nos anos 1930 receberam a denominação de “outra cidade”. No Mapa 3

é possível notar o distanciamento destes núcleos e compreender tal denominação.

Em 1881 foi construída, no Bom Retiro, a primeira hospedaria com capacidade

de até 500 pessoas com objetivo de "receber, alojar, sustentar, pelo prazo de seis

dias, salvo caso de força maior, os imigrantes recém-chegados[...]"3. Em 1887,

devido à incapacidade de acomodar o grande número de imigrantes que chegavam

ao país, uma nova Hospedaria foi construída (conforme a Figura 3) no bairro do Brás

com capacidade para 4.000, onde existia uma estação da São Paulo Railway, e o

local não foi escolhido ao acaso. O plano inicial previa sua construção definitiva na

região da estação da Luz, porém, segundo ANDRADE:

[...] acabou recebendo outra destinação porque, nas palavras de um Presidente de Província, não foi julgado 'próprio para um alojamento de imigrantes o bairro (da Luz) que mais se presta a ser aformoseado, e que vai merecendo a preferência da população abastada para aí construir prédios vastos e elegantes'

4. Assim, a escolha do Brás respondia também à

estratégia da elite de segregar os imigrantes, de afasta-los dos bairros ditos burgueses (1994, p. 98-99).

Figura 3 - Hospedaria dos Imigrantes, 1887 (Fonte: www.museudaimigracao.org.br)

3 Boletim do departamento Estadual do Trabalho (1911, apud ANDRADE, 1991, p. 73) 4 Relatório do presidente da Província João Alfredo C. de Oliveira à Assembleia Legislativa Provincial - 1886, São Paulo, Typografia de Jorge Seckler & Cia. (apud ANDRADE, 1994, p. 98-99)

Page 19: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

10

A crescente procura do café por parte do mercado estrangeiro, Estados Unidos

e Europa principalmente, gerou uma concentração de capital no estado,

especialmente na cidade de São Paulo. Esse fato somou-se ao papel da ferrovia

que fazia a interligação entre interior e o porto de Santos, barateando e tornando

mais eficiente o transporte das sacas de café (DEAN, 1991), e à mão de obra

abundante na cidade, e juntos foram fatores essenciais para o início da

industrialização na cidade. As constantes guerras no continente europeu também

foram muito importantes para a nossa indústria, pois trouxeram investimentos e mão

de obra externa.

[...] A indústria nascente se instala perto de fontes de energia (rio, florestas, depois carvão), de meios de transporte (rios e canais, depois estradas de ferro), de matérias-primas (minerais), de reservas de mão de obra (o artesanato camponês, os tecelões e ferreiros fornecem uma mão de obra já qualificada) (LEFEBVRE, 1969, p. 7).

Os primeiros focos de industrialização paulistana tiveram início com pequenas

indústrias, em sua maioria iniciadas por imigrantes, que já haviam presenciado ou

trabalhado em fábricas na Europa, e que ANDRADE (1994, p. 100-101) denominou

"oficinas de fundo de quintal", em sua maioria de bens de consumo, bebidas,

chapéus, móveis, artigos de vidro, etc. Com o tempo, algumas dessas pequenas

manufaturas foram se transformando em grandes indústrias, alavancadas pela crise

do café, que fez com que o foco de investimento mudasse da monocultura para a

crescente industrialização. A autora ressalta que haviam também grandes fábricas,

no entanto eram pouco numerosas. A paisagem da área de estudo se alternava

entre cortiços, oficinas, grandes fábricas e vilas operárias. A primeira grande fábrica

da região do Belém foi a Fábrica Sant'Anna, de Antônio Álvares Penteado, fundada

em 1889 e produzia tecidos de sacaria de café, cereais e enfardamento em geral.

Foi seguida pela Cia Mecânica Importadora, fundada em 1890 e pela Fábrica de

Cerveja Bavária na Mooca, fundada 1892 (ANDRADE, 1991, p. 114).

O crescimento contínuo no comércio do café, e seu constante beneficiamento,

resultou em um enorme crescimento da indústria paulista que, segundo Warren

Dean (1991, p. 19-20), levou a economia regional de São Paulo a superar em 1920

a capital, Rio de Janeiro, como mais importante centro industrial. Em 1940, o Estado

Page 20: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

11

passou a possuir a maior aglomeração de capacidade manufatureira da América

Latina. No Mapa 5, podemos visualizar as indústrias da cidade em 1901 e seu

número de funcionários.

Ao iniciar-se o século XX, Brás, Mooca e Belenzinho eram a maior concentração de fábricas e operários da Cidade de São Paulo. Daí em diante, fábricas e oficinas multiplicam-se, a indústria passando a ser o elemento fundamental de integração desses bairros à Cidade. E, ao mesmo tempo em que em alguns bairros se efetivava o projeto das elites de “embelezamento” da Cidade, do outro lado do Tamanduateí, entre outras porções da Cidade, multiplicavam-se os cortiços, havia falta de água e de esgoto, as ruas eram escuras e enlameadas, o lixo acumulava-se na Várzea do Carmo (ANDRADE, 2004, p.179).

1.3. A expansão urbana na cidade de São Paulo: implementação das vilas

operárias

No Mapa 4 abaixo, é possível observar a evolução da área urbanizada em São

Paulo. Notamos que até 1881 apenas a região central, marcada em rosa claro no

mapa, era considerada urbanizada. A partir de 1882, toda a área assinalada em

vermelho passa a ser considerada urbanizada através da intensificação de novos

loteamentos. Nota-se que a região do Belém está incluída nessa expansão de

urbanização, entre os anos de 1882 e 1914, conforme vemos no mapa.

Segundo ANDRADE (1991, p. 25-30), o possível e principal obstáculo para

esta urbanização tardia foi existência da Várzea do Carmo (Várzea do rio

Tamanduateí entre o antigo núcleo urbano de São Paulo e o povoado do Brás.

Page 21: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

12

Mapa 4 - Expansão Urbana da cidade de São Paulo entre 1982 e 1914 (BARBOSA, 2015 p.11)

Apesar de o rio Tamanduateí ter recebido algumas intervenções, em algumas

partes, durante a década de 1860, as constantes inundações e a falta de

saneamento dificultaram a integração do núcleo urbano da cidade com os povoados

além Tamanduateí. Tanto que a cidade cresceu para norte, noroeste e oeste ao

passar pelos limites da colina do Anhangabaú, com o nascimento dos bairros da Luz

e de Santa Efigênia, como podemos ver no Mapa 3.

Esse distanciamento devido ao obstáculo geográfico (Várzea do Carmo), à

grande aglomeração de imigrantes nos bairros a além-Tamanduateí, especialmente

nas áreas de expansão de urbanização, conforme podemos ver no Mapa 4, e às

vilas operárias que foram construídas para abrigar os funcionários das fábricas na

zona leste da capital, criaram núcleos urbanos tão específicos e particulares que

justificaram a designação dada por ANDRADE (2004, p. 172) de “outra cidade”.

Page 22: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

13

Mapa 5 - Indústria de São Paulo – 1901 (Fonte: ANDRADE, 1991, p. 121)

Page 23: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

14

Sem transporte público abrangendo essa região e, portanto, sem conseguir

acessar outras regiões da cidade, essa foi a solução mais viável para os industriais

da época. Essa segregação, promovida pela elite da cidade, impedia o convívio

entre as classes sociais, portanto, negava o urbano, como explica ANDRADE (2004,

p. 180-181):

[...] Para esse momento de nossa industrialização e urbanização, a segregação, negadora do convívio amplo entre grupos e classes sociais e, portanto, negadora do urbano, foi negada na criação do que se poderia considerar um modo de vida operário a Cidade de São Paulo. Ou seja, os bairros além-Tamanduateí, entre outros bairros paulistanos, puderam se definir como totalidade, parte de uma totalidade maior - a Cidade de São Paulo. (ANDRADE, 2004, p. 180-181)

Mesmo com a presença de pequenas indústrias entre 1870 e 1880, somente

em 1890 que a região do Belenzinho começa a se distinguir como bairro industrial.

Já no começo do século XX, a região concentra o maior numero de operários e,

consequentemente, de fábricas da capital.

Em 1900, segundo ANDRADE (1991, p. 124), o Belenzinho possuía apenas

três pequenas fábricas. Apenas 15 anos depois, esse número quase triplicou, como

podemos verificar no Mapa 6. Neste mapa, também é possível visualizar a grande

concentração industrial que existia em 1914 na região do Brás e Belém. É possível

ver a predominância de fábricas têxteis e de cristais e vidros no Belém.

Em relação à indústria têxtil, é imprescindível citar o nome de Francisco

Matarazzo. O imigrante italiano, que se tornou empresário de sucesso e fundador

das Indústrias Reunidas Francesco Matarazzo (IRFM), era dono de 12 fábricas na

região do Belém até o início da Segunda Guerra, como o Moinho Matarazzo, a

Tecelagem Belenzinho, a Fábrica de Óleo Sol Levante e a Tecelagem Mariângela,

por exemplo, sendo a Tecelagem Belenzinho instalada no Belenzinho em um

enorme terreno que se estendia da Celso Garcia até o Rio Tietê, como podemos ver

no Mapa 7 indicada pelo número 3 (ANDRADE, 1991, p. 168-188).

A dificuldade de se locomover pela cidade, devido à falta de transportes

públicos que atendessem de forma digna a população, as más condições dos

Page 24: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

15

cortiços da cidade e a crise habitacional causada pela contínua corrente migratória,

fizeram com que muitos industriais preferissem construir vilas operárias para abrigar

seus funcionários. A grande maioria das vilas operárias foram construídas em

terrenos baratos e inundáveis das várzeas dos rios Tamanduateí e Tietê, próximas

às ferrovias, possuíam cozinha e banheiro internos às casas uni-familiares, lazer

para os trabalhadores, armazém, farmácia e escolas. Entretanto, essas construções

não eram apenas benevolências desinteressadas, mas sim uma forma de controlar

ainda mais os operários. Morando nas casas do empresário, os operários tinham

seus horários de descanso controlados, o aluguel descontado diretamente do

salário, gerando uma fonte de renda adicional, as dívidas no armazém da vila

operária pertenciam ao proprietário, além de criar um domínio moral e psicológico de

gratidão sob os funcionários e torná-los alheios a qualquer reivindicação política ou

greves (BARBOSA, 2015, p. 13-15). A isenção de impostos dada pelo governo e o

retorno de renda em aluguel, que poderiam render 24% de juros ao ano, tornavam a

construção de casas operárias em vilas um negócio ainda mais lucrativo e

interessante (CARONE, 1979).

Surge então a Vila Maria Zélia, a primeira vila operária do país. Construída no

Belém em 1912 por Jorge Street, dono da Cia Nacional de Tecidos da Juta, possuía

escolas, armazém, farmácia, igreja, creche e até jardim de infância. Os aluguéis e os

itens comprados na farmácia e armazém, eram descontados diretamente do salário

dos funcionários, gerando assim, uma fonte de renda para o proprietário (2015, p.

40). Depois dela, diversas outras vilas similares surgiram pela região da Mooca, do

Brás e do Belém.

Neste período, conforme vemos no Mapa 6, existiam basicamente 2 tipos de

indústrias no Bairro do Belém: teares, com produção de fios e tecidos de lã, algodão,

linho, juta, tecidos de seda, rendas e aplicação de filó, tapetes, cordões, barbantes,

cordas, estopas, artefatos de borracha, colchões e toldos; e trabalho com madeira,

com obras em carpintaria, marcenaria, molduras e serrarias.

Page 25: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

16

Mapa 6- Indústrias em 1914: Brás, Mooca e Belenzinho (fonte: ANDRADE, 1991, p. 138)

Page 26: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

17

1.4. A vida do trabalhador: as condições de trabalho nas indústrias da época

A condição de trabalho na maioria das fábricas era muito precária. Segundo

Andrade (1991, p. 140), em 1911 o Departamento Estadual do Trabalho fez uma

análise das condições de trabalho de algumas fábricas têxteis da capital. O relatório

mostrava a diferença entre os salários de homens e mulheres, por exemplo. Em

alguns casos, eles chegavam a receber quase o dobro pelas mesmas horas

trabalhadas em relação às colegas do sexo feminino. Além disso, as jornadas de

trabalho duravam entre 10 horas e meia e 11 horas, podendo ser prolongadas em

determinadas épocas do ano. Havia relatos também do emprego de mão de obra

infantil: centenas de crianças com menos de 12 anos trabalhavam na fiação.

Diante disso, movimentos sindicalistas de orientação comunista e socialista

começaram a surgir e tinham como função socorrer trabalhadores dos abusos

empregados pelos empresários que faziam descontos compulsórios nos salários.

Esses movimentos foram de suma importância para a mobilização da greve geral de

1917 em São Paulo, que levou os governos estadual e federal a darem mais

atenção às questões trabalhistas. Benefícios como regulamentação do trabalho de

mulheres e menores, melhoria nas condições sanitárias dos locais de trabalho,

criação de férias remuneradas para os trabalhadores urbanos, estabelecimento de

jornada de 8 horas para diversas categorias, entre outras regras, foram criados

graças às seguidas greves. No entanto, o empresariado ainda relutava em cumprir

todas as regras até o final da década de 30 (ANDRADE, 1991, p. 147) .

A indústria têxtil paulista prosperou durante boa parte da primeira metade do

século XX e fez mudar a paisagem que outrora era dominada por macieiras,

chácaras e pontos de entreposto comercial. É perceptível a mudança quando

comparamos o Mapa 6, citado anteriormente, com o Mapa 7 abaixo, de 1930.

Com apenas 15 anos de diferença entre o que representa uma imagem e outra,

é possível ver o aumento na distribuição do loteamento no bairro do Belém. Existe

um maior adensamento nas ruas a leste do bairro, uma expansão da cidade em

direção ao sul e uma ocupação a norte do Rio Tietê, região que se tornaria o bairro

da Vila Maria. Finalmente a cidade chegou ao bairro.

Page 27: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

18

Mapa 7 – Indústrias em 1930: Brás, Mooca e Belenzinho (fonte: ANDRADE, 1991, p. 1174)

Page 28: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

19

A movimentação dos bondes lotados de operários a caminho do trabalho, as

agitações dos movimentos sociais, o apito da fábrica ao fim do dia: esses são os

novos personagens do dia a dia do bairro, em que nada lembra o clima bucólico do

final do século anterior, conforme podemos observar no Mapa 8.

Mapa 8 – Expansão Urbana da cidade de São Paulo entre 1930 e 1949 (BARBOSA, 2015 p.16)

Page 29: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

20

Em suma, o Belém passou por muitas mudanças no começo do século XX. O

loteamento das antigas chácaras e pomares ao longo das ferrovias e,

posteriormente, o desenvolvimento de teares, fábricas de vidros e oficinas de

carpintaria, atraídas pela facilidade de escoamento e transporte de matéria prima e

pela mão de obra abundante de imigrantes que não paravam de chegar ao país,

transformaram de vez a paisagem e o cotidiano do bairro. Cortiços e pensões

tomavam conta das moradias do bairro que, devido ao grande fluxo de imigrantes

que chegavam, tiveram seus preços inflacionados As más condições de trabalho e

os baixos salários nas fábricas produziram movimentos sindicais, compostos por

muitos imigrantes, em busca de melhorias e regulamentações de trabalho.

2. A DESINDUSTRIALIZAÇÃO DO BAIRRO

Enquanto a primeira metade do século XX foi determinante para o

estabelecimento da indústria na região e seu crescimento exponencial, a segunda

metade do século foi marcada por crises e reestruturações urbano-industriais que

culminaram em uma dispersão industrial, em que as fábricas migraram para outras

cidades do interior e/ou estados do país movidas por melhores condições fiscais e

tributárias.

Como discutido anteriormente, a ferrovia teve um papel significativo na

expansão da urbanização da cidade, porém ela não orientou apenas a

suburbanização residencial, mas também a suburbanização industrial,

principalmente a partir de 1915 (LANGENBUCH, 1968, p. 213 - 214). Segundo

Langenbuch (1968), mesmo este ultimo processo sendo mais restrito que a

suburbanização residencial, os dois acabaram por se relacionar, sendo as fábricas

antecessoras das residências nos principais subúrbios industriais. A proximidade

com a ferrovia era muito vantajosa para as indústrias, imprescindível para a indústria

pesada, pois era uma forma rápida de escoar a produção, transportar matéria prima

e conduzir rapidamente a mão de obra, já que o transporte viário ainda não possuía

uma grande malha rodoviária pavimentada.

Page 30: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

21

. A ferrovia ajudou na expansão das indústrias para outras cidades da Grande

São Paulo, como Santo André, São Bernardo do Campo e São Caetano do Sul, que

em 1949 já empregavam juntas 46.308 pessoas (NEGRI, 1994, p. 90).

Neste capítulo, vamos discutir as mudanças na industrialização paulista que

ocorreram, principalmente, na segunda metade do século XX, e suas consequências

para a cidade e, mais especificamente para o bairro.

2.1. Movimentos do desenvolvimento: tendências à desconcentração da

indústria em São Paulo

A concentração industrial e de atividades econômicas estruturou e tornou a

metrópole paulistana o polo econômico do Brasil. Segundo Barjas Negri, a indústria

paulista teve um crescimento excepcional durante a década de 1950 devido à

implantação de uma série de programas do Plano de Metas, atraindo investimento

estrangeiro e expandindo os empreendimentos públicos e privados do país. Até

1970, a concentração industrial aprofundou-se em todos os grupos industriais.

(NEGRI, 1994, p. 104-107)

Segundo Padua (2007), entre o final da 2ª Guerra Mundial e a década de

1970, houve um crescimento exponencial do mundo capitalista, com uma grande

expansão de empresas multinacionais para os países de 3º Mundo. Ao final da

década de 1970, as crises evidenciaram a instabilidade da economia capitalista,

acabando com a ilusão do crescimento infinito. Os países de 3º mundo passaram

por uma forte depressão econômica, porém, o período pós-década de 1970

caracterizou-se pelo crescimento da desigualdade social e da pobreza, mesmo em

países desenvolvidos.

Neste período, parte do mundo aderiu a ideologias neoliberais, que defendiam

a liberalização e a desregulamentação da economia, seguidas pela privatização de

ativos estatais, deixando que as leis de mercado reorganizassem as estruturas

produtivas. Tal ideologia afetou principalmente a América Latina, aumentando a

pobreza e a desigualdade, aprofundando ainda mais as contradições e aumentando

Page 31: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

22

a presença de empresas multinacionais a dominar setores estratégicos da economia

(PADUA, 2007, p. 29).

Barjas Negri (1994) aponta que houve uma aumento nas relações comerciais

internacionais devido a uma série de políticas econômicas tomadas em meados de

1968, entre elas a intensificação do endividamento externo, enormes incentivos e

subsídios fiscais e de crédito às exportações e uma política de minidesvalorização

cambial. Tais medidas levaram a um significativo aumento na taxa de acumulação

até o final de 1974, liderado pelo segmento de bens duráveis e de capital, porém,

entre o período de 1974-1980, houve queda acentuada no ritmo de crescimento

industrial e uma desaceleração da economia. Segundo Negri (1994, p. 148),

economistas alertaram sobre os problemas destas políticas: "A crise se desencadeia

em função da incompatibilidade entre as taxas de acumulação e de crescimento de

demanda efetiva de bens duráveis de consumo".

A implantação do II Plano de Nacional de Desenvolvimento (II PND),

condicionou a economia brasileira e impediu que a crise tomasse proporções ainda

maiores. Para tal, foram necessários elevados investimentos do setor público com o

objetivo de superar o atraso do setor de bens de produção e diminuir a forte

dependência na importação de insumos básicos.

Sendo assim, ao longo da década de 1970, as exportações industriais

brasileiras se diversificaram ainda mais, pois devido ao II PND, complementou-se a

estrutura produtiva e desenvolveram-se as indústrias petroquímica e de metais não

ferrosos, que até então dependiam de importações. O Estado atuou também no

setor energético carburante ao criar o "Pró-álcool", expandindo a produção nacional

do álcool automotivo.

Como parte das políticas governamentais de investimento, em São Paulo,

elas foram direcionadas para fora do estado, em uma clara política de

desconcentração industrial no sentido São Paulo - resto do país, diminuindo a

participação de São Paulo no total do valor da transformação industrial brasileira.

Foram criadas propostas de desconcentração industrial, que serão discutidas mais

adiante (NEGRI, 1994).

Page 32: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

23

O crescimento da aglomeração metropolitana paulista, que ocorreu ao longo

dos principais eixos rodoviários, produziu uma paisagem fragmentada, conforme

apresenta Lencioni (LENCIONI, 1998, p. 198), embora unificada, atingindo o interior

do estado desde os anos 1970. Mesmo sendo a concentração das atividades

econômicas e a concentração industrial responsáveis por impulsionar inicialmente tal

processo, hoje, é a dispersão industrial que permite tamanha expansão e

reestruturação da metrópole. A migração de empregos e do valor da produção

industrial para o interior paulista corrobora este argumento.

Através da tabela 1 a seguir, trazida por Lencioni para discutir a transformação

do papel da capital na geração de valor industrial em São Paulo, podemos visualizar

o movimento do valor da produção em todo o estado. Em um primeiro momento,

vemos a transição da importância da capital em direção à Região Metropolitana

(1940 – 1960) e, posteriormente, a dispersão para o interior (1970 – 1985). A tabela

apresenta valores percentuais relativos à participação de cada região em relação ao

valor da produção industrial total no Estado de São Paulo (LENCIONI, 1998).

Portanto, verificamos que entre 1940 e 1980, a capital perde o seu papel de

concentrar o valor de produção industrial, caindo de 53,9% para 30,1%. Ao mesmo

tempo, verificamos o aumento da participação relativa do interior na produção que,

em 1980, supera a capital. A região metropolitana também perde participação, mas

mesmo assim, em 1985, continua concentrando o valor da produção industrial.

Tabela 1 - Estado de São Paulo: Valor da Produção Industrial 1940-1985 (%)

Anos Região

Metropolitana Capital Interior

1940 64,5 53,9 35,5

1956 66,6 54,2 33,6

1960 71,1 51,7 28,9

1970 70,7 43,7 29,3

1980 58,6 30,1 41,3

1985 56,5* - 43,5

* Inclui a Capital

Fonte: LENCIONI, 1998, p. 199

Page 33: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

24

Com esta movimentação do Valor da Produção Industrial, consequentemente,

o número de empregos na indústria da capital foi diretamente afetado. Conforme

podemos observar na Tabela 2 citada por Lencioni (1998) a seguir, entre os anos

1970 e 1980 houve uma variação de 6% na participação do total de empregos do

setor industrial, aumentando para 9% em 1988. Isso demonstra um aumento na

industrialização do interior, que segundo a autora, está relacionada aos eixos

rodoviários e indica o efeito econômico desta região.

Tabela 2 - Estado de São Paulo: Emprego na Indústria 1970 – 1980 – 1988(%)

1970/1980 1980/1988

1970 1980 1980 1988 Região

Metropolitana 70,0 64,1 66,2 61,6

Interior 30,0 35,9 33,8 38,4 Litoral 1,8 1,7 1,7 1,6

Fonte: LENCIONI, 1998, p. 202

Segundo Lencioni (1998, p. 201), enquanto o governo federal procurava dirigir

a indústria para o Nordeste do país, através de um discurso de desconcentração

industrial, o governo local de alguns municípios do estado de São Paulo ofereceram

uma série de incentivos (isenção de impostos e taxas municipais, terrenos,

ressarcimento de gastos com infraestrutura, etc.) para atrair estabelecimentos

industriais para seus municípios. Tal política de dispersão abrangeu um raio de 150

km a partir da capital ao longo dos principais eixos rodoviários. Tais políticas serão

melhor discutidas no próximo subcapítulo.

Mesmo as indústrias se realocando para fora da capital, muitas vezes em

municípios próximos, o controle do processo de valorização do capital continuou

concentrado espacialmente na Grande Metrópole. Lencioni (1998) considerou todo o

grupo empresarial ao invés de analisar apenas a localização dos estabelecimentos

industriais. Conforme explica, no começo da década de 1990, muitas indústrias que

haviam migrado da capital mantiveram lá seus escritórios centrais, fazendo com que

todas as principais decisões e negócios permanecessem na cidade. Isso ocorreu

principalmente em um período no qual absorções, associações e fusões estavam

crescendo significativamente como podemos ver na Tabela 3, a seguir:

Page 34: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

25

Tabela 3 - Brasil – Associações, absorções e fusões: Indústria de transformação em geral –

1985-1990

Anos Indústrias de transformação em Geral

1985 36 1986 136 1987 139 1988 243 1989 180

Fonte: LENCIONI, 1998, p. 204

É preciso frisar que concentração e centralização são processos

completamente distintos, sendo que o primeiro ocorre quando uma determinada

fábrica aumenta o número de máquinas e equipamentos para ampliar sua base de

acumulação, enquanto que o segundo se trata de absorção, fusão ou associação de

capitais individuais sob o mesmo controle. Conforme a autora:

A não compreensão do que seja o processo de centralização, ou até mesmo o fato de

tomá-lo sem distinção do processo de concentração, tem sido responsável pela

interpretação da dispersão industrial como produto de uma desconcentração industrial

(LENCIONI, 1998, p. 204).

Porém, na prática, a dispersão industrial está muito ligada a processos de

centralização de capital. O importante é a capacidade da empresa de controlar os

vários ciclos de valorização do capital possível, e não a proximidade física entre os

vários segmentos da produção ou entre a administração e a produção em si.

Retomando o que propôs Lencioni,

[...] a capital e seu entorno se veem, em certa medida, homogeneizados pela expansão

da atividade econômica, mas, concomitantemente, a especialização das atividades

terciárias torna a capital distinta do seu entorno. Já não se trata mais de mecanismos de

concentração da localização industrial, mas de um movimento de dispersão desta

localização. Segundo palavras de Vinícius Caldeira Brant, a superioridade de São Paulo

é agora representada pelo financiamento e pela coordenação das atividades produtivas”

(LENCIONI, 1998, p. 208)

Page 35: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

26

Em outras palavras, a RMSP continuou sendo um polo de centralização,

porém não mais de concentração industrial. A região passou agora a centralizar o

controle e a coordenação da produção à distância, e ainda que a saída da indústria

tenha modificado a configuração urbana da capital, não retirou a importância

econômica dela.

2.2. A interferência do governo estadual no processo de dispersão da

indústria

Um dos fatores que contribuiu para o afastamento da indústria da capital

paulista, acarretando todas as mudanças supracitadas, foi que em meados da

década de 1960, os governos estadual e federal passaram a elaborar políticas de

desconcentração industrial partindo da Região Metropolitana para o interior do

estado e para o resto do país, de maneira a sanar ou aliviar as condições de vida

precárias a que se submetia a população paulista por conta da forte industrialização.

Tais políticas se estenderam até a década de 1990.

Listadas a seguir estão as principais propostas e ações tomadas pelos

governos estaduais de desconcentração industrial de cada gestão a partir de 1967

que, como citado anteriormente, estão vinculadas ao II PND, conforme aponta

Barjas Negri

a) Governo Abreu Sodré (1967/1971):

Foram criados dois grupos de trabalho em relação à situação industrial na

RMSP. Um deles, o Grupo de Desconcentração Industrial, acabou por ponderar que

o Estado não deveria intervir na questão da industrialização com medidas que

afetassem o direcionamento da indústria. Por sua vez, o Grupo de Análise Territorial,

mais voltado para a desobstrução da capital, sugerindo o desenvolvimento de

“núcleos urbanos dinâmicos” que levariam em conta até mesmo a inclusão de áreas

agrícolas. De um modo geral, esse período serviu como base para o estudo da

situação da cidade (Negri, 1996, p. 171).

Page 36: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

27

b) Governo Laudo Natel (1971/75)

Nessa época, foi proposto o Plano de Interiorização do Desenvolvimento, que

pressupunha que o Estado devia intervir diretamente na questão da industrialização

com medidas políticas. Definiram-se as regiões adjacentes aos principais eixos de

condução entre a capital e o interior (rodovias Anhanguera, Washington Luiz e

Castelo Branco) de modo a guiar a expansão industrial. As medidas práticas

tomadas durante esse governo envolviam, sobretudo, a criação de um plano

rodoviário de expansão considerando o eixo de “expansão natural” do caminho da

capital para o interior e para o Rio de Janeiro, e o acompanhamento dessa

expansão e espalhamento industrial (Negri, 1996, p. 171-172).

c) Governo Paulo Egydio Martins (1975-1978)

Por sua vez, o governo de Martins considerava que o processo de

desenvolvimento do estado estava diretamente relacionado aos problemas urbanos

encontrados. Numa tentativa de equiparar o desenvolvimento no estado, esse

governo lançou mão de uma série de programas que tinham por objetivo principal

desconcentrar a urbanização para promover o desenvolvimento de áreas externas à

capital do estado (Negri, 1996, p. 172).

d) Governo Paulo Maluf / José Maria Marín (1979-1982)

Neste período, conforme afirma Negri, a questão da desconcentração

industrial passa a ser tratada com menor prioridade pelo poder público. No sentido

de tentar implementar a industrialização e o desenvolvimento no interior do estado, o

governo propôs o deslocamento da capital para outra região que não a cidade de

São Paulo. Sobre isso, Negri aponta:

(...) Em virtude da forma autoritária com que o assunto foi tratado pelo governo estadual, da inconsistência técnica da proposta, bem como de seus elevados custos de implantação, num período de desaceleração da economia de São Paulo, o projeto acabou sendo rejeitado pela Assembleia Legislativa, e a ideia abandonada pelo governo estadual (1996, p. 173).

Page 37: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

28

e) Governo Franco Montoro (1983 – 1986)

O governo Montoro visou a desconcentração do ponto de vista administrativo,

separando o estado em regiões relativamente independentes. Além disso, esse

governo investiu na duplicação e na expansão de rodovias, ampliando o processo de

desenvolvimento do interior conforme a melhor acessibilidade (Negri, 1996, p. 173).

f) Governo Quércia (1987 – 1991)

Durante o governo Quércia, buscou-se avaliar a ampliação e a

desconcentração da indústria já vigente no estado, “apontando as áreas

preferenciais e prioritárias para o recebimento de novos empreendimentos

industriais” (NEGRI, 1994, p. 174). O governo aproveitou de recursos vindos de

impostos, como o IPVA, para investir em áreas interiorizadas que precisavam de

apoio no desenvolvimento.

Conforme Negri (1994) explica, os municípios de São Paulo buscavam

acompanhar os investimentos lançados pelo governo do estado, de modo a

acomodar a desconcentração do desenvolvimento. Na visão do autor, essas

políticas foram implementadas de modo superficial e falho, tal qual os diagnósticos

de desenvolvimento urbano da região.

Entretanto, notamos que o processo ocorreu e de fato desconcentrou a

indústria, conforme pode ser observado na Tabela 4, abaixo.

Tabela 4 – Modificações espaciais da indústria de transformação do Estado de São

Paulo (1959/1985) – valores em percentagem do VTI

Região metropolitana e interior 1959 1970 1975 1980 1985

1. Metropolitana - RMSP 73,8 74,7 69,4 62,9 56,6

1.1. Capital 54,8 48,1 44,0 34,8 29,8

1.2. RMSP, exceto capital 19,0 26,6 25,4 28,1 26,8

2. Interior 26,2 25,3 30,6 37,1 43,4

TOTAL DO ESTADO 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 Fonte: NEGRI, 1994, p.181

Page 38: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

29

2.3. A influência da desconcentração industrial do estado de São Paulo na

configuração urbana do Belém

Mesmo com as transformações urbanas e o incentivo ao desenvolvimento do

interior, a região metropolitana de São Paulo permaneceu sendo importante polo

industrial. Conforme Negri aponta:

[...] assim mesmo vamos encontrar, ao final da década [de 70], elevada concentração do produto industrial, nessa região, principalmente nos ramos de maior complexidade como os da metalomecânica e eletroeletrônica, papel e papelão, borracha, produtos de matéria plástica, entre outros (1994, p. 201).

No entanto, a ocupação da região metropolitana sofre intensa modificação

com o novo perfil industrial da cidade, que não mais representa a maior porção de

produtividade industrial do estado.

O Belenzinho passa, então por uma nova mudança em sua paisagem. O

movimento diário dos operários do bairro deu lugar a ruas vazias e prédios

abandonados. A tecelagem Belenzinho, por exemplo, funcionou por 68 anos e foi

fechada em 1981, após ser vendida pela IRFM, junto com todas as suas fábricas

têxteis. Até 1987, a IRFM vendeu quase todos seus imóveis (ANDRADE, 1991, p.

184). Outras fábricas contemporâneas a IRFM, como a Fábrica de Vidros

Multividros, então localizada na Rua Júlio de Castilho, e a Fábrica de máquinas

gráficas A. Benedini, então localizada na Rua Conselheiro Cotegipe, 227, também

fecharam suas portas ao final da década de 1980. O Cotonifício Paulista (Figura 4),

localizado na Avenida Celso Garcia, 1651, foi construído em 1921 e faliu na década

de 50. Possuía um terreno de cerca de 20.000 m², que foi dividido em dois para a

construção da ligação entre a Rua Conselheiro Cotegipe e a Rua Visconde de

Parnaíba. Não foi possível encontrar informações de quantos empregados essas

fábricas possuíam quando fecharam.

Page 39: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

30

Figura 4 - Fachada atual do Cotonifício Paulista. Imagem de agosto de 2017 (fonte: Google Street View)

Conforme aponta Andrade (1991), sobraram no bairro: "Velhos edifícios de

fábricas, abandonados ou retomados por outros usos. A 'Avenida' para o trânsito

infernal de ônibus. Cinemas fechados. O Teatro destruído. A festa confinada...".

De acordo com Pádua, o abandono de regiões industriais para

desconcentração da indústria, de modo análogo às transformações agrícolas, cria

friches: regiões desvalorizadas que interferem negativamente na imagem do bairro e

na região. “Estes espaços degradados se tornam focos de problemas urbanos,

passando a ser objeto privilegiado da atenção dos planejadores para as estratégias

de reutilização” (PADUA, 2007, p. 33). Dessas situações-problema, desencadeadas

pelo abandono da região pós-industrialização, surgiu o processo de verticalização

que afetou muito o Belém. Esse tema será abordado no próximo capítulo.

3. A VERTICALIZAÇÃO DO BELÉM

Neste capítulo, trataremos dos processos de verticalização do bairro do

Belém, os quais trouxeram intensas transformações no cotidiano, no modo de vida e

na configuração urbana da região. Conforme aponta Pádua, “há um processo real,

concreto, espacial, e há um outro processo, também real, que é aquele de

apreensão, através da consciência, deste processo” (2007, p. 33). Nesse sentido,

Page 40: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

31

este capítulo pretende dar conta da descrição e discussão das transformações

materiais do bairro, mas também das mudanças na concepção e no imaginário da

população local, a partir de entrevistas com moradores do bairro que ativamente

participaram desses processos urbanísticos.

3.1. As transformações físicas

De acordo com Nadia Somekh, a cidade de São Paulo teve uma significativa

transformação a partir do anos 1940, mas a partir de 1939, o processo de

verticalização passou de predominantemente terciário para residencial, e passou a

localizar-se fora do centro da cidade. (1997, p. 19)

3.1.1. A organização dos espaços metropolitanos dentro do capitalismo

Para entender melhor este fenômeno, é preciso antes pontuar a importância

do Estado como “agente produtor do espaço” e compreender qual conceito de

espaço deve ser considerado (Somekh, idem, p. 28).

Para Somekh, o espaço é uma totalidade que tem como essência o social e é

composto por diversos processos sociais, os quais adquirem formas de expansão

territorial. De acordo com Milton Santos (2014, p. 12): "Como as formas geográficas

contêm frações do social, elas não são apenas formas, mas formas-conteúdo".

Na visão marxista, a cidade resulta da concentração da força de trabalho e do

capital. E é seguindo esta lógica de acumulação de capital que diversas

transformações sócio-espaciais são reguladas. Tal visão considera o processo de

acumulação como determinante do espaço e vincula às suas crises o ambiente

construído no mesmo, o que corrobora o papel do Estado como agente produtor do

espaço. Para a autora, os marxistas entendem o espaço como “relação de produção

integrada a um sistema global incorporado a uma divisão internacional do trabalho”

(SOMEKH, 1997, p. 37).

Porém, deve-se ressaltar que uma visão marxista estruturalista possui certas

limitações quando considera a cidade como ponto de convergência das tendências

Page 41: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

32

de acumulação, e as formas espaciais como receptáculo de processos econômicos

e políticos.5 Nesse sentido, Lefebvre foi mais assertivo ao considerar os fatores

políticos e culturais, não apenas o econômico, na teoria do espaço. Ele não só

confirma o papel do Estado como interventor do espaço, mas também aponta que

este o produz de forma policiada. (Somekh, idem, p.29)

Tais intervenções não melhoram a vida da classe trabalhadora, mas atendem

o mercado imobiliário na liberação de terra para investimentos lucrativos.

Compreender os circuitos financeiros e produtivos como circuitos paralelos, como

elucidado por Lefebvre, nos ajuda a entender os períodos de aumento da

verticalização na cidade de São Paulo.

Considerando o potencial produtivo da cidade de São Paulo, é preciso

reconhecer que, conforme aponta Pádua, “se por um lado há uma relativa

desconcentração industrial, por outro, há uma reconcentração na metrópole dos

ramos industriais de alta tecnologia” (2007, p. 36). O autor ensina que, na realidade,

a metrópole é reorganizada para comportar novas indústrias e novas

especializações, seguindo a lógica da transformação da produção dentro de um

sistema capitalista. Harvey (2004, p. 78) postula a existência de “ordenações

espaço-temporais” que seguem a lógica capitalista contraditória e têm por objetivo

principal impedir desvalorização e, sumariamente, perda de capital. A reestruturação

geográfica faz parte desse processo e, segundo Harvey, é marcada pela

instabilidade. A organização dos espaços, orientada pelo capitalismo, está sempre

em desequilíbrio e busca satisfazer o monopólio orientando-se pela evolução dos

transportes (PADUA, 2007, p. 37).

É preciso dizer que o processo de verticalização é parte do processo de

reprodução do espaço urbano, que por sua vez, é visto como integrante do

processo de acumulação, não como "lugar", base de reprodução do capital, sendo

assim, passível às leis do valor. A verticalização não é um natural.

Nesse sentido, precisamos entender a estruturação do Belém enquanto bairro

desindustrializado e, hoje, em processo de verticalização, como um caminho

constante: essas transformações geográficas não acabarão; sempre, em função das

5 Essa visão marxista foi superada posteriormente em diversos trabalhos apresentados no Departamento de Geografia da Universidade de São Paulo.

Page 42: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

33

necessidades e demandas econômicas, os bairros das metrópoles capitalistas serão

transformados.

3.1.2. A verticalização

A verticalização pode ser definida como um processo de transformação

urbana que consiste na multiplicação do solo urbano através da construção de

diversos edifícios, afetando a circulação de ar, criando ilhas de calor e impactando

fortemente a valorização imobiliária e os usos da região afetada. Para Somekh, tal

processo só foi possível devido ao advento do elevador, pois, além de outros

motivos, facilitou o transporte dos móveis até o último andar dos prédios, que até

então não costumavam passar do 5º andar. Essa invenção foi essencial para o

desenvolvimento e a dispersão dos arranha-céus6, caracterizados pela verticalidade

e pelo aproveitamento intensivo da terra urbana, provocando assim, um

adensamento populacional.

A cidade de São Paulo teve seu crescimento vertical inicialmente terciário,

uso original, e posteriormente residencial, presente predominantemente até os dias

de hoje, com diferenças na sua produção e localização.

O marco da verticalização da cidade de São Paulo para Somekh é o ano de

1920, quando foi promulgada a Lei n. 2.332, que estabelecia o "padrão municipal"

para as construções particulares no município, e a regulamentação das alturas dos

edifícios e do uso do elevador.

Outros marcos referentes a ações tomadas pelo poder público foram

importantes para a verticalização de São Paulo, e através deles, Somekh (1997)

definiu 6 fases de verticalização, de 1920 até 1994:

De 1920 a 1939 - O primeiro período foi caracterizado pela

predominante reprodução dos padrões europeus na vida e no espaço

urbano. Concentrada na região central com uma leve expansão para

bairros próximos, era exclusivamente terciária com salas alugadas. Até

este momento o coeficiente de aproveitamento não havia sido regulado

pelo Estado e atingiu altos índices. (Mapa 9.1)

6 A definição de Arranha-céu está desenvolvida no capítulo 2 do livro de Nadia Somekh (1997)

Page 43: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

34

Mapa 9.1 – Verticalização no município de São Paulo de 1920 a 1939 (Fonte: Somekh, 1997, p. 23)

1940 a 1956 - O segundo período foi denominado pela autora como "a

verticalização americana". Possui características ascendentes

começando coma implantação de elevadores e finalizando na primeira

limitação do coeficiente de aproveitamento dos terrenos. Com o padrão

de construção valorizado passando a ser norte-americano, há um

significativo aumento no número de kitchenettes na cidade. O uso

passa ser predominantemente residencial, mesmo com os índices de

aproveitamento se mantendo altos como no período anterior. (Mapa

9.2)

1957 a 1966 - O terceiro período foi denominado "a verticalização do

automóvel" devido ao foco do crescimento industrial estar voltado ao

setor automobilístico, mostrando um novo tipo de ocupação. As

kitchenettes, símbolo da última fase, deram lugar a grandes conjuntos

residenciais. Isso só foi possível pois o Estado, pela primeira vez,

limitou o coeficiente de aproveitamento dos terrenos e apartamentos e,

junto com o crescimento do uso do automóvel, provocou um

crescimento vertical. (Mapa 9.3)

Page 44: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

35

Mapa 9.2 – Verticalização no município de São Paulo de 1940 a 1956 (Fonte: Somekh, 1997, p. 24)

Mapa 9.3 – Verticalização no município de São Paulo de 1957 a 1966 (Fonte: Somekh, 1997, p. 25)

1967 a 1971 - O quarto período foi de grande ascensão e de grande

índice de crescimento vertical, por isso foi denominado "a

verticalização do milagre". Com o início da utilização do FGTS pelo

Page 45: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

36

BNH7, o banco passa a financiar a construção e a compra de

apartamentos para a classe média, que por sua vez passa a ser

proprietária de sua própria moradia ao ver seus rendimentos

aumentarem acentuadamente. Em 1971, o então prefeito de São

Paulo, Figueiredo Ferraz, na tentativa de frear o crescimento

descontrolado da cidade, propôs o primeiro Plano Diretor de

Desenvolvimento Integrado, que deu origem à lei de zoneamento de

1972. (Mapa 9.4)

1972 a 1988 - Quinto período, "a verticalização de zoneamento"

começou depois da promulgação da legislação de zoneamento, passou

pela desaceleração econômica da década de 1980 e terminou com a

criação da lei de operações interligadas de 1988. A lei de zoneamento

provocou a construção de empreendimentos imobiliários em áreas de

preços baixos, possibilitando uma revalorização imobiliária e

expandindo a verticalização com edifícios muito mais sofisticados.

Houve então uma mercantilização dos apartamentos. (Mapa 9.5)

Mapa 9.4 – Verticalização no município de São Paulo de 1967 a 1971 (Fonte: Somekh, 1997, p. 26)

7 FGTS - Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, implementado em 1967; BNH - Banco Nacional

de Habitação

Page 46: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

37

Mapa 9.5 – Verticalização no município de São Paulo de 1972 a 1988 (Fonte: Somekh, 1997, p. 27)

1988 a 1994 - Sexto período, foi denominado "a verticalização

negociada", pois foi resultado da aplicação das operações interligadas.

Neste período reverteu-se o processo de desverticalização, pois os

coeficientes de aproveitamento puderam ser ampliados mediante

negociação. (Mapa 9.6)

Mapa 9.6 – Verticalização no município de São Paulo de 1988 a 1994 (Fonte: Somekh, 1997, p. 27)

Page 47: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

38

A verticalização chegou ao bairro do Belém após o quinto período (1972 a

1988), porém de forma modesta e não muito perceptível. Apenas no final dos anos

1990 e início dos anos 2000 que os antigos galpões e fábricas abandonadas

passam a dar lugar a empreendimentos imobiliários residenciais.

Esse novo ambiente urbano é considerado por Somekh o embrião da

verticalização paulistana, ainda com forte influência europeia. A verticalização é

tratada pela autora como uma solução para o aproveitamento do espaço na cidade,

porém impede o desenvolvimento de uma urbanidade, sendo assim, uma

reprodução do capital no espaço.

É possível observar tal mudança nos três mapas da área de estudo a seguir.

Eles foram produzidos levando em conta os condomínios verticais originados de

galpões e fábricas abandoadas.

No Mapa 10 de 1954, verificamos a maciça presença de galpões e fábricas,

não sendo possível identificar todas. Este período é o auge da industrialização do

bairro, e também é possível identificar outros galpões e fábricas na região ao

analisar a imagem. Aqui é necessário destacar as maiores indústrias do bairro que

viriam a se tornar grandes condomínios no futuro: a IRFM - Tecelagem Belenzinho,

a IRFM - Fábrica de Papel, a A. Benedini LTDA - Máquinas Gráficas, o Cotonifício

Paulista e a Fábrica de Vidros Multividros.

No Mapa 11 de 1994, temos uma significativa mudança no uso do solo da

nossa área de estudo. Com a saída das indústrias da capital e o abandono dos

edifícios, vemos o surgimento de condomínios verticais concomitante com as ruínas

das antigas fábricas, que passariam a ser utilizadas pelo mercado imobiliário para

construção de mais edifícios. O bairro, que era caracterizado por grandes fábricas,

passou a ser residencial.

Finalmente, no Mapa 12 de 2017, vemos a conclusão do processo de

verticalização. As ruínas das antigas fábricas e seus galpões deram lugar a diversos

condomínios verticais, destaque para o condomínio construído no terreno da antiga

Tecelagem Belenzinho, ao norte da área de estudo, com 28 torres e 1792

apartamentos. Neste mapa também é possível ver a existência de estacionamentos,

Page 48: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

39

que são comumente criados pelas construtoras para gerar renda antes de iniciar a

construção de condomínios. Tais terrenos apontam uma verticalização futura.

Se analisarmos o andamento das construções de condomínios verticais

através de imagens aéreas recentes (2002, 2009 e 2017), é possível observar um

aumento do processo de verticalização, principalmente a partir de 2007, época em

que o Brasil passa a ter uma estabilidade econômica e ocorre o auge do mercado

imobiliário pós-crise (ZAP IMÓVEIS, 2016).

Na sequência de mapas a seguir, podemos verificar que em 2002 (Mapa 13),

ainda é possível encontrar ruínas das antigas grandes indústrias paulistas, sendo

que em 2009 (Mapa 14), são substituídas por grandes canteiros de obras. No Mapa

15, vemos a conclusão dos empreendimentos imobiliários e o surgimento de novos,

em forma de estacionamentos.

Page 49: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

40

Mapa 10 - Verticalização no bairro do Belém - 1954. (Fonte: GEOSAMPA; Organizado por: Ricardo Dias Sandoval

Page 50: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

41

Mapa 11 - Verticalização no bairro do Belém 1994. (Fonte: LASERE - FFLCH/USP; Organizado por: Ricardo Dias Sandoval)

Page 51: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

42

Mapa 12 - Verticalização no bairro do Belém 2017. (Fonte: LASERE - FFLCH/USP; Organizado por: Ricardo Dias Sandoval)

Page 52: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

43

Mapa 13 - Construções de Condomínios Verticais no Belém - 2002 (Fonte: GEOSAMPA. Organizado por: Ricardo Dias Sandoval)

Page 53: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

44

Mapa 14 - Construções de Condomínios Verticais no Belém - 2009 (Fonte: GEOSAMPA. Organizado por: Ricardo Dias Sandoval)

Page 54: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

45

Mapa 15 - Construções de Condomínios Verticais no Belém - 2017 (Fonte: GEOSAMPA. Organizado por: Ricardo Dias Sandoval)

Page 55: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

46

Segundo levantamento feito em 2011 por empresas do mercado imobiliário,

as regiões mais afetadas pelo processo são Jardins e Perdizes. Por sua vez, regiões

como Santana e Mooca (dentro da qual considerou-se subscrito o bairro do Belém)

passam ainda pelo processo relativamente tardio da verticalização, isso porque

foram regiões industriais que hoje recebem esse investimento com o objetivo de

rapidamente valorizar o metro quadrado. Segundo Angélica Delgado Arbex, que

liderou o mapeamento da construção de edifícios por quilômetro quadrado na cidade

toda, a região da Mooca já concentra 6,2% dos edifícios da capital. Bairro vizinho, o

Tatuapé já concentra 6,7%8. A partir desse levantamento, é possível entender que

as regiões abandonadas após o processo de desindustrialização, ou os friches,

como apontou Pádua, são hoje revitalizadas pelo processo de verticalização.

Santana, Brás, Belém e Mooca participam desse processo e recebem hoje o

investimento imobiliário para o aproveitamento econômico da região, a serviço do

capital dentro da cidade.

Tal mudança na paisagem do bairro foi sentida principalmente por seus

moradores e comerciantes em seus respectivos imaginários. De bairro com grande

predominância de sobrados e casas térreas, pouco populoso e afastado do centro

da cidade, passou a comportar edifícios extremamente luxuosos, invadido por

condomínios gigantes com diversas torres, e viu sua população aumentar

drasticamente.

3.2. Transformações no imaginário: a percepção da mudança pela população

A população local observa e participa dessas transformações que se orientam

pela evolução dos transportes. Eduardo Pitta (nascido em 1954, no Belém), é hoje

dono da Casa Pitta, loja de sapatos fundada em 1923. Acompanhou o

desenvolvimento do bairro desde meados do século XX. Seu pai, Manoel Pitta, foi

um grande colaborador do bairro. Graças a ele, nos feriados da pátria, o bairro era

tomado por desfiles de escolas de diversos bairros da capital e suas fanfarras.

Todos os anos, passeios ciclísticos eram organizados para comemorar o aniversário

do bairro. Manoel Pitta foi durante muitos anos presidente da Associação Amigos do 8 Levantamento feito pela imobiliária Lello e publicado pela revista Exame em 8 de agosto de 2011.

Page 56: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

47

Belém, na qual sempre trabalhou pela melhoria do bairro e para que o poder público

melhorasse suas condições. Manoel Pitta faleceu no dia 16 de março de 2011, mas

sua colaboração com o bairro é lembrada até hoje.

Eduardo conta que, antigamente, antes da presença de grandes viadutos,

como o Guadalajara, ele e seus amigos costumavam jogar bola nos espaços que

hoje são tomados por carros, como a Avenida Salim Farah Maluf. O vendedor relata

as grandes transformações que o bairro sofreu, especialmente em relação à

infraestrutura de transporte. Para Eduardo, o que mais marcou as transformações foi

a evolução das grandes avenidas e viadutos na região do Belém e do Brás,

alterando a paisagem e o uso dessas regiões (PITTA, 22/07/2017)

Além da transformação dos transportes, Eduardo conta que “antigamente não

tinha essa separação entre fábricas e moradias. A ideia era você morar perto de

onde trabalhava, então tinha as fábricas e tinha as casas das pessoas”. O que o

morador está ressaltando nessa fala é a interação com o ambiente em que vivia,

pautada pela mistura entre elementos de zona industrial e elementos de zona

residencial. Com a desindustrialização e, sobretudo, com a verticalização, essa

realidade muda brutalmente. Hoje, o Belém é marcado por ser bairro residencial,

afastado dos grandes centros econômicos de São Paulo, como a região da Avenida

Paulista e da Avenida Luís Carlos Berrini.

O que mais transparece na fala de Eduardo, porém, é a preocupação com o

futuro do bairro: ele conta que não parece haver poder público verdadeiramente

investido em lutar pela região e pelo aproveitamento do espaço a serviço da

população, pelo contrário.

Tal pensamento é compartilhado por outro antigo comerciante e frequentador

do bairro, Clóvis Querubim, 56 anos, dono da Majestic Óptica de Precisão,

localizada na Rua Belém, 296. A óptica foi fundada por seu pai em 1954 e herdada

por Clóvis em 1976, mas desde criança já ajudava o pai na loja.

Clóvis relatou um bairro estritamente industrial, movimentado e próspero para

o comércio. Segundo o mesmo, a Rua Belém e o Largo São José concentravam

todos os tipos de lojas (móveis, material de construção, roupas, bombonieres,

calçados, etc.), bancos e restaurantes devido à presença das fábricas e respectivas

Page 57: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

48

vilas operárias. O Largo São José do Belém concentrava linhas de ônibus que

ligavam diversos bairros da Zona leste da capital e era usado pela população da

cidade como caminho do trabalho.

[...] a gente encontrava de tudo no Belém. Loja de louça, loja de roupa, corte de roupa, era sapatos. Você encontrava de tudo aqui. [..] Nos anos 1960/1970, quando você queria alguma cosia, você ia para o centro da cidade e no Belém não precisava, você tinha tudo aqui. Até as grandes lojas que tinha a Arapuã, a Eletroradiobraz... (QUERUBIM, 30/04/2018)

Ele observa que a migração das fábricas para outras cidades fez com que o

comércio do bairro fosse muito afetado. As grandes lojas por ele citadas, acabam

por fechar, e seus prédios dão lugar a academias ou até ficam abandonados até

meados dos anos 2000. Clóvis ainda aponta que o bairro passa a ser um "bairro

dormitório", pois muitas pessoas se mudaram para lá, porém trabalham em outros

pontos da cidade e, sendo assim, utilizam o bairro apenas para residir.

As duas entrevistas e as conversas que tive com moradores e antigos

frequentadores do bairro apontam para uma comum preocupação com o

enfraquecimento do comércio local e a falta de interesse da população do bairro em

procurar melhorias para o mesmo. Os comerciantes relatam que os próprios

moradores do bairro preferem fazer compras nos grandes shoppings e centros

comerciais do que incentivar o comércio local, levando a uma grande rotatividade

das lojas das outrora movimentadas Rua Belém e Rua Silva Jardim.

Como morador do bairro desde o meu nascimento (1989), vivenciei a

mudança final do bairro, onde as ruínas das grandes fábricas de tecido e cristais

deram lugar aos diversos edifícios. Aprendi na minha infância, nas aulas de

geografia do colégio, que vivia em um "bairro de velhos", pois a maioria de seus

moradores eram ex-operários aposentados. Recordo perfeitamente dos diversos

cortiços e pensões que existiam pelo bairro e de muitas famílias que ali viviam.

Andando pelo bairro, pude observar que a maioria dos cortiços de que me

recordo já não existem mais, assim como as antigas ruínas das fábricas. Percebi

que as pessoas que frequentavam o bairro já não eram em sua maioria idosas,

novos colégios e lojas apareceram, o trânsito de carros aumentou significativamente

Page 58: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

49

e os principais mercados e padarias do Largo São José do Belém foram reformados

e estavam lotados e muito mais caros que antes. A condição social dos novos

moradores mudou completamente. Os apartamentos recém-construídos foram

vendidos por valores muito mais altos que a maioria dos sobrados do bairro. Ou

seja, o custo de vida no bairro mudou bastante.

Vi então uma relação entre tais mudanças e a construção dos diversos

edifícios, criando em mim o interesse em estudar a história do bairro do ponto de

vista geográfico.

Conforme postulou Harvey e confirmou Padua (2007) em seu levantamento

análogo em Santo Amaro, a evolução das ocupações urbanísticas está somente a

serviço das necessidades do capital, que promove transformações geográficas com

largo impacto sobre a qualidade de vida da população, sem, no entanto, mover

esforços para incluir ou considerar a participação popular democrática e com

princípios de cidadania nesses espaços.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho teve por objetivo discutir os processos de urbanização que

ajudaram a moldar a configuração que tem hoje o bairro do Belém, em São Paulo.

Traçando um panorama histórico que abordou as transformações geográficas e

econômicas da região, pudemos observar que o processo de verticalização seguiu e

continua seguindo as estratégias do capital reguladas pelo Estado, que ao servir o

interesse das elites dominantes, impede que tal processo promova um barateamento

nas condições de moradia, mudando cada vez mais a paisagem e a população de

residentes do bairro.

A partir desse trabalho investigativo de recuperação da literatura relevante

sobre os processos ocorridos na região do Belém, é possível formular a seguinte

hipótese em relação aos processos aqui discutidos: o processo de verticalização em

bairros que deixaram de ser polos industriais, como o Belém, com o início da

verticalização em meados dos anos 2000, segue a lógica de transformação de

ocupação geográfica do capitalismo e tem por objetivo a especulação imobiliária,

injetando dinheiro em regiões hoje quase estritamente residenciais e impactando a

Page 59: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

50

vida da cidade sem preocupações com a integração democrática e cidadã da

população. Essa hipótese, baseada numa visão crítica do processo de

transformação dos grandes centros urbanos, retira a falsa máscara da beleza da

verticalização, que promete regiões residenciais com aparente tranquilidade para

aqueles que vivem lá. Na realidade, o que observamos é uma reconcentração dos

polos econômicos na cidade, forçando a população a realizar longos deslocamentos

diariamente, suportados pelas novas, porém precárias, infraestruturas de transporte.

Page 60: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

51

BIBLIOGRAFIA

ANDRADE, M. M. D. Bairros além Tamanduateí: O imigrante e a fábrica no Brás, Mooca e

Belenzinho. Tese (Doutorado) - Curso Geografia, Departamento de Geografia, Faculdade de Flosofia,

Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo. São Paulo, p. 277. 1991.

ANDRADE, M. M. D. Brás, Moóca e Belenzinho: "bairros italianos" na São Paulo Além-Tamanduateí.

Revista do Departamento de Geografia da USP, São Paulo, v. 8, p. 97-112, 1994.

ANDRADE, M. M. D. Industrialização, Urbanização e Vida de Bairro na São Paulo Além-Tamanduateí.

In: CARLOS, A. F. A.; OLIVEIRA, A. U. D. O. Geografia de São Paulo - Representação e crise da

Metrópole. São Paulo: Contexto, 2004. p. 171-192.

BARBOSA, L. O. Vilas Operárias Paulistanas: Mudanças e Permanências na Vila Economizadora e

Maria Zélia. Trabalho de Conclusão de Curso - Bacharelado em Geografia, Departamento de

Geografia, Faculdade de Flosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo. São Paulo,

p. 59. 2015.

CARONE, E. Movimento Operário no Brasil (1877 - 1944). São Paulo: Difel, 1979.

DEAN, W. A Industrialização de São Paulo: 1880 - 1945. Tradução de Octavio Mendes Cajado. 4ª. ed.

Rio de Janeiro: Bertrand Brasil S.A., 1991. 269 p.

HARVEY, D. O Novo Imperialismo. São Paulo: Edições Loyola, 2004.

LANGENBUCH, J. R. A Estruturação da Grande São Paulo - Estudo de Geografia Urbana. Tese

(Doutorado) - Curso de Geografia Humana, Faculdade de Filosofia, Ciência e Letras de Rio Claro,

Universidade de Campinas. Rio Claro, p. 564. 1968.

LEFEBVRE, H. Industralização e Urbanização - Noções preliminares. In: LEFEBVRE, H. O direito à

cidade. São Paulo: Ed. Documentos, 1969. p. 3-26.

LENCIONI, S. Reestruturação urbano-industrial do Estado de São Paulo. A região da Metrópole

Desconcentrada. In: SANTOS, M.; SOUZA, M. A. A. D.; SILVEIRA, M. L. TERRITÓRIO Globalização e

Fragmentação. São Paulo: Hucitec, 1998.

NEGRI, B. Concentração e Desconcentração Industrial em São Paulo (1880-1990). Tese (Doutorado) -

Instituto de Economia, Universidade Estadual de Campinas. Campinas, p. 268. 1994.

PADUA, R. F. D. Implicações socioespaciais da desindustrialização e da reestruturação do espaço

em um fragmento da metrópole de São Paulo. Dissertação (Mestrado - Programa de Pós-Graduação

em Geografia Humana) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São

Paulo. São Paulo, p. 159. 2007.

PENTEADO, J. Belenzinho 1910: retratos de uma época. 2ª. ed. São Paulo: Carrenho Editorial /

Narrativa Um, 2003.

PITTA, E. Entrevista concedida à Ricardo Dias Sandoval. São Paulo. 22/07/2017.

Page 61: UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, … · Como morador do bairro do Belém desde 1989, ano de meu nascimento, pude perceber uma grande mudança na dinâmica de sua

52

QUERUBIM, C. Entrevista concedida à Ricardo Dias Sandoval. São Paulo. 30/04/2018.

SANTOS, M. Espaço e método. 5ª Edição. ed. São Paulo: EDUSP, v. 2, 2014.

SOMEKH, N. A cidade vertical e o urbanismo modernizador: São Paulo 1920 - 1939. 1ª. ed. São

Paulo: edusp; Studio Nobel; FAPESP, 1997.

TORRES, M. C. T. M. O Bairro do Brás - Série histórias dos bairros de São Paulo. 2ª. ed. São Paulo:

Departamento de Cultura da Secretaria de Educação e Cultura da Prefeitura Municipal de São Paulo,

1985.

ZAP IMÓVEIS. G1, 2016. Disponivel em: <http://g1.globo.com/especial-

publicitario/zap/imoveis/noticia/2016/04/o-auge-e-queda-do-mercado-imobiliario-em-uma-

decada.html>. Acesso em: 04/05/2018.