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UNIVERSIDADE DE LISBOA INSTITUTO DA EDUCAÇÃO A LITERATURA INFANTIL COMO ESTRATÉGIA DE DESENVOLVIMENTO DA COMPETÊNCIA INTERCULTURAL NA EDUCAÇÃO PRÉ-ESCOLAR Ariana Miriam Silva da Fonseca MESTRADO EM EDUCAÇÃO Área de especialização em Educação Intercultural Dissertação orientada pelas Profª. Doutoras Ana Paula Viana Caetano e Ana Sofia Reis de Castro e Pinho 2018

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UNIVERSIDADE DE LISBOA

INSTITUTO DA EDUCAÇÃO

A LITERATURA INFANTIL COMO ESTRATÉGIA DE

DESENVOLVIMENTO DA COMPETÊNCIA INTERCULTURAL

NA EDUCAÇÃO PRÉ-ESCOLAR

Ariana Miriam Silva da Fonseca

MESTRADO EM EDUCAÇÃO

Área de especialização em Educação Intercultural

Dissertação orientada pelas Profª. Doutoras Ana Paula Viana Caetano e

Ana Sofia Reis de Castro e Pinho

2018

Todos os livros possuem alma. A alma de quem o escreveu, e a alma

dos que o leram, que viveram e sonharam com ele. Cada vez que um

livro muda de mãos, cada vez que alguém desliza o olhar pelas suas

páginas, o seu espírito cresce e torna-se forte.

Carlos Ruiz Zafón

Se és diferente de mim, meu irmão, em vez de me prejudicares, enriqueces-me.

Antoine de Saint-Exúpery

AGRADECIMENTOS

Começo por agradecer à Prof. Dra. Ana Paula Caetano e à Prof. Dra. Ana Sofia

Pinho, pela disponibilidade que sempre revelaram, pela atenção dispensada, pela

exigência, pelas críticas, correções e inúmeras sugestões feitas ao longo do processo de

orientação. Tenho a agradecer-vos por me terem ajudado a crescer quer a nível

académico, quer a nível profissional e pessoal. Obrigada por me acompanharem neste

processo de partilha, reflexão e aprendizagem.

Às crianças do grupo, que deram vida e voz ao projeto, transformando-o num

veículo de emoções, compreensão e conhecimento. E aos seus pais, que colaboraram

ativamente na vida escolar dos filhos quando lhes era solicitado.

À Bela e à Vera, minhas colegas de sala, por me apoiarem nesta etapa, por

assumirem o trabalho e a responsabilidade do grupo em todas as minhas ausências

académicas.

À minha mãe e à minha avó Custódia, simplesmente por serem quem são. Pelo

seu amor, pela sua atenção e presença constante e por estarem sempre prontas a amparar

qualquer tombo.

Ao Vítor, companheiro incontornável, apoio incondicional e porto de abrigo. Por

me apoiar desde o primeiro minuto desta caminhada, por sempre me motivar e acreditar

nas minhas capacidades e ambições, por compreender as minhas ausências em vários

momentos, pelas conversas e gargalhadas reconfortantes que me deram ímpeto para

nunca desistir. Pela presença constante e pela sua visão positiva e revigorante da vida e

de todas as situações, por me encorajar a prosseguir, quando algo me impossibilitava de

avançar. E sobretudo pela garantia que… “no final, a história termina sempre bem”.

RESUMO

As questões ligadas à diversidade cultural constituem cada vez mais um desafio

ao ato educativo. A educação intercultural emerge como uma estratégia diferenciada que

visa a valorização e integração de todas as culturas e a promoção da interação pacífica

entre povos.

A educação pré-escolar constitui um espaço singular para a exploração da

literatura infantil, um veículo para fomentar a perspetiva intercultural, a familiarização

com a diversidade e o contato com o outro.

Esta investigação pretendeu constituir-se como uma metodologia participativa,

em que as vozes das crianças se manifestassem e em que estas fossem perspetivadas como

intervenientes ativos do seu processo de ensino-aprendizagem. Enquadrados numa

dinâmica relacional, a interação entre as crianças, a ação da educadora e a participação

dos pais promoveram experiências e aprendizagens interculturais, realizadas através de

processos dialógicos, reflexivos e fortemente empáticos.

O projeto desenvolveu-se numa sala de jardim de infância, da rede privada, e teve

como finalidade compreender o processo de desenvolvimento da consciência intercultural

de crianças em idade pré-escolar, através do trabalho pedagógico com narrativas

multiculturais. O estudo é composto por duas partes, a primeira concerne à dimensão

teórica que integra a educação intercultural na educação pré-escolar, através de dinâmicas

participativas e utilizando a literatura infantil como estratégia para a promoção de

competências no domínio da interculturalidade. A segunda corresponde à componente

empírica da investigação-ação, recorrendo à recolha de dados através de observação

participante e notas de campo.

Os dados recolhidos revelaram como se constituiu o processo contínuo de

aprendizagem, através do qual as crianças se apropriaram do trabalho educativo com as

narrativas, para alicerçarem aprendizagens significativas e desenvolverem competência

intercultural.

Palavras-Chave: Educação Intercultural; Educação Pré-Escolar; Competência

Intercultural; Literatura Infantil; Participação.

i

ABSTRACT

The issues of cultural diversity, are an increasing challenge to the educational

action. Intercultural education emerges as a differentiated strategy aimed at enhancing

and integrating all cultures and promoting the peaceful interaction among peoples.

Pre-school education is a unique space for exploring children's literature, which

constitutes a vehicle for fostering an intercultural perspective, familiarity with diversity

and contact with others.

This research was conceived as a participatory methodology, in which the

children's voices were heard and in which children were seen as active participants in

their teaching-learning process. Based on relational dynamics, the interaction between the

children, the educator's action and the parents' participation, promoted intercultural

experiences and learning, carried out through dialogic, reflexive and strongly empathic

processes.

The project was developed with a kindergarten class of the private school

network and aimed to understand the process of developing intercultural awareness in

pre-school children, through pedagogical work with multicultural narratives. The study

is composed of two parts, the first one concerns the theoretical dimension that integrates

intercultural education in pre-school education, through participatory dynamics and using

children's literature as a strategy to promote competences in the field of interculturality.

The second corresponds to the empirical component of action research, using data

collection through participant observation and field notes.

The collected data revealed how the continuous learning process was developed,

whereby children used the educational work with narratives, to build meaningful learning

experiences and develop intercultural competence.

Key-words: Intercultural Education; Preschool Education; Intercultural Competence;

Children’s Literature; Participation.

ii

ÍNDICE GERAL

Agradecimentos

Resumo

Abstract

Índice de Figuras

Índice de Gráficos

Índice de Quadros

Índice de Anexos (Anexos em CD ROM)

Lista de Siglas Usadas

Introdução

Parte I: Fundamentação Teórica da Investigação

1. A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

1.1.A importância da Educação Pré-Escolar no quadro de uma educação

para a cidadania

1.2.A Educação Intercultural

1.2.1. Conceções e finalidades

1.2.2. Abordagens educativas

1.2.3. Competência(s) intercultural(ais)

1.3.A Educação Intercultural em Portugal: das linhas orientadoras às

Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar

2. Os projetos participativos

2.1. A pedagogia em participação: o papel da criança e do educador

2.2. O trabalho de projeto e a relação escola-família

3. A literatura infantil

3.1. A importância da literatura infantil na Educação Pré-Escolar

3.2. A promoção da Educação Intercultural através da literatura infantil:

A utilização pedagógica de materiais literários numa perspetiva intercultural

Síntese

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Parte II: Estudo empírico

4. Metodologia de Investigação

4.1. Problemática da investigação: questões e objetivos do estudo

4.2. Introdução à investigação-ação: características e finalidades

4.3. Modalidades e modelos da investigação-ação

4.4. Técnicas de investigação associadas à investigação-ação

4.5. Técnicas e instrumentos de recolha de dados

4.5.1. Observação direta

4.5.1.1.Observação participante

4.5.1.2. Notas de campo

4.5.1.3. Produções das crianças

4.5.2. Meios audiovisuais

5. Contexto e Participantes do Estudo

5.1. Caracterização do Colégio Missão

5.1.1. Localização e meio envolvente

5.1.2. Princípios educativos

5.1.3. Instalações

5.1.4. Recursos humanos

5.1.5. Organização institucional

5.2.O grupo de crianças

5.2.1. Contexto sociofamiliar

5.2.2. Caracterização do grupo

5.2.3. O espaço educativo - sala dos 4 anos

5.2.4. Rotina diária

6. Plano e desenvolvimento da intervenção pedagógica

7. Análise e interpretação de dados

Considerações finais

Referências Bibliográficas

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ÍNDICE DE FIGURAS

Figura 1 - Modelo de competência intercultural de Deardorff

Figura 2 - Modelo de competência intercultural de Byram

Figura 3 - Organização das Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar

Figura 4 - Áreas de Aprendizagem da Pedagogia em Participação

Figura 5 - Ciclo da Investigação-Ação

Figura 6 - Modelo de Investigação-Ação de Lewin

Figura 7 - Modelo de Investigação-Ação de Kemmis

Figura 8 - Organograma do Colégio “Missão”

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ÍNDICE DE GRÁFICOS

Gráfico 1 - Nível socioeconómico das famílias

Gráfico 2 - Habilitações académicas dos pais

Gráfico 3 - Número de filhos por casal

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ÍNDICE DE QUADROS

Quadro 1 - Tipos de Investigação-Ação e as suas características

Quadro 2 - Técnicas de Investigação Associadas à Investigação-Ação

Quadro 3 - Dados sociofamiliares do grupo

Quadro 4 - Constituição do grupo

Quadro 5 - Rotinas diárias

Quadro 6 - Organização Geral dos Blocos de Intervenção

Quadro 7 - Organização do Bloco de Intervenção A

Quadro 8 - Trabalho de Projeto A

Quadro 9 - Organização do Bloco de Intervenção B

Quadro 10 - Trabalho de Projeto B

Quadro 11 - Canção ‘Jan Pierewiet’ (versão original e versão traduzida)

Quadro 12 - Organização do Bloco de Intervenção C

Quadro 13 - Trabalho de projeto C

Quadro 14 - Registo das conclusões: Experiência dos ovos

Quadro 15 - Organização do Bloco de Intervenção D

Quadro 16 - Trabalho de projeto D

Quadro 17 - Organização do Bloco de Intervenção E

Quadro 18 - Registo das conclusões: Experiência das maçãs

Quadro 19 - Trabalho de projeto E

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ÍNDICE DE ANEXOS

Anexo 1 - Histórias utilizadas no projeto de intervenção

Anexo 2 - Organização curricular por histórias

Anexo 3 - Trabalhos realizados pelas crianças no âmbito do projeto

Anexo 4 - Termo de consentimento enviado aos encarregados de educação

Anexo 5 - Planta da sala dos 4 anos

Anexo 6 - Notas de campo

viii

LISTA DE SIGLAS USADAS

CCI - Competência de Comunicação Intercultural

DGE - Direção Geral da Educação

I-A - Investigação-Ação

NC - Notas de Campo

OCDE - Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico

OCEPE - Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar

ix

1

INTRODUÇÃO

Atualmente o mundo heterogéneo em que vivemos, experiencia processos de

transformação a todos os níveis - cultural, social, político e religioso. Este contexto

multicultural salienta a necessidade de processos de transformação, compreensão e

comunicação, que promovam o diálogo intercultural e valorizem a diversidade.

A interculturalidade sustenta uma estratégia dinâmica de correlação entre pessoas

e culturas (Vilar, 2009; Oliveira e Sequeira, 2012). Perspetiva uma componente de

mudança na educação, que como base do processo educativo, deve fazer refletir sobre a

sociedade atual. Assim, a escola assume uma função integradora que promove a

convivência com a diversidade, o conhecimento do outro e a igualdade de oportunidades.

É imperativo que o processo educativo contribua para o desenvolvimento de uma

sociedade democrática, reconhecendo e aceitando a individualidade de cada um, criando

espaços dialógicos e de interação, onde todos possam participar, ser ouvidos e ter voz. A

Lei de Bases do Sistema Educativo contempla a educação pré-escolar como um espaço

de promoção do desenvolvimento integral do indivíduo, tendo como base a educação para

a cidadania, numa perspetiva de consciencialização do outro, através de experiências de

natureza intercultural que possibilitem a compreensão de diferentes culturas (Silva et al,

2016). O jardim de infância emerge assim como um espaço de inserção social, onde as

crianças são estimuladas a desenvolver competências e valores inerentes à vida em

sociedade.

De acordo com as “Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar”, este

nível de ensino “é um preditor de sucesso na escolaridade e na qualidade de vida dos

jovens e dos adultos”, tal como relata Costa (2016:4) no preâmbulo do documento. A

ação educativa é centrada numa perspetiva globalizante, onde se integram a

intencionalidade educativa, a organização do ambiente educativo e as áreas de conteúdo

preconizadas para o pré-escolar. Sabendo que através da participação na vida do grupo,

as crianças vão constituir-se como “sujeito[s] e agente[s] do processo educativo” (Silva

et al, 2016:31), o trabalho cooperativo entre crianças e adultos contribuiu para o

desenvolvimento das relações interpessoais, pois ambas as partes se envolveram

mutuamente, influenciando-se. Em contexto de grupo, os princípios democráticos

contribuem para a compreensão do respeito mútuo e da importância do diálogo (Conselho

da Europa, 2008), promovendo a adaptação do ensino, às transformações patentes nas

sociedades. Deste modo, o desenvolvimento da competência intercultural vai permitir

interações sociais adequadas e harmoniosas nos vários contextos de diversidade

(Deardorff, 2006; Spitzberg e Changnon, 2009), fomentando experiências de alteridade,

consciencialização cultural e competências no domínio da cidadania (Ramos, 2007).

Sabendo que as histórias enredam formas de expressão e comunicação, estas vão

constituir-se como um dispositivo pedagógico (Stoer e Cortesão, 1996), para que a

criança descubra o mundo envolvente e usufrua de um contacto precoce com a

diversidade, que lhe vai permitir reconhecer e valorizar o outro (Leite e Rodrigues, 2000;

Balça 2003). Assim, as histórias constituem-se como um veículo incontornável para

fomentar a educação intercultural (Dolan, 2014).

O estudo relaciona-se com o projeto ‘ConverCidade - Convergir na diversidade:

participação das crianças e jovens na Cidade’, do Instituto da Educação da Universidade

de Lisboa. A investigação pautou-se numa componente participativa, que focou o grupo

como entidade social e cooperativa, sendo o processo acompanhado pela

educadora/investigadora.

Constitui uma investigação-ação, que pretende compreender como se processam

as dinâmicas que levam ao desenvolvimento da consciência e competência intercultural

em crianças do pré-escolar. Utilizando como estratégia, narrativas infantis, pretendeu-se

fomentar hábitos de reflexão conjunta, através da ação participada das crianças no seu

processo de ensino-aprendizagem.

Esta investigação encontra-se organizada em duas partes: a fundamentação teórica

da investigação e o estudo empírico. A primeira parte está dividida em três capítulos. No

capítulo 1 descrevem-se os quadros teóricos que sustentam a educação intercultural e a

educação pré-escolar, assim como a relação entre ambas, no quadro de uma educação

para a cidadania. São ainda referenciadas as dimensões necessárias para o

desenvolvimento da competência intercultural. No capítulo 2, são descritos os projetos

participativos nos quais se envolveram os diferentes agentes educativos: crianças,

educadora e famílias. No capítulo 3 é evidenciada a importância da literatura infantil no

pré-escolar, assim como a promoção da educação intercultural através das narrativas.

A segunda parte é constituída por quatro capítulos. Inicia-se com o capítulo 4,

onde são apresentadas as questões e objetivos do estudo, a descrição da metodologia de

investigação, o tipo de estudo realizado e os procedimentos de recolha de dados -

observação participante com recurso a notas de campo. Prossegue com o capítulo 5, onde

é caracterizado o contexto onde a investigação teve lugar, assim como os participantes

desta. No capítulo 6, encontra-se enquadrado o plano de intervenção pedagógica, assim

2

como uma descrição detalhada das dinâmicas realizadas. Engloba ainda o capítulo 7, em

que são analisados e interpretados os dados, de acordo com os objetivos da investigação.

Seguem-se as considerações finais, onde se apresenta uma análise reflexiva do processo

e as conclusões.

Por fim, as referências bibliográficas, assim como alguns anexos considerados

pertinentes para a investigação. Todos os anexos encontram-se em suporte informático.

3

PARTE I

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

4

Capítulo 1 - A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

_____________________________________________________________________

5

CAPÍTULO 1

A EDUCAÇÃO PRÉ-ESCOLAR E A EDUCAÇÃO INTERCULTURAL

“A educação deve visar a plena expansão da personalidade humana e o reforço dos direitos do

Homem e das liberdades fundamentais e deve favorecer a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas

as nações e todos os grupos raciais ou religiosos bem como o desenvolvimento das atividades das Nações

Unidas para a manutenção da paz” (Declaração Universal dos Direitos Humanos, Artigo 26º, 1948).

Ao longo do século XX, a educação de infância em Portugal foi-se desenvolvendo

de acordo com as políticas económicas, sociais e culturais. O primeiro jardim de infância

foi fundado em Lisboa em 1882. Entre 1910 e 1926 criou-se o ensino infantil oficial,

destinado a crianças entre os 4 e os 7 anos e realizaram-se as primeiras formações de

professores especializados em educação infantil. A educação infantil teve uma fraca

expansão, sendo extinta em 1926, o que levou ao desenvolvimento de uma rede de

educação pré-escolar privada.

Nos anos de 1970, criou-se um sistema público de educação pré-escolar e foi

decretado o Estatuto dos Jardins de Infância. Assim, emergiu de forma progressiva uma

rede pública de educação pré-escolar e, com ela, a necessidade de desenvolver linhas

orientadoras para os jardins de infância públicos, que inicialmente eram orientados por

guias curriculares (Vasconcelos, 2012).

Foi em 1997 que o Ministério da Educação aprovou o documento denominado

“Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar” (OCEPE), através de um projeto

de construção participada, documento esse revisto em 2016. Segundo Silva, Marques,

Mata e Rosa (2016), a faixa etária compreendida entre os 3 e os 6 anos de idade é de suma

importância para o desenvolvimento de aprendizagens fundamentais e para fomentar

atitudes e valores que sejam a base de futuras aprendizagens. Assim, a educação pré-

escolar é o primeiro patamar educativo que a criança integra, já que estes anos são

“decisivos na sedimentação de valores e atitudes e na construção de um processo

identitário eivado de respeito pelo outro” (Silva, Araújo, Luís, Rodrigues, Alves &

Tavares, 2005:5). Deste modo, sendo a primeira etapa da educação básica, a educação

pré-escolar torna-se “alicerce e suporte de uma educação ao longo da vida” (Vasconcelos,

1999:101).

Segundo Sacristán (2003), a educação tem uma função aglutinadora e

socializadora, cabendo-lhe o papel de propor um projeto partilhado por todos, que crie

Capítulo 1 - A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

_____________________________________________________________________

6

vínculos sociais e culturais, respeitando as especificidades de cada sujeito, através de

práticas educativas diversificadas, diferenciadas e integradoras. Assim, as políticas

educativas devem dar resposta à crescente diversidade cultural, tendo como foco o

princípio da igualdade de oportunidades no ensino, sendo que este deve:

Estimular o interesse ativo ‘pelos outros’ que provêm ou pertencem a culturas diferentes,

próximas ou mais distantes, analisando o que partilhamos com eles e o que, dada a sua

especificidade, enriquece a diversidade da humanidade (…). A procura de igualdade deve ser

um referente essencial de toda e qualquer política educativa, e de todas as práticas

pedagógicas, tendo em conta a igualdade com base nos parâmetros culturais, de género,

classe social, etc. (Sacristán, 2003:391).

O reconhecimento desta heterogeneidade quer social, quer cultural, implica que

esta diversidade se manifeste na educação, que detém “a major role to play in promoting

social cohesion and peaceful coexistence”, de acordo com a Unesco (2006:8). Segundo o

Relatório Mundial da Unesco (2009), os contatos interculturais dão lugar a novas formas

de diversidade cultural e práticas linguísticas.

Desse modo, contrariamente a procurar-se preservar a identidade em todas as suas formas,

deveria instar-se pela conceção de novas estratégias que levem em conta essas mudanças e

permitam ao mesmo tempo que as populações vulneráveis respondam mais eficazmente à

mudança cultural (p.6).

A diversidade cultural é reconhecida pela Unesco (2006, 2009) como uma

característica inerente à humanidade, um património comum, fonte de um mundo mais

rico e diversificado, que vai alargar as escolhas e fortalecer as capacidades e os valores

da humanidade. Deste modo, a necessidade de aceitação da diferença tornou-se uma

prioridade na educação. O reconhecimento da diversidade cultural é cada vez mais

necessário, assim como o desenvolvimento de estratégias que promovam a aceitação do

Outro, através de interações cooperativas. Leite e Rodrigues (2001) advogam que estas

questões devem assumir interesse particular na educação formal, pois vão requerer a

participação ativa das crianças na defesa dos direitos humanos, evitando a assimilação de

estereótipos.

É neste campo que a educação pré-escolar vai assumir um papel fundamental no

desenvolvimento pessoal e social das crianças. Assim, é essencial que, nas primeiras

etapas da educação, as crianças se familiarizem com conceitos importantes, que as vão

ajudar a desenvolver as competências necessárias para se relacionarem com os seus pares,

numa dimensão de respeito e complementaridade, “independentemente da presença ou

Capítulo 1 - A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

_____________________________________________________________________

7

não da diversidade étnica ou cultural na sala ou instituição, porque o objetivo é formar

cidadãos para uma sociedade aberta e plural” (Borges e Silva, 2000: 2).

1.1. A importância da Educação Pré-Escolar no quadro de uma educação para a

cidadania

Para Oliveira e Sequeira (2012), a educação é uma ação orientada de forma direta

ou indireta, por valores socialmente enquadrados, de forma a influenciar cada individuo.

A tarefa da educação é a de preparar os indivíduos para entrar na sociedade.

Em Portugal, na sequência dos princípios definidos na Lei de Bases do Sistema

Educativo, de acordo com a Lei-Quadro (Lei n.º 5/97, de 10 de fevereiro), a educação

pré-escolar tem como objetivos: (i) promover o desenvolvimento pessoal e social da

criança com base em experiências de vida democrática numa perspetiva de educação para

a cidadania; (ii) fomentar a inserção da criança em grupos sociais diversos, no respeito

pela pluralidade das culturas, favorecendo uma progressiva consciência do seu papel

como membro da sociedade; (iii) contribuir para a igualdade de oportunidades no acesso

à escola e para o sucesso da aprendizagem. De acordo como o mesmo documento, a

educação pré-escolar estabelece como princípio geral que é “a primeira etapa da educação

básica no processo de educação ao longo da vida (…) favorecendo a formação e o

desenvolvimento equilibrado da criança, tendo em vista a sua plena inserção na sociedade

como ser autónomo, livre e solidário” (p.670).

Atualmente, o sistema educativo tem vindo a reconhecer a importância da educação

pré-escolar como um espaço de aprendizagem fundamental na vida das crianças,

assumindo-se claramente que esta é um preditor de sucesso na escolaridade e na qualidade

de vida. Estas ideias mostram estar em conformidade com os princípios gerais e os

objetivos mencionados na Lei de Bases do Sistema Educativo (Lei n.º 103/III/90), tais

como:

Hoje em dia ninguém questiona a importância e o papel da educação da infância no

desenvolvimento e aprendizagem das crianças e no contributo para o seu sucesso escolar

futuro. A preparação de uma transição sem ruturas entre o nível pré-escolar e a escolaridade

básica, com a criação de condições favoráveis para uma igualdade de oportunidades, leva à

sua inclusão como uma primeira e fundamental etapa da educação (1990: 7).

Capítulo 1 - A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

_____________________________________________________________________

8

Oliveira-Formosinho, Formosinho, Lino e Niza (2013) esclarecem a importância do

ensino pré-escolar, pois é através deste que as crianças vão desenvolver competências,

interiorizar normas e valores inerentes à vida em sociedade, promovendo atitudes

essenciais à sua inserção social, quer na escola na escola, quer na vida. As OCEPE

instituem que “este período é crítico para o desenvolvimento de aprendizagens

fundamentais, bem como para o desenvolvimento de atitudes e valores estruturantes para

aprendizagens futuras” (2016:4).

Vasconcelos (2007), defende que o jardim de infância, como organização social

participada que é, deve proporcionar às crianças as suas primeiras experiências, ao nível

da vida democrática. Só desta forma, a criança vai deixar de ter uma visão centrada em

si, para ser parte de um do grupo, aprendendo a trabalhar de forma cooperativa,

desenvolvendo a sua autonomia. Silva et al (2005) explicam que nesta fase o processo de

aprendizagem social das crianças é desencadeado aquando da integração num grupo

social mais alargado, com características diferenciadas da família nuclear.

Deste modo, a educação para a cidadania fomenta nas crianças atitudes e valores

alusivos à aceitação/respeito pelas diferenças, à interiorização de regras de convivência

social e de comportamentos e valores fundamentais à vida em sociedade, sendo “a escola

um locus fundamental de educação para a cidadania”, segundo Vasconcelos (2007: 111).

Assim, esta área contribui para o processo de desenvolvimento de componentes como a

identidade, a autoestima, a autonomia, a consciencialização de si e a aceitação das

perspetivas dos outros, imprescindíveis à cidadania e à vida em sociedade. Encerra as

conceções referidas anteriormente, tais como: educação para os valores e reconhecimento

e aceitação das características individuais.

De acordo com a Direção-Geral da Educação (DGE) (2013:2-6), a educação para a

cidadania compreende várias dimensões, sendo elas:

(i) Educação Rodoviária - Um processo formativo que tem como objetivo

fomentar “comportamentos cívicos e mudar hábitos sociais, de forma

a reduzir a sinistralidade rodoviária”.

(ii) Educação para o Desenvolvimento - Pretende desencadear processos

de consciencialização para as disparidades locais/mundiais num

contexto de globalização. Pretende promover o desenvolvimento

sustentável.

Capítulo 1 - A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

_____________________________________________________________________

9

(iii) Educação para a Igualdade de Género - De acordo com Cardona

(2015), a distinção de género vai derivar primeiramente das

construções sociais e das especificidades de cada cultura, pois estas

variam no espaço e no tempo e são sujeitas a readaptações de acordo

vários fatores. Pode-se inferir que “o género deve ser encarado como

um dos princípios organizadores da construção do percurso individual

de cada cidadã ou cidadão, na formação das respetivas competências

para o exercício pleno da cidadania” (Cardona et al, 2015: 18). Assim,

é categórico falar de género quando se fala de cidadania.

(iv) Educação Financeira - Possibilita aos jovens a aprendizagem de

competências essenciais na área das finanças pessoais, consumo e

contextos financeiros.

(v) Educação para a Segurança e Defesa Nacional - Visa demonstrar o

contributo “dos órgãos e estruturas de defesa para a afirmação e

preservação dos direitos e liberdades civis, bem como a natureza e

finalidades da sua atividade em tempo de paz”. Pretende ainda

consciencializar para a importância do património cultural e para a

“tradição universal de interdependência e solidariedade entre os povos

do Mundo.”

(vi) Educação Ambiental/Desenvolvimento Sustentável - pretende

desenvolver processos de promoção da conservação ambiental,

“promoção de valores, de mudança de atitudes e de comportamentos

face ao ambiente, de forma a preparar os alunos para o exercício de

uma cidadania consciente, dinâmica e informada face às problemáticas

ambientais atuais.”

(vii) Educação para a Saúde/Sexualidade - Mobiliza conhecimentos nas

crianças/jovens, para fomentar atitudes e valores que os remetam para

decisões adequadas à sua “saúde, bem-estar físico, social e mental”.

(viii) Educação para o Empreendedorismo - Visa a edificação de

conhecimentos que fomentem o desenvolvimento da capacidade de

mudança iniciativa e inovação.

(ix) Educação do Consumidor - Faculta informação no sentido de sustentar

as ações que contribuem para comportamentos “solidários e

Capítulo 1 - A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

_____________________________________________________________________

10

responsáveis do aluno enquanto consumidor (…) face ao

desenvolvimento sustentável e ao bem comum.”

(x) Educação Intercultural - Difunde o reconhecimento e a valorização da

diversidade cultural como “fonte de aprendizagem para todos, no

respeito pela multiculturalidade das sociedades atuais. Pretende-se

desenvolver a capacidade de comunicar e incentivar a interação social,

criadora de identidades e de sentido de pertença comum à

humanidade.”

(xi) Educação para os Media - Incentiva as crianças/jovens a utilizar as

tecnologias de informação e comunicação, como forma de

conhecimento e incentivando atitudes de uma utilização cuidadosa da

internet.

(xii) Promoção do Voluntariado - Visa envolver as crianças/jovens nesta

prática de forma precoce e ativa para fomentar a promoção da coesão

social.

(xiii) Dimensão Europeia da Educação - fomenta o envolvimento dos alunos

em projetos de âmbito europeu, visando a promoção da identidade

europeia.

Estas dimensões são transversais aos vários níveis de ensino, sendo adaptadas a cada

um deles através de estratégias delineadas para o efeito. No entanto, é notório que as

OCEPE (2016) cruzam algumas destas dimensões, promovendo e fomentado, nas áreas

de conteúdo, comportamentos, atitudes e valores compatíveis com os mencionados nas

linhas orientadoras da DGE.

O sistema educativo é por isso, um elemento fundamental na promoção da

educação para a cidadania e para a formação de futuros cidadãos:

que participem ativamente e de modo crítico na construção de uma sociedade mais justa e

solidária, colocando como valores fundamentais a democracia, os direitos humanos, a

tolerância, ...e a escola é reconhecida como um local de aprendizagem e convivência social

(…) um espaço democrático de cidadania, um espaço relacional, de convívio, de cooperação

e de resolução de conflitos” (Araújo, 2008: 89).

Assim, assume-se a educação para a cidadania como o espaço onde serão promovidas

situações de valorização pessoal e de respeito mútuo, fomentando uma educação

orientada para princípios democráticos. De acordo com as ideias de Leite e Rodrigues

(2001), a educação para a cidadania promove interações em contextos comuns, sendo a

Capítulo 1 - A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

_____________________________________________________________________

11

instituição escolar um dos vários locais onde essas interações podem ter lugar. As autoras

defendem que “os valores vivem-se. Não se adquirem através de conceitos abstratos”

(p.35).

A publicação “Global Citizenship Education”, da Unesco (2014), refere que a

educação para a cidadania global destaca as funções essenciais da educação,

especialmente aquelas que se relacionam com a formação da cidadania, relacionando-a

com a globalização. Deste modo:

It is directly related to the civic, social and political socialization function of education, and

ultimately to the contribution of education in preparing children and young people to deal

with the challenges of today’s increasingly interconnected and interdependent world. There

are also overlapping and mutually reinforcing objectives, approaches and learning outcomes

with these and other education programmes, such as intercultural education (…) (p.15).

O documento estabelece três objetivos principais: (i) educar os alunos para a

cidadania e direitos humanos, através da compreensão dos princípios fundamentais da sua

constituição; (ii) ser capaz de exercer o chamado sentido crítico; (iii) adquirir um sentido

de individualidade e de responsabilidades comunitárias.

Uma educação para a cidadania pressupõe a vivência de situações que promovam

uma participação ativa na escola, na relação com os pares e com a família. Este ponto de

vista é defendido por Leite, Fernandes e Silva (2013:36), que afirmam que:

a educação para a cidadania não se pode limitar, de modo algum, à aquisição de uma

informação e que, ao contrário, tem de passar pela vivência de situações onde ocorram o

debate e a consciencialização da vivência da condição humana e social.

Assim, a educação para a cidadania baseia-se numa educação para o respeito, a

escolha e a autonomia e constitui:

Uma plataforma de mediação, com propriedades de inspiração de novas práticas e

envolvimentos que assentam num diálogo entre sujeitos educativos e o coletivo social. (…)

Desenvolve novas competências essenciais na complexidade do mundo contemporâneo,

ensinando o indivíduo a posicionar-se perante um problema, fazer escolhas e tomar uma

decisão (Leite, Fernandes e Silva, 2013:39-40).

Araújo (2008) defende a cidadania como um direito social, como um estatuto de

universal de igualdade para todos, pois todos são considerados cidadãos iguais, com os

mesmos direitos e deveres. Afirma também que é no contexto atual, onde surgem

propostas de uma educação multicultural, que devemos dar espaço às diferenças culturais

Capítulo 1 - A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

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no espaço escolar, para que possamos edificar uma cidadania fundamentada na

democracia participativa. Mas para que tal mudança possa ocorrer de forma efetiva, as

escolas necessitam de um esforço educativo premeditado e constante, ao longo da vida

escolar dos alunos, para que todos possam participar na vida da sociedade.

O Conselho da Europa (2008) institui que a educação para uma cidadania democrática

é imperativa para que o pleno funcionamento de uma sociedade justa, tolerante, livre,

inclusiva, com compreensão recíproca, solidariedade, coesão social, diálogo intercultural

e igualdade de todos. Reforça a importância da educação, como veículo que permite ao

indivíduo tornar-se num cidadão responsável e respeitador dos outros, através de

abordagens pluridisciplinares que fomentem a aquisição de um rol de comportamentos e

competências, tais como a capacidade de reflexão e autocrítica, necessárias para viver

numa sociedade onde se evidencia a diversidade cultural. Então, educar para a cidadania

engloba a criação de oportunidades para desenvolver autoestima, autoconhecimento,

conhecimento e respeito pelo ‘outro’ nos alunos (Araújo, 2008: 92).

Desta forma, o objetivo da educação para a cidadania é a participação responsável

e consciente dos cidadãos na vida coletiva. Para que tal seja possível, os sujeitos têm que

deter um conjunto de conhecimentos, competências e capacidades de intervenção, que a

escola deve desenvolver ao longo de todo o percurso escolar. A educação escolar:

tem assim uma grande responsabilidade no desenvolvimento dessas competências e

capacidades cívicas através dos procedimentos da prática da vida escolar, com recurso a

metodologias activas e da intervenção não apenas ao nível do currículo explícito, mas

também ao nível do currículo oculto (…) (Araújo, 2008: 89).

Para compreender o papel da educação pré-escolar e a sua articulação com a educação

para a cidadania, deve explicitar-se que a grande finalidade da Educação Pré-escolar é o

desenvolvimento pessoal e social da criança, num quadro de cidadania democrática,

“assegurando uma formação efetiva que propicie o conhecimento profundo do

desenvolvimento da criança e dos modos de a integrar e fazer aprender os valores da

democracia” (Marchão e Henriques, 2015:83).

As OCEPE (2016) enfatizam particularmente a educação para a cidadania, ao nível

da organização do ambiente educativo, afirmando que o quotidiano do jardim de infância

deve estar organizado para promover o respeito por outras culturas, vivências

democráticas, dinâmicas de participação e de equidade, para promover processos de

igualdade cultural e de género. Cardona et al (2015) afirmam igualmente que na educação

Capítulo 1 - A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

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pré-escolar devem criar-se espaços educativos facilitadores, que se relacionem com a

participação democrática do grupo, para que todos participem nas tarefas e decisões a

tomar, pois “para aprender a ser pessoa a criança precisa de estar integrada em contextos

que respondam às suas necessidades e também interesses” (Marchão & Bento, 2012: 12).

A organização do grupo vai permitir a explicitação e aceitação dos diferentes pontos

de vista, dando à criança a oportunidade de se expressar, de escolher e decidir. Esta

estratégia irá inevitavelmente favorecer a discussão de diferentes pontos de vista e a

resolução conjunta do problema, para que as crianças comecem, assim, a usufruir de

experiências de vida democráticas, através do “questionamento das atitudes e situações

observadas ou vividas em grupo – oportunidades que não poderão ser negligenciadas

quando se pretende educar para ‘viver juntos e viver com os outros’ (…) para descobrir

o que existe de comum e, só a partir daí, o que existe de diverso” (Leite e Rodrigues,

2001:28). Deste modo, as dinâmicas de interação com adultos e crianças levam a criança

a interiorizar valores e a consciencializar-se de si e dos outros, num processo de educação

para os valores e para uma vivência democrática. O jardim de infância é, desta forma, um

contexto favorável à “tomada de consciência de perspetivas e valores diferentes, que

facilitam a compreensão do ponto de vista do outro e promovem atitudes de tolerância,

compreensão e respeito pela diferença” (Silva et al, 2016:39).

Desde tenra idade, as crianças devem mover-se num ambiente escolar/educativo que

fomente boas práticas de cidadania ativa e democrática. O jardim de infância deve

assumir-se como um espaço de cooperação, partilha e respeito pela diversidade, opondo-

se a qualquer tipo de discriminação, para que cada criança cresça superando estereótipos

e preconceitos. De acordo com o Guião de Educação, Género e Cidadania: Pré-Escolar

(2015:8):

uma cidadania ativa numa sociedade cada vez mais plural implica a aceitação do valor da

igualdade dos direitos e dos deveres para todos e todas, implica um compromisso genuíno

com a sociedade na sua diversidade, o respeito crítico pelas culturas, crenças, religiões etc.,

e implica também abertura à solidariedade pela diferença (…).

O jardim de infância é um espaço de vivências precoces de cidadania e vai assumir-

se como um contexto educativo para a aprendizagem e o exercício da cidadania:

(…) formando as crianças a nível pessoal e social, educando o seu sentido ético e estético,

prepara-as para uma efetiva prática de cidadania: aprendem a importância do respeito, como

é difícil negociar diferentes pontos de vista mantendo a amizade, aprendem acerca da

diversidade e da igualdade de oportunidades, da paridade entre os sexos, da diversidade de

Capítulo 1 - A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

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culturas, da importância de cuidar do ambiente e da saúde, interiorizando um sentido de

responsabilidade social. (Vasconcelos, 2007:113)

Espera-se, portanto, que o jardim de infância eduque as crianças no sentido de as

preparar para uma prática de cidadania baseada na compreensão do Outro e de pontos de

vista diferentes do seu.

Segundo Fontoura (2005), a formação da identidade social vai requerer um

reconhecimento positivo dos traços fundamentais dos sujeitos, assumindo que a

diversidade cultural destes - se aplicada e rentabilizada nesse sentido - vai promover uma

educação multicultural. A autora advoga também que a escola e a aprendizagem escolar

ocupam um lugar chave nas relações sociais e no processo de construção identitário, pela

“relação que estabelecem com o outro, quer pela formação em si mesmo que se vai

construindo nessa relação e na experimentação das suas capacidades e competências

como ator, entre êxitos e fracassos” (Ibidem, p.52).

Na Constituição da República Portuguesa (2005:17), artigo 73º, assume-se nos

“Direitos e Deveres Culturais” que se pretende que a educação escolar:

contribua para a igualdade de oportunidades, a superação das desigualdades económicas,

sociais e culturais, o desenvolvimento da personalidade e do espírito de tolerância, de

compreensão mútua, de solidariedade e de responsabilidade, para o progresso social e para a

participação democrática na vida coletiva.

Então, a resposta a uma sociedade eminentemente multicultural e a uma educação

para todos reside no conceito de cidadania, sendo a escola um local de “aprendizagem da

igualdade de todos os alunos, quaisquer que sejam as suas origens e as suas religiões”

(Ferreira, 2003:51).

Assim, a educação pré-escolar é o primeiro local de contato social, um lugar

privilegiado da relação social e por isso promotora da cidadania e da consciência cívica.

Desta forma, a participação ativa dos sujeitos é essencial para que desenvolvam

competências, no âmbito de uma educação para a cidadania. Esta perspetiva está acordo

com Zêzere (2003), que estabelece que o percurso escolar só faz sentido se for um

instrumento promotor do desenvolvimento pessoal e social e um veículo facilitador da

inserção social, promovendo sentimentos de competência, de eficácia, de bem-estar e a

melhoria da qualidade de vida.

De acordo com as ideias de Cardoso (1998:100), “não há educação para a cidadania

que não seja educação intercultural”. Preconiza ainda que ambas:

Capítulo 1 - A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

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15

passam sobretudo pelo desenvolvimento e interiorização, em liberdade de consciência, de

atitudes e valores democráticos. Estas aprendizagens são promovidas, principalmente,

através da forma como é organizado o processo educativo, do papel que nele é reservado aos

alunos e das experiências que lhes são proporcionadas. Os conteúdos, intencionais e

criteriosamente selecionados, devem suscitar aprendizagens dinâmicas promotoras de

valores e atitudes essenciais para o exercício futuro de cidadanias em contextos cada vez mais

interculturais” (Ibidem).

O autor afirma que a educação para a cidadania visa estimular as interações, a

compreensão mútua e o respeito entre os alunos de variadas origens, mas visa

particularmente preparar os futuros cidadãos na promoção da justiça social e na

eliminação da exclusão em todas as suas formas. Pretende, por isso, contribuir para a

igualdade de oportunidades na sociedade, iniciando-a no domínio da educação. Desta

forma, é notório que a educação para a cidadania e a educação intercultural estão

profundamente relacionadas, e pode-se afirmar que a educação intercultural é uma

resposta pedagógica para preparar futuros cidadãos, “tendo em vista o seu

desenvolvimento numa sociedade pluralista e culturalmente diversificada” (Araújo,

2008:72). Assim, em Portugal, espera-se que quer a educação, quer a cultura

desempenhem um papel vital na construção e também na manutenção de uma sociedade

democrática (Stoer e Araújo, 2000).

Deste modo, para uma educação que prepare os indivíduos para o mundo globalizado

em que vivemos, Byram (2008) defende a importância da reflexão e das interações

sociais, essenciais no processo educativo, para uma educação para a cidadania

intercultural. Esta perspetiva pretende ‘transformar’ o indivíduo, promovendo o

conhecimento do Outro e da sua cultura, habilitando-o para reconhecer e respeitar as

especificidades de outros grupos ou culturas. Este processo implica uma capacidade de

descentração e a consciencialização de outras realidades culturais, com outras crenças e

valores. Pretende-se ajudar os sujeitos a pensar, agir e comunicar interculturalmente.

Assim, os intervenientes educativos devem desenvolver estratégias e atitudes que

fomentem o desenvolvimento da competência intercultural. Estes aspetos interculturais

serão abordados nos subcapítulos subsequentes.

Capítulo 1 - A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

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16

1.2.A Educação Intercultural

1.2.1. Conceções e finalidades

“If we accept diversity, the way towards tolerance will be shorter and easier.”

(Febles, 2007:338)

Sabemos que, devido a fenómenos migratórios e à intensa globalização, as

sociedades atuais são cada vez mais complexas e eminentemente multiculturais. O

aumento das correntes migratórias fez aumentar os contatos culturais, sendo que as

sociedades revelam heterogeneidade social e pluralismo cultural. Este último agrega:

princípios que visam o reconhecimento de diferenças, nomeadamente identitárias e

socioculturais, aspirando a uma sociedade na qual os diversos grupos podem coexistir em

plena liberdade, mantendo as suas respetivas identidades culturais e tendo direito equitativo

a uma participação social, política e económica (Oliveira e Sequeira, 2012:19).

É neste contexto que a diversidade cultural emerge, sendo observável em pessoas

e/ou grupos de diferentes origens culturais na mesma sociedade. Todas estas culturas

possuem traços distintivos e um capital social rico, diferenciado e singular. Todos temos

uma carga cultural e capacidade de aprender a conviver com outros.

A cultura é fundamental para o desenvolvimento do ser humano e expressa a

identidade social de um grupo. Segundo Cuche (1999), o ser humano é um produto da

cultura, pois esta vai permitir-lhe adaptar-se ao meio envolvente. A Declaração Universal

sobre a Diversidade Cultural (2002:13) afirma que:

A cultura adquire formas diversas através do tempo e do espaço. Essa diversidade manifesta-

se na originalidade e na pluralidade de identidades que caracterizam os grupos e as sociedades

que compõem a humanidade. Fonte de intercâmbios, de inovação e de criatividade, a

diversidade cultural é, para o género humano, tão necessária como a diversidade biológica

para a natureza. Nesse sentido, constitui o património comum da humanidade e deve ser

reconhecida e consolidada em benefício das gerações presentes e futuras.

O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (2004) faz também várias

referências neste âmbito. Este relatório defende o respeito pela diversidade, pelas

tradições, valores, culturas e modos de vida das sociedades multiculturais atuais e a

necessidade de sociedades mais inclusivas e de políticas multiculturais, que reconheçam

as individualidades e as diferenças culturais observáveis no mundo.

Capítulo 1 - A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

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Com estas mudanças sociais, surge a necessidade de nos relacionarmos

verdadeiramente uns com os outros, eliminando as barreiras de comunicação e interação.

Retornamos então à valorização da diversidade cultural e à necessidade de superar

estereótipos, preconceitos e hierarquização cultural. Neste âmbito, emergem ainda dois

conceitos intrinsecamente ligados: a multiculturalidade, que se refere à diversidade

cultural das sociedades, “assente em valores e normas com coesão entre si” (Silva,

2008:38), e a interculturalidade, que coloca “énfasis en el terreno de la interaccíon entre

los sujetos o entidades culturalmente diferenciados (...) buscará las convergencias sobre

las quales establecer vínculos y puntos en común” (Giménez Romero,

2003:13),“impulsiona a convivência e a coadjuvação entre pessoas distintas” (Fontoura,

2005: 15) e “expressa o contato entre culturas numa sociedade multicultural” (Silva,

2008:37).

O fenómeno designado como multiculturalidade foi explorado a partir de quatro

perspetivas: (i) postura assimilacionista: a diversidade e a diferença são percebidas como

ameaças à coesão da sociedade, que pretende manter a sua homogeneidade cultural; (ii)

postura integracionista: declara a igualdade de direitos para todos os cidadãos; (iii)

postura pluralista: respeita a diferença cultural, promovendo o reconhecimento e respeito

pelas diferenças culturais, no contexto da sociedade de acolhimento; (iv) postura

interculturalista: possibilita aceitar e valorizar a diferença e defende a comunicação, a

afirmação e o diálogo (Ferreira, 2003; Araújo, 2008). Esta perspetiva:

Promove a relação dinâmica entre as culturas, ou seja, valoriza a diferença e esforça-se por

encontrar pontos comuns entre pessoas e culturas. Trata-se da construção de uma sociedade

aberta, que apesar de consciente do choque de culturas encontra-se recetiva ao exercício de

crítica e da postura ética, na defesa de princípios valores humanos que respeitem a alteridade”

(Araújo, 2008:57-58).

Devemos por isso transformar a sociedade multicultural numa sociedade

intercultural e ao invés de um:

somatório ou justaposição de culturas que se confrontam ou se ‘toleram’ num mesmo espaço,

viver o cruzamento de culturas em transformação mútua, numa sociedade de direitos reais e

efetivos - desde os direitos cívicos e políticos aos direitos económicos, sociais e culturais.”

(Cochito, 2004: 11).

Neste contexto surge a necessidade de uma “nova abordagem na educação

alicerçada na mudança de mentalidades” (Oliveira e Sequeira, 2012:12). Para estas

Capítulo 1 - A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

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autoras a educação intercultural apresenta-se como uma estratégia educativa que vai

contribuir para procurar as razões de agir do outro, promovendo o respeito para com o

diferente, alargando a realidade dos sujeitos e facilitando “uma leitura positiva da

pluralidade social e cultural” (Ibidem).

Oliveira e Sequeira (2012:8) consideram a interculturalidade como uma estratégia

defensiva da diversidade “que implica a interdependência de pessoas e culturas e é

condição de existência social e sustentabilidade.” Assim, urge a implementação desta

perspetiva, através da qual as várias culturas se “inter-relacionem verdadeiramente”

(Ibidem).

Araújo (2008) vê a perspetiva intercultural através de dois pontos de vista: (i)

sociológica: o interculturalismo como uma atitude humanista, que deseja o diálogo, o

respeito pelas diferenças e a compreensão mútua; (ii) educacional: “o interculturalismo

fundamenta-se nos processos educativos reflexivamente concebidos, promotores de

pluralismo e da igualdade de oportunidades educativas e sociais” (p.58). Já o termo

intercultural determina a função de inter-relação entre modos de sentir e de compreender

a realidade (Morgado, 2010b), sendo que a sua ênfase não são os conteúdos, mas sim os

processos, diferenciando-a assim de outras perspetivas. A finalidade da educação

intercultural é então contribuir para manter a unidade, valorizando as culturas, culturas

que se vão modificando quando estão em contacto entre elas (Abdallah-Pretceille ,1996).

Santiago, Akkari e Marques (2013) afirmam que a diversidade se faz sentir dentro

de uma mesma cultura, de acordo com a singularidade dos seus integrantes e, se assim é,

torna-se imperativa a construção de relações interculturais na educação. Silva (2008)

descreve o interculturalismo como o veículo de um esforço consciente para aceitar a

diferença. Fontoura (2005) remete-nos para a reflexão da interculturalidade, com uma

visão de sociedade que aposta na integração das diferenças, para que cada um possa

participar ativamente na vida em sociedade. Acrescenta ainda que a interculturalidade

promove dinâmicas relacionais, sendo considerada um “projeto educativo que valoriza a

diversidade sócio-cultural e luta contra os estereótipos, os preconceitos, a xenofobia e

qualquer forma de discriminação” (p.56). Para Vilar (2009), a interculturalidade é uma

estratégia inovadora de conviver com a diversidade cultural e étnica nas sociedades atuais.

Desta forma:

para que ela possa ser uma realidade, é suposto reconhecer que a convivialidade não é

pacífica, nem um dado imediato, que é sempre tensional, comporta conflitos, é dinâmica e

Capítulo 1 - A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

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exige uma construção permanente e diária. De algum modo, [a interculturalidade] é o estado

mais evoluído da democracia (p.52).

Neste panorama, a escola depara-se com um cenário de diversidade cultural e

linguística dos alunos. Estes alunos frequentam um sistema educativo onde a

heterogeneidade cultural é muitas vezes vista como uma barreira às aprendizagens

escolares, ao invés de a reconhecer, promovendo processos educativos integradores e

diferenciados, educando na diversidade e com a colaboração de toda a comunidade

escolar. Ramos (2007:233) defende que:

A educação oferece às crianças e jovens oportunidades de adquirirem capacitação,

desenvolverem sentido crítico e auto confiança, à medida que vivenciam a experiência da

diversidade e obtêm um conjunto de conhecimentos, aptidões, atitudes e valores

fundamentais para negociarem igualdade de oportunidades na sociedade e desenvolverem

práticas de cidadania.

É imperativo que através da diversidade se criem estratégias, oportunidades de

enriquecimento e aprendizagem, partilhando costumes e saberes. De acordo Ramos

(2007), a abordagem intercultural implica múltiplas constatações e perspetivas, são elas:

(i) uma constatação de ordem sociológica, pois a maioria das nossas sociedades são cada

vez mais multiculturais; (ii) uma opção de ordem ideológica, já que a

multi/interculturalidade é, potencialmente, uma riqueza para a sociedade; (iii) uma visão

estratégica, pois torna-se necessário promover a relação entre as culturas, sem anular a

identidade de cada uma delas; (iv) uma perspetiva interdisciplinar pluridimensional; (v)

uma perspetiva sistémica e multidimensional, indispensável a uma visão global e

interaccionista das diferentes problemáticas e à construção de um pluralismo comum; (vi)

um processo dinâmico e dialético, onde o intercultural implica a tomada de consciência

da alteridade, da diversidade e das interações; (vii) uma perspetiva psicossocial e

pedagógica, pois as problemáticas interculturais implicam o desenvolvimento de

competências que promovam a consciencialização cultural, a comunicação, o diálogo

intercultural e o funcionamento democrático da sociedade; (viii) uma perspetiva sócio-

política, dado que o interculturalismo promove a coesão social, o exercício da cidadania,

a igualdade de oportunidades e uma integração adequada das minorias.

Desta forma, a implementação da educação intercultural como transversal aos

currículos educativos, dará origem a projetos que promovem a formação integral dos

Capítulo 1 - A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

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sujeitos educativos, articulando todas as áreas curriculares, assim como os percursos

curriculares alternativos (Oliveira e Sequeira, 2012).

A educação intercultural visa então a valorização das culturas e do diferente, das

suas interações, dos seus valores e da solidariedade através de um esforço conjunto entre

pessoas e países. De acordo com Díaz-Aguado (2000) e Fontoura (2005), os seus

princípios incidem: (i) no direito à diferença; (ii) na igualdade na diversidade; (iii) na

valorização das várias identidades culturais; (iv) na justiça face às desigualdades a todos

os níveis; (v) no respeito entre todas as culturas, como meio de superar discriminações;

(vi) o respeito pelos direitos humanos. Díaz-Aguado (2000) defende ainda que os

objetivos da educação intercultural devem sofrer mudanças qualitativas, ao nível do

modelo de interação educativa e na forma de transmitir e produzir o conhecimento.

A Unesco (2006) instituiu três grandes princípios para esta educação, são eles: (i)

respeitar a identidade cultural do aluno, mediante a oferta de uma educação de qualidade

para todos e culturalmente relevante; (ii) desenvolver em cada aluno o conhecimento

cultural, as atitudes e as competências necessárias a uma participação ativa na vida da

sociedade (Díaz-Aguado, 2000); (iii) garantir a todos os alunos a aquisição dos

conhecimentos, atitudes e competências (Morgado e Pires, 2010) que os capacite a

contribuir para o respeito, a compreensão e a solidariedade entre indivíduos, grupos

étnicos, sociais e religiosos, e nações. Tendo em vista a concretização destes princípios,

a Unesco traçou ainda cinco objetivos: (i) a redução de todas as formas de exclusão; (ii)

o aprofundamento da integração e do sucesso educativo; (iii) a promoção do respeito pela

diversidade cultural; (iv) o desenvolvimento da compreensão do outro; (v) o fomento da

compreensão internacional.

De acordo com Ouellet (1991, citado por Morgado e Pires, 2010: 64), a educação

intercultural pode definir-se como:

A formação sistemática que visa desenvolver, quer nos grupos maioritários, quer nos

minoritários, atitudes, comportamentos e competências de compreensão de outras culturas e

maior interação comunicativa e social, criadora de identidades e de sentido de pertença

comum à humanidade.

Carneiro (2009:156) descreve-a como “conquistar para a descoberta

extraordinária do outro, pelo exercício sistemático da escuta e pela procura do sentido do

universal que pode habitar no diferente.” Morgado e Pires (2010:61) preconizam-na como

Capítulo 1 - A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

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a “interação e diálogo positivo entre grupos culturais em sociedades multiculturais”

[ênfase no original].

Para Ferreira (2003:15) o seu objetivo final da educação intercultural é o de

“conciliar a unidade com a diversidade”. Para a autora, a finalidade da educação

intercultural é contribuir para manter a unidade, valorizando todas as culturas nela

presente, tendo em conta que estas se vão modificar, quando estiverem em contato umas

com as outras. Defende ainda que a pedagogia intercultural é destinada a todos e deve

decorrer de políticas educativas à escala nacional, aplicando-se no decorrer da

escolaridade, tendo sempre em atenção o desenvolvimento afetivo e cognitivo dos

sujeitos educativos. Já Ramos (2011) define que o objetivo da interculturalidade não é a

separação do universal e do particular, mas “a organização de um contexto social e

relacional integrativo que tenha em conta um processo dialético ligando o Eu e o Outro,

a abertura ao mundo e o reconhecimento das identidades e da alteridade” (p. 198).

1.2.2. Abordagens educativas

Para Cotrim et al (1995), a pedagogia intercultural coloca no centro das suas

metodologias o sistema relacional dos alunos, sendo que a finalidade desta é permitir uma

interação com o igual e o diferente, de forma harmoniosa. A educação intercultural

promove assim, uma pedagogia de relação humana, em que:

a criança descobre a alteridade como uma relação com o outro, seu igual, simultaneamente

semelhante e diferente, numa situação de interdependência e conflitualidade latente. (…)

Produz [nela] uma capacidade de agir em matéria de direitos do homem, e integrar na

formação da sua personalidade, nas etapas do seu crescimento, o sentido do combate contra

qualquer forma de discriminação” (pp. 15-17).

Uma escola intercultural é o local em que a teoria e a prática se articulam. Esta,

difunde a aprendizagem numa perspetiva de participação social, inserida na comunidade,

gerida de forma democrática e participada. Nesta perspetiva, a escola deve ter como

objeto central o processo de aprendizagem individual de cada aluno, conhecendo as suas

identidades culturais e refletindo-as nas aprendizagens a fomentar. Torna-se uma

estratégia para potenciar o encontro e o diálogo intercultural, sendo a escola um espaço

de interação das diferenças. Uma escola que leva os alunos a aprendem de forma conjunta

e a tirarem partido da complementaridade entre pessoas intrinsecamente diferentes e que

Capítulo 1 - A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

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se empenham em contribuir para uma sociedade de cidadãos iguais, a nível de direitos e

deveres. Assim:

a visão de escola que apenas reproduz uma dada cultura e formas de organização hegemônica

fica superada por outra que reflete sobre a complexidade das relações estabelecidas nesse

espaço. Para que se permita a afirmação das diferentes subjetividades e, ao mesmo tempo, a

construção de relações interculturais democráticas entre a própria cultura escolher e o espaço

cultural da comunidade, bem como das produções de significados trazidas pelos alunos e

alunas em convívio nessa comunidade (Santiago, Akkari e Marques, 2013:180-190).

Numa visão educacional, a interculturalidade fundamenta-se nos processos

educativos, promotores do pluralismo e da igualdade de oportunidades, quer educativas,

quer sociais. Assim, a inclusão da educação intercultural no sistema educativo pretende

dar respostas adequadas às especificidades de cada aluno, tendo em conta uma educação

para os valores e para a cidadania, fomentando o espírito crítico, competências essenciais

à vida em sociedade. Intervenções educacionais integradoras devem ter em conta a

compreensão, o ponto de vista do outro, o reconhecimento da diversidade e espaço social

de cada um dos intervenientes. Para Giménez Romero (2003:20), “el interculturalismo

educativo implica saber distinguir, relacionar y manejar”.

Mas a integração de conteúdos interculturais nos currículos não é suficiente para

atingir os objetivos traçados e referidos anteriormente. Guijarro (2005:27) defende que a

“educación ha de tener un enfoque de derechos humanos y una visión intercultural de

forma que los aprendizajes sean significativos y pertinentes para todos y no sólo para

aquellos de las clases y culturas predominantes.” É necessário desenvolver materiais que

compreendam e respeitem as características de outras culturas, reconhecendo o seu valor

e que desenvolvam uma identidade pautada no respeito pelos direitos humanos, pela

diversidade cultural e pela tolerância (Díaz-Aguado, 2000). A mesma autora advoga

ainda que os estudos publicados no âmbito da dificuldade da integração prática da

educação intercultural são consensuais ao referirem como barreiras à sua inclusão: a

conceptualização inadequada que os professores detém desta e a falta de recursos e

preparação para concretização prática da mesma.

Como tal, as seguintes condições poderão diminuir a distância entre os objetivos

de uma educação intercultural e a sua aplicação prática em contexto escolar: (i) adaptar o

estilo de ensino-aprendizagem e o modelo de interação educativa à diversidade dos

alunos; (ii) ensinar de forma explícita como se constrói o conhecimento (Banks e Banks,

1994), normas e expetativas da cultura escolar, recorrendo aos alunos na sua construção;

Capítulo 1 - A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

_____________________________________________________________________

23

(iii) ultrapassar os modelos etnocêntricos; e (iv) superar a propensão para a procura de

certezas absolutas. Para tornar esta realidade possível, os alunos devem ter algum controlo

sobre as atividades, partilhando o ato educativo com os professores e trabalhando de

forma cooperativa, para que “possam aceitar outros pontos de vista, diferentes perspetivas

e diferentes atividades de resolução dos problemas” (Fontes e Freixo, 2004), sendo que a

aceitação do outro é uma competência que se adquire com a prática (Unesco, 2009).

Ferreira (2003) advoga que para a prática da educação intercultural é

indispensável: (i) organizar a estrutura escolar, tendo em conta a diversidade de culturas;

(ii) adaptar o currículo nacional aos diferentes contextos; (iii) recorrer a práticas letivas

que invoquem a cooperação e valorizem diferentes aptidões, saberes e capacidades, tais

como a aprendizagem cooperativa social (Ferreira, 2003; Ainscow, Caldeira, Paes,

Micaelo e Vitorino, 2004; Cochito, 2004; Fontes e Freixo, 2004; Lopes e Silva, 2008;

Azevedo, 2009); (iv) focar a língua materna do país de acolhimento, pois esta irá

condicionar todas as aprendizagens (e se necessário ensiná-la como língua secundária).

Os docentes terão que “ be aware of the emerging knowledge and feelings about other

countries, including the ones which may be associated with the specific language being

taught (…)” (Byram, 2008: 80) ; (v) promover o desenvolvimento pessoal, social e moral,

através da resolução de conflitos; (vi) celebrar a unidade e a diferença.

Complementando esta visão, Morgado e Pires (2010) salientam que as abordagens

multiculturais/interculturais deveriam enfatizar os seguintes pontos: (i) ensinar/aprender

aquilo que é culturalmente diferente; (ii) promover relações humanas positivas, entre

diferentes grupos culturais; (iii) inserir novas perspetivas e experiências nos currículos

escolares; (iv) realizar estudos a grupos geralmente considerados marginais; (v) impelir

a transformação social, através de práticas reflexivas.

Uma pedagogia intercultural, que seja baseada na compreensão, no respeito e no

reconhecimento do Outro, deve ajudar os indivíduos a refletir sobre as suas próprias

representações e sistemas de valores. Deverá ainda:

ajudar a identificar as representações, preconceitos, estereótipos e sistemas de valores dos

outros indivíduos e grupos, constituindo um meio de aprendizagem de si mesmo e do Outro,

de compreensão intercultural, de luta contra o etnocentrismo, a discriminação e a xenofobia

(Ramos, 2011: 195).

De acordo com Ribeiro, Cavalcanti e Cruz (2010), a educação intercultural é um

dos pilares para a efetivação da educação inclusiva, promovendo um currículo

Capítulo 1 - A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

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contrahegemónico e assente na diferenciação pedagógica. A educação intercultural

estabelece então a inclusão dos alunos culturalmente diferentes, da cultura hegemónica

da sociedade ou com necessidades educativas especiais, numa perspetiva de ‘escola para

todos’. As mudanças na sociedade acarretam sempre novos desafios para a educação,

especialmente ao nível da procura de respostas educativas para todos os alunos, em

particular para aqueles que estão mais vulneráveis à marginalização. Para responder à

diversidade dos alunos, a escola terá que trabalhar numa perspetiva inclusiva. Pois:

a definição de uma estratégia de promoção da inclusão implica um exame detalhado do

funcionamento da escola que, continuamente, oriente e monitorize o estabelecimento de

prioridades e os esforços de melhoria no desenvolvimento das práticas educativas. (Ainscow

et al, 2004: 31)

Assim, a educação intercultural visa que a qualidade das aprendizagens e está

relacionada com a valorização das diferentes experiências e práticas de todos os

envolvidos no processo educativo. A promoção desta perspetiva vai envolver a aptidão

de cada escola para refletir acerca de si, reestruturando os seus métodos, práticas

pedagógicas e estratégias de apoio à participação e aprendizagem de todos, tal como

advoga Silva et al (2005) que reconhece este processo, assim como a promoção de uma

pedagogia assente na igualdade de oportunidades. Cada vez mais o conceito de escola

inclusiva emerge nos sistemas educativos, sendo que “a diversidade deve ser integrada e

positivamente valorizada” (p.8). De acordo com Guijarro (2005: 17) a educação

inclusiva:

implica una visión diferente de la educación común basada en la heterogeneidad y no en la

homogeneidad, considerando que cada alumno tiene sus propias capacidades, intereses,

motivaciones y una experiencia personal única, es decir, las diferencias son inherentes a los

seres humanos y, por lo tanto, están dentro de lo normal. Desde esta concepción, el énfasis

está en desarrollar una educación que valore y respete las diferencias, viéndolas como una

oportunidad para optimizar el desarrollo personal y social y para enriquecer los procesos de

enseñanza y aprendizaje.

De acordo a Declaração de Salamanca (Unesco, 1994), a escola inclusiva debate-

se com o desenvolvimento de uma pedagogia centrada nas crianças, suscetível de educar

a todas com sucesso, quaisquer que sejam as suas diferenças (físicas, emocionais ou

sociais). Ou seja, vem, também, defender o direito de todos os alunos desenvolverem e

concretizarem as suas potencialidades, bem como de apropriarem as competências que

Capítulo 1 - A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

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lhes permitam exercer o seu direito de cidadania, através de uma educação de qualidade,

que foi talhada tendo em conta as suas necessidades, interesses e características” (Freire,

2008:5).

Numa perspetiva intercultural, a escola inclusiva vai relacionar-se com noções

como grupos sociais, compreensão, adequação curricular ou diversidade cultural. A

inclusão é então “una continuación de la integración, basada en los princípios y valores

de respeto y tolerância, de cooperación, de solidaridad y de aceptación de la diversidade”

(Torre, 2001:248). Ortega e Fuentes (2014:50) advogam que:

la escuela inclusiva es algo más que una escuela organizada de manera diferente a la

tradicional, es la escuela de la diversidad. (…) La diversidad es un rasgo consustancial e

inherente a la propia naturaleza humana. Aceptar las diferencias y respetar la heterogeneidad

de las personas es un paso imprescindible para construir una escuela de calidad para todos.

(…) la escuela inclusiva representa la búsqueda incesante de una educación basada en la

justicia y en la ausencia de desigualdade (…).

Assim, a escola inclusiva e a interculturalidade caminham lado a lado, num

pressuposto de igualdade de oportunidades. Educar na diversidade é ensinar a conviver

com os outros, a viver em sociedade, a desenvolver atitudes mais tolerantes, face ao

pluralismo cultural. De acordo com Torre (2001), algumas das práticas educativas da

interculturalidade que cruzam a inclusão são: (i) educação multicultural no sentido de

reconhecimento da diversidade cultural; (ii) justiça social; (iii) responsabilização da

educação enquanto estrutura que deverá desenvolver aprendizagens culturais; (iv)

aprendizagem construtivista; (v) currículo adequado e interdisciplinar; (vi) modelos de

aprendizagem cooperativa, ou seja, trabalhar de acordo com as necessidades educativas

de cada grupo, valorizando a diversidade; (vii) a heterogeneidade dos alunos (em termos

de género, idade, competências, etc.), dando lugar a práticas diferenciadas e adequadas a

cada criança.

Uma escola inclusiva propõe que todos aprendam juntos, quaisquer que sejam as

suas especificidades, visto que a ação educativa se centra na diferenciação curricular

inclusiva. Esta diferenciação deve ser edificada de acordo com os contextos em que cada

criança está inserida, dando resposta à diversidade social e cultural. A inclusão pretende

que todos os alunos, independentemente das suas características e diferenças, tenham

acesso a uma educação de qualidade e vivam experiências significativas. A educação

intercultural advoga as mesmas ideias, tendo como foco principal a diversidade social e

cultural, podendo-se afirmar que a ação de uma é complementar à ação da outra, pois

Capítulo 1 - A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

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“buscam promover a superação de barreiras à participação e à aprendizagem” (Santiago,

Akkari e Marques (2013:98). Segundo os autores ambas promovem um ambiente

benéfico à aprendizagem das crianças, à inclusão social e à autonomia.

1.2.3. Competência(s) intercultural(ais)

A diversidade cultural e o contato intercultural são situações visíveis nas

sociedades modernas, tornando a competência intercultural e as competências

interculturais que a constituem, numa resposta necessária. Na visão da Unesco (2009),

tendo em conta as sociedades multiculturais complexas, a educação deve levar-nos a

adquirir competências interculturais “que nos permitam conviver com as nossas

diferenças culturais e não apesar delas” (p.15). Então, desenvolver competências

interculturais concorrerá para relações e interações de maior qualidade entre indivíduos

de várias origens culturais.

Estas competências interculturais são definidas como:

sobretudo linguísticas, comunicacionais e pedagógicas, que facilitem, por um lado, a

comunicação intercultural e a consciencialização cultural e, por outro, que promovam

práticas e intervenções interculturalmente competentes e inclusivas, bem como profissionais

e cidadãos culturalmente sensíveis e implicados (Ramos, 2013:353).

A perspetiva intercultural cria condições para a comunicação intercultural, definida

como um “processo dialógico” entre indivíduos com ‘filtros’ sociais e culturais distintos.

A compreensão desses ‘filtros’ é uma condição fundamental para uma “(inter)relação

recíproca” reconhecendo o outro e a sua cultura. Isto vai permitir a tomada de consciência

do eu e da sua própria cultura, assim como das diferenças entre os participantes dessa

mesma comunicação (Oliveira e Sequeira. 2012: 21). Para desenvolver estas

competências, é necessário que o sujeito tenha uma perspetiva descentrada, sendo capaz

de considerar e entender outros pontos de vista.

Segundo a Unesco (2013:5) as competências interculturais são:

abilities to adeptly navigate complex environments marked by a growing diversity of peoples,

cultures and lifestyles. (…) Intercultural competences aim at freeing people from their own

logic and cultural idioms in order to engage with others and listen to their ideas, which may

involve belonging to one or more cultural systems, particularly if they are not valued or

recognized in a given sociopolitical context.

Capítulo 1 - A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

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Esta organização descreve competência como capacidade ou conhecimento,

suficientes para permitir um comportamento apropriado nos diversos contextos. A

competência inclui: (i) componentes cognitivos (conhecimento); (ii) funcionais

(aplicação do conhecimento); (iii) pessoais (comportamento); (iv) éticos (princípios de

comportamento orientador).

De acordo com Ramos (2011, 2013), para desenvolver estas competências no

domínio da interculturalidade e na comunicação entre pessoas, grupos e/ou culturas, são

necessárias várias componentes, entre elas: (i) aprender a conhecer-se a si mesmo e à sua

própria cultura e tomar consciência da sua própria identidade cultural; (ii) aprender a

conhecer e a compreender as normas e valores, os quadros de referência do outro e os

códigos culturais respetivos e tomar consciência das diferenças e especificidades

culturais; (iii) desenvolver atitudes como abertura de espírito, cooperação, confiança,

curiosidade e interesse pela cultura, costumes e tradições do outro; (iv) lutar contra o

etnocentrismo, ou seja, a tendência a interpretar a realidade a partir dos nossos próprios

critérios e modelos culturais; (v) colocar-se no lugar do outro, tentando compreender

outros pontos de vista, permitindo a descentração; (vi) desenvolver a empatia, o que

implica a capacidade de se colocar no lugar do outro, assim como reconhecê-lo e aceitá-

lo na sua individualidade e singularidade; (vii) desenvolver estratégias e intervenções

psicossociais e educativas interculturais, dentro de um espaço educacional; (viii) respeitar

a diversidade linguística.

Ramos (2007) reforça que as problemáticas do domínio intercultural são complexas

e carecem de competências de cariz psicológico, cultural, social, pedagógico e

comunicacional, alicerçadas na experiência da alteridade e da diversidade. Estas

problemáticas implicam o desenvolvimento de competências individuais que possibilitem

a prática de interações sociais harmoniosas, que promovam uma atitude de descentração

e o desenvolvimento de competências interculturais - sobretudo linguísticas e

pedagógicas - que facilitem: (i) a comunicação intercultural e a consciencialização

cultural; (ii) promovam uma educação e um ensino interculturalmente competentes e

educadores culturalmente sensíveis; (iii) o desenvolvimento de competências de

cidadania, que promovam o funcionamento democrático das sociedades e das escolas.

Já segundo Spitzberg e Changnon (2009:7) a competência intercultural é entendida

como:

the appropriate and effective management of interaction between people who, to some degree

or another, represent different or divergent affective, cognitive and behavioral orientations to

Capítulo 1 - A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

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the world. These orientations will most commonly be reflected in such normative categories

as nationality, race, ethnicity, tribe, religion or region.

Com esta perspetiva, Deardorff (2006) descreve que indivíduos com diferentes

heranças culturais podem coexistir e cooperar com alguém étnica ou culturalmente

diferente de si. Spitzberg e Changnon (2009) advogam um modelo de competência

intercultural piramidal, que incorpora elementos motivacionais (requisitos ao nível das

atitudes) e cognitivos (conhecimentos e compreensão; skills). Os níveis seguintes

incorporam os resultados externos (visíveis) resultantes do comportamento interno. As

competências desenvolvidas pelo individuo refletem-se nos resultados externos, que se

referem ao comportamento observável e aos estilos de comunicação deste, tornando-o

interculturalmente competente.

A figura seguinte demonstra as dinâmicas entre os vários elementos da competência

intercultural, sendo que os níveis inferiores suportam e impulsionam o desenvolvimento

dos níveis superiores. As várias componentes estão articuladas da forma ilustrada na

figura 1:

Figura 1 – Modelo de competência intercultural de Deardorff

Fonte: Spitzberg e Changnon (2009: 13)

Os autores salientam que para adquirir a competência intercultural é necessário:

respeito, auto-consciência; saber ouvir, capacidade de adaptação, criação de relações e

humildade cultural (relação que combina o respeito com a auto-consciência). Reforça

ainda que a competência intercultural não pode ser adquirida num curto espaço de tempo,

Capítulo 1 - A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

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pois é um processo que se desenvolve ao longo da vida (Deardorff, 2006; Conselho da

Europa, 2008).

Byram (1997, 2008) é mencionado em documentos orientadores do Conselho da

Europa e da Unesco para o desenvolvimento da educação intercultural. Para este autor, a

competência intercultural integra quatro dimensões (atitudes, conhecimento, skills e

consciência cultural crítica) interdependentes, que interagem entre si quando se verifica

um encontro intercultural, como é observável na figura 2.

Figura 2 – Modelo de competência intercultural de Byram

Fonte: Byram (1997: 34)

Neste modelo são integrados cinco elementos: (a) as atitudes, que correspondem

às disposições do sujeito (integram atitudes de curiosidade, disponibilidade, abertura e

respeito para com a cultura do outro); (b) o conhecimento, que se reporta ao saber sobre

a cultura do outro e sobre os processos de interação com a alteridade, e também ao

autoconhecimento; (c) as skills para: (i) a interpretação e a relação (capacidade do sujeito

mobilizar conhecimentos adquiridos previamente, para interpretar factos e

acontecimentos que ocorram durante as interações); (ii) descoberta e interação

(capacidade de reconhecer um fenómeno num contexto estranho, compreendendo o seu

significado); (d) a consciência crítica cultural (capacidade de avaliar diferentes

perspetivas, práticas da sua cultura e de outras de forma crítica) (Byram, 1997, Bastos,

2014).

A competência intercultural surge assim relacionada com outras competências

- a linguística, a sociolinguística e a discursiva (como uma das dimensões da competência

de comunicação intercultural [CCI]), articulando-se com as outras três aquando da

interação intercultural. De acordo com Byram (1997), o sujeito detentor de uma CCI vai

Capítulo 1 - A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

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rentabilizar os seus conhecimentos linguísticos e culturais, sempre que interagir com

sujeitos de outras culturas. Em suma, um sujeito com competência intercultural adquirida

é alguém consciente e capaz de mediar interações entre culturas. O autor acrescenta ainda

que as competências interculturais podem ser desenvolvidas em vários contextos, não se

confinando apenas ao meio escolar.

De acordo com a Unesco (2013), estas competências estão intimamente ligadas à

aprendizagem para saber fazer e saber ser. Mendonça (1994) defende um ponto de vista

semelhante, refletindo acerca da especificidades da educação de infância na valorização

do saber-ser, sendo que este reflete também o saber-fazer. Aprender a conhecer os outros

é o primeiro passo no desenvolvimento de competências interculturais. Aprender a saber

fazer leva o sujeito a interagir com outros, diferentes de si e através destas interações,

aplicar o conhecimento adquirido, aprendendo com as interações, aprendendo a saber ser.

Esta é a base para o diálogo intercultural, um processo de troca de ideias, aberto, num

espírito de compreensão e respeito mútuos.

Neste âmbito, Byram (2008), reflete acerca do alcance do desenvolvimento da

competência intercultural em crianças na fase pré-escolar. Barrett (2007, citado por

Byram, 2008) descreve alguns fatores, como relevantes para o ensino destas

competências, entre eles: (i) os conhecimentos que as crianças possuem acerca do seu e

de outros países aos 5-6 anos de idade, assim como o orgulho demonstrado pelas suas

raízes culturais (os níveis de orgulho são variáveis de acordo com o país e o género); (ii)

a relação entre os conhecimentos que possuem e os seus sentimentos acerca de outros

países; (iii) os manuais escolares, por vezes etnocentricamente tendenciosos, influenciam

as crianças através de narrativas históricas acerca do seu país de origem; (iv) os

estereótipos que as crianças tem acerca de outros países; (v) as atitudes e sentimentos de

favoritismo para com determinados grupos sociais (as atitudes/sentimentos são variáveis

de acordo com o contexto); (vi) a perceção das crianças acerca da sua identidade nacional.

Estes fatores vão influenciar os conhecimentos, os sentimentos e as crenças das crianças,

sendo que irão consequentemente influenciar o desenvolvimento da competência

intercultural ao longo do seu crescimento.

Assim, as experiências e as atividades a implementar no âmbito intercultural,

devem estar cognitivamente de acordo com o estado de desenvolvimento das crianças, de

acordo com a perspetiva de Byram (2008). Estes aspetos são preponderantes pois na idade

pré-escolar, as crianças:

Capítulo 1 - A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

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“have not yet fully absorved the assumptions of their own cultural enviroment, and do not

yet perceive the cultural as natural. (…) [the intercultural attitude] is best developed through

experiential learning where immersion in experience is followed by reflection upon it, under

the guidance of the teacher (Ibidem, p.82)”

Deste modo, as competências interculturais desempenham um papel fundamental

na aprendizagem de convivência democrática. A educação tem um importante papel no

desenvolvimento das competências interculturais, através do diálogo e dos domínios do

saber: saber estar, saber saber, saber fazer e saber ser. Assim, do ponto de vista

pedagógico e em idades mais precoces, é possível explorar e ensinar o conhecimento dos

outros, fomentando uma atitude de respeito pelas crenças e valores dos outros.

Essencialmente, o reconhecimento das diferenças vai servir como ponto de partida

fundamental para a compreensão das implicações da diferença.

Em última análise, é necessário fomentar competências que permitam interações

bem sucedidas, com indivíduos provenientes de diferentes culturas através da CCI, pois

através do diálogo intercultural:

the process of holding conversations among members of different cultural groups whereby

individuals listen to and learn from one another, serves as the essential starting point.(…).

Individuals are not born interculturally competent, they become competent through education

and life experiences (Unesco, 2013:38).

Em suma, a educação intercultural desponta como uma hipótese de

desenvolvermos a sensibilidade para a complexidade de valores culturais. (Santiago et al,

2013). Conjetura que a educação intercultural, em contexto escolar, deve articular os

conteúdos com objetivos coerentes no processo de ensino-aprendizagem, para ambos os

sujeitos – professores e alunos – estejam em consonância com a sua situação social real

(Díaz-Aguado, 2000; Santiago et al, 2013). Deste modo, contribui para a igualdade de

oportunidades no acesso à escolaridade, assim como para a valorização das culturas nos

diferentes contextos (escolar, comunitário, etc.).

Visto que a nossa sociedade experiencia mudanças intensas a vários níveis, a

educação deve acompanhá-la com políticas educativas que fomentem mecanismos de

integração e processos inclusivos, que façam frente a estas transformações. À educação

está reservado o papel de proporcionar um espaço de aprendizagens, diálogo, respeito,

aceitação das diferenças, conhecimento mútuo, competências e trabalho cooperativo. É

imperativo que a diversidade e as relações interculturais sejam uma oportunidade de

Capítulo 1 - A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

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enriquecimento e de cidadania, numa sociedade aberta, plural, partilhando tradições,

competências, recursos e espaços, desde a idade pré-escolar. Sendo que a educação

intercultural se ‘transmite’ através do sistema educativo, mas também através de outros

agentes de socialização (como a família, os amigos, etc.), a perspetiva intercultural deverá

estar no centro do processo educativo e do desenvolvimento humano e social.

É fundamental que o sistema educativo português desenvolva estratégias, e

intervenções socioeducativas a implementar desde o jardim de infância, para que

profissionais e cidadãos possam reagir de forma crítica, flexível e refletida, às

diversidades individuais e culturais que encontram no seio da comunidade e noutras

instituições. Assim, o desenvolvimento de competência intercultural é uma finalidade

importante da educação intercultural de crianças, jovens e adultos, para fazer frente à

diversidade que carateriza as sociedades multiculturais atuais.

1.3.A Educação Intercultural em Portugal: das linhas orientadoras às Orientações

Curriculares para a Educação Pré-Escolar

A cultura e a educação tem assumido diferentes facetas na sociedade, à medida

que vão surgindo novos desafios e conflitos relacionados com questões políticas,

económicas e sociais e especialmente à imposição de crenças e valores.

Em Portugal, nos anos 1960, embora tal não acontecesse, sentia-se a necessidade

de explicitar a nível político, social e educacional, através de vários meios, que fazíamos

parte de um país considerado “um todo idêntico que se distribuía pelos diferentes

continentes, com uma mesma língua, uma mesma cultura, uma história comum e uma

‘universalidade de espírito’” (Cortesão e Pacheco, 1991:37). Nos anos 1970, Portugal

viveu um fenómeno migratório de pessoas oriundas de ex-colónias portuguesas, tendo

levado a que a heterogeneidade cultural e linguística se tornassem traços característicos

da nossa sociedade. Ergueu-se uma maior discriminação social, associada ao racismo,

sendo que no sistema educativo se verificavam vários casos de “falta de integração

cultural”, o que dificultava a inclusão dos alunos na escola e os rotulava como casos com

dificuldades de aprendizagem.

Estes acontecimentos impeliram a escola a construir legislação que permitisse o

reconhecimento da diversidade cultural na escola, ativando mecanismos que

operacionalizassem a educação intercultural. Então, no final dos anos 1980, início dos

Capítulo 1 - A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

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anos 1990, o Ministério da Educação motiva vários discursos de igualdade de

oportunidades e de respeito pela diversidade cultural, ambos orientados para a

compreensão do fenómeno do multiculturalismo e para uma intervenção educativa

adequada à nova realidade multicultural da sociedade e às características plurais

verificadas nos alunos. Assim, em 1988, através da Portaria 243/88 de 19 de abril, surge

a designação de “Currículos Alternativos”. Estes eram destinados a grupos específicos da

população, que frequentavam até então um sistema educativo que se relevava inadequado,

discriminatório e que levava ao insucesso escolar. Este foi um dos passos para o

reconhecimento das culturas dos alunos.

Ainda nesta época, foi aprovada a Lei de Bases do Sistema Educativo, com

princípios orientadores contra as metodologias da escola tradicional e advogando uma

‘escola para todos’. Acompanhando estas tendências: (i) em 1991 foi criado o

Secretariado Coordenador dos Programas de Educação Multicultural – sucedido pelo

Secretariado Entreculturas em 2001; (ii) em 1993 foi lançado o projeto de Educação

Intercultural (PREDI); (iii) entre os anos de 1994 e 1997, foi promovido pelo

Departamento da Educação Básica, um curso de formação de mediadores culturais com

o nome de “Projeto ir à Escola”, com o intuito de apoiar o percurso escolar de crianças

de etnia cigana; (iv) em 1996 foi criado o cargo de Alto Comissariado para a Imigração e

Minorias Étnicas. Foi ainda publicado o Despacho nº147 –B/ME/96, de 8 de julho,

definindo o enquadramento legal de constituição de Territórios Educativos de Intervenção

Prioritária (TEIP); (v) no final dos anos 90, reconheceu-se a língua gestual portuguesa e

o mirandês como línguas oficiais da república portuguesa; (vi) foi reconhecida a educação

inter/multicultural como uma área de formação prioritária nas candidaturas, ao abrigo do

Regulamento de Equiparação a Bolseiro; (vii) constitui-se um grupo de trabalho, para

estudar as medidas a implementar no sistema escolar e para criar oportunidades de

igualdade e inserção dos ciganos (Cochito, 2004; Araújo, 2008).

De salientar dois projetos promovidos por organizações oficiais:

(a) “A Escola na Dimensão Intercultural” [inserido no projeto de

Educação Intercultural (PREDI)], desenvolvido em escolas do 1º

ciclo do ensino básico, localizadas em bairros pobres da capital

com crianças de origem africana e cigana, cujos objetivos incidiam

em: (i) contrariar o etnocentrismo da cultura escolar e legitimar a

presença de outras culturas na instituição escolar; (ii) experimentar

estratégias de ensino-aprendizagem promotoras da continuidade

Capítulo 1 - A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

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cultural escola-família; (iii) desenvolver competências de

comunicação oral e escrita nos alunos; (iv) desenvolver estratégias

de discriminação positiva e banir o preconceito; (v) criar condições

pedagógicas que fomentem a igualdade de oportunidades e acesso

e sucesso escolar; (vi) desenvolver estratégias de intervenção

generalizáveis.

(b) Projeto de Educação Intercultural do Secretariado

Entreculturas, desenvolvido em escolas de 1º, 2º e 3º ciclos em

Lisboa, Porto e Faro, para responder às necessidades das escolas

portuguesas e à crescente multiculturalidade populacional discente.

A sua finalidade era a resolução de conflitos étnicos nas escolas e

os objetivos definidos foram: (i) melhorar a qualidade da ação

educativa nas escolas; (ii) promover uma educação intercultural a

partir dos projetos apresentados pelas escolas; (iii) favorecer a

integração escolar e comunitária dos alunos de grupos minoritários,

para favorecer a promoção de igualdade de oportunidades; (iv)

promover a criação de relações harmoniosas escola-comunidade.

Foram ainda criados programas para estudar os problemas enfrentados pelas

minorias nas escolas portuguesas e, posteriormente, com esses resultados, criados

projetos e medidas no sistema educativo português, com a intenção de promover

igualdade de oportunidades através das propostas educativas. O objetivo destes

programas foi a identificação de dispositivos pedagógicos, para posteriormente se

elaborarem atividades de ensino-aprendizagem aliciantes e interessantes para as crianças

(Araújo, 2008).

Mais recentemente, o Alto Comissariado Para a Imigração e Diálogo Intercultural

(ACIDI) introduziu, no Plano para a Integração dos Imigrantes 2010-2013, publicado em

Diário da República (2010), algumas medidas tendo em vista o desenvolvimento de

políticas e iniciativas, que vão incidir sobre várias áreas de intervenção, nomeadamente:

questões da língua, cultura, diálogo intercultural, combate ao racismo e à discriminação

e promoção da diversidade e da interculturalidade. Algumas dessas medidas foram: (i)

Programa Português para Todos (dirigido à população imigrante) e que fomenta o

conhecimento da língua portuguesa como fator de integração; (ii) reforço da expressão

da diversidade cultural em todos os domínios e atividades, como a área da cultura, tendo

em vista a promoção do diálogo intercultural e a multiculturalidade; (iii) formação para a

Capítulo 1 - A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

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interculturalidade na formação contínua dos professores; (iv) apoio ao acolhimento e

integração de estudantes estrangeiros e descendentes de imigrantes em Portugal; (v)

medidas legislativas, divulgação e formação no combate à discriminação racial; (vi)

sensibilização e capacitação para a interculturalidade e diálogo inter-religioso no

acolhimento e apoio à integração dos imigrantes. Mesmo com todas estas medidas, foi

notório o atraso de Portugal ao nível da educação. Também o Alto Comissariado para as

Migrações (ACM), publicou em 2014 o documento “Monitorizar a integração de

imigrantes em Portugal: relatório estatístico decenal”, inserido no mesmo âmbito.

Vivemos numa sociedade pluralista, quer a nível político, quer a nível religioso e

moral. Segundo o Relatório Mundial da Unesco (2009:15), habitualmente a educação é

considerada sob uma perspectiva de:

transmissão de conhecimentos e do desenvolvimento de conceitos, muitas vezes

uniformizados, das competências sociais e comportamentais, a educação é também uma

questão de transmissão de valores – na mesma geração, entre gerações e entre culturas. As

políticas educacionais têm uma repercussão decisiva no florescimento ou no declínio da

diversidade cultural e devem promover a educação pela e para a diversidade. Assim se

garante o direito à educação, ao mesmo tempo em que se reconhece a diversidade das

necessidades dos educandos (especialmente daqueles que pertencem a grupos minoritários,

indígenas ou nômades) e a variedade dos métodos e conteúdos conexos.

O quadro legal e as políticas educativas valorizavam a educação intercultural,

como um dos fatores preventivos dos fenómenos de exclusão, mas na prática foram pouco

operacionalizadas. Organizações como a Unesco, o Conselho da Europa ou a

Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Económico (OCDE), têm fornecido

espaços e instrumentos a nível europeu e mundial, com o intuito de promover a igualdade

de oportunidades, a inserção das minorias étnicas, a interação de diferentes culturas e as

implicações pedagógicas de uma didática da interculturalidade.

O Ministério da Educação e Ciência (2015) propõe várias ações de

informação/sensibilização, com temas relacionados com a interculturalidade em contexto

escolar, sendo estas dirigidas aos vários elementos da cultura escolar. Evidencia-se no

Plano Estratégico para as Migrações (2015:2) que:

é necessário consolidar o trabalho de acolhimento e de integração social e, sobretudo,

redobrar esforços na correta inclusão das segundas e terceiras gerações daqueles que,

descendendo de imigrantes, já são novos cidadãos portugueses, através de mais ações de

integração em escola, formação e emprego e de mais boas práticas que inculquem nos jovens

Capítulo 1 - A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

_____________________________________________________________________

36

uma cultura de responsabilidade, participação e confiança em si e na sociedade de que fazem

parte.

Embora existam vários movimentos e projetos em curso e, observando o contexto

sociohistórico da escola portuguesa, esta continua a manifestar dificuldades em tornar-se

orientada para o respeito, a valorização e a rentabilização das culturas minoritárias no

processo educativo. Por isso, “a escola toma parte no aumento das caraterísticas

hegemónicas da cultura dominante e, por conseguinte, no esmagamento simbólico

(coletivo) das culturas minoritárias” (Cortesão e Pacheco, 1991:35).

Atualmente há escolas em Portugal que incluem, nos seus projetos educativos

objetivos ligados à educação intercultural, mas é necessário colocá-los efetivamente em

prática, a nível nacional, promovendo o conhecimento mútuo, a convivência com a

diferença e a educação cívica desde idades precoces, iniciando esta formação na educação

pré-escolar.

Pinho e Moreira (2012:20) advogam a importância de projetos nacionais que se

assumam como “portals to the development of a plurilingual and intercultural education.”

Salientam ainda a implementação deste tipo de dinâmicas em contexto escolar, pois a

integração curricular “of plurilingual and intercultural education is deeply intertwined

with [their] professional knowledge about the topic and [their] representations about

[their] teaching” (Ibidem), alterando a perspetiva dos docentes em relação à educação

intercultural. Assim, é imperativo recorrer a metodologias com adequação

multidisciplinar do currículo, trabalhos de projeto com parcerias nacionais/internacionais

e sobretudo formação profissional adequada para todos os intervenientes no processo

educativo, fundamentalmente educadores e professores, para que estes possam contribuir

para o desenvolvimento de uma escola democraticamente mais funcional.

Então, para que seja possível implementar políticas interculturais, é necessário

tornar o educador e/ou professor, em alguém disponível para facilitar a construção e

aquisição de conhecimentos e valores culturais dos alunos, recorrendo a estratégias

colaborativas, como sugere Díaz-Aguado (2000). Uma mudança social envolve “uma

transformação da relação de poder entre as culturas; implica o reconhecimento da

ilegitimidade da submissão de uma cultura” (Silva, 2008:44).

É neste âmbito que Ferreira (2003) afirma que as práticas interculturais deveriam

estender-se a todos os níveis de ensino, através da integração da educação intercultural

na educação formal. Assim, deveriam ser explorados conteúdos e integradas práticas

Capítulo 1 - A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

_____________________________________________________________________

37

pedagógicas que promovam a compreensão das realidades sociais que surgem das

mudanças das sociedades, com objetivo de formar as futuras gerações para a aceitação da

diversidade cultural, o que será “um passo na integração das minorias, mas não deve ser

o único se quisermos formar uma sociedade democrática e plural (…)” (Marques e

Borges, 2012:73). Guijarro (2005:27) defende um ponto de vista semelhante, advogando

que:

El desarrollo de curricula para este nivel educativo es un aspecto importante para avanzar

hacia una mayor calidad (…) Es preciso, sin embargo, que una mayor intencionalidad no se

interprete como una mera preparación a la educación primaria. Los curricula en esta etapa

han de ser sumamente abiertos y flexibles para adecuarlos a las diferencias de los niños y de

los contextos en los que se desenvuelven, pero también han de considerar el desarrollo de

todo tipo de capacidades; cognitivas, motoras, sociales y emocionales.

Assim, o processo educativo poderia transforma-se, abrindo possibilidades de

relacionamento positivo, a nível de aprendizagem, interação com as diferenças e

construção social, numa “perspetiva do reconhecimento do caráter intercultural da

educação escolar que deve promover a articulação entre as diferenças que favoreçam o

exercício da cidadania em contexto de diversidade cultural” (Santiago et al, 2013:191).

O currículo da educação pré-escolar foi concretizado através das OCEPE,

consequência natural da integração no sistema nacional de educação. Foram editadas em

1997 pelo Ministério da Educação, sendo que todo o processo de elaboração, negociação

e implementação que as envolveu foi destacado pela OCDE. Em 2016 as OCEPE foram

revistas e atualizadas, após 19 anos de aplicação prática em contexto institucional. Este

referencial assume-se como conjunto de referências comum a todos os educadores de

infância, centrado na intervenção educativa através de áreas de conteúdo, destinado a

apoiá-los na sua prática pedagógica, a nível de organização, intervenção e experiências a

implementar com as crianças, destacando essencialmente a continuidade e a

intencionalidade educativa.

As suas linhas curriculares preconizam a formação de crianças plenas e socialmente

despertas para o exercício da cidadania, tendo em vista “uma educação rica e geradora de

indivíduos equipados com ferramentas para aprender e querer aprender”, segundo

descreve Costa (2016:4) nesse documento. Esclarece ainda a importância da “educação

para os valores”, do “reconhecimento das características individuais” e da “educação para

a cidadania” (2016: 33-39), para o desenvolvimento de cidadãos conscientes. O esquema

da figura 3 ilustra a organização geral das OCEPE.

Capítulo 1 - A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

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38

Figura 3 – Organização das Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar

Fonte: (Silva et al, 2016:7)

É importante salientar que cada criança é um ser único, com competências,

características e interesses distintos, que aprende de forma própria no decorrer do seu

processo de desenvolvimento, sendo que o desenvolvimento e a aprendizagem da criança

vão construir-se numa conjuntura de interação social com o meio envolvente. Assim, este

documento encontra-se organizado em diferentes dimensões: (i) observar, registar e

documentar; (ii) planear; (iii) agir; (iv) articular; (v) comunicar e articular.

A sua ação educativa é centrada numa perspetiva globalizante, onde se integram

as três áreas de conteúdo da educação pré-escolar. De acordo com Vasconcelos (2012),

esta conceptualização foi inovadora, demonstrando ser uma alternativa à tradicional

divisão de “áreas de desenvolvimento” a que os educadores estavam acostumados. De

Capítulo 1 - A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

_____________________________________________________________________

39

acordo com a mesma autora, as áreas de conteúdo representam uma forma de os

educadores pensarem e organizarem a sua intervenção educativa com o grupo, assim

como o leque de experiências que proporcionam às crianças. Esta planificação por áreas

decorre de acordo com dois princípios orientadores: (i) continuidade educativa, “o ponto

de partida é aquilo que as crianças já sabem, criando condições para posteriores

aprendizagens (Ibidem, p. 26); (ii) intencionalidade educativa, “resultado do processo de

observação, planificação, ação e avaliação, assumido pelo educador com o objetivo de

fazer coincidir as propostas educativas com as necessidades da crianças” (Ibidem).

Existem pontos de vista, nomeadamente Gaspar (1998, citado em Vasconcelos,

2012) que defendem que esta divisão por áreas de conteúdo patente nas OCEPE vai ao

encontro da perspetiva sócioconstrutivista de Lev Vygotsky, pois são baseadas:

no princípio de que, só através das relações com os outros (área de desenvolvimento pessoal

e social) se pode formar uma identidade pessoal como membro do mundo físico e social (área

de conhecimento do mundo). Para encontrar o sentido desse Mundo é necessário o uso de

sistemas simbólico-culturais (área de expressão-comunicação). (Ibidem, p. 27).

Desta forma, são descritas as linhas descritivas das áreas de conteúdo para a

educação pré-escolar, são elas:

(a) Área de formação pessoal e social: é considerada uma área

transversal ao trabalho educativo no pré-escolar e vai incidir no

desenvolvimento de atitudes e valores, que permitam à criança vir a tornar-

se num cidadão civicamente consciente;

(b) Área de expressão e comunicação: abrange diferentes formas

de linguagens, imprescindíveis para a interação da criança com os outros.

Estas vão permitir à criança dar sentido e representar o mundo envolvente.

Esta área comporta diferentes domínios: (1) domínio da educação física;

(2) domínio da educação artística - bastante específico devido às diferentes

linguagens artísticas que vão corresponder a subdomínios: (2.1.) artes

visuais; (2.2.) jogo dramático/teatro; (2.3.) música e dança; (2.4.) domínio

da linguagem oral e abordagem à escrita; (2.5.) domínio da matemática;

(c) Área de conhecimento do mundo que preconiza a abordagem de

diferentes ciências, de modo articulado, num processo de observação,

questionamento, registo e conclusão, que permite à criança compreender o

meio que a rodeia.

Capítulo 1 - A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

_____________________________________________________________________

40

As OCEPE defendem a diversificação de atividades, indo ao encontro da

perspetiva da Unesco (2009), que estabelece que o ensino das artes e humanidades, as

atividades multimédia ou os passeios a diversos locais, ajudam as crianças a

desenvolverem as “capacidades críticas indispensáveis para contrapor pontos de vista

unilaterais, facilitam a adaptação a um ambiente social e culturalmente diversificado e

oferecem uma resposta aos desafios do diálogo intercultural” (p.16).

Sendo áreas articuladas, para permitirem uma abordagem integrada e globalizante,

elas salientam dimensões fundamentais no desenvolvimento e formação das crianças,

enquanto seres sociais, ou seja, as áreas de conteúdo:

têm subjacente uma determinada mensagem cultural, na medida em que apontam para

aspetos centrados na criança e para uma abertura ao mundo real, apreendido através dos

processos de interação que estabelece com os diversos sistemas em que está inserida (Leite,

2000:59).

As OCEPE descrevem estas ‘áreas’ de acordo com uma perspetiva holística, como

“âmbitos de saber, com uma estrutura própria e com pertinência sociocultural, que

incluem diferentes tipos de aprendizagem, não apenas conhecimentos, mas também

atitudes, disposições e saberes-fazer” (Silva et al, 2016:31). Pretende-se que a criança

realize aprendizagens com sentido, pois só assim será capaz de as interiorizar e utilizar

noutras situações.

Nestas aprendizagens está contemplado o ato de brincar, pois é através deste que

as crianças comunicam e é através do envolvimento ativo no mesmo que a aprendizagem

vai acontecendo, sendo importante para oportunidades de desenvolvimento da auto-

confiança, autonomia, iniciativa, empatia e confiança no outro (Hohmann e Weikart,

2004), assim como de diversos tipos de conhecimentos, como a matemática ou a ciência.

Existe assim uma complementaridade entre o brincar e as diversas aprendizagens a

efetuar nas três áreas de conteúdo, pois, de acordo com Vasconcelos (2012), a atividade

lúdica não apresenta uma oposição às propostas curriculares, que se apresentam com

intencionalidade educativa e por isso deve integrar e dinamizar essas mesmas propostas.

Vai ser no contexto da educação pré-escolar que a criança vai despertar para as interações

sociais, iniciando a construção do seu processo de aprendizagem.

É de referir que a designação dada às áreas de conteúdo apresenta similaridades

com outros níveis de ensino, facilitando assim a continuidade educativa e articulação com

o 1º ciclo do ensino básico.

Capítulo 1 - A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

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Como instrumento regulador da educação pré-escolar, as OCEPE são um

instrumento notável para promover uma educação pré-escolar de qualidade e

“positivamente estimula[m] aprendizagens para viver num mundo multicultural” (Leite,

2000:59). A mesma autora revela que existem “mensagens culturais” através das linhas

expositivas das OCEPE. É evidenciada:

(i) a ausência de processos de assimilação e homogeneização cultural, conforme

se salienta no documento:

todas as crianças, independentemente da sua nacionalidade, língua materna, cultura, religião,

etnia, orientação sexual de membro da família, das suas diferenças a nível cognitivo, motor

ou sensorial, etc., participam na vida do grupo, sendo a diversidade encarada como um meio

privilegiado para enriquecer as experiências e oportunidades de aprendizagem de cada

criança (Silva et al, 2016:10).

(ii) o conceito de educação para o bilinguismo cultural, tendo em conta as várias

culturas, criando condições para a aquisição e saberes de outras culturas. As OCEPE

preconizam aprendizagens a desenvolver neste âmbito, tais como:

(a) Conhecer e aceitar as suas características pessoais e a sua identidade social e cultural,

situando-as em relação às de outros; (b) Reconhecer e valorizar laços de pertença social e

cultural; (c) Conhecer e respeitar a diversidade cultural.” (Ibidem, pp.42-95).

(iii) o respeito pela criança e pelo seu desenvolvimento social, visível na

atribuição da importância dada à ação da criança na organização da sala, na tomada de

decisões e na aprendizagem de vivências democráticas, tal como podemos perceber nas

afirmações seguintes:

(a) ao participarem no planeamento e avaliação, as crianças estão a colaborar na construção

do seu processo de aprendizagem; (b) Na educação pré-escolar, o grupo proporciona o

contexto imediato de interação social e de socialização através da relação entre crianças,

crianças e adultos e entre adultos. Esta dimensão relacional constitui a base do processo

educativo; (Ibidem, pp. 24-26).

(iv) o conceito de cultura, enquanto um processo dinâmico, em que a criança

participa, dando como exemplo a apologia da valorização da experiência das crianças e

do seu meio e o reconhecimento do espaço exterior da instituição, com espaço educativo,

avançando que se devem:

(a) Estabelecer relações entre o presente e o passado da sua família e comunidade,

associando-as a objetos, situações de vida e práticas culturais; (b) O espaço exterior é

igualmente um espaço educativo pelas suas potencialidades e pelas oportunidades

Capítulo 1 - A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

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42

educativas que pode oferecer (…) é um local privilegiado para atividades da iniciativa

das crianças que, ao brincar, têm a possibilidade de desenvolver diversas formas de

interação social e de contacto e exploração de materiais naturais. (Ibidem, pp. 27-95).

(v) o exercício da cidadania, desenvolvido como um tema transversal, tal como fica

expresso:

a participação das crianças no processo educativo através de oportunidades de decisão em

comum, de regras coletivas indispensáveis à vida social e à distribuição de tarefas necessárias

à organização do grupo constituem experiências de vida democrática que permitem tomar

consciência dos seus direitos e deveres (Ibidem, p. 25).

Desta forma, numa perspetiva “intermulticultural” (Vasconcelos, 2012), não

devemos esquecer que o jardim de infância é, por excelência, um espaço de cruzamento

de culturas e saberes, devido maioritariamente à globalização e à diversidade cultural das

famílias. A autora advoga que na educação de infância as aprendizagens devem ser

integradas através de projetos com “sentido cultural, estético e ético, que conduzam as

crianças e adultos a novos patamares do conhecimento, incluindo competências

sofisticadas e a qualidade das interações humanas” (Ibidem, p. 39). A Unesco (2013)

salienta também que os educadores devem disseminar as ideias relacionadas com a

pluralidade intercultural, a diversidade e os direitos humanos mais amplamente.

A educação pré-escolar promove, assim, a existência de um ambiente educativo

aberto à inclusão e à diversidade presente na sala e/ou grupo, focando-se no

desenvolvimento de uma intervenção educativa de qualidade. Sendo que os pressupostos

pedagógicos da educação intercultural vão impreterivelmente buscar respostas educativas

para a diversidade cultural observável atualmente nas sociedades e para a convivência

entre seres humanos, a educação pré-escolar deve gerar estratégias para ir ao encontro

destas necessidades, o que implicará uma reflexão ponderada acerca das práticas

educativas empregues em contexto de sala. Estas práticas deverão ter como base as

OCEPE e os seus pressupostos educativos, que se identificam com as conceções da

educação intercultural. Tal como escreve Giménez Romero (2003:21):

El educador sabrá ver semejanzas y diferencias y no confundirlas com las igualdades y

desigualdades. Finalmente esos alunos y alumnas han sido socializados en el ámbito de una

determinada cultura, o en varias en interacción, y tiene formas de ser, pensar, sentir, decir y

actuar que está pautadas culturalmente. También en este tercer reino identificará

convergencias, divergencias, etc. La maestra o maestro interculturalista sabrá distinguir entre

lo personal, lo situacional y lo cultural, y prestará atención a cómo se interrlacionam.

Capítulo 1 - A Educação Pré-Escolar e a Educação Intercultural

_____________________________________________________________________

43

No jardim de infância, a existência de grupos com idades diferentes, vai acentuar

a diversidade, enriquecendo assim as interações no seio do grupo e fomentando diversas

ocasiões de aprendizagem criança-criança, mas também adulto-criança (Silva et al,

2016).

Devemos olhar para as crianças como sujeitos educativos, tendo em atenção as

“suas singularidades e não somente a partir dos padrões homogéneos e

desenvolvimentistas, valorizando a sua ação e autonomia e não somente a sua submissão

ao conhecimento adulto” (Tomás e Fernandes, 2013:209). Cameron (2001:185) defende

que “the use of choice points contributes to children’s capacities for self-directed learning

by giving them supported practice in making decisions as learning proceeds.” Este

processo contribui para a aprendizagem de todos, na medida em que vai permitir

aprendizagens e trabalho cooperativo, o que constitui uma excelente oportunidade para

desenvolver competências ao nível sociorelacional.

Capítulo 2 - Os projetos participativos

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CAPÍTULO 2

OS PROJETOS PARTICIPATIVOS

“O modo como se aprende tem influência na construção pessoal, social, cívica e cognitiva de quem

aprende.” (Oliveira-Formosinho, Gambôa, Formosinho e Costa, 2011: 26)

Santiago et al (2013) expõem a visão de conceber a escola como um espaço onde

são construídas formas de relação não hierarquizadas, contrariando a visão tradicional

que “evidencia uma lógica homogeneizante do conhecimento, na qual se exerce o poder

hegemônico dos professores e professoras sobre os alunos” (p.184). Salienta ainda a

existência de estruturas disciplinares elaboradas a partir de conceções estereotipadas, não

tendo em conta a escola como local de encontro entre diferentes identidades e culturas.

A pedagogia tem como objeto de situação de estudo os ideais da educação,

acompanhando as suas premissas, métodos e estratégias. Deve saber “criar, recriar,

inovar, transformar, definir, especificar segundo a realidade educativa” (Mendonça,

1994:88). Organiza-se de acordo com saberes, saberes esses que se vão construir pautados

na articulação entre teoria, crenças e ação pedagógica. Com efeito, “convocar crenças,

valores e princípios, analisar práticas e usar saberes e teorias constitui um movimento

triangular da pedagogia” (Oliveira-Formosinho et al, 2011:13).

Assim, o cerne da pedagogia está assente no pilar da democracia, o que conduz

impreterivelmente à igualdade de oportunidades e à inclusão, tendo em conta todas as

formas de diversidade, pois esta “avança porque ajuda os indivíduos a identificarem-se

com a sociedade em que vivem e porque ela garante o exercício de poder e a tomada de

decisões legítimos” (Conselho da Europa, 2008:23). Para Cortesão e Stoer (1996:75), “a

grande aposta para o desenvolvimento da escola joga-se, pois, na criação de culturas de

colaboração e cooperação.” Neste âmbito, surge o seu segundo pilar, as interações, ou

seja, a participação das crianças no processo educativo, a oportunidade de decisão em

comum, de regras coletivas fundamentais à vida social e de distribuição de tarefas a fim

de organizar o grupo. Todas elas constituem experiências de vida democrática que

permitem tomar consciência dos seus direitos e deveres, indo ao encontro de princípios

que Silva et al (2016) defendem nas OCEPE.

Oliveira-Formosinho et al (2009, 2011) apoiaram a definição dos princípios

democráticos acima mencionados, nas pedagogias de Piaget, Dewey, Freinet, Malaguzzi

Capítulo 2 - Os projetos participativos

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45

e Vygotsky, pois acreditam que todos somos “seres livres e colaborativos e com

capacidade para pensamento e ação reflexiva e inteligente” (Ibidem, 2011: 17).

Esta premissa democrática é o ponto de partida para que todos, desde idades

precoces, comecem a compreender e a interiorizar a importância do respeito por todos e

do diálogo intercultural (Conselho da Europa, 2008) entre indivíduos e grupos

intervenientes no processo educativo, da aprendizagem cooperativa e da procura de

sucesso educativo, num contexto de respeito pelos direitos humanos e de respeito pelos

direitos da criança (Ibidem; Unesco, 2009).

2.1. A pedagogia em participação: o papel da criança e do educador

Para Oliveira-Formosinho et al (2011), a pedagogia concentra-se em dois modos

fundamentais: o modo de transmissão e o modo de participação. O primeiro centra-se no

conhecimento que se pretende transmitir. Esta pedagogia:

“define um conjunto mínimo de informações essenciais perenes de cuja transmissão faz

depender a sobrevivência de uma cultura e de cada indivíduo nessa cultura. A essência deste

modo de transmissão é a passagem deste património cultural ao nível de cada geração e de

cada indivíduo” (Ibidem, p. 14).

Neste, o educador/professor é visto como um mero transmissor de conhecimento

e o processo de ensino-aprendizagem é baseado na memorização de conteúdos, sendo um

modo standard de transmissão de saberes. Como é lógico este método tem um índice de

interações adulto-criança muito reduzido.

O segundo modo, de participação, vai focar-se nos atores, que vão ajudar a

construir o conhecimento através da participação nos processos de aprendizagem e na

documentação que deles decorrer. A tarefa de responder eficientemente à crescente

diversidade de alunos, todos eles com igual direito a uma escolaridade e a um ensino de

qualidade é a aprendizagem colaborativa (Cortesão e Stoer, 1996). Esta preconiza a

criança como um ser competente, que colabora no quotidiano educativo, um “sujeito e

agente do processo educativo” (Silva et al, 2016:9), “competente e participativo tem

influência no modo de aprender, nos conteúdos do aprender e na estabilidade das

aprendizagens” (Oliveira-Formosinho et al, 2011:26).

Capítulo 2 - Os projetos participativos

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46

Assim, o educador/professor funciona como organizador do ambiente educativo,

observando a criança e guiando-a neste processo. Deve documentar a participação das

crianças, fomentando a observação, a análise e a compreensão do mundo, de modo a que

as crianças possam transformar aprendizagens experienciais em aprendizagens

significativas. Então, a pedagogia em participação pode ser definida como:

a criação de espaços e tempos pedagógicos onde a ética das relações e interações permite

desenvolver atividades e projetos que valorizam a experiência, os saberes e as culturas das

crianças em diálogo com os saberes e culturas dos adultos. Uma pedagogia de infância

participativa é, na essência, a criação de espaços-tempo pedagógicos onde as interações e

relações sustentam atividades e projetos que permitem às crianças co-construir a sua própria

aprendizagem e celebrar as suas realizações (Oliveira-Formosinho, Costa e Azevedo, 2009:7-

8).

Esta pedagogia tem como objetivos: (i) apoiar o envolvimento da criança, através

de uma continuidade experiencial da vida democrática; (ii) viver a ‘experiência’; (iii) dar

significado à ‘experiência’; (iv) construção de aprendizagem através das experiências

interativas e contínuas; (v) promover o desenvolvimento. A atividade das crianças é

exercida quer em colaboração com os pares, quer em colaboração com os educadores,

“numa epistemologia de natureza construtiva, interativa e colaborativa” (Oliveira-

Formosinho et al, 2011:18).

Na pedagogia em participação a intencionalidade educativa é sustentada por eixos

pedagógicos interdependentes, que pretendem que o processo educativo contribua para o

desenvolvimento das identidades sócio-histórico-culturais dos sujeitos. São eles: (1.º)

eixo ser-estar: explora a pedagogia do ‘ser’ de forma intencional, cultivando identidades

para fazer emergir aprendizagens; (2.º) eixo pertencer-participar: explora as relações,

iniciadas no sentimento de pertença à família e progressivamente alargado à sua cultura,

à comunidade envolvente, ao jardim de infância, etc. A participação adquire sentido no

contexto dos laços de pertença desenvolvidos; (3.º) eixo explorar-comunicar: define uma

pedagogia de aprendizagem experiencial, ou seja, experimentar continuamente e

interativamente, refletindo e comunicando durante o processo de aprendizagem; (4.º) eixo

da narrativa das jornadas de aprendizagem: aprender com a experiência e posteriormente

transmitir oralmente o que aprendeu.

Nos quatro eixos a aprendizagem é realizada através da construção das identidades

dos sujeitos, realizadas no âmbito das relações que sustentam o reconhecimento das

Capítulo 2 - Os projetos participativos

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47

semelhanças e diferenças dos sujeitos e intervenientes educativos, sendo que existe entre

eles uma “interconcectividade e interatividade” (Oliveira-Formosinho et al, 2011:21).

Os autores destacam ainda quatro áreas de aprendizagem experiencial, decorrentes

dos eixos pedagógicos, esquematizadas no diagrama da figura 4:

Figura 4 – Áreas de Aprendizagem da Pedagogia em Participação

Fonte: (Oliveira-Formosinho et al, 2011:24)

As duas primeiras áreas de aprendizagem - identidades e relações - surgem do

cruzamento dos eixos - ser-estar e pertencer-participar. Estas são áreas essenciais para

explorar, daí que o educador deva promover experiências neste âmbito. As outras duas

áreas - linguagens e significados- surgem do cruzamento dos eixos - explorar-comunicar

e narrativa das jornadas de aprendizagem - as experiências nas diferentes áreas de

conteúdo a nível de aprendizagens cognitivas, psicológicas e sociais são o meio de

aprendizagem da criança. Importante salientar que a aprendizagem dos “instrumentos

culturais” está presente em aprendizagens como a linguagem oral e escrita, pois ao narrar

o que aprendeu, a criança desencadeia um processo de significação do mundo.

Oliveira-Formosinho e Araújo (2011:233) reforçam que esta perspetiva pedagógica

considera que:

from birth, pedagogical environments need to offer each child the opportunity to respect and

appreciate all differences present: diversities in families, diversities in peers, diversity in

community, culture and nature. Through early supported explorations, in collaborative

Capítulo 2 - Os projetos participativos

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journeys, children became aware of diversities, learn about diversities and celebrate them, in

a daily process of cultivating respect for others and oneself.

Assim, para desenvolver uma pedagogia em participação, os responsáveis

educativos devem ter em atenção a organização do ambiente educativo nas suas múltiplas

dimensões:

(i) o espaço pedagógico [ênfase adicionado]; (ii) o tempo pedagógico [ênfase

adicionado]; (iii) as interações e relações pedagógicas [ênfase adicionado]; (iv) os

materiais pedagógicos; (v) a organização de grupos; (vi) a observação; (vii) a planificação

e avaliação; (viii) projetos e atividades, o que vai ao encontro das orientações curriculares

estabelecidas para a educação pré-escolar (Silva et al, 2016). Documentar e refletir é

essencial para o educador (Pereira, 2004), pois o ciclo reflexivo engloba a reflexão acerca

do “conteúdo do que ensina, o contexto, a competência didática e as finalidades do

ensino”(p.102), promovendo a construção do conhecimento das crianças, com base na

experiência educativa.

De acordo com Oliveira-Formosinho et al (2009), para desenvolver uma

pedagogia participativa, são três os elementos essenciais - já mencionados acima - que

influenciam a qualidade do quotidiano e estruturam a organização do trabalho na

educação pré-escolar: (1) o espaço pedagógico deve ser organizado para a aprendizagem,

aberto às vivências e interesses das crianças e comunidades, plural, diverso, lúdico e

cultural. O espaço físico vai exercer um papel ativo no processo educativo, devendo o

educador ter a responsabilidade de criar um ambiente adequado, “rico e estimulante que

permita, e potencie, o desenvolvimento global das crianças” (Zabalza, 1998:123), sendo

que “a[s] própria[s] criança[s] se converte[m] em protagonista[s]” (Ibidem, p.157) ; (2)

o tempo pedagógico que organiza a rotina diária, que respeita os ritmos das crianças e as

suas aprendizagens, integrando uma dinâmica participativa num contexto de ensino-

aprendizagem. Pretende-se construir “uma unidade de tempo semelhante à que cada

criança vive no universo das suas relações pessoais” (Mendonça, 1994:52); (3) as

interações e relações pedagógicas que concretizam esta pedagogia. O desenvolvimento

da identidade pessoal da criança vai-se desenvolvendo ao longo das interações que vai

experienciando (Hohmann e Weikart, 1995). Assim:

desenvolver as interações, refleti-las, pensá-las, reconstruí-las é uma experiência

profissional incontornável. A pedagogia participativa é uma proposta que honra as

identidades relacionais e as relações identitárias como condição prévia de aprendizagem

experiencial. (Ibidem, p.9).

Capítulo 2 - Os projetos participativos

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49

Desta forma, a identidade vai construir-se a partir das interações sociais (Fontoura,

2005). É essencial reforçar o papel das interações na pedagogia participativa, pois estas

são o foco da concretização desta pedagogia. Então:

el desarrollo humano, tanto a nivel individual como social, involucra dos procesos

simultáneos que han de promoverse através de la educación: la socialización y la

individuación. La socialización implica que las nuevas generaciones se apropien de los

contenidos de la cultura y adquieran las competencias necesarias para ser miembros activos

en dicha cultura. (Guijarro, 2005: 13)

Desta forma, salienta-se o papel do contexto socio-pedagógico, assim como a sua

importância para sustentar e promover a “co-construção” das aprendizagens, assim como

o tempo de pequeno/grande grupo e as interações estabelecidas, visto que estas serão

“mediadores centrais do experienciar, refletir, aprender através de atividades e projetos”

(Oliveira-Formosinho et al, 2011:27). Devido ao facto de as interações serem o núcleo da

pedagogia em participação, serão focados aspetos diretamente relacionados com o papel

do adulto e da criança neste processo.

A relação adulto-criança é especialmente importante, pois deve promover a

aprendizagem experiencial participativa e transformativa. Para Lopes e Silva (2008), esta

relação é determinante na vida escolar da criança, tendo o educador que ajudar a criança

a compreender que esta, é um ator das suas próprias aprendizagens. Trata-se de um:

processo marcadamente interativo, através do qual o aprendente vai-se apropriando do

objetivo e do procedimento da tarefa, e para tal quem ensina deve-se ir apropriando das

respostas (…), dotando-as de um significado ao integrá-las na sua própria compreensão da

tarefa” (Díaz-Aguado, 2000:137).

Assim, nesta pedagogia, a partilha de controlo do tempo pedagógico vai permitir ao

educador realizar novas atividades, estimulando processos de explicação, questionamento

e avaliação, que por si mesmos vão melhorar a interação entre os alunos, assim como a

qualidade pedagógica (Hohmann e Weikart, 1995; Díaz-Aguado, 2000; Formosinho,

Katz, McClellan e Lino, 2001). Na educação pré-escolar são muitos os momentos de

partilha: partilha do espaço, de afetos, de situações, de ideias, de decisões, de problemas,

de soluções, etc. Estes momentos apelam à reciprocidade e ao desenvolvimento social,

estabelecendo o direito de participação (Hohmann e Weikart, 1995; Formosinho et al,

2001), o que “constrói uma textura social básica propiciadora de que a criança faça uma

Capítulo 2 - Os projetos participativos

_____________________________________________________________________

50

progressiva construção de equilíbrios entre direitos e deveres” (Formosinho et al, 2001:

63).

O educador deve, assim, articular as temáticas com os objetivos gerais previstos

para o ano letivo, assim como estabelecer quais os conteúdos que vão ser trabalhados,

sempre numa ótica de estimular o desenvolvimento mental da criança (Barbosa e Horn,

2008). Então, através de uma reflexão sobre as finalidades da sua prática e de um processo

pedagógico estruturado, o educador vai procurar planear a sua ação, tendo em conta o

grau de desenvolvimento e o ritmo individual de cada criança, tendo como objetivo o

desenvolvimento integral da criança e como princípio pedagógico o “reconhecimento da

capacidade da criança para construir o seu desenvolvimento e aprendizagem (…)

encarando-a como sujeito e agente do processo educativo (…)” (Silva et al, 2016: 8). A

dimensão multicultural implica que os educadores se consciencializem desta

problemática tão emergente. Envolve “uma permanente articulação entre os conteúdos,

os processos de ensino/aprendizagem e a realidade sociocultural envolvente” (Marques e

Borges, 2012:99).

Díaz-Aguado (2000) sugere estratégias para favorecer a adaptação à diversidade na

pedagogia participativa, tais como: (i) estudar a diversidade existente no grupo para

formar equipas; (ii) selecionar tarefas que estimulem a construção do conhecimento em

cada grupo; (iii) ensinar a cooperar e a resolver conflitos de forma positiva; (iv) observar

as interações, tendo atenção a todos os sujeitos educativos; (v) explicar os critérios de

avaliação, para que todos os compreendam e os considerem justo; (vi) distribuir as

oportunidades de protagonismo; (vii) proporcionar oportunidades e reconhecimento para

comprovar o progresso de todos os alunos. Formosinho et al (2001) defendem que o

educador pode ajudar a aproximar crianças de culturas diferentes, fazendo respeitar as

normas culturais, assim como os valores das relações sociais que a criança traz do seio

familiar, ajudando a integrá-la na escola e na cultura escolar.

Este ‘jogo’ educativo permite que o educador assuma o papel de mediador cultural

junto das crianças, facilitando os processos de interação, levando os seus alunos a

conhecer-se, a descobrir formas de conversar, de pensar e de ver o mundo, diminuindo

assim a distância entre este e as crianças e melhorando as relações. O educador é, então,

um agente educativo que possui autonomia pedagógica para criar espaços e condições

para a igualdade de oportunidades a nível educativo, “adequando o currículo formal à

heterogeneidade étnica e cultural dos seus discentes” (Oliveira e Sequeira, 2012:8). A

exigência de respostas a todas as crianças vai pressupor uma pedagogia diferenciada,

Capítulo 2 - Os projetos participativos

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51

centrada na cooperação, sendo que cada criança vai beneficiar dos processos educativos

desenvolvidos com o grupo, o que vai ao encontro de uma pedagogia de aprendizagem

cooperativa, tal como sustentado pelas OCEPE. Assim, o educador deve adequar o

currículo, promovendo atividades dirigidas individuais e atividades de interação

cooperativa de grupo de forma equilibrada.

Candau (2008, citado por Santiago et al, 2013:181) defende os educadores como

propulsores de uma prática pedagógica baseada na negociação cultural e na necessidade

de compreender a escola como um espaço crítico de produção cultural. Ou seja, o

educador parte do contexto e das experiências de cada criança, promovendo a partilha de

diferentes perspetivas, reconhecendo a existência de vários contextos socioculturais e a

particularidade de cada um deles, através da promoção de interações entre os

intervenientes.

Atentemos que, para além de aluno, a criança assume outros papéis na sociedade,

papéis esses que decorrem das:

relações heterogéneas estabelecidas no tecido social onde se movimenta: com a família; com

os amigos; com uma heterogeneidade de outros atores sociais que com maior ou menor

expressão vão influenciar e (serem influenciados) o seu posicionamento nas diversas

estruturas sociais que habita (…) a participação das crianças apresenta-se, assim, como um

instrumento emancipatório e radical para a reconstrução de uma cidadania compósita, que

entenda a criança como um actor social, activo no exercício concreto da ação social e, por

isso mesmo, também na construção da sua identidade pessoal, social e política (Tomás e

Fernandes, 2013:210-212).

Os mesmos autores promovem a implementação de lógicas de ação nas escolas,

com o intuito de mobilizar os contributos das crianças e dos adultos na construção

democrática das suas vidas.

Quando a relação com os pares é adequada, esta vai proporcionar um contexto

estimulante para adquirir competências sociais, tais como a cooperação, a negociação,

comunicação ou a capacidade de empatia, essenciais à vida em sociedade e a uma

cidadania plena, e também competências cognitivas (Formosinho et al, 2001; Lopes e

Silva, 2008). Tal como defendem Ellis e Brewster (2014:52) num ambiente de

aprendizagem inclusivo, as crianças vão desenvolver “empathy and an understanding of

differences as well as a positive understanding of themselves and others.” De acordo

como Díaz-Aguado (2000), ao darmos às crianças protagonismo na sua própria

aprendizagem, vamos alterar o processo de construção do conhecimento, a motivação

Capítulo 2 - Os projetos participativos

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52

geral pela aprendizagem e aumentar o seu reportório social. Zabalza (1998) estabelece

que existem sentimentos que estão na base da inteligência das crianças. Sentimentos

como, eficiência e competência vão motivar as crianças e dar sentido às suas ações, assim,

“a criança está em desenvolvimento e o caminho a percorrer é o da aprendizagem” (Lopes

e Silva, 2008:34).

Barbosa e Horn (2008) tem uma perspetiva semelhante, perspetiva essa que vai ao

encontro da visão de Vygotsky, que realça o caráter social da aprendizagem e advoga que

as atividades com ênfase nesta aprendizagem têm como objetivo promover a realização

pessoal, fazendo com que os membros do grupo se sintam responsáveis pelos seu sucesso

e pelo dos outros. A cooperação é essencial para a compreensão da escola como:

“promotora do pensamento crítico, criativo e de valores que intensificam o sentido da

aprendizagem e das relações humanas. Desta forma, os conflitos, as oposições e a

diversidades dos vários pontos de vista, constituem a trama de fundo da cooperação (…).

Esta aprendizagem promove a autonomia, porque faz com que os intervenientes se sintam

resposáveis por si próprios e pelas construção e aquisição de conhecimentos, em cooperação

com os demais elementos envolvidos no processo, alargando estas conduta ao quotidiano

letivo ” (Ibidem, p.60-63).

A relação de pares deve ser vista numa perspetiva sociocolaborativa, valorizando

durante a rotina diária “modos de participação e envolvimento das crianças na co-

construção da aprendizagem experiencial – individualmente, em pares, em pequenos

grupos, em grande grupo” (Oliveira-Formosinho et al, 2011:32). Para Lopes e Silva

(2008), o elemento que faz com que os membros do grupo trabalhem juntos e de forma

ativa - a interdependência positiva - é o núcleo da aprendizagem cooperativa. Assim, ao

partilharem materiais, subdividirem tarefas/atividades ou atribuindo papéis aos elementos

do grupo, as crianças vão integrar esta capacidade e tendo em conta “o mundo complexo

e superpovoado em que vivemos é essencial reconhecer o valor no trabalho de grupo”

(p.6). Referem ainda que para o processo de aprendizagem melhore significativamente,

as crianças devem avaliar as suas ações e tomar decisões acerca das suas condutas, o que

também vai fortalecer o desenvolvimento das competências interpessoais.

Díaz-Aguado (2000) defende que na aprendizagem cooperativa, a aquisição dos

processos cognitivos superiores se vai gerar através de atividades sociais, nas quais cada

sujeito participa. Assim, cada educador deve proporcionar “sistemas de interação social”,

para aumentar a quantidade, assim como a qualidade das interações. Assim, um dos

grandes objetivos desta perspetiva é permitir que cada criança se transforme num

Capítulo 2 - Os projetos participativos

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53

indivíduo consciente dos seus direitos e também das suas responsabilidades (Fontes e

Freixo, 2004). Para Barbosa e Horn (2008), os conhecimentos adquiridos através da vida

cooperativa e coletiva alargam o conhecimento em geral, “enriquecendo o espírito e

oferece significação mais profunda à vida” (p.88).

Desta forma, podemos inferir que, no contexto da pedagogia participativa, a

atividade do adulto é organizar o ambiente, escutar, observar, documentar, avaliar e

promover estratégias lúdicas e pedagógicas, que potenciem a aquisição de competências

fundamentais, através de um ambiente determinante para a educação, a todos os níveis.

As crianças têm com atividade, questionar e cooperar na planificação das atividades ou

projetos a implementar (Malavasi e Zoccatelli, 2013). Deste modo, a pedagogia em

participação é “uma proposta que incorpora a coconstrução da aprendizagem no fluir das

interações pedagógicas” (Oliveira-Formosinho et al, 2011:31), pois estas interações terão

grande influência na construção do conhecimento e nas aprendizagens da criança.

Entendemos, assim, que no pré-escolar a “conceção de igualdade predominante

no contexto escolar incorre em um processo de padronização, orientando à formação de

uma cultura comum a todos” (Santiago et al, 2013:99). A perspetiva leva a que o educador

se posicione em relação ao seu grupo, aos seus saberes e também à diversidade cultural,

assumindo a diferença, mas também valorizando o comum. É fundamental que o trabalho

pedagógico seja “voltado para as diferenças enquanto oportunidade e enriquecimento no

processo de ensino-aprendizagem. A articulação dos conceitos de diferenças, identidades

e igualdade se faz no cotidiano escolar que busca o desafio de práticas interculturais”

(Ibidem, pp. 45-46).

Santiago et al (2013) advogam que as relações interculturais são essenciais na

promoção da convivência entre grupos, permitindo a construção de novas aprendizagens

“numa teia complexa de significações diversas” (p. 185). Díaz-Aguado (2000) preconiza

que a aprendizagem cooperativa em equipas heterogéneas proporciona novas formas de

definir o papel dos alunos, o que origina mudanças no papel dos professores e a resolução

dos problemas dos métodos tradicionais de ensino. Assim, este método é eficaz para

adaptar o ensino às mudanças atuais das sociedades e ao objetivo primordial da perspetiva

intercultural: a defesa da igualdade num contexto de diversidade.

Os sistemas sociais implicam relações de interdependência entre pessoas e/ou

grupos (Fontoura, 2005). Assim sendo, o desenvolvimento da confiança nos outros, da

autonomia, da capacidade de iniciativa, da empatia e da autoconfiança vão fornecer a base

para a socialização da vida - quer em criança, quer em adulto - ou seja, os alicerces das

Capítulo 2 - Os projetos participativos

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54

relações humanas. Estas capacidades vão ser facilitadas e desenvolver-se “num contexto

de aprendizagem que apoie o desenvolvimento das relações sociais positivas” (Hohmann

e Weikart, 1995:65), pois quanto mais novas forem as crianças, maiores serão as

probabilidades de que a interação facilite a aprendizagem (Katz e Chard, 1997). Para

Formosinho et al (2001) os alicerces para que a aprendizagem funcione de forma correta,

eficaz e com uma base sólida nos contextos sociais, está assente nos primeiros seis anos

de vida. Sendo que as crianças passam grande parte do seu dia no jardim de infância, em

contexto de grupo, os adultos detêm aqui uma oportunidade única para contribuírem “para

os processos de construção de uma sólida base para a aprendizagem social das crianças”

(p.47). O trabalho de equipa é um processo interativo e vai promover o envolvimento das

crianças numa comunidade ativa e participante.

Promover a interculturalidade só é possível com a participação ativa de todos os

intervenientes no processo educativo, sendo que os educadores/professores tem uma

importância particular. Nesta ótica, o educador deve ainda considerar a importância dos

pais no processo educativo dos filhos, estimulando a colaboração ativa destes, propondo-

lhes que realizem atividades motivantes para os seus educandos, dando continuidade ao

trabalho desenvolvido no jardim de infância e envolvendo-os neste. Desta forma os pais

podem também compreender a utilidade das aprendizagens feitas pelos filhos no jardim

de infância. “ Cooperar [ênfase no original] é a palavra-chave nas relações pais-escola.

Os pais devem ser a ponte entre a escola e a vida.” (Lopes e Silva, 2008:5)

2.2. O trabalho de projeto e a relação escola-família

A palavra projeto está ligada à previsão de algo que se pretende efetuar.

Corresponde “ao esboço de uma visão de futuro que se pretende atingir” (Katz, Ruivo,

Silva e Vasconcelos, 1998: 91), a um estudo profundo de um tópico, desenvolvido por

uma ou mais crianças (Katz e Chard, 1997). De acordo com Boutinet (1996:104), “o

conceito de projeto permite aos indivíduos, chegados a um certo estádio do seu percurso,

antecipar a sequência seguinte. Ele serve, pois, para definir as condições de escolha e de

orientação que se colocam nas etapas-chave da existência (…).” Este autor defende que

o projeto está presente em todas as fases da nossa vida, sendo a sociedade em si vista

como o produto de um projeto e regida por projetos, assim, este é encontrado nas situações

quotidianas da existência humana. Nas palavras de Capucha (2008:7):

Capítulo 2 - Os projetos participativos

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55

atuar na lógica de projeto consiste, resumidamente, em operar com base na mobilização de

conhecimento para identificar as ações necessárias à projeção estruturada e organizada de

uma mudança face a uma situação diagnosticada que se pretende alterar dentro de um prazo

definido e mobilizando um conjunto determinado de recursos.

Para elaborar um projeto, existe um processo a seguir, com etapas definidas, de

acordo com Katz et al (1998) serão: (i) porquê? Um ponto de partida, um problema para

resolver, uma curiosidade que desencadeia o processo e traduz a razão da sua existência;

(ii) para quê? A antecipação de um ponto de chegada, ou seja, ter uma ideia de quais as

formas de encontrar uma resposta para o problema/questão, e que explica o sentido do

desenvolvimento do projeto; (iii) como? Prevê o processo para chegar atingir o objetivo

pretendido. A realização de um projeto pressupõe a elaboração de planos, ou seja, os

meios para desenvolver o projeto, definir quem faz o quê, quando e quais são os recursos

a utilizar.

No caso da educação, visto que o projeto é partilhado por um grupo, é

indispensável articular vários “projetos pessoais que ganham uma outra dimensão ao

integrarem-se no projeto coletivo” (Katz et al, 1998:95), possibilitando ao grupo

momentos de autonomia e de dependência, de cooperação e de liberdade, invidualidade

e sociabilidade, interesse e esforço, assim como “momentos de jogo e de trabalho como

fatores que expressam a complexidade do fato educativo” (Barbosa e Horn, 2008:31).

Assim, o projeto vai surgir ligado a algumas características relevantes em educação: (i)

globalização, um conjunto de ações que são necessariamente coerentes com a finalidade

do projeto; (ii) autonomia, sendo os participantes agentes de mudança, com liberdade e

poder, para decidir e influenciar o futuro; (iii) participação, pois vai existir uma

contribuição de diferentes sujeitos, tornando o projeto numa construção interativa e

coletiva.

Especificamente no caso da educação pré-escolar, vão ser visados projetos

educativo-pedagógicos promovidos pelo educador que visam fomentar o

desenvolvimento, assim como a aprendizagem do grupo de crianças, tendo como

participantes o educador, as crianças e eventualmente, os pais e outros elementos da

comunidade educativa, que possam vir a contribuir para o processo de ensino-

aprendizagem. Na visão de Katz et al (1998), este tipo de projetos pedagógicos visa o

desenvolvimento dos alunos, integrando um leque diversificado de atividades

pedagógicas e a abordagem das áreas de conteúdo da educação pré-escolar, “numa

Capítulo 2 - Os projetos participativos

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56

finalidade comum, que liga os diferentes momentos de decisão, planeamento, realização,

avaliação e comunicação”(p. 99). Todo este processo terá em conta as curiosidades e

interesses das crianças, assim como o plano de ação que o educador pretende desenvolver

com o grupo. Através da articulação de ambos, o projeto irá ser desenvolvido

cooperativamente, permitindo uma partilha de poder, para que as crianças possam

introduzir mudanças. Para Barbosa e Horn (2008), os projetos em educação assinalam

uma ação intencional, que é planeada de forma coletiva, com valor educativo e estratégias

concretas e conscientes.

O trabalho de projeto está intimamente relacionado com a pedagogia em

participação, sendo “um meio, um caminho, para a autonomia, para a participação”

(Oliveira-Formosinho et al, 2011:50). É uma perspetiva flexível e inovadora, que vai ao

encontro dos interesses das crianças e é capaz de promover propostas de qualidade para

a educação pré-escolar, assim como “o desenvolvimento intelectual de crianças e,

simultaneamente, dos seus educadores ou professores” (Vasconcelos et al, 2012:11). Esta

metodologia centra-se no destaque dado ao desenvolvimento das competências sociais

das crianças e, à aprendizagem através das interações e das suas experiências pessoais

(Katz e Chard, 1997). As mesmas autoras reforçam o facto de que, no contexto pré-

escolar, o trabalho de projeto e a brincadeira espontânea estão interligados, sendo que um

dá sentido ao outro. Nesta metodologia, as aprendizagens ocorrem a partir de situações

concretas e das interações desenvolvidas num “processo contínuo e dinâmico” (Barbosa

e Horn, 2008:42).

É importante referir que o educador deve refletir em que medida estes projetos

poderão contribuir para alargar os conhecimentos das crianças, levando-as a refletir sobre

o que já sabem sobre o assunto, colocando questões para ajudarem a resolver o problema,

proporcionando-lhes momentos de recolha de informação que alargue os seus

conhecimentos e crie momentos de clima democrático. Deve “locate the representations

of other cultures in the enviroment of the children and use them as starting points for

intercultural information and experience” (Byram, 2008: 81). Então, deve existir um

paralelismo entre o projeto pedagógico de sala e os projetos de investigação a realizar,

tendo finalidades comuns. Deste modo, o trabalho de projeto pode “complementar e

intensificar aquilo que as crianças aprendem com outras partes do currículo” (Katz e

Chard, 1997).

Sendo a primeira infância um momento fundamental para a formação da criança,

vai ser fundamental atender às necessidades e curiosidades e motivações da criança,

Capítulo 2 - Os projetos participativos

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57

tornando-a numa participante ativa na construção do projeto. Nesta ótica o trabalho de

projeto possibilita a abertura a diferentes linguagens, pois todas elas são importantes no

desenvolvimento global (Barbosa e Horn, 2008; Malavasi e Zoccatelli, 2013). Assim,

embora um projeto possa iniciar-se de várias formas, normalmente inicia-se quando uma

ou mais crianças demonstram interesse por um tópico específico, sendo esta (i) a primeira

fase do projeto, em que terá que ser estabelecida uma base comum entre as crianças, com

partilha de informações, troca de ideias e experiências acerca do tema; (ii) posteriormente,

terá lugar o desenvolvimento do projeto, em que o educador terá o papel de incentivar as

crianças a trabalharem de forma mais independente, utilizando as competências que já

adquiriram (observação, comunicação, escrita, desenho, etc.); (iii) finalmente será a fase

das reflexões e conclusões, em que se irá resumir o que se aprendeu, partilhando as

descobertas realizadas (Katz e Chard, 1997). Já para Vasconcelos et al (2012), as fases

de desenvolvimento do trabalho de projeto são: (1) definição do problema; (2)

planificação e desenvolvimento do trabalho, em que se faz uma previsão do possível

desenvolvimento do projeto; (3) execução, em que as crianças vão partir das suas

experiências diretas, para descobrirem o que pretendem saber/fazer; (4)

divulgação/avaliação das descobertas efetuadas. A autora salienta ainda que estas fases

estão interrelacionadas de forma sistémica.

A abordagem por projetos é centrada em problemas, que pretende construir o

conhecimento a partir de uma perspetiva holística e democrática, encarando a criança

como um ser competente, capaz de resolver problemas e de gerir o seu processo de

aprendizagem, com o apoio do adulto. Assim, permite à criança ser ouvida, pois esta tem

“uma voz legítima, com credibilidade científica e pedagógica (…) [com] capacidade

como construtora de conhecimento, capaz de coparticipar na sua aprendizagem”

(Oliveira-Formosinho et al, 2011:72).

Como foi referido anteriormente, esta abordagem pretende que as crianças

interajam com outras crianças e com adultos da sua comunidade, nomeadamente os pais,

avós e/ou outros familiares, que possam contribuir de alguma forma para diferenciar as

trocas de informação e alargar os conhecimentos das crianças, pois cabe ao educador

“encontrar formas de comunicação e estratégias que promovam esse envolvimento e

facilitem a articulação entre os diversos contextos de vida da criança” (Silva et al,

2016:13). Na visão destas autoras, sendo os pais os principais responsáveis pela educação

dos filhos, estes têm o direito de participar e ser integrados no desenvolvimento do seu

percurso pedagógico, sendo-lhes permitido dar “contributos que enriqueçam o

Capítulo 2 - Os projetos participativos

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58

planeamento e a avaliação da prática educativa” (Ibidem, p.16), enriquecendo assim o

processo educativo. Temos que atentar no facto de que a família é o meio natural onde a

criança cresce, sendo através das relações familiares que esta vai conhecer o meio

envolvente. Assim, o processo educativo vai iniciar-se na família (Hohmann e Weikart,

2004; Lopes e Silva, 2008; Silva et al, 2016) e é através da compreensão desta que as

crianças se vão ver a elas próprias (e aos outros) como membros participantes na

sociedade (Hohmann e Weikart, 2004).

A interação escola-família é um tema cada vez mais emergente e que se tem vindo

a intensificar no seio das políticas educativas. Estabelecer conexões entre a educação

escolar e educação familiar significa para Silva (2003:21):

entender como esta lógica de funcionamento da escola (enquanto instância simultaneamente

veiculadora e legitimadora da cultura socialmente dominante) se configura numa relação de

continuidade ou de descontinuidade com a cultura das famílias dos diferentes grupos sociais.

(…) significa entender a relação escola-família como uma relação entre culturas.

De acordo com Carneiro (2009), a família e escola são as duas estruturas sociais

que mais podem contribuir para o capital social de uma comunidade, pois:

enquanto na primeira prevalecem as aprendizagens do coração, isto é baseadas no afeto e na

cumplicidade, na segunda, têm lugar as aprendizagens da mente, que aliam cognição a

estabilidade emocional. Uma e outra são indispensáveis, proporcionando desenvolvimento

da personalidade humana, ou seja, a uma educação integral da pessoa (p. 141).

Segundo Guijarro (2005), é nas idades mais precoces que a família tem uma

influência mais decisiva, sendo por isso importante que os educadores integrem os pais

nos processos educativos. O autor assume que a participação da família pode ser

concretizada através da execução de materiais, da tomada de decisões nos projetos onde

os filhos estão envolvidos, ou através da participação/colaboração em atividades

promovidas pela instituição educativa. Considera importante relacionar e fortalecer a

articulação entre os diferentes contextos educativos da vida da criança, a família, a escola

e a comunidade, de forma a apoiar e contextualizar as aprendizagens das crianças. Assim:

La participación de los padres no sólo favorece una mayor coherencia entre el hogar y la

institución o programa educativo, sino que mejora la calidad de las relaciones con sus hijos

y les permite tener un mayor conocimiento de los mismos. El trabajo colaborativo con los

padres requiere que las educadoras y los profesionales reconozcan y valoren los

conocimientos de las familias, ya que los padres conocen muy bien a sus hijos y pueden

aportar dicho conocimiento para optimizar los procesos educativos (p. 27).

Capítulo 2 - Os projetos participativos

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59

Assim, nesta relação atuam distâncias sociais e distâncias culturais que “nem

sempre se correspondem mutuamente, nem sempre coexistem pacificamente”, segundo

Stoer e Silva (2005:20). Estes autores salientam ainda que a escola exerce um papel

homogeneizador, neste contexto de heterogeneidade.

Politicamente falando, Stoer e Silva (2005), estabelecem que a participação parental

não é assumida como uma participação democrática. Silva (2003) e Silva e Stoer (2005)

encaram a relação escola-família como uma vaga de “parentocracia”, uma tríade em que:

(1) a escola e os professores são vistos como produtores e (2) os pais como consumidores

de um produto que se destina (3) ao aluno. No entanto há um “aparente maior poder dos

pais”, sendo que a “legislação favorece o poder parental nas escolas” (Stoer e Silva,

2005:15-16). Na verdade, para estes autores, o poder político criou um mecanismo que

mantém os pais afastados da escola, ‘permitindo’ a entrada destes em atividades de cariz

pedagógico. Concluem que ‘escola aberta’ é um conceito com diferente significado para

diferentes pessoas, pois para os autores falamos do interesse de professores e pais para

atingirem os seus interesses na participação parental na escola. Assim, salientam a

necessidade de uma ‘reconfiguração’ das políticas educativas, criando uma mudança

social, que irá reconfigurar cidadania e posteriormente a relação escola-família.

Com o passar do tempo e a mudança das mentalidades, a esfera escolar e a esfera

familiar tem vindo a relacionar-se numa ótica de participação. Diogo (1998) estabelece

seis tipos de implicação parental na escola: (i) comunicação indireta, que ocorre nas trocas

estabelecidas entre escola e família, por intermédio das crianças; (ii) envolvimento na

educação escolar da criança, práticas de participação indireta, sendo a criança

acompanhada pelos pais, no seu trabalho escolar; (iii) os contatos pais-escola que são

formas de contato direto, em que os pais vão efetivamente à escola (receber informações),

mas não intervêm na tomada de decisões (pseudo-participação); (iv) colaboração nas

atividades da escola, que pretende a intervenção familiar na escola – atividades

pedagógicas e extracurriculares - sem qualquer influência destes na vida escolar

(participação parcial); (v) participação total na tomada de decisões, influenciando os

acontecimentos escolares; (vi) associativismo dos pais, uma forma particular de interação

direta escola-família, surgindo da iniciativa exclusiva das famílias, em que estas detêm

poder para influenciar as decisões da escola.

Neste âmbito, “a welcoming and inclusive school will encourage parental

involvement and establish a partnership of mutual understanding between teachers and

parents” (Ellis e Brewster,2014: 28). Smit, Driessen, Sluiter e Sleegers (2007) realizaram

Capítulo 2 - Os projetos participativos

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60

um estudo em que concluíram que os pais “are accustomed to having a say in school

matters”, sendo que, quando solicitados, participam “in activities on the behalf of the

school within the boundaries established by the school team” (p.49). Silva e Martins

(2002) advogam que o envolvimento parental na escola está diretamente relacionado com

os resultados escolares dos filhos, melhorando a motivação escolar destes e

consequentemente a relação escola-família.

Esta complexa ligação constitui uma relação entre culturas, ou seja, uma relação

entre a cultura escolar e as culturas de que os alunos são portadores. Desta forma,

podemos compreender como a diversidade tem um cunho profundo na relação escola-

família. É através do conhecimento de outras culturas, que se conseguem edificar pontes

para que possamos passar do multicultural ao intercultural. Assim, “teachers provide

opportunities for learners to share knowledge about their own cultural background with

their classmates” (Dolan, 2014:103). Estreitar as relações entre a família, a escola e

também com as respetivas comunidades:

significa defendermos a construção de uma escola intercultural. Uma escola onde as

diferentes culturas não estejam apenas formalmente presentes, lado a lado, com paredes

estanques entre si ou permeáveis num só sentido, mas onde se verifique comunicação, onde

se registem influências recíprocas. (…) A construção de uma escola intercultural – processo

difícil, lento e pouco linear – significa encarar todas as culturas ali presentes como iguais em

direitos (Silva e Martins, 2002:366).

Na instituição escolar, é de suma importância que no seu espaço se assuma a

valorização de todas as culturas presentes, para que aos poucos, a sociedade se comece a

‘transformar’ numa perspetiva intercultural, pois:

não se trata, pois, de esperar que primeiro mude a sociedade para depois mudar a escola(…)

para a passagem do multi ao intercultural não basta admitir a existência de várias culturas. É

preciso saber o que e como fazer com elas.” (Silva e Martins, 2002:370).

Tal como referem Cortesão e Stoer (1996), não basta apenas o reconhecimento da

presença do “arco-íris cultural” nas escolas, é necessário também não ceder ao

“daltonismo cultural”. Assim, a escola, valorizando o contexto familiar, social e cultural

das famílias, vai estabelecer elementos fundamentais “da nova cultura educativa que se

pretende partilhada” (Fontoura, 2005:50). Para Silva (2003), a utopia seria a construção

de uma escola transcultural, onde a interpenetração das várias culturas levasse a uma

única cultura, diferente de cada uma delas e onde todas elas se sentissem

Capítulo 2 - Os projetos participativos

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61

convenientemente representadas. O autor defende, assim, a visão da relação escola-

família “enquanto relação entre culturas” (p.371). Advoga também que promover um

diálogo entre culturas, significa lutar pela justiça social, por uma cidadania para todos

(Conselho da Europa, 2008), “por uma sociedade onde democracia representativa e

participativa se articulem” (p. 371).

Na visão de Sarmento (2005), as práticas pedagógicas não devem descurar a

seleção de materiais e abordagens tendo em conta cada família, sendo que a

“multiplicidade cultural” presente atualmente nas escolas deve ser respeitada. Assim, para

a autora, é notório que as condições políticas e sociais favorecem novos conceitos de

cidadania e práticas de participação, dando ênfase à importância da interação escola-

família e à “consciencialização dos Direitos das Crianças [que] obriga a novos processos

de interação, entendendo as crianças como seres ativos e mobilizadores no seu processo

educativo” (p. 61) (Hohmann e Weikart, 1995; Zabalza, 1998; Formosinho et al, 2001;

Lopes e Silva, 2008; Oliveira-Formosinho et al, 2011; Silva et al, 2016).

Silva (2003) defende que os professores devem valorizar as competências

educativas dos pais, de forma a permitir que a escola “entre” em casa. O conhecimento

da cultura das crianças do seu grupo, assim como um contato habitual com as famílias,

pode tornar-se num dispositivo pedagógico vantajoso. Cortesão e Stoer (1996) descrevem

os dispositivos pedagógicos como propostas educativas, com o objetivo de criar uma

ligação escola-comunidade (em que os alunos estão inseridos). No entanto, referem que

para ‘construir’ tais dispositivos, o educador/professor tem que ter consciência da

diversidade cultural dos seus alunos, “consciência essa que exige uma atitude e práticas

investigativas necessárias à identificação e compreensão do ‘arco-íris’ cultural ao qual

tem que oferecer propostas educativas adequadas” (p.41).

As escolas e principalmente os educadores e professores têm um papel

fundamental na promoção do diálogo intercultural:

pela sua tripla presença à cultura socialmente dominante, à cultura organizacional escolar e

à cultura profissional docente, eles conhecem, melhor que ninguém, “por dentro”, o meio

escolar ao mesmo tempo que detêm (ou deveriam deter) uma competência comunicacional

intercultural (Silva, 2003:376).

Assim, estes devem promover o envolvimento das famílias, com propostas

pedagógicas aliciantes e contextualizadas, quer em casa, quer em contexto escolar,

‘tornando’ os pais “num modo de construção de pontes” (Ibidem, p. 375) escola-pais-

Capítulo 2 - Os projetos participativos

_____________________________________________________________________

62

comunidade. Defende ainda que as relações entre pais e educadores não devem apenas

ocorrer no espaço físico da escola, devem sim transcendê-lo. Considera duas díades: (1)

vertentes escola e lar. Na vertente escola considera todas atividades, orientadas na escola,

por iniciativas dos pais ou pessoal docente, sendo a face visível da relação escola-família.

Na vertente lar estão subjacentes as atividades relacionadas com a escola, executadas em

casa pelos alunos e/ou pelos pais; (2) dimensões de atuação individual e coletiva. A

dimensão individual vai abranger as atividades levadas a cabo por docentes, pais e/ou

alunos, no âmbito da relação em causa, enquanto a dimensão coletiva diz respeito à

dimensão de atuação organizada, a nível da atuação docente.

Com a entrada no jardim de infância, os pais vão delegar o papel educativo do

seus filhos, no entanto deveriam complementar esse papel, através da colaboração nas

tarefas educativas. O educador deve planear atividades específicas para os pais realizarem

em casa, com a ajuda dos filhos, para os motivar a aplicar aquilo que aprendem

diariamente no jardim de infância. (Lopes e Silva, 2008), tendo em conta que “that tasks

are designed to take the at school experience into the home (…) [this] allow children to

take their story-based experiences into the home and share them with their family” (Ellis

e Brewster, 2014:28).

Na visão destes autores, cooperar é a palavra-chave na relação escola-família,

pois isto vai envolver que os pais realizem, em conjunto com os filhos, “atividades

específicas que permitam dar continuidade ao que estes vão aprendendo no jardim de

infância, tornando-se mediadores das suas aprendizagens” (p.159). Assim, este

protagonismo dos pais é fundamental, para ensinar as crianças em idades precoces a

pensarem na utilidade das aprendizagens que realizaram em contexto de jardim de

infância, sendo que os pais vão servir de estimuladores da aprendizagem. Azevedo (2009)

e Ellis e Brewster (2014) defendem um contato ativo com textos e objetos culturais das

suas comunidades, sendo esta mais uma forma de os pais participarem na vida escolar.

Atividades como ajudar a cozinhar ou a colocar a mesa, que são rotinas diárias,

vão pôr em prática os conhecimentos que as crianças adquiriram, potenciando o seu

processo maturativo. Desta forma, os pais vão ainda estimular a partilha de experiências

de natureza cooperativa, onde as crianças poderão fazer uso dos conhecimentos realizados

no âmbito das relações sociais do trabalho de projeto, sendo que “quando há continuidade

entre as suas experiências pré-escolares e familiares, as crianças estão desejosas para que

comece o dia de escola” (Hohmann e Weikart, 2004:101).

Capítulo 2 - Os projetos participativos

_____________________________________________________________________

63

Os autores defendem que se educadores e pais desempenharem corretamente os

seus papéis, estes levarão as crianças a compreender as suas famílias e a aprender através

das famílias das outras crianças, incentivando o sentido de responsabilidade, para que a

criança compreenda que “o resultado das escolhas e das decisões que fizerem sobre elas

próprias” (p. 100). Encorajam ainda que o educador utilize materiais vindos de casa das

crianças, em contexto de sala, utilizando as suas vivências pessoais (fomentando o

pensamento independente) (Ellis e Brewster, 2014). Para estes autores os resultados da

valorização da família passa por: (i) as crianças falarem abertamente sobre as suas

famílias e o que nelas se passa; (ii) explorar e apreciar as diferenças entre as famílias; (iii)

quando os adultos valorizam os talentos das crianças, as outras crianças irão

automaticamente reconhecê-los; (iv) fomenta um clima de apoio em que “as crianças

encontram semelhanças e diferenças entre as suas casas e os seus ambientes educativos”

(Ibidem, p. 109).

Para Barbosa e Horn (2008) esta é uma parceria importante em todos os sentidos.

Não só para que os pais acompanhem o trabalho feito no jardim de infância, mas também

para que possam participar ativamente no envio de materiais e na partilha de saberes. Para

Ellis e Brewster (2014:28) “parents enjoy being invited to a school to see examples of

work produced by their children such as a presentation of a story or project work.”

McDermott (2008) defende que os educadores devem orientar os pais e dar-lhes materiais,

para que possam dar continuidade às atividades escolares, em casa, de forma autónoma.

Salienta que os educadores do pré-escolar compreendem melhor as necessidades dos pais

(conhecimentos acerca das características das crianças nas diferentes faixas etárias,

estratégias de aprendizagem, etc.), necessidades a que devem tentar dar resposta. A autora

discorre acerca do tema, defendendo que:

we need to transform schools and communities into places that develop teachers and parents

by discovering how to focus on them as whole person as well. (…) teachers need to learn

about adult development as well as child development in their training (p. 92).

Para McDermott (2008) um ensino eficaz, assim como um apoio apropriado às

famílias, passa por tentar entender o contexto cultural dos pais/famílias, “while at the

same time not denying the uniqueness ofthat person or group. The goal is cultural

pluralismo (…)”(p.100). Enfatiza ainda que “everyone must learn what parents

involvement means in different cultures, because in some, active work in schools with

teachers is not expected of parents” (p.132). Considera que as visitas dos pais à escola

Capítulo 2 - Os projetos participativos

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64

são uma poderosa ferramenta de aprendizagem. Além de legitimarem o papel dos pais na

escola, levam as crianças a perceber a importância dos pais e dos educadores e a

estabelecer uma relação com a comunidade. Ellis e Bewster (2014) defendem que uma

escola inclusiva estimula o envolvimento parental, estabelecendo parcerias de

entendimento mútuo entre pais e docentes.

Então, é notório que na relação escola-família, tanto educadores e professores,

como pais devem aprender uns com os outros, pois a ambos são “reconhecidas

competências educacionais específicas que podem (e devem) ser partilhadas para

benefício dos educandos” (Silva, 2003:56). A colaboração entre ambos trará com toda a

certeza benefícios para todos os protagonistas envolvidos na esfera educativa. Desta

forma, o educador deverá assumir a prática de trabalho de projeto como um sistema aberto

e promotor de conhecimentos novos, sendo assumidamente transdisciplinar. Neste

âmbito, para Vasconcelos et al (2012:18), a criança deve ser encarada como:

uma criança-cidadã, membro de uma sociedade democrática, que aprende a gostar de

aprender desde que nasce até ao fim da sua existência. O grande desafio para os profissionais

de educação será, então, o de tornarem as suas práticas pedagógicas estimulantes sob o ponto

de vista intelectual para servir uma criança-cidadã que quer aprender ao longo da vida.

No contexto do trabalho de projeto é desenvolvida e aprendida, a capacidade de

trabalhar com os outros, designada pelos autores como “agência relacional”. Nesta

relação as crianças aprendem a trabalhar cooperativamente, tornando-se o recurso umas

das outras, sendo que o próprio educador se torna também um recurso, orientando o grupo

“no sentido de encontrarem outros recursos de que necessitam para a prossecução dos

seus projetos” (Ibidem, p.13). Assim:

A apropriação do saber, a reconstrução ou reinvenção do significado, só são possíveis numa

aprendizagem que faz do sujeito ator, agente com capacidade e direito a pesquisar, pensar

por si mesmo num processo de cooperação com os seus pares. (Oliveira-Formosinho et al,

2011:72)

É nesta “agência relacional”, num contexto social e relacional da vida quotidiana,

com pares e adultos, que as crianças vão experienciar, socializar, aprender e construir o

seu Eu. Num ambiente colaborativo, todos os intervenientes vão ter um papel preeminente

no desenvolvimento mútuo. Desta forma, as aprendizagens que as crianças realizam no

jardim de infância, tem influência na relação familiar, pois o que a criança transmite em

casa, irá resultar em diálogos, facilitando as relações familiares e, consequentemente

Capítulo 2 - Os projetos participativos

_____________________________________________________________________

65

contribuindo para o interesse da família e para a sua participação na vida escolar (Silva

et al, 2016).

Num ambiente cooperativo, também as crianças podem funcionar como mediadoras

entre a escola e a família, facilitando a aproximação, comunicação, interação e a

colaboração entre as duas ‘instituições’, quer de forma direta, quer indireta. Este processo

é benéfico para todos os intervenientes no processo educativo e ajuda as crianças a

desenvolverem as suas competências sociais, a sentirem-se capazes na justificação das

suas escolhas pessoais e na tomada de decisões.

Para concretizar este processo em pleno é necessário articular a participação

familiar dentro do espaço escolar, assumindo os pais como parceiros educativos, que

ajudam a desenvolver e a fomentar aprendizagens, dando continuidade em casa, ao

trabalho realizado no jardim de infância. Aprofundar esta relação significa romper com

as regras e alterar as relações sociais tradicionais, nomeadamente as “relações de poder”,

tendo em conta uma visão ampla e democrática, que leve a uma cidadania plena.

Tendo em conta que as histórias são um veículo para os educadores concretizarem

a sua ação pedagógica, estas serão também:

a teacher’s road to ‘discovery’ of what is they do as teachers and why. (…) can provide

teachers with ideas about what their own theories of good teaching and parenting are. It

becomes importante data they can use to develop theories of how children learn best and how

teachers and parents can help (McDermott, 2008: 208).

Esta e outras ideias serão desenvolvidas no capítulo seguinte, onde se dará

continuidade à temática da educação intercultural, no contexto da literatura infantil.

Capítulo 3 - A Literatura Infantil

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66

CAPÍTULO 3

A LITERATURA INFANTIL

"O Universo é feito de histórias, não de átomos." (Rukeyser, 1968)

Ao longo dos tempos é indiscutível a presença das histórias nos percursos da

humanidade. Através de transmissão oral, de leitura, do teatro ou do cinema, as narrativas

estão presentes, assumindo uma relevância reforçada durante a infância. Febles

(2007:338) sublinha que “literature has been one of the creative expressions of the

different peoples in the world, and with their own identity has been reinforced”. Na

literatura infantil (e na literatura em geral) conseguimos perceber como nos organizamos

enquanto sociedade (Azevedo, 2006), assim como os mitos dominantes na vida em

sociedade (Morgado e Pires, 2010). Os seus aspetos positivos na educação das crianças

são realçados por várias áreas científicas, nomeadamente a psicologia e a pedagogia.

Desde que nascem, as crianças aprendem a relacionar-se com os outros através da

linguagem. Ellis e Brewster (2014:2-3) afirmam que:

the telling of stories has been a vital mecanism ever since humans developed language -

perhaps the most vital transfering knowledge of all sorts (…) the technique of story telling

create rich and naturally contextualised learning conditions that enable teaching and language

learning to be developed spontaneously and creatively in a whole curriculum approach.

Sendo que as narrativas envolvem possibilidades comunicativas e expressivas,

estas serão um veículo para a criança descobrir o mundo envolvente. As crianças são

grandes admiradoras do simbolismo das narrativas e estas têm um papel de relevo no

imaginário infantil. Quando exploradas na infância, detêm a possibilidade de transmissão

de conceitos, mensagens e emoções, contribuindo para a abertura ao conhecimento de

outras realidades e expandindo o desenvolvimento linguístico e emocional das crianças.

Existe, assim, uma interação social, da qual a linguagem é a expressão fundamental, sendo

utilizada para “inferir, generalizar, predizer, avaliar, tudo isto em contexto social, político

e económico” (Chaves, 2007:157), tornando o leitor capaz de atuar e criar mudanças no

mundo.

Desta forma, a literatura infantil pode constituir “um espaço de representação da

diversidade cultural que nos rodeia (…) [e] reflete inevitavelmente um tempo e um lugar,

sendo parte constituinte de uma mais vasta geografia intelectual que a do seu autor ou o

contexto imediatamente circundante” (Morgado e Pires, 2010:13-14).

Capítulo 3 - A Literatura Infantil

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67

Este género literário é com toda a certeza uma “forma de leitura privilegiada”

(Macedo e Soeiro, 2009: 50) utilizada na idade pré-escolar. ‘Inseridas’ no universo das

narrativas, as crianças vão vivenciar práticas sociais de leitura, tais como a leitura de

símbolos, a leitura de histórias através de imagens ou a construção de narrativas orais,

que vão posteriormente, na opinião de Azevedo (2006), contribuir ativamente para

melhorar o panorama negativo das práticas de leitura na infância.

Assim, o livro de histórias deve ser visto como uma ponte aglutinadora para as

aprendizagens na infância, sendo o trabalho com a literatura infantil relevante, quer ao

nível cultural, quer social, enredando inúmeras possibilidades de exploração em contexto

educativo. Deste modo, a leitura de histórias, potenciada para tal, pode constituir uma

ferramenta pedagógica relevante para a ação educativa dos educadores de infância.

3.1. A importância da literatura infantil na Educação Pré-Escolar

Os livros infantis são janelas [ênfase no original] que se abrem sobre os modos de vida de outras

pessoas. São portas [ênfase no original] que permitem entrar em, e sair de, quotidianos de experiência e

que permitem interagir com outras pessoas, ou passar de uma organização social para outra. São pontes

[ênfase no original] que permitem ao leitor imaginativamente atravessar de uma cultura para outra ou

colocar-se no meio entre as duas, num espaço que alguns autores clamam de interseção cultural (…)

(Morgado e Pires, 2010)

Segundo a cultura popular, “uma imagem vale mais que mil palavras”, mas, para

Lopes e Silva (2008) numa visão cognitiva, “uma história/conto vale mais que mil

imagens, porque permite vivenciar mais ricamente as experiências, factos ou

acontecimentos que ficariam limitados ao ver apenas uma imagem” (p. 161).

Na atualidade, a literatura infantil é amplamente divulgada e é-lhe conferida uma

importância acrescida pelo Plano Nacional de Leitura, projeto que promove o

desenvolvimento de hábitos e competências de leitura desde idades precoces. Pretende

assim, aumentar hábitos de leitura, com o intuito de promover a formação dos leitores e

contribuir para o sucesso escolar (Costa, Pegado, Ávila e Coelho, 2011). Tendo esta

premissa em vista, uma das principais funções da escola é a formação do indivíduo leitor,

tornando-se num espaço privilegiado de acesso ao mundo da escrita, em todas as idades.

Desta forma, desde idades precoces, as crianças devem experienciar um ambiente escolar

reflexivo e comunicativo, onde sejam estimuladas a refletir e a debater sobre os seus

Capítulo 3 - A Literatura Infantil

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68

modos de agir/pensar, sobre si próprias, sobre o outro e sobre as interações realizadas

(Hohmann e Weikart, 1995; Silva et al, 2016).

Neste contexto, as histórias são consideradas uma ferramenta social e cultural

fundamental (Azevedo, 2006), permitindo ao recetor a hipótese de refletir sobre o mundo

e construir as suas interpretações. A leitura das histórias gera prazer estético, intelectual

e cultural, o que irá fomentar o conhecimento da leitura e a competência literária (Ibidem,

2006a) - ampliando o pensamento crítico e criativo (Colomer, 1999; Pereira, 2007).

As suas possibilidades pedagógicas incluem uma pluralidade de perspetivas que

se estendem ao nível da educação emocional, afetiva, cognitiva, linguística, social e

cultural, favorecendo o desenvolvimento da imaginação, da capacidade de observação e

de memorização, associados a momentos de fruição, o que valoriza, o seu papel como

instrumento pedagógico e educativo. Tal como defende Pires (2000:315):

os bons livros infantis são meios através dos quais os pequenos leitores, devido ao

desenvolvimento da imaginação e às emoções que a leitura neles provoca, estabelecem

formas de relação e de participação no mundo bastante diferentes das suas.

O potencial educativo das histórias radica-se, pois, na possibilidade de estabelecer

uma visão distinta do mundo, da interrogação acerca da humanidade, atendendo ao

imaginário da criança, o que vai permitir a incorporação do conhecimento humano,

ajudando na construção da personalidade (Colomer, 1999).

A literatura pode também enredar recursos ficcionais, que remetam para uma

realidade quotidiana do leitor. Existe, assim, uma coincidência entre o mundo

representado no texto e o contexto do leitor, criando uma relação emergente entre si e a

narrativa (Chaves, 2007). Uma das questões apresentadas na literatura, para ajudar a

criança a identificar-se com o mundo da fantasia, é inserir o contexto familiar, como

reflexo do quotidiano real desta, pois “the power of narrative lies in the connections it

makes for its listeners” (McNamee, 2015:99). Para Paiva (2008) a criança reconhece os

cenários comuns ao seu quotidiano, reconhecendo-se na história, fazendo associações e

“ampliando significados e representações sobre o tema narrado” (p. 46). A autora explica

que existem narrativas infantis que fogem a estereótipos. Estas, por norma utilizam:

estratégias metafóricas, com amplo grau de abertura, como um recurso de caráter psicológico

oferecido à criança, como alternativa para que ela, interiormente, justificar acontecimentos

que ainda não compreende totalmente, que conduzem o leitor ao complexo mundo das

relações familiares, que contribuem para fortalecer e construir nossa identidade como seres

humanos. (p. 47-48)

Capítulo 3 - A Literatura Infantil

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69

Devido às suas características, a leitura de histórias é fortemente recomendada nas

práticas pedagógicas praticadas na educação pré-escolar atual. A par da atuação do

educador, é um dos maiores veículos de socialização no jardim de infância (Silva et al,

2005). Esta predominância está relacionada com a importância da fantasia, durante o

período da infância. As OCEPE atribuem uma importância primária à promoção da

educação para a cidadania, estando contemplada na área de formação pessoal e social,

uma área transversal ao currículo da educação pré-escolar. Soares (2008) afirma que as

crianças dos zero aos seis anos devem ter acesso a livros, pois isso simboliza o

reconhecimento da presença do livro e da leitura de histórias no processo educativo da

criança.

Conti e Souza (2010) relacionam a tarefa lúdica de ouvir histórias com o ato de

brincar - que, por sua vez, se relaciona com a fantasia. Assim:

a condição de simbolizar, outrora desenvolvida por intermédio da possibilidade de se brincar

e de diferenciar o que é realidade do que é fantasia, é passível de ser observada por meio

dessa atividade lúdica, isto é, por meio do próprio ato de contar histórias. Seria nesse

momento de brincar contando histórias que a fantasia ou a concretude se tornariam

modalidades diagnósticas plausíveis para se escutar o inconsciente e para observar suas vias

de expressão (p.112).

Estas ideias vão ao encontro das ideias expressas pelas autoras das OCEPE.

Explanam que brincar é a atividade natural da criança, sendo a forma mais estimulante e

holística de esta aprender, pois “promove o desenvolvimento e a aprendizagem e se

caracteriza pelo elevado envolvimento da criança, demonstrado através de sinais como

prazer, concentração, persistência e empenhamento” (Silva et al, 2016:11). Também

Santos (2003) reforça que é através do brincar, do faz de conta e da personificação, que a

criança cria o seu pensamento, “faz emergir o símbolo, e dá significação aos significantes

do mundo real, criando a ponte entre o mundo exterior, o real, o quotidiano e o interior

(…)” (p.123).

Tudo isto permite à criança aceder ao conhecimento sobre as relações humanas, nas

suas várias vertentes (conflito, sentimentos, etc.). Estas vertentes são descritas de forma

simplificada “coherente y comprensible que la que se percebe en la complejidad de la

vida real.” (Colomer, 1999:116), situando a ficção como um marco semelhante ao vivido

pelos leitores. Desta forma, pode revelar-se como “uma atividade estimulante da sua vida

e como janela aberta sobre o mundo e sobre os outros” (Mesquita, 2007:146). A leitura

Capítulo 3 - A Literatura Infantil

______________________________________________________________________

70

amplia os horizontes da criança, impelindo-a a progredir, a desenvolver as suas

competências, para se tornar um “verdadeiro cidadão” (Ibidem; Pereira, 2007).

Mas o que se entende por literatura infantil? De acordo com Morgado e Pires (2010)

a literatura infantil é um meio transmissor de conhecimentos que deve ser articulado com

os processos individuais e também subjetivos dos alunos de diversos contextos, sendo

utilizada para “revelar a complexidade, a ambiguidade e a subjetividade no centro das

aprendizagens” (p.82). Colomer (1999:9) entende-a como “la iniciación de las nuevas

generaciones al diálogo cultural establecido en cualquier sociedad a través de la

comunicación literária.” Encabo (2007) descreve-a como o conjunto de textos com

determinadas qualidades artísticas, que partilha aspetos com outros tipos de textos

literários. Morgado (2010a:10) encara-a como transmissora de “conhecimento que

precisa de ser articulado com os processos individuais e subjetivos de alunos situados em

contextos muito diversos.”

Morgado (2010a) advoga que uma das funções principais da literatura infantil é

aceder ao imaginário coletivo do ser humano. Embora as histórias infantis se situem no

mundo imaginário, estas transmitem uma ordem social determinada, assim como valores

morais, comportamentos e “atitudes padronizados por referência a determinado contexto

cultural” (Leite e Rodrigues, 2000:13), sendo que nelas existe um:

instrumento potente de reprodução das estruturas de pensamento e comportamento de

autores adultos, mas também um meio de a criança poder questionar a sociedade e a ficção

que para ela é produzida. ” (Morgado e Pires, 2010:39).

Mesquita (2007) defende que a literatura infantil tem como finalidade primordial,

a de promover na criança o gosto pela beleza da palavra e pela ficção imaginativa, sendo

de acordo com este ponto de vista “um conjunto de manifestações e de atividades que têm

como a base a palavra (com finalidade artística) que interessa à criança” (p.146). O livro

é, então, um produto da imaginação. Segundo Pereira (2007) a literatura tem a função de

permitir ao leitor emergente compreender o mundo e atribuir um sentido à escrita. Assim,

as histórias serão “objetos transacionais, substituindo o objeto real na sua ausência”

(p.567).

Outros autores destacam, entre essas funções, a aprendizagem de modelos

narrativos, que permitem o conhecimento de si e do outro (Azevedo, 2006), a formação

ética e estética da criança (Rolo, 2003; Mesquita, 2007) e a socialização cultural,

problematizada por meio da ficção, estimulando, assim, o conhecimento de culturas

Capítulo 3 - A Literatura Infantil

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71

variadas, a partir do contato com o mundo imaginativo. A socialização cultural é vista

por Colomer (1999) como uma “agência educativa”, no mesmo sentido que a família ou

a escola, partindo do princípio de que “cualquier persona puede hacer uma opción social

a partir de sus características individuales y no por el hecho de ser hombre o mujer” (p.61).

Deste modo, o jardim de infância deve abrir a escola, quer à comunidade, quer às suas

famílias, assumindo-as como “recursos culturais e como parceiros educativos” e como

uma possibilidade de demonstrar outros modos de vida (Oliveira e Sequeira, 2012). Deve

acreditar no papel da família como fomentadora da leitura do seu educando, orientando-

a sempre que necessário e potenciando a sua participação na vida escolar. De salientar

que os educadores e os pais têm um papel fundamental, pois vão funcionar como

“primeiros recetores do texto literário, originam, pela sua ação, a transformação de

crianças em segundos recetores desses textos” (Azevedo, 2006:20).

Para Paiva (2008), a função da literatura infantil é constituir-se como um recurso

de aprendizagem de valores e conteúdos. Silva e Couto (2013) defendem que a literatura

pretende desenvolver a competência discursiva do aluno e constituir-se como uma área

articuladora de vários aspetos do conhecimento, promovendo a interdisciplinaridade.

Segundo Rolo (2003), a literatura surge ligada às necessidades mais profundas da

condição humana. Para a autora estas narrativas tem como finalidade a promoção do

desenvolvimento linguístico global, o equilíbrio emocional da criança, assim como a

aceleração do processo de decifração da escrita, pois “um texto bem conhecido

oralmente e eleito efetivamente favorece a adequação das hipóteses que a criança

levanta quanto ao sentido das palavras escritas que o compõem [ênfase no original]”

(p.109).

Por sua vez, as histórias tradicionais foram escritas - e são interpretadas - à luz dos

problemas sociais e morais de cada momento histórico, o que permite ao leitor projetar

as suas próprias representações (Silva et al, 2005; Ellis e Brewster, 2014). Seguindo a

tendência da época, também a educação pela cidadania e valores, veiculada pelas histórias

tradicionais, se altera à medida que os tempos mudam. Assim, atualmente, a criança vê-

se confrontada com novas questões socioculturais, novos temas e novas correntes

artísticas. A criança acede, assim, à forma verbal da cultura e “inicia su possibilidade de

compartir los referentes y formas expressivas que eles incorporan al diálogo com la

cultura” (Colomer, 1999:18). Desta forma:

Capítulo 3 - A Literatura Infantil

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children have the ability to grasp meaning even if they do not understand all the words; clues

from intonation, mime gestures, the context and visual support help them to decode the

meaning of what they have heard (Ellis e Brewster, 2014:14).

De acordo com estas ideias, pode estabelecer-se que o livro de histórias possui

algumas especificidades: (i) é uma construção sociocultural (Azevedo, 2006); (ii) induz

ao maravilhoso (Cerrillo, 2003), sendo que a distinção entre as polaridades fantasia-

realidade dar-se-á através da ouvir/contar histórias (Conti e Souza, 2010); (iii) possui uma

componente icónica “que dialoga e interage significativamente com o texto verbal (…)

supõe uma leitura intelectual e emocional” (Conti e Souza, 2010:13), auxiliando o leitor

a participar no texto e transformá-lo de acordo com as suas experiências pessoais. Assim,

fertiliza o imaginário infantil, para o conhecimento de “representações culturalmente

codificadas” (Ibidem; Ellis e Brewster, 2014); (iv) a literatura infantil possui

bitextualidade, ou seja, “a articulação semiótica entre dois modos de representação e de

significação da realidade que se interpenetram e complementam (…)” (Mergulhão,

2007:333); (v) têm sequencialidade, temporalidade e espacialidade, fatores que facilitam

às crianças a ‘entrada’ no mundo da narrativa; (vi) a ilustração fomenta a capacidade de

imaginação e a pré-leitura; (vii) tem uma carga afetiva elevada (Cerrillo, 2003).

Ainda neste âmbito, a ilustração é um dos componentes da narrativa infantil,

salientado por diversos autores, no sentido de promover a educação moral, estética e

linguística e de evidenciar aspetos da narrativa textual (Morgado e Pires, 2010).

Classificada como “um elemento de indubitável valor para a formação estética da

criança” (Pires, 2003:135), é atribuída à ilustração um papel fundamental no primeiro

contato das crianças com o livro. Para Maia (2003:149), as crianças “lêem as imagens

intercaladas (…)”, à medida que a ilustração “desenrola palavras indecifráveis (e imagens

intensas) e esconde a verdade por dizer”, sendo um recurso construtivo da história, que

complementa o texto, especialmente nas narrativas mais complexas (Colomer, 1999).

Para Macedo e Soeiro (2009), a articulação retórica entre a palavra e a ilustração

ajuda a criança na produção de sentidos. Ouvir histórias e ter acesso às suas imagens vai

treinar o desenvolvimento de todo um rol de competências, de entre outros. Alguns

exemplos são: (a) o desenvolvimento da compreensão e a expressão oral; (b) a aquisição

de vocabulário novo; (c) o desenvolvimento de espírito crítico e cívico (Cerrillo, 2003);

(d) o desenvolvimento da escrita e da leitura; e (e) a criação de laços de afeto com outras

línguas (Sardinha e Rato, 2009). As últimas autoras advogam que ouvir histórias e ver as

Capítulo 3 - A Literatura Infantil

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73

suas imagens vai desenvolver a capacidade de memorização e compreensão, assim como

a afetividade, a lógica do pensamento e uma atitude otimizada perante a língua que se

pretende aprender. As imagens são um meio importante para aprender a comunicar num

mundo intensamente globalizado, fomentando competências de observação e de atenção

ao detalhe (Ellis e Brewster, 2014).

Indo ao encontro de algumas destas perspetivas, Ellis e Brewster (2014) salientam

que são inúmeras as competências que podem ser exploradas com as histórias, pois, os

conteúdos destas, expostos com coerência e através de uma visão múltipla e aberta do

mundo é algo imprescindível numa sociedade multicultural (Cerrillo, 2003). Algumas

dessas competências são: conceitos e linguagem nova, relação entre as áreas curriculares

e ainda o desenvolvimento da consciência intercultural e cívica. Desta forma, de acordo

com Leite e Rodrigues (2000, 2001) e Sardinha e Rato (2006), é possível promover o

exercício da cidadania e dos valores através de várias formas de ação, tendo o educador

um papel elementar na desconstrução das mensagens que as histórias vão transmitir e na

sua recontextualização, transformando este recurso num dispositivo pedagógico, que “dê

voz às crianças e estimule uma reflexividade crítica orientada para a produção autónoma

de opiniões e para a mudança social positiva” (2000:25). As ideias de Soares (2008) são

semelhantes, sendo que esta advoga que a literatura infantil deve ser vista como um

instrumento pedagógico, tendo um valor em si mesma, e sendo uma fonte de prazer e

vivências estéticas. Na opinião de Cerrillo (2003),a literatura infantil é uma manifestação

literária plena:

(…) su aportación a la infancia y a la adolescência es essencial, no sólo porque es el primer

contacto del niño com la creación literaria escrita y culta, sino también porque es un bien

recurso para el desarrollo de la personalidade, de la creatividad y del espíritu crítico (p. 81).

Também Cortesão e Stoer (1996) descrevem o trabalho a partir de histórias como

um dispositivo pedagógico eficiente. Para os autores, existem princípios que enquadram

a concretização do trabalho através do recurso à literatura infantil, sendo eles: (i)

vivenciar situações que promovam a aprendizagem da cidadania, nomeadamente saber

ouvir, aceitar e participar na elaboração de regras que orientam a vida em sociedade; (ii)

promover o desenvolvimento da criança, no âmbito de atitudes de cooperação, alteridade,

conhecimento e valorização das culturas; (iii) educar para uma participação ativa na

escola (Leite, Fernandes e Silva, 2013), no seio familiar, com os pares e na sociedade;

(iv) aprender a “viver juntos e viver com os outros”, partindo do que é comum, e só a

Capítulo 3 - A Literatura Infantil

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partir daí para o que é diverso (salientando a diversidade cultural). Desta forma, a

educação através da literatura infantil cria meios para a criança:

desocultar as mensagens e os princípios, que os atravessam, de os recontextualizar, quer ao

nível das situações que proporciona, de reconhecimento e confrontação da criança com

mensagens e contextos diversos (Leite e Rodrigues, 2001:16).

Desenvolver o gosto pela leitura nas crianças implica familiarizá-las desde cedo,

com uma variedade de textos literários, para que estas tenham oportunidades para

conhecer vários suportes de literatura infantil. Assim, poderão ter contato com diferentes

temas e géneros, sendo particularmente importante o contacto com textos estimulantes,

culturalmente ricos, diferentes da sua realidade e especialmente cativantes. O vasto leque

de textos que fazem parte da literatura para a infância são recursos e oportunidades

excelentes para estimular, desenvolver, adquirir e consolidar competências linguísticas.

De forma sintetizada, dentro da temática da literatura infantil, podemos encontrar:

a) histórias, contos, lendas, fábulas ou mitos, narrativas

específicas que possuem “uma visão inusitada dos eventos e

frequentemente transgressora dos limites impostos pela

racionalidade ou pelo conhecimento dos quadros de referência

do mundo empírico e histórico-factual” (Azevedo,2006:33).

Através delas é possível explorar a relação do ‘eu’ com o Outro,

criando um estímulo cooperativo, baseada no maravilhoso.

Neste âmbito, a escrita para a infância explora a possibilidade

de superação de limites, através da capacidade imaginativa de

cada recetor;

b) literatura de tradição oral é baseada em saberes tradicionais,

que “interconectando-se intimamente com os códigos culturais

de uma comunidade, enfaticamente sublinham verdades

axiológicas e/ou simbólicas (…) frequentemente com fatores

de ordem mágica (…)” (Ibidem, p.32);

c) rimas, trava-línguas, lengalengas ou aliterações, com

“elementos textuais que, procedendo a associações inusitadas e

inesperadas de vocábulos, transgridem frequentemente o

semantismo de usos utilitários da língua” (Ibidem), utilizando

a língua com uma dimensão ludicopedagógica, que concretiza

Capítulo 3 - A Literatura Infantil

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a presença do Outro, com recurso ao humor e à imaginação da

criança. Soares (2008) defende especialmente as rimas e os

poemas, pois considera-os como “a porta de entrada para a

apreciação estética e a sensibilidade literária”(p.28),

salientando que os mesmos são fundamentais para o

desenvolvimento da consciência fonológica (essencial para o

processo de iniciação à leitura).

A interação com as narrativas literárias certifica que a criança aceda ao uso da

língua de forma mais elaborada. Colomer (1999) e Encabo (2007) advogam que a

literatura infantil contribui para a familiarização da criança com os códigos da linguagem

literária. Assim, a literatura “allows to acquire communicative competence, to study all

the curriculum areas and understand many aspects of life” (Encabo, 2007:555). Então, as

competências literárias da criança vão aumentando progressivamente durante a infância,

sendo importante trabalhá-las na fase pré-escolar. Os aspetos contributivos das narrativas

infantis são: (i) a relação com estímulos sonoros e motores, tais como voz, melodia, ritmo

ou movimento; (ii) o vínculo afetivo jogo-descoberta, referente a repetições, recriações

ou memorizações; (iii) o contentamento que resulta da interação lúdica com os outros,

dos vínculos sociais da fruição do domínio da palavras, assim como da fruição da

transgressão de determinadas normas sociais e/ou de configuração do mundo. De acordo

com Ellis e Brewster (2014), os livros são o recurso ideal para todo um rol de necessidades

pedagógicas, tendo em conta que cada criança irá responder de acordo com o seu

desenvolvimento cognitivo e linguístico.

É ainda importante que os educadores (e professores) explorem o ensino da língua

portuguesa, quer no formato oral, como no formato escrito, para que a criança entenda o

funcionamento de ambas. Azevedo (2006) refere que a língua materna tem um papel

primordial na definição do sujeito como pessoa social, pois esta vai ajudá-lo a

compreender o mundo, considerando-a um elemento mediador, que realça a dimensão

social, cultural e lúdica, promovendo o gosto por falar, ouvir, ler ou escrever. Para Dolan

(2014:92-93) os livros podem ser usados para ensinar “a range of intercultural issues (…)

[and] facilitate the development of language learning: linguistic abilities and

communication skills.”

As características da narrativa infantil vão promover o desenvolvimento global,

permitindo à criança aceder a “usos linguísticos de maior complexidade e menos

Capítulo 3 - A Literatura Infantil

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infantilidade” (Pereira, 2007), ou seja, a um capital cultural mais rico. Ouvir uma história,

vai influenciar a construção de novos significados, assim, uma nova leitura da história

será condicionada pelo conhecimento da língua e pela vivência pessoal que caracteriza a

criança até àquele momento. A literatura infantil é uma ponte, que faz a ligação das letras

“ao sentido, à análise, à interpretação, à realidade, ao sonho” (Chaves, 2007:160). Chaves

(2007) defende ainda que este tipo de texto é visto como ‘uma viagem’ entre este e o

leitor, que vai possibilitar a interpretação de ideias, situações e sentimentos, para que

todos possam partilhar o que é um direito de todos - a leitura e a escrita.

Quando colocamos a criança em contato com livros, esta vai compreender o

funcionamento da escrita, antes do período de alfabetização, o que é benéfico para a fase

seguinte - o primeiro ciclo do ensino básico. Quando as crianças trazem os seus livros

para o jardim de infância e contam as histórias ao educador e/ou pares, “they freely

engage in disciplined verbal and logical thinking” (McNamee, 2015:99), sendo frequente

que, após esta atividade, a criança demonstre interesse em:

seeking out the written word to glean new insights and perspetives (…) their command of

different ways of using language in print, their different voices as writers, and their

willingness to experiment with different literary genres long before they read and write

indepentedently” (Ibidem).

A literatura potencia então a capacidade da criança para o sucesso no domínio da

leitura, através da exploração da dimensão lúdica que “abre portas à interpretação

cooperativa e imaginativa e à leitura voluntária” (Ibidem, p.61). Assim, o contato ativo

com narrativas, possibilita a quem com elas interage - ouvinte ou leitor - o acesso ao

conhecimento da sua cultura, entendida “quer numa perspetiva de bens simbólicos, quer

numa perspetiva de ferramentas de conhecimento e ação” (Azevedo, 2006:27) tornando-

se relevantes cultural e socialmente. Silva et al (2016) reforçam também que, no jardim

de infância, o contato primordial com a escrita tem como instrumento fundamental o livro

e que as funções da linguagem escrita passam por:

dar prazer e desenvolver a sensibilidade estética, partilhar sentimentos e emoções, sonhos e

fantasias, este é também um meio de informação, de transmissão do saber e da cultura, um

instrumento para planificar e representar a realização de projetos e atividades.” (Ibidem,

p.66).

No jardim de infância, a criança vai vivenciar experiências aglutinadoras que

fomentem o seu desenvolvimento global enquanto:

Capítulo 3 - A Literatura Infantil

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ser lúcido, ativo e participante na sociedade a partir do que aprende na escola e fora dela;

cuja experiência de vida e de leitura importa; que pode encontrar na leitura, ao nível dos

títulos e formas de ler, sugestões de posicionamento crítico e mesmo de transformação social

da realidade (Morgado e Pires, 2010: 47).

Paiva (2008) advoga que na escola, no que diz respeito ao trabalho com a literatura,

continua a prevalecer a intenção educativa e pedagógica. Desta forma, no jardim de

infância, pretende-se que a criança realize um contato precoce com o livro e a leitura,

sendo que neste processo o educador é uma peça preponderante. Deve ler e explorar a

história de forma a que as crianças se apropriem do conteúdo do livro, tornando-o um

ponto aglutinador para outras abordagens multidisciplinares (Macedo e Soeiro, 2009).

Os seres humanos buscam a razão para as palavras, pois a nossa experiência

organiza-se em narrativa, através de processo de compreensão e de

interpretação/explicação reflexiva. As crianças pensam em forma narrativa. Quando o

educador as questiona acerca das atividades realizadas durante o fim de semana, por

exemplo, elas sequenciam esses eventos em narrações (Cruz, 2003). Para McNamee

(2015), ouvir uma história pode acontecer em diferentes momentos da rotina educativa:

a conversar, enquanto a criança encarna um papel no jogo dramático, ao recontar uma

história ao educador ou aos pares. Para a autora:

reading and writing helps us capture every facet of human knowledge to represent it to

ourselves in a way that help us notice, think about, and change how we interact with the world

around us (…) Using what others tell them in combination with what they imagine, children

are creating narratives in their minds about who they are and what is happening in the world

around them (p. 85).

McNamee (2015) valida o valor de ler diariamente para as crianças. Além de a

compreensão e o vocabulário aumentarem consideravelmente, as crianças vão

construindo um reportório de imagens culturais, padrões de palavras ou frases simples

e/ou complexas. A partir das narrativas lidas, as crianças devem realizar dramatizações

(Couto, 2003; Rolo, 2003), um “group behaviour that relies solely on words and pyschical

movement (…) where every word is brought to act with the help of others” (p.89-90). A

autora defende que o movimento é a linguagem das crianças em idade pré-escolar e

potencia o espírito de cooperação e interação entre pares (Couto, 2003). McNamee refere,

ainda, que ouvir histórias leva as crianças a explorar sentimentos de amizade e expressões

de humor, levando-as a “advance their growth as a group of friends not just as individuals.

(…) storytelling with one another, and as they listen to the stories the teacher reads and

Capítulo 3 - A Literatura Infantil

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tells each day” (p.99). Couto (2003) e Silva et al (2016) salientam o papel das expressões

artísticas, onde se insere a dramatização, para a criança tomar consciência de si a partir

da ação e da exploração do mundo que a rodeia. As expressões – plástica, dramática,

musical, visual e motora – permitem à criança favorecer o relacionamento com o Outro,

assim como expressar-se através de interações verbais, tendo em conta diferentes

contextos e processos de comunicação (Couto, 2003).

Para Macedo e Soeiro (2009), de acordo com as idades em questão, o educador

deve usar como critérios para a seleção de materiais literários multiculturais: (i) conteúdo

do livro; (ii) objetivos pedagógicos; (iii) relação que o livro estabelece com o

conhecimento do mundo; (iv) ser propiciador de novas aprendizagens; (v) características

e nível de interesse do grupo (Cerrillo, 2006); (vi) ilustrações; (vii) potencial educativo;

(viii) motivação e valores transmitidos; (ix) linguagem (Ellis e Brewster, 2014); (ix)

situações/problemáticas apresentadas (Balça, 2006). Também Dolan (2014) identifica

alguns dos critérios que “can be used by teachers to compare two or more of the selected

picturebooks”. Assim: (a) capa do livro; (b) representações presentes na capa; (c) contexto

da ação; (d) tipo de ilustrações; (e) páginas finais; (f) capa mole do livro (em alguns

casos); e (g) folha de rosto. De acordo com Balça (2006), estes critérios vão contribuir

para a reflexão crítica acerca de questões relacionadas com multiculturalidade,

diversidade, identidade ou alteridade. Deve referir-se que a criança também deve ter

liberdade de escolha na seleção das suas leituras, o que também contribui para promover

o espírito crítico, a autonomia e a independência.

Balça (2003) propõe algumas estratégias pedagógicas, para explorar o livro em si,

assim como a leitura, a saber: (i) leitura do texto, seguida de uma conversa entre educador

e crianças, o que vai propiciar a partilha das múltiplas leituras sobre a história; (ii)

expressão escrita de forma lúdico-expressiva para apropriação de técnicas e modelos de

escrita (no caso do pré-escolar poderia recorrer-se a registos ou desenhos); (iii)

exploração do texto através de expressões não-verbais (Couto, 2003; McNamee, 2015),

revelando os sentidos plurais que a leitura do texto proporcionou. (iv) recurso às novas

tecnologia. A autora reforça que a utilização de textos literários para o público infanto-

juvenil é um recurso pedagógico de suma importância para a promoção de uma educação

multicultural, revelando as mensagens transmitidas nestes como pertinentes e atuais.

Também Rolo (2003) propõe algumas estratégias específicas para orientar o

trabalho com a literatura em idades precoces, sendo elas: (a) ouvir histórias contadas pelos

mais diversos sujeitos da comunidade educativa; (b) realizar jogos orais ou escritos de

Capítulo 3 - A Literatura Infantil

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antecipação do sentido (em função da competência de escrita e/ou leitura); (c) ‘traduzir’

textos ouvidos para outras linguagens – dramática, plástica, musical, etc.; (d) reconhecer

palavras-chave do texto, palavra ou frase acompanhada de ilustração; (e) identificar

excertos curtos, ilustrados ou não (de acordo com a idade da criança); (f) ordenar

conjuntos de imagens de modo a reconstruir o texto; (g) refletir sobre o processo de escrita

a partir dos registos realizados, desde o pré-escolar; (h) participar em animações,

recorrendo a dramatização da história, com diferentes suportes (fantoches, sombras, etc.)

Pereira (2003) estabelece que os educadores devem estruturar atividades que

permitam às crianças prever os conteúdos a partir do título ou da sequência de

acontecimentos já relatada durante a leitura da história, visando a identificação de

personagens e a reconstrução da informação narrativa. Estas estratégias irão potenciar a

emergência da competência leitora.

A leitura de histórias torna-se ainda um recurso pedagógico para os educadores,

pois possui valores literários, estéticos e sociais, o que vai permitir à criança, ver o mundo

de uma forma plural. Previnem as crianças para as questões socioculturais do meio

envolvente e para a qualidade de vida das pessoas, fazendo a ponte para uma educação

ambiental. Além disso, as narrativas também intervém no desenvolvimento de

capacidades de compreensão e antecipação. Nesta perspetiva, de acordo com Balça

(2007), a educação para a cidadania pode ser desenvolvida através da leitura de histórias,

desde idades precoces. Algumas narrativas desenvolvem temáticas que promovem o

desenvolvimento da consciência cívica nas crianças, o que lhes vai permitir tornarem-se

cidadãos conscientes de um mundo globalizado.

Balça (2007) propõe aos educadores/professores a exploração de um conjunto de

histórias infantis, que fomentam a educação multicultural, a educação para a democracia

e a educação ambiental. Explica que as mensagens transmitidas nas histórias são atuais e

promovem uma educação para a cidadania, contexto em que as crianças se

consciencializam que são membros da sociedade, com responsabilidades partilhadas. No

caso da educação para democracia, pretende que a leitura das histórias e o

desenvolvimento de um projeto neste âmbito leve as crianças a tomarem consciência das

liberdades civis e dos direitos humanos.

Desta forma, é irrefutável que os livros, no espaço escolar, vão conferir à criança

uma forma multifacetada de acesso ao saber, sendo – excetuando a ação do educador –

“um dos grandes veículos de socialização do espaço pré-escolar (Silva et al, 2005:18;

Ellis e Brewster, 2014). Pode-se afirmar que “a leitura é a ferramenta essencial para a

Capítulo 3 - A Literatura Infantil

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compreensão e a realidade da comunicação do homem em sociedade” (Moreno,

2007:640). Em suma, a leitura das narrativas em contexto pré-escolar vai constituir:

um recurso pedagógico capital, para que os educadores e os professores possam desenvolver

com as crianças um projeto educativo onde se promova uma educação para a cidadania,

construída de forma segura, através da troca de conhecimentos, de experiências e de

vivências entre todos os intervenientes (p. 485).

Então, o relacionamento com a literatura é indispensável para a formação plena do

ser humano, tendo uma influência vital e decisiva. Ouvir histórias tem benefícios afetivos,

cognitivos e linguísticos, desenvolve a afetividade, a cognição, assim como a imaginação,

o vocabulário e o pensamento crítico. Permite à criança sonhar, enfrentar medos, vencer

angústias, conhecer outros mundos, países ou civilizações, vivendo a vida de outros,

formar o sentido crítico, dando acesso a parte da herança cultural da humanidade

(Moreno, 2007). Para o autor, o livro:

deveria estar incorporado na vida das pessoas, assim como a prática de respirar, que é tão

natural e essencial à vida (…) contar histórias é como semear sementes, onde só algumas

ficarão implantadas na mente da criança. Algumas dessas sementes trabalharão na mente de

imediato, outros estimularão processos no inconsciente da criança (…) as sementes que

caírem no solo certo se transformarão em belas flores, dando validade a importantes

sentimentos, perceções internas, esperanças e reduzirá ansiedades, enriquecendo a vida da

criança no ontem, hoje e no amanhã (p. 643).

De acordo com Carneiro (2009:153) a educação tem como função “transmitir

conhecimentos sobre a diversidade da espécie humana e (…) levar as pessoas a tomar

consciência das semelhanças e da interdependência entre todos os seres humanos do

Planeta”, ou seja, deve visar a descoberta e compreensão do Outro, através do

desenvolvimento de competências empáticas, estimulando, assim, uma educação para a

cidadania e para os valores, respeitando a diferença e a pluralidade e consequentemente

promover a interculturalidade. Uma das estratégias a utilizar será certamente a literatura

infantil e devemos ter em mente que “shared experiences, conversations, and storytelling

are among the ways in which members of a diverse group can come to understand one

another” (Unesco, 2013:17).

Cortesão e Stoer (1996) descrevem as histórias como um dispositivo pedagógico,

sendo que a sua intencionalidade é o de “contribuir para o desenvolvimento reflexivo e

para a consciencialização dos direitos dos alunos” (p.42). Ao ouvirem as histórias e

trabalharem a partir destas, as crianças vão também contribuir para:

Capítulo 3 - A Literatura Infantil

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estimular um auto-conhecimento reflexivo, que inclui também o conhecimento do seu grupo

de pertença, uma valorização, um respeito pelas suas próprias raízes culturais, ao mesmo

tempo que as aprendizagens, curricularmente consideradas como importantes, vão sendo

adquiridas com mais facilidade e sobretudo com mais prazer (Ibidem).

Assim, as histórias são apropriadas para o desenvolvimento da compreensão histórica,

mas são especialmente “preciosas para a compreensão do mundo social atual, um mundo

em que a multiculturalidade não pode ser ignorada” (Freitas, 2009:309). Em suma,

promover uma educação multicultural vai pressupor:

um projeto com as crianças, onde progressivamente elas conheçam e tomem consciência da

sua cultura e da cultura do outro, para que possam desenvolver atitudes de alteridade para

com os seus pares (Balça, 2007:480)

3.2. A promoção da Educação Intercultural através da literatura infantil: a

utilização pedagógica de materiais literários numa perspetiva intercultural

A criança convive diariamente com diversas culturas na sociedade. A sua

valorização, assim como o reconhecimento de que todas tem igual valor vai,

inevitavelmente, ser um dos grandes desafios da educação. Leite e Rodrigues (2000)

assumem que a sociedade atual exige uma escola em que o ensino, assim como os seus

conteúdos e estratégias educativas, possam ser recontextualizadas, para que seja possível

reconhecer e valorizar a pluralidade cultural. Para Sardinha e Rato (2009), tanto as

crianças de outras culturas, como as crianças da cultura dominante devem aprender a lidar

com outras palavras, outras línguas e outros modos de viver, desenvolvendo assim a

competência bilingue e plurilingue, sendo que esta interação vai constituir-se como um

fator de enriquecimento cultural.

A Lei de Bases do Sistema Educativo contempla, nos seus princípios, premissas

fundamentais que garantem o direito à diferença, tais como a igualdade de oportunidades

para ambos os sexos ou a valorização das diferentes culturas, reforçando desta forma, o

fomento da educação para a cidadania. Na educação pré-escolar é fundamental a

promoção de uma educação multi/intercultural, pois quanto mais cedo for promovida

entre crianças, mais rapidamente estas desenvolvem “a sua identidade, em interação com

o outro, tomando consciência da diversidade, aprendendo a conviver com ela, a valorizá-

la e a respeitá-la” (Balça, 2003:233). Aquando da entrada no 1º ciclo, o professor deve

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ter noção do trabalho realizado na valência de jardim de infância - recorrendo à literatura

infantil - dando-lhe continuidade, pois de acordo com a autora, através da leitura e

exploração de narrativas em contexto pedagógico, pode fomentar-se esta perspetiva

educativa.

Com efeito, a educação intercultural consiste num conjunto de práticas

pedagógicas que visam dar respostas educativas à diversidade cultural, ou seja, “aims to

enable the child to develop as a social being through living and co-operating with others,

thus contributing to the development of a cohesive multicultural society” (Dolan,

2014:93). A premissa de que a criança deve ser educada como um ser autónomo, crítico,

solidário e respeitando as diferenças, faz parte da aquisição de valores, para que a criança

se torne num sujeito consciente e participativo na sociedade. Marques e Borges (2012:82)

defendem que:

observar e compreender como são socializadas as crianças no jardim de infância no que diz

respeito aos outros povos e culturas implica necessariamente uma reflexão acerca das

alternativas disponíveis aos processos que hoje se utilizam.

As crianças nascem sem preconceitos raciais. Fatores como a televisão, a família

e até a educação, serão responsáveis pela criação de preconceitos, ao longo da vida. Do

ponto de vista pedagógico e intercultural, é imperativo que as crianças conheçam e

valorizem as suas raízes, a sua cultura para que possam entender outras culturas e iniciar

a comunicação com o Outro. É importante “become aware of the differences and

similarities in order to accept them and face the possible conflicts that may derive from

the coexistence” (Febles, 2007:339).

Nas suas investigações, Morgado e Pires (2010), nomearam diversos estudos

corroborantes da importância do potencial educativo da literatura infantil para: (i)

consciencialização crítica sobre o mundo envolvente; (ii) promoção do diálogo

intercultural; (iii) promoção de tolerância face à diferença; (iv) promoção da

solidariedade para com os marginalizados. Assim este subsistema literário demonstra

potencial para transformação social e cultural da sociedade, podendo “derrubar as

barreiras [ênfase no original] construídas nas nossas cabeças (preconceitos, pré-juízos,

fundamentalismos e racismos), que são as mais resistentes à mudança” (p.18).

A literatura para crianças traça assim um papel essencial, promovendo a aquisição

de saberes relacionados com outras culturas e novos valores, levando a criança a construir

um sentido de compreensão para com a diversidade cultural (Balça, 2003). Na perspetiva

Capítulo 3 - A Literatura Infantil

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intercultural, as crianças vão identificar-se com as personagens da narrativa, personagens

que tomam vida em diversos contextos, com diferentes valores e comportamentos

distintos (Leite e Rodrigues, 2000). Também Short (2009:4-6) defende um ponto de vista

semelhante:

“although intercultural understanding is grounded in awareness of one’s own cultural

perspective, students need to consider points of view beyond their own, so they come to

recognize that their perspective is one of many ways to view the world. (…) Students come

to deeper understandings about their own cultures and perspectives when they encounter

alternative possibilities for thinking about the world.”

Assim, o leitor vai desenvolver competências de respeito pelo Outro e pela

diversidade cultural. As dicotomias entre personagens e os espaços registados nas

histórias vão tornar possível o desenvolvimento de atitudes positivas ou negativas, por

parte do pequeno leitor (Morgado e Pires, 2010).

As histórias “educate children in handling overthrows, but at the same time in

accepting intercultural values that do not change in time and place (…) help children to

familiarize with the ‘other’ discover cultural diversity around them (…)” (Magos, 2009:1-

2). Se rentabilizadas para tal, as histórias podem ser um veículo para promoção da

consciência cívica nas crianças. Numa perspetiva intercultural, a literatura vai constituir-

se como um espaço cultural e educativo de textos infantis. Em relação ao contexto cultural

da criança, representa uma forma de educação estética e para os valores. (Morgado e

Pires, 2010). As mesmas autoras advogam que a literatura infantil é amplamente utilizada

para “desenvolver relações interpessoais e intergrupais (de diálogo intercultural) ou de

saber comunicar com grupos diferentes e tomada de consciência sobre o viver atual como

o de identidades multiculturais e multiétnicas” (p.84).

De acordo com Dolan (2014:92) os livros infantis devem ser considerados como “a

powerful vehicle in the classroom in terms of intercultural education for all learners (…).”

Desta forma, o uso de literatura multicultural constrói pontes, derrubando barreiras e

atravessando fronteiras entre pessoas e culturas. As histórias possuem um referencial

simbólico, necessário para a criança aprender a agir e a interagir de forma comunitária.

No seu texto a criança vai encontrar “lugares para uma indicação à ludicidade do

estranhamento e da surpresa” (Azevedo, 2006:29). Desta forma, é possível adaptar as

histórias ao estádio de desenvolvimento da criança/grupo, explorando-as da forma mais

adequadas pedagogicamente, tendo em conta os objetivos preconizados para o grupo

Capítulo 3 - A Literatura Infantil

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(Byram, 2008). Algumas narrativas infantis poderão até “configurar novas formas de

transformação social ao projetar para a criança o futuro da humanidade como a

conhecemos ou a transformação social idealizada” (Morgado e Pires, 2010:17).

Desta forma, em contexto escolar, os livros infantis são considerados motivadores

para a inclusão de crianças e de comunidades desfavorecidas, pois valorizam a cultura do

Outro. De acordo com Marques e Borges (2012), os livros para a infância transmitem

visões do mundo e com recurso ao livro e especialmente à imagem, irão proporcionar-se

os primeiros contactos com a alteridade, em contexto de jardim de infância. De acordo

com o estudo que efetuaram, os autores perceberam, que a leitura de livros infantis e o

recurso a canções são as duas atividades/estratégias mais utilizadas pelos educadores de

infância quando exploram os temas multi/interculturalidade. Apesar da literatura

utilizada, valorizar as características diferenciais da alteridade, os autores concluíram que

esta não estava isenta de imagens tipificadas e de estereótipos ligados aos diferentes

modos de existir.

Assim, é necessário esclarecer que não existem histórias interculturais, existem sim,

histórias multiculturais com potencial para promover o entendimento intercultural (Leite

e Rodrigues, 2000; Morgado e Pires, 2010; Morgado 2010c), isto é, histórias que

promovam a reflexão sobre o Outro, sobre a convivência em comum, que favoreçam os

processos relacionais, expandindo o reconhecimento cultural e a aceitação das diferenças.

Leite e Rodrigues (2000) referem que este tipo de texto literário vai revelar ponderação

na valorização da diversidade de culturas, tendo intenções pedagógicas bastante frisadas.

Morgado e Pires (2010) enunciam alguns critérios de classificação, para enquadrar

estas histórias. Alguns temas possíveis são: (i) culturas diferentes; (ii) grupos étnicos; (iii)

que descentram pontos de vista de culturas dominantes; (iv) moral e valores; (v) diferentes

modos de vida. Para a autora:

a literatura multicultural tem sido caraterizada como aquela que representa a diversidade

cultural e étnica de uma dada sociedade, a partir de uma revisão do cânone literário (…) é

uma literatura social e politicamente comprometida com uma postura crítica face ao que é

produzido, publicado e consumido, em nome da equidade social, política e cultural numa

sociedade em que existe uma desigual distribuição do poder e em que existem grupos

dominantes e grupos social e historicamente oprimidos, desfavorecidos ou dominados (…)

o que noção do ‘intercultural’ acrescenta ao ‘multicultural’ é a noção de influências

recíprocas de grupos diversos em contextos de interação social e cultural positiva. Onde o

‘multicultural’ aparece estático, preso à noção de culturas em paralelo, o ‘intercultural’ recria

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e reconstrói valores e muda atitudes para construir uma sociedade mais integrada e inclusiva

(Ibidem, p.41-42).

De acordo com Balça (2007), o direito à diferença é um dos temas presentes nas

narrativas de cariz multicultural, para que a criança perceba que todos devem ser

respeitados, independentemente das suas decisões, pois estas podem não estar de acordo

com as regras vigentes na comunidade.Assim, é notório que as narrativas promovem o

“respeito pelo indivíduo” e pelas suas qualidades interiores, desvalorizando o aspeto

exterior. Fomentam ainda que o leitor descubra “their own power through the ability to

make choices, assert an opinion and ask questions” (Dolan, 2014:103).

Colomer (1999:111) defende a existência de outra temática: “la lucha contra la

discriminación de raza o género, la defensa de la própria manera de ser o la búsqueda de

relaciones tolerantes y pacíficas se plasmaron en una literatura progresista.”

Recentemente as narrativas para a infância incluem temas como as conceções de famílias

atuais, tais como: famílias monoparentais, mães solteiras ou pais divorciados,

promovendo a aceitação das diferenças, a integração cultural e de todos os modos de vida.

A literatura infantil atual parece particularmente sensível “a los valores culturales (…).

Los libros infantiles ponen mucho énfasis, precisamente, en el trepaso de este legado

cultural a las nuevas generaciones (p.119).

Existem vários textos literários dirigidos ao público infantil, que exploram - de

formas mais ou menos evidenciadas - “political or ideological position” (Dolan,

2014:102), conceitos de identidade cultural, diversidade cultural ou alteridade, o que de

certa forma, vão de encontro às transformações sociais vividas um pouco por todo o

mundo. A presença da alteridade nas histórias questiona:

a possibilidade de compreensão da pessoa humana como um ser exclusivamente

unidimensional, desafiando concomitantemente o sujeito que interage com os seus textos a

assumir um grau de cooperação interpretativa. (Azevedo, 2006:35)

Neste âmbito, Dolan (2014:103) propõe um modelo para a abordagem da literatura

numa perspetiva intercultural, denominado “Respect-Understanding-Action”. Neste, os

leitores estruturam as suas respostas, de acordo com os temas apresentados na literatura

multicultural. Este modelo tem como finalidade criar um clima de empatia e respeito pela

diversidade, através da audição das experiências dos pares. Para esta autora:

Through understanding, teachers move from celebrating diversity to an exploration of how diversity

has impacted on different groups of people. Learners are exposed to issues related to the history of racism,

Capítulo 3 - A Literatura Infantil

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86

sexism, classism, homophobia and religious intolerance, and how these forms of oppression have affected

different communities. (…) Finally, through action, teachers and learners work on concrete actions which

they can deliver in response to an issue discussed in a picturebook. Opportunities are provided for learners

to teach others about global and justice issues. This allows them to become advocates by raising awareness

amongst peers, teachers, family and community members.

Desta forma, compreendemos o impacto profundo que as histórias podem ter no

desenvolvimento psíquico, psicológico, afetivo, social e relacional da criança, que projeta

no universo fantástico da literatura, as suas conceções da realidade. Oliveira e Sequeira

(2012) reforçam a relevância de um trabalho com narrativas na promoção da educação

intercultural, como forma de conhecer o Eu e reconhecer o Outro. Estas histórias de

caráter pedagógico são uma forma de comunicação e também de:

reprodução socia[l], como permitem cimentar a identidade cultural de um povo (…) é

facilitadora por excelência da construção da identidade, quer em termos pessoais, quer

coletivos, com calaras associações à herança cultural da comunidade em que o indivíduo está

socialmente inserido (…) (Rodrigues, 2007:278).

De acordo com Morgado (2010c:41), o trabalho como histórias “pode servir para

acompanhar questões atuais do debate intercultural”. Reforça ainda que a literatura

infantil deve “promover alguns dos temas mais prementes da nossa contemporaneidade”

(p. 38), tais como: (i) imigração e a deslocação de pessoas; (ii) a transformação de

sociedades monoculturais em sociedades multiculturais; (iii) a existência de visões

diferentes sobre a mobilidade, ou seja, repercussões positivas e negativas da presença no

mesmo espaço e tempo de diversidade cultural

Ainda neste âmbito, Paiva (2008) advoga a literatura infantil deve ter maior

presença de personagens negras, para que traduza a importância da integração racial. Este

tipo de narrativas estimula mecanismos de identificação positiva no seu leitor, ou seja,

fortalece a sua identidade cultural. Para a autora é importante que os textos representem

uma “reivindicação da diferença, preenchendo lacunas, denunciando e desconstruindo os

estereótipos (…) [com] uma estética de identidade a fum de que os indivíduos se

reconheçam como iguais em suas diferenças” (p.59-60). Paiva (2008) salienta ainda que

as narrativas constroem o mundo imaginário, “permitindo que dentro dele as identidades

sejam articuladas (…) articulando e fortalecendo uma estética positiva de identidade

étnico-racial (…)” (p.65).

Capítulo 3 - A Literatura Infantil

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87

Segundo Leite e Rodrigues (2000), para fomentar uma educação intercultural

devem ser utilizados livros multiculturais, obras que revelam alguma atenção no que diz

respeito ao respeito pela diversidade das culturas, tendo de acordo com as autoras

intenções pedagógicas claras e mensagens de caráter multicultural subjacentes (Balça,

2003). A autora revela que a utilização desta literatura leva a criança a valorizar a

diversidade, e a consciencializar-se que “o mundo é composto pela diferença e de que

todas as pessoas fazem parte de um todo, que interage harmoniosamente” (p. 427).

Conclui que para formar leitor multicultural se deve “promover o conhecimento do outro,

se dê visibilidade ao outro e se reconheça o outro, como diferente, mas também como

igual a nós” (Ibidem), potenciando assim uma educação intercultural e fomentando a

convivência numa sociedade plural.

De um ponto de vista de educação intercultural, ao educador cabe o papel de

compreender que embora alguns contos ou histórias veiculem situações que fomentem

temas como o diálogo intercultural ou a justiça social, “eles pode ser úteis para salientar

a importância de justapor problemas e soluções idênticos e diferentes para melhor

entender a variabilidade de respostas e a reflexão que deve[m] estar na sua base”

(Morgado e Pires, 2012:12). Desta forma, o educador funciona como uma figura

mediadora entre os livros e os leitores emergentes. O seu papel é de primeiro recetor do

texto, sendo o leitor infantil o segundo recetor, um ser em desenvolvimento “algo que só

ocorre na literatura infantil porque é uma literatura que, recordemo-lo, se dirige a leitores

específicos” (Cerrillo, 2003:35).

Este tipo de literatura possui uma natureza de caráter recetivo. Lida com sujeitos

com pouca experiência de vida e cujos saberes acerca dos textos, assim como dos seus

processos de funcionamento ainda estão em desenvolvimento. Os materiais literários tem

um papel fundamental na construção dos significados, atos simples como:

recontar e ouvir implica a apreensão de estruturas narrativas, símbolos, experiências e

moralidades comuns ou distintas entre ‘estórias’ de origens diversas e propicia a comparação

entre diferentes tradições culturais (…) para além de proporcionar o (re)conhecimento de

diversos universos socioculturais vivenciados pelos alunos, nomeadamente silenciados quer

nos materiais curriculares quer nas práticas escolares, e o desenvolvimento de competências

comunicativas em contexto escolar” (Oliveira e Sequeira, 2012:29).

Assim, do ponto de vista pedagógico deve ter-se o cuidado de escolher um bom

texto “em termos de adequação simbólica e factual, ao seu público-leitor”, tal como

defende Azevedo (2006:26). Neste âmbito, o educador terá uma tarefa preponderante,

Capítulo 3 - A Literatura Infantil

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88

selecionando criticamente livros adequados, dando às crianças a oportunidade de ter

contato com narrativas que lhe vão abrir horizontes, contribuindo para a formação de

seres críticos, conscientes e livres. Existe ainda a possibilidade de o educador utilizar as

narrativas infantis de forma mais geral, no trabalho pedagógico de outras temáticas mais

abrangentes. A seleção prévia requer análise crítica para identificação de estereótipos,

quer no texto verbal como na ilustração (Balça, 2003).

Deste modo é importante referir os parâmetros para a seleção de histórias de

literatura infantil multicultural, entre eles: (i) valor e função pedagógica do livro,

incluindo a sua adequação a comunidades linguístico-culturais diferentes; (ii) relação

entre sistema cultural e sistema educativo; (iii) histórias que valorizem a diversidade; (iv)

temáticas multiculturais e sociais, tais como democracia, migração, igualdade de género

ou marginalização; (Morgado e Pires, 2010). Dolan (2014: 92) valida esta perspetiva,

advogando que “critical multicultural analysis of [these] picturebooks examines the

complex web of power in our society, the interconnected systems of race, class and gender

and how they work together.”

Na escolha de materiais literários, especificamente na categoria de histórias

multiculturais, Leite e Rodrigues (2001) identificaram três tipos: (a) livros simbólicos

sobre multiculturalismo/sobre o conceito de diferença; (b) livros de conhecimento geral,

apresentando outras culturas, realçando aspetos como: língua, costumes ou tradições; (c)

livros de narrativa ou contos, que apresentam temas de multiculturalidade como tema

principal. Byram (2008) salienta três tipos de representações a ter em conta para fomentar

o desenvolvimento de consciência intercultural nas crianças: (a) símbolos culturais; (b)

produtos culturais (nos quais se destaca a dimensão lúdica da aprendizagem através de

histórias); (c) práticas culturais.

Para explorar conceitos como a cidadania, consciencialização para a diversidade e

para a interculturalidade, compreensão de direitos e responsabilidades, equidade de

oportunidades e valores e atitudes democráticas com as crianças, são necessários dois

tipos de livros. Tal como explicam Ellis e Brewster (2014): (a) histórias cujo conteúdo,

tem foco na cidadania e diversidade; (b) histórias com foco implícito na diversidade.

As estratégias pedagógicas para promover a educação intercultural através da

literatura infantil “baseia[m]-se na análise do conteúdo das obras e no diálogo sobre ele

que pode assumir a forma de troca de ideias, de análise colaborativa ou de atividades

performativas”, tais como reescrever uma história, encená-la, ilustrá-la, etc., (Morgado e

Capítulo 3 - A Literatura Infantil

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89

Pires, 2010; Morgado, 2010a: 9), o que vai de encontro às conceções de McNamee (2015)

referidas no capítulo anterior.

De acordo com Morgado e Pires (2010) e Morgado (2010a), para ativar os

conteúdos presentes nas histórias infantis, numa perspetiva intercultural, o

educador/professor devem focar os aspetos seguintes: (i) procurar pontos em

comum/diferenças no que é diverso; (ii) explorar enfoques temáticos como experiências

de racismo e exclusão social, de tolerância, resolução de conflitos interculturais, aceitação

positiva da diversidade, etc.; (iii) ter consciência da receção de textos em forma de

tradução e de texto bilingue ou multilingue; (iv) explorar o diálogo e a troca de

experiências, de alunos situados em comunidades linguísticas e culturais diferentes sobre

um mesmo texto; (v) compreender outras culturas, através do recurso a comparações de

textos e imagens; (vi) examinar de forma crítica representações de estereótipos e

preconceitos nos textos.

Na utilização de materiais literários no contexto da educação intercultural é de suma

importância, a forma como estes são apresentados à criança, ou seja, o educador deve

refletir sobre como os lê. De acordo com Morgado (2010b: 27):

para cumprir o projeto de promoção da educação intercultural é preciso ler a literatura

infantil (multicultural ou sobre diversidade cultural) de forma crítica (…) de forma a

contribuir para um processo de conhecimento e de transformação social.

Dolan (2014:108) defende que:

it is important for educators to choose books with maximum potential for exploring

global and justice perspectives. They need to be well-versed themselves in the complexities

of these perspectives and the political frameworks underpinning these concepts.

Assim, as histórias devem ser lidas criticamente, de forma a posteriormente, isso se

refletir quando se dialogar sobre o texto, o que vai contribuir para (i) o conhecimentos da

diversidade de realidades sociais; (ii) colocar a ênfase na competência para questionar o

texto, o que levará a criança a compreender construção dos textos e as mensagens que

estes transmitem; (iii) desocultar as ideologias dominantes” (Morgado, 2010a, 2010b);

(iv) transformação social (Morgado e Pires, 2010). Nesta perspetiva crítica, o educador

deverá seguir uma linha de questões acerca do texto, para aprofundar o “como, para quê,

porquê, para quem (…) só assim é que as crianças poderão entender que os modos de

construção dos textos acarretam consequências para quem os lê, usa e produz.” (Morgado,

2010b: 32-33).

Capítulo 3 - A Literatura Infantil

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90

A receção de uma obra multicultural por parte das crianças é condicionada pela

experiência social da criança. Assim, é necessário acompanhar as leituras, para quer a

criança se interrogue sobre o que lhe parece óbvio, que aceite o que lhe parece estranho

e que não resista ao incompreensível, pois “quando a incompreensão gera sentimentos de

estranheza, de não pertença a um mundo, que não existem discursos prontos para

classificar e comentar uma experiência social, abrem-se possibilidades novas de

representação e compreensão” (Morgado, 2010b:25).

Assim, a escolha das histórias a explorar deve ter em conta objetivos educativos

que promovam a consciencialização sobre a importância da diversidade cultural e

linguística. Para Morgado (2010b) é importante que os educadores escolham as histórias

criteriosamente e as trabalhem com as crianças, tendo em conta as potencialidades

pedagógicas de valorização da diversidade cultural e explorando a mobilidade e a

deslocação forçada, relacionando o que acontece nas histórias “com experiências que

descrevem a chegada de alguém a um território e a uma cultura novas, a sensação de

estranheza e de desenraizamento que causam os novos ambientes” (Ibidem, p. 44). Desta

forma, Morgado (2010c) sublinha como objetivos educativos: (i) o combate ao racismo e

aos preconceitos; (ii) reforçar o sentido de cidadania democrática, promovendo uma

atitude de valorização e respeito respeito pelas diferentes culturas.

Magos (2009:2) realça que a utilização das histórias como “different types of

critical stroytelling in order to combat racist perceptions and attitudes, in combination

with the intercultural communication (…).” A literatura contribui para quebrar com “uma

visão construída sobre o pilar da desigualdade étnica e se solidifiquem sobre uma base de

valorização da diversidade” (Debus, 2007:263). As narrativas são construídas com

elementos do real, o que levará o leitor a refletir sobre o seu papel na sociedade,

contribuindo também para a afirmação da sua identidade étnica. Rodrigues (2007)

defende o posicionamento das personagens face à realidade, no contexto da história,

permite ao leitor fazer leituras das visões de vida, tornando-se estas num “espelho

refletor”, que vai contribuir para a construção da sua personalidade.

Assim, a literatura infantil multicultural visa promover a educação e a cidadania

interculturais. Byram (2008) e Morgado (2013) referem o conceito de ‘cidadania

intercultural’, pois este enreda (i) uma necessidade de convivência e coesão social num

mundo globalizado; (ii) responde a solicitações para desenvolver competências

plurilingues de comunicação/interação à escala global; (iii) abertura a outros modos de

vida. De acordo com Azevedo (2009:227), a aprendizagem é gerada como “um processo

Capítulo 3 - A Literatura Infantil

______________________________________________________________________

91

de revisão e de construção de esquemas de conhecimento sobre os conteúdos (escolares

e não escolares) ”, ou seja, os alunos utilizam os pré-conhecimentos ao interagirem com

o texto. A educação formal deve integrar conteúdos e práticas pedagógicas que suportem:

a tomada de consciência e a compreensão das realidades sociais que emergem das mudanças

das nossas sociedades, do desenvolvimento tecnológico e dos mercados de emprego, mas

também que tenham como objetivo alcançar uma sociedade consensual e tolerante, com uma

nova atitude de aceitação face à diversidade cultural” (Marques e Borges, 2012:99).

Então, a promoção de uma pedagogia que vise a relação intercultural, numa

perspetiva de intervenção educativa integradora, deverá ser baseada na compreensão, no

respeito mútuo e, acima de tudo no reconhecimento do Outro e da diversidade, o que irá

levá-la a desenvolver atitudes de alteridade, para compreender o Outro e a sua perspetiva

(Fontoura, 2005), os seus comportamentos, os elementos caracterizadores da sua cultura

e pertinentes para a sociedade globalizada em que vivemos (Balça, 2007), pois, tal como

defende a autora o ser humano “é igual, independentemente da cor de pele (…) que

diferença faz a cor, se em tudo o resto somos iguais?” (p.489). Ou seja:

o conhecimento do Outro, da sua cultura, dos seus costumes, das suas regras de conduta, das

suas opções religiosas e sexuais, permit[e] que elas ignorem diferenças e tenham atitudes de

respeito para com o outro (Balça, 2007:480).

Para que esta pedagogia se concretize e seja um meio de aprendizagem e

compreensão intercultural, o sujeito educativo deve ser orientado, para que consiga ajudar

a identificar as representações, sistema de valores, estereótipos e preconceitos de outros

indivíduos e/ou grupos (Ramos, 2011). Deste modo, “intercultural literacy, which might

be glossed as all the knowledge and skills necessary to the practice of intercultural

competences, has become an essential tool for modern life (…)” (Unesco, 2013:17).

Marques e Borges (2012) salientam que para que tal aconteça, deverão existir

mudanças ao nível pré-escolar, através de uma tomada de consciência dos educadores

relativamente à problemática do inter/multicultural, tendo em conta as linhas orientadoras

das OCEPE. Assim, os educadores deverão contemplar: (i) a articulação de conteúdos;

(ii) os processos de ensino-aprendizagem; (iii) a realidade sociocultural envolvente.

O universo literário infantil tem um enorme potencial criador, que leva a criança a

descobrir que ela também pode criar histórias. Neste âmbito as histórias assumem-se

como “material passível de reconstrução” (Silva et al, 2005:20). Os mesmos autores

advogam que deste modo, o educador poderá promover estratégias e/ou atividades que

Capítulo 3 - A Literatura Infantil

______________________________________________________________________

92

visem a desconstrução/reconstrução das narrativas, de forma a diversificar os modelos

com que as crianças são confrontadas, promovendo o trabalho cooperativo adulto-criança,

em pequenos grupos, para promover a existência de visões alternativas das realidades.

Estas premissas vão de encontro à opinião de Azevedo (2006), que preconiza que as

assimetrias na relação adulto-criança originam processos de manipulação e

reconfiguração de símbolos do texto, para os leitores ainda em processo de

desenvolvimento. O autor explica que:

a literatura infantil mesmo quando concretiza espaços de questionamento e para a emergência

do Outro, para a presença do fragmentário, do carnavalesco e do emancipatório, não parece

deixar de criar e fomentar determinados modelos de configuração ética para os seus leitores

menos experientes (p.24).

Ao educador cabe o papel de criar oportunidade para as crianças colocarem

perguntas, para que seja percetível como estas estão a interiorizar a informação presente

nas histórias (Moreno, 2007). O educador poderá intervir como “agente de narrativização

do quotidiano infantil”, (Silva et al, 2005:16) ou seja, deve selecionar as obras

multiculturais, partindo de materiais literários, cultural e linguisticamente

enriquecedores, que vão de encontro aos interesses do seu grupo e que promovam

experiências de aprendizagem significativas.

Então, “multicultural literature in the classroom has the potential to promote

intercultural competencies and to equip students to live in an increasingly diverse society”

(Dolan, 2012:94).

Síntese

______________________________________________________________________

93

Síntese

As sociedades europeias têm atualmente uma nova realidade social multicultural,

que influencia de forma significativa o domínio educativo. Esta realidade leva-nos

indiscutivelmente à necessidade de uma perspetiva diferenciada. Uma educação de todos

e para todos, que promova a unidade, no atual contexto de diversidade. Tal como

perspetivaram Cortesão e Stoer (1996), para que esta mudança se verifique é necessário

o reconhecimento do ato educativo como ato social e o reconhecimento da escola como

uma organização, que irá promover verdadeiras mudanças sociais. É nesta esfera que a

educação intercultural emerge, como um “processo em (re) construção permanente”

(Silva, 2003:368), conjeturando uma abordagem baseada no respeito mútuo e igualdade,

concentrando-se no desenvolvimento de “capacidades dirigidas para a compreensão de

diferentes modos de pensar e viver” (Oliveira e Sequeira, 2012:86).

Quando inserida em contexto escolar, articula um currículo adaptado às origens e

necessidades dos alunos, valorizando as suas culturas de origem, num processo de ensino-

aprendizagem coeso e coerente, de acordo com o contexto de cada aluno. Esta perspetiva

é por isso pautada em processos de inclusão, proporcionado um espaço aberto, onde se

partilham aprendizagens e diálogos e onde se desenvolvem competências de igualdade,

tolerância, respeito e cooperação. Deste modo pretende-se que os alunos, desde as idades

mais precoces, partilhem oportunidades de convivência social onde possam vivenciar

experiências educativas significativas para desenvolverem e alicerçarem estas

competências.

Será através da educação pré-escolar que as crianças irão alargar o seu reportório

cognitivo, afetivo, social e relacional, aprendendo com as interações com crianças e

adultos, através de práticas pedagógicas que fomentem o desenvolvimento de atitudes e

valores morais, que vão constituir a base para que cresça e se torne num adulto autónomo,

responsável, consciente, cívico, democrático e solidário. É por isso essencial que as

crianças desenvolvam competência intercultural, para que possam lidar correta e

civicamente, com a diversidade que caracteriza as nossas sociedades, relacionando

diferentes culturas.

As interações realizadas pelas crianças neste período serão os alicerces das

relações humanas e “um eixo fundamental da situação educativa” (Oliveira-Formosinho

et al, 2011:72). Neste âmbito, o trabalho de equipa entre adulto-criança e criança-criança,

vai funcionar como processo interativo, que vai promover o envolvimento das crianças,

Síntese

______________________________________________________________________

94

sendo que é “em participação, pela participação, que a criança aprende a exercer os seus

direitos e deveres como ser social” (Ibidem). Assim, a pedagogia em participação,

promove a liberdade e a cooperação, levando a criança a participar na sua construção,

tornando as aprendizagens realmente significativas. Esta vai interligar-se com o trabalho

de projeto, assumidamente um “meio promissor de estimular predisposições que

permanecerão durante toda a vida” (Katz e Chard, 1997: 267), dando aos educadores a

oportunidade para estimular o desenvolvimento quer social, quer intelectual das crianças.

O envolvimento ativo dos pais neste processo educativo, dará continuidade ao trabalho

realizado diariamente no jardim de infância, promovendo a participação de todos e

promoção da igualdade de direitos, numa perspetiva democrática, cultural, social e cívica.

Assim, pode dizer-se que o espaço escolar se vai constituir como “um caminho da

democracia, um caminho que se faz caminhando” (Oliveira-Formosinho et al, 2011:52)

Desta forma, o jardim de infância vai assumir-se como um espaço onde se

desenvolve uma articulação plena das aprendizagens. Assim, conclui-se que:

a educação é vida: cria condições para que cada sujeito, pela comunicação com os outros,

adquira e mobilize um conjunto de hábitos e atitudes que lhe permitam viver condignamente,

e, acima de tudo, aprender a continuar a aprender pela experiencia (Ibidem, p. 53).

O jardim de infância é também um local privilegiado para a exploração da

literatura infantil. Esta tem uma importância fundamental na educação desde as idades

mais precoces. Desempenha um papel essencial para fomentar a educação intercultural,

pois as mensagens transmitadas através do seu texto promovem a aquisição de novos

saberes acerca de outros povos, culturas e tradições, dando à criança um panorama acerca

de realidades diferentes. O contacto com outros valores e com o Outro levam a criança a

compreender a diversidade do mundo onde está inserida. Assim, as histórias vão permitir

“que a criança se identifique com múltiplas personagens que interagem em diferentes

contextos, tem diferentes personalidades e manifestam diferentes comportamentos”

(Leite e Rodrigues, 2001:40), aprendendo a lidar com uma realidade plural e

consciencializando-se para o exercício da cidadania, num mundo global.

Desta forma, o recurso a materiais literários constitui-se como um dispositivo

pedagógico na educação intercultural. Neste âmbito, o educador deve ter consciência das

mensagens veiculadas pelas narrativas, sublinhando as dimensões que se relacionam com

a diversidade e tendo em conta o seu valor educacional para o desenvolvimento de

competências do foro intercultural. Com efeito, o uso de literatura multicultural na

Síntese

______________________________________________________________________

95

educação pré-escolar promove o desenvolvimento de “critical thinking skills,

intercultural understanding and lead to a more nuanced understanding of the power

relations underpinning our society” (Dolan, 2014: 102).

96

PARTE II

ESTUDO EMPÍRICO

Capítulo 4 - Metodologia de Investigação

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97

CAPÍTULO 4

METODOLOGIA DE INVESTIGAÇÃO

4.1. Problemática da investigação: questões e objetivos do estudo

Na atualidade, a diversidade é uma constante no quotidiano escolar, sendo visível

desde o jardim de infância. A educação de infância deve por isso, fomentar o

desenvolvimento de competências sociais e relacionais, pois o desenvolvimento destas

irá imiscuir-se no relacionamento com o Outro. Desta forma, a aprendizagem socio-

relacional e o desenvolvimento de competências interculturais, devem ter um papel

relevante nas aprendizagens desde as idades mais precoces.

A proliferação de estudos, que se centram nos conteúdos culturais transmitidos às

crianças através de diversos meios, denota uma consciencialização gradual das

repercussões destes no desenvolvimento integral das crianças. A temática da diversidade

cultural, no contexto da literatura infantil é evidente em diversas investigações (Colomer,

1999; Leite e Rodrigues, 2000; Balça, 2003, 2006, 2007; Magos, 2009; Morgado, 2010a,

2010b, 2010c; Morgado e Pires, 2010, 2012; Marques e Borges, 2012; Dolan, 2014; Ellis

e Brewster, 2014), que salientam o papel da literatura na infância.

Atualmente podemos encontrar vários materiais literários, que evidenciam temas

sociais emergentes como a multiculturalidade, o racismo ou a igualdade de género. Neles,

são frequentemente retratadas personagens que evidenciam e exploram, assuntos e

valores universais, nem sempre aceites por todos. São também ressalvados estereótipos e

preconceitos, visíveis no quotidiano. Tudo isto torna o livro infantil numa ferramenta

cultural essencial, para apoiar a criança no conhecimento e relacionamento com o mundo

envolvente, ajudando-a a compreender as relações entre as pessoas (Azevedo, 2006),

promovendo a emergência de pensamentos críticos acerca da realidade (Colomer, 1999;

Pires, 2000; Pereira, 2007; Morgado e Pires, 2010) e permitindo à criança conhecer-se a

si e ao Outro (Azevedo, 2006), para que possa determinar as suas próprias representações.

Desta forma, através das personagens e da sua forma de atuar e/ou de resolver

conflitos/problemas que surjam, a criança irá regular a sua conduta. Então, o livro infantil

constitui-se como uma ponte para o mundo social e diverso.

A educação intercultural tem um papel determinante na educação ao longo da

vida, sendo que as competências sociais e de interação com o diverso se realizam de forma

Capítulo 4 - Metodologia de Investigação

______________________________________________________________________

98

natural, integradas nas rotinas de sala e nas atividades pedagógicas desenvolvidas. As

OCEPE dão especial relevância à promoção de contexto de vida democrático, onde todas

as crianças tem o seu papel e podem participar, aprendendo assim a respeitar o Outro e as

diferentes culturas. De acordo com Silva et al (2016: 39):

a vida no jardim de infância deverá organizar-se como um contexto de vida

democrática, em que as crianças exercem o seu direito de participar, e em que a diferença de

género, social, física, cognitiva, religiosa e étnica é aceite numa perspetiva de equidade, num

processo educativo que contribui para uma maior igualdade de oportunidades entre mulheres

e homens, entre indivíduos de diferentes classes sociais, com capacidades diversas e de

diferentes etnias. Esta diversidade é entendida como forma de educação intercultural, em que

as diferentes maneiras de ser e de saber contribuem para o enriquecimento da vida do grupo,

para dar sentido à aquisição de novos saberes e à compreensão de diferentes culturas.

Foi definida como problemática do estudo a compreensão do contributo do trabalho

pedagógico com base na literatura infantil, para o desenvolvimento da interculturalidade

por parte de um grupo de crianças. Neste âmbito definiu-se o ponto de partida que

motivou esta investigação, assim como as suas questões principais, as quais se

desdobraram em sub-questões. São elas:

(1) Que experiências de educação intercultural emergem no relacionamento das

crianças com os outros e com as histórias de literatura infantil?

(1.1) Como é que as crianças se apropriam do trabalho pedagógico com as

histórias para fazerem a mediação escola-família no desenvolvimento da

interculturalidade?

(2) Que aprendizagens interculturais são evidentes nos comportamentos das crianças

e identificadas pelos adultos?

(2.1) Qual o papel das histórias no desenvolvimento de um sentido de conexão

com as raízes culturais e com o mundo envolvente?

A partir das questões anteriormente referidas, foram definidos como objetivos

desta investigação:

Capítulo 4 - Metodologia de Investigação

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99

- Compreender as experiências interculturais de exploração de literatura infantil, patentes

nas relações sociais das crianças com pares e adultos e na sua perceção do mundo

envolvente;

- Compreender as aprendizagens interculturais patentes no comportamento das crianças;

- Fomentar o desenvolvimento da competência intercultural nas crianças;

O estudo organizou-se num processo de investigação-ação, onde a educadora

assumiu o papel de investigadora, tendo como base as ações pedagógicas que desenvolve

com os alunos e a produção de conhecimentos que vai obter através destes (Stoer e

Cortesão, 1997).

4.2. Introdução à investigação-ação: características e finalidades

A origem da metodologia de investigação-ação (I-A) reporta a 1940, tendo como

base o contributo de autores oriundos de diferentes ciências sociais.

Kurt Lewin, investigador de origem judaica e cientista na área de filosofia da

ciência é considerado o fundador desta metodologia. Implementou projetos que visavam

a integração e justiça social, tendo concebido as linhas gerais que sustentam a I-A,

nomeadamente os conceitos estruturantes associados aos níveis de participação, às

dinâmicas de grupo e ao conceito do professor-investigador, onde os atores reconhecem

objetivos comuns acerca de um problema que os afeta, buscando a mudança através de

um sistema democrático de intervenção (Mesquita-Pires, 2010). Neste contexto, é ainda

relevante referir John Dewey, figura ligada à área da psicologia e filosofia, assim como à

investigação científica em educação. Este autor contribuiu para a compreensão dos

fundamentos essenciais da I-A, defendendo o programa educacional centrado na criança

e no trabalho cooperativo, como condição necessária ao progresso na educação.

Existem três paradigmas distintos para a compreensão de uma investigação:

interpretativo, positivista, e sociocrítico (Coutinho, 2014). O presente estudo insere-se no

paradigma interpretativo, paradigma que valoriza a compreensão de fenómenos,

procurando interpretar e compreender as perceções dos sujeitos em diferentes contextos,

Capítulo 4 - Metodologia de Investigação

______________________________________________________________________

100

mas também se enquadra no paradigma sociocrítico, na medida em que se vai desenvolver

num ambiente de colaboração, preconizando uma mudança.

A I-A situa-se numa abordagem de natureza qualitativa. Para Bogdan e Biklen

(1994), Tuckman (1994) e ainda Carmo e Ferreira (2008), esta investigação possui

algumas características. Estas serão apresentadas de modo breve, são elas: (i) conjetura o

contacto direto entre o investigador e o ambiente, como fonte dos dados; (ii) é descritiva;

(iii) os investigadores focam especificamente o processo, ao invés dos resultados; (iv) os

investigadores analisam os dados de forma indutiva; (v) busca o significado, pois este “é

de importância vital” (Bogdan e Biklen; 1994:50). No entanto, estes autores salientam,

que apesar desta classificação, é possível depararmo-nos com estudos desta natureza que

sejam “totalmente desprovidos de uma ou mais das caraterísticas” (Ibidem, p.47).

No caso do presente estudo, a abordagem qualitativa foi escolhida por se adaptar

às necessidades deste, favorecendo a colaboração/interação entre o investigador e o grupo

de participantes da investigação.

Com efeito, uma investigação pressupõe a formulação de perguntas, para que seja

possível dar resposta a um determinado fenómeno de compreensão. Na visão de Tuckman

(1994:5) a investigação tradicional é “uma perspetiva sistémica de atribuição de respostas

às questões”, sendo que o investigador vai encontrar os factos e formular “uma

generalização baseada na interpretação dos mesmos” (Ibidem). Coutinho (2014:4)

descreve-a como “uma atividade de natureza cognitiva que consiste num processo

sistemático, flexível e objetivo de indagação e que contribui para explicar e compreender

os fenómenos sociais”. A autora realça ainda que é através da investigação que os

problemas provenientes da prática vão ser alvo de reflexão e problematização.

Deste modo, a I-A é considerada uma forma de investigação de carácter social que

“decorre da procura de resposta para o fosso intransponível existente entre o

conhecimento teórico produzidos pela investigação tradicional e as necessidades da

prática” (Máximo-Esteves, 2008:15), sendo mais adequada quando existe a necessidade

de conhecer de forma profunda, temas específicos e resolver problemas em situações

sociais particularizadas. Para a autora a I-A indica “a colaboração dos intervenientes na

investigação como uma forma de articular a teoria e a prática” (p.19).

Várias são as definições que tem sido atribuídas à I-A ao longo dos tempos. Estas

advém de uma pluralidade de estudos, não sendo possível atribuir-lhe uma definição

Capítulo 4 - Metodologia de Investigação

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101

única, pois a sua pluralidade conceptual deriva das várias aceções e práticas enunciadas

(Latorre, 2003; Mesquita-Pires, 2010). Para Máximo-Esteves (2008:18):

a definição de um conceito é sempre redutora, isto é, nunca esgota as caraterísticas que o

compõem, todavia, permite revelar as suas qualidades essenciais. Neste caso, porém, a tarefa

é particularmente complexa, por várias razões, de entre as quais sobressaem: a recentidade

do tema, a vastidão de áreas de aplicação, a variedade de perspetivas filosóficas que procuram

sustentar este conceito e as correspondentes vias metodológicas que são propostas (…)”.

Segundo Bogdan e Biklen (1994:11), a I-A é “uma metodologia de investigação

que enfatiza a descrição, a indução, a teoria fundamentada e o estudo das perceções

pessoais”, “valorizando o papel do investigador/construtor do conhecimento” (Coutinho,

2014:16). Bogdan e Biklen realçam que (1994:292) “consiste na recolha de informações

sistemáticas com o objetivo de promover mudanças sociais.” Reiteram ainda que “pode

servir como estratégia organizativa para agregar as pessoas ativamente face a questões

particulares. A própria investigação constitui uma forma de ação” (Ibidem, p.297).

McNiff e Whitehead (2006:7) defendem que a I-A é “a form of enquiry that enables

practitioners everywhere to investigate and evaluete their work.” Koshy (2005) tem uma

perspetiva semelhante, definindo-a como uma técnica que vem reforçar a prática,

assegurando que as descobertas emergentes desta vão contribuir para o desenvolvimento

contínuo profissional do investigador. Segundo esta autora, a I-A “creates new knowledge

based on enquires conducted whitin specific contexts. (…) the purpose of action-research

is to learn through action leading to personal or professional development.”

Máximo-Esteves (2008:82) defende que esta metodologia se assume como “um

processo dinâmico, interativo e aberto aos emergentes e necessários reajustes,

provenientes da análise das circunstâncias e dos fenómenos em estudo.” Coutinho et al

(2009) descreve-a como uma família de metodologias de investigação que abrangem a

ação - mudança - e a investigação - compreensão - tendo como base um processo cíclico,

que intercala ação e reflexão crítica, enquanto Amado e Cardoso (2013) advogam que

esta visa a construção de conhecimentos. Já MacNaughton e Hughes (2009) defendem

que retrata um ciclo de pesquisa, que gera mudança, pois o investigador pensa naquilo

que realizou, efetua algo para criar essa mudança, voltando a repensar o que realizou e

quais as suas repercussões. Assim, concretiza-se numa espiral que os autores relatam

como “think - do - think”. Este processo em espiral acontece pois “as soon as we reach a

provisional point where we feel things are satisfactory, that point itself raises new

Capítulo 4 - Metodologia de Investigação

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102

questions and it is time to begin again” (McNiff e Whitehead, 2006:9). Para o seu

fundador, Lewin (1946: 38), a I-A “proceeds in a spiral each of which is composed of a

circle of planning, action, and fact-finding about the result of the action”. Na figura 5,

pode observar-se um ciclo da I-A.

Figura 5 – Ciclo da Investigação-Ação

Fonte: McNiff e Whitehead (2006: 9)

A I-A debruça-se sobre a natureza do processo de aprendizagem, assim como, sobre

a ligação entre reflexão e prática e sobre a relação entre experiências particulares e ideias

gerais (Winter, 1996). Para o autor é uma forma de:

investigating professional experience whick link pratice and the analysis of practice into a

single productive and continuously developing sequence, and which link researchers and

research participants into a single community (…)” (p.14).

Segundo Latorre (2003), o termo I-A faz referência a uma série de estratégias

levadas a cabo para aperfeiçoar o sistema socioeducativo. Defini-a como uma

“indagación práctica realizada por el profesorado, de forma colaborativa, con la finalidad

de mejorar su práctica educativa a través de ciclos de acción y reflexión” (p.24). Caetano

(2004:99) descreve-a como:

um dispositivo onde os processos de ação educativa e investigação se produzem mutuamente,

pelo que a investigação acompanha a ação e a ação surge como um dos processos de

investigação para a construção de uma compreensão/conhecimento sobre a ação e contextos,

sendo este conhecimento reinvestido na própria ação, pois visa a sua

regulação/transformação. Trata-se, pois, de um processo de investigação na ação, pela ação

Capítulo 4 - Metodologia de Investigação

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103

e para a ação, onde os próprios atores/autores da ação participam ativamente na pesquisa

desde a sua fase de conceção até à fase de síntese/formalização.

A I-A é uma abordagem de investigação sistemática que permite aos investigadores

encontrar soluções efetivas, para os problemas que surgem na vida quotidiana, permitindo

assim a produção de saberes práticos (Silva, 1996; Stringer, 2007) e meios para melhorar

a sua eficácia profissional, tenha esta lugar em escolas, empresas ou comunidades. Assim,

“assists them in working through the sometimes puzzling complexity of the issues they

confront to make their work more meaningful and fulfilling” (Stringer, 2007:1). Salienta

ainda que “enacts localized, pragmatic approaches to research, investigating particular

issues and problems in particular sites at particular moments in lives of interacting

individuals and groups (Ibidem, p. 210). Em suma, o seu objetivo é “generate living

theories about how learning has improved practice and is informing new practices

(McNiff e Whitehead, 2006:13). Este método é adequado “whenever specific knowledge

is required for a specific problem in a specific situation; or when a new approach is to be

grafted onto an existing system” (Cohen e Manion, 1994:194).

A I-A é uma metodologia de investigação que recorre à pesquisa prática e

aplicada, orientando-se pela necessidade de resolver problemas reais (Coutinho et al,

2009). Deve ser usada fundamentalmente para: (i) melhorar o conhecimento acerca de

um tema específico; (ii) desenvolver as aprendizagens do investigador; (iii) influenciar o

comportamento/aprendizagens de terceiros (McNiff e Whitehead, 2006). Deste forma,

articula a teoria e a prática, sendo que a relação entre investigação e prática tem implícitas

“formas de integração entre conhecimentos e valores. Ambos necessários para orientar a

ação” (Silva, 1996:265).

Existem princípios que são essenciais para caracterizar o processo desta

metodologia, é nomeadamente: (i) participativa - implica todos os intervenientes no

processo; (ii) colaborativa - realizada em conjunto pelos participantes no processo, sendo

que todos os pontos de vista são tidos em conta para “clarify their problemas and

formulate new ways of envisioning their situations” (Stringer, 2007:204); (iii) prática -

intervêm diretamente na realidade; (iv) interventiva - no sentido em que a ação deve estar

vinculada à mudança e ser deliberada; (v) crítica - cria comunidades críticas de

participantes que colaboram nas várias fases do processo, atuando como agentes de

mudança; (vi) cíclica - constitui-se como uma espiral de ciclos - planificação, ação,

observação e reflexão - em que o novo ciclo dá continuidade ao anterior; (vii) auto-

Capítulo 4 - Metodologia de Investigação

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avaliativa - no sentido em que as mudanças são constantemente avaliadas, com o objetivo

de melhorar as práticas. Esta auto-avaliação pressupõe práticas auto-reflexivas (Cohen e

Manion 1994; Silva, 1996; Winter 1996; Latorre 2003; Koshy, 2005; McNiff e

Whitehead, 2006; Coutinho et al, 2009, Amado e Cardoso, 2013); (viii) constitui um

processo sistemático de aprendizagens, orientado para a ação; (ix) conduz a mudanças

gradualmente maiores (Latorre, 2003); (x) induz à teorização acerca das práticas (Latorre,

2003; Winter, 1996); (xi) possui uma componente de auto-transformação; (xii) possui

uma componente de criatividade, que contribui para a sua sustentabilidade enquanto

método investigativo (McNiff e Whitehead, 2006).

Então, formalmente, a I-A é um fenómeno que se foca nos participantes, nas

experiências vividas, interpretando os atos, práticas e atividades desenvolvidas,

possuindo especificidades hermenêuticas, ou seja, interpretando o sentido das ações

quotidianas. Esta característica hermenêutica é fundamental, pois requer que os

participantes trabalhem em conjunto com o objetivo de garantir uma resolução efetiva

para as suas questões/problemas (Stringer, 2007; Carmo e Ferreira, 2008; Máximo-

Esteves, 2008; Coutinho, 2014).

De salientar que a implementação prática da I-A tem uma vertente de

participação/colaboração bastante vincada (Zuber-Skerrit, 1996; Latorre, 2003; Koshy,

2005; Coutinho et al, 2009). Esta visão participativa pressupõe um sentido de ‘igualdade’

entre o investigador e os participantes, pois embora o investigador seja um elemento

central da mudança e assuma um papel ativo no processo de ensino-aprendizagem, os

participantes são peças essenciais no caminho para melhorar a prática profissional. Com

efeito, o educador/professor enquanto investigador qualitativo questiona os participantes,

com o propósito de compreender “aquilo que eles experimentam, o modo como eles

interpretam as suas experiências e o modo como eles próprios estruturam o mundo social

em que vivem” (Bogdan e Biklen, 1994: 51). Como ator, pode ainda tomar a iniciativa,

produzindo conhecimento sobre as suas práticas de apoio à mudança, possibilitando que

este processo leve os restantes participantes a questionarem a sua própria prática,

aprofundando os seus conhecimentos (Silva, 1996).

Sintetizando, consideram-se, então, que as principais vantagens da I-A são: (a)

melhoria da prática; (b) compreensão da prática; (c) melhoria da situação onde ocorre a

prática (Latorre, 2003; Coutinho et al, 2009). Para Latorre (2003:26), esta “se propone

Capítulo 4 - Metodologia de Investigação

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105

mejorar la educación a través del cambio y aprender a partir de las consecuencias de los

câmbios.

No que diz respeito à finalidade do processo de I-A, não é o de criar conhecimento,

mas sim, o de questionar as práticas sociais e os valores que as integram, com a finalidade

de os esclarecer (Latorre, 2003; McNiff e Whitehead, 2006). Stringer (2007:208-210)

defende que “change is an intended outcome of action research (…). Its purpose is to

provide participants with new understadings of an issue they have defined as significant

and the means for taking corrective action.” Desta forma, esta metodologia assume-se

como “un poderoso instrumento para reconstruir las prácticas (…) Conlleva la

comprobación de ideas en la práctica como medio de mejorar las condiciones sociales e

incrementar el conocimiento” (Latorre, 2003:27).

Os estudos acerca do desenvolvimento profissional (Zuber-Skerrit, 1996; McNiff

e Whitehead, 2006; Máximo-Esteves, 2008; Mesquita-Pires; 2010), demonstram que a

escolha pela metodologia de I-A, na área da educação fornece:

bases conceptuais e metodológicas que ajudam o professor a compreender a ação educativa

que desenvolve, a questioná-la, a investigar novas possibilidades, promovendo mudanças que

se refletem na aprendizagem dos alunos. Os projetos sustentados, numa linha metodológica

de investigação-ação, que assumem a complexidade educativa, são entendidos numa aceção

mais profunda, envolvendo metas imediatas, que se articulam com compromissos

educacionais e sociais, a longo prazo. É neste sentido que os profissionais necessitam de

construir conhecimentos, competências, disposições e práticas que se constituam como uma

mais-valia na ação que desenvolvem. (Mesquita-Pires, 2010: 72).

4.3. Modalidades e modelos da investigação-ação

A I-A apresenta-se sob variadas configurações. Assim, as suas modalidades

baseiam-se nos seguintes critérios: objetivos, papel do investigador e relação entre

investigador e participantes. São três as modalidades da I-A: (1) técnica; (2) prática; (3)

emancipatória (ou crítica).

Com base na classificação realizada por Carr e Kemmis (1986), elaborou-se um

quadro síntese dos diferentes tipos de I-A, os quais se encontram sistematizados no

quadro 1:

Capítulo 4 - Metodologia de Investigação

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106

Quadro 1 - Tipos de Investigação-Ação e as suas características

Fontes: Zuber-Skerritt (1996:4); Latorre (2003: 31), tradução livre.

Na I-A técnica, o investigador é um especialista externo que define os objetivos,

assim como os procedimentos metodológicos. Os participantes do processo dependem do

investigador, estabelecendo-se uma relação de cooptação “profundamente assimétrica”

(Máximo-Esteves, 2008:58).

No caso da I-A prática, os docentes tem um protagonismo ativo e autónomo, tendo

o papel de conduzir a investigação. Nesta modalidade a relação mantida entre os

participantes e o investigador é de natureza cooperativa, ajudando-os a detetar problemas,

a planear estratégias e a refletir sobre as mudanças. O investigador assume por isso, um

papel socrático, não intervindo no processo, existindo uma “assimetria menor nas

relações de papéis” (Máximo-Esteves, 2008:59).

A modalidade de I-A emancipatória “vai para além da ação pedagógica, intervindo

na transformação do próprio sistema, procurando facilitar a implementação de soluções

que promovam a melhoria da ação” (Coutinho et al, 2009:365). Converte-se desta forma,

num processo crítico ao nível da intervenção, organização e reflexão das práticas

educativas. Ocorre através de “um processo igualitário de colaboração e partilha de

decisões e responsabilidades” (Máximo-Esteves, 2008:59), desenvolvendo um ambiente

Tipos de

investigação-ação

Objetivos

Papel do investigador

Relação entre

investigador e

participantes

1. Técnica - Melhorar a prática educativa

- Desenvolvimento profissional

‘Especialista’ externo Cooptação

2. Prática

- Como em 1.

- Compreensão dos participantes

- Transformação da consciência dos

participantes

Papel socrático,

encorajando a

participação e a

auto-reflexão

Cooperação

3. Emancipatória

- Como em 2.

- Emancipação dos participantes em

relação aos ditames tradicionais, à auto-

deceção e coerção

- Crítica dos participantes à

sistematização burocrática

- Transformação da organização e do

sistema educativo

Moderador do processo

(responsabilidade

partilhada igualmente

pelos participantes)

Colaboração

Capítulo 4 - Metodologia de Investigação

______________________________________________________________________

107

de maior colaboração social e procura a mudança de forma mais intencional (Coutinho et

al, 2009).

Zuber-Skerritt (1996) advoga que a I-A reflete a mudança, como um ciclo

contínuo, que afeta os participantes, os investigadores, assim como as aprendizagens de

ambos. Assim, todas as modalidades descritas anteriormente tem como suporte um

processo cíclico, havendo uma repetição encadeada das fases anteriores. É ainda de

salientar que as três modalidades de I-A tem objetivos comuns, nomeadamente ao nível

da melhoria da prática educativa e do desenvolvimento profissional (Zuber-Skerritt,

1996; Latorre, 2003).

Latorre (2003: 33) afirma que a I-A se conceptualiza como “un ‘proyecto de

acción’ formado por ‘estrategias de acción’, vinculadas a las necesidades del profesorado

investigador y/o equipos de investigación”. Desta dialógica entre teoria e ação, brota o

carácter cíclico da I-A, um “ ‘vaivén’ -espiral dialéctica- entre la acción y la reflexión, de

manera que ambos momentos quedan integrados y se complementan” (Latorre, 2003: 32).

Segundo Silva (1996), os modelos construídos a partir da metodologia de I-A

destacam a coerência entre a teoria e prática. Para Latorre (2003: 34) “la existencia de

concepciones diversas del processo [de I-A] ha dado lugar a diversas representaciones o

modelos de investigación.” Os modelos são semelhantes, quer a nível da estrutura, quer

a nível do processo, pois todos foram baseados na matriz concebida por Lewin.

De seguida, são apresentados de forma breve, o modelo de Lewin, assim como o

de Kemmis, que apoiam o design desta investigação.

Modelo de Lewin

Lewin preconizou a I-A como ciclos de ação reflexiva, ou seja, uma série de fases,

que se sucedem e se desenvolvem de forma contínua e sequencial - planificação, ação e

avaliação da ação. Estes procedimentos, que funcionam em movimento circular, irão

iniciar um novo ciclo que vai desencadear novas espirais de experiências de ação

reflexiva, ou seja, “se hace un reconocimiento del plan, sus posíbilidades y limitaciones,

se lleva a cabo el primer paso de acción y se evalúa su resultado” (Latorre, 2003:35). De

salientar que esta sequência é repetitiva.

Neste estudo, assumiu-se a necessidade do investigador para analisar o conjunto

de interações que ocorrem durante o processo, reajustando o plano da investigação,

Capítulo 4 - Metodologia de Investigação

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108

através da planificação da fase seguinte, tal como foi preconizado pelo autor e que pode

ser observado na figura 6. Tal como refere Stringer (2007:65) “continuing research cycles

enable evaluation, reformulation, and redevelopment of actions, leading to increasingly

effective solutions to the problem at the heart of the research project.”

Figura 6 – Modelo de Investigação-Ação de Lewin

Fonte: Coutinho et al (2009:368)

Modelo de Kemmis

Este modelo implica quatro fases interligadas: a planificação, a ação, a observação

e a reflexão. Estas organizam-se em dois eixos: (i) eixo estratégico - ação e reflexão; (ii)

eixo organizativo - planificação e observação. A interação destes fatores vai permitir a

resolução de problemas e uma melhor e maior compreensão das práticas educativas, assim

como um “olhar retrospetivo e prospetivo, gerando uma espiral autorreflexiva de

conhecimento e ação” (Coutinho et al, 2009: 368).

De acordo com os autores, as fases cíclicas do processo de I-A vão ocorrer de

acordo com uma sequência de quatro fases: (1) desenvolvimento de um plano de ação,

cuja finalidade é a de alterar aspetos da prática educativa; (2) aplicar o plano de ação na

prática; (3) a observação, que tem como propósito a recolha de dados da ação; (4) reflexão

acerca dos resultados, interpretando a prática educativa e se necessário reformular o

Capítulo 4 - Metodologia de Investigação

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109

plano, o que irá iniciar um novo ciclo espiralado. O esquema que ilustra o modelo, está

esquematizado na figura 7.

Figura 7 – Modelo de Investigação-Ação de Kemmis

Fonte: Coutinho et al (2009:369)

4.4. Técnicas de investigação associadas à investigação-ação

Sempre que é desenvolvida uma investigação, existe a necessidade de recolha de

informação. No caso da I-A, o docente, no papel de investigador vai recolher dados que

reportam à sua prática pedagógica, para a analisar. Para Stringer (2007:65-67):

the first cycle of an action research process is therefore qualitative in nature, requiring

researchers to gather information about participants experiences and perspectives and to

define the problema/issue in terms that ‘make sense’ in their own terms. (…). Participants,

especially the primary stakeholders, are therefore consciously engaged in the process of

describing the nature of the problem and gathering information. (…) Data gathering becomes

an ongoing process that emerges as the investigation proceeds.

De acordo com as perspetivas de McNiff e Whitehead (2006), dados, são as

informações reunidas acerca do que o investigador e os participantes estão a fazer e a

aprender.

Máximo-Esteves (2008) esclarece que quando o investigador analisa um contexto,

no qual é participante quotidianamente, vão existir alguns métodos que se adequam

Capítulo 4 - Metodologia de Investigação

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110

melhor à sua condição de docente-investigador. Existe uma enorme diversidade de

instrumentos e técnicas, passíveis de serem utilizadas para recolher dados e para ajudarem

o investigador a perceber se os dados recolhidos são indicativos de mudanças e/ou

aprendizagens.

Latorre (2003) advoga a existência de uma categorização, dividida em: (i)

técnicas baseadas na observação; (ii) técnicas baseadas na conversação; (iii) análise de

documentos. Existe ainda referência a (iv) meios audiovisuais (Máximo-Esteves, 2008;

Coutinho et al, 2009).

De seguida serão apresentadas, as técnicas e os instrumentos, mais utilizadas no

contexto de uma I-A, através do quadro 2, elaborado de forma a sistematizar e compilar

as perspetivas de diversos autores.

Quadro 2 - Técnicas de Investigação Associadas à Investigação-Ação

Fontes: Latorre (2003); McNiff e Whitehead (2006); Máximo-Esteves (2008); Coutinho et al (2009)

Nesta investigação, a educadora/investigadora utilizou técnicas baseadas na

observação, nomeadamente a observação participante, devido ao facto de estar

ativamente implicada na sala/grupo, interagindo com este enquanto educadora de

infância, técnica que foi complementada por notas de campo (NC), com o intuito de

estudar a prática pedagógica no seu contexto.

Técnicas baseadas na

observação

Técnicas baseadas na

conversação

Análise de documentos Meios audiovisuais

- Observação

participante

- Notas de campo

- Diário do

investigador

- Escalas de medida

- Questionário

- Entrevista

1) Entrevista informal

2) Entrevista formal

2.1) Entrevista em

profundidade

2.2) Entrevista semi-

estruturada

2.3) Entrevista focus

group

- Documentos oficiais

(artigos científicos,

legislação, etc.)

- Documentos pessoais

(método biográfico

narrativo e histórias de

vida)

1) Documentos

naturais

2) Documentos

sugeridos pelo

investigador

(nomeadamente, o

diário do investigador)

- Fotografia

- Vídeo

- Gravação de áudio

Capítulo 4 - Metodologia de Investigação

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111

Através da observação das interações/comportamentos das crianças - a nível

individual e de grupo, quer com os pares, quer com os adultos (educadora de infância,

auxiliar de ação educativa, pais, etc.) - e das notas de campo recolhidas no decorrer das

sessões como participante ativa, a investigadora irá tentar compreender o impacto das

atividades pedagógicas desenvolvidas a partir da literatura infantil, apurando quais as

aprendizagens e/ou experiências interculturais evidentes nos comportamentos das

crianças, no desenvolvimento da interculturalidade.

A descrição das técnicas e instrumentos de recolha de dados, utilizados no decurso

desta investigação serão apresentados e fundamentados no subcapítulo seguinte.

4.5.Técnicas e instrumentos de recolha de dados

O processo de recolha de dados para esta investigação decorreu de setembro a maio,

do ano letivo 2016/2017, ao longo do qual foi desenvolvido um projeto

pedagógico/investigação com um grupo de 24 crianças, com idades compreendidas entre

4 e os 5 anos de idade. Esta recolha adveio do uso das seguintes técnicas: observação

direta e meios audiovisuais.

Na recolha de dados para este estudo foi utilizada primordialmente a observação

direta e outras técnicas de observação que dela derivam, nomeadamente a observação

participante e as notas de campo.

4.5.1. Observação direta

A maior parte da informação que recolhemos do meio envolvente é através da

observação. O objetivo da observação consiste em observar intencionalmente uma

situação, para recolher dados da mesma, possibilitando ao investigador, o acesso às

interações sociais.

No contexto da educação de infância “observar o que as crianças fazem, dizem e

como interagem e aprendem constitui uma estratégia fundamental de recolha de

informação” (Silva et al, 2016:13). As OCEPE salientam a importância da observação e

definem quatro etapas que se complementam: (i) observar, registar e documentar; (ii)

planear; (iii) agir; (iv) avaliar. Estas etapas vão caracterizar:

Capítulo 4 - Metodologia de Investigação

______________________________________________________________________

112

a intencionalidade do/a educador/a, que caracteriza a sua intervenção profissional, exige-lhe

que reflita sobre as conceções e valores subjacentes às finalidades da sua prática (…). Esta

intencionalidade permite-lhe atribuir sentido à sua ação, ter um propósito, saber o porquê do

que faz e o que pretende alcançar (Ibidem).

Assim, a observação pode considerar-se como a primeira fonte de obtenção de

dados (Máximo-Esteves, 2008). A autora defende que “a observação permite o

conhecimento direto dos fenómenos tal como eles acontecem num determinado contexto”

(Ibidem, p.87). Ou seja, permite a compreensão dos contextos, das pessoas que nele

atuam, assim como das suas interações. Angrosino e Rosenberg (2011:151) advogam que

na investigação qualitativa “observations typically take place in settings that are the

natural loci of activity.” Guest, Namey e Mitchell (2013:75), defendem que esta técnica

“is primarily a quantitative technique in which the observer is explicitly counting the

frequency and/or intensity of specific behaviors or events or mapping the social

composition and action of a particular scene”.

Tal como advogam Simpson e Tuson (1995:16), “ the major strength of observing

is the direct access which it gives you to the events or interactions which are the focus of

your research”. Assim, a observação direta é um meio para que o investigador recolha

dados, no espaço onde decorre a ação, permitindo-lhe capturar as interações entre os

intervenientes.

No presente estudo foi realizada observação do tipo participante, em que a

investigadora/educadora observou e interagiu diariamente com o grupo de crianças.

4.5.1.1. Observação participante

De acordo como Jorgensen (1989:14) a observação participante é apropriada, para

todos os tipos de estudo, especialmente para contextos escolares. O autor advoga que esta

“aims to generate practical and theoretical truths about human life grounded in the

realities of daily existence.” É descrita por Guest et al (2013) como a técnica de recolha

de dados mais natural e desafiante, pois “it connects the researcher to the most basic of

human experiences, discovering through immersion and participation the hows and whys

of human behavior in a particular contexto” (p.75).

A observação participante rege-se pelo princípio de que o investigador deve manter

um certo grau de interação com a situação que está a estudar, influenciando-a e sendo

influenciado por ela, requerendo do observador “ a capacidade e a disposição anímica

Capítulo 4 - Metodologia de Investigação

______________________________________________________________________

113

para ‘participar’ intensamente na vida dos observados” (Amado e Silva, 2013:168).

Acerca disto, Simpson e Tuson (1995:55) referem que a observação:

is the most intrusive of all techniques for gathering data. (…) Not only have you to be

sensitive to those you are watching and build up a relationship of trust, you must be clear

what your role is - the extent to which you are an objective, fly-on-the-wall observer, or a

fully involved participant in the on-going events.

Amado (2013) salienta ainda a existência de duas posições no papel do observador: a

rígida e a flexível. Num contexto educativo, especificamente na investigação com

crianças, terá que assumir-se a segunda opção, sendo que o observador deverá alternar a

sua postura em função das situações que possam surgir e da relação com os observados.

Esta é uma das limitações desta técnica, pois é possível que surjam obstáculos na criação

de um clima de confiança entre o investigador e os sujeitos. Em relação a estas premissas,

Bogdan e Biklen (1994: 125) advogam que:

a [sua] participação exata varia ao longo do estudo. (…) À medida que as relações se

desenvolvem, vai participando mais. (…) É necessário calcular a quantidade correta de

participação e o modo como deve participar, tendo em mente o estudo que se propôs elaborar.

Desta forma, o investigador deve estar atento a tudo aquilo que observa no ambiente

educativo e obter quer a opinião, quer a interpretação dos observados. De acordo com

Cohen, Manion e Morrison (2006: 306) a abordagem qualitativa:

draws the researcher into the phenomenological complexity of participants' worlds; here

situations unfold, and connections, causes and correlations can be observed as they occur

over time. The qualitative researcher seeks to catch the dynamic nature of events, to seek

intentionality, and to seek large trends and parterns over time.

A investigadora/educadora realizou observação participante, na qual assumiu um

papel ativo, levando a cabo a investigação, num contexto do qual faz parte, participando

em algumas atividades como membro do grupo e noutras apenas como observadora.

Para Jorgensen (1989:13-14) esta técnica pode ser definida de acordo com as

seguintes caraterísticas:

(1) a special interest in human meaning and interaction as viewed from the perspective of

people who are insiders or members of particular situations and settings;

(2) location in the here and now of everyday life situations and settings as the foundation of

inquiry and method;

Capítulo 4 - Metodologia de Investigação

______________________________________________________________________

114

(3) a form of theory and theorizing stressing interpretation and understanding of human

existence;

(4) a logic and process of inquiry that is open-ended, flexible, opportunistic, and requires

constant redefinition of what is problematic, based on facts gathered in concrete settings of

human existence;

(5) an in-depth, qualitative, case study approach and design;

(6) the performance of a participant role or roles that involves establishing and maintaining

relationships with natives in the field;

(7) the use of direct observation along with other methods of gathering information.

Existem vantagens inerentes à escolha da observação participante para a recolha

de dados. No âmbito deste estudo podem salientar-se: (i) que os estudos de observação

são superiores às experiências e inquéritos quando são recolhidos dados do

comportamento não-verbal; (ii) em estudos de observação, os investigadores são capazes

de distinguir o desenvolvimento dos comportamentos, à medida que estes ocorrem,

adequando as notas relativamente às suas características (Bailey, 1978, citada por Cohen

e Manion, 1994). Também Simpson e Tuson (1995) realçam as vantagens na escolha

desta técnica, salientando que esta melhora a qualidade da recolha de dados, assim como

a sua interpretação, ajudando a estabelecer uma relação de confiança entre o investigador

e os sujeitos.

4.5.1.2.Notas de campo

Tuckman (2000) advoga que numa investigação qualitativa, a observação

pretende analisar o ambiente, sendo que o produto dessa observação é registado através

de notas de campo detalhadas e claras. Para Simpson e Tuson (1995:48) são usadas “to

obtain detailed descriptions of interactions or events without starting from pre-specified

categories.” De acordo com Bogdan e Biklen (1994: 150-151) estas representam a melhor

forma de recolher dados na investigação qualitativa. Descrevem-nas como:

o relato escrito daquilo que o investigador ouve, vê, experiencia e pensa no decurso da

recolha e refletindo sobre os dados de um estudo qualitativo.(…) As notas de campo podem

originar em cada estudo um diário pessoal que ajuda o investigador a acompanhar o

desenvolvimento do projeto, a visualizar como é que o plano de investigação foi afetado

pelos dados recolhidos, e a tornar-se consciente de como ele ou ela foram influenciados pelos

dados.

Capítulo 4 - Metodologia de Investigação

______________________________________________________________________

115

Os autores reforçam ainda que estas consistem em dois tipos de materiais: (i) o

descritivo, cujo intuito é registar de forma objetiva e descritiva, todos os detalhes que

tiveram lugar no local onde se encontrava; (ii) o reflexivo que visa o ponto de vista do

investigador, assim como os seus pensamentos e/ou reflexões.

Realizar observações envolve uma grande variedade de critérios por parte do

observador/investigador, tal como descreve Kawulich (2005:7):

“ethics, establishing rapport, selecting key informants, the processes for conducting observations,

deciding what and when to observe,keeping field notes and writing up one's findings.” O autor defende

que as notas de campo devem conter tudo o que for observado, em detalhe. O investigador

deve rever, analisar e refletir acerca das suas notas ao longo do processo de observação.

Nesta linha, Simpson e Tuson (1995:13) acrescentam ainda que após as notas de campo,

o estudo evolui para um “set of categorisations for the behaviours or interactions recorded

as the study proceeds.”

Neste estudo, no contexto das atividades realizadas com e pelas crianças no

decorrer do projeto, realizaram-se notas de campo, com base em registos escritos

decorrentes da observação das dinâmicas de trabalho e das interações em sala.

4.5.1.3.Produções das crianças

No decorrer do projeto de investigação, foram recolhidos trabalhos elaborados

pelas crianças. A recolha realizou-se ao abrigo de um termo de consentimento (Anexo 4 - Termo

de consentimento enviado aos encarregados de educação) solicitado aos encarregados de educação, para que

a educadora/investigadora pudesse efetuar a recolha dos dados.

As produções recolhidas ao longo do ano letivo pretendiam registar as

representações gráficas/escritas das crianças, acerca das aprendizagens que efetuaram no

âmbito do trabalho educativo a partir da literatura infantil para o desenvolvimento da

interculturalidade e também para que as crianças pudessem “build up a portfolio and a

personal record of their story-based work that they can share with their parents” (Ellis e

Brewster, 2014:21).

Capítulo 4 - Metodologia de Investigação

______________________________________________________________________

116

4.5.2. Meios audiovisuais

Os registos fotográficos servem para “help [to] remember

activities, and photographs can serve as illustrations of aspects of activities that are not

easily described” (Kawulich, 2005:17). Desta forma, a recolha de dados foi também

realizada através de meios de recolha digital, nomeadamente fotografias das várias

produções resultantes das sessões do projeto.

Sendo que a investigadora, é também a educadora titular do grupo, tem desde o

início do ano letivo uma autorização dos pais para recolha de dados audiovisuais, para

utilização em contexto institucional. Neste âmbito, é necessário referir que no termo de

consentimento anteriormente referido, foi garantido aos encarregados de educação o

anonimato das crianças, assegurando-lhes o sigilo em relação à utilização de fotografias

que permitissem identificá-las.

Capítulo 5 - Contexto e Participantes do Estudo

______________________________________________________________________

117

CAPÍTULO 5

CONTEXTO E PARTICIPANTES DO ESTUDO

A presente investigação decorreu num colégio privado, com fins lucrativos,

situado na margem sul do Tejo, especificamente no Barreiro. Foi realizada na valência de

jardim de infância, em que os participantes do processo de ensino-aprendizagem, foram

o grupo de crianças/sujeitos e a educadora/investigadora.

Assim, a caracterização realizada de seguida, tem como fonte o Projeto Educativo

de Escola (em vigor de 2015 a 2018) e vai focar-se primordialmente no jardim de infância,

valência em que a investigação foi implementada.

5.1.Caracterização do colégio

5.1.1. Localização e meio envolvente

O concelho do Barreiro está integrado no distrito de Setúbal, pertencente à área

metropolitana de Lisboa, localizada na margem sul do rio Tejo e tem aproximadamente

78.000 habitantes.

O colégio “Missão”1 situa-se na freguesia de Santo André, numa zona habitacional,

comercial e de serviços. Na comunidade existem bens e serviços que vão de encontro às

necessidades da população. Em termos económicos, os sectores mais dinâmicos são: (i)

atividades imobiliárias e construção; (ii) atividades financeiras e serviços; (iii) turismo e

lazer; (iv) agro-indústrias; (v) indústria automóvel; (vi) transportes e comunicações.

A valência de creche situa-se na freguesia de Palhais, uma zona maioritariamente

residencial.

O jardim de infância situa-se na União de freguesias de Alto Seixalinho, Verderena e

Santo André, na cidade do Barreiro, numa zona habitacional, comercial e de serviços. Por

estar integrada numa comunidade educativa, também participa em alguns eventos, de

cariz cultural, organizados pela junta de freguesia, em conjunto com outras escolas,

inseridas no ensino público e no ensino particular e cooperativo.

O 1º Ciclo e o CATL situam-se na União de freguesias de Palhais e Coina. Esta zona

é maioritariamente constituída por escritórios e empresas de diferentes áreas.

1 Designação fictícia, de forma a proteger a identidade do colégio

Capítulo 5 - Contexto e Participantes do Estudo

______________________________________________________________________

118

5.1.2. Princípios educativos

As linhas orientadoras da ação pedagógica do colégio Missão tem como objetivos:

(i) a contemplação de diferentes formas de aprendizagem ativa e significativa; (ii)

estimular o desenvolvimento global da criança no respeito pelas suas características

individuais, adotando uma pedagogia organizada e estruturada que valoriza o carácter

lúdico, promove a autoestima e a autoconfiança; (iii) proporcionar ocasiões de bem-estar

e de segurança, promovendo o desenvolvimento pessoal e social e estimulando a

curiosidade e o espírito crítico das crianças. Estas linhas vão baseiam-se em cinco

critérios: (i) a criança; (ii) a família; (iii) o educador/professor; (iv) a equipa; (v) a

metodologia utilizada em contexto de sala.

Assim, o colégio reconhece a criança como principal sujeito do processo educativo,

procurando promover a sua formação pessoal e social com base em experiências de vida

democrática numa perspetiva de educação para a cidadania. Contempla o processo

educativo como um ato dinâmico, interativo e continuado, onde os saberes da criança, a

sua cultura e vivências são o ponto de partida para a ação educativa. Defende ainda a

formação da criança como um ser que deve possuir e desenvolver raciocínio lógico e

espírito crítico, com o intuito de cada criança ser capaz de pesquisar, investigar, selecionar

informação, mobilizar saberes e conhecimentos, adotar metodologias personalizadas de

trabalho e estratégias adequadas à resolução de problemas e à tomada de decisões,

realizando estas atividades de forma autónoma, cooperante, responsável e criativa.

Defende ainda que a prática do ensino deve promover um processo de trabalho

cooperativo e um genuíno intercâmbio na sala de atividade/de aula, que pressupondo o

diálogo e a inerente negociação, concretize democraticamente, e de uma forma flexível,

todos os conteúdos (conhecimentos, procedimentos e atitudes). Desta forma, o

educador/professor deve procurar criar/facilitar as condições possíveis para implementar

um “clima” de sala cooperativo, empático e estimulador da autonomia, para que os alunos

estabeleçam as relações propiciadoras da sua maturação humana e social.

O colégio promove a participação das famílias, a escola aberta à comunidade, os

saberes e vivências da criança, como pontos de referência para a prática pedagógica dos

docentes. Defende assim, a importância de um contexto participativo e alicerçado em

parcerias, sustentado pela prática quotidiana do trabalho cooperativo. Privilegia assim, os

contatos informais, relacionais e a participação na vida escolar dos educandos.

Capítulo 5 - Contexto e Participantes do Estudo

______________________________________________________________________

119

O trabalho de equipa e os valores de vida democrática é outro dos princípios onde

fundamenta a prática, numa conceção de escola democrática, ancorada em atitudes e

valores como a autonomia e a responsabilidade individuais, a justiça e o respeito pela

diversidade a todos os níveis.

Para isto, assume que o educador de infância e o professor assumem o papel de

construtores e gestores do currículo, procurando ir ao encontro das diferentes

necessidades e interesses do grupo em colaboração alargada com os diferentes parceiros

educativos (pais/família/comunidade), num processo reflexivo de observação,

planeamento, ação e avaliação.

Especificamente, na creche e no jardim de infância - onde esta investigação foi

desenvolvida - assume-se como principal base as orientações do Ministério da Educação

e Ciência, especificamente as OCEPE, pondo em prática modelos curriculares e

princípios educativos preconizadas pelo Movimento da Escola Moderna (MEM), o

Modelo High/Scope e a Metodologia de Trabalho de Projeto. Assim, de acordo com o

trabalho de cada educadora, pretende-se tirar partido dos aspetos mais proficientes de

cada um destes modelos pedagógicos, de forma a ir de encontro aos interesses das

crianças no que diz respeito à sua aprendizagem e desenvolvimento, tendo por base os

objetivos educativos institucionais. Esta preocupação traduz-se no apetrechamento das

salas e adequação dos espaços; pelo facultar de experiências significativas adequadas aos

diferentes estádios de desenvolvimento (High/Scope), pelos instrumentos de trabalho

utilizados (quadro das presenças, quadro de atividades, quadro de tarefas, plano semanal,

lista de projetos e diário de turma) e, gestão democrática da vida em grupo (MEM) assim

como pelos projetos a desenvolver com o grupo de crianças (Pedagogia de Projeto).

No 1º ciclo do ensino básico e ao longo de quatro anos, preconiza-se que se deve

proporcionar ao aluno a aquisição e domínio dos saberes nas diversas áreas curriculares

lecionadas mas, também, o desenvolvimento global e harmonioso da sua personalidade,

bem como o desenvolvimento de valores, atitudes e práticas que contribuam para a

formação de cidadãos conscientes e participativos. Pretende-se, assim, o equilíbrio entre

o domínio do conhecimento académico e o domínio de valores, atitudes e capacidades.

Desta forma, esta visão concretiza-se como um projeto pedagógico global e

abrangente, enquadrado pelos objetivos gerais do ensino básico, delineados pelo

Ministério da Educação. O aluno é o centro das aprendizagens, que se querem

diversificadas e significativas, onde são contemplados os diferentes ritmos e as

Capítulo 5 - Contexto e Participantes do Estudo

______________________________________________________________________

120

necessidades individuais. Desta forma, o processo ensino-aprendizagem é uma atividade

articulada e conjunta entre os alunos e o educador/professor. Os princípios atrás

enunciados requerem, da parte do docente, a consideração de um conjunto de valores

profissionais que mobilizem estratégias e atitudes que permitam a cooperação e o sucesso

das aprendizagens dos alunos.

Algumas das metodologias usadas em sala de aula são: Trabalho de Projeto

(estruturação por projetos que permitam a aquisição e desenvolvimento dos objetivos

enunciados pelo Ministério de Educação e dentro do possível, determinados pelos

interesses e necessidades dos alunos) e ensino diferenciado na sala de aula (utilização de

estratégias de trabalho diferenciado na sala de aula com alunos que apresentam

dificuldades de aprendizagem).

Paralelamente o colégio pretende adotar uma linha pedagógica tendo por base o

construtivismo numa perspetiva de Educação para a Diversidade. Defende a importância

da formação contínua e o rigor científico, assim como a partilha de diferentes ideias e

saberes de forma a criar um currículo que fundamente a sua ação e que vá ao encontro

das necessidades das crianças, colocando ênfase no desenvolvimento de competências

essenciais de forma equilibrada.

5.1.3 Instalações

O Colégio Missão é composto pelas valências de creche, jardim de infância e 1º

ciclo do ensino básico, assim como pelo Centro de Atividades de Tempos Livres (CATL).

Está dividido em três espaços físicos, situados em duas freguesias diferentes do

concelho do Barreiro. O colégio iniciou a sua ação educativa com a valência de creche,

em 2005, tendo alargado para a valência de jardim de infância e CATL em 2010 e

ampliando para 1º ciclo, em 2015.

De seguida, serão focadas as instalações do jardim de infância, onde este estudo

foi posto em prática. Assim, esta valência recebe crianças com idades compreendidas

entre os 3 e os 6 anos, possuindo infraestruturas adequadas às necessidades do público-

alvo.

O jardim de infância situa-se num piso térreo, construído de raiz e possui alvará

para quatro salas de atividades para o pré-escolar. Para além destas salas existem ainda

diferentes espaços, nomeadamente:

Capítulo 5 - Contexto e Participantes do Estudo

______________________________________________________________________

121

(i) Cozinha; (ii) Casa de lixos; (iii) Sala de refrigeração - A cozinha

situa-se numa zona central, com acesso aos vestiários dos funcionários, à

sala de refrigeração, à casa dos lixos, à despensa e a uma das diferentes

portas de emergência existentes na instituição.

(iv) Despensa - onde se encontram arrumados os materiais

pedagógicos e de desgaste comuns e utilizados nas salas de atividade.

(v) Vestiário - Aqui podemos encontrar duas casas de banho de

adultos, equipadas com duche. É neste local que se situam os cacifos das

funcionárias.

(vi) Sala polivalente/refeitório - espaço pensado para a realização

de múltiplas atividades. Tem como principais funções a de refeitório e de

espaço destinado a atividades físicas (Motricidade, Judo, Ballet, Dança,

Criativa, Yoga e Patinagem).

(vii) Escritório/ Receção - situado à entrada da instituição, sendo

destinado ao atendimento de pais/familiares e ao trabalho administrativo.

É também servido por uma casa de banho de adultos que serve o público

em geral.

(viii) Quatro salas de pré-escolar - Todas as salas têm 50 m² e

capacidade para 25 crianças, com idades compreendidas entre os 3 e os 6

anos. As quatro salas estão distribuídas da seguinte forma:

- Duas salas de 3/4 anos;

- Uma sala de 4/5 anos;

- Uma sala de 5/6 anos;

Todas as salas têm acesso direto ao exterior. Existe também uma

porta corta-fogo e uma porta principal com acesso ao corredor central.

Todas possuem iluminação natural e artificial, tem pavimento radiante, o

que mantêm a temperatura ambiente estável;

De salientar que todos os materiais (mesas, cadeiras, paredes, chão,

etc…) são de material lavável e não tóxico.

(ix) Três casas de banho que servem as salas de pré-escolar - no

corredor central encontram-se duas casas de banho equipadas com loiças

ajustadas à estatura e faixa etária das crianças, que se destinam a servir as

três salas de atividades de pré-escolar. Estão equipadas com duche e

Capítulo 5 - Contexto e Participantes do Estudo

______________________________________________________________________

122

fraldário. Existe ainda uma casa de banho interna, numa das salas de 4/5

anos, que possui as mesmas características que as descritas anteriormente.

(x) Uma sala destinada a apoio psicopedagógico, assegurado por um

centro terapêutico-pedagógico;

(xi) Casa de máquinas - Este espaço é destinado apenas à caldeira de

aquecimento, que serve a instituição;

(xii) Espaço exterior com equipamentos infantis.

De referir que no hall da receção se encontram expostos todos os documentos

importantes referentes à instituição (alvará, certificado de desempenho energético, etc.).

5.1.4. Recursos humanos

A divisão do pessoal docente e auxiliar é realizada segundo a especialização de

cada um, tendo em conta as valências, o número de crianças, bem como algumas

necessidades pontuais que possam, eventualmente, surgir.

Quanto ao pessoal docente, a instituição dispõe de nove educadoras, colocadas em

cada uma das nove salas de creche e jardim-de-infância, três professoras de 1.º ciclo,

responsáveis pelas turmas de 1º, 2º e 3º anos e uma professora de 1º ciclo responsável

pelo CATL.

O pessoal auxiliar de ação educativa, está dividido pelas diferentes valências e pelo

CATL, segundo as necessidades de cada uma delas. A creche e o jardim de infância,

possuem uma auxiliar de ação educativa, afeta à sala, com exceção do berçário que possui

duas. Em ambas as valências existem professores especializados, que lecionam as

atividades curriculares e extracurriculares (inerentes a cada uma delas), são elas: Música,

Inglês, Motricidade, Natação, Ballet, Dança Criativa, Patinagem, Judo e Yoga.

No 1.º ciclo existem quatro auxiliares a prestar apoio durante os momentos de

recreio e almoço, bem como professores em coadjuvância nas áreas de Expressão e

Educação Musical, Expressão e Educação Físico-Motora, Inglês e TIC.

A instituição conta também com: (i) o serviço de cozinha/refeitório, realizado por

uma cozinheira e uma ajudante de cozinha; (ii) o serviço de manutenção e de limpeza que

efetuado por empresas externas; (iii) o serviço de transporte que é assegurado por duas

empresas, que trabalham em parceria com o colégio; (iv) o serviço de apoio

Capítulo 5 - Contexto e Participantes do Estudo

______________________________________________________________________

123

psicopedagógico, assegurado por um centro terapêutico-pedagógico que uma equipa

multidisciplinar, com o qual a instituição tem protocolo.

A direção administrativo-financeira é constituída pela proprietária. A direção

pedagógica da creche e jardim de infância encontra-se a cargo da educadora de infância

titular do grupo de 3 anos e a coordenação do 1º ciclo do ensino básico está entregue

encontra-se à professora titular do grupo de 2º ano.

5.1.5. Organização institucional

O colégio encontra-se organizado de acordo com as diretrizes instituídas pela

direção administrativa e financeira e constantes do regulamento interno, e com as

finalidades educativas estabelecidas em parceria por esta e pela direção pedagógica.

Encontra-se em funcionamento todos os dias do ano, com exceção dos feriados

nacionais e municipais, assegurando a permanência das crianças entre as 7h30 e as 19h30.

As equipas pedagógicas de sala, quer em creche, quer em jardim de infância são

compostas por uma educadora de infância e uma auxiliar de ação educativa. As

educadoras de creche seguem o seu grupo desde a idade de 1 ano até aos 3 anos, altura

em que os grupos prosseguem para o jardim de infância, iniciando o percurso com outra

educadora que os acompanha dos 3 aos 6 anos de idade. As auxiliares acompanham os

grupos dos 1-3 anos e dos 3-6 anos, no entanto encontram-se em regime de rotatividade,

podendo ser-lhes atribuída qualquer umas das valência.

No 1º ciclo, a professora titular acompanha o grupo do 1º ao 4º ano de escolaridade.

As auxiliares acompanham os grupos nos momentos não letivos e tempos livres.

O projeto aglutinador da instituição com a designação “Aprende a Criarte” tem a

duração de três anos letivos, sendo transversal e desenvolvido nas diversas áreas

curriculares de cada valência, de acordo com a planificação de cada educadora/professora.

Este projeto pretende que através da vivência de diferentes formas de arte, sejam

desenvolvidas competências fundamentais ao desenvolvimento integral de cada criança,

tendo em conta as diferentes áreas de conteúdo da Educação Pré-Escolar/disciplinas e

áreas curriculares do currículo nacional.

Em relação à organização pedagógica, existe uma calendarização anual,

organizada por trimestres, em que de acordo com o tema, se irão corelacionar as diferentes

formas de arte. Cada educadora/professora elabora o o projeto curricular para o seu grupo,

Capítulo 5 - Contexto e Participantes do Estudo

______________________________________________________________________

124

tendo em consideração, quer os temas definidos para cada ano letivo referente ao projeto

de escola, quer o projeto de sala que pretenda desenvolver, contextualizando e

relacionando ambos os projetos. Para a elaboração do seu projeto de sala, as docentes tem

ainda em consideração a idade/grupo de crianças e as áreas de conteúdo definidas pelas

OCEPE/ programas curriculares estipulados pelo Ministério da Educação e Ciência para

o 1ºciclo do ensino básico. Posteriormente, no caso das valências de creche e jardim de

infância, a organização pedagógica de cada sala traduz-se ainda por planificações

semanais realizadas pelas educadoras, com base no que foi anteriormente descrito.

Em relação a reuniões internas: (i) a direção reúne com todo o corpo docente e não

docente, no início de cada ano letivo e no final deste; (ii) a direção pedagógica reúne-se

com as equipas de educadoras/professoras de cada uma das valências, pontualmente e/ou

sempre que se justificar; (iii) a equipa de sala - educadora de infância e auxiliar de ação

educativa- reúnem-se de forma informal, para fazer o balanço do projeto, sempre que for

necessário.

Relativamente a reuniões de encarregados de educação, as educadoras reúnem-se

com os pais trimestralmente (setembro, janeiro e junho), existindo ainda a possibilidade

de marcação de reuniões individuais, em horário a determinar.

No que diz respeito à avaliação nas valências de creche e jardim de infância, esta

é realizada de forma diagnóstica no início do ano letivo, tendo em vista a caracterização

do grupo e de cada criança, necessidades, interesses e contextos familiares, assim como

no decorrer do ano letivo de forma formativa para permitir às educadoras, a

adequação/implementação de estratégias de diferenciação pedagógica, contribuindo para

a elaboração, adequação e reformulação do projeto curricular de sala e ainda para facilitar

a integração da criança no contexto educativo. Assim, os procedimentos de avaliação tem

em consideração a idade e as características de desenvolvimento das crianças, assim como

a articulação entre as diferentes áreas de conteúdo da educação pré-escolar. Esta avaliação

tem um carácter qualitativo, sendo entregue aos pais por escrito, trimestralmente (janeiro,

abril e junho).

Na valência de 1º ciclo, a avaliação incide sobre as aprendizagens e objetivos

definidos no currículo nacional para as diversas áreas disciplinares, expressas no projeto

curricular de escola e no projeto curricular de turma, por ano de escolaridade. A avaliação

tem uma vertente diagnóstica, formativa e sumativa, existindo testes de avaliação escrita,

em que esta é expressa de forma qualitativa. Os testes, assim como os materiais de apoio,

Capítulo 5 - Contexto e Participantes do Estudo

______________________________________________________________________

125

são apresentados em reunião de pais trimestral, no final de cada período. No final do ano

letivo, é ainda entregue uma avaliação escrita.

De seguida, será apresentado o organograma do colégio Missão.

Figura 8 - Organograma do Colégio “Missão”

5.2. O grupo de crianças

5.2.1. Contexto sociofamiliar

O sistema familiar é o primeiro agente de socialização no percurso da criança,

sendo marcante na construção da personalidade dos sujeitos educativos, assim como no

desenvolvimento de competências sociais, intelectuais e morais.

Tendo esta premissa em conta, de seguida serão sintetizados no quadro 3, os dados

sociofamiliares relativos ao grupo de crianças. Serão focados os seguintes aspetos: nível

socioeconómico, habilitações académicas/categoria profissional e número de irmãos.

Capítulo 5 - Contexto e Participantes do Estudo

______________________________________________________________________

126

Nome

da

criança

Nível

socioeconómico

Mãe Pai Nº de

filhos

por

casal

Habilitações

académicas

Categoria

profissional

Habilitações

académicas

Categoria

profissional

C. B. Médio 12º ano Administrativa 12º ano Gerente de loja 1

C. L. Médio-Alto Licenciatura Comerciante Licenciatura Comerciante 2*

D. F. Médio-Alto Licenciatura Professora

2ºciclo

Licenciatura Engenheiro 1

F. M. Médio-Alto Licenciatura Jurista Licenciatura Chefe de gráfica 1

F. P. Médio-Alto 12º ano Administrativa 12º ano Comerciante 2

G. R. Médio-Alto Licenciatura Técnica Superior

de Segurança e

Higiene do

Trabalho

Licenciatura Engenheiro 1

L. P. Médio-Alto Licenciatura Professora

1ºciclo

Licenciatura Diretor de

marketing

2

L. C. Médio-Alto Licenciatura Engenheira Licenciatura Engenheiro 2*

M. N. Alto Licenciatura Farmacêutica Licenciatura Diretor técnico

de farmácia

2*

M. S. Médio-Baixo 12º ano Administrativa 12º ano Técnico de

informática

2*

M. A. Médio-Baixo Licenciatura Educadora de

infância

12º ano Técnico de

mecânica

1

M. C. Médio-Alto Licenciatura Contabilista Licenciatura Engenheiro 1

M. J. Médio-Alto Licenciatura Gestora Licenciatura Engenheiro 2*

M. V. Alto Licenciatura Assistente de

bordo

Licenciatura Comissário de

bordo

1

M. C. Médio-Alto Licenciatura Farmacêutica 12º ano Técnico de

integração de

sistemas

2*

M. C. Médio-Alto 12º ano Delegada de

ação médica

12º ano Técnico de

manutenção de

equipamentos

1

M. M. Médio 12º ano Administrativa 12º ano Técnico de

mecânica

2*

R. Q. Médio-Baixo Licenciatura Jornalista Licenciatura Professor de

educação física

1

S. C. Médio 12º ano Gerente de loja 12º ano Técnico de

mecânica

1

T. S. Médio-Alto Licenciatura Diretora técnica Licenciatura Diretor técnico 3

T. C. Médio-Baixo 12º ano Bombeira

profissional

12º ano Bombeiro

profissional

1

Capítulo 5 - Contexto e Participantes do Estudo

______________________________________________________________________

127

T. C. Médio ____ Comerciante ____ Comerciante 2

T. R. Médio-Alto Licenciatura Técnica

imobiliária

Licenciatura Oficial da

Marinha

1

V. B. Médio-Alto Licenciatura Professora de

matemática

12º ano Vendedor 1

* Ambos a frequentar o colégio

Quadro 3 - Dados sociofamiliares do grupo

De seguida são apresentados os gráficos que ilustram os dados sociofamiliares

referidos anteriormente.

Gráfico 1 – Nível socioeconómico das famílias

Gráfico 2 – Habilitações académicas dos pais

17%

58%

17%

8%

Nivel socioeconómico das famílias

Nível médio Nivel médio-alto Nivel médio-baixo Nível alto

35%

61%

4%

Habilitações académicas dos pais

12º ano Licenciatura Sem indicação

Capítulo 5 - Contexto e Participantes do Estudo

______________________________________________________________________

128

Gráfico 3 – Número de filhos por casal

Assim, a maioria das famílias (14) insere-se no nível socioeconómico médio-alto,

enquanto as restantes se enquadram no nível médio (4), médio-baixo (4) e alto (2).

Relativamente às habilitações académicas de ambos os pais, a maioria dos pais

(29) possui habilitações académicas com formação de nível superior, nomeadamente,

licenciatura, exercendo profissões cientificas e/ou intelectuais. Existem ainda alguns pais

com o ensino secundário completo - 12º ano (17), que exercem profissões de nível

intermédio, nomeadamente pessoal administrativo, técnico ou comerciantes de vários

ramos industriais. De referir que alguns pais (2) não identificaram as suas habilitações

académicas.

No que diz respeito ao número de filhos por agregado familiar existem casais com

um filho (13), com dois filhos (10) e com três filhos (1).

De salientar que todas as crianças do grupo, vivem com ambos os pais, em

habitação própria. Os pais tem idades compreendidas entre os 33 e os 48 anos de idade.

5.2.2. Caracterização do grupo

O grupo tem idades compreendidas entre os 4 e os 5 anos, sendo constituído por

24 crianças, em que 20 das crianças são de origem portuguesa, uma de origem romena,

uma de origem indiana, uma de origem brasileira e uma de origem chinesa.

54%42%

4%

Número de filhos por casal

1 filho 2 filhos 3 filhos

Capítulo 5 - Contexto e Participantes do Estudo

______________________________________________________________________

129

É um grupo “heterogéneo”, do ponto de vista da idade cronológica. A grande

maioria das crianças completaram os 4 anos de idade, até ao final do ano civil de 2016,

com exceção de 5 crianças que realizaram 5 anos de idade.

A grande maioria do grupo da sala dos 4/5 anos já frequentava a mesma sala no

ano letivo anterior, existindo apenas duas crianças novas a ingressar. Estas estiveram em

fase de adaptação aos novos colegas, à nova sala e à equipa de sala. As restantes crianças

estiveram também em adaptação à nova educadora, à implementação de uma dinâmica

de sala/ grupo e às novas regras/rotinas da sala.

A constituição do grupo é descrita no quadro abaixo:

Quadro 4 – Constituição do grupo

Nome da criança Data de nascimento

C. B. 12/9/2011

C. L. 5/6/2012

D. F. 21/10/2012

F. M. 17/12/2011

F. P. 23/11/2011

G. R. 4/6/2012

L. P. 24/3/2012

L. C. 4/7/2012

M. N. 24/7/2012

M. S. 14/3/2012

M. A. 18/7/2011

M. C. 12/4/2012

M. J. 12/2/2012

M. V. 24/3/2012

M. C. 3/7/2012

M. C. 2/6/2012

M. M. 13/4/2012

R. Q. 28/2/2012

S. C. 21/6/2012

T. S. 28/2/2012

T. C. 17/9/2011

T. L. 6/4/2012

T. R. 27/8/2012

V. B. 25/3/2012

Capítulo 5 - Contexto e Participantes do Estudo

______________________________________________________________________

130

Segundo as OCEPE, relativamente à área de conteúdo da formação pessoal e

social, as crianças reconhecem e aceitam as características individuais de cada colega,

sendo que todos se reconhecem/identificam como membros do grupo. Circulam

livremente pelas áreas da sala, brincando em pequeno e grande grupo, tendo noção das

diferentes áreas de atividade, número limite de crianças que podem estar em cada área e

do comportamento a ter em cada uma delas. Interagem facilmente em momentos de

brincadeira livre/jogos, esperando a sua vez para jogar e/ou falar.

Algumas crianças revelam preferências a nível das amizades, gostando de brincar

com os amigos de eleição, mas ainda demonstram muita relutância em partilhar objetos

com que brincam. Verifica-se ainda a existência de alguns sub-grupos.

O grupo revela evolução a nível da capacidade de autonomia, quer a nível da sua

independência pessoal (alimentação, gestão das suas preferências pessoais, arrumar,

vestir/despir/calçar peças simples de vestuário), quer a nível das tomadas de decisão a

nível individual/grupo.

Durante o ano letivo, consciencializaram-se das regras e dinâmicas de grupo/sala,

competências imprescindíveis para a tomada de consciência do outro e para a vida em

sociedade. Embora revelem bastante diversidade de comportamentos, quer no seu

relacionamento com os pares, quer no seu comportamento individual, o grupo revela no

geral, ser participativo nas tarefas que lhes são propostas. Demonstram ter capacidade de

concentração, para realização da grande das tarefas propostas durante a rotina educativa.

Na área de expressão e comunicação e a nível da educação física tem consciência

do seu corpo e um bom domínio deste, utilizando-o avidamente para explorar o meio

envolvente. Especificamente ao nível da motricidade fina, revelam ainda ser capazes de

manusear corretamente os mais diversos materiais (pincéis, marcadores, tesouras, lápis,

etc…) e da executar tarefas como grafismos simples, recorte ou pintura dentro do

contorno.

No domínio da educação artística demonstram estar a melhorar o sentido estético

ao nível das suas produções, especialmente no desenho da figura humana, que ser revela

agora mais estruturada e em alguns casos com recurso a pormenores. Demonstram

comportamentos de compreensão de jogo simbólico/dramático, reconhecem/identificam

vários instrumentos musicais, sendo capazes de reproduzir canções aprendidas com

facilidade. São ainda capazes de comunicar e de se expressarem através da dança.

Capítulo 5 - Contexto e Participantes do Estudo

______________________________________________________________________

131

No subdomínio da linguagem oral e abordagem à escrita, são capazes de manter

um diálogo coerente, quer com os pares, quer com os adultos. Existem progressões

notórias ao nível do desenvolvimento linguístico, especialmente ao nível da consciência

fonológica. Em geral já reconhecem todas as vogais, em formato maiúsculo e minúsculo,

assim como as letras que compõem os seus nomes próprios. No domínio matemático, a

grande maioria já reconhece algarismos de 0 a 9, tendo interiorizado o sentido de número

nas suas 3 vertentes (contagem, reconhecimento e associação quantidade-número).

Na área de conhecimento do mundo, revelam ser crianças observadoras e curiosas

que gostam de experienciar atividades novas, que tem noção do meio que os rodeia e das

mudanças que nele vão ocorrendo. Em geral identificam vários países, associando-os aos

continentes de origem. Reconhecem ainda traços distintivos de várias culturas. Assim,

demonstram um bom conhecimento do mundo social, físico e natural.

Apesar da grande maioria das crianças do grupo terem idade cronológica

aproximada, verificam-se níveis de desenvolvimento e de maturidade diferenciados (em

cada período letivo, através das interações diárias e de observação participante, a

educadora recolhe dados, que se irão traduzir num gráfico circular, onde estão descritas

as competências expectáveis para cada idade em tabelas. O gráfico/tabelas foram

construídas no ano letivo 2016/2017, tendo como base uma compilação de

competências/aprendizagens a desenvolver, preconizadas nas OCEPE [2016]).

De salientar que o grupo foi acompanhado por outra educadora de infância,

durante três anos letivos (sala de 1, 2 e 3 anos). No ano letivo 2016/2017, a

educadora/investigadora assumiu o grupo, que manteve o acompanhamento da mesma

auxiliar de ação educativa.

5.2.3. O espaço educativo - sala dos 4 anos

A forma como o espaço físico está organizado vai determinar a maneira como as

crianças vão agir e construir o seu conhecimento. Sendo um fator determinante, o espaço

deve ser pensado tendo em conta as intencionalidades educativas e ir ao encontro dos

interesses e necessidades do grupo de crianças, pois será nele que vão passar grande parte

do seu tempo, a experienciar e a explorar. Assim, “num contexto de aprendizagem ativa

Capítulo 5 - Contexto e Participantes do Estudo

______________________________________________________________________

132

as crianças necessitam de espaços que sejam planeados e equipados de forma a que essa

aprendizagem seja efetuada” (Hohmann e Weikart, 1995:161).

O espaço está equipado com materiais adequados à faixa etária, sendo que estes estão

ao alcance das crianças, para que estas possam interagir de forma espontânea e autónoma.

A sala situa-se em piso térreo, sendo ampla e tendo iluminação natural, através de

duas grandes janelas/ uma porta de vidro (que dá acesso ao recreio exterior).

A sala possui dois grandes móveis de arrumação, onde estão arrumados vários

materiais didáticos utilizados regularmente na sala. Possui ainda dois placards fixos e

também um placard no exterior da sala, que tem o mesmo objetivo – afixar os trabalhos

realizados. Possui ainda um lavatório e dispensador de papel, para apoio às atividades

realizadas em sala.

O espaço encontra-se organizado por áreas de atividade, que estão identificadas com

o nome em letra de imprensa maiúscula, imagens reais e o número de crianças que nela

podem estar (com o algarismo e respetiva quantidade). Nelas, “papéis sociais, relações

interpessoais, estilos de interação – que constituem a textura social básica – são vividos,

experienciados, perspetivados nas experiências que cada área específica permite, nas

naturais saídas de uma área e entrada noutra que o desenrolar do jogo educacional vai

requerendo (…) um amplo espaço educacional desta natureza torna-se condição

necessária, ainda que não suficiente, para que a aprendizagem ativa que nele emerge seja

um suporte das aprendizagens curriculares” (Oliveira-Formosinho, 2013: 84).

De seguida serão descritas as áreas de atividade (Anexo 5- planta da sala dos 4 anos), são elas:

Arca das trapalhadas: Nesta área existe uma arca com vários

fatos, objetos de faz de conta e ainda espelhos. Aqui podem

brincar duas crianças de cada vez;

Área da cozinha: Equipada com uma cozinha de madeira, uma

mesa com quatro cadeiras, uma cama, e caixas para arrumação

dos vários materiais desta área (bebés, alimentos, copos, etc.).

Aqui podem estar quatro crianças;

Área do tapete: Delimitada por um móvel de gavetas, onde

estão dispostos/ arrumados os materiais de expressão plástica.

Aqui existe um cesto com animais e vários fantoches onde

podem estar seis crianças. Neste local as crianças podem ainda

brincar com os brinquedos que trazem de casa;

Capítulo 5 - Contexto e Participantes do Estudo

______________________________________________________________________

133

Área dos jogos: Possui um móvel rotativo com 3 prateleiras,

onde estão arrumados vários tipos de jogos (segundo um código

de formas/cores), que o grupo pode jogar nas duas mesas

designadas para este efeito e onde podem estar quatro crianças

de cada vez;

Cabana das histórias: Constituída por uma cabana triangular,

que possui almofadas, onde as crianças podem entrar e sentar-

se a explorar os livros, que se encontram arrumados no móvel

rotativo de apoio, com 3 prateleiras que se encontra ao lado

desta (os livros encontram-se etiquetados com um código de

cores). Nesta área podem estar duas crianças de cada vez;

Área da garagem: Delimitada por um tapete com orientações

rodoviárias, possui uma caixa de arrumação com comboios,

carros, pistas de madeira e uma garagem. Aqui podem estar três

crianças;

Área da pintura: Local onde existe um cavalete ambivalente,

que possibilita pintura ou registo em quadro de

ardósia/marcador. Aqui pode estar uma criança de cada vez;

Área do recorte: Nesta área, composta por uma mesa e

respetivas cadeiras, encontram-se tesouras, colas, e uma caixa

com vários tipos de papel (revista, jornais, panfletos, papel

crepe, papel seda, pedaços de cartolinas, etc.). Aqui podem

estar duas crianças;

Área das construções: Delimitada por um móvel de prateleiras,

onde se encontram arrumados os jogos de lego/construções e

por um tapete. Nesta área podem estar três crianças em

simultâneo;

Cantinho das culturas: Constituído por uma pequena mesa e

duas cadeiras, onde são expostos os objetos enviados pelas

referentes às culturas exploradas. Estes objetos serão

recolhidos pelas crianças/pais/equipa de sala, conforme o que

achem pertinente, para as culturas em questão. As crianças

podem explorar os objetos em grupos de dois;

Capítulo 5 - Contexto e Participantes do Estudo

______________________________________________________________________

134

Existem ainda mais três mesas e várias cadeiras, que servem de apoio às atividades

de sala, onde existem duas áreas distintas e orientadas para diferentes expressões:

Área do desenho: Todos os materiais de desenho encontram-se num

móvel de apoio com gavetas e aqui podem estar duas crianças de cada

vez;

Cantinho do ABC: Nesta área encontramos vários jogos com/sobre as

vogais/abecedário. Aqui podem estar duas crianças. Esta área tem

como apoio um móvel de prateleiras, onde estão arrumados materiais

didáticos referentes a esta área;

Na educação de infância, a “dimensão relacional constitui a base do processo

educativo” (Silva et al, 2016:24). Tendo esta premissa em atenção, o espaço encontra-se

organizado de forma a possibilitar “múltiplas formas de relações recíprocas” (Ibidem,

p.28). As dinâmicas de interação estabelecidas na sala pretendem potenciar um clima de

apoio e cooperação entre crianças, crianças e adultos e entre adultos e pretendem

promover o sentimento de pertença ao grupo, assim como o respeito pelas características

e opiniões de cada um.

As regras estabelecidas no início do ano letivo foram realizadas em grande grupo,

sendo aceites e compreendidas por todas as crianças, pois estas “adquirem maior força e

sentido se todo o grupo participar na sua elaboração” (Ibidem, p.25).

5.2.4. Rotina diária

“A sucessão de cada dia, as manhãs e as tardes têm um determinado ritmo,

existindo, deste modo, uma rotina que é pedagógica porque é intencionalmente planeada

pelo/a educador/a e porque é conhecida pelas crianças, que sabem o que podem fazer nos

vários momentos e prever a sua sucessão (…)” de acordo com Silva et al (2016: 27).

Assim, uma rotina corresponde a vários momentos que se repetem com uma certa

frequência, tendo uma organização diária e/ou semanal, mas sendo também flexíveis, para

atender às necessidades e interesses do grupo, mas também para respeitar o ritmo de cada

criança.

Capítulo 5 - Contexto e Participantes do Estudo

______________________________________________________________________

135

A planificação semanal realizada pela educadora contempla estes momentos, para que

possam ser previstos pelas crianças e para que sejam em simultâneo estruturados,

flexíveis e com a participação ativa do grupo.

No quadro abaixo estão descritas - de forma geral - as rotinas diárias da sala:

Quadro 5 – Rotinas diárias

Nesta rotina estão contempladas as cargas horárias das atividades curriculares

realizadas pelo grupo. São elas: Inglês (3 horas - 2 blocos de 1h30); Motricidade (45

minutos); Música (45 minutos).

Existem ainda atividades extracurriculares (natação, judo, dança, ballet, patinagem e

yoga), cada uma com a duração de 45 minutos. Todas são lecionadas pelos respetivos

docentes dentro do espaço da instituição, com exceção da natação, realizada no exterior

(Piscina do Barreiro).

Horários Rotinas

7h30 - 9h - Acolhimento

9h - 9h20

- Roda (momento de grande grupo)

Cantar o “Bom dia”

Marcar o tempo

Determinar a/o chefe do dia

Diálogo em grupo

9h20 - 11h30 - Realização de atividades pedagógicas/curriculares

- Lanche da manhã

11h30 - 11h50 - Marcar as presenças

11h50 - 12h - Higiene

12h - 12h45 - Almoço / Higiene

12h45 - 14h - Brincadeira livre nas áreas da sala/exterior

14h - 15h30 - Continuação das atividades pedagógicas/curriculares

- Realização de atividades extracurriculares

15h30 - 16h - Lanche/ Higiene

16h - 17h30 - Conclusão das atividades pedagógicas

- Realização de atividades extracurriculares

17h30 - 19h30 - Regresso à família

Capítulo 5 - Contexto e Participantes do Estudo

______________________________________________________________________

136

A rotina educativa da sala dos 4 anos é baseada nos princípios orientadores do

modelo curricular High/Scope, especificamente no que diz respeito à autonomia

intelectual da criança, à organização do espaço e ao envolvimento das famílias no

processo de ensino-aprendizagem das crianças.

Deste modo, seguindo os princípios centrais do currículo pré-escolar High/Scope,

pretende-se fomentar um clima de aprendizagem pela ação, onde as crianças vão agir

sobre o ambiente físico, para construírem o seu próprio conhecimento. Assim, inseridos

num ambiente de aprendizagem apelativo - através de uma seleção de materiais

adequados e criação de áreas de atividade com interesses específicos (desenho, jogo

simbólico, etc…) identificadas com imagens reais, algarismos, quantidade e código

escrito - que as crianças possam “ler”, de forma a fomentar um clima de autonomia

pessoal, estimulando também a sua autonomia intelectual, tendo em atenção as

experiências-chave contempladas neste modelo (Hohmann e Weikart, 1995).

São também aplicados alguns princípios da organização da rotina diária,

nomeadamente o tempo de grande grupo, essencial para troca de experiências comuns e

criação de sentido de pertença a um grupo. Privilegia-se também a colaboração/clima de

apoio entre adultos para promover a aprendizagem ativa e também uma transição suave

escola-família, sendo o envolvimento das famílias essencial no desenvolvimento das

crianças e na vida escolar destas.

Pretende-se que através das premissas do modelo, se contribua para a aquisição

de competências e de variadas aprendizagens, facilitando a assimilação e sistematização

dos conteúdos e promovendo a colaboração de adultos e crianças na recolha e tratamento

de informação a utilizar, potenciando assim a capacidade de iniciativa, trabalho em equipa

e espírito critico.

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

______________________________________________________________________

137

CAPÍTULO 6

PLANO E DESENVOLVIMENTO DA INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA

Tal como foi explanado na 1ª parte deste estudo, na atualidade o ensino deve

preconizar-se como uma ‘educação de todos e para todos’, que promova a unidade, o

diálogo entre culturas e a aceitação da diversidade, em todas as suas vertentes, cultural,

linguística, religiosa, etc. Assim, tal como referido nas OCEPE (2016), é crucial

promover a educação para a cidadania desde o ensino pré-escolar. Neste estudo, a

literatura infantil foi a estratégia utilizada para fomentar o desenvolvimento de

competência intercultural num grupo de 24 crianças, com idades compreendidas entre os

4-5 anos, em contexto de jardim de infância, através de um projeto pedagógico

implementado durante o ano letivo 2016/2017.

Desta forma, numa ótica de expansão de horizontes, de competências e de

aprendizagens, a implementação deste projeto focou-se em histórias multiculturais, que

ilustram elementos de diversidade de várias culturas existentes no mundo. Assim,

associaram-se as histórias escolhidas, às divisões por continentes que constituem o mundo

(Europa, África, América do Norte/Sul e Ásia), estando o projeto organizado por blocos

de intervenção distintos, onde foram abordadas diferentes áreas e/ou temas sociopolíticos

atuais. A organização geral dos blocos de intervenção encontra-se esquematizada abaixo,

no quadro 6.

Bloco de

intervenção

História

explorada

Conteúdos/

temas

Participação

das famílias *

A

O nabo gigante

- Diversidade cultural e

linguística;

-Gastronomia típica

europeia;

-Arte e património;

- Exploração de histórias na sua

língua materna (russa e romena);

- Exploração de vocabulário novo;

- Partilha de objetos oriundos das

culturas exploradas;

- Utilização culinária dos legumes

cultivados e partilha dos registos

fotográficos;

- Elaboração de um livro de receitas

do mundo, através de uma recolha

conjunta;

B

A surpresa

de Handa

- Diversidade cultural e

linguística;

- Músicas/ danças

tradicionais africanas;

- Arte africana;

- Partilha de objetos oriundos das

culturas exploradas;

- Recolha de materiais recicláveis;

- Pesquisa de imagens relacionadas

com as temáticas exploradas;

- Participação numa coreografia que

reproduziu danças do mundo;

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

______________________________________________________________________

138

* O projeto “Conta-me um conto com…”, realizado em parceria com os pais, foi transversal a todos os

blocos de intervenção.

Quadro 6 - Organização Geral dos Blocos de Intervenção

A organização implementada (Anexo 2 - Organização curricular por histórias) foi elaborada de

acordo com as áreas de conteúdo da educação pré-escolar, sendo flexível, ou seja, foi

alterada no decorrer do projeto, com atividades surgidas da exploração das histórias,

propostas quer pela educadora, quer pelas crianças. De salientar que algumas atividades

foram realizadas em parceria com os pais. Surgem também alguns momentos onde é

focada a metodologia de trabalho de projeto, que desponta de interesses específicos

demonstrados pelo grupo e aos quais será dada continuidade.

Como objetivos gerais podem salientar-se:

Fomentar o respeito pela diversidade, a todos os níveis;

Desenvolver a consciência de si, do outro e de si na relação com os outros;

Promover comportamentos positivos face às diferenças;

Fomentar o desenvolvimento de competência intercultural nas crianças;

Promover a participação familiar ativa no processo educativo;

C

As cores

de Mateus

- Diversidade cultural;

- Racismo;

- Adoção;

- Recolha de receitas e músicas para

o teatro realizado;

- Partilha de objetos oriundos das

culturas exploradas;

- Recolha de palavras relacionadas

com a interculturalidade;

D

Dançar nas

nuvens

- Diversidade cultural;

- Migração;

- Exploração de uma lenda

tradicional brasileira por uma nativa;

- Exploração de vocabulário novo;

- Desenvolvimento de atividades

relacionadas com a lenda, em

contexto de sala;

- Partilha de elementos

gastronómicos típicos do Brasil;

- Recolha de histórias que explorem a

perspetiva intercultural;

- Partilha de objetos oriundos das

culturas exploradas;

- Recolha de instrumentos musicais;

E

Lili e o

jardim da Índia

- Diversidade cultural e

religiosa;

- Tradições religiosas

do Hinduísmo;

- Recolha de receitas típicas da Índia;

- Partilha de objetos oriundos das

culturas exploradas;

- Elaboração da caracterização das

crianças para o ‘Dia da Índia’;

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

______________________________________________________________________

139

No âmbito do projeto, foram estabelecidos objetivos específicos, tendo em conta

as áreas e/ou temas, explorados em cada um dos blocos de intervenção.

De seguida será esquematizado e descrito, todo o plano, assim como o

desenvolvimento da intervenção pedagógica.

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

______________________________________________________________________

140

Projeto de intervenção

“Volta ao mundo das histórias: descobertas interculturais”

Bloco de

intervenção

Organização

por histórias

Objetivos

específicos

Conteúdos/

temas

Atividades

realizadas A

Continente

explorado:

Europa

História I:

‘O nabo gigante’ 1

Motivação:

A partir da

exploração e

posterior reconto da

história é explicado

às crianças que a

história tem origem

russa e é

apresentada a

personagem de

feltro com o nome

‘Oleg’.

A educadora lança

algumas questões

de partida:

- Qual acham que é

o país onde nasceu o

Oleg?

- Que língua fala?

- Quais as

semelhanças do seu

aspeto físico em

relação às crianças

portuguesas?

Existem diferenças?

Organização:

A partir daqui, foi

realizado um

diálogo em grupo,

de onde

posteriormente,

surgiram atividades

pedagógicas

propostas, quer pela

educadora, quer

pelas crianças.

Estas foram

organizadas com

base nas áreas de

conteúdo,

preconizadas para a

educação pré-

escolar e

esquematizadas na

organização

- Consciencialização

da importância das

várias línguas;

- Familiarização

com outros

reportórios

linguísticos;

- Aquisição e

mobilização de

vocabulário novo;

- Consciencialização

de outras culturas e

suas tradições;

- Diversidade

cultural e

linguística;

-Gastronomia

típica

europeia;

-Arte e

património;

Semana 1

Sessão a) Exploração

da história pela

educadora/objetos

enviados pelas

famílias; Realização

de sequências de

tamanho com as

matrioskas;

Sessão b) História

tradicional russa,

exploradas e

traduzida por uma

falante nativa;

Sessão c)

Correspondência oral

de algumas palavras

português-russo;

Trabalho de

projeto*

Sessão d) Escrita da

palavra 'nabo' em

russo;3

Sessão e) Plantação

de legumes presentes

na história (nabos e

cenouras);

Sessão f) Identificação das

quatro formas

geométricas

principais/

Construção da casa

da história, com

formas geométricas;

Semana 2

Sessão g) Pesquisa e

observação de

imagens digitais

sobre a Roménia, e

diálogo acerca da

língua falada no país,

capital, artesanato e

monumento típico;

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

______________________________________________________________________

141

Quadro 7 - Organização do Bloco de Intervenção A

_____________________________________________________________________

1 (Anexo 1 – Histórias utilizadas no projeto de intervenção)

2 (Anexo 2 - Organização curricular por histórias)

3 (Anexo 3 – Trabalhos realizados pelas crianças no âmbito do projeto)

curricular por

histórias; 2

Sessão h) Artesanato

romeno: ovos

pintados;3

Sessão i) História

tradicional romena,

traduzida por uma

mãe (falante nativa);

Sessão j) Cozinhar

'Ciorba de legume'

(receita romena típica

dada pela mãe);

Correspondência oral

de algumas palavras

português-romeno

(legumes utilizados);

Sessão k) Formação

de formas

geométricas em

grupos/com o corpo;

Sessão l)

Composição

geométrica do

Castelo de Bran

(monumento

romeno); 3

Semana 3

Sessão m) Pesquisa e

observação de

imagens digitais

sobre Itália, e diálogo

acerca da língua

falada no país,

capital, arte,

monumentos e

gastronomia típica/

Correspondência oral

de algumas palavras

português-italiano

surgidas do interesse

das crianças;

Sessão n) Cozinhar

'Pannacota’ (doce

típico italiano);

Sessão o) Impressão

artística da pintura

'Mona Lisa' de

Leonardo DaVinci; 3

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

______________________________________________________________________

142

Nota: Em simultâneo com estas atividades, foram ainda lançados dois projetos que

decorrem ao longo do ano letivo 2016/2017. Ambos se realizaram em parceria com os

pais (foram combinados previamente com as famílias, em contexto de reunião de pais),

são eles:

(i) “Conta-me um conto com…”: Este projeto funcionou em paralelo com o

desenvolvimento do projeto de intervenção.

O projeto girava em torno de 6 figuras em feltro (Anexo 3 - Trabalhos realizados pelas

crianças no âmbito do projeto) - correspondentes a 6 culturas, existentes nos 6

continentes, sendo que cada figura correspondia a uma cultura existente em

cada um dos continentes (ex: Europa - Oleg, o russo). Cada figura

acompanhava a criança/família durante uma semana e enquanto o continente

era explorado em sala (através da história), o projeto desenvolvia-se no mesmo

continente, mas em contexto familiar. Cada família participava criando uma

história, tendo como base o continente explorado em contexto de sala. A

exploração da história enviada pelas famílias foi realizada semanalmente, em

grande grupo.

No final do ano letivo, a pedido de alguns pais, a educadora digitalizou todas

as histórias e enviou-as às famílias, em formato digital. O objetivo deste

projeto era promover a inclusão das famílias no projeto, através da criação de

histórias que focassem a diversidade cultural.

(ii) “Livro de receitas do mundo” - Os pais recolheram e enviaram as receitas para

a educadora, que as compilou e elaborou um livro de receitas. No final do ano

letivo cada família recebeu um livro. Com este projeto pretendeu promover-

se a participação dos pais no processo educativo, através das suas escolhas

pessoais no ramo gastronómico.

Descrição das atividades realizadas

Semana 1

Sessão a) A sessão iniciou-se quando a educadora colocou algumas questões: Qual o país

onde cada um nasceu? Qual o país onde moram? Verificou-se que todos haviam nascido

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

______________________________________________________________________

143

e moravam no mesmo país, em Portugal, embora tenha sido referido que alguns pais

tinham nascido noutros países.

A educadora propôs então às crianças ouvirem a história ‘O nabo gigante’, um

conto tradicional da Rússia, um dos países que pertence ao continente europeu, tal como

Portugal, indicando o continente em ambos os mapas do mundo afixados na sala, assim

como no globo existente. Após ouvirem, foi proposto que realizassem o reconto da

história.

De seguida, a educadora apresentou a personagem de feltro com o nome de ‘Oleg’,

que passou por todas as crianças, para que estas o observassem. A educadora referiu que

o Oleg era um menino que morava no mesmo país de onde vinha a história ouvida e

questionou: Em que país acham que nasceu? Após ouvir a resposta, perguntou ainda: Que

língua fala? Quais as semelhanças do seu aspeto físico em relação às crianças

portuguesas, em relação a vocês? Existem diferenças? Após, o grupo expôs o seu ponto

da vista, com alguma mediação por parte da educadora, para levar as crianças a focarem

os pontos-chave das perguntas relativos à interculturalidade. Quando terminaram o

diálogo, a educadora perguntou quem tinha trazido materiais enviados pelos pais, sendo

estes materiais eram referentes à Rússia. Após receber os materiais, explicou no que

consistiam: imagens dos livros, matrioskas e qual a sua origem, tendo estes sido

observados pelo grupo, de forma individual.

A partir desta exploração das matrioskas, surgiu uma atividade onde foram

realizadas sequências de tamanho (pequeno, médio e grande), inicialmente com as

matrioskas e posteriormente, através das alturas das crianças. Em ambos os casos, as

crianças, divididas em grupos de 3, tiveram que proceder a uma organização de acordo

com os critérios de organização e tamanho, fornecidos pela educadora.

Sessão b) e c) Após as crianças estarem sentadas na área do tapete, a educadora explicou

que iriam ter uma visita da Rússia, a Eugénia, uma amiga da e mãe do J., colega que

frequentava agora o 1º ciclo. Explicou que a Eugénia tinha nascido na Rússia e vinha

contar a história ‘O nabo gigante’ mas em russo, tal como a ouvia (e de acordo com a

tradição oral) quando tinha a idade do grupo.

A Eugénia entrou na sala, apresentou-se e sentou-se de frente para o grupo,

segurando o livro da história, em português. Contou a histórias por trechos, falando

primeiro em português e posteriormente fazendo a tradução do texto para russo. Quando

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

______________________________________________________________________

144

terminou a história a Eugénia - juntamente com a educadora - questionou as crianças

acerca da língua russa, das diferenças que se tinham apercebido entre a língua portuguesa

e a russa e acerca das semelhanças e diferenças entre ambas as versões da história.

As crianças demonstraram interesse em aprender algumas das palavras presentes

na história, na língua russa, nomeadamente nabo (repka) e casa (dom), entre outras. A

Eugénia traduziu as palavras escolhidas e repetiu-as várias vezes, soletrando-as, para que

as crianças as conseguissem repetir e assimilá-las. No final, ensinou ainda as saudações

em russo: olá (priviet) e adeus (paka). A educadora pediu então que à Eugénia que regista-

se a tradução das palavras em papel, para utilizar posteriormente.

Sessão d) Trabalho de projeto*

Decorrente da sessão anterior, o grupo em geral solicitou realizar um trabalho em

que pudessem aprender a escrever ‘nabo’ em português e posteriormente em russo, como

a Eugénia tinha explicado. Dando continuidade ao interesse do grupo e de acordo com a

metodologia do trabalho de projeto, a educadora questionou as crianças e esquematizou

os seus interesses no quadro 8.

Quadro 8 - Trabalho de Projeto A

Para iniciar a atividade, a educadora escreveu a palavra ‘nabo’ no quadro de

ardósia e pediu ao grupo que identificasse as letras que constituíam a palavra. De seguida

as crianças copiaram a palavra para uma folha de registo (elaborada pela educadora), com

Trabalho de

projeto

O que sabemos? O que

queremos

saber?

Onde vamos

pesquisar?

O que

queremos

fazer? Correspondência

oral e escrita de

palavras

português - russo;

- Conhecemos uma

pessoa que veio da

Rússia;

- Sabemos a língua

(russo) e qual é a

bandeira da Rússia;

- Sabemos dizer nabo

e casa em russo;

- Também sabemos

dizer paka que é

adeus;

- E que priviet é dizer

olá;

- A Rússia é o país

maior do mundo todo;

- Como

escrevem na

Rússia?

- Como se

escreve nabo

em russo?

- Quais são as

letras da

palavra repka?

- No computador

azul da Ariana ou

no computador da

escola;

- Perguntamos à

mãe do teu menino,

à Eugénia;

- Podemos

perguntar aos pais

para ver se alguém

sabe;

- Aprender a

palavra nabo

em russo;

- A escrever

russo com as

letras deles;

- Quero saber as

letras da

Rússia;

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

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145

uma tabela simples, correspondendo uma letra a cada espaço desta. Escreveu ainda no

quadro, a palavra ‘repka’, que corresponde à tradução para russo da palavra portuguesa

‘nabo’. A cada criança foi dado um pedaço de papel com as cinco letras baralhadas, que

tinham que recortar e colar pela ordem correta numa segunda tabela, impressa na mesma

folha. Finalmente foi utilizado um carimbo com o sinal de ‘=’, que cada um carimbou

entre as duas palavras, verificando a sua igualdade, em duas línguas diferentes.

Sessão e) À semelhança do que aconteceu na história ‘O nabo gigante’, a educadora

propôs a plantação de alguns dos legumes que figuravam na história, nomeadamente

cenouras e nabos. Em grande grupo, todos se dirigiram ao exterior, onde se sentaram em

meia-lua.

Posteriormente deu-se seguimento à atividade, uma a uma, as crianças foram-se

dirigindo aos canteiros da horta - situada em frente à sala - em que cada um plantou um

legume à escolha, furando a terra com o polegar, colocando o rebento correspondente e

tapando o buraco com terra. No final, o chefe do dia regou os canteiros e a educadora

identificou os canteiros com pequenas placas que referiam o que cada um deles tinha

plantado. Foi combinado em grupo que, de dois em dois dias, o chefe do dia iria regar os

canteiros, para assegurar a manutenção e o crescimento dos legumes.

Nota: A plantação foi realizada em outubro e após seis meses (no mês de março), os nabos

e as cenouras foram colhidos e realizada uma seriação. Verificou-se que todos os legumes

tinham crescido em versão ‘baby’. Em pequenos grupos, as crianças estiveram a

classificar os legumes de acordo com critérios de tamanho (pequeno, grande e médio).

Após a educadora explicou que os legumes iriam ser divididos (dois para cada criança) e

que cada um deveria realizar um cozinhado com esses mesmos legumes, tendo os pais

que fotografar e enviar as fotos para o e-mail da educadora, para que todos pudessem ver

o cada um tinha realizado em sua casa. A educadora enviou também a informação para

os pais.

Sessão f) Na área do tapete foi realizado um jogo em grupo, com a utilização dos blocos

lógicos, material que fomenta noções matemáticas na área das formas geométricas, sendo

constituído por peças com características específicas: (i) forma (quadrado, círculo,

triangulo e retângulo); (ii) cor (azul, amarelo e vermelho); (iii) tamanho (pequeno, médio

e grande); (iv) espessura (grosso e fino).

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

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146

Após um jogo de identificação de cada forma geométrica (cada um tinha que

identificar a forma que a educadora apontava), foi realizado um jogo onde figuravam as

características dos blocos lógicos em que cada criança teria que recolher uma peça com

os critérios pedidos pela educadora (ex: uma peça quadrada, azul, pequena e fina).

Individualmente, todas as crianças realizaram a atividade, até não restarem mais peças

para recolher.

De seguida foi proposta uma atividade pela educadora. Mostrou algumas formas

recortadas em cartolina: um quadrado, um triângulo, um retângulo e dois círculos,

colocando ao seu lado, a imagem da casa da história. Salientou que as peças serviam para

construir uma nova casa para a velhinha e o velhinho da história. Individualmente ou em

pequeno grupo, as crianças tentaram montar a casa, sendo bem-sucedidas na grande

maioria dos casos, sendo os restantes ajudados pelos colegas. Quando todos

experimentaram, a educadora explicou que todos poderiam voltar a tentar, pois iriam

realizar a atividade de forma individual. Assim todos teriam o conjunto de formas

mencionado, sendo que deveriam recortá-lo e montar a casinha à semelhança do que tinha

sido realizado em grande grupo.

Semana 2

Sessão g) Após uma votação positiva em grupo, ficou determinado que iámos ‘viajar’ até

à Roménia, para novas descobertas. Assim, em grupo todos se dirigiram à sala do

computador, onde a educadora assumiu o papel de mediadora, pesquisando as sugestões

das crianças e orientando-as para alguns tópicos importantes a procurar (comida

tradicional, tradições, etc.). À medida que os tópicos iam sendo pesquisados, dialogaram

acerca das imagens observadas e das conceções das crianças. As crianças estabeleceram

pontos de igualdade e diferença entre as culturas, referindo que a língua romena era mais

parecida com a russa, do que com a portuguesa, e que todos roupas típicas diferentes do

normal, coloridas e ‘engraçadas’.

As pesquisas continuaram, sendo que a educadora pediu às crianças para

escolherem um tipo de artesanato e um monumento para explorarem, de todos os que

haviam observado. Assim, foi feita uma votação em grupo, sendo que a esmagadora

maioria das escolhas recaíram no artesanato típico de alguns países de leste, muito

popular na Roménia: os ovos pintados. A educadora explicou às crianças que as pessoas

pintavam os ovos em casa e depois os ofereciam umas às outras na Páscoa, sendo muito

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

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147

conhecidos e comuns no país. O monumento escolhido na votação foi o Castelo de Bran,

que suscitou o interesse do grupo, quando a educadora esclareceu que era um castelo

famoso por ser conhecido como o castelo do Drácula.

Sessão h) Posteriormente, no tapete, dando seguimento ao tema, a educadora mostrou os

materiais referentes à Roménia, que haviam sido enviados pelos pais da C. e do T.: ovos

pintados. Os ovos passaram por todo o grupo, para os poderem observar atempadamente.

Quando terminaram, a educadora mostrou vários desenhos de ovos em branco com vários

motivos diferentes e estabeleceu um paralelismo entre estes e os ovos trazidos pelas

crianças. Iniciou-se, então, um diálogo acerca das opiniões das crianças sobre o assunto,

tendo algumas delas dado a sua opinião estética acerca dos ovos pintados.

A educadora propôs ao grupo, a pintura dos desenhos dos ovos, para criação de

novos ovos romenos. Baseados nos ovos romenos trazidos e nas imagens observadas

anteriormente no computador, como um referencial de arte para basearem a sua criação,

cada um ia criar um novo ovo. Cada criança escolheu a sua imagem favorita, para colorir

livremente, com diferentes materiais de pintura (lápis de cor, marcadores, etc.).

Sessão i) Após as crianças estarem sentadas na área do tapete, a educadora explicou que

iriam ter uma nova visita, mas desta vez da Roménia. A Alexandra, mãe da C., entrou e

sentou-se em frente ao grupo, com um livro de histórias em romeno, que mostrou ao

grupo. Baseados nas imagens, todos adivinharam ser “O capuchinho vermelho”, tendo a

Alexandra explicado que em romeno se diz ‘Scufita Rosie’. Assim, seguindo a história

pelo livro, contou-a por trechos, falando primeiro em português e posteriormente fazendo

a tradução para romeno. Quando terminou a história, questionou o grupo se tinham

entendido a mesma e a M.V. sugeriu o reconto da história. As crianças foram realizando

o reconto e a Alexandra ia repetindo algumas palavras que estes diziam, em romeno.

As crianças demonstraram depois interesse em saber algumas das palavras que

também perguntaram à Eugénia, numa sessão anterior. A Alexandra traduziu então as

palavras pedidas, foram elas: nabo (ridiche), cenoura (morcov), feijão verde (fasole

verde) e batata (cardof). A Alexandra dizia as palavras e as crianças repetiam logo de

seguida. A educadora pediu à Alexandra que regista-se a tradução das palavras em papel.

Após, em conversa com a Alexandra, surgiu a ideia de questionar as crianças

acerca dos legumes e se conheciam alguma comida que se pudesse fazer com os legumes

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

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148

acerca dos quais tinham conversado. Foram referidos alguns pratos, nomeadamente sopa,

e por isso a Alexandra perguntou se gostariam de provar uma sopa romena, chamada

'Ciorba de legume', uma receita típica e que ela gostava muito.

Então, a educadora lançou a atividade e propôs fazerem uma sopa romena. A

Alexandra disse que não podia ficar, mas explicou a receita e deu alguns conselhos para

a confeção da sopa.

No dia seguinte, o grupo dirigiu-se ao refeitório, onde estavam já os utensílios e

ingredientes necessários à confeção da sopa. Todos ajudaram, partindo alguns legumes à

mão e juntando tudo na panela. Após terminarem esta fase, colocou-se a água e o sal, a

auxiliar levou a panela para a cozinha e colocou-a ao lume. Quando a sopa estava cozida,

todas as crianças foram até à cozinha ver o resultado final e terminou-se a confeção com

a colocação de um pouco de sumo de limão dentro de cada sopa, pois a Alexandra havia

explicado que na Roménia, esta sopa tem um sabor acre, muito forte que a caracteriza.

Cada criança espremeu um pouco de sumo de limão para dentro da sua sopa, que já havia

sido colocada em tupperwares (enviados previamente pelos pais) e foi levada para casa

pelas crianças, para partilha com as famílias.

Sessão k) Na área do tapete, o grupo esteve a observar imagens reais do castelo de Bran,

e juntamente com a educadora dialogaram sobre as caraterísticas que já conheciam da

Roménia e sobre as características do castelo em si. A educadora questionou o grupo,

sobre quais pareciam ser as formas geométricas existentes no formato do castelo e, de

acordo com as sugestões das crianças, ia desenhando com marcadores as formas em cima

da imagem. A partir daí lançou um desafio, formarem formas geométricas com o corpo.

Formaram-se grupos aleatórios (de acordo com o lugar onde estavam sentados) e

a cada grupo atribuiu aleatoriamente uma forma (escolhiam uma folha e em cada uma

delas estava desenhada uma forma). Em pequeno grupo, tinham que construir a forma

escolhida com o seu corpo. Estabeleceu-se que a educadora e os colegas podiam ajudar,

mas apenas oralmente.

Sessão l) De seguida foi proposta uma nova atividade pela educadora. Em grande grupo

esta mostrou duas folhas A4. Explicou que na primeira folha se via a imagem real do

Castelo de Bran e na segunda, ia realizar uma figura do castelo, recorrendo a várias

formas geométricas. Propôs então, que com base nas duas imagens fornecidas, cada um

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

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149

recortasse as formas geométricas e fizesse uma montagem, criando a sua própria versão

do castelo.

Após algumas questões acerca da execução do trabalho, colocadas pelas crianças,

ficou determinado podiam reproduzir a imagem da educadora ou, poderiam criar outro

castelo como quisessem. As imagens foram afixadas na sala para orientar as crianças na

sua elaboração do castelo.

Semana 3

Sessão m) Iniciou-se uma conversa sobre os locais que já ‘conhecemos’ nas ‘viagens’

pela Europa. Uma das crianças questionou a educadora, acerca de qual o país que iriam

‘visitar’ a seguir e esta questionou-a sobre qual seria o novo local que gostaria de

conhecer, alargando a pergunta ao restante grupo. Surgiram algumas respostas diferentes

e, por isso, realizou-se uma votação para que cada um votasse no local que achava mais

importante e interessante de ‘visitar’. A educadora anotou numa folha os países nomeados

e que estavam em votação: (i) França; (ii) Hungria; (iii) Itália; (iv) Espanha; (v) Suécia;

(vi) Alemanha. Cada criança votou no país de eleição e o país vencedor com 14 votos foi

a Itália.

Iniciou-se então uma conversa em que a grande maioria das crianças deduziu que

neste país se falava italiano e uma criança referiu que existia uma equipa de futebol

italiana. A educadora nomeou algumas palavras italianas que sabia, tais como obrigado

(gracie), olá (ciao) e amigo (amico) e pizza, um alimento típico italiano. Após a conversa

decidiram decidiu-se pesquisar no computador e em grupo todos se dirigiram à sala usada

para o efeito, onde a educadora iniciou a pesquisa, através dos tópicos de pesquisa

indicados pelas crianças: (i) comida tradicional; (ii) trajes típicos; (iii) capital do país. A

educadora iniciou a pesquisa e dialogava com as crianças acerca das imagens observadas

e das conceções destas acerca do que observavam.

Durante a pesquisa acerca da comida tradicional surgiu no écran a pizza, massas

e sobremesas diversas, nomeadamente pannacota, uma sobremesa italiana, à qual

algumas crianças reagiram, pois já ‘conheciam’. A educadora questionou se gostariam de

cozinhar esta sobremesa e todos concordaram. Após a pesquisa da receita, determinou-se

não fazer pannacota de frutos silvestres, como é típico e sim uma nova versão, pannacota

de chocolate.

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

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150

A educadora explicou então que Itália tinha muitos pintores famosos e que estes

haviam pintado vários quadros conhecidos. Salientou que estes fazem parte da história e

da cultura do país, pois as obras são muito importantes e deixam os italianos muito

orgulhosos da sua cultura. Realizou uma pesquisa e entre os pintores surgiu Leonardo Da

Vinci e várias imagens das suas obras. Questionou as crianças acerca de qual das obras

gostariam de realizar, sendo que em votação determinou-se que seria a ‘Mona Lisa’. A

educadora propôs então que todos pintarem a sua versão deste quadro, sugestão que foi

aceite pelas crianças.

Sessão n) No tapete, a educadora mostrou ao grupo, um livro de receitas italianas, enviado

pela mãe do M.C. No livro estavam várias imagens, observadas nas pesquisas realizadas.

Assim, a educadora começou por folhear o livro e explicar quais eram os pratos que

apareciam nas imagens, onde também surgia a pannacota. Após a leitura da receita, todos

se colocaram à volta das mesas, onde a auxiliar tinha já disposto os ingredientes e os

utensílios necessários à preparação do doce. Depois de identificarem todos os

ingredientes da receita, uma a uma, as crianças despejaram as natas frescas para uma

panela, assim como o açúcar. Após, a auxiliar abriu a vagem de baunilha e colocou-a na

mistura. A preparação do doce continuou e após ter sido terminado foi colocado no

frigorífico.

A educadora lançou então uma atividade para realizaram com os pais. Desafiou

as crianças a pesquisarem sobremesas de origem italiana com os pais e a preparam-nas e

a mandarem uma fotografia para seu o e-mail . O recado foi posteriormente enviado para

os pais.

Nota: Na hora de almoço, a pannacota foi dividida por taças individuais e tal como pedido

pelo grupo, regada com topping de chocolate, constituindo a sobremesa do almoço desse

dia.

Sessão o) No seguimento do diálogo anterior, a educadora conversou com as crianças, na

área do tapete e propôs a pintura do quadro ‘Mona Lisa’. Mostrou uma imagem real do

quadro e posteriormente o contorno da figura da ‘Mona Lisa’, desenhada a preto numa

folha de jornal. A proposta passou por pintarem a imagem do quadro com aguarelas, tendo

como base o quadro original, mas recorrendo a cores ao seu gosto.

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

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151

Projeto de intervenção

“Volta ao mundo das histórias: descobertas interculturais”

Bloco de

intervenção

Organização

por histórias

Objetivos

específicos

Conteúdos/

temas

Atividades

realizadas B

Continente

explorado:

África

História II:

‘A surpresa de

Handa’1

Motivação:

Foi colocada a

tocar, uma música

tribal africana, a

qual as crianças

ouviram até ao

final. Após, a

educadora

questionou o

grupo:

- Já tinham ouvido

esta música ou

alguma parecida?

- Que

instrumentos

ouvem nesta

música?

- O que será que

está a ser dito na

música?

Conhecem esta

língua?

- De onde acham

que esta música é?

A que continente

acham que

pertence?

Após as respostas

e um breve

diálogo, com a

conclusão de que a

música pertencia

ao continente

africano, a

educadora referiu

que iria contar

uma história, cujo

cenário é África,

indicando o

continente no

mapa mundo

afixado.

A história foi

contada ao som da

mesma música.

A partir da

exploração e

posterior reconto

- Consciencialização

dos traços distintivos

de diferentes culturas;

- Familiarização com

diferentes tribos

africanas, seus

hábitos e tradições;

- Compreensão da

música/dança como

um fator de

identidade cultural;

- Apreensão e

reprodução das

canções aprendidas

em outras línguas;

- Diversidade

cultural e

linguística;

- Músicas/

danças

tradicionais

africanas;

- Arte

africana;

Semana 1

Sessão a) Exploração

da história pela

educadora/ Diálogo em

grupo acerca da

história/ pesquisa de

imagens digitais sobre a

tribo Luo do Quénia;

Sessão b) Composição

artística com base na

arte/padrões africanos; 3

Sessão c) Registo

baseado em imagens

reais de tribos

africanas; 3 [Registo

adaptado de Conselho

da Europa (2009)]

Semana 2

Trabalho de projeto*

Sessão d)

Exploração de músicas

africanas, recorrendo a

batimentos corporais;

Sessão e) Elaboração

de uma maraca com

materiais de

desperdício; 3

Sessão f) Exploração da

canção de origem

africana: Funga Alafia;/

Criação de uma dança;

Sessão g) ‘Vamos fazer

música!’

Exploração de

sequências rítmicas,

com base na canção

anterior;

Sessão h)As sequências

da história:

Classificação ordenada

de acordo com

diferentes critérios;

Sessão i) Diálogo

acerca da África do Sul,

com um falante nativo /

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

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152

Quadro 9 - Organização do Bloco de Intervenção B

Descrição das atividades realizadas

Semana 1

Sessão a) A educadora sentou-se em frente ao grupo e transmitiu às crianças que tinha

algo muito especial para ouvirem. Colocou o computador portátil sobre a mesa (o qual

da história gerou-

se um novo

diálogo, cujo

ponto de partida

foram as questões

colocadas pelas

crianças acerca do

que

observaram/ouvir

am na história.

Organização:

Desta conversa

resultou a

planificação de

várias atividades

pedagógicas

propostas pela

educadora e

também pelas

crianças. Estas

foram organizadas

com base nas

áreas de conteúdo,

preconizadas para

a educação pré-

escolar e

esquematizadas

na organização

curricular por

histórias; 2

Exploração da canção

‘Jan Pierewiet’ em

Afrikaans;

Semana 3

Sessão j) Observação

de imagens/diálogo

acerca dos colares

tribais africanos e da

sua simbologia/

Elaboração de um colar

tribal africano;3

Sessão k)

Observação/

comparação das suas

fotografias com o colar,

com as imagens reais de

tribos africanas/

Registo acerca das

semelhanças e

diferenças observadas;

Sessão l)

Exploração da canção

africana

“Kokoleoko”

Nota: Foi preparada

uma apresentação para

as famílias, posta em

prática na festa de

Natal, com o tema:

‘Músicas e danças do

mundo’, tendo esta a

participação ativa de

alguns pais.

Os ensaios decorreram

em simultâneo com as

sessões realizadas.

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

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153

estava previamente ligada uma coluna), tendo colocado uma música a tocar. Tratava-se

de uma música muito dinâmica, com origem na Libéria. Quando a música terminou a

educadora questionou se as crianças tinham gostado e se já tinham ouvido esta música ou

alguma parecida? Que instrumentos ouviam na música? As respostas foram negativas,

salientando que era uma música nova e que pareciam ouvir-se reco-recos, maracas e

tambores.

Dando continuidade ao diálogo, a educadora perguntou: sabem o que está a ser

dito na música? Conhecem esta língua? As respostas recaírem em várias línguas que

tinham sido mencionadas no continente europeu. As questões continuaram recaindo sobre

a origem da música e o continente a que pertence? Posteriormente, a educadora lançou

uma adivinha: ‘De onde é a música, de onde é ela, do mesmo continente que a maraca e

o tambor, um lugar onde se canta e se dança com fervor?’ Após várias opiniões, conclui-

se que a resposta seria África, local que a educadora assinalou nos mapas afixados na

sala. Perguntou se conheciam histórias africanas, pois tinha uma para contar, propondo

ouvirem a história ‘A surpresa de Handa’.

Após terminar a história, perguntou às crianças o que viam nas imagens,

estabelecendo um paralelismo com a vida quotidiana atual. Focou as diferenças a nível

de habitação, alimentação, meio envolvente, objetos do quotidiano, vestuário e aspeto

físico, sendo este último - assim, como alguns frutos - aqueles que as crianças focaram

como observável no meio que as rodeia, pois já conheciam alguns destes frutos (tais como

o ananás ou a laranja) e já tinham visto pessoas com o mesmo aspeto físico, mas com

roupas diferentes, iguais as que se usam no quotidiano. A conversa deteve-se alguns

minutos nestes pontos, centrando-se nas semelhanças descobertas através da observação

das imagens da história, altura em que a educadora leu o que a autora salienta no início

do livro: que as imagens são baseadas na tribo Luo do Quénia, uma das muitas tribos que

existem em África atualmente. Seguidamente várias crianças solicitaram ver imagens

verdadeiras da tribo no computador.

Desta forma, em comboio, as crianças dirigiram-se à sala do computador, onde se

sentaram, enquanto a educadora pesquisava as imagens na internet. No entanto, as

imagens mostravam várias tribos (Masai, Zulu, Himba, etc.) e as crianças demonstraram

interesse nas peculiaridades do aspeto físico de algumas delas, nomeadamente o aspeto

dos cabelos ou os ornamentos usados em abundância. Foram também observados alguns

filmes curtos, acerca destas tribos e do seu quotidiano.

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

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154

Indo de encontro às questões colocadas, pesquisou-se a razão do aspeto diferente

do cabelo que se verificou em certas tribos e a razão do uso de tantos colares. No final, a

educadora salientou que cada tribo tem as suas caraterísticas, de acordo com as suas

crenças e tradições, daí existirem tantas diferenças observáveis. Referiu ainda que

existem muitas outras diferenças (ex. cada um tem festejos diferentes, danças e canções

que são cantadas desde antigamente) e muitos outros aspetos que não são visíveis só em

imagens, pois existem imensas coisas para descobrir.

Durante o regresso à sala, um grupo de crianças, questionou a educadora se

poderiam ouvir novamente a música, sendo a resposta afirmativa.

Sessão b) A educadora referiu que algumas crianças queriam ouvir a música novamente

e que a iria colocar a tocar, enquanto estivessem em brincadeira livre pela sala. Iniciou

então a explicação de uma nova proposta que se focava na arte africana. Mostrou algumas

imagens reais, previamente impressas, de quadros de arte típica africana. Perguntou às

crianças o que observavam de comum em todos e a reposta foi unânime, referindo que as

formas dos corpos e as cores fortes eram predominantes em todos eles.

Assim, propôs que todos realizassem a sua pintura africana. Inicialmente,

escolheram inicialmente uma folha colorida como base da sua obra e, posteriormente,

escolheram ainda uma grande variedade de padrões que estavam disponíveis para recorte.

Depois pintaram/ realizaram uma colagem com cápsulas de café, para completar as

formas do corpo, semelhantes às dos quadros observados, salientando que estes seriam

pendurados na sala para que pudessem inspirar-se.

De salientar que duas crianças referiram que as pinturas mostravam “senhoras

africanas” a trabalharem e levavam jarros e cestos na mão e/ou na cabeça e que no

trabalho não tínhamos esses materiais para colar. A educadora referiu ser uma excelente

observação e sugestão e seguindo a orientação destas crianças, foi até à sala de arrumos,

onde estão guardados os materiais da escola, procurou na caixa dos tecidos, e encontrou

um pedaço de sarapilheira. Levou-o para a sala, onde recortou várias formas de cestos e

jarros, para que as crianças pudessem usar livremente e ao seu critério, caso desejassem.

Durante a execução da tarefa, as restantes crianças estavam em brincadeira livre,

pelas áreas da sala e visto a música estar a tocar de forma cíclica, eram visíveis vários

grupos a dançar e a conversar sobre esta. Num dos grupos a educadora ouviu um diálogo

acerca dos instrumentos musicais da música, tal como tinha sido conversado inicialmente,

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

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155

e questionou as crianças sobre o seu interesse, tendo sido referido pelo F. que todos

gostavam de instrumentos e queriam fazer um instrumento musical para poderem tocar

músicas africanas como aquela. A educadora disse-lhe que posteriormente ia apresentar

a sua sugestão ao grupo.

No dia seguinte e dando seguimento ao interesse demonstrado pelo pequeno grupo

de crianças, a educadora pediu para conversarem e propôs ao F. que expusesse a sua ideia.

A educadora referiu que os instrumentos que disseram ouvir eram as maracas e o tambor,

perguntando qual o instrumento que gostariam de construir. Procedeu-se a uma votação,

tendo a maioria votado na maraca. Em relação à elaboração, decidiram que seria

elaborada com a ajuda aos pais, a quem solicitámos materiais recicláveis (tampinhas,

rolos de papel higiénico/cozinha, garrafas de água, etc.), sendo que todos teriam que

guardar estes objetos em sua casa e depois trazê-los para a escola na semana seguinte. De

acordo com a metodologia do trabalho de projeto, a educadora questionou as crianças e

esquematizou os seus interesses no quadro 9 (semana 2, sessão d).

Esta informação foi posteriormente enviada para os pais. Foi ainda pedido aos pais

que participassem, pesquisando imagens de diferentes tipos de maraca, para as crianças

se poderem basear.

Sessão c) Com base na publicação do Conselho da Europa (2009), intitulada

“Autobiography of Intercultural Encounters for Young Learners”, a educadora elaborou

um registo, constituído por uma série de perguntas, que se baseou numa imagem escolhida

pelas crianças. Essa imagem foi selecionada de um rol de imagens que se referem a

diferentes tribos africanas.

A educadora reuniu-se individualmente com cada criança, fornecendo-lhes

algumas imagens impressas para que pudessem observar e escolher ao seu ritmo. Após

escolherem a imagem, a educadora explicou a tarefa e efetuou todas as perguntas,

registando as respostas das crianças, em formato escrito. De notar que todas as perguntas

diziam diretamente respeito à imagem escolhida e às conceções das crianças acerca dessa

imagem. Após todas as crianças terem realizado a atividade, a educadora transcreveu as

respostas para o formato digital. Posteriormente, enviou os trabalhos em formato digital,

para o e-mail dos pais, para que possam acompanhar o que está a ser realizado no âmbito

do projeto de sala.

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

______________________________________________________________________

156

Semana 2 – Trabalho de projeto*

Sessão d)* No quadro 10, encontram-se sintetizados os interesses demonstrados pelo

grupo.

Quadro 10 - Trabalho de Projeto B

Posteriormente, e com base nas sugestões do grupo, deu-se início ao projeto

através da exploração de algumas canções, com ritmos típicos africanos, recorrendo

apenas a batimentos corporais. Assim, no espaço polivalente as crianças estavam

dispostas de pé e em roda. Numa mesa estava o computador portátil, ligado a uma coluna.

A educadora integrou a roda e explicou às crianças que iriam tocar algumas músicas de

África e que todos deveriam usar o corpo como se fosse um instrumento, realizando

diversos batimentos, em uníssono e ao ritmo da música. A educadora iniciou a atividade

e, durante esta, ia dizendo os nomes das crianças aleatoriamente e cada uma, na sua vez,

deveria executar os batimentos tendo todos os outros que a imitar. Isto iria repetir-se até

todos terem tido oportunidade de participar a nível individual.

Posteriormente foi ainda lançada outra proposta, tendo como base os oito animais

que figuravam na história. A educadora explicou que a cada animal correspondia um

movimento, executando-o, sendo este imitado pelas crianças. A educadora iria iniciar a

atividade e seriam as crianças a dar-lhe continuidade. Explicou então que seria formada

uma sequência de animais e que o grupo ia reproduzir a sequência, através dos gestos que

lhes estariam associados (ex.: elefante - bater com os pés; avestruz - bater palmas, etc.),

Trabalho

de projeto

O que

sabemos?

O que

queremos

saber?

Onde vamos

pesquisar?

O que

queremos

fazer? Elaboração

de

maracas

africanas

- As maracas são

instrumentos

musicais;

- São da África;

- Na África há

muitos instrumentos

de música e maracas

também;

- Usamos na aula de

música com a Cátia;

- Podemos tocar

rápido e

devagarinho;

- Há muitas

maracas, pintadas de

diferente;

- Quero ouvir mais

música da África

com maracas a

tocar;

- As maracas são

todas como as da

(aula de) música?

- Como são as

maracas da África?

- As tribos tocam

maracas?

- No teu

computador azul;

- Pergunta-se aos

pais;

- Posso ver no Ipad

do meu pai ou no

telefone dele;

- Aprender mais

canções da África;

- Ouvir as músicas

das tribos com

maracas;

- Tocar as maracas

todas ao mesmo

tempo e fazer

música;

- Tocar as maracas

com mais

instrumentos;

- Sim, mas da

África, como os

tambores;

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

______________________________________________________________________

157

formando assim uma composição de sons, recorrendo apenas ao corpo. A educadora

começou, formando uma sequência simples com três animais, que as crianças

reproduziram de seguida. As crianças foram formando sequências progressivamente mais

complexas, com recurso às oito imagens. Estes momentos foram filmados e partilhados

com os pais.

Sessão e) * Antes do início da atividade, a educadora mostrou ao grupo, as imagens

digitais enviadas pelos pais, já impressas, para as crianças poderem observar e basear as

suas construções. Dialogaram ainda sobre a origem das diferentes maracas e os materiais

da construção, associando-as aos vários países/continentes de que eram originárias. De

seguida, deu-se início à atividade em si.

A educadora perguntou quem tinha trazido materiais enviados pelas famílias. No

‘cantinho da cultura’, estavam já vários instrumentos, nomeadamente tambores, jambés,

uma flauta e uma maraca, trazidas pelos pais. Após cada criança identificar o que tinha

trazido e a sua origem, os objetos foram passados por todos para os poderem observar e

experimentar. Este foi o ponto de partida para iniciar a atividade.

A educadora mostrou às crianças os materiais recolhidos por eles e pelos pais ao

longo da semana, para a construção das maracas. Explicou que ia colocar os materiais nas

mesas (área de trabalho) e que ia chamar duas crianças de cada vez para construírem a

maraca. Podiam utilizar os materiais enviados pelos pais, assim como outros materiais

disponíveis (fita cola com padrões, papel autocolante, etc.) para decorar a maraca e que

tinham também à disposição, arroz, feijão e massa para colocarem no interior e facilitar

a produção de som.

Sessão f)* As crianças estavam sentadas em roda no espaço polivalente, onde já

estava o computador portátil, ligado à coluna. A educadora revelou que iriam ouvir a

mesma música que ouviram inicialmente, antes da história e que se chamava “Funga

Alafia”. Após ouvirem a canção, explicou que na Libéria, esta é usada como uma

canção/dança de boas vindas, que serve para exprimir agradecimento pela visita e

amizade, através das palavras e dos movimentos. Esclareceu ainda que a letra, cantada

num dialeto africano com as palavras “funga alafia, ashe ashe, funga alafia, ashe ashe”

pode traduzir-se na língua portuguesa como “em ti eu penso, contigo eu falo, de ti eu

gosto, somos amigos”. Explicou que já existe uma dança para esta música, mas que não

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

______________________________________________________________________

158

a ia mostrar para não os influenciar, pois queria que todos sugerissem movimentos, para

criarem uma “dança da amizade”, para podermos mostrar às crianças da Libéria, se um

dia as fossemos visitar. Todos concordaram e então começaram as sugestões, que todos

iam experimentando enquanto a educadora as registava numa folha, correspondendo os

tempos da música aos movimentos.

Após a dança estar concluída, iniciaram-se os ensaios que decorreram ao longo de

dois dias (após o lanche da manhã e após o almoço), sendo que ao fim deste tempo, a

dança foi concretizada, tendo sido feita uma gravação das crianças a cantarem e

dançarem, partilhada posteriormente com os pais. As crianças ficaram encarregadas de

explicar aos pais, porque criámos a dança, o significado da sua letra e para que ocasião

era utilizada.

Sessão g)* Após todos os elementos do grupo terem construído as suas maracas, estas

foram utilizadas para explorar diferentes sequências rítmicas, com várias intensidades,

ritmos e silêncios. Sentados na sala em formato de roda, com as maracas nas mãos e a

educadora sentada ao centro numa cadeira com um jambé grande - enviado pelos pais do

T. - esta instruiu as crianças que deveriam seguir os seus ritmos, respeitando sempre as

diferentes intensidades e os silêncios, de modo a que todos soassem da mesma maneira.

Assim, sempre ao som do refrão “funga alafia, ashe ashe, funga alafia, ashe ashe”,

cantado por todos, as crianças acompanharam simultaneamente o que era reproduzido

sonoramente pela educadora, com os respetivos instrumentos. Estes momentos foram

filmados e partilhados com os pais.

Sessão h) Na área do tapete a educadora propôs uma nova atividade. Mostrou ao grupo

um registo que criou, onde se podia ver um caminho de terra em África, entre a aldeia da

Handa e a aldeia da amiga Akeyo. Neste caminho, estavam assinalados através de

números ordinais, os oito locais onde a Handa encontrou um animal e simultaneamente

‘perdeu’ um fruto. A educadora mostrou novamente a história e em grupo estiveram a

recontá-la, lembrando a sequência dos animais e das frutas presente nesta.

Explicou-se ainda que existiam duas propostas, a classificação ordenada de

animais ou de frutos, havendo opção de escolha para todos. Posteriormente, recortaram

oito animais/frutos e ordenaram-nos de acordo com a posição na qual apareceram na

história (1º, 2º…).

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

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159

Algumas crianças exprimiram dúvidas na ordem da colagem a realizar e para os

tranquilizar e motivar, a educadora disse-lhes que o livro estava à disposição na área de

trabalho, podendo ser consultado em caso de dúvida.

Sessão i) Sabendo de antemão que o professor de inglês que leciona no jardim de infância

é nativo da África do Sul, a educadora agendou uma sessão, onde este ia explicar a sua

infância neste país, quais os seus hábitos e tradições, comparando-os depois com os

portugueses. Combinou também a exploração de uma canção infantil típica do país em

Afrikaans, uma das línguas faladas na África do Sul.

Assim, após uma das aulas de inglês, o professor pediu ao grupo para

conversarem. Iniciou a conversa afixando um mapa do mundo, questionando as crianças

sobre quais os países que conheciam e em que continente estes se situavam. Questionou

também se sabiam onde ele tinha nascido e posteriormente, explicou ter nascido na África

do Sul, assinalando o país no mapa-mundo. Mostrou várias imagens do país e alguns

objetos de artesanato típico, incluindo uma estatueta da tribo conhecida como ‘mulheres

girafa’, explicando os seus costumes. Noutra fase da conversa, mostrou fotografias suas

no colégio que frequentava, explicou que usavam farda e tinham que aprender três línguas

diferentes desde pequenos. Mostrou ainda fotografias do animais existentes no país,

explicando que era costume realizarem-se safaris para observação destes ao vivo.

No final propôs ensinar-lhes uma canção que cantava na escola, chamada ‘Jan

Pierewiet’, sendo esta em Afrikaans, uma das línguas que aprendia na escola. De seguida,

no quadro 11, encontra-se a letra original da canção e a tradução para português.

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

______________________________________________________________________

160

Quadro 11 - Canção ‘Jan Pierewiet’ (versão original e versão traduzida)

À medida que cantava a canção na versão original, o professor ia mostrando

imagens, que correspondiam às palavras ditas/se associavam a diferentes segmentos da

música. Quando cantou a canção em português fez exatamente o mesmo e, em ambas as

versões, pediu ao grupo para cantar consigo, repetindo a frase, sendo que as crianças

repetiam de seguida. Estes momentos foram filmados e partilhados com as famílias.

No final da sessão, a educadora sentou-se ao lado do professor e juntamente com

o grupo estiveram a estabelecer paralelismos entre a infância do professor e a infância

vivenciada pelas crianças do grupo. Constatou-se que existem hábitos diferentes e a

realidade envolvente é diferente, mas existem algumas coisas comuns. Na ótica do grupo

as semelhanças são: ir à escola, usar roupa da escola, aprender e ouvir canções.

O professor explicou ainda que os seus pais eram portugueses e que foram viver

para a África do Sul, onde viviam muitos portugueses e por isso eram visíveis alguns

hábitos portugueses no país.

Semana 3

Sessão j) Na primeira sessão da semana, a educadora questionou o grupo se sabiam o que

era comum a muitas das tribos que observaram anteriormente nas imagens? Qual a

característica que inicialmente lhes causou muita curiosidade? O grupo recordou-se e

referiu que tinha sido a quantidade de colares usados. Então a educadora mostrou-lhes

algumas imagens de joalharia tribal africana impressas, nomeadamente os seus colares

Versão original (Afrikaans) Versão traduzida (Português)

Jan Pierewiet, Jan Pierewiet,

Jan Pierewiet staan stil

Jan Pierewiet, Jan Pierewiet,

Jan Pierewiet staan stil

Goeie môre, my vrou,

Hier's 'n soentjie vir jou*

Goeie môre, my man,

Daar is koffie in die kan

Jan Pierewiet, Jan Pierewiet,

Jan Pierewiet está quieto

Jan Pierewiet, Jan Pierewiet,

Jan Pierewiet está quieto

Bom dia mulher,

Aqui fica um beijo

Bom dia marido,

Há café na cafeteira

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

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161

exuberantes e coloridos, explicando que África foi o primeiro local no mundo, onde foi

fabricada joalharia, pois esta faz parte da cultura das tribos e são usados quer por homens,

quer por mulheres, mas que são exclusivamente fabricados pelas mulheres da tribo.

Explicou também que as mulheres utilizam marfim, osso, pedra, cascas de ovos, madeira

e pelos de animal, para fabricar as joias e usavam-nas em ocasiões especiais como

casamentos, sendo que as joias tem um simbolismo enorme, pois cada cor tem um

significado diferente em cada tribo (ex: branco - amor (tribo Zulu)/paz (tribo Masai).

Foi também explicado que os colares podem ter um significado cultural. Por

exemplo de comunicação, pois as mulheres casadas e solteiras usam tipos diferentes de

joalharia, para que o seu estado civil seja reconhecido por todos, sem ser necessário

perguntar.

As imagens foram observadas e os tamanhos, cores e quantidade de colares, foram

comparadas e observados nas diferentes tribos. A educadora sugeriu então a elaboração

de um colar africano com um prato de papel. Explicou que cada um teria o seu

(previamente cortado) e poderia pintá-lo da forma que preferir (tinta, marcadores, lápis

de cor…), decorando-os com os materiais disponíveis (missangas, lã, botões, etc.).

Esclareceu que na área de trabalho já se encontravam todos os materiais à disposição,

sendo que a educadora e a auxiliar estariam prontas a ajudar se precisassem de ajuda (a

atar/pendurar/colar algo que não conseguissem sozinhos). Afixou as imagens na sala, para

que as crianças pudessem observar e ter modelos para poderem expandir as suas

capacidades de imaginação e criação.

Sessão k) Quando todas as crianças terminaram o seu colar, foi-lhes pedido que o

colocassem ao pescoço para serem fotografados. Posteriormente a educadora, criou uma

montagem onde colocou do lado esquerdo a fotografia da criança, com o respetivo colar

e do lado direito uma fotografia do elemento de uma tribo com um colar ao pescoço.

Posteriormente, chamou cada criança individualmente e pediu-lhe que nomeasse as

semelhanças e as diferenças que observava em ambas as fotografias. Pretendia-se que as

crianças concluíssem que as semelhanças seriam mais numerosas que as diferenças.

Sessão l) Na última sessão, as crianças encontravam-se sentadas na sala, em formato de

roda, juntamente com a educadora e a auxiliar. A educadora tinha ligado previamente o

computador portátil à coluna e sugeriu que ouvissem mais uma canção africana, desta vez

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

______________________________________________________________________

162

com origem no Gana, chamada ‘Kokoleoko’. Após ouvirem a canção, a educadora esteve

a reproduzi-la por fases, associando-lhes gestos, sendo que as crianças faziam o mesmo

logo em seguida. Posteriormente, todos juntos reproduziram a canção na sua totalidade,

assim como os gestos a ela associados.

Nota: Ao longo das três semanas, foi preparada uma apresentação para as famílias, sendo

que os ensaios decorreram em simultâneo com as sessões realizadas. A apresentação foi

posta em prática na festa de Natal da instituição, com o tema: ‘Músicas e danças do

mundo’. O grupo selecionou um país de cada continente (Europa - Portugal; África -

Libéria; América do Norte - Havai; América do Sul - Brasil; Ásia - Índia e Oceânia -

Austrália) e foram exploradas músicas e danças típicas de cada uma destas culturas.

Durante parte da apresentação, os pais foram chamados a participar ativamente,

realizando as mesmas danças que as crianças, em simultâneo com estas e com a equipa

de sala.

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

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163

Projeto de intervenção

“Volta ao mundo das histórias: descobertas interculturais”

Bloco de

intervenção

Organização por

histórias

Objetivos

específicos

Conteúdos/

temas

Atividades

realizadas C

Continente

explorado:

América do

Norte

História III:

‘As cores de Mateus’1

Motivação:

A educadora mostrou

ao grupo de crianças,

uma boneca originária

da República

Dominicana, uma ilha

situadas nas Caraíbas.

A educadora não

passou esta informação

ao grupo, apenas lhe

disse que a boneca lhes

iria contar uma história,

que trouxe consigo da

sua ilha, situada na

América do Norte. Iam

ouvir a história de um

menino da sua ilha, que

era amigo desta nova

personagem.

Disse-lhes também que

esta personagem

feminina ainda não

tinha nome e que o

deveria escolher-lhe

um.

Após contar a história,

dinamizada pela

personagem que as

crianças decidiram

chamar-se ‘Eva’, a

educadora questionou?

- De onde vieram a Eva

e o Mateus?

- Quem sabe mostrar no

mapa mundo, onde fica

o continente da

América do Norte?

- Quais as

características da ilha e

da cultura do Mateus e

da Eva?

- O que observam nas

personagens para

dizerem que vieram de

outro país?

- Familiarização

com noções de

identidade e

alteridade de forma

lúdica e

pedagógica;

- Identificação de

atitudes

discriminatórias;

- Desenvolvimento

de atitudes de

empatia, respeito e

tolerância face ao

outro;

- Compreensão da

adoção como um

vínculo afetivo;

- Diversidade

cultural;

- Racismo;

- Adoção;

Semana 1

Sessão a) Exploração

da história; Reconto da

história;

Sessão b) Observação

de uma boneca típica

das Caraíbas – diálogo

acerca das suas

caraterísticas,

semelhanças/

diferenças com as

personagens da história;

Sessão c) Elaboração da

cara do Mateus, através

de uma pintura com

café; 3

Sessão d) Ordenar uma

sequência da história e

criar uma legenda para

cada imagem;

Semana 2

Sessão e) Associação

quantidade-número;

Sessão f) Realização de

um pictograma

(baseado nas origens da

personagem Mateus); 3

Sessão g) Diálogo em

grupo: O que é o

racismo? O que fazer

para o diminuir?/

Registo das

observações e

conclusões;

Semana 3

Sessão h) Pesquisa/

observação de imagens

reais de famílias

adotivas/multiculturais

Diálogo acerca do tema;

Sessão i) Famílias de

todas as cores: Criação

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

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164

Quadro 12 - Organização do Bloco de Intervenção C

Descrição das atividades realizadas

Semana 1

Sessão a e b) A educadora sentou-se junto às crianças com uma boneca e uma história na

mão. Explicou-lhes que a boneca lhes ia contar uma história especial, que trouxe consigo

da sua ilha, situada na América do Norte. Iam ouvir a história de um menino da sua ilha,

que era amigo desta nova personagem. Disse-lhes ainda que esta personagem feminina

ainda não tinha nome e que iriam fazer uma votação para decidirem o que lhe chamar.

Assim, questionou as crianças sobre os nomes que gostavam de dar à boneca e após a

escolha de alguns, houve uma votação em que ficou decidido que o nome desta nova

personagem seria ‘Eva’.

Após, a educadora contou a história, recorrendo à personagem Eva para a

dinamizar e, no final, questionou se sabiam de onde vinha a Eva e a personagem principal

da história, o Mateus? As respostas recaíram em “uma ilha das Caraíbas”, tal como

nomeado na história. Perguntou ainda se alguém sabia identificar o continente da América

Organização:

A partir das respostas

dadas, do diálogo

gerado em grande

grupo e ao longo da

exploração da história

em contexto de sala,

surgiu uma planificação

de várias atividades

pedagógicas propostas

pela educadora e

também pelas crianças.

Estas foram

organizadas com base

nas áreas de conteúdo,

preconizadas para a

educação pré-escolar e

esquematizadas na

organização curricular

por histórias; 2

de famílias

multiculturais; 3

Sessão j) Quantos

elementos tem cada

família? Contagem e

registo 3;

Semana 4

Trabalho de projeto*

Sessão k) ‘Arte a preto

e branco’: Exploração

de digitinta preta/

Desenho das figuras

humanas; 3

Sessão l)

Desenvolvimento das

atividades escolhidas na

sessão g): Teatro

desenvolvido com o

tema do racismo,

recorrendo aos

temas/áreas exploradas

nas histórias anteriores;

Sessão m) A

experiência dos ovos 3;

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

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165

do Norte num dos mapas da sala? Algumas crianças levantaram-se e apontaram para o

continente correto. A educadora colocou outra questão: tendo como base o que ouviram,

quem sabia dizer algumas das características da ilha e da cultura do Mateus e da Eva?

Ouviu as várias afirmações, que recaíram nas caraterísticas mencionadas na história,

aludindo tanto na fauna e flora da ilha, como nas características culturais do povo da ilha.

A educadora questionou ainda se os personagens eram parecidos um com o outro, já que

tinham nascido no mesmo sítio? As crianças relacionaram a pergunta a alguns factos

relatados anteriormente na história mencionando o facto de a cor da pele ser diferente,

tendo ‘cor de canela ou de chocolate’ e pele preta, não se baseando apenas nos aspeto

físico das personagens, mas reportando alguns dos factos relatados na história, para

extraírem informação.

Posteriormente, pediu ao grupo que lhe recontasse a história e, durante o reconto

as crianças evidenciaram não compreender o que seria a adoção, tendo a educadora

explicado que tal como disseram na história, a mãe do Mateus não podia ficar com ele,

pois era muito pobre e então para que ele pudesse crescer feliz e poder ir à escola e

aprender muitas coisas, ela entregou-o à sua ‘mãe branca’, para que ela o pudesse criar e

dar-lhe tudo isto. Mas ela só fez isto porque o amava muito e apesar de ficar triste por não

poder ficar com ele, preferiu dar-lhe uma oportunidade de crescer num sítio muito

diferente, com outra mãe, que goste dele tanto como ela. Em geral, todos pareceram

entender o que lhes foi explicado, nomeando que o Mateus tinha ‘duas mães, uma branca

e uma negra’. A educadora resolveu ainda questionar as crianças sobre os atos dos

meninos na escola do Mateus, sendo que as crianças a questionaram sobre a palavra

‘preto’. Explicou que era apenas uma cor, mas se o dissermos de forma má ou negativa,

as pessoas podem ficar magoadas por lhe dizermos isso, salientando que as ações das

crianças foram erradas e isso era chamado de racismo, o que quer dizer, não gostar de

outra pessoa porque é diferente de nós.

Sessão c) De seguida, a educadora propôs elaborarem a cara do Mateus, através de uma

pintura com café. Explicou que iam recorrer a diferentes técnicas plásticas, tal como

pintura com pincel, colagem, carimbagem com rolhas e desenho. Explicou sucintamente

que deveriam pintar a cara do Mateus com o café, depois carimbar o seu cabelo,

bochechas e olhos, desenhando o seu sorriso no final.

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

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166

Sessão d) A educadora sentou-se juntamente com o grupo no tapete, onde lhes mostrou

o livro “As cores de Mateus” e explicou que digitalizou previamente as imagens da

história e as imprimiu. Explicou que cada criança deveria escolher quatro imagens ao seu

gosto, formando uma sequência, numerando-a de 1 a 4 e criando uma pequena história,

que posteriormente deveriam relatar para a educadora registar. As folhas estavam já

dispostas na mesa para que escolhessem as imagens pretendidas, as recortassem e

realizassem a tarefa.

Semana 2

Sessão e) A semana iniciou-se com uma atividade inserida no domínio da matemática.

Na área do tapete, a educadora explicou que o mote para a atividade foi dado pela história,

pela forma que começava e terminava, com a frase: “do tamanho de todas as cores,

Mateus”, frase que a mãe do Mateus diz no final da história.

Assim, as crianças teriam quadrados de papel, das cores que foram nomeadas na

história e teriam uma tabela de dupla entrada, onde deveriam colar o número de

quadrados, correspondente ao número indicado através de símbolos (). Deveriam

também escrever o algarismo corresponde ao número representado de , realizando

associação quantidade-número. No final nomearam toda a sequência de 0 a 9, de forma

crescente e decrescente.

Sessão f) A atividade seguinte incidiu num pictograma, que tinha como base a ilha do

Mateus e suas características físicas e culturais. A educadora explicou ao grupo que cada

criança teria quinze imagens, que deveriam recortar. Após esta tarefa a educadora iria

fazer um ditado de imagens, que significava ler o texto que está escrito na folha através

dessas imagens. Cada um teria que encontrar a imagem correspondente à palavra que

faltava no texto lido e colá-la no respetivo espaço (ex. “À noite, o povo canta canções

tradicionais, para que o _____seja bom…”/ imagem em falta: vulcão). Fariam isto até

todos os espaços estarem preenchidos e o trabalho estar completo. No final de forma

individual, a educadora ou a auxiliar iriam chamaram as crianças, para que pudessem ‘ler’

o texto por imagens que realizaram.

Sessão g) Na última sessão da semana e baseada na complexidade dos conceitos

explorados na história, a educadora pediu ao grupo que se reunisse no tapete para uma

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

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167

conversa. De seguida releu o pedaço da história que focava o racismo de que a

personagem Mateus foi vítima, momento este passado em contexto escolar.

As crianças continuaram a demonstrar algumas dúvidas no conceito e a educadora

voltou a explicar que o racismo não algo é que se veja, a não ser que alguém faça ou diga

algo, ou seja, é uma ação que alguém faz quando não gosta de alguém, por esse alguém

ser diferente, neste caso foi por não gostarem da cor de pele do Mateus. A partir daqui as

crianças começaram a expor as suas opiniões e pontos de vista, sendo que a educadora

questionou: Alguém tem ideias para tentar contrariar estas ações negativas que deixam as

pessoas tristes? Devido à complexidade do conceito, à resposta emocional e ao interesse

demonstrado pelo grupo, os seus pontos de vista foram esquematizados no quadro 13,

para posteriormente, serem explorados de forma mais focada.

Trabalho

de projeto O que sabemos?

O que queremos

saber?

Onde vamos

pesquisar?

O que

queremos

fazer?

O racismo

- Ser diferente é muito

bonito;

- E é bom;

- Não se deve lutar

com as pessoas,

mesmo se formos de

outra cor, os meninos

tem que brincar;

- Não devemos chamar

nomes feios, como

preto, porque os

amigos e os seus pais

vão ficar muito tristes;

- Acho que o racismo é

dizer coisas feias;

- Sim, porque os

outros são negros ou

porque tem uma cor

diferente;

- Acho que é bater nos

amigos;

- É uma coisa má;

- É uma palavra mais

difícil;

- Se calhar é lutar com

os outros, por

chamarem preto e eles

não gostarem;

O que é o racismo?

- Saber o que quer

dizer o que é o

racismo;

- Saber como é nas

escolas? O que os

meninos fazem uns aos

outros?

Como podemos

combater o racismo?

- Aprender e depois

ensinar todas as cores

de pele;

- Explicar às pessoas

que não se chamam

nomes às outras

pessoas;

- Explicar que há

outros países com

pessoas de outras

cores;

- Temos que dizer aos

meninos que são do

racismo, para não

fazerem isso, porque

não se faz a ninguém;

- Sermos todos

amigos;

- Amigo, mesmo que a

pele seja de cor

diferente;

- Vamos

procurar no

telefone dos

pais;

- Podemos

perguntar aos

avós;

- E aos pais;

- A Ariana pode

ver no

computador;

- Pode dar na

televisão;

- Podemos

fazer pinturas

com preto;

- Desenhos de

pessoas

diferentes;

- Ou canções e

danças;

- Um teatro;

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

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168

Quadro 13 - Trabalho de Projeto C

Semana 3

Sessão h) A sessão iniciou-se na sala do computador onde as crianças já estavam

sentadas. A educadora sentou-se no computador, com o monitor visível ao grupo e

explicou que iriam procurar imagens de famílias adotivas, tal como a do Mateus. Explicou

que existiam vários tipos de famílias tal como a deles - mãe, pai e filho(s) - mas também

existem outras famílias: (i) famílias multiculturais, onde os pais ou filhos eram de

diferentes países e/ou tinham diferentes culturas; (ii) famílias monoparentais, famílias só

com pai ou mãe e filho(s). As crianças pareceram compreender os conceitos, pois

reproduziram-nos de forma concisa, quando foram questionados pela educadora em

relação às imagens observadas.

A educadora continuou a pesquisa na internet e à medida que mostrava as

imagens, as crianças escolhiam aquelas que preferiam e iam conversando sobre o que

observavam nestas, quer com a educadora, quer entre pares. Quando já tinham algumas

imagens, a educadora mostrou-as uma a uma e propôs um jogo: as crianças deveriam

adivinhar se as crianças da foto eram filhos biológicos, ou seja, parecidos fisicamente

com os pais, ou adotados, poderiam não ser fisicamente parecidos e serem de outros

países. O conceito foi interiorizado, pois uma grande parte das crianças identificaram

facilmente as imagens, justificando as suas escolhas.

Sessão i) A educadora mostrou às crianças, algumas imagens impressas. As imagens

consistiam em diferentes pessoas - adultos, adolescentes e crianças - oriundos de

diferentes culturas mundiais. Explicou que nesta atividade, dando continuidade à

conversa anterior iria ser criada uma família multicultural.

Todos realizaram uma moldura, onde iria ficar a ‘fotografia’ da família escolhida.

A 1ª fase da atividade consistiu em realizar uma colagem com papel de seda colorido,

preenchendo todo o espaço delimitado. Numa 2ª fase o grupo teve à disposição materiais

de recorte e colagem e várias folhas com as imagens impressas. A partir daí criaram a

- Devemos ser

queridos e ajudar os

outros;

- Agir bem e tratar

bem os outros;

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

______________________________________________________________________

169

família pretendida, recortando as imagens e aplicando-as dentro da moldura elaborada,

compondo uma ‘fotografia de família’. As crianças dirigiam-se às mesas em pequeno

grupo e realizaram a 1ª parte do trabalho com a auxiliar, dirigindo-se posteriormente à

zona onde estava a educadora, para realizar a 2ª fase da atividade.

Sessão j) A educadora juntou todas as crianças nas mesas de trabalho e propôs realizarem

a atividade em simultâneo. A atividade consistia num registo criado previamente pela

educadora, onde se podiam observar várias famílias multiculturais/adotivas (as imagens

escolhidas previamente pelas crianças). Existiam várias versões do registo e as folhas

foram distribuídas de forma aleatória. Na atividade, as crianças deveriam realizar a

contagem dos elementos da família, registar o número na folha e ligar o número à

respetiva imagem a que correspondia.

Semana 4 – Trabalho de projeto *

Sessão k)* Dando continuidade ao interesse do grupo sobre o conceito de racismo, a

semana iniciou-se com uma proposta expressa anteriormente pelas crianças. A educadora

sugeriu juntar duas das ideias dadas pelo grupo e fazer arte a preto e branco. A ideia seria

juntar a pintura e o desenho. Numa 1ª fase todos deveriam explorar digitinta preta e fazer

desenhos à sua vontade. Depois esse desenho seria decalcado com uma folha de papel de

cavalinho, passando o desenho feito na digitinta, para a folha. Ao terminarem essa fase

do trabalho deveriam desenhar a família do Mateus: o próprio e a mãe branca, mas apenas

recorrendo a lápis de cor/marcadores pretos. Posteriormente, a equipa de sala realizou a

montagem, aplicando o desenho sobre a pintura.

Sessão l)* As crianças estavam sentadas na área do tapete, juntamente com a educadora,

para conversarem acerca da atividade que pretendiam realizar. A educadora perguntou o

que gostariam mais de fazer acerca da temática do racismo, pois anteriormente tinham

mencionado ideias como canções, danças ou teatro. As opiniões estavam divididas, assim,

a educadora sugeriu que podiam integrar tudo isso num teatro, incluindo ainda a

gastronomia que também já tinham trabalhado, o que iria de encontro a algumas das

sugestões. Todos concordaram e decidiram em grupo que seria a educadora a inventar a

história. Esta conversou com o grupo e disse-lhes que iria basear-se na história “As cores

de Mateus” e inserir todas as outras áreas, pedindo sugestões a todos. Diferentes crianças

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

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170

fizeram sugestões para a dança e a canção a realizar e, para a receita a incluir no teatro.

Sugeriram ainda que pedíssemos ajuda aos pais, para uma canção africana (mãe da C.,

nascida em Angola) e uma receita indiana (Avó da M., nascida em Goa). A educadora

encarregou estas meninas de falarem com os pais e enviou um recado a reforçar a ideia.

No dia seguinte, a educadora trouxe uma sugestão de guião, que sofreu algumas

alterações de acordo com as sugestões feitas pelo grupo. Nesta conversa foram também

escolhidos os papéis de cada criança na peça, estando esta tarefa totalmente nas mãos do

grupo, tendo a educadora registado numa folha de papel, quem faria o quê. Quando os

pais enviaram os dados pedidos, estes foram integrados no pequeno teatro.

Posteriormente, uma das crianças sugeriu que apresentássemos o teatro para os outros

colegas da escola e selecionaram duas crianças para convidarem as outras salas de jardim

de infância.

No dia seguinte e após alguns ensaios, o teatro foi realizado, com assistência de

colegas e adultos. A educadora e a auxiliar ajudaram as crianças nas entradas/saídas,

colocação das músicas e tiveram ainda a função de ponto, divulgando as frases de que

não se lembravam. O teatro foi realizado de forma simplista, recorrendo apenas a gestos,

à imaginação e ao jogo simbólico, não existindo objetos físicos.

Sessão m)* Esta atividade foi proposta às crianças com o objetivo de consciencializar

para a diversidade cultural e foi implementada em duas fases diferentes. A 1ª fase teve

lugar na área do tapete, onde a educadora sugeriu fazer uma experiência com ovos. Isto

suscitou a curiosidade das crianças, pois o aspeto físico dos ovos era diferente, sendo um

branco com que as crianças não estavam familiarizadas. A educadora explicou que o ovo

n.º 1 bege/acastanhado era um ovo de galinha, igual aos que estão habituados a ver/comer

e o ovo n.º 2, totalmente branco, era um ovo de pata. A educadora partiu então ambos os

ovos para dentro de dois copos transparentes, colocando a casca ao lado de ambos, para

os identificar.

A atividade prosseguiu, sendo que a educadora pediu às crianças para

identificarem semelhanças e as as diferenças entre os ovos. Inicialmente foram focadas

as semelhanças e posteriormente as diferenças, que foram registadas no quadro 14:

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

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171

Quadro 14 - Registo das conclusões: Experiência dos ovos

Embora tenham detetado várias semelhanças, as crianças apenas descobriram uma

diferença, comprovando o que tem vindo a ser explorado acerca da diversidade: por fora

temos cores e aspeto diferente, mas por dentro somos iguais.

Numa 2ª fase, todo o grupo se sentou nas mesas, onde esteve a realizar um registo

criado pela educadora. O registo consistia em duas quadrículas: na primeira deveriam

realizar a pintura de dois ovos, com as cores correspondentes ao que foi observado,

registando por baixo a palavra ‘diferente’, na segunda deveriam desenhar o interior de

um ovo, pintá-lo e registar a palavra’’ iguais. Após a explicação, a atividade foi realizada

em grande grupo, seguindo as instruções dadas, mas de forma autónoma.

Semelhanças Diferenças

- São ovos;

- Estão crus;

- Tem casca;

- São duros;

- Uma clara;

- Uma gema;

- Servem para comer;

- Tem a mesma forma;

- A cor:

Galinha: bege/castanho

Pata: branco;

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

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172

Projeto de intervenção

“Volta ao mundo das histórias: descobertas interculturais”

Bloco de

intervenção

Organização por

histórias

Objetivos

específicos

Conteúdos/

temas

Atividades

realizadas D

Continente

explorado:

América do

Sul

História IV:

‘Dançar nas nuvens’1

Motivação:

Na sala do

computador foi

colocado um vídeo

onde se podia

observar o

sambódromo no

Brasil, e uma grande

multidão a dançar o

samba.

A educadora não

forneceu esta

informação às

crianças e quando o

vídeo terminou,

lançou algumas

questões para

discussão:

- Já tinham visto esta

dança ou ouvido este

tipo de música?

- Qual é a festa que

está a ser

comemorada?

- Sabem qual é o país

onde este vídeo foi

filmado? Que língua

se ouve na música?

- A que continente

acham que pertence?

- Que instrumentos

ouvem nesta música?

Após as respostas e

um breve diálogo,

com a conclusão a

dança era do Brasil, a

educadora referiu que

iria contar uma

história, cujo cenário

era esse país,

indicando que

pertencia ao

continente da

América do Sul, no

mapa mundo

mostrado.

- Reconhecimento

de várias culturas;

- Familiarização

com o fenómeno

migratório;

- Desenvolvimento

de atitudes de

empatia, respeito e

tolerância face ao

outro;

- Familiarização

com noções de

identidade e

alteridade forma

lúdica e

pedagógica;

- Diversidade

cultural;

- Migração;

Semana 1

Sessão a) Exploração da

história; Reconto da

história;

Sessão b) Elaboração de

uma personagem da

história: baiana; 3

Sessão c) Formação de

conjuntos com as casas da

história (de acordo com

vários critérios);

Semana 2

Sessão d) O fabricante de

papagaios de papel da

história: Escultura com

arame e lã;

Sessão e) Lenda

tradicional brasileira

explorada por uma

nativa;

Sessão f) Ordenar uma

sequência de imagens, de

acordo com a lenda; 3

Sessão g) Degustação de

gastronomia típica

brasileira: pão de queijo;

Semana 3

Sessão h) Elaboração de

uma cara, recorrendo a

imagens de diferentes

culturas; 3

Sessão i) Semana dos

contos: Exploração de

histórias relacionadas

com a diversidade

cultural (enviadas pelas

famílias);

Sessão j) Mural coletivo:

‘Partilhar as nossas

semelhanças, celebrar as

nossas diferenças!’; 3

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

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173

Quadro 15 - Organização do Bloco de Intervenção D

Descrição das atividades realizadas

Semana 1

Sessão a) As sessões iniciaram-se na sala do computador, onde as crianças estavam

sentadas de frente para o monitor. A educadora colocou um vídeo, onde observaram

durante alguns minutos, imagens do sambódromo no Brasil, em que a multidão estava a

dançar o samba.

Após terminar o vídeo, a educadora questionou as crianças: Já tinham visto esta

dança ou ouvido este tipo de música? Qual é a festa que está a ser comemorada? Houve

algumas crianças que referiram que já tinha visto na televisão e que se passava noutro

país, embora não soubessem referir qual, identificando facilmente a efeméride do

Organização:

A partir das respostas

dadas e do diálogo

gerado em grupo e ao

longo da exploração

da história em

contexto de sala,

surgiu uma

planificação de várias

atividades

pedagógicas

propostas pela

educadora e também

pelas crianças. Estas

foram organizadas

com base nas áreas de

conteúdo,

preconizadas para a

educação pré-escolar

e esquematizadas na

organização

curricular por

histórias; 2

Semana 4

Trabalho de projeto*

Sessão k) Visualização

da curta-metragem da

história “A menina e o

tambor”; Diálogo acerca

da história e das suas

personagens;

Sessão l) Recriação da

história, com recurso a

instrumentos musicais;

Sessão m) Associação de

instrumentos aos

respetivos continentes de

origem; 3

Sessão n) Criação de uma

curta-metragem

recorrendo às imagens de

pessoas de diferentes

culturas presentes na

história; 3

Sessão o) Sessão de

histórias. Visita da

contadora de histórias

cearense, Tâmara

Bezerra.

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

______________________________________________________________________

174

Carnaval. Então, a educadora voltou a colocar o vídeo e levantou o som da coluna,

pedindo que todos ouvissem com atenção o que estava a ser dito. Alguns segundos depois

perguntou se já sabiam qual é o país onde este vídeo foi filmado ou a língua que se ouve

na música? A língua foi facilmente identificada como brasileiro, tendo a educadora

explicado que é português, mas do Brasil, pois ambos os países falam a mesma língua.

Posteriormente, voltou a colocar o vídeo, mas desta vez com o monitor desligado e sem

recurso a imagem e perguntou que instrumentos conseguiam ouvir? As crianças

silenciaram-se e ouviram a canção, referindo ouvir tambores e que não conseguiam ouvir

os restantes, porque os tambores e a vozes ‘se ouviam muito alto’.

A educadora mostrou então uma imagem em formato A3, onde se podia ver o

mapa-mundo e mostrou os continentes que já tinham ‘visitado’, nomeando-os um por um

com a ajuda do grupo. Referiu que agora ‘estavam’ no Brasil, e perguntou: Qual será

então o nome do continente a que acham que pertence? (apontando-o com o dedo). Duas

crianças referiram que o que ficava por baixo/’ao pé’ da América do Norte era a América

do Sul.

A educadora assentiu e referiu que a dança típica do país é o samba, sendo que

neste país o Carnaval era uma época muito importante, que todos esperavam ansiosos

durante todo o ano. Levavam o ano a construir os carros, as roupas e a compor as músicas,

para no Carnaval as apresentarem num concurso que tem lugar no sambódromo, que se

chama assim por causa do samba. Disse-lhes que era uma festa muito especial, a que vão

pessoas de todo o mundo assistir, pois é uma parte importante da cultura do Brasil. Referiu

ainda que iria contar uma história que se passava no Brasil, mostrou o livro ‘Dançar nas

nuvens’ e iniciou a exploração da história.

No final o grupo realizou o reconto da história, baseando-se nas imagens do livro

que a educadora ia mostrando. Esta foi colocando algumas questões sobre a história e

pediu-lhes que identificassem uma personagem de branco que figurava na história. Como

ninguém sabia, a educadora explicou tratar-se de uma baiana, uma das figuras mais típicas

do Brasil, que simbolizava as mulheres trabalhadoras do Brasil. Explicou ainda que estas

mulheres tem muitas influências de África, como por exemplo a sua comida, existindo

uma relação muito grande entre os países. Mostrou depois no computador, algumas

imagens onde se podiam observar as baianas, assim como as iguarias típicas que

cozinham, para que as crianças pudessem ver alguns pratos típicos do país.

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

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175

Finalmente a educadora questionou algumas das afirmações feitas pelas crianças

durante o reconto e que identificavam a chegada de ‘pessoas de outro país’, vindos ‘da

China, da Rússia, das Caraíbas e da África’, à aldeia da Isabela (personagem principal da

história). Pediu-lhes que explicassem porque tinham usado essa expressão? Houve várias

respostas, indo todas de encontro a uma mesma premissa: era de outro país, pois eram

todos diferentes, uns vinham da China, porque tinham olhos rasgados, outros vinham da

Rússia, pois eram parecidos com as pessoas russas que viram quando ‘viajaram’ até ao

país, outros vinham da África pois tinham a pele mais escura, como nas tribos africanas

ou como ‘o Mateus da outra história e ele vinha das Caraíbas’. Além disso - referiram

ainda - que as roupas eram todas diferentes e estavam relacionadas com os seus países de

origem. Tinham também instrumentos de música que deviam ser usados nos seus países.

Estas justificações originaram um diálogo em que a educadora explicou que estas

pessoas eram migrantes, pessoas que tinham vindo de outros países, países onde haviam

conflitos/guerra e dos quais tiveram que fugir para se abrigar noutro país, mais pacífico.

Assim, nesta história, a aldeia da Isabela ficou cheia de migrantes, pois estas pessoas

precisavam de um novo lugar para morar e quando isso acontecia, todos tinham que

ajudar, pois não se pode deixar ninguém sem ajuda, roupa, casa ou comida. As crianças

pareceram interiorizar bem a mensagem, produzindo de imediato uma justificação

adaptada, que lhes fez mais sentido, mas que resumia o que lhes tinha sido explicado.

Posteriormente ocorreu um breve diálogo sobre o tema, que serviu para colmatar algumas

dúvidas do grupo.

Sessão b) Já na sala de atividades, as crianças encontravam-se sentadas no tapete a

observar o livro de histórias ‘Dançar nas nuvens’. A educadora questionou novamente

quem seria a personagem vestida de branco, que todos identificaram positivamente como

baiana. Mostrou então uma personagem em feltro, que ilustrava a imagem do livro em

formato físico. Esta passou pelo grupo, para que todos a pudessem observar. Voltaram a

conversar sobre quem era a baiana e das suas origens africanas, sendo que a educadora

aproveitou este momento para voltar a reforçar os laços entre culturas e a importâncias

das várias culturas na identidade de uma pessoa ou de um país, pois todos acabam por se

relacionar.

Uma criança questionou a educadora se iriam fazer uma baiana e a educadora

perguntou-lhe porquê. A resposta recaiu em “Estamos no Brasil e a baiana é de lá. A festa

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

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176

preferida no Brasil é o Carnaval e o Carnaval está a chegar, por isso podíamos fazer a

baiana, porque é uma mascara, não é?”. A educadora respondeu que era uma boa resposta

e uma excelente ideia, perguntando se todos queriam tentar fazer uma baiana. Como

sugerido pela M.J. A resposta foi positiva e algumas crianças questionaram se podiam

usar outras cores ou se a baiana tinha que ser toda branca, como a personagem da história

e a boneca de feltro que batizaram de Isabela (tal como a personagem principal da

história). A educadora disse-lhes que poderia ser às cores e sugeriu a pintura em filtros

de café, que difundem as cores quando em contato com a água, técnica com que as

crianças já se familiarizaram em experiências realizadas anteriormente. Todos

concordaram, pois assim todas as baianas terão as cores que cada um quiser.

A educadora instruiu as crianças que iriam para a mesa em pequenos grupos, para

pintarem e posteriormente borrifarem os filtros de café com água. Posteriormente e como

foi uma atividade proposta no momento, explicou a sua ideia para terminar a baiana.

Todos iriam pintar o corpo da baiana e teriam à escolha os vários tons de pele, que iriam

ser desenhados previamente. Depois iam aplicar a roupa e o filtro de café pintado (a saia

da baiana). O grupo concordou e deu continuidade à tarefa.

Sessão c) A educadora sentou-se junto das crianças e voltou a mostrar a história, focando

desta vez, as casas que vão aparecendo na história e que possibilitam à personagem

Isabela, chegar até às nuvens. Mostrou imagens das diferentes casas, previamente

impressas em cartolina branca e sugeriu que realizassem uma atividade de grupo, em que

todas as crianças eram chamadas de forma individual e realizavam a tarefa de acordo com

os critérios dados. Assim, as crianças foram chamadas uma a uma, ou em grupos de três,

tendo que atender aos critérios dados e que visavam o domínio da matemática, tais como:

ordenar de acordo com o critério de tamanho, crescente/decrescente, de acordo com a

sequência vertical da história, em grupos de pequeno, médio ou grande, etc.

Semana 2

Sessão d) Nesta sessão, a educadora focou uma das personagens da história, Ulisses, o

fabricante de papagaios. Retomou o tema da migração, pedindo às crianças que lhe

explicassem no que consiste este fenómeno, sendo a resposta ‘são pessoas que vem de

países onde há guerra e tem que fugir, para ir viver em países onde estão seguros” ou

“tem que fugir para sítios onde as ajudam”, “não podem ficar nas suas casas, porque

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

______________________________________________________________________

177

correm perigo e não tem comida” ou “são pessoas que precisam de ajuda, temos que lhes

dar roupa quente e comida da nossa”.

Posteriormente, questionou as crianças sobre a nacionalidade do Ulisses e em

grupo, depois de hipóteses como França, África do Sul ou Hungria, a escolha mais

unânime recaiu na Rússia. A educadora relembrou que o Ulisses fez os papagaios, que a

Isabela usou para ‘dançar nas nuvens’ e questionou se seriam capazes de fazer um

papagaio idêntico, para que cada um dos novos habitantes da aldeia pudesse acompanhar

a Isabela na sua brincadeira? Mostrou então uma forma modelada em arame -semelhante

ao papagaio de papel da história - e sugeriu que todos os envolvessem com lã, criando

uma escultura. Explicou que ela e a auxiliar iam atar a lã ao arame e que depois todos

deveriam enrolavam a lã, envolvendo o arame, até acharem estar completo.

Sessão e) Neste dia, a sessão foi realizada na área do tapete, onde a educadora anunciou

que iam ter uma visita vinda do Brasil. Lembrou a todos a sugestão da colega L., cuja

mãe nasceu no Brasil e vinha contar uma história típica do seu país. Assim, a educadora

convidou esta mãe para visitar a sala e agendou a visita.

A Carine chegou e foi convidada a entrar e a sentar-se em frente ao grupo, onde

lhes explicou que a história que ia contar era uma lenda do Brasil e que não tinha um livro

de histórias, pois esta história era contada oralmente, tal como ela ia fazer. Iniciou então

a “Lenda da Vitória-Régia”, explicando que era uma lenda de uma tribo de índios

brasileiros, chamada ‘Tupi-Guarani’, que contava como uma bela índia chamada Naiá

que se apaixonou pela lua e acabou por se transformar numa planta chamada Vitória-

Régia, que apenas abre à noite, com a luz desta. Enquanto contava a lenda, acompanhava-

a com imagens, onde se podiam ver alguns momentos da história.

Após o término da história, a educadora sentou-se ao lado da Carine e pediu às

crianças que recontassem a história, com a ajuda da mãe da L. e das imagens.

Posteriormente, as crianças colocaram algumas perguntas à Carine sobre a história e

também sobre o seu país.

Sessão f) A Carine explicou ao grupo, que tinha trazido uma folha para cada uma deles,

onde figuravam três imagens, que exemplificavam as partes principais da história. Neste

momento, a educadora propôs utilizarem este recurso para realizarem uma atividade no

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

______________________________________________________________________

178

âmbito matemático, realizando uma sequência de imagens e questionou a convidada sobre

a sua opinião, convidando-a para ajudar a orientar as crianças durante a atividade.

A educadora pediu então para que todas as crianças se sentassem nas mesas,

sendo que a Carine, a educadora e a auxiliar distribuíram os materiais de desgaste

necessários para a realização da atividade. A educadora pediu que identificassem a folha

com a frase: Lenda brasileira. Posteriormente, pediu à Carine, para proceder a um breve

reconto da história, orientando as crianças na identificação e numeração das imagens de

1 a 3. Ao terminarem a atividade, a mãe da L. anunciou que à tarde, após o lanche, iria

trazer uma surpresa, uma iguaria brasileira para que todos experimentassem: pão de

queijo.

Sessão g) A Carine chegou após o lanche e dirigiu-se até ao grupo que ainda se encontrava

sentado nas mesas do refeitório a terminar o lanche. Após todos terem terminado,

explicou ao grupo que tinha cozinhado pão de queijo, uma receita típica brasileira muito

antiga, que surgiu inicialmente num local chamado Minas Gerais, mas que agora era feita

por todo o Brasil. Explicou que ia dar um pão a cada um, para que todos pudessem provar

e quem gostasse poderia repetir. A educadora e a auxiliar distribuíram guardanapos pelas

mesas, enquanto a Carine ia colocando em cima deste um pão de queijo, para as crianças

provarem. Posteriormente, ofereceu também à equipa de sala, enquanto juntas

observavam as reações das crianças e lhes iam colocando questões acerca da sua opinião.

Houve três crianças que identificaram já ter provado esta iguaria em casa/na rua, mas que

não tinham noção que fazia parte da gastronomia brasileira.

Após todos terem terminado, a Carine deixou os restantes pães de queijo, para quem

quisesse repetir/para oferecer aos restantes pais, quando viessem buscar as crianças ao

final do dia.

Semana 3

Sessão h) Nesta sessão, a educadora retomou o tema da diversidade cultural e da

existência de várias culturas, dentro da mesma cidade/país. Relembrou o fenómeno da

migração, visível na história e conversou brevemente com o grupo sobre estes temas,

recapitulando o que sabiam neste âmbito.

De seguida, sugeriu que poderiam compor uma cara, mas com uma mistura

de várias caras, oriundas de nacionalidades/culturas diferentes, formando assim uma

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

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179

unidade, composta por todos, explicando que a diversidade enriquece-nos, pois

aprendemos e crescemos uns com os outros. A educadora mostrou então imagens de

caras, onde figuravam adultos, adolescentes e crianças de ambos os sexos e as crianças

identificaram as imagens, pois já as conheciam. Haviam-nas utilizado num trabalho

relativo ao bloco de intervenção anterior, na história “As cores de Mateus”. A educadora

explicou que a diversidade de culturas é observável em todas as histórias que tem sido

exploradas na sala e por isso usavam as mesmas imagens, pois este é um ponto comum.

De seguida mostrou novamente as imagens, previamente preparadas e

delimitadas. Explicou às crianças que os materiais necessários estariam na área de

trabalho, assim como as caras, todas expostas para que pudessem escolher. Explicitou

ainda que todas as caras teriam que conter cinco partes constituintes: testa, olhos nariz,

boca e queixo, bastando apenas escolher, os cinco pedaços da cara e montá-las na folha

que lhes seria distribuída.

Sessão i) A educadora solicitou previamente aos pais, o envio de histórias multiculturais

que ilustrassem o contato com o outro/com o diferente e fomentassem o respeito pela

diversidade cultural. Algumas das crianças trouxeram histórias, identificando-se:

“Pinóquio”, “O patinho feio”, “Elmer”, “A pequena coruja branca”, “Os ovos

misteriosos” e um livro previamente explorado “A surpresa de Handa”.

Apesar de ser identificada como uma sessão individual, esta foi ramificada

em cinco momentos diferentes, sendo explorada uma história por dia, como exceção de

“A surpresa de Handa”, utilizada no âmbito do reconto. Após cada sessão foi proposto ao

grupo que identificasse: (i) as personagens principais; (ii) a ação que desencadeou o

problema/conflito; (iii) o(s) elemento(s) diferente(s), salientado as suas caraterísticas e

diferenciando-a de uma forma positiva. Finalmente, foi realizado um breve diálogo, onde

as crianças podiam colocar as suas dúvidas e exprimir as suas opiniões pessoais.

Sessão j) A educadora propôs ao grupo a construção de um mural coletivo, sob o mote

“Partilhar as nossas semelhanças, celebrar as nossas diferenças”. Questionou como

poderiam realizar a tarefa e o T.C. referiu que podiam pintar um ‘papel’ (fundo), onde a

frase seria depois colocada. A L. referiu ainda que podíamos colocar algo à volta, o que

a educadora achou boa ideia, pois poderia ilustrar como somos diferentes e convivemos

positivamente.

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

______________________________________________________________________

180

Questionou então as crianças, pedindo-lhes ideias e as sugestões que

emergiram foram: (a) colocar as suas fotografias, recortadas por elas; (b) desenhar as suas

mãos num papel e decorá-lo a gosto; (c) fazer um desenho com pessoas diferentes.

Após uma votação em grupo, ficou decidido que a opção (b) era a vencedora e a

decoração da sua mão ficaria a cargo de cada um, podendo o grupo escolher de que forma

ia decorar o desenho/pintura/ colagem com os diferentes materiais.

Semana 4 - Trabalho de projeto *

Sessão k)* No início da semana, uma grande maioria do grupo, referiu à educadora que

ainda não tinham falado acerca dos instrumentos musicais que apareciam na história, a

acompanhar as personagens. A educadora registou estes interesses no quadro 16.

Quadro 16 – Trabalho de projeto D

Durante a tarde, dando continuidade aos interesses demonstrados, a educadora

resolveu mostrar ao grupo um vídeo, uma curta-metragem que conta uma história editada

- “A menina e o tambor” - apenas com recurso a música.

Após verem o vídeo, a educadora pediu para lhe explicassem a história e que

deveriam referir o que observaram nesta. A maioria relatou a história coerentemente,

seguindo a linha temporal e conseguindo aprender os conceitos inatos do vídeo, relativos

ao foro emocional das personagens, verificado pelas suas expressões faciais e pela

intensidade da música. Foi ainda relatada a presença de elementos de outros países e

pessoas oriundas de outras culturas. A educadora explicou que esta história era

Trabalho de

projeto

O que sabemos? O que

queremos

saber?

Onde vamos

pesquisar?

O que

queremos

fazer? Instrumentos

típicos de cada

país

- Existem

instrumentos

diferentes em todos

os países;

- Alguns são iguais,

havia maracas em

países diferentes e

elas não eram iguais;

- Sabemos o nome

dos instrumentos

todos que aparecem

na história;

- Qual é o país

dos

instrumentos;

- Podemos

perguntar à Cátia

da música;

- Vemos na história

do “Dançar nas

nuvens”;

- Procuramos

noutras histórias

que tenham

instrumentos;

- Procura-se no

computador da

escola ou no da

Ariana;

- Fazer atividades

com instrumentos;

- Tocar os

instrumentos que

aparecem na

história;

- Tocar

instrumentos dos

países todos;

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

______________________________________________________________________

181

semelhante a “Dançar nas nuvens”, pois mostrava a presença de migrantes, oriundos de

vários países e que procuravam abrigo noutros países. Disse-lhes também que tinha

escolhido este vídeo, devido ao interesse na área da música demonstrado pelo grupo, mas

também devido ao tema em questão.

Para dar continuidade ao trabalho de projeto, a educadora pediu às crianças que

referissem aos pais, que deveriam enviar um instrumento, e tinham que pesquisar com as

famílias qual o seu país de origem, para partilharem posteriormente com o grupo. A

educadora transmitiu esta informação aos pais.

Sessão l)* A educadora indicou que indo de encontro ao pedido do grupo, iriámos recriar

o vídeo observado, recorrendo ao uso dos instrumentos que cada um tinha trazido de casa.

Inicialmente todos se sentaram em grupo e identificaram o seu instrumento musical,

assim como o seu país de origem, tal como pesquisado pelos pais.

Depois, a educadora explicou que ia colocar a tocar a música do vídeo no

computador portátil - previamente ligado à coluna - e que cada um deles seria uma das

personagens, recriando a ação do filme. O grupo estipulou que a educadora era a menina

com o tambor, que dá início à história, tendo os restantes que recriar as personagens

observadas no filme e seus comportamentos. Após as explicações deu-se início à

atividade, que teve a duração da música. No final, os instrumentos foram ainda utilizados

para explorar diferentes intensidades, ritmos e silêncios.

Sessão m)* Devido à ligação entre as histórias, em grupo, a educadora sugeriu que

registassem numa tabela, os instrumentos presentes no vídeo observado e os instrumentos

presentes na história “Dançar nas nuvens”, descobrindo os que são comuns. Foram

descobertos nove instrumentos em comum. Posteriormente, foram associadas às suas

origens, através das informações fornecidas pelos pais, com exceção de dois

instrumentos, cuja origem foi pesquisada pela educadora. O grupo esteve ainda a

distribuir os instrumentos, inserindo-os no respetivo continente.

Posteriormente, a educadora sugeriu que realizassem um registo criado por ela, onde

estava impresso o mapa-mundo que todos deviam colorir de acordo com um código

fornecido pela equipa de sala. Cada criança teria depois acesso a nove imagens com os

instrumentos comuns, que deveria associar e colar no respetivo continente.

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

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182

Sessão n) Tendo em conta a temática da migração, relacionada com últimas duas histórias

exploradas, foi proposto a cada criança que realizasse uma curta-metragem, com 4/5

frames, baseada no vídeo. Os frames seriam as imagens da história, previamente

impressas, sendo que cada história deveria ser criada, tendo como critério, a inclusão de

pessoas originárias de outras culturas.

As imagens foram espalhadas na mesa, para que todos pudessem escolher e ter

acesso a estas, devendo cada criança, cortar e montar a sua história, de acordo com a

sequência que pretendesse. No final, deveriam dirigir-se ao adulto, onde teriam que contar

a história, tal como a montaram e dar-lhe um título.

Sessão o) Foi explicado ao grupo que terminada ‘a viagem’ pelo continente sul-americano

iriámos receber uma visita especial do Brasil. Uma amiga da educadora, que era uma

excelente contadora de histórias e que vinha contar-lhes algumas histórias da cultura oral

brasileira.

Recebemos a Tâmara, que se sentou junto ao grupo e se apresentou, explicando que

lhes iria contar algumas histórias, em que iriam aprender alguns factos acerca do seu país,

o Brasil. Posteriormente contou três histórias, sempre recorrendo a instrumentos musicais

e à interação constante com o grupo.

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

______________________________________________________________________

183

Projeto de intervenção

“Volta ao mundo das histórias: descobertas interculturais”

Bloco de

intervenção

Organização por

histórias

Objetivos

específicos

Conteúdos/

temas

Atividades

realizadas E

Continente

explorado:

Ásia

História V:

‘Lili e o Jardim da

Índia’1

Motivação:

Foi colocada a tocar

uma canção referente

ao Diwali -festividade

religiosa indiana - a

qual as crianças

ouviram até ao final.

Após, a educadora

questionou o grupo:

- Já tinham ouvido

esta canção?

- Alguém conhecia

esta língua?

Após, a educadora

mostrou imagens

relativas à cultura

indiana: uma mulher

vestida com o sari

(traje típico), o Taj

Mahal, deuses

hindus, etc.

Questionou depois as

crianças se já sabiam

associar a canção/

imagens a um país?

Após as respostas e

um breve diálogo, a

educadora referiu que

iria contar uma

história, cujo cenário

é a Índia.

Organização:

A partir das respostas

dadas e do diálogo

gerado em grupo e ao

longo da exploração

da história, surgiu

uma planificação de

várias atividades

pedagógicas

propostas pela

educadora e também

pelas crianças. Estas

foram organizadas

com base nas áreas de

- Reconhecimento

de traços

distintivos de

diferentes culturas;

- Compreensão da

religião como um

fator de identidade

cultural;

- Reconhecimento

de diferentes

manifestações

culturais

religiosas;

- Diversidade

cultural e

religiosa;

- Tradições

religiosas do

Hinduísmo;

Semana 1

Sessão a) Exploração e

reconto da história “Lili e

o jardim da Índia”/

Diálogo acerca da

religião (hinduísmo),

tendo como ponto de

partida as festividades do

Diwali (festival das

luzes);

Sessão b) Vamos ouvir e

explorar a canção do

Diwali, na sua versão

original;

Sessão c) Explorando o

Diwali: Vamos fazer uma

‘kandil’; 3

Sessão d) Acróstico da

palavra ‘Índia’; 3

Semana 2

Sessão e) Observação de

imagens dos 5 deuses

mais importantes desta

religião: Krishna,

Ganesha, Hanuman,

Shiva, Rama. Diálogo

acerca do que foi

observado;

Sessão f) Elaboração de

puzzles com as imagens

dos deuses do hinduísmo;

Sessão g) A experiência

das maças;

Semana 3

Sessão h) Explorando o

Diwali: Arte Rangoli;3

Trabalho de projeto*

Sessão i) Vocabulário da

Índia: à descoberta de

palavras desta cultura;

Sessão j) Dia da índia#-

Gastronomia típica

indiana: chapati;

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

______________________________________________________________________

184

Quadro 17 - Organização do Bloco de Intervenção E

Descrição das atividades realizadas

Semana 1

Sessão a) A educadora sentou-se junto às crianças e colocou a tocar uma canção de

origem indiana, onde se ouviam vozes a cantar em hindi. Quando a canção terminou, uma

das crianças referiu de imediato que a avó sabia falar indiano, pois ela tinha nascido em

Goa, que ficava na Índia. Neste seguimento, a educadora questionou se alguém já tinha

ouvido aquela música ou alguma semelhante? Se o grupo conhecia a língua, que a M. já

havia descoberto ser a língua falada na Índia, um país da Ásia.

Após, a educadora mostrou imagens relativas à cultura indiana: uma mulher

vestida com o sari (traje típico), o Taj Mahal, deuses hindus, etc. Perguntou depois às

crianças se sabiam associar a canção/ imagens a um país/continente? Várias crianças

referiram a Índia/Ásia e questionaram se iriam ouvir uma história desse país, sendo a

resposta afirmativa. Após terem ouvido a história, iniciou-se um diálogo acerca do

Diwali, o festival das luzes, uma festa importante na religião indiana. O diálogo incidiu

nas características observadas na história e nas figuras indianas presentes na história,

assim como as suas especificidades.

Sessão b) Após o diálogo a educadora propôs escutarem a canção do Diwali novamente,

para tentarem cantar alguns excertos desta, em hindi. Por trechos e com associação de

gestos, a educadora cantou a canção, sendo que as crianças repetiram logo de seguida,

realizando os gestos correspondentes. A atividade durou alguns minutos, tendo as

crianças memorizado o refrão, assim como a melodia da canção.

conteúdo,

preconizadas para a

educação pré-escolar

e esquematizadas na

organização

curricular por

histórias; 2

#Nota: Ao longo deste

dia, foi celebrado o dia da

Índia, sendo que as

crianças foram vestidas a

rigor pelos pais. Durante

o dia foi explorada esta

cultura (saudações,

vocabulário aprendido,

comida típica, etc.)

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

______________________________________________________________________

185

Sessão c) De acordo com as características do Diwali (festival das luzes), exploradas na

história, a educadora propôs ao grupo a construção de uma ‘kandil’, uma lanterna que se

encontra pendurada em todas as portas durante os festejos do festival. A educadora

mostrou um exemplo e explicou que este iria ficar pendurado na sala, para que todos

pudessem perceber como se montavam todas as peças da lanterna. As crianças

concordaram e em pequenos grupos dirigiram-se à área de trabalho, onde estava disposto

o material. Cada criança tinha á sua diposição, um leque de cores variado, podendo

escolher quais as cores que pretendia para elaborar o seu trabalho autonomamente.

Sessão d) As crianças encontravam-se sentadas no tapete juntamente com a educadora,

após terem explorado mais uma história do projeto em parceria com os pais “Conta-me

um conto com…” e realizado jogos que visavam a consciência fonológica (divisão

silábica, identificação de sílaba de som inicial, nomeação de palavras iniciadas por

diferentes sons, etc.) baseados nesta.

A educadora sugeriu que utilizassem uma palavra relacionada com a história

escutada, para criarem um acróstico, ou seja, novas palavras, a partir das letras da palavra

escolhida. Foram sugeridas várias palavras e após um breve diálogo, a palavra escolhida

foi ‘Índia’. Assim, em grupo, as crianças foram nomeando palavras iniciadas pelas letras

que compõem a palavra (ex.: I - ilha, N - nuvens, etc…). A educadora sugeriu que cada

um registasse aquilo que tinha dito e posteriormente, no período da tarde, entregou uma

folha de registo com a palavra, onde cada criança registou as palavras através da escrita

e de forma individual.

Semana 2

Sessão e) Dando continuidade ao tema, nesta semana o grupo abordou os principais

deuses do hinduísmo, festejados no decorrer do Diwali. Assim, sentada no centro do

grupo, a educadora mostrou algumas imagens dos deuses Krishna, Ganesha, Hanuman,

Shiva e Rama, em formato A4.

As imagens passaram por todas as crianças, que as observaram atentamente.

Posteriormente, gerou-se um diálogo, sendo que a educadora lançou algumas questões

que serviram de ponto de partida, tais como: quais as características mais evidentes de

cada um dos deuses? O que teriam em comum? A partir destas, as crianças expuseram as

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

______________________________________________________________________

186

suas opiniões/conceções, tendo como base as imagens que se mantinham ao centro do

grupo, para que todos as pudessem observar.

Nota: No dia seguinte os pais do T., enviaram uma estatueta da deusa Ganesha, que a

criança identificou corretamente em casa. A partir desta, gerou-se um diálogo em que as

crianças estiveram a comparar semelhanças/diferenças entre a imagem mostrada no dia

anterior e a estátua trazida pelo T.

Sessão f) No decorrer das sessões anteriores, a educadora sugeriu ao grupo, a elaboração

de puzzles, a partir das imagens dos deuses, utilizadas anteriormente. Assim, cada criança

escolheu a imagem pretendida, imagem essa que foi posteriormente marcada/dividida em

peças. Posteriormente, em pequeno grupo as crianças recortaram e montaram -

autonomamente e com base na imagem inicial - o puzzle que correspondia ao deus hindu

escolhido.

Sessão g) Esta atividade foi proposta às crianças na área do tapete, onde o grupo estava

reunido. O seu objetivo recaiu na consciencialização para a diversidade cultural.

A educadora sugeriu realizarem uma experiência e apresentou duas maçãs:

uma vermelha e uma amarela, o que suscitou a curiosidade de várias crianças. A

educadora explicou que iria comparar ambas, concluindo quais as semelhanças e

diferenças, caso existissem.

Assim, abriu as maçãs ao meio, colocando cada uma delas num pequeno praro raso

de plástico. Os pratos foram colocados no centro do grupo, para que todos os pudessem

observar atentamente. Pediu às crianças que dessem as suas opiniões acerca do que lhes

parecia igual e/ou diferente em cada uma das maçãs. Posteriormente, pegou em ambas as

maçãs e partiu-as em porções iguais e distribuiu um pedaço por cada criança, primeiro da

maça vermelha e depois como a maçã amarela. Todos provaram as maçãs e deram as suas

opiniões acerca do tema. Inicialmente foram focadas as semelhanças e posteriormente as

diferenças, que foram registadas no quadro 18:

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

______________________________________________________________________

187

Quadro 18 - Registo das conclusões: Experiência das maçãs

O grupo concluiu que as maçãs teriam várias semelhanças e registaram crianças

duas diferenças, a nível de cor e sabor, recapitulando que temos mais semelhanças que

diferenças.

Foi elaborado um registo como o protocolo, as fotografias e as conclusões da

experiência, que foi posteriormente exposto no exterior da sala e enviado para os pais,

nas cadernetas do aluno.

Semana 3

Sessão h) Esta semana foram novamente focadas as características do Diwali,

nomeadamente a Arte‘Rangoli’.esta é bastante utilizada no decorrer do festival e

constituída por padrões variados, desenhados no chão das casas na Índia (entradas, salas,

etc.) e coloridos com arroz/areia colorida ou pétalas de rosa. Assim, a educadora sugeriu

que cada criança criasse a sua própria versão deste tipo de arte típica.

Algumas crianças expressaram que não queriam desenhar, que preferiam apenas

colorir os espaços. Então, em grupo, as crianças decidiram que a educadora ia pesquisar

as imagens e depois cada um podia escolher a sua preferida, para realizar a atividade. A

educadora sugeriu então colorirem as imagens com materiais de expressão plástica (lápis

de cor, marcadores), mas também recorrendo a sal colorido, o que suscitou muito

interesse.

Semelhanças Diferenças

- Tem a mesma forma,

são redondas;

- São frutas;

- Tem casca à volta;

- Por dentro tem a

mesma cor;

- Tem sementes;

- Comem-se;

- São duras;

- Vem das macieiras;

- A cor da casca

(vermelho e amarela);

- O sabor (uma é mais

doce e outra é mais

ácida);

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

______________________________________________________________________

188

No dia seguinte, numa 1ª fase da atividade, a educadora apresentou vários padrões de

Arte‘Rangoli’ e trouxe também para a sala uma ‘Bimby’, sal e giz. A educadora colocou

uma porção de sal dentro da máquina, enquanto as crianças acrescentavam o giz partido

aos pedaços, que eram depois pulverizados, ficando semelhantes a areia colorida. O

processo foi repetido várias vezes, até originar várias cores.

Na 2ªfase as crianças pintaram uma parte do desenho escolhido e posteriormente

recorreram ao apoio da equipa de sala para colocar cola branca nas partes da folha que

estas referiam. Depois, cada criança aplicou sal das cores escolhidas em cima da cola,

compondo a sua produção.

Trabalho de projeto *

Sessão i)* Dando continuidade aos pedidos do grupo ao longo do trabalho com a história,

a educadora resumiu os interesses, no quadro 19.

Quadro 19 - Trabalho de projeto E

Nesta 1ª fase do trabalho de projeto, o grupo reuniu-se e esteve a enunciar as

palavras indianas que conheciam, pedindo ajuda à educadora, para ler mais palavras na

história “Lili e o jardim da Índia”. Assim, nomearam: Diwali, Kandil, Rangoli, Sari,

Krishna, Ganesha, Hanuman, Hindi, Namastê e Taj Mahal. Quando nomeava a palavra,

Trabalho de

projeto

O que sabemos? O que

queremos

saber?

Onde vamos

pesquisar?

O que

queremos

fazer? Aprender

características da

cultura indiana

-Conhecemos

algumas palavras

usadas na Índia;

- Não são iguais às

palavras de Portugal;

- Na Índia, as pessoas

falam a língua hindi;

- Lá, vestem-se de

outra maneira, com

muitas cores e roupas

compridas;

- A minha avó nasceu

em Goa, que é na

Índia. Ela sabe fazer

comidas de lá e tem

roupas de lá também;

- O que querem

dizer as palavras

que aprendemos

na sala;

- Provar a

comida da avó

da M;

- Ver roupas de

verdade da

Índia;

- Perguntamos à

avó da M, e se

calhar à mãe e ao

pai dela;

- Vemos na história

da “Lili”;

- Procura-se no

computador;

- Perguntamos aos

pais e às mães;

- Pedimos à M, para

pedir roupas à avó

dela;

- Fazer comida

da Índia;

- Escrever as

palavras que

sabemos;

- Ver as roupas

de lá;

- Vestir as

roupas, se a avó

da M. deixar;

Capítulo 6 - Plano e Desenvolvimento da Ação Pedagógica

______________________________________________________________________

189

a criança deveria ir até ao quadro de ardósia, e registá-la, com a ajuda da educadora que

nomeava as letras que a compunham. Numa 2ª fase surgiu um diálogo em que as crianças,

juntamente com a educadora, estiveram a dizer o que significava cada uma palavra.

A educadora registou as conclusões e partilhou-as com os pais, via correio

electrónico.

Sessão j)* A educadora convidou a mãe e avó da M. a vir até à sala, cozinhar uma receita

da Índia com o grupo. Devido a acontecimentos externos, a família não pôde deslocar-se

à escola, no entanto a mãe recolheu uma receita, junto da avó, que enviou à educadora.

Enviou também um Sari para o grupo observar.

Assim, a educadora propôs ao grupo realizarem a receita de “Chapati”, um pão

indiano. Questionou também as crianças, no sentido de saber o seu interesse numa

atividade temática que chamou de “Dia da Índia”, em que os pais e as crianças deveriam

realizar uma pesquisa de imagens e elaborar uma roupa semelhante, para que no dia

escolhido, todos pudessem vir vestidos de indianos. Todos ficaram bastante

entusiasmados, pelo que o dia foi marcado e o pedido enviado para os pais na caderneta

no aluno e por via eletrónica.

No dia escolhido todas as crianças, assim como a equipa de sala integraram o

grupo, vestidas/pintadas de acordo com o que estas e os pais tinham escolhido. Neste dia,

foi também confecionada a receita de “Chapati”, na qual as crianças juntaram os

ingredientes e amassaram a massa em pequenos pedaços. Quando terminaram, a

educadora dirigiu-se à cozinha, onde estendeu a massa e a assou na frigideira quente. Na

hora do lanche, as crianças comeram o pão quente com manteiga, tal como recomendado

pela avó da M.

O “Chapati” que restou foi deixado na sala e partilhado com os pais ao final do

dia, quando vinham buscar os seus educandos.

Capítulo 7 - Análise e Interpretação de Dados

_____________________________________________________________________________

190

CAPÍTULO 7

ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE DADOS

Após se terem realizado os registos das observações/interações (Anexo 6 - Notas de

campo), procedeu-se à interpretação dos dados recolhidos. Neste capítulo serão apresentados

os resultados de análise dos dados recolhidos, através das observações realizadas entre

setembro de 2016 e maio de 2017. Pretende-se realizar a análise, através do cruzamento

de dados, tendo em conta o desenvolvimento da intervenção pedagógica, das notas de

campo recolhidas e dos objetivos da investigação.

Existiram cinco momentos fundamentais na recolha de dados, cada um deles

associado a um bloco de intervenção do projeto. Os blocos iniciaram-se em outubro de

2016 e foram-se sucedendo ao longo do ano letivo, de acordo com uma sequência pré-

determinada. Na análise pretendem-se evidenciar as mudanças ocorridas ao longo do

tempo, nomeadamente as aprendizagens e experiências interculturais evidentes no

comportamento das crianças, durante e após o trabalho pedagógico com as histórias

infantis. O plano de atividades proposto neste estudo representa uma forma de abordagem

para promover o desenvolvimento de competência intercultural de forma gradual e

contínua.

Tendo presente que esta investigação visa compreender de que forma a literatura

infantil age como estratégia educativa no desenvolvimento da interculturalidade,

retomam-se os objetivos do estudo: (i) compreender as experiências interculturais de

exploração de literatura infantil, nas relações sociais das crianças com pares e adultos e

na sua perceção do mundo envolvente; (ii) compreender quais as aprendizagens

interculturais patentes no comportamento das crianças e fomentar o desenvolvimento de

competência intercultural.

As notas de campo originais (Anexo 6 – Notas de campo) estão numeradas (de NC.1 a NC.40,

sempre que é iniciada uma nova entrada, no início do parágrafo do lado esquerdo). As

referências integradas na análise serão identificadas no final de cada excerto.

Capítulo 7 - Análise e Interpretação de Dados

_____________________________________________________________________________

191

1. Compreender as experiências interculturais de exploração de literatura

infantil, patentes nas relações sociais das crianças com pares e adultos e na

sua perceção do mundo envolvente.

As experiências interculturais fomentadas agiram como estratégia educativa

(Oliveira e Sequeira, 2012) e agiram como um elemento potenciador de aprendizagens,

que culminasse em crescimento e desenvolvimento das crianças a vários níveis. A partir

da exploração da literatura infantil e das dinâmicas surgidas ao longo do projeto, foram

vivenciados momentos que permitem concluir que as crianças atravessaram um processo

gradual de enriquecimento cultural, social, relacional e pessoal, percetível através dos

seus comportamentos e sobretudo das suas atitudes, manifestados gradualmente durante

o desenvolvimento da ação pedagógica. As estratégias pedagógicas evidenciadas no

desenvolvimento da interculturalidade tiveram as histórias como pano de fundo, o que

amplificou dinâmicas como o diálogo acerca do conteúdo das narrativas, assim como as

atividades derivantes deste.

Este objetivo articulou-se em diferentes experiências decorrentes do processo,

nomeadamente:

(i) o envolvimento crescente da participação das crianças na construção e

desenvolvimento do projeto;

Existiram várias dinâmicas ao longo do processo, no entanto uma das mais

importantes - e talvez a mais relevante - recaiu nos processos participativos. Segundo

Carvalho (2015) reconhecer a criança como ator social implica a promoção da ampliação

dos seus direitos sociais de participação na sociedade e na educação de infância. Ou seja,

o processo educativo deve incidir em “escutar suas vozes e incluir suas formas próprias

de pensar e agir (…)” (Ibidem, p.125), criando espaços de abertura que potenciaram a

participação e as escolhas nos diálogos de grupo e nas propostas a serem realizadas, “pois

se a criança elabora teorias e perguntas e é coprotagonista da construção dos

conhecimentos, a ação educativa não é de transmitir mas a de escutar” (Malavasi e

Zoccatelli, 2013:8), tornando-se função da educadora propiciar estes momentos e

legitimar as curiosidades evidenciadas pelas crianças.

Sendo finalidade do projeto proporcionar experiências de aprendizagem

pedagógicas e ricas no domínio intercultural, foi importante considerar as crianças como

competentes e “capazes de participar com suas diferentes linguagens na tomada de

decisões sobre temas que lhe dizem respeito” (Carvalho, 2015:130). Assim, em várias

Capítulo 7 - Análise e Interpretação de Dados

_____________________________________________________________________________

192

ocasiões, o grupo de crianças envolveu-se em trocas de ideias, na planificação das

atividades e nas pesquisas realizadas, tendo em conta os seus interesses e implicando-as

ativamente nas experiências, para que as aprendizagens se tornassem realmente

significativas e promovessem o trabalho cooperativo, o respeito mútuo e a aceitação do

ponto de vista do Outro. A tomada de decisões participada foi percetível após a

exploração da história I com a falante nativa de russo (elemento integrante da comunidade

educativa), em que um menino expressou a sua sugestão: “podíamos escrever numa folha

nabo, que é repka. Podemos Ariana?” (NC.4), concretizada no trabalho de projeto A.

Também na escolha das atividades aquando da exploração da arte italiana, onde sugeriram

“eu quero, gosto de pintar e é importante aprendermos coisas de outros países. Podemos

votar no quadro” (NC.11). De igual modo, na descoberta da tribo Luo, após a exploração

da história III , as crianças propuseram pesquisar na internet, questionando “podemos ver

fotografias de verdade deles no computador?” (NC.15), com o intuito de descobrirem

mais factos sobre este povo, assim como propuseram divulgar os instrumentos musicais

enviados pelos pais em grande grupo, perguntando “quando podemos mostrar aos amigos

e explicar o que é?” (NC.19), bem como sugerindo ainda ideias para as atividades a

desenvolver no bloco de intervenção C, tendo uma criança referido que “gostava de fazer

canções, músicas e danças para os outros” (NC.25). Existiram crianças que tomaram a

iniciativa de forma recorrente, para propor e/ou escolher uma atividade ou pesquisa

relacionada com o tema a explorar, pretendendo dar a sua opinião em contexto de grupo

e tendo capacidade para fundamentarem o seu ponto de vista.

Assim é possível apurar que existiram espaços de participação evidentes em que

o grupo esteve implicado ativamente, pois teve uma participação na

planificação/implementação de diversas atividades, nomeadamente no âmbito dos vários

trabalhos de projeto, oriundos dos interesses demonstrados pelas crianças ao longo do

plano de intervenção. A metodologia de trabalho de projeto focou-se numa perspetiva de

aprendizagem colaborativa (Cortesão e Stoer, 1996; Oliveira-Formosinho et al, 2011;

Malavasi e Zoccatelli, 2013) e valorizou os interesses das crianças, que sob a mediação

da educadora escolheram, planificaram, colocaram questões e pesquisaram (Vasconcelos

et al, 2012). Através das experiências vivenciadas através deste método educativo, as

crianças evidenciaram mobilizar outras experiências resultantes do processo, tal como a

participação das famílias, evidente no trabalho de projeto B, onde se afirmou “podíamos

pedir ajuda aos nossos pais também” (NC.18), estando a criança a referir-se aos materiais

Capítulo 7 - Análise e Interpretação de Dados

_____________________________________________________________________________

193

a recolher para a concretização das atividades planificadas, na exploração das tradições

musicais africanas.

As crianças demonstraram vontade de divulgar o seu trabalho e os conhecimentos

adquiridos ao longo do desenvolvimento das atividades e das interações resultantes

destas, aos colegas da instituição, especialmente no trabalho de projeto C que se movia à

volta do preconceito do racismo e da discriminação. Neste projeto refletiram em torno da

questão “Como podemos combater o racismo?”, tentando encontrar estratégias para

resolver este conflito cultural e as dicotomias de poder entre as crianças brancas, nativas

do espaço (Morgado e Pires, 2010) e o Mateus, elemento recém-chegado que se tentava

enquadrar. Este foi o tema que mobilizou mais ‘ferramentas’ emocionais e empáticas no

grupo. As crianças afirmaram “pois, porque ele não sabem como nós, não leram a história

e depois não sabem que isso [racismo] não se faz e nós vamos explicar a eles” (NC.25)

e também “mas vamos ensaiar e depois mostrar aos outros meninos da escola, não é?

Nós sabemos muitas coisas da história do Mateus. Interroguei: Sabem o quê? A M.J.

afirmou: Muitas coisas do racismo e dos meninos que são adotados e são filhos do

coração. A L.C. disse: aprendemos que temos que ser amigos de todos os meninos, não

faz mal ser diferente, isso é bonito” (NC.26). Afirmações como esta denotam a integração

de conhecimentos, atitudes e competências ligados à interculturalidade, comprovando o

papel da pedagogia de projeto na criação de uma cultura escolar que fomenta o papel da

criança como um ser capaz, pensante, que carece de compreender o mundo que a rodeia

e nele participar, que vê a criança como “alguém aberto ao novo e ao diferente” (Barbosa

e Horn, 2008:87). Os projetos contaram com a mobilização da maior parte do grupo,

embora existissem crianças que não participavam tão ativamente, quer na escolha das

atividades, quer no desenvolvimento destas. Tal poderá estar relacionado com a sua

personalidade ou com o grau de interesse em alguns temas trabalhados.

As interações entre pares foram um dos fatores potenciadores do desenvolvimento

do grupo, funcionando como um catalisador da construção coletiva. Existiram vários

espaços de diálogo e reflexão entre crianças e adulto-criança. O processo de mudança no

grupo foi sentido ao longo do projeto, tornando-se mais evidente em momentos de

interação, quer em pequeno, quer em grande grupo, o que fica patente em: “acho que se

formos diferentes é mais giro que sermos iguais aos outros…” (NC.2);

“Eugénia, lá na Rússia há pessoas de várias cores? Com cores da pele, com cores todas

diferentes?” (NC.4);

Capítulo 7 - Análise e Interpretação de Dados

_____________________________________________________________________________

194

“Na história das tribos, há muitas coisas diferentes de Portugal... esses meninos são

diferentes de nós.” (NC.15);

“A minha história também fala das tradições das tribos, fala dos colares (…)” (NC.20);

“Acho que é isso, não querer ser amigo de alguém diferente e isso está mal, temos que

ser amigos de todos. (NC.22);

“Aprendemos coisas com os outros e isso é importante para todos, não é?” (NC.31).

Momentos como estes são fundamentais, quando se procura educar para a cidadania

intercultural (Cardoso, 1998; Byram, 2008). Ao incluir experiências deste âmbito no

currículo pré-escolar, as crianças:

“begin to see how their attitudes, knowledge, and language skills can affect their intercultural

experiences. As a result, students will gain an understanding of how to enter into intercultural

situations with an open mind (…)” (Moeller e Nugent, 2014:14).

Nas experiências descritas ficou evidente que é na educação pré-escolar que a

criança vivencia dinâmicas relacionais e aprendizagens com sentido, que interioriza e

transporta para outras situações que experiencie, o que a prepara para o exercício da

cidadania. No contexto da sala, as crianças exercem o “direito de participar, [e] em que a

diferença de género, social, física, cognitiva, religiosa e étnica é aceite numa perspetiva

de equidade” (Silva et al, 2016:39). Indo ao encontro do que está preconizado nos

objetivos definidos para o pré-escolar na Lei-Quadro (Lei n.º 5/97, de 10 de fevereiro) e

nas OCEPE (2016), a organização do grupo e as dinâmicas de interação entre adultos e

crianças, funcionaram como estímulo para as crianças participarem, para se expressarem,

tomando decisões e consciencializando-se de outros pontos de vista e da diversidade.

(ii) A participação das famílias e a mediação das crianças na relação escola-

família;

Ainda no âmbito da participação, o balanço do projeto de intervenção e a análise

das notas de campo, permitem destacar o papel dos adultos no processo. As famílias,

nomeadamente os pais e alguns avós, atuaram como entidades de apoio aos interesses das

crianças, servindo de coorientadores e consequentemente de facilitadores do

desenvolvimento de competência intercultural. Deste modo, as dinâmicas de participação

familiar tiveram também um papel fundamental nas experiências interculturais

vivenciadas. Silva et al (2016: 10) defendem esta ideia, advogando que “para a construção

de um ambiente inclusivo e valorizador da diversidade, é também fundamental que (…)

pais/famílias sejam considerados como parceiros (…).”

Capítulo 7 - Análise e Interpretação de Dados

_____________________________________________________________________________

195

Existiram diversos momentos em que as famílias concretizaram intervenções,

quer em contexto de sala, quer em contexto familiar. Uma das dinâmicas criadas foi o

projeto desenvolvido em parceria com os pais, para a elaboração de um livro de receitas

do mundo, composto por receitas enviadas pelas famílias que pretendessem participar.

Mas o projeto que mais impactou o grupo foi denominado de “Conta-me um

conto com…”, um projeto que surgia em paralelo com a exploração dos diferentes

continentes e as histórias escolhidas. Assim, enquanto o continente era explorado em sala

(através da história), o projeto desenvolvia-se nesse mesmo continente, mas em contexto

familiar, sendo a escolha do país a retratar da exclusiva responsabilidade dos

pais/crianças. Cada continente era acompanhado de uma figura em feltro, que retratava

uma cultura presente neste (ex. América do Sul - Isabela, a baiana; Europa - Oleg, o russo,

etc.). Esta figura acompanhava as crianças durante uma semana, agindo como uma ponte

entre o trabalho de sala e o trabalho desenvolvido com os pais.

Este projeto motivou os interesses das crianças, muito provavelmente devido à

participação ativa que muitas delas tiveram no meio familiar. Nas sessões em contexto de

sala, algumas das crianças explicavam os factos da história e o processo de elaboração

desta com as famílias de forma entusiasta, explicando: “a minha mãe fez esse trabalho

durante muito tempo, explicou-me muitas coisas sobre Angola. E eu também expliquei

várias coisas das tribos africanas a ela, contei-lhe muitas coisas e tradições. Até apontei

onde ficava no globo, eu já sei Ariana” (NC.34). Esta implicação direta conduziu ao

desencadear da motivação das crianças nas descobertas acerca das culturas retratadas nas

suas histórias.

A interação e os processos dialógicos das crianças com os adultos de referência,

nomeadamente com a equipa de sala e as famílias, contribuíram para alargar as trocas de

informação das crianças a outros contextos, o que lhes que permitiu aumentar os seus

conhecimentos a outros contextos e criar uma maior proximidade/interação entre escola

e família (Silva et al, 2016). Neste âmbito, é importante salientar o trabalho efetuado a

dois níveis: as crianças como mediadoras da relação escola-família (Silva et al, 2016),

dimensão em que as crianças facilitaram a aproximação e colaboração entre a escola e a

família, promovendo e/ou solicitando a participação familiar no contexto educativo, como

se pode ver no seguinte exemplo: “a C. gostava que a mãe dela viesse cá e ela podia

ensinar-nos coisas, como a Eugénia” (NC.6), nota de campo que explicita a vontade de

uma criança em partilhar a cultura da sua mãe com os pares, o que culminou na visita da

mãe - de origem romena - à sala, no bloco de intervenção A. Ainda neste bloco uma das

Capítulo 7 - Análise e Interpretação de Dados

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196

crianças reconheceu em sua casa, “os ovos da Roménia mãe, os pintados, temos que levar

para a Ariana e os amigos verem” (NC.7), pedindo para os divulgar ao grupo. Esta

relação escola-família torna-se evidente também na atitude entusiasta com que as crianças

acolheram a pesquisa para o trabalho de projeto B, acerca dos instrumentos musicais

presentes na canção Funga Alafia: “ (…) diz que tem que falar com a Ariana e com os

colegas para decidirem o que vão fazer sobre as maracas.” / “Vão fazer maracas e a

Ariana mandou pesquisar e temos que pesquisar (…) A Mãe do F. interpelou e disse:

Olha o meu não me conta nada, mas ontem só falava da música e das maracas e das

fotografias.” (NC.17). Fica igualmente clara na solicitação da ajuda dos pais na recolha

de objetos referentes a diferentes países, tal como explicitado nos blocos B e E,

respetivamente: (…) farta-se de contar coisas e de perguntar se temos alguma coisa do

país que estiverem a trabalhar para trazer?” (NC.17);

”Eu pedi aos meus pais e tenho uma coisa para mostrar aos amigos, eu trouxe uma

estátua da Ganesha que estava na minha casa (…)” (NC.36).

Estas trocas de informações/opiniões, só foram possíveis devido ao papel que as crianças

assumiram como mediadoras do processo escola-família, que facilitou bastante a

aproximação entre os pais e a educadora. Foram vários os momentos em que os pais

transmitiram as conversas mantidas com as crianças, maioritariamente tendo como base

as histórias. Os objetos enviados pelos pais foram mais uma forma de participação na

vida escolar e reportavam-se a diferentes comunidades, promovendo o contato ativo das

crianças com outras culturas (Ellis e Brewster, 2014). É importante referir que estes

comportamentos das crianças promoveram ainda a continuidade das aprendizagens

escolares no contexto familiar (McDermott, 2008), dando um papel de maior destaque

aos pais, na sua vida escolar.

Salientam-se ainda as opiniões expressas pelas famílias no decorrer do

desenvolvimento do projeto. Potenciar as relações entre a família e a escola, fomenta

uma “escola intercultural” (Silva, 2003), pois ambos os agentes são considerados partes

igualitárias do processo de ensino-aprendizagem, tendo os dois uma influência basilar na

vida escolar das crianças. Também Silva et al (2016: 28) afirmam que “os pais/famílias

e o estabelecimento de educação pré-escolar são dois contextos sociais que contribuem

para a educação da mesma criança; importa, por isso, que haja uma relação entre estes

dois sistemas.” Como exemplos destas dinâmicas relacionais, salientam-se alguns

momentos. Em relação ao bloco de intervenção A, aquando do trabalho de projeto acerca

dos instrumentos musicais utilizados no continente africano, uma mãe referiu: “o meu

Capítulo 7 - Análise e Interpretação de Dados

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197

filho não se cala com a viagem à volta do mundo, diz que vai viajar para a Europa e para

Índia. (…) Sabes, nós temos que aprender coisas sobre outros países, a Ariana diz que

temos que saber como são as outras pessoas e conhecer os seus países” (NC.10), ou na

opinião da mãe romena, que visitou a sala, acerca dos trabalhos elaborados no âmbito da

exploração da Roménia, desenvolvido no bloco de intervenção A. A Alexandra afirmou

“(…) agradecer o trabalho que está a fazer com a C. (…) este toca o meu coração.

Quando vi o seu placar sobre a Roménia, até fiquei com lágrimas nos olhos. Com o

castelo e os ovos pintados, todos os pais a verem e a comentarem...Nunca tinha visto

ninguém daqui dar interesse ao meu país e ver que está a trabalhar isto com os meninos

deixa-me tão feliz. (…) Sabe ela só faz isso aqui, consigo, tem muito interesse na Roménia

agora que a Ariana puxa por eles nesse sentido. Em casa ela não quer aprender nada,

nem quer saber nada, não quer falar, diz sempre que está cansada. Ver e ouvir a minha

filha a falar do meu país com tanto entusiasmo, perguntar-me sobre o meu país, como se

dizerem certas palavras querer trazer coisas lá de casa, é mesmo por causa da escola e

da Ariana. E por isso agradeço” (NC.14).

Tendo como base o trabalho pedagógico realizado a partir das narrativas, as

crianças evidenciaram comportamentos de entusiasmo e motivação, o que foi reportado

pelos pais, tal como: “eu vejo a M.C. motivada, desejosa de vir para a escola e conta-me

imensas coisas que aprende. Vê-se que aprende mesmo factos sobre as culturas”

(NC.40). Este trabalho foi promovendo diálogos constantes em contexto familiar, onde

as crianças reportavam as temáticas apreendidas nas histórias: “agora é só falar da África

e dos colares e da tradição. (…) Sim, explicou-me a mim e ao pai ao jantar, é uma coisa

que se transmite de umas pessoas para outras” (NC.17).

Desta forma se subentende a importância da criação de culturas de participação

que promovam o envolvimento familiar no ambiente escolar, assim como a importância

dos processos interculturais no desenvolvimento de crianças em idade pré-escolar.

Deve ser referido que a participação nos projetos era aberta e não impositiva,

sendo a participação facultativa a quem estivesse interessado em contribuir. A adesão foi

bastante positiva, tendo mobilizando a grande maioria das famílias nos projetos. Das 24

famílias, 22 aderiram ao projeto “Conta-me um conto com…” e 18 contribuíram com

receitas para a elaboração do livro de receitas do mundo. Existiram também diversas

famílias que contribuíram na recolha de materiais para as atividades, nos trabalhos

enviados para casa e também no envio de materiais relacionados com as culturas

exploradas.

Capítulo 7 - Análise e Interpretação de Dados

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198

Também no diálogo acerca do trabalho desenvolvido nos blocos de intervenção C

e D, com foco na temática do racismo e migração, Carine, a mãe brasileira que veio contar

uma história à sala, salientou que “ lá no Brasil eu era professora da 1ª série e sei quão

importante é promover hábitos de leitura e empatia nessas crianças. Nossa, eu via todos

os dias. Eu digo para você, gostei da sua iniciativa, a L. me conta tudo do que faz aqui

com vocês e eu acho que ela está entendendo bem o vosso projeto da interculturalidade.

Ela me diz coisas que eu fico super admirada, como no outro dia no jantar, ela me disse:

Mamãe, hoje eu aprendi que há pessoas que não gostam de quem é diferente só porque

é de outra cor, isso é muito feio, não é? E noutro dia ela me falou que existem pessoas

que fogem do seu país porque há guerra e vem se abrigar em Portugal. Achei uma delícia

minha filha de 5 anos me dizendo isso” (NC.30). Noutra conversa surgida durante o

trabalho desenvolvido no bloco de intervenção E, que focava a temática da religião, uma

das mães salientava que “só sei que ele me disse que esta é uma deusa indiana, que é a

Ganesha, é muito importante, olhe fiquei de boca aberta. Um miúdo de 4 anos a dizer-

me isto. Então não se calou até guardar a estátua na mala para hoje trazer” (NC.36).

Deste modo, “pensar a escola como comunidade educativa, que inclui em seus projetos a

participação da família (…) significa ampliar as fronteiras sociais” (Barbosa e Horn,

2008:89).

(iii) a integração de conteúdos curriculares a partir da exploração das

histórias, numa perspetiva holística;

De salientar que o projeto de intervenção se pautou pela integração de conteúdos

que articulassem o currículo pré-escolar, encadeando todas as áreas de conteúdo, o que

pressupõe a aprendizagem numa perspetiva holística, “dado que a construção do saber se

processa de forma integrada e há inter-relações entre os diferentes conteúdos” (Silva et

al, 2016:31), com os fundamentos educativos descritos nas OCEPE, que se correlacionam

com as conceções da educação intercultural, expressas através das áreas e temas sociais

explorados ao longo da intervenção pedagógica e manifestados nas aprendizagens

realizadas nas diferentes dimensões dos modelos de competência intercultural de Byram

(1997) e de Deardorff (2006).

As crianças já possuíam conhecimentos relativos ao meio social e cultural,

adquiridos nos seus contextos familiares e nas vivências realizadas no jardim de infância

(Silva et al, 2016). As histórias emergiram como catalisadores que fomentaram uma

consciencialização gradual das crianças acerca do seu papel social e das dimensões

culturais do mundo envolvente, que remetiam para uma visão mais ampla da

Capítulo 7 - Análise e Interpretação de Dados

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199

multiculturalidade, permitindo-lhes “a compreensão gradual da sua situação no espaço e

no tempo sociais” (Ibidem, p.88).

Deste modo, os processos colaborativos, assim como as narrativas, foram o

veículo para a integração curricular, emergindo como uma dinâmica alargada, através do

envolvimento das crianças no processo de descoberta do Outro, na exploração dos

conhecimentos acerca do meio envolvente e na reflexão acerca da diversidade e da

necessidade de equilíbrio das dicotomias, sendo que:

o desenvolvimento contextualizado e articulado destes saberes permitirá à criança conhecer

as características da sua e de outras comunidades, os seus hábitos, costumes, tradições e

elementos do património cultural e paisagístico, facilitando o desenvolvimento de atitudes de

respeito e compreensão face à diversidade (Silva et al, 2016:89).

Deste modo, as crianças realizaram aprendizagens significativas, sendo capazes

de as aplicarem em contexto, mobilizando os conhecimentos nas diferentes áreas de

conteúdo de forma integrada.

2. Compreender as aprendizagens interculturais patentes no comportamento das

crianças e fomentar o desenvolvimento da competência intercultural.

No contexto da educação de infância, a aprendizagem acontece nas vivências

diárias e é a partir das interações realizadas, que as crianças vão desenvolvendo

gradualmente as competências nas várias áreas.

O desenvolvimento de “competências para comunicar com o Outro” (Bastos,

2014:7), tem vindo a alcançar uma importância acrescida, no contexto educativo. Deste

modo, o sentido deste projeto prendeu-se com a premissa da compreensão do Outro

(Unesco, 2006; Carneiro 2009), o que apenas é possível através do envolvimento das

crianças num processo de aprendizagens e experiências interculturais (Byram, 1997;

Deardorff, 2006). É essencial ter em conta que cada criança tem uma bagagem social e

emocional distinta, assim como diferentes visões do mundo envolvente.

Os modelos de competência intercultural de Byram (1997) e Deardorff (2006)

privilegiam as atitudes como dimensão primordial a trabalhar, de forma a desenvolver a

autoconsciência e transformação gradual dessas atitudes como elementos essenciais, “a

vital first step” (Moeller e Nugent, 2014:3) no processo de desenvolvimento de

competência intercultural. Ambos os modelos defendem que, nesta dimensão, os

Capítulo 7 - Análise e Interpretação de Dados

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200

indivíduos devem manifestar comportamentos que traduzam atitudes de respeito,

abertura, curiosidade e interesse em relação ao Outro. Também Ramos (2011, 2013)

defende que estas atitudes são preponderantes no domínio da interculturalidade.

Ao longo do projeto de intervenção, várias crianças evidenciaram estar a integrar

aprendizagens nesta dimensão, manifestadas através da compreensão das outras culturas,

por meio da observação de elementos visuais presentes nas ilustrações dos livros.

Manifestaram também atitudes de curiosidade e interesse pelas culturas, costumes e

tradições do outro, o que foi observável nas atividades desenvolvidas nos vários blocos

de intervenção do projeto. Numa fase inicial - bloco de intervenção A - em que as crianças

deveriam decidir qual o próximo país a explorar, afirmou-se a importância de conhecer o

Outro, numa perspetiva de abertura a outras culturas: “pois, e mais coisas de lá, [da

Roménia] como é a bandeira, a comida deles… Eu gostava de saber mais coisas de outros

sítios.”/ “ (…) se calhar devíamos saber mais coisas dos países todos, para ver se são

parecidos com Rússia ou Portugal” / “Eu posso perguntar coisas à minha mãe e vou

pedir a ela coisas da Roménia para eu trazer” (NC.6);

“Eu quando for grande também quero ir conhecer outros países e ver as coisas que

andamos a aprender, vou saber muitas coisas e vou dizer às pessoas de lá o que aprendi

sobre eles. Vou dizer à minha avó para irmos a Goa, onde ela nasceu.” (NC.19).

Também no bloco de intervenção B, após a exploração da história “A surpresa de

Handa” e no bloco de intervenção D, durante a exploração do fenómeno migratório,

respetivamente, as crianças estabeleceram as mesmas prioridades, assumindo a

importância da aprendizagem intercultural, pois “aprender coisas novas é importante.

Coisas novas sobre os outros.”/ “Sim, eu gostava de saber coisas das tribos.” (NC.15);

“Aprendemos coisas com os outros e isso é importante para todos, não é?” (NC.31).

É importante referir que a diversidade de culturas de origem presentes no grupo

foi o ponto de partida do projeto de intervenção, pois tal como advoga Dolan (2014: 93-

94) “it is an important part of every child’s educational experience whether the child is in

a school characterised by ethnic diversity, (…) or whether the child is from the dominant

or minority culture.” Neste projeto, a riqueza cultural foi encarada com uma

necessidade/potencialidade para alargar os conhecimentos das crianças acerca do mundo

envolvente e fomentar a consciencialização, partilha e respeito pelo outro e pelas suas

especificidades. A diversidade existente levou as crianças - que sempre assumiram esta

diversidade como parte do grupo - a demonstrarem mais curiosidade e interesse em certas

culturas, o que foi mais evidente com a romena e a indiana. Em algumas ocasiões

Capítulo 7 - Análise e Interpretação de Dados

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201

questionaram as colegas acerca das culturas de origem dos pais/avós acerca de vários

aspetos relativos à diversidade cultural tais como a língua ou as tradições. Denotaram,

assim, interesse na descoberta de uma cultura diferente da sua: “a C.L disse

orgulhosamente: A minha mãe nasceu na Roménia. O T.S. questionou de imediato: Tu

sabes falar a língua de lá? A C. respondeu: Sim, a minha mãe ensinou-me romeno. O

T.S. respondeu: Eu também queria saber dizer coisas de lá.” (NC.3);

“Acho que tu sabes ‘bué’ coisas da Índia M. Podes explicar-nos as coisas também. A

M.J. sorriu orgulhosa.” (NC.34).

Ao longo do desenvolvimento do projeto, as crianças oriundas de outras culturas

evidenciaram uma mudança nos seus comportamentos, quer em contexto familiar, quer

em contexto de grupo, mostrando-se mais curiosas, motivadas e até por vezes mais

participativas em diversas questões que se relacionavam com as culturas familiares, como

se depreende das afirmações de uma menina, cuja avó nasceu em Goa: “a minha avó é

como eu, mas um bocadinho mais escura…(fica pensativa). Ela é de Portugal?

Questionou o R. Vou perguntar à minha mãe, mas acho que ela é de Goa, que é Índia,

respondeu a M.J.” (NC.2) / “A M.J. disse: Vou perguntar à minha avó se ela sabe fazer

desenhos desses...isso deve dar ‘bué’ trabalho. (NC.38). Também a C.B., uma menina

com mãe nascida em Moçambique, afirmou: “tenho que contar à minha mãe, ela nasceu

em Moçambique, mas acho que não sabe isso. Vou perguntar se ela tem algum colar

desses para eu trazer.” (NC.21).

À medida que o projeto se desenvolvia as crianças evidenciaram outras

aprendizagens, que se integram nas dimensões seguintes dos modelos de Byram (1997) e

Deardorff (2006), respetivamente - conhecimentos e compreensão - nomeadamente ao

nível da integração de conhecimentos acerca da cultura do outro e consciencialização da

sua própria identidade cultural, pois compreender a nossa própria cultura é uma ponte

para compreender a dos outros (Byram, 2008; Ramos, 2011, 2013). São exemplo disso as

conceções demonstradas pelas crianças no início do projeto de intervenção, tais como:

“sim, somos todos de Portugal”/ “Pois, porque eu nasci em Lisboa (…)”/ “Não somos

não, somos diferentes uns dos outros” /“O nosso país é Portugal e aqui falamos em

português, essa é que é a língua de cá.” /“A nossa bandeira tem 3 cores. É amarela e

depois verde e vermelha” (NC.1). Ou ainda na comparação de elementos gastronómicos

sua cultura com os da cultura romena, afirmando que “esta sopa parece-se com a de

Portugal (…)” (NC.9).

Capítulo 7 - Análise e Interpretação de Dados

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202

Ao iniciar as atividades do bloco de intervenção A, a consciencialização do grupo

à diversidade cultural foi notória, sendo que várias crianças salientaram a identificação

da diversidade, não como uma forma de diferenciação, mas como um reconhecimento de

semelhança: “as cores de pele são muitas”/ “Somos diferentes uns dos outros”/ “Por fora

temos cores diferentes, caras diferentes, corpos diferentes, mas depois somos como os

M&M’s, somos todos iguais lá dentro” (NC.1).

Nos diferentes blocos de intervenção, ao trocarem opiniões, as crianças

estabeleceram paralelismos entre outras culturas e a sua própria identidade cultural. No

bloco de intervenção B, após a leitura da história III, surgiu um diálogo em que se

salientou que “(…) as pessoas podem ser de outras cores, mas podem ter nascido no

nosso país. Mas como os pais delas também são assim, elas saíram a eles, como eu saio

à minha mãe, porque nós somos parecidas.”/ “Na história das tribos, há muitas coisas

diferentes de Portugal...esses meninos são diferentes de nós” (NC.15). No bloco de

intervenção e trabalho de projeto C, as crianças concluíram que “sim, ser diferente é

importante, não podem ser todos iguais, pois é?” (NC.26) e após ouvirem a canção do

Diwali em hindi, no bloco de intervenção E, uma menina afirmou: “vou contar à minha

avó, não sei se ela sabe essas coisas todas. Os indianos e os portugueses tem coisas

parecidas” (NC.34).

Foi através de inúmeros diálogos e processos reflexivos em grande grupo, que as

crianças começaram a evidenciar interesse em conhecer e interagir com o outro, assim

como em passar o conhecimento apreendido a outros, tal como está patente em:“se eu

conhecer um menino de outro sítio no parque da cidade, vou logo dizer-lhe as coisas que

gosto no país dele” (NC.10) e também em “podemos brincar e encaixar as matrioskas?

A minha avó tem lá em casa, vou dizer a ela que são da Rússia” (NC.3). deste modo,

tornou-se evidente uma consciencialização emergente da existência de outras identidades

sociais e culturais (Ramos, 2007; 2013; Santiago et al, 2013), que funcionou como agente

de desenvolvimento da “capacidade de analisar o mundo do ponto de vista de uma outra

cultura” (Ramos, 2013: 354).

Ainda nesta dimensão, de forma a salientar as conceções do grupo em relação à

diversidade linguística e às especificidades culturais, são ressaltadas algumas afirmações,

nomeadamente relativas à consciencialização acerca de outros reportórios linguísticos,

patentes em sessões correspondentes aos blocos de intervenção A e E, tal como se

evidencia em “a minha mãe nasceu na Roménia e também me ensinou romeno” (NC.3);

Capítulo 7 - Análise e Interpretação de Dados

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203

“A língua da Roménia é parecida com a da Rússia, pois é? A nossa língua não tem nada

a ver…” (NC.6);

“A minha avó nasceu em Goa e isso fica na Índia. Ela sabe falar essa língua, a da

canção. (…) Sim, é hindi, a avó Maria já me disse” (NC.34).

No decorrer do bloco de intervenção A, as crianças envolveram-se na sessão com

a falante nativa de russo, o que desencadeou o trabalho de projeto A. Ao refletirem em

grupo, houve quem compreendesse a importância da aprendizagem de diferentes línguas,

pois as crianças salientaram que: “estamos a escrever em português e depois a seguir em

russo (…) Tem que ser, senão as outras pessoas que não falam russo, não sabiam o que

diz aí.” (NC.5), compreendendo e mobilizando facilmente o vocabulário novo, adquirido

no decorrer das sessões b), c) e i) com as falantes nativas de russo e romeno, tal como é

evidente em “podíamos escrever numa folha nabo, que é repka. (…) (NC.4);

“Nabo é ‘repka’ e ‘ridiche’, é a mesma palavra, noutras línguas. Já aprendi as três”

(NC.8).

“Diziam rapidamente, isso é ‘cardof’, ‘morcov’, ‘ridiche’, ‘repka’…” (NC.9),

correspondendo os alimentos observados às palavras em romeno com relativa facilidade.

Também no bloco de intervenção E, após ouvirem a canção do Diwali e dialogarmos

acerca dela, as crianças identificaram que “na Índia fala-se a língua ´hindi´, é a língua

deles (NC.39);

“Eu gostei de aprender a despedir em indiano, é Namastê” (NC.34).

Aqui se salienta a perspetiva de Byram, Gribkova e Starkey (2002), que advogam que a

linguagem está intimamente relacionada com as identidades sociais, pois ao explorarmos

reportórios linguísticos, teremos inevitavelmente acesso a um leque de traços distintivos

que caracterizam determinado povo ou cultura.

Ainda no âmbito da consciencialização da diversidade cultural, no bloco de

intervenção E, o grupo identificou diferentes manifestações culturais religiosas. Houve

quem mencionasse o seu contexto pessoal, como por exemplo no diálogo em grupo: “vou

à missa com a minha mãe e ela diz que temos que rezar aos santinhos porque eles ouvem

lá no céu”/“Eu e a minha mãe rezamos todos os dias ao anjinho da guarda para tomar

conta de nós” (NC.35). Noutros casos referiram-se a outras entidades religiosas

exploradas no decorrer das tradições do Diwali,“ é uma deusa da Índia. As pessoas rezam

a ela.” / “Também é uma deusa e sei outro, é ´Hanuman´.” (NC.39).

Capítulo 7 - Análise e Interpretação de Dados

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204

A compreensão do mundo (Azevedo, 2006; Mesquita, 2007) e consciencialização

das características de outras culturas, assim como as suas tradições (Byram, 2008;

Oliveira e Sequeira, 2012; Ramos,2011;2013), promoveram aprendizagens interculturais,

que permitiram às crianças ampliar o seu reportório acerca do mundo que as rodeia e

consciencializarem-se das características específicas e dos saberes culturais de outros

povos, passados de geração em geração. De referir que embora inicialmente o conceito

de ‘tradição’ tenha sido difícil de compreender, foi no bloco de intervenção B - exploração

do continente africano - que começou a consolidar-se, o que ficou patente nas afirmações:

“olha já conhecemos essas, são de uma tribo africana que usa muitos colares. (…) Faz

parte da tradição delas há muito, muito tempo” (NC.20);

“É que a roupa da baiana é toda branca. Isso também é uma… (para para pensar), uma

tradição?” (NC.29).

No último bloco de intervenção, o grupo já identificava facilmente tradições, o

que fica notório em “a tua avó é da Índia não é? Ela também faz a festa do Diwali na

casa dela?” (NC.37);

“Fizemos uma ‘kandil´ que é uma lanterna para pendurar na porta das casas e ‘rangoli’

que são pinturas no chão. Fazem isso no Diwali” (NC.39).

Ramos (2011, 2013) defende que conhecer e compreender normas, valores e códigos

culturais, consciencializa para as especificidades de cada cultura, uma componente

incontornável para desenvolver competências no domínio intercultural.

Transversalmente a estas aprendizagens, as crianças evidenciaram skills

emergentes, componentes essenciais à dimensão referida e necessárias à mobilização do

conhecimento e compreensão do Outro, que levam o sujeito a saber ouvir, interpretar e

relacionar-se com o que é culturalmente diferenciado, essenciais ao desenvolvimento da

consciência intercultural, tal como preconizado nos modelos de Byram (1997) e

Deardorff (2006).

Neste âmbito, deve também destacar-se que o grupo iniciou o processo de

consciencialização acerca da importância de alguns temas sociais explorados. O

vínculo afetivo da adoção, assim como a conceção de racismo foram algumas das

aprendizagens mais patentes nos comportamentos das crianças. Interligadas na história

III, estas questões suscitaram dúvidas sendo que aos poucos, foram dando lugar a

afirmações mais convictas, tornando claro que o processo de aquisição dos conceitos

estava a efetivar-se. Atente-se nas afirmações seguintes: “porque são de adotivas,

Capítulo 7 - Análise e Interpretação de Dados

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205

famílias que ficaram com outros meninos que não podiam ficar com os pais deles”

(NC.24);

“Então racismo é não gostar do diferente de nós. É isso não é?” (NC.22);

”É feio, as pessoas podem ser diferentes e isso é bonito. Eu também sou de uma cor mais

escura do que os outros meninos da sala e toda a gente é minha amiga. Toda a gente

gosta de mim, pois é?” (NC.24).

Estes enunciados evidenciam a capacidade empática emergente de algumas crianças,

assim como a capacidade de compreensão do Outro, evidenciando um processo processo

de consciencialização gradativo do ponto de vista intercultural. A exploração da temática

social do racismo, assim como a identificação das atitudes discriminatórias derivantes

deste e evidentes na história (Magos, 2009; Morgado e Pires, 2010), foram o ‘motor’ para

o despertar da ligação afetiva com a personagem Mateus e com a narrativa em si.

A familiarização com o fenómeno migratório foi outro ponto fundamental do

projeto. Esta consciencialização é necessária “for all citizens, including our young

learners, to understand the complex issue of seeking refuge” (Dolan, 2014: 95) e está

intimamente relacionados com noções de justiça, igualdade, respeito mútuo e liberdade

(Ibidem). Este conceito foi explorado em estreita ligação com as estruturas familiares

multiculturais. O contato precoce do grupo com estas perspetivas globalizantes permitiu

o conhecimento de diferentes realidades e as aprendizagens foram evidentes através dos

diálogos realizados em diferentes momentos da rotina educativa, tais como: “acho que

são pessoas que fogem da guerra para outros países. A M.C. completou: E eles precisam

da ajuda de muita gente, porque não têm nada. O T.S. disse: Eles não estão seguros no

país deles e têm que ir para outro qualquer” (NC.28);

“Eu percebo, há muitas famílias diferentes, com muitas culturas ou só com um pai ou

uma mãe” (NC.24).

É notório, que no discorrer do projeto, algumas crianças evidenciaram um

processo emergente de consciencialização da multiculturalidade visível nas sociedades

globalizadas. Neste âmbito destacam ainda a consciencialização das tradições de outras

culturas como fator de identidade cultural, como as manifestações gastronómicas no

bloco de intervenção A (cultura russa, romena e italiana) e as manifestações artísticas ao

nível da música e da dança no bloco B (tribos africanas). Ao nível das aprendizagens

emergentes nos comportamentos do grupo, existiram algumas crianças que se

evidenciaram como impulsionadoras e mobilizadoras, quer ao nível dos projetos

trabalhados, quer ao nível dos diálogos em grande e/ou pequeno grupo.

Capítulo 7 - Análise e Interpretação de Dados

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206

Um aspeto importante a ressaltar, é defendido em ambos os modelos, e pauta-se

na familiarização com noções precoces de alteridade, em que elementos do grupo

demonstraram compreender a interação/interdependência do outro, uma das componentes

necessárias para o desenvolvimento de consciência intercultural (Byram, 1997;

Deardorff, 2006; Ramos, 2011,2013). Tal facto foi percetível através dos comentários

realizados em diálogos de grupo no bloco de intervenção C, aquando da exploração do

conceito de racismo. Neste, as crianças mobilizaram conhecimentos apreendidos na fase

anterior do projeto de intervenção, como está patente em “tu disseste na outra história da

Handa que quando uma coisa é diferente, ajuda-nos a conhecer coisas novas e

aprendemos com elas. Os meninos não sabiam isso?” (NC.22). Também no bloco D, ao

explorar a temática da migração se afirmou: “é uma mistura de culturas, pois é?” (NC.31)

e na experiência das maçãs, atividade que pretendia fomentar a compreensão da

diversidade cultural, implementada na sessão g) do bloco E, onde foi afirmado que

“somos todos diferentes, mas vivemos todos juntos e aprendemos juntos, pois é?”

(NC.37).

Neste âmbito, a aprendizagem intercultural emergente - e a mais evidente - foi a

capacidade empática que algumas das crianças começaram a evidenciar no decorrer do

projeto, nomeadamente pela personagem Mateus, figura central da história III, explorada

no bloco de intervenção C. Após compreenderem a história e interiorizarem os seus

conteúdos, as crianças começaram a contextualizar o tema do racismo, com as situações

que observaram na história, evidenciando sensibilização à discriminação da qual o

Mateus foi vítima, tal como se denota em: “mas, não percebo porque os meninos foram

maus para ele, ele nem disse nada, porquê é que eles foram maus?” (…) não é verdade

que ser diferente é bonito?” (NC.23);

“Temos que explicar aos outros meninos, eles não sabem que tem que ser amigos de toda

a gente” (NC.26).

Esta foi a história que mais interessou o grupo, que mais os motivou e que mais os tocou

a nível emocional e relacional. Devido à motivação e ao interesse das crianças nesta

temática, este bloco de intervenção teve maior número de atividades propostas, tendo-se

alargado mais que os restantes.

As emoções desencadeadas pelas histórias levaram algumas crianças a

demonstrarem capacidades emergentes para se colocarem no papel do outro, fomentando

a compreensão de outras visões do mundo em diversas ocasiões e que foram visíveis em

vários momentos, dentro e fora do contexto escolar. Foi reportado por uma mãe que o

Capítulo 7 - Análise e Interpretação de Dados

_____________________________________________________________________________

207

filho lhe contava as histórias exploradas, a partir da visão de diferentes personagens:

“todos os dias o vou deitar e ele farta-se de me contar as aventuras das vossas ‘viagens’,

parece que foram mesmo a qualquer lado. Conta-me o que aprendem nas histórias, mas

noutros papéis, como nas histórias que vocês contam” (NC.10). Noutra situação foi

mencionada a forma como a criança começava a compreender o ponto de vista do outro:

“isso também é importante, ela ser capaz de perceber o lado do outro, não é fácil, mas

ela já vai fazendo. (NC.30). Vários estudos (Formosinho et al, 2001; Hohmann e Weikart,

2004; Lopes e Silva, 2008; Dolan, 2014) defendem o desenvolvimento de competências

empáticas como um fator essencial à compreensão de outros pontos de vista e à vida em

sociedade, potenciando que as crianças aprendam a “appreciate diversity, which enriches

and strengthens everyone” (Ellis e Brewster, 2014:52).

A última dimensão do modelo de Byram (1997) remete-nos para a consciência

cultural, numa visão mais ampla da multiculturalidade, assim como de questões ligadas

às temáticas sociais, tais como o preconceito, o racismo, a migração ou a adoção. Esta

dimensão é visível nos comportamentos evidenciados pelas crianças (Deardorff, 2006),

sendo que todas as aprendizagens explicitadas anteriormente podem considerar-se uma

manifestação da consciência (inter)cultural (Byram, 1997; Deardorff, 2006; Ramos,

2011,2013). Nos blocos de intervenção D e E, as crianças interpretaram as histórias IV e

V, tendo em conta a ‘bagagem’ cultural reunida nas dinâmicas implementadas ao longo

do projeto, como está patente em “[(…) Eram migrantes]. Ela continuou: Sim, é isso, são

pessoas que não têm nada e temos que ajudá-las, dar roupas e comidas a elas” (NC.31);

“Ariana achas que eles na história eram parecidos comigo, a cor deles é como a minha,

um castanho assim mais clarinho…” (NC.34).

Tendo em consideração que no ensino pré-escolar o tempo incorpora dinâmicas

de participação no trabalho educativo e inclui experiências múltiplas, linguagens plurais

e diferentes culturas (Oliveira-Formosinho, Andrade e Formosinho, 2011) e o espaço se

considera “como um território organizado para a aprendizagem (…) aberto às vivências

e interesses das crianças e comunidades (…) Um lugar para aprender porque dá acesso

aos instrumentos culturais” (Ibidem, p.11), os momentos de brincadeira livre,

evidenciaram-se como espaços de aprendizagens culturais. Assim, nestes momentos, o

grupo criou diversas situações de jogo simbólico em que eram “pessoas de outros países”,

recriando situações retratadas nas histórias e utilizando os materiais presentes nas áreas

para recriar tradições, como trajes ou alimentação típicas. Existiram momentos em que

as crianças encarnavam o papel das personagens das narrativas, como o Mateus e a mãe

Capítulo 7 - Análise e Interpretação de Dados

_____________________________________________________________________________

208

adotiva (história III) ou a Handa, a Akeyo e até alguns animais presentes na narrativa

(história II). Trauteavam em várias ocasiões as canções aprendidas, com proeminência

nas músicas africanas aprendidas no bloco de intervenção B, mobilizando outros

reportórios linguísticos e reproduzindo as danças aprendidas para a apresentação

“Músicas e danças do mundo”, assim como momentos desta, recriando até a participação

dos pais. Estes momentos servem também como exemplos das marcas de consciência

cultural (Byram, 1997) ou de comportamento observável resultante do conhecimento

interiorizado (Deardorff, 2006).

De salientar que as crianças mobilizaram os conhecimentos das culturas que

apreenderam, refletindo e empregando-os para estabelecer comparações entre culturas,

algo que fica visível quer relativamente à diversidade linguística, em: “a língua da

Roménia é parecida com a da Rússia, pois é? A nossa língua não tem nada a ver…”

(NC.6), quer ao nível da gastronomia típica: “esta sopa parece-se com a de Portugal e

não é muito diferente da nossa, afinal as comidas da Roménia são parecidas com as

nossas, com algumas…” (NC.9). As crianças focaram-se nas diferenças, mas também

identificaram semelhanças, refletindo sobre a diversidade e as aproximações entre Si e o

Outro.

As aprendizagens descritas neste capítulo, foram efetivadas através das múltiplas

dinâmicas educativas, planificadas em torno das diferentes áreas e/ou temas sociais

específicos (Anexo 2-Organização curricular por histórias). Nos cinco blocos de intervenção foram

abordados os seguintes temas: gastronomia, arte e património, música/dança, racismo,

adoção, migração e religião. A integração destas áreas está intimamente relacionada com

o desenvolvimento das aprendizagens nas várias dimensões dos dois modelos de

desenvolvimento da competência intercultural abordados no enquadramento teórico.

Deste modo, o desenvolvimento da competência intercultural, emergiu como

transversal, quer às experiências, quer às aprendizagens interculturais, sendo

concretizado através destas. Assim, a operacionalização do projeto passou por promover

experiências de âmbito intercultural, o que vai ao encontro do que está preconizado pela

Unesco (2013:22), “intercultural competences also must be actively taught, promoted,

enacted (…)”. Propomo-nos aqui, pôr em evidência as principais marcas de

desenvolvimento da competência intercultural por parte das crianças.

Deardorff (2011, citada por Unesco, 2013) identificou o desenvolvimento de sete

skills, como condições mínimas para promover a competência intercultural. Quatro destas

competências base, foram desenvolvidas pelo grupo de forma mais evidente ao longo do

Capítulo 7 - Análise e Interpretação de Dados

_____________________________________________________________________________

209

processo, tendo sido interiorizadas e aprendidas através das experiências interculturais,

diálogo e reflexões em grupo. A autora referiu como skills fundamentais a desenvolver:

(i) o respeito e valorização do Outro, evidentes no decorrer do projeto, mais

especificamente no bloco de intervenção C, explorando o enfoque do racismo e exclusão

social (Morgado e Pires, 2010) :“tu disseste na outra história da Handa que quando uma

coisa é diferente, ajuda-nos a conhecer coisas novas e aprendemos com elas. Os meninos

não sabiam isso? (NC.22); “Ariana, não é verdade que ser diferente é bonito?” (NC.23);

(ii) aceitação positiva da diversidade e consciencialização das identidades culturais

(Morgado e Pires, 2010), patentes nas conceções das crianças, numa reflexão entre pares

acerca das cores de pele, no bloco de intervenção A: “não se muda de cor…acho

eu…acho que tens que nascer com uma cor só e ser assim sempre.” (NC.2) e no bloco de

intervenção B, através da comparação de traços culturais distintivos entre culturas,

evidenciando uma compreensão das identidades sociais de cada indivíduo: “as pessoas

podem ser de outras cores, mas podem ter nascido no nosso país. Mas como os pais delas

também são assim, elas saíram a eles, como eu saio à minha mãe, porque nós somos

parecidas” / “Mas esses são outros, não são iguais à Handa; Sim, olha o cabelo daquele

– riam -; São todos parecidos, mas não iguais (…)” (NC.15); (iii) colocar-se no papel do

outro, assumindo a diferença do outro numa perspetiva empática: “não podemos deixar

isso acontecer, temos que explicar aos outros meninos que não sabem que deixar de ser

amigos dos outros só por eles serem bege, castanhos ou preto. São só cores de pele, nós

já sabemos e eles não” (NC.23). A autora refere ainda que neste âmbito, aprender a ouvir

é uma competência fundamental. Em geral - e a diferentes ritmos - todo o grupo foi

evidenciando a capacidade de ouvir o outro e de dar lugar a outras opiniões, como

podemos inferir em: “o grupo acalmou-se e surgiram duas opiniões. O F.P falou: Eu não

tenho a certeza, mas acho que não há mais...mais diferenças. A C.B. apoiou o ponto de

vista argumentando: Eu também acho o mesmo que o F., porque mais nenhum menino

disse nada. O resto das coisas é igual. Respondi: Então vou ler-vos o que me disseram,

eu escrevi tudo aqui - disse mostrando a folha - e li as conclusões de cada um, enquanto

todos escutavam atentamente” (NC.27). Esta skill é transversal às restantes, sendo patente

nas dinâmicas experienciais, tal como o diálogo com adultos e pares e a participação ativa

no processo de ensino-aprendizagem. Estas skills evidenciaram uma reflexão acerca do

diverso, numa dimensão de autoconsciencialização também defendidas nos modelos de

Byram (1997) e de Deardorff (2006).

Capítulo 7 - Análise e Interpretação de Dados

_____________________________________________________________________________

210

De referir que o grupo não evidenciou de modo tão marcado, aprendizagens ao

nível das restantes competências preconizadas por Deardorff (2011, citada por Unesco,

2013), nomeadamente: (v) capacidade de adaptação para alterar temporariamente a sua

perspetiva pessoal; (vi) forjar relações duradouras com sujeitos de outras culturas; (vii)

humildade cultural, que “combines respect with selfawareness” (Unesco, 2013:24).

Em suma, as histórias exploradas constituíram-se como núcleo integrador das

experiências e aprendizagem interculturais vivenciadas no decorrer do processo

educativo. Estas sensibilizaram o grupo para a diversidade cultural, promovendo trocas

de ideias e respeito mútuos, fomentando o desenvolvimento de competências em várias

áreas curriculares e nas diferentes componentes dos modelos de competência

intercultural, nomeadamente ao nível das atitudes, “the foundation of intercultural

competence” (Byram et al, 2002:7), dos conhecimentos “of social groups and their

products and practices” (Ibidem, p.8) e das skills, as capacidades de cada criança para

mobilizar e interpretar aquilo que foi apreendido ao longo do plano de ação pedagógica.

A integração das aprendizagens ao nível das dimensões de Byram (1997) e de Deardorff

(2006) possibilitaram a consciencialização das crianças acerca da diversidade cultural

existente no seu quotidiano (Cardoso, 1998; Ferreira, 2003) e ao seu redor, o que

inevitavelmente fomentou o desenvolvimento da competência intercultural.

As vivências interculturais experienciadas no decorrer do processo educativo,

permitiram ao grupo desenvolver competências em várias áreas e demonstrar atitudes

positivas face a elementos que retratavam a diversidade. Subentende-se que os efeitos das

experiências interculturais na integração das aprendizagens de outras culturas no espaço

escolar foram extremamente positivos, numa perspetiva de educação para a cidadania

intercultural (Byram, 2008). Neste âmbito deve ainda ressaltar-se a educação pré-escolar,

como ambiente promotor de experiências ao nível do diálogo e da participação e de

aprendizagens ao nível do saber-ser e saber-fazer (Mendonça, 1994), primeiro passo para

interações com o diverso e no desenvolvimento de competências interculturais.

Em síntese, o tratamento dos dados parece apontar no sentido de que o

desenvolvimento do projeto teve impacto nas crianças, agindo como um veículo de

compreensão do mundo, de aprendizagem, abrindo-lhes horizontes para o conhecimento

do Outro, e a compreensão das suas especificidades. A ação pedagógica foi ainda benéfica

ao estreitar laços para uma cultura mais colaborativa entre a escola e família, o que ficou

patente quer em diversos comportamentos das crianças, quer nas atitudes dos pais.

Considerações Finais

_____________________________________________________________________________

211

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste ponto será realizada uma síntese, onde se terão em conta os elementos

recolhidos e apresentados no capítulo de análise e interpretação dos dados.

A investigação-ação foi, tal como descrevem Bogdan e Biklen (1994), uma forma

de investigar para promover uma mudança social. A natureza cíclica entre a ação e

reflexão (Lewin, 1946; Latorre, 2003; McNiff e Whitehead, 2006; MacNaughton e

Hughes, 2009; Amado e Cardoso, 2013) foi essencial para compreender o processo de

aprendizagem do grupo e avaliar as práticas educativas (Stringer, 2007), com o intuito de

as melhorar progressivamente, permitindo otimizar as dinâmicas e consequentemente as

aprendizagens.

Esta constituiu-se como uma metodologia que pretendia modificar a realidade

educativa, mobilizando de forma mais sistemática, a participação e colaboração direta dos

intervenientes (Máximo-Esteves, 2008) no processo educativo - crianças e famílias

nucleares - atribuindo-lhes um papel ativo no processo educativo. Através dela, procurou-

se compreender como se processaria o desenvolvimento de competência intercultural

num grupo em idade pré-escolar, tendo sido fundamental recorrer à observação

direta/participante e à reflexão crítica, após a recolha de dados fotográficos, vídeos e

sobretudo à elaboração de notas de campo.

Pode ainda referir-se que se tratou de um processo de investigação-ação

participativa, pois implicou todos os intervenientes do processo educativo (Zuber-Skerrit,

1996; Latorre, 2003; Koshy, 2005; Coutinho et al, 2009), apelando à participação das

crianças para definir as atividades a realizar, as decisões a tomar em relação à organização

do ambiente educativo - organização do grupo e do tempo (Silva et al, 2016) - assim

como às famílias, para colaborarem em diversas atividades práticas e projetos

desenvolvidos. Este processo otimizou a comunicação e a relação escola-família,

primordialmente devido ao papel que as crianças assumiram como mediadoras do

processo, o que facilitou bastante a aproximação entre os pais, a equipa de sala e o jardim

de infância.

Entre o grupo de crianças e a educadora, existiram diversos momentos de partilha,

exposição e troca de opiniões, assim como reflexões acerca dos encontros interculturais

das personagens e dos elementos de diversidade explorados nas histórias, que deram lugar

à escolha das dinâmicas e pesquisas realizadas. No contexto da investigação realizada, os

Considerações Finais

_____________________________________________________________________________

212

momentos de grupo - a ‘roda’ - evidenciaram-se como espaços em que as crianças

trocavam ideias e constituíram-se como “um diálogo com múltiplas vozes” (Carvalho,

2015:135), em que as crianças “ puderam expor os seus interesses, suas preocupações

(…)” (Ibidem). Esta espiral de experiências gerou aprendizagens e consequentemente,

originou a partilha das descobertas realizadas no ambiente escolar, com os pais, o que

aprofundou o processo, favorecendo algumas mudanças nas atitudes dos pais e motivando

a sua participação na vida escolar, o que, por seu lado, estimulou (ainda) mais as crianças.

Gradativamente, estes processos levaram as crianças a desenvolverem o seu espírito

crítico, a questionarem, a refletirem na sua forma de estar e ser em relação ao Outro, na

resolução de conflitos, no saber ouvir e no colocar-se no lugar do Outro.

Os diálogos e reflexões em grande grupo possibilitaram às crianças: o

desenvolvimento do espírito crítico, a exposição de ideias, assim como a sistematização

da informação e formulação de hipóteses acerca daquilo que iam observando e

aprendendo (Malavasi e Zoccatelli, 2013). Em relação a mim, como educadora

/investigadora, permitiu-me descentrar-me do meu papel de orientação ‘pré-definido’,

refletindo acerca das dinâmicas que iam surgindo, das conceções das crianças em relação

ao processo educativo e sobretudo na minha atuação diária e efeitos desta no quotidiano

educativo, o que terá tido influência na minha prática futura. É fundamental que os

educadores compreendam as crianças como produtoras de hipóteses, não limitando as

suas possibilidades, proporcionando escolhas educativas que fomentem a participação

destas na rotina educativa (Carvalho, 2015, Silva et al, 2016).

Assim, as observações realizadas e descritas nas notas de campo foram a base para

potenciar o meu processo reflexivo, pelo qual ponderasse alguns aspetos da minha prática,

nomeadamente ao nível da inclusão dos processos participativos, da abertura e

flexibilidade face às dinâmicas que foram surgindo, de uma visão alargada acerca das

estratégias a utilizar para a promoção de uma educação intercultural no quotidiano

pedagógico. Permitiram ainda que tomasse consciência da importância da voz das

crianças e da individualidade de cada uma delas no seu processo educativo e na relação

pedagógica, quer com o grupo de crianças, quer com as famílias, que contribuíram

ativamente para o sucesso das aprendizagens. Foi preponderante ressaltar os seus

interesses e motivações, indo ao encontro de uma ação mais observadora e até empática.

Deste modo, as notas de campo foram essenciais na recolha de evidências, incidindo quer

no âmbito descritivo, quer no reflexivo. Nelas, ficou patente o papel das histórias

multiculturais nos interesses desenvolvidos e nas aprendizagens interculturais realizadas.

Considerações Finais

_____________________________________________________________________________

213

Visto que a diversidade cultural foi encarada como uma fonte de riqueza para o

processo de ensino-aprendizagem, considerei importante rentabilizar os saberes e culturas

presentes no grupo, interligando-os com as histórias exploradas, como no caso da C. (mãe

romena), L.P. (mãe brasileira), C.B. (mãe moçambicana) e M.J. (avó indiana), pois a

abordagem do “conhecimento do mundo parte do que as crianças já sabem e aprenderam

nos contextos em que vivem” (Silva et al, 2016:85) e tem em conta que:

“all learners, adults and children, must explore their own cultures before they can understand

why culture matters in the lives of others around them (…) children bring their personal

experiences of living in the world and being part of specific cultural groups and social

contexts to school. (…) they need to find their lives reflected in books in order to value school

as relevant” (Short, 2009:3-4)

Assim, os países escolhidos para ‘explorar’ envolveram estas culturas, no sentido

de promover uma conexão às raízes culturais destas crianças. Esta perspetiva fez emergir

um vínculo entre os elementos do grupo, onde foi notória a partilha, a cooperação e a

empatia, pois quando “students recognize the cultures that influence their thinking, they

become more aware of how and why culture is important to others (Short, 2009:4). Esta

visão é defendida nas OCEPE (2016:85), onde se torna evidente que a exploração do meio

envolvente da criança “tem para esta um sentido afetivo e relacional, que facilita a sua

compreensão e apreensão e também proporciona a elaboração de quadros explicativos

para compreender outras situações mais distantes.”

As pesquisas e observações de imagens realizadas em conjunto, e a partir das

histórias, permitiram às crianças afirmar as suas necessidades educativas face às

problemáticas emergentes e funcionaram como reflexões conjuntas em torno dos tópicos

de natureza (inter)cultural, tais como o racismo, a migração ou a religião. Deste modo,

implicaram a mobilização dos interesses do grupo, “a partir de situações que possibilitem

que meninos e meninas possam expor os seus pontos de vista durante o processo

investigativo” (Carvalho, 2015:135). Compreendi, assim, que estas dinâmicas

promoveram um ambiente de escuta ativa das crianças (Malavasi e Zoccatelli, 2013) e

consequentemente, uma postura reflexiva, interventiva, interrogativa e mais consciente

da parte das crianças, o que favorece as mudanças nos processos mentais, emocionais e

sociais destas, uma vez que “only through joint construction of a relationship in which

people listen to one another can individuals demonstrate their intercultural competences”

(Unesco, 2013: 38).

Considerações Finais

_____________________________________________________________________________

214

Ainda de referir que várias famílias participaram ativamente no desenvolvimento

da intervenção, através dos projetos, da recolha de objetos e das visitas à sala, entre outros.

Considero que os projetos de participação - trabalhos de projeto desenvolvidos com as

crianças e projetos em parceria com os pais, nomeadamente o projeto de elaboração de

histórias - foram fundamentais para o sucesso da investigação e para as aprendizagens

desenvolvidas (Silva e Martins, 2002; Lopes e Silva, 2008). Proporcionaram “a criação

de uma história de vida coletiva, com significados compartilhados (Barbosa e Horn,

2008:87), estimulando a aprendizagem do diálogo, do debate de ideias, da argumentação,

da compreensão de diferentes pontos de vista e da cooperação. Estes processos levam à

exploração dos saberes dos envolvidos na construção de uma visão coletiva, o que amplia

o conhecimento, enriquece o espírito e oferece uma “significação mais profunda à vida”

(Ibidem, p.88).

Ao longo da exploração das histórias, o grupo revelou atitudes de compreensão,

cooperação, valorização cultural e da alteridade, demonstrando ainda ter uma atitude

empática e positiva face às diferenças, características de outras culturas. O facto de

realizarem comparações entre culturas, em diferentes ocasiões, denotou uma forte ligação

com as experiências vivenciadas, a todos os níveis, efetivando que “to hear [these] stories

and to learn about the experiences of others” (Dolan, 2014:93), teve enorme potencial de

transformação relacional, preparando o grupo para novas práticas de cidadania e talvez

para uma atuação consciente como futuros cidadãos.

Retomando a questão principal:

De que forma a literatura infantil se assume como estratégia de desenvolvimento da

competência intercultural na educação pré-escolar?

A investigação gravitou à volta das histórias, consideradas o ‘catalisador’ do

projeto e a base de todas as experiências e aprendizagens evidenciadas pelas crianças.

Atuaram como estratégia pedagógica (Cortesão e Stoer, 1996; Leite e Rodrigues, 2000;

Soares, 2008) para familiarizar o grupo com a diversidade (Magos, 2009), desencadeando

processos reflexivos sobre a compreensão do mundo envolvente (Mesquita, 2007),

processos esses que atuaram como promotores do desenvolvimento da consciência

intercultural (Byram, 1997; Deardorff, 2006; Ramos, 2011,2013). O trabalho pedagógico

com as cinco histórias de literatura infantil constituiu-se então como um núcleo agregador

Considerações Finais

_____________________________________________________________________________

215

das aprendizagens realizadas e da exploração de áreas e/ou temas relacionados com a

diversidade cultural (Magos, 2009; Morgado e Pires, 2010), levando o grupo a “immerse

themselves in story worlds, gaining insights into how people feel, live, and think around

the world” (Short, 2009:1). Assim, através de processos relacionais e experienciais,

fomentaram-se competências e aprendizagens, focadas na perspetiva intercultural. É

fundamental aludir ao elevado número de aprendizagens manifestadas relativamente às

diferentes dimensões dos modelos de competência intercultural (Byram, 1997; Deardorff,

2006) - atitudes, conhecimentos e compreensão, skills, ações externas - nomeadamente o

reconhecimento e identificação de características e tradições de diferentes culturas,

atitudes de respeito, curiosidade e interesse em relação ao Outro. De modo não tão

evidente, houve também aprendizagens nas dimensões mais complexas ao nível da

consciência cultural (Byram, 1997), o que originou evidências no comportamento

observável (Deardorff, 2006).

Todas as aprendizagens tiveram como base a literatura explorada e foram

resultando da integração de um processo de oito meses, onde se sucederam atividades

múltiplas e se viveram experiências significativas.

Através da exploração das histórias, o grupo conseguiu identificar facilmente

aspetos físicos, assim como tradições da África, América do Sul ou Ásia - histórias II, IV

e V. A diversidade linguística e religiosa foram temáticas abordadas no âmbito da

sensibilização à diversidade cultural, nomeadamente nas histórias I, II e V. As crianças

foram expostas a diferentes reportórios linguísticos, primordialmente através do contato

com falantes nativos, o que culminou na interiorização (ainda hoje evidente) e

mobilização de vocabulário novo em diferentes contextos. Foi frequente o uso de termos

aprendidos no quotidiano educativo e consequente transmissão e explicação a diferentes

membros da família, tal como se pode inferir em: “a minha mãe disse isso e que existem

muitas culturas para conhecer no mundo todo e que é importante eu saber as palavras

que aprendemos em línguas diferentes” (NC.11). Nesta nota de campo, a criança explica

aquilo que lhe foi dito pela mãe, após a partilha do que tinha explorado e aprendido no

jardim de infância.

A perceção de diferentes manifestações culturais religiosas através de festividades

como o Natal/Ano Novo e o Diwali, permitiu às crianças estabeleceram paralelismos e

compreenderem que são “importantes para todas as culturas” (NC.34), estabelecendo

facilmente conexões entre diferentes povos: “os indianos e os portugueses têm coisas

parecidas (NC.34).” A gastronomia e a música/dança constituíram também aspetos de

Considerações Finais

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216

identidade cultural (Abdallah-Pretceille, 1996), valorizados pelas crianças. A

consciencialização da alteridade e a empatia foram também aprendizagens emergentes

aquando da exploração das histórias III, IV e V.

As narrativas utilizadas, foram escolhidas com o objetivo de fomentarem a

aceitação da diversidade, através da exposição de características físicas (e no caso do

história III características psicológicas evidenciadas pela personagem Mateus e pela mãe

branca), culturais e religiosas, apresentando estilos de vida diversos. Em suma, as

histórias utilizadas no projeto continham personagens distintas, observáveis nas

ilustrações. Estas evidenciavam traços físicos diversos - traços fisionómicos, cor de pele,

tipo de cabelo, vestuário, objetos do quotidiano, habitações - fomentando a identificação

de semelhanças e aceitação das diferenças entre as várias culturas retratadas. Também os

espaços retratados possuíam características ao nível sociocultural, como é evidente nas

ilustrações da história II - aldeia da Akeyo, situada no Quénia, da história III - ilha do

Mateus, situada nas Caraíbas, da história IV - aldeia da personagem principal (localização

não identificada, sendo explorada como se situasse no Brasil) e história V - cidade situada

na Índia.

Nas histórias III e IV, retrataram-se encontros com outras culturas, existindo

personagens que se deslocavam da sua cidade materna para outros locais, onde

estabeleciam contato com os nativos desse espaço. Esta componente é mais evidente na

história IV, onde personagens de diversas origens culturais, se instalam na aldeia,

emergindo uma relação harmoniosa entre personagens nativas e não nativas daquele

espaço e onde se evidencia uma partilha de experiências, de convivência e aceitação ativa

da diversidade.

Existiram momentos em que algumas crianças relacionaram elementos de forma

intertextual (Morgado e Pires, 2010), identificando-se com os traços distintivos de cada

personagem, estabelecendo comparações relativamente à aparência física - semelhanças

e diferenças - e também relativamente às tradições de cada povo.

Foram ainda visíveis dicotomias branco/não branco e até evidências de conflito

(Morgado e Pires, 2010) - essencialmente na história III, que retratava o racismo de que

a personagem Mateus foi vítima. Estes elementos evidenciam uma minoria inserida num

contexto escolar dominado por uma maioria cultural distinta da sua. Foi também visível

a representação de encontros interculturais na história III e especialmente na história IV,

que explorava o tema da migração.

Considerações Finais

_____________________________________________________________________________

217

Numa perspetiva intercultural, a utilização destes recursos promoveu

competências interculturais, permitindo aceder, compreender e acolher a cultura do Outro

numa vivência de diversidade. Aprofundou o conhecimento cultural das crianças acerca

de outros países e povos através da divulgação e descoberta de minorias e culturas

estrangeiras e de outros pontos de vista, numa perspetiva de encontro de culturas,

fomentando a sensibilização cultural através da consciencialização da importância de

integrar grupos minoritários nas sociedades atuais, da tolerância, equidade e justiça social,

combatendo o racismo e a xenofobia. Esta abordagem consagrou os textos narrativos

como “motivadores para a inclusão de crianças e de comunidades desfavorecidas porque

dão visibilidade, valorizam na escola a ‘cultura do outro’ e permitem estratégias de

identificação cultural” (Morgado e Pires, 2010:80).

Não obstante a que todas estas aprendizagens derivaram da literatura infantil e

estão implicitamente relacionadas com processos nucleares, como os processos reflexivos

em grupo ou as interações com adultos e pares - utilizados para ativar os conteúdos

interculturais das narrativas - em que várias crianças evidenciaram o desenvolvimento de

um pensamento mais estruturado e um entendimento conceptual de cultura, à volta dos

temas retratados nas histórias. Esta perceção de cultura, remetia-se normalmente a traços

que caracterizam a identidade cultural dos povos, como no caso do Portugal, referindo-se

ao património musical: “ essa senhora cantava a música de Portugal, que é o fado, acho

eu…” (NC.1), ou no caso da Roménia, aludindo ao património tradicional e artístico:

“trouxe estes ovos romenos que a minha mãe tinha lá em casa, ela diz que é tradição, que

as pessoas fazem e oferecem umas às outras e que o meu avô tem muitos lá em casa dele.”

(NC.7).

Para o grupo, o termo ‘cultura’ referiu-se a uma pessoa de outro país ou povo,

alguém com traços culturais específicos. Estas conceções precoces cruzam as evidências

de Cuche (1999), que delineiam o ser humano como um produto da cultura onde está

inserido. Assim, as experiências participativas vivenciadas através da literatura infantil

levaram, inevitavelmente, a que o grupo se desenvolvesse como entidade social e

cooperativa (Dolan, 2014). Foram vários os momentos em que as crianças demonstraram

vontade em realizar atividades em grupo, com recurso à participação de outros colegas:

“estávamos a falar dos instrumentos da música, das maracas. Eu e a M.J. gostávamos de

fazer uma maraca para tocar músicas como aquela” (NC. 16);

“Diz que tem que falar com a Ariana e com os colegas para decidirem o que vão fazer

sobre as maracas” / Disseram-me que queriam construir uma maraca (…) / Olhe porque

Considerações Finais

_____________________________________________________________________________

218

a Ariana e ela e os amigos, ela contou quais são, o F., a M.C. e a C. tem uma tarefa, vão

fazer maracas e a Ariana mandou pesquisar” (NC.17);

“Então fazemos o teatro para apresentar às outras salas? Já tenho o guião que me

pediram, tudo feito como combinámos! (…) Mas vamos ensaiar e depois mostrar aos

outros meninos da escola, não é?” (NC.26). Nestas notas de campo, as crianças revelaram

estar a interiorizar competências essenciais ao nível pessoal, social e cívico, numa

perspetiva de educar para a cidadania.

Assim, a utilização de materiais de aprendizagem didáticos nas práticas de ensino,

nomeadamente livros, “inclusive os que apresentam mensagens discriminatórias e

‘racistas’” (Ramos, 2013:355) foram utilizados “como instrumentos de

consciencialização intercultural” (Ibidem), comprovando a literatura como um fator de

educação para a cidadania e aprendizagem intercultural por excelência (Balça, 2003,

2006, 2007; Magos, 2009; Morgado, 2010a, 2010b, 2010c; Morgado e Pires, 2010, 2012;

Dolan, 2014).

As crianças apropriaram-se do trabalho pedagógico com as narrativas e

promoveram dinâmicas de inclusão familiar, uma estratégia fundamental (Guijarro, 2005;

Barbosa e Horn, 2008) para promover o contato ativo com a diversidade e com os traços

culturais das diferentes comunidades explorados a partir das histórias (Azevedo, 2006;

Ellis e Brewster, 2014), promovendo o outro como fonte de conhecimento e fomentando

a curiosidade pela sua própria identidade cultural.

A exploração das histórias, assim como as experiências vividas em contexto de

sala/grupo, promoveram a curiosidade e a compreensão acerca da diversidade, levando

as crianças a partilhar as suas descobertas e aprendizagens com as famílias. As ações das

crianças originaram um clima de cooperação entre os intervenientes do processo

educativo e a um trabalho colaborativo escola-família. Assim, as crianças assumiram-se

como fontes de informação, partilha e discussão e deram continuidade às suas

experiências escolares, no contexto familiar (Hohmann e Weikart, 2004), o que

possibilitou às famílias acompanharem mais facilmente o trabalho pedagógico na sala.

Estes comportamentos evidenciaram o papel das histórias, como veículo de

transmissão de conteúdos e de promoção de valores (Paiva, 2008; Short, 2009) e “como

forma de promover o conhecimento, a tolerância e a aceitação positiva da diversidade”

(Morgado e Pires, 2010:80). A componente afetiva e empática veiculada pela diversidade

representada nas narrativas (Colomer, 1999; Pires, 2000; Morgado e Pires, 2010) teve

também um papel fundamental nas aprendizagens e no desenvolvimento “de

Considerações Finais

_____________________________________________________________________________

219

competências para agir interculturalmente” (Morgado e Pires, 2010:81), pois este

desenvolvimento ocorreu essencialmente através da promoção do contato com a

diferença.

É de referir que a estrutura e as dinâmicas do projeto de intervenção contaram com

vários pontos de viragem ao longo da sua execução. Visto ser a base do projeto curricular

de sala a explorar com o grupo no ano letivo 2016/2017, o projeto começou a ser

implementado em meados de setembro e apenas no final de setembro foi apresentado à

orientadora, momento em que evidenciou várias falhas ao nível estrutural e articulatório.

Numa 1ª fase, ainda com orientação individual, o projeto foi apresentado e foi

questionada a definição das etapas deste, assim como as dinâmicas desenvolvidas com

cada história explorada, nomeadamente ao nível dos processos participativos, com

intervenção dos diferentes agentes educativos. Efetivamente após uma reflexão mais

crítica da minha parte, ficou claro que o processo estava muito centrado na educadora e

em cada cultura e que seria essencial definir a ligação entre a literatura infantil e as

áreas/temas sociais a explorar, que espelhasse as aprendizagens interculturais a

desenvolver. Os processos participativos foram também alvo de alteração após a perceção

que iriam ampliar e potenciar as aprendizagens nas diferentes áreas. Este foi o primeiro

ponto de viragem no projeto.

Numa 2ª fase, já em coorientação, o projeto foi novamente exposto e questionado:

qual a articulação entre os conhecimentos que as crianças tinham sobre outras culturas e

os objetivos de aprendizagem definidos para a exploração de cada uma das histórias? O

cerne da questão seria que esta relação iria traduzir a intencionalidade educativa do

trabalho pedagógico e consequentemente a escolha das atividades a realizar. Mais uma

vez, o projeto sofreu mudanças, desta vez através da esquematização de uma planificação

(Anexo 2-Organização curricular por histórias), que articulasse as áreas de conteúdo da educação pré-

escolar com as áreas/temas sociais exploradas nas histórias. Foi neste ponto que me

apercebi da importância da escolha de cada uma das histórias, pois cada uma delas deveria

apresentar um caso que promovesse a reflexão das crianças acerca do outro, favorecendo

assim os processos reflexivos e relacionais.

Considerou-se também que as vozes das crianças seriam fundamentais, emergindo

como o núcleo da recolha de dados para se compreenderem as aquisições realizadas ao

longo do processo. As notas de campo ‘deram vida’ a esta investigação e encontram-se

integradas no processo reflexivo e interpretativo de análise do trabalho de campo.

Considerações Finais

_____________________________________________________________________________

220

Passo a passo, desta reestruturação nasceu o projeto de intervenção descrito nestas

linhas, em estreita ligação com a fundamentação teórica que também sofreu várias

alterações a nível estrutural, durante o desenvolvimento do projeto.

Destaca-se assim, a importância dos projetos colaborativos na educação de

infância, assentes no diálogo e tomada de decisões em conjunto, para promover as

capacidades das crianças e consciencialização de si próprios e dos outros, enquanto

“sujeito[s] e agente[s] do processo educativo” (Silva et al, 2016:9) e atores sociais.

Poderia ser interessante desenvolver outros projetos que perscrutassem o

desenvolvimento da consciência intercultural na infância, procurando operacionalizar

outras estratégias para o seu desenvolvimento, em diferentes contextos educacionais,

desenvolvendo continuamente uma base de dados acerca do tema. Os processos de

participação consideram-se determinantes e por isso poderiam figurar em futuras

investigações, devido ao seu potencial nas problemáticas exploradas.

Embora o presente estudo não permita a generalização para outros casos,

nomeadamente por se tratar de um grupo específico, tanto de crianças, como de pais,

espera-se que os resultados alcançados nesta investigação possam de alguma forma servir

como material de apoio e base de consulta, assim como contribuir para o aperfeiçoamento

de questões ligadas à interculturalidade em contexto pré-escolar.

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Documentos da Escola

Projeto Educativo de Escola e Regulamento Interno do Colégio “Missão”

LEGISLAÇÃO CONSULTADA

Lei n.º 103/III/90 - Lei de Bases do Sistema Educativo

Lei-Quadro (Lei n.º 5/97, de 10 de fevereiro) - Lei de Bases do Sistema Educativo

Decreto-Lei 241/ 2001 (de 30 de agosto) - Perfis específicos de desempenho profissional

do educador de infância e do professor do 1.º ciclo do ensino básico