universidade de coimbra · necessidades e das pressões, resume clotilde palma. será isso que...

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08-02-2020 | Economia Textos Elisabete Miranda Foto Ana Baião A o longo dos anos con- tam-se pelos dedos os debates do Or- çamento do Estado sem uma polémica com o IVA à mistu- ra. O que este ano aconteceu na ener- gia tinha acontecido no ano passado com os espetáculos culturais, e antes disso com o IVA dos partidos, com as ostras ou com a res- tauração: estranheza, discussão e, por vezes, desfechos pouco coerentes, que vão moldando o imposto mais à medida das necessidades orçamentais e da for- ça dos lóbis do que da sua lógica. Em teoria, o IVA reduzido serve para uma de três coisas: proteger os rendimentos mais baixos; aumentar o consumo dos chamados bens de mé- rito, como livros ou eventos culturais, e proteger sectores de atividade mais expostos à concorrência ou intensivos em mão de obra. Mas, na prática, as fronteiras não são assim tão claras. Por exemplo, o que é um bem bá- sico? Em “A Riqueza das Nações”, Adam Smith defendia que uma camisa de linho é um bem indispensável a todo o homem honrado. Contudo, olhando para o elenco de taxas, não há país da União Europeia que aplique taxa reduzida ao vestuário. Mesmo Polémica Imposto tem evoluído entre necessidade orçamental e força dos lóbis. Na energia não estamos sós IVA Um fato à medida do freguês que hoje em dia se considere a camisa de linho uma extravagância burguesa, “então e as cuecas não são um bem de primeira necessidade?”, questiona Xavier de Basto, jubilado da Faculda- de de Economia da Universidade de Coimbra e considerado um dos “pais” do imposto em Portugal. Com a energia passa-se algo seme- lhante. Sendo um bem básico, a maio- ria dos países europeus cobra a taxa máxima. Qual é o sentido? Restauração em Portugal, cabeleireiros em França — o peso dos lóbis “Essa é uma discussão que não tem fim”, diz o fiscalista. “Não se pode que- rer encontrar uma lógica férrea nas taxas”, porque a sua evolução está intimamente ligada à história de um país, à evolução das suas necessidades orçamentais e à força dos lóbis. Clotilde Palma, professora univer- sitária e especialista em IVA, recua às origens do imposto para lembrar a lógica subjacente às suas taxas redu- zidas. Ficaram com IVA reduzido os consumos que nos Estados fundado- res já eram tributados desse modo e criou-se uma lista de bens e serviços que, dali em diante, poderiam bene- ficiar destes descontos fiscais. A defi- nição do “caráter de essencialidade” ficou a cargo de cada Estado, dentro do cardápio predefinido, mas nem sempre o guião foi seguido. Por exemplo, a meio do jogo, os franceses conseguiram fazer um en- xerto na lista para incluir as bicicle- tas, os cabeleireiros e as empregadas domésticas, porque “em França os cabeleireiros têm muito peso políti- co”. Portugal também conseguiu um feito parecido quando, depois de anos de braço de ferro com a Comissão Europeia, conseguiu transformar-se no único Estado-membro ao qual foi autorizado a cobrança de IVA reduzi- do nas pontes sobre o Tejo. Ideia a reter daqui: “Todos estes pro- cessos são muito politizados. O IVA é um fato de alfaiate feito à medida das necessidades” e das pressões, resume Clotilde Palma. Será isso que justifica que um sector que não está exposto à concorrência, como o da restauração, tenha conseguido em 2016 ver a sua taxa baixar para os 6%?, aponta Rita de La Féria, professora de Direito Fis- cal na Universidade de Leeds. Regressividade: uma discussão com vários sentidos Voltemos à energia, que nas últimas semanas esteve no centro do debate, com o Governo a defender que não faz sentido baixar a taxa dos atuais 23%. Terá sido esta oposição ditada por ra- zões orçamentais (segundo as Finan- ças, a medida custaria cerca de €700 milhões por ano em termos líquidos) ou os argumentos fazem sentido? Talvez um pouco de ambas, diz Xavier de Basto. É certo que, pela dimensão da sua receita, “o IVA é a Segurança Social do Estado” e pequenas beliscadelas podem gerar grandes desequilíbrios or- Travão no metro de Lisboa Foi uma das “coligações negativas” que mais irritou o Governo: as obras para a construção da Linha Circular do Metro em Lisboa ficam suspensas. A proposta nasceu no PAN e no PCP. Transparência nos apoios Os apoios públicos concedidos a fundações, associações e demais entidades de direito privado vão ter de ser divulgadas trimestralmente. A proposta, do Chega, foi a primeira ‘coligação negativa’ da sessão. Recibos verdes com alívio no IVA Os recibos verdes só serão obrigados a pagar IVA se ultrapassarem os €12.500 de rendimentos anuais. Até aqui o limiar de isenção era de €10.000. O alargamento beneficia tanto os trabalhadores independentes como os dependentes que passam esporadicamente recibos verdes. Reforço na dedução por filho O PS alterou a proposta para o desconto dos filhos no IRS. Assim, nas famílias onde haja dois ou mais filhos, e pelo menos um deles tenha até 3 anos, o atual desconto de €726 passa a €900 para o segundo filho e seguintes, independentemente da idade do primeiro. ORÇAMENTO SAIU DO PARLAMENTO COM ALGUMAS NOVIDADES IVA DA ENERGIA NA EUROPA Maioria tem taxa máxima À semelhança do que acontece por cá, na generalidade dos países europeus o gás e a energia não são considerados bens de primeira necessidade. A eletricidade paga taxa máxima em 21 dos 28 países que em julho de 2019 integravam a União Europeia. Já o gás natural paga o máximo em 23 Estados. Aplicam taxa reduzida ou intermédia na eletricidade a Irlanda, Grécia, Croácia, Itália, Luxemburgo, Malta e Reino Unido. Em França e na Croácia há duas taxas, para os consumos e a potência contratada, como acontece por cá. Já no gás, são a Irlanda, Grécia, Itália, Luxemburgo e o Reino Unido. Contudo, como Portugal tem a quinta taxa de IVA mais alta da Europa, os impostos pesam mais na fatura.

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Page 1: Universidade de Coimbra · necessidades e das pressões, resume Clotilde Palma. Será isso que justi ca que um sector que não está exposto à concorrência, como o da restauração,

08-02-2020 | Economia

Textos Elisabete Miranda Foto Ana Baião

Ao longo dos anos con-tam-se pelos dedos os debates do Or-çamento do Estado sem uma polémica com o IVA à mistu-ra. O que este ano aconteceu na ener-gia tinha acontecido

no ano passado com os espetáculos culturais, e antes disso com o IVA dos partidos, com as ostras ou com a res-tauração: estranheza, discussão e, por vezes, desfechos pouco coerentes, que vão moldando o imposto mais à medida das necessidades orçamentais e da for-ça dos lóbis do que da sua lógica.

Em teoria, o IVA reduzido serve para uma de três coisas: proteger os rendimentos mais baixos; aumentar o consumo dos chamados bens de mé-rito, como livros ou eventos culturais, e proteger sectores de atividade mais expostos à concorrência ou intensivos em mão de obra. Mas, na prática, as fronteiras não são assim tão claras.

Por exemplo, o que é um bem bá-sico? Em “A Riqueza das Nações”, Adam Smith defendia que uma camisa de linho é um bem indispensável a todo o homem honrado. Contudo, olhando para o elenco de taxas, não há país da União Europeia que aplique taxa reduzida ao vestuário. Mesmo

Polémica Imposto tem evoluído entre necessidade orçamental e força dos lóbis. Na energia não estamos sós

IVA Um fato à medida do freguês

que hoje em dia se considere a camisa de linho uma extravagância burguesa, “então e as cuecas não são um bem de primeira necessidade?”, questiona Xavier de Basto, jubilado da Faculda-de de Economia da Universidade de Coimbra e considerado um dos “pais” do imposto em Portugal.

Com a energia passa-se algo seme-lhante. Sendo um bem básico, a maio-ria dos países europeus cobra a taxa máxima. Qual é o sentido?

Restauração em Portugal, cabeleireiros em França — o peso dos lóbis

“Essa é uma discussão que não tem fim”, diz o fiscalista. “Não se pode que-rer encontrar uma lógica férrea nas taxas”, porque a sua evolução está

intimamente ligada à história de um país, à evolução das suas necessidades orçamentais e à força dos lóbis.

Clotilde Palma, professora univer-sitária e especialista em IVA, recua às origens do imposto para lembrar a lógica subjacente às suas taxas redu-zidas. Ficaram com IVA reduzido os consumos que nos Estados fundado-res já eram tributados desse modo e criou-se uma lista de bens e serviços que, dali em diante, poderiam bene-ficiar destes descontos fiscais. A defi-nição do “caráter de essencialidade” ficou a cargo de cada Estado, dentro do cardápio predefinido, mas nem sempre o guião foi seguido.

Por exemplo, a meio do jogo, os franceses conseguiram fazer um en-xerto na lista para incluir as bicicle-tas, os cabeleireiros e as empregadas

domésticas, porque “em França os cabeleireiros têm muito peso políti-co”. Portugal também conseguiu um feito parecido quando, depois de anos de braço de ferro com a Comissão Europeia, conseguiu transformar-se no único Estado-membro ao qual foi autorizado a cobrança de IVA reduzi-do nas pontes sobre o Tejo.

Ideia a reter daqui: “Todos estes pro-cessos são muito politizados. O IVA é um fato de alfaiate feito à medida das necessidades” e das pressões, resume Clotilde Palma. Será isso que justifica que um sector que não está exposto à concorrência, como o da restauração, tenha conseguido em 2016 ver a sua taxa baixar para os 6%?, aponta Rita de La Féria, professora de Direito Fis-cal na Universidade de Leeds.

Regressividade: uma discussão com vários sentidos

Voltemos à energia, que nas últimas semanas esteve no centro do debate, com o Governo a defender que não faz sentido baixar a taxa dos atuais 23%. Terá sido esta oposição ditada por ra-zões orçamentais (segundo as Finan-ças, a medida custaria cerca de €700 milhões por ano em termos líquidos) ou os argumentos fazem sentido?

Talvez um pouco de ambas, diz Xa vier de Basto. É certo que, pela dimensão da sua receita, “o IVA é a Segurança Social do Estado” e pequenas beliscadelas podem gerar grandes desequilíbrios or-

Travão no metro de LisboaFoi uma das “coligações negativas” que mais irritou o Governo: as obras para a construção da Linha Circular do Metro em Lisboa ficam suspensas. A proposta nasceu no PAN e no PCP.

Transparência nos apoiosOs apoios públicos concedidos a fundações, associações e demais entidades de direito privado vão ter de ser divulgadas trimestralmente. A proposta, do Chega, foi a primeira ‘coligação negativa’ da sessão.

Recibos verdes com alívio no IVAOs recibos verdes só serão obrigados a pagar IVA se ultrapassarem os €12.500 de rendimentos anuais. Até aqui o limiar de isenção era de €10.000. O alargamento beneficia tanto os trabalhadores independentes como os dependentes que passam esporadicamente recibos verdes.

Reforço na dedução por filhoO PS alterou a proposta para o desconto dos filhos no IRS. Assim, nas famílias onde haja dois ou mais filhos, e pelo menos um deles tenha até 3 anos, o atual desconto de €726 passa a €900 para o segundo filho e seguintes, independentemente da idade do primeiro.

ORÇAMENTO SAIU DO PARLAMENTO COM ALGUMAS NOVIDADES

IVA DA ENERGIA NA EUROPA

Maioriatem taxa máxima

À semelhança do que acontece por cá, na generalidade dos países europeus o gás e a energia não são considerados bens de primeira necessidade. A eletricidade paga taxa máxima em 21 dos 28 países que em julho de 2019 integravam a União Europeia. Já o gás natural

paga o máximo em 23 Estados. Aplicam taxa reduzida ou intermédia na eletricidade a Irlanda, Grécia, Croácia, Itália, Luxemburgo, Malta e Reino Unido. Em França e na Croácia há duas taxas, para os consumos e a potência contratada, como acontece por cá. Já no gás, são a Irlanda, Grécia, Itália, Luxemburgo e o Reino Unido. Contudo, como Portugal tem a quinta taxa de IVA mais alta da Europa, os impostos pesam mais na fatura.

Page 2: Universidade de Coimbra · necessidades e das pressões, resume Clotilde Palma. Será isso que justi ca que um sector que não está exposto à concorrência, como o da restauração,

08-02-2020 | Economiaçamentais, como é o caso. Mas também é verdade que o Governo tem respaldo no passado. É que quando o IVA foi introduzido, em 1986, a eletricidade pagava taxa de 8% mas o gás enfrenta­va a taxa normal de 16%, não sendo na altura considerado um bem essencial.

Já Clotilde Palma considera que a explicação é “pura e exclusivamente or­çamental”. O Governo argumenta que as classes mais desfavorecidas já estão a ser protegidas com a tarifa social. Mas para a especialista não chega. Primeiro, porque o apoio é baixo (para se ter uma ideia, um casal não pode ganhar mais do que €11.600 por ano). Depois, por­que “o IVA é um imposto regressivo, que penaliza mais quem menos ganha”.

Rita de La Féria discorda com vee­mência. “Não há razão nenhuma para uma pessoa como eu pagar IVA re­duzido na energia. Se há problemas relativamente à proteção dos mais carenciados, ela deve ser ampliada”, mas as taxas reduzidas não são um bom instrumento de redistribuição, assegura. Pelo menos “não na maioria dos países europeus, que têm sistemas sofisticados de Segurança Social”.

A economista trabalhou de perto com a troika, em 2011, e garante que, de acordo com os estudos que vem fazendo, com as taxas reduzidas “não estamos a poupar os mais pobres, es­tamos a erodir base tributária a mui­tos rendimentos altos”.

Solução? Uma taxa única, em que os mais pobres seriam protegidos através de um crédito de imposto mensal, que seria devolvido automaticamente em cada compra. Com isto “acabam­se os problemas das definições”, “limita­se o poder dos lóbis”, “simplifica­se o siste­ma” e “aumenta­se a progressividade”.

Xavier de Basto coloca­se deste lado da solução — “o ideal seria fazermos uma aterragem suave no modelo de taxa única”. Mas, como este cenário é “impossível”, a “aposta devia ser na redução da taxa máxima”, hoje em dia entre as mais altas da Europa.

Com a descida do IVA enterrada e o Governo à espera de uma improvável autorização da Comissão Europeia para modular o imposto em função dos consumos, numa coisa todos con­cordam. “Um sistema com várias taxas complica a administração do imposto”.

[email protected]

O Orçamento foi aprovado com o Governo a gastar

apenas mais €40 milhões que o previsto. O IVA agitou

a reta final do debate mas no fim tudo fica na mesma

Ajuda nas crechesO Governo prepara-se para pagar as creches às famílias mais pobres e estuda um complemento-creche para apoiar todas as famílias com dois ou mais filhos. As medidas deverão avançar no próximo ano letivo.

Vistos gold para o interiorOs estrangeiros que queiram obter um visto gold através da compra de imobiliário terão de investir no interior. Em Lisboa e no Porto só através da criação de emprego. A medida não é, contudo, para já.

Passes sociais com mais dinheiroOs fundos para financiar o programa de redução dos preços dos passes vai passar a contar com €138 milhões. São mais €9 milhões face ao previsto e uma das cedências que valeu a abstenção do BE e PCP.

Filhos com pé de fora do CSIOs idosos com pensões baixas e em situação de pobreza deixam de ver os rendimentos dos filhos a interferir nas regras de atribuição do complemento solidário para idosos (CSI), mas só até ao terceiro escalão dos rendimentos dos filhos. No resto fica igual.

Limite ao ‘eldorado fiscal’Os reformados com pensões do estrangeiro que, de futuro, obtenham em Portugal o estatuto de residente não habitual passarão a ser sujeitos a uma taxa de 10% de IRS. A taxa também é aplicável aos que já cá estão e queiram optar por serem tributados cá.

QUEM GANHA E QUEM PERDE NAS PENSÕES

PENSÃO DIFERENÇAEM 2020 EUROS %

287 6,6 2,3341,2 -0,3 -0,1441,6 -13,7 -3,0

542 -27,2 -4,8618,6 -36,7 -5,6643,4 -33,5 -4,9680,4 -42,2 -5,8785,1 -48,7 -5,8877,6 -35,9 -3,9

1025,9 -63,7 -5,81538,8 -95,5 -5,82051,8 -127,4 -5,82580,4 -126,8 -4,73053,6 -168,9 -5,23564,3 -195,2 -5,24073,5 -221,0 -5,1

O valor da pensão em 2020 inclui o aumento extraordinário previsto no Orçamento do Estado para 2020 e a atualização legal anual. Diferença perante o valor que a pensão teria em 2020 sem os aumentos extraordinários de 2017, 2018, 2019 e 2020, mas considerando que o regime de atualização legal anual não tinha sido suspenso entre 2011 e 2015.

FONTE: CÁLCULOS EXPRESSO

Apesar de quatro aumentos extraordinários, que deram bónus às pensões mais baixas, todos os que recebem pouco acima dos €300 mensais ainda estão a perder com o congelamento entre 2011 e 2015

Pensões acima dos €300 ainda não recuperaram do congelamento

A medida não estava ins­crita na proposta do Orça­mento do Estado para 2020 (OE/2020), mas, como se adivinhava desde o início, foi uma das moedas de troca do Governo de António Costa para assegurar a viabilização do documento pelos partidos mais à esquerda. E, assim, o aumento extraordináriodas pensões vai avançar pelo quarto ano consecutivo, che­gando à conta dos pensionis­tas no mês seguinte à aprova­ção do Orçamento.

Com este bónus, que marcou a legislatura da ‘geringonça’ e volta a ser repetido este ano, os pensionistas com presta­ções mais baixas viram a pen­são engordar. Mas nem isso os deverá fazer esquecer os anos difíceis da crise. É que, segundo as contas do Expres­so, quem recebe pouco acima dos €300 — e todos a partir daí — ainda não recuperaram do congelamento das pensões entre 2011 e 2015.

Vamos por partes. O aumen­to extraordinário deste ano não foge ao guião anterior, ou seja, garante um aumento de pelo menos €10 por mês a todos os pensionistas que recebem até uma vez e meia o Indexante de Apoios Sociais (IAS), ou seja, €658,2 mensaisbrutos em 2020. A exceção são

as pensões atualizadas entre 2011 e 2015 (como o primeiro escalão das pensões mínimas do Regime Geral da Seguran­ça Social), que contarão com €6. Valores que funcionam como limiares mínimos: sem­pre que da aplicação da regra de atualização legal anual re­sulte um incremento inferior, é reforçado até os perfazer. E são definidos por pensionista (acumulando todas as pensões auferidas), para não benefici­ar quem recebe mais do que uma prestação.

Quanto já ganham os pensio­nistas com esta medida? Os cálculos do Expresso chegam a um bónus acumulado de €26 brutos por mês para presta­ções que partiram em 2016 dos €300 e chegam a 2020 com €340, mais 8,3% do que teriam apenas com a aplica­ção do regime de atualização legal anual. Depois, à medida que sobe o valor da pensão, este prémio da ‘geringonça’ vai­se desvanecendo. Tudo porque estas prestações um pouco mais altas contam com um incremento absoluto mai­or pela aplicação da regra de atualização anual (que define um percentual de aumento igual para todas as pensões até dois IAS), por isso, preci­sam apenas de uns ‘pozinhos’ de bónus para perfazerem os tais €10 de aumento mínimo, ou nem precisam de todo.

Perdas até 5,8%

Mas nem mesmo com quatro aumentos extraordinários quem recebe pensões baixas pode esquecer os anos da crise. É que em 2020 estas

pensões ainda vão estar a perder com o congelamento entre 2011 e 2015. Ou seja, vão continuar abaixo do pa­tamar em que estariam caso o regime de atualização legal anual tivesse sido cumprido nesse período. E as perdas afetam todos os que recebem a partir de pouco mais de€300 brutos mensais (ver ta­bela), aproximando­se dos 6% para pensões na casa das seis centenas de euros. A ganhar estão apenas as pensões míni­mas, que foram aumentadas pelo Governo PSD/CDS, e asprestações acima desse limi­ar, mas muito baixas — até

cerca de €300 —, que foram as que mais beneficiaram dos aumentos extraordinários.

A explicação prende­se com as pensões baixas terem sido especialmente penalizadas pelo congelamento. Como a fórmula que determina a atualização anual beneficia as pensões mais baixas em detrimento das mais eleva­das, foram também estas que mais perderam com a sua suspensão.

Uma pensão que partiu de €500 brutos mensais em 2010, por exemplo, vai chegar em 2020 aos €542. Ou seja, 4,8% abaixo (menos €27 por mês) do valor mensal que teria sem os aumentos extraordi­nários de 2017, 2018, 2019 e 2020, mas considerando que a atualização legal anual ti­nha sido cumprida entre 2011 e 2015.

Além disso, o ‘bónus’ não beneficiou todas as pensões baixas. Por exemplo, uma prestação que partiu de €650 mensais em 2010, chegando a 2020 com cerca de €680, fi­cou sempre excluída. E é pre­cisamente aqui que as perdas atingem o seu máximo, nos 5,8% (menos €42 por mês).

As pensões mais elevadas — que ficam fora dos aumentos extraordinários — são menos beneficiadas pela fórmula de atualização anual, mas tam­bém elas estão a perder com a sua suspensão durante a cri­se. Uma pensão de €3000 em 2010, por exemplo, chega a 2020 com cerca de €3054. A perda é de 5,2%, ou seja, €169 mensais.

Sónia M. Lourenç[email protected]

Em países com sistemas de Segurança Social sofisticados, as taxas reduzidas de IVA não fazem sentido. (...) Não protegemos os mais pobres, aliviamos os ricos Rita de La FériaProfessora universitária, especialista em direito fiscal

O ideal seria fazermos uma aterragem suave no modelo de taxa única. (...) Mas como é impossível, a aposta devia ser na redução da taxa máxima Xavier de BastoProfessor jubilado, considerado um dos ‘pais’ do IVA

Todos estes processos são muito politizados. O IVA é um fato de alfaiate feito à medida das necessidades Clotilde PalmaProfessora universitária, especialista em IVA

Page 3: Universidade de Coimbra · necessidades e das pressões, resume Clotilde Palma. Será isso que justi ca que um sector que não está exposto à concorrência, como o da restauração,

08-02-2020 | Economia

Manuela Ferreira Leite

E C O N O M I A 24678 de fevereiro de 2020

www.expresso.pt

IMOBILIÁRIO & EMPREGO

Expresso

OPINIÃO PESSOAS

O cheiro do dinheiroNUNO GRACIAS FERNANDES E18

O dramalhão do IVAFRANCISCO LOUÇÃ E5

Será o sistema fiscal um dos responsáveis pela falta de habitação?POR RICARDO REIS E5

A discussão na especialidade do Orçamento do Estado, que se traduz sempre em centenas de propostas de alteração, não é, nem

nunca foi, apenas um reflexo de desencontros políticos entre os diferentes partidos.

É também o momento em que os deputados dispõem da oportuni-dade, com visibilidade individual, de fazer ouvir os anseios locais que representam.

Falam para as atas e não com a esperança de serem atendidos, o que em democracia nada tem de criticável.

A novidade este ano está no apare-cimento de propostas cujo conteúdo não é mais do que uma reação à forma como os Orçamentos têm sido geridos nos últimos anos.

Quando se pretende introduzir no Orçamento normas que, por exemplo, retiram ao ministro das Finanças a possibilidade de intervir na contratação de pessoal na área da saúde e a atribuem ao ministro responsável pelo respetivo sector, não estão a legislar, mas a intervir em atos administrativos para os quais não têm competência.

O Parlamento legisla, não governa.A própria referência ao ministro

das Finanças, e não ao primeiro--ministro, que é quem tem poderde delegar competências, é prova evidente de um sentimento de deses-pero à forma cega e surda como os Orçamentos têm sido geridos, não atendendo a que o nível de impostos tem limites sociais de aceitação e o nível da despesa não pode pôr em causa a prestação de serviços públi-cos essenciais.

É uma luta entre o desespero e a insensibilidade que resulta em propostas absurdas.

O desespero dos Deputados

A novidade está no aparecimento de propostas cujo conteúdo não é mais do que uma reação à forma como os Orçamentos têm sido geridos

AMEAÇA DO CORONAVÍRUS A epidemia com origem na China está já a ter consequências na economia global e pode marcar o crescimentoem 2020 E36

> Erik Lasscheé o novo diretor executivoda Fullsix Portugal E34

> Dicas 4 conselhosde carreira dos líderes da “Fortune 500” E34

Sabia que existem hackers bons? E valem dinheiro E28

Produção de azeite bate recorde em Portugal E16

HERDEIROS COM ACESSO A DADOS

PRIVADOS DOS MORTOS

HEL

DER

OLI

VEI

RA

Lei de proteção de dados dá aos sucessores o direito

de acederem a dados de saúde e conversas no WhatsApp

que as pessoas falecidas tiveram em vida E20

Duplicam clientes que

recebem juros nos créditos à habitação

Número de contratos em que Euribor

negativas anulam spreads aumentou desde nova lei, em

julho de 2018 E11

Pensões acima de €300 ainda não recuperaram do congelamento

Mesmo com quatro aumentos extraordinários, valor das reformas ainda está a perder com o congelamento das atualizações entre 2011 e 2015 E13

TAP, Easyjet e Ryanair resistem a voar para o Montijo> Companhia portuguesa recusa novo aeroporto por ter hub na Portela > Transportadoras low cost só irão atraídas por preços mais baixos e por necessidade de crescimento E8