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UNIVERSIDADE DE CAXIAS DO SUL GABRIELA BREGOLIN GRILLO LEGISLAÇÃO PARA UMA COMUNICAÇÃO DEMOCRATIZADA NO BRASIL: UMA COMPARAÇÃO COM A LEI DE MEIOS ARGENTINA CAXIAS DO SUL 2015

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UNIVERSIDADE DE CAXIAS DO SUL

GABRIELA BREGOLIN GRILLO

LEGISLAÇÃO PARA UMA COMUNICAÇÃO DEMOCRATIZADA NO BRASIL:

UMA COMPARAÇÃO COM A LEI DE MEIOS ARGENTINA

CAXIAS DO SUL

2015

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GABRIELA BREGOLIN GRILLO

LEGISLAÇÃO PARA UMA COMUNICAÇÃO DEMOCRATIZADA NO BRASIL:

UMA COMPARAÇÃO COM A LEI DE MEIOS ARGENTINA

Trabalho de conclusão de curso para obtenção

do grau de Bacharel em Comunicação Social –

Habilitação em Jornalismo, da Universidade

de Caxias do Sul.

Orientador: Prof. Ms. Marcell Bocchese

CAXIAS DO SUL

2015

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GABRIELA BREGOLIN GRILLO

LEGISLAÇÃO PARA UMA COMUNICAÇÃO DEMOCRATIZADA NO BRASIL:

UMA COMPARAÇÃO COM A LEI DE MEIOS ARGENTINA

Trabalho de conclusão de curso para obtenção

do grau de Bacharel em Comunicação Social –

Habilitação em Jornalismo, da Universidade

de Caxias do Sul.

Aprovado em 06/07/2015

Banca Examinadora

_____________________________________

Prof. Ms. Marcell Bocchese

Universidade de Caxias do Sul – UCS

_____________________________________

Prof. Dr. Álvaro Benevenuto Jr.

Universidade de Caxias do Sul – UCS

_____________________________________

Prof. Dra. Marlene Branca Sólio

Universidade de Caxias do Sul – UCS

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Diz Cecília Meireles que a liberdade é uma

―[...] palavra que o sonho humano alimenta

que não há ninguém que explique e ninguém

que não entenda‖. Dedico este trabalho a todos

que buscam, por meio da comunicação,

libertar a sociedade do preconceito e da falta

de compreensão, para construí-la com mais

amor e justiça.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço infinitamente ao meu orientador, prof. Marcell Bocchese, pelas incontáveis

contribuições para a elaboração da pesquisa e por fazer a ponte entre as minhas ideias, meu

entusiasmo e o conhecimento científico. Sua disposição e preocupação em ajudar, desde a

primeira orientação do projeto de monografia, foram fundamentais para o resultado aqui

apresentado.

Um agradecimento gigante à Diúlit Oldoni, pela amizade de todos os dias da

graduação - desde o primeiríssimo -, pelas piadas internas, pelas gargalhadas, por todas as

incontáveis vezes em que faltou o ar de tanto rir. Mas também pelos dias de cansaço, em que

nada parece ter sentido. Acima de tudo, por compartilhar a esperança de um mundo mais

bonito e também a agonia de quando ele não o é.

À minha mãe, Fabiana Bregolin, por todo o amor, pelos conselhos e por me ensinar,

entre tantas lições, a amar os livros, meus companheiros desde a infância, que abriram meus

olhos para outros mundos possíveis e construíram comigo essa monografia.

À minha avó, Ester Dal Prá Bregolin, e à minha tia, Carla Bregolin, por todo o apoio e

carinho.

Às minhas irmãs, Carolina e Isabela Bregolin Pedruzzi, pela felicidade de tê-las em

minha vida e pela esperança de que cresçam em um mundo cada vez melhor.

À Alexandra Ungaratto, pelos almoços, conversas e risos. Por refletir comigo sobre o

mundo e sobre tudo, pelas frases lindas e por toda a poesia, mas, principalmente, pela

sensibilidade.

À Agência Experimental de Comunicação e a alguns dos meus primeiros colegas de

lá, Maíra Moraes, Mayara Bergamo e Pedro Rech, bem como à prof. Marliva Vanti

Gonçalves, por despertar em mim as preocupações que me levaram a escolher esse tema para

a monografia, pelo mais feliz primeiro emprego do mundo e por toda a contribuição para que

eu me tornasse, ao sair da faculdade, alguém muito diferente de quem eu era ao ingressar nela.

A todos os professores que passaram pela minha vida e abriram as portas para novas

visões de mundo, pelo conhecimento e pela oportunidade de aprender.

Ao Luís Fernando Romanzini, pelo carinho e companheirismo.

Por fim, a todas as pessoas de alma bonita e boas ideias que conheci ao longo da

graduação, pelos momentos de diversão e pelo afeto.

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"La democracia es un lujo del

norte. Al sur se le permite el

espectáculo, que eso no se le niega

a nadie. Y a nadie molesta mucho,

al fin y al cabo, que la política sea

democrática, siempre y cuando la

economía no lo sea".

Eduardo Galeano

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RESUMO

A presente monografia trata da regulação da imprensa brasileira a partir da proposta de

comparar o caso da Lei de Meios, destinada a esse fim na Argentina, com a legislação

brasileira, para averiguar se é urgente e justificável uma nova regulação das comunicações no

Brasil, considerando-se o cenário político e social do país. O trabalho tem como objetivos

específicos compreender o processo de elaboração e implementação da Lei de Meios,

comparar o cenário argentino e sua legislação específica com o brasileiro, analisar os aspectos

da imprensa brasileira que carecem de legislação ou de seu cumprimento, estudar a

necessidade de uma regulação específica para a imprensa no Brasil e quais pontos ela deveria

contemplar, e realizar um apanhado dos dispositivos da legislação brasileira destinados a

regular a imprensa. O referencial teórico dessa pesquisa envolve o tema da regulação

midiática sob uma ótica política e social, que leva em conta o direito à comunicação e à

liberdade de expressão, e tem como base os autores Bolaño (2007), Lima (2004), Ramos

(2000) e Soares (2006), bem como diversos outros, não menos importantes. A Análise de

Conteúdo segundo Bardin (1997) e a Pesquisa Bibliográfica conforme Barros; Junqueira

(2005) e Stumpf (2005) compõem a metodologia desse trabalho, que segue uma orientação

geral de caráter qualitativo. Uma das mais relevantes considerações abstraídas da presente

pesquisa é a percepção da não representatividade dos meios de comunicação brasileiros com

relação ao povo. Por consequência, o entendimento da urgência de uma legislação detalhada

com foco nos veículos midiáticos constituídos por meio de concessão pública, para que ocorra

uma necessária transformação desse cenário.

Palavras-chaves: Comunicação social. Lei de Meios. Legislação brasileira. Democratização

da comunicação. Representatividade social.

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RESUMEN

La presente monografía habla de la regulación de la prensa brasileña a partir de la propuesta

de comparar el caso de la Ley de Medios, hecha con este fin en Argentina, con la legislación

brasileña, para averiguar si es urgente y justificable una nueva regulación de las

comunicaciones en Brasil, considerándose el escenario político y social del país. El trabajo

tiene como objetivos comprender el proceso de implementación de la Ley de Medios,

comparar el escenario argentino y su legislación específica con el brasileño, analizar los

aspectos de la prensa brasileña que carecen de legislación o de su cumplimiento, estudiar la

necesidad de una regulación específica para la prensa en Brasil y cuales puntos ella debería

contemplar, y realizar un apañado de los dispositivos de la legislación brasileña destinados a

reglar la prensa. El referencial teórico de esa pesquisa abarca el tema de la regulación

mediática bajo la óptica política y social, que comprende el derecho a la comunicación y la

libertad de expresión, y tiene como base los autores Bolaño (2007), Lima (2004), Ramos

(2000) y Soares (2006), así como otros no menos importantes. El Análisis de Contenido según

Bardin (1997) y la Pesquisa Bibliográfica conforme Barros; Junqueira (2005) y Stumpf

(2005) componen la metodología de ese trabajo, cuya orientación geral es de carácter

cualitativo. Una de las más importantes consideraciones abstraídas de la presente pesquisa es

la percepción de la no representatividad de los medios de comunicación brasileños con

relación al pueblo. Por consecuencia, el entendimiento de la urgencia de una legislación

detallada con foco en los medios constituidos mediante concesiones públicas, de modo que

ocurra una necesaria transformación de ese escenario.

Palabras-llave: Comunicación social. Ley de Medios. Legislación brasileña.

Democratización de la comunicación. Representatividad social.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

§ Parágrafo

ABA Associação Brasileira de Anunciantes

Abepec Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Comunicação

Abert Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão

ABI Associação Brasileira de Imprensa

ABTA Associação Brasileira de Televisão por Assinatura

AC Análise de Conteúdo

AFSCA Autoridade Federal de Serviços de Comunicação Audiovisual

Anatel Agência Nacional de Telecomunicações

Ancine Agência Nacional do Cinema

Art. Artigo

CBT Código Brasileiro de Telecomunicações

CCS Conselho de Comunicação Social

CF Constituição Federal

Confecom Conferência Nacional de Comunicação

CR-P Cenário de Representação Política

Fenaj Federação Nacional dos Jornalistas

FHC Fernando Henrique Cardoso

FNDC Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação

HDTV Televisão de alta definição

Intercom Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação

Intervozes Coletivo Brasil de Comunicação Social

LGCEM Lei Geral da Comunicação Eletrônica de Massa

LGT Lei Geral das Telecomunicações

LSCA Lei dos Serviços de Comunicação Audiovisual

Minicom Ministério das Comunicações

OP Opinião Pública

PME Pequenas e Médias Empresas

SBTVD­T Sistema Brasileiro de Televisão Digital Terrestre

SDTV Televisão de definição padrão

STF Supremo Tribunal Federal

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TVD Televisão digital

Unesco Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 13

2 COMUNICAÇÃO PARA A DEMOCRACIA: A RELAÇÃO ENTRE PODER E

RESPONSABILIDADE ......................................................................................................... 17

2.1 A COMUNICAÇÃO COMO ESPELHO DAS RELAÇÕES DE PODER

CONSTITUÍDAS NO ESPAÇO DE REPRESENTAÇÃO SOCIAL ..................................... 17

2.2 A MÍDIA CONTROLADA E O OLIGOPÓLIO DAS COMUNICAÇÕES ..................... 20

2.3 O PRIMEIRO PASSO ........................................................................................................ 26

2.4 O PAPEL DA INTERNET ................................................................................................. 28

3 A AUSÊNCIA DE DISCURSOS PLURAIS NA IMPRENSA BRASILEIRA .............. 30

3.1 A MÍDIA E A FORMAÇÃO DA OPINIÃO PÚBLICA ................................................... 32

3.2 A HIPÓTESE DO AGENDA SETTING ........................................................................... 34

3.3 UNIFORMIZAÇÃO SOCIAL: CULTURA E ESTEREÓTIPO NA MÍDIA ................... 36

3.3.1 A simplificação da cultura ............................................................................................ 36

3.3.2 A simplificação do indivíduo ........................................................................................ 38

4 LEGISLAÇÃO BRASILEIRA ........................................................................................... 41

4.1 CONSTITUIÇÃO FEDERAL ............................................................................................ 44

4.2 LEI DE IMPRENSA .......................................................................................................... 47

4.3 CÓDIGO BRASILEIRO DE TELECOMUNICAÇÕES ................................................... 51

4.4 LEI GERAL DAS TELECOMUNICAÇÕES E A REGULAÇÃO DA COMUNICAÇÃO

ELETRÔNICA DE MASSA .................................................................................................... 52

4.4.1 A Lei Geral da Comunicação Eletrônica de Massa .................................................... 53

4.5 LEI DE ACESSO À INFORMAÇÃO ............................................................................... 54

4.6 MARCO CIVIL DA INTERNET ...................................................................................... 55

4.7 OS CÓDIGOS DE ÉTICA ................................................................................................. 57

4.8 TV DIGITAL: NOVAS PERSPECTIVAS ........................................................................ 58

4.9 PROJETO DE LEI DE INICIATIVA POPULAR PARA A REGULAÇÃO DA MÍDIA 60

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5 LEI DE MEIOS: O CASO DA ARGENTINA .................................................................. 62

5.1 O EMBATE COM O CLARÍN .......................................................................................... 63

5.2 BRASIL E ARGENTINA: REALIDADES SEMELHANTES ......................................... 65

5.3 PREMISSAS DA LEI DE MEIOS ..................................................................................... 67

5.4 CINCO ANOS DEPOIS, A REGULAÇÃO DOS DISPOSITIVOS DA LEI DE MEIOS 72

6 METODOLOGIA ................................................................................................................ 75

6.1 MÉTODO ........................................................................................................................... 75

6.2 PROBLEMA DE PESQUISA ............................................................................................ 77

6.3 ANÁLISE ........................................................................................................................... 77

6.3.1 Análise de conteúdo ....................................................................................................... 78

6.3.1.1 Pré-análise .................................................................................................................... 79

6.3.1.2 Análise .......................................................................................................................... 80

6.3.1.3 Tratamento dos resultados e inferências ....................................................................... 82

6.4 PESQUISA BIBLIOGRÁFICA ......................................................................................... 83

7 ANÁLISE ............................................................................................................................. 85

7.1 CONTROLE ECONÔMICO DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO .................................. 85

7.2 DIVERSIDADE CULTURAL NA MÍDIA ....................................................................... 90

7.3 LIBERDADE DE EXPRESSÃO E O LIVRE EXERCÍCIO DO JORNALISMO ............ 90

7.4 ÓRGÃOS RESPONSÁVEIS PELA REGULAÇÃO DAS COMUNICAÇÕES ............... 97

7.5 UMA REFLEXÃO SOBRE DEMOCRACIA, COMUNICAÇÃO E

REPRESENTATIVIDADE SOCIAL ...................................................................................... 99

8 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................ 102

REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 105

ANEXOS ............................................................................................................................... 114

ANEXO A – PORTAL G1, 27 MAR. 2015 ........................................................................... 115

ANEXO B – PORTAL DO JORNAL ZERO HORA, 27 MAR. 2015 .................................. 117

ANEXO C – PORTAL DO JORNAL PIONEIRO, 27 MAR. 2015 ...................................... 119

ANEXO D – CD COM PROJETO DE MONOGRAFIA E LEI DE MEIOS ........................ 121

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1 INTRODUÇÃO

A comunicação desempenha um papel fundamental na construção da sociedade, por

ser o principal mecanismo de representação social. Como consequência disso, dita as

discussões, indivíduos e grupos que serão os agentes de influência e transformação no âmbito

coletivo. Ela possui uma íntima e profunda relação com a manutenção do estado democrático

de direito e, mais que isso, tem grande responsabilidade na garantia de igualdade e justiça

para a população.

Por esse motivo, a temática desenvolvida pela presente pesquisa é a necessidade da

regulação da imprensa no Brasil, para que seja assegurada a sua responsabilidade com os

princípios supracitados. A abordagem de tal tema envolve uma análise da

imprescindibilidade, ou não, da criação de uma regulação específica para os meios de

comunicação brasileiros, com base em uma comparação entre o país e a Argentina, que possui

uma lei do gênero em vigor – conhecida como Ley de Medios –, possibilitando uma reflexão

acerca de sua executabilidade e eficácia.

Esse trabalho justifica-se por meio da premissa de que o regime político vigente no

Brasil é uma democracia representativa e, como tal, a comunicação do país também há de

seguir essas características. Por consequência, a mídia deveria constituir-se como porta-voz,

que democraticamente representa o povo da nação.

É possível perceber, entretanto, uma constante falta de pluralidade nos meios de

comunicação. Em um país continental como o Brasil, com tamanha miscigenação étnica e

cultural – e, na verdade, em qualquer país –, tal ausência de discursos plurais não é

justificável. Além disso, a mídia brasileira concentra-se em poderio de um oligopólio no qual

poucas famílias detêm a quase totalidade dos meios de comunicação do país.

Com isso em mente, entende-se a busca de uma legislação ideal com base na

necessidade de regulação da imprensa brasileira como crucial para o desenvolvimento de

meios de comunicação mais democráticos e justos. É fundamental que os comunicadores do

país sejam os primeiros a buscar uma renovação desse sistema.

Projeta-se que esse estudo tenha, ainda, uma grande importância acadêmica, uma vez

que a bibliografia acerca do assunto necessita, constantemente, de atualizações, face às

transformações – principalmente de ordem legislativa e tecnológica – que ocorrem nas

comunicações do país. Também é essencial à academia, bem como à sociedade, o debate

dessas questões – a democratização da comunicação e o papel que a mídia desempenha no

país –, visando à formação ética dos(as) profissionais que atuam na comunicação e que, ao

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entrar no mercado de trabalho, serão responsáveis por promover as mudanças aqui postas em

debate. As pesquisas em comunicação devem, sempre que possível, calcar-se na função social

da área. As transições ocorridas na imprensa ao longo dos anos devem ser atentamente

observadas para jamais a desvincular de seu propósito, que é o de comunicar por e para o

povo.

A partir das observações do cenário comunicacional posto em debate, essa pesquisa

pretende responder à seguinte questão: como uma reformulação da legislação brasileira pode

assegurar a democratização – e por consequência a representatividade de todos os grupos

sociais – dos meios de comunicação? Tal questão envolve uma comparação com a Lei de

Meios argentina, que embasa os argumentos e propostas para uma nova regulação das

comunicações brasileiras.

Com o fim de responder à questão, é objetivo geral do presente trabalho analisar o

caso da Lei de Meios, destinada a regular a imprensa na Argentina, com a finalidade de

estabelecer um comparativo com as leis brasileiras e descobrir se há a necessidade de

implementação de uma medida semelhante no Brasil, considerando o cenário histórico, social,

cultural e econômico do país. São objetivos específicos, dentro desse, compreender o processo

de elaboração e implementação da Lei de Meios, na Argentina; comparar o cenário da

Argentina e suas legislações específicas com o panorama brasileiro; analisar quais aspectos da

imprensa brasileira carecem de legislação – ou do cumprimento dela –; estudar a necessidade

de constituir uma regulação específica para a imprensa no país, quais pontos ela deveria

contemplar e como poder-se-ia torná-la eficaz em termos de representatividade da população

e democratização dos meios de comunicação no Brasil e realizar um apanhado dos variados

dispositivos da legislação brasileira destinados a regular a imprensa – Constituição Federal,

Lei de Imprensa, Código Brasileiro de Telecomunicações, Lei Geral das Telecomunicações,

Lei de Acesso à Informação e Marco Civil da Internet.

O método pelo qual a presente pesquisa é realizada consiste na Análise de Conteúdo

segundo Bardin (1997), bem como na pesquisa bibliográfica, segundo Barros e Junqueira

(2005), além de Stumpf (2005).

Para atingir os objetivos estabelecidos, a questão proposta foi dividida em quatro

tópicos que abrangem assuntos relativos à temática geral desse trabalho. São eles:

Comunicação para a democracia: a relação entre poder e responsabilidade; A ausência de

discursos plurais na imprensa brasileira; Legislação brasileira e Lei de meios: o caso da

Argentina.

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O primeiro deles, e segundo capítulo da presente pesquisa, Comunicação para a

democracia: a relação entre poder e responsabilidade, aborda o conceito de regime

democrático e o papel que a comunicação desempenha nele. O texto discorre acerca das

relações de poder constituídas na sociedade, a concentração do domínio dos veículos

midiáticos e o papel da internet no processo de democratização da comunicação, com base

nos textos de Bolaño (2007, 2008); Brittos (2008); Bucci (2012); Lima (2004) e Soares

(2006), bem como nos conceitos de cenário de representação política de Lima (2004) e

verdade como relação de poder de Foucault (2004).

O terceiro capítulo, A ausência de discursos plurais na imprensa brasileira, apresenta

ponderações sob a ótica da representatividade dos grupos sociais na mídia e tem como

principais referências os textos de Martín-Barbero (1997, 2004), bem como os conceitos de

opinião pública de Mateus (2008) e Champagne (1998); agenda-setting de Martino (2010) e

Hohlfeldt (1997) e indústria cultural de Martino (2010). Nele, são abordadas as relações da

comunicação com a preservação da cultura e com o entendimento do outro.

No quarto capítulo, Legislação Brasileira, são apresentadas as principais leis do país

que versam sobre a comunicação em um aspecto mais amplo – Constituição Federal, Lei de

Imprensa, Código Brasileiro de Telecomunicações, Lei Geral das Telecomunicações, Lei de

Acesso à Informação e Marco Civil da Internet. Além disso, discutem-se os códigos de ética

dos profissionais da comunicação – principalmente o dos jornalistas –, o cenário trazido pela

implantação da TV Digital e o projeto de lei de iniciativa popular para a regulação da mídia.

Destacam-se como referências do capítulo os autores Bolaño (2007), Martins (2007) e Ramos

(2000).

O quinto capítulo e último tópico teórico da presente pesquisa tem como tema a Lei de

Meios argentina, com base nas discussões de Lins (2009) e Marino; Mastrini; Becerra (2010),

entre outros. Nele são comentados os percalços ocorridos na implantação da lei, suas

premissas, artigos e alíneas, bem como as mudanças ocorridas no cenário comunicacional do

país após sua aprovação.

No capítulo seis são explicados os métodos utilizados na pesquisa, bem como suas

etapas. O sétimo capítulo apresenta a análise de conteúdo, na qual os pontos desenvolvidos ao

longo desse trabalho são interligados de modo a realizar-se uma imersão mais profunda na

questão proposta.

Esse trabalho tem o intuito de fomentar uma discussão imprescindível ao povo e,

especialmente, aos comunicadores, acerca do papel da comunicação na construção de uma

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sociedade ideal, justa e igualitária. Espera-se trazer à luz alguns problemas enraizados no

sistema midiático brasileiro e, por meio dessa discussão, contribuir com sugestões e caminhos

que possam resultar em uma transformação desse panorama. Como diz a conhecida frase,

grandes poderes vêm com grandes responsabilidades. Com a comunicação, não é diferente.

Há que honrar-se o poder de representar o povo, agindo com responsabilidade para com suas

necessidades e reivindicações.

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2 COMUNICAÇÃO PARA A DEMOCRACIA: A RELAÇÃO ENTRE PODER E

RESPONSABILIDADE

A democracia é um modelo de governo no qual as decisões são tomadas pelo povo, de

modo direto – por meio de assembleias e processos do gênero – ou indireto – por meio da

escolha de representantes para governar. De acordo com a Enciclopédia Intercom, ―[...] ela é

um valor que se caracteriza como: a inalienável tendência humana de assumir seu destino, do

ponto de vista individual ou coletivo‖. (HILL, 2010, p. 367).

A comunicação – aqui entendida não como processo cognitivo, mas como modo de

informação e representação da sociedade, mediado pela imprensa, tem uma intensa relação

com a manutenção da democracia em um Estado. A ela cabe a tarefa de auxiliar a população a

observar se os políticos escolhidos para representá-la agem de acordo com suas promessas e

deveres, bem como o interesse popular.

A democracia guarda, nos seus fundamentos, o princípio de que o poder emana do

povo e em seu nome é exercido. Disso resulta que, sem o livre fluxo de informações

e opiniões, o regime democrático não funciona, a roda não gira. A delegação do

poder e o exercício do poder delegado dependem do compartilhamento dos temas de

interesse público entre os cidadãos. (BUCCI, 2012, p. 113).

O Brasil encontra-se em regime democrático ininterruptamente desde 1985, quando

findou o período da Ditadura Militar no país e, constituindo-se, então, numa democracia

representativa, supõe-se que, de lá para cá, seja regido pela vontade do povo. Se isso

efetivamente ocorre em todas as esferas do governo do país, não é um questionamento que

cabe ao presente trabalho. Essa pesquisa tem como objetivo analisar se a democracia proposta

como regime de governo no país se estende aos meios de comunicação.

2.1 A COMUNICAÇÃO COMO ESPELHO DAS RELAÇÕES DE PODER

CONSTITUÍDAS NO ESPAÇO DE REPRESENTAÇÃO SOCIAL

A comunicação é o modo pelo qual as pessoas acessam as realidades que não

conhecem. Ela funciona, simultaneamente, como um espelho da sociedade e como sua

criadora. É isso que explica Venício A. de Lima (2004), ao definir o conceito de Cenário de

Representação Política (CR-P). Tal definição põe a mídia no centro da construção da

hegemonia, conceituando o espaço midiático específico de representação política – isso em

democracias representativas – como lugar e objeto das relações hegemônicas.

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[...] Um aspecto (não o único) que diferencia o CR-P da hegemonia é a ênfase no

papel central da mídia na construção do hegemônico [...], logo se manifesta uma das

implicações de seu caráter ―constituidor da‖ e ―constituído pela‖ realidade: as

―representações‖ que a mídia faz da ―realidade‖ (media representations) passam a

constituir a própria realidade. Aqui está o fundamento para a hipótese de que o CR-

P, construído na e pela mídia, define e delimita o próprio espaço da realidade

política no mundo contemporâneo. (LIMA, 2004, p. 186).

Devido a esse caráter bilateral da mídia – como constituidora da e constituída pela

sociedade –, ela impacta significativamente a estrutura social. Isso pode ser compreendido na

explicação do jornalista Eugênio Bucci – autor que trata, principalmente, da televisão no país

– sobre o papel da televisão como instrumentário indispensável à criação de uma identidade

nacional1.

O modelo de televisão que vingou no Brasil soube unificar o país no plano do

imaginário por cima de um alicerce (o plano do real) marcado por desencontros,

rupturas, abismos sociais. Conseguiu que um país desunido (real) se visse (se

imaginasse) unido. Mas esse alicerce, ainda que condenado à escuridão, não cessa de

existir. Ele se move e projeta suas dilacerações para o plano que se vê na TV.

(BUCCI, 1997, p.13).

Por meio da imprensa, a população busca conhecer o cenário nacional em sua

complexidade – cenário esse que, por questões geográficas, somente pode conhecer

virtualmente. Não apenas a esse propósito servem os meios de comunicação, como também

consiste em uma ferramenta de reivindicação social. Portanto, faz-se necessária uma mídia

que aja para os interesses e para a representatividade do povo, ou seja, uma imprensa

democrática.

A definição que Michel Foucault (2004) dá às relações de poder – que ele constrói

junto à noção de verdade – auxilia na elucidação da relação entre os meios de comunicação e

a manutenção da democracia. Para o autor, ―[...] a verdade não existe fora do poder ou sem

poder. [...] A verdade é deste mundo; ela é produzida nele graças a múltiplas coerções e nele

produz efeitos regulamentados de poder‖. (FOUCAULT, 2004, p. 12).

É nessa construção da verdade que a mídia se insere como um dos principais

mecanismos atuantes nas relações de poder social. Isso porque, ainda segundo Foucault:

1 O rádio foi utilizado para esse mesmo propósito, principalmente no período do primeiro mandato de Getúlio

Vargas (1930 – 1945). Getúlio influiu ―[...] sobre os meios de comunicação ao buscar impor o seu projeto

político que incluía a unificação nacional. Em 1º de maio de 1937 já destacava o valor que daria ao rádio, na

mensagem enviada ao Congresso Nacional que anunciava o aumento do número de emissoras no país‖

(HAUSSEN, 2004, p. 51).

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Cada sociedade tem seu regime de verdade, sua "política geral" de verdade: isto é,

os tipos de discurso que ela acolhe e faz funcionar como verdadeiros; os

mecanismos e as instâncias que permitem distinguir os enunciados verdadeiros dos

falsos, a maneira como se sanciona uns e outros; as técnicas e os procedimentos que

são valorizados para a obtenção da verdade; o estatuto daqueles que têm o encargo

de dizer o que funciona como verdadeiro. (FOUCAULT, 2004, p. 12).

A mídia é uma das mais importantes instituições responsáveis por esse processo. Ela

dissemina os discursos que compõem a verdade da população, por meio da produção de

significados a partir dos fatos por ela veiculados, constituindo-se, junto com a política, em um

espaço de representação social. Isso quer dizer que, nela, estão presentes os atores de

transformação social, as figuras politicamente relevantes, bem como as pautas por eles

reivindicadas. Portanto, a imprensa deve contemplar as diferentes realidades e manifestações

dos variados grupos sociais para que, no caminho de construção da verdade, não gere

preconceitos e estereótipos, contribuindo para a marginalização de integrantes da sociedade.

O contexto histórico dos meios de comunicação no país, bem como o controle desses

meios na atualidade, faz crer que a imprensa acima mencionada, feita do povo para o povo, de

modo a contemplar todas as realidades, não existe. As empresas de comunicação estão, em

sua maioria, aliadas a corporações ou partidos políticos que influenciam no agendamento de

suas pautas.

Historicamente algumas das características mais notáveis do nosso sistema de mídia

permanecem imutáveis: o monopólio familiar e a propriedade cruzada nos meios de

comunicação de massa, a pequena diversidade externa do ponto de vista político e o

viés conservador, a baixa circulação dos jornais associada ao baixo número de

leitores e, como conseqüência, no campo da grande imprensa, um jornalismo

orientado prioritariamente para as elites e permeável à influência dos públicos fortes.

(AZEVEDO, 2006, p. 2).

Partindo do ponto de que a mídia é, ao mesmo tempo, objeto e sujeito da sociedade,

pode-se concluir que ela é – ou deveria ser – um espelho das relações constituídas no espaço

social. Se, em um país democrático, os meios de comunicação atuam em meio a um

oligopólio2 que pouco demonstra em termos de representatividade, percebe-se um problema

de coerência: ou a mídia age contrariamente aos desejos da população, ou o governo o faz, ou

ambos. Em todo caso, nenhuma dessas situações condiz com instituições que se dizem

democráticas e representativas.

2 Monopólio é um fenômeno mercadológico no qual uma empresa controla a oferta de determinado produto ou

serviço. O oligopólio é similar, contudo, nele o controle é exercido por um grupo, e não apenas uma empresa.

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A comunicação midiática tem como função primordial ―vigiar o poder por meio da

investigação e disseminação das notícias e das ideias de interesse público, promovendo o

diálogo entre os integrantes do espaço público‖ (BUCCI, 2012, p. 115). É atribuição da

imprensa zelar pelo bom uso do poder por parte dos representantes escolhidos pela população

para guiá-la. Quando foge a esses deveres, a mídia abre mão da própria essência que a define

– a de comunicação social, ou seja, a serviço da sociedade.

Além disso, a falta de pluralidade na mídia, questão a ser explorada no próximo

capítulo, é outro ponto denota a falta de compromisso dos meios de comunicação com

questões relevantes para a população.

Em uma sociedade dividida em classes, os bens materiais e simbólicos nela

produzidos são apropriados por seus integrantes de forma desigual. A comunicação

não foge à regra. Seu controle se dá segundo os níveis de poder alcançados pelos

diferentes grupos sociais. (LEAL FILHO, 2010, p. 368).

2.2 A MÍDIA CONTROLADA E O OLIGOPÓLIO DAS COMUNICAÇÕES

Visto que a mídia, em uma democracia, tem um dever perante a sociedade de, em

primeiro lugar, atuar como fiscalizadora do governo e, em segundo lugar, refletir os anseios

do povo, o controle dos meios de comunicação é uma preocupação inerente à população, bem

como aos seus representantes políticos.

As liberdades de informação e de expressão postas em questão na atualidade não

dizem respeito apenas ao acesso da pessoa à informação como receptor, ao acesso à

informação de qualidade irrefutável, nem apenas no direito de expressar-se por

―quaisquer meios‖ – o que soa vago, mas de assegurar o direito de acesso do cidadão

e de suas organizações coletivas aos meios de comunicação social na condição de

emissores-produtores e difusores – de conteúdos. Trata-se, pois, de democratizar o

poder de comunicar. (PERUZZO, 2007, p. 11).

A não existência dessa democracia comunicativa no Brasil apenas pode ser entendida

mediante a análise de alguns pontos da regulação vigente no setor. O autor César Bolaño

(2007) analisa, na obra Qual a lógica das políticas de comunicação no Brasil?, alguns dos

processos que percorreram a legislação das telecomunicações no país – desde a criação do

Código Brasileiro de Telecomunicações (CBT), em 1962, até o governo Lula, iniciado em

2002 – que explicam as incertezas existentes quanto à extensão da democracia na mídia.

O CBT, uma das principais legislações envolvendo a imprensa no país, foi

promulgado pelo Congresso Nacional em 1962 e mantém-se até hoje em vigor, tendo passado

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por emendas desde sua promulgação. Como instrumento regulador destes que são os

principais meios de comunicação do país3 – rádio e televisão –, junto ao impresso, a

legislação retifica a hegemonia existente no setor ―[...] tal como foi constituída pela dinâmica

das lutas entre os atores relevantes no início dos anos 60 e, sobretudo, a partir de 19644‖.

(BOLAÑO, 2007, p. 5-6).

Para o autor, a implementação do Código foi resultado de um processo de negociações

que possuía, de um lado, o interesse educativo e cultural acerca da mídia e, do outro, o

comercial (2007).

[Houve] a consolidação, no país, diferentemente do que ocorrera em larga escala na

Europa, por exemplo, de um sistema comercial privado de rádio e televisão, com

base num modelo de concessões públicas – para 10 e 15 anos respectivamente,

renováveis por períodos idênticos e sucessivos –, ainda que preservando o direito da

União de executar serviço idêntico, dando preferência, no processo de outorgas, às

pessoas jurídicas de direito público, inclusive universidades. (BOLAÑO, 2007, p.

12).

No Brasil, o modelo de concessões adotado para as telecomunicações é de 10 e 15

anos, respectivamente, para rádio e televisão. ―Compete ao Poder Executivo outorgar e

renovar concessão, permissão e autorização para o serviço de radiodifusão sonora e de sons e

imagens, observado o princípio da complementaridade dos sistemas privado, público e

estatal‖ (BRASIL, 1988). Diferentemente de rádio e televisão, veículos impressos não

necessitam de licença de autoridade para operar.

O problema que deriva desse sistema de concessões públicas, muitas vezes levantado

pelos pesquisadores da comunicação no Brasil, revela-se justamente na falta de

representatividade, pois, sendo este espaço destinado às telecomunicações um espaço de uso

público, deveria ser usado em prol das massas e não, como o é atualmente, em sua maioria, a

favor dos grupos hegemônicos formados, principalmente, por proprietários de grandes

corporações e políticos.

3 Apesar de não ter a mesma credibilidade e importância das telecomunicações e do jornalismo impresso, a

internet é um mercado que cresce cada vez mais para o setor das comunicações. Até 2013, eram 31,2 milhões de

domicílios com acesso à internet, o correspondente a 48 por cento do total, segundo a Pesquisa Nacional por

Amostra de Domicílios, realizada pelo IBGE. Ainda conforme o documento, o índice de utilização da internet

era maior na faixa de 15 a 17 anos, na qual 75,7 por cento dos indivíduos utilizam a rede. ―Em todos os grupos

compreendidos na faixa de 10 a 39 anos de idade, o uso da Internet ultrapassava 50%‖. (IBGE, 2015). 4 A Ditadura Militar que teve início com o Golpe de 1964 perdurou até 1985. O período foi caracterizado por

forte repressão e censura que, até certo ponto, eram corroboradas pela legislação. BOLAÑO (2007, p.17) ressalta

que ―[...] o modelo de regulação do audiovisual gestado nos anos 60, é nacionalista e concentracionista. Ao

mesmo tempo em que protege os capitais instalados da concorrência externa, limita a manifestação das

expressões locais e o desenvolvimento de um panorama audiovisual diversificado, servindo basicamente aos

interesses políticos e econômicos hegemônicos que se articulam no seu interior‖.

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O sistema privado não se pode eximir das obrigações de serviço público, visto tratar-

se de concessão pública, exigindo, no caso dos países plenamente democráticos,

contratos de concessão, cadernos de encargos e controle público sobre os conteúdos,

de modo a evitar as distorções conhecidas no mercado brasileiro: censura privada e

manipulação. (BOLAÑO, BRITTOS, 2008, p.10).

Com o fim do Regime Militar e o período de transição democrática, a comunicação

entrou em discussão na Assembleia Nacional Constituinte, com a Associação Brasileira de

Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) defendendo, de um lado, os interesses da iniciativa

privada sobre o meio, e a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), de outro, que propunha

a criação do Conselho Nacional de Comunicação, buscando a exploração das

telecomunicações no país por organizações sem fins lucrativos. Pouco foi conquistado em

comparação à legislação anterior, estabelecendo-se que a exploração poderia ser feita por

entidades privadas, públicas e estatais, sendo que as concessões e renovações outorgadas pelo

Poder Executivo teriam de ser aprovadas pelo congresso (BOLAÑO, 2007).

A partir dessa breve contextualização dos embates que permearam a regulação das

telecomunicações – mas que podem ser estendidos à comunicação em um âmbito geral –,

pode-se perceber a grande influência exercida pelo grupo de interesse composto,

principalmente, por empresários da comunicação e políticos, na formação de leis que

deixassem o setor das comunicações livre para a iniciativa privada fazer dele o que bem

entendesse. O resultado disso é a consolidação, no Brasil, de uma imprensa elitista moldada

aos objetivos de grupos hegemônicos, dominada por um oligopólio que abre muitas brechas à

censura econômica – e política, pois ―muitos parlamentares são proprietários ou sócios de

veículos de radiodifusão ou, então, têm o controle de veículos registrados em nome de amigos

ou parentes (SOARES, 2006)‖ – e à manipulação das massas.

Um dos aspectos mais destacados da comunicação é a tendência para a

oligopolização dos meios, apesar de ser expressamente proibida pela Constituição

brasileira. A concentração mediática no Brasil ocorre em três níveis: da propriedade,

da audiência e da distribuição da verba publicitária pelas agências. (SOARES, 2006,

p. 121).

A regulação que se quer para a imprensa no Brasil combateria, principalmente, o

oligopólio no âmbito da propriedade. Estima-se que apenas sete famílias controlam a maior e

mais relevante parcela dos meios de comunicação brasileiros – número que pode variar para

dez ou 11, de acordo com cada pesquisador. São elas: Abravanel (Sistema Brasileiro de

Televisão), Civitta (Grupo Abril), Frias (Grupo Folha), Macedo (Rede Record), Marinho

(Grupo Globo), Mesquita (Grupo Estado) e Saad (Rede Bandeirantes).

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Atualmente, existem 9477 veículos de comunicação no Brasil, segundo o site Donos

da Mídia5. Desses, 2421 pertencem a redes e são, em sua maioria, os que concentram a maior

parte da audiência de sua região/público-alvo, uma vez que contam com mais investimento e

alcance do que seus pares independentes. De acordo com uma reportagem publicada no site

da revista The Economist6, em julho de 2014, a audiência da Rede Globo supera, em muito,

seus maiores concorrentes:

Não menos que 91 milhões de pessoas, pouco menos da metade da população,

sintonizam o canal todo o dia: o tipo de audiência que, nos Estados Unidos, é

esperada apenas uma vez ao ano, e somente para a rede que conquistou os direitos

de transmissão do campeonato de futebol americano Super Bowl. A Globo

certamente é o mais poderoso conglomerado do país, dado o alcance que possui. Sua

mais próxima concorrente na televisão aberta, a Record, tem um share de apenas

cerca de 13 por cento da audiência. (ECONOMIST, 20147).

Figura 1 – Redes e veículos de comunicação existentes no Brasil

Fonte: www.donosdamidia.com.br.

Segundo o site Donos da Mídia, algumas das maiores redes de comunicações do Brasil

são: Rede Globo de Televisão e afiliados, com 340 veículos; Sistema Brasileiro de Televisão

5 De acordo com o próprio site (donosdamidia.com.br), ―o projeto Donos da Mídia reúne dados públicos e

informações fornecidas pelos grupos de mídia para montar um panorama completo da mídia no Brasil‖. 6 Publicação semanal inglesa dedicada a assuntos internacionais.

7 O trecho da reportagem aqui citado foi traduzido livremente pela autora dessa pesquisa.

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e afiliados, com 195 veículos; Rede Bandeirantes de Televisão e afiliados, com 166 veículos;

Rede Record e afiliados, com 142 veículos; Empresa Brasil de Comunicação – administrada

pelo Governo Federal – e afiliados, com 95 veículos; Grupo Abril, com 74 veículos; Rede

Novo Tempo de Rádio e afiliados, com 14 veículos, e Canção Nova e afiliados, com 12

veículos. Ben H. Bagdikian (1993) analisa, no contexto estadunidense, os efeitos dessa

concentração midiática:

Quando corporações compram um monopólio local ou o domínio de um mercado,

são poucas as que conseguem resistir aos lucros espetaculares que podem ser

atingidos com os cortes na qualidade e a elevação do preço. [...] Essas mesmas

corporações, quando expandem seu controle sobre muitos tipos diferentes de meios

de comunicação, defendem-se ardorosamente, dizendo que proporcionam ao público

opções mais variadas e ricas no que diz respeito a notícias e entretenimento.

Entretanto, a experiência demonstra que o controle comum de meios de

comunicação diferentes torna-os mais repetitivos do que nunca (BAGDIKIAN,

1993, p. 27-28).

A análise que o autor faz da imprensa nos Estados Unidos também pode ser aplicada

ao Brasil, visto que a comunicação no país é marcada pelo oligopólio e pela falta de discursos

plurais. O que se vê, muito pelo contrário, é um discurso único, no qual todos os veículos

integrantes desse oligopólio adotam a mesma postura diante dos acontecimentos. Podem-se

perceber, em uma mesma empresa, diversas notícias que são ―recicladas‖ por diferentes

veículos. Em 27 de março de 2015, por exemplo, uma notícia em comum compunha a

homepage do g1.com8 e do site do jornal Zero Hora

9, bem como a página inicial da seção de

economia do site do jornal Pioneiro10

(ver anexos A, B e C). Sob o título ―Economia brasileira

cresce 0,1% em 2014, diz IBGE‖, no G1, e ―Economia cresce 0,1% em 2014, pior resultado

desde 2009‖, nos portais do Zero Hora e Pioneiro, a notícia é construída de forma similar nos

três veículos. De fato, nos dois portais do Grupo RBS, o conteúdo publicado é integralmente o

mesmo.

Com poucas diferenças entre os distintos veículos, a matéria denota como o argumento

utilizado, criticado por Bagdikian (1993), é falho. Quando as empresas de comunicação

expandem seu controle a diversos veículos, de diferentes tipos ou até mesmo para diferentes

localidades, o resultado não é uma maior e mais rica gama de opções, mas um conteúdo cada

vez mais unificado.

8 Portal de notícias da Globo.

9 Jornal de Porto Alegre (RS), pertencente ao grupo RBS, afiliado ao Grupo Globo.

10 Jornal de Caxias do Sul (RS), também pertencente ao Grupo RBS.

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Além da falta de uma real variedade de oferta, outro problema que surge em um setor

dominado por oligopólios é a dificuldade que as empresas menores têm ao concorrer por uma

fatia do mercado. Isso porque os oligopólios dispõem, devido ao seu poder econômico, de

várias ferramentas que possibilitam a redução do custo de seus produtos.

Algumas empresas de comunicação, por exemplo, além de serem produtoras de

conteúdo, são proprietárias de empresas que fazem sua distribuição, estão envolvidas com

bancos e políticos, além de possuírem diversos veículos que contribuem com a publicidade

uns dos outros. As empresas independentes, que não possuem tal poder econômico,

encontram dificuldades em fazer alianças e, geralmente, têm custos de produção maiores.

Esse cenário faz com que, mesmo que elas consigam se estabelecer no mercado, jamais

alcancem público semelhante ao dos veículos controlados pelos grandes grupos de

comunicação midiáticos11

.

A centralização da informação tem outro profundo impacto social, que deriva dessa

falta de discursos variados na mídia:

Vivemos num mundo dinâmico onde a ignorância das mudanças políticas e

econômicas destrói a democracia e a elaboração de decisões inteligentes. É de seus

jornais, revistas, rádio, televisão, livros e cinema que os americanos, assim como a

maioria dos povos, recebem as imagens do mundo. A mídia de massa torna-se a

autoridade que, a qualquer momento, dita o que é verdadeiro e o que é falso, o que é

realidade e o que é fantasia, o que é importante e o que é trivial. Não existe força

maior capaz de moldar assim a ―cabeça‖ do público; mesmo a força bruta só triunfa

quando consegue gerar uma atitude de aceitação em relação aos brutos

(BAGDIKIAN, 1993, p. 13-14).

O resultado desse processo é, portanto, uma agenda nacional pautada pelos fatos e

opiniões veiculados por meio dos grandes conglomerados de mídia. Esses, por sua vez, são

pautados por interesses próprios, que advêm, em parte, das empresas que compõem o bolo

publicitário de seus veículos.

O mercado publicitário brasileiro movimentou um total de R$ 30.776 milhões entre

os meses de janeiro e novembro de 2014. [...] Na divisão do bolo publicitário, a TV

aberta continua angariando a maior fatia, detendo quase 70% do faturamento dos

meios do País. Os jornais continuam na segunda posição, com 8,5% de participação,

seguidos da TV por assinatura, com 5,9% e o Rádio, com 3,9%. (TUDO

RÁDIO.COM, 2015).

11

Esse é um cenário que se modifica com o auxílio da internet, onde os custos de distribuição e, até mesmo, de

produção, são bem menores.

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Além das empresas, os meios são pautados, também, por políticos que com eles

mantêm uma relação de mútuo auxílio. Por consequência, a imprensa – que deveria ser

norteada pelo interesse público – torna-se um campo fértil para jogos de poder e prospecções

econômicas.

2.3 O PRIMEIRO PASSO

Por consequência do modelo midiático adotado no país, surge, principalmente a partir

da década de 1980, uma expressão nacional do movimento mundial por uma nova ordem da

informação e comunicação. A mobilização busca ―[...] ampliar o número de atores envolvidos

na produção, difusão e circulação de informações‖ (LEAL FILHO, 2010), defendendo o livre

acesso à informação e à comunicação, a presença da diversidade étnica e cultural na grande

imprensa, além de conteúdo interessante e de qualidade, livre de censura, para a população.

O movimento teve início, no país, por meio de um grupo de professores do curso de

comunicação social da Universidade Federal de Santa Catarina, que lançou a Frente Nacional

de Lutas por Políticas Democráticas de Comunicação – incorporada posteriormente pela

Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Comunicação (Abepec) e pela Fenaj.

Atualmente, as frentes mais mobilizadas em prol da democratização da comunicação são o

Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) e o Coletivo Intervozes

(LEAL FILHO, 2010).

Contudo, essas são lutas que pedem uma profunda modificação nas estruturas de um

sistema há muito enraizado nos meios de comunicação brasileiros. Como explica Soares,

(2006, p. 120):

As políticas democráticas de comunicação só vieram a ser discutidas na década de

1980, quando os modelos operacionais já estavam consolidados, os canais

concedidos e os meios já solidamente estabelecidos, sob a forma de empresas e

redes poderosas e influentes.

Para viabilizar essas mudanças, seria preciso uma revisão nos critérios utilizados para

outorgar as concessões para rádio e televisão, bem como a fiscalização do controle das

empresas midiáticas em uma ―força-tarefa‖ de combate ao oligopólio. Contudo, esse seria

apenas o começo do processo, visto que não basta distribuir o controle da comunicação no

país de forma justa sem a análise e criação de políticas que aprimorem o conteúdo atualmente

oferecido por esses meios.

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Ainda assim, o primeiro passo para iniciar um processo de democratização na

comunicação brasileira consiste em romper com o oligopólio, dada a influência que ele exerce

na estagnação da discussão sobre as políticas públicas envolvendo o assunto e o bloqueio que

impõe ao acesso da população a essas informações.

Quanto maior a concentração dos meios de comunicação, menor a quantidade de

grupos que podem ter acesso a eles, resultando na redução virtual da liberdade de

expressão da sociedade, cujo exercício efetivo fica restrito às famílias detentoras dos

oligopólios de meios existentes. No entanto, todas as vezes que se discute a

necessidade de regulação das comunicações, os empresários do setor se defendem

com o argumento de ameaças de restrições à liberdade de expressão, de censura dos

meios, recusando a discussão. (SOARES, 2006, p.125).

Soares (2006) explica que as mudanças ocorridas na sociedade devidas à televisão,

pelo impacto e dimensão que o meio alcançou, culminaram no reconhecimento do potencial

que possui a comunicação para a educação e o desenvolvimento social. Por esse motivo, na

década de 1970, esse debate chegou à Organização das Nações Unidas para a Educação, a

Ciência e a Cultura (Unesco) e gerou o início da discussão sobre as políticas públicas

destinadas a regular os meios de comunicação. Essa questão foi barrada, entretanto, por uma

concepção de que o controle dos meios de comunicação por parte do estado consiste em um

mecanismo de censura, criado para coibir a liberdade de opinião e de imprensa. Entende-se

que a aceitação a esse argumento implica em oferecer ao oligopólio detentor da comunicação

a justificativa perfeita para manter seu império e continuar a impedir que as diversas esferas

sociais encontrem um meio de representação perante a sociedade.

A criação de ferramentas que deem ao Estado os meios de regular o controle

econômico das comunicações, bem como o espaço que eles destinam à informação e

expressão da população, não necessariamente implica em censura. A intenção é, justamente, o

contrário. Busca-se, com um maior controle dos processos e da propriedade desses meios,

promover o acesso de todos à comunicação, democratizá-la.

[...] a necessidade ou não de regulação de qualquer setor e a intensidade e o formato

dessa regulação estão condicionadas justamente ao poder potencial que tal setor tem

para mudar as preferências da sociedade e dos governantes. [...] Portanto, à medida

que, ao longo da história, crescem a presença e influência dos meios de comunicação

de massa sobre a sociedade, aumenta a necessidade de o Estado regular este poder.

Não para definir o que as emissoras podem ou não podem dizer, mas para garantir

condições mínimas de operação do serviço de forma a manter o interesse público – e

não o lucro das empresas – em primeiro lugar. (INTERVOZES, 2014).

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O que se pretende não é o controle sobre a informação, mas proporcionar ao Estado

mecanismos para impedir a centralização da comunicação, porque isso deixa um poder muito

grande nas mãos de poucas empresas que raramente se preocupam em honrar a

responsabilidade social que vem com ele.

2.4 O PAPEL DA INTERNET

Na virada do milênio, o surgimento da internet e a rápida ascensão da plataforma

alavancaram a discussão sobre a democratização das comunicações, dada a possibilidade das

massas atuarem não mais apenas como receptoras, mas também como produtoras de

informação. Com a web foi possível, pela primeira vez, vislumbrar um processo horizontal de

comunicação na sociedade.

A partir da metade dos anos 1990, a expansão da Internet concretiza um modelo de

comunicação em rede – horizontal, retroalimentável, plural – e coloca novas

questões: o copyleft12

na luta contra a propriedade intelectual e a favor da

socialização do conhecimento, o ciberativismo13

como mobilização social global, as

mídias táticas como atuação política que passam a marcar a ascensão de novas

reflexões quando imagens, músicas, palavras e ideias se desatrelam de seus suportes

materiais e passam a correr o planeta. (PINHEIRO; SILVA, 2005, p. 166).

Ao perceber aí uma brecha democrática, teve início um combate à manipulação da

informação e à ausência de muitos grupos sociais na grande imprensa.

Embora não tenha sido objeto das lutas anteriores, a Internet teve um impacto

generalizado na abertura da comunicação, por meio da disponibilização de

informações a baixo custo por sites pessoais, organizações, movimentos e entidades,

de forma livre e independente. Assim, do ponto de vista social, a Internet é um

estímulo ao protagonismo, à pluralidade, diversidade, favorecendo a crítica e

disseminando-a. (SOARES, 2006, p. 132).

12

O movimento copyleft é contra a propriedade intelectual e o copyright. Ele tem como principal mote a

democratização da informação, de qualquer mídia ou plataforma. Foi essa articulação que deu origem à ―[...]

Internet-Livre, pensada como uma rede aberta para livre circulação de informação. Isso possibilitou mais tarde

que diversos movimentos sociais constituíssem redes ativas no espaço da Internet‖ (PINHEIRO; SILVA, 2005,

p. 167). 13

O ciberativismo é uma prática que se forma em torno de três elementos. O primeiro deles é o discurso, que

envolve a premissa de empoderamento do povo. O segundo são as ferramentas que possibilitem ao indivíduo

tomar parte no movimento, fazer algo para levantar a causa – tais ferramentas vão desde arquivos transmitidos

pela internet com conteúdos relativos à causa até softwares livres. O terceiro é a visibilidade, uma vez que, para

um movimento social constituir-se como tal, os indivíduos adeptos da causa devem reconhecer seus pares,

unindo seus esforços. (UGARTE, 2007).

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Essas novas práticas sociais desenvolvidas com o amparo da internet auxiliaram na

articulação de grupos que se uniram para reivindicar as mais diversas pautas, no Brasil e no

mundo. Um dos resultados disso está nas manifestações que mobilizaram o país em junho de

2013 e março de 2015. Milhares de pessoas foram às ruas, em diversas cidades brasileiras,

para dar voz a opiniões e anseios da população que, há tempos, compunham a agenda das

mídias sociais digitais.

Essas redes de relacionamento virtuais conquistaram, no Brasil, um de seus maiores

públicos. O país disputa um dos primeiros lugares no ranking de usuários de ferramentas

como o Facebook o Twitter14

, que protagonizaram movimentos de expressão mundial como a

Primavera Árabe – responsável por derrubar diversos regimes ditatoriais no Oriente Médio e

na África, ao longo dos últimos cinco anos.

[...] a rede das redes de computadores, com abrangência planetária, propiciou o

aumento da oferta de informação gratuita em todos os setores e viabilizou a

emergência da interatividade em diversos graus. Os blogs, o jornalismo online, as

páginas dos movimentos sociais são algumas das novas possibilidades

comunicativas críticas e alternativas que revelam a Internet como um novíssimo

protótipo de comunicação, cujo princípio é o da interatividade. Com sua

implantação, a discussão se deslocou para as políticas de inclusão digital, visando a

estender a rede às maiorias, como condição de efetivação do seu potencial

democratizante, para que o fosso tecnológico não se alargue entre ricos e pobres,

trazendo mais desvantagens ainda para estes últimos. (SOARES, 2006, p. 132-133).

As minorias, antes esquecidas pelas grandes corporações midiáticas brasileiras,

encontram na internet um meio de expressar-se e de assegurar a sua participação na vida e nos

processos sociais. Certamente, as empresas integrantes do oligopólio comunicacional também

perceberam o potencial da rede e infiltraram-se, com sucesso, nela. Os sites de notícias mais

acessados são, geralmente, os veículos online das principais redes de comunicação do país.

Contudo, a proliferação de entidades e portais de mídia independentes é um fenômeno que

continua a ocorrer, e eles conquistam cada vez mais visibilidade, principalmente por meio do

compartilhamento de conteúdos na rede. Esses portais dão início ao que há muitos anos se

luta para proporcionar nas telecomunicações: a diversidade de informação e, finalmente, a

efetiva democracia que, no país, existe apenas no papel.

14

De acordo com o site Statista, em maio de 2014, o Brasil possuía 70,5 milhões de usuários no Facebook, atrás

apenas de Estados Unidos e Índia (STATISTA, 2014). No mesmo período, de acordo com o site da revista

Forbes, o Brasil era o 5º país em número de usuários do Twitter, atrás de Estados Unidos, Reino Unido, Canadá

e Austrália (LIPMAN, 2014).

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3 A AUSÊNCIA DE DISCURSOS PLURAIS NA IMPRENSA BRASILEIRA

Ao considerar-se o Brasil um país continental cuja população é composta por uma

grande miscigenação de etnias e classes, torna-se imprescindível pensar-se na

representatividade dos grupos sociais em quaisquer esferas do ambiente social. Aborda-se,

para os fins dessa pesquisa, a necessidade da presença da pluralidade especificamente nos

meios de comunicação.

De início, vale a pena destacar duas conclusões. Em primeiro lugar, o fato de que a

diversidade e o pluralismo são valores que é bom fomentar e não restringir. [...] Por

outro lado, a eficácia das medidas encaminhadas a melhorar a forma e o conteúdo da

comunicação dependem muito diretamente das que tendem a fazer com que a

sociedade seja menos opressora e mais equitativa, mais justa e mais democrática.

(UNESCO, 1983, p. 28).

A premissa citada acima, presente no documento conhecido como Relatório

MacBride15

, reflete a necessidade da existência de discursos plurais na mídia, em consonância

com o desejo de contribuir para a manutenção de uma sociedade democrática. Ao estabelecer

uma relação entre ―a forma e o conteúdo da comunicação‖ e os valores construídos na

sociedade, o relatório demonstra como as práticas e discussões fomentadas pela opinião

pública estão intimamente interligadas à mídia. Quando grupos não hegemônicos têm seu

acesso vedado aos meios de comunicação e, por consequência, ficam impedidos de manifestar

suas reivindicações e opiniões às massas, percebe-se uma atitude que fere os princípios da

democracia, para a qual o que deveria prevalecer é a vontade do povo.

Para se perceber a importância da questão plural na mídia, cabem algumas

ponderações sobre a constituição da população brasileira – os diferentes grupos sociais e

minorias que a compõem – que são fundamentais para a análise de quão representativa a

mídia de fato é e quais grupos, classes e etnias ela falha em representar. Segundo dados do

Censo de 2010, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil

possuía, até a data, 190.755.799 habitantes - 93.406.990 homens e 97.348.809 mulheres.

Desses, ―[...] 91 milhões se classificaram como brancos (47,7%), 15 milhões como pretos

(7,6%), 82 milhões como pardos (43,1%), 2 milhões como amarelos (1,1%) e 817 mil

indígenas (0,4%)‖. Os resultados do Censo mostraram ainda que, no país, havia 14,6 milhões

15

Publicado no Brasil sob o título de Um Mundo e Muitas Vozes, o Relatório MacBride – assim chamado em

virtude de Seán MacBride, presidente da comissão que produziu o documento – foi resultado da Conferência

Internacional sobre Planejamento da Educação, ocorrida entre 6 e 14 de agosto de 1968, em Paris. O evento,

realizado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), contou com a

presença de 95 países, além de outros órgãos internacionais, intergovernamentais e não-governamentais.

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31

de pessoas de 10 anos ou mais de idade que não sabiam sequer ler e escrever um bilhete

simples, sendo de 9,0% a taxa de analfabetismo deste contingente.

Mulheres, que são a maioria da população no país, muitas vezes não são representadas

na mídia e, quando o são, geralmente sofrem discriminação de gênero. Dos mais de 190

milhões de habitantes, apenas 91 milhões declaram-se brancos. Contudo, esse ainda é o grupo

mais retratado na mídia. Os outros, quando são comentados, aparecem como personagens

marginalizados, de caráter duvidoso ou em posições de pouca importância. Os analfabetos

também não se encontram em situação melhor, uma vez que são muitas vezes

desconsiderados em suas opiniões e aspirações. Em época de eleições, principalmente para

presidente e governadores, apenas os candidatos com mais pontos nas pesquisas – e

geralmente de partidos maiores – recebem espaço e são comentados nos meios de

comunicação16

.

Outro ponto importante na questão da pluralidade na mídia é a falta de regionalismo,

uma vez que os telejornais e grandes diários de circulação estadual e nacional, por exemplo,

pouco representam as cidades do interior, que muitas vezes têm de contentar-se com aparições

esporádicas na televisão e informações a seu respeito apenas nos jornais locais. Esses são

apenas alguns dos grupos contidos na miscigenação da sociedade brasileira e já denotam a

falta de um discurso plural no sistema midiático.

Estamos em presença de um social heterogêneo, no qual nem indivíduos nem grupos

parecem reconhecer valores coletivos. Este contexto dá origem a múltiplos arranjos

societários, a múltiplas lógicas de condutas. Predominando tal situação, é válido

falar em sociedade fragmentada, plural, diferenciada, heterogênea, tanto no âmbito

material – das organizações e dos movimentos sociais – quanto no simbólico, no

qual diferentes sistemas de valores vivem e convivem de forma mais ou menos

autônoma. (PORTO, 2002, p. 158).

Em democracias marcadas por conflitos de interesses políticos, econômicos e culturais

entre as diferentes classes sociais, como é o caso do Brasil, a mídia desempenha um papel

fundamental na inserção ou exclusão de determinadas pautas da opinião pública e, por

consequência, nos debates fomentados nos diversos ambientes e camadas da sociedade

(AZEVEDO, 2006).

[...] diversos temas e questões competem entre si para obter atenção da opinião

pública e só se transformam verdadeiramente em questões públicas quando ganham

visibilidade nos meios de comunicação de massa. Há, assim, na arena midiática,

uma disputa incessante entre as várias agendas postas em circulação por diversos

16

Exclui-se nessa ponderação o horário eleitoral gratuito e os debates.

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32

atores sociais e políticos, inclusive a própria imprensa [...]. Portanto, a

visibilidade/invisibilidade dos atores, temas e demandas dependem em larga medida,

no regime democrático, do grau de pluralidade externa existente no sistema de mídia

ou da pluralidade interna praticada em cada jornal, revista ou emissora de TV e

rádio. (AZEVEDO, 2006, p. 11).

3.1 A MÍDIA E A FORMAÇÃO DA OPINIÃO PÚBLICA

A opinião pública (OP) é um conceito que passa por diversos debates e divergências

entre os autores que o abordam. Parece, contudo, haver uma concordância entre os

pesquisadores recentes de que ela não se trata de um consenso, mas um conjunto formado por

diversas opiniões individuais. A OP possui uma estreita relação com o poder público e, apesar

de já ter sido por ele rejeitada, os governos atuais possuem a preocupação de serem

benquistos por ela.

A opinião pública política fundamenta-se na esfera privada, mais propriamente na

sociedade civil, e é constituída pelos indivíduos particulares reunidos em público

que fazem ouvir a sua voz através de uma comunicação política expressa como

opinião pública, tida esta como produto do raciocínio público sobre os assuntos

públicos. (MATEUS, 2008, p. 61-62).

Patrick Champagne (1998), ao analisar a história da opinião pública, reflete que ela

passou por diversas alterações em seu conceito, desde um momento em que era produto

apenas do que pensavam intelectuais e uma pequena elite da sociedade – por volta do século

XVIII –, até o século XX, onde as transformações sociais e revoluções ocorridas até então

acabaram por situar o povo como participante ativo em sua construção. Apesar dessas

mudanças, o papel da opinião pública no espaço social permanece, essencialmente, o mesmo:

conferir legitimidade ao governo e suas políticas, bem como às manifestações populares. De

acordo com o autor, ―[...] os profissionais da política tentam impor seu ponto de vista ao

maior número possível de pessoas ou, pelo menos, procuram reapropriar-se da visão do

mundo social que, segundo eles, é a do maior número de cidadãos‖. (CHAMPAGNE, 1998, p.

21).

Todos os governos e sistemas necessitam, para manterem-se estáveis, de legitimação

por quem é a eles submetido, seja ela obtida por meio da força, da manipulação ideológica,

ou, como o é em governos democráticos, pela escolha do povo. Se a opinião pública voltar-se

contra eles, se pode tomar por certo que, em algum momento, revoltas começarão a surgir.

Um exemplo disso pode ser percebido na conjuntura atual do Brasil que, face aos escândalos

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33

de corrupção que vieram à tona nas duas últimas décadas, começa-se a perceber uma opinião

pública crítica, principalmente, ao sistema político do país.

Enquanto a legitimidade que está associada ao princípio da autoridade é frágil

porque se apoia em uma imposição externa e visível e tende naturalmente para o

autoritarismo puro e simples, pelo contrário, aquela que deriva da ―opinião pública‖

é muito mais poderosa na medida em que se trata de uma imposição aparentemente

interna: é aquela que os próprios indivíduos reconhecem porque faz apelo somente

ao raciocínio e à persuasão. (CHAMPAGNE, 1998, p. 50).

Os meios de comunicação têm uma profunda relação com a opinião pública na medida

em que constroem o panorama político que dá, ao povo, as ferramentas para formá-la. Noam

Chomsky (2003) comenta, em Controle da mídia: os espetaculares feitos da propaganda, o

modo como se dá essa relação. De acordo com ele, a propaganda teve muito êxito, nos

Estados Unidos (contexto de análise da obra), em conduzir a opinião pública ao longo dos

anos, articulando as opiniões da massa em torno de dois motes: o uso de slogans vazios que

pouco incitavam à reflexão e por consequência obtinham a aprovação do público, bem como o

isolamento dos indivíduos.

O processo de manipulação da opinião pública funcionava, então, da seguinte forma: a

propaganda utilizava recursos como o slogan ―apoie nossas tropas‖ que, ao invés de propor a

real questão – que seria ―você concorda com a nossa política‖, ou ainda, ―você acha que

devemos investir em militarização‖ –, mascarava o questionamento com um lema ao qual

ninguém seria contrário, moldando a opinião pública ao seu favor. Por consequência, quem se

dedicasse a uma reflexão mais profunda sobre o tema e não concordasse com essa posição

adotada pela opinião pública, se absteria de manifestar-se por presumir ser o único com tal

opinião e, dessa forma, alienar-se-ia da conjuntura política do momento (CHOMSKY, 2003).

Obviamente há uma determinada concepção por trás disso tudo. [...] O rebanho

assustado é que é o problema. Temos que ignorar o seu clamor e evitar sermos

atropelados. Temos que o distrair. Ele deve ficar assistindo ao Superbowl17

, a

seriados de humor ou vendo filmes violentos. De vez em quando nós o convidamos

a repetir slogans sem sentido como ―apoiem as nossas tropas‖. Temos que mantê-lo

bastante assustado porque a menos que esteja adequadamente amedrontado e

intimidado com todo o tipo de ameaças, capazes de o destruir interna ou

externamente, ele pode começar a pensar, o que é muito perigoso, porque ele não

tem discernimento para isso. Por isso é importante distraí-lo e marginalizá-lo.

(CHOMSKY, 2003, p. 25).

17

Campeonato Nacional de Futebol Americano.

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34

Esse processo de manipulação da opinião pública, decorrente de uma visão ―menos

democrática‖ da democracia, é possível sob duas circunstâncias: os esforços propagandísticos

envolvidos e o apoio da mídia na propagação de tais discursos. O problema principal

encontra-se, portanto, na veiculação do discurso propagandístico pronto, sem opiniões

diversas que tragam contrapontos e possibilitem ao espectador uma reflexão consciente e

bem-informada acerca dos assuntos de interesse público.

À medida que o setor das comunicações de massa representa o que ocorre na

sociedade e essas representações são tomadas como a própria realidade para a opinião

pública, a representatividade de todos os grupos sociais na imprensa faz-se fundamental para

que suas lutas e demandas não se tornem invisíveis perante as demais reivindicações feitas

por grupos hegemônicos da sociedade. Quando tal pluralidade não chega à mídia, esses atores

sociais encontram-se impossibilitados de desempenhar seu papel como integrantes da

sociedade e, por consequência, seu direito e dever de cidadania.

Esse é, de modo geral, o cenário encontrado no Brasil. A grande concentração dos

meios de comunicação nas mãos de poucas famílias, a pouca exploração das

telecomunicações para fins culturais e educativos e a recorrente falta de crítica das mensagens

veiculadas pela mídia são alguns dos fatores que agravam essa situação. Com relação ao

oligopólio comunicacional, isso se dá devido a uma falta de interesse dos proprietários que

utilizam os meios de comunicação – muitos deles derivados de concessões públicas – para

defender as próprias ideologias, interesses e, claro, beneficiar seus parceiros comerciais.

Quanto aos veículos de comunicação geridos por entidades educativas, eles carecem de

competitividade face às emissoras e jornais comerciais que, de modo geral, possuem mais

recursos e estrutura, bem como uma audiência já consolidada. Por fim, a falta de crítica por

parte da população, que vê a mídia como uma instituição livre de corrupção e que age em prol

de interesses públicos – o que de fato deveria, mas não o faz – torna a falta de

representatividade mais grave, uma vez que os estereótipos e ideias divulgados são, por vezes,

aceitos sem um maior questionamento acerca de sua veracidade.

3.2 A HIPÓTESE DO AGENDA SETTING

A hipótese do agenda setting – corrente das teorias da comunicação – é fundamental

para compreender a relação entre a pluralidade discursiva e as comunicações. Ela é

apresentada aqui, em detrimento de outras teorias, devido à relação que possui com a

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35

representatividade social nos meios de comunicação e sua importância para as reflexões

apresentadas nessa pesquisa.

O conceito de ―agenda‖ refere-se a um grupo definido de temas discutidos em lugar

e tempo específicos. Assim, a ―agenda da mídia‖ são os temas presentes nos meios

de comunicação; ―agenda pública‖ são temas e assuntos presentes nas conversas

entre as pessoas. O modelo do Agenda-Setting prevê que os temas da agenda da

mídia definem a agenda pública, isto é, passarão a ser discutidos pelas pessoas uma

vez pautados pela mídia (MARTINO, 2010, p. 203).

O agendamento midiático opera, segundo Antonio Hohlfeldt (1997), sobre três

principais pressupostos: (a) de que a população recebe uma remessa massiva de informações

todos os dias e estas, armazenadas automaticamente, são simplesmente externalizadas em

algum momento; (b) que a influência dos meios de comunicação não se dá a curto, mas a

médio e longo prazos, observando-se o tempo decorrente desde o lançamento da informação

na mídia e a culminância em uma atitude por parte do receptor e (c) que a mídia, apesar de

não ser capaz de impor stricto sensu um modo de pensar, é capaz de influenciar o receptor na

medida em que determina suas pautas.

[...] dependendo dos assuntos que venham a ser abordados – agendados – pela

mídia, o público termina, a médio e longo prazos, por incluí-los igualmente em suas

preocupações. Assim, a agenda da mídia termina por se constituir também na agenda

individual e mesmo na agenda social. (HOHLFELDT, 1997, p. 44).

Os assuntos pautados pela mídia não são, certamente, os mais importantes temas da

agenda de cada indivíduo. Contudo, eles tendem a ocupar uma posição intermediária em

termos de relevância para boa parte da população, de modo a conquistar a atenção do público.

―Os temas discutidos por um número alto de pessoas tornam-se o principal tema da agenda

pública‖. (MARTINO, 2010, p. 204).

Hohlfeldt (1997) traz, ainda, três conceitos referentes a essa hipótese que reforçam a

lógica apresentada nesse capítulo. São eles a) a acumulação, entendida como a relevância que

a mídia dá a determinado tema em detrimento de outros que ocorrem em um mesmo período;

b) a centralidade, que ocorre quando a mídia confere, além da relevância, hierarquia e

significado a esses acontecimentos e c) a focalização, que consiste na ―[...] maneira pela qual

a mídia aborda um determinado assunto, apoiando-o, contextualizando-o, assumindo

determinada linguagem, tomando cuidados especiais para a sua editoração‖. (HOHLFELDT,

1997, p. 49-50).

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Pode-se perceber, portanto, que a mídia afeta profundamente a construção da agenda

social. Se a pluralidade de opiniões e discursos na imprensa não existir, ou mesmo se for

escassa, diversos grupos sociais serão relegados às margens da sociedade no âmbito das

discussões sociais – como já o são fora da mídia. Considerando-se o papel social da mídia,

que inclui defender os interesses do povo ao dar voz aos anseios populares das diversas

minorias existentes, esse é um quadro que não deveria ocorrer.

Se a possibilidade de recorrer aos meios de comunicação social continua sendo o

terreno vedado dos grupos política e culturalmente dominantes, tanto no plano

nacional quanto no internacional, há um grande perigo de que transmitam certos

modelos que contradizem os valores de civilização das minorias étnicas, sócio-

culturais e religiosas. Outra exigência do pluralismo é a necessidade de oferecer a

elas uma voz que lhes permita afirmar esses valores. (UNESCO, 1983, p. 34).

Não se pode esquecer, contudo, que a exclusão das minorias no processo de

agendamento das pautas sociais não é a única consequência da falta de discursos plurais na

grande imprensa. Os meios de comunicação constituem uma ―janela para o mundo‖, que

possibilita ao indivíduo o conhecimento virtual daquilo que não pode conhecer na realidade18

.

Quando não há a abertura para o pluralismo, esses grupos sociais que divergem do perfil

hegemônico não apenas são esquecidos mas, muitas vezes, retratados de forma errônea.

3.3 UNIFORMIZAÇÃO SOCIAL: CULTURA E ESTEREÓTIPO NA MÍDIA

O pluralismo estabelece uma íntima relação com a cultura e o estereótipo. Esses três

elementos encontram-se interligados na sociedade pelas representações sociais,

essencialmente realizadas pelas comunicações.

3.3.1 A simplificação da cultura

A cultura pode ser percebida, em uma primeira análise, como algo inato ao ser

humano, construído a partir de suas interações com a natureza e com outros indivíduos. É por

meio dela que compreendemos as ―ações e representações sociais‖ construídas a partir da vida

e do convívio em sociedade. (ROCHA; TOSTA, 2010).

18

Não cabem, aqui, ponderações sobre a realidade ou não das experiências virtuais. Usam-se os termos apenas

para diferenciar o que é conhecido e percebido pela própria pessoa do conteúdo que chega a ela perante a

mediação da mídia.

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37

Nesse sentido, pode-se apreender culturas, no plural, enquanto sistemas de símbolos

e significados construídos social e, historicamente, o que equivale dizer que culturas

são mecanismos de controle, orientação e classificação das condutas emocionais,

intelectuais, corporais, estéticas, econômicas, políticas, religiosas e morais.

(ROCHA; TOSTA, 2010, p. 346).

As culturas também encontram, nos meios de comunicação, sua representação perante

a sociedade e, junto com outras ferramentas, um meio de preservação. Contudo, face à

constituição de uma sociedade cada vez mais global e baseada no consumo, a diversidade

cultural encontra-se, de certa forma, ameaçada. E, nesse processo, por vezes a mídia é mais

inimiga do que aliada.

É importante ponderar, no entanto, que a globalização, entendida principalmente como

a extinção das barreiras territoriais, não constitui, por si só, um elemento dizimador da

diversidade cultural. Ela exige certa compreensão do que representa essa diversidade para não

constituir-se em um processo negativo.

[O processo de globalização] implica um permanente exercício de reconhecimento

daquilo que constitui a diferença dos outros como enriquecimento potencial da nossa

cultura, e uma exigência de respeito àquilo que, no outro, em sua diferença, há de

intransferível, não transigível e inclusive incomunicável. (MARTÍN-BARBERO,

2004, p. 60-61).

Muitas vezes, por falta dessa compreensão, diferentes culturas tendem a ser

minimizadas e tratadas de forma estereotipada – assunto tratado no próximo item. Por

consequência, passa-se a divulgar apenas uma cultura rasa, de fácil ―digestão‖ e apreensão,

que se torna protagonista das representações sociais na mídia, homogeneizando os valores

culturais do público e relegando a diversidade ao esquecimento – ao menos perante a

imprensa e às pessoas que dela dependem para esse conhecimento, uma vez que há, também,

outras formas de preservar a cultura, a exemplo da tradição oral.

Nos últimos anos, os pesquisadores sociais começaram a pensar que os êxitos e

fracassos de nossos povos na luta para se defenderem e para se renovarem

culturalmente estão estrategicamente ligados às dinâmicas e aos bloqueios na

comunicação: seja associando os processos de modernização dos países à revolução

das tecnologias comunicativas por sua incidência sobre a reconversão industrial, a

renovação educacional, a nova cultura organizacional ou a descentralização política;

seja fazendo da comunicação de massas um sinônimo daquilo que nos engana e

manipula, nos desfigura como países e nos destrói culturalmente como povos.

(MARTÍN-BARBERO, 2004, p. 63).

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38

A sociedade de consumo, observada pela ótica da indústria cultural19

, tende a fazer

com que a produção da cultura volte-se apenas para o que é rentável, o que pode ser

reproduzido e consumido em massa.

Na indústria cultural, o lucro orienta a produção, e o espaço da criação individual é

eliminado em virtude da lógica da produção coletiva. Duas ordens de produção –

material e simbólica – se sobrepõem, com substanciais perdas para a cultura. O

artista criador é substituído pela linha de produção, com uma divisão do trabalho

cultural em partes mais e mais compartimentadas. [...] O espaço para o

experimentalismo é mínimo: não agradar ao público contraria a lógica da produção.

(MARTINO, 2010, p. 49).

Essa reformatação da cultura tem profundo impacto no comportamento do consumidor

e, também, nos valores prezados pela sociedade como um todo. Forma-se, cada vez mais, uma

cultura voltada para o que se vê, para o que é aparente e, por consequência, para o estereótipo.

É uma cultura reduzida ao estado de mercadoria, em que o hábito faz o monge, em

que o look se transforma em uma espécie de ideologia. As galerias comerciais, as

praças ―públicas‖ privatizadas e os bairros sem vizinhos dos subúrbios residenciais

são as novas igrejas dessa civilização mercantil. (MARTÍN-BARBERO, 2004, p.

43).

A ausência de discursos e representações plurais nos meios de comunicação tem,

como se pôde perceber, um grande impacto na cultura. Além de simplificá-la e contribuir para

a extinção de sua diversidade, ela possui outro efeito nocivo à sociedade, que é a propagação

de uma ―cultura do estereótipo‖.

3.3.2 A simplificação do indivíduo

O estereótipo é resultado da falta de habilidade em lidar com culturas diferentes.

Quando um indivíduo não consegue compreender o outro, o diferente, busca associá-lo à

própria percepção de mundo, deslocando esse outro de suas particularidades e das presentes

na cultura na qual ele se insere.

19

Corrente de pensamento criada por Theodor Adorno e Max Horkheimer. Integra a Escola de Frankfurt,

importante escola da Teoria da Comunicação. O conceito é atualizado, posteriormente, por Mattelart e Mattelart,

para o termo indústrias culturais, que é contrário à ideia de uma mesma lógica para a produção de mercadorias

culturais, defendendo que ―[...] a indústria cultural não existe em si; é um conjunto compósito, constituído por

elementos que se diferenciam fortemente uns dos outros, por setores que apresentam suas próprias leis de

padronização‖. (MATTELART; MATTELART, 2005, p. 122).

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39

Eles [os meios de comunicação] buscam nas outras culturas o que mais se parece

com a nossa e, para isso, silenciam ou enfraquecem os traços mais conflitivamente

heterogêneos e desafiantes. Para tanto não haverá outro remédio senão estilizar e

banalizar, isto é, simplificar o outro, ou melhor, descomplexizá-lo, torná-lo

assimilável sem necessidade de decifrá-lo. (MARTÍN-BARBERO, 1997, p. 41).

Assim, a mídia abre lugar para o estereótipo, simplificando o indivíduo e lhe

atribuindo caraterísticas, valores, hábitos, etc., que não necessariamente fazem parte de sua

cultura. Ou, por vezes, o indivíduo é apresentado fora de seu contexto histórico e social, de

modo que a compreensão que se cria dele é, no máximo, bastante rasa.

[...] o estereótipo [...] reduz toda a variedade de características de um povo, uma

raça, um gênero, uma classe social ou um ―grupo desviante‖ a alguns poucos

atributos essenciais (traços de personalidade, indumentária, linguagem verbal e

corporal, comprometimento com certos objetivos etc.), supostamente fixados pela

natureza. Encoraja, assim, um conhecimento intuitivo sobre o Outro,

desempenhando papel central na organização do discurso do senso-comum.

(FREIRE FILHO; HERSCHMANN; PAIVA, 2004, p. 4).

Em uma visão antropológica, a representação que a mídia tem dado às minorias é

gerada com base em um conhecimento superficial e, por consequência, na larga difusão de

visões estereotipadas do outro. Isso resulta, em primeira instância, na falta de compreensão

acerca de outros grupos sociais, culturas e etnias, e por consequência, no preconceito. Em

segundo, a ausência do entendimento sobre o outro gera uma intolerância que pode culminar

em discursos de ódio. É o que explica Jesus Martín-Barbero. (1997, p. 42-43):

Ali onde o ordenamento coletivo é precário uma vez que idealizado como algo

preconstituído ontologicamente e não construído política e cotidianamente, a

pluralidade é percebida pelos cidadãos como desagregação e ruptura da ordem, a

diferença contém sempre algo de rebelião e a heterogeneidade é sentida como fonte

de contaminação e deformação das purezas culturais.

Longe de passar despercebida, a falta de pluralidade tem sido alvo de estratégias,

ferramentas e processos que visam a confrontá-la. Meios que facilitem a produção

independente, principalmente, são linha de frente desse processo. Destaca-se, entre eles, a

internet. Diversos portais de construção coletiva, como Mic20

, Mídia NINJA21

e Obvious22

,

têm obtido sucesso em quebrar o oligopólio da informação e trazer um discurso mais plural,

20

Disponível em mic.com, o portal define-se como um veículo de informação para jovens, que busca apresentar

narrativas de interesse desse público comumente excluídas da grande mídia. 21

A Mídia NINJA (Narrativas Independentes, Jornalismo e Ação) é uma rede brasileira de comunicação

centrada no ativismo social e político. Ela tornou-se conhecida, no Brasil e no mundo, após a cobertura das

manifestações ocorridas em junho de 2013 em diversas cidades do país. Disponível em ninja.oximity.com. 22

Disponível em obviousmag.org, o site aborda temas culturais e possui diversos colaboradores.

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40

que atenda a variados grupos sociais. É o que explanam Lovink e Schneider (2003, apud

PINHEIRO; SILVA, 1997, p. 167): ―No curso dos últimos anos, as lutas criativas das

multidões produziram os materiais de sujeitos numerosos e diferentes: a dialética das fontes

abertas, das fronteiras abertas, do conhecimento aberto‖.

Percebidos os impactos que a falta de um discurso plural nos meios de comunicação

têm sobre a sociedade e o modo como ela aceita seus diversos grupos, culturas e etnias, é

fundamental que se reflita sobre a necessidade de um investimento em políticas públicas de

comunicação23

que assegurem a representatividade de todos na mídia. Democratizar os meios

de comunicação é o primeiro passo a ser dado nesse processo, mas ele não garante, por si só,

que a pluralidade ocorra. É preciso que haja, também, projetos e leis relativos aos conteúdos

produzidos para os meios de comunicação brasileiros.

23

As políticas públicas de comunicação começaram a ser discutidas no Brasil apenas a partir da década de 1970,

com os debates acerca da Nova Ordem Mundial da Informação. Alguns avanços na questão foram conquistados

na década de 90, com o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação e o Coletivo Intervozes

(LIEDTKE, 2010), e posteriormente, após a virada do milênio, com a aprovação da Lei de Acesso à Informação

e o Marco Civil da Internet. Rosane Rosa (2010) defende que ―[...] o grande desafio contemporâneo é conceber a

comunicação como uma questão de política pública que implica na democratização da comunicação, essencial

para a formação de redes sociais, consolidação de identidades e desenvolvimento territorial‖ (p. 947).

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4 LEGISLAÇÃO BRASILEIRA

A legislação é um aparato fundamental para assegurar a existência de uma mídia

democrática e representativa. Por meio dela, é possível regular o exercício das empresas de

comunicação, de forma a observar os interesses públicos inerentes à função da comunicação

na sociedade. Para entender melhor as relações desenvolvidas em torno da regulação da

imprensa, será apresentado um breve histórico dos debates que cercaram a criação das

principais leis destinadas à comunicação no Brasil.

O Brasil somente começou a desenvolver políticas relativas à comunicação em 1860,

após a publicação do Decreto Imperial nº 2614, que dispunha da exploração dos telégrafos

elétricos (MARTINS, 2007). ―Dessa data até 1960, [...] inúmeros instrumentos normativos

isolados, entre resoluções federais, decretos, disposições constitucionais e leis, foram

instituídos [...] o que dificultou uma organização efetiva tanto na exploração quanto na

fiscalização dos serviços‖ (MARTINS, 2007, p. 305).

Desde o início da década de 1960, quando as discussões e políticas referentes à

comunicação começaram a organizar-se no país, até o presente momento, houve diversas

frentes opostas nesse debate. Cinco grandes entidades nesse cenário são a Associação

Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), a Federação Nacional dos Jornalistas

(Fenaj), o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), o Ministério das

Comunicações (Minicom) e o Coletivo Intervozes.

O autor César Bolaño (2007) dedica a obra Qual a lógica das políticas de

comunicação no Brasil? a essa questão. De acordo com ele, quando, no governo Sarney24

,

surge a Assembleia Nacional Constituinte, as duas principais frentes que se opõem no debate

são representadas pelas correntes definidas como conservadora e progressista. A primeira,

representada principalmente pela Abert, e a segunda, atendendo aos objetivos da Fenaj,

tiveram grande embate na criação do Título VIII, Capítulo V, da Constituição Federal25

, todo

ele dedicado à comunicação (BOLAÑO, 2007).

Bolaño é acompanhado, nessa discussão, por Murilo César Ramos (2000), que

também discute os embates travados na regulação das comunicações no país. Em Às margens

24

José Sarney foi o primeiro presidente do Brasil após o final da Ditadura Militar de 1964. Ele assumiu o cargo

em 1985 – ao substituir Tancredo Neves, que faleceu antes de tomar posse da presidência – e governou até 1990. 25

O Título VIII, Capítulo V, da Constituição Federal de 1998 versa especificamente sobre as comunicações no

país. Ele envolve questões como a propriedade das empresas de comunicação, o conteúdo, direito de resposta,

bem como, de um modo geral, deveres e direitos dos comunicadores brasileiros. O tema será abordado de forma

mais ampla no próximo subcapítulo.

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42

da estrada do futuro, ele comenta o processo de formação do Código Brasileiro de

Telecomunicações26

.

A indústria da radiodifusão brasileira, congregada desde os embates congressuais

para aprovação da Lei nº 4.117/62 em torno da Associação Brasileira de Emissoras

de Rádio e Televisão (Abert), sempre se pautou por uma grande influência sobre o

meio parlamentar, sobre o Poder Executivo e sobre a sociedade. Escudada sob seu

poder formador de opinião e liderada, inicialmente, pelos Diários e Emissoras

Associados, até os anos 60, e, a partir dos anos 70, pelas Organizações Globo, a

Abert é um grupo de pressão sempre presente nas mais estratégicas decisões

nacionais. (RAMOS, 2000, p. 174).

Murilo César Ramos (2000) sustenta a hipótese de que a Abert optou, para manter-se

livre de regulamentações, por fugir à categorização de serviço de telecomunicações, criando,

assim, o que ele chama de ―paradoxo da radiodifusão27

‖. Isso repercutiu, segundo o autor, da

seguinte maneira:

Em decorrência [do paradoxo], o Serviço de Radiodifusão não ficou sujeito à alçada

da Agência Nacional de Telecomunicações, o órgão regulador previsto na Lei Geral

de Telecomunicações. Paradoxalmente, porém, estão sujeitos à alçada da Agência

todos os demais serviços correlatos à radiodifusão, como os serviços de TV por

Assinatura [...]. Isto para não falar em outros serviços, ainda dependendo de

regulação, como o LMDS, e os serviços multimídia que deverão se popularizar com

a expansão da Internet e das redes digitais de banda larga. Ainda paradoxalmente,

cabe à Agência administrar todo o espectro de frequências, inclusive aquelas

destinadas ao Serviço de Radiodifusão, o que poderá se tornar [...] em fonte

potencial de grandes conflitos. (RAMOS, 2000, p. 177).

A tentativa de fugir à regulação do setor das telecomunicações estendeu-se, também,

para a Constituinte. Segundo Murilo César Ramos (2000) o cenário que permeou a definição

do Título VIII, Capítulo V, da Constituição pode ser entendido da seguinte forma:

Acesso e informação privilegiados, intransparência, capacidade de impor nomes de

dirigentes estatais – de ministros a chefes de departamentos e serviços. Tudo isto

beneficiava a indústria da radiodifusão e não foi por outra razão que, durante o

processo de elaboração da Constituição Federal de 1988, a Comunicação Social

tornou-se o capítulo mais polêmico. (RAMOS, 2000, p. 175).

26

O CBT também será tratado posteriormente, no presente capítulo. 27

O termo refere-se a uma ocorrência jurídica única no Brasil. O termo radiodifusão refere-se aos serviços de

transmissão de mensagens via rádio e televisão, e foi utilizado pela primeira vez em um Decreto do primeiro

governo de Getúlio Vargas. Ambos os meios de transmissão referidos foram considerados, por lei, assim como

na maioria dos países do mundo, integrantes do âmbito das telecomunicações. Assim foi até 1995, quando tal

questão foi reformulada na Constituição Federal. ―Por um estranho desígnio político-legislativo, [...]

radiodifusão deixou de ser serviço de telecomunicações para se transformar em um serviço por si só, singular,

criando uma situação técnico-jurídica inédita no mundo, de repercussões ainda por se verificar‖ (RAMOS, 2000,

p. 170).

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43

O autor explica, ainda, que a proposta de criação do Conselho Nacional de

Comunicação, feita pela Fenaj, foi um dos pontos que causou maior divisão entre os

envolvidos no processo. De acordo com Othon Jambeiro (2000):

Ao contrário da Abert, a Fenaj propunha a criação de um Conselho Nacional de

Comunicação para regular o rádio e a televisão. O Conselho seria um órgão coletivo

autônomo, com atribuições executivas, e composto, na sua maioria, por

representantes de entidades de trabalhadores e da sociedade civil. A exploração dos

serviços de rádio e TV deveria ser feita por fundações sem fins lucrativos.

(JAMBEIRO, 2000, p. 82-83).

A criação desse Conselho foi a maior concessão dada à ala progressista e, mesmo

assim, dado o desinteresse dos partidos conservadores, ele somente veio a ser efetivamente

instituído 14 anos depois, com o incentivo do Fórum Nacional Pela Democratização28

. Como

citado anteriormente, o Fórum foi organizado em 1991 e, de acordo com Bolaño (2007, p.

23), ―[...] tornou-se peça fundamental nas negociações que levariam à regulação do Conselho

de Comunicação Social e à lei da TV a cabo, representando 362 entidades nacionais e

regionais‖.

A Associação Brasileira de Televisão por Assinatura (ABTA) também teve influência

na Assembleia Constituinte, conquistando a exclusividade da exploração da TV a cabo para

operadores privados, além da possibilidade de ―[...] participação do capital estrangeiro em até

49% do capital das empresas de TV a cabo‖ (BOLAÑO, 2007, p. 27).

A Frente Nacional de Lutas por Políticas Democráticas de Comunicação, surgida em

1983, é ―um marco na luta pela legalização das rádios comunitárias29

no Brasil‖ (BOLAÑO,

2007, p.50). Segundo o autor, a entidade tem parte no projeto de lei apresentado pelo

deputado Arnaldo Faria de Sá (atualmente integrante do PTB-SP), que origina a lei 9.612, de

1998, regulamentadora das rádios comunitárias brasileiras.

No início do governo Lula, como resultado de um longo debate entre os órgãos e

poderes do Brasil na área da comunicação, ocorre, finalmente, a implantação do Conselho de

Comunicação Social (CCS), instituído por lei ainda em 1991. Tal feito ocorreu, segundo

Bolaño (2007), para obter o apoio da bancada do Partido dos Trabalhadores (PT) à emenda

28

Em 2006, após dois mandatos do Conselho de Comunicação Social, o órgão foi desativado, permanecendo

assim até 2012 (REDE BRASIL ATUAL, 2014). 29

As rádios comunitárias são emissoras regulamentadas pela lei 9.612/98, que operam em Frequência Modulada

e com alcance de cerca de um quilômetro, concedidas às associações das comunidades – que devem observar

características específicas – para fins públicos (BRASIL, 1998).

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constitucional que permitiria uma participação em até 30% do capital estrangeiro nas

empresas de comunicação do país30

.

Na verdade, o governo petista foi responsável por algumas tentativas de dar voz às

discussões em torno de uma democratização da mídia. Nos dois governos de Lula, a questão

foi levantada e inclusive chegou-se a constituir duas comissões para a criação de um projeto

de lei que abordasse a comunicação eletrônica – que não chegaram a reunir-se, mantendo a

pauta, mais uma vez, apenas nos anseios da população –, de acordo com Liedtke e Aguiar

(2011). Segundo os autores, ―[...] somente em julho de 2010, o presidente Lula assinou novo

decreto criando outra Comissão Interna para ‗elaborar estudos e apresentar propostas de

revisão do marco regulatório da organização e exploração dos serviços de telecomunicações e

de radiodifusão‘‖ (LIEDTKE; AGUIAR, 2011, p. 9). O trabalho dessa comissão resultou, em

novembro do mesmo ano, no Seminário Internacional Comunicações Eletrônicas e

Convergências de Mídias. (LIEDTKE; AGUIAR, 2011).

É possível ver, nas discussões apresentadas acima, os principais atores que participam

e influenciam, até hoje, os debates acerca das políticas públicas de comunicação no país.

Percebe-se, também, o grande peso do empresariado nas decisões sobre leis e projetos de

regulação do setor, dadas suas constantes vitórias nesse processo.

O presente trabalho tem o intuito de analisar a necessidade de uma regulação da

imprensa que atue de forma mais profunda e atualizada do que a legislação existente. Para

tanto, é preciso, antes de tudo, uma análise das leis em vigência ou que já vigoraram no

âmbito da comunicação.

Os principais códigos que regem ou regeram o sistema de comunicação brasileiro são

a Lei de Imprensa, o Código Brasileiro de Telecomunicações (CBT), a Constituição Federal, a

Lei Geral das Telecomunicações, os Códigos de Ética, a Lei de Acesso à Informação e, mais

recentemente, o Marco Civil da Internet.

4.1 CONSTITUIÇÃO FEDERAL

A Constituição Federal data de 1988 e marca a retomada à democracia após os 21 anos

nos quais perdurou a ditadura militar. Desde sua criação até 2009, ela vigorou

30

A Constituição é alterada, então, pela Emenda Constitucional nº 36/2002, que define, no Artigo 222, § 1º, o

seguinte: ―Em qualquer caso, pelo menos setenta por cento do capital total e do capital votante das empresas

jornalísticas e de radiodifusão sonora e de sons e imagens deverá pertencer, direta ou indiretamente, a brasileiros

natos ou naturalizados há mais de dez anos, que exercerão obrigatoriamente a gestão das atividades e

estabelecerão o conteúdo da programação.

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45

concomitantemente à Lei de Imprensa, que foi revogada, inclusive, por defender princípios

contrários aos constitucionais. O Título VIII, Capítulo V, da Constituição Federal é

direcionado à Comunicação Social e, hoje, funciona como a sua principal regulação.

Após tantas leis e decretos que praticamente se repetem, um dos momentos na

história da legislação sobre as concessões de rádio e TV no Brasil que proporcionou

algumas mudanças importantes, porém nada radicais para o sistema de comunicação

em vigor, foi a Constituição Federal de 1988, a partir do Capítulo V, dedicado à

Comunicação Social. Além de confirmar responsabilidades educativas e culturais

aos meios de comunicação e também a competência da União Federal nas decisões

das outorgas e renovações de outorgas de radiodifusão, trouxe importantes

mudanças no que se refere às concessões de radiodifusão. (VIEIRA JR., 2008).

A formulação do capítulo destinado às comunicações na Constituição Federal foi,

assim como as demais leis relacionadas à área, marcada por embates entre diferentes crenças

quanto ao papel da comunicação e como ela deve ser guiada. Entende-se que, nesse processo,

a Abert aparece novamente em defesa da visão dos empresários da imprensa e, na oposição,

toma frente à Fenaj.

No período de transição democrática, durante o governo Sarney, o Congresso

Nacional, além das suas funções cotidianas, assumiu aquelas de uma Assembleia

Nacional Constituinte. No seu interior, grosso modo, duas grandes frentes –

progressistas e conservadores – se defrontavam, inclusive nos debates que levaram à

formulação de todo um capítulo dedicado à comunicação, o qual pode ser

considerado como a base para um novo modelo de regulação setorial [...]. A

ABERT31

aparece, mais uma vez, como uma força poderosa, vinculada à ala

conservadora, conhecida como ―centrão‖. A ala progressista, por sua vez, era

influenciada pelas posições da Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ).

(BOLAÑO, 2007, p. 19).

Destaca-se como principal proposta do capítulo da comunicação o combate à censura.

Consta, já no primeiro parágrafo, que ―[...] nenhuma lei conterá dispositivo que possa

constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de

comunicação social‖. O texto veda, também, ―[...] toda e qualquer censura de natureza

política, ideológica e artística‖ (BRASIL, 1988), em um claro contraponto à Lei de Imprensa.

Um dos pontos fundamentais da Constituição ao exercício da comunicação social e,

principalmente, ao Jornalismo, é a proteção ao sigilo da fonte. Ela é garantida pelo inciso

XIV, no qual consta que ―[...] é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o

sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional‖ (BRASIL, 1988).

31

Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão, criada em 1962.

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46

A liberdade de expressão do pensamento, em seu enunciado tradicional, é uma

liberdade de quem informa. Este inciso XIV garante, a cada um e a todos nós, o

direito de receber a informação, o direito de ser informado. Trata-se, portanto, de um

direito coletivo. Todos os membros da sociedade podem reivindicá-lo. E o direito à

informação torna-se, a cada dia, mais importante, pois o progresso individual ou

coletivo depende cada vez mais da atualização de conhecimentos. (COSTELLA,

2002, p. 49).

José Marques de Melo (2011) comenta, na obra A Metamorfose da Comunicação do

século XXI, que, até a criação da Constituição, o Brasil teve o hábito de manter-se ―em cima

do muro‖ quando chegava-se à discussão das políticas em torno da comunicação social.

A Constituição de 1988 representa o fim dessa tradição de ‗tapar o sol com a

peneira‘. Pela primeira vez, os nossos legisladores enfrentam com determinação os

desafios da sociedade midiática, dedicando-lhe um capítulo exclusivo da nossa carta

magna. Sob o título genérico Da Comunicação Social, os artigos 220-224 assimilam,

em grande parte, as aspirações democráticas da nossa sociedade civil. Entre elas, a

instituição do Conselho de Comunicação, organismo destinado a funcionar como

catalisador dos anseios populares nesse âmbito da vida nacional. (MELO, 2011, p.

69).

Contudo, nem todas as normas estabelecidas na Constituição são respeitadas.

Pode-se citar como exemplo o Artigo 220, § 5º, e o artigo 221. O primeiro proíbe a existência

de monopólios ou oligopólios nas comunicações no Brasil – o que, na prática, não ocorre,

visto que uns poucos grupos, citados no segundo capítulo desse trabalho, controlam a maioria

dos veículos midiáticos nacionais. Simões e Mattos (2005) explicam que:

A questão da formação de monopólios privados em comunicações, em geral, e na

televisão, em particular, não é somente um problema econômico, mas uma questão

ampla, que se relaciona também com aspectos políticos que envolvem a

consolidação da democracia e a conformação das relações de poder dentro da

sociedade brasileira. (SIMÕES; MATTOS. 2005, p. 48).

A ocorrência desses fenômenos de mercado é especialmente prejudicial na

comunicação, como já citado anteriormente, pois se percebe como consequência disso um

controle descomunal da informação por uma pequena parcela da sociedade que, alienada aos

interesses públicos, controla a mídia de acordo com as próprias intenções. Também porque,

na maioria dos casos, a propriedade de diversos veículos distintos por um único grupo de

comunicações resulta na perda de diversidade de conteúdos, que é fundamental para o

exercício da plena democracia.

O artigo 221, por sua vez, defende que a programação de canais de radiodifusão deve

observar, entre outros pontos, os seguintes:

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47

[...] preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas;

promoção da cultura nacional e regional e estímulo à produção independente que

objetive sua divulgação; regionalização da produção cultural, artística e jornalística,

conforme percentuais estabelecidos em lei. (BRASIL, 1988).

Posto que há falhas na representatividade dos grupos sociais, étnicos e culturais nos

canais de rádio e televisão, como apresentado no item que versa sobre a pluralidade, é

possível perceber que tais regras defendidas na Constituição Federal também não estão

regulamentadas. Vale ressaltar, ainda, que ―98% de toda produção de TV no país é feita no

eixo Rio-São Paulo pelas próprias emissoras de radiodifusão, e não por produtoras

independentes‖ (EKMAN, BARBOSA, 2014), o que claramente vai contra o fomento à

cultura regional e à produção independente.

Dois anos após a promulgação da constituição, houve uma tentativa de regulação,

voltada principalmente para a questão da regionalização da cultura, no Projeto de Lei

256/1991, elaborado pela deputada federal Jandira Feghali (PCdoB/RJ). Entre as medidas

propostas, estava a exigência de que, no mínimo, 30 por cento da programação cultural,

artística e jornalística fosse produzida no local da sede das emissoras (RODRIGUES, 2014).

O projeto levou mais de dez anos para ser discutido na câmara, sendo aprovado apenas

em 2003. Entidades como a Associação Brasileira de Anunciantes (ABA) e a Associação

Brasileira de TV por Assinatura (ABTA), bem como a Rede Globo, manifestaram seu

posicionamento claramente contrário (RODRIGUES, 2014). Isso pode ser entendido como

um dos possíveis motivos para o projeto não ter sido votado pelo Senado até hoje, em vista da

força do lobby formado por empresas e entidades da radiodifusão nas discussões políticas no

país.

É preciso ressaltar, ainda, que a constituição pouco versa sobre o processo de

comunicação democrático, o acesso à informação e a qualidade do conteúdo que é veiculado

nos meios de comunicação. Algumas dessas lacunas na legislação encontram amparo nas mais

recentes Lei de Acesso à Informação e Marco Civil da Internet, abordados adiante nesse

capítulo.

4.2 LEI DE IMPRENSA

Constituída em 1967, a Lei de Imprensa é um dos ranços da ditadura militar que

perdurou por mais tempo no país. Em 30 de abril de 2009, 25 anos após o fim do período

ditatorial, ―[...] num julgamento histórico, 7 dos 11 ministros do STF decidiram tornar sem

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efeitos a totalidade da lei ao concluírem que ela, que foi editada em 1967, era incompatível

com a democracia e com a atual Constituição Federal‖ (GALLUCCI, 2009).

A Lei de Imprensa foi ratificada em 10 de março de 1967, começando a vigorar no fim

do Governo Castello Branco e início do mandato de Costa e Silva. Os anos seguintes32

são

considerados os mais violentos do regime militar, ―[...] em que predominou a censura e

repressão, contexto em que a Lei de Imprensa foi amplamente utilizada‖ (MELO;

COUTINHO, 2009, p. 198).

No papel, a lei pregava a livre manifestação de opiniões e circulação de informação

por qualquer meio e sem a necessidade de censura, cabendo ao emissor a responsabilidade de

responder, por meio da lei, por abusos que cometa. Em contraponto, ela proibia processos de

subversão, bem como a própria liberdade de expressão.

Melo e Coutinho (2009, p. 197) citam alguns artigos da lei que atuavam nesse âmbito.

Foram considerados inconstitucionais os ―[...] §§ 1º e 2º do art. 60 e a íntegra dos arts. 61, 62,

63 e 64, que preveem a possibilidade de apreensão e destruição de impressos, contrariando

claramente a liberdade de informação jornalística e vedação à censura‖. O artigo 61,

especificamente, é um dos que mais reflete a censura garantida pela Lei. Ele sujeita à

apreensão qualquer publicação que contenha propagada de guerra, preconceitos ou ―incite à

subversão da ordem política e social‖. Além disso, também são passíveis de censura

impressos que ofendam a moral e os bons costumes (BRASIL, 1967).

A Lei de Imprensa foi compreendida como elemento limitador da liberdade de

expressão assegurada na Constituição, sendo alvo de arguição de descumprimento

de preceito fundamental por não parecer ser serviente do padrão de Democracia e de

imprensa que ressaiu das pranchetas da Constituinte de 87/88. (MELO;

COUTINHO, 2009, p.198).

A Lei de Imprensa é lembrada, ainda, pela severidade com que trata os crimes de

calúnia, difamação e injúria (GALLUCCI, 2009). Nessa questão, ela favorece os detentores

de poder. Um exemplo disso é o modo como trata o crime de calúnia33

. Para ser caluniosa,

uma alegação deve ser falsa. Portanto, se sua veracidade for comprovada, deixa de ser

caracterizada como crime.

A calúnia, que é a imputação falsa de fato definido como crime, somente se

configura se estiver presente o elemento normativo ―falsamente‖, isto é, a falsidade

32

Até 1969, período no qual Costa e Silva esteve no poder. 33

A calúnia consiste em imputar a alguém um fato criminoso, com algumas indicações de circunstância, como

tempo e lugar (COSTELLA, 2002).

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da imputação é elementar do tipo. Isso quer dizer que a imputação da autoria de um

fato, verdadeiro, definido como crime, constitui conduta atípica. E ninguém pode

responder por um crime — calúnia — se a conduta que pratica — imputação de fato

verdadeiro — não se adequar a uma descrição típica — imputar falsamente —, ou

seja, se o seu comportamento não constitui crime. (BITENCOURT, 2012, p. 335).

Contudo, no artigo 20, parágrafo 3º, da Lei de Imprensa, está explícito que:

Não se admite a prova da verdade contra o Presidente da República, o Presidente do

Senado Federal, o Presidente da Câmara dos Deputados, os Ministros do Supremo

Tribunal Federal, Chefes de Estado ou de Governo estrangeiro, ou seus

representantes diplomáticos. (BRASIL, 1967).

E, em contraponto, o Código Penal brasileiro define que é admitida a prova da

verdade, exceto nos seguintes casos:

I ­ se, constituindo o fato imputado crime de ação privada, o ofendido não foi

condenado por sentença irrecorrível;

II ­ se o fato é imputado a qualquer das pessoas indicadas no nº I do art. 141 [contra

o Presidente da República, ou contra chefe de governo estrangeiro];

III ­ se do crime imputado, embora de ação pública, o ofendido foi absolvido por

sentença irrecorrível (BRASIL, 1940).

Há que se observar, contudo, que a impossibilidade de utilizar o recurso da exceção da

verdade não torna caluniosa a informação verdadeira, pois:

[...] a exceção da verdade é apenas um meio de prova ou uma forma procedimental

para produzir prova, cuja supressão não tem o condão de alterar a tipicidade do

crime de calúnia. Na verdade, a proibição da utilização do instituto da ―exceção da

verdade‖ representa, por razões de política-criminal, somente uma limitação aos

meios de prova permitidos nos crimes de calúnia e de difamação, quando o sujeito

passivo for o presidente da República ou chefe de governo estrangeiro,

permanecendo a necessidade de o Ministério Público demonstrar, no processo

criminal próprio, que o sujeito ativo praticou um fato ―típico‖, antijurídico e

culpável, isto é, que imputou, falsamente, um fato definido como crime.

(BITENCOURT, 2012, p. 335).

A Lei de Imprensa é considerada limitadora da liberdade de expressão, nessa questão,

também porque ―[...] previa a aplicação de penas de prisão mais duras aos jornalistas do que

as previstas no Código Penal – nos casos de crimes de injúria, calúnia e difamação. Para os

jornalistas, a pena de prisão era de três anos, contra dois anos para os demais cidadãos‖

(GAZETA DO POVO, 2009). Hoje, a pena é de seis meses a dois anos de reclusão, além de

multa, para todas as pessoas, independentemente de profissão, como previsto no Código

Penal.

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50

Um dos pontos mais polêmicos a nortear os debates em torno da revogação da Lei de

Imprensa diz respeito ao direito de resposta. Nela, está previsto detalhadamente o modo como

a resposta deve ocorrer: formulada pela própria pessoa ou representante, a resposta deve ser

publicada no mesmo periódico ou jornal, no mesmo local e com a mesma tipografia – em caso

de veículo impresso –; na mesma emissora, programa e horário – em caso de veículo de

radiodifusão –; na transmissão da resposta a todos os veículos que a receberam – no caso de

agências de notícias (BRASIL, 1967).

Apesar de o direito de resposta ser, também, referido na Constituição Federal, não é

explicitada a forma como ele deve ser conduzido, tal qual o é na Lei de Imprensa. O Capítulo

I do documento assegura apenas, no artigo 5º, inciso V, ―o direito de resposta, proporcional ao

agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem‖ (BRASIL, 1998). Cabe a

cada julgamento discorrer sobre como deve ser tratada a questão quando reivindicada.

Um exemplo interessante sobre a questão do direito de resposta é o caso ocorrido na

Folha de S. Paulo em 2014. O jornal publicou, em 23 de julho do mesmo ano, uma matéria

que apontava o pagamento de propina pelo candidato do PSB ao governo de Pernambuco,

Paulo Câmara, em troca de apoio político. Após o ocorrido, travou-se uma batalha judicial

entre o partido e o jornal, pois o candidato reivindicava o mesmo espaço, a manchete do

jornal, para se defender da acusação.

A Folha de S. Paulo foi condenada pela Justiça Eleitoral de Pernambuco a conceder

espaço de defesa ao candidato e recorreu ao Tribunal Superior Eleitoral para não se submeter

à decisão. O recurso, no entanto, foi negado pelo ministro Dias Toffoli. A resposta foi

publicada, no que foi considerado um ato histórico, em 2 de agosto de 2014, com direito a

chamada na capa e manchete na página A3, a mais nobre do jornal. Contudo e por ter sido

apontado como um acontecimento histórico, entende-se que comumente o direito de resposta

não é atendido da forma como deveria. (BRASIL 247, 2014).

Segundo Melo e Coutinho (2009, p. 208), ―[...] a fim de evitar os abusos da imprensa,

deve-se garantir a todos os cidadãos os supracitados direitos fundamentais, que podem ser

lesados com a ausência de limites ao trabalho da imprensa (que são diferentes de censura)‖.

Essa questão teria de ser especificada no caso de uma nova legislação para as comunicações,

garantindo que a resposta tenha a mesma evidência da declaração à qual ele se contrapõe.

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51

4.3 CÓDIGO BRASILEIRO DE TELECOMUNICAÇÕES

O Código Brasileiro de Telecomunicações (CBT), lei nº 4.117, foi sancionado em 27

de agosto de 1962 pelo presidente João Goulart, após cerca de duas décadas de negociações e

debates entre o poder público e os empresários do setor (MARTINS, 2007). Sua elaboração

teve forte influência do governo do presidente Juscelino Kubitschek34

, dotado de ideais

nacionalistas e desenvolvimentistas (BRANDÃO, 2009), que norteariam o progresso da

comunicação nas décadas posteriores.

O Código foi a primeira legislação construída com a proposta de unificar a regulação

das comunicações – mais especificamente da radiodifusão – no Brasil. Ele prevê a

responsabilidade da União em manter e explorar ―os serviços dos troncos integrantes do

Sistema Nacional de Telecomunicações‖, bem como os ―serviços públicos de telégrafos, de

telefones interestaduais e de radiocomunicações‖. Além disso, é competência do governo

federal fiscalizar a exploração das telecomunicações, por ele concedida.

Ramos (2000) aponta algumas deficiências do CBT, em comparação com o modelo

estadunidense, em estabelecer medidas que garantam o prevalecimento do interesse público

na condução das telecomunicações no Brasil.

O cenário legal brasileiro, nessa primeira onda, resultou da Lei no. 4.117/62, o

Código Brasileiro de Telecomunicações, legislação que jamais contemplou, no caso

do rádio e da televisão, os princípios e dispositivos existentes, por exemplo, na

legislação norte-americana, país do qual emulamos nosso modelo de exploração

privada da radiodifusão. Nos Estados Unidos foram, desde os anos 30, adotados

princípios como interesse público e localismo, e dispositivos restringindo tanto a

propriedade cruzada de meios de comunicação [...] quanto o número de concessões

que uma mesma empresa poderia deter nacionalmente. Tais princípios e dispositivos

não foram contemplados na legislação brasileira, exceto pelos limites à propriedade

de geradoras de rádio e televisão, embora mesmos estes tenham vindo a ser

desrespeitados com o passar do tempo. (RAMOS, 2000, p. 126-127).

A implementação do CBT também envolveu uma série de embates entre os setores

público e privado. Um lobby formado por empresários das comunicações no Brasil – que

posteriormente daria origem à Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão

(ABERT) – teve sucesso, em um marco histórico da regulação da imprensa brasileira, ao

derrubar todos os 52 vetos presidenciais ao projeto da lei (RAMOS, 2000).

34

Governou o Brasil de 1956 a 1961. Entre os feitos de sua gestão, destaca-se a construção de Brasília, sob o

lema ―50 anos de progresso em 5‖.

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Bolaño (2007) defende que o modelo de regulação do setor audiovisual, representado

pelo CBT, reforça a verticalização e a concentração da informação, bem como o

nacionalismo.

Ao mesmo tempo em que protege os capitais instalados da concorrência externa,

limita a manifestação das expressões locais e o desenvolvimento de um panorama

audiovisual diversificado, servindo basicamente aos interesses políticos e

econômicos hegemônicos que se articulam no seu interior. (BOLAÑO, 2007, p. 17).

Pode-se concluir, portanto, que o CBT reflete os anseios do empresariado das

comunicações e dos governos instalados na ditadura militar. Segundo Brandão (2009, p.2),

diversas pesquisas ―apontaram para o fato de que a implantação e o desenvolvimento das

telecomunicações seriam resultado quase exclusivo do pensamento militar e teriam

contribuído para a legitimação e manutenção dos militares no poder‖.

4.4 LEI GERAL DAS TELECOMUNICAÇÕES E A REGULAÇÃO DA COMUNICAÇÃO

ELETRÔNICA DE MASSA

A lei nº 9.472, conhecida como Lei Geral das Telecomunicações (LGT), foi

sancionada em julho de 1997. Ela estabelece como competência da União, por meio da

Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), a fiscalização e organização dos serviços de

telecomunicações no país. (BRASIL, 1997).

De acordo com Bolaño (2007), a LGT foi idealizada como parte das reformas

liberalizantes realizadas no governo FHC35

. Pretendia-se, então, substituir o CBT por uma

legislação mais moderna. Contudo, até hoje, ambas as leis vigoram concomitantemente, uma

vez que o CBT ainda regula a radiodifusão no Brasil. Bolaño ressalta o papel da Anatel na lei:

Do arcabouço regulatório da proposta, apresentado na exposição de motivos do

projeto da LGT, interessa aqui a questão do chamado organismo regulador

independente. Suas missões principais seriam promover a competição justa,

defender os interesses e os direitos dos consumidores dos serviços e estimular o

investimento privado. Sua principal função é definir a regulação do setor, cobrindo

todos os aspectos, desde a atribuição de licenças até a definição dos padrões de

interconexão. (BOLAÑO, 2007, p. 40).

O autor pondera, ainda, com relação à Anatel que, apesar de a agência ter sua

autonomia limitada por seu ―notável presidencialismo‖, ela incorpora ―mecanismos

35

Fernando Henrique Cardoso presidiu o país de 1995 a 2002. Seu governo foi marcado pelas reformas

econômicas iniciadas anteriormente, com o Plano Real, e por um grande número de privatizações.

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53

democráticos importantes, como o das consultas públicas‖ (BOLAÑO, 2007, p. 42). A lei

define como dever do Estado garantir à população o acesso às telecomunicações, em boas

condições e a preços razoáveis, bem como ―estimular a expansão do uso de redes e serviços

de telecomunicações pelos serviços de interesse público em benefício da população brasileira‖

(BRASIL, 1997).

É importante retomar, ao discutir a LGT, o conceito de ―paradoxo da radiodifusão‖,

apresentando anteriormente nessa pesquisa (ver p. 38). Diversos autores apontam a

singularidade de os serviços de radiodifusão se diferenciarem das telecomunicações, no país,

no que tange à legislação. Eles ponderam que isso ocorra, principalmente, pela presença de

um lobby das empresas de radiodifusão no Congresso Nacional – estruturado principalmente

pela Abert – que teve sucesso em manter a autonomia da radiodifusão perante o Estado, à

época da criação da LGT, caracterizando-a como serviço especial e excluindo-a da alçada da

Anatel (BOLAÑO, 2007; RAMOS, 2000; SOARES, 2006).

4.4.1 A Lei Geral da Comunicação Eletrônica de Massa

A proposta de criar uma única lei que regesse a comunicação eletrônica de massa

acompanhou as discussões em torno da elaboração da LGT. Fomentava-se, à época, a

instituição de uma Lei Geral da Comunicação Eletrônica de Massa, que visasse à ―regulação

dos artigos 221 e 222 da Constituição Federal, relativos à Comunicação Social e à

organização e exploração dos serviços de comunicação social eletrônica‖ (ATTAYDE, 2007,

p. 304). No entanto, seu encaminhamento foi suspenso por diversas vezes.

Superada a fase de formulação das novas regras para a telefonia brasileira, que

levaram à privatização do Sistema Telebrás, o governo FHC se via livre para tentar,

mais uma vez, apresentar uma nova Lei Geral de Comunicação. Dessa vez, o foco

era apenas a radiodifusão, e a lª versão do anteprojeto de lei gestada do Ministério

das Comunicações (Minicom) passou a se chamar "Lei Geral de Comunicação

Eletrônica de Massa" [...]. Após muitas e muitas discussões - que geraram pelo

menos seis diferentes versões de anteprojetos -, finalmente em 2001, durante a

gestão de Pimenta da Veiga no Ministério, o texto do que poderia vir a ser a "Lei

Geral de Comunicação Eletrônica de Massa" foi colocado em consulta pública.

(LOPES, 2005, p. 5).

Em 2006, a questão encontrava-se sem avanços e foi criada, então, uma Comissão

Interministerial que ficou responsável por elaborar um anteprojeto de lei (ATTAYDE, 2007).

O projeto esteve em discussão nesse e no ano seguinte, contudo, até hoje, a lei não foi

instituída e permanece engavetada no Congresso. Alguns pontos da regulação ficam a cargo

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do antigo CBT e, mais recentemente, do Marco Civil da Internet – a ser abordado em um

próximo subcapítulo –, bem como da Agência Nacional do Cinema (Ancine) (BOLAÑO,

2007).

4.5 LEI DE ACESSO À INFORMAÇÃO

A Lei nº 12.527, também conhecida como Lei de Acesso à Informação, foi sancionada

em 18 de novembro de 2011. Ela regula o acesso à informação oriunda da administração

pública, que está previsto ainda na Constituição Federal de 1988:

[A Lei obriga] os órgãos públicos a considerar a publicidade como regra e o sigilo

como exceção. São seus objetivos, portanto, fomentar o desenvolvimento de uma

cultura de transparência e o controle social na administração pública. Para isso, a

divulgação de informações de interesse público ganha procedimentos, a fim de

facilitar e agilizar o acesso por qualquer pessoa, inclusive com o uso da tecnologia

da informação. (BRASIL, 2011, p. 7).

Além disso, a Lei 12.527 garante a gestão transparente da informação, bem como sua

proteção, de modo a garantir que ela seja disponibilizada verídica e integralmente e sem violar

informações consideradas sigilosas36

ou pessoais. Para assegurar o acesso à informação, a Lei

prevê, ainda, a criação de um ―serviço de informações ao cidadão‖, apto a orientar o público

quanto à obtenção de dados, protocolar requerimentos e documentos referentes a esse acesso

– bem como informar sobre a sua tramitação –, e realizar ―[...] audiências ou consultas

públicas, incentivo à participação popular ou a outras formas de divulgação‖ (BRASIL,

2011).

A Lei facilita, portanto, o livre e fácil acesso à informação referente às empresas e

órgãos estatais. Contudo, há pedidos que ficam sem resposta, muitas vezes pelo mau

gerenciamento do conteúdo estatal.

O que se tem percebido desde a implementação da lei de acesso à informação nesse

ano de 2012 é que o Estado brasileiro, até então, não tinha uma preocupação com o

tratamento e centralização das informações a respeito do desempenho das políticas,

das estratégias implementadas e das ações de governos e das instituições estatais. A

maior dificuldade para a implementação da lei de acesso à informação foi a

descoberta de que as informações demandadas pelos cidadãos estavam depositadas

em computadores individuais e pessoais, tornando o cumprimento da lei mais difícil

36

A Lei de Acesso à informação considera, como informação sigilosa, ―[...] aquela submetida temporariamente à

restrição de acesso público em razão de sua imprescindibilidade para a segurança da sociedade e do Estado‖

(BRASIL, 2012).

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55

por, muitas vezes, depender do humor e disponibilidade de servidores públicos.

(FILGUEIRAS, 2012).

Até a criação dessa lei, não havia, no país – ao contrário de seus vizinhos – uma lei

consistente dedicada ao acesso à informação e à transparência das ações do poder público,

como ressaltam Abdala e Nascimento (2013). Segundo os autores:

―A democracia participativa, por ser ligada ao princípio da transparência, resulta no

objetivo de se estabelecer um efetivo controle social, fatores que são imprescindíveis

para a conscientização política de um povo e a consequente evolução de uma

nação‖. (ABDALA; NASCIMENTO, 2013, p. 3).

A Lei de Acesso à Informação representa, portanto, um grande avanço para a

democratização da informação e da mídia, na medida em que possibilita e facilita a obtenção

de dados por parte dos jornalistas, a quem cabe, como ressalta Eugênio Bucci (2012) em A

imprensa e o dever da liberdade, ―o papel de fiscalizar o Estado, e também ao povo, pois

também a ele pertence essa tarefa‖.

4.6 MARCO CIVIL DA INTERNET

O Marco Civil da Internet é a mais recente legislação que dispõe da comunicação no

Brasil – e a única especificamente relativa ao uso da internet. O projeto estabelece princípios,

garantias, direitos e deveres aos usuários da rede, de modo a respeitar a liberdade de

expressão e com o intuito de democratizá-la e impedir a censura.

Um dos principais pontos dessa lei é a neutralidade da rede – destinada a impedir a

ocorrência de censura econômica – defendida em seu terceiro capítulo: ―[...] o responsável

pela transmissão, comutação ou roteamento tem o dever de tratar de forma isonômica

quaisquer pacotes de dados, sem distinção por conteúdo, origem e destino, serviço, terminal

ou aplicação‖ (BRASIL, 2014). Esse ponto da lei foi postulado pois algumas empresas

visavam à venda de pacotes que bloqueassem o acesso à determinados sites, possibilitando,

assim, cobrar mais caro pelo uso deles.

―[A lei ...] proíbe totalmente os provedores de internet de vender planos que façam

diferenciações no tráfego de dados ou que selecionem o conteúdo a ser acessado.

Com a aprovação do Marco, ficou vetado por exemplo, a venda de um pacote

permitindo utilizar somente acesso a e-mails e sites de notícias‖. (BBC, 2014).

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Outro aspecto a ser destacado sobre o Marco Civil é a responsabilização pelo conteúdo

publicado. Ao passo que, anteriormente, ela recaía sobre o provedor, agora ela passa ao

indivíduo que o publicou.

Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, o provedor

de aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos

decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não

tomar as providências para [...] tornar indisponível o conteúdo apontado como

infringente, ressalvadas as disposições legais em contrário. (BRASIL, 2014).

Esse ponto da lei afeta de forma especial o exercício do jornalismo na rede, uma vez

que o jornalista passa a responder pessoalmente pelos discursos que veicula. Assim, é

redobrada a atenção com a verificação dos fatos e a ética profissional, reforçando o papel do

profissional de comunicação como mediador da informação.

O Marco Civil é um importante avanço na legislação destinada à web no país,

principalmente no quesito de respeito à privacidade, pois ―[...] proíbe o acesso de terceiros a

dados e correspondências ou comunicação pela rede‖ (BBC, 2014). Ele pode ser entendido,

também, como uma resposta às recentes denúncias de espionagem envolvendo os Estados

Unidos37

.

Vale citar, também, nesse âmbito, a Lei nº 12.737, de 2012, conhecida como Lei

Carolina Dieckmann. Nela é prevista, entre outros pontos, a criminalização da invasão de

dispositivos informáticos alheios:

[...] mediante violação indevida de mecanismo de segurança e com o fim de obter,

adulterar ou destruir dados ou informações sem autorização expressa ou tácita do

titular do dispositivo ou instalar vulnerabilidades para obter vantagem ilícita

(BRASIL, 2012a).

Tais leis são fundamentais para garantir que o uso da internet e de meios digitais de

comunicação consolidem-se em práticas corretas. É importante ressaltar que passaram-se

muitos anos sem que houvesse uma regulação sobre a área, o que oportunizou a realização de

diversos crimes e ações impróprias. Quanto ao Marco Civil, é possível dizer que ele é o

reflexo da migração da luta há muito travada nos setores de comunicação impressa e

radiodifusão pela democratização na comunicação e ―[...] também busca garantir a liberdade

de expressão e a proteção da privacidade e dos dados pessoais‖ (BBC, 2014).

37

O escândalo da espionagem norte-americana causou grande desconforto nacional. O esquema foi descoberto

em junho de 2013, quando o ex-funcionário da CIA e da Agência Nacional de Segurança dos EUA (NSA),

Edward Snowden, divulgou aos jornais The Guardian e The Washington Post informações e documentos que

revelavam um programa de vigilância eletrônica global (WILGOREN, 2013).

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4.7 OS CÓDIGOS DE ÉTICA

O Jornalismo, Publicidade e Propaganda e Relações Públicas são áreas que, além de

regidas pela legislação da comunicação, têm códigos de ética que condicionam suas práticas.

Embora não constituam um aparato legislativo de fato, eles norteiam as decisões tomadas

pelos órgãos reguladores dessas profissões.

Abordaremos aqui, com mais efeito, o Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros, que

possui diretrizes mais intimamente ligadas com a questão proposta nesse trabalho. O

documento fundamenta-se no direito dos cidadãos a produzir e obter informação. (FENAJ,

2007).

De acordo com o documento, nada deve impedir o jornalista de apurar e divulgar

informações relevantes ao interesse público. Portanto, ―[...] a liberdade de imprensa, direito e

pressuposto do exercício do jornalismo, implica compromisso com a responsabilidade social

inerente à profissão‖, e ―a produção e a divulgação da informação devem se pautar pela

veracidade dos fatos e ter por finalidade o interesse público‖. (FENAJ, 2007).

As premissas do código, vale ressaltar, vão ao encontro do que é resguardado na

Constituição Federal. O documento também defende, por exemplo, ―[...] o direito

fundamental do cidadão à informação, que abrange o direito de informar, de ser informado e

de ter acesso à informação‖. O código ratifica que nada deve representar embaraço à liberdade

de opinião e expressão, pois ―[...] a obstrução direta ou indireta à livre divulgação da informação, a

aplicação de censura e a indução à autocensura são delitos contra a sociedade, devendo ser

denunciadas à comissão de ética competente, garantido o sigilo do denunciante‖. (FENAJ, 2007).

É importante perceber que, na essência, o código confere à comunicação os mesmos

preceitos e responsabilidades sociais defendidos nos dois primeiros capítulos da presente

pesquisa. De acordo com o documento, estão entre os deveres do jornalista:

[...] opor-se ao arbítrio, ao autoritarismo e à opressão, bem como defender os

princípios expressos na Declaração Universal dos Direitos Humanos; divulgar os

fatos e as informações de interesse público; lutar pela liberdade de pensamento e de

expressão; combater e denunciar todas as formas de corrupção, em especial quando

exercidas com o objetivo de controlar a informação; defender os direitos do cidadão,

contribuindo para a promoção das garantias individuais e coletivas, em especial as

das crianças, adolescentes, mulheres, idosos, negros e minorias. (FENAJ, 2007).

O código determina o sigilo da fonte e estabelece como um dos fundamentos da

profissão a presunção de inocência. Além disso, declara que o jornalista não deve ―[...] colocar

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em risco a integridade das fontes e dos profissionais com quem trabalha‖, e deve exercer com

responsabilidade a manifestação da opinião nos meios de informação. (FENAJ, 2007).

Caso não sejam respeitadas as diretrizes estabelecidas no código, cabe às comissões de

ética dos sindicatos e à Comissão Nacional de Ética – cujas formações são regulamentadas

também no documento – julgar as transgressões. O não cumprimento dos pontos

regulamentados no código pode resultar em ―penalidades de observação, advertência,

suspensão e exclusão do quadro social do sindicato e à publicação da decisão da comissão de

ética em veículo de ampla circulação‖. (FENAJ, 2007).

Um exemplo recente da atuação das comissões de ética foi o caso de Joice

Hasselmann, jornalista da revista Veja. Após o pedido de diversos veículos do Paraná, o

Conselho de Ética do estado abriu uma investigação que comprovou o plágio, por parte da

jornalista, de 65 reportagens escritas por 42 pessoas, entre 24 de junho e 17 de julho de 2014.

O Sindicato dos Jornalistas do Paraná (SindijorPR) optou por proibir o ingresso de

Joice Hasselmann no quadro da entidade, impedindo-a de desfrutar de serviços e benefícios

concedidos aos profissionais da categoria. ―As denúncias serão levadas também à Comissão

Nacional de Ética da Federação dos Jornalistas, onde outras sanções estão previstas‖.

(PORTAL FÓRUM, 2015).

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4.8 TV DIGITAL: NOVAS PERSPECTIVAS

O desenvolvimento da Televisão Digital e o estudo sobre a sua implantação

levantaram novas questões quanto à democracia nas comunicações. O Decreto nº 5.820, que

regula a implementação do Sistema Brasileiro de Televisão Digital Terrestre (SBTVD­T)38

,

estabelece algumas importantes observações nesse sentido. De acordo com o documento, o

SBTVD-T possibilita ―transmissão digital em alta definição (HDTV) e em definição padrão

(SDTV), transmissão digital simultânea para recepção fixa, móvel e portátil; e interatividade‖

(BRASIL, 2006).

A interatividade merece especial atenção, pois pode ser utilizada como ferramenta

para garantir o acesso da população aos mais variados serviços. ―[...] uma base digital

interativa pensada desde o campo da comunicação dialógica deve contemplar as

complexidades inerentes aos âmbitos da produção e da recepção e ser arquitetada a partir de

um projeto horizontal e participativo que contemple as audiências‖. (CASTRO, 2005, p. 108).

A Televisão Digital oferece uma nova possibilidade de dar voz aos diversos atores

existentes na sociedade, o que deve encontrar respaldo na legislação. Para isso, é necessário

que haja diálogo acerca de sua implementação.

Na perspectiva do dialogismo e da horizontalidade, faz-se necessária a busca por um

ponto de interesse comum entre os sujeitos envolvidos no processo de comunicação.

No caso da comunicação voltada para a sociedade contemporânea, cremos que o

ponto comum é um modelo digital que possa motivar os sujeitos a participarem

ativamente e não apenas como consumidores. Cidadãos de diferentes classes sociais

(e não apenas das classes média e alta que já têm acesso aos computadores) possam

descobrir na TVD e na interatividade um espaço de participação, diálogo e

construção cidadã, inclusive, propondo conteúdos a partir da sua realidade.

(CASTRO, 2005, p. 109).

Observando a necessidade de inclusão social, o Decreto nº 5.820 garante a existência

de canais explorados pela União, com fins educativos e culturais, bem como dedicados ao

Poder Executivo e à Cidadania – esse último, voltado à ―[...] transmissão de programações das

comunidades locais, bem como para divulgação de atos, trabalhos, projetos, sessões e eventos

dos poderes públicos federal, estadual e municipal‖. (BRASIL, 2006).

Atualmente, o projeto Brasil 4D tem reunido esforços para tornar realidade o cenário

de inclusão digital. A iniciativa utiliza a tecnologia Ginga39

, bem como diretrizes de políticas

38

―[...] conjunto de padrões tecnológicos a serem adotados para transmissão e recepção de sinais digitais

terrestres de radiodifusão de sons e imagens‖ (BRASIL, 2006). 39

―O Ginga é o middleware ou programa desenvolvido no Brasil para o sistema nipo-brasileiro de TV digital

terrestre (ISDB-Tb). O sistema pode ser instalado em conversores (set-top boxes), televisores, dispositivos

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públicas, ―transformando-as em conteúdos audiovisuais e aplicativos que permitem o acesso

do cidadão às informações acerca dos serviços disponibilizados‖ (EBC, 2014a).

O projeto tem como foco a população de baixa renda que, por meio da Televisão

Digital, pode obter informações sobre serviços públicos. A iniciativa é realizada de forma

gratuita, de modo a não comprometer a renda familiar (EBC, 2014a).

4.9 PROJETO DE LEI DE INICIATIVA POPULAR PARA A REGULAÇÃO DA MÍDIA

No final do governo Lula, o então ministro-chefe da Secretaria de Comunicação

Social, Franklin Martins, elaborou um projeto de lei voltado para a regulação da mídia, junto

a um grupo de trabalho, com base nas discussões da Conferência Nacional de Comunicação

(Confecom), realizada em 2009. A iniciativa, entretanto, foi engavetada com a entrada de

Paulo Bernardo na chefia da pasta, no início do governo de Dilma Roussef40

(VALENTE,

2014).

Como resposta a esse cenário, diversas entidades reuniram-se, em uma iniciativa do

FNDC, no ano de 2012, para criar uma campanha com o objetivo de discutir com os diversos

segmentos da sociedade a regulação da mídia. Assim, nasceu a campanha ―Para Expressar a

Liberdade – Uma nova lei para um novo tempo‖, que conta com o apoio da Associação

Brasileira de Imprensa (ABI), Coletivo Brasil de Comunicação Social (Intervozes), Fenaj,

Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação (Intercom), entre outros.

O projeto regulamenta os Arts. 5, 21, 220, 221, 222 e 223 da Constituição Federal.

Entre os principais dispositivos estão a criação do Conselho Nacional de

Comunicação41

e do Fundo Nacional de Comunicação Pública, veto à propriedade

de emissoras de rádio e TV por políticos, proibição do aluguel de espaços da grade

de programação e a definição de regras para impedir a formação de monopólio e a

propriedade cruzada dos meios de comunicação, entre outros pontos. (FNDC, 2015).

portáteis e outras plataformas digitais [... e] se diferencia pela adaptabilidade e interoperabilidade do modelo‖

(EBC, 2014). 40

A presidenta assumiu o poder em 2011 e foi reeleita em 2014, permanecendo na presidência do país até o

presente. 41

É importante destacar que o Conselho pretendido pelo projeto de lei tem funções um pouco distintas e

vigoraria junto ao Conselho de Comunicação Social, cuja existência e funções são definidas no artigo 224 da

Constituição Federal. O primeiro seria responsável por auxiliar na elaboração de políticas públicas do setor, bem

como elaborar um plano nacional de comunicação social eletrônica, entre outros pontos. Já o segundo tem como

principais funções estudar e avaliar questões referentes ao capítulo da Consituição Federal destinado à

comunicação, que tenham sido encaminhadas pelo Congresso Nacional.

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A iniciativa, que recolhe assinaturas desde o primeiro trimestre de 2013, ganhou no

início desse ano um formulário online de apoio ao projeto42

. A proposta tem como objetivo

recolher a assinatura de um por cento do eleitorado nacional – equivalente a aproximadamente

1,3 milhões de pessoas – para ser analisada como projeto de iniciativa popular na Câmara dos

Deputados. (FNDC, 2015).

42

Disponível em paraexpressaraliberdade.org.br/assina.php.

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5 LEI DE MEIOS: O CASO DA ARGENTINA

A mais recente lei que normatiza a exploração dos meios de comunicação na

Argentina, conhecida como Lei de Meios ou Lei dos Serviços de Comunicação Audiovisual

(LSCA), foi sancionada em outubro de 2009 no país. Instituída com o objetivo de tornar mais

plural e democrática a comunicação na Argentina, a lei buscou renovar o aparato regulador do

setor, ainda datado do período ditatorial argentino43

.

O marco normativo, vigente até o fim de 2009, tinha como elemento chave uma

norma (22.285/80) sancionada pelo governo de fato de 1976, que deu continuidade à

ditadura mais cruel da história argentina, regulou muitos aspectos da sociedade e

criou um sistema de meios de comunicação centralista e privatista, com muitos

setores excluídos dos seus direitos. (MARINO; MASTRINI; BECERRA, 2010, p.

105-106).

A Lei de Meios foi aprovada durante o governo de Cristina Kirchner – atual presidente

do país, desde 2007 –, do Partido Justicialista44

, e causou grande polêmica no cenário nacional

e internacional, principalmente por alguns pontos relativos à proibição da concentração dos

veículos audiovisuais em monopólios ou oligopólios.

Pelas diversas inovações previstas em suas disposições, a Lei vem sendo apontada

por uns como uma referência em termos de democratização da mídia e de

instrumento de combate à concentração do setor e, por outros, como uma ofensa à

liberdade de expressão e como fundamento a uma maior intervenção do Estado na

comunicação social. (LINS, 2009, p. 3).

Marino, Mastrini e Becerra (2010) apontam que a LSCA excede o âmbito nacional,

integrando um ―saudável processo latino-americano‖ no qual, em um marco inédito na

história das comunicações, as discussões e anseios da sociedade civil organizada conseguem

suplantar os ―acordos ‗não escritos‘ entre governos e donos das mídias‖. (MARINO;

MASTRINI; BECERRA, 2010, p. 105, grifo do autor). Os autores comentam, ainda, que:

43

A Argentina passou por diversos períodos de regime militar, muitos de caráter provisório. O último,

permanente, ocorrido entre 1976 e 1983, é lembrado como o mais violento. Teve início com o golpe de 24 de

março de 1976, que tirou Isabel Perón do poder e instalou, em seu lugar, uma junta militar autodenominada

"Processo de Reorganização Nacional". 44

Também conhecido como Partido Peronista, foi fundado pelo general Juan Domingos Perón. O partido – bem

como o movimento que a ele deu origem, o Justicialista – define-se como uma entidade populista e segue ―as 20

verdades peronistas‖, proferidas pelo general em um discurso ocorrido em outubro de 1950. A primeira das

verdades peronistas diz que ―a verdadeira democracia é aquela na qual o governo faz o que o povo quer e

defende um só interesse: o do povo‖ (PERÓN, 1950).

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63

Alguns governos assumiram a iniciativa [referindo-se à questão supracitada, de

suplantar os acordos entre a mídia e as empresas de comunicação], seja por estarem

convencidos da necessidade de regular a comunicação, seja para aumentar o seu

controle sobre o sistema midiático. Porém, além das intenções dos governos, a lei de

radiodifusão comunitária no Uruguai, as constituições da Bolívia e do Equador, a

Conferência Nacional de Comunicação no Brasil constituem exemplos da extensão e

amplitude de enfoques do debate. (MARINO; MASTRINI; BECERRA, 2010, p.

105).

Pode-se perceber, na Lei de Meios, o reflexo dos anseios que têm tomado conta da

população do Brasil – e de muitos países da América Latina e outras regiões do mundo, pelo

desejo de uma comunicação que atenda aos diversos atores da sociedade, que contemple as

minorias e que prime por representações verdadeiras das relações políticas, econômicas e

sociais que se desenvolvem nessas nações. É possível encontrar, também, nas discussões

políticas que se desenvolveram em torno da aprovação da lei, os mesmos grupos e entidades

contrários à implementação de tais políticas de comunicação, representados, principalmente,

pelas empresas de radiodifusão.

5.1 O EMBATE COM O CLARÍN

Apesar de ter sido sancionada ainda em 2009, a Lei de Meios esteve sem efeito até o

final de 2013, devido a uma medida cautelar outorgada ao Grupo Clarín45

, que questionava

algumas medidas estabelecidas pelo documento. (ARAÚJO, 2013). Na época de sua

aprovação, a lei causou uma ―batalha judicial‖ entre o governo de Cristina Kirchner, favorável

à aprovação da lei, e o conglomerado midiático argentino que, face à sanção da medida, teria

que desfazer-se de parte de suas licenças.

Desde 2009, quando a lei foi promulgada, o Clarín entrou na Justiça pedindo que

quatro artigos antimonopólio fossem declarados inconstitucionais. No período, o

grupo obteve liminares impedindo a aplicação da lei. Pela legislação vigente, o

Clarín não poderá ter emissoras de televisão (seu canal aberto principal é o 13) e

rádio, ao mesmo tempo que possui serviço de televisão a cabo e internet.

(MESQUITA, 2013).

Na verdade, a relação conflitiva entre o conglomerado midiático e o governo de

Cristina Kirchner teve início ainda em 2008, em decorrência do apoio da mídia ao lock out

45

O grupo é o maior conglomerado de comunicação argentino. Dono de jornais, revistas, provedor de internet e

emissoras de rádio e TV aberta e a cabo, o Clarín, que em 2011 teve faturamento de US$ 2 bilhões, teve que

desmembrar-se, pois possuía 250 licenças, quando a lei permite 24 (MESQUITA, 2013).

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64

agropecuário46

. Assim, estabeleceu-se uma desavença entre ambas as partes – o Clarín aliado

a outras grandes empresas de mídia – que agravou-se com o envio do projeto que resultaria na

Lei de Meios ao parlamento. (MARINO; MASTRINI; BECERRA, 2010).

Entende-se que a Lei de Meios, por seus dispositivos antimonopólio e antioligopólio,

suas limitações à concentração de audiência e a proibição à propriedade cruzada nos meios de

comunicação impacta, e muito, no espólio do Clarín, bem como o controle que ele exerce no

setor midiático. Ribeiro (2011) aponta um exemplo de como a LSCA afeta o conglomerado

midiático:

Na esfera nacional, uma mesma empresa, grupo ou pessoa física poderá ser titular

de, no máximo, uma licença de serviço de comunicação audiovisual por satélite.

Esta licença exclui a possibilidade de acumular qualquer outra. Na prática, isso

significa que megagrupos de mídia, como a Telefónica de España e o Clarín, terão

que optar por permanecer no negócio da televisão por satélite (o Grupo Clarin detém

5% da DirecTV e a Telefónica está presente do mercado de satélites por meio da

subsidiária Hispasat) ou permanecer com seus canais de televisão aberta. (RIBEIRO,

2011, p. 128).

O autor traz, ainda, uma declaração de Juan Gabriel Mariotto47

, que explica que o

Clarín conta com 80 por cento do público da televisão por assinatura no país. Com a

aprovação da lei, o grupo poderia reter no máximo 35 por cento dos assinantes e, portanto,

seria obrigado a desfazer-se de parte de suas operadoras, abrindo mão de quase 50 por cento

de sua fatia de mercado. (MARIOTTO apud RIBEIRO, 2010).

Igor Waltz (2013) explica que a regulação é considerada uma medida do governo

argentino para enfraquecer o Clarín, grupo de oposição aos governistas. Contudo, a Lei conta

com grande apoio da sociedade civil.

[A Lei] estabelece o limite de um terço das concessões de rádio e televisão do país

para empresas privadas, um terço para empresas públicas e um terço para entidades

sem fins lucrativos. Além disso, impõe níveis mínimos de difusão de conteúdo

nacional e de conteúdo educativo no caso das empresas privadas. (WALTZ, 2013, p.

2).

46

O lock out agropecuário foi uma mobilização ocorrida na Argentina em 2008, na qual quatro associações

patronais do setor agropecuário do país - a Confederação Rural Argentina (CRA), a Sociedade Rural Argentina

(SRA), a Federação Agrária Argentina (FAA) e a Confederação Intercooperativa Agropecuária (Coniagro) –

uniram-se em protesto a um novo regime de impostos sobre as exportações, realizando bloqueios sistemáticos de

estradas de modo a impedir a chegada de alimentos aos grandes centros consumidores urbanos

(AGROANALYSIS, 2008). 47

Então presidente da Autoridade Federal de Serviços de Comunicação Audiovisual (AFSCA) e um dos

principais redatores da Lei de Meios.

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65

Em 2013, após quatro anos de disputas judiciais, o governo de Cristina Kirchner saiu

vitorioso, com a declaração da constitucionalidade da Lei de Meios pela Corte Suprema da

Argentina. ―Com a sentença, o conglomerado [Clarín] dono de jornais, revistas, provedor de

internet e emissoras de rádio e TV aberta e a cabo terá que ser desmembrado. O grupo, que

em 2011 teve faturamento de US$ 2 bilhões, possui 250 licenças, quando a lei permite 24‖

(MESQUITA, 2013).

5.2 BRASIL E ARGENTINA: REALIDADES SEMELHANTES

Bráulio Costa Ribeiro (2011), no artigo O modelo de desconcentração do mercado

audiovisual da Argentina proposto pela nova Lei de Meios, pondera que, apesar de ter

encontrado na Argentina situação semelhante à que vive a maioria dos países latino-

americanos no início de seu governo, a presidente Cristina Fernandez Kirchner conseguiu, em

leis como essa, modificar o cenário. Ao dizer isso, o autor refere-se, principalmente, a

questões que podem ainda ser percebidas no Brasil, como o controle das comunicações por

um oligopólio e a presença cada vez maior do capital estrangeiro.

Com relação ao controle do mercado de comunicações, percebe-se, antes da Lei de

Meios, uma forte dominância do conglomerado Clarín nas comunicações argentinas, junto

com outras poucas empresas. Na mídia impressa paga, os jornais Clarín, La Nación e Diario

Popular – todos situados em Buenos Aires – retêm a maior parte do público com uma tiragem

média semanal de 350 mil, 152 mil e 89 mil, respectivamente. A televisão aberta tem como

principais redes a Telefe, pertencente ao grupo Telefónica, e o Canal 13, do grupo Clarín.

Telenueve, America e a TV Pública são os outros canais de maior audiência. Duas emissoras

de rádio AM, a Radio 10 e Mitre, controlam 50 por cento do share. Em FM, destacam-se seis

emissoras de Buenos Aires, com shares entre nove e 12 por cento – Pop, LA 100, Metro,

Principales, Vale, Rock and Pop e Mega. O mercado de televisão por assinatura é dominado

pelo Clarín, com as operadoras Multicanal e Cablevisión, que atendem a 47 por cento dos

assinantes. (LINS, 2009). Esse cenário, em especial, é muito semelhante ao brasileiro, cuja

imprensa permanece na mão de poucas famílias e grupos midiáticos.

Quanto à segunda questão, referente à presença do capital estrangeiro, regulamentada

no Brasil por meio do artigo 222 da Constituição Federal, é determinado que apenas

brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos, ou pessoas jurídicas constituídas sob

as leis brasileiras e que tenham sede no país, podem possuir empresas jornalísticas. A

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66

tendência mencionada – da presença cada vez maior do capital estrangeiro – reflete-se já

nessa definição pois, como apontam Sapper e Heberlê (2006), até 1988, tais propriedades

eram exclusivas a brasileiros natos. A participação do capital estrangeiro encontrou abertura,

nas empresas de comunicação brasileiras, principalmente após uma emenda constitucional

sancionada em 2002.

A principal alteração [da emenda constitucional nº 36, de 2002] ficou por conta da

nova redação do parágr. 1.º do art. 222, quando se reduz de 100 para 70% o

percentual mínimo de capital votante em tais empresas que deve ser controlado por

brasileiros natos ou naturalizados há mais de 10 anos [...] Houve, a rigor, três razões

básicas que explicam a abertura para o ingresso de capital do exterior: esta é uma

tendência muito clara observada na grande maioria dos países, impulsionada pela

onda globalizante dos mercados que se instaura a partir do meio da década de 90,

inclusive naqueles de economia tradicionalmente mais fechada; em segundo lugar,

empresas e empresários brasileiros viam (e vêem) com bons olhos o aporte de

recursos do exterior, [...] e, por fim, a questão da reciprocidade, ou seja, empresas

brasileiras ligadas à convergência da comunicação social também são sócios

(majoritárias ou minoritárias) em empreendimentos do gênero, na América Latina e

Europa, especialmente. (SAPPER; HEBERLÊ, 2006, p. 3).

Os autores percebem a possibilidade desse valor modificar-se novamente, a médio

prazo, de modo a conceder uma ainda maior abertura aos recursos estrangeiros no setor das

comunicações.

[... a] tendência é de aumentar provavelmente para até 49% a presença do capital

estrangeiro nas empresas do setor, reservando um controle mínimo de 51% para os

brasileiros natos ou naturalizados há mais de 10 anos, prática que já é adotada em

grande número de nações na atualidade. (SAPPER; HEBERLÊ, 2006, p. 5).

A participação do capital estrangeiro nas empresas de comunicação também é um

tema deliberado na Lei de Meios e será comentado no próximo item. Pode-se perceber, na

Argentina, a existência de uma preocupação – também pautada na legislação brasileira ao

longo dos anos – em manter as comunicações no domínio nacional. Entretanto, nas últimas

décadas as empresas estrangeiras têm recebido mais oportunidade e espaço nesse mercado,

bem como na legislação que o controla.

É importante ressaltar que a Lei de Meios surge para combater uma situação

comunicacional muito parecida com a do Brasil. Marino, Mastrini e Becerra (2010)

apresentam, em O processo de regulação democrática da comunicação na Argentina um

breve histórico das mudanças legislativas relativas à comunicação na Argentina, desde a

ditadura até o presente momento. Referindo-se ao país, os autores explicam:

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67

Não se pode negar sua precoce dependência do capital e vinculação à produção

externa; o histórico centralismo do sistema em torno de Buenos Aires tanto no que

se refere à gestão quanto à circulação de informação e à produção de conteúdos; a

sistemática discriminação dos agentes não-governamentais sem fins lucrativos; a

validação legal (geralmente por meio de decretos presidenciais) de situações de fato

que violaram a lei; o não cumprimento da lei e do seu regulamento em determinados

pontos (por exemplo, os que exigem a divulgação das contas dos meios de

comunicação ou a autorização do Executivo para realizar repasse de ações); a

formação de organismos de regulação e controle com caráter centralista, unitário e

diretamente dependente do Executivo Nacional; a privatização do lucro e a

estatização das dívidas. (MASTRINI et al., 2005, apud MARINO; MASTRINI;

BECERRA, 2010, p. 107).

A concentração da produção de conteúdos em torno das capitais e metrópoles, a

permissividade do oligopólio e o centralismo que permeia os organismos de regulação são

fatores que ainda se fazem presentes na realidade do Brasil. Isso explica o impacto que a

medida teve nas discussões em prol da democratização da comunicação no país e os estudos

relativos à possibilidade de medidas similares para a regulação da mídia no Brasil.

5.3 PREMISSAS DA LEI DE MEIOS

A Lei de Meios passou a vigorar, na Argentina, como uma legislação voltada

principalmente para a radiodifusão – uma vez que dispõe principalmente da exploração dos

serviços de televisão e rádio –, apesar de discorrer das telecomunicações, de um modo geral.

Ela propõe-se a regular a comunicação audiovisual e o desenvolvimento de ferramentas que

visam a fomentar e descentralizar o setor, ―com o objetivo de diminuição de custos,

democratização e universalização do aproveitamento das novas tecnologias da informação e

da comunicação‖. (ARGENTINA, 200948

). O documento explica, ainda, que:

A atividade realizada pelos serviços de comunicação audiovisual é considerada de

interesse público, de caráter fundamental para o desenvolvimento sociocultural da

população porque exterioriza o direito humano inalienável de expressar, receber,

difundir e investigar informações, ideias e opiniões. (ARGENTINA, 2009).

Ribeiro destaca que a lei, ―[...] além de modificar o modelo de outorgas das licenças

dos serviços de radiodifusão, regula a camada dos chamados serviços de comunicação

audiovisuais, independentemente da plataforma de transmissão‖. (RIBEIRO, 2011, p. 121). O

documento aumenta, ainda, a transparência do setor, uma vez que exige dos detentores de

outorgas a divulgação de informações relativas aos veículos. (RIBEIRO, 2011).

48

Os fragmentos da LSCA citados aqui são traduções livres do documento original, realizadas pela autora da

presente pesquisa.

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68

Nos Artigos 10, 15 e 17, a lei estabelece a criação de três importantes entidades

destinadas a auxiliar o estado na regulação das comunicações. São eles a Autoridade Federal

de Serviços de Comunicação Audiovisual (AFSCA), o Conselho Federal de Comunicação

Audiovisual e o Conselho Assessor da Comunicação Audiovisual e da Infância.

(ARGENTINA, 2009).

Cabe, à AFSCA, entre outros: aplicar, interpretar e observar o cumprimento da lei;

elaborar e aprovar as regras que regulem o funcionamento do diretório; elaborar e atualizar a

Norma Nacional de Serviço e normas técnicas que regulam a atividade; promover a

participação da comunicação audiovisual no desenvolvimento de uma Sociedade da

Informação e do Conhecimento; aprovar os projetos técnicos das estações de radiodifusão,

outorgar a habilitação e aprovar o início das transmissões; elaborar e aprovar documentos de

bases e condições para a concessão de serviços de comunicação audiovisual; conceder,

prorrogar e declarar a expiração das licenças e autorizações; fiscalizar e verificar o

cumprimento das obrigações previstas na lei, bem como os compromissos assumidos pelos

prestadores dos serviços de comunicação audiovisual e radiodifusão; prevenir e desencorajar

práticas monopolísticas e condutas anticompetitivas e predatórias; aplicar as sanções pelo não

cumprimento da lei; administrar os fundos provenientes de encargos, taxas e multas;

administrar os recursos e reclamações do público ou outras partes interessadas; prover os

recursos necessários para o funcionamento do Conselho Federal de Comunicação

Audiovisual, bem como responder aos seus requerimentos e aos da Defensoria do Público e

da Comissão Bicameral de Promoção e Desenvolvimento da Comunicação Audiovisual;

realizar estudos técnicos para avaliar o nível e efeitos das emissões radioelétricas no corpo

humano e no ambiente, de modo a impedir danos à saúde e ao meio-ambiente.

(ARGENTINA, 2009).

O Conselho Federal de Comunicação Audiovisual tem, entre outras funções, as de

colaborar na elaboração da política pública de comunicação; propor pautas para os

documentos de bases e condições para os participantes de concursos ou da concessão direta de

licenças; confeccionar e levar à atenção do Poder Executivo nacional a listagem de eventos de

interesse público transcendente como definido no Título III, Capítulo VIII da lei49

; apresentar

os requerimentos do público à Defensoria do Público, quando solicitado ou quando se

considere oportuno devido à relevância da reclamação; produzir um informe anual sobre o

49

A listagem, definida no Artigo 78 do documento, inclui acontecimentos emitidos ou retransmitidos

tradicionalmente por TV aberta, cuja realização desperte atenção ou relevância sobre a audiência e que se trate

de um acontecimento de importância nacional, ou internacional com significante participação de argentinos

(ARGENTINA, 2009).

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69

estado do cumprimento da lei e o desenvolvimento da radiodifusão do país; selecionar os

projetos apresentados ao Fundo de Fomento Concursável. (ARGENTINA, 2009).

Ao Conselho Assessor da Comunicação Audiovisual e da Infância, cabe a elaboração

de propostas que aumentem a qualidade da programação dirigida às crianças e adolescentes;

estabelecer critérios e diagnósticos de conteúdos recomendados e apontar os conteúdos

inconvenientes; propiciar a realização de estudos sobre audiovisual e infância, bem como de

programas da capacitação na área; apoiar concursos, prêmios e festivais de cinema, vídeo e

televisão para crianças e adolescentes, bem como cursos, seminários e atividades que tratem

da relação entre audiovisual e infância; formular um plano de ação para o fortalecimento das

relações do campo audiovisual – que compreende cinema, televisão, vídeo, videogames,

informática e outros meios e suportes audiovisuais – com a cultura e a educação; promover a

produção de conteúdos para crianças ou adolescentes com necessidades especiais; elaborar

um Programa de Formação em Recepção Crítica de Meios e Tecnologias da Informação e das

Comunicações; monitorar o cumprimento da norma vigente sobre o trabalho de crianças e

adolescentes na televisão; e estabelecer critérios básicos para os conteúdos publicitários, de

modo a evitar que tenham um impacto negativo sobre a infância e a juventude.

(ARGENTINA, 2009).

A Lei de Meios define, no Artigo 3, como objetivos dos serviços e conteúdos de

comunicação audiovisual, entre outros, os seguintes: promover e garantir o direito de toda

pessoa a investigar, receber e difundir informações, opiniões e ideias, sem a existência de

censura, em consonância com o estado democrático de direito e os direitos humanos;

promover o federalismo e a integração da América Latina; difundir as garantias e direitos

estabelecidos na Constituição Federal; construir uma sociedade da informação e do

conhecimento, com prioridade à alfabetização midiática; promover a expressão da cultura

popular, bem como o desenvolvimento cultural, educativo e social; o acesso de toda a

população à informação pública; a participação dos meios de comunicação como formadores

de atores sociais e de distintas representações das realidades do mundo, elucidadas por

diversos pontos de vista e com abertura, sempre, ao debate. (ARGENTINA, 2009).

No Artigo 45 da Lei de Meios estão estabelecidos os limites à concentração de

licenças, ―a fim de garantir os princípios de diversidade, pluralidade e respeito‖. O documento

define que uma pessoa poderá ser titular ou ter participação na titularidade de licenças, em

nível nacional, nos limites de: a) uma licença de serviços de comunicação audiovisual por

satélite; b) no máximo dez licenças de serviços de comunicação audiovisual além da

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titularidade do registro de um sinal de conteúdos, para rádio, televisão aberta e radiodifusão

televisiva por assinatura com uso do espectro radioelétrico; c) até 24 licenças para a

exploração dos serviços de radiodifusão por assinatura com vínculo físico em diferentes

localidades – para as quais a autoridade de aplicação determina o alcance territorial e de

audiência. A lei define que a concentração de licenças a nível nacional e para todos os

serviços não pode implicar, em caso algum, na prestação de serviços a mais de 35% do share

nacional. (ARGENTINA, 2009).

O Artigo 45 define ainda que, a nível local, é permitida a titularidade, por uma mesma

pessoa, de: a) uma licença de radiodifusão sonora por AM; b) uma licença por FM ou até duas

licenças quando existirem mais de oito licenças na área primária de serviço; c) uma licença de

radiodifusão televisiva por assinatura, se o solicitante não for titular de uma licença de

televisão aberta; d) uma licença de radiodifusão televisiva aberta, se o solicitante não for

titular de uma licença de televisão por assinatura. ―Em nenhum caso, a soma do total de

licenças outorgadas na mesma área primária de serviço ou o conjunto delas que se

sobreponham de modo majoritário, poderá exceder a quantidade de três licenças‖.

(ARGENTINA, 2009).

Cotas para a programação veiculada também são delimitadas pelo documento. As

emissoras de rádio não estatais devem veicular um mínimo de 70 por cento de conteúdos

nacionais, além de 30 por cento da música veiculada – da qual metade deve ser de produção

independente –, e devem produzir ao menos a metade da programação jornalística. Para a

radiodifusão sonora estatal e de universidades públicas, as cotas de produção própria são de

60 por cento, e ao menos 20 por cento da programação deve abranger conteúdo educativo,

cultural e de interesse público. As emissoras de televisão aberta devem possuir no mínimo 60

por cento de conteúdo nacional. Elas devem produzir, no mínimo, 30 por cento de sua

programação, inclusos aí os programas jornalísticos locais. (LINS, 2009). Além disso, a ―[...]

quota de programação local independente é de 30% para estações situadas em localidades

com mais de 1.500.000 habitantes, de 15% se a localidade possuir mais de 600.000 habitantes

e de 10% nos demais casos‖. (LINS, 2009, p. 19).

Os limites para entrada do capital estrangeiro nas empresas de comunicação são outro

ponto referido na lei. No artigo 25, alínea c, o documento define que titulares de licenças de

exploração dos serviços de comunicação audiovisual ―não poderão ser filiais ou subsidiárias

de sociedades estrangeiras, nem realizar atos, contratos ou pactos societários que permitam

uma posição dominante do capital estrangeiro na condução da pessoa jurídica licenciada‖.

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71

(ARGENTINA, 2009). No artigo 29, ainda, consta que sociedades comerciais prestadoras de

serviços de comunicação licenciados devem possuir um capital social de origem nacional,

permitindo que no máximo 30% do capital acionário e com direito a voto fique em poderio

estrangeiro, ―sempre que essa porcentagem não signifique possuir direta ou indiretamente o

controle da sociedade‖. (ARGENTINA, 2009).

A lei estabelece, com relação ao espectro radioelétrico, a retenção de emissoras para

alguns casos específicos. Ao Estado, estão reservadas ―as frequências necessárias para o

cumprimento dos objetivos da Rádio e Televisão Argentina Sociedade do Estado50

‖. A cada

província e à Cidade Autônoma de Buenos Aires, reservam-se duas emissoras de rádio – uma

em AM e outra em FM – e uma de televisão aberta. A cada município, uma emissora de rádio

em FM. (ARGENTINA, 2009).

Além disso, cada local sede de uma universidade federal tem direito a uma emissora

de televisão aberta e uma de rádio em FM. Aos povos originários, estão reservadas uma

emissora de rádio em FM e outra em AM. Por fim, ―33 por cento das localizações

radioelétricas planificadas, em todas as bandas de radiodifusão sonora e de televisão terrestres

[... estão reservadas] para exploração sem fins lucrativos‖. (ARGENTINA, 2009).

Marino, Mastrini e Becerra ponderam, com relação à LSCA, que:

[...] constitui um importante avanço porque vincula o conceito de liberdade de

expressão aos direitos humanos. Também porque, em um país centralista, ela

promove o federalismo tanto da produção de conteúdos como da tomada de

decisões, porque incentiva a diversidade de vozes, estabelecendo limites para a

concentração e o domínio de mercado; e porque, pela primeira vez na Argentina,

tanto a autoridade de aplicação quanto os meios de comunicação de gestão estatal

não serão totalmente controlados pelo governo de turno. (MARINO; MASTRINI;

BECERRA, 2010, p. 108).

A Lei de Meios argentina é, certamente, um marco no que se refere à legislação das

comunicações. O governo de Cristina Kirchner conseguiu, ao aprová-la, o que o governo

brasileiro ensaia fazer desde o primeiro mandato de Lula, em 2002, e até hoje não obteve

sucesso. Entende-se que a LSCA é um grande avanço, em matéria de democracia e pluralismo

na mídia, e que está aliada aos anseios dos países latino-americanos que conviveram com

regimes ditatoriais recentes – aí incluso o Brasil – por uma imprensa que tenha superado

legislações ultrapassadas e práticas que vão contra o interesse público.

50

Empresa estatal de comunicação.

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72

5.4 CINCO ANOS DEPOIS, A REGULAÇÃO DOS DISPOSITIVOS DA LEI DE MEIOS

Mais de cinco anos após a aprovação da Lei de Meios, sua implementação ainda

encontra desafios, mas obteve êxito em diversos pontos. Segundo o relatório elaborado pelo

Conselho Federal de Comunicação Audiovisual (Cofeca), em 2013, que versa sobre o

cumprimento da lei e o desenvolvimento da radiodifusão na Argentina, ―[...] depois de muitas

décadas, voltou-se a discutir o papel dos meios de comunicação como atores sociais, políticos

e econômicos; desfecho que foi possível graças ao modo de gestão dessa lei‖. (COFECA,

2013, p. 5)51

.

Um dos aspectos em que a lei se encontra estagnada é a concentração de mercado.

Como exemplo, o relatório aponta que as 1117 licenças dos serviços de televisão a cabo são

exploradas por 709 empresas, o que equivale a uma média de 1,6 licença cada. ―O Grupo

Clarín possui 237 licenças, o que significa 150 vezes mais que a média‖ (COFECA, 2013, p.

7).

[...] é necessário recordar que as travas judiciais impostas à lei dificultaram sua

aplicação até junho de 2010 e os artigos centrais relacionados ao tema (art. 41 sobre

a intransferibilidade das licenças; art. 45 sobre a multiplicidade de licenças; art. 48

sobre concentração de meios e art. 161 sobre adequação patrimonial dos grupos do

setor) até o momento não puderam ser aplicados ao Grupo Clarín, a empresa de

comunicações com maior concentração de licenças e propriedade cruzada.

(COFECA, 2013, p. 8).

O Clarín continua, mesmo após perder a batalha que travou na justiça contra o

governo, fugindo à regulação estabelecida pela LSCA. Em 2014, o conglomerado apresentou

seu plano de adequação voluntária à AFSCA, que rejeitou o projeto. Segundo o jornal

argentino La Nación, o então titular da entidade, Martín Sabatella, afirmou que as medidas

não se ajustavam à lei e apontou duas principais ―manobras‖ no plano, que visavam a burlar

as premissas estabelecidas na LSCA. (NACIÓN, 2014).

O conglomerado propôs dividir-se em seis unidades de negócios para adequar-se à lei.

Uma das manobras diz respeito a duas dessas unidades: o Grupo Clarín S. A. – detentor dos

canais de televisão aberta 13, 12 e 6; duas emissoras de rádio AM e cinco FM; e 24 licenças

de televisão por assinatura por vínculo físico – e a Cablevisión Holding S. A., detentora de

outras 24 licenças de televisão por assinatura por vínculo físico. Percebeu-se a existência de

vínculos societários e comerciais entre os administradores e membros propostos para as duas

51

Todos os trechos desse relatório apresentados nessa pesquisa foram traduzidos livremente pela autora do

presente trabalho.

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unidades, o que significaria, na prática, que os mesmos donos – ou uma parte deles – teriam

posse das licenças de ambas, excedendo o limite de licenças destinado a um único dono.

(AFSCA, 2014).

A segunda manobra detectada, por sua vez, envolve condicionamentos aos supostos

compradores. Segundo o plano, as ações não poderiam ser vendidas, pela empresa que as

adquirisse, em um prazo de 6 a 8 anos, dependendo da unidade. Dentro desse período, apenas

o Clarín poderia readquirir os serviços vendidos e, terminado o prazo, o grupo ainda teria

direito preferencial de compra. O documento estabelece, ainda, que o Clarín deve receber uma

comissão de 85 por cento da venda bruta dos sinais, com um mínimo garantido de 6 milhões

de pesos por mês durante dez anos52

. (AFSCA, 2014).

Frente à reprovação do plano de adequação voluntária do Grupo Clarín, a AFSCA deu

início a um processo de adequação forçosa à lei, no qual a entidade decidiria quais sinais e

veículos deveriam ser vendidos pelo conglomerado. Contudo, em fevereiro de 2015, a Câmara

Federal da Argentina suspendeu o processo, por meio de uma medida cautelar concedida ao

conglomerado, sob o argumento de que a decisão de Martín Sabatella foi arbitrária e

inesperada. (NACIÓN, 2015).

As empresas de comunicação do país foram convocadas a apresentar seus planos de

adequação à Lei de Meios até 7 de dezembro de 2012. Foram recebidos e analisados os planos

de quase 40 grupos de mídia, dos quais 14 foram aprovados. De outras 15 empresas, não se

requereu adequação à lei. (COFECA, 2013).

O relatório do Cofeca evidencia a criação de diversas emissoras sem fins lucrativos,

produtoras audiovisuais comunitárias e independentes e o surgimento de pequenas e médias

empresas no setor. A Associação Argentina de Teledifusoras PME e Comunitárias apontou

um crescimento exponencial de associadas, que ultrapassam as 300 emissoras. O Fórum

Argentino de Rádios Comunitárias, por sua vez, registrou um aumento de 44 para 92

emissoras, entre 2009 e 2013 – ou seja, mais de 50 por cento, apesar de ter sido instituído há

20 anos. (COFECA, 2013).

Ainda no âmbito de mudanças relativas à lei, foram entregues 12 licenças em

localidades vulneráveis ou com baixa densidade demográfica, 42 autorizações para serviços

de comunicação audiovisual de estabelecimentos educativos e juvenis e 11 autorizações de

rádios de FM mais um canal de televisão aos povos originários de todo o país. (COFECA,

2013).

52

O relatório completo elaborado pela AFSCA pode ser acessado em bit.ly/1DvSjmq.

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Foram lançadas políticas de fomento às produções audiovisuais, que resultaram em

―[...] 400 obras audiovisuais fomentadas pelo Estado; 1126 horas de novos conteúdos

audiovisuais; 5 mil novos postos de emprego; 480 programas já emitidos; 5 milhões de pesos

investidos em novos equipamentos tecnológicos; 19 séries do Plano de Fomento vendidas ao

exterior‖. (COFECA, 2013).

Desde a sanção da lei, os povos originários receberam 35 autorizações para instalação

de serviços de comunicação audiovisual e oito universidades federais puseram seus canais no

ar. Também é relevante a reserva de 33 por cento das licenças para entidades privadas sem

fins lucrativos – que antes da aprovação do documento, não eram reconhecidas e

funcionavam, por vezes, com permissões precárias. (COFECA, 2013).

Em janeiro de 2015 a AFSCA aprovou uma chamada para concurso que deve criar 82

novos canais de televisão digital, dando início a um plano de migração do analógico para o

digital. Segundo o La Nación, ―os concursos podem dar lugar a uma nova composição da TV

aberta argentina até o final do ano‖. (CRETTAZ, 201553

). A AFSCA aprovou também, de

acordo com o jornal, os planos de adequação do Canal 9 e Telecentro. (CRETTAZ, 2015).

53

Trecho traduzido livremente pela autora dessa pesquisa.

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6 METODOLOGIA

6.1 MÉTODO

O método é o que orienta a aquisição do conhecimento, seus processos e etapas, e

pode compreender três distintos significados. Conforme Paviani (2009):

[...] o primeiro, indica caminho, orientação, direção; o segundo, aponta modos

básicos de conhecer (como analisar, descrever, sintetizar, explicar, interpretar), e o

terceiro refere-se a um conjunto de regras, de procedimentos e de instrumentos e ou

técnicas (como questionário, entrevista, documentos) para obter dados e

informações. (PAVIANI, 2013, p. 61).

O autor explica, ainda, que o método não deve ser percebido, em uma visão

reducionista, como um simples esquema. Ele não é aplicado indistintamente, mas, sim,

construído em cada caso, observando as especificidades do estudo no qual está inserido. Para

Paviani, ―[...] o verdadeiro método consiste na articulação de um conjunto de elementos que

caracterizam determinado processo de conhecer, efetivado numa determinada linguagem e

numa concepção de realidade‖. (PAVIANI, 2013, p.62).

Lakatos e Marconi (2011) apontam que a inteligência e o talento são, sim, necessários

e determinantes na elaboração de um projeto, mas devem estar aliados ao método, que é ―um

fator de segurança e economia para a consecução do objetivo‖. (LAKATOS; MARCONI,

2011, p. 455). Para os autores, o método atinge seus objetivos após o cumprimento de nove

etapas. São elas:

a) Descobrimento do problema; b) colocação precisa do problema; c) procura de

conhecimentos ou instrumentos relevantes ao problema; d) tentativa de solução do

problema com auxílio dos meios identificados; e) invenção de novas ideias, f)

obtenção de uma solução; g) investigação das consequências da solução obtida; h)

prova (comprovação) da solução; e i) correção das hipóteses, teorias, procedimentos

ou dados empregados na obtenção da solução incorreta. (LAKATOS; MARCONI,

2011, p. 51-52).

A presente monografia consiste em uma pesquisa qualitativa realizada por meio do

estudo de caso. Contudo, uma vez que aborda duas realidades distintas – do Brasil e da

Argentina –, vale ressaltar que o trabalho também adentra no campo da comparação.

O estudo de caso, segundo definição de Lakatos e Marconi (2011), ―[...] se caracteriza

por dar especial atenção a questões que podem ser conhecidas por meio de casos‖. Os autores

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explicam, ainda, que ele utiliza diferentes métodos de pesquisa para levantar informações

sobre o objeto estudado.

Para Lüdke e André (1986), algumas características são fundamentais ao estudo de

caso – eles visam à descoberta; enfatizam a interpretação em contexto; buscam retratar a

realidade de forma completa e profunda; usam uma variedade de fontes de informação;

revelam experiência vicária e permitem generalizações naturalísticas; procuram representar

diferentes pontos de vista numa situação social; utilizam linguagem mais acessível.

Algumas dessas características, em especial, são importantes para esta pesquisa.

Destaca-se, em primeiro lugar, a questão da descoberta, uma vez que, entre os objetivos aqui

destacados, está o de descobrir se há necessidade de uma regulação da imprensa nos moldes

do caso analisado no estudo comparativo e como ela seria possível. Em segundo lugar, atenta-

se para a interpretação em contexto, uma vez que as lutas políticas e seus atores no Brasil – e

também na Argentina, que é o caso comparado – são imprescindíveis para que o presente

estudo pondere todas as nuances envolvidas nas questões que aborda, bem como suas causas e

consequências. A busca por retratar a realidade de forma profunda também é um dos nortes

dessa pesquisa, que trata de importantes questões sociais e, por consequência, com estruturas

de dominação intrinsecamente consolidadas e dissimuladas.

Como essa pesquisa envolve dois casos – o da Argentina, por ser um país de realidade

semelhante ao Brasil e no qual a regulação já foi implementada, e o do próprio Brasil –, fez-se

uso também a presença da metodologia comparativa. ―Ocupando-se da explicação dos

fenômenos, o método comparativo permite analisar o dado concreto, deduzindo do mesmo os

elementos constantes, abstratos e gerais‖. (LAKATOS; MARCONI, 2011, p. 92).

A comparação é fundamental a essa pesquisa, pois ela aborda as relações entre o

contexto social e político brasileiro e o argentino, com foco na legislação em torno da

comunicação em ambos os países.

Ocupando-se da explicação dos fenômenos, o método comparativo permite analisar

o dado concreto, deduzindo do mesmo os elementos constantes, abstratos e gerais.

Consititui uma verdadeira ―experimentação indireta‖. É empregado em estudos de

largo alcance, [...] assim como para estudos qualitativos. [...] num estudo descritivo,

pode averiguar a analogia entre ou analisar os elementos de uma estrutura.

(LAKATOS; MARCONI, 2011, p. 92).

A comparação, na presente pesquisa, começa por analisar as semelhanças e diferenças

entre o Brasil e a Argentina no cenário político e social, descobrindo, então, os elementos

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constantes. Estes servirão de base para observar a urgência de uma lei, no Brasil, com

dispositivos semelhantes aos da Lei de Meios do país vizinho.

6.2 PROBLEMA DE PESQUISA

O problema de pesquisa é, para o conhecimento científico, um tópico não resolvido

que é transformado em objeto de discussão (GIL, 2002). Ele deve possibilitar a investigação

de fatores relacionados às suas causas e consequências por meio do método, bem como

possibilitar a observação de variáveis e as relações que elas estabelecem no âmbito geral do

problema.

O problema de pesquisa deve ser elaborado na forma de pergunta, pois facilita a

identificação do objetivo do projeto: ―De modo geral, o estudante inicia o processo da

pesquisa pela escolha de um tema, que por si só não constitui um problema. Ao formular

perguntas sobre o tema, provoca-se a sua problematização‖. (GIL, 2002, p. 27). Visto que a

elaboração do problema exige uma reflexão acerca do cerne da questão abordada na pesquisa,

ele ajuda a identificar o fio condutor do projeto a ser realizado e suas questões de relevância.

O presente trabalho norteia-se pela necessidade e urgência de uma legislação que

assegure a democratização e a representatividade de todos os grupos sociais nos meios de

comunicação brasileiros. Por meio desse questionamento, busca-se abranger a proposta de

pesquisa em todas as suas variáveis – que envolvem, principalmente, o aparato legislativo e a

representação social – e guiar o raciocínio elaborado ao longo do trabalho.

6.3 ANÁLISE

A análise envolve a explicitação ou decomposição de elementos que constituem

determinado estudo – que são, no presente trabalho, as leis brasileiras e a LSCA argentina.

Ela requer a desestruturação de conceitos, proposições e discursos nas menores partes

possíveis, de tal forma que a compreensão dos detalhes e pormenores possibilite uma mais

ampla e refletida visualização do todo.

Num sentido próximo aos procedimentos de pesquisa, a análise consiste em definir

conceitos, estabelecer categorias, codificações, tabulações, dados estatísticos,

generalizações de dados, relações entre variáveis, etc. A análise também pode ser

entendida ―como redução, como decomposição e como elucidação‖. Podem-se

decompor ideias, conceitos ou atos (vivências), proposições, discursos, conceitos.

Cada uma dessas formas combinadas entre si podem dar origem a diferentes

processos metodológicos. (PAVIANI, 2013, p. 76).

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A linguagem, a descrição, a comparação e as estatísticas também podem integrar uma

análise. Segundo Paviani (2013), esses quatro processos podem ser utilizados para analisar

uma série de diferentes ferramentas, processos e dados, e são extremamente úteis para a

interpretação da realidade.

6.3.1 Análise de conteúdo

A análise de conteúdo, definida por Bardin como ―[...] um conjunto de técnicas de

análise das comunicações‖ (1997, p.31), será empregada neste trabalho. Segundo a autora, a

AC possui duas funções, que podem estar associadas ou não. A primeira é a função heurística,

na qual ―[...] a análise de conteúdo enriquece a tentativa exploratória, aumenta a propensão à

descoberta‖. (BARDIN, 1997, p. 30). A segunda refere-se à administração da prova, na qual a

análise age de modo a confirmar ou não as questões e afirmações provisórias54

propostas na

pesquisa. (BARDIN, 1997, p. 30).

Ambas as funções serão fundamentais para, em uma primeira instância, observar os

pormenores legislativos presentes no Brasil e na Argentina, que são o conteúdo essencial a ser

analisado, detectando pontos estabelecidos claramente na lei e também outros, não tão

definidos. Em uma segunda instância, para estabelecer um comparativo entre a realidade

legislativa de ambos os casos analisados.

O objetivo da análise de conteúdo é ultrapassar a interpretação inicial da realidade,

levando a uma interpretação mais ponderada e profunda. Ela propõe a dúvida quanto à visão

do observador também poder ser partilhada por outros, bem como o enriquecimento da

leitura,

[...] pela descoberta de conteúdos que confirmam (ou infirmam) o que se procura

mostrar a propósito das mensagens, ou pelo esclarecimento de elementos de

significações susceptíveis de conduzir a uma descrição de mecanismos de que a

priori não detínhamos a compreensão. (BARDIN, 1997, p. 29).

A AC possibilita, portanto, na presente pesquisa, esclarecer possíveis acordos e

entendimentos entre as partes interessadas na formulação da legislação, bem como propósitos,

mecanismos e questões subjetivas identificadas nas leis. A análise de conteúdo constitui-se,

54

Cabe a ressalva, nesse ponto da metodologia, que a presente pesquisa não contém hipóteses pela razão de que

não houve necessidade de outras ponderações além da questão norteadora e dos objetivos para guiar o trabalho

no âmbito da temática proposta.

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79

segundo Bardin (1997), por três etapas. São elas a a) a pré-análise; b) a exploração do

material; e c) o tratamento dos resultados, a inferência e a interpretação.

6.3.1.1 Pré-análise

A pré-análise representa a organização do conteúdo e, de acordo com Bardin (1997),

propõe-se às seguintes missões: ―a escolha dos documentos a serem submetidos à análise, a

formulação das hipóteses e dos objetivos e a elaboração de indicadores que fundamentem a

interpretação final‖. (BARDIN, 1997, p. 95). Portanto, nessa fase do processo, a análise faz a

transição do pensamento e das ideias para um projeto definido de como será elaborada.

Em um primeiro momento, ocorre o processo de ―leitura flutuante‖, que tem início

com uma leitura exploratória do material. Com o aprofundamento e familiarização com o

material, esse contato inicial com o conteúdo dá lugar a uma leitura direcionada aos possíveis

objetivos, aos elementos específicos que constituirão a pesquisa. (BARDIN, 1997).

Vale destacar, quanto à escolha do conteúdo a ser analisado, que algumas regras

devem ser respeitadas. Elas dizem respeito à exaustividade, representatividade,

homogeneidade e pertinência.

Para a primeira, depois de definido o âmbito documental a ser pesquisado, como, no

caso dessa pesquisa, as leis brasileiras que se referem à comunicação, nenhum texto que

integre esse campo deve ser deixado de fora. A segunda explicita que, caso sejam

selecionadas amostras do conteúdo, estas devem ser representativas do todo para que os

aspectos observados possam ser generalizados, como é o caso da Lei de Meios, escolhida por

abranger vários aspectos do campo comunicacional na Argentina e ser a principal lei em

vigência nesse setor. A terceira defende que, quando determinado o campo de análise,

nenhum documento deve ser muito singular em relação ao tema – portanto, uma vez que o

campo delimitado são leis que abrangem a comunicação de um modo geral, não devem ser

analisadas leis muito específicas ou referentes a temas que não os relativos à comunicação. A

última, por sua vez, ressalta que a seleção de documentos deve ser realizada em concordância

com a pertinência deles ao projeto. (BARDIN, 1997). As leis brasileiras selecionadas para

esse trabalho, por exemplo, foram escolhidas com base na presença de pontos essenciais para

as questões de democracia e pluralidade na comunicação – controle econômico dos meios de

comunicação; diversidade cultural assegurada pela lei na mídia; liberdade de expressão e livre

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exercício do jornalismo; órgãos responsáveis pela regulação – que fundamentam os objetivos

da presente pesquisa.

Em seguida, são formulados os objetivos, que foram traçados no projeto de pesquisa,

em anexo. Eles têm como função orientar a análise para quais questões ela deve responder,

para os aspectos que estão sendo postos em debate pela pesquisa.

A última parte da pré-análise consiste na definição dos índices e elaboração dos

indicadores.

O índice pode ser a menção explícita de um tema numa mensagem. Se se parte do

princípio que este tema possui tanto mais importância para o locutor, quanto mais

frequentemente é repetido (caso da análise sistemática quantitativa), o indicador

correspondente será a frequência deste tema de maneira relativa ou absoluta,

relativamente a outros. (BARDIN, 1997, p. 100).

Nesse trabalho, por exemplo, relaciona-se a democracia nas comunicações com a não

existência do oligopólio. Isso porque, de acordo com o discurso apresentado no segundo

capítulo, o oligopólio vai contra os princípios democráticos na comunicação – define-se,

assim, o oligopólio como um índice. Observada, então, a existência do oligopólio nas

comunicações brasileiras, esse será o indicador de que é preciso uma mudança de caráter

regulatório para que esse fenômeno de concentração de mercado deixe de existir e a

comunicação possa, por fim, ser democratizada.

6.3.1.2 Análise

Finalizada a pré-análise, tem início a exploração do material, ou seja, a análise

propriamente dita, que compreende a administração dos dados levantados na etapa anterior.

―Esta fase [...] consiste essencialmente de operações de codificação, desconto ou enumeração,

em função de regras previamente formuladas‖. (BARDIN, 1997, p.101).

A codificação corresponde a uma transformação – efetuada segundo regras precisas

– dos dados brutos do texto, transformação esta que, por recorte, agregação e

enumeração, permite atingir uma representação do conteúdo, ou da sua expressão,

susceptível de esclarecer o analista acerca das características do texto. (BARDIN,

1997, p. 103).

O processo de codificação envolve, portanto, de acordo com Bardin (1997), três

etapas. A de recorte, que é a escolha das unidades; enumeração, que é a escolha das regras de

contagem; e classificação e agregação, na qual definem-se as categorias.

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A escolha das unidades de registro e contexto é fundamental. Ela busca responder à

necessidade de fazer recortes do conteúdo de modo a não ficarem incompletos. Bardin (1997)

apresenta como unidades de registro a palavra, o tema, o objeto, o personagem, o

acontecimento e o documento (BARDIN, 1997). No presente projeto, são utilizadas como

unidades a palavra – análise de caputs, incisos e alíneas, os textos presentes nas leis – e o

documento – as leis, como um todo. A unidade de contexto, que tem a função de ―unidade de

compreensão para codificar a unidade de registro‖, consiste, para a presente análise, no

cenário político-regulatório das comunicações no Brasil, em comparação com o argentino.

A enumeração pode variar entre as seguintes opções: presença – determinada pela

relevância da ausência de certos indicadores –; frequência; frequência ponderada – quando a

existência de um elemento é mais relevante que a de outro –; intensidade; direção – que, por

exemplo, em uma pesquisa que buscasse decidir se algo é certo ou errado, poderia ser certa,

errada ou neutra –; a ordem de aparição; e a co-ocorrência – presença de duas unidades de

registro em uma mesma unidade de contexto (BARDIN, 1997).

A intensidade atua como principal regra de enumeração dessa pesquisa, uma vez que é

pertinente ao estudo de aparatos e discursos ideológicos. A percepção da intensidade pode ser

auxiliada, segundo Bardin (1997), que parafraseia Osgood, nos seguintes critérios:

―intensidade (semântica) do verbo, tempo do verbo (condicional, futuro, imperativo...),

advérbios de modo, adjetivos e atributos qualificativos‖ (BARDIN, 1997, p. 111).

O processo de categorização, por sua vez, compreende a seguinte premissa:

―classificar elementos em categorias, impõe a investigação do que cada um deles tem em

comum com os outros. O que vai permitir o seu agrupamento, é a parte comum existente entre

eles‖ (BARDIN, 1997, p. 118).

A classificação envolve, para Bardin (1997), as etapas de inventário – isolação dos

elementos – e da classificação propriamente dita – separação dos elementos, que culmina na

organização das mensagens. Ainda de acordo com a autora, um conjunto de categorias, para

ser considerado bom, deve compreender os seguintes aspectos: exclusão mútua, na qual cada

elemento existe em apenas uma categoria; homogeneidade; pertinência ao material analisado;

objetividade e fidelidade; e produtividade (BARDIN, 1997).

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6.3.1.3 Tratamento dos resultados e inferências

A última etapa da análise envolve o tratamento dos resultados obtidos, que são

submetidos a provas estatísticas ou testes de validação. Quando, enfim, o pesquisador extrair

resultados significativos de sua análise, pode propor inferências.

A inferência busca oferecer mais subsídios sobre o tema ao leitor crítico da pesquisa e

pode apoiar-se nos elementos que constituem a comunicação: o emissor e o receptor, e a

mensagem – que envolve a significação e o código, e seu canal (BARDIN, 1997). Esses polos

podem contribuir com informações fundamentais à compreensão da pesquisa.

Quando centrada no emissor, a inferência retoma o caráter expressivo e representativo

da comunicação, com relação a quem a está emitindo. Quando o foco é o receptor, a

inferência centra-se na finalidade de comunicar-se com ele e nele provocar uma ação. Quanto

à mensagem, ela é objeto de toda a análise de conteúdo, uma vez que é da mensagem que

parte o processo. (BARDIN, 1997). A presente pesquisa observará todos os polos

mencionados, ao longo da inferência, para a) fornecer informações relativas à comunicação

democrática pelo ponto de vista da emissora, como forma de apresentar a percepção de uma

pessoa envolvida no estudo e no fazer da comunicação midiática; b) chamar a atenção do

receptor para o seu direito à participação na comunicação e para a importância da mídia

perante a formação da sociedade; e c) apresentar conclusões, ponderações e questionamentos

obtidos por meio da análise da mensagem – leis, teorias da comunicação e processos

históricos analisados.

A análise pode ser realizada em dois níveis: o da codificação e o da significação. O

primeiro é utilizado como ―indicador capaz de revelar realidades subjacentes‖ e centra-se nas

descobertas que podem ser abstraídas do código – no caso desse trabalho, a linguagem.

(BARDIN, 1997, p. 135). O segundo debruça-se sobre os significados que podem ser

extraídos do conteúdo, sejam eles num nível superficial ou mais subjetivo – mitos, valores e

símbolos (BARDIN, 1997), que nessa pesquisa referem-se às premissas expressas nas leis,

aos acordos implícitos entre as partes interessadas no desenvolvimento do aparto regulatório e

à própria percepção do papel da comunicação como função social inerente a toda a população.

A análise de conteúdo constitui um bom instrumento de indução para se

investigarem as causas (variáveis inferidas) a partir dos efeitos (variáveis de

inferência ou indicadores; referências no texto), embora o inverso, predizer os

efeitos a partir de factores conhecidos, ainda esteja ao alcance de nossas

capacidades. (BARDIN, 1997, p. 137).

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As inferências podem ser específicas, quando buscam solucionar a uma determinada

pergunta, ou gerais, quando buscam relativizar fenômenos observados e suas causas ou

consequências. Para estabelecer tais relações – ou leis relacionais –, de acordo com Bardin

(1997), é necessário recensear, nas análises já realizadas, os índices utilizados, as inferências

efetuadas e as situações de comunicação.

6.4 PESQUISA BIBLIOGRÁFICA

O referencial teórico da pesquisa deve envolver o conhecimento científico reconhecido

na área da comunicação, de modo a sustentar os argumentos e fornecer explicações sobre as

questões abordadas. (BARROS, JUNQUEIRA, 2005). Ele constará na pesquisa bibliográfica,

definida por Stumpf (2005, p. 51) como:

[...] o planejamento global inicial de qualquer trabalho de pesquisa que vai desde a

identificação, localização e obtenção da bibliografia pertinente sobre o assunto, até a

apresentação de um texto sistematizado, onde é apresentada toda a literatura que o

aluno examinou.

A pesquisa envolve, portanto, os processos que levam à identificação do referencial

necessário para a abordagem do tema, a escolha dos materiais a serem estudados e seu

fichamento.

A presente pesquisa abordou diversos autores em sua pesquisa bibliográfica, entre eles

alguns dos principais estudiosos da questão da democratização da comunicação no Brasil.

Grande parte das bibliografias aqui apresentadas abordam a mídia pela ótica de sua

responsabilidade social.

Destaca-se como um dos principais pesquisadores aqui referenciados, César Bolaño,

que aborda, principalmente, as telecomunicações ou serviços de radiodifusão. O autor explica

os processos, embates, frentes e ideologias que permeiam a questão da criação de aparatos

que visam a regulação dos meios de comunicação no país. Um dos pontos nos quais se

fundamenta o discurso do autor pode ser definido pelos seguintes dizeres:

O debate nacional em torno das políticas públicas de comunicação, embora muitas

vezes intenso, não logrou até o momento mudar a equação do poder montada nos

idos do regime militar, à diferença do que ocorreu com outros países, em que o

processo de democratização se traduziu em uma mudança estrutural profunda na

área da mídia. (BOLAÑO; BRITTOS, 2008).

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Valério Brittos também traz ponderações importantes à pesquisa, principalmente em

trabalhos realizados junto à Bolaño. Ambos autores, ao falarem da comunicação no âmbito

político, trazem os principais argumento referentes ao porquê da comunicação no país não ser

plural e democrática, que são os desejos políticos e econômicos envolvidos no processo.

Além deles, outro importante autor a ser destacado é Murilo César Soares, que, assim

como os outros dois autores citados, aponta a concentração midiática brasileira:

As políticas democráticas de comunicação só vieram a ser discutidas na década de

1980, quando os modelos operacionais já estavam consolidados, os canais

concedidos e os meios já solidamente estabelecidos, sob a forma de empresas e

redes poderosas e influentes. (SOARES, 2006, p. 120).

Os textos de Eugênio Bucci contribuem com diversas ponderações sobre a democracia

nas comunicações, a liberdade de imprensa e o papel do jornalista em meio a esse cenário. A

ele, une-se o relatório McBride, com suas ainda atuais afirmações sobre os estreitos laços que

envolvem os direitos humanos e as comunicações, e como tal laço encontra-se esquecido na

atualidade.

É necessário destacar, ainda, Jesus Martín-Barbero, que traz a justificativa para a

importância da questão aqui abordada, pelo viés antropológico de seus textos. O autor explana

o impacto da representação social produzida pelos meios de comunicação no cotidiano e nas

ações práticas. Ele traz conceitos como a opinião pública, fundamentais à compreensão da

necessidade de uma mídia democrática a representativa.

Além dos autores citados, outra fonte bibliográfica de extrema importância a essa

pesquisa são as leis, que atuam como objeto de estudo desse trabalho, junto à realidade da

representação social. Foram consultadas as leis Nº 4.117 – Código Brasileiro de

Telecomunicações, Nº 5.250 – conhecida como Lei de Imprensa –, Código Brasileiro

Constituição Federal de 1988, Nº 12.527 – Lei de Acesso à Informação, Nº 12.737 – Lei

Carolina Dieckmann, Lei Nº 12.965 – Marco Civil da Internet e a Lei de Meios da Argentina.

Com relação à LSCA, dois textos são imprescindíveis para elucidá-la. São eles O

processo de regulação democrática da comunicação na Argentina, de Marino, Mastrini e

Becerra (2010), que versa sobre o contexto social, econômico e político no qual se

desenvolveu a Lei de Meios; e Argentina: nova lei dos meios audiovisuais, de Bernardo

Felipe Lins, que analisa em pormenores os dispositivos regulatórios do documento.

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7 ANÁLISE

Para realizar a análise de conteúdo das leis e discursos apresentados até este momento

da pesquisa, bem como estabelecer um comparativo entre o cenário legislativo brasileiro e o

argentino, optou-se por dividir a ampla questão com base em diferentes aspectos da

comunicação regulados por essa lei. São eles: concentração do controle econômico dos meios

de comunicação; diversidade cultural assegurada pela lei na mídia; liberdade de expressão e

livre exercício do jornalismo, e órgãos responsáveis pela regulação.

O presente estudo se propõe, por meio dessa análise, a aprofundar a relação entre a

legislação, a comunicação e a construção da sociedade, de modo a responder à questão

norteadora e demais aspectos apontados ao longo da pesquisa. Serão apresentados aqui

excertos das diferentes leis destinados à regulação de um ponto em comum para,

posteriormente, discutir o quanto a regulação corresponde à teoria e como ela poderia ser

transportada do papel para a prática.

7.1 CONTROLE ECONÔMICO DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO

Se a democracia consiste na ―[...] inalienável tendência humana de assumir seu

destino, do ponto de vista individual ou coletivo‖. (HILL, 2010, p. 367), conforme citado no

início da presente pesquisa, pode-se dizer que ela somente existe efetivamente, nos meios de

comunicação, quando a população encontra neles o reflexo de seus anseios e interesses. A

distribuição da propriedade dos veículos midiáticos em um país define, mais do que qualquer

outro aspecto, a representatividade e justiça sociais existentes. No Brasil, os dispositivos que

regulam essa questão constam na Constituição Federal, um dos documentos analisados no

presente trabalho.

Como visto anteriormente, ela define, no artigo 220, parágrafo 5º – uma das unidades

de registro desse trabalho –, que ―[...] os meios de comunicação social não podem, direta ou

indiretamente, ser objeto de monopólio ou oligopólio‖. Entende-se claramente, disso, que é

proibido o controle da oferta de informação e comunicação por uma empresa ou um grupo

delas. Pode- se perceber, no entanto, que nesse quesito a regulação é extremamente vaga no

que corresponde ao modo como a concentração de propriedade deve ser evitada.

Com relação ao contexto das comunicações no Brasil, conforme já comentado, estima-

se que os maiores e mais relevantes veículos de comunicação sejam controlados por não mais

que sete famílias – Abravanel (Sistema Brasileiro de Televisão), Civitta (Grupo Abril), Frias

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(Grupo Folha), Macedo (Rede Record), Marinho (Grupo Globo), Mesquita (Grupo Estado) e

Saad (Rede Bandeirantes). Isso significa, em suma, que o artigo 220 da CF não é respeitado e

fiscalizado.

Pela lei, o órgão responsável por auxiliar a regulação da questão é o Conselho de

Comunicação Social. A lei que o regulamenta não é mais específica do que a CF quanto aos

procedimentos relativos ao monopólio e oligopólio das comunicações. O colegiado do

Conselho, conforme citado anteriormente, está desativado desde agosto de 2014, quando

findou o último mandato da composição do órgão, e aguarda nova eleição de representantes.

(AGÊNCIA PT, 2014).

A não proibição, na prática, da concentração dos meios de comunicação em poucas

mãos tem graves consequências para o processo democrático. Isso porque, como elucidado no

segundo capítulo dessa pesquisa, o oligopólio instalado na imprensa brasileira – com destaque

para o setor da radiodifusão – resulta em uma quase inexistente diversidade de discursos e

opiniões, bem como na exclusão de diversos atores e grupos sociais do cenário midiático

brasileiro.

Tal acontecimento é extremamente relevante ao levar-se em conta o que Venício A. de

Lima (2004) explica, como supracitado, sobre o Cenário de Representação Política (CR-P). O

conceito pode ser entendido como uma conjuntura na qual a mídia desempenha um papel

central na construção da hegemonia, ―[...] logo se manifesta uma das implicações de seu

caráter ‗constituidor da‘ e ‗constituído pela‘ realidade: as ‗representações‘ que a mídia faz da

‗realidade‘ (media representations) passam a constituir a própria realidade‖. (LIMA, 2004, p.

186. Grifos do autor).

Devido à grande concentração dos meios de comunicação no Brasil, já comentada, que

ocorre em níveis de propriedade, audiência e distribuição da verba publicitária (SOARES,

2006), alguns poucos atores – que em sua maioria fazem parte da elite econômica e política

do país – decidem quais são as informações pertinentes ao conhecimento público.

Informações essas que, na maioria dos casos, correspondem mais aos interesses desses atores

do que da população brasileira.

Tais informações, que a elite julga pertinente levar ao conhecimento público por meio

da imprensa, tornam-se a verdade para a maioria da população. Isso porque, como visto

anteriormente, segundo Foucault, ―cada sociedade tem seu regime de verdade‖, ou seja, cada

sociedade possui ―os tipos de discurso que ela acolhe e faz funcionar como verdadeiros; [...] o

estatuto daqueles que têm o encargo de dizer o que funciona como verdadeiro‖.

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(FOUCAULT, 2004, p. 12). Para a nossa sociedade, tal papel, de definir a verdade entre suas

tantas versões, cabe aos meios de comunicação de massa que, conforme já explicado, atuam

como constituidores da realidade. (LIMA, 2004).

Para mudar esse cenário, portanto, é necessária uma revisão nos critérios utilizados

para a outorga das concessões de rádio e televisão, bem como a fiscalização da propriedade

das empresas midiáticas por meio de uma ―força-tarefa‖ de combate ao oligopólio. Contudo, é

preciso ressaltar a dificuldade em fomentar esse debate, devido à desinformação da população

quanto ao assunto, o que se entende ser resultado de um esforço dos empresários das

comunicações em esquivar-se da regulação, cunhando erroneamente a proibição da

concentração midiática como ato de censura.

Tal percepção se deve ao estudo das diversas discussões presentes no contexto

político-regulatório das comunicações no Brasil, nas quais um lobby constituído pelas

empresas de radiodifusão, representadas principalmente pela Abert, teve sucesso por

consecutivas vezes em manter-se fora da alçada da lei. Como exemplo disso, cita-se o

paradoxo da radiodifusão55

, no qual as empresas de rádio e televisão brasileiras optaram por

caracterizar-se como serviço distinto das telecomunicações56

, para fugir da submissão à LGT

e, por consequência, do campo de atuação regulatória da Anatel, permanecendo reguladas

pelo ultrapassado CBT.

Outro ponto importante relativo à propriedade dos meios de comunicação é a presença

do capital estrangeiro, já mencionada na pesquisa. Ao levar-se em conta a importância dos

discursos e informações veiculados pela imprensa no cenário político de um país, entende-se

como fundamental a predominância dos interesses nacionais no âmbito das comunicações.

Contudo, percebe-se uma tendência cada vez maior de abertura do capital às empresas

internacionais. (SAPPER; HEBERLÊ, 2006). Ao passo que, originalmente, a CF defendia, no

artigo 222, parágrafo 1º, que o total do capital votante pertencesse a brasileiros natos ou

naturalizados há mais de 10 anos, após 2002 esse número passou, por meio de uma emenda

constitucional, a 70 por cento. Sapper e Heberlê (2006, p. 5) apontam a possibilidade de esse

valor modificar-se novamente e ―aumentar provavelmente para até 49% a presença do capital

estrangeiro nas empresas do setor, [...] prática que já é adotada em grande número de nações

na atualidade‖.

55

Conceito de Ramos (2000), explicado no segundo capítulo. 56

Diferentemente do que ocorre no resto do mundo, uma vez que a radiodifusão, de fato, caracteriza-se como um

serviço de telecomunicações.

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Bucci explicita a relação entre a comunicação e a democracia com a seguinte frase, já

citada: ―[...] sem o livre fluxo de informações e opiniões, o regime democrático não funciona,

a roda não gira. A delegação do poder e o exercício do poder delegado dependem do

compartilhamento dos temas de interesse público entre os cidadãos‖. (BUCCI, 2012, p. 113).

Entende-se, portanto, que sendo o Brasil uma democracia representativa, é essencial a

regulação da propriedade dos meios de comunicação, de modo a extinguir monopólios e

oligopólios existentes no setor, para que o regime democrático estenda-se, também, à

imprensa.

Diferentemente do Brasil, a Argentina não apenas obteve sucesso em aprovar uma lei

que detalha a quantidade de licenças e porcentagem do share de audiência permitidas, como

também implantou de modo eficaz a autoridade regulatória, a AFSCA. A Lei de Meios, uma

das principais referências em matéria de regulação da comunicação na América Latina,

integra um marco inédito na história das comunicações, conforme visto anteriormente, no

qual as discussões e anseios da sociedade civil organizada conseguem suplantar os ―acordos

‗não escritos‘ entre governos e donos das mídias‖. (MARINO; MASTRINI; BECERRA,

2010, p. 105. Grifo do autor).

―A fim de garantir os princípios de diversidade, pluralidade e respeito pelo local‖

(ARGENTINA, 200957

), o artigo 45 do documento, outro trecho incluído nas unidades de

registro da pesquisa, define, referente aos serviços de comunicação audiovisual em nível

nacional, conforme já visto, um máximo de: uma licença por satélite; dez licenças – além da

titularidade do registro de um sinal de conteúdos – para rádio, televisão aberta e radiodifusão

televisiva por assinatura com uso do espectro radioelétrico; 24 licenças para a exploração dos

serviços de radiodifusão por assinatura com vínculo físico em diferentes localidades; e uma

concentração máxima de 35 por cento do share nacional (ARGENTINA, 2009). Isso

representa, na prática, uma maior facilidade em tornar a lei realidade, uma vez que as

diretrizes nela presentes quanto às possibilidades de propriedade de meios de comunicação

guiam a autoridade regulatória no momento de fiscalizar e regular a exploração da

comunicação audiovisual. A LSCA reserva, ainda, ―um terço das concessões de rádio e

televisão do país para empresas privadas, um terço para empresas públicas e um terço para

entidades sem fins lucrativos‖ (WALTZ, 2013, p. 2). Além disso, a clareza do texto evita

possíveis contestações ao seu conteúdo ou interpretações questionáveis.

57

Os fragmentos da LSCA citados aqui são traduções livres do documento original, realizadas pela autora da

presente pesquisa.

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Entre os pontos relativos à propriedade das empresas de comunicação, a Lei de Meios

versa, no artigo 29, sobre a presença do capital estrangeiro nas empresas de comunicação,

garantindo a manutenção do controle majoritariamente nacional da mídia. Segundo o trecho,

já citado, é permitido que no máximo de 30 por cento do capital acionário e com direito a voto

esteja em poderio estrangeiro, ―sempre que essa porcentagem não signifique possuir direta ou

indiretamente o controle da sociedade‖ (ARGENTINA, 2009). Vale ponderar que, apesar da

tendência apontada no Brasil, de essa porcentagem chegar a 49 por cento, atualmente ela

mantém-se com os mesmos valores do país vizinho.

A lei estabelece, no artigo 10, a criação de uma autoridade de aplicação – a AFSCA,

atualmente em pleno funcionamento –, que possui, entre suas funções, segundo o artigo 12, as

de promover a participação da comunicação audiovisual no desenvolvimento de uma

Sociedade da Informação e do Conhecimento; elaborar e aprovar documentos de bases e

condições para a concessão de serviços de comunicação audiovisual; conceder, prorrogar e

declarar a expiração das licenças e autorizações; prevenir e desencorajar práticas

monopolísticas e condutas anticompetitivas e predatórias, conforme visto anteriormente.

Marino, Mastrini e Becerra (2010, p. 108) apontam, no trecho supracitado, que ―pela primeira

vez na Argentina, tanto a autoridade de aplicação quanto os meios de comunicação de gestão

estatal não serão totalmente controlados pelo governo de turno‖.

Percebe-se a eficiência do texto da LSCA pois mesmo em face da prolongada batalha

judicial que o governo trava com o conglomerado midiático Clarín – que desde a aprovação

da lei tenta fugir à regulação, principalmente no que tange aos dispositivos antimonopolíticos

–, foram feitos diversos avanços, por meio da AFSCA, no sentido de aprovar os planos de

adequação de diversas empresas de comunicação e distribuir o espectro antes concentrado.

A Lei de Meios encontra, certamente, alguns pontos de estagnação, principalmente no

que se refere ao Grupo Clarín, mas o cenário da imprensa argentina passou por uma inegável

transformação, não apenas por essas empresas já reguladas, mas também pelo avanço da

discussão do controle das comunicações no cenário político do país. Vale ressaltar que a

LSCA não apenas modifica o modelo de outorgas, como também regula os serviços de

comunicação audiovisual independentemente de plataforma e aumenta a transparência do

setor, conforme já comentado, pois exige das empresas de mídia a divulgação de informações

pertinentes à exploração das comunicações em espaço público (RIBEIRO, 2011).

A LSCA desenvolveu-se no contexto de uma Argentina com veículos de comunicação

extremamente concentrados – cenário idêntico, nesse quesito, ao brasileiro. Lá, os debates

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sobre a regulação encontraram os mesmos ―inimigos‖ que enfrentam aqui – a elite econômica

e política, da qual muitos representantes encontram-se no controle acionário de empresas

midiáticas.

Com a aprovação da lei, o cenário já sofreu um processo de transformação voltado

para a inclusão da sociedade, como um todo, nas pautas da imprensa. Percebe-se, entretanto,

que isso somente foi possível graças a uma lei bem desenhada, que detalha o papel de cada

entidade envolvida na regulação e que explicita o modo como o controle dos meios de

comunicação deve ser distribuído e fiscalizado.

A deficiência regulatória brasileira, em grande parte incentivada por interesses

compartilhados entre políticos e grandes conglomerados de imprensa nacionais e que fica

mais evidente ainda se comparada com a legislação argentina, bem como a própria

inexistência de um papel ativo do Conselho de Comunicação Social no controle, fiscalização

e desenvolvimento do setor explicam o porquê da existência de monopólios e oligopólios tão

enraizados. Percebe-se, ao comparar os avanços da Argentina com os crescentes fracassos

brasileiros em alavancar essa discussão, a força do lobby dos empresários de rádio e televisão

no Congresso Nacional brasileiro e um possível desinteresse do governo, ou mesmo uma falta

de aliados dentro do Congresso, em aprovar uma bem-fundamentada lei de democratização

das comunicações no Brasil.

7.2 DIVERSIDADE CULTURAL NA MÍDIA

Os meios de comunicação têm como principal papel o de porta-vozes da sociedade. A

eles cabe refleti-la e comunicá-la em seus anseios, cultura e tradições. Define o Relatório

MacBride, supracitado, que ―a diversidade e o pluralismo são valores que é bom fomentar e

não restringir‖ (UNESCO, 1983, p. 28).

A necessidade da presença dessas duas premissas – a diversidade e o pluralismo – nos

meios de comunicação advém da representatividade social que deriva delas. Se a mídia dita a

verdade, como já comentado, ela delimita quem está dentro ou fora das decisões políticas

tomadas no país.

A opinião pública política fundamenta-se na esfera privada, mais propriamente na

sociedade civil, e é constituída pelos indivíduos particulares reunidos em público

que fazem ouvir a sua voz através de uma comunicação política expressa como

opinião pública. (MATEUS, 2008, p. 61 – 62).

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A representatividade de todos os grupos sociais é, portanto, imprescindível para sua

inclusão nas pautas da opinião pública. Sem isso, suas lutas e demandas acabam por se tornar

invisíveis perante as demais reivindicações, feitas pelos grupos hegemônicos da sociedade,

conforme visto anteriormente, pois ―[...] dependendo dos assuntos que venham a ser

abordados – agendados – pela mídia, o público termina, a médio e longo prazos, por incluí-los

igualmente em suas preocupações‖ (HOHLFELDT, 1997, p. 44) ou, caso contrário, por

excluí-los delas.

É importante lembrar, ainda, que a mídia age como propagadora da cultura e, portanto,

tem o poder de preservar, bem como ―apagar‖, tradições e costumes. Entende-se, aqui, como

já conceituado, a cultura ―enquanto sistemas de símbolos e significados construídos social e

historicamente, o que equivale dizer que culturas são mecanismos de controle, orientação e

classificação das condutas‖ (ROCHA; TOSTA, 2010, p. 346).

Essa cultura tem uma íntima relação com o indivíduo nela inserido, que apreende o

mundo por tais valores e deles necessita para constituir-se enquanto pessoa, enquanto ser

humano que convive em sociedade e se relaciona com uma comunidade que possui tradições

e costumes específicos. Ao não conceder o devido espaço para a diversidade cultural na

imprensa, esses distintos valores e formas de viver tendem a ser retratados de maneira rasa,

estereotipada.

Os meios de comunicação, conforme supracitado, ―[...] buscam nas outras culturas o

que mais se parece com a nossa e, para isso, silenciam ou enfraquecem os traços mais

conflitivamente heterogêneos e desafiantes‖. (MARTÍN-BARBERO, 1997, p. 41). Assim,

dão lugar a ―um conhecimento intuitivo sobre o Outro, desempenhando papel central na

organização do discurso do senso-comum‖ (FREIRE FILHO; HERSCHMANN; PAIVA,

2004, p. 4), ou seja, do estereótipo.

A falta de representação dessas culturas e indivíduos – a partir de si e por um viés

antropológico, por parte da mídia – culmina, em uma primeira instância, na exclusão de

minorias das pautas políticas. Em uma segunda instância, resulta na falta de compreensão

acerca de outros grupos sociais e, por consequência, no preconceito. A ausência do

entendimento sobre o outro gera uma cultura de intolerância que pode, por fim, culminar em

discursos de ódio.

Para compreender o contexto, os meios de comunicação no Brasil, pelo próprio modo

como se constituíram nas mãos de uma elite política e econômica conservadora, carecem, e

muito, de pluralidade e diversidade em seus discursos e conteúdos. Negros, mulheres e

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analfabetos, apenas para citar alguns exemplos, estão longe de serem retratados de forma

positiva e ouvidos em suas reivindicações, mesmo constituindo a maior parte da população,

nos dois primeiros casos, e uma parcela expressiva dela, no último. Quanto à diversidade

cultural, vale ressaltar, como já visto, que ―98% de toda produção de TV no país é feita no

eixo Rio-São Paulo pelas próprias emissoras de radiodifusão, e não por produtoras

independentes‖. (EKMAN, BARBOSA, 2014), o que denota uma grande concentração da

produção de conteúdo em poucas mãos e de modo a contemplar uma pequeníssima porção do

país em termos de geografia, cultura e tradições.

A legislação atual pouco faz para mudar tal situação. A Constituição Federal

estabelece – no artigo 221, incisos I, II e III, uma das principais unidades de registro no

âmbito da representatividade assegurada por lei –, como comentado anteriormente, que devam

ser observados, na programação de canais de radiodifusão, a ―[...] preferência a finalidades

educativas, artísticas, culturais e informativas; promoção da cultura nacional e regional e

estímulo à produção independente que objetive sua divulgação; regionalização da produção

cultural, artística e jornalística‖. (BRASIL, 1988). Contudo, como já demonstrado, tal questão

é claramente desrespeitada na prática e a própria CF é bastante vaga quanto ao modo como a

diversidade deve ser assegurada. Conforme visto no terceiro capítulo dessa pesquisa:

Se a possibilidade de recorrer aos meios de comunicação social continua sendo o

terreno vedado dos grupos política e culturalmente dominantes, tanto no plano

nacional quanto no internacional, há um grande perigo de que transmitam certos

modelos que contradizem os valores de civilização das minorias étnicas, sócio-

culturais e religiosas. Outra exigência do pluralismo é a necessidade de oferecer a

elas uma voz que lhes permita afirmar esses valores. (UNESCO, 1983, p. 34).

A legislação argentina pontua, nesse âmbito, diversas medidas a serem tomadas para a

garantia de uma comunicação que contemple todos os grupos culturais, étnicos e sociais,

como visto anteriormente. A LSCA inclui, no artigo 3, alíneas b, f e i, entre os objetivos dos

serviços e conteúdos de comunicação audiovisual: promover o federalismo e a integração da

América Latina; promover a expressão da cultura popular, bem como o desenvolvimento

cultural, educativo e social; a participação dos meios de comunicação como formadores de

atores sociais e de distintas representações das realidades do mundo, elucidadas por diversos

pontos de vista. (ARGENTINA, 2009).

O documento estabelece cotas de programação para todos os veículos, de acordo com

o comentado no quinto capítulo. Para citar alguns exemplos, segundo o artigo 65, emissoras

de rádio não estatais devem ―[...] emitir um mínimo de 70 por cento de produção nacional‖,

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bem como ―[...] 30 por cento da música emitida deve ser de origem nacional‖. Além disso, 60

por cento da programação deve ser de produção local e própria. As de televisão aberta, por

sua vez, além de serem responsáveis por uma cota de produção nacional de 60 por cento, ―[...]

deverão emitir um mínimo de 30 por cento de produção própria‖ e ―[...] um mínimo de 30 por

cento de produção local independente quando se trate de emissoras localizadas em cidades

com mais de 1,5 milhão de habitantes‖. (ARGENTINA, 2009).

Ainda no sentido de garantir espaço a todos os grupos sociais, a LSCA garante, no

artigo 89, como já visto, a reserva do espectro radioelétrico para o Estado, as províncias e

municípios. Também resguarda emissoras de televisão aberta e rádio para as universidades

federais, e apenas de rádio para os povos originários, e assegura a reserva de ―33 por cento

das localizações radioelétricas planificadas, em todas as bandas de radiodifusão sonora e de

televisão terrestres [...] para exploração sem fins lucrativos‖. (ARGENTINA, 2009).

Conforme comentado anteriormente, a lei representa um avanço em termos de

representatividade. ―[...] em um país centralista, ela promove o federalismo tanto da produção

de conteúdos como da tomada de decisões, porque incentiva a diversidade de vozes,

estabelecendo limites para a concentração e o domínio de mercado‖. (MARINO; MASTRINI;

BECERRA, 2010, p. 108).

A diversidade e o pluralismo são características fundamentais a uma imprensa

representativa num país culturalmente rico e miscigenado como é o Brasil. Percebe-se, aqui,

uma clara divisão entre quem está na mídia e a comanda – uma elite branca, economicamente

favorecida e politicamente influente, predominantemente masculina –, e quem está fora dela,

ou permanece às suas margens – que é, em suma, todo o restante da população.

Essa elite que comanda as comunicações do país foge ao dever que têm para com a

representatividade social, afirmando falsamente que a regulação é sinônimo de censura, como

mostra o trecho abaixo, retirado do editorial do jornal O Globo, publicado em 7 de abril de

2013:

A ―regulação‖ do desejo dessa militância visa a interferir no conteúdo jornalístico —

censura, a palavra certa. Como tem ocorrido na Venezuela, no Equador, nos países

ditos bolivarianos, este objetivo é alcançado pela rota dissimulada da

desestabilização empresarial dos grupos de comunicação. A Argentina é outro

exemplo. Em nome da necessidade de se estimular a concorrência no mercado de

imprensa e entretenimento — como se ela já não existisse no país —, força-se a

quebra de conglomerados de comunicação, para que eles passem a depender de

verbas públicas, o fim de sua independência. (O GLOBO, 2013).

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Entretanto, como é possível ser porta-voz de um povo sem dar a ele a chance de falar?

O questionamento reflete quão necessário é um aprimoramento da lei brasileira no que tange à

questão. O pouco que há não é respeitado e, possivelmente, encontram-se obstáculos à sua

aplicação pela própria não especificidade da lei, no sentido de quais medidas podem ser

tomadas para garantir os princípios por ela estabelecidos.

Sem isso, dá-se lugar a uma mídia ―fechada‖, com uma visão carregada de

preconceitos e de um não entendimento do diferente, que gera na população um sentimento de

ódio e intolerância para com o outro. Se a própria premissa da comunicação é ―tornar

comum‖, ―fazer conhecer‖ e levar a informação às pessoas, tal imprensa constitui-se na

própria antítese do que se pretende fornecer à sociedade pelos meios de comunicação.

7.3 LIBERDADE DE EXPRESSÃO E O LIVRE EXERCÍCIO DO JORNALISMO

Não existe democracia sem a livre expressão do pensamento. Sendo a comunicação a

principal expressão do estado democrático de direito, torna-se fundamental atentar para

liberdade de expressão e de imprensa, bem como para quaisquer possibilidades de

cerceamento a essa premissa. Como já citado:

A democracia guarda, nos seus fundamentos, o princípio de que o poder emana do

povo e em seu nome é exercido. Disso resulta que, sem o livre fluxo de informações

e opiniões, o regime democrático não funciona, a roda não gira. A delegação do

poder e o exercício do poder delegado dependem do compartilhamento dos temas de

interesse público entre os cidadãos. (BUCCI, 2012, p. 113).

É dever da mídia, portanto, como visto anteriormente, observar e investigar o poder e

aqueles que o detêm, a fim de assegurar decisões e práticas de governo que beneficiam a

população, como um todo. Não apenas a esse propósito serve a comunicação de massa, como

também ao de observar o respeito às regras e leis que norteiam o convívio social. Por isso, a

informação e expressão devem ser um direito inerente a todos, comunicadores ou não, uma

vez que toda a sociedade faz parte do processo de manutenção de seu progresso e bem-estar.

Para que tal liberdade seja plena, ela deve estender-se a duas instâncias. A primeira

delas, a liberdade de um povo comunicar-se e ser ouvido, que deve ser assegurada tanto pelo

governo quanto pelas empresas de comunicação – o primeiro, de modo a impedir a censura de

ordem política e o segundo, de ordem econômica, aos cidadãos. Como afirma Peruzzo (2007),

citada anteriormente na presente pesquisa:

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[...] as liberdades de informação e de expressão postas em questão na atualidade

[dizem respeito, também, ao] direito de acesso do cidadão e de suas organizações

coletivas aos meios de comunicação social na condição de emissores-produtores e

difusores – de conteúdos. Trata-se, pois, de democratizar o poder de comunicar.

(PERUZZO, 2007, p. 11).

Em segundo, a liberdade de expressão deve ser uma premissa interna das próprias

empresas de comunicação, garantida por um diálogo com os órgãos reguladores e pela lei, de

modo a inibir uma censura econômica ou até mesmo política que parta do comando desses

veículos midiáticos para a reportagem.

A questão é mais relevante ainda, de acordo com o ponderado anteriormente, ao tratar-

se da exploração privada das comunicações por meio de concessões do espaço público, caso

das telecomunicações, ―exigindo, no caso dos países plenamente democráticos, contratos de

concessão, cadernos de encargos e controle público sobre os conteúdos, de modo a evitar as

distorções conhecidas no mercado brasileiro: censura privada e manipulação‖. (BOLAÑO,

BRITTOS, 2008, p.10).

A legislação brasileira, em específico a Constituição Federal, tem como primeira

afirmação, no capítulo que dispõe da comunicação social, supracitado, que ―[...] nenhuma lei

conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística

em qualquer veículo de comunicação social‖ e reforça que é vedada ―[...] toda e qualquer

censura de natureza política, ideológica e artística‖. (BRASIL, 1988). Ela representa um claro

contraponto à revogada Lei de Imprensa, documento datado do regime militar no país, que

limitava a ação da imprensa por diversos dispositivos. Entre eles, previa penas mais duras aos

jornalistas nos crimes de calúnia, difamação e injúria, além de não possibilitar a prova da

verdade, nos casos de calúnia, quando o delito envolvesse altos cargos do governo federal.

De 1988, quando a CF entrou em vigor, para cá, portanto, a liberdade de expressão e

de imprensa é palavra de ordem. Contudo, é importante ressaltar que a questão anteriormente

analisada, referente à concentração dos meios de comunicação em monopólios e oligopólios,

também constitui ameaça à liberdade de expressão, pois, como já visto ―[...] quanto maior a

concentração dos meios de comunicação, menor a quantidade de grupos que podem ter acesso

a eles, resultando na redução virtual da liberdade de expressão da sociedade‖. (SOARES,

2006, p. 125).

A Lei de Acesso à Informação vai ao encontro do que diz a CF no sentido de impedir

qualquer embaraço à liberdade de informar-se e vai além, constituindo-se numa facilitadora

desse processo, conforme já comentado, uma vez que obriga ―[...] os órgãos públicos a

considerar a publicidade como regra e o sigilo como exceção‖. (BRASIL, 2011, p. 7). Ela

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garante a gestão transparente da informação, assegurando sua disponibilização verídica e

integralmente, e prevê a criação de um serviço de informações ao cidadão, apto a orientar o

público quanto à obtenção de dados (BRASIL, 2011a).

O Marco Civil da Internet, outro aparato regulatório que visa à garantia dos direitos

básicos inerentes à expressão e informação do cidadão, representa um enorme avanço em

termos de regulação do ambiente virtual, sendo uma das primeiras leis atuantes nesse âmbito,

na América Latina e, possivelmente, também a nível mundial. Ele impossibilita a censura de

conteúdos pois, de acordo com o citado no quarto capítulo, ―[...] proíbe totalmente os

provedores de internet de vender planos que façam diferenciações no tráfego de dados ou que

selecionem o conteúdo a ser acessado‖. (BBC, 2014).

O documento define, ainda, conforme visto anteriormente, que ―o provedor de

aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes

de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências

para [...] tornar indisponível o conteúdo‖. (BRASIL, 2014). Com isso, a responsabilidade pela

informação divulgada recai sobre seu autor, inibindo tentativas de censura por parte dos

portais sobre os discursos neles inseridos. Tal norma afeta especialmente o exercício do

jornalismo na rede, uma vez que o jornalista passa a responder pessoalmente pelos discursos

que veicula, o que reforça seu papel como mediador da informação.

O Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros reforça o papel da profissão em

consonância com os princípios já comentados, de liberdade de expressão e informação. Nada

deve impedir o jornalista de apurar e divulgar informações relevantes ao interesse público e,

por consequência, ―[...] a liberdade de imprensa [...] implica compromisso com a

responsabilidade social inerente à profissão‖. (FENAJ, 2007).

Pode-se perceber, portanto, que a legislação brasileira é bem clara com relação à

defesa da liberdade de expressão e informação, e ao livre exercício do jornalista de investigar

quaisquer pautas de interesse público. Documentos como a Lei de Acesso à Informação e o

Marco Civil da Internet são, inclusive, inovadores em diversos pontos da questão. O problema

reside, como em outros casos vistos na presente pesquisa, na transposição da lei para a

prática. Pouco adianta defender tal liberdade em discurso e aprisioná-la na configuração atual

do mercado das comunicações.

A Lei de Meios argentina entende que a exploração dos serviços de comunicação

audiovisual ―[...] é considerada de interesse público, de caráter fundamental para o

desenvolvimento sociocultural da população porque exterioriza o direito humano inalienável

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de expressar, receber, difundir e investigar informações, ideias e opiniões‖. (ARGENTINA,

2009), conforme supracitado. Tal garantia pode ser encontrada em diversos trechos da lei

trazidos na presente pesquisa. Estão entre os objetivos dos conteúdos de comunicação

audiovisual promover e garantir o direito de toda pessoa a investigar, receber e difundir

informações, opiniões e ideias, sem a existência de censura; construir uma sociedade da

informação e do conhecimento, com prioridade à alfabetização midiática; promover o acesso

de toda a população à informação pública. (ARGENTINA, 2009). Ela possibilita isso, na

prática, conforme visto nos itens anteriores, estabelecendo limites à concentração de licenças

de exploração dos serviços de comunicação, garantindo o acesso à informação oriunda de

órgãos públicos e assegurando espaço para todos os grupos sociais no espectro radioelétrico.

Apesar de a Argentina visivelmente transpor a liberdade de expressão e informação

para a prática de uma forma mais eficaz que o Brasil, principalmente no que se refere ao

combate à censura privada e à manipulação da informação, percebe-se aqui um ponto no qual

a legislação brasileira é tão expressiva quanto, justamente pelas recentemente aprovadas Lei

do Acesso à Informação e Marco Civil da Internet. Nesse quesito, as leis de um país

complementam a do outro e podem, se unidas, avançar significativamente no sentido de

garantir uma comunicação cada vez mais consonante com o estado democrático de direito.

7.4 ÓRGÃOS RESPONSÁVEIS PELA REGULAÇÃO DAS COMUNICAÇÕES

Alguns poucos órgãos são responsáveis pela regulação da comunicação no Brasil.

Destacam-se, como atuantes na área de um modo geral, a Anatel e o Conselho de

Comunicação Social.

A primeira teria um grande papel de fiscalização e acompanhamento dos meios de

comunicação constituídos por meio de concessão pública, não fosse o supracitado ―paradoxo

da radiodifusão‖, por meio do qual ―[...] o Serviço de Radiodifusão não ficou sujeito à alçada

da Agência Nacional de Telecomunicações, o órgão regulador previsto na Lei Geral de

Telecomunicações‖, ao passo que, paradoxalmente, ―estão sujeitos à alçada da Agência todos

os demais serviços correlatos à radiodifusão‖. (RAMOS, 2000, p. 177).

O segundo, uma das poucas concessões dadas à ala progressista quando da definição

do capítulo dedicado à comunicação social na CF, como visto anteriormente, encontra-se num

eterno impasse entre existir ou não. Isso porque, apesar de criado pela legislação ainda em

1998, somente veio a ser efetivamente instituído em 2001 e, em 2006, após a vigência de dois

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mandatos, foi desativado, permanecendo assim até 2012. Conforme já mencionado,

atualmente o colegiado do órgão está novamente inativo, desde agosto de 2014, quando

findou o último mandato da composição do órgão, e aguarda nova eleição de representantes.

(BOLAÑO, 2007; AGÊNCIA PT, 2014).

Como visto anteriormente, na Argentina, foi prevista a criação de três órgãos para

auxiliar a regulação dos serviços de comunicação audiovisual, cujas leis contém, nas unidades

de registro aqui analisadas, dispositivos de auxílio ao exercício da regulação. São eles a

Autoridade Federal de Serviços de Comunicação Audiovisual (AFSCA), o Conselho Federal

de Comunicação Audiovisual e o Conselho Assessor da Comunicação Audiovisual e da

Infância. (ARGENTINA, 2009).

À primeira cabe a aplicação e fiscalização da Lei de Meios, bem como a aprovação,

permissão e outorga de licenças para a exploração dos serviços de comunicação audiovisual.

Sua função é inteiramente voltada à ―[...] construção de uma sociedade da informação e do

conhecimento, que priorize a alfabetização midiática e a eliminação das brechas no acesso ao

conhecimento e às novas tecnologias‖. (ARGENTINA, 2009), conforme já comentado.

O Conselho Federal de Comunicação Audiovisual, por sua vez, é responsável pelo

delineamento das políticas públicas de comunicação no país. São suas funções, como visto

anteriormente, entre outras, fazer com que as pautas de interesse público relativas ao tema

cheguem ao Poder Executivo, intermediar a comunicação entre a população e a Defensoria do

Público – entidade também criada pela Lei de Meios –, bem como elaborar um informe anual

sobre o cumprimento da lei (ARGENTINA, 2009).

Ao Conselho Assessor da Comunicação Audiovisual e da Infância, cabe, como já

mencionado, a elaboração de propostas que aumentem a qualidade da programação dirigida às

crianças e adolescentes, o que inclui apontar quais conteúdos são ou não convenientes, bem

como realizar estudos sobre o tema e atividades de fomento à produção de conteúdo

audiovisual de qualidade destinado ao público infanto-juvenil. Além disso, é dever do órgão

estabelecer critérios básicos para os conteúdos publicitários, de modo a evitar que tenham um

impacto negativo sobre a infância e a juventude. (ARGENTINA, 2009).

É importante ressaltar que a criação desses três órgãos, bem como suas diretrizes e

regras de funcionamento, estão todas previstas no próprio texto da LSCA, e não em

documentos separados, como é o caso brasileiro. No caso do Conselho de Comunicação

Social, vale lembrar, ainda, que seu funcionamento é pouquíssimo detalhado na lei em

comparação ao correspondente argentino.

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Na CF, artigo 224, consta apenas, como supracitado, que ―[...] para os efeitos do

disposto neste Capítulo, o Congresso Nacional instituirá, como órgão auxiliar, o Conselho de

Comunicação Social, na forma da lei‖. (BRASIL, 1988). Ele indica, então, a Lei nº 8389, de

1991 que, em não mais de seis artigos, explicita as funções e forma de constituição do

colegiado do conselho. A AFSCA, por sua vez, consta em diversos artigos da Lei de Meios,

sendo citada pelo documento ao menos 20 vezes, entre os artigos que regulam seu

funcionamento a aqueles cuja regulação compete a ela. A lei explicita, nos artigos 10, 11 e 12,

a missão do órgão e suas competências, além de questões como o patrimônio, formação do

colegiado e registro dos dados por ele obtidos.

Percebe-se outra interessante diferença no sentido de não ser previsto, no Brasil, um

órgão que desempenhe a função de autoridade de aplicação da lei, tal qual a AFSCA. Marino,

Mastrini e Becerra (2010, p. 108) apontam, como já visto, com relação à última, que ―pela

primeira vez na Argentina, tanto a autoridade de aplicação quanto os meios de comunicação

de gestão estatal não serão totalmente controlados pelo governo de turno‖, ocorrência que

deve ser analisada com relação à sua aplicabilidade no Brasil, de modo a incentivar a questão

da continuidade dos processos regulatórios independente da troca de partidos no poder.

Entende-se, como papel dos órgãos auxiliares, auxiliar na fiscalização dos artigos

defendidos na lei, atividade imprescindível no Brasil, em face dos pontos ainda não regulados

da Constituição Federal. Eles compreendem, com relação ao capítulo que versa sobre a

comunicação social, como já mencionado, o artigo 220, parágrafo 5º, que proíbe a existência

de monopólios e oligopólios; artigo 221, que define os princípios da programação das

emissoras de rádio e televisão e o artigo 224, que institui o Conselho de Comunicação Social

(BRASIL, 1988).

7.5 UMA REFLEXÃO SOBRE DEMOCRACIA, COMUNICAÇÃO E

REPRESENTATIVIDADE SOCIAL

Percebe-se, no Brasil de hoje, o resultado de uma comunicação fundamentada, desde

seus primórdios, em interesses privados, acordos não explícitos, favorecimentos de indivíduos

e censura. O país saiu, já há algum tempo, do regime militar, mas suas cicatrizes mantém-se

abertas na imprensa. Assim como se mantém presente, também, a desigualdade social, muito

dela fruto do poder daqueles a quem a mídia brasileira favorece.

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A comunicação carrega em si a responsabilidade de uma função social, que é de todos

e a todos serve. Ela é, num exagero, a democracia em outra palavra. Por isso, desempenha um

papel fundamental na manutenção do estado democrático de direito, concedendo a todos

representação, voz e participação ativa na vida política da sociedade. Ou deveria, pois, em

face das discussões e fatos apresentados na presente pesquisa, percebe-se que não o faz, no

Brasil.

Marcado por uma população miscigenada, por sua grande extensão e tão variadas

culturas e formas de vidas que carrega, o país tem em si a característica de complexidade que

marca a noção da vida em sociedade. São tantas pessoas com visões e contribuições distintas,

que apenas a comunicação e, de preferência, de massa, consegue fazer dessas vozes um

impacto na sociedade e em seus rumos políticos. Por isso, uma comunicação democrática e

representativa é tão fundamental e consiste numa preocupação inerente a cada cidadão.

Sem ela, as tantas minorias não representadas na mídia veem-se marginalizadas,

esquecidas em seus anseios e reivindicações, privadas de seu espaço nas decisões políticas. E

não somente isso: elas também enfrentam uma incompreensão mútua, ocasionada por uma

imprensa que as retrata erroneamente com base em estereótipos, que culmina em preconceito,

intolerância e discursos de ódio.

Percebe-se a importância dos dois primeiros tópicos dessa análise, a distribuição do

controle dos meios de comunicação e a presença da diversidade social e cultural na imprensa,

pela própria intensidade com que ambos os pontos aparecem no referencial teórico, citados

por diversos autores. O espaço por eles conquistado na Lei de Meios reforça ainda mais o

caráter protagonista dos dois aspectos para uma comunicação ideal na sociedade.

A conjuntura atual da imprensa brasileira, altamente concentrada, elitista, não

representativa e marcada pelas mais variadas formas de censura privada e manipulação, faz

pouco caso da importância da questão supracitada. Ou supõe que representa o povo quando

não o faz ou, o que é mais provável, tira do povo o poder da comunicação em prol de

benefícios próprios das poucas empresas que a controlam.

A legislação do país, em muito influenciada pelos proprietários e integrantes dessas

mesmas empresas, pouco faz para mudar a situação e, no que discorda, não é respeitada. A

Constituição Federal de 1988 contém, em si, a premissa para uma comunicação democrática,

mas carece de clareza e de dispositivos que ofereçam um modo de pô-la em prática.

Na Argentina, por muito tempo, a situação foi idêntica. Após a aprovação da Lei dos

Serviços de Comunicação Audiovisual, porém, a situação é outra. No documento constam os

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mesmos princípios da CF brasileira, porém, com um planejamento, detalhamento e

objetividade que em nada se parecem com a nossa lei. E é por isso, entende-se, que ela

funciona.

Um dos principais exemplos disso é o artigo que versa sobre a concentração de

licenças para exploração dos meios de comunicação audiovisual. Na lei brasileira, define-se

apenas, conforme visto, que ―[...] os meios de comunicação social não podem, direta ou

indiretamente, ser objeto de monopólio ou oligopólio‖. Em contraponto, a LSCA dedica o

artigo 45, composto por três parágrafos e nove alíneas, para especificar o número de licenças

simultâneas permitidas para cada serviço distinto no âmbito da comunicação audiovisual. Ela

afirma, por exemplo, que ―[…] a multiplicidade de licenças – a nível nacional e para todos os

serviços – em nenhum caso poderá implicar a possibilidade de prestar serviços a mais de 35

por cento do total nacional de habitantes‖. Além disso, explica que ―[…] a existência de

práticas monopolísticas e oligopolísticas na propriedade dos meios de comunicação social

afeta seriamente a liberdade de expressão e o direito de informação dos cidadãos‖.

(ARGENTINA, 2009).

Compreende-se, disso tudo, que a comunicação democrática não vai partir do interesse

privado dos conglomerados midiáticos, porque para eles, tal interesse não existe. Em face

disso, torna-se urgente e imprescindível uma reformulação da lei brasileira no que se refere à

comunicação, especialmente a estabelecida em espaço público, para garantir as premissas que

norteiam a democracia – representatividade, participação política, voz e, talvez, como

consequência disso, justiça e igualdade.

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8 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A presente pesquisa, desenvolvida sob a temática da necessidade de regulação da

imprensa brasileira, surgiu a partir da observação de um cenário comunicacional que pouco

representa o regime democrático sob o qual o país está alicerçado. Isso, porque possui uma

mídia onde apenas os mais abastados têm voz, princípio que contraria a função social da

comunicação e a responsabilidade dos que detém o poder de comunicar, de falar pelo e para o

povo.

Com base nessa premissa, encontrou-se um problema de pesquisa, expresso na

seguinte questão: como uma reformulação da legislação brasileira pode assegurar a

democratização – e por consequência a representatividade de todos os grupos sociais – dos

meios de comunicação? A questão envolveu uma comparação com a Lei de Meios argentina,

que serviu de base aos argumentos e propostas para uma nova regulação das comunicações

brasileiras.

A resposta para tal questão, encontrada por meio desse trabalho, é afirmativa.

Entendeu-se que a imprensa brasileira precisa de uma regulação urgente, principalmente

voltada para os veículos midiáticos estabelecidos por meio de concessões do espaço público –

rádio e televisão –, mas que atinja a comunicação de um modo geral. Apenas assim, cumprirá

com sua responsabilidade para com a sociedade, de assegurar a representação de toda a

população e fiscalizar o exercício do poder pelos representantes democraticamente escolhidos,

Portanto, necessita de uma regulação nos moldes da LSCA, que aborde pontos importantes

como o limite à concentração de meios de comunicação, cotas de programação que garantam

diversidade cultural e regionalismo, acesso à informação e prevalência do interesse público,

órgãos de apoio à aplicação da lei, entre outros.

Para chegar a essa resposta, foi definido um objetivo geral, que consistiu na análise do

caso da Lei de Meios, destinada a regular a imprensa na Argentina, com a finalidade de

estabelecer um comparativo com as leis brasileiras e averiguar a necessidade de

implementação de uma medida semelhante no Brasil. Ele também foi alcançado, na presente

pesquisa, por meio do estudo e posterior realização de contrapontos entre ambos os cenários –

o brasileiro e o argentino –, que resultaram na compreensão de como uma lei mais específica

e eficaz seria capaz de alterar as lacunas existentes no exercício da comunicação social em

prol da democracia.

Para cumprir tal meta, foram estabelecidos diversos objetivos específicos. O primeiro

deles, ―compreender o processo de elaboração e implementação da Lei de Meios, na

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103

Argentina‖, foi cumprido por meio da análise das disputas políticas que permearam a

aprovação da lei, bem como dos dispositivos por ela estabelecidos e sua posterior aplicação.

O segundo, ―comparar o cenário desse país e suas legislações específicas com o panorama

brasileiro‖, foi realizado por meio do estudo do panorama das comunicações em ambos os

países – com especial atenção para as semelhanças em pontos como a passagem por regimes

ditatoriais e a concentração midiática – e posterior análise de pontos comuns ou divergentes

entre as leis e sua aplicabilidade. O terceiro, ―analisar quais aspectos da imprensa brasileira

carecem de legislação – ou do cumprimento dela –‖, foi atingido mediante a análise dos

aparatos regulatórios brasileiros e sua fiscalização. Foi estudada, por exemplo, a Constituição

Federal, da qual se constatou que há artigos não regulados. O quarto, ―estudar a necessidade

de constituir uma regulação específica para a imprensa no país, quais pontos ela deveria

contemplar e como se poderia torná-la eficaz em termos de representatividade da população e

democratização dos meios de comunicação no Brasil‖, foi realizado a partir avaliação de

como tais aspectos – regulação da propriedade das comunicações, cotas de programação

nacional e regional, entre outros – estão, ou não, presentes na legislação brasileira como a

legislação argentina faz para assegurá-los e como poderiam ser aplicados nos marcos

regulatórios brasileiros. O último, ―realizar um apanhado dos variados dispositivos da

legislação brasileira destinados a regular a imprensa – Constituição Federal, Lei de Imprensa,

Código Brasileiro de Telecomunicações, Lei Geral das Telecomunicações, Lei de Acesso à

Informação e Marco Civil da Internet‖, foi cumprido por meio do estudo dos principais

pontos defendidos e assegurados por essas leis e o que eles significam na prática – a exemplo

do Marco Civil da Internet, do qual se mostrou os princípios que defende e como eles alteram

o exercício da comunicação na rede.

A realização dos objetivos supracitados requereu uma metodologia de trabalho, que

consistiu na Análise de Conteúdo, uma vez que ela compreende ―[...] um conjunto de técnicas

de análise das comunicações‖ (BARDIN, 1997, p.31). Tal método buscou ultrapassar a

primeira interpretação da realidade – observando acordos estabelecidos por trás da regulação

das comunicações e o modo como tais entendimentos e o cenário midiático do país impactam

na construção da sociedade – de modo a levar a uma compreensão mais profunda do tema.

Além disso, levantou-se o referencial teórico, que tem a finalidade de sustentar argumentos e

fornecer explicações (BARROS; JUNQUEIRA, 2005) e consta na pesquisa bibliográfica, que

envolve a identificação, localização e obtenção da bibliografia (STUMPF, 2005, p. 51).

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Ambos os métodos foram aplicados e mostraram-se fundamentais à realização dessa

pesquisa. Primeiramente, por meio da construção dos capítulos teóricos com base no

referencial coletado na fase de elaboração do projeto. Em seguida, pela junção desses

diferentes textos e aplicação de suas teorias à análise do conteúdo pré-estabelecido – as leis

brasileiras e a argentina –, que possibilitou a produção das inferências, as quais propõem um

entendimento mais profundo do tema.

A produção do presente trabalho é resultado de um anseio por uma comunicação que

tenha sempre, como norte, a sua função social. É por meio do ato de comunicar, tornar

comum, que diferenças são compreendidas e aceitas, que os muitos indivíduos existentes

integram-se em uma sociedade e exercem a cidadania. Essa pesquisa possibilitou, antes de

tudo, o entendimento da importância desse papel e a necessidade de honrar o poder de

comunicar para e pela sociedade.

Pôde-se perceber, ainda, como essa premissa não é posta em prática pelos veículos de

comunicação constituídos por meio de concessão pública no país. É evidente, entretanto, o

anseio da população brasileira por mudar esse paradigma. Após as reflexões propostas por

esse trabalho, conclui-se que é, sim, uma transformação possível, se incorporada às lutas

daqueles que exercem a função e com o amparo da legislação à causa.

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ANEXOS

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ANEXO A – PORTAL G1, 27 MAR. 2015

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ANEXO B – PORTAL DO JORNAL ZERO HORA, 27 MAR. 2015

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ANEXO C – PORTAL DO JORNAL PIONEIRO, 27 MAR. 2015

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ANEXO D – PROJETO DE MONOGRAFIA E LEI DE MEIOS EM CD