universidade de brasÍlia faculdade de ciÊncias da...
TRANSCRIPT
UNIVERSIDADE DE BRASLIA
FACULDADE DE CINCIAS DA SADE
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM NUTRIO HUMANA
PSYLLIUM COMO SUBSTITUTO DE GLTEN
Renata Puppin Zandonadi
Dissertao de Mestrado apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Nutrio Humana, da Universidade de Braslia, como requisito obteno do grau de Mestre em Nutrio Humana.
Orientadora:Profa. Draa. Wilma Maria Coelho Arajo
Braslia2006
Renata Puppin Zandonadi
Psyllium como substitu to de glten
Comisso Julgadora da
Dissertao para obteno do grau de Mestre
Profa. Dra. Wilma Maria Coelho Arajo Orientador/Presidente
Profa. Dra. Raquel Braz Assuno Botelho Examinador
Profa. Dra. Lenora Gandolfi Examinador
Profa. Dra Knia Mara Baiocchi de Carvalho Suplente
Braslia, 2006.
Para meus pais, Jussara e Renato, que me
apoiaram em todos os momentos.
AGRADECIMENTOS
minha orientadora Profa. Dra. Wilma Maria Coelho Arajo pela dedicao,
amizade e pacincia.
Ao Departamento de Nutrio da Faculdade de Cincias da Sade da
Universidade de Braslia.
amiga Profa. Dr3. Raquel Botelho pela colaborao sem limites.
Prof3 Dr3. Lenora Gandolfi pelo incentivo pesquisa.
Ao Prof. Luiz Antnio Borgo e aos tcnicos, Mrcio e Fernando, responsveis
pelo Laboratrio de Anlise de Alimentos da Faculdade de Agronomia e Medicina Veterinria da Universidade Braslia pela orientao e pelo apoio na
realizao das anlises qumicas.
A Rosilene Christo Beirude pela valiosa ajuda no desenvolvimento dos produtos.
Aos meus pais, Renato e Jussara Zandonadi, e irmos, Luisa e Paulo Puppin
Zandonadi, pelo apoio, pela dedicao, pela amizade, pela pacincia e pelo
incentivo.
Ao Silvio, pelo apoio constante, pelo carinho e pela pacincia.
Ao meu tio, Orlando Puppin, pelo exemplo e pelo incentivo constante.
farmcia MEDICARE pelo fornecimento de ingredientes.
A todos aqueles que incentivaram esta caminhada.
Resumo
A doena celaca (DC) uma enteropatia imunomediada, que apresenta
intolerncia permanente ao glten ingerido, a qual atualmente tem como nica
forma de tratamento a retirada do glten da dieta. Aps o incio da dieta os
indivduos portadores de DC apresentam dificuldade na aquisio e tambm no
preparo de alimentos isentos de glten, o que dificulta a adeso ao tratamento.
Alm disso, os alimentos modificados para esse tipo de patologia apresentam
prejuzos nas caractersticas sensoriais e, para compensar tecnologicamente a
retirada do glten, acrescenta-se grande quantidade de lipdios a essas
preparaes, o que conduz ao ganho excessivo de peso dos indivduos em
tratamento. Nesse contexto, o presente trabalho tem como objetivo avaliar o efeito da substituio do glten pelo psyllium (Plantago ovata) nas caractersticas
sensoriais de preparaes isentas de glten; comparar as caractersticas
qumicas, nutricionais, tecnolgicas e sensoriais das preparaes modificadas. Foram selecionadas cinco preparaes - po, pizza, bolo, biscoito e macarro -
privilegiando alm da iseno de glten, a reduo calrica e lipdica dos
produtos, conforme desejo manifestado pelos celacos por meio de sua associao - Acelbra. Os dados da anlise sensorial para os produtos
modificados em massas para po, biscoito, bolo, macarro, pizza indicam que os produtos apresentaram boa aceitao tanto pelos portadores como pelos no
portadores de DC. Em termos de composio qumica, os produtos obtidos com
as massas modificadas para po, biscoito, macarro, bolo e pizza apresentaram
reduo da frao de lipdios de 42,3%; 54,8%; 85,4%; 50,0% e 41,0%
respectivamente e tambm do valor do valor energtico de 32,1%; 4,0%; 26,5%
e 15,6% respectivamente. Dessa forma amplia-se a oferta de produtos para
portadores dessa patologia, dentro de uma viso de alimentao saudvel,
proporcionando melhoria na qualidade de vida desses indivduos.
Palavras-chave: Doena Celaca; glten; psyllium.
SUMRIOLISTA DE FIGURAS................................................................................................................ 7LISTA DE TABELAS................................................................................................................ 9LISTA DE TABELAS................................................................................................................ 91. INTRODUO........................................................ .............................................................101. INTRODUO..................................................................................................................... 112. OBJETIVOS..........................................................................................................................15
2.1. Objetivo Geral................................................................................................................ 152.2. Objetivos Especficos.....................................................................................................15
3. REVISO BIBLIOGRFICA............................................................................................163.1. Doena Celaca............................................................................................................... 16
3.1.1. Histrico e conceito............................................................................................... 163.1.2. Sintomatologia, epidemiologia e diagnstico..................................................... 203.1.3. Tratamento............................................................................................................... 26
3.2. Glten............................................................................................................................... 283.2.1. Glten, propriedades e consumo...........................................................................283.2.2. Substitutos para farinhas que contm glten...................................................... 32
3.3. Fibras................................................................................................................................ 343.3.1. Psyllium....................................................................................................................36
4. MATERIAL E MTODOS................................................................................................ 424.1. Tipo de pesquisa.............................................................................................................424.2. Seleo e desenvolvimento das preparaes.............................................................. 424.3. Anlise qumica.............................................................................................................. 45
4.3.1. Materiais e equipamentos utilizados nas anlises qumicas............................. 454.3.2. Umidade...................................................................................................................464.3.3. Resduo mineral fixo.............................................................................................. 474.3.4. Protena..................................................................................................................... 484.3.5. Extrao de lipdios................................................................................................ 49
4.4. Anlise sensorial.............................................................................................................504.4.1. Anlise sensorial com indivduos portadores da D C .........................................514.4.2. Anlise sensorial com indivduos no portadores da DC..................................51
4.5. Anlise Estatstica...........................................................................................................525. RESULTADOS E DISCUSSO.....................................................................................53
6
5.1. Preparaes modificadas............................................................................................... 565.1.1. Po............................................................................................................................. 565.1.2 Biscoito...................................................................................................................... 675.1.3. Massa para macarro.............................................................................................. 745.1.4 Bolo............................................................................................................................ 815.1.5. Massa para pizza.....................................................................................................87
6. CONCLUSO...................................................................................................................... 937. REFERNCIAS...................................................................................................................958. A N E X O S............................................................................................................................. 106
8.1. Anexo A .........................................................................................................................1068.2. Anexo B .........................................................................................................................1078.3. Anexo C Erro! Indicador no definido.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1. Alimentos mais procurados por portadores da doena celaca........... 13
Figura 2. Vilosidade intestinal: epitlio normal (esquerda) e epitlio de portador
da DC no tratado (direita), caracterizado por infiltrao de linfcitos
intraepiteliais e achatamento das vilosidades.............................................. 18
Figura 3. Achados mais comuns em pacientes celacos desde a introduo do
teste sorolgico entre 1993 e 2000 ..............................................................21
Figura 4. Estrutura do glten: gliadina e glutenina.............................................. 29
Figura 5. Psyllium (Plantago ovata) e semente................................................... 37Figura 6 . Modelo de ficha de anlise sensorial................................................... 50
Figura 7. Variao entre o teor de lipdios da preparao padro e da modificada.......................................................................................................................53
Figura 8 . Variao entre o valor energtico da preparao padro e damodificada.................................................................................................... 54
Figura 9. Impresso do po preparado com farinha de arroz............................. 60
Figura 10. Impresso do po preparado com amido de milho........................... 61
Figura 11. Po isento de glten...........................................................................63Figura 12. Distribuio da aceitao por celacos para po isento de glten.....64
Figura 13 Distribuio da aceitao do po isento de glten por indivduos no
portadores da DC.......................................................................................... 66Figura 14. Biscoito do tipo casadinho modificado............................................... 68
Figura 15. Distribuio da aceitao por celacos para biscoito do tipo casadinhoisento de glten.............................................................................................72
Figura 16. Distribuio da aceitao do biscoito do tipo casadinho isento de
glten por parte dos indivduos no portadores de DC................................ 73Figura 17. Massa de macarro isenta de glten................................................. 75
Figura 18. Distribuio da aceitao por celacos para massa de macarro isenta
de glten........................................................................................................79
Figura 19. Distribuio da aceitao da massa de macarro isenta de glten porindivduos no portadores de DC................................................................. 80
Figura 20. Bolo de chocolate modificado............................................................ 82
Figura 21. Distribuio da aceitao do bolo isento de glten por indivduos no
portadores de DC..........................................................................................86
Figura 22. Preparao modificada para pizza..................................................... 88
Figura 23. Distribuio da aceitao da pizza isenta de glten por indivduos noportadores de DC.......................................................................................... 91
Figura 24. Distribuio da aceitao da pizza isenta de glten por indivduos
portadores de DC.......................................................................................... 92
LISTA DE TABELAS
Tabela 1. Sintomas clnicos e patologias anteriores ao tratamento da DC........ 22
Tabela 2. Prevalncia de Doena Celaca em Diversos Pases......................... 23
Tabela 3. Qualidade da informao recebida pelos celacos sobre a doena....27
Tabela 4. Consumo alimentar domiciliar per capita anual...................................31
Tabela 5. Utilizao de psyllium relacionado a condies de sade..................40
Tabela 6 . Fluxograma das etapas dos processos de seleo e de produo depreparaes modificadas para portadores de DC........................................42
Tabela 7. Relao e percentual de ingredientes nas preparaes.....................43
Tabela 8 . Materiais utilizados na anlise qumica dos produtos originais emodificados...................................................................................................45
Tabela 9. Ficha tcnica de preparao da massa para po (receita padro).....57
Tabela 10. Ficha tcnica de preparao para a massa modificada de po....... 58
Tabela 11. Ingredientes das preparaes padro e modificada......................... 59
Tabela 12. Percentual de rejeio, indiferena ou aceitao do po isento deglten por portadores de DC.........................................................................64
Tabela 13. Resultado da anlise sensorial de amostra padro e modificada de
massas para po........................................................................................... 65
Tabela 14. Percentual de rejeio, indiferena ou aceitao do po isento deglten............................................................................................................. 66
Tabela 15. Comparao entre ingredientes das preparaes padro e modificadado biscoito casadinho................................................................................... 68
Tabela 16. Ficha tcnica de preparao padro de biscoito casadinho............. 70
Tabela 17. Ficha tcnica de preparao de biscoito casadinho modificada.......71
Tabela 18. Percentual de aceitao dos portadores de DC em relao ao biscoitodo tipo casadinho modificado.......................................................................72
Tabela 19. Resultado da anlise sensorial de amostra padro e modificada debiscoito casadinho para indivduos no celacos..........................................72
Tabela 20. Percentual de rejeio, indiferena e aceitao do biscoito do tipocasadinho isento de glten por indivduos no portadores de DC.............. 74
Tabela 21. Ficha tcnica de preparao de massa padro para macarro....... 76
Tabela 22. Ficha tcnica de preparao de massa para macarro modificada .. 76
Tabela 23. Comparao entre ingredientes das preparaes obtidas com asmassas padro e modificada da massa de macarro................................. 77
Tabela 24. Porcentagens de aceitao, indiferena e rejeio do macarro de
arroz para os atributos avaliados pelos consumidores celacos..................78
Tabela 25. Percentual de rejeio, indiferena e aceitao do macarro isento de
glten por indivduos portadores de DC.......................................................78
Tabela 26. Percentual de rejeio, indiferena e aceitao do macarro isento deglten por indivduos no portadores de DC................................................ 79
Tabela 27. Mdia de aceitao do macarro isento de glten por indivduos noportadores de DC.......................................................................................... 80
Tabela 28. Ingredientes das preparaes modificada e padro do bolo............ 82
Tabela 29. Ficha tcnica de preparao bolo (padro).......................................83
Tabela 30. Ficha tcnica de preparao bolo modificado................................... 84
Tabela 31. Mdia de aceitao das preparaes padro e modificada do bolopara indivduos no portadores de DC......................................................... 85
Tabela 32. Percentual de indiferena, rejeio ou aceitao da preparaomodificada do bolo para indivduos no portadores de DC......................... 86
Tabela 33. Percentual de indiferena, rejeio e aceitao da preparaomodificada do bolo para indivduos portadores de DC................................ 87
Tabela 34. Ingredientes das preparaes padro e modificada da massa parapizza.............................................................................................................. 88
Tabela 35. Ficha tcnica de preparao de massa de pizza (padro)............... 89
Tabela 36. Ficha tcnica de preparao de pizza modificada............................ 89
Tabela 37. Mdia de aceitao das preparaes padro e modificadas da pizzapara indivduos no portadores de DC......................................................... 90
Tabela 38. Percentual de rejeio, indeferena e aceitao da preparaomodificada da pizza para indivduos no portadores de DC........................91
Tabela 39. Percentual de rejeio, indeferena e aceitao da preparaomodificada da pizza para indivduos portadores de DC.............................. 92
1. INTRODUO
A doena celaca (DC) uma enteropatia imunomediada em indivduos
geneticamente suscetveis, caracterizada histologicamente pela atrofia das
microvilosidades intestinais (BUTTERWORTH, 2004), que resulta em leses de
varivel gravidade. A expresso da DC ocorre por uma srie de fatores:
imunolgicos, genticos, ambientais e presena de glten na dieta.
Essa enteropatia se apresenta nas formas sintomtica e assintomtica e
sua ocorrncia observada em diversos pases. A prevalncia mundial da
doena de aproximadamente 1 para cada 300 indivduos (FASANO; CATASSI,
2001). O perfil da DC comumente comparado a um iceberg: no topo se encontram os portadores sintomticos; os demais so os portadores
assintomticos que apresentam formas silenciosa e latente ou ento
apresentam-se geneticamente semelhantes aos portadores de DC, podendo mais tarde desenvolver a doena (HOLMES; CATASSI, 2006). Supostamente, a
prevalncia superior encontrada, porque os indivduos no sabem que so
portadores da doena.A manifestao da DC ocorre por meio de um mecanismo em que o
contato da prolamina1 com as clulas do intestino delgado provoca resposta imune a essa frao. Esta resposta imune pode conduzir a danos no intestino do
portador da doena que apresente consumo de glten.Apesar dos estudos desenvolvidos at o presente momento, a DC ainda
pouco conhecida e seus sintomas podem ser confundidos com outros distrbios.
Geralmente se manifesta na infncia, entretanto, pode surgir em qualquer idade,
inclusive na fase adulta (ACELBRA, 2006).
A frao prolamnica do trigo (gliadina) a principal responsvel pelo
desencadeamento da resposta imune em comparao aos outros cereais (aveia,
cevada e centeio) devido ao alto consumo de produtos base de trigo no Brasil,
onde o consumo de trigo no ano de 2005 foi de 10.265 toneladas. Considerando
que 75% desse consumo so feitos sob a forma de farinha de trigo, obtm-se um
consumo de aproximadamente 7.700 toneladas de farinha de trigo nesse perodo
(CONAB, 2005), ou seja, aproximadamente 42 kg de farinha de trigo per capita.
1 Frao do glten solvel em lcool, que provoca o desenvolvimento da DC.
12
A gliadina e a glutenina2 possuem a propriedade de formar com a gua
uma rede tridimensional viscoelstica, insolvel em gua, denominada glten,
amplamente utilizada devido a sua capacidade de influenciar a qualidade de
produtos como pes, macarro e biscoitos (BOBBIO; BOBBIO, 1992).
Para as preparaes que necessitam de crescimento, o glten uma
protena muito importante, pois forma finai membranas que retm as bolhas de
ar produzidas pelos agentes de crescimento. Em contato com o calor, o glten
coagula formando uma crosta que limita os orifcios produzidos pela expanso
do gs no interior da massa e lhe confere caracterstica crocante (ORNELLAS,
2001).
A dieta isenta de glten conduz monotonia alimentar, dado o fato de que esta substncia compe a estrutura qumica das massas alimentcias e dos
produtos de panificao - pes, bolos e biscoitos. Alm disso, a indstria
alimentcia recorre ao uso da farinha de trigo, como ingrediente3 ou como
aditivo4, pelo efeito das propriedades funcionais do glten na definio das
caractersticas sensoriais dos produtos.Tambm importante considerar que os produtos industrializados
destinados a celacos so de alto custo e que, tradicionalmente, em nvel
domstico, no se praticam as substituies necessrias nas preparaes
especficas ou por falta de tempo ou por falta de habilidade do portador ou de seus familiares para desenvolverem alimentos adequados a sua dieta.
A adeso dieta totalmente isenta de glten no constitui prtica de fcil
exeqibilidade, tanto pela difcil adaptao aos produtos modificados como pela
dificuldade de se encontrarem produtos isentos de glten no mercado
(EGASHIRA, 1986). Muitos portadores da DC consideram a dieta isenta de
glten desagradvel ao paladar, o que torna ainda mais difcil sua adeso
(MOWAT, 2000).
2 Fraes proticas do trigo3 Ingrediente: elemento que entra numa composio, num preparado ou numa mistura alimentcia em proporo inferior da matria-prima.
4 Aditivo: Substncia adicionada aos produtos dietticos, com a finalidade de impedir alteraes, manter, conferir ou intensificar seu aroma, cor e sabor, modificar ou manter seu estado fsico geral ou exercer qualquer ao exigida para a tecnologia de fabricao. Utiliza-se na concentrao de at 1% da matria-prima.
13
Segundo a Associao dos Celacos do Brasil (ACELBRA, 2006), os pacientes transgridem a dieta por vrios motivos: falta de orientao sobre a doena e suas complicaes; descrena na quantidade de cereais proibidos (qualquer quantidade prejudicial e agressiva aos ceiacos); dificuldades financeiras, pois os alimentos permitidos so os de custo mais elevado; hbito do uso da farinha de trigo na alimentao (po, macarro, etc.); falta de habilidade culinria para preparar alimentos substitutivos; forte presso da propaganda dos produtos industrializados, que contm glten; rtulos, embalagens ou bulas que nem sempre contm a correta ou clara composio dos ingredientes.
A transgresso dieta imposta aos pacientes pode ser voluntria ou involuntria. A primeira pode ocorrer em todas as faixas etrias, especialmente em adolescentes (ANSALDI, 1992; SDEPANIAN, 2001) e a segunda pode acontecer devido incorreta inscrio dos ingredientes nos rtulos dos alimentos ou contaminao com giten de determinado produto industrializado ou preparado nas residncias e Unidades Produtoras de Refeies (UPR). Este tipo de acidente pode ocorrer desde a colheita da matria-prima at o momento da comercializao ou do consumo do alimento (SKERRIT, 1991).
De acordo com a ACELBRA (2005), os produtos mais procurados pelos portadores de doena celaca so o po, seguido do macarro, das bolachas,
iPo
Macarro
Bolachas e Biscoitos
Rzza
Figura 1. Alimentos mais procurados por portadores da doena celaca5
dos biscoitos e da pizza (FIGURA 1).
21%
5 Fonte: ACELBRA, 2005.
14
Um estudo mostra que 90% (n= 130) dos pacientes pesquisados
substituem pes, biscoitos e outros produtos que contm glten por similares
isentos de glten. Os 1 0 % restantes disseram que no consomem produtos com
glten, mas tambm no utilizam seus similares isentos dessa protena. O
principal motivo relatado foi no gostarem das preparaes modificadas que no contm glten (BUTTERWORTH, 2004).
Diante do exposto, constata-se a importncia de se buscarem alternativas
que promovam caractersticas sensoriais e funcionais semelhantes quelas que o glten confere s preparaes, alm de aprimorar e desenvolver outras
preparaes para assim ampliar a oferta de produtos e proporcionar maior
aceitao de novos padres alimentares6 pelos portadores de doena celaca.
6 Padro alimentar: perfil do consumo de alimentos feito pelo indivduo, ao longo de um determinado perodo de tempo.
15
2. OBJETIVOS
2.1. Objetivo Geral
O objetivo deste trabalho avaliar o efeito da substituio do glten pelo
psyllium (Plantago ovata) nas caractersticas sensoriais de preparaes para
consumidores portadores da doena celaca.
2.2. Objetivos Especficos
Desenvolver preparaes isentas de glten adicionadas de psyllium',
Comparar as caractersticas tecnolgicas das preparaes modificadas
com as preparaes padro;
Reduzir o teor lipdico das preparaes isentas de glten;
Analisar a composio qumica das preparaes modificadas e das
originais;
Comparar as caractersticas organolpticas entre os produtos padro e
modificados;
Analisar a qualidade nutricional dos produtos elaborados;
Avaliar a aceitabilidade das preparaes modificadas.
16
3. REVISO BIBLIOGRFICA
3.1. Doena Celaca
3.1.1. Histrico e conceitoH aproximadamente 10 mil anos, aps o final da Era Glacial, o homem
praticava a caa de animais e a coleta de frutos, para tornar possvel sua sobrevivncia. Posteriormente, verificou que se permanecesse em um lugar por
um perodo longo seria possvel semear a terra e obter colheitas de diversos
cereais, entre eles, o trigo, conhecido na fabricao de um dos mais antigos
alimentos: o po (ROSTAMI, 2004). O rendimento desta produo era to
expressivo, que permitiu ao homem viver no mesmo local sem necessidade de
andar constantemente procura de alimentos. Nesse perodo, denominado
revoluo Neoltica, houve uma grande mudana na histria da alimentao.
(ACELBRA, 2004).
O princpio de propriedade foi consolidado e foram desenvolvidos
sistemas de fortificao para terra e para seu produto, o alimento. No perodo Neoltico, houve o desenvolvimento de gramneas tendo como origem o Triticum
monococcum bocoticcum e o Triticum monococcum uratru ao norte - Turquia, Ir
e Iraque - e o Triticum turgidum dicoccoides ao sul - Israel, Sria e Lbano
(ROSTAMI, 2004).
O cultivo do trigo e da cevada foi primeiramente explorado com intensivo
desenvolvimento no Ir; um pouco mais lentamente do oeste ao norte europeu, quatro mil anos a.C. As grandes transformaes causadas no modo de vida e na
dieta pela revoluo na agricultura (da coleta para o cultivo de hortalias, gros e
frutas) levaram ao aparecimento de novas doenas, entre elas, a doena celaca
(ROSTAMI, 2004).
A DC conhecida desde a antiguidade e seu primeiro relato data do
tempo de Aretaeus da Capadcia, provncia romana, que corresponde atual
Turquia. O termo koiliacos, era utilizado por ele com o significado de doena do
intestino. Os relatos de doentes com um tipo de diarria, Koiliakos, levam a crer
que esta doena seria aquela posteriormente descrita por Samuel Gee, em
1888, afeco celaca, com as seguintes caractersticas: indigesto crnica,
17
identificada em pessoas de todas as idades, especialmente em crianas entre
um e cinco anos (ARUCCHIO, 1996; PAVELEY, 1989).
Segundo Samuel Gee (1888), controlar a alimentao a parte principal
do tratamento. A ingesto de farinceos deve ser reduzida e, se o doente pode
ser curado, h de ser por meio da dieta (ACELBRA, 2004).
No ano de 1950, em razo da 2a Guerra Mundial, o racionamento de
alimentos reduziu drasticamente o fornecimento de po populao holandesa
e, assim, um pediatra holands verificou que crianas com afeco celaca
melhoraram sua qualidade de vida7. Assim, ele associou esse fato ao baixo
consumo de dieta rica em cereais (BERGE, 1993). Posteriormente, Charlotte
Anderson comprovou a existncia de uma substncia contida no trigo e no
centeio que provocava a doena: o glten (ACELBRA, 2004).
Em 1991, Richard Logan comparou a distribuio das vrias formas da
DC a um iceberg devido existncia de casos de apresentao sintomtica, que
corresponderiam sua poro visvel, e os de apresentao assintomtica, que corresponderiam poro submersa do iceberg (CATASSI, 1996; SDEPANIAN,
1999).
Essa enteropatia auto-imune leva intolerncia permanente ao glten ingerido, o maior componente protico do trigo, da aveia, da cevada e do centeio
(ROSTAMI, 2004) e caracterizada histologicamente pela atrofia das microvilosidades intestinais (BUTTERWORTH, 2004).
Os fatores histolgicos sugestivos da DC so atrofia vilositria com
hiperplasia das criptas e linfcitos intraepiteliais (GREEN, 2003), como mostra a
Figura 2. Ocorre infiltrao de clulas T no epitlio intestinal e o tecido
subjacente leva destruio das microvilosidades do intestino, com conseqente
m-absoro de nutrientes (SCHUPPAN, 2003). No intestino de indivduos
normais ou pacientes celacos tratados, as clulas T no esto presentes
(MOWAT, 2003).
7 Qualidade de vida a percepo do indivduo de sua posio na vida no contexto da cultura e do sistema de valores nos quais ele vive e, em relao aos seus objetivos, expectativas, padres e preocupaes.
18
Figura 2. Vilosidade intestinal: epitlio normal (esquerda) e epitlio de portador da DC no tratado (direita), caracterizado por infiltrao de linfcitos intraepiteliais e achatamento das vilosidades8
Na DC esto presentes mecanismos imunolgicos que envolvem a imunidade inata e a imunidade adquirida (celular e humoral). A resposta imune gliadina, com a produo de anticorpos antigliadina, a ocorrncia aumentada de produtos de genes HLA Classe II e outros, e o envolvimento virai tm sido considerados na patognese da DC (MALNICK, 1997; TRONCONE, 1996).
Em condies fisiolgicas normais, o epitlio intestinal age como uma barreira contra a passagem de macromolculas como o glten. Em portadores de DC, a permeabilidade intestinal aumentada e os peptdeos de gliadina no totalmente degradados pelas peptidases intraluminais podem penetrar pelo epitlio e conduzir a reaes imunolgicas (GUANDALINI; GUPTA, 2002).
A doena primariamente afeta a mucosa das pores proximal e mdia do intestino delgado, apesar de os segmentos mais distais tambm poderem estar envolvidos. Alteraes da mucosa intestinal que precedem o envolvimento das clulas T foram observadas logo aps o estmulo com gliadina. Assim, aps uma hora, a bipsia intestinal dos pacientes celacos mostrava aumento na expresso de HLA-DR nos entercitos e nos macrfagos e posteriormente ocorre a invaso
8 Fonte: Management of Celiac Disease, 2005
19
das clulas T CD8 + na camada epitelial (linfcitos intraepiteliais) (GUANDALINI;
GUPTA, 2002).
Com a passagem dos peptdeos de glten pela barreira epitelial, atingem
a regio em que encontram a enzima transglutaminase (tTG) e as clulas
apresentadoras de antgeno DQ2 e DQ8 que apresentaro a gliadina aos
linfcitos T CD4+. Dessa forma, clones de clulas T CD4+ especficas para o
reconhecimento de gliadina so encontrados em bipsias intestinais de pacintes
com DC (GUANDALINI; GUPTA, 2002).
Os linfcitos T CD4+ estimulados produzem inmeras citocinas
responsveis pela inflamao e atrofia vilositria (GREEN, 2003). A atrofia e o
achatamento das vilosidades limitam a rea disponvel para absoro de nutrientes. Alm disso, as clulas das vilosidades se tornam deficientes em
enzimas dissacaridases e peptidases, necessrias para a digesto e para o
transporte de nutrientes para corrente sangnea (KRAUSE, 1998). Essa m absoro, relacionada total ou parcial atrofia das vilosidades da mucosa
intestinal, pode voltar ao normal aps aderncia do paciente a uma dieta isenta
de glten - nica terapia efetiva (LEPERS, 2004).
Apesar dos estudos desenvolvidos, a DC ainda pouco conhecida e seus sintomas podem ser confundidos com outros distrbios. Ela geralmente se
manifesta na infncia, entre o primeiro e terceiro ano de vida, podendo, entretanto, surgir em qualquer idade, inclusive na fase adulta (ACELBRA, 2004).
Para que ocorra a expresso da DC, alm do uso do glten na dieta, tambm necessria a presena de outros fatores como os genticos, os
imunolgicos e os ambientais (SDEPANIAN, 1999). Estudos realizados por
MacDonald (1965) e por Mylotte (1974), com amostras de biopsia de intestino
delgado de parentes de primeiro grau, mostraram que fatores genticos podem
influenciar na susceptibilidade doena. A prevalncia da DC em parentes de
primeiro grau varia de 2 % a 2 0 %, com mdia de 8 % a 1 2 % na maioria dos
estudos (MACDONALD, 1965; MYLOTTE, 1974), sendo igual a 70% em gmeos
monozigticos (SDEPANIAN, 1999).
20
3.1.2. Sintomatologia, epidemiologia e diagnsticoA DC pode ser considerada, mundialmente, como um problema de sade
pblica, principalmente devido alta prevalncia, freqente associao
morbidade varivel e no-especfica e, no longo prazo, probabilidade
aumentada de aparecimento de complicaes graves, principalmente
osteoporose e doenas malignas do trato gastroentrico (PRATESI; GANDOLFI,
2006).
Deficincias nutricionais so comuns em pessoas que apresentam essa
enteropatia, tais como deficincia de ferro, vitamina B12 e folato, devido
dificuldade de absoro de nutrientes. Alm disso, em pacientes no tratados,
pode ocorrer osteoporose (HARRIS, 1970), infertilidade (BUTTERWORTH, 2004; DISSANAYAKE, 1974; MORRIS, 1977) e doenas depressivas (HALLET, 1982).
A DC pode apresentar as seguintes formas clnicas: clssica, no-clssica ou latente e assintomtica (SDEPANIAN, 1999). A DC Clssica se caracteriza
pela diarria ou constipao crnica, dficit do crescimento, anemia no curvel,
emagrecimento, falta de apetite, distenso e dor abdominais, vmitos, osteoporose, esterilidade, abortos de repetio, inchao das pernas, afinamento
de braos e pernas, apatia, queda de plos, alteraes no ciclo menstrual e ou
desnutrio aguda, que podem levar o paciente morte na falta de diagnstico e
tratamento.
As formas no-clssicas caracterizam-se por quadro monossintomtico,
no qual as manifestaes digestivas esto ausentes ou, quando presentes, ocupam um segundo plano. Os pacientes deste grupo podem apresentar
manifestaes isoladas, como: baixa estatura; anemia por deficincia de ferro
refratria ferroterapia oral; artralgia ou artrite; constipao intestinal; hipoplasia
do esmalte dentrio; osteoporose; esterilidade; irritabilidade; fadiga; baixo ganho
de peso; manchas e alterao do esmalte dental (SDEPANIAN, 1999).
A DC silenciosa ou assintomtica, reconhecida com maior freqncia nas
ltimas duas dcadas, identificada por marcadores sorolgicos especficos,
especialmente os anticorpos antigliadina, antiendomsio e anti-reticulina. Alm
disso, o paciente apresenta uma atrofia vilositria total ou subtotal por bipsia
duodenal, porm estes indivduos praticamente no apresentam os sintomas
21
clssicos. Os testes so freqentemente realizados em indivduos com riscos de desenvolver a doena, principalmente parentes de primeiro grau de portadores da DC, diabticos insulino-dependentes, indivduos que apresentam tireoidite de Hashimoto e distrbios neurolgicos (LEPERS, 2004; CATALDO, 1995; CATALBUIG, 1990; PRATESI, 2003).
As manifestaes clnicas da DC variam de acordo com a idade do paciente, a durao e a extenso da doena e podem ainda desencadear distrbios neurolgicos relacionados (PRATESI, 2003).
A DC uma causa conhecida de dficit de crescimento, podendo ser a baixa estatura o seu principal sintoma. Um estudo realizado por Queiroz (2000), analisou crianas com problemas de baixa estatura e sem sintomas gastrintestinais e mostrou a incidncia de doena celaca em 2,8% da populao estudada, confirmando a relao de dficit de crescimento doena celaca. De acordo com um estudo feito por Cacciari (1983), aproximadamente 10% dos indivduos com baixa estatura, isoladamente submetidos biopsia de intestino delgado, apresentaram atrofia vilositria total.
O sintoma mais comum da DC a diarria (FIGURA 3), mesmo que se apresente em um pouco menos da metade dos indivduos celacos (GREEN, 2003).
H
D
E
C
A. DiarriaB. Parentes com DCC. Identificao incidental durante a endoscopiaD. AnemiaE. Doena sseaF. Baixo pesoO. Dor abdominal H. Outros (constipao, neuropatias e dermatite herpirtiforme
B
Figura 3. Achados mais comuns em pacientes celacos desde a introduo do teste sorolgico entre 1993 e 2000 9
9 Grfico adaptado de Green, 2003.
22
De um modo geral, a DC ocorre em diversos pases e a prevalncia da
doena parece ser de cerca de 1/266 (GREEN, 2003), acometendo com igual
freqncia crianas de ambos os sexos. Porm nos adultos a doena acomete
duas vezes mais pessoas do sexo feminino (FASANO; CATASSI, 2001).
Em 2003, foi realizado um estudo que investigou sintomas clnicos e
patologias que os portadores de DC apresentavam antes do tratamento da
doena (Tabela 1).
Tabela 1. Sintomas clnicos e patologias anteriores ao tratamento da DC10Sintomas clnicos Proporo de respondentes (n= 266)Flatulncia e dor abdominal 73,9%Diarria 71,3%Fadiga 66,3%Perda de peso 64,0%Palidez 55,0%Dor nas articulaes 29,0%Nuseas 27,0%Patologias Proporo de respondentes (n= 266)Anemia 46%Estresse 32%Sndrome do intestino irritvel 24%Deficincia de vitaminas 17%Alergias alimentares 1 1 %Esofagite de refluxo 14%Sndrome de fadiga crnica 8 %
Estudo realizado por Garcias e Pratesi, em 2001, sobre o rastreamento deprovveis casos de DC entre pacientes adultos usurios dos laboratrios de
anlises clnicas do Hospital Universitrio de Braslia (HUB), mostrou que a
prevalncia da DC nesses indivduos de 1:501, encontrada na forma silenciosa
e clssica. Outro estudo realizado por Modelli e Gandolfi (2001), que consistiu em um rastreamento de provveis casos de doena celaca entre crianas
usurias do laboratrio de anlises clnicas no mesmo hospital, mostrou uma
prevalncia de um a cada 215 indivduos.
Estudo mais recente realizado por Pratesi et al. (2003) mostrou a
prevalncia de 1:185 (0,54%) em crianas componentes de um grupo de
usurios de laboratrio de anlises clnicas do hospital geral. Esses estudos
levam a crer que a prevalncia da DC no Brasil, se no for similar encontrada
na Europa, em muito se aproxima.
10 Adaptado de Cranney et al, 2003.
23
Calcula-se que existam 300 mil brasileiros portadores da doena com
maior prevalncia na Regio Sudeste (ACELBRA, 2004). A Tabela 2 apresenta a
prevalncia da doena em diversos pases e destaca a diferena entre a
prevalncia por diagnstico clnico e por screening11.
Tabela 2. Prevalncia de Doena Celaca em Diversos Pases12
Area geogrfica Prevalncia em diagnsticos clnicos
Prevalncia em pesquisa de screening
Dinamarca 1 : 1 0 0 0 0 1 500Finlndia 1 : 1 0 0 0 1 130Alemanha 1:2300 1 500Itlia 1 : 1 0 0 0 1 184Holanda 1:4500 1 198Noruega 1:675 1 250Sucia 1:330 1 190Reino Unido 1:300 1 1 1 2Estados Unidos 1 : 1 0 0 0 0 1 1 1 1
Mdia mundial 1:3345 1:266
Ainda no est claro na literatura se as diferenas epidemiolgicas refletem simplesmente a composio da dieta nas diferentes localidades
geogrficas do mundo ou se so devidas a outros fatores como o perfil
imunogentico da populao ou, ainda, a uma subestimativa do diagnstico.
A prevalncia da DC vem aumentando no mundo tanto na populao em
geral quanto em grupos de risco, como em pacientes com sindrome do intestino
irritado ou diabetes do tipo 1. Estudos mostram ainda o aumento na prevalncia em condies como outras doenas auto-imunes (ATIKINSON, 2001; ROSTAMI,
2004).
Em crianas com diabetes tipo 1, a prevalncia da DC varia de 1 a 10%
comparada com 0,5% da populao em geral (CRONIN, 1997; VALRIO, 2002).
Em grande parte desses pacientes, a doena subclnica, assintomtica ou
11 Prevalncia em diagnsticos clnicos: indivduos que apresentaram sintomas e, por meio de anlises clnicas e laboratoriais, tiveram a doena diagnosticada.
Prevalncia em pesquisa de screening: a deteco de doenas em indivduos assintomticos, ou seja, realizar o diagnstico na fase que antecede o aparecimento dos sintomas. Tal atitude se insere dentro de uma lgica de medicina preventiva, pois em muitos casos o diagnstico precoce gera intervenes benficas ao paciente.
Tabela adaptada de FASANO; CATASSI, 2001.
24
caracterizada por aspectos atpicos reconhecidos apenas com mtodos retrospectivos (FRANZESE, 2004). A DC assintomtica considerada como um
estgio pr-clnico do desenvolvimento da doena grave sendo a dieta
considerada como protetora contra riscos de doenas auto-imunes futuras
(VENTURA, 1999).
Recentemente, estudos de rastreamento demonstraram alta prevalncia
da doena em crianas e adultos aparentemente saudveis (SDEPANIAN,
1999). Um estudo epidemiolgico realizado em uma provncia italiana (CATASSI,
1995) demonstrou que a prevalncia de DC no grupo em que foi realizado o
rastreamento sorolgico foi de um para cada 300 indivduos estudados.
Posteriormente, um estudo multicntrico italiano observou que a prevalncia de
DC na populao pesquisada foi de um para cada 184 indivduos estudados
(CATASSI, 1996).
Durante as duas ltimas dcadas, o espectro de sinais clnicos da DC em
adultos est se modificando. Aproximadamente 60% dos casos so descobertos
por manifestaes extra-intestinais. Alm disso, estudos recentes que utilizam
mtodos sorolgicos para o diagnstico da DC revelam a existncia das formas latente e silenciosa (LEPERS, 2004). O aumento da freqncia de achados da DC atpica, em virtude da melhoria dos mtodos diagnsticos, tem contribudo
para a estimativa correta da prevalncia da doena, reduzindo os riscos de
deficincias nutricionais e malignidade.
Anteriormente, o procedimento clssico de diagnstico consistia de bipsia da mucosa do intestino delgado. O processo consistia na retirada de um
pedao do intestino para anlise no microscpio, seguida de uma dieta sem
glten e de rebipsia, para documentar qualquer melhora das vilosidades
intestinais e, posteriormente, um desafio de glten - reintroduo do glten na
dieta - seguido por outra bipsia aps seis semanas (TRONCONE, 1996).
Mais recentemente, foi empregada uma tcnica de diagnstico como
ferramenta de seleo menos invasiva em pessoas que inicialmente apresentam
sintomas clnicos similares DC, utilizada tambm para avaliao e
acompanhamento de pacientes, aps o diagnstico e o tratamento: o
rastreamento sorolgico (CATASSI, 1997). A realizao de rastreamento
sorolgico com os anticorpos antitransglutaminase e anti-endomsio aceita
25
como diagnstico definitivo, quando positivos e confirmados pela bipsia
intestinal seguida pela resposta sorolgica dieta isenta de glten (PRATESI,
2003). Tal tcnica permite a identificao de outras formas de manifestao
clnica da doena, alm da digestiva (SDEPANIAN, 1999).
Como os sintomas so muito genricos e constantemente associados a outras patologias, comum a doena ser tratada de forma inadequada at se
chegar ao diagnstico correto (ACELBRA, 2004). A doena normalmente se
manifesta em crianas at um ano de idade, a partir do momento em que
comeam a incluir em sua dieta alimentos que contm glten. Entretanto, em
alguns casos, ela se manifesta somente na idade adulta, dependendo do grau de
intolerncia. O atraso no diagnstico conduz a deficincias no desenvolvimento
da criana e a diversas outras complicaes (ACESSA, 2004).
Os mtodos de anlise imunohistoqumica permitem a deteco de mudanas histolgicas mais amplamente que aqueles previamente
reconhecidos. Os menores sinais de inflamao na mucosa intestinal, assim
como o aumento do nmero de linfcitos intraepiteliais carreados aos receptores
de clulas T e expresso inadequada do HLA-DQ em criptas sem vilosidades atrofiadas, podem ser encontradas em um subgrupo de pacientes com anticorpos endomisiais positivos. Esses achados representam alteraes
observadas antecipadamente relacionadas exposio ao glten (KAUKINEN,
2001).
O surgimento dos testes sorolgicos permite o rastreamento de grupos
de risco, o diagnstico das formas clnicas leves com sintomas no
caractersticos, dos casos assintomticos, bem como monitorar a adeso dieta
isenta de glten. Apesar da necessidade da bipsia intestinal para confirmao
do diagnstico da DC, os testes sorolgicos orientam a necessidade da bipsia e
evidenciam os casos suspeitos da DC.
26
3.1.3. TratamentoA DC est associada morbidade e crescente mortalidade. Atualmente,
a nica forma de melhorar o prognstico da doena o tratamento dietoterpico
(LOGAN, 1989).
O tratamento da DC , no momento, basicamente diettico e consiste na
excluso do glten da dieta de forma permanente (SDEPANIAN, 2001). Assim,
as microvilosidades intestinais podem retornar ao seu estado histolgico normal
(MACDONALD, 1964), pois o glten agride e danifica as vilosidades do intestino
delgado e prejudica a absoro de nutrientes.
Pesquisa realizada por Chartrand em 2003 mostrou que pacientes
celacos apresentaram reao gliadina em uma quantidade de 0,75mg de gliadina por 100g de alimento, com consumo de, no mximo, 4,5g de gliadina por
dia. Porm, alguns indivduos apresentam reao s mnimas quantidades de
gliadina ingerida.
A obedincia dieta isenta de glten previne a ocorrncia de
complicaes malignas e no-malignas (FERGUSON, 1996). De acordo com
estudo realizado por Sdepanian (2001), quanto maior o grau de conhecimento sobre a doena e seu tratamento, maior a obedincia dieta isenta de glten.
Estima-se que apenas 50-70% dos portadores da DC diagnosticada aderem ao tratamento. Isso se deve principalmente dificuldade de se obterem alimentos
isentos de glten (MKI, 1997; MAYER, 1991).
Pacientes com DC necessitam de orientaes dietticas de profissional,
capacitado na rea de nutrio, que possa propiciar-lhes suporte no sentido de
inform-los sobre a escolha de alimentos e trein-los para o preparo de
alimentos isentos de glten, uma vez que a aceitao do tratamento est
condicionada ao esclarecimento inicial sobre a necessidade da dieta e sobre a
implicao prtica da aderncia ou no ao tratamento (BUTTERWORTH, 2004).
Estudo realizado por Cranney et al. (2003) mostrou o ndice de satisfao
dos portadores de DC em relao s informaes recebidas (Tabela 3).
27
Tabela 3. Qualidade da informao recebida pelos celacos sobre a doena13
Informante Excelente(%)
Adequado(%)
Inadequado(%)
Norecebeu
(%)Associao dos celacos 83 17 - -
Gastroenterologistas 35 35 17 13Nutricionista 29 40 2 2 9
Mdicos da famlia 1 2 33 21 34
Verifica-se que o percentual de indivduos que recebeu informaes
inadequadas ou no recebeu informaes de profissionais de sade sobre a DC elevado. Dos portadores de DC entrevistados, 31% no receberam informao
adequada por parte dos nutricionistas, profissionais capacitados a orient-los sobre a escolha e preparo de alimentos, fundamental para o tratamento. Por outro lado, observa-se que 1 0 0 % dos pacientes receberam orientao de
Associaes relacionadas a essa patologia, e a consideraram adequada. Isso
mostra a importncia da atuao deste tipo de Associao na divulgao de
informaes relativas doena e, conseqentemente, na adeso ao tratamento.
Alm dos pacientes, h necessidade de se estender a orientao
populao em geral, principalmente aos funcionrios que atuam na rea de produo de alimentos sobre essa doena e sobre as possibilidades de
contaminao de alimentos pelo glten. Um estudo realizado por Karaje (2004)
mostrou que entre o grupo de chefs estudado (n= 322) apenas 17% j haviam ouvido falar sobre a doena, sem, contudo, terem qualquer conhecimento a
respeito. Tal fato compromete o tratamento, uma vez que no garante a
adequada alimentao do celaco fora de casa.
Nesse mesmo estudo, foi questionado aos celacos (n= 319) sobre quais
locais em que eles sentiam maior restrio alimentar. Os dados obtidos
indicaram que 82,1% consideravam difcil fazer lanches em padarias, bares e quiosques; 78,6% apresentavam dificuldade em se alimentar em restaurantes e
61,3% relataram dificuldade para se alimentar em casa de amigos. Esses dados
apontam a dificuldade na insero social desses pacientes, uma vez que a
populao desconhece a doena (KARAJE, 2004).
13 Adaptada de CRANNEY, 2003
28
Em maio de 2003 foi sancionada a Lei n 10.674 (ANEXO A), que
determina a obrigatoriedade dos produtos alimentcios industrializados
informarem sobre a presena de glten, como medida preventiva e de controle
da DC.
Pesquisas dietticas mostram que 30% dos pacientes admitem ter
consumido glten e permanecido assintomticos. Porm, em alguns pacientes, a
ingesto mesmo de pequenas quantidades de glten provoca distenso
abdominal e diarria (ACELBRA, 2004; SHILLS, 1998).
A vigilncia da dieta deve ser permanente, uma vez que a ingesto de
glten pode acontecer sem o conhecimento do portador de DC, em situaes
como: utilizao do mesmo leo no preparo de alimentos com glten e,
posteriormente, no preparo de outro sem glten; pelo uso da mesma faca para
passar margarina em po com glten em bolacha sem glten; pela reutilizao de tabuleiros polvilhados com farinha de trigo para assar produtos com ou sem
glten, sem que tenham sido bem lavadas; ou, ainda, alimentos que no contm glten, mas que foram contaminados com glten (ACELBRA, 2004).
Um estudo realizado por Corrao (2001) mostrou que o ndice de mortalidade em paciente celaco duas vezes maior que o da populao em geral. Isso pode ocorrer em razo do atraso no diagnstico, porm decorre
principalmente do tratamento incorreto. Tal constatao evidencia a importncia da dieta totalmente isenta de glten como medida preventiva ao aumento da
morbidade e mortalidade relacionadas DC no tratada (VENTURA, 2004).
3.2. Glten
3.2.1. Glten, propriedades e consumo
O glten uma protena presente no trigo, na aveia, na cevada e no
centeio, obtida pela lavagem de farinhas destes cereais, aps a remoo dos
grnulos de amido. composto por duas fraes proticas: a gliadina e a
glutenina (FIGURA 4). A gliadina apresenta peso molecular mdio de 40.000,
cadeia simples e extremamente gomosa quando hidratada. Possui pouca ou
nenhuma resistncia extenso e , portanto, responsvel pela coesividade da
massa (TEDRUS, 2001).
29
A glutenina formada por vrias cadeias ligadas entre si, apresentando
peso molecular mdio que varia de 1 0 0 . 0 0 0 a vrios milhes. elstica, mas
no coesiva e fornece massa a propriedade de resistncia extenso
(TEDRUS, 2001).
Figura 4. Estrutura do glten: gliadina e glutenina14
A gliadina e a glutenina combinadas possuem a propriedade de formar
com gua e energia mecnica uma rede tridimensional viscoelstica, insolvel
em gua: o glten (BOBBIO, 1992).
Tedrus (2002) afirma que nenhum outro cereal apresenta protenas com
capacidade para a formao de massas como as do trigo. O centeio e o triticale,
um hbrido de centeio e trigo, so os cereais que mais se aproximam dessas caractersticas, porm suas massas ainda so mais fracas que a do trigo.
Das protenas totais do trigo, 15% correspondem a globulinas e albuminas
(no formadoras de glten) e 85% gliadina (alta extensibilidade e baixa elasticidade) e glutenina (baixa extensibilidade e alta elasticidade), que so
formadoras de glten. A quantidade total de protenas existente no gro
corresponde a um percentual que varia entre 8 a 2 1 %. O entrelaamento das
protenas, obtido pela mistura com gua e pelo batimento da massa, resulta em uma rede elstica, responsvel pela reteno dos gases formados no processo
de fermentao de massas e no de liberao de vapor de gua durante o
processo de coco, que dar o volume final e a textura caracterstica dos
produtos (ESTELLER, 2004).
Os fragmentos polipeptdicos do glten, que constituem sua frao solvel
em lcool, so denominados de prolaminas. Estas, em geral, representam 50%
14 Figura adaptada de: FoodDoc, 2005
30
da quantidade total dessa protena. Fraes proticas do glten, txicas ao
paciente com DC, diferem de acordo com o tipo de cereal: gliadina no trigo,
secalina no centeio, hordena na cevada e avenina na aveia (ANAND, 1978;
CICLITIRA, 1991).
O glten uma protena muito importante para as preparaes que necessitam de crescimento, pois, conforme exposto, forma finas membranas que
retm as bolhas de ar produzidas pelos agentes de crescimento - ar, vapor de
gua, fermento biolgico e fermento qumico. Em contato com o calor, o glten
coagula e forma uma crosta que limita os orifcios produzidos pela expanso do gs no interior da massa e confere caracterstica crocante a sua crosta
(ORNELLAS, 2001).
Nas massas, o glten responsvel pelas propriedades viscoelsticas e sua presena permite que elas assumam vrias formas e tamanhos
(FREELAND-GRAVES,1995). Quando misturadas farinha de trigo e gua, pode- se observar a formao de uma massa constituda da rede protica do glten
ligada a grnulos de amido. O glten, em panificao, retm o gs carbnico
produzido durante o processo fermentativo e, assim, faz que o po aumente de volume (GUARIENTI, 1993).
A expresso "fora de uma farinha" normalmente utilizada para designar
a maior ou menor capacidade de uma farinha de sofrer um tratamento mecnico ao ser misturada com gua. Tambm est associada maior ou menor
capacidade de absoro de gua pelas protenas formadoras do glten e
capacidade de reteno do gs carbnico, resultando num bom produto final de
panificao, ou seja, po de bom volume, de textura interna sedosa e de
granulometria aberta. Uma farinha de trigo forte possui, em geral, maior
capacidade de reteno de gs carbnico. Uma farinha fraca, por sua vez,
apresenta deficincia nesta caracterstica (GUARIENTI, 1993).
A farinha de trigo o nico produto de cereal que, misturado com gua
em proporo adequada, possui a habilidade de formar massa viscoelstica,
capaz de reter gases e apresentar estrutura esponjosa quando aquecida no
forno. Em panificao, a massa de trigo est sujeita deformao em cada
etapa do processo (FERRARI, 1998).
31
Estatsticas revelam que, nos Estados Unidos, o cereal mais consumido
o trigo, cujo consumo representa cerca de 74% do total de cereais. O mesmo
estudo apontou que o consumo de massas, naquele pas, aumentou em 50% no
perodo compreendido entre 1982 e 1992, com perspectiva de contnuo
aumento, em funo das refeies rpidas (pouco tempo para preparo e
consumo). Isso afeta a parte da populao que tm DC, pois a maior parte
desses alimentos contm glten (FREELAND-GRAVES.1995).
De acordo com a ltima Pesquisa de Oramento Familiar (POF)15
realizada no Brasil (2002/2003), em relao pesquisa anterior (POF
de1995/1996), verifica-se aumento do consumo de farinhas e de massas em
aproximadamente 54%. De panificados, no entanto, houve uma reduo de 20% (TABELA 4) (IBGE, 2004).
Tabela 4. Consumo alimentar domiciliar per capita anual16Consumo alimentar per capita (em kg)
Produto POF 1995/1996 POF 2002/2003
Farinhas, fculas e massas 14,69 22,768Farinha de trigo * 5,083Macarro * 4,423Creme de arroz * 0,177Pizza * 0,168
Panificados 25,367 20,29Po * 14,796Bolo * 0,697Biscoitos e roscas * 4,806
* Informaes no detalhadas na POF 1995/1996.
Possivelmente, o aumento do consumo das farinhas se deve, entre outras
razes, no s a sua ao como agente espessante em preparaes como molhos, sopas, caldos, mingaus, mas tambm, como matria-prima de produtos
como pes, biscoitos e massas. Para os produtos panificados, a reduo no consumo pode ser explicada pela oferta de novos produtos no mercado e pela
possibilidade de produo desses alimentos em casa, a partir da farinha de trigo.
15 POF: objetiva recolher informaes sobre gastos e rendimentos de uma populao de famlias, por meio de amostra aleatria em quatro pontos distintos do tempo, para que estas observaes proporcionem uma base emprica, que permita elaborar estruturas mdias de consumo.16 Tabela adaptada das POFs 1995/1996 e 2002/2003. Fonte: IBGE.
32
Por outro lado, o alto consumo de macarro se deve ao fato de este alimento
constituir uma fonte de carboidrato com custo acessvel populao de baixa
renda e de ser um produto de difcil elaborao em nvel domstico.
3.2.2. Substitutos para farinhas que contm glten
O glten, complexo protico responsvel pela qualidade de alimentos,
principalmente dos produtos de panificao (SOUZA, 2001) deve ser eliminado
das refeies dos portadores da DC e substitudo por outras opes como farinha de arroz, amido de milho, farinha de milho, fub, farinha de mandioca,
polvilho e fcula de batata (ACELBRA, 2004), alm das farinhas de quinoa e de amaranto.
Quando uma farinha considerada pobre em glten, h alternativas para enriquec-la com melhoradores17, para favorecer as propriedades gastronmicas
da referida protena. Podem ser utilizados: cido ascrbico, palmitato de ascorbila, bromato de potssio, persulfatos, tricoleto de nitrognio. A legislao
brasileira, porm, probe o uso de melhoradores no fisiolgicos e recomenda o
cido ascrbico, o qual fortalece e d maior elasticidade ao glten, retendo
gases liberados na fermentao (SOUZA, 2001). Entretanto, no havendo glten, esses melhoradores no colaboram para a reteno de gases, o que dificulta ainda mais o preparo de alimentos para os celacos.
Os gros de cereais apresentam estrutura caracterstica e diferenciada.
Seus envoltrios e o amido presentes caracterizam seu comportamento no s sob a ao do calor, mas tambm sob a ao de outros agentes (SOUZA, 2001).
Os cereais tm como base os carboidratos e as protenas, que formam os
constituintes principais do organismo vivo, alm de serem a mais abundante e econmica fonte de energia para o homem (BOBBIO, 1992).
De acordo com Bobbio (1992), o amido um polissacardeo neutro,
formado por dois polmeros: amilose e amilopectina. A diferena entre essas
duas formas so as ligaes: a primeira composta de unidades de glicose com
ligaes glicosdicas alfa (1,4), que formam unidades de maltose. A segunda
formada por unidades de glicose unidas em alfa (1,4), com cadeias de glicose
17 Substncia que, agregada farinha, melhora sua qualidade tecnolgica para os fins a que se destina.
33
ligadas em alfa (1 ,6 ), de modo que, alm de unidades de maltose, tem-se em
menor proporo isomaltose nos pontos de ramificao.
As propores de amilose e amilopectina so variveis entre os amidos
procedentes de diferentes espcies vegetais e, mesmo entre amidos
provenientes da mesma espcie, variam de acordo com o grau de maturao
das plantas. Amidos do trigo e do milho contm relativamente grandes
quantidades de amilose (26% a 30%). O arroz apresenta variao de 8 % a 30%
de amilose. Por sua vez, tubrculos como batata e mandioca contm pequenas
quantidades de amilose (17% a 23%) e grandes quantidades de amilopectina.
Portanto, em substituio farinha de trigo, recomenda-se o uso de produtos
que contenham caractersticas de amido semelhantes, para se promoverem caractersticas funcionais semelhantes.
As propores de amilose e amilopectina influenciam na viscosidade e no poder de geleificao do amido (BOBBIO, 1992). A amilose a frao do amido
que se apresenta mais viscosa, solvel em gua e facilita a formao de gis
em funo da sua estrutura em forma helicoidal. A amilopectina se apresenta
menos solvel e no contribui para a formao de gis (ARAJO et al., 2006).
A tecnologia da gelatinizao do amido de grande importncia na
indstria alimentcia, pois o aumento da solubilidade pelo processo de
gelatinizao a base para a elaborao de alimentos amilceos pr- preparados, como pudins, pur de batata, polenta entre outros. Em produtos
como embutidos de carne, o amido utilizado como estabilizante de emulso, fato que pode prejudicar os portadores de DC, uma vez que a farinha de trigo
frequentemente usada como fonte de amido para essas preparaes (ARAJO
et al; 2006).
A fcula de batata, a araruta e o polvilho no se comportam da mesma
forma que o amido de milho, a farinha de arroz e a farinha de trigo, os quais
formam um gel moldvel. Isso ocorre porque as primeiras contm menor
quantidade de amilose, que depois de cozida e resfriada, apresenta formao de
um gel firme (SOUZA, 2001).
A farinha de arroz, por no conter glten, usada como substituto
farinha de trigo em alimentos destinados a portadores da DC e amplamente
34
utilizada em alimentos congelados, porque resistente ao extravasamento do
fluido do gel quando o amido da massa congelado e descongelado
(FREELAND-GRAVES.1995). Ressalta-se que a farinha de arroz considerada
um subproduto do beneficiamento deste cereal, uma vez que os gros
quebrados tm pouca utilizao industrial e que a possibilidade do uso desta farinha na produo de pes aumenta seu valor agregado (TEDRUS, 2001).
A farinha de milho contm uma protena denominada zena, que
apresenta pequena capacidade de reteno de gs e tambm pode conferir
elasticidade s preparaes (FREELAND-GRAVES.1995).
O amaranto um pseudocereal18 rico em lisina, aminocido limitado em
cereais, que pode ser utilizado no preparo de pes e massas. Seus gros
destinam-se alimentao humana e animal e, a partir dele, inmeros alimentos podem ser produzidos para atender demanda por dietas especiais, sob a forma
de farinhas, de cereais matinais, de massas e de biscoitos livres de glten; o que
til a pessoas que buscam alternativa protena animal, livre de colesterol, e a pacientes celacos (SPEHAR, 2003) apesar de ainda no se conhecer a
composio do amido desse pseudocereal.
A quinoa (Chenopodium quinoa Willd), pseudocereal originrio dos Andes, destaca-se pela tolerncia seca, pela elevada qualidade de protena,
pela ausncia de colesterol e de glten e, apesar de no haver estudos relacionados composio do amido desse pseudocereal, na prtica permite o
preparo de alimentos de modo similar ao do arroz ou ao do trigo (SPEHAR,2002).
3.3. Fibras
Novos ingredientes tm sido investigados, de modo a atender s
exigncias do atual mercado consumidor, que deseja produtos com qualidade
sensorial e nutricional associada a benefcios para a sade (MOSCATTO, 2004).
As fibras alimentares esto entre os principais fatores da alimentao na
preveno de doenas crnicas (MATTOS, 2000). So polissacardeos no
18 Alimentos que se assemelham aos cereais, porm no so sementes provenientes de espigas de gramneas.
35
amilceos (celulose, hemicelulose, pectinas, gomas e outros) e lignina19
(ARAJO, 1998; MARLETT, 2002). Encontram-se nas paredes celulares das
sementes, razes, hastes e folhas e no so digeridas pelas enzimas endgenas
do trato grastrointestinal (TROWELL, 1985; ARAJO, 1997).
As propriedades fsico-qumicas das fibras alimentares produzem
diferentes efeitos fisiolgicos no organismo. As fibras solveis so responsveis,
por exemplo, pelo aumento da viscosidade do contedo intestinal e reduo do colesterol plasmtico. As fibras insolveis aumentam o volume do bolo fecal,
reduzem o tempo de trnsito no intestino grosso, e tornam a eliminao fecal
mais fcil e rpida. Por estas razes, esto relacionadas preveno de
constipao crnica (MORAIS, 1999) e regulao do funcionamento intestinal, o que as tornam relevantes para o bem-estar das pessoas e para o tratamento
diettico de vrias patologias (CAVALCANTI, 1989; MATTOS, 2000).
O efeito benfico das fibras dietticas se deve hidrofilia, que implica a reduo do trnsito fecal e, assim, reduz no s o tempo para produo das
substncias carcinognicas como do contato destas com o epitlio (AOE, 1989).
Estudo realizado por Green (2003) mostrou que o risco de desenvolvimento de cncer no intestino em portadores de DC elevado. Portanto, as fibras dietticas poderiam apresentar um efeito protetor aos celacos.
O consumo de fibras dietticas ajuda tambm no controle dos nveis de colesterol, dos nveis de glicose sangunea e de insulina e ainda pode auxiliar na
preveno de doenas cardiovasculares e diabetes tipo 2 (MARLLET, 2002).
Estudos realizados em humanos mostram que o psyllium, fibra extrada da casca da semente de Plantago ovata, agente hipocolesterolmico (FIETZ, 1999).
Constatou-se, tambm, que as fibras alimentares tm importante papel na
preveno de transtornos gastrointestinais, como diverticulite, hemorridas e de transtornos metablicos como a obesidade (ARAJO, 1997).
A fibra, em alimentos, aumenta a absoro da gua, o tempo de
desenvolvimento da massa e o ndice de tolerncia mistura. Em grandes
19 A lignina um polmero hidrofbico que apresenta estrutura tridimensional complexa (ARAJO, 1998)
36
quantidades, diminui a capacidade de reteno de gs e, conseqentemente,
reduz o volume de massas (ARAJO, 1997).
A fibra alimentar pode ser utilizada no enriquecimento de produtos ou
como ingrediente, pois constituda de polissacardeos, lignina,
oligossacardeos resistentes e amido resistente, entre outros, que tm diferentes
propriedades fsico-qumicas. De maneira geral, estas propriedades permitem
inmeras aplicaes na indstria de alimentos, substituindo gordura ou atuando
como agente estabilizante, espessante, emulsificante. Desta forma, podem ser
aproveitadas na elaborao de diferentes produtos: bebidas, sopas, molhos,
sobremesas, derivados de leite, biscoitos, massas e pes. O conhecimento das
propriedades fsico-qumicas importante para a produo de alimentos com boa textura e sabor, porque a simples adio de elevadas quantidades de fibra
nem sempre resulta em produtos com caractersticas sensoriais desejveis (GIUNTINI, 2003).
No Brasil, a Portaria n27, da Secretaria Nacional de Vigilncia Sanitria
(ANVISA), estabelece, no regulamento tcnico referente informao nutricional
complementar, que um alimento pode ser considerado fonte de fibra alimentar quando o produto pronto apresentar 3g de fibra para cada 100g da preparao, para alimentos slidos e 1,5g de fibra para cada 100ml de um produto na forma
lquida. Entretanto, se apresentar o dobro deste contedo, considerado um alimento com elevado teor de fibra alimentar (BRASIL, 2004).
3.3.1. PsylliumInmeros estudos j estabeleceram que a dieta, alm de prover os
nutrientes necessrios aos requerimentos metablicos do organismo, fornece compostos, nutrientes ou no, capazes de modelar as funes orgnicas,
favorecendo a preveno, a manuteno e a recuperao de doenas
(ROBERTFROID, 1998; MELO, 2004). No entanto, sabe-se que alguns
indivduos podem apresentar alergias e intolerncias a alguns nutrientes, como
acontece com os portadores de DC, cuja adeso ao tratamento dificultada pela
limitada escolha das preparaes que compem sua dieta.
37
A fim de atender a necessidades especficas, como as dos celacos, surgem os produtos para fins especiais que so, segundo a Anvisa (BRASIL, 1998), alimentos especialmente formulados ou processados, nos quais se introduzem modificaes no contedo dos nutrientes adequados utilizao em dietas diferenciadas e ou opcionais, com vistas s necessidade de pessoas em condies metablicas e fisiolgicas especficas. Nesta categoria incluem-se os alimentos com restrio de nutrientes - carboidratos, protenas, gorduras, sdio ou outros destinados a fins especficos; os alimentos para ingesto controlada de nutrientes e os alimentos para grupos populacionais especficos.
Os alimentos para dietas com restrio de protenas devem ser totalmente isentos do componente associado ao distrbio. No caso em estudo, a criao de alimentos para fins especiais requer a substituio do trigo por outros ingredientes. Entre as alternativas disponveis, destaca-se o uso de fibras solveis como o Psyllium - Plantago ovata (PACKER, 2000). Tambm denominada ispaghula ou isapgol (FIGURA 5), esta planta tem safra anual e cultivada principalmente na ndia, mas j difundida em vrios pases (SVC, 2005).
Figura 5. Psyllium (Plantago ovata)20 e semente21.
O maior componente do psyllium a mucilagem22, que representa de 10 a 30% de sua estrutura. Tambm contm lipdio, protena, cido oxlico, enzima invertase e emulsina. Sua semente (FIGURA 5) se apresenta em forma de bote,
20 Fonte: Psylliumindia, 200521 Fonte: Numark Pharmacists, 200522 Constituda por polissacarfdeos pouco ramificados, encontrados nas algas e nas sementes. Diferentemente das gomas, no se dissolvem rapidamente na gua, mas formam massas viscosas.
37
A fim de atender a necessidades especficas, como as dos celacos, surgem os produtos para fins especiais que so, segundo a Anvisa (BRASIL, 1998), alimentos especialmente formulados ou processados, nos quais se introduzem modificaes no contedo dos nutrientes adequados utilizao em dietas diferenciadas e ou opcionais, com vistas s necessidade de pessoas em condies metablicas e fisiolgicas especficas. Nesta categoria incluem-se os alimentos com restrio de nutrientes - carboidratos, protenas, gorduras, sdio ou outros destinados a fins especficos; os alimentos para ingesto controlada de nutrientes e os alimentos para grupos populacionais especficos.
Os alimentos para dietas com restrio de protenas devem ser totalmente isentos do componente associado ao distrbio. No caso em estudo, a criao de alimentos para fins especiais requer a substituio do trigo por outros ingredientes. Entre as alternativas disponveis, destaca-se o uso de fibras solveis como o Psyllium - Plantago ovata (PACKER, 2000). Tambm denominada ispaghula ou isapgol (FIGURA 5), esta planta tem safra anual e cultivada principalmente na ndia, mas j difundida em vrios pases (SVC, 2005).
Figura 5. Psyllium (Plantago ovata)20 e semente21.
O maior componente do psyllium a mucilagem22, que representa de 10 a 30% de sua estrutura. Tambm contm lipdio, protena, cido oxlico, enzima invertase e emulsina. Sua semente (FIGURA 5) se apresenta em forma de bote,
20 Fonte: Psyllium\nti\a, 200521 Fonte: Numark Pharmacists, 200522 Constituda por polissacardeos pouco ramificados, encontrados nas algas e nas sementes. Diferentemente das gomas, no se dissolvem rapidamente na gua, mas formam massas viscosas.
38
com aproximadamente 8 mm de comprimento e com 1 a 2 mm de espessura
(SBPL, 2005). utilizada tradicionalmente como erva medicinal, principalmente
no tratamento de constipao intestinal (LEUNG, 1996).
Adicionalmente possibilidade de se substituir o glten pelo psyllium em
preparaes culinrias, verifica-se que algumas fibras alimentares podem
veicular componentes ou substncias bioativas23, anteriormente denominadas
funcionais (PARK, 1997). Vrias pesquisas esto sendo desenvolvidas com o
objetivo de avaliar a eficcia de tais substncias, com o intuito de esclarecer
quimicamente a relao entre esses compostos e seus efeitos no organismo
humano.
Por sua vez, o consumidor, preocupado com a sade e no desejo de viver mais e melhor, procura alternativas para retardar o envelhecimento, prevenir e
tratar doenas. Ao observar este mercado, a indstria de alimentos busca
desenvolver produtos que apresentem componentes bioativos benficos sade (MELO, 2004). Entre as substncias bioativas, destacam-se os prebiticos24 e os probiticos25.
Alimentos prebiticos possuem compostos no digerveis, que estimulam seletivamente o crescimento e/ou atividade de uma ou de um nmero limitado de
bactrias benficas ao organismo no clon intestinal. Como conseqncia, restabelecem o equilbrio da microbiota intestinal, estimulam o sistema imunolgico e inibem ou reduzem a atividade carcinognica (ROBERTFROID,
2000; BRASIL, 2006).
O processo fermentativo desencadeado pelo efeito bifidognico pode
modular as funes intestinais e o metabolismo dos lipdios; favorecer a
produo de vitaminas, principalmente do complexo B; reduzir a concentrao
de amnia no sangue; promover a restaurao da flora intestinal; aumentar a biodisponibilidade do clcio; reduzir o risco de desenvolver hipertrigliceridemia e
hiperglicemia (CAPITO, 1999; YAESHIMA, 1998; WALKER, 1998; ROBERTFROID, 2001).
23 So nutrientes ou no nutrientes que possuem ao metablica ou fisiolgica especfica24 So substncias no digerveis pelo homem que so utilizadas para as bactrias benficas ao organismo (probiticos).25 De acordo com a RDC 02/2002 da ANVISA, so microrganismos vivos capazes de melhorar o equilbrio microbiano intestinal, produzindo efeitos benficos sade do indivduo.
39
Os prebiticos so adicionados em um amplo nmero de produtos
alimentcios, principalmente cereais matinais, produtos de confeitaria e
panificao, sem alterar consideravelmente as caractersticas organolpticas dos
mesmos (MELO, 2004).
Ainda que, sob o aspecto legal, a Anvisa no estabelea que os alimentos
adicionados de prebiticos possam apresentar a propriedade de alegao
funcional e ou de sade, a literatura relata que o psyllium considerado um
alimento prebitico e, puro ou em preparaes, utilizado para melhoria da
constipao intestinal26. A constipao intestinal tem como causa mais comum a dieta, mas pode se relacionar a outras condies como efeito de medicamentos,
doena celaca e problemas mecnicos de motilidade intestinal (DUKAS, 2000).
Paradoxalmente, essa fibra tambm utilizada no controle da diarria,
uma vez que absorve gua e conduz a fezes mais consistentes (EHERER,
1993). Alm disso, o consumo de psyllium est relacionado a diversas condies
de sade (Tabela 5).
26 Condio em que h reduo na freqncia de evacuaes com fezes ressecadas. Dificuldade de evacuao.
40
Tabela 5. Utilizao de psyllium relacionado a condies de sade27Classificao Relao com a sade
*** ConstipaoDiabetes
DiverticuliteHipercolesterolemia
Sndrome do intestino irritado
** AteroscleroseDiarria
HemorridaHipertrigliceridemia
Colite ulcerativa
Doena de Parkinson (constipao)Perda de peso e obesidade
*** Confivel, com pesquisas cientficas consistentes mostrando substanciaisbenefcios para sade.** Estudos preliminares sugerindo benefcios sade.* Pouco suporte cientfico sugerindo benefcios.
Mdicos gastroenterologistas recomendam o uso da referida fibra antes
das refeies em alguns casos de sndrome do intestino irritado, principalmente
em pacientes que apresentam sintomas ps-prandiais como os diabticos (THOMPSON, 2002). Estudos realizados mostraram melhora dos sintomas da
sndrome do intestino irritado. Um deles utilizou 3,25g de psyllium, trs vezes ao
dia, o que resultou na regulao intestinal de pacientes com essa patologia (HOTZ, 1994; JALIHAL, 1990).
O psyllium reduz os nveis de glicose ps-prandial e a sensibilidade da
insulina, o que foi comprovado pelo teste oral de tolerncia glicose (TOTG).
Trata-se portanto, de um produto importante para o controle do diabetes (SONG,
2000). Ademais, a utilizao dessa fibra tambm se relaciona ao controle do
colesterol em humanos e est sendo utilizada como suplementao teraputica
de fibra viscosa para evitar a interveno farmacolgica (JENKINS, 2003).
Um estudo duplo cego realizado com homens diabticos (tipo 2), que
ingeriram 5,1g de psyllium por dia durante 8 semanas, mostrou reduo dos
27 Tabela adaptada de Numark Pharmacists, 2005
41
nveis de glicose sangunea em percentuais que variaram de 11,0% a 19,2%.
Para o colesterol total, a reduo foi de 8,9% e para o colesterol LDL, de 13,0%
em relao ao placebo (ANDERSON, 1999).
Com a dupla funo de substituir o trigo no desenvolvimento de alimentos
especiais e de veicular prbiticos, o psyllium j foi acrescentado a massas de panificao, tradicionalmente feitas com farinha de trigo, produzidas com
reduo da quantidade de farinha de trigo e adio de outras farinhas
adicionadas de psyllium, para melhorar caractersticas obtidas por meio da
reteno de gua e gelatinizao por Haque (1994).
Alm disso, a literatura descreve sua aplicao em sorvetes, produtos de
panificao (pes, bolos, biscoitos), gelias, macarro instantneo, cereais matinais, com a finalidade de aumentar o contedo de fibra do alimento, ou
tambm, de aumentar o volume do produto. Pode ser utilizado ainda como
aditivo - espessante - em alimentos para melhorar sua consistncia, deixando os produtos mais macios e para prevenir a separao de ingredientes
(esfarelamento) e conferir estabilidade aos produtos (URVESH, 2005).
A viscosidade do psyllium no afetada em temperaturas entre 20C e 50C, pH entre 2 e 10, e concentrao de NaCI de 0,15M. Estas propriedades,
alm do seu teor em fibras alimentares, tornam-no muito interessante para a
indstria alimentcia (URVESH, 2005) e muito til aos portadores de DC, uma vez que confere caractersticas funcionais semelhantes s do glten s preparaes.
42
4. MATERIAL E MTODOS
4.1. Tipo de pesquisaO presente estudo de carter exploratrio e quantitativo, subdividido em
cinco etapas: seleo e desenvolvimento das preparaes, anlise qumica,
anlise sensorial e anlise estatstica.
4.2. Seleo e desenvolvimento das preparaesForam selecionadas cinco formulaes de produtos, que contm glten e
de consumo freqente entre os celacos. As informaes sobre os alimentos
mais procurados pelo grupo foram obtidas por intermdio da Acelbra (FIGURA
1). Para a seleo das formulaes tambm foi considerada a possibilidade de substituir a farinha de trigo por ingredientes similares isentos de glten - de
acordo com informao especificada no rtulo dos produtos - e adicionados de psyllium.
As receitas escolhidas foram: po, pizza, biscoito, macarro e bolo. A
Tabela 6 apresenta o fluxograma das etapas dos processos de seleo e de
produo de preparaes modificadas para portadores de DC.
Tabela 6. Fluxograma das etapas dos processos de seleo e de produo de preparaes modificadas para portadores de DC.
IDENTIFICAO DAS PREPARAES MAIS SOLICITADAS POR PORTADORES DE DC
*SELEO DAS RECEITAS
EXECUO DAS PREPARAES sP
IDENTIFICAO DE MTODOS E DE INGREDIENTES MODIFICVEIS
*ELABORAO DAS PREPARAES MODIFICADAS (Ficha Tcnica de Preparao)
*COLETA DE AMOSTRAS E ARMAZENAMENTO (-18 C)
*ANLISE QUMICA
43
A execuo e a modificao das preparaes foi realizada no Laboratrio
de Tcnica Diettica do Departamento de Nutrio da Universidade de Braslia.
As receitas originais das preparaes foram obtidas em livros de receitas
convencionais. Posteriormente, estas receitas foram testadas, assim como foram
elaboradas as fichas tcnicas de preparao (FTP), de acordo com o modelo
proposto por Botelho e Camargo (2005).
A modificao das receitas originais foi realizada por meio da retirada de
ingredientes contendo glten e pela incluso de outras farinhas adicionadas de
psyllium. Em seguida tambm foram elaboradas as FTPs dessas receitas. Foram
utilizados na elaborao, como substitutos da farinha de trigo o creme de arroz,
a fcula de batata e o amido de milho, adicionados de psyllium. O psyllium usado
foi doado pela farmcia de manipulao MEDICARE, localizada em Braslia - DF.
A Tabela 7 mostra a relao de ingredientes e a respectiva proporo
utilizada para o desenvolvimento das receitas. Para elaborao de todas as
preparaes utilizou-se balana de preciso da marca Plenna, com capacidade
para at 2kg e graduao de 1g. Foram utilizados para as preparaes do bolo, do biscoito e do po, fornos eltricos da marca Layr (Crystal 1.75), com
temperatura mnima de 10C e mxima de 300C (graduao de 10C), com capacidade de at 46 litros.
Tabela 7. Relao e percentual de ingredientes nas preparaesPreparao original Preparao modificada
% Ingredientes % IngredientesPo 8,61 Ovo 5,26 Ovo
0,69 Acar 3,86 Acar10,76 leo 9,35 leo21,53 Leite morno 2 1 , 8 6 Leite morno0,69 Sal 0,44 Sal1,72 Fermento biolgico (p) 7,18 Creme de arroz
43,07 Farinha de trigo 12,85 Amido de milho12,93 Batata 17,46 Fcula de batata
18,21 Batata1,08 Fermento biolgico (p)1,19 psyllium1,08 manteiga
Biscoito 31,94 Margarina 13,16 Manteiga
44
8,960 ,0 1
43,2115,98
Acar refinado SalFarinha de trigo especial Goiabada
19.45 3,4313.45 2 0 , 0 2 13,73 4,00 0,14 0,03 12,59
AcarguaLeite condensado Creme de arroz Fcula de batata PsylliumEssncia de baunilha SalGelia de goiaba
Macarro 69,61 Farinha de trigo 24,39 Creme de arroz0,23 Sal 24,39 Fcula de batata23,20 Ovo 5,85 Psyllium6,96 Gema de ovo 1 2 , 2 0
33,17guaClara de ovo
Bolo 15,37 Ovo 17,13 Ovo5,12 Acar 9,79 Acar15,37 leo 10,49 leo20,50 Leite 17,49 Leite morno30,74 Farinha de trigo especial 0,47 Sal12,29 Achocolatado em p 12,59 Creme de arroz0,61 Fermento em p 9,91
7,691,751,391,289,440,58
P para pudim dechocolateFcula de batataChocolate em pFermento em pPsylliumCenouraEssncia de baunilha
Pizza 11,78 Ovo 11,73 Ovo1,69 Acar 2,39 Acar8,42 leo 3,59 leo15,63 Leite 16,76 Leite0,24 Sal 0,48 Sal60,13 Farinha de trigo especial 24,90 Creme de arroz
1 , 2 0 Fermento biolgico (p) 11,97 gua0,91 Pizza certa 28 20,58
1 ,2 05,500,90
Fcula de batata Fermento biolgico (p) Psyllium Pizza certa
O valor energtico total (VET) e o valor de nutrientes no foram
calculados por meio das FTPs, mas por anlise qumica das preparaes modificadas e originais.
28 Composto por amido de milho ou fcula de mandioca, levedura seca inativa, enzima hemicelulase, melhorador de farinha alfa-amilase. NO CONTM GLTEN.
45
4.3. Anlise qumica
Aps a preparao das amostras padro e modificada, pores de cada
produto foram transportadas ao Laboratrio de Anlise de Alimentos da
Faculdade de Agronomia e Medicina Veterinria da Universidade Braslia e
armazenadas sob congelamento (- 18C) para realizao das anlises qumicas.
Para determinar umidade, resduo mineral fixo, protena e lipdios foram
conduzidas anlises em duplicata. Os carboidratos totais (HCT) foram calculados
por diferena, subtraindo-se de 1 0 0 os valores encontrados para umidade,
protena, lipdios e resduo mineral fixo, conforme a frmula que segue. A anlise
da frao de fibra alimentar no foi realizada, por no se dispor de mtodo
adequado; seu teor foi inserido no valor de carboidratos (Ribeiro, 2003). Para o
clculo do VET foram utilizadas as mdias dos valores de gordura e de protena, em gramas, e os valores de carboidratos encontrados por meio do mtodo
referido anteriormente, multiplicados por 9, 4 e 4 respectivamente (fatores de Atwater), conforme Ribeiro (2003).
%carboidratos = 1 0 0 % - (%protenas + %lipdios + %cinzas + %umidade)
4.3.1. Materiais e equipamentos utilizados nas anlises qumicasNa Tabela 8 , est relacionado o material utilizado nas anlises qumicas
dos produtos originais e modificados.
Tabela 8. Materiais utilizados na anlise qumica dos produtos originais e modificados
Reagentes Vidrariass Hexano PA - (Vetec) v' cido brico (H3B03) s K2SO4; CUSO4; SeO; HCI 0,1 N; KCI 0,88% Soluo de NaOH 40%
s Pipeta de vidro 1 mL s Becker 50 mL s Tubos de ensaio com tampa
rosquevel s Pipetas Pasteur (INLAB,
s Indicador vermelho de metila s Indicador azul de metileno.
Brasil) s Buretas Tubos de ebulio
46
_________ Acessrios_________s Papel filtro n 1 (Whatmam
International Ltd, England)
s Pra de suco (Boeco, Germany)
s Cadinho
v' Cartucho
(reboilers)s Tubo de vidro com
capacidade volumtrica de 50ml; com tampa rosquevel e septo de teflon da Pyrex, USA
s Tubo de vidro com capacidade volumtrica de 2 ml; com tampa rosquevel e septo de alumnio da Supelco, USA
_______ Equipamentos_______s Balana analtica eletrnica
AEL-200 CG Libror(, Marca Instrumentos Cientficos CG Ltda, Capacidade 200g (Preciso 0,1 mg)
s Balana analtica (BOSCH - SAE 200)
s Evaporador AO-SYS(Organomation Associates Inc, USA)
s Dessecador de vidro (Pyrex, USA) contendo slica gel com indicador de umidade (Merck, Germany)
s Mufla marca EDG, modelo EDGCON3P
s Destilador de nitrognio marca TECNAL, modelo TE- 036/1
Aparelho para determinao de gordura (Soxhlet), marca TECNAL, modelo TE-044
4.3.2. UmidadeA determinao de umidade foi realizada de acordo com as Normas
Analticas do Instituto Adolfo Lutz (1985). Os cadinhos, utilizados para a anlise,
foram secados em estufa a 105C, por 1 hora, e colocados para resfriar em
dessecador de vidro (Pyrex, USA), por 45 minutos. Foram pesados em balana
analtica (BOSCH - SAE 200) dois cadinhos de porcelana para cada amostra,
analisadas em duplicata. Os pesos foram devidamente registrados.
47
Posteriormente, foram pesados 2g de cada amostra. Os cadinhos com as
amostras foram colocados na estufa (marca LUFERCO), a 105C, durante 4
horas. Os cadinhos com o material foram colocados para resfriar no dessecador
de vidro (Pyrex, USA) por 45 minutos, e pesados novamente. Esta operao foi
repetida por trs vezes ou at atingir um peso constante. A umidade foi obtida pela frmula:
% Umidade = 100-ff(Peso cadinho. + amostra seca 105C) - Peso cadinhol x 100}Peso da amostra
4.3.3. Resduo mineral fixoFoi utilizado o mtodo de incinerao (cinzas) temperatura de 550C,
conforme orienta a Association of Official Analytical Chemists (AOAC,1998). O mtodo consiste em secar os cadinhos que sero utilizados na anlise feita em duplicata e resfri-los em um dessecador de vidro (Pyrex, USA) por 45
minutos. Os cadinhos so pesados, com aproximadamente 2 g de cada amostra
e levados para a mufla a 550 C por 4 horas. Devem ser, ento, resfriados em dessecador de vidro e pesados, novamente.
A determinao de cinzas totais foi realizada por mtodo gravimtrico, baseado na perda de massa da amostra quando submetida ao aquecimento a
550C. A perda de massa corresponde ao teor de matria orgnica do produto,
pois completamente carbonizado a essa temperatura. A diferena entre a
massa padro da amostra e essa perda fornece a quantidade da frao de cinzas presente no produto.