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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES INSTITUTO “A VEZ DO MESTRE” PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” PRISÃO E LIBERDADE PROVISÓRIA À LUZ DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988 Por: DEOCLECIO FRANCISCO DE ASSIS FILHO Orientador Prof. Francis Razman Rio de Janeiro 2012

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  • UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

    INSTITUTO “A VEZ DO MESTRE”

    PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

    PRISÃO E LIBERDADE PROVISÓRIA À LUZ DA

    CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO

    BRASIL DE 1988

    Por: DEOCLECIO FRANCISCO DE ASSIS FILHO

    Orientador

    Prof. Francis Razman

    Rio de Janeiro

    2012

  • 2

    UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

    INSTITUTO “A VEZ DO MESTRE”

    PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

    PRISÃO E LIBERDADE PROVISÓRIA À LUZ DA

    CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO

    BRASIL DE 1988

    Apresentação de monografia a Universidade

    Candido Mendes - Instituto A Vez do Mestre como

    requisito parcial para obtenção do grau de

    Especialista em Direito Penal e Processo Penal.

    Por: Deoclecio Francisco de Assis Filho

  • 3

    AGRADECIMENTOS

    A Deus, por ter me dado o dom da vida e a

    oportunidade de me tornar uma pessoa

    melhor a cada dia;

    Aos meus pais pela criação, educação,

    carinho e bons exemplos;

    A minha família (mulher, filho, sogra, irmã,

    sobrinhos e meu cachorro) pelo amor

    incondicional e pela compreensão pelas

    horas roubadas, em nome do estudo e do

    trabalho;

    Aos amigos sinceros que dividiram

    conhecimento; e a todos que contribuíram

    com esse projeto, sem os quais teria sido

    impossível chegar ao fim.

  • 4

    DEDICATÓRIA

    Dedico esse trabalho aos meus alunos;

    agradecendo a Deus por me conceder o

    dom de poder ajudar a lapidar esses

    verdadeiros diamantes.

  • 5

    RESUMO

    No presente trabalho o autor verifica se o sistema de prisão e liberdade proposto

    pelo Código de Processo Penal está em consonância com a Constituição da

    República Federativa do Brasil de 1988. Para explicar o tema o autor faz uma

    análise sobre a evolução histórica da prisão. O autor também faz um estudo sobre

    a prisão provisória e liberdade provisória, e a partir daí, confronta o sistema de

    prisão e liberdade proposto pelo Código de Processo Penal, com a ordem

    constitucional vigente. No presente trabalho, se enfrentará ainda, a discussão

    sobre a natureza jurídica da prisão provisória, aduzindo se a mesma deve ser

    vista como execução provisória da pena ou medida cautelar subjetiva. O autor

    procura demonstrar que a prisão provisória, somente pode coexistir com a novel

    ordem constitucional, como medida cautelar, devendo ser aplicada observando

    princípios da necessidade, utilidade e proporcionalidade em sentido estrito,

    destacando que, como verdadeira medida cautelar, a prisão provisória não pode

    produzir consequências mais severas que o próprio resultado final do processo.

    Finalizando o trabalho, faz uma explanação da entrada em vigor da Lei nº

    12.403/2011, que criou outras medidas cautelares subjetivas, além da prisão

    preventiva, comprovou o que de há muito já se afirmava, que o encarceramento

    no curso do processo tenha caráter subsidiário e cautelar.

    PALAVRAS: CHAVE: Prisão Provisória. Liberdade Provisória. Medida Cautelar.

    Princípio da Proporcionalidade. Princípio da Inocência. Constitucionalidade.

  • 6

    METODOLOGIA

    O presente estudo foi elaborado a partir dos levantamentos bibliográficos

    colhidos através de pesquisa ampla, incluindo consulta a fontes diversas de

    produção intelectual, constantes de livros, compilações, legislações comentadas,

    artigos de periódicos, teses, pareceres, jornais, revistas, da rede internacional de

    dados – internet, enfim, todo e qualquer material disponibilizado para consulta na

    mídia (imprensa/virtual).

    Por demonstrar ser o mais adequado tipo de pesquisa para auferir os

    resultados almejados.

  • 8

    SUMÁRIO INTRODUÇÃO 9

    CAPÍTULO I – O SISTEMA DE PRISÃO PROVISÓRIA DO CPP E LEIS

    EXTRAVAGANTES À LUZ DA CRFB/88 12

    1.1 – Evolução Histórica da Prisão 12

    1.1. 1 – Idade Antiga 12

    1.1. 2 – Idade Média 13

    1.1. 3 – Idade Moderna 14

    1.2 – Conceito de Prisão 15

    1.3 – Espécie de Prisão 16

    CAPITULO II – DAS PRISÕES PROVISÓRIAS 18

    2.1 – Espécies de Prisão Provisória 23

    2.1. 1 – Prisão em Flagrante 23

    2.1. 2 – Prisão Temporária 25

    2.1. 3 – Prisão Preventiva 27

    2.2 – Natureza Jurídica da Prisão Provisória 33

    CAPÍTULO III – O SISTEMA DE LIBERDADE PROVISÓRIA DO CPP E LEIS

    EXTRAVAGANTES À LUZ DA CRFB/88 38

    3.1 – Evolução Histórica da Liberdade Provisória 38

    3.2 – Conceito de Liberdade Provisória 44

    3.3 – Espécie de Liberdade Provisória 45

    3.3. 1 – Liberdade Provisória sem Fiança 46

    3.3. 2 – Liberdade Provisória com Fiança 47

    3.4 – Natureza Jurídica da Liberdade Provisória 49

    CAPÍTULO IV – ALTERAÇÕES NO SISTEMA DE PRISÃO E LIBERDADE

    PROVISÓRIA DO CPP, TRAZIDAS PELA LEI Nº 12.403/2011 50

    CONCLUSÃO 57

    REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA 60

  • 9

    INTRODUÇÃO

    Inicialmente, faz-se pertinente trazer o conceito de Direito Penal.

    O Direito Penal é entendido como o setor do ordenamento jurídico que

    criminaliza condutas e impõe sanções para quem comete condutas antissociais.

    Cabendo mencionar inclusive que, o Direito Penal é um remédio sancionador

    extremo e que sua intervenção está condicionada a incapacidade dos demais

    mecanismos de controle social.

    Contudo, a escalada crescente da violência, a prática de crimes cada vez

    mais bárbaros faz com que a sociedade, inspirada pelo sensacionalismo da

    imprensa, clame por punições mais severas, com o aumento das penas privativas de

    liberdade e a criação de novos tipos penais.

    Desta forma, o Direito Penal é visto como a melhor das alternativas, para

    solução destes males, em total afronta aos princípios da ultima ratio;

    fragmentariedade e subsidiariedade.

    A sociedade é forçada a acreditar que, a onda de violência só será contida

    com a aplicação do Direito Penal.

    O legislador, atento a tudo isto, cria a todo instante, através de ações

    eleitoreiras, novos tipos penais, dando origem a leis incompatíveis com o sistema

    constitucional vigente, como por exemplo: a Lei de Crime Organizado, a Lei Anti-

    Drogas e o Estatuto do Desarmamento, dentre outras, às quais prevêem a vedação

    a liberdade provisória.

    As pesquisas demonstram que estas iniciativas têm se demonstrado inócuas

    para conter a violência, deixando evidente que recrudescer o tratamento ao infrator

    não o ressocializará, ao contrário, impossibilita o seu retorno ao convívio social,

    exterminando qualquer chance de recuperação.

    Dentre as sanções penais previstas, a pena privativa de liberdade se destaca

    pelo seu grande poder intimidatório e por sua força, segregando, alguns cidadãos

    comuns dos delinqüentes contumazes.

    Nesse sentido Luiz Flavio Gomes1:

    1GOMES, Luiz Flávio. Penas e medidas alternativas à prisão. São Paulo. Revista dos Tribunais, 1999, p. 30.

  • 10

    A prisão é um produto caro e reconhecidamente não

    ressocializa. Pelo contrário, dessocializa. Em razão da

    superpopulação, dos seus métodos e da sua própria natureza,

    é desumana e cruel; corta o vínculo com a comunidade, com a

    família, com o trabalho, com a educação, etc. Há séria dúvida,

    por tudo isso, sobre se cumpre ou não o seu papel de

    intimidação.

    A tendência mundial é justamente a edição de medidas despenalizadoras,

    as quais visam impedir a imposição da pena privativa de liberdade, evitando o

    encarceramento cautelar provisório ou a prisão imposta por condenação criminal

    definitiva, sendo esta substituída, por exemplo, por aplicação da transação penal ou

    concessão do sursis processual.

    A falência da pena de prisão é fator de difusão das medidas alternativas.

    Embora no Brasil tenhamos tido algumas importantes iniciativas, com o fito

    de evitar o cárcere, neste sentido, por exemplo a edição da Lei nº 9.099/95; Lei nº

    9.714/98 e Lei nº 12.403/2011; alguns legisladores insistem numa hipertrofia do

    estado de polícia, super repressor. Contudo, esquecem que desta maneira o país vai

    navegando na contramão dos países mais evoluídos.

    Desta feita não se pode continuar acreditando que, a privação da liberdade,

    a título de pena ou de prisão provisória, será a única e eficaz medida à disposição

    do Juiz Criminal capaz de conter a criminalidade desenfreada.

    Não se deve continuar entendendo que, aquele flagrado na prática de

    determinada infração penal, ou mesmo denunciado como autor de crime, deva

    responder ao processo, como se condenado fosse, como se certa fosse a sua

    condenação; numa verdadeira antecipação do juízo de culpabilidade.

    A partir da CRFB/88, sentimos necessidade de fazer uma releitura do

    Código de Processo Penal, uma vez que o referido diploma legal fora construído sob

    a égide da Constituição de 1937, outorgada e repressora, que não primava por

    direitos e garantias fundamentais.

    Sendo assim, reconhecendo que o investigado ou réu é sujeito de direitos,

    não podemos mais admitir a manutenção ou decretação da prisão provisória, por si

  • 11 só, sem analisar a necessidade, utilidade e proporcionalidade da aplicação da

    medida, sobretudo e principalmente, naqueles casos em que o resultado do

    processo for, em tese, menos gravoso, que a própria medida instrumental.

    Não podemos mais aceitar a prisão provisória como verdadeira execução

    antecipada da pena, só devendo a mesma ser decretada em casos de extrema

    necessidade, em caráter subsidiário em relação a outras medidas cautelares

    subjetivas menos gravosas, para garantir a produção da prova, ou ainda, o resultado

    final do processo.

  • 12

    CAPITULO I

    O SISTEMA DE PRISÃO PROVISÓRIA DO CPP E LEIS

    EXTRAVAGANTES À LUZ DA CRFB/88

    1.1 – Evolução Histórica da Prisão

    A prisão sempre foi considerada uma providência drástica, porém

    imprescindível.

    A história da prisão não é a de sua progressiva abolição, mas de sua

    reforma. A prisão é concebida modernamente como um mal necessário, mesmo

    sabendo que trará algumas conseqüências nefastas.

    Vejamos a evolução histórica desta providência judicial ou administrativa

    (prisão em flagrante), que relativiza o direito individual de liberdade.

    1.1. 1 – Idade Antiga

    A antiguidade desconheceu totalmente a privação da liberdade, estritamente

    considerada como sanção penal.

    Embora seja inegável que o encarceramento de delinquentes existiu desde os

    tempos mais remotos, o mesmo não possuía caráter de pena e se justificava em

    outras razões.

    Até fins do século XVIII a prisão serviu somente à contenção e guarda de réus

    para preservá-los fisicamente até o momento de serem julgados.

    Recorria-se, durante esse longo período histórico, fundamentalmente, à pena

    de morte, às penas corporais (mutilações e açoites) e as infamantes. Por isso, a

    prisão era uma espécie de ante-sala de suplícios, pois se usava a tortura,

    frequentemente para descobrir a verdade.

    A prisão sempre foi uma situação de grande perigo, um incentivo ao

    desamparo e, na verdade, uma antecipação da extinção física do indivíduo.

    A civilização helênica desconheceu a privação da liberdade como pena.

  • 13

    Platão, contudo propunha, no livro nono de “As Leis”, o estabelecimento de 3

    (três) tipos de prisões: uma na praça do mercado, que servia de custódia; outra,

    denominada sofonisterium, situada dentro da cidade, que servia de correção, e uma

    terceira destinada ao suplício que, com o fim de amedrontar, deveria constituir-se

    em lugar deserto e sombrio, o mais distante possível da cidade.

    Os romanos, segundo os historiadores, foram notáveis no Direito Civil, mas,

    primários no Direito Penal, pois só conheceram o encarceramento com fim de

    custódia.

    Na Grécia e em Roma existia a chamada prisão por dívidas, penalidade civil

    que se fazia efetiva até que o devedor saldasse, por si, ou por outro, a dívida.

    1.1. 2 – Idade Média

    Na idade média, até 1791, a lei criminal era o código da crueldade legal.

    Na realidade, a lei penal dos tempos medievais tinha como verdadeiro

    objetivo provocar o medo coletivo. Não importava a pessoa do réu; loucos,

    delinqüentes de toda ordem, mulheres, velhos e crianças esperavam, espremidos

    entre si, em horrendos encarceramentos subterrâneos, ou calabouços de palácios e

    fortalezas, o suplício e a morte.

    Durante todo o período da idade média, a idéia de pena privativa de liberdade

    não aparece. Há nesse período, um claro predomínio do direito germânico.

    A privação da liberdade continua a ter uma finalidade custodial aplicável

    àqueles que foram submetidos aos mais terríveis tormentos. O povo clamava por

    assistir a cenas bárbaras e sangrentas.

    O Direito Canônico contribuiu decisivamente para o surgimento da prisão

    moderna, especialmente no que se refere às primeiras idéias sobre a reforma do

    delinquente.

    Do vocábulo “penitência”, intimamente ligado com o Direito Canônico, derivam

    as palavras “penitenciário” e “penitenciária”.

  • 14

    1.1. 3 – Idade Moderna

    Na idade moderna, durante os séculos XVI e XVII, a pobreza se abate e se

    estende por toda a Europa. Contra os miseráveis que delinquiam, quase sempre

    para viver, experimentou-se todo tipo de reações penais, mais todas falharam.

    Na segunda metade do século XVI iniciou-se um movimento de grande

    contribuição ao desenvolvimento das penas privativas de liberdade, que foi a criação

    e construção de prisões organizadas para a correção dos apenados.

    A pedido de alguns integrantes do clero inglês, que se encontravam muito

    preocupados pelas proporções que havia alcançado a mendicidade em Londres, o

    rei lhes autorizou a utilização do castelo de Bridwell, para que nele se recolhessem

    os vagabundos, os ociosos, os ladrões e os autores de pequenos delitos.

    A finalidade da criação daquele modelo de prisão, consistia na reforma dos

    delinquentes por meio do trabalho e da disciplina. Ademais, as prisões tinham

    objetivos relacionados com a prevenção geral, já que pretendiam desestimular as

    outras pessoas da vadiagem e da ociosidade.

    Com essa experiência surgiram na Inglaterra Houses of Correction ou

    Bridwell.

    As prisões de Amsterdã, edificadas expressamente para fins de recuperação

    e correção, contando com um programa de reforma, alcançou um grande êxito e

    foram imitadas em muitos países europeus. Constituíam um fato excepcional.

    Foi necessário esperar mais de dois séculos para que as prisões fossem

    consideradas um lugar de correção e não de simples custódia do delinquente à

    espera de julgamento.

    Em meados do século XVII surge na Europa uma obra importante, sob o

    ponto de vista penitenciário, que deixaria idéias positivas, nesse campo, ainda que

    incipientes. Trata-se do famoso “Hospício de San Felipe Néri”, fundado em Florença

    (1667), pelo sacerdote Filippo Franci, que pôs em prática uma idéia de Hipólito

    Francini.

    As casas de correção deveriam se destinar à reforma de crianças que de

    certa forma delinquissem, embora mais tarde tenham sido admitidos jovens rebeldes

    e desencaminhados. Aplicava-se um regime celular, onde um interno não conhecia

  • 15 os outros, já que todos ficavam com um capuz cobrindo a cabeça quando todos se

    reuniam.

    Clemente XI trouxe importantes reformas ao sistema carcerário pregando

    que a pena privativa de liberdade poderia reabilitar e educar (1649-1721). As suas

    idéias foram postas em prática na “Casa de Correção de São Miguel” (em Roma),

    fundada em 14 de novembro de 1703.

    1.2 – Conceito de Prisão

    A palavra prisão vem do latim prehensio que significa prender, ou seja, ato

    de privar a liberdade pessoal. Assim, a prisão consiste na supressão da liberdade de

    locomoção, vez que ocorre a restrição ao direito de ir e vir do homem.

    A prisão é um dos institutos mais antigos empregados pelo Estado para

    exercer o seu jus puniendi em face daquele que cometeu um crime, retirando-o do

    convívio social.

    Como declaram Nestor Távora e Rosmar Rodrigues Alencar2: “A prisão é o

    cerceamento da liberdade de locomoção, é o encarceramento”.

    Para Edilson Mougenot Bonfim3 “O termo “prisão”, genericamente, designa

    a privação da liberdade do indivíduo, por motivo lícito ou por ordem legal, mediante

    clausura”.

    Finalizando a conceituação, André Luiz Nicolitt4, diz:

    A prisão, que significa tanto ato de prender como local de

    clausura, é signo da supressão da liberdade. (...)

    (...) Pretende-se com ela garantir o desenvolvimento regular da

    persecução e a eventual punição que possa vir, afastando-se

    riscos à instrução do processo, ou ainda, risco a eventual

    aplicação da lei penal.

    2TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar Rodrigues. Curso de direito processual. 7ª Ed. Bahia: Jus Podivm, 2012, p. 545. 3BONFIM, Edilson Mougenot. Reforma do código de processo penal: comentários à lei nº 12.403, de 4 de maio de 2011: prisão preventiva, medidas cautelares, liberdade provisória e fiança. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 57. 4NICOLITT, André Luiz. Manual de processo penal. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009, p. 416.

  • 16

    1.3 – Espécies de Prisão

    A prisão pode se dividir em dois segmentos, tendo o trânsito em julgado da

    sentença penal condenatória como divisor de águas, nos seguintes termos: prisão

    provisória e prisão pena.

    A prisão provisória tema do nosso estudo, subdivide-se em: prisão em

    flagrante, prisão temporária e preventiva, ocorrendo esta antes do trânsito em

    julgado da sentença penal condenatória e tem sua previsão no Código de Processo

    Penal e em Legislação Extravagante.

    Já a prisão pena prevista no Código Penal, Decreto-Lei nº 2.848/40, é

    tratada como sanção penal, vez que a cautela ocorre após o trânsito em julgado da

    sentença penal condenatória, quando a pena aplicada for privativa de liberdade,

    podendo variar os regimes de cumprimento de pena, que podem ser: reclusão,

    detenção e prisão simples.

    Fernando Capez5 ensina que:

    a) Prisão-pena ou prisão penal: é aquela que imposta em

    virtude de sentença condenatória transitada em julgado, ou

    seja, trata-se da privação da liberdade determinada com a

    finalidade de executar decisão judicial após o devido

    processo legal, na qual se determinou o cumprimento de

    pena privativa de liberdade. Não tem finalidade

    acautelatória, nem natureza processual. Trata-se de medida

    penal destinada à satisfação da pretensão executória do

    Estado.

    b) Prisão sem pena ou prisão processual: trata-se de prisão de

    natureza puramente processual, imposta com a finalidade

    cautelar, destinada a assegurar o bom desempenho da

    investigação criminal, do processo penal ou da futura

    execução da pena, ou ainda a impedir que, solto, o sujeito

    continue praticando delitos. É imposta apenas para garantir

    5CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. São Paulo. 19ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 301-302.

  • 17

    que o processo atinja o seu fim. Seu caráter é auxiliar e sua

    razão de ser é viabilizar a correta e eficaz persecução

    penal.

    Apesar das diferenças entre as prisões provisórias e a prisão pena, o

    recolhimento do autor do fato ao cárcere é algo em comum.

  • 18

    CAPITULO II

    DAS PRISÕES PROVISÓRIAS

    O Código de Processo Penal Brasileiro, Decreto-Lei nº 3.689/41, trata da

    prisão provisória dentre os Art. 282 à 318. Logo assim que foi editado, partiu-se da

    premissa, que a prisão em flagrante já era o bastante para provocar efeitos, em tese,

    de uma antecipação da responsabilidade penal, podendo a prisão ser mantida

    exclusivamente na força da situação flagrancial.

    Esta afirmação se comprova quando percebemos que o termo “provisória”,

    veio atrelado à expressão “liberdade”; e não à “prisão”.

    O CPPB contemplava, originariamente, as seguintes modalidades de prisão:

    a) prisão em flagrante;

    b) prisão temporária;

    c) prisão preventiva;

    d) prisão decorrente da sentença de pronúncia;

    e) prisão decorrente de sentença condenatória recorrível.

    As 3 (três) primeiras (prisão em flagrante, prisão temporária e a prisão

    preventiva) eram consideradas prisões cautelares e as outras (prisão decorrente da

    sentença de pronúncia e prisão decorrente de sentença condenatória recorrível)

    prisões processuais, ambas subespécies do gênero prisão provisória.

    Ressalte-se que, a citada classificação encontra-se superada, não havendo

    mais que se falar em prisões processuais; pois, toda e qualquer prisão, no curso do

    processo, somente pode coexistir com viés de cautelaridade; logo prisões

    cautelares.

    Podemos observar que, o Art. 282 do CPPB previa, originariamente, a prisão

    em decorrência da sentença de pronúncia (Art. 408, § 1º do CPPB); prisão em

    decorrência de sentença condenatória recorrível (Art. 594 do CPPB); bem como em

    qualquer outra situação prevista em lei; baseando-se, assim, num mero e escasso,

    juízo de probabilidade, alicerçado em indícios de autoria e materialidade.

  • 19

    Isso se deve ao fato, do CPPB ter suas bases inspiradas na Constituição de

    1937, também chamada de constituição polaca, outorgada, repressora, não

    democrática, sem participação popular, e que não contemplava direitos e garantias

    fundamentais.

    O referido diploma processual foi desenhado partindo do pressuposto que,

    aquele que fosse preso em flagrante, preso durante o inquérito policial ou processo,

    em razão de outra espécie de prisão, antes da sentença condenatória transitada em

    julgado, deveria ser visto e tratado como culpado, pois dificilmente seria absolvido,

    considerando certa a sua condenação.

    O diploma processual vigente foi projetado sem levar em consideração o

    chamado estado ou princípio da inocência, trazido à lume com a CRFB/88, Art. 5º,

    LVII; por este princípio o indiciado ou réu deve ser visto e tratado como sujeito.

    No entanto, em 1988 foi promulgada uma nova Constituição da República,

    com ares e anseios democráticos, trazendo uma enorme gama de direitos

    fundamentais, dentre eles o direito de liberdade.

    Além dos direitos fundamentais, a novel Constituição da República, trouxe

    mecanismos de defesa destes direitos, que são as garantias fundamentais, sem os

    quais aqueles seriam inócuos.

    O Art. 5º da CRFB/886 trouxe vários incisos que tratam do tema prisão e

    liberdade, senão vejamos alguns:

    Art. 5º. (...)

    (...)

    LXI - ninguém será preso senão em flagrante delito ou por

    ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária

    competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime

    propriamente militar, definidos em lei;

    (...)

    LXV - a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela

    autoridade judiciária;

    LXVI - ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a

    lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança; 6BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988. Disponível na internet: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm. Acesso em: 15 mar. 2012.

    http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm

  • 20

    (...)

    LXVIII - conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém

    sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em

    sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de

    poder;

    Numa rápida análise, já podemos reparar que, passou a existir uma

    incongruência, dentre tantas outras, diga-se de passagem, no que se refere ao tema

    ora em estudo, referente ao que vinha contido no Art. 282 do CPPB (antes da edição

    da Lei nº 12.403/2011) e o previsto no Art. 5º, LXI da CRFB/88.

    No Art. 282 do CPPB, antes da edição da Lei nº 12.403/2011, havia previsão

    de prisão, antes de sentença condenatória transitada em julgado, em casos em que

    houvesse previsão em lei; contrariando frontalmente o contido na CRFB/88, que

    prevê que a prisão, antes do trânsito em julgado de sentença condenatória, somente

    poderá ocorrer nos casos de flagrante delito ou ordem escrita e fundamentada da

    autoridade judiciária competente; ressalvando apenas os casos transgressões

    militares.

    A doutrina e a jurisprudência sempre criticaram o que vinha contido no Art.

    282 do CPPB, tendo em vista que, havia previsão de prisão, sem uma razão cautelar

    específica, resultando a prisão somente na lei.

    O Art. 282 do CPPB7 previa “À exceção do flagrante delito, a prisão não

    poderá efetuar-se senão em virtude de pronúncia ou nos caso determinados em lei,

    e mediante ordem escrita da autoridade competente” (grifo nosso).

    Percebe-se, desse modo, que o sistema de prisão e liberdade previsto no

    CPPB, originariamente, trazia muitas contradições com o sistema acusatório,

    adotado pela Constituição da República de 1988, havendo total falta de sintonia

    entre ambos; daí a necessidade de uma releitura do sistema de prisão e liberdade

    previsto no CPPB à luz da CRFB/88.

    É por essas e outras, que o CPPB vem sofrendo constantes alterações para

    correções de tais impropriedades, sobretudo na parte que trata da prisão e da

    liberdade provisória, dentre as quais destacamos a Lei nº 11.690/2008, que alterou o

    Art. 408, §§ 1º e 2º, não mais tratando de prisão como uma decorrência natural da

    7BRASIL. Código de processo penal – 11ª Ed. – São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 390.

  • 21 decisão de pronúncia; a Lei nº 11.719/2008, que revogou o Art. 594, e alterou o Art.

    387, parágrafo único, ambos do CPPB; e ainda a Lei nº 12.403/2011, que alterou

    completamente o sistema de prisão provisória, trazendo novas medidas cautelares

    subjetivas, alternativas à prisão preventiva; conforme veremos adiante.

    No presente trabalho o autor não pretende discorrer sobre todas as

    peculiaridades das modalidades de prisão provisória, visando não fugir ao debate.

    No entanto, vale tecer breves considerações, sobre algumas delas, uma vez

    que, a partir da edição das Leis nº 11.689/2008; 11.719/2008 e 11.423/11 houve

    algumas mudanças suscitadas pelo texto constitucional e já declamadas pela

    doutrina.

    As prisões provenientes da decisão de pronúncia e outras previstas em lei

    classificavam-se como sendo prisões processuais, onde o legislador levou em

    consideração algumas presunções como, por exemplo, a possibilidade de fuga do

    réu. Vários dispositivos legais mencionam a necessidade do réu ser recolhido à

    prisão, a fim de poder recorrer: Art. 2º, § 3º, da Lei nº 8.072/90; Art. 9º, da Lei nº

    9.034/95; Art. 3º, § 2º, da Lei nº 9.613/98 e Art. 59 da Lei nº 11.343/2006.

    Previsões estas não recepcionadas pela nova ordem constitucional vigente e

    que, portanto, já deviam de há muito ser banidas do cenário processual, o que ao

    final acabou acontecendo em 2008, com a promulgação das Leis nº 11.689/08 e

    11.719/08.

    Conforme as lições de André Luiz Nicolitt8:

    No processo penal brasileiro existem as seguintes prisões

    processuais: prisão em flagrante, prisão preventiva e prisão

    temporária. (...) A prisão em razão da pronúncia e a prisão

    decorrente da sentença penal condenatória recorrível,

    enquanto títulos autônomos de prisão processual, foram

    banidas pela reforma processual de 2008. Atualmente, na fase

    da pronuncia (§ 3º, art. 413, CPP), ou por ocasião da sentença

    (parágrafo único, art. 387, CPP), a prisão será regulada pelos

    mesmos critérios da prisão preventiva.

    8NICOLITT, André Luiz, op. cit. p. 420.

  • 22

    A Lei nº 11.689/2008 alterou a redação do Art. 408 do CPP, bem como todo

    o procedimento do Tribunal do Júri, acertando em cheio na então prisão

    decorrente da sentença de pronúncia que, a partir dali estava excluída do

    ordenamento.

    Antes da mudança legislativa, bastava a decisão de pronúncia, para que o

    réu restasse preso; exceto se o mesmo fosse primário e de bons antecedentes.

    Com as alterações provocadas pela edição da Lei nº 11.689/2008, o Art.

    413, § 3º do CPPB9 passou a prever que, o Juiz decidirá, motivadamente, sobre a

    necessidade da decretação da prisão (prisão preventiva) ou imposição de quaisquer

    outras medidas cautelares subjetivas diversas da prisão; nos seguintes termos:

    Art. 413 (...)

    (...)

    § 3º O Juiz decidirá, motivadamente, no caso de manutenção,

    revogação ou substituição da prisão ou medida restritiva de

    liberdade anteriormente decretada e, tratando-se de acusado

    solto, sobre a necessidade da decretação da prisão ou

    imposição de quaisquer das medidas previstas no Título IX do

    Livro I deste Código.

    Como salienta Paulo Rangel10:

    A reforma da Lei 11.689/08 não mais trata, e com acerto, a

    prisão como efeito da decisão de pronúncia. A prisão passa a

    ser decretada se houver necessidade e sempre, como já

    dizíamos, preventivamente. O juiz ao proferir a decisão de

    pronúncia verificando a necessidade de se decretar a prisão

    preventiva decide no corpo da pronúncia, tratando a prisão não

    como efeito da decisão de pronúncia, mas sim como prisão

    preventiva. (...)

    Sempre defendemos esse ponto de vista, qual seja, a prisão

    em decorrência da decisão de pronúncia “era letra morta da 9BRASIL. Código de processo penal – 11ª Ed. – São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 415. 10RANGEL, Paulo. Direito processual penal. 16ª Ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 730.

  • 23

    lei”. Agora, com a reforma, ela desaparece definitivamente, do

    texto legal.

    Outra grande alteração que sofreu o CPPB, foi com a edição da Lei nº

    11.719/2008 que, revogou expressamente o Art. 594 do CPP, e ainda alterou a

    redação do Art. 38711, sobretudo a do parágrafo único do mesmo artigo.

    Com a alteração, passou a não mais existir a prisão decorrente de sentença

    condenatória recorrível; passando o Juiz, no momento da sentença condenatória

    recorrível, a decidir, motivadamente, sobre a necessidade da decretação da prisão,

    desde que presentes os requisitos da prisão preventiva; nos seguintes termos:

    Art. 387. (...)

    (...)

    Parágrafo único. O juiz decidirá, fundamentadamente, sobre a

    manutenção ou, se for o caso, imposição de prisão preventiva

    ou de outra medida cautelar, sem prejuízo do conhecimento da

    apelação que vier a ser interposta.

    Paulo Rangel salienta ainda que12: “(...) prisão na sentença penal

    condenatória da qual ainda caiba recurso somente será imposta preventivamente, se

    estiverem presentes os motivos que a autorizam. Desaparece a chamada

    execução provisória da pena”.

    Concluímos então que, não podemos mais admitir a prisão provisória, sem

    bases cautelares.

    2.1 Espécies de Prisão Provisória

    2.1. 1 – Prisão em Flagrante

    A prisão em flagrante está prevista no CPP nos Art. 300 à 310, parágrafo

    único, também encontrando acolhida no texto constitucional no Art. 5º, LXI.

    11BRASIL. Decreto-lei nº 3.689, de 03 de outubro de 1941. Disponível na internet: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del3689.htm. Acesso em: 15 mar. 2012. 12RANGEL, Paulo, op. cit. p. 727.

    http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del3689.htm

  • 24

    O texto constitucional é claro ao mencionar o direito de liberdade como

    direito fundamental, somente podendo ser relativizado pela prisão em flagrante, ou

    qualquer outra modalidade prisional, desde que precedida de ordem judicial,

    emanada por Juiz competente.

    Do exposto, é forçoso reconhecer que a prisão em flagrante é um

    instrumento constitucional, uma vez previsto na CRFB/88, capaz de restringir a

    liberdade do indivíduo, sem que isso represente desrespeito aos direitos individuais,

    sobretudo o direto fundamental de liberdade.

    O termo flagrante, vem do latim “flagrare”, que significa quente, crepitar,

    queimar, em chamas, ardente, etc. Logo aquele que é surpreendido em flagrante,

    está praticando ou acaba de praticar a ação criminosa, como também aquele que é

    perseguido, logo após a prática da conduta criminosa, bem como aquele que é

    encontrado, logo depois com bens, papéis, instrumentos, armas, que façam

    presumir ser o autor do fato criminoso.

    A doutrina e a jurisprudência reconhecem algumas espécies de flagrante,

    tais como:

    a) flagrante facultativo;

    b) flagrante obrigatório;

    c) flagrante próprio ou real;

    d) flagrante impróprio ou quase-flagrante;

    e) flagrante presumido;

    f) flagrante retardado ou postergado;

    g) flagrante esperado;

    h) flagrante preparado;

    i) flagrante forjado.

    Não nos aprofundaremos em cada uma das espécies de flagrante, tendo em

    vista que, se assim o fizéssemos, fugiríamos do objetivo principal deste trabalho.

    O CPPB menciona que qualquer pessoa do povo pode prender em flagrante,

    face à gravidade e à urgência da situação que não poderia esperar por um

    provimento judicial. A autoridade policial e seus agentes deverão prender aqueles

    encontrados em flagrante delito.

  • 25

    O texto do código de processo penal explica que, naquelas infrações penais

    em que a consumação se protraia no tempo, segundo a vontade do agente, a prisão

    em flagrante pode ser perpetrada a qualquer tempo.

    O CPPB prevê também que, uma vez efetuada a prisão em flagrante, os

    autos deverão ser encaminhados ao Juízo competente, no prazo de 24 (vinte e

    quatro) horas; bem como que, no mesmo prazo deverá ser entregue ao preso a nota

    de culpa, onde deverá constar o motivo da prisão, o nome do condutor e o das

    testemunhas.

    A autoridade judicial, de posse da comunicação do flagrante, irá analisar a

    legalidade da medida podendo relaxá-la, imediatamente, caso conclua que a prisão

    foi ilegal; ou revogá-la, caso entenda que a prisão é legal, mas despida dos

    pressupostos das medidas cautelares e da prisão preventiva, concedendo assim,

    liberdade provisória, com ou sem fiança. Neste último caso, o juiz de direito,

    fundamenta a sua decisão, não pela gravidade do fato praticado, tampouco pelo

    direito de punir, mas em cima de bases cautelares, a fim de que a prisão possa ser

    considerada legal e constitucional.

    De se destacar que, aplicou-se o princípio da proporcionalidade quando da

    previsão de fiança para determinadas infrações penais, em virtude de suas penas

    muito baixas. Neste diapasão, trazemos à colação a previsão de fiança naqueles

    casos de crimes cuja pena máxima em abstrato não ultrapasse a 4 (quatro) anos,

    conforme prevê o Art. 322 do CPPB.

    2.1. 2 – Prisão Temporária

    A prisão temporária, outra modalidade de prisão provisória, somente pode

    ser decretada por juiz de direito, conforme previsão constitucional contida no Art. 5º,

    LXI, da CRFB/88.

    Diferentemente da prisão preventiva, somente pode ser decretada no curso

    do inquérito policial, quando: for imprescindível para as investigações; quando o

    indiciado não tiver residência fixa ou não fornecer elementos que possibilitem sua

    identificação; e ainda, houver fundadas razões de sua autoria ou participação, nos

  • 26 crimes previstos no Art. 1º, III, da Lei nº 7.960/89; não cabendo interpretação

    extensiva.

    A prisão temporária tem prazo certo de duração (fato este que não é próprio

    da prisão preventiva), de 5 (cinco) dias, podendo ser prorrogado por igual período,

    uma única vez, desde comprovada a extrema necessidade da medida, conforme o

    contido no Art. 2º, caput da Lei nº 7.960/89.

    No entanto, se o crime imputado ao indiciado for hediondo, assim definido na

    Lei nº 8.072/90, o prazo da prisão temporária será de 30 (trinta) dias, podendo ser

    prorrogado por igual período, uma única vez, em caso de comprovada e extrema

    necessidade.

    No que concerne aos legitimados para representar pela prisão temporária,

    somente o delegado de polícia e o membro do ministério público, podem fazê-la, não

    prevendo a Lei nº 7.960/89 a possibilidade de representação por parte do querelante

    e do assistente, bem como, também não permitindo que o juiz de direito a decrete

    de ofício; possibilidade esta que existe na prisão preventiva.

    Encerrado o prazo, o preso deve ser colocado em liberdade, imediatamente,

    independentemente, da emissão de alvará de soltura.

    Cumpre salientar ainda que, os presos a título de prisão temporária, bem

    como os demais presos provisórios, devem ficar separados dos demais detentos,

    que estão definitivamente condenados.

    Por fim, cabe destacar o posicionamento de alguns doutrinadores, como

    Paulo Rangel e André Luiz Nicolitt, que defendem que a prisão temporária é

    inconstitucional, seja por ter um vício formal de constitucionalidade por violação ao

    processo legislativo, seja por não se coadunar com o Estado Democrático de Direito

    a idéia de primeiro se prender para depois se investigar, o que viola o Princípio da

    Não Culpabilidade.

    Paulo Rangel13 assevera:

    A questão que nos parece interessante, de início, é que a

    referida prisão foi criada através de medida provisória nº 111,

    de 24 de novembro de 1989, ou seja, o Executivo, através de

    Medida Provisória, legislou sobre processo Penal e Direito

    13RANGEL, Paulo, op. cit. p. 734.

  • 27

    Penal, matérias que são da competência privativa da União (cf.

    art. 22, I, da CRFB) e, portanto, deveriam ser tratadas pelo

    Congresso Nacional, pois o art. 4º da lei de Prisão Temporária

    criou um tipo penal na Lei. Nº 4.898/65. Neste caso,

    entendemos que a lei traz um vício de iniciativa que não é

    sanado com a conversão da medida em lei. Há flagrante

    inconstitucionalidade por vício formal, qual seja: a iniciativa da

    matéria.

    (...)

    A prisão temporária é também inconstitucional por uma razão

    muito simples: no Estado Democrático de Direito não se pode

    permitir que o Estado lance mão da prisão para investigar, ou

    seja, primeiro prende, depois investiga para saber se o

    indiciado, efetivamente, é o autor do delito. Trata-se de medida

    de contrição da liberdade do suspeito que, não havendo

    elementos suficientes de usa conduta nos autos do inquérito

    policial, é preso para que esses elementos sejam encontrados.

    2.1. 3 – Prisão Preventiva

    Outra modalidade de prisão provisória é a prisão preventiva.

    De certo a mais gravosa das prisões provisórias, tendo em vista que não tem

    prazo fixo e pode perdurar até o término do processo.

    A prisão preventiva somente pode ser imposta mediante decisão judicial

    fundamentada, atendendo ao comando constitucional, previsto no Art. 5º, LXI da

    CRFB/88, desde que, presentes os requisitos contidos no Art. 312 do CPPB.

    Além dos requisitos do Art. 312 do CPPB, devem estar presentes os

    requisitos genéricos de qualquer medida cautelar, quais sejam: fumus boni iuris e o

    periculum in mora.

    Quanto a estes últimos, requisitos genéricos das medidas cautelares, a

    melhor doutrina e a jurisprudência mais abalizada, afirmam que estas duas

    expressões são mais consentâneas com o processo civil, devendo sofrer uma

    interpretação própria quando aplicadas no processo penal; desta forma, no âmbito

  • 28 do processo penal, melhor será falar em: fumus comissi delicti (fumaça da

    existência de um delito) e periculum libertatis (perigo na liberdade do acusado).

    Paulo Rangel14 cita o renomado Doutrinador Aury Lopes Júnior que destaca:

    (...) não só de características como as anteriormente

    mencionadas vive a medida cautelar, pois mister se faz,

    também, que preexistam dois requisitos, ou, como se diz: dois

    pressupostos. São eles: o periculum in mora (periculum in

    libertatis) e o fumus boni iuris (fumus comissi delicti) que,

    analisados por Aury Lopes Jr., em sua obra, chama de

    periculum in libertatis e fumus comissi delicti (Sistema de

    Investigação Preliminar no Processo Penal, Rio de Janeiro:

    Lumem Júris, 2001). Para o autor, mister se faz que haja um

    perigo na liberdade do réu a justificar sua prisão e não perigo

    na demora da prestação jurisdicional. Da mesma forma que a

    fumaça deve ser do cometimento do delito e não do bom

    direito, pois do bom direito pode ser para condenar ou absolver

    o acusado, ou ainda, para declarar extinta a punibilidade. (...)

    Nesse caso, devemos mostrar que há perigo social se o réu

    permanecer em liberdade, bem como para o curso do processo

    e, ainda, que há provas do cometimento do delito. A fumaça é

    da prática do crime e não do bom direito.

    Para ser decretada a prisão preventiva é necessário que haja indícios

    suficientes de autoria e materialidade razoável, que comprove, preliminarmente, o

    cometimento do crime, ou seja, que haja um suporte probatório mínimo, além de

    apresentar, pelo menos, um pressuposto, dentre aqueles contidos no Art. 312 do

    CPPB, quais sejam:

    - para garantia da ordem econômica;

    - para garantia da ordem pública;

    - por conveniência da instrução criminal;

    - para assegurar a aplicação da lei penal. 14RANGEL, Paulo. Apud. LOPES JR, Aury. Direito processual penal. 16ª Ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 681.

  • 29

    Cabe ressaltar que, atualmente para a decretação da prisão preventiva, não

    basta o preenchimento destes requisitos e de, pelo menos, um destes pressupostos,

    devendo ser observados também os novos requisitos trazidos à lume com a edição

    da Lei nº 12.403/2011, conforme veremos no capítulo próprio, mais a frente.

    Esta concepção é necessária nos dias atuais. Entretanto, nem sempre foi

    assim, pois logo que foi editado, o CPPB previa a decretação de prisão preventiva

    para casos, em que o crime imputado ao réu tivesse pena privativa de liberdade

    cominada igual ou superior a 8 (oito) anos; era a chamada prisão preventiva

    obrigatória. Ainda havia previsão, que o réu deveria ser mantido preso, mesmo

    sendo absolvido em primeira instância, naqueles casos em que o crime a ele

    imputado, tivesse a pena máxima prevista em abstrato, igual ou superior a 10 (dez)

    anos.

    Superada esta fase, o CPPB vem sofrendo ajustes, no sentido de adaptá-lo

    ao novo sistema processual adotado pela Constituição da República de 1988, qual

    seja o sistema acusatório, não mais se admitindo falar em prisão preventiva

    obrigatória.

    A prisão preventiva é considerada compatível com o princípio constitucional

    da inocência, desde que respeitados os princípios da cautelaridade processual:

    judicialidade; provisoriedade; instrumentalidade; necessidade, adequação e

    proporcionalidade em sentido estrito.

    Mesmo antes da edição da Lei nº 12.403/2011, que alterou sobremaneira o

    sistema de prisão e liberdade do CPPB, a prisão preventiva já era considerada um

    norte do sistema prisional brasileiro, haja vista que, doutrina e jurisprudência já

    entendiam que a prisão em flagrante e a extinta prisão decorrente da decisão de

    pronúncia, além da prisão decorrente de sentença condenatória recorrível, não

    poderiam persistir com identidade própria; mas somente poderiam ser decretadas ou

    mantidas, no caso específico da prisão em flagrante, se estivessem presentes os

    requisitos da prisão preventiva; donde se conclui que, uma vez decretadas não

    passavam de uma prisão preventiva.

    São percussores desse entendimento Nestor Távora e Rosmar Rodrigues

    Alencar15 que expõem:

    15TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar Rodrigues, op. cit. p. 602-603.

  • 30

    (...) já éramos partidários do entendimento que na pronúncia,

    só caberia o encarceramento daquele que se encontrava em

    liberdade, se estivessem presentes os requisitos que

    autorizariam a decretação da prisão preventiva. Caso contrário,

    a liberdade é de rigor. (...)

    Com o advento da Lei nº 11.689/08, os maus antecedentes e a

    reincidência como fundamento do cárcere cautelar foram

    expressamente revogados.

    Nestor Távora e Rosmar Rodrigues Alencar16 expõem ainda:

    Com o advento da Lei nº 11.719/08, o art. 594 do CPP que

    tratava da prisão decorrente de sentença condenatória

    recorrível foi revogado expressamente, de sorte que a matéria

    passa a ser disciplinada pelo parágrafo único do art. 387, CPP

    (...). O direito do acusado de recorrer em liberdade foi

    reafirmado com a edição da Lei nº 12.403/2011, que

    expressamente revogou o art. 595 do CPP (já desprovido de

    eficácia, conforme jurisprudência do STF), que dispunha que a

    apelação seria julgada deserta na hipótese de fuga do

    condenado após a interposição da apelação.

    O Supremo Tribunal Federal já havia se pronunciado neste sentido, adotando

    este entendimento. Vejamos a ementa do acórdão:

    "HABEAS CORPUS" - DENEGAÇÃO DE MEDIDA LIMINAR -

    PREJUDICIALIDADE DO "HABEAS CORPUS", EM VIRTUDE

    DE SUPERVENIENTE DECISÃO COLEGIADA DO SUPERIOR

    TRIBUNAL DE JUSTIÇA - INOCORRÊNCIA - ACÓRDÃO QUE

    NÃO ANALISOU O FUNDO DA CONTROVÉRSIA - SÚMULA

    16Ibidem, p. 604-605.

  • 31

    691/STF - SITUAÇÕES EXCEPCIONAIS QUE AFASTAM A

    RESTRIÇÃO SUMULAR - CONDENAÇÃO PENAL

    RECORRÍVEL - SUBSISTÊNCIA, MESMO ASSIM, DA

    PRESUNÇÃO CONSTITUCIONAL DE NÃO-CULPABILIDADE

    (CF, ART. 5º, LVII) - RÉU QUE PERMANECEU SOLTO

    DURANTE O PROCESSO - RECONHECIMENTO DO

    DIREITO DE RECORRER EM LIBERDADE - CONVENÇÃO

    AMERICANA SOBRE DIREITOS HUMANOS (ARTIGO 7º, Nº

    2) - DECRETABILIDADE DA PRISÃO CAUTELAR

    DECORRENTE DE SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA -

    POSSIBILIDADE, DESDE QUE SATISFEITOS OS

    REQUISITOS MENCIONADOS NO ART. 312 DO CPP -

    NECESSIDADE DA VERIFICAÇÃO CONCRETA, EM CADA

    CASO, DA IMPRESCINDIBILIDADE DA ADOÇÃO DESSA

    MEDIDA EXTRAORDINÁRIA - SITUAÇÃO EXCEPCIONAL

    NÃO VERIFICADA NA ESPÉCIE - CONSTRANGIMENTO

    ILEGAL CARACTERIZADO - "HABEAS CORPUS"

    CONCEDIDO "EX OFFICIO". DENEGAÇÃO DE MEDIDA

    LIMINAR - SÚMULA 691/STF - SITUAÇÕES EXCEPCIONAIS

    QUE AFASTAM A RESTRIÇÃO SUMULAR. - A jurisprudência

    do Supremo Tribunal Federal, sempre em caráter

    extraordinário, tem admitido o afastamento, "hic et nunc", da

    Súmula 691/STF, em hipóteses nas quais a decisão

    questionada divirja da jurisprudência predominante nesta Corte

    ou, então, veicule situações configuradoras de abuso de poder

    ou de manifesta ilegalidade. Precedentes. Hipótese ocorrente

    na espécie. PRISÃO CAUTELAR - CARÁTER EXCEPCIONAL.

    - A privação cautelar da liberdade individual reveste-se de

    caráter excepcional, somente devendo ser decretada em

    situações de absoluta necessidade. A prisão processual, para

    legitimar-se em face de nosso sistema jurídico, impõe - além da

    satisfação dos pressupostos a que se refere o art. 312 do CPP

    (prova da existência material do crime e indício suficiente de

  • 32

    autoria) - que se evidenciem, com fundamento em base

    empírica idônea, razões justificadoras da imprescindibilidade

    dessa extraordinária medida cautelar de privação da liberdade

    do indiciado ou do réu. - A questão da decretabilidade da

    prisão cautelar. Possibilidade excepcional, desde que

    satisfeitos os requisitos mencionados no art. 312 do CPP.

    Necessidade da verificação concreta, em cada caso, da

    imprescindibilidade da adoção dessa medida extraordinária.

    Doutrina. Precedentes. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO, NO

    CASO, DA NECESSIDADE CONCRETA DE DECRETAR-SE A

    PRISÃO CAUTELAR DO ACUSADO. - A denegação, ao

    sentenciado, do direito de recorrer em liberdade depende, para

    legitimar-se, da ocorrência concreta de qualquer das hipóteses

    referidas no art. 312 do CPP, a significar, portanto, que,

    inexistindo fundamento autorizador da privação meramente

    processual da liberdade do réu, esse ato de constrição reputar-

    se-á ilegal, porque destituído, em referido contexto, da

    necessária cautelaridade. Precedentes. - A prisão processual,

    de ordem meramente cautelar, ainda que fundada em

    sentença condenatória recorrível (cuja prolação não

    descaracteriza a presunção constitucional de não-

    culpabilidade), tem, como pressuposto legitimador, a

    existência de situação de real necessidade, apta a ensejar,

    ao Estado, quando efetivamente ocorrente, a adoção -

    sempre excepcional - dessa medida constritiva de caráter

    pessoal. Precedentes. - Se o réu responder ao processo em

    liberdade, a prisão contra ele decretada - embora fundada em

    condenação penal recorrível (o que lhe atribui índole

    eminentemente cautelar) - somente se justificará, se, motivada

    por fato posterior, este se ajustar, concretamente, a qualquer

    das hipóteses referidas no art. 312 do CPP. Situação

    inocorrente no caso em exame.

  • 33

    (Supremo Tribunal Federal – HC nº 92.967/AC, Relator Ministro

    Celso de Mello – 2ª Turma, Data do Julgamento 18/12/2007)

    (grifos nossos)

    Este entendimento doutrinário e jurisprudencial acabou sendo encampado

    pelo legislador, com a edição das Leis nº 11.689/2008; 11.719/2008 e 12.403/2011.

    Prosseguindo no estudo do tema, a prisão preventiva pode ser decretada no

    curso do inquérito policial, ou ainda, no curso do processo penal, desde que

    observados os requisitos genéricos inerentes às medidas cautelares, pelo menos um

    dos pressupostos dos contidos no Art. 312 do CPPB, observados os novos

    requisitos contidos no Art. 282, caput e §§ do CPPB, alterados pela Lei nº

    12.403/2011.

    São legitimados para requerer ou representar pela prisão preventiva, o

    delegado de polícia, o membro do ministério público, o querelante, podendo o juiz de

    direito decretá-la, de ofício, no curso da ação penal. A Lei nº 12.403/2011 inovou

    prevendo agora a possibilidade do assistente da acusação poder representar pela

    prisão preventiva.

    Dentre os pressupostos, há quem diga que a prisão preventiva não seria o

    instrumento hábil, por si só, para garantir a ordem pública e/ou a ordem econômica,

    fugindo-lhe nestas hipóteses, a natureza cautelar.

    Certo é que, não podemos mais admitir a prisão preventiva como

    antecipação de pena, perdurando infinitamente, até o trânsito em julgado, como

    melhor explicaremos no momento adequado.

    2.2 – Natureza Jurídica da Prisão Provisória

    Divergem os doutrinadores ao apontarem a Natureza Jurídica da Prisão

    Provisória, existindo duas grandes correntes doutrinárias, a saber: a primeira que vê

    a prisão provisória como execução antecipada da pena e a segunda que afirma que

    a prisão provisória somente pode coexistir com a Constituição da República de

    1988, como medida cautelar.

  • 34

    Porém, para a maioria dos doutrinadores, fica consignado que é uma medida

    cautelar. Neste sentido é o entendimento de Eugênio Pacelli, Edilson Mougenot

    Bonfim, Paulo Rangel, Fernando Capez que se passa a expor.

    Com maestria Eugênio Pacelli17 preleciona:

    assumiu-se a natureza cautelar de toda prisão antes do trânsito

    em julgado; junto a isso, ampliou-se o leque de alternativas

    para a proteção de regular tramitação do processo penal, com

    a instituição de diversas outras modalidades de medidas

    cautelares.

    Defendendo também este posicionamento Edilson Mougenot Bonfim18:

    Todas as prisões ocorridas antes do advento do trânsito em

    julgado da decisão penal condenatória, como visto, não têm

    natureza de pena, devendo ser dotadas de cautelaridade.

    As prisões cautelares têm por finalidade resguardar a

    sociedade ou o processo com a segregação do indivíduo. (...)

    Deve necessariamente a prisão provisória fundar-se em uma

    das cautelaridades acima apontadas, sob pena de ser

    considerada inconstitucional por afronta ao princípio da

    presunção de não culpabilidade (art. 5º, LVIII, da CF).

    Neste sentido traz colação de recente entendimento do Supremo Tribunal de

    Federal, na qual foi decidido que não é possível execução provisória da pena

    enquanto estiver pendente julgamento de recurso especial ou de recurso

    extraordinário, tendo em vista que prisão antes do trânsito em julgado da

    condenação a prisão somente poderá ser decretada a título cautelar.

    17PACELLI, Eugênio. op. cit. p. 488. 18BONFIM, Edilson Mougenot, op. cit. p. 58.

  • 35

    HABEAS CORPUS. INCONSTITUCIONALIDADE DA

    CHAMADA “EXECUÇÃO ANTECIPADA DA PENA”. ART. 5º,

    LVII, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. DIGNIDADE DA

    PESSOA HUMANA. ART. 1º, III, DA CONSTITUIÇÃO DO

    BRASIL.

    (...)

    3. A prisão antes do trânsito em julgado da condenação

    somente pode ser decretada a título cautelar.

    4. A ampla defesa, não se a pode visualizar de modo restrito.

    Engloba todas as fases processuais, inclusive as recursais de

    natureza extraordinária. Por isso a execução da sentença

    após o julgamento do recurso de apelação significa,

    também, restrição do direito de defesa, caracterizando

    desequilíbrio entre a pretensão estatal de aplicar a pena e

    o direito, do acusado, de elidir essa pretensão.

    5. Prisão temporária, restrição dos efeitos da interposição de

    recursos em matéria penal e punição exemplar, sem qualquer

    contemplação, nos “crimes hediondos” exprimem muito bem o

    sentimento que EVANDRO LINS sintetizou na seguinte

    assertiva: “Na realidade, quem está desejando punir demais,

    no fundo, no fundo, está querendo fazer o mal, se equipara um

    pouco ao próprio delinqüente”.

    6. A antecipação da execução penal, ademais de

    incompatível com o texto da Constituição, apenas poderia

    ser justificada em nome da conveniência dos magistrados ---

    não do processo penal. (...)

    8. Nas democracias mesmo os criminosos são sujeitos de

    direitos. Não perdem essa qualidade, para se

    transformarem em objetos processuais. São pessoas,

    inseridas entre aquelas beneficiadas pela afirmação

    constitucional da sua dignidade (art. 1º, III, da Constituição

    do Brasil). É inadmissível a sua exclusão social, sem que

    sejam consideradas, em quaisquer circunstâncias, as

  • 36

    singularidades de cada infração penal, o que somente se

    pode apurar plenamente quando transitada em julgado a

    condenação de cada qual.

    Ordem concedida.

    (Supremo Tribunal Federal – HC nº 84.078/MG, Relator

    Ministro Luiz Fux – Plenário, Data do Julgamento 26/02/2010)

    (grifo nosso)

    Com a promulgação da Constituição da República de 1988, houve previsão

    de várias direitos fundamentais ligados ao direito de liberdade, dentre todos

    destacamos a presunção de inocência e a necessidade de ordem fundamentada da

    autoridade judiciária competente para prisões provisórias à exceção da prisão em

    flagrante.

    Sendo assim, a privação da liberdade de um inocente, com exceção da

    prisão em flagrante, somente pode ser decretada por Juiz competente, ou seja, por

    Juiz de Direito, com a sua competência previamente fixada (Juiz Natural ou Juiz

    Constitucionalmente Competente).

    Mais ainda, que a fundamentação seja construída sob os argumentos da

    cautelaridade, ou seja, que a prisão seja decretada e fundamentada para acautelar

    interesses da justiça.

    Desta forma, toda prisão anterior ao trânsito em julgado de sentença penal

    condenatória deve ser considerada, além de provisória, como cautelar.

    Eugênio Pacelli19 ressalta que a possibilidade de execução provisória da

    pena foi suprimida do ordenamento jurídico, tendo em vista que, uma vez

    executada a prisão, nada poderá ser feito em relação ao tempo em que o

    indivíduo permaneceu encarcerado de forma provisória:

    Nesse passo, a Lei nº 12.403/11 parece ter afastado

    definitivamente a possibilidade de execução provisória da

    condenação, conforme se vê do caput do art. 283, a exigir, ou

    19PACELLI, Eugênio, op. cit. p. 598.

  • 37

    ordem escrita e fundamentada para a imposição da prisão, ou

    sentença condenatória com trânsito em julgado.

    Quando afirmamos a necessidade de ordem escrita e fundamentada da

    autoridade judiciária competente, entendemos que estas exigências não se aplicam

    à prisão em flagrante, em razão da urgência da intervenção prisional, o que não

    impede que após a sua conclusão, com a lavratura do auto de prisão em flagrante e

    demais providências legais necessárias, todo o procedimento seja submetido ao

    Judiciário, que deverá fundamentar a manutenção de prisão ou relaxar,

    imediatamente, a prisão que entender ilegal.

    A reserva de jurisdição se deve ao fato de vivermos num Estado

    Democrático de Direito, onde a tutela dos direitos e garantias individuais cabe ao

    poder judiciário.

    Embora não haja previsão no código de processo penal brasileiro é cediço

    que, em se tratando de prisões cautelares, devem ser adotados e respeitados os

    contornos de proporcionalidade, quando de sua decretação ou manutenção.

    Como a prisão em flagrante é uma medida cautelar, uma vez que se dá

    antes da sentença penal condenatória transitada em julgado, não se pode descurar

    da visualização do resultado prático do processo, que constitui a sua razão de ser.

    A prisão cautelar só é legítima quando funciona como instrumento para

    garantia da eficiência da persecução penal, de forma que não podemos aceitar que

    sua consecução pudesse produzir conseqüências mais drásticas e mais fortes do

    que aquelas alcançadas na sentença penal.

    Por todos os argumentos expostos alhures, não podemos mais aceitar como

    válido o preceito sumular nº 716 do STF, uma vez que admitia progressão de regime

    de pena, antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória, ou seja, o

    STF entendia que a prisão provisória tinha natureza de execução provisória da pena;

    pensamento este já superado.

  • 38

    CAPÍTULO III

    O SISTEMA DE LIBERDADE PROVISÓRIA DO CPP E LEIS

    EXTRAVAGANTES À LUZ DA CRFB/88

    3.1 – Evolução Histórica da Liberdade Provisória

    O instituto da Liberdade Provisória teve sua origem com os romanos a partir

    da Lei da XII Tábuas.

    No entanto, foi em 1603, no século XIV, nas Ordenações Filipinas, que o

    nosso ordenamento processual, passou a conceder a liberdade provisória, pois

    nesta época, a regra era a privação de liberdade antes do trânsito em julgado da

    decisão judicial, com o fito de garantir a apresentação do detido ao julgamento.

    As modalidades existentes de liberdade provisória eram: o seguro; a

    homenagem; a caução por fiéis carcereiros e a fiança. Sendo a concessão da

    liberdade provisória uma faculdade do Poder Público.

    Na Legislação Imperial, na vigência da Constituição 1824, mais

    precisamente em 1832, com a edição do Código de Processo Criminal, a liberdade

    provisória ficou restrita a uma única modalidade, qual seja, a mediante o pagamento

    da fiança, sendo todas as demais modalidades excluídas.

    O CPPB, Decreto-Lei nº 3.689, que foi elaborado em 1941 e entrou em vigor

    em 1942, traduzia os ideais de uma constituição anti-democrática que coexistia num

    mundo fascista, enxergando o indiciado como mero objeto de investigação.

    O CPPB em sua exposição de motivos20 diz que em se tratando de crime ao

    qual seja cominada pena de reclusão por tempo, no máximo, igual ou superior a 10

    (dez) anos, a decretação da prisão preventiva será obrigatória, nos seguintes

    termos:

    A prisão em flagrante e a prisão preventiva

    VIII – (...)

    20BRASIL. Exposição de motivos do código de processo penal – 11ª Ed. – São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 345-346.

  • 39

    A prisão preventiva, por sua vez, desprende-se dos limites

    estreitos até agora traçados à sua admissibilidade.

    Pressuposta a existência de suficientes indícios para

    imputação da autoria do crime, a prisão preventiva poderá ser

    decretada toda vez que o reclame o interesse da ordem

    pública, ou da instrução criminal, ou da efetiva aplicação da lei

    penal. Tratando-se de crime a que seja cominada pena de

    reclusão por tempo, no máximo, igual ou superior a 10 (dez)

    anos, a decretação da prisão preventiva será obrigatória,

    dispensando outro requisito além da prova indiciária contra o

    acusado. (...)

    A decretação da prisão era concedida apenas pela gravidade da sanção

    prevista em abstrato, fazendo, nitidamente, um juízo de antecipação de

    culpabilidade do indivíduo que fosse preso em flagrante. Por isso que alguns

    doutrinadores aduzem que a prisão cautelar era obrigatória e a liberdade, provisória.

    Aury Lopes Jr.21 relata:

    (...) Era uma época em que a prisão ao longo do processo era

    uma regra, havendo, inclusive, a prisão “preventiva” obrigatória

    quando o crime tivesse pena de reclusão, no máximo, igual ou

    superior a 10 anos. Nada interessava ou se questionava, a

    prisão “cautelar” era obrigatória.

    Daí por que a liberdade era provisória, precária.

    A liberdade provisória era uma exceção, e somente seria concedida

    mediante o pagamento de fiança. Deste modo, com maestria Pacelli 22 declama:

    21LOPES JR., Aury. O novo regime jurídico da prisão processual, liberdade provisória e medidas cautelares diversas. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p.149. 22LOPES JR., Aury. Apud. PACELLI, Eugênio de Oliveira. O novo regime jurídico da prisão processual, liberdade provisória e medidas cautelares diversas. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p.152.

  • 40 “Evidencia-se que a Liberdade provisória se estrutura diretamente sobre as bases da

    prisão em flagrante”.

    No entanto, nem sempre foi assim, uma vez que, com a edição da Lei nº

    6.416/77 (a chamada Lei Fleury), foi acrescentado ao CPPB o parágrafo único do

    Art. 310, o qual previa que o Juiz poderia conceder liberdade provisória ao

    capturando se não estivessem presentes, nenhum dos motivos ensejadores da

    prisão preventiva.

    A criação do mencionado parágrafo, em muito desestruturou a sistemática

    da lei processual e esvaziou a fiança, já que passou a prever liberdade provisória

    sem fiança, mediante termo de compromisso. Bem como a Lei nº 9.099/95, vez que

    em seu Art. 69, parágrafo único, prevê que não se imporá prisão em flagrante, nem

    se exigirá fiança, nos crimes de menor potencial ofensivo, em que o autor do fato

    assumir o compromisso de comparecer ao Juizado Especial Criminal.

    De acordo com André Luiz Nicolitt23:

    (...) a liberdade provisória com fiança perdeu sua importância,

    vez que o art. 310, parágrafo único, do CPP veio possibilitá-la

    em qualquer caso em que não se verificarem os requisitos dos

    art. 311 e 312 que cuidam da prisão preventiva: não havendo

    risco para o processo, ou inexistindo probabilidade do direito de

    punir, impende a liberdade provisória independentemente de

    fiança.

    Paulo Rangel24 elucida: “A Liberdade é provisória porque, se o réu

    descumprir a obrigação de comparecer a todos os atos do processo, ela será

    revogada. Portanto, o réu fica livre, mas preso ao processo”.

    Eugênio Pacelli25 aduz:

    Note-se, então, que a fiança havia perdido toda a sua utilidade

    desde a Lei nº 6.416/77, que passou a autorizar a restituição de

    23NICOLITT, André Luiz, op. cit. p. 420. 24RANGEL, Paulo, op. cit. p. 748. 25PACELLI, Eugênio, op. cit. p. 582.

  • 41

    liberdade mediante o comparecimento a todos os atos do

    processo, desde que ausentes as razões da prisão preventiva.

    Em contraposição ao Código Antidemocrático, em 1998 foi promulgada a

    Constituição da República, totalmente democrática, ampliativa e que passou a tratar

    o indiciado/réu como sujeito de direitos.

    Na Constituição da República de 1988 em seu Art. 5º, LXI, a liberdade

    passou a ser tratada como direito fundamental, somente podendo ser

    excepcionalizada, nas hipóteses em que o próprio texto constitucional previu, ou

    seja, através de prisão em flagrante ou outra prisão provisória decretada por

    autoridade judiciária competente. Assim, nos termos da CRFB/88, a Liberdade

    passou a ser a regra e a prisão a exceção, ficando o sistema de prisão e liberdade

    do CPPB em total dissonância com a Carta Magna.

    Ante tamanho desencontro, enquanto não se edita um novo CPPB

    harmônico com a Constituição da República, passou a ser necessário uma nova

    leitura do já ultrapassado Código de Processo Penal Brasileiro.

    Entretanto, após a promulgação da CRFB/88, em total afronta ao Estado

    Democrático de Direito, num verdadeiro retrocesso social, os legisladores passaram

    a editar várias leis infraconstitucionais que restringiu a liberdade provisória ao

    pagamento da fiança (Lei nº 8.035/90, que – acrescentou o Art. 325, parágrafo 2º ao

    CPP, que faz menção às Leis nº 1.521/51 e 8.137/90) ou a sua própria vedação (Art.

    2º, II da Lei nº 8.072/90; Art. 7º da Lei nº 9.034/95; Art. 3º da Lei nº 9.613/98; Art. 21

    da Lei nº 10.826/2003 e Art. 44 da Lei nº 11.343/2006), além de criar tipos penais

    inafiançáveis (Art. 31 da Lei nº 7.492/86 e Art. 14, parágrafo único e 15, parágrafo

    único da Lei nº 10.826/2003).

    Apesar do texto constitucional, no Art. 5º, LXVI, prever a possibilidade de

    liberdade provisória com ou sem fiança; como também a inafiançabilidade de certos

    crimes, conforme o contido no Art. 5º, XLII, XLIII e XLIV, percebe-se uma nítida

    contradição, uma vez que a nova ordem constitucional, elegeu um sistema

    garantista, que neste particular alçou a liberdade provisória como direito fundamental

    do indivíduo considerado inocente. Até porque, vedar a possibilidade de fiança para

    determinados crimes, não significa inviabilizar a liberdade provisória.

  • 42

    Tal afirmação pode ser comprovada com a transcrição da ementa da

    decisão recente do Supremo Tribunal Federal, na apreciação da ADI nº 3112-126, no

    qual declarou inconstitucional o Art. 21 da Lei nº 10.826/2003 que vedava a

    Liberdade Provisória, além de decidir que está vedada a prisão provisória ex lege ou

    também conhecida como prisão provisória obrigatória. Aliado a isto declarou que, as

    prisões provisórias têm natureza cautelar, mencionando inclusive que deve ser

    respeitado outro pressuposto que é a necessidade cautelar da prisão. Conclusão:

    caem por terra todo comando legislativo quanto à vedação da concessão da

    liberdade provisória, com ou sem fiança existentes em diversas Leis Extravagantes:

    AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI

    10.826/2003. ESTATUTO DO DESARMAMENTO.

    INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL AFASTADA.

    INVASÃO DA COMPETÊNCIA RESIDUAL DOS ESTADOS.

    INOCORRÊNCIA. DIREITO DE PROPRIEDADE.

    INTROMISSÃO DO ESTADO NA ESFERA PRIVADA

    DESCARACTERIZADA. PREDOMINÂNCIA DO INTERESSE

    PÚBLICO RECONHECIDA. OBRIGAÇÃO DE RENOVAÇÃO

    PERIÓDICA DO REGISTRO DAS ARMAS DE FOGO.

    DIREITO DE PROPRIEDADE, ATO JURÍDICO PERFEITO E

    DIREITO ADQUIRIDO ALEGADAMENTE VIOLADOS.

    ASSERTIVA IMPROCEDENTE. LESÃO AOS PRINCÍPIOS

    CONSTITUCIONAIS DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA E DO

    DEVIDO PROCESSO LEGAL. AFRONTA TAMBÉM AO

    PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE. ARGUMENTOS NÃO

    ACOLHIDOS. FIXAÇÃO DE IDADE MÍNIMA PARA A

    AQUISIÇÃO DE ARMA DE FOGO. POSSIBILIDADE.

    REALIZAÇÃO DE REFERENDO. INCOMPETÊNCIA DO

    CONGRESSO NACIONAL. PREJUDICIALIDADE. AÇÃO

    JULGADA PARCIALMENTE PROCEDENTE QUANTO À

    PROIBIÇÃO DO ESTABELECIMENTO DE FIANÇA E

    LIBERDADE PROVISÓRIA. 26Supremo Tribunal Federal - ADI nº 3112-1/DF, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, Plenário, Data do Julgamento 10/05/2007.

  • 43

    (...)

    IV – A proibição de estabelecimento de fiança para os

    delitos de “porte ilegal de arma de fogo de uso permitido”

    e de “disparo de arma de fogo”, mostra-se desarrazoada,

    porquanto são crimes de mera conduta, que não se

    equiparam aos crimes que acarretam lesão ou ameaça de

    lesão à vida ou à propriedade.

    V - Insusceptibilidade de liberdade provisória quanto aos delitos

    elencados nos arts. 16, 17 e 18. Inconstitucionalidade

    reconhecida, visto que o texto magno não autoriza a prisão

    ex lege, em face dos princípios da presunção de inocência

    e da obrigatoriedade de fundamentação dos mandados de

    prisão pela autoridade judiciária competente.

    (...)

    IX - Ação julgada procedente, em parte, para declarar a

    inconstitucionalidade dos parágrafos únicos dos artigos 14 e 15

    e do artigo 21 da Lei 10.826, de 22 de dezembro de 2003.

    (Supremo Tribunal Federal - ADI nº 3112-1/UF, Relator Ministro

    Ricardo Lewandowski, Plenário, Data do Julgamento

    10/05/2007) (grifo nosso)

    Segundo a suprema corte brasileira, a Lei nº 10.826/2003, quando vedou

    expressamente a possibilidade de liberdade provisória, no Art. 21, criou a

    possibilidade de prisão ex lege, automática, sem a necessidade de fundamentação,

    quando é sabido por todos que o texto constitucional exige fundamentação para a

    decretação da prisão cautelar, aliado que a medida seja decretada por Juiz de

    Direito.

    Da mesma forma, o legislador, através da Lei nº 11.464/2007, aplicou o

    entendimento da citada ADI e revogou a vedação a Liberdade Provisória previsto na

    Lei nº 8.072/90 para os crimes hediondos e equiparados.

    Cabe inclusive mencionar que, o entendimento jurisprudencial já vinha

    apontando que, nos casos de prisão em flagrante, recebida a comunicação do

  • 44 flagrante no Juízo competente, deveria ser concedida liberdade provisória ao réu,

    caso não estivessem presentes os requisitos da prisão preventiva.

    No tocante as outras legislações em que não ocorreu a revogação tácita,

    entendemos que, não haverá outra alternativa, senão estender os efeitos desta

    declaração de inconstitucionalidade a outros dispositivos legais que fizeram as

    mesmas vedações, quais sejam: Art. 7º da Lei nº 9.034/95; Art. 3º da Lei nº

    9.613/98; Art. 44 da Lei nº 11.343/2006 e Art. 325, parágrafo 5º (que faz menção às

    Leis nº 1.521/51 e 8.137/90, respectivamente).

    Toda essa discussão perdeu o foco com o surgimento da Lei nº 12.403/2011

    que prevê a liberdade provisória com ou sem fiança.

    Aury Lopes Jr.27 informa que: “Com o advento da Lei nº 12.403/2011,

    estabeleceu-se um sistema cautelar polimorfo, com diferentes instrumentos e

    possibilidades jurídicas do tratamento do regime de liberdade provisória”.

    A partir de então o juiz de direito não ficará mais diante de dois extremos; de

    manter o réu preso ou em liberdade; muitas das vezes preferindo, na dúvida, pela

    opção mais gravosa para mesmo; a Lei nº 12.403/11, como se verá mais adiante,

    trouxe várias medidas cautelares subjetivas, menos gravosas que a prisão

    provisória, que somente poderá ser levada a efeito, em último caso.

    3.2 Conceito de Liberdade Provisória

    A liberdade provisória é o instituto que permite que o indiciado/réu, em

    determinadas situações, aguarde em liberdade o julgamento do processo, sendo

    vinculado ou não ao cumprimento de certas obrigações que lhe são impostas,

    impedindo assim o sacrifício do cárcere.

    A liberdade é provisória, pois, a qualquer tempo, caso haja o

    descumprimento das obrigações impostas ou ocorrendo certas hipóteses previstas

    em lei, como por exemplo, a presenças dos requisitos da prisão cautelar, a liberdade

    poderá ser revogada e o indiciado/réu, ser recolhido à prisão.

    André Luiz Nicolitt 28 conceitua:

    27LOPES JR., Aury, op. cit. p. 153. 28NICOLITT, André Luiz, op. cit. p. 436.

  • 45

    A liberdade provisória e um instituto através do qual o indiciado

    preso em flagrante regular tem a possibilidade de aguardar em

    liberdade o seu julgamento. Trata-se assim de um instrumento

    do princípio da presunção de inocência, do qual se extrai que

    ninguém será tratado como se culpado fosse antes do trânsito

    em julgado da sentença penal condenatória.

    Como elucidam Nestor Távora e Rosmar Rodrigues Alencar29:

    A Liberdade Provisória é um estado de liberdade, circunscrito

    em condições e reservas, que impede ou substitui a prisão

    cautelar, atual ou iminente. É uma forma de resistência, uma

    contracautela, para garantir a liberdade ou a sua manutenção,

    ilidindo o estabelecimento de algumas prisões cautelares.

    Para Tourinho30 Liberdade Provisória é uma: “(...) medida intermediária entre

    a prisão provisória e a liberdade completa. É uma situação em que o réu ou

    indiciado não fica preso nem desfruta de plena liberdade”.

    Cabe inclusive mencionar que, apesar do parágrafo único do Art. 310, trazer

    a expressão “poderá”, não se trata de uma faculdade e sim de um dever legal da

    autoridade policial ou judicial, conceder a liberdade provisória, caso estejam

    presentes os seus requisitos, vez que a liberdade é um direito subjetivo

    constitucional.

    3.3 Espécies de Liberdade Provisória

    29TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar Rodrigues, op. cit. p. 642. 30BONFIM, Edilson Mougenot. Apud. TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Reforma do código de processo penal: comentários à lei nº 12.403, de 4 de maio de 2011: prisão preventiva, medidas cautelares, liberdade provisória e fiança. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 93.

  • 46

    A doutrina costumava dividir a liberdade provisória em 3 (três) espécies,

    quais sejam: liberdade provisória obrigatória; liberdade provisória permitida e

    liberdade provisória proibida ou vedada.

    A liberdade provisória obrigatória constitui-se em direito incondicional do

    acusado nos casos de livrar-se solto. Há ainda doutrinadores que citam as hipóteses

    do parágrafo único do Art. 69 da Lei nº 9.099/95 e do Art. 301 da Lei nº 9.503/97,

    como sendo de direito incondicional, quando, respectivamente, o acusado assumir o

    compromisso de comparecer ao Juizado Especial Criminal e se o condutor do

    veículo prestar pronto e integral socorro a vítima.

    A liberdade provisória permitida é aquela em que a lei admite a sua

    concessão quando não estiverem presentes os requisitos de decretação da prisão

    preventiva e ainda quando não houver vedação expressa a sua concessão.

    A liberdade provisória proibida ou vedada é aquela em que a lei

    estabelece expressamente sua proibição e também quando estiverem presentes os

    requisitos que autorização a decretação da prisão preventiva. Entretanto, se faz

    necessário ressaltar que o Supremo Tribunal Federal31 já se manifestou acerca da

    vedação da liberdade provisória e decidiu que num Estado Democrático de Direito e

    diante dos princípios da presunção de inocência e da obrigatoriedade de

    fundamentação dos mandados de prisão pela autoridade judicial, é inconcebível

    prisão provisória ex lege.

    Contudo, tal classificação de acordo com a melhor doutrina está defasada,

    pois de acordo com o texto constitucional e com o CPP, se extrai que a liberdade

    provisória pode ser concedida com ou sem arbitramento da fiança, sendo esta a

    melhor classificação e a qual iremos adotar.

    3.3.1 – Liberdade Provisória Sem Fiança

    A liberdade provisória sem fiança poderá ser vinculada ou não vinculada, o

    que vai diferenciar uma da outra é a imposição do cumprimento de algumas

    obrigações para que seja mantida sua concessão.

    31 Supremo Tribunal Federal - ADI nº 3112-1/DF, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, Plenário, Data do Julgamento 10/05/2007.

  • 47

    A liberdade provisória sem fiança vinculada é aquela em que o acusado tem

    uma condição para ser cumprida para ser mantida a sua liberdade. A liberdade está

    vinculada ao cumprimento de uma obrigação imposta, que pode ser a obrigação de

    comparecer a todos os atos do processo, conforme previsto no parágrafo único do

    Art. 310 do CPP e no parágrafo único do Art. 69 da Lei nº 9.099/95 ou de se

    submeter às medidas cautelares previstas no art. 319 do CPP.

    Já a liberdade provisória sem fiança e sem vinculação é aquela em que o

    acusado não precisa se submeter a nenhuma obrigação para fazer jus à liberdade.

    Tal concessão é realizada nos casos em que a lei traz a expressão livrar-se solto.

    Paulo Rangel32 chega inclusive a relatar que tal modalidade “Trata-se de

    uma liberdade definitiva e não provisória, como quer a doutrina. O legislador cria

    uma presunção de não-periculosidade do réu”.

    Cabe inclusive mencionar que, com a chegada da Lei nº 12.403/2011,

    Nestor Távora e Rosmar Rodrigues Alencar33 defendem o entendimento que a

    liberdade provisória sem fiança e sem vinculação deixou de existir:

    necessário frisar que não há mais no CPP para metro para

    definir quais as infrações que possibilitam ao agente “livrar-se

    solto”, pelo que a liberdade provisória obrigatória, imposta à

    autoridade policial em prol do autuado em flagrante, deixou de

    existir. (...)

    No entanto, o legislador não cuidou de suprimir a expressão

    livrar-se solto de outros dispositivo do CPP. Pensamos, no

    entanto, que os artigos que trazem em seu texto essa

    expressão estão desprovidos de eficácia.

    3.3.2 Liberdade Provisória Com Fiança

    A liberdade provisória com fiança será sempre vinculada, pois caso não haja

    o pagamento da fiança, que é uma caução e será imposta obrigatoriamente, a 32RANGEL, Paulo, op. cit. p. 752. 33TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar Rodrigues, op. cit. p. 644.

  • 48 liberdade não será concedida. Cabe ainda mencionar que, além da fiança, o juiz

    poderá impor outras cautelares que entender necessário.

    Tal modalidade de liberdade provisória estava sem aplicação. Entretanto,

    com o surgimento da Lei nº 12.403/2011 esse contexto se modificou e a fiança

    passou a ter um campo maio de atuação, pois além de ser aplicada no momento da

    concessão da liberdade provisória, passou a ter aplicação como espécie de medida

    cautelar diversa da prisão nos termos do Art. 319, VIII, do CPP.

    Quanto à fiança cabe ainda mencionar que, quando aplicada no momento

    da concessão da liberdade provisória, o legislador não indicou expressamente quais

    os crimes serão afiançados. Assim, portanto, em tese, todos os crimes serão

    afiançáveis, com exceção daqueles em que a lei prevê sua vedação expressa;

    quando estiverem presentes os requisitos da decretação da prisão preventiva; ou

    ainda quando houver impedimento à sua concessão nos termos dos Art. 323 e 324

    do CPP.

    Ressalta-se também esclarecer que, não é porque um crime é inafiançável,

    que o acusado irá ficar preso. Ao se dizer que um crime é inafiançável, o legislador

    vedou a concessão da fiança, mas não vedou a concessão da liberdade provisória

    sem fiança. Portanto, nesses casos, poderá o juiz conceder a liberdade provisória

    sem fiança. Contudo, essa liberdade será vinculada, com imposição de uma ou mais

    medidas cautelares.

    Aury Lopes Jr.34 elucida que:

    Diante de um flagrante por crime inafiançável, não estando

    presente o periculum libertatis da prisão preventiva ou, ao

    menos, não em nível suficiente para exigir a prisão preventiva,

    poderá o juiz conceder a liberdade provisória sem fiança, mas

    com medidas cautelares alternativas com suficiência para

    tutelar a situação fática de perigo.

    Ainda que na se imponha fiança, por ser inafiançável, poderá o

    juiz lançar mão do monitoramento eletrônico e da proibição de

    ausentar-se da comarca ou país, por exemplo.

    34LOPES JR., Aury, op. cit. p. 156-157.

  • 49

    O que não se pode tolerar é simplesmente alguém ser preso

    por ser o crime inafiançável.

    3.4 Natureza Jurídica da Liberdade Provisória

    No tocante a natureza jurídica da Liberdade provisória os doutrinadores

    eram uníssonos em dizer que se tratava de uma medida de contracautela que,

    visava assegurar a liberdade do acusado. Entretanto, com a edição da Lei nº

    12.403/2011 já há doutrinador se manifestando que se trata de uma medida

    cautelar.

    Aury Lopes Jr.35 assegura que: “a liberdade provisória é uma medida

    alternativa, de caráter substitutivo em relação à prisão preventiva, que fica

    efetivamente reservada para os casos graves, em que sua necessidade estaria

    legitimada”.

    Paulo Rangel36 defende que a Liberdade Provisória é: “uma contracautela,

    pois a cautela é a prisão; a liberdade provisória é a sua contraposição. O

    antecedente lógico da liberdade provisória é a prisão cautelar”.

    Edilson Mougenot Bonfim37 enfatiza que:

    a liberdade provisória deve ser entendida como uma verdadeira

    medida “contracautelar” alternativa à decretação da prisão

    preventiva, justamente visando impedir que o acusado, preso

    em flagrante, tenha sua detenção convertida em prisão

    preventiva.

    Eugênio Pacelli38 atribui que a Liberdade Provisória: “Ao fim e ao cabo,

    cuida-se