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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” INSTITUTO A VEZ DO MESTRE ÉTICA NO SERVIÇO PÚBLICO Por: Anderson Braga de Oliveira Orientador Prof. William Rocha Rio de Janeiro 2010

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

ÉTICA NO SERVIÇO PÚBLICO

Por: Anderson Braga de Oliveira

Orientador

Prof. William Rocha

Rio de Janeiro

2010

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

ÉTICA NO SERVIÇO PÚBLICO

Apresentação de monografia à Universidade

Candido Mendes como requisito parcial para

obtenção do grau de especialista em Direito Público

e Tributário

Por: Anderson Braga de Oliveira

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus em primeiro lugar,

por ter mantido a chama da fé acesa

em mim ao longo dessa jornada;

agradeço também à minha família que

me apoiou nessa empreitada,

resignando-se muitas vezes das

minhas ausências; e agradeço, enfim, a

Patricia, minha esposa, pelo dia-a-dia

de amor, compreensão, dedicação e

apoio incondicional.

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho às três mulheres

da minha vida: minha mãe, Wilma, que

me deu o alicerce; minha mulher,

Patricia, que me tem dado o amor; e a

minha filha, Beatriz, que com seu

sorriso e espontaneidade de criança

me faz continuar acreditando na vida.

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RESUMO

O presente estudo tem como objetivo investigar a questão da Ética no

Serviço Público, definindo o sentido de Ética, sua relação com o Direito, bem

como demonstrar como este momento em que se experimenta a retomada de

valores éticos e sua reinserção no ordenamento jurídico pode ser benéfica para

o Direito e a sociedade. Em seguida o estudo passa a examinar a noção de

Serviço Público, delimitando suas bases conceituais, classificação, evolução

histórica, previsão constitucional e disciplina legal. Por fim, busca-se apresentar

a síntese do trabalho através da demonstração de como é possível aferir a

questão ética no Serviço Público valendo-se do instrumental jurídico disponível,

isto é, analisando os meios de que dispõe a Administração Pública para

controlar e regular a conduta ética dos servidores públicos no exercício de suas

funções, seja pela observância dos princípios da moralidade, probidade

administrativa e eficiência, seja pelo controle judicial, ou pelo controle

administrativo representado pela sindicância ou pelo processo administrativo

disciplinar em que o servidor é chamado a se defender, seja, por último, pelo

controle político-legislativo a cargo dos Tribunais de Contas.

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METODOLOGIA

Para realização do presente trabalho monográfico foi utilizada pesquisa

bibliográfica, com amplo estudo e consulta à doutrina administrativista, como

também a autores constitucionalistas e filósofos do Direito.

Além da pesquisa bibliográfica lançou-se mão à consulta de Revistas

especializadas, bem como ao sítio da Presidência da República, para consulta

à legislação federal pertinente.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 08

CAPÍTULO I

ÉTICA E DIREITO 09

CAPÍTULO II

SERVIÇO PÚBLICO 23

CAPÍTULO III

ÉTICA NO SERVIÇO PÚBLICO 41

CONCLUSÃO 60

BIBLIOGRAFIA 62

ÍNDICE 64

FOLHA DE AVALIAÇÃO 66

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho terá por objetivo abordar a questão da ética no

serviço público, investigando-se os elementos que compõem essa relação.

O primeiro capítulo será dedicado ao estudo da Ética e do Direito.

Buscar-se-á delinear o sentido jusfilosófico de Ética; em seguida será realizada

uma análise em que se pretende demonstrar a influência da Ética e de seu

objeto de estudo, a Moral, na ciência do Direito, e, por fim, expor-se-á a

influência da filosofia de Kant e a retomada de valores éticos no Direito a partir

da segunda metade do século XX.

No segundo capítulo cuidar-se-á da noção de Serviço Público, sua

origem, seu desenvolvimento e o tratamento jurídico adotado no Brasil para o

tema.

O terceiro capítulo será dedicado ao exame da conduta ética do

servidor no exercício de suas atribuições no Serviço Público, abordando-se o

teor e a aplicação dos princípios da moralidade, da probidade administrativa e

da eficiência, bem como os meios de controle existentes para tal exame.

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CAPÍTULO I

ÉTICA E DIREITO

1.1 – Ética: conceito

Quando se pensa na palavra ‘ética’ logo a associa-se com outra, a

‘moral’. Ética vem do grego ethos e moral vem do latim mos ou mores. Há

quem não faça uma distinção etimológica entre os vocábulos ética e moral,

significando ambos o conjunto de princípios, normas e regras de conduta a

serem seguidos pelos homens, ou seja, de forma sintética, aquilo que se

conhece como costumes. No entanto, a mera origem semântica é insuficiente

para alcançar-se o real sentido dos termos em questão. Historicamente, ética e

moral foram ganhando contornos distintos, não se podendo confundir

atualmente seus significados. Cabe, nesse sentido, precisar um conceito para

Ética, o qual seria “a ciência do comportamento moral dos homens em

sociedade.”1

1.2 – Ética: objeto e definição

O estudo científico-filosófico da Ética passou a definir como seu objeto

a moral, sendo esta um dos aspectos do comportamento humano que se

constitui de atos conscientes e voluntários dos indivíduos que afetam outros

indivíduos, grupos sociais ou a sociedade em seu conjunto. Melhor dizendo, ‘o

objeto da ética é a moralidade positiva, ou seja, “o conjunto de regras de

1 VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez. Ética. 15ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1995, p. 12. Para o autor, Ética seria a teoria ou ciência do comportamento moral dos homens em sociedade, apud NALINI, José Renato. Ética geral e profissional. 6ª ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 28 (grifos no original).

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10comportamento e formas de vida através das quais tende o homem a realizar o

valor do bem”’2

Logo, acerca da definição de moral, tem-se que é um “conjunto de

regras de conduta, inerente ao espírito humano, aplicáveis de modo absoluto

para qualquer tempo ou lugar, ou a grupo ou pessoa determinada, proveniente

dos estudos filosóficos; ou ainda, conjunto de regras e princípios de decência

que orientam a conduta dos indivíduos de um grupo social ou sociedade (moral

burguesa, moral cristã); ou o conjunto dos valores morais de cada um; ou um

estado de espírito ou de ânimo; ou, em referência às regras de conduta e aos

costumes aceitos em determinada sociedade (dever moral, valores morais), ou

que é conforme às regras dos bons costumes, da ética”.3

Depurando-se a definição da palavra Ética, verifica-se que ethos

significa não apenas costume, mas também morada ou lugar onde se habita, e

ainda modo de ser ou caráter. “Esse ‘modo de ser’ é a aquisição de

características resultantes da nossa forma de vida. A reiteração de certos

hábitos nos faz virtuosos ou viciados”.4 Assim sendo, “o ethos é o caráter

impresso na alma por hábito”.5

Considerando-se que a ética é uma ciência, a ciência dos costumes, e

a moral não deve ser interpretada como tal, mas como objeto de investigação

da ética, verifica-se que, enquanto ciência “a ética procura extrair dos fatos

morais os princípios gerais a eles aplicáveis.”6 “Enquanto conhecimento

2 MÁYNEZ, Eduardo García. Ética – Ética empírica. Ética de bens. Ética formal. Ética valorativa. 18ª ed. México: Porrúa, 1970, p. 12, apud NALINI, José Renato. Op. cit., p. 29 (grifos no original). 3 MORAL. In: DICIONÁRIO contemporâneo da língua portuguesa Caldas Aulete (Aulete Digital). AULETE, Francisco Júlio de Caldas; VALENTE, António Lopes dos Santos. Edição brasileira original: Hamílcar de Garcia. Disponível em: <http://www.auletedigital.com.br/>. Acesso em: 04 jul. 2010 (grifos no original). 4 NALINI, José Renato. Op. cit., p. 29. 5 CORTINA, Adela. Ética aplicada y democracia radical. 2ª ed. Madrid: Tecnos, 1997, p. 162, apud NALINI, José Renato. Op. cit., p. 29 (grifo no original). 6 NALINI, José Renato. Op. cit., p. 29.

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11científico, a ética deve aspirar à racionalidade e objetividade mais completas e,

ao mesmo tempo, deve proporcionar conhecimentos sistemáticos, metódicos e,

no limite do possível, comprováveis.”7

Mas como se deu o desenvolvimento teórico acerca da ciência da ética

de forma que esta prevaleceu sobre a moral? Se pela etimologia dos termos

não temos como nos socorrer, como então iremos nos orientar?:

“A distinção mais compreensível entre ambas seria a de que ética reveste conteúdo mais teórico do que a moral. Pretende-se a ética mais direcionada a uma reflexão sobre os fundamentos do que a moral, de sentido mais pragmático. O que designaria a ética seria não apenas uma moral, conjunto de regras próprias de uma cultura, mas uma verdadeira ‘metamoral’, uma doutrina situada além da moral. Daí a primazia da ética sobre a moral: a ética é desconstrutora e fundadora, enunciadora de princípios ou de fundamentos últimos.”8

Por derradeiro, pode-se inferir que a ética “é uma disciplina normativa,

não por criar normas, mas por descobri-las e elucidá-las. Seu conteúdo

mostra às pessoas os valores e princípios que devem nortear sua existência.”9

De forma que “A Ética aprimora e desenvolve o sentido moral do

comportamento e influencia a conduta humana.”10

1.3 – Ética e Direito

Ética e Direito são ciências afins e indissociáveis, senão vejamos:

dissemos que Ética é a ciência do comportamento moral dos homens em

sociedade. Já o Direito tem como principal função ordenar a vida social. Para

Paulo Nader, o Direito é, em sua dimensão positiva, “o conjunto de normas de

7 CORTINA, Adela. Op. cit., p. 162, apud NALINI, José Renato. Op. cit., p. 29. 8 NALINI, José Renato. Op. cit., p. 29-30. 9 HARTMANN, Nicolai. Ethik. 2ª ed. Berlin, p. 34, apud MÁYNEZ, Eduardo García. Op. cit., p. 15, apud NALINI, José Renato. Op. cit., p. 30 (grifos no original). 10 HARTMANN, Nicolai. Op. cit., p. 34, apud MÁYNEZ, Eduardo García. Op. cit., p. 15, apud NALINI, José Renato. Op. cit., p. 30.

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12conduta social, imposto pelo Estado, para a realização da segurança, segundo

os princípios de justiça.”11 Assim, pode-se inferir que, “dentre todas as formas

de comportamento humano, a jurídica é a que guarda maior intimidade com a

moral.”12 Isto porque, como a moral tem como fundamento o próprio

comportamento social, e a ética, uma reflexão sobre ele, o papel do Direito no

ordenamento da vida social deverá observar os limites da ética e da moral,

respeitando o campo de atuação delimitado pela Ética, pois, como esclarece

Miguel Reale, o Direito está contido na Ética e é sua garantia:

“Donde pode dizer-se que a Ética é a realização da liberdade, e que o Direito, momento essencial do processo ético, representa a sua garantia específica, tal como vem sendo modelado através das idades, em seu destino próprio de compor em harmonia, liberdade, normatividade e poder.”13

No mesmo passo, seguindo a lição de mestre Reale e considerando-se

a ética mais abrangente do que o direito, tem-se em relação à moral, que é o

objeto da ética, a conhecida figura dos círculos concêntricos, donde o Direito é

o círculo menor, concêntrico a um círculo de diâmetro maior, representado pela

moral. De modo que, toda infração jurídica seria também infração moral, posto

que, para se atingir a faixa destinada ao direito, antes se percorreria o espaço

reservado à moral.

Alguns elementos característicos aproximam direito e moral, sem

prejuízo de outros, como por exemplo: a) direito e moral disciplinam, por meio

de normas, a relação entre os homens. Portanto, impõem conduta obrigatória a

seus destinatários; b) tais normas, tanto as jurídicas quanto as morais, se

apresentam de forma imperativa, não sendo mera recomendação (não se

olvidando, por certo, que a imperatividade das normas morais não acarretam

sanções a seus infratores, exceto aquelas de foro íntimo, ao nível da própria

11 NADER, Paulo. Filosofia do direito. 14ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 44 (grifos no original). 12 NALINI, José Renato. Op. cit., p. 124. 13 REALE, Miguel. Filosofia do direito. 19ª ed. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 219, apud ALMEIDA, Guilherme Assis; CHRISTMANN, Marta Ochsenhofer. Ética e direito: uma perspectiva integrada. São Paulo: Atlas, 2002, p. 15.

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13consciência); c) direito e moral são preordenados à garantia da coesão social,

atendendo à mesma necessidade social.

Ademais dessas considerações, há que se ter em conta que tanto

moral quanto direito modificam-se no momento em que se altera historicamente

o conteúdo de sua função social, dado que são formas históricas de

comportamento humano.

Diferença fundamental entre a vida jurídica e a vida moral são seus

campos de aplicação e observância. Enquanto a vida moral é interior, isto é, do

foro íntimo da consciência individual, a vida jurídica é exterior, onde a

observância da norma jurídica independe da consciência, de forma que mesmo

sem se convencer do acerto ou não da norma jurídica, sem aderir intimamente

a seu conteúdo, o agente deverá cumpri-la, donde observa-se a máxima

insculpida no art. 3º da Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro, que

declara: “Ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece”.

Dito de outra forma, têm-se as palavras de García Máynez, para quem “a

legalidade de um proceder consiste na mera adequação externa do ato à regra;

sua moralidade, na concordância interna”.14

Destarte, a prática do ato moral exige reflexão, discernimento de quem

o pratica, onde é necessário um juízo ético, mínimo que seja, de modo que o

agente opte por uma ou outra conduta, para que assim seja considerado tal ato

com atributo de moral. Já o ato jurídico, ao contrário, pode ser praticado

inconscientemente e não perderá esse atributo.

Levando-se em conta a lição kantiana15, aquele que cumpre um

preceito moral, consubstanciado, por exemplo, por um determinado ato frente a

14 MÁYNEZ, Eduardo García. Op. cit., p. 166, apud NALINI, José Renato. Op. cit., p. 124. 15 Relativo ao filósofo alemão Immanuel Kant (1724-1804).

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14uma pessoa ou a um grupo de pessoas, mas não acredita sinceramente em tal

preceito moral, tendo praticado o ato sem a força da intenção e da convicção

quanto a seus efeitos, estará praticando um ato que não é moralmente bom,

haja vista que sem acreditar em tal preceito, o agente não estará movido por

reta intenção.

Distinta é a concepção quando se considera o ato perante o direito, de

modo que para tal é irrelevante tal lucubração. Para o direito basta que se

cumpra o preceito, sem se especular do reflexo que possa atingir na

consciência do agente.

Aspecto relevante para o direito e a moral é o relacionado à coação.

Esta é interna quando diz respeito à moral e externa no que tange ao direito.

Vale dizer, o descumprimento da regra moral pode provocar uma reação da

consciência do agente, isto é, algo como o remorso ou arrependimento,

chegando até a causar alguma oposição do grupo, como que causando uma

reprovação social. Já a violação da regra jurídica irá resultar em conseqüências

exteriores, como se denota, por exemplo, da prisão na esfera criminal ou a

repercussão patrimonial na área cível. Por este raciocínio, conforme a lição de

José Renato Nalini, temos que “existe uma sanção concreta em relação à

norma jurídica e uma sanção virtual no que concerne à norma moral.”16

Importa também identificar: o que surgiu primeiro, o direito ou a moral?

Afirma-se, sem margem de dúvida, que a moral antecedeu ao direito. A moral

existe interiorizada no homem desde remotas eras, quando se formaram os

primeiros agrupamentos tribais. O sentimento definidor da moral é aquele que

nasceu na consciência dos homens desde o início das formas gregárias mais

arcaicas ou primitivas, procurando definir e distinguir o certo e o errado, sendo

gravado a pouco e pouco na memória dos povos e servindo à própria

16 NALINI, José Renato. Op. cit., p. 125 (grifos no original).

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15sobrevivência destes, uma vez que por meio de uma formação de certos

códigos morais passados de geração em geração foi possível ao homem

sobreviver a si mesmo e ao meio hostil em que vivia.

Por outro lado, o direito é resultado de um aprimoramento muito

posterior na evolução da espécie humana, se comparado com a moral.

Inclusive, como vem-se estudando, a moral é uma das bases do direito. O

aperfeiçoamento do direito ao longo dos séculos deve parte de sua aplicação

ao desenvolvimento da moral. Foi a partir da introjeção da moral e do

sentimento de justiça na consciência humana que o direito encontrou terreno

fértil para florescer.

De modo que, considerada a existência anterior da moral e sua

imbricação com o direito, denota-se que a regra moral é direito latente,

podendo vir a ser norma jurídica ou não. Ao revés, a norma jurídica que cai em

desuso pode continuar impregnada de sentido moral, voltando a seu campo

restrito e íntimo de observância, a consciência do homem.

A evolução do direito, melhor dizendo, do direito positivo, passa pelo

surgimento e pela evolução do Estado. O direito, enquanto produto do

monopólio estatal, representa uma uniformidade de regras e preceitos a serem

observados por uma dada coletividade, assim definida como campo de

aplicação desse direito posto pelo Estado. Por este raciocínio, conclui-se que,

se o direito positivado tende a uniformizar, pelo emprego do monopólio da força

atribuído ao Estado, as normas que compõem o ordenamento jurídico, as

convicções pessoais de foro íntimo, que demarcam o campo de incidência da

moral, estão livres para se manifestarem, formando o que se pode designar

como a existência de diversas morais, desde que estas não confrontem no

campo prático de observância e aplicação das normas jurídicas.

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16O direito foi preciso existir onde a moral dos homens não encontrou

uniformidade e observância pacífica na sua aplicação, de modo que a coação

do direito precisou atuar. Uma sociedade evoluída e pacífica é aquela onde os

preceitos morais são respeitados, reduzindo ou até evitando a aplicação do

direito. “À proporção que os homens observam as regras fundamentais de

convivência de maneira espontânea, tornando despicienda a coação, amplia-

se a esfera da moral.”17

1.4 – A “virada kantiana”

Com a derrocada sofrida pelo positivismo jurídico no pós 2ª guerra

mundial, onde restou claro que o primado da lei em todo seu apogeu

cientificista não foi suficiente para garantir a paz entre os povos, a teoria do

filósofo Immanuel Kant ganhou destaque por meio do resgate de suas idéias

feito por autores alemães, no que se convencionou chamar de ‘“virada

kantiana” (kantischen Wende)’18, onde foi proposta uma reaproximação entre a

ética e o direito.

Autores como Luís Roberto Barroso19 e Ricardo Lobo Torres20

desenvolveram em suas obras a idéia de que a evolução atual do

constitucionalismo seria a reação possibilitadora dessa “virada kantiana”, na

qual a prevalência dos valores sobre o dogmatismo absoluto dariam novo rumo

ao positivismo jurídico, vindo a conformar uma nova doutrina, então

denominada pós-positivismo.

17 NALINI, José Renato. Op. cit., p. 126 (grifos no original). 18 HÖFFE, Otfried. Kategorische Rechtprinzipien. Ein Kontrapunkt der Moderne. Frankfurt: Suhrkamp, 1990, p. 351, apud TORRES, Ricardo Lobo. O orçamento na constituição. Rio de Janeiro: Renovar, 1995, p. 90 (grifos no original). 19 BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da constituição: fundamentos de uma dogmática constitucional transformadora. 6ª ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 325. 20 TORRES, Ricardo Lobo. O orçamento na constituição. Rio de Janeiro: Renovar, 1995, p. 90.

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17

Nesse sentido, vale trazer à colação a pertinente observação de

Ricardo Lobo Torres quanto à filosofia de Kant que:

“postula, no campo da fenomenologia do direito e da sua aplicação prática, a distinção entre direito e moral, entre conduta externa e intenção, daí não se extrai a conclusão de que também no plano abstrato haja tal separação. Pelo contrário. O imperativo categórico, enquanto norma universal de conduta fundada na liberdade individual, condiciona ao mesmo tempo o direito e a moral em sua fundamentação básica e em seus valores.”21

Assim, a dimensão ética é resgatada e passa a compor uma nova

doutrina, de cunho principiológico, onde idéias de justiça e legitimidade passam

a ser reintroduzidas no ordenamento jurídico, conformando um novo momento

histórico, onde o constitucionalismo passa a dar preeminência aos princípios

informadores de um Estado Democrático de Direito.

1.5 – O pós-positivismo e a introdução de valores éticos no ordenamento jurídico

Pós-positivismo é a denominação dada ao que restou e pôde ser

aproveitado do positivismo jurídico a partir da segunda metade do século XX.

Explica-se. No início do século XIX, já com o Estado liberal consolidado e o

êxito do movimento de codificação do Direito, o direito natural (jusnaturalismo),

considerado metafísico e anticientífico, acabou por tornar-se superado

historicamente, sendo empurrado para a margem da história pela onipotência

positivista do século XIX. Era o alvorecer do positivismo.

O positivismo jurídico, fruto da investigação empreendida pelo

positivismo filosófico, foi resultado de uma idealização do conhecimento

21 TORRES, Ricardo Lobo. Op. cit., p. 91.

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18científico, de modo a crer que os variados “domínios da indagação e da

atividade intelectual pudessem ser regidos por leis naturais, invariáveis,

independentes da vontade e da ação humana”.22

As ciências naturais, também conhecidas e denominadas por

matemáticas ou exatas, desenvolviam-se a pleno vapor. A racionalidade

científica era a palavra-chave. No entanto, os modelos matemáticos e objetivos

utilizados pela ciência natural não se encaixavam de forma simples aos

padrões da ciência jurídica, subjetiva por essência. Enquanto a natureza segue

um movimento constante e previsível, passível de controle e apreensão pela

ciência, o direito, exemplo por excelência de ciência social/humana, carece de

uma observação acurada, que considere não simplesmente modelos

matemáticos, mas variáveis subjetivas relacionadas ao grupo social objeto da

análise.

Destarte, verifica-se que a tentativa de se criar uma ciência jurídica

com características semelhantes às ciências exatas e naturais falhou. Como

bem observa Luís Roberto Barroso “a busca de objetividade científica, com

ênfase na realidade observável e não na especulação filosófica, apartou o

Direito da moral e dos valores transcendentes”.23

Apesar de ter comportado variações de inúmeras escolas doutrinárias,

o positivismo teve seu ponto culminante no normativismo de Hans Kelsen, com

sua obra-prima, a Teoria pura do direito. Nas primeiras décadas do século XX o

positivismo tornou-se a filosofia dos juristas. Empreendia-se, no

22 BARROSO, Luís Roberto. Fundamentos teóricos e filosóficos do novo direito constitucional brasileiro (pós-modernidade, teoria crítica e pós-positivismo). In: BARROSO, Luís Roberto (org.). A nova interpretação constitucional: ponderação, direitos fundamentais e relações privadas. 3ª ed. rev. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p. 23. 23 Ibidem, p. 24.

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19desenvolvimento de conceitos dogmáticos, a busca pela cientificidade

anunciada.24

No entanto, com o passar do tempo, o positivismo submeteu-se a

fortes e severas críticas, oriundas de diversas procedências, até culminar com

uma dramática derrota histórica. Como bem ressalta Barroso: “A troca do ideal

racionalista de justiça pela ambição positivista de certeza jurídica custou caro à

humanidade”.25

A lição resultante é a de que nunca foi possível uma aplicação

satisfatória da metodologia das ciências naturais para a área de humanidades.

A pretensão positivista de objetividade e neutralidade mostrou-se insuscetível

de realizar-se.

Ademais, como conseqüência, o “fetiche da lei e o legalismo acrítico,

subprodutos do positivismo jurídico, serviram de disfarce para autoritarismos de

matizes variados”.26

O símbolo representativo da decadência do positivismo, conforme

aguçada observação de Luís Roberto Barroso, foi associado:

“à derrota do fascismo na Itália e do nazismo na Alemanha. Esses movimentos políticos e militares ascenderam ao poder dentro do quadro de legalidade vigente e promoveram a barbárie em nome da lei. Os principais acusados de Nuremberg invocaram o cumprimento da lei e a obediência a ordens emanadas da autoridade competente. Ao fim da Segunda Guerra Mundial, a idéia de um ordenamento jurídico indiferente a valores éticos e da lei como um (sic) estrutura meramente formal, uma embalagem para qualquer produto, já não tinha mais aceitação no pensamento esclarecido.”27

24 BARROSO, Luís Roberto. Fundamentos teóricos e filosóficos do novo direito constitucional brasileiro (pós-modernidade, teoria crítica e pós-positivismo). In: BARROSO, Luís Roberto (org.). A nova interpretação constitucional: ponderação, direitos fundamentais e relações privadas. 3ª ed. rev. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p. 25. 25 Ibidem, p. 25. 26 Ibidem, p. 26. 27 Ibidem, p. 26.

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20

Assim, com o ocaso histórico do jusnaturalismo e o insucesso político

do positivismo cedeu-se passo a um novo conjunto de reflexões sobre o

Direito, sua função social e sua interpretação. Esse movimento, que então

convencionou-se chamar de pós-positivismo é, nas palavras de Luís Roberto

Barroso, “a designação provisória e genérica de um ideário difuso, no qual se

incluem a definição das relações entre valores, princípios e regras, aspectos da

chamada nova hermenêutica constitucional e a teoria dos direitos

fundamentais, edificada sobre o fundamento da dignidade humana”.28

O pós-positivismo surge com o propósito de manter as conquistas

obtidas pelo positivismo e, portanto, sem o afã de desconstruir os méritos

alcançados pela etapa anterior. Não se vislumbrou um mero rompimento com o

positivismo, mas antes uma superação do conhecimento convencional.

Nesse passo, o pós-positivismo “inicia sua trajetória guardando

deferência relativa ao ordenamento positivo, mas nele reintroduzindo as idéias

de justiça e legitimidade”.29 Conforme observa Luís Roberto Barroso, “O

constitucionalismo moderno promove, assim, uma volta aos valores, uma

reaproximação entre ética e Direito”.30

Restou ao pós-positivismo a tarefa de conciliar todo o arcabouço

instrumental do Direito, transpondo as idéias da filosofia para o campo jurídico,

28 BARROSO, Luís Roberto; BARCELLOS, Ana Paula de. O começo da história. A nova interpretação constitucional e o papel dos princípios no direito brasileiro. In: BARROSO, Luís Roberto (org.). A nova interpretação constitucional: ponderação, direitos fundamentais e relações privadas. 3ª ed. rev. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p. 336 (grifos no original). 29 BARROSO, Luís Roberto. Fundamentos teóricos e filosóficos do novo direito constitucional brasileiro (pós-modernidade, teoria crítica e pós-positivismo). Op. cit., p. 28. 30 Esse fenômeno é referido por autores alemães como “virada kantiana”. HÖFFE, Otfried. Kategorische Rechtprinzipien. Ein Kontrapunkt der Moderne. Frankfurt: Suhrkamp, 1990, p. 351, apud TORRES, Ricardo Lobo. O orçamento na constituição. Rio de Janeiro: Renovar, 1995, p. 90 (grifo no original), apud BARROSO, Luís Roberto. Fundamentos teóricos e filosóficos do novo direito constitucional brasileiro (pós-modernidade, teoria crítica e pós-positivismo). Op. cit., p. 28.

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21fazendo com que os valores compartilhados pela comunidade, em certo

momento e lugar, fossem materializados em princípios, de modo que estes

passassem a ter guarida na Constituição, explícita ou implicitamente.

Valendo-se de síntese formulada por Luís Roberto Barroso, e com o

fito de se delimitar o campo de análise dos conceitos relacionados ao pós-

positivismo, evitando, além disso, que o presente trabalho se tornasse

demasiado amplo em seu desenvolvimento, temos que:

“O pós-positivismo identifica um conjunto de idéias difusas que ultrapassam o legalismo estrito do positivismo normativista, sem recorrer às categorias da razão subjetiva do jusnaturalismo. Sua marca é a ascensão dos valores, o reconhecimento da normatividade dos princípios e a essencialidade dos direitos fundamentais. Com ele, a discussão ética volta ao Direito. O pluralismo político e jurídico, a nova hermenêutica e a ponderação de interesses são componentes dessa reelaboração teórica, filosófica e prática que fez a travessia de um milênio para o outro.”31

Assim, o ideário pós-positivista passa por uma introdução de valores

éticos no ordenamento jurídico, orientada através do constitucionalismo

moderno que, realizando a migração da filosofia para o direito, faz com que

esses valores consubstanciem-se em princípios, os quais passam a estar

abrigados na Constituição.

Os princípios, alguns já conhecidos de longa data, como o da liberdade

e o da igualdade, somam-se a outros não menos importantes, ainda que com

novas releituras, como a separação de Poderes e o Estado democrático de

direito. Outros passaram a se incorporar mais recentemente, ainda que não

sejam menos importantes, tais como o da dignidade da pessoa humana, que

ganha dimensão nunca antes alcançada, da razoabilidade, da solidariedade e

da reserva da justiça, para citar alguns. Por essa análise, temos que os

31 BARROSO, Luís Roberto. Fundamentos teóricos e filosóficos do novo direito constitucional brasileiro (pós-modernidade, teoria crítica e pós-positivismo). Op. cit., p. 47.

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22princípios constitucionais e a questão do reconhecimento da normatividade

destes, passam a ser a síntese dos valores abrigados no ordenamento jurídico.

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23

CAPÍTULO II

SERVIÇO PÚBLICO

2.1 – Noção de Serviço Público

Pacífico é o entendimento de nossos doutrinadores de que a França foi

o berço da noção de serviço público. No início do século XX, com León Duguit

e Gaston Jèze, foi formada a conhecida Escola do Serviço Público. A partir da

célebre escola, alicerçou-se no ordenamento francês a noção de serviço

público, expandindo-se para o mundo ocidental.

Para Duguit:

“serviço público é toda atividade cuja realização deve ser assegurada, disciplinada e controlada pelos governantes, porque a realização dessa atividade é indispensável à efetivação e ao desenvolvimento da interdependência social e não se pode realizar a não ser com a intervenção da força governamental”.32

Segundo Odete Medauar, a noção de serviço público de Duguit:

“adquiriu tal força no ordenamento francês que passou a ser critério do direito administrativo e critério da competência da jurisdição administrativa. Nesta concepção clássica, serviço público exigia prestação pelo Poder Público sob regime de direito público, embora o conceito de Duguit não estivesse nesta linha.”33

No entanto, como discorre a autora, a partir da década de 30 do século

passado:

“Com o surgimento da gestão dos serviços públicos por particulares e do serviço público realizado sob normas do direito privado, emergiu a chamada crise do serviço público, nome dado à obra de Jean-Louis Corail, publicada na década de 50 do século XX. Alguns autores

32 DUGUIT, León. Traité de droit constitutionnel. 1927, apud MEDAUAR, Odete. O direito administrativo em evolução. 2ª ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 215. 33 MEDAUAR, Odete. O direito administrativo em evolução. 2ª ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 215-216.

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24pregaram o fim desta noção; outros, propuseram novos nomes. Mas a noção permaneceu; houve, na verdade, transformação da concepção defendida pela Escola do Serviço Público. Passou-se a admitir a gestão privada e o uso do direito privado no regime jurídico do serviço público.”34

Acurada análise traça Odete Medauar acerca da atual noção de serviço

público, máxime a partir da década passada, em virtude dos vários novos

fatores abaixo expendidos:

“onda de privatizações, quebra de monopólios estatais, dinâmica de novas conquistas tecnológicas e, com grande força, documentos oriundos da União Européia. Tais documentos buscaram dar um tratamento econômico a atividades que sempre foram consideradas serviços públicos, sobretudo mediante a inserção da concorrência nestas atividades. Na visão dos órgãos dirigentes da União Européia, o serviço público associado a monopólio estatal significa obstáculo à livre circulação e ao livre mercado na Europa.”35

Em conclusão, consoante as observações de Odete Medauar, verifica-

se que tais documentos gerados na União Européia, que visam dar um novo

panorama às questões econômicas, conciliando-as às relacionadas ao serviço

público:

“repercutiram nos países europeus e em vários outros, suscitando debates quanto à permanência ou não da noção de serviço público. Seria um nova crise do serviço público? No Brasil também surgiram questionamentos semelhantes. (...) No ordenamento brasileiro a Constituição de 1988 diferencia serviço público de atividade econômica, na combinação dos arts. 175 e 173. As concepções da União Européia se colocam num sistema ordenado a objetivos de circulação de mercadorias e serviços. Pode-se pensar de modo evolutivo no tocante ao serviço público para inserir o dado econômico, a gestão privada, a concorrência, sem abolir a presença do Estado, o aspecto social, os direitos sociais.”36

34 MEDAUAR, Odete. O direito administrativo em evolução. 2ª ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 216 (grifos no original). 35 MEDAUAR, Odete. Op. cit., p. 216. 36 Ibidem, p. 216-217.

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252.2 – Conceito de Serviço Público

A doutrina administrativista pátria é unânime quanto à dificuldade de

conceituação de serviço público ou serviços públicos como preferem muitos.

Isto se dá em função das transformações que a noção de serviço público

sofreu ao longo do tempo, seja em decorrência da evolução do tema relativo às

funções do Estado ou no que diz respeito aos seus elementos constitutivos ou

ainda no que concerne à sua abrangência.

Dessarte, convém mencionar algumas conceituações de doutrinadores

pátrios. Para Hely Lopes Meirelles “Serviço público é todo aquele prestado pela

Administração ou por seus delegados, sob normas e controles estatais, para

satisfazer necessidades essenciais ou secundárias da coletividade ou simples

conveniências do Estado.”37

Já para Maria Sylvia Zanella Di Pietro serviço público é “toda atividade

material que a lei atribui ao Estado para que a exerça diretamente ou por meio

de seus delegados, com o objetivo de satisfazer concretamente às

necessidades coletivas, sob regime jurídico total ou parcialmente público.”38

José dos Santos Carvalho Filho, a seu turno, considera serviço público

“toda atividade prestada pelo Estado ou por seus delegados, basicamente sob

regime de direito público, com vistas à satisfação de necessidades essenciais e

secundárias da coletividade.”39

37 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 25ª ed. atual. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 306 (grifos no original). 38 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 18ª ed. São Paulo: Atlas, 2005, p. 99 (grifos no original). 39 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 12ª ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 301 (grifos no original).

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26Desdobrando-se o conceito de serviço público, temos, em Di Pietro,

duas subdivisões. A autora cita serviço público em sentido amplo e em sentido

restrito.40 Leciona a autora que as noções de serviço público surgidas na

França, com a chamada Escola de Serviço Público, foram tão amplas que

chegaram a abranger todas as atividades do Estado.41 Ressalta Di Pietro que,

naquele país, León Duguit tinha “serviço público como atividade ou

organização, em sentido amplo, abrangendo todas as funções do Estado; ele

chegou ao ponto de pretender substituir a noção de soberania pela de serviço

público”.42

Citando autores brasileiros, Di Pietro traz à colação em sua obra

exemplos de conceito amplo, como é o adotado por Mário Masagão, para

quem serviço público é “toda atividade que o Estado exerce para cumprir os

seus fins”.43 No conceito deste autor inclui-se a atividade judiciária e a

administrativa, sendo que nesta, o Estado exerce atividade primária, decidindo

acerca do seu próprio procedimento, já naquela, desempenha função de

terceiro, quando gerencia o procedimento das partes. Com relação à atividade

legislativa, também é própria da Administração Pública. Entretanto, este autor

também elabora um conceito restrito de serviço público administrativo, como

sendo “toda a atividade que o Estado exerce para cumprir seus fins, exceto a

judiciária”.44

Outro autor que expressa conceito amplo é José Cretella Júnior, de

onde se extrai que serviço público é “toda atividade que o Estado exerce, direta

40 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. cit., p. 95-96. 41 Ibidem, p. 95. 42 DUGUIT, León. Manuel de droit constitutionnel. Paris: Fontemoing et Cie. Éditeurs, 1911, apud DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. cit., p. 95 (grifos no original). 43 MASAGÃO, Mário. Curso de direito administrativo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1968, apud DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. cit., p. 95. 44 Idem, p. 96.

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27ou indiretamente, para a satisfação das necessidades públicas mediante

procedimento típico do direito público”.45

Discorrendo, nesse passo, sobre serviço público em sentido restrito, Di

Pietro salienta que:

“Restritos são os conceitos que confinam o serviço público entre as atividades exercidas pela Administração Pública, com exclusão das funções legislativa e jurisdicional; e, além disso, o consideram como uma das atividades administrativas, perfeitamente distinta do poder de polícia do Estado. Parte-se da distinção entre atividade jurídica e atividade social.”46

Na atividade jurídica, conforme o ensinamento de Caio Tácito,

colacionado por Di Pietro, “atende-se à preservação do direito objetivo, à

ordem pública, à paz e à segurança coletivas”;47 o que, segundo a autora,

“corresponde ao poder de polícia.”48 No que concerne à atividade social, por

outro prisma, ainda pela lição de Caio Tácito, “a Administração cuida de

assuntos de interesse coletivo, visando ao bem-estar e ao progresso social,

mediante o fornecimento de serviços aos particulares”.49 O que, para Di Pietro,

“equivale aos serviços públicos propriamente ditos.”50

2.3 – Definição de Serviço Público

Quanto à forma como se define serviço público a doutrina também não

é pacífica. Enquanto Maria Sylvia Zanella Di Pietro trata dos elementos da

45 CRETELLA JÚNIOR, José. Administração indireta brasileira. Rio de Janeiro: Forense, 1980, apud DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. cit., p. 96. 46 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. cit., p. 96 (grifos no original). 47 TÁCITO, Mário. Direito administrativo. São Paulo: Saraiva, 1975, apud DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. cit., p. 96. 48 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. cit., p. 96 (grifos no original). 49 TÁCITO, Mário. Direito administrativo. São Paulo: Saraiva, 1975, apud DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. cit., p. 96. 50 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. cit., p. 96 (grifos no original).

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28definição como sendo subjetivo, formal e material.51 José dos Santos Carvalho

Filho enfoca dois sentidos fundamentais para a expressão serviço público,

quais sejam, um subjetivo e outro objetivo, sem olvidar que o tema não se

exaure com tais sentidos, dando margem à investigação de três correntes

distintas, baseadas, respectivamente, num critério orgânico, num critério formal

e num critério material.52

Acerca da definição do elemento subjetivo, Di Pietro leciona que:

“O serviço público é sempre incumbência do Estado, conforme está expresso, aliás, no artigo 175 da Constituição Federal, e sempre depende do Poder Público: 1. a sua criação é feita por lei e corresponde a uma opção do Estado; este assume a execução de determinada atividade que, por sua importância para a coletividade, parece não ser conveniente ficar dependendo da iniciativa privada; 2. a sua gestão também incumbe ao Estado, que pode fazê-lo diretamente (por meio dos próprios órgãos que compõem a Administração Pública centralizada da União, Estados e Municípios) ou indiretamente, por meio de concessão ou permissão, ou de pessoas jurídicas criadas pelo Estado com essa finalidade.”53

O elemento formal relaciona-se ao fato de que o serviço público

submete-se a regime jurídico definido por lei. Assim, tendo em vista que as

relações jurídicas no serviço público revestem-se pela legalidade, traço

característico do elemento formal, Di Pietro enumera uma série de situações

que denotam a evidência de tal elemento, como por exemplo:

“Para determinados tipos de serviços (não comerciais ou industriais) o regime jurídico é de direito público: nesse caso, os agentes são estatutários; os bens são públicos; as decisões apresentam todos os atributos do ato administrativo, em especial a presunção de veracidade e a executoriedade; a responsabilidade é objetiva; os contratos regem-se pelo direito administrativo. (...) Quando, porém, se trata de serviços comerciais e industriais, o seu regime jurídico é de direito comum (civil e comercial), derrogado, ora mais ora menos, pelo direito público. Em regra, o pessoal se submete ao direito do trabalho, com equiparação aos funcionários públicos para determinados fins; os contratos com terceiros submetem-se, em regra, ao direito comum; os bens não afetados à realização do serviço público submetem-se ao direito privado, enquanto os vinculados ao serviço têm regime semelhante ao dos bens públicos

51 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. cit., p. 99-100. 52 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Op. cit., p. 299-300. 53 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. cit., p. 99-100 (grifos no original).

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29de uso especial; a responsabilidade, que até recentemente era subjetiva, passou a ser objetiva com a norma do art. 37, § 6º, da Constituição de 1988.”54

Por último, Di Pietro analisa o elemento material, para afirmar que “o

serviço público corresponde a uma atividade de interesse público.”55 Mas não é

só; enfatiza a autora que não é suficiente para caracterizar o serviço público o

objetivo de interesse público;56 porque, em prosseguimento a seu

percuciente raciocínio, “todo serviço público visa atender a necessidades

públicas, mas nem toda atividade de interesse público é serviço público.”57

Pelo prisma de José dos Santos Carvalho Filho, serviço público admite

dois sentidos, um subjetivo e outro objetivo. No sentido subjetivo, esclarece o

autor que “levam-se em conta os órgãos do Estado, responsáveis pela

execução das atividades voltadas à coletividade. Nesse sentido, são serviços

públicos, por exemplo, um órgão de fiscalização tributária e uma autarquia

previdenciária.”58 Pelo sentido objetivo, “serviço público é a atividade em si,

prestada pelo Estado e seus agentes. Aqui nos abstraímos da noção de quem

executa a atividade para nos prendermos à idéia da própria atividade.”59

Nada obstante, ressalta que as dificuldades não se esgotam com o

balizamento desses dois sentidos, isto porque, conforme observa:

“Mesmo quando chegamos à idéia de serviço público como atividade, é preciso averiguar quais são os fatores que o caracterizam. E o tema também suscita discrepâncias, calcadas em enfoques especiais levados em consideração pelo estudioso, o que nos leva a três correntes distintas.”60

54 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. cit., p. 100 (grifos no original). 55 Ibidem, p. 100. 56 Ibidem, p. 101 (grifos no original). 57 Ibidem, p. 101 (grifos no original). 58 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Op. cit., p. 299. 59 Ibidem, p. 299. 60 Ibidem, p. 299.

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30Assim, discorrendo sobre as três correntes mencionadas, esclarece

que as mesmas baseiam-se, respectivamente, nos critérios orgânico, formal e

material:

“A primeira baseia-se no critério orgânico, pelo qual o serviço público é o prestado por órgão público, ou seja, pelo próprio Estado. (...) Há, ainda, o critério formal, que realça o aspecto pertinente ao regime jurídico. Vale dizer, será serviço público aquele disciplinado por regime de direito público. (...) Por fim, temos o critério material, que dá relevo à natureza da atividade exercida. Serviço público seria aquele que atendesse direta e essencialmente à comunidade.”61

Para José dos Santos Carvalho Filho nenhuma das três correntes está

isenta de críticas. A censura quanto ao critério orgânico “consiste em que essa

noção clássica está hoje alterada pelos novos mecanismos criados para a

execução das atividades públicas, não restritas apenas ao Estado, mas, ao

contrário, delegadas freqüentemente a particulares.”62

Já o critério formal, segundo o autor, “... é insuficiente, porque em

alguns casos incidem regras de direito privado para certos segmentos da

prestação de serviços públicos, principalmente quando executados por

pessoas privadas da Administração, como as sociedades de economia mista e

as empresas públicas.”63

Por derradeiro, e com vistas à análise do critério material, preleciona o

autor que:

“A crítica aqui reside no fato de que algumas atividades, embora não atendendo diretamente aos indivíduos, voltam-se em favor destes de forma indireta e mediata. Além disso, nem sempre as atividades executadas pelo Estado representam demandas essenciais da coletividade. Algumas vezes são executadas atividades secundárias, mas nem por isso menos relevantes na medida em que é o Estado que as presta, incumbindo-lhe exclusivamente a definição de sua estratégia administrativa.”64

61 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Op. cit., p. 299-300 (grifos no original). 62 Ibidem, p. 299-300. 63 Ibidem, p. 300. 64 Ibidem, p. 300.

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31

2.4 – Classificação de Serviço Público

Nesse aspecto a doutrina também não é uniforme. Varia segundo

distintos enfoques a classificação que se dá a serviço público. Para que se

tenha um panorama do magistério pátrio em sede de doutrina, ao mesmo

tempo em que se promove uma análise comparativa, cabe mencionar algumas

classificações.

Hely Lopes Meirelles, tomando em consideração a essencialidade, a

adequação, a finalidade e os destinatários dos serviços, classifica-os em:

serviços públicos propriamente ditos, isto é, aqueles “que a Administração

presta diretamente à comunidade, por reconhecer sua essencialidade e

necessidade para a sobrevivência do grupo social e do próprio Estado”65,

dando como exemplos desses serviços os de defesa nacional e os de polícia;

serviços de utilidade pública, sendo aqueles “que a Administração,

reconhecendo sua conveniência (não essencialidade, nem necessidade) para

os membros da coletividade, presta-os diretamente ou aquiesce em que sejam

prestados por terceiros (concessionários, permissionários ou autorizatários)”66,

tendo como exemplos os serviços de transporte coletivo, energia elétrica, gás e

telefone; serviços próprios do Estado, ou seja, “aqueles que se relacionam

intimamente com as atribuições do Poder Público (segurança, polícia, higiene e

saúde públicas etc.) e para execução dos quais a Administração usa da sua

supremacia sobre os administrados”67; serviços impróprios do Estado, quer

dizer, “os que não afetam substancialmente as necessidades da comunidade,

mas satisfazem interesses comuns de seus membros, e, por isso, a

Administração os presta remuneradamente, por seus órgãos ou entidades

65 MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit., p. 307 (grifos no original). 66 Ibidem, p. 307 (grifos no original). 67 Ibidem, p. 308 (grifos no original).

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32descentralizadas (...), ou delega sua prestação a concessionários,

permissionários ou autorizatários”68; serviços administrativos, aqueles “que a

Administração executa para atender a suas necessidades internas ou preparar

outros serviços que serão prestados ao público, tais como os da imprensa

oficial”69; serviços industriais, isto é, “os que produzem renda para quem os

presta, mediante a remuneração da utilidade usada ou consumida,

remuneração, esta, que, tecnicamente, se denomina tarifa ou preço público,

por ser sempre fixada pelo Poder Público”70; serviços “uti universi” ou

gerais, vale dizer, “aqueles que a Administração presta sem ter usuários

determinados, para atender à coletividade no seu todo, como os de polícia,

iluminação pública, calçamento e outros dessa espécie”71; serviços “uti

singuli” ou individuais, aqueles “que têm usuários determinados e utilização

particular e mensurável para cada destinatário, como ocorre com o telefone, a

água e a energia elétrica domiciliares.”72

Já José dos Santos Carvalho Filho, adota a seguinte classificação:

serviços delegáveis “são aqueles que, por sua natureza ou pelo fato de assim

dispor o ordenamento jurídico, comportam ser executados pelo Estado ou por

particulares colaboradores”73, sendo exemplos os serviços de transporte

coletivo, energia elétrica, sistema de telefonia etc.; serviços indelegáveis “são

aqueles que só podem ser prestados pelo Estado diretamente, ou seja, por

seus próprios órgãos ou agentes”74, tendo como exemplos os serviços de

defesa nacional, segurança interna, fiscalização de atividades, serviços

assistenciais etc.; serviços administrativos são “aqueles que o Estado

executa para compor melhor sua organização, como o que implanta centro de

pesquisa ou edita a imprensa oficial para a divulgação dos atos

68 MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit., p. 308 (grifos no original). 69 Ibidem, p. 308 (grifos no original). 70 Ibidem, p. 308 (grifos no original). 71 Ibidem, p. 309 (grifos no original). 72 Ibidem, p. 309 (grifos no original). 73 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Op. cit., p. 303-304 (grifos no original). 74 Ibidem, p. 304 (grifos no original).

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33administrativos”75; serviços de utilidade pública “se destinam diretamente aos

indivíduos, ou seja, são proporcionados para sua fruição direta. Entre eles

estão o de energia domiciliar, fornecimento de gás, atendimento em postos

médicos, ensino etc.”76; serviços coletivos (uti universi) “são aqueles

prestados a grupamentos indeterminados de indivíduos, de acordo com as

opções e prioridades da Administração, e em conformidade com os recursos de

que disponha”77, exemplificando esta modalidade com os serviços de

pavimentação de ruas, de iluminação pública, de implantação de serviço de

abastecimento de água, de prevenção de doenças e outros do gênero;

serviços singulares (uti singuli) “preordenam-se a destinatários

individualizados, sendo mensurável a utilização por cada um dos indivíduos.

Exemplos desses serviços são os de energia domiciliar ou de uso de linha

telefônica”78; serviços sociais “são os que o Estado executa para atender aos

reclamos sociais básicos e representam ou uma atividade propiciadora de

comodidade relevante, ou serviços assistenciais e protetivos”79, dando como

exemplos os serviços de assistência à criança e ao adolescente; assistência

médica e hospitalar; assistência educacional; apoio a regiões menos

favorecidas; assistência a comunidades carentes etc.; serviços econômicos

“são aqueles que, por sua possibilidade de lucro, representam atividades de

caráter mais industrial ou comercial, razão por que alguns os denominam de

serviços comerciais e industriais.”80

2.5 – Evolução histórica no Brasil

A evolução do serviço público no Brasil ao longo da história contou com

a contribuição de inúmeros doutrinadores brasileiros, como também de 75 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Op. cit., p. 304 (grifos no original). 76 Ibidem, p. 304 (grifos no original). 77 Ibidem, p. 305 (grifos no original). 78 Ibidem, p. 305 (grifos no original). 79 Ibidem, p. 305 (grifos no original). 80 Ibidem, p. 305 (grifos no original).

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34consagrados autores estrangeiros. Conforme esclarece José Cretella Júnior,

“nossos especialistas, a partir de segundo período da fase republicana, se

empenharam em atualizar a doutrina pátria em face do que se alcançara nos

grandes centros europeus, sempre levando em consideração nossa vida

administrativa.”81

Cretella Jr., citando doutrinadores brasileiros da época imperial,

ressalta que raros foram os nossos primeiros tratadistas que fizeram alguma

referência à noção de serviço público, “não obstante o progresso que a

disciplina atingira, entre nós, do que é cabal evidência a série apreciável de

obras de grande valor como os compêndios de VICENTE PEREIRA DO REGO,

de VEIGA CABRAL, de VISCONDE DO URUGUAI, de FURTADO DE

MENDONÇA, de A. J. RIBAS.”82

Prosseguindo-se no resgate histórico, afirma Cretella Jr. que o primeiro

tratadista da época republicana foi Viveiros de Castro, mas que, até a 1ª edição

(1906), do seu Tratado de ciência da administração e direito administrativo,

nenhuma referência foi feita à noção do serviço público. Isto muda, porém, a

partir da 3ª edição da referida obra (1914), quando, conforme observa Cretella

Jr., a noção de serviço público já estava bem divulgada.83

No entanto, ainda no primeiro decênio do século XX, esclarece Cretella

Jr. que o tema do serviço público já era “familiar ao mundo jurídico da Europa,

81 CRETELLA JÚNIOR, José. Tratado de direito administrativo. Rio de Janeiro: Forense, 1967, v. 4, p. 34. 82 CRETELLA JÚNIOR, José. Op. cit., p. 34 (grifos no original). 83 CASTRO, Augusto Olímpio Viveiros de. Tratado de ciência da administração e direito administrativo. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1906, apud CRETELLA JÚNIOR, José. Op. cit., p. 35.

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35divulgado pelas obras conhecidas de LEÓN DUGUIT84 e MAURICE

HAURIOU.”85

Para finalizar as referências à época republicana Cretella Jr. cita,

ainda, Aarão Reis86 e Matos de Vasconcelos, destacando da obra deste último,

de 1936, que “a noção de serviço público está ligada, direta e imediatamente, à

satisfação das necessidades de ordem pública.”87

Contemporaneamente, compreendendo as décadas de 40 a 60 do

século passado, Cretella Jr. cita os principais autores à época e como estes

delineavam a noção de serviço público.

Para Cirne Lima, “Serviço público é todo serviço existencial,

relativamente à sociedade ou, pelo menos, assim havido num momento dado

que, por isso mesmo, tem de ser prestado aos componentes daquela, direta ou

indiretamente, pelo Estado ou por outra pessoa administrativa”.88

Enquanto que pelo magistério de Brandão Cavalcanti, “a conceituação

do serviço público não pode ser compreendida em uma fórmula a priori

traçada. (...) Pode o Estado ser acionista de uma empresa e não se considerar

84 DUGUIT, León. Manuel de droit constitutionnel (Théorie générale de l´État – Organisation politique). Paris: Albert Fontemoing, Éditeur, ancienne Librairie Thorin et Fils, 1907, apud CRETELLA JÚNIOR, José. Op. cit., p. 35 (grifo no original). 85 HAURIOU, Maurice. Précis de droit administratif et de droit public. 6ª ed. Paris: Librairie de la Societé du Recueil J. B. Sirey & du Journal du Palais, 1907, apud CRETELLA JÚNIOR, José. Op. cit., p. 35 (grifo no original). 86 REIS, Aarão. Direito administrativo brasileiro. Rio de Janeiro: Oficinas Gráficas Villas-Boas & Cia., 1923, apud CRETELLA JÚNIOR, José. Op. cit., p. 35. 87 VASCONCELOS, José de Matos. Direito administrativo. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1936/1937, v. 1, p. 125-147, apud CRETELLA JÚNIOR, José. Op. cit., p. 35. 88 LIMA, Rui Cirne. Princípios de direito administrativo brasileiro. 4ª ed. Porto Alegre: Sulina, 1964, p. 82, apud CRETELLA JÚNIOR, José. Op. cit., p. 36.

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36aquele serviço como público (...), ao mesmo tempo que podem empresas

particulares realizar serviços públicos (especialmente as concessões)”.89

Já Mário Masagão observa que: “Na realidade, é serviço público toda

atividade que o Estado exerce para cumprir seus fins. E, à medida que, através

do tempo, crescem na prática as incumbências do poder público, aumenta o

âmbito dos serviços que ele desempenha.”90

2.6 – A normatização no Brasil

De suma importância é o estudo acerca do tratamento jurídico que a

Constituição e a lei vieram dar ao servidor público brasileiro, outrora também

denominado como funcionário público.91

Em termos ilustrativos históricos, busca-se a lição de Ruy Cirne Lima

para destacar que:

“A primeira Constituição a tratar dos assim chamados funcionários públicos foi a Constituição Federal de 16.7.1934, que nos arts. 168 a 173 estabeleceu pela primeira vez, em nosso Direito Público Constitucional, normas acerca do funcionalismo – imitava, à época, a Constituição alemã de Weimar, de 11.8.1919, que em seus arts. 129, 130 e 131 dispunha acerca dos funcionários públicos.”92

89 CAVALCANTI, Themístocles Brandão. Tratado de direito administrativo. 2ª ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1949, v. 4, p. 8, apud CRETELLA JÚNIOR, José. Op. cit., p. 37 (grifos no original). 90 MASAGÃO, Mário. Curso de direito administrativo. São Paulo: Max Limonad, 1959/1960, v. 2, p. 287-288, apud CRETELLA JÚNIOR, José. Op. cit., p. 39-40. 91 Conforme observa José dos Santos Carvalho Filho em seu Manual de Direito Administrativo (2005:532), a expressão “funcionário público” é inadequada nos dias atuais, tendo em vista ter sido banida da atual Constituição, mormente porque a expressão tem caráter mais restrito do que a de “servidor público”, porque, na verdade, somente eram assim considerados (funcionários públicos) os servidores estatutários que integravam a estrutura dos entes federativos (Administração Direta), o que indica que se tratava de uma categoria dos servidores públicos. 92 LIMA, Ruy Cirne. Princípios de direito administrativo. 7ª ed. rev. e reelab. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 432.

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37Por meio dos ensinamentos de Cretella Jr., verifica-se que desde o

início do século passado os jurisconsultos brasileiros empreendiam esforços no

sentido de elaborar um Estatuto93 que contemplasse de forma sistemática o

regime jurídico dos servidores públicos (à época designados como funcionários

públicos), determinando os direitos e deveres decorrentes da posição que

ocupavam e ainda ocupam na máquina administrativa do Estado.

Em precioso resumo, Cretella Jr. discorre sobre a gênese do Estatuto

dos Funcionários Públicos brasileiros, traçando uma linha do tempo com os

vários projetos de lei e suas respectivas autorias, demonstrando, segundo ele,

o cuidado especial que esses projetos dedicaram ao servidor público:

“JUSTINIANO SERPA, em 1907, apresenta seu projeto, sem resultados práticos; ALCINDO GUANABARA, em 1910, tenta, em vão, que seu projeto seja aprovado na Câmara; no ano seguinte, GRACO CARDOSO volta ao assunto, salientando, em projeto levado à Câmara, a necessidade de regulamentar a situação jurídica dos funcionários; MONIZ SODRÉ, em 1913, leva à consideração de seus pares importante projeto de estatuto, procedido de bem fundamentada exposição-de-motivos; no ano seguinte, CAMILO DE HOLANDA defende seu projeto, de âmbito mais geral, abrangendo civis e militares; o governo de VENCESLAU BRÁS reúne o que de mais importante se realizara no tocante ao funcionalismo, o que deu como resultado excelente Consolidação, a qual não chegou a ser aprovada pelo Congresso; a Comissão nomeada por Epitácio Pessoa, em 1921, para estudar o trabalho anterior e melhorá-lo, também vê malogrados seus esforços; a tentativa de Consolidação das leis sobre o funcionalismo, feita em 1923, por determinação do Ministro da Fazenda, não consegue melhor êxito;

93 Leciona o autor que o vocábulo estatuto provém do latim statutu, particípio substantivado do verbo statuo, statui, statum, statuere, verbo transitivo estatuir, estabelecer, pôr, colocar, erigir. Estatuto, etimologicamente, significa, pois, erigido, estabelecido, posto, colocado. CRETELLA JÚNIOR, José. Tratado de direito administrativo. Rio de Janeiro: Forense, 1967, v. 4, p. 97, item 49, nota 51 (grifos no original).

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38em 1929, quase se converte em realidade o projeto nº 425, de autoria de SÁ FILHO, GRACO CARDOSO, MAURÍCIO DE MEDEIROS, HENRIQUE DODSWORTH e DANIEL DE CARVALHO; em 1931, a Comissão nomeada pelo governo provisório apresenta novo projeto que, anos depois, ainda não obtivera aprovação da Câmara, não obstante a Constituição Federal de 1934 haver determinado expressamente, em seu art. 170: ‘O Poder Legislativo votará o Estatuto dos Funcionários Públicos’. Era a primeira vez que o texto constitucional brasileiro assim se pronunciava. A Carta Constitucional de 1937 ainda encontra o país sem um diploma estatutário peculiar ao funcionalismo. Em seu art. 156, rezava aquela Constituição: ‘O Poder Legislativo organizará o Estatuto dos Funcionários Públicos’. Finalmente, criado o Departamento Administrativo do Serviço Público (DASP), principia este a elaborar o Estatuto que, terminado, recebe algumas pequenas modificações e entra em vigor pelo Decreto-lei nº 1.713, de 28 de outubro de 1939.”94

Posteriormente ao primeiro Estatuto dos Funcionários Públicos Civis da

União, de 1939, somente veio a surgir novo estatuto em 1952, com a Lei nº

1.711, de 28 de outubro de 1952. Este vigorou até 11/12/1990 quando, em

conformidade com o mandamento constitucional da Carta de 1988, em seu art.

39, foi determinado que a União, bem como os Estados, o Distrito Federal e os

Municípios instituíssem regime jurídico único para os servidores da

administração pública direta, das autarquias e das fundações públicas, o que,

no âmbito federal, consolidou-se com a edição da Lei nº 8.112, de 11 de

dezembro de 1990, publicada em 12/12/1990, com vigência nesta mesma data,

alterada pela Lei nº 9.527, de 10 de dezembro de 1997.

Ocorre que, sem que tenha havido severas críticas por parte da

doutrina, veio a Emenda Constitucional nº 19, de 04/06/1998, alterar a redação

do art. 39, caput, resultando numa total modificação do conteúdo original do

referido dispositivo, uma vez que suprimiu a obrigatoriedade do regime jurídico

único para todos os servidores públicos.

94 CRETELLA JÚNIOR, José. Tratado de direito administrativo. Rio de Janeiro: Forense, 1967, v. 4, p. 98-99, nota 52 (grifos no original).

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39No entanto, conforme leciona Ruy Cirne Lima:

“Subsiste, entretanto, o regime estatutário, como já referimos, para uma parcela ponderável dos servidores públicos, tendo sido reintroduzido o emprego público, disciplinado pela CLT, para inúmeras atividades. A idéia de reintroduzir o regime de emprego público, mediante contrato de trabalho de acordo com a legislação trabalhista, já foi posta em prática em relação às chamadas agências reguladoras, que se destinam a supervisionar as concessões de serviço público, introduzidas como forma normal de administrar a coisa pública. A lei 9.986, de 18.7.2000, estabeleceu que as Agências Reguladoras terão suas relações de trabalho regidas pela Consolidação das Leis do Trabalho (art. 1º).”95

Não obstante o comentário da parte final da citação anterior, acerca da

edição da Lei nº 9.986, de 18/07/2000, e seus criticáveis propósitos, o art. 1º da

citada lei, que já havia tido seus efeitos suspensos liminarmente em

19/12/2000, na ADI 2.310-1-DF, em despacho lapidar do eminente Ministro

Marco Aurélio, ao entender que, em razão da natureza das atividades que são

afetas às agências reguladoras, o regime jurídico só poderia ser o estatutário,

foi definitiva e expressamente revogado pelo art. 37 da Lei nº 10.871, de

20/05/2004.

Registre-se, ademais, a afirmação de Celso Antônio Bandeira de Mello,

acerca da Emenda Constitucional nº 19, de 04/06/1998:

“Note-se, de passagem, que o fato de o chamado “Emendão” (Emenda Constitucional 19, de 4.6.98) haver suprimido a referência, dantes existente, à obrigatoriedade de ‘regime jurídico único’ para o pessoal da Administração direta, autarquias e fundações públicas de modo algum significa, como ao diante (sic) se esclarecerá, que conferiu ampla liberdade para que possam elas adotar livremente regime trabalhista para seus servidores”.96

Em remate à questão, é de se ter em conta a observação de Ruy Cirne

Lima:

95 LIMA, Ruy Cirne. Princípios de direito administrativo. 7ª ed. rev. e reelab. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 431. 96 MELLO, Celso Antônio Bandeira. Curso de direito administrativo. 12ª ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 223 (grifos no original).

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40“A conclusão inelutável é a de que a supressão da obrigatoriedade do regime jurídico único não impede que ele seja adotado por lei e que o Poder Público não é livre para escolher o regime da CLT, quando, como no caso das agências reguladoras, o interesse público de independência na fiscalização está em causa.”97

97 LIMA, Ruy Cirne. Op. cit., p. 432.

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41

CAPÍTULO III

ÉTICA NO SERVIÇO PÚBLICO

3.1 – Moralidade e probidade administrativa

Moralidade e probidade administrativas são conceitos e práticas que

andam juntos, paralelamente, de forma indissociável. A probidade

administrativa, em termos sintéticos, é a “conduta honesta, íntegra de

servidores públicos na gestão da coisa pública.”98 Definida também como

“retidão ou integridade de caráter que leva a observância estrita dos deveres

do homem quer públicos, quer privados”.99

Quanto à moralidade, diga-se logo que se trata de princípio de status

constitucional. Obtempera Maria Sylvia Zanella Di Pietro que muitos autores

não aceitam a existência deste princípio, sob a alegação de que o conceito de

moral administrativa é vago e impreciso, além de ser absorvido pelo conceito

de legalidade.100 Além disso, “licitude e honestidade seriam os traços

distintivos entre o direito e a moral, numa aceitação ampla do brocardo

segundo o qual non omne quod licet honestum est (nem tudo o que é legal é

honesto).”101

Hely Lopes Meirelles infere, tomando por base conceito de Hauriou,

que “a moralidade administrativa constitui, hoje em dia, pressuposto de

validade de todo ato da Administração Pública (CF, art. 37, caput).”102

98 PROBIDADE ADMINISTRATIVA. In: DICIONÁRIO contemporâneo da língua portuguesa Caldas Aulete (Aulete Digital). AULETE, Francisco Júlio de Caldas; VALENTE, António Lopes dos Santos. Edição brasileira original: Hamílcar de Garcia. Disponível em: <http://www.auletedigital.com.br/>. Acesso em: 04 jul. 2010. 99 Ibidem. 100 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. cit., p. 77. 101 Ibidem, p. 77 (grifos no original). 102 MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit., p. 83 (grifos no original).

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42Prossegue o insigne doutrinador, em citação a Hauriou, esclarecendo que “não

se trata da moral comum, mas sim de uma moral jurídica, entendida como ‘o

conjunto de regras de conduta tiradas da disciplina interior da

Administração’”.103

Pelas observações de Suzy Elizabeth Cavalcante Koury, a “moralidade

surge da moral em ação ou em prática”104, sendo entendida como o “conjunto

de relações efetivas ou atos concretos que adquirem um significado moral com

respeito à ‘moral’ vigente.”105

Lapidar é o conceito de moralidade administrativa do jurista português

António José Brandão, trazidas à colação por Hely Lopes Meirelles:

“a atividade dos administradores, além de traduzir a vontade de obter o máximo de eficiência administrativa, terá ainda de corresponder à vontade constante de viver honestamente, de não prejudicar outrem e de dar a cada um o que lhe pertence (...). À luz dessas idéias, tanto infringe a moralidade administrativa o administrador que, para atuar, foi determinado por fins imorais ou desonestos como aquele que desprezou a ordem institucional e, embora movido por zelo profissional, invade a esfera reservada a outras funções, ou procura obter mera vantagem para o patrimônio confiado à sua guarda.”106

O princípio da moralidade e a noção de probidade administrativa foram

positivados pelo legislador pátrio tanto em nível constitucional como em nível

infraconstitucional.

No texto constitucional temos várias alusões diretas a tais preceitos,

como por exemplo: o caput do art. 37 “A administração pública direta e indireta

de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos 103 HAURIOU, Maurice. Précis élémentaires de droit administratif. Paris, 1926, p. 197 e ss., apud MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit., p. 83 (grifos no original). 104 KOURY, Suzy Elizabeth Cavalcante. A ética no serviço público. Revista de direito administrativo. Rio de Janeiro, nº 220, p. 183-194, abr./jun. 2000. 105 VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez. Ética. 18ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1998, p. 50, apud KOURY, Suzy Elizabeth Cavalcante. Op. cit., p. 184 (grifo no original). 106 BRANDÃO, António José. Moralidade administrativa. RDA 25/454, apud MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit., p. 84.

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43Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade,

moralidade, publicidade e eficiência (...)”107; ainda neste dispositivo, dispõe o §

4º acerca dos atos de improbidade administrativa e suas conseqüências “Os

atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos

políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o

ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da

ação penal cabível.”108; cabe também citar a menção do art. 15, inciso V, que

trata de uma das hipóteses de perda ou suspensão dos direitos políticos, nos

casos de “improbidade administrativa, nos termos do art. 37, § 4º.”109; cite-

se, ainda, o art. 5º, inciso LXXIII, que prevê o cabimento de ação popular em

caso de ato lesivo à moralidade administrativa, nos seguintes termos “qualquer

cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo

(...) à moralidade administrativa (...)”110; por fim, nos temos do § 9º do art. 14,

foram traçados os objetivos a serem alcançados pela lei que vier a estabelecer

os caso de inelegibilidades, assim dispondo “Lei complementar estabelecerá

outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger

a probidade administrativa, a moralidade (...)”.111

No plano legal podemos referenciar, exemplificativamente, a Lei

Federal nº 1.079, de 10/04/1950, que define os crimes de responsabilidade,

mais precisamente seu art. 9º que prevê os crimes contra a probidade na

administração, destacando-se os itens 5 e 7:

“Art. 9º São crimes de responsabilidade contra a probidade na administração: ………………………………………………………………………………… 5 - infringir, no provimento dos cargos públicos, as normas legais; …………………………………………………………………………………

107 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 05 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao.htm>. Acesso em: 04 jul. 2010 (grifo meu). 108 BRASIL. Constituição (1988). Op. cit. (grifos meus). 109 Ibidem (grifos meus). 110 Ibidem (grifos meus). 111 Ibidem (grifos meus).

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447 - proceder de modo incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo.”112

Importante ressaltar sobre a referência anterior, quanto ao

exemplificado nos itens 5 e 7 do art. 9º da Lei nº 1.079/50, que a lei abarcou

tanto hipóteses de infringência às normas legais, ou seja, hipóteses de caráter

objetivo, como se depreende da leitura do item 5, como também faz referência

ao proceder incompatível com a dignidade, a honra e o decoro (item 7), isto é,

conceitos de caráter subjetivo, o que demonstra claramente que a improbidade

administrativa pode ser aferida por violação ao direito, à moral ou a ambos.

Com todo o clamor da sociedade pela necessidade de conduta ética

dos servidores públicos, máxime após a vigência da atual Constituição, que,

diga-se por oportuno, já garantia assento constitucional à ética no serviço

público, amplos debates se formaram acerca da questão, não se chegando a

consenso sobre a necessidade ou não de uma normatização específica a

respeito. Fato é que, em 1994, seis anos após a promulgação da Constituição

Federal, o governo federal editou o Código de Ética Profissional do Servidor

Público Civil do Poder Executivo Federal, aprovado pelo Decreto nº 1.171, de

22 de junho de 1994.

O Código de Ética veio confirmar o princípio da moralidade

administrativa, dispondo em seu texto que o servidor nunca poderá desprezar o

elemento ético de sua conduta, devendo decidir não apenas “entre o legal e o

ilegal, o justo e o injusto, o conveniente e o inconveniente, o oportuno e o

inoportuno, mas principalmente entre o honesto e o desonesto, consoante as

regras contidas no art. 37, caput, e § 4º, da Constituição Federal.”113

112 BRASIL. Lei nº 1.079, de 10 de abril de 1950. Define os crimes de responsabilidade e regula o respectivo processo de julgamento. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L1079consol.htm>. Acesso em: 04 jul. 2010 (grifos meus). 113 BRASIL. Decreto nº 1.171, de 22 de junho de 1994. Aprova o código de ética profissional do servidor público civil do poder executivo federal. Anexo, capítulo I, seção I, item II. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D1171.htm>. Acesso em: 04 jul. 2010 (grifo no original).

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O Código foi dividido em dois capítulos, sendo que o primeiro foi

subdividido em três seções. Tratam as seções, respectivamente, das regras

deontológicas, dos principais deveres do servidor público e das vedações ao

servidor público, e o segundo capítulo versa sobre as Comissões de Ética.

Tais Comissões, conforme observação de Suzy Elizabeth Cavalcante

Koury, “não têm poder de coerção, o que foi justificado pelo então Ministro da

Administração Federal, ROMILDO CANHIN, pelo fato de não se tratar de mais

uma lei, e sim de um Código de Ética:”114

“... que deverá ser cumprido não tanto por sua condição de ato estatal, aprovado por um Decreto do Senhor Presidente da República, na qualidade de titular da ‘direção superior da administração federal’ (Constituição, artigo 84, inciso II), mas principalmente em virtude da adesão de cada servidor, em seu foro íntimo...”115

Pois:

“... o princípio da obrigatoriedade do procedimento ético e moral no exercício da função pública não tem por fundamento a coercibilidade jurídica.”116

Outrossim, destaque-se a Lei nº 9.784, de 29/01/1999 que, dispondo

sobre o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal,

prevê em seu art. 2º, caput, o princípio da moralidade, a ser obedecido pela

Administração Pública: “Art. 2º A Administração Pública obedecerá, dentre

outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade,

proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança

114 KOURY, Suzy Elizabeth Cavalcante. Op. cit., p. 189 (grifo no original). 115 CANHIN, Romildo. Exposição de motivos. Código de ética profissional do servidor público civil do poder executivo federal. Brasília: ENAP, 1994, p. 10, apud KOURY, Suzy Elizabeth Cavalcante. Op. cit., p. 189 (grifos meus). 116 CANHIN, Romildo. Op. cit., p. 10, apud KOURY, Suzy Elizabeth Cavalcante. Op. cit., p. 189 (grifos meus).

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46jurídica, interesse público e eficiência”117; e, ainda, o inciso IV do parágrafo

único do mesmo artigo: “IV - atuação segundo padrões éticos de probidade,

decoro e boa-fé”.118

Vale ressaltar, em conclusão, algumas medidas sugeridas por Suzy

Elizabeth Cavalcante Koury, com o fito de ser “assegurada a prevalência do

interesse público sobre o privado, o triunfo da ética sobre a corrupção”119, a

saber:

“1º) que o respeito ao Código de Ética integre o compromisso de posse de todos os servidores públicos; 2º) que se combata a impunidade para que não se perca a fé nas instituições; 3º) que se concentre esforços na educação e na conscientização ética da sociedade e, em particular, dos servidores públicos, restaurando-se a cidadania através da formação de cidadão livres, críticos e que participem da definição dos destinos da Nação; 4º) que se valorize os servidores públicos, através do pagamento de salários dignos, de sua qualificação e da definição de suas carreiras, garantindo-lhes estabilidade e profissionalização”120

3.2 – Eficiência no serviço público

A eficiência é mais uma dessas noções que, como a moralidade, vista

no item anterior, deve se tornar atributo necessário dos prestadores de serviços

públicos, ou seja, uma qualidade que passou a ser exigida do servidor público

no exercício de seus misteres.

Em começo de reflexão, pode-se recorrer à definição mais genérica,

que é aquela apresentada pelo léxico, de onde extraímos o seguinte

117 BRASIL. Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999. Regula o processo administrativo no âmbito da administração pública federal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9784.htm>. Acesso em: 04 jul. 2010 (grifo meu). 118 Ibidem (grifos meus). 119 KOURY, Suzy Elizabeth Cavalcante. Op. cit., p. 193. 120 Ibidem, p. 193.

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47entendimento de eficiência: “ação, força ou capacidade de produzir bem o

efeito desejado ou realizar bem tarefas; EFICÁCIA.”121; e, ainda, “qualidade ou

capacidade (de alguém, um dispositivo, um método etc.) de ter um bom

rendimento em tarefas ou trabalhos com um mínimo de dispêndio (de tempo,

recursos, energia etc.); PRODUTIVIDADE.”122 Depreende-se daqui que a

noção dicionarística já atribui duas acepções cumulativas à definição de

eficiência.

Para Odete Medauar:

“A eficiência tornou-se uma das idéias-força das reformas administrativas realizadas em inúmeros países a partir da década de 90 do século XX. O vocábulo eficiência liga-se à idéia de ação que leve à ocorrência de resultados de modo rápido e preciso; significa obter o máximo de resultado de um programa a ser realizado, como expressão de produtividade no exercício de atribuições. Eficiência opõe-se a lentidão, a descaso, a negligência, a omissão. Como princípio da Administração Pública, determina que esta deve agir de modo ágil e preciso, para produzir resultados que atendam às necessidades da população.”123

Foi a Emenda Constitucional nº 19, de 04/06/1998 (reforma

administrativa do Estado), que acrescentou o princípio da eficiência aos

princípios da Administração enunciados no caput do art. 37 da Constituição

Federal. Conforme observa Odete Medauar, “na legislação pátria, a eficiência

já aparecera relacionada à prestação de serviços públicos; p. ex., a Lei

8.987/1995 – concessões – caracteriza como serviço adequado o que satisfaz

as condições de regularidade, continuidade, eficiência ...”124

Celso Antônio Bandeira de Mello é um dos críticos implacáveis do

princípio da eficiência. Para o ilustre doutrinador, não haveria nada a ser dito

121 EFICIÊNCIA. In: DICIONÁRIO contemporâneo da língua portuguesa Caldas Aulete (Aulete Digital). AULETE, Francisco Júlio de Caldas; VALENTE, António Lopes dos Santos. Edição brasileira original: Hamílcar de Garcia. Disponível em: <http://www.auletedigital.com.br/>. Acesso em: 04 jul. 2010. 122 Ibidem. 123 MEDAUAR, Odete. O direito administrativo em evolução. 2ª ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 242 (grifos meus). 124 Ibidem, p. 242-243 (grifo no original). A menção da autora refere-se ao § 1º do art. 6º da lei.

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48sobre tal princípio, posto que a expectativa de eficiência é evidente e mais do

que desejável. Ressalta o autor, que “... é juridicamente tão fluido e de tão

difícil controle ao lume do Direito, que mais parece um simples adorno

agregado ao art. 37 ou o extravasamento de uma aspiração dos que buliram no

texto.”125 Prosseguindo em sua análise, polemiza o autor ao afirmar que “... o

fato é que tal princípio não pode ser concebido (entre nós nunca é demais fazer

ressalvas óbvias) senão não intimidade do princípio da legalidade, pois jamais

uma suposta busca de eficiência justificaria postergação daquele que é o dever

administrativo por excelência.”126 Por fim, arremata seu raciocínio, afirmando

que “... este princípio da eficiência é uma faceta de um princípio mais amplo já

superiormente tratado, de há muito, no Direito italiano: o princípio da ‘boa

administração’.”127

Em linha de oposição ao pensamento de Celso Antônio Bandeira de

Mello, Hely Lopes Meirelles considera o princípio da eficiência distinto do da

legalidade, ainda que se possa vislumbrá-lo como complementar a este. Nesse

sentido, preleciona:

“O princípio da eficiência exige que a atividade administrativa seja exercida com presteza, perfeição e rendimento funcional. É o mais moderno princípio da função administrativa, que já não se contenta em ser desempenhada apenas com legalidade, exigindo resultados positivos para o serviço público e satisfatório atendimento das necessidades da comunidade e de seus membros.”128

Aprofundando as considerações acerca do princípio da eficiência, José

dos Santos Carvalho Filho expõe que tal princípio, designado de “qualidade do

serviço prestado” no projeto da Emenda, por ter sido alçado a mandamento

125 MELLO, Celso Antônio Bandeira. Curso de direito administrativo. 12ª ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 92. 126 Ibidem, p. 92. 127 Ibidem, p. 92. 128 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 25ª ed. atual. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 90 (grifos no original).

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49constitucional “... prevê para o futuro maior oportunidade para os indivíduos

exercerem sua real cidadania contra falhas e omissões do Estado.”129

Este autor faz, ainda, esclarecedora distinção entre os sentidos de

eficiência, eficácia e efetividade, asseverando que não se deve confundi-los.

De modo que:

“A eficiência transmite sentido relacionado ao modo pelo qual se processa o desempenho da atividade administrativa; a idéia diz respeito, portanto, à conduta dos agentes. Por outro lado, eficácia tem relação com os meios e instrumentos empregados pelos agentes no exercício de seus misteres na administração; o sentido aqui é tipicamente instrumental. Finalmente, a efetividade é voltada para os resultados obtidos com as ações administrativas; sobreleva nesse aspecto a positividade dos objetivos.”130

3.3 – O controle judicial

Controle judicial é o poder de fiscalização exercido pelos órgãos do

Poder Judiciário sobre os atos administrativos do Executivo, do Legislativo e do

próprio Judiciário quando realiza atividade administrativa. No Brasil adota-se o

sistema da unidade de jurisdição ou sistema de jurisdição única, de modo que

compete exclusivamente ao Poder Judiciário apreciar, com força de coisa

julgada, todo ato de administração praticado por agente de quaisquer órgãos

ou Poderes do Estado.

O fundamento constitucional de adotar-se no Brasil o sistema da

unidade de jurisdição encontra esteio no que dispõe o inciso XXXV do art. 5º

129 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 12ª ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 21. 130 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Op. cit., p. 22 (grifos no original).

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50da Carta Magna, segundo o qual “a lei não excluirá da apreciação do Poder

Judiciário lesão ou ameaça a direito”.131

Trata-se, em regra, de um controle judicial posterior (a posteriori), ou

seja, “depois que os atos administrativos são produzidos e ingressam no

mundo jurídico é que o Judiciário atua para, a pedido dos interessados,

examinar a legalidade, ou não, dos atos.”132

Entretanto, há situações especiais que admitem um controle prévio

pelo Judiciário (a priori). Conforme lição de José dos Santos Carvalho Filho,

“esse controle, porém, não deve ser entendido como uma forma de o Judiciário

fazer averiguação prévia de tudo o que está a cargo da Administração, mas sim

como o meio de evitar que direitos individuais ou coletivos sejam

irreversivelmente ofendidos, vale dizer, sem que haja a possibilidade de o

ofendido ver restaurada inteiramente a legalidade.”133 Isto ocorre pelo que se

infere da própria dicção do inciso XXXV do art. 5º, onde é expressa a garantia

do indivíduo contra lesão ou ameaça de lesão a direito. Prossegue o autor

esclarecendo que, para esse fim, ou seja, para fim de controle prévio ou a

priori, “as leis processuais prevêem a tutela preventiva, ensejando a

possibilidade de o juiz sustar os efeitos de atos administrativos através de

medidas preventivas liminares, quando presentes os pressupostos da

plausibilidade do direito (fumus boni iuris) e o risco de haver lesão irreparável

pelo decurso do tempo (periculum in mora).”134

Mas a apreciação pelo Poder Judiciário dos atos da Administração

encontra alguns limites, isto porque o controle judicial deve ater-se somente à

legalidade. Maria Sylvia Zanella Di Pietro inclui também o controle pelo 131 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 05 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao.htm>. Acesso em: 04 jul. 2010 (grifos meus). 132 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Op. cit., p. 921. 133 Ibidem, p. 921. 134 Ibidem, p. 921 (grifos no original).

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51aspecto da moralidade, segundo o disposto no art. 5º, inciso LXXIII, da

Constituição, no que tange à possibilidade de qualquer cidadão propor ação

popular, visando a anular ato lesivo à moralidade administrativa.135

A apreciação pelo Judiciário não pode invadir a esfera do mérito

administrativo, ou seja, na análise da legalidade não há que se ter em conta os

critérios de oportunidade e conveniência adotados pela Administração. E como

pacífica é a doutrina nesta questão, vale trazer à colação a lição de ilustres

administrativistas. Para Di Pietro, “quanto aos atos discricionários, sujeitam-se

à apreciação judicial, desde que não se invadam os aspectos reservados à

apreciação subjetiva da Administração Pública, conhecidos sob a denominação

de mérito (oportunidade e conveniência)”136; já pelo magistério de José dos

Santos Carvalho Filho, temos que “o que é vedado ao Judiciário, como

corretamente têm decidido os Tribunais, é apreciar o que se denomina

normalmente de mérito administrativo, vale dizer, a ele é interditado o poder

de reavaliar critérios de conveniência e oportunidade dos atos, que são

privativos do administrador público.”137

Em conclusão, passa-se a citar os meios de controle judicial pelos

quais se pode intentar a correção da conduta administrativa, que podem ser

divididos em meios específicos e meios inespecíficos. Os inespecíficos são os

vários tipos de ações previstos na legislação ordinária para impugnar os atos

da Administração, tais como: as ações ordinárias, de indenização,

possessórias, reivindicatórias, de consignação em pagamento, a nunciação de

obra nova, cautelares etc. Como meios específicos temos as ações com

natureza de garantia dos direitos fundamentais, conhecidas pela denominação

de remédios constitucionais, sendo eles: o habeas corpus, o habeas data, o

mandado de segurança individual e coletivo, o mandado de injunção, a ação

135 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 18ª ed. São Paulo: Atlas, 2005, p. 654 (grifos meus). 136 Ibidem, p. 654 (grifo no original). 137 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Op. cit., p. 920 (grifos no original).

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52popular e o direito de petição. Tem-se, ademais, a ação civil pública que,

apesar de nem sempre exigir a presença do Estado ou de alguma de suas

autoridades, nem estar prevista no artigo 5º da Constituição, não deixa de ser

um meio específico de controle judicial, servindo à mesma finalidade, quando o

ato lesivo seja praticado pela Administração.

Por fim, não se pode deixar de citar as seguintes ações especiais ou

específicas para enfrentar atos ou omissões da autoridade pública: a ação

direta de inconstitucionalidade, a ação de inconstitucionalidade por omissão, a

ação declaratória de constitucionalidade e a argüição de descumprimento de

preceito fundamental.

3.4 – O controle administrativo (PAD – Processo Administrativo

Disciplinar)

O processo administrativo disciplinar ou simplesmente PAD, é o meio

de controle que a Administração Pública utiliza com relação a seus servidores,

ou melhor, “é o meio de apuração e punição de faltas graves dos servidores

públicos e demais pessoas sujeitas ao regime funcional de determinados

estabelecimentos da Administração.”138

A definição de Hely Lopes Meirelles sofre críticas de José dos Santos

Carvalho Filho, para quem “processo administrativo-disciplinar é o instrumento

formal através do qual a Administração apura a existência de infrações

praticadas por seus servidores e, se for o caso, aplica as sanções

adequadas.”139

138 MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit., p. 638 (grifos meus). 139 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Op. cit., p. 896.

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A discordância de Carvalho Filho cinge-se ao fato de que o objeto do

PAD consiste na averiguação de alguma infração funcional do servidor público,

independentemente do nível de gravidade. Nesse sentido, é oportuno de se

trazer à balha as anotações do autor relacionadas à divergência:

“O processo serve tanto para as faltas graves como para as leves, pois que é preciso considerar que a apuração é que vai levar à conclusão sobre a maior ou menor gravidade da falta. Por esse motivo é que entendemos que o art. 41, § 1º, da CF, que dispõe que o servidor estável só perderá o cargo por força de sentença judicial ou de processo administrativo com ampla defesa, apenas se refere ao processo administrativo para indicar a alternativa com a sentença judicial. O dispositivo tem que ser interpretado em consonância com o princípio da ampla defesa e do contraditório, previsto no art. 5º, LV, da CF. A não ser assim, haveria o risco de se considerar que apenas para a perda do cargo seria necessário o processo administrativo com ampla defesa, quando, na verdade, é ele exigível para qualquer tipo de infração funcional.”140

Sublinha, ainda, Carvalho Filho, que a base normativa do PAD reside

nos estatutos funcionais dos diversos entes da Federação, posto que cada um

desses entes (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) tem autonomia

para, em seus estatutos funcionais, instituir as regras do processo disciplinar,

ficando tal liberdade limitada apenas pelos mandamentos constitucionais.141

Importante frisar também que, quando se busca um exemplo ou base de

consulta sobre estatuto de servidores, comumente a doutrina se refere à Lei nº

8.112/90, que é o Estatuto dos Servidores Civis da União. No entanto, esse

diploma se aplica somente aos processos disciplinares relacionados aos

servidores federais, devendo-se, portanto, no caso dos outros entes da

Federação, buscar-se o regramento próprio de seus estatutos para o devido

entendimento da dinâmica processual atinente. Para a presente análise sobre o

PAD, tomar-se-á por referência o estatuto dos servidores federais, ou seja, a

Lei nº 8.112/90.

140 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Op. cit., p. 897 (grifos no original). 141 Ibidem, p. 897.

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54O PAD é obrigatório (art. 41, § 1º, II, Constituição) sempre que a pena

aplicada culmine com a perda do cargo para o servidor estável. Hely Lopes

Meirelles assinala que a jurisprudência tem entendido que o PAD também é

obrigatório para o servidor efetivo, ainda que em estágio probatório.142 Além

disso, dispõe o art. 146 da Lei nº 8.112/90 que o PAD será sempre exigido nos

casos de suspensão por mais de 30 dias, demissão, cassação de

aposentadoria ou disponibilidade e destituição de cargo em comissão. Observa

Di Pietro que o Decreto-lei nº 200, de 25/02/1967, que versa sobre a Reforma

Administrativa federal, exige o PAD “para demissão ou dispensa do servidor

efetivo ou estável, comprovadamente ineficiente no desempenho dos

encargos que lhe competem ou desidioso no cumprimento de seus

deveres.”143

O PAD é realizado por comissão disciplinar (comissão processante)144,

podendo ser especial ou permanente145, composta por três servidores estáveis,

sob a presidência de um deles, sendo que este deve ter categoria igual ou

superior à do indiciado (art. 149, Lei nº 8.112/90). Tal procedimento visa não

quebrar o princípio hierárquico e assegurar a imparcialidade na instrução do

processo, tudo conforme obediência ao princípio da ampla defesa. Ressalta Di

Pietro que, com a finalidade de se garantir a imparcialidade de tal comissão,

“tem-se entendido, inclusive na jurisprudência, que os integrantes da comissão

devem ser funcionários estáveis e não interinos ou exoneráveis ad nutum.”146

Desenrola-se o PAD em três fases: instauração, inquérito e julgamento

(art. 151). Pela lição de Di Pietro, cinco são as fases, a saber: “instauração,

instrução, defesa, relatório e decisão.”147 Isto ocorre porque, na verdade, a fase

142 MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit., p. 639 (grifo no original). 143 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. cit., p. 557 (grifos no original). 144 Ibidem, p. 557. 145 MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit., p. 639. 146 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. cit., p. 557 (grifos no original). 147 Ibidem, p. 558.

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55do inquérito que a lei se refere compreende a instrução, a defesa e o relatório,

e a fase do julgamento equivale à fase da decisão, aludida pela autora.

Inicia-se o PAD a partir da ciência da autoridade acerca de

irregularidade cometida pelo servidor, quando então aquela ficará obrigada a

instaurar sindicância ou processo disciplinar (art. 143). Portanto, o processo

tem início com o despacho da autoridade competente, que age de ofício,

considerando-se o princípio da oficialidade. A instauração efetiva-se com a

publicação do ato que constituir a comissão (art. 151, I). No dizer de Di Pietro,

tal ato reveste-se da forma de portaria148; no entanto, nada impede que o ato

receba denominação diversa, posto que, como observa Carvalho Filho, “o que

interessa é verificar seu conteúdo indicativo da vontade administrativa de

deflagrar o processo.”149

A partir da publicação do ato que inaugura o PAD, dá-se

prosseguimento às demais fases previstas no art. 151, incisos II e III. A

instrução é regida pelos princípios da oficialidade e do contraditório, sendo este

essencial à garantia da ampla defesa; passa-se à fase de defesa, momento

apropriado para a apresentação das razões escritas, podendo o servidor

indiciado atuar pessoalmente ou com o auxílio de advogado; terminada a

defesa, chega o momento da comissão apresentar o relatório, que deve

concluir pela absolvição ou pela aplicação de penalidade, ressaltando-se que a

conclusão da comissão tem caráter opinativo, não vinculando a autoridade

julgadora, que poderá, fundamentadamente, apresentar conclusão diversa; por

fim, a decisão, a ser proferida pela autoridade julgadora, que poderá concordar

com o relatório da comissão ou discordar do mesmo “para impor pena não

pedida, minorar, agravar ou excluir a responsabilidade do acusado”150, sempre

observando-se a devida motivação, sem a qual o processo tornar-se-ia nulo,

148 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. cit., p. 558 (grifo no original). 149 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Op. cit., p. 902, nota 97. 150 MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit., p. 640.

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56deixando de ser procedimento disciplinar legítimo e convertendo-se em

arbitrário, tendo em vista a possibilidade de controle pelo Judiciário.

Além do processo administrativo disciplinar pode a Administração

lançar mão do processo sumário, também denominado de meio sumário. O

processo sumário, pelo prisma de Hely Lopes Meirelles, tem o objetivo de

promover “a elucidação preliminar de determinados fatos ou aplicação de

penalidades disciplinares menores ou comprovadas na sua flagrância”.151 Não

obstante a objetiva definição de Hely Lopes Meirelles, temos a clássica

definição de sindicância por José Crettela Júnior:

“é o meio sumário de que se utiliza a Administração Pública, no Brasil, para, sigilosa ou publicamente, com indiciados ou não, proceder à apuração de ocorrências anômalas no serviço público, as quais, confirmadas, fornecerão elementos concretos para a imediata abertura de processo administrativo contra o funcionário público responsável”.152

Pela definição de Cretella Jr., a sindicância seria “uma fase preliminar à

instauração do processo administrativo; corresponderia ao inquérito policial que

se realiza antes do processo penal.”153

Depreende-se do conteúdo da Lei nº 8.112/90 que a sindicância

contempla a apuração de irregularidade (art. 143), podendo resultar em

arquivamento do processo, aplicação de penalidade de advertência ou

suspensão de até 30 dias e instauração de processo disciplinar (art. 145,

incisos I a III).

Há, ainda, como meio sumário, o princípio conhecido em doutrina como

verdade sabida. Tal princípio é clássico na doutrina de Hely Lopes Meirelles.154

151 MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit., p. 641. 152 CRETELLA JÚNIOR, José. Dicionário de direito administrativo. Rio de Janeiro: Forense, 1980, p. 494, apud CARVALHO FILHO, José dos Santos. Op. cit., p. 898, nota 86. 153 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. cit., p. 559. 154 MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit., p. 641.

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57Verdade sabida é o conhecimento pessoal e direto da infração pela autoridade

competente para punir o infrator. Esse meio só é passível de aplicação para

penalidades que não exijam processo administrativo disciplinar. Encontra

previsão no art. 271, parágrafo único, do Estatuto paulista, porém, quanto ao

Estatuto federal (Lei nº 8.112/90), não tem aplicação, por falta de previsão no

aludido diploma. Entretanto, esse dispositivo não mais prevalece, em qualquer

que seja o regime estatutário, pois vai de encontro à norma constitucional do

art. 5º, LV, que exige o contraditório e a ampla defesa nos processos

administrativos.

3.5 – O controle do Tribunal de Contas

O Tribunal de Contas, órgão integrante do Congresso Nacional, tem

sua competência prevista nos artigos 70 a 75 da Constituição Federal. Sua

missão constitucional é auxiliar o Legislativo no controle externo da

Administração Pública. Tal controle, de caráter político, estabelece-se pela

fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da

União e da administração direta e indireta, considerando-se a legalidade, a

legitimidade, a economicidade, a aplicação das subvenções e a renúncia de

receitas.

As atribuições confiadas ao Tribunal de Contas são inúmeras.

Observando-se a competência estabelecida constitucionalmente no art. 71,

incisos I a XI e §§ 1º a 4º, verifica-se, por exemplo, que compete à Corte de

Contas: a) apreciar as contas do Presidente da República mediante parecer

prévio; b) julgar as contas dos administradores e responsáveis por dinheiros,

bens e valores públicos da Administração, bem como das contas que derem

causa a perda, extravio ou prejuízo ao erário público; c) fiscalizar a aplicação

de quaisquer recursos repassados pela União mediante convênio, acordo,

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58ajuste ou outros instrumentos congêneres, a Estado, ao Distrito Federal ou a

Município; etc.

Pela lição de Hely Lopes Meirelles, as atividades dos Tribunais de

Contas do Brasil consubstanciam-se fundamentalmente em “funções técnicas

opinativas, verificadoras, assessoradoras e jurisdicionais administrativas,

desempenhadas simetricamente tanto pelo TCU quanto pelos Estados-

membros, do Distrito Federal e dos Municípios que os tiverem (presentemente,

só o Município de São Paulo e o do Rio de Janeiro os têm).”155

Esclarece-nos José dos Santos Carvalho Filho que as funções básicas

dos Tribunais de Contas em geral são as dispostas no art. 71 da Constituição,

apesar de tais normas serem aplicáveis diretamente ao Tribunal de Contas da

União, significando dizer que, em observância ao princípio da simetria

constitucional, as demais Cortes de Contas não podem incluir em sua

competência funções não mencionadas na Constituição Federal.156

Ressalta Hely Lopes Meirelles que a atuação dos Tribunais de Contas

deve ser a posteriori, ou seja, não cabe controle prévio sobre os atos ou

contratos da Administração, ressalvadas as inspeções e auditorias in loco, que

podem ocorrer a qualquer tempo.157

Quanto à atribuição prevista no inciso II do art. 71, segundo a qual o

Tribunal de Contas tem competência para julgar as contas dos

administradores e responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos da

Administração, destaca José dos Santos Carvalho Filho que o termo julgar não

tem o sentido típico da função jurisdicional, mas sim o de apreciar, examinar,

155 MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit., p. 647 (grifos no original). 156 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Op. cit., p. 914-915. 157 MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit., p. 647 (grifos no original).

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59analisar as contas, porque a função exercida pelo Tribunal de Contas na

hipótese é de caráter eminentemente administrativo.158

O autor aponta que tal observação decorre da clássica posição de José

Cretella Júnior, que anota:

“As decisões do Tribunal de Contas não são decisões judiciárias, porque ele não julga. Não profere julgamento nem de natureza cível, nem de natureza penal. As decisões proferidas dizem respeito à regularidade intrínseca da conta, e não sobre a responsabilidade do exator ou pagador ou sobre a imputação dessa responsabilidade”.159

158 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Op. cit., p. 914 (grifos no original). 159 CRETELLA JÚNIOR, José. Manual de direito administrativo. P. 49, apud CARVALHO FILHO, José dos Santos. Op. cit., p. 914, nota 121.

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CONCLUSÃO

O estudo empreendido nessa pesquisa possibilitou a tomada de

consciência para tema de sumo interesse à sociedade brasileira, qual seja a

relação do indivíduo com a coisa pública, consubstanciada pelo vínculo jurídico

funcional formado entre o servidor público e a Administração, bem como a

contrapartida que se espera e se exige de tal agente na prestação de seus

serviços à sociedade.

O objetivo inicial desse trabalho foi alcançado satisfatoriamente no que

atinente à disciplina jurídica de que o tema contempla. Foi possível estabelecer

o sentido conceitual de Ética e Direito, bem como demonstrar a íntima relação

entre tais conceitos, concluindo-se que o Direito não se realiza, não em sua

plenitude, sem Ética.

Ademais, no prosseguimento do estudo, pôde-se desenvolver os vários

aspectos que compõem a disciplina do Serviço Público, tais como o conceito, a

definição, a classificação, a evolução histórica e a normatização de tal instituto

no contexto brasileiro.

Na parte final do trabalho procurou-se focar na importância que o agir

ético do servidor público tem no Serviço Público, buscando-se demonstrar

como a Constituição Federal e as normas infraconstitucionais balizam a

aferição desse agir, dessa conduta que se almeja do servidor público. Para

tanto, foram abordados os princípios constitucionais da moralidade, da

probidade administrativa e da eficiência, bem como os meios de controle a que

os agentes públicos e a Administração se sujeitam (controle judicial, controle

administrativo via processo administrativo disciplinar e o controle do Tribunal de

Contas).

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61Constata-se que a realidade brasileira tem muito a ser transformada

quanto à conscientização do servidor público para a nobre função que exerce

e, por outro lado, a sociedade também necessita assumir seu papel na

reivindicação da qualidade e eficiência dos serviços públicos prestados pelo

Estado e seus agentes.

Mas nem tudo está perdido. Iniciativas positivas como a edição do

Código de Ética do Poder Executivo Federal (1994) e a inclusão do Princípio da

Eficiência aos princípios constitucionais e da Administração Pública por meio

da EC nº 19/98, demonstram a intenção do legislador e do governo em incitar a

formação de uma nova cultura no Serviço Público, onde a Ética passe a ser

observada como regra e a eficiência ganhe seu verdadeiro sentido de

“presteza, perfeição e rendimento funcional” (MEIRELLES, 2000, p. 90).

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BIBLIOGRAFIA

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AULETE, Francisco Júlio de Caldas; VALENTE, António Lopes dos Santos.

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ÍNDICE

FOLHA DE ROSTO 2

AGRADECIMENTOS 3

DEDICATÓRIA 4

RESUMO 5

METODOLOGIA 6

SUMÁRIO 7

INTRODUÇÃO 8

CAPÍTULO I

ÉTICA E DIREITO 9 1.1 – Ética: conceito 9 1.2 – Ética: objeto e definição 9 1.3 – Ética e Direito 11 1.4 – A “virada kantiana” 16 1.5 – O pós-positivismo e a introdução de valores éticos no ordenamento

jurídico 17

CAPÍTULO II

SERVIÇO PÚBLICO 23 2.1 – Noção de Serviço Público 23 2.2 – Conceito de Serviço Público 25 2.3 – Definição de Serviço Público 27 2.4 – Classificação de Serviço Público 31 2.5 – Evolução histórica no Brasil 33 2.6 – A normatização no Brasil 36

CAPÍTULO III

ÉTICA NO SERVIÇO PÚBLICO 41 3.1 – Moralidade e probidade administrativa 41 3.2 – Eficiência no serviço público 46 3.3 – O controle judicial 49 3.4 – O controle administrativo (PAD – Processo Administrativo

Disciplinar) 52

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653.5 – O controle do Tribunal de Contas 57

CONCLUSÃO 60

BIBLIOGRAFIA 62

ÍNDICE 64

FOLHA DE AVALIAÇÃO 66

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FOLHA DE AVALIAÇÃO

Nome da Instituição: Universidade Candido Mendes

Pós-graduação Lato Sensu

Instituto A Vez do Mestre

Título da Monografia: Ética no Serviço Público

Autor: Anderson Braga de Oliveira

Data da entrega:

Avaliado por: Conceito: