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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” FACULDADE INTEGRADA AVM A MATERNAGEM NO PROCESSO DE APRENDIZAGEM INFANTIL: um olhar da psicopedagogia Por: Isabella Nunes Valente Orientador Prof. Marcelo Saldanha Rio de Janeiro 2012

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

FACULDADE INTEGRADA AVM

A MATERNAGEM NO PROCESSO DE APRENDIZAGEM

INFANTIL: um olhar da psicopedagogia

Por: Isabella Nunes Valente

Orientador

Prof. Marcelo Saldanha

Rio de Janeiro

2012

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

FACULDADE INTEGRADA AVM

A MATERNAGEM NO PROCESSO DE APRENDIZAGEM

INFANTIL: um olhar da psicopedagogia

Apresentação de monografia à Universidade

Candido Mendes como requisito parcial para

obtenção do grau de especialista em

Psicopedagogia

Por: Isabella Nunes Valente

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AGRADECIMENTOS

A minha mãe

À Deus

Ao orientador Marcelo Saldanha

A Mônica Melo

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DEDICATÓRIA

À minha mãe Vera Nunes por seu

apoio, amor e dedicação.

Ao meu pai (em memória)

Aos meus amigos

Ao Jo-fi

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Poema

Eu hoje tive um pesadelo e levantei atento, a tempo Eu acordei com medo e procurei no escuro

Alguém com seu carinho e lembrei de um tempo Porque o passado me traz uma lembrança

Do tempo que eu era criança E o medo era motivo de choro

Desculpa pra um abraço ou um consolo Hoje eu acordei com medo mas não chorei

Nem reclamei abrigo Do escuro eu via um infinito sem presente

Passado ou futuro Senti um abraço forte, já não era medo

Era uma coisa sua que ficou em mim, que não tem fim De repente a gente vê que perdeu Ou está perdendo alguma coisa

Morna e ingênua Que vai ficando no caminho

Que é escuro e frio mas também bonito Porque é iluminado

Pela beleza do que aconteceu Há minutos atrás

Cazuza (autor) Ney Matogrosso (interprete)

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RESUMO

Esse trabalho visa abordar o processo de maturidade do ego e

desenvolvimento emocional na visão de Winnicott, abordando a importância

dos cuidados iniciais que a mãe deverá ter com o seu bebê e como esses

cuidados são fundamentais para o desenvolvimento do mesmo ao entrar no

ambiente escolar. Além desse teórico do âmbito da psicanálise, teremos a

utilização de teóricos que estão em sintonia com a teoria Psicopedagógica

como Bossa, Porto para o auxilio das exposições das ideias desse trabalho.

Com isso valorizamos também a importância do olhar da

psicopedagogia na escola, abordando a importância da análise tanto da família

quanto para com os alunos, buscando observar e analisar se os problemas de

aprendizagem apresentados pelos alunos estão na ordem cognitiva ou física,

ou se estão no nível família, ou seja, observar como está o contexto da família

dos alunos para podermos melhor estudar e ajudar os mesmos a se

desenvolver. Para tal também é importante que psicopedagogo conheça a

instituição, verificando a sua demanda e as caraterísticas institucionais e do

seu corpo docente, para que não corremos o risco de patologizar

indiscriminadamente os alunos, fazendo os encaminhamentos necessários

tanto dos alunos que verdadeiramente podem estar com problemas de

aprendizagem, quanto dos alunos que estão com problemas emocionais e

estruturais no âmbito familiar.

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METODOLOGIA

Os métodos que utilizamos para realizar esse trabalho foram baseados

em pesquisas bibliográficas com utilizações de livros que se encontravam em

sintonia com os temas propostos.

A pesquisa bibliográfica foi levantada devido ao olhar para as crianças

que não apresentam nenhum problema de aprendizagem, porém acabam se

enquadrando nesse diagnóstico devido à presença de sintomas, que na

verdade podem estar direcionados a fatores familiares. Buscamos observar e

estudar como a falta de um olhar atencioso, e cuidador para com as crianças

pode prejudicar o seu desenvolvimento e como uma sociedade baseada em

sistemas vazios de relacionamento pode interferir na aprendizagem dos alunos.

Veremos também as dificuldades e os perigos dos enquadres

sintomáticos, onde todos apresentam algum quadro diagnóstico grave, e como

o psicopedagogo poderá ajudar nesse processo olhando para a criança e para

a instituição se possibilitando tanto os enquadres necessários. Para

verificarmos sobre a importância desse trabalho utilizamos bibliografias de

autores que possibilitaram o pensamento da importância desses

questionamentos acima citados.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 09 CAPÍTULO I - Noções básicas sobre maternagem e desenvolvimento do ego 11 CAPÍTULO II - A família e a formação dos Vínculos 23 CAPÍTULO III – O Psicopedagogo e seu olhar para o novo dilema: patologizar ou cuidar... Eis a questão. 32 CONCLUSÃO 41 BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 42 ÍNDICE 44 FOLHA DE AVALIAÇÃO 46

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem o intuito de abordar a importância do olhar que

o psicopedagogo necessitará apresentar dentro do ambiente escolar para

melhor análise da problemática do aluno. No sentido de estimular que haja um

pensamento ao nos depararmos com um problema de aprendizagem, no

sentido de que ao invés de patologizar aleatoriamente qualquer que seja o

caso, podermos sempre olhar para dentro de uma estrutura multifatorial e

analisarmos se o problema de aprendizagem esta relacionada a alguma

patologia ou dificuldade física como a dislexia, por exemplo. Mas também

podermos pensar se o problema esta na verdade relacionado a um problema

no âmbito institucional ou familiar, já que teremos o auxilio teórico da

abordagem psicanalítica para nos auxiliar na ponderação da importância da

família na rede estrutural da criança.

No capítulo inicial, veremos a teoria de Donald Winnicott sobre o

desenvolvimento emocional, faremos neste uma breve apresentação da teoria

deste autor para a impressão dos aspectos pertinentes ao processo da

maternagem. Ainda neste capítulo, serão apresentados os conceitos de

ambiente suficientemente bom, mãe suficientemente boa, preocupação

materna primária. Além das funções como holding, handing, faremos uma

breve apresentação sobre o conceito de apresentação dos objetos que são os

cuidados tanto na esfera física como na esfera psíquica e que permitem o

desenrolar dos processos de maturação da criança. Abordaremos também,

conceitos e a importância do papel da mãe no processo que vai da

dependência do bebê até a independência, que para este Winnicott nunca será

absoluta.

No capítulo II faremos iremos focar na importância do olhar que o

psicopedagogo fará dentro da família e seus traçados teóricos por isso é

importante que se conheça a história da mesma, seu sistema sociocultural, ou

seja, precisamos ao entrar na escola e ao se deparar com uma criança com

dificuldades de aprendizagem, precisamos verificar e olhar para o interior

dessas famílias para podermos melhor entender os contextos de vida que a

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criança está vivenciando e “como” esses contextos “podem” prejudicar o

aprendizado da mesma.

No capítulo III veremos primeiramente um breve histórico sobre a

profissão da psicopedagogia, ou seja, abordaremos as origens históricas, os

países onde surgiram os primeiros estudos sobre o tema dos problemas de

aprendizagem. Posteriormente falaremos sobre a entrada do psicopedagogo

na escola, e como este estruturará uma análise contextual dos problemas que

poderão ser observados, tanto no âmbito institucional, quanto no nível dos

alunos e professores. Justamente, como já fora mencionado, para evitar um

excesso de diagnósticos equivocados sem que conheça os diferentes

contextos e situações que os alunos se encontram.

Por isso veremos a importância que o psicopedagogo tem dentro do

contexto institucional no sentido da melhoria da aprendizagem dos alunos no

seu contexto biopsicossocial. Visando tanto a melhoria da instituição, quanto do

auxilio as famílias dos alunos, que em muitas ocasiões se sentem “perdidas”,

sem saber como agir com seus filhos. Por isso a presença do psicopedagogo

será vital para o pensamento e estruturação dessa observação e análise.

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CAPÍTULO I

NOÇÕES BÁSICAS SOBRE MATERNAGEM E

DESENVOLVIMENTO DO EGO

“Por muito tempo achei que a ausência é falta. E lastimava ignorante, a falta.

Hoje não a lastimo. Não há falta na ausência.

A ausência é um estar em mim. E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços,

que rio e danço e invento exclamações alegres, porque a ausência, essa ausência assimilada,

ninguém a rouba mais de mim”. Ausência – Carlos Drummond de Andrade.

Criando uma estratégia de pensamento sobre as dificuldades de

aprendizagem, podemos criar um paralelo com a teoria de Winnicott sobre os

processos de amadurecimento emocional e a maternagem, pois, para que haja

a facilitação do processo de aprendizagem é necessário que haja “afeto”,

sentimento este que é a matriz da teoria winnicottiana. Observamos que a

partir do desenvolvimento de uma boa maternagem e do desenvolvimento do

ego a criança, na maioria dos casos, conseguirá construir novos vínculos,

inclusive com os vínculos educacionais, com os estudos, professores.

A experiência de Winnicott foi como pediatra e psicanalista este

trouxe importantes contribuições à teoria psicanalítica. Ele dedicou sua vida

e obra a estudar crianças e bebês que se encontravam em perfeita saúde

física, investigando os “porquês” de estarem emocionalmente doentes.

Apontava também que a maior parte dos problemas emocionais da fase

adulta tinha sua origem em etapas precoces do desenvolvimento do ego.

Para o aprimoramento dos seus estudos Winnicott, focou grande parte dos

seus trabalhos na relação existente entre a mãe e seu bebê.

Winnicott não aboliu o pensamento freudiano, mas buscou um estilo

próprio e inovador. Bleichmar (1992), em seu livro “A Psicanálise depois de

Freud” fazendo um aporte sobre essa diferença entre os autores diz que:

Para Freud, a base dos conflitos humanos deve-se à luta entre as pulsões e a cultura, entre o Id, Ego e Superego. Winnicott, [...],

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pensa que os problemas psicológicos se iniciam com o vínculo entre o recém-nascido e a mãe. Quando tudo depende da mãe ser ou não adequada, de poder se aproximar do bebê, sustentá-lo, personalizá-lo e ajudá-lo a amadurecer. A conflitiva edípica, ainda que não seja rechaçada, é secundária, em grande parte, à forma como evoluem os vínculos diádicos. A base da estabilidade mental depende das experiências iniciais com a mãe e, principalmente, de seu estado emocional. Winnicott pensa que seus achados são pertinentes para determinar patologias e que a teoria freudiana, baseada no complexo de Édipo ou no de castração, continua a ser completamente válida para as neuroses. (BLEICHMAR, 1992, p. 241, 242).

Winnicott afirmava que no processo de desenvolvimento emocional

existem aspectos que devem ser considerados como a hereditariedade e o

ambiente. Com a hereditariedade Winnicott queria demonstrar que o bebê

traz consigo tendências hereditárias, que incluem os processos de

maturação, ou seja, o bebê tem uma tendência inata ao amadurecimento do

ego. Para uma integração deste, independentemente da sua situação física

e /ou patológica, já que isso é um impulso biológico para a vida, incluindo

seu crescimento e desenvolvimento do ego. Porém, apesar de existir

fisicamente uma criança, esta não se reconhece, não reconhece os outros

(mãe, pai ou familiares) e nem o mundo que a rodeia; essa não-integração

do ego não é uma deficiência da pessoa, e sim um estágio de imaturidade

do bebê onde não existe a unidade dos núcleos do mesmo se encontrando

em um estado de dispersão.

1.1. Considerações sobre o Processo Dependência Absoluta a

Independência.

Seguindo a teoria de Winnicott, explicaremos em breves palavras o

significado analítico do processo de maturação ou amadurecimento do ego e

seus desdobramentos teóricos, faremos isso, pois para este psicanalista as

bases da saúde mental de qualquer pessoa são amoldadas no período

correspondente à primeira infância e este processo se dá pela atuação mãe,

através do meio ambiente fornecido por esta, ou seja, o que podemos nomear

de “saúde psíquica” estaria ligada ao livre desenrolar dos processos de

maturação do ego.

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Este processo vai da dependência absoluta do lactante à

independência, possuindo neste percurso três etapas distintas: a primeira

seria a dependência absoluta, a segunda seria a dependência relativa e a

terceira seria a independência, enfatizando por sua vez que ela nunca é

absoluta.

Compreendemos que a fase da Dependência Absoluta corresponde

aproximadamente aos seis primeiros meses aproximadamente do bebê onde

este se encontra como o próprio nome diz totalmente dependente da mãe ou

do seu substituto, ou seja, o bebê nessa fase está indiferenciado de sua

mãe, necessitando desta quase da mesma forma que na fase intrauterina. O

bebê é, inicialmente, completamente dependente da mãe a quem cabe

protegê-lo das circunstâncias internas, como fome e sede, e das externas,

como calor ou frio demasiados. Os bebês só iniciam o processo de

desenvolver uma “persona” com a ajuda de uma mãe devotada, que se

identifique verdadeiramente com o filho, podendo assim atender as suas

necessidades.

No estágio de dependência absoluta [...] é necessário não pensar no bebê como uma pessoa que sente fome, e cujos impulsos instintivos podem ser satisfeitos ou frustrados, e sim como um ser imaturo que está continuamente a pique de sofrer uma ansiedade inimaginável. Esta ansiedade inimaginável é evitada por esta função vitalmente importante da mãe neste estágio, sua capacidade de se pôr no lugar do bebê e saber o que ele necessita no cuidado geral de seu corpo e, por consequência, de sua pessoa. (WINNICOTT, 1962, p. 56, grifo do autor).

Podemos dizer que o ego de uma pessoa é inicialmente um grande

quebra-cabeça desmontado (desintegrado), ou seja, os núcleos que

correspondem ao ego estão dispersos. Para o bebê não há diferenciação /

separação entre o “eu”, “não-eu” e o “meio externo”, ou seja, ele se percebe

em uma unidade com o ambiente, estando fusionado com sua mãe.

Entendemos aqui a noção de ambiente não apenas como o meio externo,

mas sim também a mãe, já que para o bebê, esta também faz parte do seu

ambiente. Consequentemente nas fantasias dessa fase vigora-se um

sentimento de onipotência com relação aos objetos, pois ele percebe que os

mesmos são parte dele, como se fosse sua propriedade, e o bebê acaba

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vivendo através deles. No seu livro intitulado “A Teoria do Amadurecimento

de D. W. Winnicott” Elsa O. Dias complementa:

A dependência absoluta refere-se ao fato de o bebê depender inteiramente da mãe para ser - do modo como é, como pode ser, nesse momento inicial - e para realizar a tendência inata à integração em uma unidade. O relacionamento peculiar com a mãe, na dependência absoluta dos estágios iniciais, fornece um padrão para as relações que o bebê venha a desenvolver com a realidade externa. É no interior desse relacionamento que está sendo construída a ilusão do contato com o mundo externo, a confiança de que comunicação inter-humana é possível e de que a vida faz sentido. (DIAS, 2003, p. 130).

Para o bebê a finalidade da fase de dependência absoluta é a

integração dos núcleos do ego e a personalização, isto é, adquirir a

sensação de que o corpo aloja o verdadeiro self. No entanto o crescimento

físico e emocional depende também, para a sua realização, de um ambiente

propicio para tal, o que Winnicott denomina de ambiente de facilitação cujo

objetivo é a adaptação às necessidades dos bebês que se originam nos

processos de amadurecimento emocional.

Com o passar do tempo, na medida em que forem formados os

vínculos iniciais com seu bebê, a mãe conseguirá perceber as necessidades

da criança e se permitirá satisfaze-las, suprindo-as, na medida das suas

possibilidades. Esta irá desempenhar com a criança o que Winnicott nomeia

de um Ambiente Suficientemente Bom, ou seja, segundo este autor, a mãe

que se permite exercer a preocupação materno primária é uma “mãe

suficientemente boa”, ou seja, é aquela que favorece a ilusão de onipotência

do seu filho, reafirmando a ideia de que ele criou o seio; somente aos

poucos na medida em que seu bebê for se desenvolvendo é que a mãe vai

desiludindo o seu bebê.

Os cuidados maternos primários pertinentes às suas necessidades,

para possibilitar-lhe viver (no sentido físico de alimentação e cuidados com a

higiene) e se desenvolver. Nesse momento o bebê e sua mãe (juntamente

com os cuidados que ela exerce) formam uma só unidade, “um só ego”, e ali

a mãe deveria dispor de uma condição de suportar vivenciar uma espécie de

“doença” essencial para o desenvolvimento do seu filho: uma simbiose

temporária com seu bebê, para ser capaz de bem interpretá-lo e atendê-lo, e

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que Winnicott nomeia “preocupação materno primária”. Porém, não é

necessariamente dessa maneira que a relação mãe-bebê acontece, e

algumas mães não apresentam essa condição interna para receber o seu

filho.

Gostaria de dar a este estado especial da mãe um nome especial, porque acho que a sua importância não tem sido apreciada. As mães se recuperam desse estado e se esquecem. Eu denomino isso “preocupação materna primária”. Este não é necessariamente um bom nome, mas o certo é que ao chegar ao fim da gravidez e nas primeiras semanas depois do nascimento de uma criança a mãe está preocupada com (ou melhor “devotada ao”) o cuidado de seu nenê, que de inicio parece ser parte dela mesma; além disso ela está muito identificada com o nenê e sabe muito bem como é que o nenê está se sentindo. Para isso ela usa suas próprias experiências como bebê. Deste modo a própria mãe está em um estado dependente, e vulnerável. É para descrever este estágio que uso as palavras dependência absoluta ao me referir ao estágio do bebê. (WINNICOTT, 1963, p. 81).

Esses cuidados iniciais da mãe da à criança uma sensação de

continuidade, o bebê que existia dentro da mãe, ligado a ela pelo cordão

umbilical, pode depois de nascer permanecer com essa sensação de

continuidade do ser. A mãe deve respeitar um horário para as mamadas, um

ambiente adequado com paz e privacidade, um tempo para seu bebê, para

olhar para seu bebê. A mãe também não deverá invadir seu filho, ou seja, a

mãe deve se adaptar ativamente ao seu processo de maternagem. Ate

mesmo se pensarmos judicialmente todas as mulheres tem por lei a “licença

maternidade”, para justamente se adaptar e cuidar ativamente e quase que

exclusivamente de seu filho. Winnicott também afirma que a mãe precisa ser

saudável, para permanecer nesse espaço de “doação”, de “doença” e

posteriormente recuperar a sua saúde psíquica.

Quando Winnicott menciona a falha no processo de maternagem ele

não se refere somente à ausência de cuidados maternos, ou físico, mas

também a falta desse olhar que visa às necessidades do seu bebê, por isso

uma mãe também poderá falhar pelo excesso. Ou seja, se essa mãe não

conseguir se identificar com seu bebê e não entrar nessa “doença” psíquica

com ele, esta não conseguirá atender as necessidades do seu bebê. Ou se

a mãe se preocupa exclusivamente por muito mais tempo que a criança esta

preocupação passa a ser doentia.

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Todas as experiências do bebê ficam armazenadas na memória

afetiva do mesmo, possibilitando tanto a confiança no mundo, quanto a falta

de confiança do mesmo. Winnicott fala em seus artigos sobre a ameaça de

aniquilamento.

Posteriormente a esse estágio de dependência absoluta, teremos a

dependência relativa, que é onde Winnicott afirma no texto “Da dependência

à independência no desenvolvimento do indivíduo” de 1963 que “[...] se

pode distinguir entre a dependência que está além da capacidade de

percepção do lactante e a dependência da qual o lactante pode tomar

conhecimento”. (WINNICOTT, 1963, p.83).

Na dependência relativa, a mãe vai se desconectando e, como o

autor afirma, fazendo uma desadaptação gradual. Isso é muito importante

para que a criança possa ir, por conta própria, criando meios para ele se

adaptar ao mundo que a cerca. Ao contrário da dependência absoluta em

que o bebê nem percebe que se encontra em uma situação onde necessita

dos cuidados da mãe, na dependência relativa a criança já começa a ter

noções de que necessita desse outro para suprir as suas carências, as suas

necessidades. A criança, segundo Winnicott, já apresenta ansiedades na

falta da mãe. Winnicott em seu livro “A família e o desenvolvimento

individual” afirma que:

No primeiríssimo estágio não há vestígios de uma consciência de dependência, e por isso esta é absoluta. Gradualmente, a dependência torna-se em certa medida conhecida pela criança, que, por consequência, adquire a capacidade de fazer saber ao ambiente quando necessita de atenção. Do ponto de vista clinico, constata-se um progresso muito gradual em direção à independência, sempre marcado por recorrências da dependência e até da dupla dependência. Neste e noutros aspectos, a mãe é capaz de adaptar-se às necessidades variáveis – e crescentes – da criança. Com um ano de idade, a criança já é capaz de manter viva a ideia da mãe e também do tipo de cuidado que se acostumou a receber. [...]. (Winnicott, 2005, pag. 06).

A partir do segundo ano de vida a criança utiliza a sua memória

emocional para começar a se suprir, é o que ele chama de Independência,

onde ele não mais depende tanto dos cuidados da mãe, para Winnicott

aborda também que essa independência nunca é definitiva.

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Nesse processo, de desenvolvimento emocional, o fato do bebê ser

fisicamente saudável não garante necessariamente que este atinja a saúde

psíquica relacionada acima, ou seja, mesmo quando as estruturas físicas,

biológicas, neurológicas, motoras e sensoriais do bebê estejam fisicamente

perfeitas, uma maternagem insuficientemente boa pode ocasionar

problemas emocionais, e assim este bebê enfrentará mais dificuldades de se

tornar um SER independente psiquicamente.

1.2 As funções maternas primárias.

Segundo Winnicott há três aspectos fundantes e complementares nos

cuidados da “mãe suficientemente boa”: o handing (manejo), holding

(sustentação) e a apresentação dos objetos.

A maneira com que a mãe cuida, trata, manipula o seu bebê é

nomeada de handing, que se constitui no propiciar um ambiente que facilite o

desenvolvimento do bebê, ou seja, a mãe suficientemente boa que possibilita

que o bebê saia da condição de bebê-mãe (fusionados) e possa ir integrando

as suas partes, e se desenvolvendo psiquicamente. São os cuidados que a

mãe dispõe para o seu filho no sentido da higiene pessoal da criança. Winnicott

observou que algumas crianças que apresentavam doenças físicas, tinham

uma fundamentação psicológica devido à falta dos cuidados com o seu corpo.

Durante a fase de dependência absoluta a outra função materna de

uma mãe suficientemente boa é o holding. Isto significa literalmente que a mãe

está sustentando emocionalmente o seu bebê, como ela segura no colo a

criança. Essa experiência de holding tanto tem sua base no físico, no sentido

da maneira como a mãe segura, coloca no colo, acalma, alimenta; quanto no

psicológico, significando simbolicamente que a criança é amada e desejada.

Ou seja, faz parte da maneira como a mãe o sustenta emocionalmente, e não

apenas o seu corpo, mas também suas dores, suas angústias, seus

sofrimentos. Contendo e sustentando o rudimentar ego do seu neném,

sustentando a onipotência infantil de que é ele quem cria o que na mãe

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encontra. Essa forma de cuidado ajudará o bebê no seu processo de

maturação do ego.

Winnicott aborda que a maneira como a mãe protege seu bebê das

adversidades ambientais como o frio ou calor intenso, preparando um lugar

acolhedor, calmo, estabelecendo uma rotina ao dar o banho, a alimentação, o

sono. Portanto, para o autor a forma com que a mãe provê o ato de segurar e

manter o seu bebê em seus braços ajudará a determinar a maneira com que

essa criança, na fase adulta, se relacionará com os outros seres humanos. Por

isso não existem fórmulas mágicas e pragmáticas para determinar esses

cuidados, mas dependerá da sensibilidade da mãe para perceber e atender a

essas carências do seu bebê, ou seja, sendo uma mãe suficientemente boa,

que se encontra atenta ao seu neném.

Quando a mãe não consegue fazer parte da maternagem não propicia

um cuidado com o corpo de seu bebê, com a cabeça, com o ambiente (com

muita iluminação ou ruídos altos), a sensação de despedaçamento e

desintegração permanece já que na fase de holding o bebê vivencia a

dependência absoluta da mãe.

O holding deficiente produz extrema aflição na criança, sendo fonte: da sensação de despedaçamento; da sensação de estar caindo num poço sem fundo; de um sentimento de que a realidade exterior não pode ser usada para o reconforto interno; e de outras ansiedades que são geralmente classificadas como “psicóticas”. (WINNICOTT, 2005, pag. 27).

Para Winnicott as mães que não conseguem sustentar os seus bebês

contribuem para que eles se sintam desamparados, inseguros e desprotegidos.

Essas maneiras iniciais de contenção, de cuidados, de sustentação, para

Winnicott serão determinantes para se entender e significar a maneira como o

indivíduo se relacionará com o mundo externo.

Ao longo desse processo ocorrerá o início da formação ego -

fortalecido - do bebê, da sua psique, das relações, ou seja, da mente e da

criatividade do mesmo, bem como o estabelecimento de mais relações de

objeto. Além do handing e do holding, também a mãe deve mostrar à criança o

mundo que a cerca - apresentação dos objetos - para que ela possa ir

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decodificando e integrando o que é dela e o que é do outro, e possa ir

diminuindo suas experiências de onipotência.

Percebemos com isso que quando o bebê nasce ele passa por

diversos níveis e períodos de integração, já que seu ego é inicialmente

muito rudimentar. Ao longo do processo de desenvolvimento, esses

períodos de integração teoricamente deverão se tornar mais constantes e

duradouros. Posteriormente, o bebê deverá conseguir reunir suas partes que

ainda não foram integradas em um único núcleo egóico próprio. Esse

processo implica ter recebido os cuidados relacionados acima provenientes

da mãe que, como afirmamos, teve que suportar a não-integração inicial do

ego de seu filho, permitindo que ele pudesse se sentir “inteiro”, integrado no

interior do seu próprio ego (da mãe), o que demanda uma grande

quantidade de energia e saúde da mãe, pois ela tem que alimentar,

proteger, embalar, amparar o seu bebê.

Vimos até agora a importância dos primeiros meses e dos cuidados

maternos primários nesses estágios do desenvolvimento a criança, e nessa

altura poremos começar a nos questionar sobre a relevância do

psicopedagogo estudar sobre fases tão primitivas do desenvolvimento

humano, por essa razão verificaremos agora como essas fases tendem a se

repetir ao longo da relação entre a mãe e seu bebê. Pois quando a criança

cresce e inicia seu período escolar esta passa novamente pelas adaptações

na vida e deverá contar com uma mãe que suporte e acolha suas

ansiedades e temores. Winnicott aborda, no livro “A família e o

desenvolvimento individual” que:

Algumas mães funcionam em dois níveis (...) as mães, querem apenas uma coisa: que sua criança cresça, saia do cercado, vá à escola, encontre o mundo. Noutro nível, que suponho ser mais profundo e não de todo consciente, não concebem a ideia de deixar seu filho ir. Neste nível mais profundo, em que a lógica não tem grande papel, a mãe não consegue abdicar dessa coisa tão preciosa que é a sua função materna; é mais fácil para ela sentir-se maternal quando seu bebê é dependente, do que quando, pelo crescimento, ele já começa a gostar de ser separado, independente e desafiador. (WINNICOTT, 2005, pag. 53, grifo do autor).

Por conta da observação dessa relação materna à criança sente que

sua mãe ainda necessita que ela permaneça nesse papel de bebê, por isso

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se recolhe apresentando dificuldades de crescer, de fazer novos laços com

o colégio, com as professores e consequentemente com os estudos, pois

para que haja a aprendizagem a criança tem que abrir mão da sua posição

infantilizada e dependente para poder crescer e se desenvolver.

A criança também vê inicialmente vantagens em continuar imatura,

pois além de sentir pena da sua mãe - por vê-la não suportando a sua

ausência, - a criança receberá da mesma, benefícios para continuar nesse

papel, como por exemplo, presentes, falta de limites e obrigações, etc..

Esta mãe deve ter tido problemas nas fases inicias do

desenvolvimento da criança, como por exemplo, na fase em que vivia

exclusivamente para atender as necessidades do seu filho, por medo de

perdê-lo para a vida esta cria uma falsa “redoma de proteção” onde não

permite que ele crie novas relações com o meio. Isso poderá instituir

problemas para a criança na escola, pois se ela esta preocupada com sua

mãe não irá se conectar na professora, não criará vínculos com os estudos

e será muitas vezes dispersa em sala de aula.

Na idade escolar a criança, teoricamente, já deve ter estabelecido os

primeiros momentos e experiências de independência e começa a ver a mãe

como alguém próximo, e não mais como alguém “colado”, também já

consegue perceber a importância de outras pessoas e coisas e devera

iniciar um processo de relacionamento com essas para poder crescer e ser

verdadeiramente independente.

1.3 A criança e o crescimento dos laços familiares

Nos primeiros meses de vida do bebê ele se vê como absoluto, não

existem distinções entre ele e o ambiente externo (incluindo a mãe ou seu

cuidador). Ele reina soberano no mundo de ilusões e fantasias e suas

necessidades como fome, frio, calor etc. são prontamente atendidas. Vimos

também à importância de uma mãe devotada para estar “pronta” para

atender as necessidades do filho.

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Por isso observamos que a teoria de Winnicott se baseia

intensamente nas argumentações sobre a importância da figura da mãe e

dos cuidados maternos, para o desenvolvimento da criança, porém ao longo

do seu trabalho este autor foi ampliando a veemência de outras pessoas que

complementam o trabalho materno primário, ampliando o quadro familiar da

criança.

Ou seja, Winnicott vai acrescentado à importância da figura paterna,

para romper figurativamente essa relação dual entre mãe-bebê, portanto os

cuidados maternos transformam-se em cuidados fornecidos por ambos os

pais. Assim como, os cuidados oferecidos pelos pais, com o decorrer do

desenvolvimento da criança, serão ampliados com a introdução dos avós

(enquanto relação para a criança), tios, primos e outros parentes que forem

sendo apresentados pela família. Para o autor os laços iniciais tanto o que

diz respeito à relação com sua mãe, quanto em relação os outros futuros

cuidadores (família) devem ser baseados no afeto, no amor, pois só assim

que se formará um vínculo de confiança entre eles.

Em seu artigo “A família e maturidade emocional” contido no livro “A

família e o desenvolvimento individual” ele aborda que:

(...) creio que a família da criança é a única entidade que possa dar continuidade à tarefa da mãe (e depois também do pai) de atender ás necessidades do individuo. Tais necessidades incluem tanto a dependência como o caminhar do individuo em direção à independência. A tarefa consiste em fazer face às necessidades mutantes do individuo que cresce, não apenas no sentido de satisfazer a impulsos instintivos, mas também de estar presente para receber as contribuições que são características essenciais da vida na dependência que se seguem humana. A tarefa consiste, ademais, em aceitar as irrupções de rebeldia e as recaídas na dependência que se seguem à rebeldia. (WINNICOTT, 2005 pag. 131).

Aqui vemos no discurso de Winnicott vemos um paralelo entre a

dependência e a rebeldia, pois para ele mesmo quando conseguimos

alcançar o estágio de independência emocional esta dificilmente será

definitiva ou absoluta, pois mesmo no individuo sadio este sempre poderá

transitar de um estágio para outro, ou seja, mesmo depois dele ter

alcançado a independência com relação a sua mãe, ele poderá passar por

momentos em que necessitará de cuidados maternos primários, de atenção

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mais individualizada, de um “colo”, e esses cuidados não mais poderão ser

de aplicados exclusivamente pela mãe e sim por qualquer membro da

família, através de uma orientação, de um cuidado de uma proteção, de uma

escuta que esteja aberta às necessidades do indivíduo. Por essa razão é

muito importante que essa família estabeleça, assim como a mãe, laços de

confiança com a criança, pois esta precisa estabelecer vínculos seguros

com seus familiares se sentindo parte de um “todo”, parte de sua família.

O bebê que conheceu a segurança nesse primeiro estágio de dependência absoluta passa a levar consigo a expectativa de que não será “decepcionado”. As frustrações – bem, estas são inevitáveis; mas ser decepcionado por uma pessoa de confiança – isso nunca (WINNICOTT, 2005, pag. 46, grifo do autor).

Vemos essa afirmação no sentido de que a confiança em um

ambiente suficientemente bom ajuda a criança a ampliar seus laços de

vínculos e de relacionamentos. Pois depois dos laços familiares

verificaremos a ampliação dessas relações pessoais para o nível do social,

ou seja, a criança sai da sua casa, do seu quintal, da sua proteção e vai

para o mundo social. Esta irá se relacionar com novos vínculos e pessoas

incluindo as pessoas da escola, seus professores, amigos, diretoras.

Posteriormente ampliará ainda mais indo para a faculdade, arrumando um

emprego, constituindo laços com namorados (as), casamento, laços sociais,

políticos, culturais e religiosos.

Enfim abre-se um leque infinito de possibilidades e de relações que

serão amiúde baseadas nessas relações primárias. Esse convívio social

será o produto final, o resultado das projeções dos laços iniciais que aquele

indivíduo constituiu com os seus familiares. Por essa razão é de suma

importância conhecer de onde a criança veio, qual é a sua origem, como se

constituiu os primeiros vínculos da mesma, pois assim teremos a dimensão

das questões que poderemos enfrentar com a criança e de como ela se

relaciona com o mundo.

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CAPÍTULO II

A FAMÍLIA E A FORMAÇÃO DOS VÍNCULOS

“leve a semente vai onde o vento leva

gente pesa por mais que invente

só vai onde pisa”

Ney Matogrosso.

Atualmente a nossa sociedade está repleta de teorias, livros e artigos

que abordam a problemática da infância, porém sabemos que a preocupação

com a infância é algo recente na mesma. Se instituirmos como ponto inicial a

Era Medieval veremos que a criança não tinha o mesmo “valor” sócio cultural

que vemos no século XXI. A preocupação com a problemática da criança é

recente em termos de História da Humanidade. Segundo Ariès (1981),

observamos que os trabalhos artísticos da Era Medieval não reconheciam a

infância e nem a representavam; ou seja, as crianças em suas pinturas eram

representadas como “adultos em miniatura”, suas vestes representavam bem

essa articulação. Nesse momento social não havia lugar para a infância e o

sentimento da mesma não existia.

Na sociedade medieval, que tomamos como ponto de partida, o sentimento da infância não existia – o que não quer dizer que as crianças fossem negligenciadas, abandonadas ou desprezadas. O sentimento da infância não significa o mesmo que afeição pelas crianças: corresponde à consciência da particularidade infantil, essa particularidade que distingue essencialmente a criança do adulto, mesmo jovem. Essa consciência não existia. Por essa razão, assim que a criança tinha condições de viver sem solicitude constante de sua mãe ou de sua ama, ela ingressava na sociedade dos adultos e não se distinguia mais deles. Essa sociedade de adultos hoje em dia muitas vezes nos parece pueril: sem duvida, por uma questão de idade mental, mas também por sua questão de idade física, pois ela era em parte composta de crianças e de jovens de pouca idade. (ÁRIES, 1981, pág. 156).

Considerava-se a infância um período de transição, que logo era

ultrapassado e sua lembrança perdida. No seu livro “Historia Social da Criança

e da Família”, Philippe Ariès se propôs a explanar sobre a evolução do olhar

das pessoas no âmbito da infância; no sentido de corroborar e estudar como as

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crianças “conquistaram” espaço dentro da sociedade. As crianças antigamente

eram tratadas como pequenos adultos. Só recebiam cuidados especiais em

idade precoce, e quando já possuíam condições de viver sem a ajuda

constante de sua mãe ou ama, a criança ingressava no mundo dos adultos e

não se distinguiam mais destes.

Neste mesmo livro podemos observar notoriamente diferentes

perspectivas de se pensar o homem, a criança, a escola e o meio familiar; não

estamos buscando sugerir uma crítica entre a Era Medieval e o Século XXI,

pois partindo desse princípio poderíamos correr o risco de abordar que os

métodos medievais são inferiores ao da sociedade posterior; esquecendo-se

da circunstância que de fato acontece, é que surgiram novos modos de se

pensar a sociedade, a cultura e a politica, consequentemente a forma de se

pensar sobre a infância, a homem, e a família também passou a ser

reestruturada.

No caso da criança, esta passou a ser reconhecida e valorizada pelo

seu potencial lúdico, pela sua graça e pelo seu encantamento, revelando uma

nova relação entre família e a criança. O sentimento de infância pode ser

entendido em dois momentos distintos: primeiro, a partir da ideia de

“paparicação” em que a criança é vista como um ser lúdico, capaz de gracejos,

gentileza, “engraçadinha”, tornando-se uma fonte de distração para os adultos;

e um segundo, como se verá, em que a formação moral da criança deve ser

garantida por meio da educação, da saúde e do bem estar físico. Nesta, a

infância passa a ser considerada uma etapa uma etapa peculiar da vida,

exigindo a efetivação de cuidados específicos capazes de suportar as

necessidades específicas dessa fase da vida.

Ariès (1981) também fala do segundo sentimento da infância, que veio

dos eclesiásticos, ou dos homens da lei, e de um maior número de moralistas,

onde se preocupavam com a disciplina e a racionalidade dos costumes. Os

moralistas se tornaram sensíveis, mas também se recusavam a considerar as

crianças como “seres apenas encantadores”, pois as viam como frágeis

criaturas de Deus, e que era preciso preservar e também disciplinar, tal

sentimento passou para a vida familiar.

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O autor supracitado considera que o apego à infância e à sua

particularidade passou a ser entendida por um interesse psicológico e moral.

Tentativas de compreender a mentalidade das crianças eram necessárias para

melhor adaptar o nível dos métodos de educação. As pessoas passavam a se

preocupar com as crianças, pois as consideravam testemunhas da inocência

batismal, semelhantes aos anjos e próximas de Cristo. A preocupação era

fazer dessas crianças pessoas honradas. Desta forma a Igreja afasta a criança

de assuntos ligados ao sexo, para que isso não afetasse a formação do caráter

e da moral dos indivíduos.

O primeiro sentimento da infância – caracterizado pela “paparicação” – surgiu no meio familiar, na companhia das criancinhas pequenas. O segundo, ao contrário, proveio de uma fonte exterior à família: dos eclesiásticos ou dos homens da lei, raros até o século XVI, e de um maior número de moralistas no século XVII, preocupados com a disciplina e a racionalidade dos costumes. Esses moralistas haviam-se tornado sensíveis ao fenômeno outrora negligenciado da infância, mas recusavam-se a considerar as crianças como brinquedos encantadores, pois viam nelas frágeis criaturas de Deus que era preciso ao mesmo tempo preservar e disciplinar. Esse sentimento, por sua vez passou para a vida família. (ARIÈS, págs. 163, 164, 1981).

Vemos também que a mudança no olhar da criança refletiu em uma

mudança no olhar da instituição (escola), pois com o decorrer dos séculos esta

passou a exercer na sociedade uma nova função, por exemplo, antes as

crianças em sala de aula não eram separadas por idade e as famílias não

questionavam sobre essa dinâmica. Com os anos e com as mudanças sobre o

olhar para com as crianças (principalmente em relação às crianças pequenas),

essa situação começou a ser questionada e as escolas tiveram que repensar o

seu quadro acadêmico.

O “ato de estudar” passou a ser valorizado, em detrimento ao

patriarcalismo das profissões e da estruturação da herança profissional, já que

as profissões antigamente passavam de geração em geração; as crianças

tinham que se preocupar em aprender apenas o básico para exercer sua

profissão, geralmente isso era ensinado pelo pai, que se constituía como o -

senhor dotado de todo o conhecimento e poder – não havia muitas opções

para as crianças e a família valorizava esse poder patriarcal.

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A família também sofreu ao longo dos séculos profundas

mudanças em sua estruturação, esta se tornou uma sociedade fechada

reforçando a intimidade dos seus membros. Como já abordamos a família era

estruturada de forma a privilegiar o poder patriarcal e o saber era destinado a

um único viés – a figura paterna –, porém com o tempo esse poder foi

deslocado para outros membros da família, a mãe passou a igualmente ser a

provedora do lar e a criança ganhou espaço e cuidados diferenciais. Com o

aumento da participação das mulheres no mercado de trabalho o quadro

família, onde a mulher era a única que cuidava das crianças enquanto o marido

trabalhava se modificou. A responsabilidade na criação da criança, com o

passar dos anos, vem se alterando, os parentes e subsistemas vêm cada dia

desempenhando um papel mais presente no dia-a-dia dos filhos, ou seja,

pessoas como avós, tias e primas passam a ter um papel direto na educação

das crianças, já que as mães saem para trabalhar deixando seus filhos aos

cuidados dos avós e outros parentes, ou então em creches e escolas.

2.1 A Importância de se olhar para dentro da família

Hoje sabemos que a família possui um importante papel na dinâmica

da aprendizagem, e a família é muito importante para as pessoas, e a criança

necessita de um espaço dentro da família para se desenvolver. É importante

que a mãe possibilite que seu filho se desenvolva adequadamente a sua faixa

etária. Vimos anteriormente que a mãe tem um importante papel no

desenvolvimento do seu bebê, mas a família vai sucessivamente entrando

nessa dualidade formando novos papeis e novas relações.

A família, portanto, tem a função de dar um suporte afetivo, físico e

social socializando a criança, já a família é uma pequena sociedade, permitindo

que se instaure na criança um sentimento de identidade no sentido de

pertencimento dentro do quadro familiar – dando continuidade ao nome da

família -, que a protege e a sustenta, porém a família também deverá permitir

que emerja um ser individualizado, com opiniões e ideias próprias sobre si e

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sobre o mundo. No livro “Avaliação Psicopedagógica da criança de zero a seis

anos” vimos que

Cada família tem suas próprias regras que vão sendo forjadas através de anos de convivência, as quais podem ser implícitas ou explicitas. A grande dificuldade em lidar com as famílias reside no cuidado que é necessário para entender as regras que governam as relações familiares tanto internamente como com os sistemas extrafamiliares (BOSSA, pág. 189, 2009).

Por isso, é importante que o psicopedagogo institucional possa

conhecer a família, e seus esquemas teóricos e de pensamento conhecendo a

história da mesma, seu sistema sociocultural, ou seja, as regras que vigorizam

dentro do quadro da família, para poder saber “como” deverá olhar para as

crianças da instituição. Isso permite que o psicopedagogo passe a estruturar

um perfil dos aspectos estruturais e a funcionalidade da mesma, isso será

importante para saber “quem” é a criança que está diante dele.

Podemos perceber que na sociedade atual há uma reestruturação das

famílias, já que estas vêm se modificando e os subsistemas familiares -

compostos por avós, tios ou então por creches ou escolas maternais, - cada dia

mais vêm desempenhando um papel importante na vida, da educação e na

formação dos alunos, no entanto devemos pensar sobre o papel da escola

nesse novo enquadre social.

Se refletirmos sobre o dia (rotina) das crianças veremos que a ampla

maioria passa grande parte do dia dentro do ambiente escolar, porém, a nosso

ver, não é da competência da escola “criar” os alunos, sozinha. Por isso

deveremos ter cuidado e precaução com as famílias e seus desejos, já que

estas, às vezes, locam no ambiente escolar a responsabilidade da doutrinação,

ensino e educação dos valores tanto no nível acadêmico, quanto no nível ético

e moral dos seus filhos. Observamos enquanto psicopedagogos, na hora de

uma entrevista ou encontro com os pais aspectos como: a presença, a

dedicação, o incentivo, e o “tempo” dedicado com os filhos, já que estes

também são importantes na formação das crianças.

Portanto, a forte ligação com quem desempenha os cuidados maternos proporciona a base para desenvolvimento emocional, intelectual e social do indivíduo no decorrer de sua vida. O desenvolvimento saudável da afetividade contribui para a ampliação de seus vínculos sociais, interesses para explorar seus ambientes,

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capacidade para elaborar seus traumas, habilidades para resolver seus problemas e autoestima suficiente para enfrentar suas crises de identidade no futuro. Por outro lado, interrupções sérias neste processo produzirão problemas no desenvolvimento social, emocional e intelectual das crianças. (MUNHOZ, pág. 67, 2003).

Devemos enquanto psicopedagogos estar preparados para olhar

dentro dessa família, verificando a demanda e as possíveis necessidades de

apoio, orientação e encaminhamentos externos, como por exemplo, médicos,

psicólogos, psicopedagogos clínicos, para dar conta da demanda da família,

com isso a escola poderá dar apoio e suporte para acolher essas famílias.

Sobre os alunos a escola poderá ajudar as crianças, criando um

espaço para brincadeiras construtivas, que possibilitam que a mesma possa

crescer e se desenvolver adequadamente. A escola também poderá arquitetar,

junto com seu corpo docente, projetos que inspirem desafios e estratégias,

para que as crianças consigam aprender não apenas os conteúdos

acadêmicos, mas também possa entender e aprender a lidar com as

frustrações, com as vitórias, as derrotas, a culpa, a raiva, assim como, seus

impulsos agressivos e destrutivos.

Portanto é importante que as crianças também criem vínculos com a

instituição de ensino, para que elas possam se sentir seguras e confiantes na

presença dos integrantes da escola, como se esta fosse um “braço”, um

prolongamento da família, isso criará um ambiente propício para o

desenvolvimento psicológico da mesma, assim como, propícia um ambiente

seguro onde ela pode se sentir capaz para revelar suas inseguranças, medos e

incertezas. Ou seja, para que consigam, por exemplo, perguntar conteúdos não

entendidos (dúvidas) para o professor, ou denunciar um aluno por violência

verbal ou física, enfim, independente dos motivos e das consequências o aluno

deverá confiar no ambiente escolar e criar um vínculo institucional que facilitará

o aprendizado da mesma.

Com isso, não estaremos fazendo o papel de pais dos alunos, mas

estaremos dentro do nosso quadro acadêmico, ajudando os mesmos na

estruturação e nos ensinamentos básicos, dentro do projeto de ensino e

aprendizagem das crianças; introduzindo histórias, desenhos, trabalhos

artísticos que estimulem a criatividade, músicas, enfim, uma serie de projetos e

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trabalhos que podem ajudar no crescimento dos alunos. No entanto esses

projetos não podem estar desassociados de uma política de apoio familiar,

pois, como já mencionamos a escola sozinha, não tem essa obrigatoriedade e

dever. Principalmente por que é a família que levará os estudantes para as

escolas, por isso teremos que tentar criar uma parceria entre os deveres e

obrigações tanta das escolas, quanto das famílias e cuidadores.

Nessas questões, a escola (...) tem funções importantes e óbvias. Uma delas é o fortalecimento, durante algumas horas diárias, de uma atmosfera emocional que não é a tão densamente carregada do lar. Isso propicia à criança uma pausa para o desenvolvimento pessoal. Também novas relações triangulares menos intensamente carregadas do que as famílias podem ser formadas e expressas entre as próprias crianças.

A escola, que é um apoio, mas não uma alternativa para o lar da criança, pode fornecer oportunidade para uma profunda relação pessoal com outras pessoas que não os pais. Essas oportunidades apresentam-se na pessoa das professoras e das outras crianças e no estabelecimento de uma tolerante, mas sólida, estrutura em que as experiências podem ser realizadas. (WINNICOTT, pág. 217, 2008).

Ou seja, a criança precisa se sentir livre para se desenvolver, para usar

a sua criatividade e sua imaginação, mas para isso é necessário que haja um

ambiente em que ela possa se desenvolver. Uma criança que se sente muito

reprimida ou que recebe poucos estímulos externos poderá ter mais

dificuldades de desenvolver sua criatividade, assim como terá mais dificuldades

de lidar com as frustrações e com seus impulsos de destruição e impulsividade.

A entrada na escola pode gerar inquietudes na mãe ou na família,

principalmente se esta não estiver preparada para observar e vivenciar o livre

desenvolvimento do seu filho. E cabe a escola o auxílio, a assistência e

demonstração do real desenvolvimento do seu filho – entrevista de devolução -,

mostrando aos mesmos como a criança está na escola. Para tal, os

professores poderão auxiliar nas observações dos alunos em sala de aula,

assim como a observação das notas dos alunos, ajudará na devolução e na

conversa com os pais ou responsáveis. Isso será importante, pois na escola a

criança terá oportunidade de estabelecer diferentes tipos de vínculos, tanto

com os professores, quanto com os alunos e como também, poderá apresentar

diferentes tipos de comportamentos, por isso a parceria entre professores,

família e psicopedagogia é tão importante para os alunos.

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Outro ponto que podemos observar é que a criança que não se sente

amada, acolhida, pode se sentir desprotegida e insegura em relação às

questões da vida, apresentando dificuldades para construir amizades, chora

com facilidade, porque sempre parece frágil, é retraída, solitária, insegura,

muitas vezes tem dificuldades de se expressar, de falar, apresentam pouco

contato e interação social, dentro da escola dependendo do “olhar” podemos

ser preconceituosos e “pré-diagnosticar”, mesmo que no nível institucional,

essas crianças como disléxicas, TDAH, ou incompetentes. Porém, quando não

nos preocupamos com laudos e estatísticas, mas sim com a criança no seu

nível biopsicossocial, percebemos que existem muitas questões que deverão

ser levantadas antes de se forjar um diagnóstico e uma exclusão ou rotulação.

Devemos, enquanto psicopedagogos, orientar o corpo docente, para

evitar esse tipo de segregação de doenças e “pré-diagnósticos institucionais”,

para que essas crianças não entrem nesse “rótulo” e fiquem encravadas em

estereótipos que nem sempre estão corretos. Os riscos dessas nomeações e

dos preconceitos com as crianças que apresentam algum nível de dificuldade

poderão ser: sentimentos como a baixa autoestima, sentimentos de

incompetência, desmotivação para lidar com as dificuldades e com os

pequenos empecilhos, frustrações e em alguns casos até mesmo quadros

depressivos.

A falta do amor, ou a pouca demonstração de amor, causa prejuízos

não apenas na vida dos alunos, como também na vida acadêmica, no sentido

de que os vínculos iniciais com os familiares são importantíssimos para criar

uma base para os vínculos com a aprendizagem, ou seja, os problemas de

aprendizagem podem dentro de uma família surgir como um “sintoma”,

declarando dentro da escola problemas que podem estar intrínsecos, e que

estarão direcionados para o meio familiar. Podemos observar que o bom

desenvolvimento das pessoas na vida pode estar ligado, a capacidade que os

pais tiveram de amá-la e dela consequentemente aprender a receber e dar

amor. E é com o ambiente familiar que se inicia os primeiros vínculos e suas

primeiras relações e com que se adquirem os primeiros conhecimentos e a

criança pode aprender as primeiras lições.

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As experiências vivenciadas no lar, as interações estabelecidas entre os membros, da família, os padrões relacionais encontrados abrirão ou fecharão o caminho para que o aprendente sinta o desejo de buscar condições para se tornar autor de seu conhecimento, desenvolvendo a aptidão para realizar suas escolhas, responsabilizando-se por suas decisões, assumindo as consequências de seus erros e recendo os méritos de seus êxitos. (MUNHOZ, págs. 70 e 71, 2003).

O ambiente familiar também será importante na vinculação da

aprendizagem no sentido de que quando a aprendizagem é algo estimulado

dentro de casa, há uma facilitação do prazer em ler e estudar. Os pais são os

primeiros professores dos filhos por isso é importante que independente do

grau de escolaridade dos pais, estes valorizem a escola, tratem os professores

e a instituição com respeito, pois isso ajudará que os alunos tenham o mesmo

respeito tanto pelo “ato de aprender”, quanto pela instituição de ensino no qual

esta inserida.

.

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CAPÍTULO III

O PSICOPEDAGOGO E SEU OLHAR PARA O NOVO

DILEMA: PATOLOGIZAR OU CUIDAR... EIS A

QUESTÃO.

“ Parto, é hora de içar as velas e vê-las, (a)mar adentro, (gr)ávidas de vento”

Valeria Tarelho.

Antes de entendermos os aspectos relevantes sobre a entrada do

psicopedagogo na escola, verificaremos aqui um breve histórico sobre o

surgimento da psicopedagogia.

Esta profissão teve seu berço na Europa por volta de 1946, com a

“união” de três áreas de estudos: a psicologia, a psicanálise e a pedagogia,

inicialmente esta veio para dar conta de uma demanda de crianças com

dificuldades de aprendizagem. O crescente olhar dos estudiosos para a

problemática da criança não poderia mais se limitar aos aspectos físicos (como

a deficiência intelectual, ou as síndromes) e nem apenas ao olhar do trauma

psicológico. Por isso uma nova perspectiva teve que ser criada possibilitando

um novo enquadre para crianças que apesar de terem problemas na

aprendizagem não se enquadravam em nenhum dos aspectos acima citados.

O estudo da psicopedagogia no continente americano surgiu na

Argentina há mais de trinta anos com o primeiro curso de psicopedagogia em

na capital Buenos Aires. Os cursos de psicopedagogia nesse país são

ministrados no nível de graduação. Esse país teve uma importância enorme no

estudo dessa área de atuação com as teorias da psicologia genética de Jean

Piaget, com a psicanálise de Sigmund Freud e a psicologia social de Pichon-

Rivière. Posteriormente outros estudiosos do assunto também tiveram suas

teorias reconhecidas dentre os quais teremos Vygotsky, Ana Teberosky e

Emília Ferreiro. Contendo estudiosos próprios como Jorge Visca, Sara Paín,

Jacob Feldmann, Ana Maria Muniz, dentre outros.

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No Brasil a psicopedagogia surgiu no ano de 1970, e se diferencia da

Argentina, pois aqui esse curso é ministrado em caráter de pós-graduações.

Dentre seus autores destacam-se Maria Lúcia Weiss, Aglael Borges, Nádia

Bossa, Beatriz Scoz e Heloísa Padilha, dentre outros. Apesar desta profissão

ter sido originada a partir do estudo de outras áreas, hoje ela se destina ao

estudo do processo de aprendizagem de forma independente, não mais se

limitando aos distúrbios de aprendizagem como dislexias, disgrafias,

disortográficas, discalculias, dentre outros. Nádia Bossa em seu livro “A

psicopedagoga no Brasil” afirma que:

Ao admitir essa interseção entre a psicologia e a psicopedagogia, não nos resta oura alternativa senão abandonarmos a ideia de tratar a psicopedagogia apenas como aplicação da psicologia à pedagogia, pois, ainda que se tratasse de recorrer apenas a estas duas disciplinas (o que não creio) na solução da problemática que lhe deu origem – os problemas de aprendizagem – não seria como mera aplicação de uma à outra, mas sim na constituição de uma nova área que recorrendo aos conhecimentos dessas duas, pensa o seu objeto de estudo a partir de um corpo teórico próprio, ou melhor, que se busca constituir. (BOSSA, 2007, págs. 17 e 18, grifo do autor).

Hoje seu objetivo é estudar, compreender e intervir na aprendizagem

humana, não apenas se limitando a estudar crianças com distúrbios de

aprendizagem, mas ampliando seu campo de atuação para qualquer pessoa

que apresente algum problema de aprendizagem, já que se entende que esses

distúrbios não mais são pensados exclusivamente em crianças.

Este campo de atuação conta também com inúmeros recursos

pedagógicos e áreas de atuação tanto no âmbito clínico como no âmbito

institucional (escola, empresas, hospitais) tanto para o tratamento de

problemas e distúrbios já estabelecidos, como para a prevenção desses

problemas. Veremos a partir de agora a importância do psicopedagogo na

escola e os desdobramentos de sua atuação.

3.1 A entrada do psicopedagogo na escola

O psicopedagogo institucional tem como campo de atuação os

problemas de aprendizagem tanto no caráter preventivo, quanto no caráter

“curativo”, este se dispõe a “resolver” os problemas já estabelecidos e

diagnosticados. No enfoque preventivo o papel do psicopedagogo é detectar

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possíveis problemas no que diz respeito ao processo de ensino-aprendizagem,

antes que os mesmos se tornem um grande empecilho ao aluno no sentido da

aquisição da aprendizagem. Este profissional poderá se utilizar de recursos

próprios para detectar os problemas de aprendizagem e esquematizar os

possíveis caminhos de intervenção e os devidos encaminhamentos para outros

profissionais externos a escola.

Mas o psicopedagogo deverá ter em mente alguns cuidados no que diz

respeito a esse processo de verificação dos problemas da escola,

principalmente com respeito aos problemas de aprendizagem dos alunos.

Atualmente vemos uma crescente demanda pelos estudos e diagnósticos de

“crianças problemas”, dentre as quais temos “sintomas e doenças” como:

dislexias, TDAH, disgrafias, dentre outras, ou então, crianças agressivas, sem

limites, inquietas, “incapazes de aprender”. Essas crianças perdem sua

identidade, passando a serem conhecidas pelos seus sintomas e

características básicas, sendo muitas vezes excluídas em classe, postas como

“inabilitadas” e problemáticas. Olivia Porto em seu livro “Psicopedagogia

Institucional: teoria, prática e assessoramento psicopedagógico” (2011) afirma

que:

A dificuldade de aprendizagem, comportamentos divergentes, que podem levar o aluno ao fracasso, causando grandes angústias nos professores, e a relação que se dá entre alunos e professores, principalmente por meio da “fala”, todos esses fatos não podem ser vistos como peças enguiçadas que não têm mais conserto. Importante é entender o que se passa em um processo educativo e os motivos que levam essas dificuldades a fracassos escolares, tornando-se muitas vezes fracassos de vida. Importante e desafiante é repensar as práticas educativas, envolvendo não só os alunos mas também professores, coordenadores, diretores e todos que fazem parte do processo, um recorte para uma intervenção psicopedagógica. (PORTO, 2011, pag. 97).

Vivemos em um período social onde são valorizadas as práticas

imediatistas e urgentes, ou seja, tudo tem que ser “agora”, é uma sociedade

que podemos nomea-la de “fast food”, ou seja, não há tempo para pensar, para

ouvir, para cuidar ou olhar para as crianças e verificar se os sintomas que elas

estão apresentando são de ordem emocional, cognitiva, estrutural, se são

problemas direcionados a escola e seu corpo docente, ou simplesmente se os

alunos ainda não conseguiram aprimorar sua maturidade emocional para se

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desenvolver. Não estamos com essa afirmativa querendo levantar uma

bandeira crítica e preconceituosa da nova sociedade, mais sim, levantando

proposta de novo olhar, não apenas com uma visão que valorize

exclusivamente os problemas de aprendizagem e sim um olhar atencioso e

multifatorial para essas crianças que estão diante de nosso trabalho. Pois

acreditamos que muitas crianças possuem, sim, o diagnóstico de TDAH,

dislexia, dentre outras e temos que cuidar dessas para ajudá-las a se

desenvolver e aprender a lidar com o seu problema, mas não podemos com

isso colocar todas as crianças no mesmo “pacote patológico” e acreditar de

todas elas tem algum problema de aprendizagem, sem que antes possua uma

verificação, uma avaliação profissional e um olhar do psicopedagogo tanto para

o auxílio dos problemas dos alunos, quanto para os problemas da instituição

onde o mesmo atua.

Para que se possa melhor avaliar esses problemas deveremos primeiro

conhecer e mapear a instituição para saber qual é a demanda que estamos

lidando, ou seja, que fatores levaram ao fracasso escolar, no sentido de

analisarmos se o problema está na instituição ou na própria criança.

Segundo Manuel Sanchez-Cano e Joan Bonals no seu livro intitulado

“Avaliação Psicopedagógica”,

Conhecer a organização e o funcionamento interno da escola em tudo aquilo que diz respeito aos aspectos institucionais e educacionais constitui informação relevante para a tomada de decisões e, particularmente, para estabelecer roteiros de intervenção adequados, d mesmo modo que conhecer os critérios e as propostas existentes sobre a detecção de necessidades dos alunos, as modalidades organizacionais e metodológicas de atenção à diversidade, e saber como se pesquisa no Projeto Educativo da Escola (PEC) e como se concretiza no Projeto Curricular da Escola (PCC). Em ultima analise, dispor de conhecimento da estrutura organizacional da escola no momento de identificar necessidades e pôr em funcionamento processos de avaliação interna, nos permite participar com nossa experiência profissional das possíveis mudanças institucionais. (SANCHEZ-CANO e BONALS, 2008, pag. 21).

O psicopedagogo deverá inicialmente conversar com a equipe de

direção escolar, para conhecer as propostas pedagógicas da escola; ele

deverá ser informado pela equipe de direção claramente dos objetivos do

trabalho, e deverá também conhecer a política da instituição. É importante que

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o profissional faça também um histórico da mesma para que possa conhecer

as origens da instituição, ou seja, como esta escola foi formada, qual é a

estrutura, sua visão de mundo, de homem, de aluno. O psicopedagogo poderá

também investigar as metas que a escola idealiza e como seu corpo

administrativo e docente entende o processo de aprendizagem e quais são os

obstáculos que a escola está enfrentando.

É também importante que o psicopedagogo avalie e observe como é a

relação existente entre a escola e a comunidade, e o local que a escola esta

inserido, no sentido de verificar se a escola está localizada em uma área de

risco, e como é a estrutura do local. Este profissional também poderá solicitar

um espaço para conversar com as famílias dos alunos. Para verificar os pontos

que podem ou que estão gerando conflitos na instituição.

Outro aspecto que poderá ter a sua observação considerada será o

ambiente, tanto o de sala de aula, quanto o ambiente da escola como um todo.

Ou seja, como é o pátio, a sala dos professores, as salas de aula, o local onde

as crianças brincam no intervalo e, quais são os horários dos mesmos, etc..

Segundo Bossa no seu livro “A Psicopedagogia no Brasil: contribuições a partir

da prática”:

O diagnóstico psicopedagógico é um processo, um contínuo sempre revisável, onde a intervenção do psicopedagogo inicia, segundo vimos afirmando, numa atitude investigadora, até a intervenção. É preciso observar que esta atitude investigadora, de fato, prossegue durante todo o trabalho, na própria intervenção, com o objetivo de observação ou acompanhamento da evolução do sujeito. (BOSSA, 1994, pag.74).

A sala de aula pode ser considerada como um sistema social dotado

de “leis próprias”, onde as pessoas interagem entre si, tanto no âmbito dos

alunos, quanto no âmbito dos professores. Por tal motivo, é fundamental que

se observe como os professores se relacionam com os alunos, para podermos

pensar como se desenvolve o processo de ensino-aprendizagem dos alunos.

Assim sendo, para investigar os diferentes fatores que podem levar ao

fracasso escolar também deveremos pensar e observar – ao entrar na escola –

situações como a dinâmica existente entre o professor e o aluno, por exemplo.

Sabemos que é muito difícil que o psicopedagogo entreviste todos os

professores da instituição, mas é importante que este faça entrevista com um

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determinado número de professores, uma espécie de amostra, para termos um

quadro diagnóstico do corpo docente da instituição.

Nesse contexto poderemos apurar como os professores lidam com os

problemas de aprendizagem, e como eles “entendem” o processo de ensino-

aprendizagem, verificando qual é o método de trabalho do professor. Nessa

avaliação - entrevista com os professores - podemos averiguar sobre os

procedimentos que os mesmos se utilizam quando percebem que os alunos

não estão conseguindo acompanhar o ritmo escolar. Outra questão importante que poderá ser solicitada será a respeito das avaliações em sala de aula, para

podermos observar se estas estão condizentes com os conteúdos e com a

forma que foram passados. Este também poderá organizar um esquema por

turma, série, período, ano para facilitar a sua organização e leitura dos

resultados.

Quais ajudas pedagógicas são oferecidas na sala de aula e o grau de planejamento didáticos. Se essas ajudas permitem que os alunos alcancem os novos conteúdos de aprendizagem e favorecem a autonomia do aluno ou, ao contrario, se o mantêm em um estado de permanente dependência. (SANCHEZ-CANO e BONALS, 2008, pag. 20).

Com o “mapeamento da instituição” poderemos conhecer melhor a

dinâmica da instituição, seus “problemas”, percebendo os alunos que estão

com dificuldades, as problemáticas, as características de cada turma, para

posteriormente traçar um plano inicial de metas para trabalhar tanto com as

crianças, como quanto os professores e familiares. Conversando com os

professores, o profissional terá a dimensão dos alunos encontrados na

instituição.

Posteriormente o psicopedagogo poderá ter uma conversa com os

familiares dos alunos para averiguar as características das crianças,

aproveitando também para observar se as características descritas pelos

professores são apresentadas somente na sala de aula, ou também são

apresentadas no ambiente familiar. O psicopedagogo também poderá conhecer

pessoalmente os alunos, visitando as salas de aulas para ele mesmo poder

fazer uma avaliação dos alunos e turmas. Segundo Porto em seu livro

“Psicopedagogia Institucional: teoria, prática e assessoramento

psicopedagógico”.

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O mapeamento institucional é um método de análise da instituição escolar, observando minuciosamente não somente aquilo que e dito mas o que não é dito por meio de observações, gestos e postura das pessoas que estão respondendo às perguntas. O psicopedagogo necessita ser o mais isento possível para uma avaliação fidedigna e que esteja mais próxima da realidade para uma posterior proposta pedagógica. (PORTO, 2011, pag. 124).

A partir do diagnóstico da instituição, baseado nos relatórios e

respostas das entrevistas, e dos dados coletados, o profissional deverá fazer o

enquadramento das características das crianças, percebendo as demandas da

escola, para posteriormente poder pensar nas estratégias de intervenção e

atuação, ou seja, pensar e traçar pontos para os projetos que facilitarão o

crescimento e fortalecimento educacional.

Depois da elaboração dos projetos pedagógicos o psicopedagogo

deverá convocar novamente os familiares para traças as direções da proposta

do mesmo, explicando os motivos e objetivos das suas intervenções.

Acordando uma espécie de contrato de comprometimento para que os pais se

impliquem também nesse projeto psicopedagógico.

Após a realização da(s) tarefa(s) o psicopedagogo deverá chamar a

família para fornecer a mesma a devolução dos resultados obtidos com a(s)

tarefa(s), verbalizando o que foi observado, fazendo os devidos

encaminhamentos nos casos necessários.

O trabalho do psicopedagogo também se posicionará não apenas pelo

viés do aluno e sim também pelo viés dos professores no sentido do auxílio da

elaboração do plano de aula, na elaboração do projeto pedagógico da

instituição. No momento em que haja o diagnóstico de um aluno – este deverá

ser concretizado por um médico especialista - com algum grau de dificuldade

e/ou transtorno o psicopedagogo institucional poderá ajudar o corpo docente

tanto sobre “o que é” aquela dificuldade como também a criação conjunta de

estratégias facilitadoras para o processo ensino aprendizagem.

As questões psicológicas também são importantes, já que o aluno com

um quadro de dificuldade de aprendizagem, geralmente apresenta um quadro

de baixa alto estima, por isso é importante vejamos que a cada ação do aluno,

mesmo que não tenha sido concretizada com o máximo de zelo, este receba

elogios e incentivos pelo seu esforço. Encorajando o aluno a continuar e se

capacitar nos estudos. Porto afirma que:

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A boa compreensão da leitura provem do equilíbrio entre o desenvolvimento das operações da leitura, decodificação e compreensão, interagindo com os estágios de desenvolvimento do pensamento e dos processamentos linguísticos. É necessário destacar a importância dos vínculos afetivos estabelecidos com a aprendizagem. (PORTO, 2011, pag. 145).

Nessa área de trabalho podemos verificar uma série de propostas de

intervenções que o psicopedagogo poderá atuar para melhor desenvolver a

qualidade do processo de ensino-aprendizagem em crianças com algum tipo

de problema ou déficit na aprendizagem, como a proposta de uma inserção de

adaptações nas salas de aula, com quadro de horários, metas, dias de

avaliações que facilitam em alunos que tenham problemas como o TDAH,

provas diferenciadas como a prova oral para quem tem dislexia e uma

adaptação e inclusão dos alunos com necessidades especiais.

Porem como poderemos lidar com alunos que possuem problemas em

casa, onde a maternagem e os vínculos iniciais – abordados no capitulo inicial

desse projeto - não foram adequadamente desenvolvidos, como podemos

ajudar as crianças que não conseguem aprender devido a uma “não conexão”

com o processo de ensino aprendizagem. Vimos crianças que tem dificuldades

de se adaptar as escolas devido ao fato de se sentirem ainda presas aos seus

laços maternos e por isso tem grandes dificuldades de “crescer” psiquicamente

e consequentemente apresentam grandes dificuldades de estabelecer laços

com a aprendizagem. Vimos também que a mãe, o pai e a família são as

primeiras relações dos bebês e serão determinantes nas próximas experiências

das crianças, por isso é tão importante a nosso ver que o psicopedagogo possa

olhar para essas crianças não com um olhar analítico, já que esta não é sua

função, mas com um olhar de mediador do seu retrocesso e possíveis

estabelecimentos dos vínculos iniciais com o processo de aprendizagem.

Vemos em nossa clinica um grande numero de crianças que não possuem

nenhum tipo de “doença” ou “problema físico-químico”, mas mesmo assim não

conseguem aprender se tornando “pseudo-autistas” com relação ao processo

de aprendizagem, e podemos aqui pensar que o psicopedagogo poderá

estimular através de jogos e dinâmicas que esses laços iniciais possam ser

revisados, para que a criança possa estabelecer vínculos importantes, como

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por exemplo, vínculos com seus professores, diretores, com os alunos etc..

Winnicott em seu livro “o brincar e a realidade”:

Posso agora reenunciar o que estou tentando transmitir. Desejo afastar a atenção da sequencia psicanálise, psicoterapia, material da brincadeira, brincar, e propor tudo isso novamente, ao universo. Em outros termos, é a brincadeira que é universal e que é própria da saúde: o brincar facilita o crescimento e, portanto, a saúde; o brincar conduz aos relacionamentos grupais; o brincar pode ser uma forma de comunicação na psicoterapia; finalmente, a psicanálise foi desenvolvida como forma altamente especializada, a serviço da comunicação consigo mesmo e com os outros. (WINNICOTT, 1975, pag. 63).

Queremos com essa proposta que os diferentes profissionais dentro da

instituição possam pensar o que estão fazendo para captar e receber os

alunos, ou seja, como as crianças estão sendo conquistadas em sala de aula

para poderem de desenvolver com mais facilidade. Não adianta a escola

buscar apenas investir em parques, salas de TV com computadores e

aparelhos multimídia.

É importante a escola investir no Ser Humano, nos seus alunos,

estimulando que eles “gostem” da aprendizagem, que eles entendam o

processo e que façam vínculos com as pessoas do seu cotidiano, para que

haja a confiança e a abertura do processo de aprendizagem, por isso é tão

importante o psicopedagogo olhar para o interior das famílias, assim como

olhar para a demanda e para a problemática do aluno e seus conflitos.

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CONCLUSÃO

Partimos de um referencial teórico em que buscamos unir tanto

teóricos da Psicanálise, como Donald Winnicott, quanto teóricos da

Psicopedagogia como Porto, Bossa e Àries, para embasar nosso esquema

teórico e metodológico. Já que vimos à importância da colagem desses

autores, pela observação na pessoal da clinica psicológica de uma demanda

de pacientes com pseudos “problemas de aprendizagem” e com dificuldades

múltiplas de ensino.

Vimos que não podemos generalizar os problemas de aprendizagem

em um único viés: aluno-problema; mas sim em uma perspectiva ampla e

multifatorial, por isso vimos, dentro desse corpo teórico, a importância do

psicopedagogo olhar para a estrutura tanto da escola, quanto dos alunos e

suas famílias. Já que em muitas vezes vimos alunos que não conseguem

aprender porque ainda não são estimulados por suas famílias a “crescer”,

tivemos nesse trabalho, uma apresentação da estrutura de famílias e suas

mães que se mostram com dificuldades de permitir que seus filhos tenham um

livre desenvolvimento psíquico, fazendo com que eles fiquem “encapsulados”

em uma espécie de rede materno-infantil, onde as crianças pelas vantagens

apresentadas pelas mães terão mais dificuldades de crescer e

consequentemente, mais dificuldades de lidar com os diferentes aspectos do

aprender. Isso criará na escola uma mascara onde os alunos aparentemente

apresentarão um problema de aprendizagem, quando na realidade, o real

problema está dentro de um quadro psicológico.

Por esse motivo, vimos nesse trabalho, à importância da análise

Psicopedagógica dentro do âmbito escolar para criar projetos e auxilio para a

melhoria dos problemas de aprendizagem já diagnosticados e observados,

assim como na prevenção de futuros problemas de aprendizagem de alunos.

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BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

ÀRIES, Phillippe. História Social da Criança e da Família. 2ª. Edição, editora

LTC, 1981.

BOSSA, Nádia e OLIVEIRA, Vera Barros (org.). Avaliação Psicopedagógica da

criança de zero a seis anos. 18ª. Edição. Petrópolis, RJ: Vozes, 2009.

BOSSA, Nádia e OLIVEIRA, Vera Barros (org.). Avaliação Psicopedagógica da

criança de sete a onze anos. 17ª. Edição. Petrópolis, RJ: Vozes, 2010.

BOSSA, Nádia. A Psicopedagogia no Brasil: contribuições a partir da prática.

Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1994.

GROISMAN, Moises; LOBO, Monica e CAVOUR, Regina. Histórias

Dramáticas: Terapia Breve para Famílias e Terapeutas. 1ª. Edição. Ano S.D.

MUNHOZ, Maria Luiza Puglisi (org.) Questões Familiares em temas de

Psicopedagogia. São Paulo. Coleção Temas de Psicopedagogia. Livro 7. 2003.

PICHON-RIVIERE, Enrique. Teoria do Vínculo. São Paulo: Martins Fontes,

1982.

PORTO, Olivia. Psicopedagogia Institucional: teoria, prática e assessoramento

psicopedagógico. 4ª. Edição. Rio de Janeiro: Wak Ediora, 2011.

SANCHEZ-CANO, Manuel e BONALS Joan, organizadores. Avaliação

Psicopedagógica. Porto Alegre: Artmed, 2008.

WINNICOTT, Donald. A Criança e seu Mundo. Editora LTC. 6ª. Edição. 2008.

_________________. A Família e o Desenvolvimento Individual. Editora

Martins Fontes. 3ª. Edição. 2005

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_________________. O Brincar e a Realidade. Editora Imago, 1975.

__________________. Privação e Delinquência. Editora Martins Fontes. 1ª.

Edição. 2005.

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ÍNDICE

FOLHA DE ROSTO 2

AGRADECIMENTO 3

DEDICATÓRIA 4

EPÍGRAFO 5

RESUMO 6

METODOLOGIA 7

SUMÁRIO 8

INTRODUÇÃO 9

CAPÍTULO I

NOÇÕES BÁSICAS SOBRE MATERNAGEM E DESENVOLVIMENTO DO EGO 11

1.1. Considerações sobre o Processo Dependência Absoluta a Independência. 12

1.2 As funções maternas primárias. 17

1.3 A criança e o crescimento dos laços familiares 20

CAPÍTULO II

A FAMÍLIA E A FORMAÇÃO DOS VÍNCULOS 23

2.1 A Importância de se olhar para dentro da família 26

CAPÍTULO III

O Psicopedagogo e seu olhar para o novo dilema: patologizar ou cuidar... Eis a questão. 32

3.1 A entrada do psicopedagogo na escola 33

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CONCLUSÃO 41

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 42

ÍNDICE 44