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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E
DESENVOLVIMENTO DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS
PROJETO A VEZ DO MESTRE
A PSICOPEDAGOGIA E A RELAÇÃO PROFESSOR-ALUNO NO ENSINO MÉDIO:
SOLIDARIEDADE AO SENTIR, PENSAR E AGIR
Por Mara Moura do Nascimento
Professora Orientadora Maria Esther de Araujo Oliveira
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Rio de Janeiro
Abril/2005 UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PSICOPEDAGOGIA PROJETO A VEZ DO MESTRE
A PSICOPEDAGOGIA E A RELAÇÃO PROFESSOR-ALUNO NO ENSINO MÉDIO:
SOLIDARIEDADE AO SENTIR, PENSAR E AGIR
Por Mara Moura do Nascimento
Monografia apresentada à Universidade Candido Mendes como condição prévia para a conclusão do Curso de Pós-Graduação “Lato Sensu” em Psico-pedagogia. Professora Orientadora Maria Esther de Araujo Oliveira.
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Rio de Janeiro
Abril/2005
AGRADECIMENTOS
À professora Maria Esther de
Araujo Oliveira da Pós-Graduação
em Psico
pedagogia da Universidade
Candido Mendes, grande
orientadora, pacien- te e amiga,
através desta pequena aventura
axiológica.
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Obrigada
DEDICATÓRIA
Este trabalho é dedicado a todos
os psicopedagogos institucionais
que buscam superar os desafios
do relacionamento professor-
aluno em tempos de globalização.
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RESUMO
Esta pesquisa apresenta alguns desdobramentos importantes
sobre a solidariedade, como a compaixão, o reconhecimento e a
universalização, conforme nos explica García Roca (1994), que ainda
sustenta a seu começo na empatia. Mas, classificando os valores humanos
em aspectos intelectuais, físicos, psíquicos, mentais e espirituais,
encontramos em Martinelli (1996), o valor “solidariedade” compreendido no
campo espiritual, como a mais elevada conquista da personalidade humana.
Por isso, como objetivo da pesquisa procura-se conduzir a compreensão das
necessidades e estratégias para satisfação no trabalho psicopedagógico
institucional, observando ainda os conflitos geradores vinculados à ação
solidária, uma vez que os atuais sistemas educacionais dissociam o aspecto
material do espiritual, fragmentando o conhecimento e comprometendo o
desenvolvimento integrado da personalidade dos alunos.
Procura-se também entender que as indiferenças podem ser superadas, ao
reconhecer o outro em nós, amparados por uma abordagem educacional, o
que torna a comunidade escolar identificada com a humanidade. Dessa
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forma, a análise traz alguns conhecimentos relevantes sobre a
“solidariedade” e sua vinculação a outros aspectos para além do campo
educacional.
METODOLOGIA
A metodologia foi realizada por um pequeno levantamento
bibliográfico de três obras de Edgar Morin, como também utilizando as idéias
que permeiam o trabalho de dois educadores nacionais, Paulo Freire e
Rubem Alves, à luz de pressupostos teóricos de Carl Rogers e
embasamentos de comentadores conhecidos, atuantes na última década
dentro da sociologia do conflito, que tratam do tema como García Roca,
Martinelli e Juan Escamez.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
CAPÍTULO I
SENTIR A SOLIDARIEDADE COMO UM VALOR CAPÍTULO II
PENSAR A SOLIDARIEDADE COMO UM CAMINHO PSICOPEDAGÓGICO CAPÍTULO III
AGIR COM SOLIDARIEDADE BUSCANDO MUDANÇAS NA RELAÇÃO PROFESSOR-ALUNO CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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FOLHA DE AVALIAÇÃO
ÍNDICE
ANEXOS
INTRODUÇÃO
Em pouco tempo assistimos enormes mudanças na sociedade. Começando com a
educação, que antes cabia aos pais e hoje é dividida com a escola. A própria Lei de Diretrizes e
Bases da Educação ampara essa nova atribuição. Mas percebemos que os professores, de um
modo geral, não estão capacitados para essa nova função, pois em seus cursos de formação, não
fica estabelecido que serão muito solicitados pelas famílias e responsáveis em relação à educação
dos filhos, além da formação. E o resultado que presenciamos são alunos que não respeitam os
educadores nem os pais.
Além disso, percebemos com Morin (2002), que neste começo de século, o homem se
defronta com várias crises, muitas que envolvem diretamente a própria sobrevivência da
humanidade, o que vai influenciar grandemente educadores e educandos, mudando perspectivas,
sonhos e valores.
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Por isso, uma das tarefas importantes da psicopedagogia institucional é trabalhar junto
ao relacionamento professor-aluno, devido a grande carência dos educadores sobre as noções
básicas de psicologia e da adolescência.
Dessa forma, esta pesquisa trata da questão da “solidariedade”, que representa uma
possibilidade de resposta à permanente busca da educação no século XXI, empenhada em
atualizar seus métodos psicopedagógicos, em capacitar seus professores, e, em construir a ponte
entre o conhecimento e o desenvolvimento ético do caráter.
O objeto da pesquisa foi estudar o conceito “solidariedade” mostrado na LDB 9394/96,
Art. 2o., cujo texto oferece espaço de flexibilidade para que os sistemas de ensino operem,
criativamente, os seus ordenamentos, fazendo ainda referências à liberdade, à auto-estima e à
autonomia, relacionados ao Ensino Médio.
Encontramos, vivenciando conosco nesta encruzilhada do processo de nossa civilização,
os alunos do Ensino Médio sedentos de conhecimento e de experiências, em busca das nascentes
da sabedoria, que precisam encontrar seu rumo para direcionar seu destino, enquanto os
educadores, desejosos de pôr em prática mudança no comportamento social, precisam renovar a
compreensão do homem, do mundo e das ciências exatas e humanas. E que isso não seja uma
renovação apenas intelectual, mas com uma transformação interior, atingindo o mais profundo do
ser e se manifestando por suas ações.
Nessa transição, processada entre alunos e educadores, o psicopedagogo tem um papel
fundamental, já que pode trazer uma nova compreensão da natureza humana, do mundo e da
própria existência.
Sendo assim, um problema precisa ser discutido: Como a psicopedagogia institucional
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poderia auxiliar o relacionamento professor-aluno no ensino médio? E conseqüentemente, auxiliar
no desenvolvimento da personalidade do próprio aluno?
Através de diferentes leituras de teóricos sobre o tema, buscamos a ênfase no recurso
da solidariedade, daí que a hipótese com a qual a pesquisa foi orientada constitue-se na
descoberta da atuação solidária do psicopedagogo, que ao enfatizar as similaridades, propicia o
desenvolvimento da personalidade, de credo, cultura, raça e até mesmo da posição sócio-
econômica do outro, podendo ser esse outro, tanto educador quanto educando. Isso porque
saber lidar com o outro pelo viés da solidariedade torna-se, no momento, essencial para um
trabalho psicopedagógico de sucesso.
A importância em se trabalhar este tema foi considerada primordialmente, porque o
estudo de um tema respaldado pela LDB 9394/96 sempre valoriza qualquer pesquisa. Verifica-se
ainda poucos estudos ligados a essa questão, ligando o desenvolvimento da personalidade à ação
psicopedagógica institucional, o que nos influencia a pesquisarmos sobre a “solidariedade”, em
função dos paradoxos a que estão sujeitos o educador. Mas acima de tudo, constitui-se um
processo muito instigante, o fato de ser efetuada uma pesquisa em psicopedagogia, vinculando o
tema da “solidariedade” ao desenvolvimento da personalidade e principalmente, à luz das aulas
teóricas dos professores do curso de Pós-Graduação da Universidade Candido Mendes.
Para desenvolver os estudos, a pesquisa foi dividida em três capítulos. No primeiro
capítulo, procurando na polissemia da palavra “solidariedade”, foi analisado o sentido do valor,
como o sentido utilizado na LDB, para objetivar uma classificação na ordem axiológica, através
do trabalho de Martinelli (1996), estabelecendo um princípio para se entender a ação solidária
num sistema de relações. No segundo capítulo, identificando um caminho pautado na
solidariedade, a fala de Morin (2002) foi trabalhada na orientação do trabalho psicopedagógico
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que reconhece a dignidade de alunos e professores e procura questionar o estilo de vida presidido
pela invasão das coisas, já que o ter, produzir e consumir é uma espécie de triângulo mágico que
deve ser denunciado constantemente como gerador da cultura do possuir e do ganhar a qualquer
custo. No terceiro capítulo, a solidariedade é empregada para se buscar mudanças nas relações
estabelecidas, através dos pressupostos de Rogers (1980), gerando questionamentos que devem
ser elucidados em conjunto no dia-a-dia da escola.
CAPÍTULO I
SENTIR [ Auto-análise ]
· “Aquele que obtém uma vitória sobre outros homens é forte; porém, quem consegue vencer a si mesmo é todo-poderoso.”
Lao-tsé
· “A maior sabedoria é conhecer a si mesmo.” Galileu Galilei
[ Espírito de pesquisa - Busca ]
[ Esforço ]
· “Não é por veredas planas que se sobe às alturas.”
Sêneca
· “Esquecendo o caminho já percorrido,
me esforço por alcançar o que está mais adiante.” São Paulo
[ Sinceridade ]
· “As palavras vão ao coração quando
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· “Busquem sua felicidade na felicidade de todos.” Zoroastro
· “Antes escutava suas palavras e confiava em suas ações. Agora escuto o que dizem e observo o que fazem.”
Confúcio
[ Atenção ]
· “Busca dentro de ti mesmo e lá encontrarás tudo.” Sólon
[ Honestidade ]
· “Se sentes mais vergonha diante dos outros que diante de ti mesmo, é porque não estimas tua alma.” Anônimo
saem do coração.” Rabindranath Tagore
· “A autenticidade perde amizades,
porém ganha amigos.” José Narosky
[ Caráter ]
· “O caráter não é nada de postiço. Não é uma etiqueta que se cola e descola à vontade. Não é jóia que se exibe em público e se guarda depois a chave, no fundo de um cofre de veludo. O caráter são hábitos que se imprimem para sempre na vontade. O homem de caráter é o mesmo em toda a parte. Sabe guardar as conveniências, mas desconhece oportunis-mos. O que não se permite a si mesmo perante a sociedade não o faz tampouco em oculto, nem no mais íntimo recesso da consciência.”
Arcebispo D. Aquino Corrêa
1. A SOLIDARIEDADE COMO UM VALOR
O que é solidariedade? Costa (1992) pensa a solidariedade como uma conduta
social aprendida. Assim, podemos adquirir essa conduta como podemos perder a habilidade de
exercê-la. Ao mesmo tempo, joga com a polissemia da palavra, empregando como sinônimo de
fraternidade, como equivalente ao princípio moral que recomenda respeito pelo próximo, e,
empregando como um modo técnico, tendo o valor de preceito epistêmico. Ou seja, a
solidariedade para o autor é, ao mesmo tempo, princípio ético e epistêmico. Diz o que podemos
conhecer e para que queremos conhecer. Afinal para que saber e por que saber sobre a
solidariedade? E é Costa quem responde: para construir junto com os outros, uma vida mais bela
e mais feliz.
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Concordando com o autor, para começar, pensamos a solidariedade como um valor
e, podemos ver que na filosofia, o estudo e a crítica dos valores são realizados pela axiologia.
Tudo porque o homem, pela configuração mental ou mesmo espiritual, não vive mergulhado tão
somente num mundo de coisas materiais, como acontece com os outros animais, mas num
ambiente de valores, símbolos e sinais. Por isso é necessário a exata compreensão dos valores,
antes de se estudar sobre a solidariedade.
O filósofo Nietzsche deu status filosófico aos valores, mas foi Max Scheler quem
atuou no campo da pesquisa dos valores, na descrição dos fenômenos ou das essências puras
que ocorrem na consciência. Por meio de sua pesquisa, Scheler concluiu que os valores
pertencem a uma esfera que não se confunde com a do ser, pois possuem uma peculiaridade
irredutível. Os valores são percebidos não por uma introspecção simples, mas por uma instituição
emocional.
Os valores apresentam uma imensa dispersão, ficando difícil conceituá-los com
abrangência. Segundo Martinelli (1996), deve-se englobar na designação de valores a honra, o
dinheiro, o zelo, o dever, o direito etc., pois todos são valores e por isso sua definição deve ser
de tal ordem que convenha a essas categorias axiológicas.
É comum conceituar valor como uma não-indiferença de alguma coisa com um
sujeito ou uma consciência motivada. Mas, conforme Martinelli (1996), os valores se alicerçam
em dois aspectos: como um sujeito dotado da necessidade de motivação; e como um objeto, uma
pessoa, uma atitude, algo enfim capaz de satisfazer ou atender à exigência do sujeito.
Para se chegar à solidariedade deve-se desencadear a motivação interior,
despertando, pela atuação do psicopedagogo, o interesse em tal descoberta, porque é importante
ensinar a pensar, a enfrentar desafios internos e externos, e fazer do ato de viver a grande
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oportunidade para a ampliação de subsídios na investigação da própria realidade. Só assim uma
transformação terá êxito e permitirá que cada indivíduo contribua para o progresso consciente
dos valores, esforçando-se para construção de um novo modelo de sociedade.
1.1. Sobre os valores
Os valores do homem são fundamentos morais e espirituais da consciência humana.
Os educadores, mais dos que todos, podem e devem tomar conhecimento dos valores inerentes
aos homens. Muitos conflitos que afligem a humanidade estão na negação dos valores como
suporte e inspiração para o desenvolvimento integral do potencial individual e em conseqüência,
do potencial social.
O educador deve ter conhecimento que sem os valores registrados no profundo de
nosso ser, mesmo que adormecidos na mente e latentes na consciência, não seria possível
encontrar o propósito da vida, já que os valores se constituem na reserva moral e espiritual
reconhecida da condição humana.
A vivência dos valores alicerça o caráter e reflete-se na conduta como uma conquista
espiritual da personalidade. No dinamismo histórico, os valores permanecem inalteráveis,
conforme Martinelli (1996), como herança em cada um, mas que apontam na direção do
autoconhecimento.
Nesse grande drama humano, criado por nossos erros e acertos, os valores abrem
espaço e trazem inovações essenciais para o viver, que através do conviver com o outro,
objetiva-se o sobreviver, indo além do viver no cumprimento do papel do ser humano.
Vive-se tempos críticos, violentos e desesperados e isso acontece devido ao fato de
grande parte da humanidade ter esquecido seus valores, considerando-os ultrapassados e sem
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interesse. Por essa razão, a falta de amor, o medo, a enganação têm qualificado os
relacionamentos emocionais e operativos dos homens uns com os outros e dos homens com o
mundo, apesar do ser humano visar a felicidade, conforme Aristóteles, cujas palavras encontram
eco até nossos dias.
No entanto, conforme diz Aristóteles, cada ser humano responde à busca pela
felicidade de forma singular, pois a felicidade pode representar para alguns como paz de espírito,
como também representa para outros fama, ou mesmo poder, dinheiro, beleza e tantas outras
características.
Mas percebe-se que o homem constata, mais cedo do que imagina, que os bens
materiais, a fama, o poder econômico, a beleza são ineficazes como portadores de felicidade, o
que traz a todos uma auto-indagação e a necessidade de mudanças. E aos poucos percebe-se
que a felicidade é uma conquista da alma e não depende de circunstâncias e satisfação de
desejos. Isso obriga o homem a redefinir a sua noção de poder, dinheiro, fama, beleza e
diferentes características que são anuladas com o amor e o conhecimento compartilhado.
Dessa forma, como as relações de poder mudam na medida em que os valores criam
novos significados e modos de ver a vida, o grande desafio para todos educadores, especialmente
para o psicopedagogo, seria resgatar os valores humanos, e dentre esses, a solidariedade que
promove a verdadeira prosperidade do homem, do país e do mundo.
1.2. Os valores e a personalidade
Os valores que podemos ditar como absolutos e que participam das manifestações
da vida são os instrumentos de aprimoramento da personalidade, como a verdade, a ação
correta, o amor, a paz e a não-violência, que abrangem cinco aspectos importantes, conforme
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Martinelli (1996). Esses aspectos por sua vez englobam uma gama de valores relativos que
devem ser assimilados pelo ser humano e praticados na vida cotidiana.
Vivenciar os valores é de extrema importância para o caráter porque provoca muitas
transformações dos níveis de consciência. A partir da internalização dos valores, os pensamentos,
as diversas formas de expressão e as ações adquirem padrões novos e um espectro de atuação
cada vez mais amplo. Nesse ponto, cada um pode assumir responsabilidade por si mesmo e
também perante o mundo. De fato, concordamos com Martinelli (1996), que o resgate dos
valores humanos, principalmente da solidariedade se constitui num grande desafio para a atuação
psicopedagógica.
Enfim, a partir da crise do homem em seus aspectos político-econômicos, nas
rivalidades religiosas, raciais e de classes, a educação, por tabela, também reflete a crise com
seus desequilíbrios e contradições. E como o desenvolvimento tecnológico, científico e a
globalização, que a cada dia se supera em inovações, não serviu para unir os povos, mas sim para
aumentar as diferenças e as distâncias, pois só se utiliza a inteligência, a informação e a
criatividade para o serviço da crueldade e do egoísmo, resta a solução para tanto descompasso
no próprio homem. E, para tanto, o homem deve procurar o autoconhecimento, usar a inteligência
para fazer o bem, minimizando o sofrimento, as dificuldades de aprendizagem através da vivência
dos valores que são intrínsecos ao próprio homem, como estabelece Martinelli (1996), seguindo
os aspectos intelectual, físico, psíquico, mental e espiritual, de acordo com os valores de Max
Scheler.
1.2.1. No aspecto intelectual
O psicopedagogo encontra a verdade como um valor humano porque só o homem
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pode encontrar e vivenciar a verdade. A verdade dirige a conduta do homem. É o que dá
significado e dignidade à vida. Ser verdadeiro é uma conquista da mente, logo é um valor lógico.
A verdade relativa é aquela que se percebe através dos sentidos físicos, e é
representada pelo que se vê, se sente e sobre a qual se emite julgamento. É, portanto, variável de
acordo com as experiências vividas pelo aluno.
VERDADE valores relativos
OTIMISMO DISCERNIMENTO INTERESSE PELO CONHECIMENTO AUTO-ANÁLISE ESPÍRITO DE PESQUISA PERSPICÁCIA ATENÇÃO REFLEXÃO SINCERIDADE OTIMISMO HONESTIDADE EXATIDÃO COERÊNCIA IMPARCIALIDADE SENTIDO DE REALIDADE JUSTIÇA LEALDADE LIDERANÇA HUMILDADE
1.2.2. No aspecto físico
Conforme Morin (2002), descobrir quem somos é o princípio e o fim da educação.
O aspecto físico seria a ação que permite uma manifestação proveitosa da consciência. A
personalidade assume diferentes papéis, enfrenta forças opostas e conflitantes ao viver a sua
natureza sensorial.
Por isso, Martinelli (1996) apresenta nesse aspecto físico, os valores éticos, que
chama de ação correta.
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AÇÃO CORRETA valores relativos
DEVER ÉTICA HONRADEZ VIDA SALUTAR INICIATIVA PERSEVERANÇA RESPONSABILIDADE RESPEITO ESFORÇO SIMPLICIDADE AMABILIDADE BONDADE DISCIPLINA LIMPEZA ORDEM CORAGEM INTEGRIDADE DIGNIDADE SERVIÇO AO PRÓXIMO PRUDÊNCIA
1.2.3. No aspecto psíquico
Seguindo a força da criação, coesão e sustentação da vida, concordamos com
Martinelli (1996), que o amor é a energia de unidade e transformação. O amor sendo inesgotável,
move os universos, o mundo, os seres, os homens. E como vivemos num universo dual entre os
pares de opostos e a relatividade, o amor é o impulso de integração.
Para Martinelli (1996), as divergências se expressam, mais acentuadamente, na luta
entre o amor e seu oposto, que é o medo, quando há a expansão e retração do ser. Por isso, na
eliminação consciente do medo, o homem se liberta do egocentrismo e o amor preenche os
espaços internos, assumindo a direção da vida. E estando, segundo Martinelli (1996), sob o
domínio do medo, ficamos sempre sujeitos ao dualismo do mundo e da ilusão das coisas
inconsistentes e passageiras, que nos fazem sofrer pela sua própria condição de transitoriedade.
Porém com o amor é diferente, pois este é energia que abastece a psiquê, a alma, e
essa plenitude reflete-se em nossos pensamentos, palavras e ações. O educador juntamente com
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o educando que se relacione através do amor, ultrapassa o sentido de posse, da autopreservação
e vence os limites das aversões e preferências. É como se todos se unissem tornando-se felizes e
fazendo os outros também felizes, além de viver em harmonia com os cosmo.
AMOR valores relativos
DEDICAÇÃO AMIZADE GENEROSIDADE DEVOÇÃO GRATIDÃO CARIDADE PERDÃO COMPAIXÃO COMPREENSÃO SIMPATIA IGUALDADE ALEGRIA ESPÍRITO DE SACRIFÍCIO E RENÚNCIA
1.2.4. No aspecto mental
Outro valor importante e base para a felicidade humana seria a paz. A eliminação da
desordem interior criada pelas emoções, pensamentos e desejos permite a experiência da paz. E
para Martinelli (1996), na experiência da paz é que se processam as transformações profundas da
personalidade. Como na mente nascem as idéias, os pensamentos tomam formas e os desejos
tornam-se emoções, a paz pode ser a nossa maior aliada, mas também pode ser o nosso maior
obstáculo, pois em desordem a paz tende a criar pensamentos, dúvidas que devastam e corroem
o nosso interior.
Logo, o repouso mental é tão importante quanto o repouso físico. O psicopedagogo
tem que saber o valor de uma meditação para que professores e alunos tenham mentes que
obedeçam as suas vontades, se esvaziando de falsos egos.
Deve-se ter em mente que o egoísmo, a inveja, a hipocrisia e outros defeitos da
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personalidade nascem da mente humana de natureza animal. Mas o ser humano é diferente dos
animais, devido a sua mentalidade. E a paz se constitui num valor humano porque só o homem
pode domar as paixões e tendências inferiores, redirecionando sua vida.
PAZ valores relativos
SILÊNCIO INTERIOR CALMA CONTENTAMENTO TRANQÜILIDADE PACIÊNCIA AUTOCONTROLE AUTO-ESTIMA AUTOCONFIANÇA AUTO-ACEITAÇÃO TOLERÂNCIA CONCENTRAÇÃO DESPRENDIMENTO (DESAPEGO)
1.2.5. No aspecto espiritual
A mais elevada conquista da personalidade humana, seria quando o ser humano
conquista a si mesmo, tornando-se incapaz de ferir algo ou alguém através de pensamentos,
palavras ou atitudes. Ou seja, na conquista de nossas tendências inferiores e no cultivo das
virtudes se atinge a não-violência.
Para se vivenciar a não-violência como valor importante é preciso respeitar as leis
naturais, os seres e coisas criadas, ter humildade e sabedoria. A vida, conforme diz Martinelli
(1996), se nutre da vida, mas o ser humano pode atingir a grandeza de saber que é possível
subsistir sem infligir danos desnecessários as outras formas de vida. É a finalidade, a meta do
desenvolvimento da consciência, a perfeição humana. A vitória do espírito sobre a natureza
inferior é refletida na não-violência.
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NÃO-VIOLÊNCIA valores relativos
FRATERNIDADE COOPERAÇÃO CONCÓRDIA ALTRUÍSMO FORÇA INTERIOR RESPEITO À CIDADANIA PATRIOTISMO RESPONSABILIDADE CÍVICA UNIDADE SOLIDARIEDADE RESPEITO À NATUREZA RESPEITO PELAS DIFERENTES RAÇAS, CULTURAS E RELIGIÕES USO ADEQUADO: DO TEMPO DA ENERGIA DO DINHEIRO DA ENERGIA VITAL DA ENERGIA DO ALIMENTO DO CONHECIMENTO
Enfim, a razão desses posicionamentos, sentimentos e valores seria para elucidar que
o psicopedagogo, apesar de seus próprios valores, sentimentos e vivências, pode ter em mente
que dependendo da esfera de sua atividade profissional, mudanças extremamente benéficas
ocorrem nos relacionamentos humanos, assim como no trato com as emoções.
Ao expor essas definições o profissional tem auxílio para observação das conexões
internas que se estabelecem nas relações diárias dentro da escola, na reformulação de opiniões e
comportamentos.
E quando pode trabalhar as relações vinculadas aos valores, principalmente o valor
em destaque, a solidariedade, o psicopedagogo reintroduz na corrente cultural processada na
escola um interesse renovado pelo autoconhecimento.
CAPÍTULO II
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PENSAR [ Responsabilidade ]
· “Cada um é responsável pelo que lhe sucede
e tem o poder de decidir o que quer ser. O que és hoje é o resultado dos teus atos passados. O que serás amanhã é o resultado dos teus atos de hoje.” Vivekananda
· “A consciência é o melhor livro de moral, e
é, seguramente, o que mais devemos consultar.” Pascal
[ Respeito ]
· “Seja uma pessoa e trate os outros como
pessoas.” Hegel
· “Antes de tudo, respeitem a vocês mesmos.”
Pitágoras
[ Simplicidade ]
· “O simples e o natural é o supremo e último fim da cultura.” Nietzsche
[ Amabilidade ]
· “Não importa a causa do teu sofrimento, não firas teu semelhante.” Buda
[ Iniciativa ]
· “Aventurar-se causa ansiedade; porém, não se aventurar é perder-se. E aventurar- se no mais alto sentido é precisamente to- mar consciência de si mesmo.”
Sören Kierkegaard
[ Perseverança ]
· “Existem homens que lutam um dia e são bons. Existem homens que lutam um ano e são muito bons. Porém, existem os que lutam toda a vida. Esses são impres- cindíveis.”
Bertolt Brecht
[ Coerência ]
· “Dizer o que sentimos. Sentir o que dizemos. Concordar as palavras com a mente.”
Sêneca
[ Justiça ]
“Deveis fazer a todo custo o que é justo; deveis deixar de fazer o injunto, sem im- portar-vos com o que o ignorante pense ou diga.”
Krishnamurti
· “Se as pessoas que ocupam posições de
menor destaque não têm confiança nos de cima, o governo do povo é uma impossibi- lidade.”
Confúcio
2. A SOLIDARIEDADE COMO UM CAMINHO PSICOPEDAGÓGICO
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Porém, o psicopedagogo precisa ter em mente que a solidariedade é uma forma de
comunicação profunda com o outro (Martinelli, 1996), porque sendo solidários, enfatizamos
nossas similaridades e superamos grandes empecilhos nas mais diversas formas de personalidade,
credo, cultura, raça, posição sócio-econômica. A solidariedade supera a indiferença e faz
reconhecer o outro em nós. Ela nos torna mais receptivos e identificados com a humanidade e o
cosmos.
E que melhor forma para se pensar um caminho psicopedagógico que abrangesse
por completo a solidariedade? Morin (2002) procura mostrar a resposta em sete passos. Para
isso deve-se ter em mente sobre os erros e as ilusões inerentes ao conhecimento, já que todos
ensinam e todos aprendem no processo ensino-aprendizagem, mas é importante que o educando
esteja seguro no aspecto erro e ilusão para que na vivência diária haja lucidez e discernimento
quanto às diversas cegueiras paradigmáticas que elucidam, mas cegam, revelam, mas ocultam,
abrangendo diferentes tipos de equívocos e erros mentais, intelectuais e da razão. Deve ficar,
portanto claro, que a primeira impressão nem sempre é a correta, muito menos as idéias das quais
nos apossamos, pois o inesperado vive a nos surpreender e a incerteza do conhecimento é a
marca das teorias abertas. Concordamos com Morin, quando diz:
“É impressionante que a educação que visa a transmitir conhecimentos seja cega quanto ao que é o conhecimento humano, seus dispositivos, enfermidades, dificuldades, tendências ao erro e à ilusão, e não se preocupe em fazer conhecer o que é conhecer. De fato, o conhecimento não pode ser considerado uma ferramenta ready made, que pode ser utilizada sem que sua natureza seja examinada. Da mesma forma, o conhecimento do conhecimento deve aparecer como necessidade primeira, que serviria de preparação para enfrentar os riscos permanentes de erro e de ilusão, que não cessam de parasitar a mente humana. Trata-se de armar cada mente no combate vital rumo à lucidez. É necessário introduzir e desenvolver na educação o estudo das características cerebrais, mentais, culturais dos conhecimentos humanos, de seus
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processos e modalidades, das disposições tanto psíquicas quanto culturais que o conduzem ao erro ou à ilusão.” (2002: 13-14)
Podemos, em seguida, articular com Morin (2002) sobre os princípios do
conhecimento pertinente a ser abordado pelo psicopedagogo, pois é através de vários meios,
além da escola, que o educando tem acesso às informações sobre o mundo. Mas a maioria tem a
possibilidade de articular e organizar tais informações? Os alunos e até mesmo os professores
conseguem perceber o contexto, o global, a relação todo/partes, o multidimensional, o
complexo? Diante dessas questões, o autor indica a reforma do pensamento, que deve ser
paradigmática e não programática, já que todos precisam saber que se de um lado a escola
possui os saberes divididos, compartimentados, de outro lado a mesma escola participa de
problemas multidisciplinares, transnacionais, globais e planetários.
Razão pela qual o conhecimento pertinente que abrange o contexto, com os saberes
isolados são insuficientes. Também aquele conhecimento que abrange o global, as relações entre
o que é importante saber e as especialidades não atinge o que é multidimensional. Não alcança o
aluno em sua inteireza, em termos biológicos, psíquicos, social, afetivo, racional, já que esse
aluno ainda pertence a uma sociedade com diversas características históricas, econômicas,
sociais, religiosas. Ou seja, ainda impede que se atinja o complexo dentro da concepção global.
É importante que o psicopedagogo tenha seguro que a inteligência geral, ocasiona a
antinomia, a contradição que impera na sociedade e no ser humano, como os progressos
gigantescos criados por homens desunidos pela forte especialização e enfraquecidos na
solidariedade e na responsabilidade. Razão pela qual descatamos a posição do mesmo autor:
“Existe um problema capital, sempre ignorado, que é o da necessidade de promover o conhecimento capaz de aprender problemas globais e fundamentais para neles inserir os conhecimentos parciais e locais. A supremacia do conhecimento fragmentado de acordo com as disciplinas
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impede freqüentemente de operar o vínculo entre as partes e a totalidade, e deve ser substituída por um modo de conhecimento capaz de apreender os objetos em seu contexto, sua complexidade, seu conjunto. É necessário desenvolver a aptidão natural do espírito humano para situar todas essas informações em um contexto e um conjunto. É preciso ensinar os métodos que permitam estabelecer as relaçoes mútuas e as influências recíprocas entre as partes e o todo em um mundo complexo.” (Ibidem, p.14)
Quando o educador procura ensinar a condição humana, ele quer compactuar com
Morin (2002) que propõe a compreensão da vida e de nós mesmos como o princípio e o fim da
educação. Mas para se compreender a vida, o enraizamento e desenraizamento do ser humano
se faz necessário conhecer as nossas condições cósmicas, físicas, terrestres e humanas. Ou seja,
o ser humano aprendendo a conhecer o humano em suas esferas física, individual e social,
conforme o mesmo autor diz:
“O ser humano é a um só tempo físico, biológico, psíquico, cultural, social, histórico. Esta unidade complexa da natureza humana é totalmente desintegrada na educação por meio das disciplinas, tendo-se tornado impossível aprender o que significa ser humano. É preciso restaurá-la, de modo que cada um, onde quer que se encontre, tome conhecimento e consciência, ao mesmo tempo, de sua identidade complexa e de sua identidade comum a todos os outros humanos. Desse modo, a condição humana deveria ser o objeto essencial de todo o ensino. (...) é possível, com base nas disciplinas atuais, reconhecer a unidade e a complexidade humanas, reunindo e organizando conhecimentos dispersos nas ciências da natureza, nas ciências humanas, na literatura e na filosofia, e põe em evidência o elo indissolúvel entre a unidade e a diversidade de tudo que é humano.” (Ibidem, 15)
O psicopedagogo precisa ter em mente que todos têm que conhecer a identidade
terrena, pois o aluno, esse futuro homem do século XXI precisa refletir sobre seus problemas e
os problemas de seu tempo, para viver solidariamente. Se esse homem não for ensinado a
compreender a mundialização, que com Jacques Levy seria “o surgimento de um objeto novo,
o mundo como tal”, a globalização, a complexidade, a ter um pensamento policêntrico, só
poderá absorver o pior do legado do século XX, como a sua herança de morte, das armas
nucleares, da AIDS, das bactérias erradicadas que retornam com força total. Mas, segundo
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Morin (2002) há esperança justamente com a contribuição solidária do pensamento que emerge
contra o status quo e que auxilia o jogo da vida na contradição das possibilidades que surgem. E
de acordo com as palavras do autor:
“O destino planetário do gênero humano é outra realidade-chave até agora ignorada pela educação. O conhecimento dos desenvolvimentos da era planetária, que tendem a crescer no século XXI, e o reconhecimento da identidade terrena, que se tornará cada vez mais indispensável a cada um e a todos, devem converter-se em um dos principais objetos da educação. Convém ensinar a história da era planetária, que se inicia com o estabelecimento da comunicação entre todos os continentes do século XVI, e mostrar como todas as partes do mundo se tornaram solidárias, sem, contudo, ocultar as opressões e a dominação que devastaram a humanidade e que ainda não desapareceram. Será preciso indicar o complexo de crise planetária que marca o século XX, mostrando que todos os seres humanos, confrontados de agora em diante aos mesmos problemas de vida e de morte, partilham um destino comum.” (Ibidem, 15-16)
O que leva o psicopedagogo a pensar como enfrentar as incertezas e preparar os
alunos a entender o que o século XX descobriu e passou para o século XXI, senão a perda do
futuro e a imprevisibilidade da história humana? Morin (2002) nos adverte para a não linearidade
da história que criadora e destruidora originam um mundo incerto, mas ao enfrentarmos as
incertezas, nos encaminhamos a novas aventuras, desafios que nos trazem outras estratégias de
ação, como a atuação através da solidariedade. Com muita propriedade o estudioso mostra que:
“As ciências permitiram que adquiríssemos muitas certezas, mas igualmente revelaram, ao longo do século XX, inúmeras incertezas. A educação deveria incluir o ensino das incertezas que surgiram nas ciências físicas (microfísicas, termodinâmica, cosmologia), nas ciências da evolução biológica e nas ciências históricas. Seria preciso ensinar princípios de estratégia que permitiriam enfrentar os imprevistos, o inesperado e a incerteza, e modificar seu desenvolvimento, em virtude das informações adquiridas ao longo do tempo. É preciso aprender a navegar em um oceano de incertezas em meio a arquipélagos de certeza. A fórmula do poeta grego Eurípedes, que data de 25 séculos, nunca foi tão atual: “O esperado não se cumpre, e ao inesperado um deus abre o caminho”. O abandono das concepções deterministas da história humana que acreditavam poder predizer nosso futuro, o estudo dos grandes
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acontecimentos e desastres de nosso século, todos inesperados, o caráter doravante desconhecido da aventura humana devem-nos incitar a preparar as mentes para esperar o inesperado, para enfrentá-lo. É necessário que todos os que se ocupam da educação constituam a vanguarda ante a incerteza de nossos tempos.” (Ibidem, 16)
O passo seguinte seria o ensino da compreensão, que somente se alcança através da
solidariedade, pois de que outra forma o psicopedagogo pode orientar o aluno seguindo a missão
espiritual da educação, ou seja, a compreensão? Morin (2002) estabelece a existência de duas
compreensões, uma intelectual mais objetiva e outra humana, por isso intersubjetiva, alertando
para que a educação identifique sempre os obstáculos à compreensão como os ruídos, a
polissemia e a ignorância, os valores, os imperativos éticos, as idéias e até a estrutura mental de
cada um. Dessa forma, importa que o psicopedagogo procure junto ao aluno e aos profissionais
da educação a superação do egocentrismo e o espírito redutor, objetivando a ética da
compreensão, do “bem estar”, da introspecção, aliás nada comum na atualidade.
Há necessidade de que todos tenham consciência da complexidade do homem, e
que melhor lugar senão a escola para mostrar a nossa abertura subjetiva, simpática em relação
aos nossos pares, ao outro? Há necessidade da interiorização da tolerância, para se
compreender as éticas e as culturas, que sendo meio acaba por ser fim da comunicação,
conforme o autor evidencia:
“A compreensão é a um só tempo meio e fim da comunicação humana. Entretanto, a educação para a compreensão está ausente do ensino. O planeta necessita, em todos os sentidos de compreensão mútua. Considerando a importância da educação para a compreensão, em todos os níveis educativos e em todas as idades, o desenvolvimento da compreensão pede a reforma das mentalidades. Esta deve ser a obra para a educação do futuro. A compreensão mútua entre os seres humanos, quer próximos, quer estranhos, é daqui para a frente vital para que as relações humanas saiam de seu estado bárbaro de incompreensão. Daí decorre a necessidade de estudar a incompreensão a partir de suas raízes, suas modalidades e seus efeitos. Este estudo é tanto mais necessário
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porque enfocaria não os sintomas, mas as causas do racismo, da xenofobia, do desprezo. Constituiria, ao mesmo tempo, uma das bases mais seguras da educação para a paz, à qual estamos ligados por essência e vocação.” (Ibidem, 17)
O psicopedagogo precisa conhecer sobre a ética do gênero humano, que Morin
(2002) estabelece como a antropo-ética, mostrando como esse pensamento nos instrui a assumir
a missão antropológica do milênio, pois só assim poderemos compreender a esperança na
completude da humanidade, que se apresenta na consciência individual além da individualidade. E
assim, orientar sobre a complexidade da democracia e numa posição dialógica, mostrar o futuro
dessa democracia, se não houver solidariedade. Por isso concordamos com as palavras de
Morin:
“A educação deve conduzir à “antropo-ética”, levando em conta o caráter ternário da condição humana, que é ser ao mesmo tempo indivíduo/sociedade/espécie. Nesse sentido, a ética indivíduo/espécie necessita do controle mútuo da sociedade pelo indivíduo e do indivíduo pela sociedade, ou seja, a democracia; a ética indivíduo/espécie convoca, ao século XXI, a cidadania terrestre. A ética não poderia ser ensinada por meio de lições de moral. Deve formar-se nas mentes com base na consciência de que o humano é, ao mesmo tempo, indivíduo, parte da sociedade, parte da espécie. Carregamos em nós esta tripla realidade. Desse modo, todo desenvolvimento verdadeiramente humano deve compreender o desenvolvimento conjunto das autonomias individuais, das participações comunitárias e da consciência de pertencer à espécie humana. Partindo disso, esboçam-se duas grandes finalidades ético-políticas do novo milênio: estabelecer uma relação de controle mútuo entre a sociedade e os indivíduos pela democracia e conceber a Humanidade como comunidade planetária. A educação deve contribuir não somente para a tomada de consciência de nossa Terra-Pátria, mas também permitir que esta consciência se traduza em vontade de realizar a cidadania terrena.” (Ibidem, 18)
Uma educação voltada para a solidariedade pode ser pensada para se aumentar
gradualmente a autonomia e o auto-controle na personalidade dos educandos, conforme
Martinelli (1996). Não se trata de ensinar virtudes, impor conceitos, mas de facilitar a
autodescoberta de virtudes individuais, já que o adolescente no Ensino Médio que desenvolve um
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bom caráter pela conscientização de suas virtudes terá um comportamento de acordo com os
valores vivenciados e internalizados. Desse modo, ele não pautará as suas ações por regras e
obrigações sociais apenas, mas por uma convicção interior do que seja a solidariedade.
Para uma educação pautada na solidariedade, Martinelli (1996) orienta o
psicopedagogo e os professores a terem como metas importantes:
Conduzir os alunos ao caminho do autoconhecimento e auto-realização pelo
desenvolvimento integral da personalidade e da espiritualidade, independentemente de religião ou
credo;
Fomentar o espírito de equipe, a criatividade, o respeito às diferenças, assim como
a solidariedade e o amor pelos outros e pela natureza;
Auxiliar os alunos na descoberta de suas capacidades e estimular esses alunos a
empregar seus talentos a serviço da escola, da família e até da comunidade;
Livrar os alunos do medo e da culpa impostos culturalmente, mostrando que a
felicidade é o estado natural do ser humano;
Mostrar aos alunos que o poder está na boa qualidade do caráter e no
autoconhecimento e não no dinheiro e coisas que se compra e se adquire;
Demonstrar que o progresso do homem é seu auto-aprimoramento e que esse
aperfeiçoamento traz o progresso social;
Cultivar os valores humanos, os bons costumes e a compreensão do homem como
um ser cósmico;
Despertar nos alunos a consciência de que eles serão as lideranças que
estabelecerão os moldes da sociedade futura;
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Demonstrar que a educação, tanto a que se recebe em família, quanto a que se
recebe na escola são complementares. E que a educação espiritual, não é doutrinação nem
catequese, já que corresponde ao desejo essencial do ser humano de experienciar o sagrado sem
priorizar nenhuma forma de culto ou religião;
Vivenciar o amor como fundamento da fraternidade entre todos e vivenciar a paz
como valorização da vida.
Enfim, pensar na solidariedade como um valor que propicia a aquisição do
conhecimento, precisa ser a idéia fundamental do psicopedagogo ao trabalhar com o professor,
pois assim a ação educativa propicia que o educando construa a auto-realização e defina o
propósito de sua vida, além de ter o pensamento reconstruído para atingir a necessidade social-
chave, que segundo Morin (2002a) seria transformar-se num cidadão capaz de enfrentar os
problemas de seu tempo, uma vez que, segundo o próprio autor (2002b), uma cabeça bem-feita
é uma cabeça capaz de organizar os conhecimentos e que evita com isso, a acumulação de
informações inúteis.
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CAPÍTULO III
AGIR [ Moralidade ]
· “A mais importante busca humana é esforçar-
se pela moralidade em nossa ação. Nosso equilí- brio interno, inclusive da existência, depende dis- so. Somente a moralidade em nossas ações pode dar beleza e dignidade à vida. Fazer disso uma força viva e trazê-la para a consciência é talvez a tarefa principal da educação.” Albert Einstein
[ Humildade ]
· “A soberba é uma das mais perigosas enfer- midades do espírito.”
Montaigne
[ Limpeza ]
· “Jogar limpo significa, antes de tudo, não cul-
par os outros pelos nossos erros.” Erick Moffer
· “Deus olha para as mãos limpas, não para as
[ Coragem ]
· “Não nos falta valor para empreender certas coisas porque são difíceis; porém, são difíceis porque nos falta coragem para empreendê-las.”
Sêneca
[ Prudência ]
· “Prudente é aquele que analisa suas
circunstâncias, observa a conduta dos que o rodeiam e sabe distanciar-se a tempo do que não convém a sua dignidade.”
Cícero
[ Autocontrole ]
· “Pelo tamanho da resposta que deres a quem te ofenda saberás o tamanho da ver- dade que existe na ofensa.”
Mahatma Gandhi
· “Para saber falar é preciso saber exe-
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mãos cheias.” Spinoza
[ Integridade ]
· “É imprescindível acentuar o fato de que a habilidade de amar depende do desenvolvimento do caráter da pessoa.” Erich Fromm
cutar.” Plutarco [ Amizade e ética ]
· “De nada servem a fama, o dinheiro, o
êxito, se não soubermos criar, ao longo de nossa existência, laços de amizade sincera, conduta ética, propósito honesto de nossas atividades, respeito pela lei e pelos nossos semelhantes.” Marcílio
3. COM SOLIDARIEDADE BUSCANDO MUDANÇAS NA RELAÇÃO PROFESSOR-ALUNO
O clima que se estabelece entre educador e educando é importante para a efetiva
liberação das competências e habilidades pessoais que propiciam a realização de cada um. Mas
implícito nesse clima, ou seja, na solidariedade, estará a disponibilidade do educador e o interesse
do educando, tanto na dimensão emocional quando pela dimensão cognitiva.
O psicopedagogo consciente de seu trabalho nas questões das dificuldades de
aprender e procurando contribuir em caráter preventivo, procura ampliar sua prática para uma
nova forma de sentir, pensar e agir frente à aprendizagem dos conceitos na escola. Por isso,
recorrendo a Rogers (1980) procura pistas para que o clima, a solidariedade entre educador e
educando propicie o desenvolvimento, numa franca atuação onde o desenvolvimento da pessoa é
o objetivo pretendido.
A primeira condição consiste na autenticidade, na veracidade, que o autor chama de
congruência. E isto pressupõe que o educador seja sempre ele mesmo em seus relacionamentos,
não mantendo “fachadas” artificiais no seu agir pessoal e profissional. Em termos práticos, o
educador só é útil ao processo educativo quando compreende e expressa verdadeiramente os
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sentimentos que possui. E no âmbito da relação interpessoal, a congruência no relacionamento
abre espaço para que o educador e os educandos possam juntos construir o desenvolvimento.
Rogers (1980) afirma que o educando ao descobrir que o educador está se
permitindo ser como é, tenderá a descobrir nele a mesma liberdade de ação. Nesse mesmo
aspecto Fromm (1984) vem dizer o seguinte:”
“As idéias não influenciam o homem profundamente, quando são apenas ensinadas como idéias e pensamentos. Usualmente quando apresentadas de tal maneira modificam outras idéias: novos pensamentos assumem o lugar de antigos pensamentos, novas palavras tomam o lugar de velhas palavras. Mas tudo o que aconteceu foi uma mudança nos conceitos e nas palavras. O simples travar conhecimento co outras idéias não é o bastante, embora essas idéias, em si mesmas, sejam corretas e poderosas. Mas as idéias só têm, realmente, um efeito sobre o homem quando são vividas por aquele que as ensina, quando são personificadas pelo professor, quando a idéia aparece encarnada.” (39-40)
A segunda atitude importante na criação de um clima, uma solidariedade para a
mudança é a aceitação, atenção ou apreciação, ou seja, a consideração incondicional positiva. Há
mais probabilidade de ocorrer a mudança no educando quando o educador vivencia uma atitude
positiva de aceitação, relativamente ao que quer que o educando esteja “sendo” naquela
circunstância. Ser empático, envolve, assim uma escolha seletiva por parte do educador sobre o
que deve prestar mais atenção e de que modo o educando percebe individualmente o seu mundo
interior. Não se pode considerar essa atitude como um sinal de controle e sim de ajuda, pois o
que se pretende é que o educando obtenha uma compreensão mais objetiva de seu próprio
mundo e possa, então, a partir desse referencial, ter um controle maior sobre si mesmo.
Rogers (1980) observou que o processo de mudança no educando é sempre uma
recíproca das atitudes do educador, conforme diz:
“A medida que o aluno depara-se com o professor escutando com aceitação seus sentimentos, torna-se capaz de escutar com atenção a si
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mesmo; ouvir e aceitar a raiva, o medo, a ternura, a coragem que estão sendo vivenciados. A medida que o aluno percebe o professor apreciando e valorizando mesmo os aspectos ocultos e desagradáveis que foram expressos, ele vivencia apreço e afeição por si mesmo. A medida que o professor é percebido como sendo real, o aluno é capaz de abandonar fachadas, para mostrar mais abertamente sua vivência e interesse.”(p.20)
Sob o ponto de vista político, ao ouvir os seus sentimentos internos, o educando
possibilita em si mesmo a redução do poder que os outros tiveram sobre ele, ao lhe inculcar
culpas, medos e inibições. É muito mais fácil desse modo chegar-se à definição proposta por
Fromm (1984), de obediência, ou seja, obediência autônoma, que é aquela ligada à própria razão
ou convicção, que não é um ato de submissão, mas de afirmação. As convicções e os juízos de
cada pessoa, se foram autenticamente seus, mais fazem parte de si mesmo. Se a pessoa os segue,
não se subjugando a outros, estará sendo ela mesma.
Deste modo, o indivíduo conseguirá, progressivamente, ampliar a compreensão e o
próprio controle sobre si mesmo. E à medida que se aceita, alarga em muito a possibilidade de
comandar mais efetivamente o seu eu. Neste clima permissivo, livre de pressões, de condições
impostas, de julgamentos e avaliações, pode reavaliar as percepções pessoais a respeito de seu
autoconceito, integrando as novas idéias e formulações à organização individual de modo flexível,
coerente e realista.
Em conseqüência, o educando estará mais capacitado a encontrar soluções próprias
para os problemas existentes em sua reestruturação pessoal, tendo nesta procura mais confiança
na sua capacidade de discernimeto e seleção. E é Rudio (1978) quem confirma que:
“Este é o processo de oportunidade para que o indivíduo experiencie, de modo novo, as suas experiências. Assim, torna-se capaz de descobrir, reconhecer, modificar, tornando corretas as percepções que tem de si. Desta maneira, produz-se uma transformação da imagem de si, ensejando um melhor funcionamento do indivíduo e um relacionamento mais construtivo com os outros, ajustando-o melhor ao meio.” (p.25)
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Essas idéias vão ao encontro do pensamento conceitual de educação de Morin
(2002b), compreendido como um processo de evolução e engajamento, sendo a evolução
considerada em termos de expansão horizontal, significando o acúmulo de experiências, e em
termos de expansão vertical, significando a qualidade desse quantitativo de experiências; enquanto
que o engajamento seria visto como um compromisso do homem relativamente ao ser humano e
ao mundo.
Uma definição, como se percebe, que identifica-se com a definição de criatividade,
se a sua interpretação for considerada como sinônimo de auto-revelação da capacidade
individual, e, conseqüentemente, da originalidade de cada um, ou expressão mais marcante, de
sua própria autenticidade.
Portanto, ao psicopedagogo preocupado em recriar esse processo educativo,
respaldado na solidariedade, que questione a si mesmo e aos profissionais da educação, sobre
aspectos que deve considerar para o desenvolvimento de sua atuação:
“Que tipo de experiências são necessárias a minha formação pessoal para que eu chegue a aceitar o educando como pessoa, acreditando nele e em sua tendência à atualização?
Que tipo de experiências são necessárias a minha formação pessoal para que eu tenha sensibilidade às atitudes e comportamentos do educando?
Que tipo de experiências são necessárias a minha formação pessoal para que eu possa desenvolver a consciência do meu “eu” e do “eu” do outro?” (Rogers, 1980: 30)
Enfim, trabalhando com educador e educandos, o profissional precisa ter alguns
princípios como fundamentais que equacionem a abordagem da solidariedade, conforme Rogers
(1980):
“Nas minhas relações com as pessoas descobri que não ajuda, a longo prazo, agir como se eu fosse aquilo que não sou.
Descobri que sou mais eficaz quando posso me ouvir aceitando-me e
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quando posso ser eu mesmo.
Atribuo um enorme valor ao fato de poder permitir-me compreender uma outra pessoa.
Verifiquei que me enriquece abrir canais através dos quais os outros possam me comunicar os seus sentimentos, os seus mundos perceptuais privados.
É sempre sumamente gratificante poder aceitar o outro.
Quanto mais aberto estou às realidades em mim e nos outros, menos me vejo a tentar a todo custo remediar as coisas.
Posso confiar na minha experiência.
A avaliação feita pelos outros não me serve de guia, apenas uma pessoa pode saber se estou agindo com honestidade, aplicação, franqueza e vigor, ou se o que faço é falso, defensivo e fútil. E essa pessoa sou eu mesmo.
A experiência é para mim a suprema autoridade. É sempre à experiência que eu me volto para me aproximar cada vez mais da verdade no processo de descobri-la em mim.
Sinto-me satisfeito em descobrir uma ordem na experiência.
Os fatos são amigos... essas penosas reorganizações são o que se chama aprender.
Aquilo que é mais pessoal é o que há de mais geral... aquilo que há de único e de mais pessoal em cada um de nós é provavelmente o sentimento que, se fosse partilhado ou expresso, falava mais profundamente aos outros.
A experiência mostrou-me que as pessoas têm uma orientação fundamentalmente positiva. Acabei por me convencer de que quanto mais um indivíduo é compreendido e aceito, maior tendência tem para abandonar as falsas defesas que empregou para enfrentar a vida e para progredir numa vida construtiva.
A vida, no que tem de melhor, é um processo de flui, que se altera e onde nada é fixo.” (p.30-31)
Agindo sob o enfoque da solidariedade, o psicopedagogo precisa procurar os
aspectos irrelevantes em educação, para que sua atuação produza melhores efeitos. Por exemplo,
na parte física, a educação em nosso sistema limita-se a jogos, sendo irrelevante. O
psicopedagogo pode intervir sobre o aprimoramento do corpo, o desenvolvimento de um
organismo saudável e sobre o equilíbrio da energia vital, através de diferentes vivências.
Outro aspecto irrelevante em educação são as emoções, logo mais um campo de
atuação psicopedagógica pois as emoções estão ligadas às alterações de saúde, humor e
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comportamento dos educandos. Várias intervenções podem ser produzidas nesse campo.
Martinelli (1996) ainda lembra da concentração, da auto-observação e da educação
dos impulsos instintivos que são irrelevantes na educação formal e que podem ser trabalhados de
forma bastante criativa para o desenvolvimento da personalidade do educando.
Finalmente, o procedimento para a aplicação de ações solidárias por parte do
psicopedagogo, requer a realização de vivências junto aos profissionais da educação para que
algumas condições sejam garantidas, conforme Fagali (1993) nos mostra:
“Aprender em grupo numa vivência interdisciplinar.
Integrar sensações, sentimentos, pensamentos, intuições no desenvolvi-mento dos conceitos, nas diferentes áreas de conhecimento.
Vivenciar e ampliar sensibilizações e dinâmicas de grupo para o desenvolvimento das percepções e operações do pensamento.
Integrar as artes às ciências.
Desenvolver os conteúdos programáticos integrados à vida, às sensações e aos sentimentos.
Vivenciar e refletir sobre “como trabalhar” a partir de um conceito-referência que seja gerador.
Aplicar as operações mentais, as formas de raciocinar no diálogo com os conteúdos acadêmicos.” (p.21)
Dessa forma, o psicopedagogo estará apto a produzir projetos dentro das
instituições que objetivem uma transformação nas relações interpessoais professor-aluno nos
grupos, na abordagem da aprendizagem e na forma de se processar, diante do conteúdo e da
informação, sempre com vistas à solidariedade, procurando solucionar alguns questionamentos
que intrigam a categoria: Por que o aluno não aprende? Por que o aluno se nega o estudar? Por
que o aluno, com potencial mental bem estruturado apresenta dificuldades em lidar com a
aprendizagem acadêmica?
3.1. Uma metodologia pautada na solidariedade
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O psicopedagogo precisa orientar os professores para que busquem em si mesmos o
verdadeiro sentido de educar, já que devem servir de exemplo para os alunos, o que faz com que
o trabalho pedagógico se transforme numa atividade que coopera para o engrandecimento da
vida.
Sabemos que a crise mundial dos sistemas educacionais resulta da transição de
paradigmas, que afeta o sistema nacional de educação, assolando a educação brasileira, e mais
precisamente, a educação carioca, com ênfase no ensino médio, o que geram as crises e ocasiona
o fracasso escolar percebido ao longo de vários anos.
Ou seja, num processo em cadeia as grandes mudanças globais, a liberação de
antigas crenças, dogmas, o rompimento de conceitos têm efeitos nas atividades práticas diárias do
professor. Os professores precisam ser reeducados. Por isso o psicopedagogo, orientado por
Alves (2000) precisa ser especialista em amor e solidariedade, antes de ser especialista em
ferramentas do saber, já que o nascimento do pensamento é semelhante ao nascimento de uma
criança; ambos começam com um ato de amor, com uma semente que é depositada num ventre
vazio, e nesse caso, falando de pensamento a semente é o sonho.
O psicopedagogo precisa amorosamente interpretar os sonhos dos educadores, dos
educandos e pode ainda buscar auxílio em outras áreas da escola e na família, porque Freire
(1996) estabelece que ao educarmos, devemos querer bem, significando que a afetividade não
pode nos assustar, já que não devemos temer expressá-la. Por isso, atuando em parceria com os
profissionais da educação, os familiares e os educandos deve-se estar apto a realizar a
verdadeira revolução solidária no campo da educação.
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Isto significa ao psicopedagogo a criação de ambientes acolhedores e criativos,
significa estar atento aos talentos e às dificuldades dos alunos, estar ligado nas ações dos
professores que precisam estimular a determinação, o interesse e a alegria dos educandos pelo
fato de aprender.
Nesse sentido, buscando o melhor para todos através da solidariedade, o
psicopedagogo necessita de um método de preparação do professor, que deve vivenciar valores
humanos e utilizar técnicas de ensino numa proposta holística de desenvolvimento do ser humano.
Há necessidade de um método de aplicação aos alunos, onde se faça a aplicação direta, indireta
ou paralela de valores dentro do programa educacional. Tudo isso, através de técnicas de
aplicação, como harmonização, com relaxamento e atividades físicas e mentais, como objetivo
didático, com destaque à solidariedade, como narrativa de contos, histórias, fábulas, parábolas
com exemplos para a vivência de valores, e como atividades de grupo com tarefas e até
recomendações de silêncios como forma de ajuda aos alunos.
A propósito do trabalho psicopedagógico, lembramos Millor Fernandes (1984), com
o texto “O filho pródigo” que ilustra a necessidade de mudanças nos padrões educacionais:
“Era um desses meninos modelos. Desse, é modo de dizer, pois nunca existiu outro igual. O seu primeiro choque com o mundo foi com o seu próprio pai. Estava um dia brincando com o seu trenzinho fazendo barulho, enquanto o pai lia. De repente o pai gritou: “Para com isso menino!” Ele parou, olhou para o pai e disse: “Talvez, meu pai, outro menino de minha idade perguntasse por que o senhor dá essa ordem. Eu não. Obedeço e pronto! Outra feita subiu numa escada de mão para tirar mangas de uma mangueira. A escada escorregou no tronco da árvore molhada e lá veio ele ao chão, num tombo perigoso. Ficou caído, todo machucado, enquanto a mãe se aproximava chorando e gritando. Levantou-se e disse: “Minha mãe, espero que isto me sirva de lição.” Às visitas ele se apresentava rapidamente sempre que sua mãe o chamava. Para não embaraçá-la dizia logo: “Realmente estou muito crescido, não estou? Agora posso retirar-me para brincar lá fora e não perturbar a conversa das senhoras?” Certa vez saía de casa para ir ao cinema. Sua mãe ajeitou-lhe o laço do
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sapato. Ele disse, olhando a expressão do rosto dela: “Realmente, a gente tem um filho, cria-o com tanto carinho e logo ele tem atitudes e vontades próprias. Isso é muito triste, a senhora não acha?” Quando falavam qualquer coisa de mais sério ou picante à sua frente ele se levantava, pedia licença para se retirar. “Os senhores sabem, eu ainda não tenho idade para ouvir certas coisas.” Quando o pai lhe dava dinheiro para comprar livros ou divertir-se, comentava invariavelmente: “Na minha idade o senhor já ganhava a vida sozinho.” Se surpreendia a mãe trabalhando fora de horas, não se esquecia de dizer: “Óh! a senhora trabalha como uma escrava para sustentar-me e a verdade é que eu jamais saberia reconhecer isso.” Quando se esquecia e discutia um problema, voltava logo a si e ordenava-se: “Bem, e agora creio que a senhora não quer ouvir mais nem uma palavra sobre esse assunto!” Se errava, dizia ao pai: “Na verdade não sei o que está acontecendo com os meninos da minha idade. No seu tempo não era assim.” Ou então: “Realmente, eu já tenho idade para não fazer isso!” Ou ainda: “Nunca serei nada na vida se continuar assim!” Quando entrou para a Faculdade disse ao pai: “O senhor nunca teve as oportunidades que está me dando.” Quando teve o seu primeiro amor falou a ambos, pai e mãe: “Acho que estou numa idade crítica.” Quis casar cedo, mas reconheceu-o diante da progenitora: “Sim senhora, depois de todos os sacrifícios que a senhora fez por mim!” Era um cínico ou era um sábio.
A reflexão suscitada por esta crônica, traz considerações quanto à influência da
concepção de pessoa na estrutura familiar. Os familiares, a quem ainda o psicopedagogo precisa
recorrer, pois são os transmissores dos valores iniciais aos alunos, são a sua base de sustentação
e que hoje enfrentam conflitos devido à dinâmica violenta da sociedade que apela numa escalada
invertida de valores, induzindo para o individualismo, o egocentrismo, o racismo, o medo, o
ceticismo, o cinismo, o preconceito, a intolerância.
Portanto, o grande desafio psicopedagógico consiste em trabalhar, de forma
solidária, o método de trabalho e a experiência pessoal de cada um, atentando para os caminhos
da transformação com Tiba (1998), já que é preciso estar integrado em relação a si mesmo,
sentindo-se física, psicológica e eticamente bem, estando capacitado a atingir os objetivos e
receptivo a tudo que possa melhorar o trabalho; é preciso entender o aluno, considerando em que
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etapa de desenvolvimento se encontra, levando em conta as dificuldades e facilidades de seu
aprendizado e procurando conhecer sua família e os interesses que favoreçam o seu crescimento;
por fim é preciso conhecer o ecossistema vigente, para que se possa empenhar pela melhoria do
ambiente, das condições de trabalho, estando informado sobre o que atinge o professor, o aluno
e seus familiares como a violência, as drogas, as dificuldades sócio-econômicas, mercado de
trabalho, saúde, podendo atuar sobre tais condições e aspectos sempre praticando a cidadania e
a solidariedade.
CONCLUSÃO
Alexandre Graham Bell disse certa vez:
“Não permaneça sempre na estrada pública, indo por onde os outros vão. Deixe o caminho batido ocasionalmente e embrenhe-se na mata. Esteja certo de que encontrará alguma coisa diferente do que você não viu até então. Pode ser uma coisa muito pequena, mas não a ignore. Siga-a, explore ao seu redor; uma descoberta leva a outra e, antes que você se dê conta, terá alguma coisa realmente digna para pensar. Toda descoberta realmente grande foi o resultado do pensamento.”
É uma mensagem que se ajusta a esta pesquisa, pois considerando os problemas
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educacionais, voltamos à questão inicial: como a psicopedagogia institucional pode auxiliar o
relacionamento professor-aluno no ensino médio? Confirmamos a hipótese, pelo desenrolar do
trabalho, que sendo solidários poderemos enfatizar nossas similaridades e propiciar o
desenvolvimento da personalidade, do credo, cultura, raça e até posição sócio-econômica do
outro, do educando e até do educador, pois saber lidar com o outro através do viés da
solidariedade é essencial para um trabalho psicopedagógico de sucesso.
O psicopedagogo precisa ser o inspirador do aprendizado, tanto das disciplinas
quanto dos valores que estruturam o caráter, dedicando-se ao trabalho profissional e levando em
conta a ação solidária.
Somente dessa forma, poderá pesquisar, inovar e aumentar os conhecimentos
pedagógicos, expandindo sua cultura geral e procurando conhecer e desenvolver novas técnicas
de ensino.
Como sugestão para futuros trabalhos, indicamos o estudo da solidariedade no
ensino fundamental, porque nesse âmbito escolar acontecem as primeiras intervenções sobre
valores na vida dos alunos que iniciam o autoconhecimento; sugerimos o estudo da solidariedade
vinculado à educação de jovens e adultos, pois a maioria dos alunos provêm de segmentos
carentes, necessitando de orientação e indicações para suas vivências diárias; e apontamos ainda
um estudo sobre a solidariedade vinculada à pedagogia empresarial, que em plena vigência no
mercado de trabalho, necessita, mais do que nunca de discutir o homem e seus valores, devido ao
rumo que atualmente toma o sistema capitalista globalizado.
Isso porque, para todos os envolvidos com a educação, os profissionais, pais, alunos
e escolas, que se assumem na sociedade do futuro, os valores e em destaque a solidariedade são
primordiais, uma vez que o progresso acontece quando há integração de conhecimento intelectual
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e valores, que revelam o papel do homem na sociedade.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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FOLHA DE AVALIAÇÃO
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PSICOPEDAGOGIA
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PROJETO A VEZ DO MESTRE
A PSICOPEDAGOGIA E A RELAÇÃO PROFESSOR-ALUNO NO ENSINO MÉDIO:
SOLIDARIEDADE AO SENTIR, PENSAR E AGIR
DATA DA ENTREGA: 06/04/2005
AVALIADO POR: _________________________________GRAU: _____
Rio de Janeiro, RJ, ______ de _______________ de 2005.
ÍNDICE
CAPA 01 CONTRA-CAPA 02 AGRADECIMENTOS 03 DEDICATÓRIA 04
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RESUMO 05 METODOLOGIA 06 SUMÁRIO 07 INTRODUÇÃO 08 CAPÍTULO I 11 1. A SOLIDARIEDADE COMO UM VALOR 12
1.1. Sobre os valores 13 1.2. Os valores e a personalidade 15 1.2.1. No aspecto intelectual 16 1.2.2. No aspecto físico 17 1.2.3. No aspecto psíquico 17 1.2.4. No aspecto mental 18 1.2.5. No aspecto espiritual 19 CAPÍTULO II 21
2. A SOLIDARIEDADE COMO UM CAMINHO PSICOPEDAGÓGICO 22 CAPÍTULO III 30 3. COM SOLIDARIEDADE BUSCANDO MUDANÇAS NA 31 RELAÇÃO PROFESSOR-ALUNO
3.1. Uma metodologia pautada na solidariedade 36 CONCLUSÃO 40
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 42
FOLHA DE AVALIAÇÃO 44
ÍNDICE 45
ANEXOS 46
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ANEXOS
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO MESTRE
PLANO DE PROJETO DE PESQUISA
Nome da Aluna: MARA MOURA DO NASCIMENTO
Curso: PSICOPEDAGOGIA
TEMA DA MONOGRAFIA
A psicopedagogia institucional e a ação solidária
TÍTULO
A PSICOPEDAGOGIA E A RELAÇÃO
PROFESSOR-ALUNO NO ENSINO MÉDIO: SOLIDARIEDADE AO SENTIR, PENSAR E AGIR
1. PROBLEMA
Como a psicopedagogia institucional pode auxiliar o relacionamento
professor-aluno no ensino médio?
2. JUSTIFICATIVA
Por que desejamos estudar sobre esse tema? Por que acreditamos que o estudo desse tema sempre valoriza o trabalho do aluno. Por que verificamos poucos estudos ligando o desenvolvimento da relação professor-aluno à ação psicopedagógica institucional, o que nos influencia a pesquisarmos mais sobre a “solidariedade”, em função dos paradoxos a que estamos sujeitos. Por que constitui-se um processo muito instigante, o fato de efetuarmos uma pesquisa em psicopedagogia, vinculando o tema da “solidariedade” ao desenvolvimento do processo ensino-aprendizagem e principalmente, à luz das aulas teóricas dos professores do curso de Pós-Graduação da UCAM.
3. OBJETIVOS
Para quê desejamos estudar sobre esse tema? Conduzir a compreensão das necessidades e estratégias para a satisfação no trabalho institucional e notadamente, observar os conflitos geradores vinculados ao tema. Entender que as indiferenças podem ser superadas, reconhecendo o outro em nós amparados por uma abordagem
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educacional, tornando a comunidade escolar identificada com a humanidade. Conhecer melhor o tema da “solidariedade”, e sua vinculação a outras áreas de estudo, além da educacional.
4. HIPÓTESE
Que solução desejamos? Descobrir que em última análise, sendo solidários enfatizamos nossas similaridades e propiciamos o desenvolvimento da personalidade, de credo, cultura, raça e até posição sócio-econômica do outro, que pode ser professor ou aluno. Saber lidar com o outro pelo viés da solidariedade é essencial para um trabalho psicopedagógico de sucesso.
5. DELIMITAÇÃO
Qual o objeto de nossa pesquisa? O conceito “solidariedade” mostrado na LDB 9394/96 e outras referências à liberdade, à auto-estima e à autonomia, relacionados ao ensino médio.
Para auxílio na interpretação dos conceitos recorremos a três educadores conhecidos atualmente, Paulo Freire, Edgar Morin e Rubem Alves.
1. PROCEDIMENTO METODOLÓGICO
A pesquisa constará de um pequeno levantamento bibliográfico de três obras de Edgar Morin, como também das obras de dois educadores nacionais, Paulo Freire e Rubem Alves, além de comentadores conhecidos.
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALVES, Rubem. A alegria de ensinar. Campinas, SP : Papirus, 2000. MORIN, Edgar. A cabeça bem-feita; repensar a reforma, reformar o pensamento. RJ : Bertrand Brasil, 2002. ____________. Educação e complexidade; os sete saberes e outros ensaios. SP : Cortez, 2002. ____________. Os sete saberes necessários à educação do futuro. SP : Cortez; Brasília, DF : UNESCO, 2002. FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. SP : Paz e Terra, 1996 FREITAS, Nilson Guedes de. Pedagogia do amor; caminho da libertação na relação professor-aluno. RJ : WAK, 2002. GADOTTI, Moacir. Diversidade cultural e educação para to- dos. RJ : Graal, 1992. ____________. História das idéias pedagógicas. SP : Ática, 1993.
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