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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” FACULDADE INTEGRADA AVM O TREINAMENTO DA EMPATIA E SUA APLICABILIDADE NO CURSO DE GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA Simone de Mello Nocetti Orientador: Profª. Edla Lúcia Trocoli Xavier Da Silva Rio de Janeiro 2011

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

FACULDADE INTEGRADA AVM

O TREINAMENTO DA EMPATIA E SUA APLICABILIDADE NO CURSO DE

GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA

Simone de Mello Nocetti

Orientador: Profª. Edla Lúcia Trocoli Xavier Da Silva

Rio de Janeiro

2011

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

FACULDADE INTEGRADA AVM

O TREINAMENTO DA EMPATIA E SUA APLICABILIDADE NO CURSO DE

GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA

Apresentação de monografia à

Universidade Candido Mendes como

requisito parcial para obtenção do grau

de especialista em Docência do Ensino

Superior.

Por: Simone de Mello Nocetti

Rio de Janeiro

2011

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DEDICATÓRIA

À minha mãe Vera Lucia, minha tia,

Sonia Maria, Ana Paula e Danielle, pela

paciência, apoio e colaboração, e a

Deus acima de tudo.

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RESUMO

O presente trabalho pretende abordar a importância da inclusão de

um treinamento empático nos cursos de graduação em Psicologia, ou seja, da

sistematização da aprendizagem desta habilidade social, tendo em vista que o

curso de formação não dispõe de uma grade curricular que contemple o ensino

formal da empatia. Esta medida seria uma forma de tentar minimizar, ou

mesmo dirimir eventuais deficiências de interação interpessoal do graduando,

que podem vir a afetar o seu futuro desempenho profissional, considerando

que a operacionalização do conteúdo teórico depende, principalmente na área

da Psicologia, da disposição e capacidade para lidar com o outro.

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METODOLOGIA

A seção de metodologia da pesquisa esclarece qual foi o caminho

percorrido para alcançar a solução do problema de pesquisa proposto,

havendo coerência com a problemática definida e com os objetivos indicados, e

considerando os aspectos operacionais como o acesso às informações.

Embora a roupagem da pesquisa a caracterize como qualitativa, a

abordagem engloba uma ampla variedade de delineamentos em todo o

trabalho.

Utilizando a taxionomia de Vergara (2005), tornou-se possível

identificar os aspectos pelos quais a metodologia pôde ser entendida. Quanto

aos fins, a pesquisa teve caráter descritivo, pois seu objetivo foi descrever o

problema de pesquisa e as variáveis diretamente relacionadas. Com relação

aos meios utilizados, a pesquisa teve caráter bibliográfico, com base na revisão

de literatura para a fundamentação teórico-empírica, e desenvolvida a partir da

consulta de material já publicado e/ou elaborado, tais como: artigos, livros,

jornais, revistas, monografias, teses, etc. (GIL, 2002, p.71).

A pesquisa bibliográfica é o estudo sistematizado desenvolvido com base em material publicado em livros, revistas, jornais, redes eletrônicas, isto é, material acessível ao público em geral (VERGARA, 2005, p. 48).

A fase exploratória do projeto de pesquisa se deu através da

observação e exame de diversos artigos, livros e documentos disponibilizados

na Internet, que serviram como fundamento para a elaboração deste estudo.

Este estudo foi especialmente interessante do ponto de vista do

método da pesquisa qualitativa, ao mesmo tempo em que se constituiu como

exemplo de triangulação (MYNAIO, 1993), através da integração de diferentes

abordagens e técnicas – qualitativas e quantitativas – num mesmo estudo,

como se uma complementasse a outra.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 6

CAPÍTULO I

EMPATIA: UMA HABILIDADE SOCIAL 8

CAPÍTULO II

A AQUISIÇÃO DO COMPORTAMENTO SOCIALMENTE HABILIDOSO 15

CAPÍTULO III

O ALUNO, SUA FORMAÇÃO E A PRÁTICA PROFISSIONAL

EM PSICOLOGIA 20

CAPÍTULO IV

A APLICAÇÃO DO TREINAMENTO DA EMPATIA 26

CONCLUSÃO 33

BIBLIOGRAFIA 35

ÍNDICE 38

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INTRODUÇÃO

A busca pela satisfação e qualidade nas relações interpessoais tem

sido recorrente e alvo de pesquisas, talvez devido ao fato de que a experiência

da relação com o outro mostre-se cada vez mais empobrecida e comprometida,

reflexo dos laços e vínculos fragilizados pela parcial ou total falta de habilidade

para conviver.

Eisenberg & Strayeir (1992, p.9) citado por Falcone (1998, p.6), inferem:

Dos grandes e numerosos problemas da sociedade moderna, cabe destacar a falta de comunicação e de entendimento entre os indivíduos e os grupos, assim como a enorme freqüência com que se produzem comportamentos desumanos. Esses problemas têm sua origem em uma grande variedade de fatores, tanto do tipo social como psicológico. É necessário, particularmente neste momento da história, recolher informações sobre esses fatores e seu papel preciso no desenvolvimento e manutenção dos vínculos afetivos, da compreensão mútua e do comportamento humano entre os indivíduos.

Segundo Pacheco (2009, p.49), nos Anais do II Seminário

Internacional de Habilidades Sociais:

A literatura tem mostrado que as habilidades sociais constituem um importante ingrediente das relações interpessoais satisfatórias e que a competência social é determinada por múltiplos fatores, incluindo-se aí as crenças e normas individuais ou coletivamente assimiladas.

De todo repertório de habilidades sociais, destacamos a empatia,

escopo deste trabalho. Na apresentação de sua tese de doutorado, Falcone

(1998, p.XVI) coloca:

Alguns indivíduos possuem uma habilidade especial para interagir com sucesso em contextos sociais variados. Essa habilidade tem sido, nos anos recentes, mais valorizada do que o QI e está relacionada a uma facilidade de “ler” as emoções e perspectivas dos outros. Tal leitura nada tem a ver com a telepatia ou com poderes extra-sensoriais. Trata-se de uma disposição genuína para compreender como alguém se sente e pensa, através de deduções, de informações retidas na memória, ou colocando-se no lugar do outro. Trata-se também de uma disposição para expressar essa compreensão de tal maneira que a outra pessoa se sinta compreendida e validada.

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A questão que se torna aqui relevante diz respeito ao fato de que

para o mercado de trabalho a competência para as relações interpessoais

torna-se cada vez mais imprescindível, principalmente para profissões como no

caso da Psicologia, que exigem um maior e mais estreito contato interpessoal

em praticamente todos os seus segmentos.

O curso de formação acadêmica não oferece um ensino formal

destas habilidades, assim como da habilidade empática aqui abordada, a

aprendizagem da mesma é assistemática e oriunda de um currículo oculto que

não garante necessariamente que possíveis deficiências no elenco dos

graduandos sejam corrigidas, o que pode vir a comprometer o futuro

desempenho profissional.

De acordo com Falcone (1998, p.XVI) estas deficiências são produto

de um processo de aprendizagem:

Nos seres humanos essa capacidade se desenvolve e se refina com a aprendizagem, onde a educação familiar, a escola e a variedade de experiências interpessoais irão exercer papel fundamental nesse sentido. Quando esse desenvolvimento não ocorre naturalmente, pela carência dessas condições, o treinamento específico pode ser um recurso eficaz.

O presente trabalho pretende abordar a importância da inclusão do

treinamento empático nos cursos de graduação em Psicologia, ou seja, da

sistematização da aprendizagem desta habilidade social, visando oferecer uma

formação mais plena, com o objetivo de assegurar a capacitação necessária

para o exercício profissional.

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CAPÍTULO I

EMPATIA: UMA HABILIDADE SOCIAL

Com base na tese de doutorado de Pacheco (2007, p. 8):

Profissionais das ciências Humanas têm abordado a questão do relacionamento interpessoal sob vários enfoques e um dos principais campos voltados para esta temática é o campo teórico-prático das Habilidades Sociais (Del Prette e Del Prette, 1996). Segundo Caballo (1999), esse campo teve maior difusão e desenvolvimento nas décadas de 60 e 70. Nos anos 80 este campo incorporou alguns resultados de pesquisas de outras áreas da Psicologia, principalmente elementos de orientação cognitiva, em especial pelo fato do treino em habilidades sociais apresentar dentre os seus objetivos a reestruturação cognitiva de seus participantes. Atualmente há um corpo crescente de publicações sobre o assunto.

Devido à novidade do tema, Pacheco (2007, p 12, apud Caballo,

2003), atenta para uma das mais importantes lacunas na área de estudo das

habilidades sociais, que remete à ausência de uma teoria geral que aborde o

treinamento e a avaliação de tais habilidades. Desta forma, é possível

constatar a existência de controvérsias na conceitualização das habilidades

sociais e de sua relação com outras construções da área, como assertividade e

competência social.

A título de exemplo, Pacheco (2007) destaca Caballo (1999), por

sua utilização do termo habilidades sociais e competência social como

sinônimos e Del Prette e Del Prette (1999a), que sobre tal termo apontam

diferenças conceituais. Caballo (1999), também utiliza o termo habilidades

sociais como sinônimo de assertividade, enquanto que Falcone (2000) e Del

Prette e Del Prette (1999a, 2001), entendem que assertividade “é um

componente do conjunto das habilidades sociais”.

Para evitar tais confusões geralmente presentes na literatura da

área, Pacheco (2007,p.9), opta pela definição específica de Del Prette e Del

Prette (2001b) dos termos desempenho social, habilidades sociais e

competência social:

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O desempenho social refere-se à emissão de um comportamento ou seqüência de comportamentos em uma situação social qualquer. Já o termo habilidades sociais aplica-se à noção de existência de diferentes classes de comportamentos sociais no repertório do indivíduo para lidar com as demandas das situações interpessoais. A competência social tem sentido avaliativo que remete aos efeitos do desempenho das habilidades nas situações vividas pelo indivíduo (...) qualificando, portanto a proficiência de um desempenho e referindo-se à capacidade do indivíduo de organizar pensamentos, sentimentos e ações em função de seus objetivos e valores articulando-os às demandas imediatas do ambiente. (DEL PRETTE E DEL PRETTE, 2001b, p. 31).

No texto Habilidades Sociais: conceitos e campo teórico-prático, Del

Prette e Del Prette (2006) organiza o conjunto das habilidades sociais mais

acentuados em classes e subclasses com variações de abrangência:

Entre as principais classes, destacamos as habilidades de comunicação (fazer e responder perguntas, dar e pedir feedback, elogiar, iniciar, manter e encerrar conversação), as habilidades de civilidade (dizer por favor, agradecer, apresentar-se, cumprimentar), as habilidades assertivas de enfrentamento ou defesa de direitos e de cidadania (expressar opinião, discordar, fazer e recusar pedidos, interagir com autoridades, lidar com críticas, expressar desagrado, lidar com a raiva do outro, pedir mudança de comportamento e etc.), as habilidades empáticas e de expressão de sentimento positivo e outras duas mais abrangentes que nomeamos como habilidades sociais profissionais ou de trabalho (coordenação de grupo, falar em público), as habilidades educativas de pais, professores e outros agente envolvidos na educação ou treinamento. Na base de qualquer desempenho socialmente competente, destacamos a automonitoria, enquanto habilidade geral de observar, descrever, interpretar e regular pensamentos, sentimentos e comportamentos em situações social.

1.1 O que é empatia

No dicionário Houaiss, a palavra empatia apresenta um cunho

psicológico que aqui destacamos e que se refere ao “processo de identificação

em que o indivíduo se coloca no lugar do outro e, com base em suas próprias

suposições ou impressões, tenta compreender o comportamento do outro”.

Carvalho (2010) busca em Zimerman (1999) a origem da palavra

empatia: “deriva do grego em (dentro de) + pathos (dor, sofrimento),

designando assim a idéia de sofrer dentro de alguém, ou melhor dizendo, de

sofrer a dor de outra pessoa”.

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De acordo com Falcone, Ferreira, Luz, Fernandes, Faria, D’Augustin,

Sardinha e Pinho (2008, apud Burns & Auerbach, 1996, Wispé, 1992), o termo

empatia originou-se da palavra alemã einfühlung, cujo significado referia-se a

“uma projeção da predisposição interna de um observador, em resposta à

percepção de um objeto estético”. A palavra foi traduzida para o inglês com o

nome de empathy, denotando a possibilidade de se conhecer a consciência de

outra pessoa através do esforço da mente ou imitação interior.

Lipps propôs, em 1903, outro significado da palavra “einfühlung”,

onde a percepção de um gesto emocional emitido por alguém, ativa

diretamente a mesma emoção no observador, sem a interferência de rotulação,

associação ou tomada de perspectiva (Preston & de Waal, 2002).

A partir daí, a empatia tem sido objeto de discussão e estudo nas

áreas evolutiva, social, da personalidade e clínica (Eisenberg & Strayer, 1992)

e atualmente, das neurociências (Decety & Jackson, 2004; Preston & de Waal, 2002).

Falcone, Ferreira, Luz, Fernandes, Faria, D’Agustin, Sardinha e

Pinto (2008) ressaltam ainda que alguns autores defendem a empatia como um

fenômeno predominantemente cognitivo (Eisenberg, Murphy & Shepard, 1997)

e outros afirmam que é um processo fundamentalmente afetivo com

componentes cognitivos (Barnett, 1992). Já a atual literatura considera a

empatia como um construto multidimensional, abrangendo componentes

cognitivos, afetivos e comportamentais (Davis, 1980; Falcone, 1999; Koller,

Camino & Ribeiro, 2001).

Falcone (2009, p. 7) apresenta a seguinte definição do conceito de

empatia:

(...) a empatia humana pode ser entendida como a “capacidade de compreender, de forma acurada, bem como de compartilhar ou considerar sentimentos, necessidades e perspectivas de alguém, expressando esse entendimento de tal maneira que a outra pessoa se sinta compreendida e validada” (Falcone & cols., 2008, p. 323). De acordo com essa definição, a empatia corresponde a uma habilidade social multidimensional, constituída de componentes cognitivos, afetivos e comportamentais (Falcone, 1998).

O componente cognitivo está relacionado à dedução aprimorada dos

pensamentos e sentimentos de um indivíduo em determinado contexto. Essa

dedução tem sido citada como tomada de perspectiva (Falcone, 1998) e abarca

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processos cognitivos tais como: flexibilidade mental, autoconsciência,

consciência do outro, auto-regulação, atenção, memória, dentre outros. (Decety

& Jackson, 2004).

O componente afetivo é manifestado por um interesse autêntico em

atender às necessidades do indivíduo alvo e é refletido pela presença de

sentimentos de simpatia, preocupação, compaixão ou consideração pelo

estado da outra pessoa, sem que isso envolva experimentar sentimentos

idênticos ao dela. (Falcone, Gil & Ferreira, 2007; Mehabian & Epstein, 1972;

Thompson, 1992)

O componente comportamental é caracterizado pela expressão,

verbal ou não verbal de entendimento e é essencial na comunicação humana,

fazendo com que o outro indivíduo se sinta totalmente compreendido (Falcone,

1998; 2003). Burleson (1985) define tal habilidade como “uma estratégia

sensível de consolar”. Através da expressão empática é possível deduzir a

acuidade da percepção daquele que experimenta a empatia.

O conceito de empatia humana como uma habilidade social

multidimensional requer que os três componentes - cognitivos, afetivos e

comportamentais - estejam presentes (Falcone, 2009). Compartilhar emoções

sem a tomada de perspectiva pode ser visto como uma forma de contágio

emocional ou simpatia. Entender a perspectiva de um indivíduo sem a

experiência de compaixão ou consideração por seu estado não caracteriza a

empatia (indivíduos com transtorno de personalidade anti-social costumam

perceber as intenções dos outros para tirar proveito pessoal) (Decety &

Jackson, 2004; Falcone, 1998).

Por fim, para compreender e compartilhar emoções com alguém é

necessária à capacidade de exprimir entendimento de forma sensível (Falcone,

1998).

1.2 O comportamento empático e seus estágios

No artigo A avaliação de um programa de treinamento da empatia

com universitários, Falcone (1999) recorre às considerações de Barret-

Lennard, (1981); Greenberg & Elliot (1997), que estabelecem que em

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condições de interação, a habilidade empática manifesta-se em dois

momentos. No primeiro momento, o indivíduo que empatiza, deve compreender

a perspectiva e os sentimentos do interlocutor e, de certa forma, vivenciar o

que acontece com ele naquela situação. O segundo momento fundamenta-se

em comunicar tal entendimento, de modo que seu interlocutor sinta-se

plenamente compreendido.

Para Falcone (1999), a compreensão empática engloba prestar

atenção e ouvir sensivelmente e a comunicação empática de entendimento

compreende verbalizar sensivelmente.

A atenção empática envolve "estar com" a outra pessoa, física e psicologicamente. Os comportamentos que demonstram atenção empática são predominantemente não-verbais: (a) fitar diretamente a outra pessoa, adotando uma postura que identifique envolvimento; (b) adotar uma postura aberta, evitando cruzar os braços e as pernas; (c) inclinar-se levemente em direção à pessoa alvo; (d) acenar com a cabeça e/ou usar vocalizações breves (ex.: "hum-hum") quando a pessoa está revelando algo importante; (e) adotar uma postura descontraída - gestos nervosos, tais como: tamborilar, balançar a perna ou remexer-se na cadeira demonstram impaciência e desinteresse.

A atenção empática busca também a identificação das mensagens

não-verbais do interlocutor, que exprimem emoções, tais como: comportamento

corporal (movimentos corporais, postura), expressões faciais (lábios

contraídos, sorrisos, cenho franzido, sobrancelhas arqueadas); relação entre o

comportamento e a voz (fluência, tom de voz, inflexão, intensidade, espaço

entre as palavras, etc.); observação de respostas autonômicas (dilatação da

pupila, palidez, rubor, respiração acelerada etc); aparência geral.

Com base no conceito de Nichols (1995), Falcone (1999) define

ouvir sensivelmente como uma capacidade que está para além de repetir com

fidedignidade o discurso da outra pessoa. É proporcionar-lhe a possibilidade de

ser ouvido segundo seu ponto de vista, sem julgá-lo. Ser um bom ouvinte é

considerar o outro em sua dimensão singular, admitindo suas idéias e

sentimentos da mesma forma. Como resultado, a pessoa se sentirá aceita,

reconhecida, entendida e valorizada.

Falcone (1999 apud Goleman, 1995 e Nichols, 1995) entendem que

o ouvir sensível também gera efeitos positivos na interação em situações de

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conflito, à medida que reduz a divergência e a possibilidade de rompimento.

Ouvir sensivelmente, evidenciar compreensão e aceitação a um indivíduo

furioso, reduz sua ira, fazendo com que esteja acessível para ouvir também. Da

mesma forma, compreender as razões do comportamento de alguém que

provocou mágoa e raiva pode amortizar a intensidade desses sentimentos e

promover um diálogo de entendimento.

Falcone (1998) observa que um bom recurso para ouvir e

compreender melhor a outra pessoa é descobrir através da manifestação do

seu ponto de vista, desejos e sentimentos, uma mensagem central.

Segundo Falcone (1999 apud Egan, 1994), os comportamentos que

fazem parte do ouvir sensível são: (a) voltar-se inteiramente para as

perspectivas, desejos e sentimentos da outra pessoa, deixando

temporariamente os seus próprios de lado; (b) considerar as emoções do

interlocutor, através de seu comportamento não verbal, enquanto este fala; (c)

identificar-se com os sentimentos, desejos e perspectivas da outra pessoa,

colocando-se no lugar dela; (d) descobrir a conexão existente entre o

sentimento, o contexto e seu significado para a outra pessoa.

No que tange ao conceito de verbalizar sensivelmente, Falcone

(1999) expressa que:

A função da verbalização empática é fazer com que a outra pessoa se sinta compreendida, encorajando-a a explorar as suas preocupações de forma mais completa. As estratégias de verbalização empática: (a) tentam explicar e validar os sentimentos e perspectivas da outra pessoa, sem julgar; (b) relacionam o contexto, a perspectiva e os sentimentos da outra pessoa. Um exemplo de verbalização empática dirigida a uma pessoa que está triste por não haver conseguido passar em um concurso público, poderia ser: "É muito duro estudar tanto para um concurso e não passar. Eu sei o quanto você investiu em seus estudos. Você deve estar se sentindo magoado e injustiçado por não ver os seus esforços reconhecidos, não é mesmo? Neste caso, os sentimentos e perspectiva da pessoa são identificados, validados e relacionados. Um exemplo de verbalização não empática poderia ser: "Não há razão para ficar deprimido. Você poderá fazer outros concursos." Neste tipo de verbalização, o sentimento e a perspectiva da outra pessoa são desvalorizados. O indivíduo é considerado inadequado por "exagerar" no seu sentimento e por "supervalorizar" a importância do concurso.

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Em situações de conflito, quanto maior é o desacordo, mais

importante é reconhecer o que a outra pessoa diz, antes de apresentar sua

própria opinião. Quando o outro indivíduo está irado ou magoado, é

imprescindível demonstrar aceitação e compreensão sobre seus sentimentos

sem apresentar qualquer justificativa, antes de se certificar de que a outra

pessoa se sentiu plenamente compreendida.

Como exemplo de declaração empática em situação de conflito

pode-se citar: "Então, todo esse tempo você vem sentindo que eu estou com

raiva de você e por essa razão eu deixei de ser afetuosa. Não é de admirar que

você esteja magoado comigo." Declarações deste tipo tendem a reduzir a

ansiedade da outra pessoa, tornando-a mais disponível para ouvir.

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CAPÍTULO II

A AQUISIÇÃO DO COMPORTAMENTO SOCIALMENTE

HABILIDOSO

De acordo com Pacheco (2007, p.11):

Os comportamentos socialmente habilidosos são, em grande parte aprendidos na interação do indivíduo com o seu ambiente. Começam a ser desenvolvidos na infância (modelo de pessoas próximas, modelação social e esquemas de reforçamento) e podem continuar o desenvolvimento, dependendo das contingências a que são submetidos (Skinner, 1989). A aquisição do repertório comportamental socialmente habilidoso envolve um aprendizado durante toda a vida através da interação do indivíduo com seu meio social, no exercício crescente de novos papéis e assimilação de normas culturais (Del Prette e Del Prette, 1999ª). Portanto, os comportamentos socialmente habilidosos emitidos por um adulto foram aprendidos ao longo de sua história de vida e respondem também a contingências atuais (quer sejam de reforçamento positivo ou de reforçamento negativo, com ou sem o envolvimento de regras).

2.1 A aquisição de habilidades sociais

Pacheco (2007) faz alusão a autores como Caballo (2003), Del

Prette e Del Prette (1999a, 2005) quando trata sobre o desenvolvimento do

repertório de habilidades sociais, salientando que o período crítico de

desenvolvimento das habilidades sociais é o da infância, vez que nesta etapa

do desenvolvimento ocorre o acréscimo e aprimoramento do repertório de suas

habilidades sociais, começando gradualmente a compreender os valores e

normas da sociedade na qual está incluída, destacando-se a importância dos

pais e da escola, através da interação com companheiros, como principais

fontes de promoção das habilidades sociais.

A autora ressalta a atenção destacada por Del Prette e Del Prette

(2005) para a importância da aprendizagem, planejada ou não, no

desenvolvimento das habilidades sociais, definindo um modo de agir que a

criança irá desenvolver, bem como as possibilidades de modificá-lo.

Pode-se destacar os processos de modelagem e modelação como

sendo as principais formas de aprendizagem envolvidos na aquisição de

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habilidades sociais. Segundo Pacheco (2007), entende-se por modelagem, o

processo de reforçamento empregado pelos pais a cada comportamento

apropriado produzido pela criança. Tal reforçamento se dá através dos

resultados agradáveis dos comportamentos socialmente habilidosos. A

modelação, abrange a observação de modelos significativos, onde na infância,

os pais ocupam um lugar de referência, com a reprodução total ou parcial do

comportamento expresso por estes.

Verifica-se então a importância do padrão de relacionamento e de

educação nutridos pelos pais no incremento do repertório de habilidades

sociais dos filhos.

Pacheco (2007 apud Gomide 2003) menciona que a autora divide as

práticas educativas parentais em dois grupos: as práticas parentais positivas,

que desenvolvem comportamentos pró-sociais e as práticas parentais

negativas que implicam em comportamentos anti-sociais. Dentre as práticas

parentais positivas é mencionado o uso adequado da atenção e distribuição de

privilégios, a distribuição sucessiva e segura do afeto, o estabelecimento

apropriado de regras e o acompanhamento e supervisão de atividades tanto

escolares, como de lazer. Dentre as práticas parentais negativas destacam-se

a falta de atenção e afeto, a negligência, o abuso físico e moral, o castigo

inconsistente, a formação de um ambiente de convivência hostil, a disciplina

relaxada, etc.

Pacheco (2007, p. 26) ressalta ainda que:

Ao sair da exclusividade do contato familiar, iniciando o convívio com outros grupos sociais, amplia-se a possibilidade de desenvolvimento do repertório social da criança. Entretanto esta passagem para outros grupos sociais pode ainda requerer o monitoramento parental, visto que nem sempre se faz de forma tranqüila podendo aumentar muito o nível de ansiedade da criança, o que traria conseqüências adversas ao desenvolvimento do repertório de habilidades sociais.

Pacheco (2007 apud Del Prette e Del Prette 2006b) salienta que os

autores consideram a escola um ambiente de socialização, constituindo-se em

um fator de proteção à criança à medida que forneça um clima de convivência

positiva, estimulação do senso de responsabilidade, sentimento de ligação e

pertencimento , atividades pró-sociais e oportunidade de realização escolar

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com assimilação de regras voltadas para a não violência. Fazendo alusão a Del

Prette e Del Prette, 2003c e Löhr, 2003, Pacheco (2007) aponta para a

necessidade de capacitação do professor para impulsionar as habilidades

sociais dos alunos, visto que o seu desenvolvimento está sujeito às condições

de ensino determinadas por este professor que são, em grande parte,

apontadas por suas concepções, habilidades, valores, atitudes e competências

profissionais.

Assim, Pacheco (2007) conclui que o desenvolvimento do repertório

de habilidades sociais do sujeito é um processo sucessivo no qual deficiências

originárias do seu processo de socialização podem ser superadas. Embasado

nos mesmos princípios de aprendizagem que possibilitaram o desenvolvimento

de tal repertório, torna-se possível realizar programas de treinamento de

habilidades sociais com o objetivo de desenvolver o conjunto destas

habilidades.

2.2 A aquisição da habilidade empática

Quanto à habilidade empática, Falcone (1998, p. 24), reporta-se a

hipótese do gene comunicativo:

A hipótese do gene comunicativo considera a empatia como uma propriedade emergente de uma capacidade biológica primordial para a comunicação, que é inseparável dos genes. Tal capacidade constitui a base de um fenômeno afiliativo, que é uma propriedade de todas as criaturas, desde as formas mais simples até as mais complexas. Existem evidências fortes, a partir de diferentes níveis da escala filogenética, de que as tendências de enviar e receber mensagens são baseadas geneticamente e participam juntas em processos de comunicação, que correspondem a adaptações filogenéticas. Os organismos socialmente mais elevados devem aprender a usar essas capacidades de comunicação, de base inata, em contextos sociais (Buck e Ginzburg, 1997). Em humanos, o caminho para essa aprendizagem costuma ser longo e tortuoso e o progresso difere de pessoa a pessoa (Levenson & Ruef, 1997).

Falcone (2009, p. 10, apud Decety & Jackson, 2004), complementa

ainda que: “as predisposições biológicas só poderão levar à manutenção da

empatia a partir da interação social e dos vínculos afetivos.”

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Sobre o desenvolvimento da empatia, Falcone (1998, p. 40 e 41)

salienta que:

(...) os seres humanos já nascem predispostos a desenvolver empatia, para assegurar a sobrevivência. Esse desenvolvimento parece obedecer a um continuum, onde as respostas empáticas começam com uma reação emocional ressonante, tal como um contágio emocional, até uma resposta bem mais complexa, envolvendo interpretações de sinais afetivos e cognitivos das outras pessoas. Nesse continuum, o mal estar pessoal é identificado em bebês até cerca de 14 meses e a empatia emocional parece ter início entre 2 e 3 anos, quando a criança passa a manifestar o comportamento prosocial. Com o tempo, a identificação de sinais emocionais se torna mais sofisticada e, em torno dos 5 anos, a empatia cognitiva pode ser identificada, na medida em que as crianças já manifestam adoção e perspectiva. Daí por diante, o desenvolvimento cognitivo, aliado às experiências de vida, irão aprimorar a capacidade do indivíduo de empatizar de forma acurada. Fatores de aprendizagem são importantes no desenvolvimento da capacidade de compreender os estados internos das outras pessoas. A conduta empática dos pais, caracterizada por manifestações de simpatia, compreensão, cuidado, aceitação e sensibilidade promove maior autoestima e autoconfiança nos filhos, além de modelar comportamento empático. Por outro lado, pais não empáticos, que são menos sensíveis aos sentimentos de seus filhos, irão modelar comportamentos não empáticos, além de promover sentimentos de inadequação e de insegurança nos mesmos. Pais que empregam castigos físicos freqüentes estão contribuindo para a formação de padrões de comportamento agressivo em seus filhos, assim como transtornos e desajustes.

No que diz respeito às inclinações pessoais que viabilizam a

aquisição do comportamento empático, Falcone (1998), refere-se a pesquisas

sobre traços de personalidade que apontam indivíduos mais calmos, com

elevada auto-estima, assim como psicologicamente mais ajustados e com

entendimento da realidade mais flexível e aberto como possuidores de elevado

nível de competência social e empatia cognitiva. A ansiedade e os padrões

cognitivos disfuncionais impedem a empatia acurada, com isso o indivíduo

pode sensibilizar-se com o sofrimento do outro, mas por intermédio de um mal

estar pessoal ou de empatia emocional.

Em relação a questão de gêneros, segundo Falcone (1998), estudos

propõem que homens e mulheres não possuem diferenças importantes quanto

a habilidade de empatizar, apenas que o componente afetivo da empatia nas

mulheres sobressai ao dos homens, visto que social e culturalmente estas são

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mais incentivadas a captar sinais emocionais nos outros, assim como

demonstrarem maior sensibilidade e compaixão.

A autora destaca ainda que:

Todas essas constatações permitem concluir que as diferenças individuais na capacidade de compreender acuradamente os sentimentos e pensamentos dos outros decorre de uma educação pautada na empatia, uma vez que esta pode contribuir para a formação de indivíduos mais ajustados, competentes socialmente e com maior motivação para empatizar. Entretanto, o convívio familiar não é suficiente para o desenvolvimento de competências sociais, uma vez que estas podem se perder pela falta de uso (Caballo, 1991). As pessoas aprendem a se relacionar durante toda a vida, através de um processo natural de imitação de modelos disponíveis (Bandura, 1979) e da variedade de experiências interpessoais (Hottman, 1982). Quando essa aprendizagem não ocorre naturalmente, seja por uma educação ineficiente, seja por falta de modelos ou de experiências disponíveis, o indivíduo, ainda assim, pode desenvolver habilidades sociais através de treinamento específico (Matos, 1997). (FALCONE, 1998, p. 42)

Compartilhando da mesma opinião da autora, pode-se daí inferir que

a capacidade empática é produto de um processo de educação calcado na

empatia, conferindo ao indivíduo a capacidade de empatizar.

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CAPÍTULO III

O ALUNO, SUA FORMAÇÃO E A PRÁTICA

PROFISSIONAL EM PSICOLOGIA

O processo ensino-aprendizagem pressupõe a existência de três

instâncias básicas que garantem a instauração do mesmo: o aluno, o professor

e o conteúdo. No contexto explorado por este trabalho destacaremos o aluno e

o conteúdo.

O Corpo Discente é formado por uma população heterogênea, que

abrange aspectos sócio-econômicos e culturais distintos, que se mesclam

produzindo histórias de vida singulares. Cada um apresentará, portanto, formas

diferentes de operacionalizar os conteúdos que lhes são apresentados,

principalmente no que tange à questão das habilidades sociais. Decorrente

disto a formação profissional estará atrelada a estas disposições individuais. Se

o conteúdo se resumir tão somente a aspectos teóricos, negligenciando a

sistematização da aprendizagem de habilidades necessárias ao futuro

exercício da profissão, descarta-se a possibilidade de oferecer ao alunado a

oportunidade de superar possíveis deficiências no seu trato interpessoal e o

desenvolvimento destas habilidades continuará sendo produto de um currículo

oculto, ao invés de integrar-se ao currículo oficial, garantindo uma formação

mais plena.

3.1 Deficiências no comportamento social

De acordo com Del Prette e Del Prette (2001a) citados por Pacheco

(2007), estudos realizados na área de habilidades sociais demonstram que

indivíduos com competência social são propensos a relações sociais e

profissionais mais produtivas, como também melhor saúde física e bem estar

psicológico, enquanto deficiências corresponderiam a dificuldades

interpessoais em geral, implicando na qualidade de vida ou de trabalho do

indivíduo e presente em uma série de transtornos psicológicos.

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Pacheco (2007) recorre a Del Prette e Del Prette (1999a); Del Prette,

Del Prette & Barreto (1999); Caballo (2003) para apontar as várias causas de

um comportamento social impróprio, tais como: o comportamento adequado

pode não ter sido aprendido pelo indivíduo; pode ser que situações sociais

deflagrem grande ansiedade, impossibilitando uma resposta socialmente

adequada; pode apresentar embaraço social, resultante da percepção

distorcida de crenças, auto-verbalizações negativas, expectativas irracionais,

baixa auto-estima ou auto-instruções inadequadas; pode apresentar falta de

interesse em face da inexistência de reforçadores sociais adequados; pode não

saber discernir apropriadamente situações em função de um déficit na

percepção social ou pode não ter convicção de seus direitos.

Feitosa, no artigo Habilidades Sociais e dificuldades de

aprendizagem na interface da educação com a saúde, classifica as habilidades

sociais como um estado de equilíbrio, do qual destoam dois opostos,

caracterizados por reações não habilidosas ativas e passivas. Cita Del Prette e

Del Prette (2004) para discorrer sobre estes dois estados de desequilíbrio.

Comportamentos não habilidosos ativos, estariam relacionados a déficits no

que diz respeito ao autocontrole, caracterizando impulsividade, onde o objetivo

do indivíduo seria alcançado por intermédio de ameaça, autoritarismo e

agressividade, prejudicando terceiros, assim também como a relação. Os

comportamentos não habilidosos passivos estariam relacionados à inibição de

respostas, implicando em prejuízo para o sujeito, visto que seu comportamento

além de não modificar as condições do contexto, não produziria reforçadores

desejados na interação social. Como exemplo, é mencionado o sujeito que em

detrimento de seus próprios desejos, deixa que predomine o do outro, por

constrangimento em contrapor-se a ele.

Na literatura da área encontram-se alguns modelos de aquisição de

habilidades sociais que explicam as deficiências no comportamento

interpessoal.

Para salientar o modelo de Percepção Social, Pacheco (2007)

remete-se a Del Prette e Del Prette (1999a) que se referem à Argyle (1967/

1994), onde as dificuldades interpessoais são explicadas a partir de

deficiências na leitura do ambiente social. Este modelo é descrito como um

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processo cognitivo caracterizado pela identificação e leitura de códigos que se

encontram em situações de interação, assim como pelo discernimento das

normas e valores apropriados a cada situação e o comportamento esperado a

partir deste conhecimento. Visto que as situações de interação envolvem

pessoas e instituições do cotidiano do sujeito, como família, escola, trabalho,

etc., deve-se concordar que a percepção social é indispensável para um

desempenho social apropriado.

A Teoria de Papéis é outro modelo explicativo, onde as habilidades

sociais são adquiridas através do entendimento do indivíduo sobre seu próprio

papel social. Neste modelo considera-se também o papel das regras no

contexto social do qual faz parte e que exercem influência no modo de

conceber a si próprio, determinando seu comportamento.

Pacheco (2007, p. 15 e 16 apud Del Prette e Del Prette, 1999a) cita

as considerações sobre as três dimensões na análise das habilidades sociais,

onde os autores entendem que estas dimensões estariam presentes em todas

as interações pessoais e sua combinação harmoniosa resultaria no

desempenho socialmente habilidoso.

A dimensão pessoal refere-se aos aspectos: (1) Comportamental – levando-se em consideração aspectos verbais ou não verbais diretamente observáveis do comportamento; (2) Cognitivo-afetivo – referindo-se às expectativas e crenças, conhecimentos prévios e estratégias e habilidades de processamento do sujeito e; (3) Fisiológico – referindo-se às reações físicas mensuráveis de acordo com critérios mais estudados na literatura da área. A dimensão situacional está relacionada aos interlocutores e à demanda da situação. A dimensão cultural refere-se às regras, normas e valores, ou seja, diferentes contextos culturais determinando padrões diversos acerca do que seriam comportamentos sociais adequados.

Percebe-se desta forma que o campo teórico-prático das habilidades

sociais abrange, na análise da atuação social, o papel das regras, valores e

normas existentes no contexto cultural do indivíduo e que por ele é absorvido

como crenças, posturas e sentimentos que influenciam no comportamento.

Pacheco (2007 apud Caballo & Irustia, 2004) destaca que as

dificuldades em distintas áreas de atividade do indivíduo, sobretudo na situação

social como também na laboral e da saúde, pode ser produto da inadequação

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social. Diante desta situação, Pacheco (2007 apud Del Prette & Del Prette,

1999ª; Del Prette , Del Prette & Barreto, 1999) consideram o surgimento de

uma crescente inquietação com o desenvolvimento emocional e das

habilidades de relacionamento interpessoal, identificadas como alvo

concernente a uma concepção mais ampla da educação, tanto de pré-

escolares quanto na área do ensino superior e da formação profissional.

3.2 O currículo oficial e o currículo oculto

Em sua tese de doutorado, Pacheco (2007, p.2) aborda a questão

do currículo oficial do curso de Psicologia:

Embora as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Psicologia (1996) mencionem claramente em seu artigo terceiro que a formação deve assegurar ao futuro psicólogo “a atuação em diferentes contextos tendo em vista a promoção da qualidade de vida do indivíduo”, acrescentando ainda no artigo quarto que os objetivos gerais do curso de psicologia incluem dotar o profissional das seguintes habilidades e competências: tomada de decisão; comunicação; liderança; e no artigo oitavo: coordenar grupos; relacionar-se com o outro de modo a proporcionar a criação de vínculos interpessoais requeridos na atuação profissional, e apesar de haver uma preocupação de coordenadores, professores e supervisores neste sentido, as habilidades sociais profissionais acabam não sendo contempladas pelas estruturas curriculares dos cursos de Psicologia, o que pode, em muito, comprometer a prática destes profissionais.

O desenvolvimento das habilidades sociais no campo da educação

formal, fica a critério de um currículo oculto, que pode vir a comprometer o

processo de aprendizagem pela falta de sistematização, isto torna-se mais

patente em relação a alunos que possuem dificuldades em seu desempenho

comportamental. Tais dificuldades comprometem de forma mais incisiva o

desempenho profissional, quando o domínio de conteúdos e técnicas está

diretamente atrelado a exigência de uma competência interpessoal acentuada,

como no caso das ciências humanas em geral, e em particular, da psicologia.

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3.3 O psicólogo e sua prática profissional

Quanto à prática profissional, Bandeira, Quaglia, Freitas, Souza,

Costa, Gomides e Lima (2006, p. 139 e 140) afirmam que:

A atuação profissional do psicólogo requer um repertório adequado de habilidades de comunicação interpessoal, que o capacite a lidar com as situações sociais inerentes ao exercício de sua profissão nas diversas áreas de aplicação da Psicologia. A qualidade da relação interpessoal que o psicólogo estabelece com as pessoas, na sua atuação profissional, dependerá do seu desempenho social e, portanto, do seu repertório de habilidades sociais. Segundo Del Prette e Del Prette (2001) algumas profissões, como a do psicólogo, requerem habilidades técnicas que estão estreitamente mediadas pelas interações sociais e que foram denominadas de habilidades sociais profissionais, na literatura da área. Foram definidas, por estes autores, como aquelas habilidades “que atendem às diferentes demandas interpessoais do ambiente de trabalho, objetivando o cumprimento de metas, a preservação do bem-estar da equipe e o respeito aos direitos de cada um (p.89).

Pacheco (2007), menciona que as pesquisas realizadas por Del

Prette & Barreto (1999), indicam que os estudantes de Psicologia, ao longo do

curso, adquirem sensibilidade interpessoal, no entanto, não desenvolvem

suficientemente a habilidade para lidar com situações de interação, o que

justamente vem a ser um requisito essencial na prática profissional. Dentre as

principais dificuldades dos estudantes apontadas por Del Prette, Del Prette &

Barreto (1999), destacam-se:

(...) a de observar e interpretar o ambiente social, adotar a perspectiva do outro, parafrasear e demonstrar compreensão e respeito pelos pensamentos e sentimentos do interlocutor, oferecer feedback positivo, elaborar e responder perguntas, falar em público, oferecer apoio verbal e não verbal, abordar pessoas desconhecidas e que representam autoridade, controlar a própria ansiedade, observar a própria atuação interpessoal e lidar com o silêncio do interlocutor.(PACHECO, 2007, p. 18 apud DEL PRETTE, DEL PRETTE & BARRETO, 1999)

Ao lado da crescente preocupação em suprir as demandas

relacionadas às deficiências no desenvolvimento emocional e das habilidades

de relacionamento interpessoal que podem comprometer o futuro desempenho

profissional do estudante, encontra-se a preocupação de pesquisadores em

delimitar quais são exatamente as habilidades sociais relevantes à atuação do

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psicólogo, pois desta forma seria possível concentrar ações e estratégias,

aprimorando os programas de treinamento.

Na pesquisa de Bandeira (2006), citada por Pacheco (2007) dez

habilidades são apontadas como as mais significativas na atuação do

psicólogo. São elas: ajudar o outro a reconhecer, nomear e exprimir seus

sentimentos; explicar, com clareza e objetividade, conteúdos importantes sobre

o trabalho desenvolvido; ouvir, com atenção, o que a outra pessoa diz;

manifestar empatia; dizer não; observar, atentamente, no outro, expressões

verbais importantes; observar, atentamente, expressões não verbais

importantes; não aceitar pedidos abusivos; demonstrar segurança nas opiniões

e decisões tomadas; e relacionar-se com profissionais de outras áreas. Dentre

as habilidades estudadas, quatro foram as apontadas por psicólogos como

sendo as mais relevantes a sua prática profissional: ouvir, observar, não aceitar

pedidos abusivos e ajudar o outro a reconhecer seus sentimentos. Estes

resultados confirmam os alcançados no estudo de Del Prette e cols. (2000),

segundo Pacheco (2007), onde ouvir o outro com atenção e não aceitar

pedidos abusivos, foram as habilidades interpessoais eleitas como mais

relevantes para a atuação profissional do psicólogo.

De acordo com Pacheco (2007, p. 21 e 22), a habilidade de ouvir

para Caballo (1996, 2003), “constitui uma habilidade básica, incluída em

manuais de pesquisa e intervenção em habilidades sociais”. É tida como

“componente importante e pré-requisito da habilidade de iniciar e manter uma

conversação” (Caballo, 1996), assim também como “é um componente

importante da habilidade de oferecer feedback ao interlocutor em uma

interação social” (Caballo, 2003) .

De posse das informações apresentadas nesta subseção fica clara a

inferência de que, para a prática profissional do psicólogo é imprescindível o

domínio de habilidades sociais.

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CAPÍTULO IV

A APLICAÇÃO DO TREINAMENTO DA EMPATIA

Neste capítulo serão apresentados dois programas de treinamento

de habilidades sociais. O primeiro a ser abordado refere-se ao treinamento

puramente da habilidade empática com universitários, o segundo, embora mais

abrangente no sentido de contemplar um maior número de habilidades sociais,

é aqui mencionado, em função de delimitar um espaço para o treinamento da

habilidade empática, assim também por tratar-se de um treinamento dirigido a

um público cuja especificidade nos interessa: graduandos em Psicologia de

uma instituição particular de ensino superior.

Em ambos os trabalhos será feita uma apresentação sucinta, detida

à análise qualitativa, deixando a análise quantitativa para um momento mais

apropriado.

4.1 Sobre um programa de treinamento da empatia com

universitários

O processo de avaliação e treinamento de um programa visando à

habilidade empática será destacado com o trabalho de Falcone. Segundo a

autora (1998), “tendo em vista que a empatia é uma habilidade social,

avaliação e o treinamento da mesma pode seguir o mesmo formato utilizado

para as demais habilidades”.

Anteriormente à descrição da pesquisa, serão destacados alguns

aspectos importantes que serviram como embasamento para estruturar sua

aplicação e avaliação.

Falcone (1998), cita Caballo (1993) e Edelmann (1996), que

apontam a entrevista como um método da prática clínica, do qual pode se

lançar mão para avaliar o comportamento social.

Ainda sobre a entrevista, a autora refere-se a Becker e Heimberg

(1988), que descrevem os objetivos da entrevista clínica:

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A entrevista clínica deve alcançar os seguintes objetivos: (a) especificar os contextos em que ocorre o comportamento problemático; (b) identificar as competências comportamentais específicas necessárias para se ter um comportamento eficaz em cada situação; (c) determinar se o paciente possui ou não tais competências; (d) examinar os antecedentes e conseqüentes dos comportamentos hábeis e inábeis em cada contexto; (e) determinar que procedimentos de avaliação adicionais serão necessários para contemplar a avaliação comportamental. (FALCONE, 1998, p.43)

Falcone (1998) destaca ainda outros métodos empregados na

avaliação da habilidade empática, como: medidas de auto-informe (o inventário

de relacionamento, a escala de empatia, o questionário de medida da empatia

emocional e o índice de reatividade), o jogo de papéis, a observação e a

mensuração da atuação do indivíduo em interações naturais, sem que este

saiba, a busca de informações sobre o indivíduo, junto a pessoas que lhe são

significativas, a abordagem molecular (por exemplo:tempo de contato ocular,

frequência de gestos, etc.).

A autora observa que os métodos supracitados, quando utilizados de

maneira isolada, não garantem uma adequada avaliação e mensuração de

habilidades.

Pode-se salientar outras questões levantadas por Falcone (1998,

p.55), relevantes ao treinamento da empatia, tendo em vista ser seu trabalho

direcionado a grupos. Uma delas diz respeito aos recursos de intervenção em

grupos, que segundo a autora, para atingir bons resultados faz-se necessário

tomar certas medidas, tais como: “seleção dos componentes, preparação para

o grupo e o papel do líder”. No tocante a pesquisas com grupos, os critérios

metodológicos devem orientar os procedimentos utilizados em terapia de

grupo, o que requer tanto conhecimento, como domínio da técnica.

Falcone (1998) alude as considerações de Collins & Collins (1992),

de que problemas referentes ao desempenho social são costumeiros na

população em geral, para inferir que o treinamento da habilidade empática

poderia beneficiar qualquer pessoa. Referindo-se a Matos (1997), apresenta o

fato de que na atualidade os programas de treinamento buscam desenvolver

plenamente as capacidades pessoais e de relação, assim como expandir esta

aprendizagem para o ambiente relacional do indivíduo, com isso Falcone

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(1998) conclui que o comportamento empático uma vez aprendido se refletiria

tanto na vida pessoal, quanto profissional do indivíduo.

4.1.1 Método e discussão dos resultados da pesquisa

Esta seção é dedicada a descrição sucinta do estudo de Falcone

(1999), e a conclusão que chegou a autora.

Participaram da pesquisa 17 alunos de graduação da Universidade

do Estado do Rio de Janeiro, que por foram recrutados por intermédio de

cartazes. O grupo experimental foi composto por 10 estudantes (3 do sexo

masculino e 7 do sexo feminino) e o grupo controle formado por 7 estudantes

(4 do sexo masculino e 3 do sexo feminino). A avaliação dos sujeitos nos dois

grupos se deu antes do treinamento (linha de base), após o treinamento (pós-

treinamento) e um mês após o treinamento (follow up).

O processo de avaliação foi constituído por entrevista estruturada,

baseada na adaptação da Entrevista Dirigida para Habilidades Sociais

(Caballo, 1993), assim como pela verificação do comportamento dos sujeitos,

que através do desempenho de papéis em condições de interação envolvendo

ajuda e conflito, foram filmados.

Para avaliar o comportamento verbal e não verbal dos sujeitos em

condições de interação, foram utilizados o Sistema de Avaliação do

Comportamento Empático - Forma Verbal (SACE-V) e o Sistema de Avaliação

do Comportamento Empático - Forma não-verbal (SACENV).

Para avaliar os efeitos do treinamento nos momentos pós-

treinamento e no follow up, foi utilizado o questionário de avaliação do

treinamento da empatia (QUATE).

Falcone (1999) ressalta que:

Os procedimentos utilizados no programa de treinamento da empatia (PTE) focalizaram o desenvolvimento de capacidades de: (1) identificar sinais emocionais não-verbais no comportamento dos outros; (2) ouvir e compreender a perspectiva e os sentimentos da pessoa-alvo, sem julgar; (3) declarar entendimento da perspectiva e dos sentimentos da pessoa-alvo; (4) demonstrar compreensão e aceitação através de comunicação não-verbal.

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O PTE – Programa de Treinamento da Empatia aconteceu em 11

encontros, duas vezes na semana, tendo cada encontro duas horas de

duração. As técnicas utilizadas compreenderam: (1) o esclarecimento sobre

como ter uma conduta empática em situações de ajuda e conflito; (2) o

reconhecimento de causas que prejudicam o ouvir e entender o outro,

impossibilitando um comportamento empático; (3) visualizar momentos vividos

contendo situações de interação; (4) o desempenho de papéis ou

dramatização, onde os sujeitos buscavam revelar empatia; e (5) a execução

das habilidades aprendidas com sujeitos do trato pessoal do graduando.

O primeiro encontro consistiu na apresentação dos sujeitos, visando

a integração do grupo, na definição e explicação do conceito de empatia e

sobre comportamento empático e no estabelecimento das normas do grupo.

Nos demais encontros as seções era iniciadas com um rápido

esclarecimento sobre o estágio do comportamento empático que seria

trabalhado. Os sujeitos praticavam a etapa abordada, através de jogos de

papéis. Ao final de cada seção era sugerido ao participante que treinasse a

etapa aprendida junto à pessoas de seu meio. Após a aprendizagem de todos

os estágios da empatia, os sujeitos foram conduzidos a agir reciprocamente em

situações de jogos de papéis, aplicando este conhecimento em condições de

ajuda e de conflito.

No que tange aos resultados apresentados nesta pesquisa, Falcone

(1999) explica que segundo a avaliação do desempenho dos estudantes em

condições de jogos de papéis, assim como a avaliação fundamentada na

observação dos sujeitos experimentais sobre seu próprio comportamento, o

PTE demonstrou ser eficiente tanto para desenvolver comportamento

empático, como também para generalizar este resultado para o ambiente

relacional dos estudantes.

Baseada no resultado acima, Falcone (1999) concluí que:

A empatia corresponde a urna habilidade de comunicação que parece se adequar cada vez mais às necessidades do mundo atual. A capacidade de compreender acuradamente os sentimentos e pensamentos das outras pessoas e de manifestar essa compreensão de forma sensível e apropriada, tem sido bastante valorizada nas relações pessoais e profissionais.

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Considerando-se que essa habilidade pode ser desenvolvida através de treinamento específico, promovendo resultados satisfatórios na qualidade das relações interpessoais (aumento do vínculo, redução de conflitos e de rompimento), seria recomendável incluir programas de treinamento da empatia nas escolas como um recurso preventivo importante no desenvolvimento moral e interacional, contribuindo para a formação de pessoas mais saudáveis e felizes.

Esta conclusão da autora confirma as expectativas do presente

trabalho, e vem somar para a sua conclusão.

4.2 Sobre um programa de desenvolvimento de habilidades

sociais em graduandos de psicologia com recorte na

habilidade empática

A pesquisa que será abordada a seguir é tese de doutorado de

Pacheco (2007), e dela foram destacados dados relevantes ao objetivo do

trabalho aqui desenvolvido, a fim de prestar esclarecimentos, como também,

obter conclusões.

4.2.1 Método e discussão dos resultados da pesquisa

Foram sujeitos desta pesquisa alunos dos dois primeiros períodos

do curso de Psicologia da Universidade Estácio de Sá, dos Campi de Niterói e

Nova Friburgo. Dos voluntários que se apresentaram para participar do

programa, foram excluídos os que segundo a avaliação, prescindiram do

treinamento, por manifestarem um desenvolvido conjunto de habilidades

sociais.

A avaliação dos estudantes, baseou-se em entrevistas semi-

estruturadas e na aplicação coletiva do Inventário de Habilidades Sociais (IHS-

Del Prette). O processo avaliativo se deu antes e imediatamente após o

término do treinamento de habilidades sociais (THS).

Por conta de mudanças que se impuseram no decorrer do estudo, o

mesmo dividiu-se em dois momentos diferentes. O primeiro momento, tido

como estudo piloto teve a participação de 264 voluntários, no segundo

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momento 36 voluntários participaram, separados em grupo experimental e de

controle. A duração do programa neste segundo momento foi de 40 horas

aproximadamente, composto por 16 encontros semanais de duas horas e meia,

uma vez por semana.

A apresentação dos componentes do grupo, visando a interação,

assim como a motivação para a tarefa que se daria a partir daquele momento,

foi a tônica do primeiro encontro, onde também foi sugerida literatura sobre

habilidades sociais. No último encontro se deu a despedida do grupo através

de atividades, avaliação do processo pelos sujeitos e uma segunda aplicação

do IHS-Del Prette. O treinamento foi feitos nos 14 encontros intermediários,

dividido em três etapas diferentes: o período inicial, a etapa intermediária e a

fase final.

Cabe aqui destacar que a habilidade empática foi abordada na fase

final do treinamento, mais especificamente no décimo segundo e no décimo

terceiro encontros, visto ser esta etapa destinada a habilidades mais

complexas.

O planejamento das sessões de treinamento das habilidades sociais

foi feito em módulo teórico e prático numa mesma sessão. No processo de

treinamento foram utilizados vários recursos como: a descrição de conceitos, a

fim de promover o esclarecimento sobre o tema; a utilização de vivências, para

por em ação a habilidade em questão; o emprego de tarefas de casa, para

reforçar o material trabalhado, como também para promover a transferência de

aprendizagem; a utilização de textos selecionados, visando a discussão ou

reflexão do grupo.

O treinamento da habilidade empática constituiu-se da apresentação

das características da comunicação empática, seguida da discussão sobre as

condições necessárias para desenvolvê-la, também foi feita a distinção entre a

comunicação empática e pró-empática, com a devida análise sobre os efeitos

causados no interlocutor pela última, para promover a vivência desta

habilidade, foi utilizada uma dinâmica de grupo, outro recurso usado foi a

proposta de tarefa de casa, como também a sugestão de texto selecionado.

No tocante aos resultados obtidos pela pesquisa, Pacheco (2007),

menciona que é possível promover o desenvolvimento de habilidades sociais

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em universitários através de programas de treinamento, cujo intuito, de

melhorar a qualidade de vida e relações interpessoais, repercutiria seu

resultado no futuro desempenho profissional dos estudantes e

consequentemente em sua inserção no mercado de trabalho.

Ainda sobre a leitura da pesquisa, Pacheco (2009, p. 49), observa:

Os resultados indicaram diferenças significativas entre os escores pré e pós intervenção tanto nos escores gerais de habilidades sociais, assim como nos escores específicos, demonstrando assim a possibilidade de se realizar programas breves e de baixo custo direcionados ao desenvolvimento do repertório de habilidades sociais da população citada.

Pacheco (2007), considerando os resultados alcançados por seu

estudo, conclui que visando o desenvolvimento de um repertório de habilidades

sociais, o treinamento das mesmas mostra-se eficaz assim como propício para

o progresso pessoal e profissional dos graduandos de psicologia,

representando um recurso simples, econômico e conciso, que não prejudica,

nem causa impacto ao andamento das atividades acadêmicas do referido

curso.

Conforme os resultados apresentados pelo estudo de Pacheco

(2007), pode-se destacar que o treinamento da habilidade empática, uma das

habilidades abordadas pela pesquisa, também alcançou um índice de eficácia,

o que corrobora para a intencionalidade do presente trabalho.

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CONCLUSÃO

É através da relação com o outro que construímos nossa

humanidade, potencialmente somos instrumentalizados para conviver. Nem

sempre as condições são favoráveis para despertar e desenvolver certas

habilidades mais refinadas, por vezes imposições da vida cotidiana apontam

para a necessidade de mudança, mas por outras não se tem acesso aos meios

que poderiam permitir a transformação. No caso da população abordada por

este estudo, graduandos de Psicologia, a futura prática profissional solicitará

destes um desempenho interpessoal apurado para torna-la viável e eficiente.

Além do domínio de teoria e técnicas é fundamental a habilidade para acolher o

outro que precisa de ajuda, como também de fazê-lo sentir-se acolhido. No

transcorrer da formação do graduando, muitas vezes eles mesmos não são

acolhidos em suas deficiências, por variadas questões, que vão desde um

currículo que não se compromete com o desenvolvimento pleno do futuro

profissional, até a falta de tempo e oportunidade de professores, supervisores e

coordenadores para particularizar o aluno enquanto sujeito singular.

A habilidade empática destacada neste estudo é uma das

habilidades que podem ser elencadas como necessárias à prática do

psicólogo. Portanto os programas de treinamento com estudantes de

Psicologia buscam resgatar a possibilidade de suprir carências dentro de uma

realidade limitadora.

De acordo com o conhecimento que foi arregimentado, é pertinente

concluir que o treinamento da empatia é eficaz e que expande seus efeitos a

diversas esferas do contexto relacional dos indivíduos, inclusive no âmbito

laboral, munindo-os de uma escuta mais sensível, da disposição para entender

o outro segundo seu ponto de vista e da capacidade de transmitir este

entendimento, de forma que seu interlocutor sinta-se legitimado, promovendo

assim, vínculos qualitativamente melhores.

Sendo assim, é plausível afirmar que a aplicabilidade do treinamento

da empatia no curso de graduação em Psicologia, além de oferecer a

oportunidade aos alunos que apresentam déficits nesta habilidade, de

amenizá-los ou mesmo dirimí-los, colaboraria para uma formação mais plena,

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garantindo ao futuro profissional meios para desenvolver uma prática de

excelência, unindo ao cabedal teórico a operacionalização adequada do

mesmo.

A viabilidade da aplicação deste treinamento está relacionado a

simplicidade, brevidade e economia de seu processo, não revertendo em ônus

para a instituição de ensino, mas em bônus por enriquecer a formação do seu

corpo discente.

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ÍNDICE

INTRODUÇÃO 6

CAPÍTULO I

EMPATIA: UMA HABILIDADE SOCIAL 8

1.1 O que é empatia 9

1.2 O comportamento empático e seus estágios 11

CAPÍTULO II

A AQUISIÇÃO DO COMPORTAMENTO SOCIALMENTE HABILIDOSO 15

2.1 A aquisição de habilidades sociais 15

2.2 A aquisição da habilidade empática 17

CAPÍTULO III

O ALUNO, SUA FORMAÇÃO E A PRÁTICA PROFISSIONAL

EM PSICOLOGIA 20

3.1 Deficiências no comportamento social 20

3.2 O currículo oficial e o currículo oculto 23

3.3 O psicólogo e sua prática profissional 24

CAPÍTULO IV

A APLICAÇÃO DO TREINAMENTO DA EMPATIA 26

4.1 Sobre um programa de treinamento da empatia com universitários 26

4.1.1 Método e discussão dos resultados da pesquisa 28

4.2 Sobre um programa de desenvolvimento de habilidades sociais em

graduandos de psicologia com recorte na habilidade empática 30

4.2.1 Método e discussão dos resultados da pesquisa 30

CONCLUSÃO 33

BIBLIOGRAFIA 35

ÍNDICE 38