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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” PROJETO A VEZ DO MESTRE A AÇÃO DE RESPONSABILIDADE CIVIL EM FACE DO TRANSPORTADOR AÉREO Por: Bianca Szlana F Finkielsztejn Orientador Prof. Willian Rocha Rio de Janeiro 2007

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO A VEZ DO MESTRE

A AÇÃO DE RESPONSABILIDADE CIVIL EM FACE DO

TRANSPORTADOR AÉREO

Por: Bianca Szlana F Finkielsztejn

Orientador

Prof. Willian Rocha

Rio de Janeiro

2007

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Exemplo de configuração de monografia A Vez do Mestre

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO A VEZ DO MESTRE

A AÇÃO DE RESPONSABILIDADE CIVIL EM FACE DO

TRANSPORTADOR AÉREO

Apresentação de monografia à Universidade

Candido Mendes como condição prévia para a

conclusão do Curso de Pós-Graduação “Lato Sensu”

em Direito do Consumidor.

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AGRADECIMENTOS

A minha mãe por todo o incentivo que

me deu nessa etapa da minha vida..

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RESUMO

Aborda o conflito de normas existentes na regulamentação da

responsabilidade civil do transportador aéreo por danos causados aos

passageiros e aplica-o a ação de responsabilidade civil em face do

transportador aéreo. Para tanto, traça inicialmente os contornos da

responsabilidade civil contratual do transportador em relação aos passageiros

e da responsabilidade civil. Em seguida, aponta o que dispõe os institutos que

disciplinam o transporte aéreo internacional e nacional, bem como aquele que

define as regras de proteção ao consumidor. Posteriormente, apresenta os

pontos centrais nos conflitos das normas citadas e trabalha os argumentos

produzidos doutrinaria e jurisprudencialmente sobre o tema, mostrando qual

entendimento deve prevalecer.

Palavra-chave: Transporte aéreo. Ação de responsabilidade civil.

Conflito de leis.

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ABSTRACT

It broaches the conflict of rules that exists on the regulation of civel

responsibility of air transporter by injury caused on passengers and applies it on

civil responsibility action in view of air trasporter.For this,set out at first the

outline of contractual civil responsibility of transporter in respect to pássengers

and to the responsibiulity action. Next,points out what asserts intitutes that

discipline internacional and nacional air transport , as well as that one that

defines consumer protection rules. Subsequently, presents central points of the

summoned conflict of rules and wors on the arguments produced by doctrine

and jurisprudence about the subject, showing what should prevail.

Keywords: Air transport. Civil responsability action. Conflict of rules.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO 08

2 A RESPONSABILIDADE CIVIL DO TRASPORTADOR AEREO 12

2.1 O tríplice aspecto da responsabilidade do transportador 12

2.2 O contrato de transporte aéreo 13

2.3 A clausula de incolumidade 13

2.4 A ação de responsabilidade civil 14

3 O TRANSPORTE AEREO 17

3.1 Transporte aéreo internacional 17

3.2 Transporte aéreo nacional 19

4 CODIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR 23 4.1 Conceitos 25 4.1.1 Consumidor 25 4.1.2 Fornecedor de serviços 26 4.1.3 Fato do serviço 27 4.2 A ação de reparação de danos 28 5 CODIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E A CONVENÇÃO DE

VARSOVIA 29

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6 CODIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E O CODIGO BRASILEIRO DE

AERONAUTICA 38

7 CODIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E O CODIGO CIVIL 43

8 CONCLUSÃO 46

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1 INTRODUÇÃO

Talvez o homem nunca tenha imaginado que a concretização de

alguns de seus sonhos pudesse de tal forma ampliar suas relações sócio

econômicas que estas ganhariam o mundo, rompendo limites físicos,

geográficos e ideológicos. Ao menos ele certamente tinha a consciência de

que esses sonhos mudariam definitivamente o seu modo de vida. E mudaram.

Quis o destino que somente muitos séculos depois de idealizado pelo

grande artista renascentista Leonardo de Vinci., um dos sonhos mais primitivos

do homem viesse a se tornar realidade pelas mãos de um brasileiro. Coube ao

mineiro Alberto Santos Dumont a proeza de se tornar o primeiro homem a

fazer com que uma maquina mais pesada que o ar conseguisse reproduzir o

que os pássaros sempre fizeram, e que , desde os tempos da lenda de Dédalo

e Ícaro, o homem almeja, que é voar.

Analisando estes quase cem anos de pioneirismo de Santos Dumont,

podemos notar o quão grande foi o salto tecnológico dado pela industria

aeronáutica mundial, sobretudo no séc XX , no campo da aviação civil.

Entretanto, este espantoso avanço da industria aeronáutica, que reduziu a

horas as fronteiras que antes se separavam por dias ou meses, foi, em grande

parte, uma conseqüência natural da intensificação das relações comerciais

entre os paises e mesmo daquelas realizadas internamente.

Isto porque, gradativamente, o avião foi se consolidando como um

transporte seguro e eficiente, sendo assim, utilizado como um dos principais

meios de transporte de pessoas, bagagens e cargas, o que sempre demandou

uma resposta imediata das industrias aeronáuticas as crescentes

necessidades das companhias aéreas.

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Contudo, tamanha evolução tecnológica não foi capaz de impedir a

ocorrência de acidentes aeronáuticos. No inicio do desenvolvimento da aviação

civil, muitos acidentes ocorriam devido a incipiente tecnologia de construção de

aeronaves e equipamentos, da pequena de infra-estrutura aeroportuária e da

falta de regras para a navegação aérea. Embora hoje aconteçam

proporcionalmente menos acidentes, e em sua grande maioria causados por

falha humana, a dimensão que um único acidente é capaz de alcançar, pode

torna-lo em uma verdadeira catástrofe.

Sabemos que onde há um fato social marcado por um grande valor,

como é o caso do transporte aéreo, há a necessidade de regula-lo por meio de

normas legais. Tais normas vieram ainda no inicio do séc XX para disciplinar o

funcionamento do transporte aéreo, regulando, entre outras coisas, a

reparação dos eventuais danos causados aos funcionários das empresas

transportadoras, a terceiros e aos passageiros.

A característica especial da Aviação civil de ultrapassar com maior

facilidade as fronteiras entre os paises, levou a comunidade internacional a

reunir-se, ainda no inicio do século passado, para unificar certas regras do

transporte aéreo internacional, o que teve como resultado a chamada

“Convenção de Varsóvia”. Esta convenção, assinada e ratificada pelo Brasil, foi

concebida com intuito claro de “proteger” as jovens companhias aéreas, que

alem de possuírem um alto custo de operação, ainda se encontravam em

processo de afirmação de sua viabilidade econômica e tecnológica.

Também foi esta a política adotada pelo legislador brasileiro para

disciplinar o transporte aéreo nacional, ou domestico, quando editou o código

brasileiro do Ar (Decreto lei nº 32 de 18 de novembro de 1966), já revogado e o

atual código Brasileiro de Aeronáutica ( Lei nº 7565, de 18 de dezembro de

1986)

Com o advento do código de defesa do consumidor( lei 8078, de 11 de

setembro de 1990), que teve por principal objetivo a proteção ao consumidor -

parte mais fraca da relação consumerista - houve conseqüentemente um

choque de dois sistemas “protetivos” :um destinado ao consumidor e outro

destinado as empresas de transporte aéreo. Deste choque, surgiu a grande

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questão: o que deve prevalecer , a histórica proteção as companhias aéreas ou

a hodierna proteção ao consumidor, ou seja, o sistema da convenção de

Varsóvia, o Código Brasileiro de Aeronáutica ou o Código de defesa do

consumidor?

Importante ressaltar que o único ponto de contato existente entre tais

diplomas legais é aquele que diz respeito a responsabilidade civil do

transportador. Mas não obstante ser a limitação da responsabilidade a principal

discussão travada na doutrina e, sobretudo, na jurisprudência , reflexos desta

antinomia foram sentidos, conseqüentemente, na respectiva ação de

responsabilidade civil em face do transportador aéreo.

Uma ação de responsabilidade civil ajuizada por um passageiro em

face do transportador aéreo, decorrente de um acidente aeronáutico ocorrido

ate 1990 em um vôo internacional, será claramente regida pela convenção de

Varsóvia, que estipula um prazo decadencial ou prescricional para o melhor

entendimento – de 2(dois) anos para o ajuizamento desta ação.

Caso o acidente tivesse ocorrido em um vôo nacional[, o panorama

seria praticamente o mesmo, com exceção da adoção , expressa , pelo atual

Código Brasileiro de Aeronáutica (CBA) de um prazo prescricional de 2 anos

para o ajuizamento da ação de responsabilidade civil.

Contudo, a grande discussão começa a partir de década de 90, com o

código de defesa do consumidor (CDC). Esta lei trouxe consigo um prazo

prescricional de 5(cinco) anos para o ajuizamento da ação de responsabilidade

civil por dano causado ao consumidor pelo fato do produto ou do serviço. A

partir daí, a ação de responsabilidade civil proposta com o fim de reparar os

danos causados aos passageiros - dentro de uma relação de consumo, poderá

ser regulada pelo sistema Varsóvia, CBA ou pelo CDC, a depender do

entendimento adotado pelo órgão julgador desta ação.

Agrava-se a situação se atentarmos para a inovação do código civil.

Adotando uma política de redução geral dos prazos, o legislador reduziu o

prazo ate então aplicável de 20 anos das ações pessoais, para meros 3 anos,

agora dentro de um inciso especifico para as ações de reparação civil.

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Desta forma, em virtude da ausência de uma norma que unifique a

disciplina dos referidos diplomas legais ou que revise as suas disposições, seja

excepcionado ou revogando expressamente esta matéria-solução ideal, mas

de lege ferenda - analisaremos como a jurisprudência (verdadeiro laboratório

do jurista) e a doutrina vem se posicionando sobre estas e outros questões que

surgirem em torno da responsabilidade civil do transportador aéreo, para que

possamos extrair o melhor entendimento sobre a respectiva ação de

responsabilidade civil em face do transportador aéreo, tema ainda pouco

explorado pelos doutrinadores.

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2. A RESPONSABILIDADE CIVIL DO TRANSPORTADOR AEREO

Como havíamos dito anteriormente, a principal discussão relacionada ao

conflito do sistema Varsóvia, CBA com o CDC gira em torno da limitação da

responsabilidade civil do transportador aéreo. Contudo, utilizaremos esta

divergência, e o que se produziu sobre ela, como base para o estudo da ação

de responsabilidade civil, tema muito menos presente na doutrina e na

jurisprudência, pois, necessariamente, a natureza, prazo e limites da ação

seguirão o entendimento adotado naquele campo.

2.1 O tríplice aspecto da responsabilidade do transportador

Em primeiro lugar, devemos nos situar acerca de qual responsabilização

iremos tratar, visto que, segundo Sergio Cavalieri Filho, a responsabilidade

civil do transportador pode ser decomposta em três espécies 1: em relação aos

danos causados aos seus empregados( responsabilidade fundada em contrato

de trabalho), em relação a terceiros (responsabilidade extracontratual) e aos

passageiros(responsabilidade fundada no contrato de transporte aéreo)

Desta forma, restringiremos o presente estudo aquela que gera maior

discussão doutrinaria e jurisprudencial, que é responsabilidade pelos danos

causados aos passageiros (muito embora , como veremos mais adiante , o

código do consumidor unificou o conceito de vitimas de acidentes de consumo,

incluindo passageiros e terceiros).

2.2 O contrato de transporte aéreo

1 CAVALIERI FILHO, Sergio.Programa de Responsabilidade civil. 4ªed.SP :Malheros 2003.p.286

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A responsabilidade derivada dos danos causados aos passageiros é

fundada no contrato de transporte aéreo, pelo qual, segundo o art 222 do

Código Brasileiro de Aeronáutica (CBA), “obriga-se o empresário a transportar

passageiro, bagagem, carga, encomenda ou mala postal, por meio de

aeronave, mediante pagamento”. Apesar da impropriedade do termo

“empresário”( no entanto escusável, visto que o CBA é anterior a adoção da

teoria da empresa pelo código civil de 2002)utiliza no lugar de “transportador “,

este tanto pode set pessoa física ou jurídica, proprietário ou explorador da

aeronave, nos termos do parágrafo único do art 222.

Para Sergio Cavalieri Filho, o contrato de transporte de passageiros

reúne as características de um contrato de adesão, onde as clausulas são

previamente estipuladas pelo transportador, e ainda as características de um

contrato.

Consensual, bilateral, oneroso e comutativo, posto que para que sua celebração basta o simples encontro de vontades; cria direito e obrigações para ambas partes e há um equilíbrio econômico entre as respectivas prestações. O preço da passagem, voa de regra, corresponde ao beneficio recebido pelo passageiro. 2

No contrato de transporte aéreo de passageiro,”bilhete de passagem”

nos moldes do art 227 do CBA, deve constar ”lugar e data de emissão, os

pontos de partida e destino, assim como o nome dos transportadores”.

2.3 A Clausula de incolumidade

No entanto, a característica mais importante deste contrato, fundamental

para a reparação de danos, é a sua cláusula de incolumidade. Embora esteja

implícita no contrato, através dela o transportador é obrigado a conduzir o

2 Op. Cit.p. 292

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passageiro são e salvo ao lugar de destino, sob pena de responsabilização

pelos danos causados (art.734 Código Civil).

O transportador assume desta forma a obrigação de meio – pela qual

obriga-se a utilizar sua “ habilidade, técnica, prudência e diligência no sentido

de atingir um resultado, sem, contudo se vincular a obtê-lo “ 3 - de resultado,

certo e determinado,e , sobretudo, de garantia ( pois ele é o garante do

transporte) que se descumprida, gera o inadimplemento contratual e o dever

de indenizar do transportador.

2.4 A ação de responsabilidade civil

Sabemos que a responsabilidade civil pode nascer tanto de um ato

ilícito absoluto (art. 186 c/c art. 927, ambos do Código Civil) como de um

descumprimento de prestação contratual (art. 3889 do Código Civil). Neste

ponto, destaca-se a lição de José Aguiar Dias:

Se o contrato é uma fonte de obrigações, a sua inexecução também o é. Quando ocorre a inexecução, não é a obrigação contratual que movimenta o mundo da responsabilidade. O que se estabelece é uma obrigação nova, que se substitui a obrigação preexistente no todo ou em parte: a obrigação de reparar o prejuízo conseqüente a inexecução da obrigação assumida. 4

3 CAVALIERI FILHO, Sergio.Programa de responsabilidade civil.4ªed.SP:Malheiros,2003.p.292 4 DIAS,Jose Aguiar apud CAVALIERI, Sergio Cavalieri. P. 281

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Dessa forma, o descumprimento da clausula de incolumidade por parte

do transportador gerara ao passageiro a pretensão a indenização e o dever

jurídico do transportador de quita-la, conforme o art 389 do código civil:”Não

cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos...”

Sendo assim, a ação de responsabilidade civil - direito de exigir a tutela

jurídica do estado- nascera quando houver a recusa do adimplemento desta

obrigação por parte do transportador. Esta ação será de natureza

condenatória, pois é aquela “que busca não apenas a declaração do direito

subjetivo material do autor, mas também a formulação de um comando que

imponha uma prestação a ser cumprida pelo réu (sanção)5 – no nosso caso a

indenização.

Portanto, conforme a clássica doutrina de Agnelo Amorim Filho, a ação

de responsabilidade civil, por ter como pressuposto uma pretensão não

atendida e ser conseqüentemente de natureza condenatória, será

necessariamente submetida ao instituto da prescrição. Na verdade, a

prescrição nascera da pretensão, pois

[...] o estado de intranqüilidade social que o instituto da prescrição procura limitar no tempo, não resulta somente da possibilidade de propositura da ação, mas também de um fato que sempre lhe é anterior, e que pode ate ocorrer sem que haja nascido a ação: a possibilidade de exercício da pretensão. Pouco, ou nada, adiantaria paralisar a ação, com o objetivo de alcançar aquela paz social, se a pretensão permanecesse com toda a sua eficácia”6

A doutrina acolhida pelo código civil de 2002 foi exatamente esta,

quando em seu art 180 dispõe que “violado o direito, nasce para o titular a

5 THEODORO JUNIOR,Humberto.Curso de direito Processual Civil. VolI Rio deJaneiro:Forense,2003.p.56 6 AMORIM FILHO,Agnelo.Critério cientifico para distinguir a prescrição da decadência e para identificar as ações imprescritíveis.Revista de dir Proc civil.ano II vol 3. SP,Saraiva,1961.p.111

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pretensão, a qual se extingue, pela prescrição...”.Com relação ao inicio do

prazo prescricional, entende o Conselho da justiça Federal que:

1) O inicio do prazo prescricional ocorre com o surgimento da pretensão, que decorre da exigibilidade do direito subjetivo. 2) o art 189 diz respeito a casos em que a pretensão nasce imediatamente após a violação do direito absoluto ou da obrigação de não fazer. 7

3. O TRANSPORTE AÉREO

7 Enunciado nº14.I Jornada de Direito Civil.Conselho de Justiça Federal. <www.justicafederal.gov.br>

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Exemplo de configuração de monografia A Vez do Mestre

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Para os fins deste trabalho, trataremos separadamente o transporte

aéreo internacional e o transporte aéreo nacional, visto que são regidos por

diferentes diplomas legais, os quais ensejarão diferentes colocações e

ponderações - muito embora a legislação interna tenha procurado seguir o

disposto nos tratados internacionais.Portanto, trataremos inicialmente do

transporte aéreo internacional.

3.1 Transporte aéreo internacional

O transporte aéreo internacional é disciplinado pela convenção de

Varsóvia(Convention for the Unification of Certais Rules Relating to

International Transportation by Air), promulgada em 12 de outubro de 1929 e

ratificada por mais de cem paises. Foi recebido em nosso ordenamento juridico

pelo Decreto nº 20.704, de 24 de novembro de 1931. Posteriormente, sofreu

alterações de outros tratados, como do Protocolo de Haia , de 28 de setembro

de 1955.

Segundo o art 1º dessa convenção, “transporte internacional” é aquele

onde os pontos de partida e destino, havendo ou não interrupção do

transporte, ou baldeação, estejam situados no território de paises diferentes

(contratantes ou não) ou quando situados no mesmo território e houver escala

no território de outro pais( contratante ou não).

A responsabilidade do transportador prevista na convenção é subjetiva

e com culpa presumida, atenuada ou ate excluída, por fato do passageiro

(respectivamente, arts 17,20 nº1 e 21). È ainda, regra geral, tarifada (art 22

nº1,) salvo se o passageiro provar que o transportador agiu com dolo ou culpa

grave, quando a responsabilidade sera ilimitada(art 25,nº 1)

No entanto, o que nos interessa aqui são as discussões que envolvem o

art 29,nº1, que dispõe que a ação de responsabilidade civil deve ser intentada.

Sob pena de caducidade, dentro do prazo de dois anos, a contar da data de chegada, ou do dia em que a aeronave

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devia ter chegado a sue destino, ou da interrupção do transporte.

Em primeiro lugar, a questão que envolve o prazo, ponto central do

presente trabalho, será tratada mais a frente, quando analisarmos o conflito

com o CDC.

Uma outra importante discussão, em grande parte jurisprudencial, fixou-

se no termo “caducidade” para saber se este correspondia a um prazo

prescricional ou decadencial. Entendemos que esta discussão foi valida

quando ainda em vigor o código civil de 1916, que disciplinava indistintamente

os institutos da prescrição e da decadência, desorientando o interprete.Mas ,

mesmo se tal código ainda estivesse em vigor, entenderíamos como sendo

um prazo prescricional, porque negar a natureza condenatória da ação de

responsabilidade, é negar um fato jurídico.

Pela doutrina de Agnelo Amorim Filho 8, as ações condenatórias

submetem-se, necessariamente, a prescrição. Portanto, não deve o operador

jurídico limitar-se a interpretação literal de um texto legal sob pena de conferir

um sentido não pretendido pelo legislador ou contrario a ordem jurídica a qual

se insere. Deve, pois, utilizar todos os instrumentos da hermenêutica para

extrair o melhor sentido do texto legal, para assim, conferir-lhe normatividade.

De acordo com o que se ira debater mais à frente , esta discussão

perdeu totalmente o seu sentido, seja em vista da promulgação do novo código

civil, que tratou melhor e especificamente deste assunto 9, ou seja porá causa

do advento do Código de Defesa do Consumidor.

Analisando a segunda parte do artigo 29, nº 1, merece destaque o dies

a quo da ação de responsabilidade, que será “a data de chegada, ou do dia em

que a aeronave devia ter chegado a seu destino, ou do da interrupção do

transporte”

8 Op.cit.p.131. 9 Cf, arts 189 e ss; e art 205,§3º,V CC/2002

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Exemplo de configuração de monografia A Vez do Mestre

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Devemos, ainda, ressaltar que a convenção faculta ao autor da ação de

responsabilidade a possibilidade de escolha de onde ajuíza-la.De acordo com

o art 28, nº 1, ele poderá optar entre o território de qualquer das partes

contratantes, o domicilio do transportador ou a sede principal do seu negocio, o

lugar por cujo intermédio se tenha realizado o contrato ou o território do lugar

de destino. Determina ainda, em seu art 28, n º 2, que o processo será aquele

da “lei do tribunal que conhecer a questão”.

3.2 O transporte aéreo nacional

O transporte aéreo realizado exclusivamente dentro do território

nacional, ou seja, aquele “em que os pontos de partida, intermediários e de

destino estejam situados em território nacional”(art 215) é disciplinado pelo

Código Brasileiro da Aeronáutica, Lei nº 7565, de 19 de dezembro de 1986.

Este código não diverge dos princípios consagrados na convenção de Varsóvia

e chega inclusive, a ser utilizado como norma complementar nos pontos

omissos da convenção(art 1,§3º)

Contudo, o Código Brasileiro de Aeronáutica, diferentemente da

Convenção de Varsóvia, aponta para uma responsabilidade fundada na teoria

do risco - leia-se responsabilidade objetiva-onde o transportador responde(art

256) pela “morte ou lesão de passageiro, causada por acidente ocorrido

durante a execução do contrato de transporte aéreo, a bordo de aeronave ou

no curso das operações de embarque e desembarque.”

Nos termos do §1, alínea a, deste artigo, esta responsabilidade só será

elidida “se a morte ou lesão resultar exclusivamente, do estado de saúde do

passageiro, ou se o acidente decorrer de sua culpa exclusiva” Esta

responsabilidade também é estendida(§2, alíneas a e b) aos passageiros

gratuitos e aos tripulantes, diretores e empregados ( não excluindo a derivada

do contrato de trabalho).

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Exemplo de configuração de monografia A Vez do Mestre

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Contudo, o que mais importa para o presente trabalho é o que dispõe o

art 317 sobre a ação de responsabilidade civil:

Art 317.Prescreve em 2 (dois)anos a ação:

I – Por danos causados a passageiros, bagagem ou carga transportada a contar da data em que se verificou o dano, da data da chegada ou no dia em que devia chegar a aeronave ao ponto de destino, ou da interrupção do transporte;

Acertadamente, o legislador menciona expressamente que este prazo é

prescricional, silenciando a controvérsia existente quando ainda em vigor o

Código Brasileiro do Ar, onde era descrito como decadencial, erroneamente,

como vimos anteriormente em relação a Convenção de Varsóvia.

Com relação ao dies a quo desta ação, o Código Brasileiro Aeronáutico

manteve todos os termos estabelecidos pela convenção e somente incluiu a

data do dano, como também geradora da fluência do prazo.

Ainda quanto à responsabilidade do transportador, uma importante

divergência ocorrida nos tribunais tratou de saber se a ocorrência de dolo ou

culpa grave do transportador afasta exclusivamente os limites indenizatórios

estipulados pelo legislador, reparando-se integralmente o dano, nos termos do

art 248( como o art 25 da convenção) ou se esta exclusão afasta também as

regras para o ajuizamento e prazo, para a ação de responsabilidade10

Entendemos que o legislador quis somente que a limitação da

responsabilidade do transportador, quando esta resultar de dolo ou culpa

grave. Fosse afastada, sendo regulada pela legislação comum, pois, se assim

10 “Ação proposta por acidentado em desastre de avião.Alegação de dano resultante de dolo ou culpa grave do transportador. Os limites da indenização, previstos no CBA , lei 7565, de 19/12/83, não se aplica se for provado que o dano resultou de dolo e culpa grave do transportador ou de seus prepostos(art 248).Nesses casos, não se aplica o prazo de 2 anos para a propositura da ação, mas o art 177CC, por se tratar de ação pessoal.Na ação de indenização de dir comum, o pedido não sofre restrições do dir aeronáutico”TA/RJ.Apelação cível nº 862 Rel Des Mauro Fonseca Pinto Nogueira.Julgamento:27/08/92

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Exemplo de configuração de monografia A Vez do Mestre

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não fosse, estaríamos criando uma situação de tratamento diferenciado em lei

sem qualquer finalidade.

Não necessariamente um dano causado por um agente imbuído de

dolo ou por culpa grave será mais gravoso do que um causado por mera culpa.

Alias, no campo da aviação civil comercial, danos causados por agentes com

aquele estado psicológico são certamente raros.

Assim, caso entendêssemos que toda a matéria deveria ser regulada

pela legislação comum, teríamos ações de responsabilidade ilimitada que

prescreveriam em vinte anos e ações de responsabilidade limitada que

prescrevem em dois anos, sem necessariamente seremos danos na primeira

mais gravosos que o da segunda. Teríamos fatos, que na maioria dos casos

geram os mesmos efeitos para as vitimas, causados pelos mesmos agentes

(em diferentes estados psicológicos), mas regulados de formas diversas, o que

deve ser repelido por todo ordenamento jurídico, em vista do tratamento

isonômico constitucional.

Portanto entendemos que, conseqüentemente, o prazo aplicável seria o

do Código Brasileiro da aeronáutica, porque lei evidentemente especial e

posterior ao código civil de 1916.Ora, uma lei 70 (setenta) anos mais nova e

que trata especificamente da relação jurídica em questão, deve certamente

estar em maior consonância com a sociedade do que uma lei feita no começo

do século passado , quando ainda não se falava em transporte aéreo com a

desenvoltura de hoje(registre-se que o código civil de 2002 reduziu o prazo das

ações de reparação civil para 3 (três) anos).

Mesmo que o argumento contrario a este seja o de não poderia haver

duas normas aplicáveis a um mesmo fato (a reparação integral regulada para o

direito comum e o prazo da ação pela lei especial ), entendemos que a vontade

do legislador foi exatamente esta que, ainda , o código civil de 1916 era omisso

quanto as contratos de transporte aéreo , assim tendo necessariamente de se

valer das definições e da aplicação das regras especiais.

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Exemplo de configuração de monografia A Vez do Mestre

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4. CODIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

Fruto te expressa determinação constitucional (art 28 ADCT), o Código

de defesa do Consumidor, lei nº 8078, de 11 de setembro de 1990, veio a lume

para dar efetividade a defesa do consumidor, direito fundamental (art 5,

XXXII,CRFB) e um doa princípios gerais da ordem econômica brasileira(art

170,V,CRFB) trazendo normas de ordem publica e de interesse social(art 1º

CDC) destinadas a restabelecer o equilíbrio nas relações de consumo.

Não obstante haver essa expressa previsão constitucional, o código de

defesa do Consumidor também se fundamenta no principio da solidariedade,

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Exemplo de configuração de monografia A Vez do Mestre

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previsto no art 3, I CRFB, como um dos objetivos fundamentais da republica

federativa do Brasil : “I- construir uma sociedade livre, justa e solidária”

Como todos sabemos, a constituição de 1988 foi nitidamente

influenciada pelo processo de redemocratização, quando o Brasil tentava

estabelecer uma nova ordem jurídica, baseada em princípios mais ligados a

Justiça Social, igualdade material etc. O principio da solidariedade surge

exatamente desta preocupação, pois é aquele que vincula os interesses do

individuo aos interesses do grupo social no qual este se insere.

Ainda dentro deste principio, podemos encontrar as bases de outro,

essencial para o Código de Defesa do Consumidor, que é o principio da

vulnerabilidade do consumidor (art 4, I, CDC), onde a inconteste

vulnerabilidade do consumidor nas relações de consumo, enseja que a ordem

jurídica minimize a disparidade evidenciada, protegendo e defendendo aqueles

que se encontrarem nesta situação.

Diante de tamanha previsão e fundamentação constitucional,

podemos dizer que a defesa do consumidor foi escolhida com um dos “nortes”

da ordem jurídica inaugurada pela constituição de 1988.è o que defende

Thereza Arruda Alvim, Eduardo Arruda Alvim e James Marins, frisando a

importância das relações de consumo e do Código de defesa do consumidor:

Esta destacada posição da defesa do consumidor, situada, agora, no ápice de nosso ordenamento, mostra-nos a importância do tema na esfera da economia nacional, que tem grande parte de sua atividade econômica pautada pelas chamadas relações de consumo, ou seja, relações das mais variadas entre fornecedor e consumidor que a partir de agora devem estar necessariamente, subordinadas aos comandos, em sua maioria cogentes, deste Código, avultando a necessidade da correta interpretação de seu conjunto normativo. 11

Assim para alguns doutrinadores, como Claudia Lima marques, o

Código de Defesa do Consumidor trouxe uma nova visão para o mundo

11 ALVIM, Arruda.Código do consumidor Comentado . 2ª ed. São Paulo:RT,1995.p.14-15

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Exemplo de configuração de monografia A Vez do Mestre

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negocial e acabou por influenciar todo sistema do Direito privado, ainda sob a

égide do vestuto e desatualizado Código civil de 1916.Já Cavalieri Filho,

defendendo a grande importância e influencia do Código de Defesa do

Consumidor, entende que este criou:

...uma sobreestrutura jurídica multidisciplinar, normas de sobredireito aplicáveis em toda e qualquer área do direito onde ocorrer relação de consumo.Usando de uma figura, costumo dizer que o código fez um corte horizontal em toda extensão da ordem jurídica existente, levantou o seu tampão e espargiu a sua disciplina por todas as áreas do direito – publico e privado, contratual e extracontratual, material ou processual. E assim entendo porque, tendo o código de defesa do consumidor, como vimos, estabelecido uma disciplina única e uniforme para todas as relações de consumo, necessariamente terá que ser aplicado em toda e qualquer área do direito onde elas ocorrem 12

Conseqüentemente, a influencia dessa sobreestrutura jurídica

multidisciplinar também foi sentida no campo do transporte aéreo, ate então

regulado inteiramente por leis próprias. Atualmente, o controle das cláusulas

contratuais e praticas abusivas (como o overbooking), da publicidade, dos

bancos de dados e da cobrança de dividas são matérias indiscutivelmente

reguladas pelo CDC. Contudo a grande discussão é aquela que deriva da

única matéria que o CDC e o sistema de Varsóvia / CBA regulam em comum,

que é a responsabilidade civil do transportador.

4.1 Conceitos

12 Op. Cit.p.463

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Exemplo de configuração de monografia A Vez do Mestre

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Antes de nos aprofundarmos naquela que pe a grande discussão

envolvendo o transporte aéreo e a proteção ao consumidor , devemos

esclarecer alguns conceitos caracterizadores de uma relação de consumo e

que permitem a analise do transporte sob a perspectiva do Código de Defesa

do Consumidor.

4.1.1 Consumidor

O primeiro conceito que devemos analisar é o de consumidor.

Seguramente, este é um dos temas mais tortuosos dentro do direito do

consumidor, mas, genericamente, podemos conceitua-lo como “toda pessoa

física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário

final “ (art 2ºCDC). Nota-se a preocupação do legislador em definir

objetivamente o consumidor como destinatário final dos produtos e serviços,

ou seja aquele que retira do mercado determinado bem ou serviço para o seu

próprio consumo , o que nos permite excluir do conceito aqueles q utilizam o

transporte aéreo p fins comerciais.

Contudo, para os fins desse trabalho, baseado em acidentes e danos

causados aos passageiros, utilizaremos o conceito do art 17 do CDC, onde

“equiparam-se aos consumidores todas as vitimas do evento” .Portanto, aqui

não há que se perquirir se a vitima era destinatária final ou não do serviço ou

produto, bastando que ela seja vitima de um evento danoso ao qual esse artigo

se refere, que é o fato do produto e do serviço. Vale ressaltar que com este

conceito, o código equipara, para fins de responsabilidade, o terceiro ao

passageiro (superando a distinção entre responsabilidade contratual e

extracontratual). Conclui, nesse mesmo sentido, Silvio Venosa:

Cuida-se da proteção ao denominado bystander, ou seja, as pessoas, naturais ou jurídicas, que mesmo sem serem participantes diretas da relação de consumo, foram atingidas em sua saúde ou segurança em virtude do fato do produto ou do serviço.A extensão justifica-se pela

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Exemplo de configuração de monografia A Vez do Mestre

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potencial gravidade que pode assumir a difusão de um produto ou serviço no mercado.Protege-se assim, o consumidor direto e indireto ou por equiparação.13

4.1.2 Fornecedor de serviços

Quanto aos conceitos de fornecedor e de serviço, podemos conceitua-

los conjuntamente.Segundo o art 3º do CDC, ”fornecedor é toda pessoa física

ou jurídica , publica ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes

despersonalizados,que desenvolvam atividades de...prestação de serviços “ e

segundo o § 2 deste mesmo artigo, “serviço é qualquer atividade fornecida no

mercado de consumo, mediante remuneração...”

Importante ressaltar que o transporte aéreo é serviço publico (art.

174CBA), operando sob o regime de concessão (quando se tratar de

transporte regular) ou autorização (quando não regular), nos moldes do art 21,

XII,c, da Constituição, e destinados somente as pessoas jurídicas(art 216CBA).

No entanto, estas características não excluem aquela de serviços oferecido no

mercado de consumo, visto que a proteção ao consumidor se aplica a qualquer

serviço oferecido no mercado de consumo, seja ele público ou privado.

4.1.3 Fato do serviço

Embora o código trate do fato do produto e do fato do serviço,

restringiremos nosso estudo ao fato do serviço, tendo em vista o interesse do

presente trabalho. Fato do serviço, também denominado de “acidente de

consumo” , é o dano moral ou material causado ao consumidor por um serviço

defeituoso, que é aquele que não oferece a segurança que dele se espera,

levando-se em conta o modo do seu fornecimento, o resultado e o risco que

dele se esperam e a época em que foi fornecido (art.14 CDC), ou seja, é o

dano à saúde ou a segurança física do consumidor.

13 VENOSA, Silvio de Salvo.Responsabilidade civil.3 ª ed .São Paulo:Atlas,2003.p.167

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Exemplo de configuração de monografia A Vez do Mestre

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Portanto, cabe ao fornecedor agir pautado no dever de segurança,

fornecendo seu serviço dentro dos padrões da normalidade e previsibilidade

pois, do contrário, responderá, independentemente da culpa (visto que o

código adotou a teoria do risco do empreendimento), pelo simples fato de ter

posto no mercado de consumo, um serviço defeituoso.

Contudo, é importante ressaltar que, necessariamente, o dano deve

consistir em um real prejuízo ao consumidor, bem como deve derivar

exclusivamente (nexo de causalidade) de um defeito constatado do serviço e

não de sua desvalorização ou inservibilidade .Dessa forma, um mero defeito

constatado, sem qualquer dano, não configura o fato de serviço, mas sim vício

do serviço. Da mesma forma, um dano sem a comprovação do nexo causal

que o conecte a um defeito do serviço, também não configurará o fato. Assim,

a diferença entre o fato do serviço e o vício do serviço é quanto à gravidade do

dano. No fato do serviço há risco à saúde e à segurança física do consumidor,

enquanto que no vício do serviço há a lesão pela qualidade ou identificação

incorreta do serviço.

4.2 A ação de reparação de danos

Diferentemente do Código Civil de 1916, e agora encontrado guarida

no Código Civil de 2002, o Código de Defesa do Consumidor previu

separadamente na Seção IV os prazos de decadência e de prescrição

respectivamente, do direito de reclamar dos vícios do produto ou do serviço e

da pretensão de reparação de danos causados pelo fato do produto ou serviço.

Contudo, o que nos interessa é o que o Código dispõe sobre a

pretensão de reparação de danos por fato do serviço:

Art.27.Prescreve em 5 (cinco anos a pretensão à reparação pelos danos causados por fato do produto ou do serviço prevista na Seção II deste capítulo, iniciando-se a contagem do prazo a partir do conhecimento do dano e de sua autoria

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Exemplo de configuração de monografia A Vez do Mestre

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Como podemos observar, estabeleceu-se um prazo de 5 (cinco) anos

pelo fato do serviço para o ajuizamento da ação de reparação de danos, o que

destoa do estabelecido no Código Brasileiro de Aeronáutica e na Convenção

de Varsóvia, 2(dois) ano, admitindo que o Código do Consumidor é aplicável

ao transporte aéreo nacional e internacional. Vale lembrar que tal prazo

também destoa daquele que foi posteriormente no Código Civil para as ações

de reparação de civil: 3 (anos).

Destarte, é este o ponto que iremos enfrentar de agora em diante,

sobre a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor no campo do

transporte aéreo internacional e nacional, bem como o resultado desta

aplicação sobre a ação de responsabilidade civil e o aparente conflito com o

Código Civil.

5. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E A CONVENÇÃO DE

VARSDÓVIA

Até o final da década de 80, era pacífico o entendimento de que a

Convenção de Varsóvia era a lei especial a ser aplicada para o transporte

aéreo internacional, apenas podendo ser afastada (para alguns, como vimos

anteriormente) quando o dano causado ao passageiro resultasse de dolo ou

culpa grave do transportador.

Todavia, com o advento de Defesa do Consumidor, paulatinamente, os

tribunais passaram a afastá-la em detrimento à lei do consumidor, quando

danos eram causados aos passageiros (entendidos como consumidores) pelos

transportadores (agora tratados como fornecedores de serviços)

Ainda hoje a aplicação de Código do Consumidor não é uma matéria

pacífica na jurisprudência, muito menos entre os doutrinadores que

nitidamente se dividem em dois grupos: aqueles que defendem irrestritamente

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Exemplo de configuração de monografia A Vez do Mestre

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a aplicação da lei do consumidor, por entende-la uma lei de natureza especial,

cogente e que influencia todo sistema de Direito Privado; e aqueles que se

apegam ao entendimento de que a convenção deve ser cumprida por ter um

status de norma internacional – o que gera uma posição hierárquica prevalente

em nosso ordenamento jurídico – pela sua especialidade e pelo que dispõe o

art. 178 da Constituição, que, para estes doutrinadores, obriga a observância

dos tratados internacionais quando da ordenação do transporte aéreo.

Desta forma, a grande questão a ser enfrentada neste momento -

certamente, o que mais se debate nos tribunais e na doutrina – é aquela que

trata da hierarquia das normas em questão. Deixaremos a análise da questão

da especialidade para o momento em que tratarmos do conflito entre o Código

de Defesa do Consumidor e o Código Brasileiro de Aeronáutica, quando esta

é mais evidente.

Em suma, “discute-se as normas oriundas de tratado internacional,

recebidas no ordenamento jurídico interno devem prevalecer sobre as normas

internas mesmo que posteriores, em virtude de sua origem internacional [sob o

argumento da universalidade destas normas] e da obrigação internacional do

Estado Brasileiro de cumprir estas normas até a denúncia do tratado”14 ou se

deve prevalecer a norma interna e posterior, atinente aos comandos

constitucionais e criadora da tutela específica das relações de consumo.

Formaram-se duas correntes em torno desta questão (que se

basearam em duas correntes já existentes dentro do Direito Internacional

Público). A primeira denominada monista, que defende a primazia de direito

internacional sobre as normas de direito interno, e a segunda denominada

dualista, que pugna pela paridade entre os tratados e o direito interno (infra-

constitucional).

Jurisprudencialmente, o que vem prevalecendo é o entendimento da

doutrina dualista, quando de setembro de 1975 a junho de 1977 estendeu-se

no plenário do Supremo Tribunal Federal o julgamento de Recurso

Extraordinário nº 80.004/77, firmando o entendimento de que

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Exemplo de configuração de monografia A Vez do Mestre

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Ante a realidade do conflito entre tratado e lei posterior, esta, porque expressão última da vontade do legislador republicano, deve ter sua prevalência garantida pela justiça - sem embargo das consequências do descumprimento do tratado no plano internacional .15

Desta forma, tal corrente, que se entende dualista ( veremos que há

uma impropriedade conceitual nesta doutrina ), entende que na falta da

garantia de privilégio hierárquico dos tratados sobre as leis do Congresso, deve

ser aplicada a lei mais recente, posto que de “ mesmo nível” que o tratado.

Contudo, entendemos que o sistema brasileiro é ligado a doutrina

monista, numa espécie moderada. Se o Brasil adotasse realmente o dualismo,

o Congresso teria de ir além de uma mera aprovação do tratado ( trataremos

mais a frente do procedimento de incorporação dos tratados) por Decreto-

Legislativo. Precisaria enviar à sanção presidencial projeto de lei que emulasse

os tratados, pois, no dualismo, o tratado só é fonte de Direito Internacional, não

podendo se admitido como fonte de Direito Interno. Para esta corrente, os

Decretos-legislativos não possuem atividade legislativa strictu sensu, que

demonstra, assim como o art.102,III,b, da Constituição, que é o próprio tratado,

uma vez ratificado e publicado internamente, que produzirá os efeitos

normativos, estando na mesma posição que a lei federal.

Na jurisprudência, o verdadeiro leading case para o Direito Aeronáutico,

foi o Recurs Extraordinário nº 172.720-9/RJ, quando o STF posicionou-se pela

aplicação do Código de Defesa do Consumidor e permitiu o ressarcimento de

danos morais, não previstos pela Convenção de Varsóvia, mas previstos na

Constituição de 1988, em caso de extravio de bagagens:

Indenização – Dano Moral – Extravio de mala em viagem aérea – Convenção de Varsóvia – Observação mitigada – Constituição Federal – Supremacia. O fato de a Convenção de Varsóvia revelar, como regra, a indenização tarifada por danos matérias não exclui a relativa aos danos morais. Configurados esses pelo sentimento de desconforto, de constrangimento,

14 MARQUES,Claudia Lima.Contratos no Codigo de Defesa do consumidor.4ªed.SP:RT,2002.p.524 15 REZEK,Francisco.Direito dostratados.1ªed.Rio de janeiro: Forense, 1984.p. 471.

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Exemplo de configuração de monografia A Vez do Mestre

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aborrecimento e humilhação decorrentes do extravio de mala, cumpre observar a Carta Política da República, incisos V e X do art.5º, no que se sobrepõe a tratados e convenções, ratificados pelo Brasil

Com relação à jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça,

esta inicialmente inclinou-se pela prevalência da Convenção de Varsóvia, por

entendê-la como lei especial frente às disposições gerais contidas no Código

de Defesa do Consumidor, como no bastante citado Recurso Especial nº

58.736/MG:

Lei – Tratado. O tratado não se revoga com a edição de lei que contrarie norma nele contida. Perderá, entretanto, eficácia, quanto ao ponto em que existia antinomia, prevalecendo a norma legal. Aplicação dos princípios pertinentes a sucessão temporal das normas, previstos na Lei de Introdução ao Código Civil. A lei superveniente, de caráter geral, não afeta as disposições especiais contida em trabalho. Subsistência das normas constantes da Convenção de Varsóvia, sobre transporte aéreo, ainda que disponham diversamente do contido no Código de Defesa do Consumidor .

Contudo, progressivamente, o entendimento do STJ foi sendo

modificado, no sentido de entender como prevalente a lei do consumidor. O

acórdão que marca essa alteração na jurisprudência é aquele extraído do

Recurso Especial nº 169.000/RJ, quando por unanimidade, a 3º turma do STJ

entendeu que, quando estiver caracterizada uma relação de consumo, as

disposições do Código de Defesa do Consumidor, devem prevalecer .

Responsabilidade Civil. Transportador. Limitação de Indenização. Código de Defesa do Consumidor. Convenção de Varsóvia. Editada lei específica em atenção a Constituição ( art.5º XXXII), destinada a tutelar os direitos de consumidor, e mostrando-se irrecusável o reconhecimento da existência

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Exemplo de configuração de monografia A Vez do Mestre

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de relação de consumo, suas disposições devem prevalecer. Havendo antinomia, o previsto em tratado perde eficácia, prevalecendo a lei interna posterior que se revela com ele incompatível [...] .

Muito embora esse entendimento tenha sido sufragado por

unanimidade na 3ª turma, ele ainda foi objeto de algumas resistências dentro

do próprio STJ, como podemos notar no acórdão da 4ª turma no Recurso

Especial nº 135.535/PB, julgado uma semana depois daquele acórdão

proferido no Recurso Especial nº 169.000/RJ. No entanto, a jurisprudência

acabou sendo uniformizada no sentido do entendimento esposado na 3ª turma,

quando a 2ª seção do STJ não conheceu dos Embargos de Divergência em

recurso

especial nº 269353/SP, referente a um extravio de bagagem, visto que

entendeu não mais existir divergências entre as 3ª e 4ª turmas. A partir desse

momento, já foi possível dizer que as divergências entre as 3ª e 4ª turmas

foram superadas e que a responsabilidade civil do transportador aéreo pelo

extravio de bagagem ou de carga é regida pelo Código de Defesa do

Consumidor, se o evento ocorreu em sua vigência, ficando afastada a

indenização prevista na Convenção de Varsóvia16

Quando identificada a antinomia entre a Convenção eo CDC, o STJ, em

seus julgados, propõe ora a perda da eficácia da Convenção anterior, ora a

derrogação das normas do Tratado ou uma nova interpretação da norma

“conforme a Constituição”

Contudo, entendemos que o melhor entendimento é o da perda da

eficácia. Lei ordinária interna não pode revogar tratados ou convenções

internacionais, pois revogar significa, etimologicamente, cassar a voz, ou seja

retirar a eficácia, o que é permitido apenas aos Estados partes, quando em

uma deliberação decidem conjuntamente por revogar tácita ou expressamente

as disposições de um Tratado. O estado individualmente considerado, pode

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Exemplo de configuração de monografia A Vez do Mestre

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somente denunciar, mas nunca revoga-lo, instrumento de competência do

chefe do Estado brasileiro.

No entanto, como os tribunais devem solucionar os conflitos de normas,

eles podem somente afastar a aplicação dos tratados, determinando a adoção

do direito interno. Assim, se revogada a lei interna que afastou a aplicação de

determinado tratado, este voltara a produzir seus efeitos (se recepcionado e

ainda não denunciado), visto que, se não pode ser revogado, o fenômeno da

repristinação não é vedado(art 2º §3º, LICC)17

Na doutrina Sergio Cavalieri Filho ainda utiliza outro argumento para

defender a aplicação do Código de Defesa do Consumidor, o de que os

Tratados internacionais foram colocados no mesmo plano que as leis

ordinárias pela constituição de 1988, visto que ao tratar da competência do

Superior Tribunal de Justiça, dispõe no art 105, III,a, que cabe recurso especial

contra decisão recorrida que “ contrariar tratado ou lei federal , ou negar-lhes

vigência”. Afirma o autor que “se os tratados tivessem status de lei

constitucional o recurso cabível em tais hipóteses seria o extraordinário pra o

Supremo Tribunal Federal, e não o especial.18

Antecipando os argumentos contrários que iremos citar mais a frente,

não cabe aqui alegar o art 102, III,b, que prevê o cabimento de recurso

Extraordinário para decisões de única ou ultima instancia que julguem a

inconstitucionalidade de tratado ou lei Federal, como faz Paulo Henrique de

Souza Freitas. Em primeiro lugar, o que se discute nessa hipótese é a ofensa

a constituição e não ao próprio tratado, como na hipótese do Recurso Especial.

16 NORONHA,Fernando.A Responsabilidade civil do transportador aéreo por danos a pessoas , bagagens e cargas.Revista de direitodo Consumidor.nº44.São Paulo: RT,2002 17 REZEK,Francisco. Direito dos tratados.1 ed. Rio de Janeiro:Forense, 1984.p.474 18 Op.cit..p.317

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Exemplo de configuração de monografia A Vez do Mestre

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Em segundo lugar, de qualquer maneira, a constituição é a fonte de validade

do tratado, pois alem de ser o parâmetro para a sua recepção, ela estabelece

todo o rito para a sua recepção, a partir de quando produzira efeitos na ordem

interna. Assim, não pode o tratado ir de encontroas disposições

constitucionais , a sua própria fonte de aplicação e validade.

E assim não poderia deixar de ser. Para que os tratados produzam

efeitos na ordem jurídica brasileira, após serem devidamente celebrados pelo

representante do estado brasileiro , devem ser aprovados pelo congresso

Nacional , sob a forma de Decretos Legislativos ( art 49, I, CRFB) e

posteriormente promulgados pelo chefe do poder executivo através de um

decreto Presidencial (art 84, VIII, CRFB), publicado no Diário Oficial da União,

Seção I.Somente a partir dessa publicação é que os tratados possuirão

executoriedade, cumprindo o que dispõe o Decreto nº 4520/2002:

Art 1 Incumbe ao Poder Executivo, por intermédio da

imprensa Nacional da casa Civilda Presidência da Republica, a publicação: I- das leis e doa demais atos resultantes do processo legislativo previsto na constituição: II- dos tratados , convenções e outros atos internacionais aprovados pelo Congresso nacioanl; ... Art 2 São obrigatoriamente publicados, na integra , do diário oficial da união : I- as leis e demais atos resultantes do processo

legislativo do congresso nacional II- Os tratados, as convenções e outros atos

internacionais aprovados pelo congresso Nacional e os respectivos decretos de promulgação;

...

Assim de acordo com o que vivos anteriormente, a revogação do

Decreto- Presidencial não implica na revogação do tratado, pois este decreto é

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Exemplo de configuração de monografia A Vez do Mestre

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apenas um instrumento de publicação do tratado , condição de sua eficácia no

direito interno.

Contudo, parte da doutrina ainda entende pela aplicação da Convenção

de Varsóvia ao transporte aéreo internacional. Assim, para fins deste trabalho,

citaremos apenas alguns expoentes deste posicionamento, para que, após,

possamos debater cada argumento.

Ricardo Alvarenga tem como argumento principal o status de norma

internacional da Convenção de Varsóvia, predominante sobre a lei interna.

Alega também que o art.5º, § 2º, DA Constituição, dá prioridade aos tratados.

José Gabriel Assis de Almeida defende a aplicação da Convenção de

Varsóvia pela preponderância do direito internacional sobre o direito interno,

pela sua especialidade (em virtude do disposto no art.2º, § 2º, da LICC) e pela

impossibilidade de aplicação do CDC além do território brasileiro, pois este só

prevê responsabilidade decorrente de fato ocorrido em território brasileiro, e

nunca, no estrangeiro.

Em sua singular obra de responsabilidade civil, Rui Stocco defende

igualmente a aplicação da Convenção de Varsóvia pela maioria dos

argumentos citados acima, mas pela razão fundamental do art.178 da

Constituição dispor que “a lei disporá sobre a ordenação dos transportes

aéreo, aquático e terrestre,devendo, quando à ordenação do transporte

internacional, observar os acordos firmados pela União “ , o que significaria

uma preocupação do legislador em honrar os acordos e tratados

internacionais, uma vez que a norma nacional deve obrigatoriamente respeitar

os acordos e tratados internacionais.

Coma devida vênia aos ilustres autores, sabemos que os tratados,

muitas vezes, são marcados pelos interesses econômicos dos países centrais

que, na maioria das vezes, fazem prevalecer a sua vontade nos organismos

internacionais. Claúdia Lima Marques, invocando os ensinamentos de

Francisco Rezek, diz que

A Constituição Brasileira de 1988 não prestou maiores homenagens ao Direito Internacional Público a não ser àquelas que ele realmente merece, isto porque as regras

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Exemplo de configuração de monografia A Vez do Mestre

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do cenário internacional não estão totalmente fixadas e dependem ainda muito do poder econômico e da importância política de cada país. Assim, não é pelo simples fato de ter sido uma norma inserida em um ato internacional que assegura a ela o fato de ser uma norma justa ou de aplicação conveniente no Brasil.19

Embora o Código de Defesa do Consumidor seja, na correta técnica

legislativa, uma lei ordinária, a defesa do consumidor foi alçada ao nível de

direito fundamental e de princípio da ordem econômica, como já vimos

anteriormente. Destarte, cabe fazer a ponderação do que se deve prevalecer,

a defesa do consumidor ou o princípio do pacta sunt servanda ? O pleno do

Supremo Tribunal Federal já assentou o entendimento de que a Constituição

da República deverá sempre prevalecer frente aos tratados internacionais.

O primado da Constituição, no sistema jurídico brasileiro, é oponível ao princípio pacta sunt servanda, inexistindo, por isso mesmo, no direito positivo nacional, o problema da concorrência entre tratados internacionais e a Lei Fundamental da República, cuja suprema autoridade normativa deverá sempre prevalecer sobre os atos de direito internacional público. 20

A ordem jurídica internacional não pode atentar contra a soberania do

Estado. Estes têm a faculdade de afastar a aplicação de determinada cláusula

disposta em tratado que contrarie a sua Constituição, ainda mais quando se

fala em cláusula pétrea (art.60, § 4º,IV, CRFB), onde nem o legislador pátrio

pode atuar contra.Esta é a chamada doutrina da supremacia constitucional

sobre as normas que ingressam no ordenamento jurídico por meio de atos e

tratados internacionais defendida por Canotilho e Moreira, quando tratam sobre

regra similar na Constituição Portuguesa:

19 Op. Cit,532 20 STF.Pleno.ADI 1480MC/DF Rel. Min.Celso de Mello.julgamento:04/09/1997 Publ. DJ: 18/05/2001

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Exemplo de configuração de monografia A Vez do Mestre

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...as normas de direito internacional público vigoram na ordem interna com a mesma relevância das normas de direito interno, desde logo quanto à subordinação à Constituição – sendo, pois, inconstitucionais se infringirem as normas da Constituição\ ou de seus princípios.21

6. CODIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E O CODIGO BRASILEIRO DE

AERONAUTICA

O Código Brasileiro da aeronáutica procurou seguir a disciplina da

Convenção de Varsóvia , ou seja conferir uma certa “proteção” as empresas de

transporte aéreo com relação a sua responsabilidade civil, tendo em vista o

seu alegado alto custo de operação, os maiores riscos a que estavam

submetidos, etc. Dessa maneira alem das disposições semelhantes quanto a

responsabilidade do transportador, o CBA trouxe igualmente um prazo de

2(dois) anos para a ação responsabilidade civil, mas agora submetido

expressamente ao instituto da prescrição(art 317)

Por trazer disposição similares a Convenção de Varsóvia , o código de

defesa do consumidor também colidiu com o código brasileiro de aeronáutica,

por trazer consigo disposição que procuram restabelecer o equilíbrio das

relações contratuais , protegendo o consumidor , e que eliminam qualquer

“privilegio” que impossibilite, atenue ou exonere a responsabilidade do

fornecedor de serviços( a exceção de uma relação constituída com um

consumidor –pessoa jurídica, nos termos do art 51 do CDC)

De acordo com o que dissemos no capítulo anterior, a maior

controvérsia dentro do debate que agora enfrentamos é quanto ao critério de

especialidade das normas ora conflitantes, visto que, ambos , o CDC e o CBA,

são normas de mesma hierarquia ( leis ordinárias federais), onde seria, em

21 MORAES,Alexandre de.Direito Constitucional 11º ed. São Paulo :Atlas,2002 p.570

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Exemplo de configuração de monografia A Vez do Mestre

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tese , aplicável o disposto na regra lex posterior generalis non derrogat priori

speciali ( art.2º, § 2º,LICC).

Antes, devemos esclarecer que este não é exatamente o mesmo caso

do conflito com a Convenção de Varsóvia, pois neste ultimo são discutidas a

hierarquia , principalmente, e a especialidade das normas.Dessa forma, o

entendimento que daqui extrairmos. Sobre a regra da especialidade, também

pode ser aplicado ao conflito anterior.Mas, como dissemos anteriormente ,

preferimos trata-lo melhor nesse ponto, ao qual se aplica com mais

propriedade.

Na doutrina e na jurisprudência não resta duvidas quanto a

especialidade do Código Brasileiro de Aeronáutica , que trata exclusivamente

do transporte aéreo nacional e , supletivamente , do internacional. Assim a

primeira vista, no conflito com o CDC seria aplicável o principio do art 2§ 2 da

lei de introdução ao código civil : “ A lei nova , que estabeleça disposições

gerais ou especiais a par das existentes , não revoga nem modifica a lei

anterior”. Portanto, o CBA prevaleceria por se tratar de norma especial quanto

ao transporte aéreo. No entanto, como pondera Caio Mário da Silva Pereira,

não se pode dizer “ que uma lei geral nunca revogue uma lei especial, ou vice-

versa, porque nela poderá haver dispositivo incompatível com a regra

especial, da mesma forma que a lei especial pode mostrar-se incompatível

com o dispositivo inserto em lei geral “ . Ao intérprete, acrescenta, “ cumpre

verificar, entretanto, se uma nova lei geral tem o sentido de abolir disposições

preexistentes”.21

Contudo, há aqueles que defendem a especialidade da lei do

consumidor, como Antônio Herman Benjamin, entendendo que além de ser

daquelas leis “horizontais” que invadem todos os demais campos do Direito ela

também se caracteriza pela sua especialidade:

São normas que têm função, não regrar uma determinada matéria, mas proteger sujeitos particulares, mesmo que estejam eles igualmente abrigados sob outros regimes jurídicos.Daí o caráter “especializado” do

21 PEREIRA,Caio Mario da Silva. Apud GONÇALVES,Carlos Roberto.p.169

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Direito do Consumidor. Enquanto o Direito Aeronáutico é disciplina especial em decorrência da modalidade da prestação, o Direito do Consumidor é disciplina especial em razão do sujeito tutelado.21

Portanto, neste caso, estaríamos diante de um conflito de duas normas

especiais, mesmo que em planos diferentes. Fernando Noronha entende que

não podemos falar, neste caso, de especialidade de uma norma em relação à

outra, visto que não há uma inserção total do âmbito de atuação de uma em

outra, como haveria no Direito Civil.

Comete-se um equívoco quando se afirma que o Código Brasileiro de Aeronáutica e a Convenção de Varsóvia são leis especiais perante o Código de Defesa do Consumidor, Só se pode dizer que dois ramos de direito estão, um em relação ao outro, numa situação de direito comum para direito especial quanto o âmbito do segundo se insere totalmente dentro do âmbito maior do primeiro, só tendo como nota distinta o acréscimo de alguns elementos específicos daquele. Só se pode falar num direito especial quando, se ela existisse, todos os casos por ele abrangidos caíssem no âmbito geral, para serem por ele regulados. Ora, não é isso que acontece com o direito das relações de consumo e com o direito da responsabilidade civil do transportador aéreo. A posição em que estes se encontram, um em relação ao outro, é a de dois direitos especiais, e por isso mais complexa 22.

Desta maneira, não cabe aqui utilizar o princípio lex posterior

generalis non derrogat priori speciali, pois, como visto, este princípio não

tem aplicação no caso do conflito de duas leis especiais. Tese defendida

com grandes méritos, por Sérgio Cavalieri Filho:

[...] é impertinente a regra lex posterior generalis non derrogat priori speciali, porque, tratando-se de relações de consumo, o Código do Consumidor é a lei própria , específica e exclusiva; a lei que estabeleceu a Política Nacional de Relações de Consumo, consolidando em um só diploma legal todos os princípios pertinentes à matéria, em razão de competência que lhe foi atribuída pela própria Constituição Federal. E, na matéria de sua competência específica, nenhuma outra lei pode a ele

21 Op.cit,p.17-18 22 Op.cit.p. 179-180

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(Código) se sobrepor ou subsistir.Pode apenas coexistir naquilo que com ele não for incompatível.23

Resta, portanto, aplicar o brocardo lex posteriori derrogat priori, adotado

pelo legislador pátrio no art.2º, § 1º , da Lei de Introdução ao Código Civil que

diz que “ A lei posterior revoga a anterior quando regule inteiramente a matéria

de que tratava a anterior”.

É necessário frisar, que mesmo que seja claro, que o comando desta

regra não é apenas o de que lei mais nova derroga lei mais antiga, como

muitos crêem. Para que exista a revogação (ab- rogação ou derrogação) é

necessário que haja uma expressa declaração da lei revogadora, uma

incompatibilidade flagrante entre as normas ou quando a revogadora regule

inteiramente a matéria tratada na anterior.

Sabemos que o Código de Defesa do Consumidor limitou-se em seu

art.119 ao genérico”revogam-se as disposições em contrário “ e que tão pouco

regula a matéria relativa aos transportes aéreos. Portanto a aplicação daquela

regra se dará pela incompatibilidade entre as leis do consumidor e do

transportador aéreo, mesmo que aquela, lei nova, seja incompatível apenas

parcialmente com esta, como ressalta Caio Mário:

Incompatibilidade poderá surgir também no caso de disciplinar a lei nova, não toda, mas parte apenas da matéria, antes regulada por outra, apresentando o aspecto de uma contradição parcial. A lei nova, entre os seus dispositivos, contém um ou mais, estatuindo diferentemente daquilo que era objetivo de lei anterior. As disposições não podem coexistir, porque se contradizem, e, então, a incompatibilidade nascida dos preceitos que disciplinam diferentemente um mesmo assunto, impõe a revogação dos mais antigos.24

Na pesquisa da incompatibilidade das normas, o intérprete deve buscar

a intenção e os objetivos do legislador e analisar se efetivamente a lei nova

não pode coexistir com a velha , pois, caso não haja incompatibilidade, ambas

permanecerão vigentes, regulando o que lhes pertence.

23 Op.cit,p. 332-326 24 PEREIRA,Caio Mario da Silva.Instituições de direito civil Vol I 19ª ed. atual.RJ Forense ,2002.p.84

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Desta maneira, o Código de Defesa do Consumidor ao obedecer ao

comando constitucional, tutelando os interesses dos consumidores, avocou a

regulação de todos as relações de consumo, sejam elas contratuais e

extracontratuais .

No entanto, não fez ressalvas a privilégios existentes em leis anteriores,

que se mostram não condizentes com a realidade social, assim,

revogando(derrogando) estas disposições. Portanto, é aplicável o prazo

de 05 (anos) do Código de Defesa do Consumidor.

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7. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E O CÓDIGO CIVIL

Sem a pretensão de querer esgotar o tema, devemos, por último, posto

que mais recente, analisar o que dispõe o Código Civil de 2002. O art.206, § 3º, V,

reduziu para 3(três) anos o prazo da “ pretensão e reparação civil” , antes

regulada genericamente pelo art. 177 do Código Civil de 1916 que estipulava um

prazo de 20 (vinte) anos para as ações pessoais.

Embora seja louvável a política de redução geral dos prazos de

prescrição, o legislador acabou por criar um descompasso com a lei consumerista,

que dispõe um prazo de 5(cinco) anos para reparação de danos causados por fato

do produto ou serviço (art.27).

Não obstante este evidente descompasso, ambos os prazos continuarão

vigendo, onde forem aplicáveis. Neste caso, é de simples constatação que há a

relação de especialidade entre o Código de Defesa do Consumidor e o Código Civil

( que não há entre o CDC e o CBA ). Portanto, continuará subsistindo o prazo

quinquenário da lei do consumidor, mas somente quando se tratar de ações de

responsabilidade civil derivadas de danos causados por fato do produto ou do

serrviço,” até que, de lege ferenda, se adapte a lei especial à política prescricional

em boa hora adotada pelo Código Civil de 2002”25

Analisando os pontos de convergência entre o Código Civil de 2002 e o

Código de Defesa do Consumidor, Ruy Rosado de Aguiar Júnior entende que

devem ser aplicadas as regras do Código Civil quando estas regulamentarem

especificamente uma situação de consumo, porque se trata de lei mais recente .

Cita o exemplo do contrato de transporte de pessoas, onde embora exista uma

regulamentação específica do Código Civil desta espécie de contrato

25 Humberto Theodoro Junior.Comentarios do noco codigo civil. Vol III 2ª ed. Rio de janeiro:forense,2004.p.299

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(diferentemente do Código Civil de 1926, que nada dispôs), não deixam de ser

aplicados os princípios de uma relação contratual consumerista.

Porém, quando trata dos prazos de prescrição, o eminente Ministro

defende a aplicação do disposto na lei do consumidor, posição que entendemos

ser a mais correta:

Pergunto se essa disposição nova do Código Civil, que reduz o tempo de prescrição da pretensão indenizatória para três anos, também se aplica à relação de consumo. Acredito que, em razão de sua especificidade, que se denota inclusive pela regra própria sobre o início de sua contagem, manté –se para o cálculo da prescrição da pretensão de reparação do dano causado ao consumidor a regra do Código de Defesa do Consumidor, permanecendo o prazo de cinco anos.

Contudo, tal posição há de ser afastada quando o dano for resultado de

um simples descumprimento de prestação contratual e não causada pelo fato

do produto ou do serviço, caracterizando assim um foro de aplicação do

disposto na lei comum, como dispõe Humberto Theodor Júnior:

Se se trata de exigir cumprimento de prestação contratual, para a qual o Código Civil tenha estabelecido prazo específico, a prescrição será a nele prevista, e não a do Código do Consumido. É o caso , por exemplo, do contrato de seguro , cujo lapso prescricional, tanto para a pretensão do segurado, como dôo segurador, é de um ano ( art. 206, §1º,II ). Dessa maneira [ citando o Des. Sylvio Capanema], “ prazo do Consumidor, só se aplicará quando o segurado pretender indenização de danos causados por fato do serviço, e não o simples adimplemento do contrato.

Em sentido contrário, Rui Stocco defende a aplicação do prazo de

prescrição do Código Civil a todos os casos de reparação de danos, não dando

margem à atuação do princípio da especialidade. Para o autor (que descarta

a aplicação do Código de Defesa do Consumidor por entende-lo lei geral ), o

Código Civil trouxe “ regra geral que deve prevalecer para toda e qualquer

hipótese de ação visando a reparação civil do dano , visto que disciplinou

especificamente sobre esta ação ( art. 206,§3º,V).

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Exemplo de configuração de monografia A Vez do Mestre

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Entende ainda inaplicável o disposto em legislação especial sobre

transporte aéreo, pelo motivo do Código Civil ter disposto em seu art.732 que “

aos contratos de transporte, em geral, são aplicáveis, quando couber, desde

que não contrariem as disposições deste Código, os preceitos constantes da

legislação especial e dos tratados e convenções internacionais” (grifo nosso).

Assim, para o autor , o prazo de 2 (dois) anos do Código Brasileiro de

Aeronáutica e da Convenção de Varsóvia, mesmo que em leis especiais sobre

a matéria, contraria o que dispõe o Código Civil, que unificou, e

posteriormente, o prazo da ação de reparação civil e que elegeu sua

supremacia sobre toda a legalização que apanhou no momento de sua

entrada em vigor “.

Contudo, tais argumentos não prosperam. O Código Civil, ao disciplinar

supervenientemente e especificamente sobre uma relação tipicamente de

consumo, como é o contrato de transporte, determinou que suas regras

fossem aplicadas em detrimento da regras do Código do Consumidor.

Contuso, ao contrário do que prega o autor, o art.732 estabelece a supremacia

do Código Civil somente em relação aos contratos de transporte.

A Ação de reparação civil , bem como a sua prescrição, não devem

estar regulados no lugar onde os contratos. A ação e, conseqüentemente a

prescrição, pertencem ao direito de ação dos indivíduos e, verdadeiramente,

derivam da pretensão de reparação de danos de uma vítima de acidente que,

por isso, se situa em lugar diferente do código, que não estabelece, como faz

no capítulo que trata dos contratos de transporte, a supremacia das suas

disposições. Desta forma, entendemos que o prazo do Código de Defesa do

Consumidor, lei especial, continua sendo aplicável.

8. CONCLUSÃO

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Ao longo de todo século XX, a avaliação comercial desempenhou um

papel de fundamental importância dentro do fenômeno da globalização.Foi ela

em parte responsável pelo”salto” na integração cultural e econômica dos

paises, ao permitir que mais e mais pessoas transitassem ao redor do mundo

com maior facilidade, levando consigo todo o valor que agregam as viagens,

sobretudo as de negócios e de turismo. Isso nos permite fazer a comparação

de que a aviação comercial esta para o capitalismo, assim como as grandes

expedições marítimas estiveram para o Mercantilismo.

Tendo em vista essa singularidade de transpor facilmente as fronteiras

Territoriais, já em 1966, em sua famosa obra Tratado de Direito Privado,

Pontes de Miranda alertava para a maior capacidade de produzir danos do

transporte aéreo :” a conquista do espaço, por mais seguro que seja,

corresponde possibilidade mais extensa de danos”26 . De lá para cá, com a

evolução tecnológica da aviação civil comercial, voar tornou-se ainda mais

seguro, o que podemos confirmar com a expressiva diminuição do numero de

acidentes aeronáuticos.

Contudo, não obstante ser atualmente um dos meios mais seguros de

transporte, a aviação civil ainda esta sujeita a imprevistos da natureza, a falhas

mecânicas e aos erros humanos, o que na maioria dos casos, causa danos

aos passageiros . Estes devem sempre ser indenizados integralmente, ou seja

, de acordo coma a extensão dos danos, sob pena de estar-se legitimando um

tratamento desigual e que não tem mais razão de ser , conforme entendimento

de maior parte da doutrina e da jurisprudência.

Desta forma, e por tudo o que foi exposto e debatido, a ação de

responsabilidade civil em face do transportador aéreo deve sempre seguir o

que dispõe o Código de defesa do Consumidor , verdadeira lei de função social

dentro da ordem jurídica brasileira, obedecendo , assim , em ultima instancia, a

26 MIRANDA,Pontes de.Tratado de Direito Privado.Parte especial Tomo LIII. RJ :Borsoi,1966.p.415

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própria Constituição, lei máxima do sistema, ao dar efetividade a proteção ao

consumidor.

Portanto, todos os operadores jurídicos, sobretudo os tribunais, devem

orientar-se pela proteção ao consumidor , deferindo-lhe um tratamento mais

favorável e, assim, mais isonômico. Devem, porem, sempre observar os limites

desta proteção especial, para que não seja instalada a chamada “ditadura do

consumidor”, que acabara, por um lado, atentando contra a iniciativa privada e,

por outro, desconfigurando a real intenção desta proteção.

ANEXOS

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ANEXOS

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BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

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FOLHA DE AVALIAÇÃO

Nome da Instituição: Universidade Candido Mendes- a Vez do Mestre

Título da Monografia: Ação de responsabilidade civil em face do

transportador aereo

Autor: Bianca Szlana F Finkielsztejn

Data da entrega: 01/02/2007

Avaliado por: Conceito: