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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
DO DISTRITO FEDERAL AO ESTADO DA GUANABARA: A
TRANSFERÊNCIA DA CAPITAL FEDERAL
Autor: Enio Silva de Almeida
Orientador: Prof. Jorge Tadeu V. Lourenço
Data: 25/09/2006
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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
DO DISTRITO FEDERAL AO ESTADO DA GUANABARA: A
TRANSFERÊNCIA DA CAPITAL FEDERAL
OBJETIVOS:
Trabalho de Conclusão de curso apresentado por
Enio Silva de Almeida ao Departamento de pós-
graduação como parte dos requisitos para a
obtenção do título de Especialista em Gestão
Estratégica.
CURSO: GESTÃO ESTRATÉGICA
Autor: Enio Silva de Almeida
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DEDICATÓRIA
Dedico esta obra e seus efeitos a toda a minha
família que muito me ajudou, motivando e
acreditando em minhas vitórias.
Dedico a você, meu pai, Sr. Enio Almeida; a você,
minha mãe, Sra. Ivonete Almeida e a vocês meus
irmãos, Henrique, Miriam e Denise Almeida. Quero
em especial dedicar a você meu filho, que muito
amo, Felippe Barros de Almeida, razão maior da
minha vida.
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AGRADECIMENTOS
Agradeço a todos que foram fundamentais na realização
desta obra. Cada sorriso, cada sugestão, cada crítica, cada
frase, cuja, principal “vai dar tudo certo” foi a alavanca
principal para a certeza do sucesso que juntos iremos
compartilhar com mais essa grande vitória.
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“Capital na Colônia, Capital no Império e na República sua situação ímpar lhe impõe
um estatuto diferente. O Rio é a cidade de todo o Brasil, a cidade que se identifica com
o Brasil, a cidade-cenária de acontecimentos políticos culminantes que levaram aos
confins do país, vibrações de toda a ordem”.
(Deputado Munhoz da Rocha, em discurso na Câmara dos Deputados, em
12/02/1960).
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SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO páginas
1- A Idéia da interiorização da capital – Síntese histórica 8
2- A Política no Rio de Janeiro Distrito Federal 18
2.1- O Rio de Janeiro como Distrito Federal
2.2- O mapa político do Rio de Janeiro 34
2.3- As tentativas de impedir a transferência da capital 39
2.4- A relação entre o Governo Federal e o Governo Local 48
2.4.1- Autonomista x Intervencionistas
2.4.2- As relações entre a Câmara dos Vereadores do Distrito 51
Federal, o Senado Federal e o Prefeito.
3- A imprensa e a transferência da capital 54
4- Conclusão 61
5- Bibliografia 66
6- Anexos
7- Anexo 1
8- Anexo 2
9- Anexo 3
10- Anexo 4
11- Anexo 5
12- Anexo 6
13- Anexo 7
14- Anexo 8
15- Anexo 9
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INTRODUÇÃO:
Esse trabalho analisa a transferência da Capital Federal da cidade do Rio de
Janeiro para Brasília. O Rio de Janeiro foi sede do governo Colonial, Imperial e
Republicano e este fato marcou profundamente a história da cidade. Falar
sobre a transferência da Capital é um desafio pois são muitas as informações e
aspectos que se podem abordar da política à economia. Catalogar estas
informações e retratar uma parte do que ocorreu neste momento crítico para a
cidade é objetivo principal desse trabalho. O trabalho busca avaliar as
condições em que o processo de transferência foi feito, principalmente no que
se refere aos aspectos políticos envolvidos na ação da mudança da Capital. A
Guanabara, um dos produtos finais da interiorização da Capital Federal, era a
realização de um antigo sonho carioca de conquistar sua autonomia política e
afastar a influência do poder federal, sendo certo afirmar que a acidade,
mesmo tendo perdido o status de Capital Federal, ganhou o que mais
almejava: sua liberdade política.
A estruturação do trabalho se apresenta da seguinte forma: o capítulo 1,
consiste no resumo histórico das idéias de interiorização da Capital Federal,
desde a Inconfidência Mineira até o ano de 1955, quando Juscelino Kubistchek
é eleito Presidente da República e concretiza esta idéia. As fontes utilizadas
para construir este retrospecto das idéias foram os Anais do Parlamento
Nacional do Império da República, discursos e mensagens dos Presidentes da
República, Decretos Presidenciais e as Constituições de 1891, 1934, 1937 e
1946.
O capítulo 2 é dedicado à política, a partir de uma síntese da história política do
Distrito Federal até a transferência da Capital em 1960. Foram descritas as
mudanças institucionais ocorridas desde o Município Neutro até ano de 1955,
ano de eleição presidencial.
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É traçado um mapa político da Capital Federal com o objetivo de analisar no
período compreendido entre 1956 a 1960 , quais forças dominavam o cenário
político à época da discussão da transferência, a fim de se analisar a relação
entre o Governo Federal e o Governo Local ao longo da história republicana do
Distrito Federal. A descrição do processo de aprovação das leis relativas à
transferência e a ação da oposição e suas tentativas de impedir a respectiva
mudança foram os objetivos desta seção do capítulo 2. Por último, ainda neste
capítulo é discutida a luta travada entre os defensores da autonomia, intitulados
“Autonomista”, e os membros do Executivo e do Senado Federal, denominados
de “Intervencionista”, com ênfase nas relações entre a Câmara Municipal e o
Senado Federal, que eram instituições vitais na administração do Distrito
Federal. Para a elaboração deste capítulo foram utilizadas as seguintes fontes:
Anais das Assembléias Gerais Constituintes do Império e da República; do
Parlamento Nacional do Império e da República; as Constituições de 1891,
1934, 1937 e 1946, bem como Leis e Decretos Presidenciais referentes ao
Distrito Federal. Além destas foram utilizados depoimentos de políticos e
diversos recortes de jornais do Rio de Janeiro da época, como o Correio da
Manhã, o Jornal do Brasil e a Tribuna da Imprensa.
Finalmente, no capítulo 3 um artifício foi usado para avaliar as reações da
sociedade carioca sobre a mudança da Capital Federal. Tais reações foram
analisadas através da leitura da imprensa carioca, buscando elementos que
retratassem o que a sociedade carioca pensava acerca da mudança da Capital
e de que maneira os jornais abordaram o assunto. Os periódicos consultados
para a elaboração deste capítulo foram: o Jornal do Brasil, o Correio da Manhã,
a Tribuna da Imprensa, O Globo, a Última Hora, o Jornal do Comércio, O Dia, A
Notícia, O Diário Carioca e O Jornal, todos com edições dos anos de 1958,
1959 e 1960.
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CAPÍTULO 1
A idéia da interiorização da capital – Síntese Histórica
A idéia da interiorização da capital federal remonta ao ano de 1789 e
está presente nos arquivos da Inconfidência Mineira. A conspiração de Vila
Rica tinha como principal objetivo constituir uma República em Minas Gerais e
uma das providências, após a proclamação, era transferir a capital para o
interior do país, mas especificamente, para a cidade de São João Del Rei. Para
os inconfidentes a área seria favorável para a expansão da lavoura e da
agropecuária, que eram atividades econômicas mais aconselháveis, após a
crise e queda da mineração. Além disso, com a mudança da capital, “Vila Rica
se transformaria numa cidade universitária, uma nova Coimbra, centro de
estudos superiores da República.“(Barros, Edgard L. “Os sonhadores de Vila
Rica”. RJ Ed.Histórias em Documentos, 1989. 6ª ed., cap. 2, pág. 28.) A idéia
portanto, era transferir o eixo cultural e político do país para Minas Gerais.
Mais tarde, em 1822, José Bonifácio fez a seguinte referência aos deputados
da corte de Lisboa, acerca da transferência da capital da colônia:
“ Parece-nos também muito útil que se levante uma cidade central no
interior do Brasil para assento da Corte ou da Regência, que poderá ser
na latitude, pouco mais ou menos, de 15 graus, em sítio sadio, ameno,
fértil e regado por algum rio navegável.” (Carta de José Bonifácio aos
deputados de Lisboa. “Instruções ao governo provisório de SP aos
deputados às Cortes de Lisboa”. 10/09/1821)
10
No dia 15 de junho de 1822, a comissão de deputados brasileiros,
encarregada dos artigos adicionais à Constituição portuguesa no que se referia
ao Brasil, recomendava:
“O Congresso Brasileiro ajuntar-se-á na capital, onde ora reside o
Regente do Reino do Brasil, enquanto não se funda no centro daquele
uma nova capital.” (Anais da Assembléia Geral Constituinte e
Legislativa do Império do Brasil, 13/08/1823).
Em 1823, novamente José Bonifácio reafirma a necessidade da
interiorização, em sessão da Assembléia Constituinte e Legislativa do Império
do Brasil. Através de uma “memória”, sugeriu o nom e Brasília para a nova
cidade (Anais da Assembléia Geral Constituinte de Portugal. Comissão de
deputados brasileiros encarregada da redação dos artigos adicionais à
Constituição Portuguesa, referente ao Brasil, 15 de junho de 1822).
.Porém, a Assembléia Constituinte foi dissolvida e na Constituição de 1824 não
era mais citada a transferência da capital do Reino.
Conforme se pode notar nos trechos acima, a preocupação em transferir
a capital para o interior do território brasileiro era antiga, sendo que a questão
da segurança do Reino parecia ser a idéia inicial. Tal fato pode ser confirmado
pois assim que a República foi proclamada e a primeira constituição
republicana foi promulgada, a transferência da capital, foi prevista nas
disposições transitórias, Art. 3º:
“Fica pertencendo à União, no Planalto Central da República, uma zona
de 14.400 quilômetros quadrados, que será oportunamente demarcada,
para nela estabelecer-se a futura capital federal” e mais, no parágrafo
único: “Efetuada a mudança da capital, o atual Distrito Federal passará
a constituir um Estado”. (Constituição de 1891, art. 3º,parágrafo único,
disposições transitórias).
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Segundo o livro de Cláudio Pacheco, cujo conteúdo discute acerca das
Constituições Brasileiras (Pacheco, Cláudio, “Tratado das Constituições
Brasileiras”, RJ, 1965, Volume XIV, pág. 7 e 32) coube ao deputado Tomás
Delfino a iniciativa de definir o local que
“Não devia ser colocada nem ao norte, nem ao sul”., mas de modo a
receber a influência de ambas as grandes divisões territoriais, num
ponto central, traduzindo assim a nossa harmonia, a nossa
confraternização e a nossa força”. Disse ainda que lhe parecia urgente
a mudança da capital para fazer com que o Congresso deixasse de
estar “sob a influência dominadora de uma cidade como a nossa,
agitada, tumultuária, como grande centro que é”.
Portanto, um dos motivos para a proposta da transferência da capital,
presente na Constituição de 1891, foi a preocupação com a segurança, pois tal
proposta fazia referência à sede do governo republicano estar situada em uma
cidade agitada como o Rio de Janeiro, o que não era aconselhável, bastando
citar como exemplo que a cidade foi palco para a Proclamação desta
República.
Outro defensor da transferência da capital par a o centro do país na
Carta Magna de 1891, foi o Visconde de Porto Seguro. Ele argumentava que a
interiorização era importante por uma questão estratégica e de segurança:
“Quando se der trabalho de percorrer conosco o catálogo das nações
da Europa e da América, e fizer o reparo de como as maiores dellas, e
ainda as consideradas como primeiros potenciais marítimos, não têm
seus capitães junto do mar, como a si política ou o instincto da própria
defesa lhes dissesse que estavam mo estão, assim, mais seguras...”
pois “...As grandes cidades, de muita população e movimento, não
convêm para residência do governo e lugar de reunião do congresso,
n’ellas ficam muito expostos à influência de capitaneadas por agitadores
perigosos” e “Quanto ao estado defensável do Rio, e a possibilidade de
resistência, mais haveria que dizer, mas poupemo-nos a mencionar
exemplos de triste recordação para todo o bom cidadão, embora
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pudessem fazer argumento em nosso favor” (Pacheco, C. “Tratado das
Constituições Brasileiras”, RJ, 1965, Volume XIV, pág. 30 e 31).
Além das questões de segurança da sede do governo, a pretendida
mudança também foi defendida sob os argumentos de que
“acodem ainda outras razões, além da estratégia e de segurança com
relação a inimigos externos. Collocada em lugar proximamente
eqüidistante dos extremos, como pretende a constituição, facilitam-se
as comunicações e relações com os estados, em múltipla vantagem
para elles e para a União” (Pacheco, C. Op. Cit.p.30 e 3).
Nos trechos acima assinalados, podem-se tirar duas conclusões principais
sobre a inserção da transferência da capital no artigo 3º das disposições
transitórias da Constituição de 1891:
Questão de segurança da sede do governo:
A) Internamente por ser o Rio de Janeiro uma Capital muito desenvolvida,
de indivíduos politizados e dada a agitação político-sociais, também era
uma cidade muito perigosa para ser a sede do governo republicano
recentemente instituído;
B) Externamente interiorizando a capital, estaria protegendo o governo de
um ataque externo, a exemplo de outras nações da Europa.
1 – Com a sede do governo mais distante do litoral, facilitavam-se as relações
com outros estados da nação.
A primeira Constituição republicana não fixava prazos. Era vaga,
imprecisa quanto à formação da Comissão e a divulgação dos seus resultados.
Deixava de definir o local e tampouco indicava em quanto tempo tal local
deveria ser definido pela Comissão. Por fim não definia com precisão como se
resolveria a questão do Rio de Janeiro após a transferência concluída.
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Logo após a promulgação da Constituição, foi nomeada uma Comissão
para cumprir o dispositivo constitucional. No dia 12 de maio de 1892, o chefe
do governo, Marechal Floriano Peixoto, em uma mensagem ao Congresso
Nacional, por ocasião da abertura da segunda sessão ordinária, afirmou:
“Reputando de necessidade inadiável a mudança da capital da União, o
governo trata de fazer seguir para o Planalto Central a comissão que
deve proceder à demarcação da área e fazer sobre a zona os
indispensáveis estudos.”
Complementando a resolução presidencial, o Ministro da Agricultura
organizou a Comissão Exploradora do Planalto Central e nomeou o astrônomo
Luís Cruls para dirigi-la. No dia 9 de julho de 1892, a “missão Cruls” seguiu
para o Planalto Central.
Dentre as tarefas da missão, pode-se destacar a demarcação dos
14.400 quilômetros quadrados; o levantamento dos itinerários percorridos
numa extensão de cerca de 4000 quilômetros; o levantamento das lagoas, o
estudo da geologia, a mineralogia e a botânica da região. No final da
expedição, a comissão apresentou dois relatórios ao governo, um em 1893 e
outro em 1894, contendo ambas as informações sobre a topologia, as fontes de
energia, a fertilidade do solo, a abundância de águas, a geologia, a fauna e a
flora, o clima da região, etc., sendo que o último relatório recomendava que a
instalação da Capital fosse no Planalto Central. A área demarcada pela
expedição ficou conhecida como “quadrilátero de Cruls”.
Durante o governo de Prudente de Morais, a missão foi dissolvida por
falta de verba e o assunto foi abandonado até 1919. Neste ano, o senador
Chermont apresentou um projeto para que o governo lançasse a pedra
fundamental do palácio do Congresso, nas comemorações do centenário da
independência, em 1922. Outro senador da República, Rego Monteiro ratificou
a posição do colega, afirmando que:
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“A mudança da capital da República está decretada por um dispositivo
insofismável do nosso pacto fundamental; nenhuma discussão é
permitida em torno da necessidade dessa medida. A constituição a
consagrou. É quanto basta para que não seja suscetível a impugnação”.
Em 18 de janeiro de 1922, o presidente Epitácio Pessoa assinou um
decreto administrativo, cujo teor designava que o
“poder executivo tomará as necessárias providências para que, no dia 7
de setembro de 1922, seja colocada no ponto mais apropriado da zona
a que se refere o artigo anterior, a pedra fundamental da futura cidade,
que será capital da União. “ (Decreto nº 4.494, de 18 de janeiro de
1922).
A placa colocada no Quadrilátero de Cruls”, tinha a seguinte inscrição:
Após este evento público e solene, nada mais significativo, no que diz
respeito a transferência, aconteceu. Os governos após 1922 não executaram o
dispositivo constitucional. A Constituição de 1891 foi substituída pela de 1934,
Nesta nova Constituição vinha novamente, no seu artigo 4º, das disposições
transitórias, a questão da mudança da Capital sob os seguintes termos:
“Será transferida a capital da União para um ponto central do Brasil. O
Presidente da República, logo que esta constituição entrar em vigor nomeará
uma comissão que recebendo instruções do governo, procederá aos estudos
das várias localidades adequadas à instalação da capital.” (Constituição de
1934, Art. 4º, das Disposições Transitórias).
A Constituição de 1934 também era vaga. Novamente não estabelecia
prazo para a criação da Comissão e nem para a emissão do relatório. Sequer,
indicava o Planalto Central como a região escolhida para a instalação da futura
sede do governo, denotando, portanto, um claro efeito de retrocesso, já que o
Presidente da República deveria nomear outra comissão, frise-se, quase que
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tornando sem efeito os trabalhos realizados pela Comissão anterior, pois além
de tudo ainda ordenou proceder o “estudo de várias localidades”.
Em 1940, Getúlio Vargas lançou um programa de “marcha para o oeste”, numa
atitude demagógica para implementar a interiorização. Mas o programa de
governo não apresentou ações concretas, manifestando-se apenas no campo
do discurso: “o vosso Planalto é o miradouro do Brasil. Torna-se imperioso
localizar no centro geográfico do país poderosas forças capazes de irradiar a
garantir a nossa expansão futura.” (Getúlio Vargas, Discurso de 7 de Agosto de
1940, em Goiânia (GO)).
Na Constituição de 1946, a exemplo das Constituições anteriores –
exceto a de 1937, o artigo da transferência ressurgia nas disposições
transitórias:
“A capital da União será transferida para o Planalto Central do país.
Parágrafo primeiro – Promulgado este ato, o Presidente da República,
dentro de sessenta dias, nomeará uma comissão de técnicos de
reconhecido valor para proceder aos estudos da localidade da nova
capital. Parágrafo segundo – O estudo previsto no parágrafo
antecedente será encaminhado ao congresso nacional, que deliberará a
respeito, em lei especial, e estabelecerá o prazo para o início da
delimitação da área a ser incorporada ao domínio da União. Parágrafo
terceiro – Findo os trabalhos demarcatórios, o Congresso Nacional
resolverá sobre a data da mudança da capital. Parágrafo quarto –
Efetuada a transferência, o atual Distrito Federal passará a constituir o
Estado da Guanabara.” (Constituição de 1946, Art. 4º, das Disposições
Transitórias).
A Constituição de 1946 era muito mais precisa que as demais. Indicava
prazo para que se formasse uma Comissão. Apontava côo o Congresso seria
responsável pela deliberação dos estudos, cuja função consistia em editar leis
complementares para definir a área, a data da transferência e a demarcação do
território do novo Distrito Federal. Caberia ao Congresso também definir de
maneira geral a futura formação do Estado que já teria um nome: Estado da
Guanabara.
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O Presidente da República à época, General Eurico Gaspar Dutra, assim
que foi promulgada a Constituição nomeou a Comissão de Estudos para a
Localização da Capital. A nova Comissão, chefiada pelo General Poli Coelho,
era integrada pro agrônomos, engenheiros, geógrafos, geólogos, higienistas,
médicos e militares, deu preferência ao local demarcado por Cruls, ampliando-
o e indicando uma área irregular de 77.250 quilômetros quadrados.
Nos desdobramentos dos estudos sobre a melhor localização da nova
capital, verificou-se a formação de duas correntes: a primeira uma fiel à
transferência da Capital para o Planalto Central, enquanto a outra defendia a
construção da nova cidade no Triângulo Mineiro.
Porém, ao escrever o relatório final à Presidência, o General Poli Coelho
indicou a área sugerida para a construção da Capital Federal no Planalto
Central e ampliou a área para o norte, partindo do quadrilátero antes
demarcado.
O relatório foi enviado pelo presidente Dutra ao Congresso Nacional,
através da mensagem nº 293, de 21 de agosto de 1948 e o assunto ficou em
discussão no Congresso por cinco anos. A lei nº1.803, de janeiro de 1953,
sancionada no governo de Getúlio Vargas, determinava que o poder executivo
realizasse estudos definitivos sobre a localização da nova capital, sendo que o
estudo de Poli Coelho já havia determinado o local onde deveria ser erguida a
nova cidade. A discussão no Congresso causara um retrocesso num ponto que
parecia já ter sido decidido: a localização da nova Capital. Prova disso foi o
decreto nº32.976, assinado em 8 de junho de 1953 pelo presidente Getúlio
Vargas, que novamente criava uma Comissão de Localização da Nova Capital.
O decreto instituía que a Comissão fosse constituída por um Presidente,
nomeado pelo chefe de governo; de um representante de cada Ministério, além
de representante de cada Ministério, além de representantes do Conselho de
Segurança Nacional, do Estado de Goiás, do IBGE, do DASP e da Fundação
Brasil Central. O Presidente nomeou o General Caiado de Castro, chefe da
Casa Militar da Presidência da República, para liderar a nova comissão.
O General Caiado de Castro contratou a empresa Cruzeiro do Sul para
aerofotografar e fazer o levantamento de todo o chamado “Retângulo do
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Congresso” (“Retângulo do Congresso” foi o nome dado à área pela Comissão
chefiada pelo General Poli Coelho. A área marcada antes, era de 14.400
quilômetros quadrados (“Quadrilátero de Cruls”). – perímetro de 52.000
quilômetros quadrados escolhidos pelo Congresso, sendo que em janeiro de
1954, toda a área já estava aerografada.
Completada a primeira fase, o presidente da comissão contratou a firma
norte-americana Donald J. Belcher and Associates Incorporated, para
interpretar as fotografias aéreas em melhores condições para a implantação da
Capital. Entretanto, antes da firma entregar o seu relatório final, o General
Caiado de Castro foi substituído pelo Marechal João Pessoa Cavalcanti de
Albuquerque, por ocasião do suicídio do presidente Getúlio Vargas. O Marechal
João Pessoa, nomeado por Café Filho para a presidência da Comissão de
Localização da Nova Capital, tomou ciência das conclusões preliminares da
empresa norte-americana, que indicou cinco pontos melhores de localização,
de 1000 quilômetros quadrados, dentro do chamado “Retângulo do
Congresso”, para a escolha definitiva do local ideal para a construção da
Capital. Em fins de fevereiro de 1955, o relatório final foi entregue, em 15 de
abril de 1955, a Comissão de Localização da Nova Capital escolheu
definitivamente, tendo por base o parecer da Donald J. Belcher, o local onde
Brasília seria construída.
Logo que decidiram sobre o local, o Marechal João Pessoa solicitou que
o Presidente em exercício assinasse um decreto, declarando de utilidade
pública, para fins de desapropriação, toda a área escolhida, a fim de evitar que,
em face da proximidade da construção da Capital, ali tivesse lugar uma corrida
imobiliária especulativa. Café Filho não baixou o decreto, ficando a tarefa para
o governador de Goiás, José Ludovico de Almeida, que assinou o decreto, dia
30 de abril de 1955.
No mesmo dia que a comissão aprovou a área onde seria construída a capital,
o Presidente da Comissão designou uma subcomissão que teria a
responsabilidade de demarcar os limites do futuro Distrito Federal. Essa
subcomissão era formada por engenheiros e por dois membros, do Serviço
Gráfico do Exército. (As comissões nomeadas para tratar da transferência da
18
capital federal, tinham sempre membros do exército nacional, podendo sugerir
que a interiorização da capital era uma questão de Segurança Nacional)l.
Paralelamente às providências da Comissão, o governo goiano criou
uma Comissão de Cooperação para a Mudança da Capital Federal, a qual
caberia, a posteriori, a responsabilidade pelas desapropriações na área do
futuro Distrito Federal.
Quando Juscelino Kubitschek assumiu a Presidência da República, a
antiga Comissão de Localização da Nova Capital já havia mudado de nome.
Através do decreto nº 38.281, de 9 de dezembro de 1955, passou a se chamar
Comissão de Planejamento da Construção e da Mudança da Capital, já que a
escolha da localização já havia sido feita. O local foi escolhido, os estudos
foram feitos, mas a ação da Comissão foi interrompida em maio de 1955.
Nessa época, é bem ressaltar, foi erguida uma cruz de madeira que seria
conhecida como “Cruzeiro” e marcou a última providência tomada, antes que o
novo presidente assumisse.
Coube ao presidente eleito, assumindo uma promessa de campanha
transferir a capital para Brasília. Incluiu a construção da cidade no Programa de
Metas do governo, como a “meta-síntese” e transferiu o patrocínio da iniciativa
para o governo de Goiás, estado mais estreitamente ligado à transferência.
Para Juscelino Kubitschek, a transferência da capital era imprescindível
justamente porque
“O Brasil, voltado até então para o mar, teria de assumir uma atitude
diametralmente inversa, isto é, voltar às costas para o oceano e
empenhar-se em tomar posse efetiva de seu território, de cuja
existência só tinha conhecimento através dos mapas.” (Oliveira, J.K.
“Porque construí Brasília. RJ, 1975. Ed. Bloch, pág. 47).
E adotou o nome Brasília como sugerido por José Bonifácio em 1823, para a
nova capital que se ergueria no Planalto Central do Brasil.( Bonifácio, José.
Anais da Assembléia Geral Constituinte e Legislativa do Império do Brasil,
13/08/1823).
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CAPÍTULO 2:
2.1 – O Rio de Janeiro como Distrito Federal: uma síntese
A tentativa de explicar como seria o Rio de Janeiro política e
juridicamente organizado às vésperas da transferência da capital requer um
retrocesso em sua história, isto é, de como a cidade-capital transformou-se de
Colônia à Capital da República. A tarefa é bastante complicada, por se tratar de
uma síntese, ou seja, a política do Rio de Janeiro sempre foi truncada, pois em
seu espaço atuavam várias forças que, por vezes, resultaram em mudanças da
nossa História como país. Fazer a síntese do passado desta cidade, que já foi
o centro da República, e seu processo de desmembramento do governo federal
para assumir uma identidade política própria é de vital importância para o
entendimento da articulação da transferência da Capital e a atuação de grupos
interessados nesse movimento.
A cidade do Rio de Janeiro, devido à sua localização e ao surto da
Mineração, tornou-se capital da colônia em 1763. O país ainda vivia seu tempo
de principal colônia do Reino e o fluxo de metais preciosos passava pela
cidade, antes de seguir para além-mar.
O país se tornou independente em 1822, promulgando sua primeira
constituição em 1824, sem que muito se alterasse na vida da agora Capital do
Reino.
Em 12 de agosto de 1834, D. Pedro I decretou o Ato Adicional à
Constituição de 1824, com várias resoluções, entre elas ressalta-se o artigo 1º:
“A autoridade da Assembléia Legislativa da Província em que estiver a
Corte não compreenderá a mesma Corte, nem o seu município.” ( Lei nº
16, de 12 de agosto de 1834, Art. 1º).
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Se a Assembléia Legislativa não compreenderá a mesma corte e nem o
seu município, então é um Município Neutro, ou no mínimo diferente das outras
províncias. Estava criado o Município Neutro que, ao contrário das outras
províncias, não tinha autonomia, como descreve mais adiante a mesma lei:
“A sua primeira reunião (da assembléia legislativa) far-se-á nas capitais
das províncias, e as seguintes nos lugares que forem designados por
atos legislativos provinciais; o lugar, porém, da primeira reunião da
assembléia legislativa da província em que estiver a corte será
designado pelo governo”. (Lei nº 16, de 12 de agosto de 1834, Art. 5º).
O Município Neutro do Brasil, único na América Latina foi criado
seguindo o modelo americano de Distrito, conforme já dizia Visconde de
Uruguai:
“...foi uma imitação da organização dos Estados Unidos, onde o distrito
que é assento do governo, não está sujeito à mesma organização que
os Estados, se bem que entre nós não sendo em igual grau de força as
razões que tiveram os Estados Unidos para esta exceção.” (Uruguai,
Visconde de – Estudos práticos sobre a administração das províncias
RJ, 1865. V.I,p.29).
Depois da promulgação do Ato Adicional e enquanto perdurou o regime
monárquico, coube à Assembléia Geral conferir todos os provimentos
legislativos ao Município Neutro, que também tinha sua Câmara Municipal,
mantendo relações de dependência com o Ministério do Império.
Após a Proclamação da República, em 15 de novembro de 1889, a
cidade do Rio de Janeiro passou de Município Neutro a Distrito Federal dos
Estados Unidos do Brasil, sendo que antes da promulgação da Constituição de
1891, o Governo Provisório designou procedimentos a respeito da organização
municipal da Capital. No decreto nº 1, artigo 10 das instruções do governo
provisório, ficou instituído que
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“território do Município Neutro fica provisoriamente sob a
administração imediata do governo provisório da República, e a
cidade do Rio de Janeiro, constituída, também provisoriamente,
sede do governo federal.” (Decreto nº 1, Art. 10, de 25 de
novembro de 1889).
Após essa resolução, o Governo Provisório dissolveu a Câmara Municipal e
criou o Conselho de Intendência Municipal com sete membros, nomeados pelo
executivo federal (Decreto nº 50 A, de 7 de dezembro de 1889).
O regime do Conselho de Intendência vigorou de 1889 a 1892, quando
foi promulgada a primei Lei Orgânica ou Distrito Federal (Lei nº 85, de 20 de
setembro de 1892).
Assim, o Governo Provisório manteve o Rio de Janeiro como sede do
governo até a promulgação da Constituição, ao mesmo tempo que extinguiu a
Câmara Municipal carioca
“como condição básica para constituir uma estrutura política na capital
ao mesmo tempo mais representativa e mais autônoma em relação ao
poder central.” (Freire, Américo – República, cidade e Capital: o poder
federal e as forças políticas do Rio de Janeiro no contexto da
implantação republicana”; Artigo em Moraes, Marieta. Rio de Janeiro:
uma cidade na história. Ed.FGV.2000 1/ªed.pág.17).Contudo, o mesmo
instrumento que criava uma estrutura mais livre para a política do
Distrito Federal, paradoxalmente, criava também um “Conselho de
Intendência Provisório”, responsável pela administração da cidade até a
Constituição. O Conselho era nomeado pelo Governo Provisório e tinha
como tal “o direito de restringir, ampliar, suprimir, quaisquer atribuições
confiadas ao Conselho de Intendência.” (Decreto 50 A, de 7 de
dezembro de 1889).
Portanto, como se pode notar, o início do controle sobre a cidade do Rio
de Janeiro foi no começo do governo republicano e o decreto, além de deixar
22
claro a existência de tal controle, tornou explícito que o novo governo queria
manter este controle.
Além disso, a cidade do Rio de Janeiro poderia significar um grande
perigo pra a República recém instalada. A cidade, conforme foi explicado no
capítulo anterior, era agitada politicamente, formada por uma sociedade
alfabetizada, que lia jornais e, sobretudo, assistiu a derrubada da Monarquia.
Nesse sentido, cabia pensar em restringir o poder político da capital e,
indo mais além, transferir a capital para o interior do país. O novo governo, sem
dúvida, sentia-se ameaçado em sua sede, caso contrário não teria tido o
cuidado de tomar providências acerca da sua Capital já nos primeiros dias do
novo governo.
Como visto anteriormente, um dos argumentos a favor da transferência da
Capital era a questão da segurança do governo, prova disto está no discurso
de um dos deputados da Assembléia Constituinte de 1890, pois o novo
governo se sentia ameaçado em sua própria sede e a solução seria mudar a
sede para o interior do país, longe das “perturbações da massa carioca.” (Anais
da Assembléia Nacional Constituinte, sessão de 13 de dezembro de 1890, pág.
352).
Assim, a Constituição de 1891, Art. 2º das disposições preliminares, dizia que:
“Cada uma das antigas províncias formará um Estado, e o antigo
Município Neutro constituirá o Districto Federal, continuando a ser
capital da União, enquanto não se der execução ao disposto no artigo
seguinte; Art. 3º- “Fica pertencendo à União, no Planalto Central da
República, uma zona de 14.400 quilômetros quadrados, que será
oportunamente demarcada para nella estabelecer-se a futura capital
federal.” E Parágrafo Único: affectuada a mudança da capital, o actual
Districto Federal passará a constituir um Estado.” (Constituição de 1891,
Título I, “Da organização Federal”, Art. 2º e 3º).
23
Indo ao artigo 34, da mesma Carta Magna, tem-se os poderes do
Congresso Nacional para “legislar sobre a organização municipal do Districto
Federal, bem como sobre a polícia, o ensino superior e os demais serviços que
na capital forem reservados para o governo da União.” (Constituição de 1891,
Art. 34)
No art. 67, em seu parágrafo único, lê-se “Salvo as restrições
especificadas na Constituição e nas leis federais, o Districto Federal é
administrado pelas autoridades Municipais” e que “as despesas de caráter
local, na capital da República, incubem exclusivamente à autoridade
municipal.” (Constituição de 1891, Art. 67). Como se pode notar, a liberdade
era vigiada, não concedendo autonomia total e local, muito embora a
autonomia política do Distrito Federal fora também defendida na constituinte de
1890.
Em 1890, iniciadas as discussões para incluir a mudança na Capital na
Constituição, o constituinte Tomás Delfino se posicionou a favor da
transferência, com o objetivo de transformar a Capital em um novo Estado.
Essa era a proposta defendida pelos parlamentares cariocas. A bancada
fluminense reagiu, argumentando que o Território do Município Neutro havia
sido desmembrado do resto do Estado do Rio de Janeiro unicamente para
representar o papel de Capital do Império do Brasil, uma vez que a República
havia sido Proclamada, “(...) cessada essa função deveria voltar ao que era...”
(Discurso de Érico Coelho, Anais da Assembléia Nacional Constituinte, seção
de 13/08/1890). A cidade do Rio de Janeiro seria incapaz de cumprir o papel de
Capital da República porque “não tem um verdadeiro caráter nacional e parece
mais uma colônia e que predomina o elemento estrangeiro. Não tem feição
alguma que lhe dê um tipo de nacionalidade distinta (Discurso de Érico
Coelho.Op.Cit.).
Aqueles que se opuseram à autonomia se concentravam na bancada do
Estado do Rio, liderados pelo deputado Érico Coelho e França Carvalho. Esta
corrente se empenhava em fazer o Rio de Janeiro retornar ao território
fluminense, quando acontecesse a mudança da Capital. Como justificativa,
argumentavam:
24
“Senhores, o Distrito Federal fazia parte da ex-província do Rio de
Janeiro, apenas divergia pela administração municipal, um município sui
generis, chamado por isso mesmo Neutro; Porém, havia unidade de
Território havia a mesma origem da população, e sobretudo, unidade
política e judiciária.” (Discurso de Érico Coelho.Op.Cit.).
Com isso, a Constituição de 1891, definiu apenas algumas diretrizes
gerais. A Capital se transformou em Distrito Federal, como já foi dito, com
representação na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, similar a
qualquer outro Estado. Determinou também que sua “legislação sobre sua
organização política (...) seria de competência exclusiva do Congresso,
enquanto sua administração ficaria a cargo das autoridades municipais”. Este
dispositivo constitucional deixava em aberto a necessidade de uma legislação
complementar que definisse com mais clareza a organização do Distrito
Federal. (A primeira Lei Orgânica do Distrito Federal foi promulgada em 20 de
setembro de 1892).
Após a definição dos princípios gerais que passariam a reger a capital
republicana, foi criada no Congresso Nacional uma comissão encarregada de
estudar a e formular um projeto de lei sobre a melhor organização municipal do
Distrito Federal. Foram nomeados pelo presidente da Câmara sete membro,
todos pertencentes à Capital Federal. O projeto da bancada carioca foi
apresentado pelo relator Tomas Delfino, na sessão do dia 8 de agosto de 1891,
sendo aprovado pela Câmara dos Deputados e, em contrapartida, foi impedido
no Senado. Um dos seus principais opositores, o senador Quintino Bocaiúva,
julgava errônea a idéia de dar autonomia ao Distrito Federal porque:
“ correria o risco de colocar o próprio poder federal, o próprio governo
da União, na contingência de um atrito contínuo e permanente, com
autoridade até certo ponto subtraída por sua independência à sua ação
direta, e esse poder ficaria quase constituído novas condições de um
intruso ou de um hóspede importuno tolerado, que seria forçado a ver
diminuído a sua autoridade por uma jurisdição autônoma e
25
independente, criada também ao amparo do princípio eletivo, na
democracia da constituição dos poderes, constituindo-se assim
também, por seu turno, um poder em face de outro poder.” (Anais do
Senado, 20 de outubro de 1891).
O discurso do senador seria um a mais a favor da política
intervencionista que o governo federal impunha ao Rio de Janeiro, controlando
sua ação política. O Governo Federal era muito mais que “um intruso
ameaçado em sua sede”, seria um elemento controlador do campo político da
mais desenvolvida das cidades do país. Esse assunto será tratado mais
detalhadamente adiante, quando for abordada a questão da ação do governo
federal sobre o Distrito Federal.
Varias emendas foram apresentadas ao projeto vindo da Câmara Federal,
sendo que na sessão do dia 30 de dezembro de 1891, elas foram aprovadas
pelo Congresso. O projeto de lei se tornou lei, depois de tramitar novamente na
Câmara e a emenda do artigo que falava sobre a apreciação do veto do
prefeito pelo Senado e do chefe do executivo local, sendo nomeado pelo
Presidente da República, foi mantida. A lei foi a primeira lei orgânica do Distrito
Federal (Lei nº 85, de 20 de setembro de 1892) e o Senado Federal passava a
ser o grande tutor da cidade, que teria sua Câmara Municipal eleita que não
faria a apreciação do veto do prefeito. De certo, não poderia maior interferência
no campo político da cidade.
Mais adiante, será avaliado o poder de barganha que o Governo Federal
adquiriu sobre as bases cariocas, devido a estes dois dispositivos
estabelecidos pela Lei Orgânica de 1892 e os jogos políticos da União,
favoreciam o clientelismo na Capital Federal, ao mesmo que se travavam
embates políticos entre autonomistas e intervencionistas.
No início do governo Rodrigues Alves, com um maior apoio do
Congresso, o presidente, o presidente eleito aprofundou a intervenção na
Capital. Em 29 de dezembro de 1902, foi aprovada a lei nº 939, que alterou a
organização do Distrito Federal. Este, para efeito de eleição, passaria a ter
somente um distrito, extinguindo o voto distrital, com o prefeito e seu substituto
nomeados pelo Presidente da República, sem o aval do Senado. O Conselho
26
Municipal sofreu uma redução de suas atribuições político-administrativas,
tornando o jogo político local enfraquecido e exercido mais amplamente pelo
Executivo Federal. É certo dizer que foi a lei nº939 que criou a figura do
Prefeito / Interventor Federal. No Art. 1º da Lei nº 939, lê-se que
“O Conselho Municipal do Distrito Federal compor-se-há de 10
intendentes, um dos quais o presidirá, por eleição de seus pares.
Parágrafo único. A Capital Federal constituirá um só districto eleitoral.”
E no Art. 3º, parágrafo único, lê-se aquilo que representa a obrigação do
prefeito: “Reunido o Conselho, o prefeito enviar-lhe-há uma mensagem,
informando-os de todos os actos de sua gestão no período provisório
em que tiver administrado o districto.” (Lei nº 939, de 29 de dezembro
de 1902, Art. 1º e Art. 3º).
Após a Revolução de 1930, onde o Rio de Janeiro serviu de cenário
para o golpe, o novo governo necessitaria de promulgar uma nova Constituição
para o Brasil. A Constituição de 1934 foi a mais liberal para o Distrito Federal,
como se constata nos trechos abaixo, retirados da própria Constituição:
Art. 4º, parágrafo único – “O acutal Districto Federal será administrado
por um prefeito, cabendo as funcções legislativas a uma Câmara
Municipal, ambos eleitos por suffragio directo, sem prejuízo da
representação profissional na forma que fôr estabelecida pelo poder
legislativo federal na lê orgânica (...) A primeira eleição para prefeito
será feita pela Câmara Municipal em escrutínio secreto.” (Constituição
de 16 de agosto de 1934, Art. 4º, parágrafo único).
O prefeito foi realmente eleito e a cidade votou no médico Pedro
Ernesto, mas em 1937 era decretado o Estado-Novo, e uma das primeiras
ações do governo de Getúlio Vargas foi decretar a intervenção no Distrito
Federal para impossibilitar que a Capital Federal se articulasse politicamente
para derrubar o governo, como havia feito na Revolução de 1930. A
Constituição de 1937, a Polaca, simplesmente aboliu a pouca autonomia que o
Distrito Federal havia adquirido. O disposto no Art. 7º deixa claro que
27
“enquanto sede do governo da República” seria o Distrito Federal “administrado
pela União”. O art. 30 acrescentou que o “Distrito Federal será administrado por
um prefeito de nomeação do Presidente da República, com a aprovação do
Conselho Federal e demissível ad nutum” – a qualquer momento, cabendo a
este mesmo Conselho Federal as funções deliberativas referentes ao Distrito.
Assim, não existia uma Câmara Municipal nem com funções deliberativas,
muito menos com funções legislativas, sendo certo afirmar que não havia
eleições municipais, com base no art.26, embora os Prefeitos municipais
fossem todos nomeados pelos Governadores dos Estados (art.28). A regra era
a eleição indireta e o corpo eleitoral do país era composto, em cada município,
por vereadores das Câmaras Municipais em por mais de 10 “eleitos por
sufrágio direto no mesmo ato da eleição da Câmara Municipal”, constituindo
cada Estado uma circunscrição eleitoral (Art.47). O Distrito Federal ao tinha
Câmara de Vereadores, tampouco podia eleger representantes no Colégio
Eleitoral do Presidente da República por não possuir Câmara Municipal
(art.82). Assim, o Rio de Janeiro não elegeria representantes no parlamento e
nem concorreria à eleição para a presidência da República. Sendo assim,
“...como o Distrito de Columbia, o nosso atual Distrito Federal não elege
representantes ao parlamento, nem concorre para eleição do Presidente
da República”. (Castro, Araújo. “A Constituição de 1937.Estudos de
Direito Constitucional. RJ, 1951, pág. 123).
Em 1945, após o fim do Estado-Novo, o novo governo democrático
necessitou substituir novamente a Constituição por uma outra mais condizente
como o momento político do país. O ano de 1945, foi marcado por importantes
transformações políticas, pois após um longo período de ditadura, foram
realizadas eleições diretas para Presidente da República, para deputados e
senadores. Diversos partidos políticos foram criados, entre eles, o Partido
Democrático, o Partido Trabalhista Brasileiro conquistou a legalidade, podendo
então participar de todo o processo eleitoral.
28
O vencedor para Presidente da República foi Eurico Gaspar Dutra, da
coligação PSD-PTB e a aliança entre estes dois partidos também foi
vencedora na maioria das eleições parlamentares.
É importante notar que mais da metade dos parlamentares constituintes
eram do PSD, à exceção da bancada carioca, onde o partido era minoria. Na
bancada da capital, a maioria era do Partido Comunista, valendo ressaltar que
o senador eleito com a maior votação do país foi o Sr. Carlos Prestes. A
representação dos partidos está discriminada nas tabelas abaixo:
REPRESENTAÇÃO DOS PARTIDOS DA BANCADA DO DISTRITO FEDERAL
NA ASSEMBLÉIA CONSTITUINTE DE 1946:
(Ferreira, Marieta de M.”Os apaziguados anseios da Terra Carioca – lutas
autonomistas no processo de redemocratização pós-45”. Artigo em Ferreira, Marieta
de Moraes, Rio de Janeiro; uma cidade na história, Rio de Janeiro, Ed. FGV, 2000,
p.62).
União Democrática Nacional 4 representantes
Partido Social Democrático 2 representantes
Partido Trabalhista Brasileiro 7 representantes
Partido Comunista Brasileiro 4 representantes
Total: 17 parlamentares
REPRESENTAÇÃO DOS PARTIDOS NA CONSTITUINTE DE 1946:
(Ferreira, Marieta de M. Op. Cit.)
Partido Comunista Brasileiro 15
Partido Trabalhista Brasileiro 24
União Democrática Nacional 87
Partido Social Democrático 177
OUTROS 17
TOTAL: 320
29
Logo que iniciaram os trabalhos da Constituinte,a primeira proposta que
circulou sobre a autonomia política foi feita pelo Ministro da Justiça, Sampaio
Dória. A subcomissão de organização federal (da Comissão da Constituição)
apresentou parecer contrário à autonomia do Distrito Federal. O relator da
subcomissão, o constituinte Ataliba Nogueira (PSD-SP), indicou duas razões
para a posição contrária:
“Quisemos fugir a todas as hipóteses remotamente realizáveis, senão
impossíveis, de se transferir a Capital da República para o coração do
Brasil em segundo lugar, porque considerava impossível que o
Presidente do País fosse hóspede na Capital Federal. (Anais da
Assembléia Nacional Constituinte 1946. V.5, p.2229).
Após o parecer, foi incorporada ao anteprojeto da Constituição o Artigo
que estabelecia que o projeto do Distrito Federal seria indicado pelo Presidente
da República. Parecia que a situação havia retornado à Constituição de 1891,
nem tão castradora como a de 1937, mas nem tão democrática como a de
1934.
Era como um grande retrocesso, considerando que a Constituição de
1946 seria a primeira Constituição realmente democrática do Brasil. A bancada
dos cariocas se uniu em prol da autonomia local e o deputado José Romero
(partido Social Democrático-Distrito Federal) foi o representante escolhido pra
expressar a insatisfação dos cariocas destacando que a cidade possuía “uma
grande cultura política e super capacitada de auto dirigir-se além de prover por
si próprio todas as necessidades de sua complexa administração”. (Anais da
Assembléia Nacional Constituinte. 1946, V.19, p.398).
Apesar da coesão da Bancada carioca em defesa do direito de eleição
do Prefeito do Distrito Federal e o direito de veto da Câmara Municipal, as
resistências encontradas na esfera nacional foram de grande dimensões,
neutralizando os esforços dos representantes cariocas. O Partido Comunista foi
30
o único partido que nacionalmente se posicionou a favor da autonomia do
Distrito Federal. No dia 9 de setembro, foi colocada em votação a emenda nº
2.819. “O Distrito Federal será administrado por um prefeito e uma Câmara,
eleitos pelo povo, cabendo a última poderes legislativos.” (Anais da Assembléia
Nacional Constituinte, 1946 v,24,p.414).
Porém, a emenda chegou à Assembléia e foi rejeitada pelos
constituintes.
Segundo Marieta de Moraes Ferreira, em seu artigo sobre o processo de
redemocratização brasileira pós-45 (Ferreira,M. “Os apaziguados anseios da
letra carioca” – Artigo em Ferreira, Marieta de Rio de Janeiro:uma cidade na
história. RJ Ed. FGV2000, p.59).na Constituinte de 1946, ficaram
“evidenciadas as práticas neutralizadoras implementadas pelo Governo
Federal, através do partido majoritário, o PSD, e de membros da elite
política de outros estados, que tudo fizeram para garantir o direito de
indicação do prefeito pelo Presidente da República.” (–Ferreira, Marieta.
Op.Cit.,p.66).
Sendo o chefe do executivo do PSD e os membros das bancadas
parlamentares, em sua maioria, também do PSD, ficou fácil manter a
intervenção na Capital Federal.
Com a discussão da autonomia, reacenderam as discussões sobre a
transferência, afinal, um assunto estava intimamente ligado ao outro. As
reinvidicações cariocas para obter autonomia política passavam pela
transferência, já que transferindo a sede, automaticamente se formaria um
novo estado. Este fato, pode ter estimulado o surgimento de uma solução
conciliadora: além de conceder a tão sonhada autonomia, a transferência da
Capital para o interior afastaria o Governo Federal da ameaça de revoltas
populares e de uma tentativa de golpe de Estado, haja vista que o eleitorado
carioca era um dos maiores do país, um dos mais alfabetizados e politizados e
a imprensa carioca atuava de maneira eficaz na formação da opinião, já que
alguns políticos do governo e da oposição eram ligados a jornais de circulação
nacional.
31
Para finalizar o comentário à Constituição de 1946, acerca do Distrito
Federal, vale citar os artigos 25 e 26:
“Art.25 – A organização administrativa e a judiciária do Distrito Federal e
dos territórios regular-se-ão por lei federal...
Art.26 – O Distrito Federal será administrado por um prefeito, de
nomeação do Presidente da República, e terá Câmara eleita pelo povo,
com funções legislativas.
§ 1º - Far-se-á a nomeação depois do Senado Federal houver dado o
assentimento ao nome proposto pelo Presidente da República.
§ 2º - O prefeito será demissível ad nutum.” (Constituição de 1946, Art.
25 e 26).
Segundo trecho acima da Constituição de 1946, haveria a necessidade
de se editar uma Segunda Lei Orgânica que regulamentasse o Distrito Federal,
pois ainda que a mesma Constituição já estabelecesse a nomeação do
prefeito, restava a questão do veto do prefeito. Os autonomistas tentariam
remover este dispositivo, já existente desde 1892.
Após a promulgação da Constituição de 1946, tanto a Câmara de
Deputados como o Senado passaram a discutir diversos projetos sobre a Lei
Orgânica. A lei deveria ser elaborada pelo Congresso Nacional.
A composição do Senado foi fundamental nesse momento, Dos
sessenta e dois senadores, três eram da bancada carioca. O PSD, além de
partido do governo eram maioria no Senado, conforme mostra a composição
da casa em 1946:
32
COMPOSIÇÃO DO SENADO, EM 1946:(Ferreira, M.Op.Cit,p.70)
Partido Social Democrático 33 representantes
Partido Trabalhista Brasileiro 3 representantes
União Democrática Nacional 19 representantes
Partido Comunista Brasileiro 1 representante
Total: 62 membros
Bancada Carioca no Senado:(Ferreira, M.Op.Cit.p.78)
Luiz Carlos Prestes PCB
Hamilton Nogueira UND
Mário de Andrade Ramos PSD/PDC
Com essa composição do Senado, junto à maioria do PSD na Câmara
dos Deputados, não foi difícil aprovar uma lei orgânica que veio a favorecer o
caráter tutelar do Senado sobre a cidade do Rio de Janeiro.
Aqui cabe ressaltar um momento particular das eleições de 1946, qual
seja, o resultado expressivo do Partido Comunista na cidade do Rio de Janeiro,
pois tal fato poderia explicar uma preocupação maior do Governo Federal com
a Capital e o seu grau de autonomia política.
Naquele ano explodia a “Guerra Fria” entre os Estados Unidos da
América do Norte e a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, sendo certo
notar que a tradicional aliança do governo brasileiro com a política internacional
norte-americana teve significativa expressão neste excesso de rigor com a
autonomia política da cidade do Rio de Janeiro, O governo Dutra conspirou
contra o PCB, querendo coloca-lo na ilegalidade, e conseguiu cassar o registro
do partido em 7 de maio de 1947. Com a cassação, as sedes do partido foram
fechadas e os seus representantes eleitos perderam seus mandatos (Dos 50
33
vereadores eleitos para a Câmara em 1946, 18 eram do Partido Comunista
Brasileiro).
Portanto, sendo o PCB a voz a favor da autonomia no âmbito nacional,
essa voz se calou quando o governo pôs o partido na ilegalidade isso
representou um duro golpe para a luta autonomista na composição da Lei
Orgânica.
Quanto à Câmara dos Vereadores, que era o principal órgão interessado
na mobilização, houve uma tentativa a favor da autonomia. Os vereadores, em
um esforço conjunto e sem distinção de partidos, tentaram pressionar o
Senado nas votações da lei orgânica e combatiam na imprensa a intervenção
“Câmara e Senados Federais pretendem fazer a Câmara Municipal (...)
um órgão apenas parcialmente deliberante, anódino, inócuo, para que
continue no Distrito, como na União, a ditadura que já devia estar morta
e enterrada.” (Correio da Manhã, de 21/03/1947) “Não devendo o
Partido Comunista. Defendo a democracia (...) Enquanto estiver
fechado o Partido Comunista não escreverei nenhuma palavra contra
ele nem contra qualquer de seus membros.”( “Correio da Manhã” – de
08/05/1947).
Contudo, apesar de todo o esforço do governo local, o projeto da Lei
Orgânica que determinava a apreciação do veto do prefeito do Distrito Federal
como de responsabilidade do Senado foi aprovado. Ainda que na Câmara dos
Deputados houvesse emendas a esse dispositivo, embora a Comissão de
Constituição e Justiça da Câmara e do Senado tenha considerado o artigo
inconstitucional, o item foi incluído, sem maiores justificativas.
Somente no governo seguinte as lutas autonomistas tomaram novas
direções. O primeiro passo neste sentido foi a emenda à Constituição nº 2, de 3
de julho de 1956:
34
“Art. 1º - O atual Distrito Federal será administrado por um prefeito,
cabendo as funções legislativas a uma Câmara de Vereadores, eleitos
estes e aquele, por sufrágio direto, simultaneamente, pelo período de
quatro anos.
Parágrafo Único – A primeira eleição para prefeito realizar-se quando se
efetuar a de Presidente da República para o próximo período
governamental” (Emenda Constitucional nº 2, de 3 de julho de 1956, Art.
1º.)
Na realidade, a emenda somente previa um fato que aconteceria
inevitavelmente com a transferência da Capital e o nascimento do Estado da
Guanabara: a autonomia política da cidade do Rio de Janeiro.
35
2.2 – O Mapa político do Rio de Janeiro – de 1956 à 1960
Nessa seção, será esboçado o mapa político da cidade do Rio de
Janeiro à época da mudança da Capital. É importante mapear o campo político
da cidade para se entender o jogo político que estava implícito na transferência
desta mesma Capital. Para tanto, torna-se essencial identificar os principais
partidos políticos a fim de entender as forças que atuaram a favor e contra a
proposta de interiorização da Capital.
Conforme dito na seção anterior, a historia do Rio de Janeiro como sede
do governo sofreu muitas modificações e seria natural que o campo político da
cidade fosse bastante específico e singular, dado as forças que atuavam dentro
do mesmo espaço. As redes de poder na capital se cruzavam e não havia
muita separação entre o que era o poder local e o que era o poder nacional.
Por duzentos anos a cidade teve essa peculiaridade e, sendo assim, falar de
política do Rio de Janeiro é falar de exercício do poder político bastante
concentrado. Esta informação, portanto, torna-se de vital importância para
fundamentar as próximas seções. Para isso, nada melhor do que falar de
partidos políticos e correntes dentro desse espaço de conflito de interesses,
sendo que o ponto de partida são as eleições de 1954 e 1958.
Após 1945, surgiram vários partidos políticos aproveitando o momento
de democracia que o país atravessava. Tais partidos seriam os responsáveis
pelo exercício do poder a partir daquele momento em diante. Nas primeiras
eleições presidenciais, após o longo período de ditatura, a política do Rio de
Janeiro começou a ser reconstruída, já que a cidade perdeu toda a sua
representatividade política no governo de Vargas (Ver seção 2.1, desta
monografia) Começava a ser desenhada a “cara” do novo Brasil e o Rio de
Janeiro foi o local onde se iniciou este processo de redemocratização.
Surgiram partidos como o Partido Social Democrático, a União
Democrática Nacional e o Partido Trabalhista Brasileiro, que balizaram todo o
movimento pós-45.
36
O Partido Social Democrático, tão getulista, quanto conservador, não só
elegeu dois presidentes, como se tornou o partido oficial do governo.
Situacionista, defendia a intervenção do Estado na economia e tinha grande
apelo ao capital, sendo estruturado por fortes raízes nacionais. Pregava o
chamado movimento da “modernização conservadora”.
O Partido Trabalhista Brasileiro, ou PTB, também getulista, defendia
igualmente a intervenção do Estado na economia, sendo que a diferença com
relação ao PSD estava na formação do partido: o PTB, um partido popular, era
o partido das classes operárias, principalmente das indústrias. Já dizia Getúlio
Vargas sobre os dois partidos que “ganhava a eleição com o PTB e governava
o país com o PSD.”
Apesar das diferenças, as alianças entre estes dois partidos se
tornariam comuns e os desentendimentos também. Era muito difícil conciliar
interesses de diversas linhas, onde um partido usava o outro para se perpetuar
no poder. No caso destes dois partidos, quem ganhava a eleição era o partido
das massas (PTB) e quem exercia o poder era o PSD. Os petebistas, às vezes,
não aceitavam muito essa regra, conforme será exemplificado na próxima
seção, pois como disse Celina Vargas, em um depoimento, “o PTB era de
esquerda...”, “O PTB era o braço do trabalho...o PSD era o braço do capital.
(Depoimento de Celina Vargas, extraído do livro “Histórias do Poder”, SP,
ed.34, ano de 2000. V.3, p.38 organizadores: Alberto Dines, Florestan
Fernandes JR. E Nelma Salomão).
Um outro partido muito importante nesse período foi a UDN. A União
Democrática Nacional foi fundado em 1945, por um grupo de bacharéis da
oligarquia da cidade do Rio de Janeiro, também com fortes raízes nacionais,
conservadores e com grande apelo para o capital, não defendiam a intervenção
do Estado na economia e eram a favor da abertura do país ao capital
estrangeiro. Mas a grande diferença para o PTB e para o PSD estava
localizada na figura de Getúlio Vargas, pois os udenistas tinham verdadeiro
horror ao retorno do Estado-Novo.
A UND era a grande oposição ao governo pós-45, representando os
partidos liberais, a partir dos liberais. Tinha como membros grandes intelectuais
37
da época, como Afonso Arinos de Mello Franco e Carlos Lacerda. Alguns
nomes influentes do país em nossos dias foram membros da UDN, como
Antônio Carlos Magalhães e José Sarney. Era um partido forte, altamente
articulador e muito barulhento: suas campanhas eram feitas com grandes e
inflamados discursos, com carreatas nas ruas do Rio. Como disse Sandra
Cavalcanti, que foi vereadora pela UDN em 1954 e constituinte em 1961, na
Guanabara:
“a UDN era uma União. E era uma União Democrática. Quando a UDN
foi fundada...ela acolheu vários das mais contraditórias correntes
políticas do país...o objetivo era liberar o país daquela ditadura e
daquele sistema fascista que estava montado no Brasil”. (Depoimento
de Sandra Cavalcanti, op. Cit.,vol2,p.39).
Mas até a UDN tinha divisões do mesmo partido. Figura como Carlos
Lacerda, José Sarney e outros, faziam parte da bancada mais radical,
enquanto Magalhães Pinto e Emival Caiado eram mais moderados.
Este fato gerou muitas desavenças, que também serão citadas na
próxima seção, e foi responsável pelo enfraquecimento da oposição na
resistência à transferência da capital.
Existiam ainda os partidos menores que exerciam influência e faziam
alianças com partidos maiores para se elegerem (Era o caso do PDC, PTN,
PST, PRT, PL, PSP, PRP e o PR. O PCB continuava na ilegalidade desde
1947, mas exercia influência nos bastidores do poder, principalmente no Rio de
Janeiro. Os nomes dos partidos, por extenso estão presentes nos anexos 2 e
4, deste mesmo trabalho) porém, o enfoque deste capítulo será para os
partidos maiores, que exerceram influência direta sobre a política do Distrito
Federal e a transferência da Capital.
Nas eleições de 1954, ganhou Juscelino Kubitschek, candidato da
aliança PTB-PSD. Na Câmara dos Deputados eleita em 1954, 114 membros
eleitos eram do PSD, 74 da UDN e 56 do PTB, sendo o total da casa de 326
membros. Deste número, correspondia à bancada do Rio de Janeiro 6
38
membros da UDN, 6 membros do PTB, 2 membros do PSD, dois membros do
PSP e um membro do PRT (ANEXO 1).
Cabe ressaltar que o PSD não era muito popular na antiga Capital, fato
que pode ser comprovado pelo número de vereadores eleitos desse partido na
Câmara dos Vereadores e o favoritismo na capital da UDN e do PTB (ANEXO
2). Aliás, cabe também o comentário de que, analisando os partidos políticos
eleitos para exercer o legislativo local em 1954, pode ser verificado que este
mesmo poder local era bastante pulverizado e heterogêneo , o que dificultava a
ação e a mobilização política, principalmente junto ao governo federal. Não que
a Câmara dos Vereadores, por ser mais fragmentada, não tivesse influência
junto ao poder federal. A Lei Orgânica do Distrito Federal favorecia um maior
entrosamento entre o legislativo municipal e o Senado, que detinha o poder
sobre o veto do prefeito do Distrito Federal. Este assunto será abordado mais
tarde, na seção 2.4, deste mesmo capítulo.
Das 50 vagas disponíveis na eleição de 1954, 9 eram da UDN, 9 do
PTB, 7 do PSD, 6 do PSP, 5 vagas para o PR e as demais vagas para partidos
menores.
As eleições de 1958 foram marcadas por choque entre o PTB e a UDN.
O PTB fazia a política mais ligada aos sindicatos, mas
“O PTB que deveria ser um partido urbano, classista, um partido as
massas, na verdade, estava totalmente ligado ao corporativismo estatal,
totalmente ligado ao Estado, porque o Estado dominava todos os
sindicatos e, portanto, passava a dominar também o partido
trabalhista.”( Lúcia Avelar, cientista política, em depoimento ao livro
“Histórias do Poder”. Op.Cit.V3, p.55).
A UDN não concordava com a postura popular do partido, contrária ao
que ele efetivamente exercia, a começar pela aliança com um partido de elite,
como o PSD, que sozinho não elegeria dois presidentes da República. Dos 326
deputados eleitos em 1958, 70 eram da UDN, 66 membros do PTB, 115
membros do PSD e 75 membros de outros partidos (ANEXO 3). Consolidou-se,
assim, a maioria do governo na Câmara dos Deputados e, portanto, mais fácil
39
de implementar e aprovar os projetos do “Programa de Metas” do governo de
Juscelino Kubitschek, incluindo a Meta-Síntese, que era Brasília. Destes
deputados eleitos, a bancada da capital tinha 17 vagas, 6 da UDN, 5 do PTB, 4
do PSP e 2 de partidos menores. Novamente se pode notar que o PSD não
conseguiu eleger ninguém pela bancada carioca.
As eleições para senador do Rio de Janeiro em 1958 merecem um
especial destaque. Havia uma única vaga disponível para a bancada carioca e
a UDN não tinha representante algum dentro do Senado. Carlos Lacerda,
aproveitando-se deste momento, lançou, juntamente com outros elementos do
partido, a candidatura de Afonso Arinos de Mello Franco. A disputa se tornou
acirrada, pois Afonso Arinos concorreu com Metro Vargas, do PTB e a UDN
jamais poderia permitir que o filho de Getúlio Vargas ganhasse a única vaga do
Rio de Janeiro dentro do Senado Federal. Graças a eficaz campanha do
partido dentro da capital, o candidato da UDN venceu. Quanto à Câmara dos
Vereadores do Distrito Federal no pleito de 1958, a composição de suas 50
vagas ficou assim: 8 vagas para a UDN, 7 para o PTB, 7 para o PSD, 5 para o
PSP e 23 vagas divididas para os partidos menores (ANEXO 4). Confirmou-se
então o favoritismo da oposição na capital, ainda que com grande
fragmentação na formação dos partidos na Câmara Municipal.
A formação do Congresso Nacional e o poder local em 1958 será o
ponto de partida para o entendimento das forças políticas que atuaram e, mais
especificamente, como o Executivo Federal atuou para a consolidação da
transferência da capital dentro de um mesmo governo. Cabe salientar que o
presidente era do PSD e o vice-presidente era do PTB, frise-se os mesmos
partidos que tinham a maioria no Congresso Nacional. Então, era fácil aprovar
leis, e ainda que a oposição fosse muito eficaz, mesmo assim seria fraca frente
à força política que gozava o Governo Federal naquele momento.
40
2.3 – As tentativas para impedir a transferência da Capital Federal –
Conflitos dentro do poder federal
Ao assumir o governo,o presidente eleito iniciou o movimento para
concretizar a transferência da Capital Federal ainda em seu mandato. Juscelino
Kubitscheck encaminhou à Câmara dos Deputados o projeto de lei que previa
as providência para a construção da nova capital e criava, no mesmo
dispositivo, a Companhia Urbanizadora da Nova Capital (NOVACAP), que teria
a tarefa de atuar diretamente nas obras de Brasília.
Quando o projeto passou pela análise na Câmara dos Deputados, em
fevereiro de 1956, um líder udenista, que participava da Comissão de Justiça,
pediu vistas ao processo e o engavetou no mês de abril. O governo, verificando
a demora na tramitação do projeto de lei, buscou apoio na bancada de Goiás,
que era o estado mais interessado na rápida resolução do impasse. O
deputado udenista Emival Caiado foi o encarregado de recupera o projeto para
prosseguimento e votação (O governo tinha a maioria no Congresso Nacional,
mas contava com elementos da bancada de Goiás). Quando, finalmente, o
projeto deixou a Comissão de Justiça e foi encaminhado ao plenário houve
votação favorável e conseqüente aprovação pela Câmara dos Deputados.
Seguiu para o Senado, onde o PSD era maioria. A lei nº 2.874 (ANEXO 5),
sancionada em 19 de setembro de 1956, significou o primeiro passo para a
mudança da capital, concretamente. Contudo, não estabelecia a data da
transferência, o que caberia ao Congresso Nacional deliberar posteriormente.
Dos membros da oposição, uns votam contra, outros a favor, justamente por ao
acreditarem que o presidente conseguiria concluir a construção da capital
dentro do seu mandato. Na verdade, confiavam na hipótese de que o governo,
tentando concluí-la em tempo hábil, jamais conseguiria, e, conseqüentemente,
aniquilaria-se perante a opinião pública.
Em junho de 1956, enquanto o projeto de lei ainda tramitava pelo
Congresso, o governo se antecipava, iniciando o edital para a realização do
concurso para o plano-piloto da nova cidade. O edital foi publicado, no Diário
41
Oficial da União, quase no mesmo dia da sanção da lei 2.874, em 30 de
setembro de 1956.
Após estas medidas, a cidade foi se tornando realidade. Tanto que em
um ano, o Congresso precisou marcar a data da transferência da capital. No
dia 1º de outubro de 1957, a lei nº 3.273 fixava a data da transferência para o
dia 21 de abril de 1960 (ANEXO 6).
A oposição, que até então não acreditava que a mudança ocorreria
concretamente, pôs-se em estado de alerta. Nos jornais cariocas de oposição,
que apelidaram a futura cidade de “ali vai ser”, começaram a surgir com mais
freqüência a questão dos gastos com a acelerada construção. Para que a
cidade fosse construída do nada, foi necessário criar toda uma infra-estrutura
no local, bem como estradas, que ligassem Brasília a todas as partes do país,
promovendo a interiorização ou um “novo surto bandeirante” (J.K.Op.Cit.,p.9).
Os deputados udenistas, principalmente da facção mais radical, tentaram
embargar, pela segunda vez, a ação do governo justamente no que se referia à
questão dos custos na construção da cidade. Argumentavam que os gastos
eram elevados em sem propósito. O poder de influência da UDN foi, no
entanto, limitado. Além do governo ter a maioria na Câmara dos Deputados
junto à opinião pública, o presidente procurou elaborar um projeto de lei para a
capital – que resultaria na lei 2.874, que “uma vez aprovada fosse o diploma
legal completo, capaz de cobrir todas as fases de execução da transferência
sem que fosse obrigado a recorrer, de novo, ao Congresso” (J.K.Op.Cit.,p.9). A
idéia, portanto, era neutralizar a ação da oposição, no que tangia a realização
da mudança da capital.
Em abril de 1959, a UDN e seus deputados tentaram pela segunda vez
impedir a concretização da meta-síntese. Os oposicionistas, constatando que
Brasília já estava em adiantado estágio, o que indicava que terminaria em
tempo hábil, articularam um plano para paralisar a obra. A tentativa consistia
em buscar adesão da maioria dos deputados pra tornar possível a instauração
de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para averiguar as contas da
NOVACAP. Assim que fosse estabelecida a CPI, as obras seriam paralisadas
imediatamente, o que implicava no não comprimento da meta de inaugurar
42
Brasília até 21 de abril de 1960. Em última análise, significava a derrota do
governo.
A princípio, a oposição lançou nos jornais a campanha da
“inoportunidade”, argumentando que o Brasil passava por dificuldades
econômicas, sendo inoportuna a ação do governo de gastar muito construindo
uma Capital no interior do país.
Então, os udenistas mudaram de tática. Passaram a divulgar nos jornais
que não eram contra Brasília, mas contra a maneira como a cidade estava
sendo feita. Havia o esforço no entendimento com outros deputados para obter
o número regimental necessário para a instauração automática da CPI, no
mesmo momento em que a oposição buscava explorar as constantes
desavenças entre o PSD e o PTB. O PSD era o partido do Presidente da
República, mas o PTB era o partido de sustentação do governo do Congresso,
conforme foi visto na seção anterior. A UDN tentava, então, enfraquecer esta
aliança e precisava obter êxito, pois, do contrário, não conseguiria o mínimo de
assinaturas para a CPI.
O Presidente e o Vice-Presidente João Goulart tinham divergências
políticas. O PTB não se mostrava favorável à transferência e somando-se a
isso, o Presidente havia feito um convite para que o professor San Tiago
Dantas assumisse o Ministério da Agricultura. A solução proposta pelo
presidente foi sugerir a instauração de uma CPI no dia 22 de abril de 1960,
portanto um dia depois da inauguração da nova capital. Além disso, o
candidato que iria assumir a pasta da Agricultura recusou o convite. As duas
ações fizeram com que muitos membros do PTB e a Comissão Parlamentar de
Inquérito automaticamente. Mesmo assim, no documento já constavam cento e
nove assinaturas e, portanto, faltava somente uma assinatura para a
constituição automática da CPI. Somente um deputado udenista não havia
assinado o documento, pois estava viajando: Jânio quadros. A adesão deste
deputado não parecia muito complicada, visto que se declarava publicamente
contrário à transferência da Capital. Entretanto, ao voltar ao país, Jânio não
assinou o documento e a CPI não pode ser viabilizada.
43
A derrota fez com que a oposição reavaliasse sua estratégia. Não
podiam negar: Brasília já existia. Não deveriam ser contrários às metas, porque
assim seriam contrários ao desenvolvimento nacional, mas algo deveria ser
feito para a inauguração não ocorresse na data marcada.
Contudo, em abril de 1959, começavam a surgir os movimentos dentro
dos partidos visando a sucessão presidencial. A UDN passou a ter, dentro do
mesmo partido, três interesses distintos: a sucessão presidencial, o
impedimento à transferência da Capital e a eleição para prefeito do Rio de
Janeiro, quando a cidade se transformasse em Estado da Guanabara.
Além desta divisão de interesses, que dificultava a ação comum, outro
fato acentuou o enfraquecimento do partido: a convenção udenista de maio de
1959.
Nesta convenção foi aprovado o nome do mineiro Magalhães Pinto para
a presidência do partido, cuja postura mais conciliadora junto ao governo não
agradou a banda mais radical do partido. Os movimentos dissonantes dentro
da UDN geraram uma crise política, enfraquecendo ainda mais sua atuação,
tanto que em 10 de setembro de 1959, Carlos Lacerda, que era
incompatibilizado com Magalhães Pinto, renunciou ao cargo de líder da UDN
no Distrito Federal. Carlos Lacerda descreveu assim “
“a crise que ocorria em grande parte ao modo pelo qual os agentes do
grupo econômico do Sr. Magalhães Pinto, na imprensa e no rádio,
completam a obra do Sr. Juscelino Kubitschek” (Dulles, John W.F.,
“Carlos Lacerda-A vida de um lutador”.RJ.Ed.Nova Fronteira, 1992. V1,
p.358).
Ao mesmo tempo que a crise na UDN se aprofundava, o governo
buscava se consolidar e se reafirmar com os membros do PSD. O partido
chegou a promover um encontro das principais líder o deputado Armando
Falcão, que declarou em nome do partido:
“nós temos o compromisso solene com o eminente correligionário que
ascendeu a chefia da nação (Jornal do Brasil, 5 de abril de 1959)”.
44
Sendo irreversíveis a transferência da Capital e a construção de Brasília,
a questão que passou a povoar as discussões dentro da Câmara dos
Deputados foi a da organização administrativa e judiciária da nova Capital e o
futuro do ex-Distrito Federal. Estas questões, obviamente atreladas uma a
outra, já faziam parte das discussões da sociedade carioca, desde 1959 (Sobre
as discussões acerca do que será o Rio de Janeiro após a transferência, ver
capítulo 3), conforme demonstram as reportagens da época, mas por
conveniência do governo, somente foram postas em pauta ao apagar das
luzes, em março de 1960.
Quanto à situação do Rio de Janeiro como Estado da Guanabara, a
proposta inicial foi do deputado udenista Menezes Cortes. Tal proposta tinha o
nome de emenda nº 6 (ANEXO 7) que foi modificada, através de substitutivos,
pelo deputado San Tiago Dantas (PTB – MG), anexando vários projetos
anteriores, sobre a instauração da Guanabara (1828/56, 3273/57 e 622/59).
Três pontos mobilizaram os debates: a relação entre a União e o novo Estado,
no que se referia aos serviços antes mantidos pela União e a concessão de
recursos financeiros decorrentes da perda da condição da cidade como sede
do governo; a extinção da Câmara dos Vereadores, finalmente, o governo
provisório depois da mudança e antes das eleições de outubro de 1960, que
era prevista na emenda constitucional nº 2 (Mais informações sobre a emenda
constitucional nº 2, vide seção 2.1 deste trabalho e cap.3).
Ao reabrir o Congresso, em 15 de março de 1960, a oposição lançaria
mão de seu último recurso para atrasar a inauguração da Capital, que já estava
pronta, mas sem a devida organização administrativa e judiciária. Esta
organização era de vital importância para o funcionamento da nova capital, pois
se referia ao funcionamento dos poderes dentro do novo Distrito Federal.
Juntamente com a organização, vinha no bojo das discussões o estatuto do
novo Estado da Guanabara, que deveria estar pronto quando a capital fosse
transferida, já que ditaria as normas de seu funcionamento. Afinal,
45
“como administra a cidade em um período de transição entre a
cessação das atribuições dos atuais governantes da municipalidade
carioca (Câmara dos Vereadores e o prefeito nomeado pelo Presidente
da República até 3 de outubro) e a eleição dos dirigentes do futuro
Estado da Guanabara (Assembléia Legislativa e Governador)?
(Abranches, Carlos D.,Jornal do Brasil, 20/06/59, 1º caderno).
A facção mais radical da UDN se aproveitou da necessidade da
aprovação desta lei para articular o atraso da transferência. Os principais
articuladores eram Carlos Lacerda (UDN-DF) e João Agripino (UDN-PB).
Desde o início de 1960, estes udenistas e outros que não concordavam com
mudança, buscavam conscientizar o funcionalismo público federal,
principalmente aquele ligado ao primeiro escalão do governo, acerca do fato de
que a transferência era impossível, pois a futura cidade não possuía infra-
estrutura para abrigar suas famílias, ao mesmo tempo em que o governo fazia
circular listas para que os servidores optassem se quereriam ir ou não. Os
oposicionistas tentavam argumentar, alegando que a atitude era impositiva.
Nos jornais, eram bastante comuns as matérias que diziam que viver em
Brasília era impossível, porque
“não possuía requisitos essenciais para a instalação e funcionamento
dos três poderes neste mês de abril (Jornal do Brasil, 05/04/1960,
2ºcaderno).”
Mas a oposição estava enfraquecida, o que facilitava ainda mais os
sucessos das ações do governo. Em fevereiro de 1960, surgiu um movimento
dentro da UDN de resgate do partido, contra as atitudes amorais utilizadas pelo
governo, o “desaparecimento da oposição na Câmara, com a propaganda de
Juscelino (José Sarney, em carta à Carlos Lacerda, em 06/02/1960)”,
procurando não atacar as metas governamentais para não serem acusados de
contrários ao desenvolvimento. Esse movimento recebeu o nome de “Bossa
Nova” e era liderado pelos deputados José Sarney e Clóvis Ferro Costa.
46
“Por muitas vezes a gente pensa que naquela época do Juscelino as
coisas se desenvolviam todas muito bem, que era um mundo de
desenvolvimento, mas não era não (...) o que se combatia naquele
tempo era que justamente o Juscelino tinha uma visão absolutamente
desenvolvimentista, só pensava na parte econômica, na parte do
desenvolvimento, e havia um certo abandono na parte social
(Depoimento de José Sarney, “Histórias do Poder”, Op.Cit.V.3,p.280)”.
Lacerda retornou à luta, argumentando que a transferência para Brasília
era um crime, pois a cidade não se encontrava em condições de funcionar.
Elaborou um projeto de lei que manteria o Congresso no Rio de Janeiro até 3
de outubro de 1960, salientando que, enquanto havia sido gasta uma fortuna
nas comemorações da inauguração da capital, as vítimas das inundações no
Ceará “estavam famintas” (Tribuna da Imprensa, 02/04/1960). Contudo, ao
mesmo tempo que o projeto era apresentado em plenário, Emival Caiado
(UDN-Goiás), comentava que “um projeto desses não valia nada” (Correio da
Manhã, 05/04/1960) e outros membros, como Jânio Quadros e Magalhães
Pinto, já elogiavam a transferência da Capital.
O projeto da organização administrativa e judiciária e o estatuto da
Guanabara foi muito discutido e foi conduzido a “um impasse só resolvido na
madrugada do dia 12 de abril” (Motta, Marly S. da.”Saudades da Guanabara”.
RJ.Ed.FGV,2000,p.33). Quando a lei orgânica e administrativa do futuro Estado
da Guanabara chegou ao plenário, o PTB em sua postura sempre ambígua,
resolve assumir a mesma posição da UDN, sendo contrário à aprovação do
estatuto. O ponto de discórdia era a palavra “interventor”, que seria nomeado
pela Presidente da República, com funções de dirigir o Estado até a posse do
governador que seria eleito pelo povo. Na realidade, o Partido de sustentação
do governo achou que o Presidente pudesse indicar o nome do Ministro da
Justiça, Sr. Armando Falcão para assumir o cargo de “interventor”. O nome do
Ministro não era aprovado pelo PTB para assumir o cargo. A resolução mais
rápida foi estabelecer uma emenda em plenário oralmente, retirando a palavra
“interventor” do estatuto. Um segundo substutivo foi apresentado “como a
47
fórmula de tranqüilidade dos espíritos” (Anais da Câmara dos Deputados,
12/04/1960). A lei nº3.751 (ANEXO 8) foi aprovada e ficou conhecida como Lei
San Tiago Dantas. Tal lei regulamentava a vida da cidade após a transferência,
da situação dos funcionários públicos, das eleições, além de outras questões
que diziam respeito à administração da cidade-estado. Mas, apesar de toda a
discussão gerada em função do estatuto, ele ainda mantinha algumas
ambigüidades:
1- Mantinha o artigo que previa a escolha do governador provisório do
Presidente da República, que exercia o cargo de interventor até dezembro de
1960;
2- Ainda se mantiveram indefinidas as relações entre o governo da
União e o ex-Distrito Federal, deixando em aberto todos os repasses das
verbas federais para a Guanabara;
3- O artigo 7º, que tratava do poder legislativo local, estabelecia que a
Câmara dos Vereadores deveria exercer função administrativa até a
promulgação da nova Constituição da Guanabara, ou seja, durante alguns
meses, o Estado teria duas Assembléias: uma eleita em 1958 e outra eleita em
3 de outubro de 1960, mantendo os 50 vereadores eleitos em 1958 e elegendo
30 deputados constituintes.
Com isso, o novo Estado ganhou um triste arremedo em forma de
estatuto, que pela pressa deixou indefinidas questões essenciais para o bom
funcionamento de mais uma das unidades de federação. Como disse um
jornalista, dias depois de aprovado o estatuto:
“os dois maiores inimigos da dignidade – a pressa e a violência – foram
fadas melancólicas que se debruçaram sobre o berço do novo Estado
da nação: o da Guanabara.” (Correio da Manhã, 15/04/1960).
A aprovação do novo estatuto da Guanabara e da organização
administrativa e judiciária, não havia mais impedimentos institucionais. O
projeto foi aprovado pela Câmara dos Deputados no dia 13 de abril de 1960 e
seguiu para o Senado, onde também foi aprovado. A preocupação política
passou a ser a indicação do governador provisório e a sucessão presidencial.
48
O governador escolhido foi José Sette Câmara, chefe da casa civil de JK, que
exerceu o mandato até dezembro de 1960.
O senador Mem de Sá foi um dos únicos a declarar sua posição
contrária ao projeto da organização administrativa e judiciária, definindo-o “um
perfeito, nítido e justo reflexo da própria construção de Brasília: uma aberração,
um monstrengo”. E, deflagrando a situação política confortável do governo em
aprovar suas leis, ponderou sobre a situação política, da seguinte forma:
“antes, quero registrar o masoquismo que domina o Congresso
Nacional...” e “...sempre tão pronto a declarar que o poder executivo é
perfeito, supremo, maravilhoso, fabuloso, incapaz de erros e falhas...”,
“...no caso atual do Brasil, o poder executivo conta com maioria sólida
das duas casas do Congresso”, “...é o poder executivo que estabelece a
hierarquia, o programa, a ordem das medidas legislativas do que carece
para a execução de seus objetivos.” (Anais do Senado Federal,
13/04/1960).
49
2.4- A relação entre o Governo Federal e o governo local
2.4.1- Autonomista x intervencionistas
Uma das maneiras de analisar a relação entre a União e o governo do
Distrito Federal é refletir sobre a situação que existia entre intervencionistas e
autonomista dentro do espaço físico da cidade do Rio de Janeiro. As forças
atuavam dentro da mesma realidade da capital, mas com interesses diferentes.
As decisões nacionais eram tomadas na cidade, que tinha também seus
projetos a realizar, seus problemas locais. Os interesses, além de diferentes,
tinham graus bem distintos – o governo federal era bem mais forte que o poder
local, naturalmente. Esta singularidade que conferia à cidade um caráter
nacionalizador muito poderoso. Às vezes, o que era Rio de Janeiro se
confundia com o que era Brasil.
Na primeira parte deste capítulo, quando foi abordada a história
institucional do Rio de Janeiro como sede do governo, buscou-se mapear a
situação da cidade para servir de base nesta discussão. A situação da cidade
foi uma das forças atuantes no processo de transferência na Capital Federal e
o presidente Juscelino Kubistchek sabia disso pois, em seu livro “Porque
construí Brasília”, o presidente chegou a afirmar que “a população do Rio de
Janeiro ansiava por exercer plenamente seus direitos políticos” (Op.Cit.p.275).
Este foi um dos argumentos utilizados para a transferência: para atender às
reinvidicações cariocas, e ao mesmo tempo cumprir a constituição,
“mudaremos a capital”.
Conforme já mencionado, na seção 2.1 deste capítulo, sobre as leis
orgânicas de 1892 e 1948, ambas restringiam o poder político da cidade do Rio
de Janeiro, seja na nomeação do prefeito, que era feito pelo Presidente da
República, seja pelo poder do Senado, de derrubar o veto do prefeito do
Distrito Federal. A cidade não tinha autonomia política em duzentos anos de
sua história como sede do governo. Estas leis controlavam as ações políticas
da cidade. O poder federal, inicialmente se valendo do pretexto de “segurança
50
dentro sua rede”, intervinha na vida local, tornando-o soberano na Capital, ao
mesmo tempo em que limitava o poder local. Em um segundo momento, mais
precisamente após a Revolução de 1930 – portanto já na lei orgânica de 1948
a preocupação do poder central consistia em um poder politicamente auto-
suficiente dentro do Distrito Federal. Sem exercer seu poder pleno, o Rio de
Janeiro era a cidade mais politizada do país, palco da mais bem-sucedidas
ações políticas que ocorreram no Brasil. A solução de intervir na cidade e
limitar a ação de grupos políticos seria a decisão que garantia mais segurança
do governo em sua sede. Este era o objetivo explícito do controle: a segurança.
Sendo assim, quando o Presidente nomeava um prefeito, ou era seu amigo
particular, ou era membro do partido do governo; quando o Senado derrubava
o veto do prefeito, o fazia porque
“caso entregasse o veto aos vereadores, o poder executivo municipal,
indicado pelo presidente, ficaria inteiramente nas mãos da Câmara
Municipal eleita”. (Depoimento de Erasmo Martins Pedro, concedido a
equipe CPDOC.RJ.Ed.ALERJ/FGV,1999,p.63).
Esta postura de intromissão na vida política da cidade, conferiu ao poder
central a denominação de intervencionistas.
A posição intervencionista do governo, implicitamente, favorecia ao
controle da máquina administrativa da capital da República e “dava ao
Presidente da República imenso poder de barganha política” (Ferreira, Marieta
de Moraes, Op.Cit.p.76). O enfraquecimento político do poder local, por sua
vez, “abria o campo político carioca pra o lançamento de candidaturas
inteiramente afinadas como governo federal” (Ferreira, Marieta de
Moraes,op.Cit.p.77). Então, era muito interessante para o poder federal
controlar o Rio de Janeiro, O campo político da Capital favorecia a prática do
clientelismo entre o governo federal e o poder local – principalmente nas
relações entre o Senado e a Câmara dos Vereadores.
O governo local, por sua vez, iniciou sua luta pela autonomia política
local a partir da primeira lei orgânica do Distrito Federal, em 1892. Em 1933, os
políticos da cidade, inconformados com a situação limitada da capital,
51
fundaram o Partido Autonomista do Distrito Federal, de caráter nacionalista e
com forte mobilização das forças políticas locais. O partido, resultado direto dos
anos de “sufocamento imposto pelo mecanismo interventivo de “pacificação” e
de “domestificação” da política carioca”. (Sarmento,Carlos E., “A arquitetura do
impossível”, Artigo,op.cit.Ed.FGV,2000,P.39), lutava pelo direito de eleger seu
prefeito e de julgar vetos. Os prefeitos nomeados eram quase todos
“estrangeiros”, ou seja, figuras que não pertenciam à vida política da cidade e
incapazes de identificarem muitos dos problemas urbanos locais. A intervenção
externa “assumia contornos variados, de acordo com as conjunturas políticas.”
(Freire,Américo,Op.Cit.p.31), isto é, a nomeação era perfeitamente consonante
com a política vigente no Governo Federal, e nada de acordo com as
necessidades da cidade. Então, “a permanência do Governo Federal na cidade
sufocava uma vibrante vida política que clamava por se manifestar”.
(Depoimento de Erasmo Martins Pedro.Op.Cit.p.57). Os que pertenciam a esta
corrente, recebiam o nome de Autonomistas. Para esse grupo, a transferência
da capital era interessante porque libertaria o Rio de Janeiro, quando este se
transformasse em um novo Estado. Pela Constituição de 1946, o antigo Distrito
Federal se transformaria em um novo Estado, ao mesmo tempo em que a
capital fosse transferida. Por isso, de um modo geral, os políticos locais eram a
favor da mudança da capital.
52
2.4.2- As relações entre a Câmara dos Vereadores do Distrito
Federal, o Senado Federal e o Prefeito
Para identificar os movimentos implícitos dentro da esfera local, foi
necessário utilizar o depoimento de um parlamentar da época – Erasmo
Martins Pedro, a fim de tentar descobrir como agiam as forças políticas no
Distrito Federa.
2.4.2.1- Sobre a escolha do prefeito do Distrito Federal
“Era muito importante ser prefeito do Distrito Federal que ser Ministro. O
prefeito era uma escolha pessoal do Presidente da República. Às vezes,
as nomeações eram feitas com critérios partidários. Nas negociações
para a indicação do prefeito alguns acertos também eram feitos para
garantir a maioria na Câmara dos Vereadores.” (Erasmo Martins
Pedro,Op.Cit.,p.59).
Os prefeitos nomeados nesse período seguiam esta tendência, eram
nomeados sem que houvesse identificação com o povo carioca, por isso eram
denominados de “estrangeiros” (ANEXO 9).
PREFEITOS DE 1956 À 1960 (Motta,Marly Silva da.Op.Cit.,p.20)
Negrão de Lima 1956/1958 PSD
Sá Freire 1958/1960 PSD
O prefeito Negrão de Lima era um político mineiro do PSD e foi Ministro
do governo de Getúlio Vargas. Do tipo conciliador, saiu da prefeitura do Distrito
Federal para ser Ministro das Relações Exteriores do governo de Juscelino
53
Kubitschek. O prefeito Sá Freire Alvim pertencia a uma tradicional família de
políticos cariocas – seu tio Milcíades Sá Freire foi prefeito do Distrito Federal
(1919/1920): era secretário-geral do Distrito Federal na administração de
Negrão de Lima, quando foi indicado para substituí-lo em “função também das
suas relações com a política local” e “ele sempre procurava atender às
demandas da Câmara na nomeação do secretariado.” (Erasmo Martins Pedro,
Op.Cit.,p.61). Foi um dos únicos prefeitos que teve alguma relação
administrativa anterior com o Distrito Federal.
Entretanto, o prefeito após assumir, estava em posição delicada entre a
Câmara dos Vereadores e o Senado Federal. Isso acontecia porque um dos
pontos mais difíceis da política do Distrito Federal era a apreciação dos vetos
do prefeito que, de acordo com a lei orgânica cabia ao Senado Federal. O
prefeito tinha quinze dias para sancionar uma lei, depois desta, se aprovada,
passava pela Câmara dos Vereadores. Se vetasse, o veto não retornava à
Câmara dos Vereadores, indo para o Senado Federal, o único que podia
derruba-lo. Portanto, a articulação da Câmara Municipal com o Senado era
uma articulação-chave.
“Tenho que alguns vereadores entravam em acordo com os Senadores
e apresentavam determinados projetos meio absurdos que obrigava o
prefeito a vetar. O veto ia então para o Senado, e lá sua manutenção
era negociada. Essa negociação muitas vezes era a oportunidade para
a distribuição de cargos e empregos. A grande parte dos bons cargos
era ocupada por filhos de senadores ou parentes de senadores”.
(Erasmo Martins Pedro.Op.Cit.,p.61).
Ou seja, a máquina administrativa municipal ficava muito marcada pela
influência direta do Senado Federal.
Nesta realidade, o prefeito tinha que cuidar, ao mesmo tempo, do
Senado Federal, por onde passavam seus vetos, e da Câmara Municipal, para
ter sua maioria e apoio político. O Senado Federal era o poder moderador, mas
a Câmara Municipal também tinha sua força política. E o legislativo local tinha
que desenvolver e ampliar a sua rede de interesses para poder sobreviver. Por
54
isso, justificava-se a fala do vereador Erasmo Martins Pedro quando fez
menção em seu depoimento, quando falava ao poder da Câmara Municipal:
“Se um vereador fazia uma indicação para calçar uma rua, a rua tinha
que ser calçada, porque o prefeito ficava dependendo do apoio político.
Nenhum prefeito podia sobreviver se não tivesse o apoio do poder
legislativo”. (Erasmo Martins Pedro.Op.Cit.,p.57).
55
CAPÍTULO 3:
A imprensa (os principais jornais para consultados para a análise
deste capítulo foram a Tribuna da Imprensa, o Jornal do Brasil e o
Correio da Manhã) e a transferência da capital
A imprensa era muito presente na política do antigo Distrito Federal. No
Rio de Janeiro dos anos 50, existiam muitos jornais na capital, a maioria deles,
ou eram ligados a grupos políticos ou exerciam forte oposição a eles. A
imprensa escrita tinha um importante papel na formação da opinião da
população carioca, que tinha por hábito ler os jornais e acompanhar as
decisões nacionais partindo da cidade. Além disso, a imprensa tinha grande
penetração dentro da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, o que
facilitava retratar os acontecimentos, principalmente políticos, que ocorriam
dentro do Congresso Nacional. Assim foi descrita a presença da imprensa
carioca na vida política da cidade:
“No Rio de Janeiro antigo, no Rio Capital, nessa fase de ouro da
eloqüência parlamentar, do Congresso girando em torno da oposição e
governo, ambos da mesma estrutura conservadora... A UDN com suas
fumaças liberais... o PSD mais pousado nas suas bases interioranas,
um partido com enorme competência na administração do poder.” “a
vida partidária girava em torno dos partidos no palco do Congresso. O
jogo do poder era feito no Congresso e as reuniões partidárias, que
eram regulares. Com hábitos diferentes de partido. A UDN, que era o
grande partido de oposição...se dava a esse requinte de fazer reuniões
de portas abertas.” “o PSD, não (...) eram reuniões fechadas”. “Era uma
casa (o Congresso) que forçava o convívio, o convívio partidário e o
convívio interpartidário. Porque o gabinete das lideranças era o ponto
de encontro das bancadas. E de freqüente obrigatória pelos repórteres
(...) todos freqüentávamos obrigatoriamente a Câmara (...) Tínhamos a
bancada da imprensa na Câmara, que ficava dentro do plenário (...)
56
Então, tínhamos absoluta intimidade, assistíamos vis à vis à disputa do
poder (...) a vida girava em torno dos partidos. E os jornalistas cobriam
os partidos.” (Depoimento do jornalista Luiz Antonio Villas-Boas Corrêa.
“Histórias do Poder”.Op.Cit.,v.2, p.84 e 85).
Quanto ao posicionamento político de alguns jornais da época, no Rio de
Janeiro, ainda Distrito Federal, pode-se dizer que havia jornais de caráter mais
regional e outros de abordagens mais nacionais. De cunho nacional, estavam a
“Tribuna da Imprensa” do deputado udenista Carlos Lacerda, “O Globo” e o
“Correio da Manhã” que eram oposicionistas também. Na linha do governo e
declaradamente mudacionistas estavam “A Última Hora”, de Samuel Wainer,
“O Jornal”, “O Jornal do Comércio”, do petebista San Thiago Dantas, “Jornal do
Brasil e o “Diário Carioca”. Os jornais “O Dia” e “A Notícia” eram mais voltados
para os acontecimentos do Distrito Federal. “O Dia” era o paladino das massas,
defensor do servidor público, e conseguiu eleger muitos vereadores do PSP
para o Distrito Federal. Os donos do Jornal eram Adhemar de Barros e Chagas
Freitas, do PSP. (Sobre a influência política destes dois jornais, ler “Chagas
Freitas”, de Carlos Eduardo Sarmento. Ed.FGV,1999). A imprensa elegia os
políticos e os derrubavam também:
“Ao final da apuração dos votos (em 1954), o PSP-DF havia dobrado
sua representação na Câmara dos Deputados.” “...o fato de os
candidatos terem praticamente triplicado a votação que haviam obtido
quatro anos antes dava indícios da eficácia da estratégia de divulgação
através das páginas de “O Dia” e “A Notícia” (Ler “Chagas Freitas”,
Op.Cit.).
As notícias que eram divulgadas, ainda que tendenciosas, serviam para
retratar alguns assuntos abordados pela sociedade carioca no período
considerado neste trabalho. Uma das discussões que mais apreciam nos
jornais, principalmente entre julho e agosto de 1958, tratavam sobre a
construção de Brasília e a transferência da capital – que naquela altura já era
57
irreversível, e o que aconteceria com a cidade do Rio de Janeiro após deixar de
ser Capital Federal. Simultaneamente, “O Correio da Manhã”, “A Tribuna da
Imprensa” e o “Jornal do Brasil” publicaram reportagens sobre o destino do Rio
de Janeiro, após a transferência, o que era uma clara indicação de que esse
era o assunto que mobilizava o povo e a imprensa carioca.
A inexistência de uma legislação capaz de definir com certeza a futura
situação da cidade pode ser atribuída em parte ao governo que parecia
satisfeito com a indefinição reinante. Prolongando o impasse, iam transferindo
a capital ainda sem uma clara institucionalização sobre o destino do Rio de
Janeiro. O governo Juscelino Kubistchek não decidiu nada ao longo dos cinco
anos e deixou para os últimos dias que dispunha a definição acerca do futuro
do novo estado. Foi uma manobra proposital pois o governo, no afã de
sacramentar a transferência, acabou por atrela-la à criação de um estatuto para
o novo Estado, na noite do dia 12 de abril de 1960, nove dias antes, portanto,
da inauguração da nova Capital.
A Constituição de 1946, como já foi dito, citava a criação do Estado da
Guanabara. E só. A emenda constitucional nº 2, previa a eleição direta para o
prefeito do Rio de Janeiro após a transferência, coisa que também era óbvia, já
que, transformando-se em Estado, a Guanabara exerceria suas funções
políticas plenas. Como disse Lopo Coelho, deputado carioca do Partido Social
Democrático (PSD) e relator da comissão que estudava as necessidades do
futuro estado, “a Guanabara boiava no ar” (Lopo Coelho, “Que será do Rio?”,
Correio da Manhã, 18/07/1958).
Muito mais polêmico que a discussão sobre a transferência da capital
para Brasília, o debate sobre o futuro ex-Distrito Federal, envolveu um impasse
sobre a definição da identidade da cidade após a mudança: a cidade passaria a
ser Território, Estado ou Município: O elemento fundamental para este debate
foi o passado de cidade-capital do Rio de Janeiro.
Em agosto de 1958, o Ministro da Justiça Cirilo Junior apresentou o
projeto de transformar o Rio de Janeiro em Território da Guanabara por um
período de dez anos. A proposta visava preservar a cidade como uma área
especial no quadro da federação brasileira. Mas, a idéia implícita parecia ser a
58
de manter a cidade neutra dentro da política brasileira, antevendo talvez os
pleitos de 1960 e 1965. A proposta ameaçava a autonomia da cidade, e isso
era impensável. Seria como transformar a antiga Capital em “um simples
território como o Acre” (“Intervenção no Distrito” – Tribuna da Imprensa,
03/09/1958) O custeio dos principais serviços ficariam a cargo da União, como
se a cidade ainda se mantivesse como Capital, em uma condição diferenciada
dos demais estados da nação (“Estado, Território ou reintegração ao Estado do
Rio?” – Jornal do Brasil – 12/07/1958). A oposição, principalmente da UDN, foi
diretamente contrária a esta idéia, talvez por enxergar que o governo preparava
suas bases de retorno na eleição de 1965. Como citado na própria “Tribuna da
Imprensa”:
“Nem Território da Guanabara, nem cidade livre, nem junção com o
estado do Rio, idéia da moda (...) A constituição não permite dúvidas.
Mudada a capital, o Distrito será estado da Guanabara. Só.” (“Território
da Guanabara”, Tribuna da Imprensa, 07/08/1958).
No caso da transformação do Distrito Federal em Estado da Guanabara
– como definia a Constituição -, o ponto central do debate foi a viabilidade do
ex-Distrito Federal se tornar mais um estado na federação, com organização
jurídica-política semelhante aos demais, ou ao contrário, ser um estado
especial, uma cidade-estado. O status especial de capital que a cidade
desfrutava por tanto tempo, talvez tenha sido o maior empecilho ao seu
engajamento como um Estado normal. Constantemente, havia a lembrança de
que “a cidade do Rio de Janeiro já tomou feição tão particular...que se distingue
claramente não só da velha província fluminense, como dos demais estados da
União” (“Que será do Rio?” – Correio da Manhã, 15/08/1958).
“quer queiram, quer não, os mineiros que agora nos governam, e os
fluminenses, que hospedamos cordialmente, mas que ainda não nos
governam, o Rio de Janeiro, através da sua história, graças ao seu
desenvolvimento social por ter sido a corte e depois a capital
republicana, possui características psicológicas que devem ser
59
preservadas, que enriquecem a cultura nacional” (José Artur
Rios,sociólogo, “Que será do Rio?” – Correio da Manhã – 06/08/1958).
E havia uma terceira corrente que apoiava a fusão da cidade do Rio de
Janeiro ao estado, já em 1960. Este grupo era formado basicamente por
udenistas. Eles, temendo que a cidade se transformasse em território da União
– submetida ao controle federal e vulnerável pra a composição das forças do
PSD-PTB -, para o pleito de 1960 e 1965, e buscando resolver os impasses da
seção fluminense do partido (Ver Motta, Marly S.da, “O Rio de Janeiro continua
sendo...”Tese de Doutorado, UFF,1997, c.2.), queriam que a cidade do Rio de
Janeiro se juntasse à antiga província do Rio de Janeiro. Os defensores da
fusão deveriam definir o lugar a ser ocupado pela cidade do novo estado do
Rio de Janeiro, A antiga capital poderia ser a capital do novo estado ou uma
cidade comum. As opiniões divergiam. Uns achavam que, após a fusão, o Rio
deveria se tornar um grande centro, como o geógrafo fluminense Alberto
Lamego:
“a capital do novo estado deveria ser deslocada para Petrópolis,
Friburgo, ou qualquer outra cidade nas proximidades do centro
geográfico fluminense. Continuaria o Rio como grande comercial que já
é, e se evitariam maiores agitações políticas aqui. Pois não é esse um
dos motivos para a transferência para Brasília?” (Alberto Lamego, “que
será do Rio?”, Correio da Manhã, 19/07/1958).
Outros consideravam vantajoso para o novo estado que o predomínio da
antiga capital na política e na administração deveria se manter, para
transformar o estado do Rio de Janeiro em “um estado poderoso, um novo São
Paulo” (Correio da Manhã, 06/04/1960).
Esses debates sobre o futuro do antigo Distrito Federal, provocados pela
mudança da capital e a passividade com que o governo federal tratava a
matéria, foi se prolongando até a fatídica noite do dia 12 de abril de 1960 e
resultou em atropelos desnecessários para a criação de um novo estado, que
60
poderia vir a ser o mais importante do país, ainda que perdesse seu título de
Capital Federal.
“Separa-se a União do Rio, mas em que estado civil fica o Rio?” (Jonas
Baiense, deputado petebista fluminense, autor da emenda constitucional
prevendo a fusão, ao Correio da Manhã, 16/07/1958).
Era o momento de apreensão que a cidade estava vivendo ante à
indefinição. Daí, vieram a emenda constitucional nº 6, de Menezes Cortes, que
era vice-presidente da UDN, defendendo-se ao mesmo tempo, as emendas nº5
(da fusão) e a nº 2 (da organização da Guanabara). A emenda proposta pelo
deputado previa a criação do Estado da Guanabara, que poderia vir a ser fundir
com o estado do Rio de Janeiro e formar um novo estado, mediante plebiscito.
Deste modo, na eleição seguinte, 3 de outubro de 1960, os eleitores dos dois
estados poderiam optar pela fusão dos respectivos territórios, para constituir
um novo Estado (Para acompanhar o andamento da votação do estatuto da
Guanabara, ver cap. 2 deste trabalho). Esta emenda foi embargada e o
problema do governo de Juscelino quanto à situação do Rio de Janeiro. Tudo
parecia demonstrar a intenção de prorrogar pelo maior tempo possível esta
situação. As denúncias do desinteresse do executivo, no que se referia ao
problema carioca, partiria dos parlamentares udenistas, o que já era esperado.
Em discurso inflamado, o senador Afonso Arinos (UDN/DF) alertava que:
“assim o Distrito Federal vai ser um burgo podre de eleição de 1960, por
que vai ter todos os instrumentos da ação pública entregues a um
delegado do Presidente da República. Vamos assistir à entrega do
centro, do cérebro,enfim, do cume das tradições cívicas do país, num
ano decisivo para a nacionalidade, à discrição do poder federal, para a
realização de um pleito que interessa a toda a nação, sendo este dos
maiores e seguramente o mais livre dos colégios eleitorais do país”.
(Anais do Senado Federal, seção de 03/02/1960).
Do deputado petebista carioca Sérgio Magalhães, vieram acusações
mais explícitas. Depois de lembrar das manifestações de vários parlamentares
61
em apresentarem projetos para a nova organização política do Rio de Janeiro,
lançou a afirmação de que o que estava acontecendo não era por acaso:
“não é sem plano, por comodismo, mas desinteresse ligado, sem dúvida
alguma, a qualquer coisa de muito sério que se trama nessa República
(...) em que se percebe a ação dos grupos econômicos que
enriqueceram à custa desse grande plano de desenvolvimento
econômico, e que pretendem um continuísmo” (Anais da Câmara dos
Deputados, em 08/02/1960).
A solução final foi a criação do Estado da Guanabara, como previa a
Constituição de 1946, com interventor e tudo. Nascia um novo Estado da nação
e uma nova Capital. Porém ainda permaneceu a polêmica sobre a inserção do
novo estado como um estado normal dentro da nação. Mas, um estado que
teve uma história como o Rio de Janeiro teve como ex-capital, dificilmente
formaria um estado como outro qualquer da federação.
“A identificação do Rio com o Brasil penetrou tão profundamente o
espírito de sua metrópole que as grandezas do Rio são as Grandezas
do Brasil; as fragilidades do Rio são as fragilidades do Brasil; o calor do
Rio, o calor do Brasil; a paisagem do Rio, paisagem do Brasil.”
(Deputado Munhoz da Rocha, em Anais da Câmara dos Deputados,
12/02/1960) .
62
CONCLUSÃO
O trecho que utilizei como epígrafe deste trabalho é um parte do
discurso proferido pelo deputado paranaense Munhoz da Rocha, dias antes da
última seção da Câmara dos Deputados no Rio de Janeiro ainda como Capital
Federal, demonstra claramente a preocupação em se manter a cidade numa
situação de excepcional idade no quadro federativo brasileiro. Contudo, o mais
novo membro da federação tinha problemas justamente em razão do estatuto
aprovado para a regulamentação de sua organização possuir indefinições que
comprometiam o seu futuro, principalmente no que dizia respeito ao repasse de
verbas do Governo Federal para a Guanabara. Um dos principais objetivos do
presidente Juscelino Kubitschek era concluir a transferência da Capital para
Brasília ainda no seu mandato. Desta maneira, o processo de mudança da
Capital foi muito mais rápido do que seria recomendável, visto que ao mesmo
tempo que o Governo criava uma nova cidade, um novo Estado surgiria no
país. Portanto, não houve o menor cuidado na elaboração do estatuto legal,
pois a preocupação em cumprir as metas dentro dos prazos era o que
realmente importava.
É bom ressaltar que a idéia de transferir a sede do Governo brasileiro
para o interior do país era muito anterior ao governo de Juscelino Kubitschek.
Em 1789 os inconfidentes já planejavam transferir a Capital para o interior,
tendo sido tal idéia reforçada e discutida nos anos seguintes e esteve presente
em quase todas as Constituições brasileiras. Quando o Presidente eleito em
1955 assumiu, a área que mais tarde seria Brasília já havia sido demarcada,
aerografada, catalogada, estudada e tinha até o nome da futura cidade.
Naturalmente, muito poderia ter sido feito antes de 1956, afinal a transferência
já constava nas Disposições Transitórias desde a primeira Constituição
Republicana, datada de 1891. Ao presidente que assumiu em 1956, coube a
63
vontade de executar a obra e a institucionalização das leis referentes à nova
cidade e ao novo Estado. Porém, os méritos não eram exclusivamente dele.
Um segundo ponto a comentar, foi que a mudança da Capital também
envolvia a questão de Segurança Nacional. Desde o início da República
envolvia a questão de Segurança Nacional. Desde o início da República houve
uma preocupação muito grande com a permanência da Capital no litoral, tanto
que, no primeiro Decreto, promulgado pelo Governo Provisório, um dos pontos
relevantes abordava a questão da manutenção da Capital do Rio de Janeiro,
até a definição da nova Constituição. Depois, já na Constituição de 1891, a
preocupação passou a ser a interiorização a Capital. Para justificar a
necessidade de transferir a Capital, foram alegadas questões de Segurança
externa e interna. Extremamente, seria melhor que a Capital estivesse mais
longe do litoral para que, caso houvesse uma guerra ou um ataque externo, a
sede do poder não ficasse tão exposta. Contudo, foi a preocupação com a
questão interna que pesou mais. O Rio de Janeiro não era o tipo de cidade
segura para que um novo governo republicano se consolidasse e se
estabelecesse posto que a ex-Capital Federal tinha fama de revolucionária,
sendo também altamente politizada. Governar o Brasil dentro do Rio de Janeiro
era um grande risco.
Um terceiro ponto diz respeito exatamente ao processo pelo qual o
Governo Federal articulou e manuseou as Leis para conseguir governar o país
no Rio de Janeiro. A cidade se beneficiava com a presença do poder federal
sendo, em contrapartida, o único lugar do país que até 1960 não havia exercido
plenamente a democracia. O Rio de Janeiro esteve por dois séculos sendo
contida politicamente e administrativamente através de Constituições, Leis
Orgânicas e Decretos, cujo objetivo era limitara a política e, por fim, as ações
políticas dentro do antigo Distrito Federal. Com isso, criou-se um espaço
institucional muito diferente do resto do país, com uma grande idéia de
representar a nação brasileira. Essa característica tornou-se um problema para
a cidade que após 1960, teve que se enquadrar primeiro como um Estado
qualquer da federação e, depois da fusão, como um município comum da
nação. O Rio de Janeiro perdeu muito com a transferência, pois a cidade que
64
tinha um passado de acontecimentos nacionais permaneceria, após a
mudança, como se tivessem roubado sua identidade de “Vitrine do país”
precisando assumir uma nova identidade – de Estado da Guanabara – seguida
de outra – na Fusão com o Estado do Rio de Janeiro – mais desconhecida que
a primeira.
Ao elaborar o mapeamento político da ex-Capital é importante registrar a
formação de um grande número de partidos políticos pós-1945, dentro do
espaço da cidade, pois a formação de uma grande quantidade de partidos no
Rio de Janeiro só poderia representar uma enorme reação aos anos da
ditadura e à Constituição de 1937, quando o antigo Distrito Federal
praticamente deixou de existir como núcleo de representatividade política. Dos
partidos que surgiram três tiveram muita relevância: o Partido Social
Democrático, o Partido Trabalhista Brasileiro e a União Democrática Nacional.
Tais partidos foram responsáveis pelas articulações políticas dentro e fora do
Distrito Federal e vieram a formar outros partidos de importância para a
realidade política atual.
É interessante constatar, ainda analisando o processo da transferência
da Capital, a facilidade com que o Governo Federal aprovou as Leis referentes
à transferência da Capital. Basicamente, foram três Leis principais e o governo
não teve nenhuma grande dificuldade em aprova-las, já que tinha a maioria no
Congresso. Outro ponto a favor que facilitou muito a ação do governo, foi o
enfraquecimento da oposição. Ela não agiu unida para tentar alterar o quadro
que se apresentava, pois estava dividida por interesses divergentes e, como se
não bastasse, dentro do maior partido de oposição – a UDN – existiam
membros que apoiavam o governo. A ação contra a transferência, portanto,
nunca poderia ter tido um bom resultado, como efetivamente não teve. Cabe
frisar que a bancada de Goiás, o estado mais favorecido com a transferência,
agiu em conjunto, buscando assegurar os interesses da região sem se prender
às filiações partidárias. Os acontecimentos narrados neste trabalho mostram
que o Governo Federal foi bastante eficaz e articulado no que se referia à
aprovação das leis sobre a mudança da Capital, o que lhe possibilitou alcançar
os objetivos de maneira satisfatória.
65
Uma das constatações desta pesquisa foi o descaso com que o Governo
Federal cuidou da situação da cidade do Rio de Janeiro após a mudança da
sede do governo. Deixou propositalmente relegado a segundo plano o
problema da organização administrativa e judiciária do novo Distrito Federal,
assim como a questão do Estatuto do Estado da Guanabara. Somente, dias
antes da data marcada para inauguração de Brasília, no “apagar das luzes”,
chegou-se a uma decisão acerca do referido estatuto. O resultado dessa ação
não poderia ser mais desastrosa para a cidade do Rio de Janeiro que, após
dois séculos como capital não recebeu uma única indenização do Governo
Federal, por deixar de ser Distrito Federal. Os encargos que eram pagos pela
União foram repassados para o novo Estado, indiscriminadamente. Tudo feito
às pressas. A idéia com isso era de agilizar a transferência, já que a aprovação
da organização administrativa e judiciária da nova cidade estava atrelada à
aprovação do estatuto do Estado da Guanabara. E deveria ser desta maneira
para fazer cumprir o que determinava a Constituição: um novo Estado passaria
a existir automaticamente o que determinava a Constituição: um novo Estado
passaria a existir automaticamente com a transferência da Capital para outro
lugar do território nacional.
As relações políticas na cidade do Rio de Janeiro eram ambíguas e a
Câmara dos Vereadores, devido a Lei Orgânica do Distrito Federal, e na busca
de maior poder dentro da política da cidade, mantinha uma relação de troca de
favores com o Senado Federal. Possivelmente, foi a maneira encontrada para
sobreviver à intervenção permanente do Governo Federal. O poder local
barganhava a aprovação no Senado para seus projetos que eram vetados pelo
Prefeito. Em contrapartida, o Senado Federal ganhava cargos, dentro da antiga
Capital para aprovar os atos do Prefeito nomeado pelo Presidente da
República. Essa relação pode ser comprovada pelo depoimento de um
parlamentar na época, pois nem nos Anais tal situação estava bem definida. As
relações entre o poder local e o poder federal consistia em uma relação de
interesses, onde o poder local tentava garantir alguma vantagem sobre o
intervencionismo federal.
66
Na sociedade carioca a imprensa escrita era muito importante na vida da
população. Este fato fica evidenciado pela grande quantidade de jornais que
circulavam na antiga Capital e o conteúdo de suas informações. Os jornalistas
tinham acesso à vida política do país quase que integralmente, e conseguiam
estar presentes até em reuniões de partido. Tal aproximação facilitava a
circulação de uma grande quantidade de informações, cujo teor contribuía pra
a formação da opinião pública da sociedade carioca.
A imprensa, por se manter próxima à sociedade carioca, retratou a
opinião do povo do Rio de janeiro naquele momento crítico, em que a cidade
perdia sua identidade. O que pôde ser constatado é que a população do ex-
Distrito Federal não estava preocupada com a perda da cidade do status de
Capital Nacional. A preocupação maior dos cariocas era com o futuro do Rio de
Janeiro, quando deixasse de ser Capital. Assim, no momento da transferência
da Capital, existia uma cidade de passado grandioso e futuro incerto, que
sofreu e sofre com as opções daquele período. A cidade que abrigou por tantos
anos o Governo do país não devia ter sido “abandonada”, haja vista que em
nenhum momento houve a preocupação do Governo Federal com o futuro do
Rio de Janeiro ou mesmo com os meios pelos quais a ex-Capital se adaptaria à
sua nova realidade. O Estado da Guanabara estava em situação mais difícil
que outros estados do país, porque precisava se transformar em uma unidade
auto-suficiente imediatamente e sem nenhum auxílio da União. Entretanto
mesmo assim, o Rio de Janeiro continuava a ser a “vitrine do país” para o
mundo.
67
BIBLIOGRAFIA:
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IMPÉRIO DO BRASIL. Anais.1823
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14.BRASIL. Decreto nº 38.281, de 9 de dezembro de 1955.
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16.BRASIL. Lei nº 16, de 12 de agosto de 1834.
17.BRASIL. Lei nº 85, de 20 de setembro de 1892.
18.BRASIL. Lei nº 939, de 29 de dezembro de 1902, artigos 1º e 3º
19.BRASIL. Lei nº 1.803, de 15 de janeiro de 1953.
20.BRASIL. Lei nº 2.874, de 19 de setembro de 1956.
68
21.BRASIL. Lei nº 3.273, de 1 de outubro de 1957.
22.BRASIL. Lei nº 3.751, de 13 de abril de 1960.
23.BRASIL. Segunda Lei Orgânica do Distrito Federal, 15 de dezembro de
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40.PICALUGA, Izabel F. Partidos Políticos e Classes Sociais: a UDN na
Guanabara. São Paulo, e. Vozes, 1984.
41.SARMENTO, Carlos E. Chagas Freitas. Rio de Janeiro, ed. ALERJ/FGV
– Núcleo de Memória Política Carioca e Fluminense, 1999.
42.URUGUAI, Visconde de. Estudos Práticos sobre a administração das
províncias. RJ, 1865, v1.,p.29.
70
ANEXOS
71
ANEXO 1
DEPUTADOS FEDERAIS ELEITOS EM 1954 NO RIO DE
JANEIRO (DISTRITO FEDERAL)
NOME PARTIDO POLÍTICO QTDE. DE VOTOS
1- Carlos Lacerda UDN 159.707
2- Odilon Braga UDN 8.960
3- Mário Martins UDN 8.993
4 Adauto Lúcio Costa UDN 6.993
5- Anésio Frota Aguiar UDN 5.926
6- Francisco Valente UDN 5.198
7- Luthero Vargas PTB 120.913
8- João Machado PTB 10.315
9- Rubens Berardo PTB 10.271
10- Danton Coelho PTB 6.370
11- Sérgio Magalhães PTB 5.128
12- Georges Galvão PTB 4.829
13- Lopo Coelho PSD 13.546
14- Eurípedes Cardoso de Meneses PSD 12.264
15- Benjamim Farah PSP 15.471
16- Antonio Chagas Freitas PSP 11.250
17- Antonio Buzzi de Mendonça PRT 45.137
Fonte: Izabel F. Picaluga. Partidos Políticos e Classes Sociais:
UDN na Guanabara, ed. Vozes, 1984, p. 194 à 201.
72
ANEXO 2
VEREADORES ELEITOS EM 1954 (50 VAGAS)
NOME PARTIDO POLÍTICO QTDE. DE VOTOS
1- Raul Brunini UDN 27.034
2- Gladstone Chaves de Melo UDN 11.115
3- Ligia Lessa Bastos UDN 11.069
4- José Candido de Souza UDN 9.497
5- Sandra Cavalcanti UDN 3.474
6- Armando Nogueira UDN 3.050
7- Domingos D’Ângelo UDN 2.845
8- Aníbal Espinheira UDN 2.559
9- Wilson Leite Passos UDN 1.868
10- Luis Paes Leme PTB 8.207
11- Sagramor Scruvero PTB 5.603
12- Celso Lisboa PTB 5.179
13- José Lima Romero PTB 4.931
14- Geraldo Moreira PTB 4.922
15- Odilon Braga PTB 4.913
16- Milton Castro Menezes PTB 4.609
17- Salomão Hassem Filho PTB 4.419
18- Gentil de Castro PTB 4.071
19- Levi Neves PSD 5.603
20- Álvaro Tolentino Dias PSD 4.035
21- Luis Gonzaga da Gama PSD 3.980
22- Ari Almeida Costa PSD 3.758
23- Hugo Ramos Filho PSD 3.491
24- Joaquim Couto de Souza PSD 3.189
25- Frederico Trotta PSD 2.976
26- Edgard Carvalho PSP 3.590
27- Manoel Blásquez PSP 3.511
28- Índio do Brasil PSP 3.462
29- Antonio Mourão Filho PSP 3.444
73
ANEXO 2 (Continuação)
VEREADORES ELEITOS EM 1954 (50 VAGAS)
NOME PARTIDO POLÍTICO QTDE DE VOTOS
30- Telêmaco Gonçalves Maia PSP 3.279
31- Miécimo da Silva PSP 3.154
32- Alcides Miguel de Oliveira PR 22.940
33- Mário Luis Piragibe PR 2.449
34- José Augusto Bretas PR 2.076
35- Nilo Romero PR 1.810
36- Hélio Luis Walcacer PR 1.789
37- Dulce Magalhães PDC 2.694
38- Indaléceio d’Araújo Iglesias PDC 2.544
39- Manoel da Silva Junior PDC 2.282
40- Raimundo Magalhães PSB 3.325
41- Isaac Isecksonh PSB 2.810
42- José Machado Wanderlei PST 1.836
43- Pedro Alves de Faria PST 1.678
44- João de Freita Ferreira PTN 2.206
45- Alexandrino Mendes Soares PTN 1.685
46- Cipriano Fernandes Lima PL 1.339
47- Raul Gomes Ferreira PL 959
48- Walter Viana de Carvalho PRT 1.684
49- Francisco Durso PRT 1.223
50- Alberto Cotrim Neto PRP 2.252
Fonte: Izabel F. Picaluga. Op. Cit.
74
ANEXO 2 (Continuação)
NOME DOS PARTIDOS POLÍTICOS, POR EXTENSO,
SEGUNDO RESPECTIVAS SIGLAS
UDN – União Democrática Nacional
PTB- Partido Trabalhista Brasileiro
PSP – Partido Social Progressista
ADN – Aliança Democrática Nacionalista
PSD – Partido Social Democrático
PSB – Partido Socialista Brasileiro
PRT – Partido Republicano Trabalhista
PR – Partido Republicano
PTN – Partido Trabalhista Nacional
PL – Partido Libertador
PDC – Partido Democrático Cristão
PST – Partido Social Trabalhista
PRP – Partido da Representação Popular
75
ANEXO 3
DEPUTADOS FEDERAIS ELEITOS EM 1958
NOME PARTIDO POLÍTICO QTDE. DE VOTOS
1- Carlos Lacerda UDN 143.012
2- Geraldo Menezes Cortes UDN 60.579
3- Adauto Lucio Costa UDN 19.797
4- Eurípedes Cardoso de Menezes UDN 15.633
5- Hamilton Nogueira UDN 8.305
6- Mário Martins UDN 7.421
7- Elói Dutra PTB 59.780
8- Rubens Berardo PTB 26.213
9- Sérgio Nunes Magalhães PTB 20.094
10- Waldir Simões PTB 17.786
11- Licio Hauer PTB 15.664
12- Antonio Chagas Freitas PSP 94.999
13- Ângelo Mendes de Morais PSP 36.729
14- Benjamim Farah PSP 16.099
15- Franciso Gurgel PSP 7.407
16- Breno da Silva ADN 9.480
17- Nelson Carneiro ADN 16.067
Fonte: Izabel F. Picaluga. Op. Cit.
76
ANEXO 4
VEREADORES ELEITOS EM 1958 PARA A CÂMARA DO
DISTRITO FEDERAL
NOME PARTIDO POLÍTICO QTDE. DE VOTOS
1- Raul Brunini Filho UDN 24.361
2- Arnaldo Nogueira UDN 16.700
3- Ligia Lessa Bastos UDN 8.687
4- Jair Martins UDN 7.934
5- Murilo Miranda UDN 5.174
6- Paulo Areal UDN 4.940
7- Domingos D’Ângelo UDN 4.234
8- Francisco Sales Neto UDN 3.898
9- Geraldo Moreira PTB 11.737
10- Armando da Fonseca PTB 7.647
11- Celso Lisboa PTB 6.567
12- Velinda da Fonseca PTB 5.762
13- Salomão Hassem Filho PTB 4.356
14- Roberto Gonçalves Lima PTB 3.980
15- Milton de Castro Menezes PTB 3.706
16- Hugo Ramos Filho PSD 9.789
17- Frederico Trotta PSD 6.861
18- Erasmo Martins Pedro PSD 6.450
19- Rubens Cardoso Filho PSD 5.986
20- Osmar Lopes de Rezende PSD 5.659
21- José Maria de Carvalho PSD 5.239
22- Pedro Alves de Fria PSD 4.995
23- Antônio Mourão Filho PSP 10.171
24- Miécimo da Silva PSP 6.920
77
ANEXO 4 (Continuação)
VEREADORES ELEITOS EM 1958 PARA A CÂMARA DO
DISTRITO FEDERAL
NOME PARTIDO POLÍTICO QTDE. DE VOTOS
25- Ubaldo da Silva Oliveira PSP 6.846
26- Nelson José Salim PSP 6.705
27- Levi Neves PSP 4.371
28- Cesário de Melo PSB 4.371
29- Isaac Isecksohn PSB 3.850
30- Francisco Silbert Sobrinho PSB 3.440
31- Antônio Dias Lopes PSB 2.555
32- Manoel Navella PRT 5.347
33- Waldemar Viana PRT 4.450
34- Lauro do Vale PRT 3.794
35- Aníbal de Gouveia PRT 2.882
36- Telêmaco Gonçalves Maia PRT 4.238
37- Sami Jorge PRT 3.872
38- Nilo Romero PRT 3.361
39- Jurandir Cícero PRT 3.235
40- Albano Fonseca Marquês PTN 3.062
41- José Romero Dantas PTN 2.687
42- Alexandre Mendes Soares PTN 2.566
43- Luciano Lopes PL 3.337
44- Cristiano Salinas Lacorte PL 3.197
45- Horácio Cardoso Franco PL 2.576
46- Gladstone Chaves de Melo PDC 5.886
47- Dulce Magalhães PDC 3.257
48- Antônio Luvizaro PST 3.131
49- Nilton Moreira Pereira PST 2.422
50- Benedito Inácio Maria PRP 2.372
Fonte: Izabel F. Picaluga. Op. Cit.
78
ANEXO 5
Lei nº 2.784, de 19 de setembro de 1956.
79
ANEXO 6
Lei nº 3.273, de 1 de outubro de 1957.
80
ANEXO 7
Emenda Constitucional nº 6, 27 de janeiro de 1960.
81
ANEXO 8
Lei nº 3.751, de 13 de abril de 1960.
82
ANEXO 9
RELAÇÃO DOS PREFEITOS DO DISTRITO FEDERAL (DE
1930 À 1955)
PREFEITO MANDATOS
Adolfo Bergamini 24/10/30 à 21/09/31
Pedro Ernesto 30/09/31 à 03/04/36
Olímpio de Melo 04/04/36 à 02/07/37
Henrique de Toledo Dodsworth 03/07/37 à 03/11/45
Filadelfo de Barros Azevedo 03/11/45 à 30/11/46
Hildebrando de Araújo Góes 31/01/46 à 13/06/47
Ângelo Mendes de Moraes 13/06/47 à 24/04/51
Joá Carlos Vital 25/04/51 à 12/12/52
Dulcídio Cardoso 12/12/52 à 24/08/54
Alim Pedro 05/09/54 à 11/11/55
Fonte: Marly Silva da Motta. Saudades da Guanabara. RJ. Ed. FGV,
2000, p.20.