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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
AÇOES COLETIVAS E SEUS REFLEXOS NAS RELAÇÕES DE
CONSUMO
Por: JOSEFA DOS SANTOS COSTA
Orientador:
Prof.Dr. SÉRGIO RIBEIRO
Prof. Dr. WILLIAM LIMA ROCHA
Rio de Janeiro 2006
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
AÇÕES COLETIVAS E SEUS REFLEXOS NAS RELAÇÕES DE
CONSUMO
Apresentação de monografia à Universidade
Candido Mendes como condição prévia para a
conclusão do Curso de Pós-Graduação “Lato Sensu”
em Direito do Consumidor.
Por: Josefa dos Santos Costa.
3
AGRADECIMENTOS
Agradeço a todas as pessoas que
passaram pela minha vida e que de
alguma forma contribuíram apara o
meu amadurecimento.
4
DEDICATÓRIA
Aos meus amigos que me incentivaram
na feitura de mais uma especialização na
área jurídica, em especial a uma amiga
do coração Raquel Monteiro Alves.
5
RESUMO
A lei 8078/90 tem a preocupação primordial com as Ações Coletivas .
No parágrafo único do artigo 81 está a definição de direitos individuais
homogêneos, de direitos difusos e de direito coletivos, observa-se a todo
tempo que o Código de Defesa do Consumidor tem como princípio básico e
primordial proteger o consumidor em larga escala, preocupando-se com a
questão do direito difuso e do direito coletivo.
Exatamente por estarmos numa sociedade de massa, onde a produção,
a fabricação e o planejamento de produtos e serviços se dão em série, e não
há a participação do consumidor, é vital que se possa contar com um Código,
um modelo processual no ordenamento jurídico que proteja o consumidor de
maneira difusa.
Com efeito a Lei 8078/90 está engajada com a questão do consumidor
coletivo, devendo ser utilizada amplamente para as ações coletivas. È por seu
intermédio que o consumidor estará protegido, e percebemos que aos poucos
começa-se a ter consciência da importância da Aço coletivas, que podem ser
propostas pelo Ministério Público ou pelas Associações de Defesa do
Consumidor.
A missão deste trabalho é abordar o tema das Ações Coletivas
analisando as controvérsias sobre o assunto , suas peculiaridades e nuances,
os caracteres importantes e polêmicos, tais como a sua efetividade e
aplicabilidade no Direito Brasileiro.
Portanto neste trabalho trataremos das Ações Coletivas especialmente
tratando dos direitos, interesses transindividuais, interesses difusos, coletivos
individuais homogêneos, os Princípios Constitucionais e a tutela jurisdicional
dos interesses transindividuais as Ações Coletivas previstas no CDC, Ação
Popular, Ação Civil Pública e sua respectivas tutelas jurisdicionais, a
legitimidade para a propositura das Ações Coletivas,Legitimidade do Ministério
Público para a defesa das questões de massa, a competência nas Ações
Coletivas do CDC, a coisa julgada e seus efeitos.
6
METODOLOGIA
Para demonstrar o presente trabalho será utilizada a metodologia
dogmática, com a leitura de livros, pesquisa de jurisprudência, estudo de
doutrina e legislação processual brasileira pertinente ao caso em questão.
7
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 08
CAPÍTULO I - Evolução Histórica 09
CAPÍTULO II - Princípios constitucionais e a tutela jurisdicional 13
dos interesses transindividuais
CAPÍTULO III – Interesses ou Direitos Difusos, Coletivos
individuais homogêneos 15
CAPÍTULO IV – As ações Coletivas previstas no CDC 20
CAPÍTULO V – A competência nas ações coletivas 26
CAPÍTULO VI – Coisa julgada e seus efeitos 32
CONCLUSÃO 43
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 45
FOLHA DE AVALIAÇÃO 46
8
INTRODUÇÃO
O tema que abordaremos refere-se às Ações Coletivas e seus reflexos nas
relações de consumo.
A missão deste trabalho é abordar o tema das Ações Coletivas analisando
as controvérsias sobre o assunto , suas peculiaridades e nuances, os
caracteres importantes e polêmicos, tais como a sua efetividade e
aplicabilidade no Direito Brasileiro.
A presente monografia pretende situar as Ações coletivas no Direito
brasileiro, mostrando sua evolução histórica , abordando a questão dos
interesses ou direitos difusos, abordando suas definições e distinções, a
fixação da competência, os critérios de determinação e também quanto aos
danos ocorridos em nível regional ou nacional.
Será também analisada a natureza da legitimação na proteção jurisdicional
coletiva, as atribuições do Ministério Público, e das associações .
E por fim abordaremos os problemas referentes à litispendência e á coisa
julgada.
9
CAPÍTULO I
ORIGEM E EVOLUÇÃO HISTÓRICA
ORIGEM DAS AÇÕES COLETIVAS
A maioria da doutrina costuma identificar a origem das ações coletivas
no século XVII como uma variante do bill of peace, era uma espécie de
autorização para processamento de uma ação individual, e era concedida
quando o autor requeria que o provimento englobasse os direitos de todos que
estivessem envolvidos no litígio, tratando da questão de maneira uniforme,
evitando assim a multiplicação de processos.
Bills of peace eram requeridos quando um proprietário buscasse
reivindicar dos arrendatários terras comuns da vila para atender a seus
propósitos, ou quando o vigário litigava com sues fiéis sobre dízimo. Em tais
situações, cada membro da comunidade tinha os mesmos interesses em jogo
e na mesma medida dos demais. Portanto era uma óbvia perda de tempo
apresentar as mesmas questões de fato e de direito em ações separado.
O direito estava estruturado para atender demandas de cunho do tipo “
Tício x Caio”, somente os direitos subjetivos eram contemplados pela norma
jurídica, ficando de fora certos interesses que,por ser inviável a apropriação
individual como por exemplo a pureza das águas, acabavam sendo
desconsiderados.
Nas palavras de Rodolfo de Camargo Mancuso1 :
O “primeiro passo para a revelação desses interesses difusos, deu-se
com o advento da Revolução industrial e a conseqüente constatação de que os
valores tradicionais, individualistas do século XIX, não sobreviveriam muito
tempo, sufocado ao peso de uma sociedade de massa..... Nessa sociedade
10não há lugar para o homem enquanto individuo isolado;ele é tragado pela
roda-viva dos grandes grupos que compõem a sociedade: não há mais a
preocupação com as situações jurídicas individuais, o respeito ao indivíduo
enquanto tal, mas ao contrário, indivíduos são agrupados em grandes classes
ou categorias...Paralelamente à Revolução Industrial e à massificação da
sociedade, também o sindicalismo contribuiu para fazer aflorar essa ordem
coletiva: os conflitos não mais se dão entre empregados e patrão, mas
coletivamente, isto é, integrantes da força de trabalho na categoria X versus
integrantes da força-capital na categoria patronal correspondente”.
Constata-se , portanto um retorno à necessidade de que as questões
sejam tratadas de forma molecular e não atomizadas para a solução de casos
dotados de intensa, complexa e numerosa conflituosidade.
EVOLUÇÃO HISTÓRICA
Em 1950 foi editada a Lei 1134 de 1950 que estatui : as associações de
classes existentes na data da publicação desta lei, sem nenhum caráter
político, fundada nos termos do Código Civil e enquadradas nos dispositivos
constitucionais, que congreguem funcionários ou empregados de empresas
industriais da União, administradas ou não por elas, dos Estados, dos
Municípios e das entidades autárquicas, de modo geral, é facultada a
representação coletiva ou individual de seus associados, perante as
autoridades administrativas e a justiça ordinária.
Da mesma maneira, o antigo Estatuto da Ordem dos Advogados do
Brasil, pela Lei 4215/63 estabelecia em seu artigo 1º , parágrafo único: Cabe à
ordem representar, em juízo ou fora dele, os interesses gerais de classe dos
advogados e os individuais, relacionados com e exercício da profissão.
A Constituição da República de 1934 em seu artigo 113 dispunha que:
Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a declaração de nulidade ou
anulação dos atos lesivos do patrimônio da União, dos Estádios e dos
Municípios. Era a chamada Ação Popular, que foi regulamentada pela Lei
4717/65.
1 Interesses difusos, conceitos e legitimação para agir, p.81
11Em 24 de julho de 1985 foi sancionada a Lei da Ação Civil Pública,
disciplinando a ação civil pública de responsabilidade por danos causados ao
meio ambiente, ao consumidor e a bens e direitos de valor artístico, estético,
histórico, turístico e paisagístico.
Com a promulgação da Constituição da República, em 1988, novos
valores sociais foram inseridos em diversos dispositivos normativos.
A nova Constituição em seu artigo 5º,inciso XXI conferiu legitimação às
entidades associativas, quando expressamente autorizadas, para representar
seus filiados, judicial ou extrajudicialmente. O artigo 8º estatui que cabe ao
sindicato a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da
categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas.
Observamos também que o artigo 48 do Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias determinou que o Congresso elaborasse o Código
de Defesa do Consumidor, prazo que efetivamente não foi respeitado.
Com o escopo de dar cumprimento ao disposto no artigo 48 do Ato das
Disposições Constitucionais Transitórias foi constituída Comissão Mista do
Congresso Nacional que realizou a consolidação dos projetos existentes e foi
publicado em 04 de novembro de 1989, e que foi aprovado em julho de 1990,
resultando na Lei 8078/90, entrando em vigor em 11/03/1991, ou seja O
Código de Defesa do Consumidor, que passou a representar o modelo
estrutural para as ações coletivas no Brasil, sendo aplicado não somente para
os processos relacionados com a proteção do consumidor em juízo, mas
também, em geral, para a defesa dos direitos e interesses difusos, coletivos e
individuais homogêneos.
O Código de Defesa do Consumidor regula os aspectos mais
importantes da tutela jurisdicional coletiva, é com base nesta Lei que
trataremos deste presente trabalho.
Não esquecendo de relacionar as seguintes leis: 8625/93, 8884/94, lei
complementar 75, 8437/92, 9494/97, 9870/99, leis extravagantes que tratam
das ações coletivas, enquanto o Código de Processo em nada regula o
instituto, exceto a previsão contida no artigo 6º.
12O Código de Defesa do Consumidor permite a proteção em larga
medida dos consumidores, através das ações coletivas e das ações civis
públicas. É por seu intermédio que o consumidor poderá ser protegido, mas
aos poucos se começa a ter consciência da importância da ação coletiva, quer
propostas pelo Ministério Público ou pelas Associações de Defesa do
Consumidor.
O CDC permite a proteção dos consumidores mediante ações coletivas
e ações civis públicas. È através destas que o consumidor deverá ser
protegido.
A LEI 8078/90, malgrado apresentar uma série de direitos subjetivos
individuais dos consumidores, preocupa-se primordialmente com a proteção
coletiva, ou seja, com a coletividade de consumidores.
A constituição Federal faz referencia aos direitos difusos e coletivos no
artigo 129 inciso III , in verbis:
Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos;
A lei 8078/90 faz esta definição no artigo 81, in verbis:
Art. 81. A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo. Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de: I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato; II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base; III - interesses ou direitos individuais homogêneos assim entendidos os decorrentes de origem comum.
13
CAPÍTULO II
PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS E A TUTELA JURISDICIONAL
DOS INTERESSES TRANSINDIVIDUAIS
A Constituição Federal de 1988 trouxe um rol de princípios que visam a
tutela de interesses, direitos e deveres individuais e coletivos. O legislador
constituinte fez referência aos direitos do consumidor entre os direitos e as
garantias fundamentais , e nos princípios gerais da atividade econômica ,
visando conceituar, proteger e garantir os direitos individuais ou coletivos
daqueles que a lei infraconstitucional qualificou como vulneráveis e
hipossuficientes.
O objetivo é proteger o cidadão garantindo-lhe o pleno exercício de seus
direitos fundamentais, seja a título individual ou coletivo, e conter o abuso do
poder econômico, que faz com que esses direitos sejam preteridos em relação
aos interesses do capital, que, segundo a doutrina consumerista, tem nos
fornecedores de produtos e serviços o conhecimento técnico e o poderio
financeiro que os consumidores dificilmente terão nas relações de consumo.
Daí a necessidade de uma tutela protetiva ampla, garantidora dos direitos dos
consumidores em sua plenitude, e ampliadora das possibilidades do acesso à
justiça, seja em caráter individual ou coletivo.
A defesa dos interesses coletivos em juízo pode se dar mediante
substituição, que deve ser voluntária, sob pena de ferir as garantias e direitos
fundamentais do cidadão de acesso à justiça e o direito de não ser obrigado a
associar-se ou permanecer associado, os direitos do consumidor, por atingirem
patamar constitucional de cláusula pétrea, atingem o status de princípios e,
como tais, devem ter prevalência num sopesamento com outras espécies de
normas ou até mesmo de princípios divergentes.
14As relações de consumo, além de terem caráter individual ou coletivo
lato sensu, podem requerer a tutela jurisdicional contra atos praticados pelo
Poder Público (consumidor de serviço público) ou por fornecedores de bens e
serviços de caráter privado. O consumidor tem previsto no texto legal a sua
vulnerabilidade, mas a sua hipossuficiência deve ser reconhecida em juízo, em
face do não conhecimento técnico ou meramente cultural a respeito da relação
de consumo invocada.
A defesa dos interesses do consumidor em juízo deve ser ampliada ao
máximo, a fim de não existirem disparidades injustas no sopesamento entre
regras e princípios que regerão o decisum. A inversão do ônus da prova nos
processos que versem sobre relações de consumo é fruto direto da
responsabilidade objetiva do fornecedor, seja este privado ou o próprio Estado,
e, juntamente com a regra da proporcionalidade, deve ser aplicado nas
decisões jurídicas a fim de garantir: o princípio da lealdade processual; do
interesse público e a correlata subordinação das ações estatais ao princípio da
dignidade da pessoa humana; da proporcionalidade e da adequação axiológica
e da simultânea vedação de excesso e de inoperância, ou omissões
causadoras de sacrifícios desnecessários e inadequados; da segurança
jurídica; da legitimidade; da ampla e irrestrita tutela jurisdicional a fim de
resguardar direitos lesados ou ameaçados de lesão.
15
CAPÍTULO III
INTERESSES OU DIREITOS DIFUSOS, COLETIVOS E
INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS
Direitos transindividuais: Os direitos transindividual, metaindividuais
ou coletivos lato sensu compõem-se dos direitos coletivos stricto sensu, dos
difusos e dos direitos individuais homogêneos, diferenciando-se entre si.
Os direitos coletivos stricto sensu :são os interesses transindividuais
indivisíveis de um grupo determinado ou determinável de pessoas, reunidos
por uma relação jurídica básica comum. Assim, o dano decorre da própria
relação jurídica que une todo o grupo. Por exemplo, uma determinada revenda
de automóveis vende os seus produtos, contratando com o consumidor através
de um contrato de adesão que contém uma cláusula abusiva. Em virtude disso,
todos os consumidores que contrataram restaram lesados, podendo
determinar quais pessoas compraram na referida revenda, mas não sendo
possível afirmar qual a mensuração do dano causado àquelas pessoas.
Os direitos difusos: são interesses transindividuais, de natureza
indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por
circunstância de fato. Por exemplo, uma determinada indústria, instalada em
uma zona urbana, expele uma grande quantidade de gases tóxicos, poluindo o
meio ambiente. Não se pode determinar quantas e quais pessoas foram
efetivamente lesadas pela poluição, conseqüentemente, não será possível,
também, mensurar o dano causado a cada pessoa individualmente.
Os direitos individuais homogêneos: são os interesses de grupo,
categoria ou classe de pessoas determinadas ou determináveis, que
compartilhem prejuízos divisíveis, de origem comum, normalmente oriundos
das mesmas circunstâncias de fato. Por exemplo, uma determinada loja de
veículos vende um automóvel com defeito de série. Todos os compradores
16desse bem restaram lesados pelo fato, podendo determinar-se quantas e quais
pessoas sofreram com o dano, sendo possível, também, mensurar o dano
causado a cada pessoa individualmente.
Origem comum : São coisas, interesses, direitos, que advém da
mesma “fonte”, ex: contrato de trabalho, contrato de adesão, etc.
Os direitos coletivos lato sensu: Possuem uma proteção especial em
juízo, diversificando da proteção dada aos direitos individuais, uma vez que o
processo civil brasileiro preocupa-se, precipuamente, com estes direitos, não
positivando a defesa necessária aos outros direitos humanos.
Portanto há institutos próprios para a defesa dos direitos transindividuais
em juízo, como, a Lei n.º 7.347/85, que instituiu a Ação Civil Pública, a Lei n.º
7.853/89, que protege os portadores de deficiência, Lei n.º 7.913/89, que
protege os investidores no mercado de valores mobiliários, a Lei n.º 8.069/90,
que protege as crianças e adolescentes, a Lei n.º 8.078/90, que protege o
consumidor, a Lei n.º 8.884/94, que protege as pessoas atingidas por danos à
ordem econômica e a economia popular e a Lei n.º 10.257/01, que protege à
ordem urbanística.
A ação protetiva dos direitos metaindividuais em juízo é a Ação Civil
Pública, que também será abordada nesse trabalho.
Os direitos difusos: Dentre os interesses transindividuais descritos no
parágrafo único do art. 81 do CDC, o primeiro arrolado refere-se aos direitos
ou interesses difusos, como sendo "os transindividuais de natureza indivisível,
de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de
fato".
Um exemplo de interesses difusos, é a da propaganda enganosa ou
abusiva, prevista nos arts. 6o, IV e 37 do CDC, que atinge um número
indeterminado de pessoas, sendo que seus efeitos são igualmente
indetermináveis em relação aos espectadores como um todo. Como destacar
exatamente quais as pessoas lesadas por uma propaganda enganosa? A
única maneira seria constatando quais, entre os espectadores, consumiram o
produto cuja informação falsa fora veiculada na propaganda, mas, nesse caso,
passaria de interesse difuso para interesse individual homogêneo.
17A propaganda, segundo o CDC, pode ser enganosa ou abusiva. É
"enganosa qualquer modalidade de informação ou comunicação de caráter
publicitário, inteira ou parcialmente falsa, ou, por qualquer outro modo, mesmo
por omissão, capaz de induzir em erro o consumidor a respeito da natureza,
características, qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço e
quaisquer outros dados sobre produtos e serviços" e "abusiva, dentre outras, a
publicidade discriminatória de qualquer natureza, a que incite à violência,
explore o medo ou a superstição, se aproveite da deficiência de julgamento e
experiência da criança, desrespeite valores ambientais, ou que seja capaz de
induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua
saúde ou segurança".
Tanto a pessoa que somente assistiu à propaganda, como aquela que
comprou o produto o qual a propaganda erroneamente descrevera, como
todas as pessoas atingidas pelo vício ou fato do produto comprado em função
do anúncio veiculado são considerados consumidores lesados e detentores de
uma pretensão jurídica fruto de um interesse difuso. Porém, não se pode
determinar exatamente até que ponto cada pessoa foi atingida pela
propaganda abusiva ou enganosa, nem mesmo exatamente quem foi atingido
e de que maneira específica isso ocorreu. Tal caso é, exatamente, exemplo de
interesses difusos como descrito pelo CDC.
O parágrafo único do art. 2º do CDC, ampliando o conceito de
consumidor, descreve como consumidor equiparado, e, portanto, detentor de
direitos e interesses referentes às práticas abusivas ocorridas em relações de
consumo, "a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja
intervindo nas relações de consumo.
Interesses coletivos: O CDC descreve como sendo "interesses ou
direitos coletivos, assim entendidos, [...] os transindividuais, de natureza
indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas
entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base" . As
características dos interesses coletivos, assim como os difusos, levam em
conta, respectivamente, a divisibilidade do interesse (interesses de natureza
indivisível), um grupo de indivíduos determinados atingidos (categoria ou
18classe de pessoas ligadas entre si ou com parte contrária) e a origem da lesão
ou da ameaça de lesão a direito (ligadas por uma relação jurídica base).
Para individualizar o dano ocorrido em face de um interesse coletivo
stricto sensu pleiteado em juízo de forma coletiva, se faz necessária a
respectiva liquidação de sentença, a ser pleiteada individualmente por cada um
dos interessados que fizeram parte do pólo ativo do processo de conhecimento
coletivo. Dessa maneira, somente, um interesse coletivo pode ter identificados
os interesses individuais de cada uma das partes atuantes na demanda,
caracterizando, assim, a presença de interesses individuais homogêneos.
Interesses individuais homogêneos: Para o CDC, interesses
individuais homogêneos são aqueles de grupo, categoria ou classe de pessoas
determinadas ou determináveis, que compartilhem prejuízos divisíveis,
Na acepção do termo, os interesses individuais homogêneos são
aqueles individualizáveis consoante o direito concernente a cada componente
de um grupo definido, cujas partes estão solidamente ligadas pela mesma
natureza.
Segundo GRINOVER :
A origem comum pode ser de fato ou de direito e, como observou Kazuo Watanabe, a expressão não significa, necessariamente, uma unidade factual e temporal. As vítimas de uma publicidade enganosa veiculada por vários órgãos de imprensa e em repetidos dias de um produto nocivo à saúde adquiridos por vários consumidores num largo espaço de tempo e em várias regiões têm, como causa de seus danos, fatos de uma homogeneidade tal que os tornam a ‘origem comum’ de todos eles.
Humberto THEODORO JÚNIOR diz que2 :
Os interesses individuais homogêneos tanto podem ser tutelados individualmente, em ações movidas pelo ofendido, como coletivamente, em ações de grupo, como aquelas promovidas por sindicatos e associações.
Um exemplo já citado de interesses individuais homogêneos é o do
consumidor que comprou um produto cuja propaganda descrevia
2 THOEDORO JÚNIOR,Humberto.Direitos do Consumidor, a busca de um ponto de equilíbrio entre as garantias do Código de Defesa do Consumidor e os princípios gerais do Direito Civil e do Direito Processual Civil.4ª ed.,Rio de Janeiro:Forense, 2004.
19erroneamente uma qualidade, ou não informava sobre seu caráter nocivo à
saúde. Todos os consumidores que compraram o produto em função da
veiculação do comercial enganoso possuem um interesse individualizável, pois
aquele que comprou apenas um produto terá o interesse diferente daquele que
comprou dois e assim sucessivamente. Da mesma maneira, quem comprou
um produto que ainda não ocasionou o fato danoso decorrente de seu defeito
oculto terá pretensões diversas daquele cujo produto comprado ocasionou um
fato danoso. "Cada indivíduo lesado tem direito próprio a exercitar
individualmente contra o fornecedor" , nos casos de direitos individuais
homogêneos.
20
CAPÍTULO IV
AS AÇÕES COLETIVAS PREVISTAS NO CÓDIGO DE
DEFESA DO CONSUMIDOR E LEIS ESPARSAS
As ações coletivas previstas no CDC: Estas ações prestam-se
basicamente à defesa de interesses transindividuais, quais sejam, difusos,
coletivos e individuais homogêneos. Por meio delas, alguns legitimados
substituem processualmente a coletividade de lesados (legitimação
extraordinária). A ação coletiva visa a celeridade e a economia processual,
bem como a facilitação da instrução e da fase probatória do processo, que
ficariam excessivamente penosos, tanto para as partes como para o órgão
instrutor, se o exercício da tutela jurisdicional se desse individualmente a todos
os interessados.
Os direitos coletivos lato sensu, ao terem a tutela jurisdicional exercida
em ações coletivas, diminuem a possibilidade da desistência de indivíduos
frente às dificuldades e burocracias do procedimento processual, o que, em
caráter individual, pode se tornar comum, caracterizando uma restrição do
princípio do acesso à justiça.
O CDC trata das ações coletivas para a defesa dos interesses
individuais homogêneos nos arts. 91 a 100, segundo os quais "os legitimados
de que trata o art. 82 poderão propor, em nome próprio e no interesse das
vítimas ou seus sucessores, ação civil coletiva de responsabilidade pelos
danos individualmente sofridos" . Cria, portanto, um novo instituto processual,
que é a ação civil coletiva.
O procedimento da ação civil coletiva do CDC refere-se aos casos de
defesa de interesses individuais homogêneos que, como tais, precisam ter
individualizadas as indenizações pelos danos sofridos segundo a gravidade em
que cada integrante do grupo foi atingido, através de liquidação de sentença,
bem como a sua conseqüente execução. As demais possibilidades dos casos
21que tratam de interesses difusos e coletivos além da previsão do CDC, serão
regidas pelas leis que tratam da ação civil pública e da ação popular.
Para o CDC, a legitimidade ativa para a propositura de ações coletivas é
concorrente entre o MP, a União, os Estados, os Municípios, o Distrito Federal,
certas entidades e órgãos da administração pública direta ou indireta e as
associações civis que tenham por fim a defesa dos interesses de
consumidores.
Os interesses individuais homogêneos, ao contrário dos difusos e dos
coletivos, não necessitam ser exercidos em juízo de maneira coletiva, e, caso
se requeira individualmente a tutela jurisdicional, a pré-existência de uma ação
coletiva não induz a litispendência.
Em relação aos interesses coletivos e aos difusos, esses também
podem ser exercidos em juízo a título coletivo sem que induzam litispendência
ao exercício individual da tutela jurisdicional, pelo fato de, em ambos os casos,
serem indivisíveis.
A letra do CDC, no art. 95, diz que "em caso de procedência do pedido,
a condenação será genérica, fixando a responsabilidade do réu pelos danos
causados", sendo, assim, individualmente indeterminada.
A sentença declara o requerido responsável pelo dano causado a um
grupo de autores e, conseqüentemente, condena-o a indenizá-los por isso de
maneira genérica. O quantum indenizatório a cada um dos autores dependerá
de liquidação em processo autônomo e de caráter individual, bem como sua
execução, eis que impossível uma execução coletiva para este caso previsto
no CDC.
Prova da intenção do CDC em promover a economia e a celeridade
processual também está no seu art. 94, que amplia as possibilidades de
atuação no pólo ativo da relação jurídica em processo coletivo, dizendo que,
"proposta a ação, será publicado edital no órgão oficial, a fim de que os
interessados possam intervir no processo como litisconsortes, sem prejuízo de
ampla divulgação pelos meios de comunicação social por parte dos órgãos de
defesa do consumidor". Abre-se, dessa maneira, espaço para o ingresso de
interessados individuais na mesma condenação genérica, mas sem que estes
22possam formular pedidos individualizados e diversos da inicial proposta pelo
coletivo.
Em relação à coisa julgada em ações coletivas regidas pelo CDC, esta
terá eficácia erga omnes nos casos de interesses difusos, exceto "se o pedido
for julgado improcedente por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer
legitimado poderá intentar outra ação, com idêntico fundamento, valendo-se de
nova prova" . Terá, porém, em casos de interesses coletivos stricto sensu,
eficácia "ultra partes, mas limitadamente ao grupo, categoria ou classe, salvo
improcedência por insuficiência de provas", nos termos do inciso I do art. 103
Tratando-se de interesses individuais homogêneos, a coisa julgada em
processos coletivos terá eficácia "erga omnes, apenas no caso de procedência
do pedido, para beneficiar todas as vítimas e seus sucessores" . "Em caso de
improcedência do pedido, os interessados que não tiverem intervindo no
processo como litisconsortes poderão propor ação de indenização a título
individual" , em face do já referido caráter individual do interesse juridicamente
pleiteado. Portanto, o réu que lesou direitos individuais homogêneos poderá
figurar no pólo passivo de qualquer ação proposta individualmente por pessoa
que, mesmo não tendo figurado na ação coletiva que o condenou, é titular de
um interesse individual idêntico ao do grupo, evitando, assim, a necessidade
de novo processo de conhecimento e de nova instrução processual sobre fato
já apreciado e comprovado judicialmente.
A Ação Popular: Qualquer cidadão é legitimado para propor a Ação
Popular, a fim de pleitear a anulação ou declaração de nulidade de atos lesivos
ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios, de
entidades autárquicas, de sociedades de economia mista ou mútuas de seguro
nas quais a União represente os segurados ausentes, de empresas públicas,
de serviços sociais autônomos, instituições ou fundações . A pessoa jurídica,
por sua vez, não tem legitimidade para propor ação popular.
O autor popular não defende interesse próprio mas sim o da
comunidade.
O Ministério Público necessariamente deve atuar como custus legis na
ação popular.
23O pedido, na ação popular, deve limitar-se à anulação de ato lesivo ao
patrimônio público, à moralidade administrativa, ao meio ambiente ou ao
patrimônio cultural, casos em que o interesse predominante é difuso ou
coletivo, mas jamais será o individual homogêneo.
A Ação Civil Pública: A Lei nº 7.347 de 1985, conhecida como Lei da
Ação Civil Pública (LACP), surgiu com a finalidade de disciplinar a ação civil
pública de responsabilidade por danos patrimoniais e morais causados ao
meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico,
estético,histórico, turístico e paisagístico, sem prejuízo da ação popular.
A LACP e o CDC se complementam, a ponto de ambas disporem do
mesmo dispositivo procedimental sendo que o CDC, por ser lei ulterior, alterou
de forma substancial o texto original da primeira. Tanto que os arts. 110 a 117
do CDC servem com o único propósito de alterar o texto da LACP.
Diferentemente da ação popular, a ação civil pública poderá ter por
objeto tanto a condenação em dinheiro como o cumprimento de obrigação de
fazer ou não fazer , bem como não é permitido ao cidadão comum ser autor da
ação, mas somente os entes descritos no CDC .
Com relação aos efeitos da coisa julgada em ações civis públicas, de
que cuida o art. 16 (erga omnes nos limites da competência territorial do órgão
prolator, exceto se improcedente o pedido por insuficiência de provas),
combinado com o art. 13 da LACP, não prejudicarão as ações de indenização
por danos pessoalmente sofridos, propostas individualmente ou na forma
prevista no CDC, mas, se procedente o pedido, beneficiarão as vítimas e seus
sucessores, que poderão proceder à liquidação e à execução, nos termos dos
arts. 96 a 99 da lei de proteção ao consumidor.
ARAÚJO FILHO comenta3:
Como o CDC é posterior à LACP, e estabeleceu, entre nós, um inédito sistema processual para as ações coletivas para tutela de interesses individuais homogêneos, suprindo uma carência da Lei da Ação Civil Pública, que estava originariamente voltada às ações relativas aos direitos difusos e coletivos, parece-nos que não pode haver dúvida de que hoje é o art. 103, inciso III, do CDC que rege os efeitos da coisa julgada naquele tipo
3 ARAÚJO FILHO, Luis Paulo da Silva.Ações Coletivas: a tutela jurisdicional dos direitos individuais homogêneos.Rio de Janeiro: Forense, 2000.
24de ação coletiva, até por uma relação de especialidade desta última norma (lex specialis derogat generali).
Em anterior referência ao art. 103, III do CDC, ressalte-se que o mesmo
descreve a eficácia da coisa julgada para os casos de ações que versarem
sobre direitos individuais homogêneos como sendo erga omnes apenas no
caso de procedência do pedido, para beneficiar todas as vítimas e seus
sucessores, e não beneficiarão os autores das ações individuais, se não for
requerida sua suspensão no prazo de trinta dias, a contar da ciência nos autos
do ajuizamento da ação coletiva .
Por se complementarem subsidiariamente, o CDC e a LACP abrangem
na totalidade a tutela jurisdicional que visa proteger os interesses coletivos lato
sensu. Se, no CDC, o procedimento tem descrito no seu título a defesa dos
interesses individuais homogêneos, na LACP a previsão abrange os interesses
difusos e coletivos. "
Legitimidade Ativa para propositura de Ações ColetivasA norma do artigo 82 do CDC rege a legitimidade para o ingresso das
ações coletivas, conforme transcrição abaixo:
O artigo 127 da Constituição Federal , in verbis:
Art. 127. O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.
Também no artigo 129 Constituição Federal existe um rol de funções
atribuídas ao Ministério Público, em especial, as constantes nos incisos II, III e
IX, que ora transcrevemos:
Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:II - zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia;III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos;IX - exercer outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis com sua finalidade, sendo-lhe vedada a representação judicial e a consultoria jurídica de entidades públicas.
25
Portanto, em qualquer situação de fato seja envolvendo problemas de
consumidores, do meio ambiente, do patrimônio histórico, turístico e
paisagístico , estará o Ministério Público autorizado a intentar as ações
necessárias à coibição de eventuais abusos, conforme o disposto nos artigos
83 e 117 do CDC.
A legitimidade das entidades no caso das ações coletivas para proteção
dos direitos difusos e coletivos é autônoma , não se tratando de substituição
processual.
A legitimidade das entidades no caso das ações coletivas para a defesa
dos direitos individuais homogêneos é extraordinária, configurando caso de
substituição processual, conforme determinação expressa no artigo 82 da Lei
8078/90 e consonância com a regra do artigo 6º do CPC
Legitimidade do Ministério Público para a defesa das questões
de massa
Conforme já consignado no inciso I do artigo 82 do CDC, o Ministério
Público dispõe de legitimidade para defesa dos direitos individuais
homogêneos, dos direitos difusos e dos direitos coletivos, segundo os artigos
127 e 129 da Carta Magna.
26
CAPÍTULO V
A COMPETÊNCIA NAS AÇÕES COLETIVAS
Consoante dispõe o art. 2º da LACP, as Ações Civis Públicas serão
propostas no foro onde ocorrer ou deva ocorrer o dano, cujo juízo terá
competência funcional, portanto, absoluta, para o conhecimento e julgamento
da demanda.
Já em seu parágrafo único – introduzido pela MP 2.180 – dispõe a lei
que a propositura da ação prevenirá a jurisdição (rectius: competência) do juízo
para as demais demandas que sejam idênticas.
Por outro lado, a definição do local do dano como determinação da
competência do juízo tem por fim, sob o aspecto prático, a facilitação na
colheita de provas, visto que o Juiz estará mais perto – e, por conseqüência,
terá maior facilidade na sua captação e entendimento – dos indícios oriundos
da probabilidade da ocorrência do dano e dos vestígios deixados pelo dano
efetivamente causado.
Daí que, com a introdução do parágrafo único ao art. 2º pela MP 2.180,
se os efeitos do dano (potencial ou efetivo) transbordarem dos limites de uma
comarca, ou até mesmo de um Estado-membro, competente será – nas Ações
Civis Públicas, repise-se – aquele juízo onde ocorrer a primeira citação válida,
segundo as regras insertas no Código de Processo Civil sobre prevenção (art.
219).
Frise-se que, em se tratando de Ação Civil Pública, em hipótese alguma,
não importando a dimensão que os efeitos do dano possam alcançar, será
competente o foro da Capital do Estado ou o Distrito Federal, e sim, como dito,
o juízo, dentre somente as comarcas envolvidas, que primeiro realizar citação
válida, simplesmente por inexistir norma jurídica que de forma diversa o
preveja, e, ao revés, haver comando legal que assim o determine.
Desta forma, um dano ambiental que envolva os Estados de Minas
Gerais e Rio de Janeiro – como recentemente de fato ocorreu – competente
27será o juízo da comarca que primeiro realizou a citação válida para o
conhecimento e julgamento da Ação Civil Pública eventualmente proposta,
independentemente do Estado a que pertença tal comarca, não havendo que
se falar em competência da Comarca da Capital de uma das entidades
federadas, caso não esteja envolvida pelos efeitos do dano. E mesmo neste
caso – de ser a Comarca da Capital de um dos Estados ou de ambos atingida
pelos efeitos danosos – esta somente será sede do juízo competente se
citação válida foi realizada antes de qualquer outro, o que a tornará preventa.
Em se tratando de relações jurídicas de consumo cujo objeto imediato
do pedido seja a condenação ao pagamento de determinada quantia, aplicável,
aí sim, o CDC, mais especificamente o seu art. 93 no que concerne à
competência, em razão do princípio da especialidade, ficando afastada a
incidência da Lei de Ação Civil Pública.
De efeito, sendo o Código de Defesa do Consumidor lei posterior e
especial no cotejo com a norma que instituiu a Ação Civil Pública, pensamos
que aquela derrogou esta no que diz respeito à defesa dos interesses difusos,
coletivos e individuais homogêneos nas relações jurídicas de consumo. Isto
porquanto, segundo os ditames do parágrafo 1º do art. 2º da Lei de Introdução
ao Código Civil (LICC), lei posterior – acrescentamos, de mesma ou superior
hierarquia – derrogará anterior quando regule inteiramente a matéria de que
tratava esta.
A inaplicabilidade da LACP somente ocorrerá quando se pleitear a
condenação do Réu ao pagamento de determinada quantia. A contrario sensu,
quando o pedido imediato da demanda for a condenação em obrigação de
fazer ou não fazer será perfeitamente viável a utilização da Ação Civil Pública,
consoante determina o artigo 83 do CDC.
Assim, tratando-se de relação jurídica material de consumo, aplicável
sempre o CDC, devidamente subsidiado pela LACP e pelo CPC – nesta ordem
– naquilo em que for omisso. Desta forma, inapropriada a utilização de Ação
Civil Pública quando se tratar de violação a direito consumerista, ressalvado o
que dissemos supra.
28Tal raciocínio ficará mais patente no que diz respeito à competência,
pois, como afirmado, não há na LACP, ao contrário do que ocorre no CDC,
determinação daquela em razão do âmbito alcançado pelos efeitos do dano.
Em suma, forçoso admitir que, em se tratando de Ação Civil Pública,
nos casos de competência concorrente entre dois ou mais juízos, determinar-
se-á aquela pela prevenção em quaisquer casos, não havendo de se cogitar da
amplitude dos efeitos do dano perpetrado.
Sem embargo, nas Ações Coletivas previstas no CDC, repete o
legislador ser o dano causado o critério legitimador da competência do juízo,
porém com algumas nuanças, in verbis:
Art. 93 – Ressalvada a competência da Justiça Federal, é competente para a causa a justiça local:I – no foro do lugar onde ocorreu ou deva ocorrer o dano, quando de âmbito local;II – no foro da Capital do Estado ou no do Distrito Federal, para os danos de âmbito nacional ou regional, aplicando-se as regras do Código de Processo Civil aos casos de competência concorrente .
Competência em Caso de Dano em Âmbito Local
Consoante o dispositivo transcrito, ressalvada a competência da Justiça
Federal, será competente para o conhecimento e julgamento da Ação Coletiva
a Justiça local do foro do lugar onde ocorreu ou deva ocorrer o dano.
Assevera a Profª. Grinover , ao comentar o artigo 93,I do CDC
Quando de âmbito local, a competência territorial é do lugar onde ocorreu ou deva ocorrer o dano (inc. I do art. 93).Será o caso de danos mais restritos, em razão da circulação limitada de produtos ou da prestação de serviços circunscritos, os quais atingirão pessoas residentes num determinado local.
A interpretação literal do preceptivo presente no inciso I do art. 93 do
CDC poderá levar o intérprete à conclusão de que, transbordando os efeitos do
dano dos limites de determinada comarca e alcançando outra, competente
será o foro da Capital do Estado.
Não obstante, tendo em vista que a eleição pela lei do local da
ocorrência ou da possibilidade de ocorrência do dano tem por escopo, dentre
outros, maior aproximação do Juiz aos vestígios do dano causado, bem como
29a facilidade na colheita de sua prova, pensamos que será aplicável, por
subsidiariedade, a norma presente no parágrafo único do art. 2º da LACP.
Assim, ocorrido o dano consumerista cujos efeitos ultrapassem as
fronteiras de determinada comarca, alcançando outra ou outras, a
determinação da competência será realizada pela prevenção, ou seja,
competente será o juízo que primeiro realizar citação válida no processo (art.
219 CPC).
Urge ressaltar, entretanto, que, aqui, estamos tratando de dano de
âmbito local cujos efeitos, não obstante, transbordaram dos limites de uma
única comarca, alcançando outras. Em outras palavras, não estamos tratando
de dano onde os respectivos efeitos ganharam foros de regionalidade ou
nacionalidade, hipóteses expressamente previstas no inciso II do artigo sob
comento.
Para que seja determinada a competência da Capital do Estado, o dano
deverá ganhar foro de regionalidade e, evidentemente, o fato de serem
atingidas uma, duas ou três comarcas não caracterizará tal aspecto,
resolvendo-se, neste caso, pelas regras da Lei de Ação Civil Pública (art. 2º,
parágrafo único) combinada com Código de Processo Civil (art. 219) a
competência concorrente, quais sejam, as regras que prevêem a prevenção.
Em um caso concreto, poderemos imaginar um dano consumerista
cujos efeitos restrinjam-se a duas comarcas contíguas, cuja localização diste
quilômetros da Capital do Estado. Conseqüentemente, seguindo o disposto no
inciso I do art. 93 do CDC, com a subsidiariedade da LACP e do CPC,
competente será o juízo que primeiro realizou a citação válida para o
processamento e julgamento da demanda.
Assim, em compêndio, para o dano de âmbito local cujos efeitos
atinjam mais de uma localidade (comarca), sem que possuam dimensão de
regionalidade, a determinação da competência restará condicionada à
prevenção do juízo que primeiro realizou a citação válida no processo.
30Competência em Caso de Dano em Âmbito Regional ou Nacional
Assevera Grinover4 sobre o inciso ora estudado:
Cabe, aqui, uma observação: o dispositivo tem que ser entendido no sentido de que, sendo de âmbito regional o dano, competente será o foro da Capital do Estado ou do Distrito Federal. Mas, sendo o dano de âmbito nacional, a competência territorial será sempre do Distrito Federal:isso para facilitar o acesso à Justiça e o próprio exercício do direito de defesa por parte do réu, não tendo sentido que seja ele obrigado a litigar na Capital de um Estado, longínquo talvez de sua sede, pela mera opção do autor coletivo. As regras de competência devem ser interpretadas de modo a não vulnerar a plenitude da defesa e o devido processo legal.
Competência em Caso de Dano em Âmbito Regional
Tratando-se de dano cujos efeitos sejam de âmbito regional, aplicável o
que foi dito quanto ao dano de âmbito local.
Com efeito, somente será competente para conhecimento e julgamento
da demanda coletiva a Capital do Estado quando os efeitos produzidos pelo
dano consumerista ganharem foros de regionalidade, independentemente se a
comarca da Capital do Estado sofreu ou não tais efeitos, visto que, nesta
hipótese, ante o número razoável de comarcas atingidas por aqueles efeitos,
traduzir-se-á em interesse da sociedade do Estado a resolução do conflito,
importando que a Capital seja sede da demanda face à relevância configurada
pelo vulto do dano.
Competência em Caso de Dano em Âmbito Nacional
Havendo dano de âmbito nacional, e, não sendo hipótese prevista
dentro na competência da Justiça federal, caberá à Justiça local do foro da
Capital de cada Estado ou do Distrito Federal que tenha sido atingido pelo
evento danoso o processamento e julgamento da demanda coletiva.
4 GRINOVER, Ada Pellegrini.da Class action of damagaes á ação de classe brasileira: os requisitos de asmissibilidade,in MILARÉ, Edis(Coord.).Ação Civil Pública, Lei 7347/1985 – 15 anos.2ªed., São Paulo:RT,2002.
31Os critérios de determinação de competência (ratione materiae, loci,
personae, etc.) dos Juízos Estaduais são de mesma equivalência aos do Juízo
Distrital, sendo que, cada qual, tem seu âmbito ordinário de incidência
coincidente com os seus próprios limites territoriais. Na hipótese extraordinária
de dano nacional, de competência da Justiça local, qualquer capital de Estado
ou o Distrito Federal estará, em igualdade de condições, apta(o) a conhecer e
julgar a causa.
Ou seja, para não dificultar a defesa do Réu, determina o CDC –
havendo diversas demandas coletivas propostas – a concentração em um, e
tão-somente um, foro, que poderá ser o da Capital estadual ou o do Distrito
Federal, cuja decisão proferida terá efeitos em todo território nacional.
Para o desate da questão, a própria lei determina a utilização das
regras do Código de Processo Civil aos casos de competência concorrente,
qual seja, também neste caso, a prevenção, haja vista não ocorrer relação
hierárquica entre as Justiças locais dos Estados e a do Distrito Federal.
Daí que, existindo diversas demandas já propostas, definir-se-á a
competência da Justiça local no foro da Capital do Estado – ou no do Distrito
Federal, se este for atingido pelos efeitos do dano e houver demanda coletiva
aí proposta – em que tenha havido a primeira citação válida (art. 219 CPC).
Com efeito, dispõe o inciso III do art. 19 da Constituição Federal ser
vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios criar
preferências entre si.
Concluindo: a melhor interpretação é :
Dano de âmbito local: foro do lugar onde ocorreu ou deva ocorrer o
dano; abrangendo mais de uma comarca dentro de um mesmo Estado: a
competência será concorrente, resolvendo-se pelas regras de prevenção;
abrangendo dois ou mais Estados: foro da Capital de qualquer deles,
resolvendo-se pela prevenção; abrangendo todos os Estados: foro da capital
de qualquer deles, resolvendo-se pela prevenção.
32
CAPÍTULO VI
COISA JULGADA E SEUS EFEITOS
Primeiramente, o CDC elenca, no inciso I do art. 103, a eficácia erga
omnes, estendida para todos os titulares de direitos difusos, quais sejam,
aqueles que não possuem definição quanto aos seus titulares (CDC, art. 81, I).
Tal eficácia, contudo, deixará de ser válida para todos à medida em que for
julgada a ação improcedente por insuficiência de provas. É de bom alvitre
ressaltar-se que a expressão “todos” compreende apenas aqueles legitimados
do art. 82 do CDC8, sendo para eles destinada tal norma.
Em seguida, o Código do Consumidor, no inciso II do artigo acima
citado, nomeia como sendo ultra partes o efeito estendido para aqueles
titulares de direitos chamados pela doutrina de “coletivos”, cujo titular é
encontrado na expressão de um grupo, categoria ou classe de pessoas
determinadas (CDC, art. 81, II). Na verdade, esta eficácia ultra partes deve ser
entendida como uma espécie de eficácia erga omnes, abrangendo, contudo,
um agrupamento determinado, onde a coisa julgada encontra o seu limite,
valendo para este caso, também, a regra da não-extensão da imutabilidade por
julgamento improcedente fundado em insuficiência de prova.
Por último, o legislador, no inciso III do mencionado artigo do diploma
legal já exaustivamente citado, atribui efeito erga omnes (retornando agora
com o nomen iuris primeiramente utilizado), e apenas em caso de procedência
do pedido, para as hipóteses de defesa de interesses individuais homogêneos,
constituindo-se seus titulares por pessoas cujos interesses possuam origem
comum (CDC, art. 81, III).
Tratam-se tais mudanças, portanto, de verdadeira evolução do Direito
Processual Civil brasileiro, que, é certo, comporta suas falhas, conforme vem
asseverando a doutrina, sendo, contudo, em seu conjunto, uma poderosa arma
de proteção a direitos que, pela via processual tradicional, talvez restasse
33duvidosa a efetividade da tutela dos mesmos. Parte da doutrina vem
apontando, ainda que timidamente, para uma questão de relevo em relação à
extensão erga omnes dos efeitos da coisa julgada nas ações coletivas. É que
a Lei nº 9.494/97 (antiga Medida Provisória nº 1.570/97), tratante da Ação Civil
Pública, em seu art. 16, preconiza a extensão da coisa julgada apenas nos
limites da competência territorial do órgão prolator. Desta feita, em hipótese de
sentença transitada em julgado na Justiça Federal do Rio Grande do Sul,
determinando-se a retirada de determinado medicamento que, por qualquer
motivo, não estivesse em condições de ser consumido, tendo sido o processo
iniciado por meio de Ação Civil Pública, de acordo com a norma retro referida,
a eficácia desta sentença seria restrita apenas àquele Estado, sem maiores
alcances, revelando-se, deste modo, um total absurdo.
O segundo argumento, de ordem processual, repousa na interpretação
que deve ser dada ao Código do Consumidor, em seu art. 90, cujo teor
informa-nos que a aplicação de normas referentes à Ação Civil Pública (como
é o caso da Lei nº 9.494/97), deve ser realizada apenas naquilo que não
contrariar o CDC, restando inatingíveis, pelo comando do art. 16 da Lei nº
9.494/97, as ações coletivas de consumo, cujo tratamento é diferenciado das
Ações Civis Públicas, possuindo ambas, como ponto comum, apenas o fato de
serem espécies do gênero “ação coletiva”, conforme mais acima aduzido.
Deve esta corrente de não-aplicação de tal restrição territorial à coisa julgada
prevalecer, uma vez que a Medida Provisória antecessora da Lei nº 9.494/97
foi editada apenas com o fulcro político de procurar deter os bons resultados
obtidos pelas Ações Civis Públicas que vinham obtendo, na Justiça, o
restabelecimento de diferenças salariais para o setor do funcionalismo público,
assim como atravancando os procedimentos de leilão público, amargando o
Estado, em decorrência disto, diversas derrotas judiciais, as quais iniciavam a,
financeiramente, preocupar o Poder Executivo, que, decerto, à míngua de
qualquer estudo jurídico-científico, acabou por editar a teratológica Medida
fundada no art. 62 da CF/88.
Ao estudarmos as ações destinadas à defesa de interesses
transindividuais, ressaltamos que tais interesses requerem uma concepção de
34processo diferente do tradicionalmente previsto no Código de Processo Civil
Pátrio – individualista –, em razão de algumas peculiaridades que apresentam.
Dentre os institutos processuais previstos no ordenamento processual
brasileiro que recebem tratamento diferenciado frente à disciplina normativa
das ações coletivas está o fenômeno da coisa julgada, que possui limites
subjetivos diversos dos previstos nas demandas individuais.
Antes, contudo, de verificarmos como se operam os limites acima
referidos, é mister entender como se processa a coisa julgada no processo civil
tradicional.
Da Coisa julgada: nas Ações Coletiva O artigo 103, que define os
efeitos da coisa julgada, está diretamente ligado as 3 hipóteses do parágrafo
único do art. 81 que define respectivamente, direitos difusos, coletivos e
individuais homogêneos.
Coisa julgada nas ações coletivas de proteção ao direito difusos: O
efeito da coisa julgada na Ação Coletiva de proteção a direito difuso será erga
omnes, isto é, valerá para todas as pessoas se a ação for julgada procedente
ou improcedente pela análise de mérito com provas adequadamente
produzidas. Na hipótese de procedência todos os consumidores se
aproveitarão da sentença definitiva, inclusive para fazer pleitos individuais.
No caso de improcedência, o que está impedida é a propositura de nova
ação coletiva. Mas não fica impedido o ajuizamento de ações individuais.
A coisa julgada na Ação coletiva negativa não atinge o consumidor
individual: Coisa julgada nas Ações Coletivas de proteção aos direitos
coletivos: Efeito “ultra partes”. O sentido de ultra partes é o de estender os
efeitos da coisa julgada a todos os consumidores integrantes do grupo,
categoria ou classes, quando a ação visar a proteção dos chamados direitos
coletivos previstos no inciso II do parágrafo único do art. 82 do CDC.
Se a ação for julgada improcedente com avaliação das provas
produzidas da mesma maneira o efeito é ultra partes e impede a propositura
de nova ação coletiva, ma não fica impedido o ajuizamento de ações
individuais.
35Efeitos da improcedência por insuficiência de provas: Neste caso, a
sentença não produz efeitos e poderá a ação novamente ser proposta por
qualquer dos legitimados do art. 82. Da mesma maneira que no caso dos
direitos difusos, qualquer dos legitimados pode promover nova medida,
inclusive a própria entidade que a propôs anteriormente.
Mesmo quando julgada improcedente a ação coletiva com avaliação das
provas produzidas, poderá o consumidor propor ação individual com idêntico
fundamento.
A coisa julgada na ação coletiva negativa não atinge o consumidor
individual.
Coisa julgada nas Ações Coletivas de proteção aos direitos individuais
homogêneos.
Efeito “erga omnes” O efeito é erga omnes para beneficiar todas as
vítimas e seus legítimos sucessores, isto é, o efeito se produz apenas no caso
de procedência do pedido. Se a ação for julgada improcedente, na produzirá
qualquer efeito em relação às vítimas e seus sucessores.
Efeitos da improcedência por insuficiência de provas – aqui nos direitos
individuais homogêneos a lei não faz referência a improcedência por
insuficiência de provas. Donde se deve concluir que está vedada a
apresentação de nova demanda ainda que o resultado da ação coletiva
expressamente reconheça a insuficiência da prova produzida, restando apenas
a via individual.
Limites subjetivos da coisa julgada:
Conforme preleciona Nelson Nery Júnior em sua obra Código de
processo Civil Comentado:
“No processo Civil ortodoxo, a coisa julgada não favorece nem beneficia terceiros, alcançando somente as partes entre as quais foi dada a sentença de mérito(CPC 472).Nas ações coletivas entretanto, a solução não atende ás necessidades próprias dos conflitos coletivos, de sorte que LACP criou, a exemplo do que dispõe a LAP art. 18, um sistema diferenciado de limites subjetivos da coisa julgada: o da eficácia erga omnes do comando da
36sentença de mérito.” ( Nelson Nery Júnior- Código de processo Civil Comentado5)
Portanto, ao terceiro que quiser opor pretensão própria em uma relação
jurídica em que duas partes contendem, é resguardado o direito de ingressar
com ação autônoma. Tal ação poderá ser proposta sozinha ou juntamente com
outra, que é o caso da oposição. Não há que se negar, desse modo, a
faculdade de terceiro pleitear em juízo direito que alega ter, mesmo que a
relação jurídica entre as partes já tenha transitado em julgado.
Ressaltamos que o instituto da oposição serve tanto ao terceiro
juridicamente interessado quanto ao terceiro juridicamente indiferente, visto
que, de acordo com a classificação de Ovídio Baptista da Silva, estão
compreendidos na categoria de terceiros juridicamente indiferentes os
interessados de fato, os quais não podem ser tolhidos de exercer suas
pretensões em juízo.
Nada impede, por exemplo, que um credor, percebendo que seu
devedor é demandado em juízo por outro credor, queira reclamar algum direito
que lhe pertence. Não seria justo que tal credor fosse atingido pela eficácia da
sentença transitada em julgado porque considerado terceiro interessado de
fato. Desse modo, entendemos que a indiscutibilidade da sentença trânsita em
julgado, nas ações individuais, opera-se inter partes e não erga omnes.
Frisamos que são considerados terceiros todos aqueles que não
figurarem como parte no processo. Sobre a matéria, vale lembrarmos que, na
substituição processual, o substituído, embora formalmente considerado
terceiro, figura de fato como parte no processo.
A substituição processual, já analisada anteriormente, é chamada de
legitimação extraordinária e tem previsão legal no artigo 6º do Código de
Processo Civil. A última parte do dispositivo, "salvo quando autorizado por lei",
refere-se aos casos de legitimação extraordinária, em que alguém substitui a
parte no processo, passando a ocupar seu lugar.
5 Júnior, Nelson Nery.Código de Processo Civil Comentado.7ªed.revista e ampliada.RT.
37 Para José Frederico Marques, dá-se a substituição processual quando
alguém está legitimado a agir em juízo, em nome próprio, como autor ou réu,
para a defesa do direito de outrem.
Portanto, em casos de legitimação extraordinária, o substituto, que
figurou na relação como parte, defendendo em nome próprio direito alheio, é
atingido pela coisa julgada, assim como o substituído.
Athos Gusmão Carneiro, posicionando-se sobre o tema, afirma que a
sentença, proferida na demanda, faz coisa julgada também perante o
substituído, pois, como elucida mestre Chiovenda, seria absurdo que a lei
conferisse a alguém autorização para defender em juízo direitos alheios e, ao
mesmo tempo, não conferisse a tal atividade uma plena eficácia relativamente
aos direitos assim deduzidos.
Sinteticamente, portanto, como a coisa julgada opera-se inter partes e
não erga omnes, somente os sujeitos que integrarem o processo, como
elementos componentes do litígio, serão atingidos pela coisa julgada.
Abordaremos como se operam os limites subjetivos da coisa julgada
frente às demandas coletivas, que se destinam à defesa de interesses
metaindividuais.
Os limites subjetivos da Coisa Julgada nas demandas
Coletivas
A coisa julgada anteriormente adquire contornos bem diferenciados
quando se está diante de ações coletivas, pois tais demandas, como já
analisamos, possuem características peculiares que as afastam do modelo
tradicional implementado pela lei processual civil pátria. Há autores, inclusive,
defendendo o surgimento, em nosso ordenamento jurídico, de uma teoria geral
do processo coletivo.
Desse modo, impõe-se verificar qual a extensão dos limites subjetivos
da coisa julgada nas ações coletivas lato sensu, bem como o modo como se
operam as eficácias da sentença trânsita em julgado nessas demandas.
38
A coisa julgada e os interesses difusos, coletivos e individuais
homogêneos
O Código de Defesa do Consumidor, além de conceituar interesses
difusos, coletivos e individuais homogêneos, também trouxe dispositivo legal
referente à coisa julgada nas demandas de consumo, disciplinando assim a
forma como a autoridade da coisa julgada processa-se em relação aos direitos
transindividuais. Justamente por ultrapassarem a esfera do interesse individual,
não se pode afirmar que teremos coisa julgada inter partes em ações coletivas.
Destarte, segundo o art. 103 do CDC, na hipótese de interesses
difusos, pela própria natureza de tais direitos, a sentença fará coisa julgada
erga omnes, o que também ocorrerá quanto aos interesses individuais
homogêneos, mas apenas em caso de procedência da ação, a fim de
beneficiar todas as vítimas e seus sucessores. Por fim, quando a ação coletiva
versar sobre direito coletivo, a autoridade da coisa julgada processar-se-á
ultrapartes, mas limitadamente ao grupo, categoria ou classe.
Vale ressaltarmos, todavia, que o artigo 103 do CDC, não obstante
tenha sido taxativo quanto às eficácias da coisa julgada nas ações coletivas,
gerou dúvidas em várias questões, as quais vêm sendo debatidas no mundo
jurídico contemporâneo. Por tal razão, nesse trabalho apresentamos as
principais conclusões derivadas da interpretação do dispositivo supra referido,
acerca da coisa julgada na tutela coletiva.
Em primeiro lugar, os incisos I e II do art. 103, que se referem a direitos
difusos e coletivos, trazem uma exceção à existência da coisa julgada, que é a
improcedência da ação por falta de provas. Isso significa que, neste caso, será
possível aos autores intentar nova ação, assim que surgirem novas provas
sobre o direito pleiteado na demanda.
A prova nova referida nos incisos I e II do artigo 103, não se confunde
com ‘documento novo’ mencionado no inciso VII do artigo 485 já que podem se
referir a outros elementos que não sejam necessariamente ‘documento’, como
novas testemunhas ou perícia. ‘Prova nova’ é todo elemento probatório que
não pôde ser produzido na instrução anterior, seja por impossibilidade física ou
por falta de conhecimento pela parte de sua existência.
39 Assim, só podemos considerar prova nova aquela que não foi
produzida na demanda anterior por manifesta impossibilidade. Nos demais
casos, haverá coisa julgada, não podendo as partes negar a sua existência no
sentido de intentar nova demanda após o trânsito em julgado na primeira ação.
A segunda questão que se impõe diz respeito aos vocábulos erga
omnes e ultrapartes, pois há autores que os consideram como sinônimos,
enquanto outros afirmam a sua distinção..
Arruda Alvim e outros ao diferenciarem os sentidos das expressões erga
omnes e ultra partes, parecem-nos contrários ao posicionamento citado acima.
Segundo os autores, o sentido de ultra partes é aquele em que a coisa julgada
atinge o grupo, categoria ou classe e todos os seus membros nessa qualidade,
não abrangendo, porém, toda a coletividade. Comparativamente, a erga omnes
é mais extenso.
Desse modo, independentemente de estarmos diante de uma ação
coletiva que defenda interesses difusos, coletivos ou individuais homogêneos,
é importante saber que todos aqueles que foram atingidos pelo evento danoso
estarão sob a autoridade da coisa julgada.
Travado o debate em torno do significado dos adágios latinos trazidos
pelo art. 103 do Código de Defesa do Consumidor, não nos podemos esquivar
de mencionar o parágrafo 1º do referido dispositivo, o qual prevê a
possibilidade de serem intentadas ações individuais na defesa do mesmo
interesse difuso ou coletivo, postulado na ação coletiva.
Conforme o referido parágrafo 1º, a autoridade da coisa julgada, a
qual, como vimos, opera-se extra partes nas ações coletivas, em nada obsta a
possibilidade de um cidadão, insatisfeito com o resultado da demanda, intentar
nova ação, individualmente. Mas, tal só irá ocorrer em caso de improcedência
da ação ou mesmo de parcial procedência, porquanto, se o pleito for
integralmente acolhido, a eficácia do decisum se estenderá a todos os
substituídos, não havendo necessidade de se intentar nova demanda.
Assim, em uma ação em defesa de interesses difusos ou coletivos,
podem surgir três casos distintos em relação à coisa julgada. Em primeiro
lugar, se a demanda for acolhida integralmente, a sentença prevalecerá a
todos os substituídos. Em segundo lugar, se o pedido for rejeitado no mérito,
40não poderá ser intentada nova ação coletiva, mas são admitidas ações
individuais. E, finalmente, em terceiro lugar, se a sentença for julgada
improcedente por falta de provas, não haverá coisa julgada, podendo nova
ação ser ajuizada a qualquer tempo, desde que surjam novas provas.
Ainda em relação ao parágrafo 1º do art. 103, devemos frisar que a
referida regra somente se estende aos direitos difusos e coletivos, já que os
direitos individuais homogêneos possuem dispositivo específico - parágrafo 2º
do art. 103 - o qual disciplina de modo distinto a matéria.
Segundo o referido parágrafo, só poderão propor ação de
indenização a título individual aqueles que não intervieram no processo como
litisconsortes e apenas em caso de improcedência da ação.
A fim de entendermos corretamente o dispositivo acima
mencionado, contudo, é mister conjugá-lo como o inciso III do artigo em
comento. Segundo a regra inserta nesse inciso, nas ações destinadas à defesa
de interesses individuais homogêneos somente haverá coisa julgada em caso
de procedência da ação.
O inciso III do CDC prevê que a sentença fará coisa julgada somente
no caso de procedência do pedido. Surge, então, a perplexidade de se saber o
que aconteceria no caso de improcedência. Não haveria formação de coisa
julgada material nesse caso? A coisa julgada seria apenas inter partes?
Resolve-se o problema com uma interpretação conjugada com o § 2º do
mesmo artigo. Se esse dispositivo ressalva ‘aos interessados que não tiverem
intervindo no processo como litisconsortes’, a possibilidade de propor a sua
ação individual é porque, contrario sensu, aqueles interessados que
intervieram, aceitando a convocação do edital a que se refere o art. 94, são
atingidos pela coisa julgada inter partes.
Portanto, quem ingressou na ação coletiva, como litisconsorte, em
caso de improcedência da ação, é atingido pela autoridade da coisa julgada
inter partes.
Logo, é o artigo 94 do CDC, que permite o tratamento diferenciado às
ações em defesa de direitos individuais homogêneos, na medida em que
determina que os interessados intervenham como litisconsortes ativos nessas
ações, tornando-se partes.
41 Na perspectiva de Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery
litisconsórcio é a possibilidade que existe de mais de um litigante figurar no(s)
pólo(s) da relação processual. O listiconsórcio classifica-se em inicial ou
ulterior, quanto ao momento de sua formação; necessário ou facultativo;
quanto à obrigatoriedade de sua formação; ativo, passivo ou misto quanto ao
pólo ativo da relação processual; e unitário ou simples quanto ao destino dos
litisconsortes no plano do direito material.
No caso do artigo 94 do CDC, trata-se de litisconsórcio unitário
necessário, regido pelo artigo 47 do Código Processual Civil.
Assim, todos aqueles que se habilitarem na ação coletiva para defesa
de direito individual homogêneo, atuarão como listisconsortes, ou seja, partes,
da relação. Logo, não haverá, na espécie, legitimação extraordinária para
causa, explicando-se, assim, porque a sentença, nesse caso, faz coisa julgada
inter partes e não erga omnes.
Analisados os parágrafos 1º e 2º do art. 103 do Código de Defesa do
Consumidor, devemos mencionar que a referida norma ainda traz mais duas
regras (parágrafos 3º e 4º), de importante compreensão.
Questões processuais pertinentes
Os limites subjetivos da coisa julgada merecem estudo especial em
relação às demandas coletivas não apenas por se diferenciarem quanto à
extensão, mas também por trazerem algumas peculiaridades processuais, tais
como a coisa julgada secundum eventum litis, a coisa julgada in utilibus e a
litispendência.
Coisa julgada secundum eventum litis
Na seção anterior, foi estudada a autoridade da coisa julgada frente a
ações destinadas à defesa de interesses metaindividuais e notamos que, em
conformidade com os incisos I e II do artigo 103 do CDC, a sentença faz coisa
julgada erga omnes ou ultra partes, exceto se for julgada improcedente por
falta de provas.
42 Tal determinação demonstra, assim, importante característica da coisa
julgada em demandas coletivas, que é o fato de seus limites subjetivos
estenderem-se aos demais substituídos "secundum eventum litis".
Isso significa que as eficácias da sentença trânsita em julgado, em
ações destinadas a defesa de interesses metaindividuais, somente atingirão
aos demais interessados, dependendo do resultado da ação (se procedente ou
improcedente) e de sua fundamentação (se improcedente por falta de provas,
p. ex.).
Mas, não devemos confundir a extensão dos limites subjetivos da coisa
julgada com a sua formação, pois essa não se dá de acordo com o evento da
lide. Na verdade, como afirma-nos Antônio Gidi, a coisa julgada sempre se
formará, independentemente de o resultado da demanda ser pela procedência
ou improcedência.
O que há de novo, portanto, é a possibilidade de modificação do rol das
pessoas atingidas pelo fenômeno da coisa julgada, sempre que se estiver
diante de uma ação coletiva.
Outrossim, devemos lembrar que o princípio da vulnerabilidade do
consumidor no mercado de consumo, inserido no Código de Defesa do
Consumidor, não existe por mero acaso.
Obviamente, consumidor e fornecedor não se encontram em igualdade
de condições, daí porque devemos sempre almejar o equilíbrio nas relações, o
que se faz tratando desigualmente aos desiguais.
Não podemos nos olvidar que a proteção ao consumidor existe
porquanto esse é a parte mais fraca em uma relação de consumo. Ademais,
atrela-se aos argumentos favoráveis à constitucionalidade da coisa julgada
secundum eventum litis o princípio da economia processual, pois a
possibilidade de se beneficiar a todos os interessados é um dos maiores
objetivos das demandas coletivas.
43
CONCLUSÃO
O Estado Democrático de Direito necessita ser constante, com a
satisfação dos interesses sociais postos em litígio nas demandas coletivas,
pois somente assim poderemos almejar a realização efetiva de uma
democracia , com o acolhimento, in totum, do princípio do acesso à justiça.
Interesses ou direitos difusos: São os transindividuias de natureza
indivisível de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por
circunstâncias e fatos.
Exemplo: Destinatário de propaganda enganosa, veiculada em painés
publicitários, jornais, revistas ou televisão. Trata-se de relação de consumo,
mas sem vínculo jurídico ou fático muito preciso, pois é impossível identificar
os titulares dos interesses e direitos envolvidos. Quando condenatória, a
sentença protege de modo indeterminado todos os indivíduos que estão sendo
atingidos pela propaganda enganosa.
Interesses ou direitos coletivos: São os transindividuais de natureza
indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas
entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base.
Exemplo: Aumento indevido das prestações de um consórcio. Como há
relação jurídica formalmente fixada, a sentença beneficia todas as vítimas
lesadas pelo réu, em uma ação promovida em nome de determinada
coletividade.
Interesses ou direitos individuais homogêneos: São os decorrentes de
origem comum.
Exemplo: Um determinado bem de consumo, produzido em série,
apresenta um mesmo defeito, lesando os usuários finais. Neste caso, um fato
comum liga inúmeros consumidores, mas que, por não estarem envolvidos por
uma relação jurídica, não podem ser determinados formalmente. A sentença
que suspende a produção e pode implicar a reparação de danos, atinge a
todos os consumidores indistintamente.
44Portanto, com apenas uma ação coletiva são evitadas milhares de
ações individuais de conhecimento sobre a mesma coisa, economizando-se
dinheiro da estrutura estatal, dos jurisdicionados, configurando assim um
acesso à justiça justo e eficaz.
Os direitos Coletivos passaram a ter maior cobertura por parte do
Estado com o advento do Código de Defesa do Consumidor, protegendo
assim, os princípios que regem os indivíduos singular ou coletivamente, e que
são cláusulas pétreas da constituição Federal.
Um maior controle nas políticas de consumo e na ordem financeira
estão nas mãos do cidadão, que têm o poder de invocar o Estado para
proteger seus interesses frente ás ameaças oriundas da s relações mercantis
da sociedade capitalista.
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BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
NUNES, Rizzatto, Curso de Direito do Consumidor,Editora Saraiva, 2ª edição,
2005.
GRINOVER, Ada Pellegrine. REPRO Nº 99, julho e setembro de 2000.
____________.Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: Comentado pelos
autores do anteprojeto.8ed.,ver.;ampl. E atual.conforme o novo código civil.Rio
de Janeiro:Forense Universitária,2004.
Tutela Coletiva: 20 anos da Ação Civil Pública e do Fundo de defesa de
direitos difusos,15 anos do Código de defesa do consumidor/Paulo Henrique
dos Santos Lucon (coordenador).São Paulo: Atlas ,2006.
JÚNIOR, Nelson Nery.Código de Processo Civil Comentado.7ed.SP,RT.
Revista de Direito do Consumidor,n.56.-Legitimidade para a defesa dos
Interesses Coletivos Lato Sensu, decorrentes de questões de massa, Paulo
Valério Dal Pai Moraes.
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FOLHA DE AVALIAÇÃO
Nome da Instituição: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
Título da Monografia: ações coletivas e seus reflexos nas relações
de consumo
Autor: JOSEFA DOS SANTOS COSTA
Data da entrega: 28/07/2006
Avaliado por: Conceito: