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EDUCAÇÃO AMBIENTAL NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS (EJA): UM DIÁLOGO EM CONSTRUÇÃO Magda Regina Dias Farias 1 Paulo Cesar Gastaldo Claro 2 Resumo O presente artigo tem como objetivo problematizar a compreensão dos professores que atuam na Educação de Jovens e Adultos no Serviço Social da Indústria (SESI), município de Ji-Paraná RO, em relação a Educação Ambiental (EA). Para tanto, realizou-se uma investigação de caráter qualitativo com professores dos anos finais do Ensino Fundamental e Ensino Médio no período de março a agosto de 2012. A metodologia adotada foi o estudo de caso, com a utilização de entrevistas semidiretas, análise documental e observação participante. Como inferência se destacam a ausência da questão ambiental nas práticas dos professores, compreensão da EA como ecologia e a assunção por parte dos professores da necessidade da EA como um tema transversal nas disciplinas. PALAVRAS-CHAVE: Educação Ambiental. Educação de Jovens e Adultos. Práticas Pedagógicas. Introdução A Educação Ambiental (EA) configura-se enquanto uma educação integradora de valores que preconiza a consolidação de uma nova sociedade, com novas relações entre os seres, suprimindo, assim, concepções ingênuas acerca da complexidade humana, consubstanciando uma educação que deve transcender o discurso apaziguador que reverencia as atitudes ecologicamente corretas, desconectadas das lutas políticas em que a Educação Ambiental (EA) emerge, nascendo em um momento histórico, cuja tentativa é a de 1 Especialista em Gestão Escolar: Orientação, Supervisão e Direção Escolar pela Faculdade Integrada de Cacoal - UNESC, Cacoal-RO. Graduada em Pedagogia pela Fundação Universidade Federal do Rio Grande – FURG, Rio Grande–RS. E-mail: [email protected] 2 Doutorando em Desenvolvimento Regional pela Universidade Federal de Rondônia – UNIR-Porto Velho- RO. Mestre em Educação Ambiental pela Fundação Universidade Federal do Rio Grande – FURG, Rio Grande-RS. Graduado em Pedagogia pela Fundação Universidade Federal do Rio Grande – FURG, Rio Grande-RS. E-mail: [email protected]

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Page 1: EDUCAÇÃO AMBIENTAL NA EDUCAÇÃO DE … Saberes...Educação Ambiental, a qual estabelecia os objetivos, os princípios norteadores e as metodologias a serem utilizadas para o desenvolvimento

EDUCAÇÃO AMBIENTAL NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS (EJA): UM DIÁLOGO EM CONSTRUÇÃO

Magda Regina Dias Farias1

Paulo Cesar Gastaldo Claro2

Resumo

O presente artigo tem como objetivo problematizar a compreensão dos professores que atuam na Educação de Jovens e Adultos no Serviço Social da Indústria (SESI), município de Ji-Paraná RO, em relação a Educação Ambiental (EA). Para tanto, realizou-se uma investigação de caráter qualitativo com professores dos anos finais do Ensino Fundamental e Ensino Médio no período de março a agosto de 2012. A metodologia adotada foi o estudo de caso, com a utilização de entrevistas semidiretas, análise documental e observação participante. Como inferência se destacam a ausência da questão ambiental nas práticas dos professores, compreensão da EA como ecologia e a assunção por parte dos professores da necessidade da EA como um tema transversal nas disciplinas. PALAVRAS-CHAVE: Educação Ambiental. Educação de Jovens e Adultos. Práticas Pedagógicas.

• Introdução

A Educação Ambiental (EA) configura-se enquanto uma educação

integradora de valores que preconiza a consolidação de uma nova sociedade,

com novas relações entre os seres, suprimindo, assim, concepções ingênuas

acerca da complexidade humana, consubstanciando uma educação que deve

transcender o discurso apaziguador que reverencia as atitudes ecologicamente

corretas, desconectadas das lutas políticas em que a Educação Ambiental

(EA) emerge, nascendo em um momento histórico, cuja tentativa é a de 1Especialista em Gestão Escolar: Orientação, Supervisão e Direção Escolar pela Faculdade Integrada de Cacoal - UNESC, Cacoal-RO. Graduada em Pedagogia pela Fundação Universidade Federal do Rio Grande – FURG, Rio Grande–RS. E-mail: [email protected] 2Doutorando em Desenvolvimento Regional pela Universidade Federal de Rondônia – UNIR-Porto Velho-RO. Mestre em Educação Ambiental pela Fundação Universidade Federal do Rio Grande – FURG, Rio Grande-RS. Graduado em Pedagogia pela Fundação Universidade Federal do Rio Grande – FURG, Rio Grande-RS. E-mail: [email protected]

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responder aos sinais de falência de todo um modo de vida (CARVALHO,

2004).

Entrementes, por mais notória que seja a afirmação de Carvalho, nem

sempre conseguimos vislumbrar nos projetos de EA práticas que configurem

ou valorizem tal assertiva. Pelo contrário, muitas vezes observamos ações

denominadas de EA que contradizem plenamente a proposição de uma

educação que transgrida os mecanismos de perpetuação da exploração

humana.

Não obstante a essas práticas caracterizadas como EA, presenciamos,

ainda, no interior das escolas, um sem número de projetos escolares que

promovem a EA a partir de concepções limítrofes e acríticas em relação ao

ambientalismo, como se o “ambientalismo se resumisse a datas

comemorativas e não configurasse como um projeto de vida, de lutas sociais

para os cuidados ecológicos, necessários para a construção da sociedade que

queremos” (SATO, 2001, p. 16).

Nesse contexto, complexo em suas nuanças, o presente trabalho

conjuga um movimento que intenta problematizar a compreensão dos

professores atuantes na Educação com Jovens e Adultos (EJA) no SESI,

município de Ji-Paraná, estado de Rondônia, em relação a Educação

Ambiental. Para tal o artigo encontra-se estruturado em quatro itens distintos,

sendo eles: resgate histórico dos principais eventos que fizeram despertar o

pensamento ambiental no mundo; os caminhos metodológicos adotados;

análise dos dados e considerações finais.

• Educação Ambiental: marco inicial

A partir das décadas de 1950 e 1960, em virtude dos avanços

tecnológicos alicerçados às premissas da racionalidade ocidental, o homem

amplia sua capacidade de produção de alterações no ambiente natural,

principalmente nos países mais desenvolvidos, sendo visivelmente

constatados, nas décadas posteriores, os resultados desastrosos dessa

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manipulação indébita dos recursos naturais. Morin, acerca das catástrofes

ambientais, menciona:

O aspecto meta-nacional e planetário do perigo ecológico surgiu com o anúncio da morte do oceano por Ehrlich em 1969 e o relatório Meadows encomendado pelo Clube de Roma em 1972. Após as profecias apocalípticas mundiais de 1969-1972, houve um período de multiplicação das degradações ecológicas locais-campos, bosques, lagos, rios, aglomerados urbanos poluídos (MORIN 2011, p. 68).

A partir de 1977, por orientação da Conferência de Estocolmo,

aconteceu em Tbilisi, Geórgia, promovida pela UNESCO/PNUMA, a

Conferência Intergovernamental sobre Educação Ambiental, conhecida como

Conferência de Tbilisi, responsável pela elaboração da Declaração sobre a

Educação Ambiental, a qual estabelecia os objetivos, os princípios norteadores

e as metodologias a serem utilizadas para o desenvolvimento da Educação

Ambiental.

A Conferência de Tbilisi instaura um decisivo marco na consolidação e

divulgação da Educação Ambiental no mundo, sendo considerada a

continuação do Encontro de Belgrado. Nesse evento (Conferência de Tbilisi),

que reuniu mais de 300 especialistas representando 68 países e vários

organismos internacionais, o destaque recaiu, inevitavelmente, para os

trabalhos apresentados pelo Programa Internacional de Educação Ambiental

(PIEA), o qual proporcionou uma ampla mostra de experiências em Educação

Ambiental (DIAZ, 2002).

Entretanto, a década de 1970 no Brasil foi marcada por passos lentos

em direção à resolução dos problemas ambientais, cujos esforços para

instauração de um confronto contra a hegemonia da modernidade resultavam

somente de ações de pequenos grupos organizados e de órgãos estaduais de

meio ambiente (CLARO, 2012).

Nesse caminho, grupos de exilados políticos que retornaram ao Brasil

no final da década de 1970 e que vivenciaram os movimentos ambientalistas

europeus, juntaram-se a outros defensores do movimento ecológico, entre

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eles, José Lutzenberger consolidando na década de 1980, principalmente no

Rio Grande do Sul, fortes embates contra empresas multinacionais (CLARO,

2012).

A partir de 1992, com a Eco-92 e o Fórum Global, são elaborados os

PCNs pelo Ministério da Educação, tendo em suas referências as

recomendações da Agenda 21 sobre a importância do ensino na formação da

consciência ambiental, suscitando, assim, a criação dos Temas Transversais

no currículo escolar do Ensino Fundamental com a inserção do tema meio

ambiente aos demais assuntos discutidos na escola.

A partir da década de 1990, no Brasil, a questão ambiental passa a ser

compreendida como uma política pública necessária, principalmente com a

aprovação Lei 9795/99 pelo Congresso Nacional, a qual instituiu a Política

Nacional de Educação Ambiental, “sistematizando os objetivos, pressupostos e

estratégias da Educação Ambiental com base nos principais documentos

nacionais e internacionais sobre o tema” (MENDONÇA, 2004, p. 222),

distinguindo ainda, o ensino formal e não formal para a Educação Ambiental.

Dessa forma, a EA para o ensino formal ficou sob responsabilidade dos

sistemas de ensino vinculados ao Ministério da Educação e a EA para o

ensino não formal ao encargo do Ministério do Meio Ambiente (CLARO, 2012).

• Metodologia: o caminho percorrido

O Serviço Social da Indústria (SESI) detêm dentre seus objetivos

primeiros a preocupação com o fomento e desenvolvimento da educação em

sua zona de abrangência, focalizando ações que priorizem a melhoria da

qualidade de vida dos empregados da indústria.

A Educação de Jovens e Adultos no SESI delineia uma alternativa para

a erradicação e nivelamento dos estudos dos alunos trabalhadores. Porém,

como qualquer instituição de ensino, é possível depreender algumas questões

que sobressaem empiricamente às análises feitas cotidianamente.

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Nesse sentido, emerge a necessidade de um olhar profícuo em relação

às práticas pedagógicas desenvolvidas pelos professores que atuam na

instituição, no caso, na Educação com Jovens e Adultos.

Diante desta necessidade, com o objetivo de compreender as práticas

pedagógicas dos professores da EJA, necessário ressaltar os procedimentos

metodológicos adotados para esta investigação.

Dessa maneira, a metodologia traduz o conjunto de procedimentos,

decisões, reflexões e ações adotados e assumidos pelo pesquisador no

encaminhamento de atender aos objetivos propostos. Somo a essa ideia inicial

a noção de que todos os aspectos metodológicos que perpassam uma

pesquisa não são definidos a priori, mas vão se constituindo na medida em que

a própria investigação avança. Isto significa dizer, em outras palavras, que o

início de uma pesquisa ocorre a partir de alguns pressupostos metodológicos

gerais que irão ser reorientados e redefinidos ao passo em que a experiência

do investigador com seu objeto se constituem.

Entretanto, compreendemos, em caráter do problema posto, que a

mesma está situada dentro do campo de educação e atribuída à dimensão

qualitativa. Julgamos procedente particularizar tanto o termo pesquisa quanto o

qualitativo, principalmente em função do uso pouco cuidadoso que se faz de

ambos.

O termo pesquisa vem ganhando uma dimensão popular exaustiva,

sendo incorporada ao quotidiano de maneira abrupta, negligenciando por vezes

seu verdadeiro sentido. Ludke e André, afirmam que:

Pode-se notar esse fenômeno em várias instâncias da vida social. Na esfera do comportamento político, por exemplo, observa-se um verdadeiro surto de “pesquisas”, que procuram revelar especialmente as tendências eleitorais de determinados grupos sociais, não sem correr o risco (por vezes intencional) de dirigir essas tendências, como já foi revelado em estudos sociológicos (Thiollent, 1980). Trata-se, pois, de uma concepção de pesquisa bastante estreita (LUDKE E ANDRÉ 1986, p. 01).

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No âmbito escolar, na maioria das vezes, pesquisar limita-se à consulta

bibliográfica ou recorte de jornais e revistas sobre algum tema específico, onde

são coletados e apresentados aos professores como um produto final de

pesquisa.

É possível perceber uma variedade inesgotável de conceitos e

aplicações do termo pesquisa, porém essa variedade, em sua maioria,

obedece a aspectos similares, que são observados na história da própria

pesquisa. Geralmente, quando falamos em pesquisa, associamos o termo a

quantificações, variáveis e índices percentuais.

A partir da década de 70, em alguns países na América Latina começa

a surgir o interesse pelos aspectos qualitativos das investigações, devido à

insatisfação de alguns pesquisadores em educação frente aos resultados de

suas pesquisas, almejando assim, soluções para os problemas, até então, não

solucionados pela pesquisa quantitativa (LÜDKE E ANDRÉ, 1986).

Dessa maneira, objetivando o mínimo de distorções conceituais e

operacionais em relação a esta investigação, procura-se consolidar alguns

procedimentos metodológicos que orientaram este trabalho, situando esta

pesquisa numa perspectiva qualitativa e de cunho etnográfico.

Faz-se a opção deste tipo de pesquisa por acreditar-se que haverá,

indubitavelmente, uma imersão nos sentidos e significados atribuídos à

questão ambiental dos atores investigados, cabendo a mim, enquanto

pesquisadora, criar estruturas interpretativas que me permitam, por meio de

uma aproximação mais efetiva dos atores investigados, compreender os

contornos atribuídos por eles em relação à questão ambiental na Educação de

Jovens e Adultos do SESI em Ji-Paraná.

Assim, na tentativa de responder ao problema proposto, ou seja,

dialogar em relação aos pressupostos que norteiam às práticas de EA

utilizadas pelos professores da Educação de Jovens e Adultos do SESI de Ji-

Paraná, foram estabelecidos os seguintes contornos metodológicos:

1º Imersão nas políticas de promoção da Educação Ambiental para a

Educação de Jovens e Adultos do SESI de Ji-Paraná por intermédio da análise

documental do Regimento Escolar;

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2º Realização de entrevistas do tipo semidiretiva com os professores

que atuam com a EJA no SESI em Ji-Paraná, atuantes nos Anos Finais do

Ensino Fundamental e Ensino Médio, num total de doze entrevistas;

Com o objetivo de compreender as práticas pedagógicas dos

professores investigados em relação à EA, estabeleceu-se um roteiro com seis

perguntas para os professores do Ensino Fundamental – Anos Finais e Ensino

Médio, focalizando duas questões abertas e quatro questões fechadas. As

questões abertas situaram a compreensão dos professores em relação ao

termo EA e o núcleo diferenciador entre EA e ecologia.

As questões fechadas indicaram para a interpretação dos entrevistados

em relação a inserção do tema EA nos conteúdos trabalhados, situando

também para o conhecimento dos entrevistados em relação aos teóricos que

discutem a questão da EA no Brasil. Apontou, ainda, para a função do SESI

em relação a promoção da EA durante as reuniões pedagógicas.

Para a interpretação das informações resultantes das entrevistas

utilizou-se como instrumento reflexivo a análise de conteúdo fundamentada por

Roque Morais. O autor, em relação à utilização da análise de conteúdo nesse

tipo de investigação, declara:

A análise de conteúdo constitui uma metodologia de pesquisa usada para descrever e interpretar o conteúdo de toda classe de documentos e textos. Essa análise, conduzindo a descrições sistemáticas, qualitativas ou quantitativas, ajuda a reinterpretar as mensagens e a atingir uma compreensão de seus significados num nível que vai além de uma leitura comum (MORAIS, 1999, p. 09).

3º Acompanhamento dos projetos relacionados à Educação Ambiental

dos professores, sinalizando, como instrumento de acompanhamento a técnica

de observação participante.

Nesta fase, o uso da observação participante, oportunizou vivenciar o

dia a dia dos professores que atuam com a EJA no SESI em Ji-Paraná. A

observação participante traduz a possibilidade de uma aproximação mais

intensa entre pesquisador e os atores investigados, possibilitando o

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desvelamento de questões singulares, muitas vezes não identificadas durante

a análise das entrevistas.

A ideia de que a permanência do pesquisador entre os atores

envolvidos na investigação deve configurar o maior tempo possível, facilitando

assim, o aparecimento de situações que reflitam comportamentos

espontâneos, como se o investigador não estivesse presente. Cortes em

relação às dificuldades encontradas pelo pesquisador no que tange a

veracidade das informações coletadas, diz que:

A resposta a esta dificuldade tem sido a difusão da observação participante, cuja técnica tem sido aprimorada desde o início do século pelos antropólogos. Mesmo neste caso o pesquisador permanece, em maior ou menor grau, sendo estranho ao grupo, mas a familiaridade que ele adquire com os pesquisados facilita o aparecimento de situações em que as pessoas manifestam-se como o fariam se ele não estivesse entre elas (CORTES 1998, p. 23).

Em relação à análise das informações coletadas por meio das

observações, referendou-se a análise de conteúdo proposta por Roque

Moraes, uma vez que o procedimento nos possibilita chegar a compreensões

detalhadas em relação ao meio investigado. Dessa forma, Moraes acerca da

amplitude de análise permitida por essa metodologia menciona:

A matéria-prima da análise de conteúdo pode constituir-se de qualquer material oriundo de comunicação verbal ou não-verbal, como cartas, cartazes, jornais, revistas, informes, livros, relatos auto-biográficos, discos, gravações, entrevistas, diários pessoais, filmes, fotografias, vídeos, etc. Contudo os dados advindos dessas diversificadas fontes chegam ao investigador em estado bruto, necessitando, então ser processados para, dessa maneira, facilitar o trabalho de compreensão, interpretação e inferência a que aspira a análise de conteúdo (MORAES 1999, p. 7).

Em face dessas considerações, evidente torna-se, devido à

especificidade da investigação, a opção adotada para o processo de coleta de

dados, conjugando assim, coleta de documentos, entrevista semidiretiva e

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observação participante, analisados por meio da metodologia de análise de

conteúdo proposta por Roque Moraes.

• Análise dos dados levantados

Diante da análise dos dados obtidos pelas entrevistas e observações,

detectou-se que do total das doze entrevistas realizadas com os professores

dez não compreendiam a necessidade de inserção da EA em suas disciplinas,

considerando que a temática ambiental não estabelecia vínculo com os

conteúdos trabalhados.

Já, outro professor, afirmou introduzir a discussão ambiental nos

conteúdos delineados em sua disciplina, compreendendo a relevância da

temática ambiental como um tema transversal, devendo perpassar todas as

áreas do conhecimento.

O último respondente compreendia a necessidade da inserção de temas

ambientais nas disciplinas, porém afirmou não fazê-lo em função da ausência

de tempo para tal.

Nesse quadro, cabe aqui destacar o simplismo compreensivo em

relação ao termo EA, sendo que dos doze professores entrevistados, todos

mencionam não ter lido obra alguma relacionada ao tema.

Ainda nesta direção, importante ressaltar que os entrevistados, em sua

totalidade, confundem o termo EA com ecologia ou meio ambiente,

apresentando grande insipiência conceitual não só em relação ao termo EA

como em relação à sua inserção nos conteúdos desenvolvidos durante a

realização das disciplinas.

Do mesmo modo é possível aferir que a concepção adotada em relação

à EA não configura uma proposição epistemológica da EA em relação ao

ensino formal, evidenciando assim uma dimensão simplista em relação ao

fazer ambiental. Brugger a respeito do tema meio ambiente como tema

transversal menciona:

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Mas a EA que se tornou dominante, calcada nesses temas clássicos, tem falhado em sua missão de transformar valores, precisamente porque não vem construindo um ideário verdadeiramente contra hegemônico. Não basta transversalizar os chamados “temas ambientais”. Jamais faremos com que a educação seja “ambiental” apenas transversalizando temas supostamente ambientais sem aprofundar e discutir os paradigmas e visões de mundo subjacentes a eles. Não adianta, tampouco, criar disciplinas ou “cursos de meio ambiente” para futuros engenheiros, economistas, arquitetos, ou mesmo biólogos – como “ilhas” de outra racionalidade – num currículo que privilegia a produtividade, o crescimento, a eficiência tecnológica e uma fé acrítica na Ciência como valores indiscutíveis, bons em si mesmos (BRUGGER 2004, p. 198).

Outro ponto, também interessante, obtido durante a análise documental,

diz respeito à ausência do termo ambiental no Projeto Político Pedagógico,

sendo corroborada pelas falas de nove professores quando mencionam a

inexistência do termo EA, inclusive durante as reuniões pedagógicas

promovidas pela instituição.

Em relação às questões abertas contidas no roteiro das entrevistas

semidiretivas evidenciou-se que os professores compreendem a necessidade

da EA como tema transversal, entretanto, todos os entrevistados manifestam

fragilidade teórico-prático em relação ao assunto, ressaltando a necessidade

de sua vinculação às reuniões pedagógicas promovidas pelo SESI,

possibilitando assim, não só a aprendizagem de novas metodologias, mas o

conhecimento dos teóricos que atuam com a EA no Brasil.

• Considerações finais

A questão da Educação Ambiental nas escolas contemporâneas,

lamentavelmente, vem caracterizando uma temática pouco discutida e

difundida nas práticas dos professores e professoras.

Nesse contexto, idiossincrásico, percebe-se que os professores que

atuam com a Educação com Jovens e Adultos no SESI em Ji-Paraná não

apresentam em suas aulas proposições que apresentem preocupação com a

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questão ambiental, uma vez que dos doze professores entrevistados, apenas

um professor, da área de História, desenvolve atividades que englobem em

suas nuanças temáticas que discutem questões relacionadas ao meio

ambiente.

Entretanto, todos os entrevistados dizem preocupar-se com problemas

ambientais, porém, apenas um professor desenvolve em suas atividades

cotidianas diálogos que remetam a questão ambiental.

Outro ponto, relevante, é a concepção de Educação Ambiental

apresentado pelos professores investigados, sendo que dos doze professores

entrevistados, dez deles afirmam que a Educação Ambiental é uma

metodologia que focaliza a preservação da natureza, dicotomizando o homem

do ambiente.

Estas questões, identificadas durante a análise das entrevistas,

corresponderam quantitativamente e qualitativamente em relação às

observações das aulas dos professores, sendo observadas duas aulas de cada

disciplina ministrada nos Anos finais do Ensino Fundamental e do Ensino

Médio.

Durante a observação participante, foi possível inferir que pouco ou

quase nunca foram referenciados diálogos que remetessem às questões

ambientais, explicitando a insipiência em relação aos temas que poderiam

corresponder à Educação Ambiental.

Em relação ao Regimento Geral da escola do SESI, percebe-se

também, a ausência de uma preocupação com a Educação Ambiental, uma

vez que, em momento algum, não é referenciado tópicos que possam culminar

em práticas de Educação Ambiental para a escola.

Nesse sentido, a ausência da categoria ambiental nas práticas dos

professores que atuam com a Educação com Jovens e Adultos no SESI,

inevitavelmente, reflete no cotidiano pedagógico dos professores, ficando a

problemática ambiental como um apêndice opcional dos professores e

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professoras, resultando em práticas que não priorizam a Educação Ambiental

no interior da instituição.

Entrementes, tanto nas entrevistas como na observação participante

com os professores e professoras, fica evidente que a questão ambiental não é

evidenciada por uma ausência de proposição regimental, uma vez que a

confluência dos diálogos focalizam os conteúdos e as diretrizes dimensionadas

pelo Regimento Escolar.

Nesse quadro, explícito a necessidade de um redimensionamento

democrático das diretrizes pedagógicas da educação do SESI, cabendo aos

gestores possibilitar reflexões que direcionem para a preocupação ambiental,

suscitando a preocupação de uma Educação Ambiental que não fragmente o

homem da natureza, mas associe a responsabilidade do homem enquanto um

ser natural, superando as concepções ingênuas em relação ao ambientalismo

e a emergência do pensamento ambiental como foi referenciado por Carvalho

no início deste trabalho.

Nesse sentido, cabe ao gestor escolar oportunizar uma reflexão mais

profunda em relação às premissas teóricas que conjugam o Projeto Político

Pedagógico (PPP) da escola, situando, em termos materiais, quais as

tendências que permeiam o fazer ambiental nesse ambiente, assim como as

possibilidades metodológicas que podem ser construídas com o corpo

docente.

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