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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” PROJETO A VEZ DO MESTRE

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO A VEZ DO MESTRE

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1

EMPREGADO DOMÉSTICO

Por: Jorge Antonio da Silva Ribeiro

Matricula: k202424

Turma: k045

Orientadora

Prof. Dr. Denise Almeida Guimarães

Rio de Janeiro

2007

UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO A VEZ DO MESTRE

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Apresentação de monografia à Universidade Cândido

Mendes como requisito parcial para obtenção do grau de

especialista em Direito do Trabalho

Por: . Jorge Antonio da Silva Ribeiro

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AGRADECIMENTOS

....a Deus, a esposa querida, aos amigos e

professores......

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4

DEDICATÓRIA

Agradeço a Deus, pois sem que seja de sua vontade, nada acontece.

À meus familiares, colegas de Curso, professores e a todos aqueles que

direta ou indiretamente contribuíram para a realização desta pesquisa.

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LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

ADCT – Ato das Disposições Constitucionais Transitórias

APS – Agência de Previdência Social

CEI – Cadastro Específico do INSS

CF – Constituição Federal

CLT – Consolidação das Leis do Trabalho

CTPS – Carteira de Trabalho e Previdência Social

DCT – Documento de Cadastramento do Trabalhador

DRT - Delegacia Regional do Trabalho

FGTS – Fundo de Garantia por Tempo de Serviço

GFIP - Guia de Recolhimento do FGTS e Informações à Previdência Social

GRFC - Guia de Recolhimento Rescisório do FGTS e da Contribuição Social

INSS – Instituto Nacional de Seguridade Social

NIT – Número de Inscrição do Trabalhador no INSS

OIT – Organização Internacional do Trabalho

PASEP - Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público

PCSS – Pedidos de Compras e Solicitação de Serviços

PIS – Programa de Integração Social

RSDED - Requerimento do Seguro-Desemprego do Empregado Doméstico

STF – Supremo Tribunal Federal

STJ – Supremo Tribunal de Justiça

SUS – Sistema único de Saúde

TRT – Tribunal Regional do Trabalho

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RESUMO

Esta monografia tem por objetivo analisar os direitos assegurados aos empregados

domésticos pelo Direito do Trabalho, além das inovações conferidos pelas Leis

10.208/2001 e 11.324/2006, as quais ampliou em muito os direitos aos empregados

domésticos, onde irá se analisar a controvérsia da facultatividade/obrigatoriedade

do empregador estender o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço a seu

empregado doméstico, em face do Princípio da Proteção e do Art.7ª, caput, da

Constituição Federal. Entende-se por empregado doméstico aquele que presta

serviços de natureza contínua e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família no

âmbito residencial destas. O empregado doméstico é regido pela Lei 5.859/1972,

regulamentada pelo Decreto 71885/1973, tendo seus direitos previstos na

Constituição Federal/1988 no parágrafo único do artigo 7º, bem como sua integração

à Previdência Social. Empregado doméstico é a pessoa física que presta serviços de

natureza contínua, subordinada e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família,

no âmbito residencial destas, recebendo salário por isso. O empregado doméstico

deverá ter as seguintes características: ser pessoa física; impessoalidade; prestar

serviços com habitualidade; subordinação; o empregador sem finalidade lucrativa;

trabalho realizado na residência do empregador; serviço prestado remunerado.

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SUMÁRIO

1 - INTRODUÇÃO--------------------------------------------------------------------------------- 08

2 - A TEORIA DOS SISTEMAS E OS PRINCÍPIOS DE DIREITO DO

TRABALHO--------------------------------------------------------------------------------------- 10

2.1 O Princípio da Proteção----------------------------------------------------------------- 15

2.2 O princípio da igualdade e o parágrafo único do artigo 7º da CF/88-------- 19

3 - O EMPREGADO DOMÉSTICO NO DIREITO DO TRABALHO------------------ 21

3.1 Instituições de direitos trabalhistas e previdenciários Leis 10.208/2001 e

11.324/2006................................................................................................24

3.2 Estabilidade Provisória da Gestante Celetista na CF/88............................26

3.3 Estabilidade Provisória da Empregada Doméstica Gestante Lei 11.324/2006--

----------------------------------------------------------------------------------------------------------27

4 - CONTROVÉRSIA A CERCA DA FACULTATIVIDADE/OBRIGATORIEDADE DO

FUNDO DE GARANTIA E O SEGURO DESEMPREGO ------------------------------- 30

5 - CONCLUSÃO---------------------------------------------------------------------------------- 33

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS---------------------------------------------------------- 34

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1 - INTRODUÇÃO

Esta monografia tem por objetivo analisar os

direitos assegurados aos empregados domésticos pelo Direito do Trabalho, bem

como analisar as inovações introduzidas pelas Leis 10.208/2001 e 11.324/2006, em

especial a não obrigatoriedade do acesso ao Fundo de Garantia do Tempo de

Serviço, face ao Princípio Constitucional de Proteção à Dignidade Humana e do

Valor Social do Trabalho .

Entende-se por empregado doméstico aquele que

presta serviços de natureza contínua e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à

família no âmbito residencial destas.

O empregado doméstico é regido pela Lei

5.859/1972, regulamentada pelo Decreto 71885/1973, tendo seus direitos previstos

na Constituição Federal/1988 no parágrafo único do artigo 7º, bem como sua

integração à Previdência Social.

Segundo a Lei nº 5.859, de 11 de dezembro de

1972, regulamentada pelo Decreto nº 71.885, de 9 de março de 1973, considera-se

empregado doméstico aquele maior de 16 anos que presta serviços de natureza

contínua e de finalidade não-lucrativa à pessoa ou à família, no âmbito residencial

destas.

Assim, caracteriza-se como da atividade do

emprego doméstico o caráter não-econômico da atividade no âmbito residencial do

empregador. Nesses termos, integram a categoria os seguintes trabalhadores:

cozinheiro(a), governanta, babá, lavadeira, faxineiro(a), vigia, motorista particular,

jardineiro(a), acompanhante de idosos, entre outras. O(a) caseiro(a) também é

considerado(a) empregado(a) doméstico(a), quando o sítio ou local onde exerce a

sua atividade não possui finalidade lucrativa.

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A Constituição Federal de 1988 concedeu os direitos sociais

aos empregados domésticos, tais como: salário-mínimo; irredutibilidade salarial;

repouso semanal remunerado; gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos,

1/3 a mais do que o salário normal; licença à gestante, sem prejuízo do emprego e

do salário, com duração de 120 dias; licença-paternidade; aviso-prévio;

aposentadoria e integração à Previdência Social.

Para o desenvolvimento desta pesquisa, optou-se

pela pesquisa bibliográfica em jurisprudências referentes à temática abordada.

A pesquisa bibliográfica procura explicar um

problema a partir de referências teóricas publicadas, buscando conhecer e analisar

as contribuições culturais ou científicas do passado existentes sobre um

determinado assunto, tema ou problema.

O presente estudo será dividido em 5 etapas, a saber: (a)

levantamento do referencial teórico; (b) seleção do referencial teórico apropriado a

presente investigação; (c) leitura crítico-analítica do referencial selecionado; (d)

organização dos dados levantados e (e) elaboração do relatório final.

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2 - A TEORIA DOS SISTEMAS E OS PRINCÍPIOS

DE DIREITO DO TRABALHO

Para se ter em mente o significado global de um

princípio de Direito, partir-se-á de uma análise sistêmica complexa. Sistema é um

conjunto mais ou menos complexo (dependendo do sistema) de elementos

coordenados e estruturados, ligados por um conjunto coordenado e estruturado de

relações. Ou ainda, mais simplificadamente, sistemas são "(...) complexos de

elementos em interação" (BERTALANFFY, 1973, p.56). O universo, por exemplo, é

um sistema, do qual se subtraem subsistemas como as galáxias, e assim

sucessivamente. É a partir de um padrão estruturado e complexo de elementos e de

suas relações que se determinam a unidade e coerência de um sistema em um

determinado lapso de tempo.

Sistema social é "um conjunto estruturado e

coordenado de interações sociais que se comportam como uma entidade"

(NORONHA, 1988, p.57). Atualmente, uma importante corrente da ciência vem

defendendo o sistema social como autopoiético (LUHMAN, 1990). "A autopoiese é

um padrão de rede no qual a função de cada componente consiste em participar da

produção ou da transformação dos outros componentes da rede"(CAPRA, 2000,

p.136). Ser autopoiético significa que o sistema social está inserido em uma rede de

processos de produção, nos quais a função de cada componente participa da

produção ou da transformação de outros componentes da rede. Desse modo, toda a

rede se auto-produz constantemente. "Ela é produzida pelos seus componentes e,

por sua vez, produz esses componentes"(CAPRA, Op. Cit., p.89).

Um sistema autopoiético tem pelo menos três

propriedades:

[...] ele deve ser auto-limitado, auto-gerador e auto-perpetuador. Ser auto-limitado significa que a extensão do sistema é determinada por uma fronteira, que por sua vez é também parte integrante da rede. Ser auto-gerador significa que todos os componentes, inclusive os da fronteira, são produzidos por processos internos à rede. Ser auto-perpetuador significa

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que os processos de produção continuam ao longo do tempo, de modo que todos os componentes são continuamente produzidos e reproduzidos pelos processos de transformação do sistema (CAPRA, Op. Cit., p.159).

O sistema social é necessariamente aberto, ou

seja, está em constante interação e/ou intercâmbio com o seu meio

(BERTALANFFY, Op. Cit., p.58); mais do que isto, esta constante interatividade com

o meio " [...] é um fator essencial, que lhe sustenta a viabilidade, a capacidade

reprodutiva ou continuidade e a capacidade de mudar (BUCKLEY, 1971, p.81). Daí

uma diferença fundamental entre sistemas fechados e sistemas abertos: naqueles, a

impossibilidade de interferência de novos elementos advindos do meio externo torna

o padrão de relações entre seus elementos internos constantes, ou seja, seus

princípios são eternos. Já nos sistemas abertos, as relações entre seus elementos

internos são constantemente modificadas em função da agregação de novos

elementos externos ou da própria modificação de seus elementos internos,

tornando-os essencialmente dinâmicos.

Esta interatividade constante de um sistema com o

seu meio dá-se através de, em uma linguagem cibernética, inputs (entradas,

imissões) e outputs (saídas, emissões). Os primeiros advêm do meio e impulsionam

o sistema, enquanto os segundos representam as respostas ao meio dadas pelo

sistema, a partir do reconhecimento pelo seu código cognitivo próprio. Um elemento

externo somente repercutirá no sistema se for capaz de ser reconhecido pelo seu

código de linguagem próprio, e a partir daí que se transformará em uma informação

a ser processada e emitida ao ambiente. Estas respostas, por sua vez, provocam

novas respostas emanadas do meio, ou seja, originam novos inputs. Este fenômeno

pode ser denominado como "efeito de retorno" ou feedback (realimentação),

podendo ser positivo ou negativo, conforme reforce ou reduza o comportamento

anterior de um sistema. Assim, como se observa, “em um sistema social, inputs

podem provocar outputs, e estes podem dar origem a novos inputs, e assim

sucessivamente “(NORONHA, Op. Cit., p.58)

Essa condição, portanto, torna o sistema social não

apenas dinâmico, mas também complexo, pois, como já afirmamos, sua permanente

interação externa (sistema aberto) pode produzir constantes absorções de

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elementos externos, bem como alterações em elementos internos que produzem

modificações nas suas relações com maior ou menor intensidade, refletindo-se na

sua função e estrutura. Segundo Buckley (Op. Cit., p.68), um sistema complexo

pode ser definido como:

[...] um complexo de elementos ou componentes direta ou indiretamente relacionados numa rede causal, de sorte que cada componente se relaciona pelo menos com alguns outros, de modo mais ou menos estável, dentro de determinado período de tempo. Os componentes podem ser relativamente simples e estáveis, ou complexos e mutáveis; podem variar em apenas uma ou duas propriedades ou assumir muitos estados diferentes. As inter-relações mais ou menos estáveis de componentes, que se estabelecem em qualquer tempo, constituem a estrutura particular do sistema nesse tempo, atingindo assim uma espécie de ‘todo’ com algum grau de continuidade e limites.

Esta característica dos sistemas abertos torna

extremamente dificultosa, ou mesmo impossível, a verificação de um padrão

permanente na estruturação e na coordenação de seus elementos internos. Daí que,

em sistemas abertos, esta verificação somente é possível em um determinado limite

de tempo. Este limite temporal, por sua vez, será determinado em função de vários

fatores, tais como a capacidade de adaptação de um sistema, a capacidade do

código de cognição do sistema em apreender o elemento externo, a quantidade de

elementos absorvidos pelo sistema bem como a qualidade da informação para

transformar o padrão de suas relações internas preestabelecidas, entre outros.

O meio ambiente de um sistema será sempre um

outro sistema que o engloba. Isto é o que chamamos de padrão de rede: cada nodo

da grande teia sistêmica reproduz um complexo jogo de inter-relações, e assim

sucessivamente. "Portanto, aquele que visto de um ângulo nos parece como um

sistema, será, se visto de outro ângulo, apenas um subsistema de outro sistema"

(NORONHA, Op. Cit., p.58). Assim ocorre com relação ao Direito e à Sociedade

como um todo.

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No esquema de Parsons1, encontra-se em

permanente interação com o sistema social (sociedade globalmente considerada)

quatro subsistemas: a Economia, a Política, o Direito e a Cultura. Deixando de lado

a análise da completude dessa construção esquemática, tem-se que o Direito é um

dos subsistemas do sistema social ou, invertendo-se o foco de observação, o

sistema Sociedade é o meio do subsistema Direito. Em última análise, e esta idéia é

essencial para este trabalho, tem-se uma interação permanente entre a Sociedade e

o Direito. Assim, as relações, distorções, valores, comportamentos, ou seja, todos os

elementos que compõem a Sociedade têm seu reflexo e, de alguma forma, com

mais ou menos intensidade, moldam o Direito2.

Viu-se que um sistema, para ser considerado como

tal, deve conter um mínimo de unidade e de coerência na interação de seus

elementos internos - ao menos em um determinado lapso de tempo - que estabelece

relações entre si estruturadas e coordenadas. Em um sistema aberto, a

dinamicidade e a complexidade internas conferem ao sistema a propriedade de se

readaptarem em função de uma alteração de alguma relação - ocasionada pela

introdução de um elemento externo novo, ou pela modificação de algum elemento

interno (por isso são chamados de sistemas adaptativos ou de organização). A

infinidade de elementos que interagem internamente em um sistema em um lapso

de tempo constitui um padrão determinado de relações, que podem ser abstraídas

em proposições abstratas que conferem ao sistema a coerência e a unidade

necessárias e, portanto, a própria condição de sistema. Essas proposições

abstratas, que não se confundem com os próprios elementos ou com suas relações

internas, são os princípios, ou suas “verdades básicas” (BOBBIO, 1996, p.159).

Estes, portanto, governam a dinâmica de um sistema aberto naquele determinado

1 Talcott Parsons pode ser considerado um dos pais da teoria funcionalista sistêmica. Sua análise não parte de uma noção de complexidade e de dinamicidade do sistema daí a grande crítica à sua teoria, que parte do pressuposto de que toda a organização social tende para um cooperação harmoniosa, um equilíbrio natural, negando os conflitos internos que a compõem. Segundo esta concepção, quaisquer alterações nos elementos ou em suas inter-relações, afastando o ponto de equilíbrio natural do sistema social, tende a ser sanado por alterações inerentes ao sistema de modo a restaurar o próprio equilíbrio. Sua teoria de sistemas sociais, desta forma, é considerada como estática ou mecânica. Portanto, ressalte-se, o esquema parsoniano não significa uma adesão total a suas idéias, mas apenas o aproveitamento de sua concepção sobre os subsistemas que compõem o sistema social. 2 Isto não quer dizer que o contrário também não possa ocorrer. Se os valores e elementos sociais interferem no subsistema Direito através dos inputs, sendo a relação sociedade-Direito dinâmica e aberta, este também interfere naquela através de outputs.

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momento analisado, e, neste lapso de tempo, lhe confere as propriedades básicas

para que seja conferida a sua condição de sistema.

Nesta perspectiva, pode-se dizer que os princípios

de Direito do Trabalho refletiam um certo padrão de inter-relações entre seus

elementos internos, ou seja, entre suas normas (BOBBIO, Op. Cit., p.19) (em sentido

amplo), próprios de um determinado período de configuração capitalista (capitalismo

organizado). Estas inter-relações internas ao Direito do Trabalho são verificadas

quando uma norma justrabalhista de hierarquia superior informa o conteúdo de uma

outra norma hierarquicamente inferior, e assim sucessivamente até chegarmos, por

exemplo, à sua incidência em uma relação concreta de trabalho. Este padrão se

perpetuará enquanto:

a) os novos elementos externos reconhecidos pelo direito como

informação a partir de seu código cognitivo binário próprio (lega/ilegal; permitido/ não

permitido; não alterarem a lógica das inter-relações valorativo-normativas do sistema

jurídico, ou;

b) enquanto estes elementos externos não puderem ser traduzidos como

informação pelo código jurídico-cognitivo, ou ainda;

c) enquanto os valores emitidos pela sociedade capitalista (meio ambiente

do Direito do trabalho) não se alterarem substancialmente, de modo a que os

elementos emitidos ao direito se perpetuem.

Sendo o Direito um sistema aberto, cujo meio é a

Sociedade e com esta está em constante interação, tem-se que os princípios de

direito refletem, em última análise, determinados valores e distorções que compõem

a complexidade do sistema social recepcionados pelo Direito e informadores de sua

estrutura normativa (SANTOS, 1988, p.141). Em outras palavras, nesta perspectiva,

os princípios podem ser vistos como síntese ou reflexo dos elementos externos

(sociais) recebidos pelo sistema jurídico e que o integram; estes elementos externos

podem ser emitidos diretamente a partir do sistema-ambiente (Sociedade) ou

indiretamente a partir dos subsistemas sociais outros que não o próprio Direito

(Política, Economia, Cultura) (NORONHA, Op. Cit., p.127). Assim, em uma

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perspectiva global, os princípios refletem os elementos (valores) emitidos pela

Sociedade ao Direito, bem como um padrão de relações estabelecidas entre o

conteúdo de suas normas internas a partir da integração deste elemento valorativo

emitido pela Sociedade.

Em outras palavras, podemos referir que os

princípios podem ser abordados em uma dupla perspectiva. Em uma ótica sistêmica,

o Direito está em constante interação com a Sociedade, interação esta que pode ser

vista tanto em uma perspectiva interna (a partir do Direito) quanto em uma

perspectiva externa (a partir da Sociedade). Em uma perspectiva interna, a

verificação do conteúdo valorativo gerado a partir da inter-relação de suas normas

identifica a lógica sobre a qual este ramo jurídico se sustenta, bem como os padrões

valorativo-normativos emitidos à Sociedade. Por exemplo, a medida em que uma

norma de Direito do Trabalho de hierarquia superior informava a uma outra norma

de hierarquia inferior o conteúdo proteger o trabalhador, este valor era emitido pelo

Direito do Trabalho à Sociedade através de suas normas.

Já em uma perspectiva externa, os princípios

refletem os valores sociais absorvidos pelo Direito e sobre os quais o mesmo se

sustenta e se molda. Assim, o conteúdo valorativo proteção do trabalhador, por

exemplo, somente se constituiu internamente no Direito do Trabalho porque a

Sociedade observou no Trabalho um valor a ser protegido socialmente. Estas duas

perspectivas (interna e externa), ao se revelarem nos princípios do Direito do

Trabalho (NORONHA, Op. Cit., p.182), justificam a importância da verificação destes

para o operador do direito. A seguir, veremos a seguir como se apresenta o mega-

princípio da tutela nestas perspectivas.

2.1 - O princípio da proteção

Os diversos tratadistas de Direito do Trabalho

divergem um pouco sobre a classificação dos princípios juslaboristas. No entanto,

um princípio é praticamente unânime: o princípio da proteção. Esta unanimidade é

atribuída à seguinte idéia, sintetizada por Plá Rodriguez (1996, p.30): "O fundamento

deste princípio está ligado à própria razão de ser do Direito do Trabalho." Vejamos

no que consiste este princípio.

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Explica-nos o autor acima citado que, "(...) no

Direito do Trabalho, a preocupação central parece ser a de proteger uma das partes

com o objetivo de, mediante essa proteção, alcançar-se uma igualdade substancial e

verdadeira entre as partes" (PLA RODRIGUEZ, Op. Cit., p.28) A necessidade de

proteção jurídica, assim, decorre da condição de subordinação pessoal e muitas

vezes econômica inerente ao trabalhador, encontrando, segundo o autor, um duplo

fundamento.

Süssekind (1993, p.128) afirma que "O princípio da

proteção do trabalhador resulta das normas imperativas e, portanto, de ordem

pública, que caracterizam a instituição básica do Estado nas relações de trabalho,

visando a opor obstáculos à autonomia da vontade". A seguir, citando Deveali,

afirma o autor ser o Direito do Trabalho "(...) um direito especial, que se distingue do

direito comum, especialmente porque, enquanto [este] supõe a igualdade das

partes, [o Direito do Trabalho] pressupõe uma situação de desigualdade que ele

tende a corrigir com outras desigualdades" (Ibid).

Viu-se anteriormente que os princípios representam

valores emitidos pela Sociedade ao Direito a partir da inter-relação de seus

membros, bem como deste para com aquela, a partir da inter-relação entre suas

normas. O Direito do Trabalho surgiu em um contexto de reconhecimento social dos

anseios de grupos até então oprimidos e, nesse contexto, revelou-os em seu

conteúdo valorativo interno. No entanto, surgiu também em um contexto de

reconfiguração do capitalismo existente na estruturação do capitalismo organizado a

partir de uma crise de acumulação do sistema como um todo (ou seja, de

preservação das relações sociais moldadas pela estrutura capitalista) e, sendo

assim, igualmente absorveu este elemento.

Em função do princípio da proteção sintetizar a

própria lógica do Direito do Trabalho, representando a quase totalidade das suas

normas, será tratado aqui como um mega-princípio, que fundamenta, em última

análise, os demais3. Como se sabe, o Direito do Trabalho tem como um dos

3 Todos os princípios citados pela grande maioria dos tratadistas de Direito do Trabalho revelam com maior ou menor clareza a lógica de dupla preservação consubstanciada no mega-princípio da proteção. Assim ocorre com os princípios da irrenunciabilidade dos Direitos Trabalhistas, da

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primeiros fundamentos a proteção do trabalhador. É oriundo da reformulação do

quadro social iniciada no capitalismo organizado a partir da ascensão do movimento

operário aos mecanismos de regulação social, principalmente o estatal, que visava a

inserção máxima (busca ao pleno emprego) e digna dos trabalhadores no mercado

de trabalho. A partir de então, voltou-se o Estado – e conseqüentemente, o Direito –

para o propósito de estabelecer patamares máximos de exploração ou mínimos de

dignidade aos trabalhadores. Esta característica do Direito do Trabalho protetiva do

trabalhador atribuiu-lhe, na visão de alguns tratadistas, um caráter revolucionário,

emancipatório do trabalhador, somente possível quando procedemos a uma

abordagem sistemática fechada, ou seja, excluindo as inter-relações constantes

entre Direito e Sociedade.

Isto porque, ao se identificar estas inter-relações

entre Direito e Sociedade, verificar-se-á que, ao estabelecer um patamar mínimo, o

Direito do Trabalho acabou igualmente preservando a exploração. Nesse sentido,

[...] o Direito do Trabalho surgiu também com a função de realimentação ou de preservação do sistema capitalista. Esta perspectiva extra-sistêmica de permanente interatividade entre Sociedade e Direito, e onde este se configura como subsistema daquela, nos auxilia no entendimento do porquê o Direito do Trabalho apenas surgiu quando a sociedade capitalista atingiu uma determinada configuração (capitalismo organizado) já analisada em outro lugar (DORNELES, 1999, p.91).

No processo de produção capitalista há uma

separação entre o produtor e os proprietários dos meios de produção. Esta

característica configurou, a partir da consolidação do sistema capitalista, uma nova

forma de exploração social baseada nas noções de mais-valia e de trabalho

excedente. No plano dos fatos, na imensa maioria dos casos, esta forma de

exploração provoca a dependência econômica do trabalhador. Sendo assim, o

Direito do Trabalho surgiu para regular uma situação econômica em que um homem

– o trabalhador - depende economicamente do outro – o proprietário dos meios de

produção, e onde um homem – o proprietário dos meios de produção - apropria

grande parte do valor gerado na cadeia de produção pelo outro (mais-valia).

continuidade da relação de emprego, da primazia da realidade, os princípios da integrabilidade, da

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As relações de produção que ocorrem no interior

da sociedade capitalista interagem entre si e informam a ordem jurídica que, por sua

vez, ampara esta relação de exploração. Assim, o proprietário dos meios de

produção, amparado pelo sistema jurídico, determina aos trabalhadores o que,

como, onde, quando e com que finalidade produzir. Muitas vezes, o trabalhador está

inserido em um sistema de normas que tornam extremamente débil o seu poder de

decisão, envolvendo-se em uma cadeia de produção cujas conexões sociais sequer

conhece (padrão taylorista/fordista, em que o trabalhador não tem a consciência do

todo, do que produz).

No entanto, o Trabalho que se insere na cadeia

produtiva não se separa da pessoa humana do prestador. Esta noção fundamental à

lógica do Direito do Trabalho somente pôde ser reconhecida quando os próprios

trabalhadores se organizaram e puderam expor suas necessidades e reivindicar a

preservação de sua dignidade perante todo o grupo social, transformando o valor

dignidade humana do trabalhador um elemento chave mesmo em uma sociedade

tipicamente capitalista (ou seja, que se baseia, entre outros fatores, na exploração

do trabalho humano). Por isto, pode-se afirmar que

[...] a relação visada pelo Direito do Trabalho é imediata em relação ao trabalho, porém mediata em relação à pessoa. Em outras palavras: quando um trabalhador se insere no processo produtivo, insere-se imediatamente a sua força de trabalho, mas também, mediatamente, a pessoa humana e sua dignidade, pois ambas nunca podem ser separadas (ARAUJO, 1996, p.77).

É a partir desta constatação global da relação de

trabalho que o Direito do Trabalho define sua lógica. Lógica esta que se baseia em

uma dupla perspectiva de preservação. O Direito do Trabalho busca um sistema de

proteção mínima (nunca máxima) que preserve a dignidade da pessoa humana

trabalhadora; nesta perspectiva, estas garantias tentam compensar a diferença

sócio-econômica (exploração) existente no seio das relações capitalistas de

trabalho. Já em outra perspectiva, estas garantias mínimas preservam a diferença

econômica (exploração) existente no seio da sociedade capitalista, embora procure

fazer com que a mesma não aumente. Esta é a função normativa do Direito do

Trabalho: por um lado, não deixar que a diferença sócio-econômica entre

trabalhador e empregador aumente, preservando àqueles garantias mínimas; por

intangibilidade e da irredutibilidade salariais, da não discriminação, entre os mais referidos.

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outro lado, legitima juridicamente um determinado regime de exploração do

trabalhador, preservando o sistema capitalista. Este é o princípio da proteção:

[...] ao mesmo tempo que, em uma perspectiva intra-sistêmica, busca preservar a dignidade do trabalhador (valor social dignidade da pessoa humana), acaba indiretamente, em uma perspectiva global ou inter-sistêmica, preservando a lógica da exploração capitalista (valor social capitalismo como modo de produção hegemônico) (ARAUJO, Op. cit., p.79).

2.2 O princípio da igualdade e o parágrafo único do artigo 7º da CF/88

O termo princípio é utilizado, sem distinção, em

várias searas do saber humano. No vernáculo, o dicionário Aurélio Buarque de

Holanda dá várias acepções à palavra:

Princípio: [Do lat. Principiu.] S.m. 1. Momento ou local ou trecho em que algo tem origem (...) 2. Causa primária. 3. Elemento predominante na constituição de um corpo orgânico. 4. Preceito, regra, lei. 5. P. ext. Base; germe (...) 6. Filos. Fonte ou causa de uma ação. 7. Filos. Proposição que se põe no início de uma dedução, e que não é deduzida de nenhuma outra dentro do sistema considerado, sendo admitida, provisoriamente, como inquestionável. [São princípios os axiomas, os postulados, os teoremas etc.] (HOLANDA apud ESPÍNDOLA, 2002, p. 52).

Adiante, noutra passagem do referido glossário,

registra-se o significado de princípios – agora no plural: “Princípios. (...). 4. Filos.

Proposições diretoras de uma ciência, às quais todo o desenvolvimento posterior

dessa ciência deve estar subordinado" (HOLANDA apud ESPÍNDOLA, Op. Cit.,

p.52).

Demonstrado singelamente o significado de

princípio, trazemos então à colação o conceito de princípio constitucional, alinhado

pela professora Carmem Lúcia Antunes Rocha apud Espíndola (Op. cit., p.53):

Os princípios constitucionais são os conteúdos primários diretores do sistema jurídico-normativo fundamental de um Estado. Dotados de originalidade e superioridade material sobre todos os conteúdos que formam o ordenamento constitucional, os valores firmados pela sociedade são transformados pelo Direito em princípios. Adotados pelo constituinte, sedimentam-se nas normas, tornando-se, então, pilares que informam e conformam o Direto que rege as relações jurídicas do Estado. São eles, assim, as colunas mestras da grande construção do Direito, cujos fundamentos se afirmam no sistema constitucional [...]

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A Constituição da República, no caput do art. 5º, cláusula

pétrea, consagra o princípio da igualdade: "todos são iguais perante a lei, sem

distinção de qualquer natureza". Desta feita, não se pode admitir nenhuma forma

de discriminação, principalmente pela própria Constituição, que tem como postulado

o dogma da paritate.

Rezam as constituições – e a brasileira estabelece no art. 5º, caput – que todos são iguais perante a lei. Entende-se, em concorde unanimidade, que o alcance do princípio não se restringe a nivelar os cidadãos diante da norma legal posta, mas que a própria lei não pode ser editada em desconformidade com a isonomia (MELLO, 1995, p.9).

E continua Mello (Op. cit., p.9) :

O preceito magno da igualdade, como já tem sido assinalado, é norma voltada quer para o aplicador da lei quer para o próprio legislador. Deveras, não só perante a norma posta se nivelam os indivíduos, mas, a própria edição dela sujeita-se ao dever de dispensar tratamento equânime às pessoas.

Todavia, a norma prescrita no parágrafo único do

art. 7º, do Texto Político, especificando quais são os direitos garantidos ao

empregado doméstico, discriminou-o, pois ao particularizar, estabeleceu diferenças

entre os trabalhadores, afetando o princípio constitucional da isonomia, consagrado

como o maior vetor do direito pátrio.

O parágrafo único do art. 7º, embora seja uma

norma inserida na Carta, não está em consonância com o princípio da igualdade,

que "é a bússola que norteia a elaboração da regra, embasando-a e servindo de

forma para sua interpretação. Os princípios influenciam as regras. Estas não

influenciam os primeiros" (MARTINS, 2000, p.111).

Desse modo, em face de tal princípio, não poderia

a Norma Maior discriminar o empregado doméstico, concedendo-lhe menos direitos

que ao trabalhador comum. Pois, se todos são iguais perante a lei, sem distinção de

qualquer natureza, o laborista do âmbito familiar deve ter regime jurídico equiparado

ao dos demais empregados.

O professor José Cretella Júnior (1998, p.1036),

apesar de ter posicionamento contrário à ampliação dos direitos dos trabalhadores

domésticos, assim manifestou a contradição do legislador constituinte:

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O art. 7º, parágrafo único da Constituição de 5 de outubro de 1988, que estamos comentando, alterou os princípios que informam a nossa Oitava Constituição da República Federativa do Brasil, o da igualdade entre eles. Se todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, o regime jurídico do trabalhador doméstico, advindo da relação empregatícia é equiparado ao regime jurídico trabalhista dos demais empregados de fábricas, indústrias ou empresas [...]

Desta forma, ressurte inconteste que o parágrafo

único do art. 7º da Carta feriu o princípio da igualdade, pois se todos devem ser

tratados com paridade, não poderia tal dispositivo limitar de forma discriminatória os

direitos do trabalhador doméstico, gerando desarmonia no sistema jurídico.

3 - O EMPREGADO DOMÉSTICO NO DIREITO BRASILEIRO

A definição de empregado doméstico apresenta

muitos aspectos comuns à configuração do empregado celetista, prevista no art. 3º.

Tanto o doméstico quanto o trabalhador comum são pessoas físicas que prestam

serviços não eventuais, de forma subordinada e mediante salário. As únicas

diferenças estão no fato de que a prestação de serviço doméstico se vincula ao

âmbito familiar, sem fins lucrativos, enquanto que o trabalhador comum se presta a

uma atividade empresarial que visa lucro.

A Lei 5.859, de 11/12/72, que dispõe sobre a

prestação de serviço doméstico, conceitua este trabalhador como "aquele que presta

serviços de natureza contínua e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família, no

âmbito residencial destas" (art. 1º), concedendo-lhe basicamente direito à férias,

assinatura da CTPS, filiação obrigatória à Previdência Social, FGTS e seguro-

desemprego. Estes dois últimos, facultativamente.

A Constituição Federal de 1988, no capítulo "DOS

DIREITOS SOCIAIS", elencou no art. 7º, parágrafo único, outros direitos além

daqueles especificados na citada Lei n. 5.859/72.

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Inúmeras críticas foram dirigidas acerca do rol de

direitos do trabalhador doméstico na Constituição. Houve quem defendesse somente

a inserção de direitos de caráter genérico, sem particularidades que deveriam ficar a

cargo de lei ordinária, pois tal especificação inibiu a equiparação do doméstico aos

demais empregados definidos no art. 3º da CLT.

As legislações, constitucional e infraconstitucional,

reguladoras da prestação de serviço doméstico são extremamente restritivas quanto

aos direitos dessa categoria, permanecendo tais trabalhadores excluídos do campo

de aplicação dos demais direitos garantidos aos laboristas comuns.

Domésticos e empregados são segurados

obrigatórios nos termos do art. 11, incisos I e II, da Lei 8.213/91 (Lei de Benefícios),

possuindo, como regra, os mesmos direitos previdenciários. Como exceção,

podemos citar o salário-família, somente percebido pelos empregados (art. 65 da Lei

de Benefícios).

Outra diferenciação, que é o objeto deste capítulo,

determina que o período de carência do doméstico não é computado a partir da data

de sua filiação, como é feito para o empregado, mas tão-somente a partir da data do

efetivo pagamento da primeira contribuição sem atraso.

Ora, indaga-se: qual o motivo de tal distinção?

Esta indagação é de suma importância para a

verificação da constitucionalidade de tal distinção, vez que, como ensina Alexandre

de Moraes:

O princípio da igualdade consagrado pela constituição opera em dois planos distintos. De uma parte, frente ao legislador ou ao próprio executivo, na edição, respectivamente, de leis, atos normativos e medidas provisórias, impedindo que possam criar tratamentos abusivamente diferenciados a pessoas que encontram-se (sic) em situações idênticas. Em outro plano, na obrigatoriedade ao intérprete, basicamente, a autoridade pública, de aplicar a lei e atos normativos de maneira igualitária, sem estabelecimento de diferenciações em razão de sexo, religião, convicções filosóficas ou políticas, raça, classe social (MORAES, 1999, p.62).

Assim, devemos inicialmente identificar quais são

as diferenças existentes entre os empregados comuns e os domésticos. Após,

analisar a guerreada distinção da Lei de Benefícios. Por fim, devemos verificar se

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esta distinção é lógica e razoavelmente compatível com as diferenças constatadas

entre ambos.

Segundo Martins (2000, p.39):

O que caracteriza o doméstico não é a natureza do serviço que faz, mas onde presta os serviços: no âmbito doméstico.

A definição de empregado doméstico precisa, assim, ser mais bem enunciada, da seguinte forma: empregado doméstico é a pessoa física que presta serviços de natureza contínua à pessoa ou família, para o âmbito residencial destas, desde que não tenham por objeto atividade lucrativa.

Afora este aspecto, não há distinção entre posição

do doméstico e dos demais empregados. Ambos são perfeitamente alcançados pela

definição de empregado:

"Empregado é a pessoa física que com ânimo de

emprego trabalha subordinadamente e de modo não-eventual para outrem, de quem

recebe salário" (NASCIMENTO, 1996, p.324).

A distinção feita pela norma previdenciária,

colocando o empregado doméstico em evidente desvantagem em relação ao

empregado comum não encontra nenhum respaldo lógico ou razoável, vez que: a

posição de subordinação perante seu empregador é a mesma do empregado

comum, ou até pior, haja vista que, na esmagadora maioria dos casos, o trabalhador

doméstico é pessoa de poucas letras; a responsabilidade para o recolhimento do

tributo é, em ambos os casos, do empregador; a falta de conhecimento da legislação

atinge ambos de forma idêntica, como regra.

De outra parte, os arts. 35 e 36 da Lei de

Benefícios, ao permitirem a concessão de benefícios de valor mínimo aos

empregados e domésticos que não comprovarem os valores de seus salários-de-

contribuição, conferem tratamento assemelhado a ambos, reforçando as idéias

acima expostas.

Nesse sentido, encontra-se também a abalizada

doutrina de Martinez (2001, 192):

O dispositivo discriminou social e juridicamente o doméstico, trabalhador subordinado e hipossuficiente, e andaria melhor o legislador se o tivesse dispensado de severa restrição. Além de não ser responsável pelo

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recolhimento das contribuições (PCSS, art. 30, V), a norma representa inquestionável distinção constitucional. Tal distinção operada, incluindo o doméstico a partir de 1.°.11.91, é odiosa, pois trata-se de hipossuficiente, geralmente recolhendo com base no mínimo, e em muitos casos incapaz de compreender a legislação. Igualou-o ao empresário e isso não tem propriedade.

Encontramos também na jurisprudência

manifestações favoráveis aos domésticos, como se observa do seguinte aresto:

PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. EMPREGADA DOMÉSTICA. CARÊNCIA. COMPROVAÇÃO. I – A legislação atribui exclusivamente ao empregador doméstico, e não ao empregado, a responsabilidade quanto ao recolhimento das contribuições previdenciárias (ex vi do art. 30, inciso V, da Lei 8.212/91). II – A alegada falta de comprovação do efetivo recolhimento não permite, como conseqüência lógica, a inferência de não cumprimento da carência exigida. Agravo regimental desprovido." (STJ; AGRG 331.748/SP; Rel. Min.Felix Fischer; 5ª T.; J. em 28/10/2003; DJ de 09/12/2003; p.310).

Assim também se manifestaram as seguintes

Cortes: TRF 4ª R. – AC 1998.04.01.071530-0 – RS – 5ª T. – Rel. Juiz Néfi Cordeiro

– DJU 06.09.2000 e TRF 1ª R. – AC 01990036594 – MG – 1ª T. – Rel. Des. Fed.

Luiz Gonzaga Barbosa Moreira – DJU 13.10.2003 – p. 43.

No entanto, a falta de informação tem afastado os

segurados domésticos de seus direitos previdenciários, vez que, a negativa legal

(mas inconstitucional, repita-se) do INSS ao analisar pedidos de benefícios com

carências não cumpridas diante da norma em questão, faz com que milhares de

contribuintes não recebam benefícios por culpa de seus empregadores.

Como solução, num primeiro momento, o

dispositivo legal em questão precisa ser sopesado pelo Poder Judiciário tendo em

conta os princípios constitucionais da isonomia e da dignidade da pessoa humana,

bem como "em relação ao disposto no art. 45 do PCSS, com a redação dada pela

Lei n. 9.032/95 (autorizou contribuintes individuais a recolherem atrasados tomando

como base de cálculo valores hodiernos)" (MARTINEZ, op. cit., p. 193).

Num segundo momento, mas com urgência, deve o

legislador infraconstitucional reparar seu equívoco e equiparar os equiparáveis,

expurgando tal norma de nosso sistema, o que poderia ser feito, diga-se de

passagem, pelo próprio Poder Executivo utilizando-se de sua prerrogativa

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constitucional de editar medidas provisórias, vez que evidenciada a urgência e a

relevância do tema.

3.1 Instituição de direitos trabalhistas e previdenciários Leis 10.208/2001 e

11.324/2006

Como estava, o ordenamento jurídico laboral

ostentava gravíssima ofensa ao princípio da isonomia( art. 5 , caput da Carta

Magna), mantendo-se duas classes de trabalhadores, sem qualquer motivo

plausível, em clara discriminação.

Atendendo aos reclamos de muitos, as Leis

10.208/2001 e principalmente a 11.324/2006, veio ampliar consideravelmente os

direitos trabalhistas e previdenciários dos empregados domésticos.

A lei n. 10.208/2001, na qual foi convertida a

Medida Provisória n. 2.104-16, de 23 de fevereiro de 2001, alterou dispositivos da

Lei n. 5.859/72 para facultar o acesso do empregado doméstico ao Fundo de

Garantia do Tempo de Serviço(FGTS) e ao Seguro Desemprego.

A inclusão do empregado no FGTS fica a critério

do empregador, a quem compete fazer o requerimento nesse sentido. O seguro

desemprego é devido ao doméstico no valor de um salário mínimo, por um período

máximo de três meses, de forma contínua ou alternada.

Esse benefício será concedido ao empregado

inscrito no FGTS, despedido sem justa causa, que houver trabalhado como

doméstico por, no mínimo, quinze meses nos últimos vinte e quatro meses contados

da dispensa. Deverá ser requerido a partir de sete até noventa dias contados da

dispensa, podendo ser renovado a cada período de dezesseis meses decorridos do

desligamento que originou o benefício anterior.

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No que tange aos direitos trabalhistas a Lei n.

11.324/2006, estabeleceu :

a) férias anuais remuneradas de trinta dias com o acréscimo de 1/3, após

doze meses de trabalho prestado à mesma pessoa ou família;

b) estabilidade provisória à empregada doméstica gestante, sendo vedada

sua dispensa arbitrária ou sem justa causa desde a confirmação da gravidez até

cinco meses após o parto;

c) a proibição de o empregador efetuar descontos do salário do

empregado por fornecimento de alimentação, vestuário, higiene ou moradia,

ressalva feita, em relação a esta, para o caso de se tratar de local diverso da

residência em que ocorrer a prestação de serviços, e desde que essa possibilidade

tenha sido expressamente acordado entre as partes;

d) vedação de incorporação dos valores pecuniários das referidas

despesas na remuneração para quaisquer efeitos, negando-se a eles natureza

salarial;

e) extensão ao empregado doméstico do direito ao repouso semanal

remunerado, ao revogar a alínea a do art.5 da Lei n. 605/1949.

Em relação a benefício de ordem fiscal, instituiu-se

a faculdade de o empregador doméstico deduzir, até o exercício de 2012, ano

calendário de 2011, a contribuição patronal paga à Previdência Social incidente

sobre valor da remuneração correspondente a um empregado doméstico por cada

declaração, mesmo no caso de declaração em conjunto.

3.2 Estabilidade Provisória da Gestante Celetista na CF/88

Estabilidade provisória é o período em que o

trabalhador tem assegurado o exercício de seu emprego, cargo ou função, por

determinado lapso temporal, não podendo ser dispensado por vontade do

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empregador, sem que se registre motivo legal como por exemplo, justa causa (Art.

7º, inc. I, da CF/88).

A Carta da República protege a relação de

emprego da gestante contra a despedida arbitrária ou sem justa causa como

espécie de estabilidade provisória, visando mantê-la no emprego, outorgando-lhe

tranqüilidade suficiente para levar a bom termo sua gravidez.

Conferindo efetividade a tal direito, o art. 10, inc. II,

letra b, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, determina que "até que

seja promulgada lei complementar a que se refere o artigo 7º, inciso I, da CF, fica

vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa da empregada gestante desde a

confirmação da gravidez até cinco meses após o parto".

Assim, se demitida sem motivo justificado, tem a

gestante direito aos salários relativos à licença maternidade propriamente dita e ao

período de garantia de emprego, previsto no citado artigo do ADCT.

A disposição reguladora dos direitos da

trabalhadora gestante procura atingir duplo objetivo: a uma, garantir o trabalho da

mulher, porque na fase de gestação a obreira necessita de segurança econômica e

emocional, que são encontradas com a manutenção de seu emprego; a duas,

assegurar sobretudo o bem-estar do nascituro. Em virtude desses dois fatores de

proteção, dá-se uma garantia especialíssima à empregada gestante (CLT, arts. 391

a 395).

3.3 Estabilidade Provisória da Empregada Doméstica Gestante

No tocante à proteção endereçada à empregada

doméstica gestante, expressamente lhe foi conferido o direito à licença-maternidade,

uma vez que o parágrafo único do art. 7º da CF/88, faz remissão ao inciso XVIII do

mesmo dispositivo, garantidor de tal direito

Anote-se que a licença maternidade é um período

em que a trabalhadora permanece afastada do trabalho recebendo ordenado em

virtude do nascimento de filho, que, com o advento da atual Carta Política, passou a

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ser de 120 dias. Nesse espaço de tempo é devido o chamado salário maternidade, o

qual fica a cargo do INSS.

Como o parágrafo único do art. 7º da Carta não

menciona o seu inciso I, tinham-se concluído de forma equivocada que a empregada

doméstica não fazia juz à estabilidade gestante prevista no art. 10, do ADCT.

Todavia tal ilação não resiste a uma interpretação consentânea com os princípios

norteadores da Lei Maior: igualdade, dignidade da pessoa humana, proteção à

criança etc.

Tanto a empregada doméstica quanto as demais

trabalhadoras gestantes merecem a mesma proteção, pois não há nenhuma

diferença ontológica entre as duas mães. Não se pode aceitar a tese de que existem

duas categorias de mulheres, para considerar que o art. 10 do ADCT não se

aplicaria às empregadas domésticas gestantes.

Martins (2000, p.74), discorrendo sobre o assunto,

redigiu orientação nos seguintes termos:

[...] os argumentos utilizados para negar estabilidade provisória à gestante doméstica, baseados na interpretação isolada da norma contida no art. 7º, I, e parágrafo único, da CF, mostram-se equivocados. A boa hermenêutica jurídica nos ensina que, em primeiro lugar, deve-se buscar a razão de ser do direito e de seus princípios, conjugando-os com a interpretação sistemática das normas que se mostram consentâneas com os institutos em estudo. Assim, data máxima vênia, daqueles que entendem divergentemente, pensamos que o reconhecimento da garantia no emprego da gestante doméstica, ao contrário que possa parecer, encontra asilo dentro da própria Constituição Federal e está em consonância com os princípios protetivos do Direito do Trabalho.

A Constituição, ao estabelecer a garantia em

questão, visou amparar a gestante bem como o nascituro, dando-lhes segurança

financeira pelo menos até cinco meses após o parto. “Entender que a condição de

doméstica retira da mãe e do nascituro a proteção que a CF definiu para a

empregada gestante em geral, fere, no mínimo a razoabilidade” (PAMPLONA FILHO

e VILLATORE, 2000, p. 104).

Eram poucas as decisões dos tribunais

reconhecendo o direito à estabilidade gestante à empregada doméstica, mas alguns

julgados eram encontrados:

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GESTANTE – EMPREGADA DOMÉSTICA – ESTABILIDADE PROVISÓRIA – APLICAÇÃO DO ART. 10, INCISO II, ALÍNEA B DO ATO DAS DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS TRANSITÓRIAS. À gestante despedida sem justa causa, mesmo na condição de doméstica são devidos os salários e vantagens correspondentes ao período estabilitário, aplicando-se-lhes a norma constante do art. 10, inciso II, alínea b do ADCT (Acórdão por unanimidade da 2ª Turma do TRT – 12ª Região, Recurso Ordinário 2064/98 – Rel. Juiz João Cardoso, J. 10.8.1998 – DJ/SC, de 19.8.1998, p. 181).

EMPREGADA DOMÉSTICA – GESTANTE – GARANTIA DE EMPREGO. Constituição negou à empregada doméstica a proteção da relação de emprego contra despedida arbitrária ou sem justa causa como especifica o parágrafo único do art. 7º. Todavia, o dispositivo contempla, dentre os direitos reservados às doméstica, o inc. XVIII e esse assegura à gestante a licença-maternidade de cento e vinte dias sem prejuízo do emprego e do salário. O art. 10 do ADCT, no inc. II, alínea b, veda a dispensa da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto, sem discriminar a empregada doméstica. (TRT – 2ª Região – 8ª T.; RO nº 029.901.606-76 (20000259033); rel. Juiz José Carlos Arouca; DOESP 4/7/2000 ST 137/65)

GESTANTE – EMPREGADA DOMÉSTICA. A licença de 120 dias à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, constitui direito e garantida fundamental expressamente conferidos à categoria dos trabalhadores domésticos pelos incs. XVIII e XXXIV, parágrafo único, do art. 7º, da CF. Assim, a norma contida no art. 10, b, do ADCT, não pode ser interpretada de forma a contrariar o próprio texto da CF. Dispensada injustamente se encontra sob o manto da proteção constitucional a reclamante, doméstica, faz jus à indenização correspondente ao período estabilitário. (TRT – 3ª Região – 5ª T.; RO nº 5.080/00; Rela. Juíza Maria A Duarte de Las Casas; DJMG 16/9/2000) ST 138/84).

Ademais, a proteção à gestante conferida pelo art.

10 do ADCT, não se direciona somente à determinada classe de trabalhadora, como

acreditavam alguns. O dispositivo não discrimina a empregada doméstica, a fim de

que tenha menos direitos que as outras grávidas, pois não visou assegurar apenas o

emprego à gestante mas também o bem estar do nascituro. Portanto, se o

constituinte não diferenciou, não é lícito ao intérprete fazê-lo.

Desta forma, não estender à empregada doméstica

o direito à estabilidade gestante espanca o objetivo do texto constitucional, lavrado

no preâmbulo da Lex Fundamentalis, que é “[...] instituir um Estado Democrático,

destinado à assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a

segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça [...]".

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Portanto, a Lei n.11.324/2006, veio ao encontro dos

reclamos, acrescentar à Lei n. 5.859/72, o art.4-A, o qual tem esta redação:

“ Art. 4-A – É vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa da empregada

doméstica gestante desde a confirmação da gravidez até 5 (cinco) meses após

o parto.”

Corrigiu-se uma discriminação da Constituição de

1988, concedendo-se às domésticas grávidas, os mesmos direitos das

trabalhadoras urbanas e rurais.

Verifica-se a preocupação do legislador

constituinte ao deixar patente na Carta que "todos são iguais perante a lei". O

sentido de "todos" no texto tem abrangência amplíssima, compreendendo a

coletividade em geral e restaria vulnerado se admitisse que a empregada doméstica

gestante está excluída do "todo".

4. Controvérsia a cerca da facultatividade/obrigatoriedade do Fundo de

Garantia do Tempo de Serviço e o Seguro Desemprego do doméstico

A Lei n. 10.208/2001, ao conceder a possibilidade

de inclusão do empregado doméstico no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, a

critério do empregador , o qual compete fazer este requerimento, na realidade,

nega, está concessão, pois, apenas faculta ao empregador incluir ou não o

empregado doméstico ao FGTS, na realidade a Lei já nasceu morta para o

empregado.

O benefício do Seguro Desemprego, somente será

concedido ao empregado doméstico, se o mesmo estiver inscrito no FGTS, que for

despedido sem justa causa.

Assim, os Artigos 3ª. A. e 6ª.A. Lei 5.859/72,

alterado pela Lei 10.208/2001, trazem em seu bojo supostos benefícios, que na

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realidade não produzirão o bem que todos almejaram, ou seja, medidas capazes de

reduzirem a grande dívida social dos empregados domésticos, todavia, manteve-se

na lei uma atitude injusta , discriminatória e desigual, o que vem fazer com que o

empregado doméstico, tão digno quanto qualquer outro trabalhador, seja excluído

dos mesmos direitos garantidos aos demais trabalhadores.

Depreende-se mas uma vez, a discriminação em

face dessa categoria de trabalhadores, em total afronta ao Princípio da Proteção e

da Isonomia prevista na Constituição Federal/88

Se a inclusão do trabalhador doméstico ao Fundo

de Garantia do Tempo de Serviço é uma faculdade do empregador, claro está que o

mesmo jamais irá requerer a inscrição do empregado, o que com certeza o impedirá

de ter acesso ao benefício do Seguro Desemprego, pois, não terá o trabalhador

doméstico como cumprir uma das exigências estabelecida no inciso III, do art.6ª.B,

da Lei 5.859/72.

“ III – Comprovantes do recolhimento da contribuição previdenciária e do

FGTS...”

A Lei n. 10.208/2001, contrariando o Art. 7, III, da

Carta Magna, de que o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, passou a ser um

direito social a todos os trabalhadores urbanos e rurais, o que compõe o chamado

mínimo de garantias, expresso no caput do artigo 7, da Constituição Federal/88,

constitui um direito tutelado pelo Estado, o que o torna inafastável pela vontade das

partes.

Assim, verifica-se, que a Lei n. 10.208/2001, ao

dispor do FGTS ao empregado doméstico, deu tratamento discriminatório, oposta ao

que foi dado pela Carta Maior de 1988 aos trabalhadores urbanos e rurais. A o

contrário da Constituição Federal/88, a mencionada Lei não tornou o FGTS um

direito OBRIGATÓRIO, estabeleceu como direito facultativo, ou seja, os empregados

domésticos somente terão acesso se houver a concordância do empregador

doméstico.

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Se é certo que a Constituição Federal/1988, não

estendeu aos trabalhadores domésticos o direito ao FGTS, não é menos certo que a

Carta Magna estabeleceu o FGTS como regime geral e obrigatório a todos os

trabalhadores, independente da concordância do empregador, não tendo previsto

em nenhum momento a discriminação da categoria de trabalhadores a qual seria o

FGTS facultativo em relação a esta ou aquela categoria, logo, consideramos que a

Lei 10.208/2001, fere o caput do art.7, da Constituição Federal/88.

Entendemos , que ainda que não se considere que

a lei que instituiu o FGTS aos empregados domésticos seja inconstitucional, a

mesma fere os princípios gerais do Direito do Trabalho, em especial o princípio da

proteção e o caput do art.7, da Carta Magna/88.

Sendo o FGTS um direito social, o qual integra o

mínimo de garantias, o mesmo não pode ficar condicionado à vontade de uma das

partes, não podendo ter um caráter facultativo, o que deixaria o FGTS de ser

protegido por normas tutelares e cogentes.

O argumento é o mesmo de sempre, as vozes

neoliberais como meio de evitar a ampliação das garantias trabalhistas, alegam de

que a obrigatoriedade contribuiria para a informalidade e o desemprego, se assim

fosse, nenhuma categoria profissional lutaria por melhores condições de trabalho, na

realidade o acesso facultativo ao FGTS parece ter decorrido em grande parte de

fatores políticos, e o receio de desagradar a classe média.

Tal situação deve ser rechaçada de plano, a

importância social do trabalhador doméstico, supera o encarecimento do contrato e

melhor atende aos princípios constitucionais de proteção à dignidade humana e do

valor social do trabalho, e assim, devem a categoria dos empregados domésticos

receberem o mesmo tratamento jurídico que é dado aos demais trabalhadores.

Entendemos, que somente se conseguiria

resgatar essa dívida histórica que a sociedade brasileira tem para com a categoria

dos empregados domésticos se, tornasse obrigatória a inclusão do empregado

doméstico ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, o que lhes confeririam o

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direito real ao FGTS e Seguro Desemprego, haja vista que teriam como cumprir com

a exigência do inciso III, do Art.6ª. A. da Lei 5.859/72.

5 - CONCLUSÃO

As medidas legais em referência procuram

resgatar uma dívida histórica que a sociedade tem para com uma categoria

profissional que, embora não exercendo atividade econômica, presta relevantes

serviços à família. As medidas adotadas representam um significativo avanço, mas

que ainda não são suficientes, não obstante possuir singularidades que o

diferenciam do contrato de trabalho em geral, não justifica o tratamento jurídico

restritivo e discriminatório sofrido pela categoria, o que vem ocorrendo desde a

edição da Lei 5.859/72, e que se agravou com a edição da Lei n. 10.208/2001.

O acesso facultativo dos trabalhadores domésticos

ao FGTS, condicionado à vontade unilateral do empregador, afronta o texto

constitucional e os princípios gerais do Direito do Trabalho, que consagra os direitos

sociais dos trabalhadores, incluídos aí os domésticos, como mínimo de garantias,

significando que estes são indisponíveis de serem afastados pela vontade de uma

das partes e têm caráter obrigatório.

Assim, entendemos que o direito dos empregados

domésticos ao FGTS não pode ter caráter facultativo, tal como previsto pela Lei n.

10.208/2001, senão obrigatório, a fim inclusive de que os mesmos possam ter

acesso ao benefício do Seguro Desemprego.

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