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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” INSTITUTO A VEZ DO MESTRE LEI DO INQUILINATO, CONTRATO DE LOCAÇÃO E CLÁUSULAS ABUSIVAS ESTUDO COMPARADO – PERSPECTIVAS E POSSIBILIDADES Por: Silvia Mendes da Silva Pavan Orientador Prof. Wiliam Rocha Rio de Janeiro 2008

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

LEI DO INQUILINATO, CONTRATO DE LOCAÇÃO E

CLÁUSULAS ABUSIVAS

ESTUDO COMPARADO – PERSPECTIVAS E

POSSIBILIDADES

Por: Silvia Mendes da Silva Pavan

Orientador

Prof. Wiliam Rocha

Rio de Janeiro

2008

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

LEI DO INQUILINATO, CONTRATO DE LOCAÇÃO E

CLÁUSULAS ABUSIVAS

ESTUDO COMPARADO – PERSPECTIVAS E

POSSIBILIDADES

Por: Silvia Mendes da Silva Pavan

Monografia apresentada à Universidade

Candido Mendes – Instituto A Vez do

Mestre, como condição prévia para a

conclusão do Curso de Pós- Graduação

“Lato Sensu” em Direito do Consumidor.

Rio de Janeiro

2008

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus, Senhor da minha

vida, e em quem confiei ao assumir esta

empreitada, e a todos aqueles que de

alguma forma contribuíram para a

conclusão deste trabalho.

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Dedico às minhas amigas Maria de

Fátima Couto Barbosa e Glória Regina

dos Santos Argento, amigas incansáveis

e verdadeiras, presentes em todos os

momentos da minha vida, e que apesar

dos meus inúmeros defeitos, me amam

incondicionalmente.

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RESUMO

A presente pesquisa traz à tona a discussão acerca dos inúmeros

problemas enfrentados por aqueles que não possuem moradia própria, e ficam à

mercê das imobiliárias e seus contratos leoninos recheados com cláusulas ilegais.

Tal fato ocorre por não terem a quem recorrer, sendo obrigados a

submeter-se, ou retornar à procura de outro imóvel, muitas vezes não dispondo de

tempo hábil ou condições de esperar até encontrar outro nas condições

necessárias.

O presente estudo tem por objetivo demonstrar os efeitos da lei 8.078/90

nesta relação, bem como os aspectos de sua aplicabilidade, e as implicações de

uma efetiva fiscalização, se for necessário, a fim de garantir o elemento limitador

da liberdade de contratar, com base na função social dos contratos.

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METODOLOGIA

A pesquisa desenvolver-se-á de forma precípua com base em modelos de

contratos residenciais praticados por imobiliárias, uma vez que os contratos

particulares feitos entre Locador e Locatário, e os de locação não residencial não

estão sob a égide da Lei Consumerista.

As cláusulas contratuais serão analisadas sob a luz da LEI 8245/91 – Lei do

Inquilinato e da Lei 8.078/90 Código de Proteção e Defesa do Consumidor, bem

como seus reflexos na jurisprudência.

O período histórico da pesquisa inicia-se no final do século XIX e começo

do século XX, período do início da transformação do direito civil brasileiro

totalmente individualista, em que o Estado comportava-se de forma

essencialmente absenteísta quanto à ordem econômica e social, e que

gradualmente vai dando lugar a um Estado intervencionista e regulamentador,

com alguns reflexos nas relações locatícias. Entretanto a análise propriamente dita

será feita nos casos concretos contemporâneos.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 08

CAPÍTULO I - Histórico da habitação na cidade do Rio de Janeiro enquanto

Capital do Brasil 10

I.I - Da colonização até o início do séc. XX 10

I.II - Do início do Século XX e o advento do Código Civil de -

1916 em diante 14

CAPÍTULO II – Lei 8.078/90 – Código de Proteção e defesa do Consumidor,

Lei 8.245/91 Lei do Inquilinato e o novo Código Civil –

“o diálogo das fontes” 17

CAPÍTULO III - Cláusulas abusivas nos Contratos de Locação Residencial 19

CAPÍTULO IV - Estado Social e Boa-fé Objetiva 24

CAPÍTULO V - Conclusão 27

ANEXOS 29

Bibliografia Consultada 35

Folha de avaliação 37

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INTRODUÇÃO

“Ah! Como dói viver quando falta a esperança”. Manoel Bandeira.

O novo estado democrático de direito, traçado pela “Constituição cidadã” de

1988, consiste em superar as desigualdades sociais e regionais e instaurar um

regime democrático que realize a justiça social. Somente após um longo e árduo

caminhar surgiu a Lei 8.245/91, amparado nos novos conceitos constitucionais.

A intervenção do Estado na ordem econômica, legitimado pelo caráter

social do direito de propriedade, se faz, em sede do direito de locação imobiliária,

através das normas jurídicas, restrição da autonomia da vontade nos contratos,

prefixação de conduta dos contraentes (por exemplo a restrição à retomada

imotivada do imóvel) e previsão de conseqüência para determinadas condutas

(admitir a renovação judicial dos contratos de locação não-residencial por prazo

superior a cinco anos).

Entretanto, é forçoso observar que mesmo após o advento da Constituição,

da Lei Consumerista, da lei do Inquilinato e até mesmo depois da vigência do novo

Código Civil de 2002, que traz a boa-fé objetiva como norma que condiciona e

legitima as cláusulas contratuais, ainda assim subsistem nos contratos cláusulas

abusivas e destoantes de toda a legislação pátria. Legislação essa que prima por

coroar a igualdade de condições entre os desiguais, como forma de correção da

inferioridade causada pela vulnerabilidade que pode ser econômica, técnica ou

fática, conforme nos ensina o grande Jurista, Desembargador e Professor Sylvio

Capanema de Souza.

As relações de consumo são o dia-a-dia de cento e setenta milhões de

consumidores. Diz o mestre que não basta que as partes sejam livres para

contratar, como acontecia no Estado Liberal. A garantia desta liberdade é a mais

perversa das falácias: o que assegura o equilíbrio do Contrato é a igualdade

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econômica, técnica e fática. O Estado Moderno passa a ser intervencionista por

estar preocupado em garantir a igualdade entre as partes, a fim de realizar uma

maior justiça social.

É dentro deste novo contexto, desta nova realidade que a presente

pesquisa pretende a análise das cláusulas contratuais.

O Capítulo I traz um breve relato histórico da moradia no Rio de Janeiro,

enquanto capital do Brasil, e os problemas enfrentados por quem não tinha

moradia, bem como ordenação das legislações até o advento da Lei do inquilinato.

O Capítulo II aborda o estudo da Professora Cláudia Lima Marques sobre “o

diálogo das fontes”, mostrando que as leis posteriores à Constituição se

preocupam com a função social, podendo se complementar, atuarem de forma

subsidiária, ou serem opcionais. Mostra também que o Código de Defesa do

Consumidor, com o advento do novo Código Civil passou a fragmentar o combate

às cláusulas abusivas: a aplicação pura do CÓDIGO CIVIL para as relações

puramente civis, a aplicação do CÓDIGO CIVIL e das leis especiais comerciais no

caso de contratos entre comerciantes ou inter-empresários, e a aplicação

prioritária do Código de Defesa do Consumidor, nas relações mistas entre um civil

e um empresário, isto é, entre um consumidor e um fornecedor.

O Capítulo III elenca as mais variadas situações de cláusulas abusivas, e

situações adversas as quais são impingidas aos Locatários, à despeito da

proteção do Código de Proteção e Defesa do Consumidor, por ausência de

fiscalização, ignorância ou desconhecimento do Locatário dos direitos e

prerrogativas que a Lei concede.

O Capítulo IV aborda aspectos do Estado Social e a Boa-fé objetiva.

No Capítulo V, reconhecendo que a análise foi efetivamente feita sob a

ótica do Locatário, é feita a explanação dos motivos pelos quais foi trilhado o

caminho escolhido, com o porquê do raciocínio e da lógica sustentada.

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CAPÍTULO I

HISTÓRICO DA HABITAÇÃO NA CIDADE DO RIO DE JANEIRO

Enquanto Capital do Brasil

I. I - Da colonização até o início do séc. XX

Até o início do século XIX o Rio de Janeiro era ainda uma cidade limitada

pelos morros do Castelo, São Bento, Santo Antônio e morro da Conceição.

Poucos eram os trabalhadores livres, a elite era reduzida, e todos moravam

próximos uns dos outros.

Com a vinda da família real, o Rio de Janeiro passa a ter uma classe social,

até então inexistente. A partir de meados do século XIX a cidade começa a atrair

capital internacional, tornando distintas duas realidades: uma escravista e a outra

capitalista, passando a refletir no espaço urbano. O centro urbano encontrava-se

congestionado, e as classes de renda mais alta, e com poder de mobilidade

deslocaram-se em direção à Lapa, Catete e Glória (freguesia da Glória), Botafogo

(freguesia da Lagoa), e São Cristóvão (freguesia do Engenho Velho). No entorno

dos morros, os brejos e mangues foram pouco à pouco sendo dessecados e

ocupados.

Em 1843/44 foi inaugurada uma carreira de barcos a vapor ligando

Botafogo ao Saco do Alferes (no atual bairro de Santo Cristo) e também à ponta

do Caju (Quinta da Boa Vista - São Cristóvão). Surge o bonde de burro e o trem a

vapor em 1870, impulsionando o crescimento da zona sul pelos bondes, e do

“subúrbio” com os trens. É a partir desta década que o sistema escravista entra

em colapso.

Na década de 1880 São Cristóvão rivalizava com Botafogo como área

residencial das classes abastadas da cidade. Era servido, inclusive, por sistema

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de esgoto. Mas logo Botafogo passou a ser, antes mesmo da proclamação da

República, o mais procurado pela aristocracia, sendo inclusive o lugar de moradia

de Carlota Joaquina. Essa mudança deu-se, entre outros motivos, pela difusão da

ideologia que associava o estilo de vida “moderno” à localização residencial à

beira mar.

Na década de 1890 o Rio passava por uma séria crise de transporte, o que

explica o adensamento que irá provocar as transformações na administração de

Pereira Passos, em 1903. A razão do adensamento foi a necessidade da

população, de residir próximo aos locais de emprego, e estes eram muitos em

toda a região central, referentes aos mais variados tipos de serviços. A população

desta região, na maioria de renda baixa, se aglomerava em cortiços. O mais

famoso, o célebre Cabeça de Porco, foi derrubado em 26 de janeiro de 1893 pelo

Prefeito Barata Ribeiro, que havia declarado verdadeira guerra aos cortiços, e

precisou de um aparato policial para ser destruído.

Isto porque a proliferação de cortiços preocupava as autoridades públicas,

que os combatiam principalmente através de discurso sanitarista. Em 1886, o

Conselho Superior de Saúde Pública escrevera em relatório: “todos deplorando as

condições dos cortiços e concordando em que as habitações eram higienicamente

perigosas e que os moradores deveriam ser removidos, “para os arredores da

cidade, por onde passem trens e bondes”. Os relatórios pressionavam o governo a

expropriar os cortiços, destruí-los e construir casas individuais para o pobre”.

A questão de higiene era realmente de fundamental importância, haja vista

as inúmeras epidemias, como exemplo a febre amarela. Entretanto, as

recomendações só foram seguidas ao pé da letra na parte relativa à expropriação

dos cortiços. A Revista Ilustrada nº 656, de fevereiro de 1893 assim saudou a

destruição do “Cabeça de Porco”:

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Cabeça de Porco

Era de ferro a cabeça,

De tal poder infinito,

Que – se bem nos pareça,

Devia ser de granito.

No seu bojo secular

De forças devastadoras,

Viviam sempre a bailar

Punhos e metralhadoras.

Por isso vivo tranqüila

Dos poderes temerosos,

Como um louco cão de fila

Humilhando poderosos.

Mas eis que um dia a barata,

Deu-lhe na telha almoçá-la

E assim foi sem patarata,

Roendo até devorá-la!

“Precursores das favelas, os cortiços eram a única opção de moradia dos

mais pobres, especialmente de escravos recém-libertos, num Brasil que dava os

primeiros passos rumo à industrialização. Eram locais insalubres e, acreditava-se,

verdadeiros focos de doenças habitados por marginais e prostitutas, as “classes

perigosas”. Expulsos dos cortiços, e sem ter para onde ir, os pobres subiram os

morros da cidade para construir suas casas. Nascia a favela, contraditoriamente

com o apoio do próprio poder público.” (1)

“A legislação urbana teve um papel decisivo neste processo, assegurando

tanto a política de destruição de cortiços como impulsionando a ocupação dos

subúrbios e dos morros. Assim, o decreto n° 762, de 01.06.1900, reforça as

proibições “de divisões de casas de vasta dimensão em cubículos de madeira”

(artigo 24) e estabelece que as habitações coletivas só poderiam ser construídas

nas “frequesias da Gávea, Engenho Velho, Engenho Novo, São Cristovão,

Inhaúma e Irajá ...” (artigo 23), isto é, fora da região central da cidade e dos novos

arrabaldes chiques que começavam a se formar no litoral Sul, e, por fim, o artigo

33 determina que “os barracões toscos não serão permitidos, seja qual for o

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pretexto de que se lance mão para obtenção da licença, salvo nos morros que

ainda não tiverem habitações.” Ressalte-se que o supracitado artigo permite a

construção de tais ‘barracos toscos’ somente nos morros que ainda não tivessem

habitações, o que nos leva a concluir que a ocupação dos morros já era um fato

conhecido e bem difundido.” (2)

De fato, os morros situados no centro da cidade (Providência, São Carlos,

Santo Antônio e outros) passam a ser ocupados rapidamente. O morro da

Providência já era conhecido como Morro da Favela, (daí a origem do nome:

favela) desde 1897.

A reforma Passos destruiu os quarteirões de cortiços habitados pela classe

operária, que se viu forçada a mudar para os morros, morar com outras famílias,

pagando aluguéis altos, devido à diminuição da oferta de habitações, ou mudar-se

para o subúrbio, já que as casas construídas pelo governo em substituição às que

foram destruídas eram pouquíssimas. Em sua gestão foi construída a Avenida

Beira Mar, o novo porto do Rio de Janeiro e a Avenida Central (atual Rio Branco),

para cuja abertura foram demolidas duas ou três mil casas, muitas com famílias

numerosas. Um dos redutos proletários no Centro, que havia sido poupado na

reforma Passos, foi arrasado na administração Carlos Sampaio, com o objetivo de

preparar o Rio para o centenário da Independência do Brasil. Ali viviam inúmeras

famílias pobres, que se beneficiavam de alugueis baratos das antigas construções

ali existentes.

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I. II - Do início do Século XX e do advento do Código Civil de 1916 em

diante

Este o cenário que recebe o Código Civil promulgado em 1916, quando a

Europa já se voltava para o social, e o Brasil encontrava-se, ainda, em plena

posição absenteísta. Ou seja, deixava a regulação da locação predial à vontade

das partes. “Sob a presidência de Campos Sales e a convite de seu amigo de

congregação da Faculdade de Direito do Recife, o Ministro da Justiça Epitácio

Pessoa, Clóvis Beviláqua apresenta, após seis meses de trabalho, seu projeto do

Código Civil em 1901. Duramente criticado por Rui Barbosa e por vários juristas

da época, como Inglês de Sousa e Torres Neto, a sugestão de Beviláqua foi

influenciada fortemente pelo Código Civil Alemão (BGB) e sofreu várias alterações

até sua aprovação em 1916.” (3)

Para uma maior compreensão do pensamento do jurista Clóvis Bevilaqua,

pede vênia para transcrever suas palavras na obra intitulada Teoria Geral do

Direito Civil, da edição que foi revisada em 1928:

“Da forma dos atos jurídicos – Forma é o conjunto das

solenidades, que se devem observar para que a declaração da

vontade tenha eficácia jurídica. É o revestimento jurídico, que

exterioriza a declaração de vontade. É princípio aceito pelo direito

moderno que as declarações de vontade não estão sujeitas a uma

forma especial, senão quando a lei expressamente, a estabelece. É

até um dos resultados da evolução jurídica, assinalado pela história e

pela filosofia, a decadencia do formalismo em correspondência com

o revigoramento da energia jurídica imanente nos atos realizados

pelos particulares, a expansão da autonomia da vontade e a

conseqüente abstenção do Estado, que se acantoa, de preferência,

na sua função superintendente, pronto a intervir, quando é

necessário restabelecer coativamente o equilíbrio dos interesses.

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Todavia como a forma é uma valiosa garantia dos interesses, quer

individuais, quer sociais, não poderá ser eliminada do direito.”

Após a Primeira Guerra, houve uma crise habitacional, com a retomada dos

prédios pelos Locadores. O Decreto nº 4.403/22 suspendeu as ações de despejo

até 1924, sendo revogado pelo Decreto nº 5.617, que resgatou o status quo ante

do sistema do Código Civil. Em 1934 Getúlio Vargas baixou o Decreto nº 24.150,

visando proteger o fundo de comércio pela ação de renovação da locação. A Lei

1.300/50 restringiu em parte a autonomia da vontade, entretanto as Leis 4.409/64

e 5.334/67 restabeleceram a “denúncia vazia” para os contratos por prazo

indeterminado.

A Lei 6.649/79 estabeleceu um sistema de protecionismo em favor do

Locatário, que foi considerado como fator que afugentou o capital, necessário ao

mercado.

Art. 6º - O locatário pode, mediante notificação ou aviso ao locador, com

antecedência mínima de trinta dias, dar por findo o contrato por tempo

indeterminado.

Art. 51 - A locação somente poderá ser rescindida:

III - por mútuo acordo ou por denúncia do locatário.

Por ocasião da criação da Lei 8.245/91, que revogou a Lei 6.649/79, em

exposição de motivos do anteprojeto assinado pelos ministros Jarbas Passarinho,

Zélia Cardoso de Mello e Margarida Procópio, foi informado que existiam cinco

milhões de moradias fechadas no aguardo de melhores condições de locação.

Muitas foram as críticas à nova Lei de Locações, e as mais variadas: que

era pretensiosa em querer regular toda a questão locatícia urbana, dispondo ao

mesmo tempo sobre o direito material e processual; outros que a mesma era

protecionista em relação ao Locador, e outros tantos comentários depreciativos.

Comentário interessante foi feito por Geraldo Rezende Ciribelle, administrador de

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imóveis no Rio de Janeiro, que declarou ter ocorrido uma deflação nos alugueis,

uma vez que os Locatários, não suportando os altos preços, rescindiam os

contratos, e o imóvel voltava ao mercado mais barato, pois o Locador não mais

podia suportar pagar o imposto predial e o condomínio às suas próprias expensas,

com o imóvel vazio. Com efeito, mais de dezesseis anos se passaram e o que se

nota em relação aos valores dos alugueres, é um mercado equilibrado e estável.

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CAPÍTULO I I

Lei 8.078/90 – Código de Proteção e Defesa do Consumidor,

Lei 8.245/91 Lei do Inquilinato e o novo Código Civil - “o diálogo

das fontes”

A Professora Claudia Lima Marques nos ensina que é possível a aplicação

simultânea das inúmeras fontes, ao mesmo tempo e no mesmo caso, seja

complementando, seja de forma subsidiária, ou mesmo permitindo opção entre

elas. Assim como a Constituição orientou, as novas leis trouxeram atualizações

nos preceitos, superando o caráter individualista até então vigente. Parafraseando

o grande Miguel Reale, as três diretrizes do novo Código Civil são: eticidade

(impõe a interpretação segundo a boa-fé, permite a revisão por onerosidade

excessiva e permite ao juiz solucionar de forma mais justa e eqüitativa);

socialidade ( predomínio do social sobre o individual, facilidade para o

usucapiente, prevalência dos valores coletivos sobre os individuais, sem perda,

porém, do valor da pessoa humana e a interpretação mais favorável ao aderente

no contrato de adesão) e operabilidade (facilitar a aplicação do direito pelo

operador através de normas). Assim foi no Código de Proteção e Defesa do

Consumidor: o inciso XXXII do art. 5º da Constituição diz: “O Estado promoverá,

na forma da lei, a defesa do consumidor.”

O Código de Defesa do Consumidor, com o advento do novo Código Civil –

CC/2002 - passou a fragmentar o combate às cláusulas abusivas: a aplicação

pura do CC/2002 para as relações puramente civis, a aplicação do CC/2002 e das

leis especiais comerciais no caso de contratos entre comerciantes ou inter-

empresários, e a aplicação prioritária do Código de Defesa do Consumidor, nas

relações mistas entre um civil e um empresário, isto é, entre um consumidor e um

fornecedor. Isto determinou a exclusão do contrato de locação não residencial do

âmbito do Código de Proteção e Defesa do Consumidor - CDC. Desta forma os

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Contratos de locação não residenciais e os Contratos particulares entre Locador e

Locatário estão fora da proteção do CDC, mas protegidos pelo Código Civil.

Entretanto já existe um movimento na jurisprudência em reconhecer a relação de

consumo entre consumidores profissionais, como pequenas empresas e

profissionais liberais, tendo em vista a hipossuficiência, mais uma vez lembrando

da lição do ilustre dês. Sylvio Capanema, que diz que hipossuficiente é não só o

econômico, mas também aquele deficiente técnica ou faticamente.

Para corroborar as alegações supra na doutrina, eis as palavras de José

Geraldo brito Filomeno, in Código de Defesa do Consumidor Comentado pelos

autores da Anteprojeto: “ Sem embargo de algumas decisões judiciais, entendo

que o Código de defesa do Consumidor também se aplica às relações locatícias,

ainda que entre pessoas jurídicas...” p.57.

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CAPÍTULO III

Cláusulas abusivas nos Contratos de Locação Residencial

Embora não reste dúvida quanto à aplicação do CDC às relações entre

Locatário e Administradoras de imóveis (vide Anexo, item 3 e outros julgados),

percebe-se que os Locatários continuam à mercê de Contratos leoninos (vide

anexo, item 2), com cláusulas abusivas. Eis alguns exemplos de cláusulas

abusivas mais comuns, encontradas nos contratos:

Situação 1 - Imóveis velhos, por exemplo, na região de Copacabana,

Flamengo, Glória, Laranjeiras, Catete e outros, com encanamento de gás

em péssimas condições, os prédios em sua maioria foram construídos entre

as décadas de 50 e 70. O desavisado Locatário assina um Contrato com

cláusula de renúncia à indenização de benfeitorias, mesmo que essas

obras sejam necessárias. Ocorre que a CEG não efetua re-ligação sem que

a instalação esteja adequada, nos novos padrões legais, como por

exemplo, instalação de chaminé com maior polegada para adequação da

nova normatização para o gás natural, que apesar de ser responsabilidade

da CEG, por vezes exige obra de alvenaria para a devida instalação,

inexistência de ventilação em porta de cozinha, de banheiro, inferior e

superior, no rebaixo por onde passa a chaminé, ramificações em

desacordo, registros e válvulas em locais inadequados, aparelhos a gás

instalados de forma inadequada, e outros. Também ocorre do Condomínio

estar em desacordo, como por exemplo, ausência de área de ventilação

adequada, exigência de luminária a prova de explosão, para uso de

atmosferas explosivas ( especificação: NBR 5363, NBR 9518 e NBR 6146 –

Grau de proteção: IP65), o que implica em solicitação por parte do novo

“inquilino” morador para a adequação, enquanto espera as providências,

sem gás, para banho e alimentação, até as devidas providências.

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Na contra-mão da nova ordem jurídica, o STJ – Superior Tribunal de Justiça

assim decidiu:

Súmula 335 do STJ - Nos contratos de locação, é válida a cláusula de renúncia à

indenização das benfeitorias e ao direito de retenção.

A Súmula não diz a que tipo de benfeitorias se refere, estando portanto

inclusas as voluptuárias, úteis ou necessárias.

Ora, se o Locatário não assinar, pode estar perdendo um imóvel dentro das

condições que, em sua maioria, preenchem suas expectativas, entretanto, se não

tiver tempo disponível para prosseguir na procura, terá que assumir despesa que,

a rigor, deveria ser suportada pelo Locador, uma vez que este é responsável por

dar condições de habitabilidade ao imóvel a ser locado (alínea c do inciso X do

artigo 22).

Situação 2 – “O Locatário pagará os encargos de condomínio no valor total

constante do recibo apresentado, sem dedução alguma, seja a que título for, dado

em sua discriminação e despesas normais ordinárias OU EXTRAORDINÁRIAS.”.

A Lei diz que as despesas extraordinárias são àquelas “que não se refiram

aos gastos rotineiros de manutenção do edifício”. O dever do Locatário relaciona-

se aos seguintes pressuposto cumulados:

a) que tais despesas tenham causa em época contemporânea à locação,

não se podendo imputar ao locatário a obrigação de pagar serviço prestado a

outrem. Ex. Locatário iniciou contrato de locação em janeiro de 2005. Em janeiro

de 2007 o porteiro que fora contratado em 1995 é demitido. A responsabilidade do

Locatário é tão somente com a despesa referente aos anos de 2005 à 2007, e não

aos doze anos de serviço prestado pelo porteiro. (art. 22, parágrafo único, alínea

d), o que não ocorre na prática;

b) o serviço ou instalação seja utilizado, ou, ao menos, posto à disposição

do locatário, e que não seja, por exemplo, despesas de decoração e paisagismo

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nas partes de uso comum, como por exemplo, colocação de espelho de cristal

bisotado no elevador social (alínea f do inciso X do artigo 22);

c) que haja previsão no orçamento do condomínio (art. 23,§ 2º). Uma

grande parcela dos síndicos não respeitam e/ou desconhecem a legislação, e

efetuam obras sem previsão orçamentária, sejam voluptuárias, úteis ou

necessárias;

d) que haja rateio mensal (art. 23, § 2º);

Os incisos VI e X do artigo 22 diz que o Locador é obrigado a: “VI – fornecer

ao locatário recibo discriminado das importâncias por este pagas, vedada a

quitação genérica, e X – pagar as despesas extraordinárias do condomínio.

Situação 3 – Permissão de vistoria e visita, para imóvel colocado à venda, e

quando o Locatário não se interessa em adquiri-lo. Deve ser exercido mediante

prévio ajuste de dia e hora, tendo o Locatário residencial preferência para a

fixação, de forma a sofrer, no mínimo possível, qualquer perturbação na vida

domiciliar.

As imobiliárias trabalham aos sábados e algumas até mesmo aos

domingos, e é praxe corriqueira entre vendedores de imóveis tentar forçar o

Locatário a receber os interessados nos fins-de-semana, atrapalhando o período

de descanso e lazer, causando situação de embaraço e desconforto. Além da

situação incômoda de se ver obrigado a buscar novo imóvel, o que acarretará

despesa inesperada, uma vez que terá que providenciar a pintura e reparos no

imóvel para entregá-lo dentro das condições exigidas no contrato, terá que pagar

as despesas com a mudança, muitas vezes em momento que não está em

condições financeiras para isto. Outra situação conflitante é a mudança em

período escolar, que obriga o Locatário a ficar limitado a região onde estudam os

filhos, ou mudá-los de escola.

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Situação 4 – “O Locatário declara receber o imóvel em perfeitas condições

de uso para a finalidade a que se destina, com pintura nova (algumas mencionam

a marca e a cor, entretanto a pintura não foi feita com a marca especificada, o que

só é notado quando o Locatário tenta limpar a parede) com todas as instalações

hifráulicas, elétricas e sanitárias em pleno funcionamento, responsabilizando-se

pela reparação imediata de quaisquer estragos causados ou decorrentes de sua

má conservação como Locatários, fazendo às suas custas todos os consertos,

pinturas e substituições de peças e aparelhos que se tornem necessários de modo

a restituírem o imóvel, quando finda ou rescindida a locação, em perfeitas

condições de uso, com pintura nova, devendo ser usadas tintas da mesma

qualidade e cores daquelas existentes em cada um dos cômodos, e as

substituições de peças e aparelhos devem ser feitas por outras de igual qualidade

e marca dos substituídos.

O Inciso III do art. 23 da Lei de Inquilinato diz: O locatário é obrigado a: III-

restituir o imóvel, finda a locação, no estado em que o recebeu, salvo as

deteriorações decorrentes de seu uso normal. (grifo nosso).

A princípio não deveria ser obrigatória a pintura do imóvel, claro que

observados os cuidados mínimos de manutenção e conservação das paredes, que

devem ser devolvidas sem furos, aplicações de decalques e/ou outros, etc.

Estando as paredes em estado de uso, não deveria ser, com base no disposto no

artigo supra, exigida a pintura. Ocorre que os Contratos, via de regra, trazem a

seguinte cláusula: “A entrega das chaves será efetuada em data a ser

previamente marcada, procedendo-se a vistoria e verificação das condições do

imóvel, objeto da Locação. No caso de não encontrar-se em perfeitas condições

de pintura e demais acessórios, o Locador se reserva o direito de não receber as

chaves, até que o imóvel esteja em perfeitas condições, correndo por conta do

Locatário as despesas de aluguel e demais encargos, até que providencie os

reparos necessários.”

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Diante deste impasse, o Locatário vê-se mais uma vez obrigado a cumprir a

exigência, sob pena de não conseguir romper a Locação até que pinte o imóvel, e

recoloque o imóvel nas condições exigidas (ou coloque) ou pague para que o

Locador o faça.

Importante ressaltar o inciso V do art. 22, que diz que o Locador é obrigado

a: fornecer ao Locatário, caso este solicite, descrição minuciosa do estado do

imóvel, quando de sua entrega, com expressa referência aos eventuais defeitos

existentes. (grifo nosso) . Na prática isto não existe.

Situação 5 – “Renunciam os FIADORES das faculdades previstas nos

artigos 827, 830, 835 e 838 do Código Civil.”

Mal acabou de ser promulgada, e entrar em vigor, e já aparecem as

cláusulas que pretendem retirar os direitos elencados no Código Civil de 2002.

Situação que o próprio STJ já admitiu (vide Anexo, item 2), até que a ação chegue

à última instância, muito dissabor e aborrecimento de todo tipo já passaram

Locatário e Fiador. Mesmo porquê, a despeito de decisões favoráveis, sempre

existem as desfavoráveis, por mais óbvio que possa parecer o direito.

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CAPÍTULO I V

Estado Social e Boa-fé Objetiva

As primeiras normas de direito civil foram as leis separadas por Jean Domat, do

Código de Napoleão, e ao contrário do que se deduz, a delimitação do direito civil

não provém do Direito Romano, onde o jus civile era eminentemente direito

público. Essas leis vieram a ser adotadas pelas codificações do século XIX. O

Código Civil regulava as relações entre as pessoas privadas, seu estado, sua

capacidade, sua família e principalmente a propriedade, consagrando-se como o

reino da liberdade individual, assim como os poderes jurídicos que assegurava

absoluta liberdade para o exercício da atividade econômica (contratos), os dois

últimos como pontos cardeais do individualismo. Em trabalho publicado na Revista

de Direito Civil nº 65, intitulado “A Caminho de um Direito Civil Constitucional”, a

professora Maria Celina Bodin de Moraes ensina: “O sustentáculo fundamental do

liberalismo que, pressuposta a separação entre o Estado e a sociedade civil,

relegava ao Estado a tarefa de manter a coexistência pacífica entre as esferas

individuais, para que atuassem livremente, conforme suas próprias regras, entrou

em crise desde que o Poder Público passou a intervir cotidianamente na

economia. Diante de um Estado intervencionista e regulamentador, que dita as

regras do jogo, o direito civil viu modificadas as suas funções e não pode mais ser

estimado segundo os moldes do direito individualista dos séculos anteriores.”

Gradualmente acontece a aplicação direta das normas constitucionais nas

relações jurídicas de caráter privado. O novo “estado democrático de direito”

traçado pela “Constituição cidadã” consiste em “superar as desigualdades sociais

e regionais e instaurar um regime democrático que realize a justiça social.”... “O

antagonismo público-privado perdeu definitivamente o sentido. Os objetivos

constitucionais de construção de uma sociedade livre, justa e solidária e de

erradicação da pobreza colocaram a pessoa humana – isto é, os valores

existenciais – no vértice do ordenamento jurídico brasileiro, de modo que tal é o

valor que conforma todos os ramos do direito....Configura-se inevitável, em

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conseqüência, a inflexão da disciplina civilista (voltada anteriormente para a tutela

dos valores patrimoniais) em obediência aos enunciados constitucionais, os quais

não mais admitem a proteção da propriedade e da empresa como bens em si,

mas somente enquanto destinados a efetivar valores existenciais, realizadores da

justiça social. Não deve a proteção do patrimônio suplantar a proteção das

pessoas....O interesse a ser tutelado não é mais o do grupo organizado como

esteio do Estado, e das relações de produção existentes, mas das condições que

permitam à pessoa humana realizar-se íntima e afetivamente, nesse pequeno

grupo social.” Nada nem ninguém desfrutam de proteção absoluta, nem mesmo o

principio do direito adquirido, incluído no rol das garantias fundamentais, pode ser

isolado do sistema, e a despeito de outros direitos. Deve ser analisado à luz do

princípio da proporcionalidade.

De acordo com o professor Gustavo Tepedino, em sua obra

“Código Civil Interpretado conforme a Constituição da República ( Vol. II – artigo

421, p. 14 – Ed. Renovar – 2006): “ à luz do texto constitucional, a função social

torna-se razão determinante e elemento limitador da liberdade de contratar, na

medida em que esta só se justifica na persecução dos fundamentos e objetivos da

república (arts. 1º e 3º CF). Extrai-se daí a definição da função social do contrato,

entendida como o dever imposto aos contratantes de atender – ao lado dos

próprios interesses individuais perseguidos pelo regulamento contratual – a

interesses extracontratuais socialmente relevantes, dignos de tutela jurídica, que

se relacionam com o contrato ou são por ele atingidos. Tais interesses dizem

respeito, dentre outros, aos consumidores, à livre concorrência, ao meio ambiente,

às relações de trabalho.” È o fim do conceito “pacta sunt servanda”, pelo menos

da forma como foi concebido.

Após a entrada em vigor do novo Código Civil, restou consagrada e

perpetuada, pela primeira vez na legislação civil brasileira, a boa-fé objetiva,

exigível tanto na conclusão quanto na execução do contrato conforme preceitua o

artigo 422. Em conjunto com o princípio da função social e o princípio da

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equivalência material, o princípio da boa- fé objetiva é o princípio contratual típico

do estado social, dentro do contexto da ideologia da terceira fase histórica do

Estado Moderno (as três fases corresponderiam às do Estado absolutista, do

Estado liberal e do Estado social), sempre destacado pelos autores do projeto,

notadamente por Miguel Reale, quando se refere à diretriz de “socialidade” (Reale,

Miguel -O projeto do Código Civil, São Paulo: Saraiva, 1986, p. 9.), que o teria

informado.

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CAPÍTULO V

CONCLUSÃO

O presente trabalho, está sendo apresentado sob a ótica do Locatário, e

teve verdadeiramente a intenção de mostrar a hipossuficiência técnica do mesmo,

uma vez que os Locadores, nos casos em questão, estão amparados e orientados

pelas Administradoras, especializadas no assunto, e na grande maioria das vezes

orientadas também por advogados, sejam eles contratados da Administradora, ou

terceirizados.

É importante reconhecer que não são poucos os Locatários desleais e

irresponsáveis, maus pagadores e por vezes estelionatários. Também os fiadores,

alguns profissionais, que não poucas vezes frustram a possibilidade de

ressarcimento do prejuízo causado ao Locador. Entretanto a Lei não foi feita

apenas para proteger o Locador. Se não, estaria infringindo o direito constitucional

de igualdade. E devemos garantir o direito para todos, em igualdade de condições.

É bom lembrar que paga aluguel, na maioria das vezes, o hipossuficiente

não só financeiro mas também técnico. Dificilmente o Locatário conhece a Lei do

Inquilinato, o que torna difícil inclusive reconhecer uma cláusula leonina, e mesmo

que reconheça, está em necessidade, e se dobra às determinações esdrúxulas do

Contrato.

Hoje é muito comum o cidadão buscar os direitos do consumidor nos

Juizados Especiais, em relação ao produto, e até mesmo ao serviço mal prestado.

Entretanto, ainda não faz parte da cultura da população, não com a freqüência das

situações de relação de consumo corriqueiras, que hoje abarrotam os tribunais,

buscar o judiciário para cláusulas ilegais no Contrato de Locação. Até porquê,

conforme foi explanado no capítulo das cláusulas leoninas, após a assinatura do

Contrato, muito pouco, ou quase nada pode ser solucionado.

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Para que fosse possível ao bom Locatário, ter seus direitos, já

determinados na belíssima Lei do Inquilinato, efetivamente amparados, seria

necessária uma divulgação da legislação, e não só isso, mas uma fiscalização,

uma maior intervenção do poder público nos Contratos de Locação. Assim como

existem as Agências Nacionais para garantia da normatização e dos Contratos de

saúde, de telefonia, de energia elétrica, etc.

O presente trabalho pretendeu mostrar que apesar da nova realidade Civil

de luta contra a desigualdade, e em prol da justiça social, ainda existe um caminho

a ser percorrido, até que o Locatário, parte hipossuficiente na relação, tenha

certeza de que o Contrato que irá assinar prima por estabelecer cláusulas legais,

dentro, inclusive, do princípio da boa-fé contratual.

“Como se vê, a boa-fé não constitui um imperativo ético abstrato, mas sim uma

norma que condiciona e legitima toda a experiência jurídica, desde a interpretação

dos mandamentos legais e das cláusulas contratuais até as suas últimas

conseqüências.”

Miguel Reale

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ANEXOS

1)

Quarta Turma COMPETÊNCIA. EMPRESA. FINS LUCRATIVOS. CONSUMIDORA INTERMEDIÁRIA. Em ação de indenização por danos morais e materiais, a empresa alega a suspensão indevida do fornecimento de energia elétrica pela concessionária. Por outro lado, a ré sustentou preliminares de ilegitimidade ativa, incompetência da vara de defesa do consumidor por não existir relação de consumo e inépcia da inicial. O Tribunal a quo manteve a decisão agravada que rejeitou as preliminares. Daí o REsp da concessionária ré. A Turma, em princípio, examinou a questão relativa à admissibilidade e processamento desse REsp e reconheceu que, como a discussão versa sobre competência, poderia influenciar todo o curso processual, justificando, pela excepcionalidade, o julgamento do REsp, sem que ele permanecesse retido, conforme tem admitido a jurisprudência. A Turma também reconheceu a legitimidade ativa da recorrida, pois cabe à locatária, no caso a empresa, o pagamento das despesas de luz (art. 23 da Lei do Inquilinato). Mas proveu o recurso quanto à inexistência de consumo e a conseqüente incompetência da vara especializada em Direito do Consumidor. Argumentou-se que a pessoa jurídica com fins lucrativos caracteriza-se, na hipótese, como consumidora intermediária e a uniformização infraconstitucional da Segunda Seção deste Superior Tribunal perfilhou-se à orientação doutrinária finalista ou subjetiva, na qual o consumidor requer a proteção da lei. O Min. Relator ressaltou que existe um certo abrandamento na interpretação finalista a determinados consumidores profissionais, como pequenas empresas e profissionais liberais, tendo em vista a hipossuficiência. Entretanto, no caso concreto, a questão da hipossuficiência da empresa recorrida em momento algum restou reconhecida nas instâncias ordinárias. Isso posto, a Turma reconheceu a nulidade dos atos processuais praticados e determinou a distribuição do processo a um dos juízos cíveis da comarca. Precedente citado: REsp 541.867-BA. REsp 661.145-ES, Rel. Min. Jorge Scartezzini, julgado em 22/2/2005.

2)

Processo

Ag 942587 Relator(a)

Ministro PAULO GALLOTTI Data da Publicação

DJ 30.10.2007 Decisão

AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 942.587 - RJ (2007/0196863-0) RELATOR : MINISTRO PAULO GALLOTTI AGRAVANTE : MARIA ADELAIDE RAMOS

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ADVOGADO : RICARDO VENTURELLE DE OLIVEIRA E OUTRO(S) AGRAVADO : JANDIRA NEVES LAGO ADVOGADO : JOEL PEREIRA RODRIGUES E OUTRO(S) DECISÃO CIVIL. LOCAÇÃO. FIANÇA. EXONERAÇÃO. PRORROGAÇÃO CONTRATUAL. DISTINÇÃO. SÚMULA Nº 214/STJ. INAPLICABILIDADE. 1. O entendimento predominante neste Superior Tribunal de Justiça era de que o contrato de fiança, por ser interpretado restritivamente, não vincula o fiador à prorrogação do pacto locativo sem sua expressa anuência, ainda que houvesse cláusula prevendo sua responsabilidade até a entrega das chaves. 2. A Terceira Seção desta Corte, no julgamento dos Embargos de Divergência nº 566.633/CE, em 22/11/2006, acórdão pendente de publicação, assentou, contudo, compreensão segundo a qual não se confundem as hipóteses de aditamento contratual e prorrogação legal e tácita do contrato locativo, concluindo que "continuam os fiadores responsáveis pelos débitos locatícios posteriores à prorrogação legal do contrato se anuíram expressamente a essa possibilidade e não se exoneraram nas formas dos artigos 1.500 do CC/16 ou 835 do CC/2002, a depender da época em que firmaram o acordo". 3. Na linha da recente jurisprudência da Terceira Seção, não sendo hipótese de aditamento, mas de prorrogação contratual, tem-se como inaplicável o enunciado de nº 214 de nossa Súmula, sendo de rigor a reforma do julgado. 4. Agravo conhecido para dar provimento ao recurso especial. Cuida-se de agravo de instrumento desafiando decisão que não admitiu recurso especial, este calcado nas alíneas "a" e "c" do permissivo constitucional, interposto contra acórdão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro assim ementado: "LOCAÇÃO PREDIAL URBANA. FIANÇA. CONTRATO GARANTIDO CELEBRADO POR PRAZO DETERMINADO. PRORROGAÇÃO DESTE SEM ANUÊNCIA DO FIADOR. EXONERAÇÃO. A FIANÇA É CONTRATO ACESSÓRIO E BENÉFICO, CABENDO INTERPRETÁ-LA RESTRITIVAMENTE. NÃO RESPONDE O FIADOR PELO AFIANÇADO APÓS O IMPLEMENTO DO TERMO FINAL DAQUELE, SE NÃO ADERIU À SUA PRORROGAÇÃO, AINDA QUE HAJA PREVISÃO DE SE OBRIGAR ATÉ A ENTREGA DAS CHAVES, CLÁUSULA LEONINA QUE SUBMETE O FIADOR AO ARBÍTRIO OU CONVENIÊNCIA EXCLUSIVA DE CREDOR E DEVEDOR. A RENÚNCIA PELO FIADOR DA FACULDADE CONTIDA NO ART. 835 DO CÓDIGO CIVIL NÃO CONSTITUI MANIFESTAÇÃO ESPONTÂNEA DE SUA EFETIVA VONTADE, MAS IMPOSIÇÃO DO CREDOR, INCOMPATÍVEL COM A PRÓPRIA NATUREZA DA GARANTIA EM APREÇO, POIS ENSINA A EXPERIÊNCIA COMUM TRATAR-SE DE EXIGÊNCIA UNILATERAL E INVARIÁVEL DO LOCADOR, INEXISTINDO POSSIBILIDADE DE A SEU RESPEITO HAVER QUALQUER DISCUSSÃO. Reforma do julgado." (fl. 8) Aponta a agravante, no apelo especial, além de dissídio jurisprudencial, violação do artigo 835 do Novo Código Civil, sustentando haver responsabilidade dos fiadores até a entrega das chaves, ainda que após o término do prazo contratual, não sendo hipótese de incidência da Súmula nº 214/STJ. A irresignação merece acolhimento. Veja-se o seguinte trecho do aresto recorrido: "Como sabido, o contrato de fiança é benéfico e se interpreta restritivamente, não podendo, assim, subsistir após o termo final previsto para sua duração, ainda que seja prorrogado o vínculo locatício, se a tanto não anuiu o fiador, e, se assim, é, insubsistente, a partir do implemento do termo final de duração daquele, a obrigação imposta ao fiador consistente em garantir a satisfação do crédito do locador referente a período posterior a seu término, relevando notar que o entendimento contrário, como o

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exposto na r. sentença, consagra, concessa maxima venia a imposição de cláusula leonina ao fiador, submetendo a subsistência de sua obrigação ao arbítrio exclusivo de locador e afiançado em reconduzir o contrato de locação por outro período, ou mesmo por tempo indeterminado, o que se apresenta como injurídico e injusto. A esse respeito, aliás, já se pronunciou o E. STJ. Cuja Súmula nº 214 esclarece que 'o fiador na locação não responde por obrigações resultantes de aditamento ao qual não anuiu', princípio que se aplica, por idênticas razões à hipótese de prorrogação tácita ou automática do negócio jurídico garantido pela fiança. (...) Quanto à renúncia da faculdade de exoneração contida no art. 1500 no revogado Código Civil, correspondente ao art. 835 do agora vigente como está documentado, através do teor da cláusula 8ª do contrato de locação (fl. 7), na verdade não corresponde a legitima e autêntica manifestação de vontade do fiador, sendo exigência unilateral do locador por ele garantido, como ensina a experiência comum, porquanto, sem essa capitulação não se contrata a locação, e, assim, não deve ser entendia como óbice a impedir que aquele venha a se libertar das obrigações relativas à fiança, oferecida, até porque contrário a princípio basilar do direito contratual, impeditivo de que alguém se obrigue indefinidamente, e, mais ainda, segundo a conveniência exclusiva de terceiros e sem seu consentimento." (fls. 10/11) Conforme afirmado pelo Tribunal de origem, o entendimento predominante neste Superior Tribunal de Justiça era realmente o de que o contrato de fiança, por ser interpretado restritivamente, não vincula o fiador à prorrogação do pacto locativo sem sua expressa anuência, ainda que houvesse cláusula prevendo sua responsabilidade até a entrega das chaves. Contudo, a Terceira Seção desta Corte, no julgamento dos Embargos de Divergência nº 566.633/CE, em 22/11/2006, acórdão pendente de publicação, assentou a compreensão segundo a qual não se confundem as hipóteses de aditamento contratual e prorrogação legal e tácita do contrato locativo, concluindo que "continuam os fiadores responsáveis pelos débitos locatícios posteriores à prorrogação legal do contrato se anuíram expressamente a essa possibilidade e não se exoneraram nas formas dos artigos 1.500 do CC/16 ou 835 do CC/02, a depender da época em que firmaram o acordo". Assim, na linha da recente jurisprudência da Terceira Seção, não sendo hipótese de aditamento, mas de prorrogação contratual, tem-se como inaplicável o enunciado de nº 214 de nossa Súmula, sendo de rigor a reforma do julgado. Do exposto, nos termos do art. 544, § 3º, do CPC, conheço do agravo de instrumento para dar provimento ao recurso especial, invertidos os ônus da sucumbência. Publique-se. Brasília (DF), 18 de outubro de 2007. MINISTRO PAULO GALLOTTI, Relator

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3)

2007.001.50723 - APELACAO CIVEL -

JDS. DES. WERSON REGO - Julgamento: 13/11/2007 - DECIMA SEGUNDA CAMARA CIVEL “Em primeiro lugar, não temos dúvidas em afirmar que, no caso concreto, os contratos de locação e de administração imobiliárias se subsumem ao campo principiológico-normativo do Código de Defesa do Consumidor. Isto porque o que caracteriza o negócio jurídico imobiliário é o seu objeto: recai sobre bens imóveis ou sobre direitos correlatos. Estes, por sua vez, estão compreendidos na definição de produto do artigo 3º, §1o, do Código de Proteção e Defesa do consumidor. Presentes, portanto, os elementos da relação de consumo, inafastável a incidência ao caso da Lei n.8.078/90, eis que composta por normas de ordem pública e de interesse social. A legislação consumerista considera abusivas quaisquer cláusulas que estabeleçam vantagens desproporcionais ou iníquas, ou que gerem um ônus excessivo para o consumidor. No caso dos autos, a mora no pagamento de aluguéis e encargos da locação não autoriza a cobrança de honorários advocatícios, quando se tratar de cobrança extrajudicial. Trata-se, ao contrário, de ônus financeiro que deve ser suportado pelo locador, eis que contratante do respectivo serviço de cobrança. Destarte, previsão contratual em sentido contrário é de ser considerada abusiva e, portanto, nula de pleno direito. Portanto, tratando-se de prática manifestamente abusiva, deve-se restituir ao Autor, em dobro, aquilo que fora indevidamente pago pelo locatário (a título de honorários advocatícios na esfera extrajudicial e de custas relacionadas a ações não distribuídas), consectário lógico e natural de mandamento legal explícito, qual seja, o artigo 42, do Código de Proteção e Defesa do Consumidor.”

4)

2006.001.55047 - APELACAO CIVEL - 1ª Ementa

DES. MARCO ANTONIO IBRAHIM - Julgamento: 10/04/2007 - DECIMA SEGUNDA CAMARA CIVEL

Consumidor. Responsabilidade civil. Administradora de imóveis. Desídia na prestação de serviços. Dano moral e material. Lucros cessantes. Hipótese em que o autor contratou a ré para administrar imóvel que foi dado em locação a pessoas inidôneas e que ostentavam cadastros negativos pela emissão de cheques sem fundos. Falta de cuidado da administradora que aceitou como fiador, o próprio companheiro da locatária, o qual não era titular de bens de raiz, nem demonstrou capacidade econômico-financeira para garantir eventual inadimplência da locatária. Imóvel que foi danificado pela locatária que, juntamente com o fiador, se evadiu do imóvel indo residir em local incerto e não sabido. Dano moral, material e lucros cessantes, provados. Sentença reformada. Inteligência do disposto no § 3º do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor. Recurso provido.

5)

2005.001.08404 - APELACAO CIVEL - 1ª Ementa

DES. EDSON VASCONCELOS - Julgamento: 13/07/2005 - DECIMA SETIMA CAMARA CIVEL

DESPEJO POR FALTA DE PAGAMENTO - A MULTA MORATÓRIA NÃO PODE ULTRAPASSAR A TAXA DE 10% REPELIDA A PRETENSÃO DE DUPLICIDADE DE MULTAS JUROS DE MORA LEGAIS - IMPOSSIBILIDADE LÓGICA DE SE APLICAR PENA DE LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ A RÉU REVEL, QUE SEQUER COMPARECEU AO PROCESSO - A sentença condenou o locatário no pagamento dos aluguéis e encargos devidos, com acréscimo de multa moratória de 10%, além de juros legais e atualização monetária. A locadora postula sejam aplicadas multas em valor equivalente a 8 prestações locatícias, com cumulação de outra no percentual de 20%, juros de mora de 1% ao mês e elevação da verba honorária de advogado para 20% sobre o valor da condenação, de acordo com cláusula contratual, condenado ainda o locatário nas coimas da litigância de má-fé. Fixados os itens da pretensão recursal, verifica-se não assistir razão à locadora em quaisquer dos pontos de sua irresignação. Com efeito, ainda que se não aplique o Código de Defesa do Consumidor à relação locatícia, tem-se que a natureza social da locação residencial, que se projeta no direito constitucional de moradia, não tolera inclusão contratual de cláusulas abusivas, em detrimento do locatário. Na hipótese em exame, é de se reputar excessiva a taxa de 20% estabelecida no contrato, a título de multa moratória dos encargos locatícios, pelo

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que andou bem a sentença em fixá-la em 10%. Afigura-se abusiva, tangenciadora da litigância de má-fé, a pretendida acumulação de coimas contratuais, com inclusão da cláusula genérica que estabelece multa de quase uma anuidade dos aluguéis para a eventualidade de descumprimento de quaisquer das obrigações pactuadas. O arbitramento de verba honorária de advogado em processo contencioso será realizado, em princípio, pelo juiz da causa, nos termos das regras instituídas no Código de Processo Civil, havendo exceção, em matéria locatícia, na disposição do art. 62, II, d, da Lei nº 8.245/91. Os juros de mora constituem matéria de ordem pública, não podendo, pois, ser convencionado, como ocorreu na relação contratual estabelecidas entre as partes. Destarte, correta a sentença ao determinar a incidência dos juros legais. Por fim, não há falar em litigância de má-fé de locatário que, revel, sequer se pronunciou nos autos. Improvimento do recurso.

Não incidência do Código de Defesa do Consumidor:

2007.001.40352 - APELACAO CIVEL -

JDS. DES. MAURO MARTINS - Julgamento: 17/10/2007 - DECIMA PRIMEIRA CAMARA CIVEL

CONTRATO DE LOCAÇÃO. DÉBITO LOCATÍCIO RECONHECIDO PELO RÉU NA CONTESTAÇÃO, NÃO TENDO SIDO REQUERIDA A PURGA DE MORA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. PEDIDO DE REDUÇÃO DA MULTA CONTRATUAL TENDO COMO FUNDAMENTO O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. DOUTRINA E JUSRISPRUDÊNCIA UNÍSSONAS NO SENTIDO DA NÃO APLICABILIDADE DO ALUDIDO DIPLOMA LEGAL NAS RELAÇÕES LOCATÍCIAS. MULTA PREVISTA NO CONTRATO E COM A QUAL O RÉU ANUÍU. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO

2007.001.03781 - APELACAO CIVEL -

DES. ROBERTO GUIMARAES - Julgamento: 11/07/2007 - DECIMA PRIMEIRA CAMARA CIVEL

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE DESPEJO POR FALTA DE PAGAMENTO COM COBRANÇA. PLANILHA ELABORADA PELO CONTADOR JUDICIAL NÃO IMPUGNADA PELOS RÉUS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE PAGAMENTO DE ENCARGOS. MULTA ESTABELECIDA EM CONFORMIDADE COM CLÁUSULA CONTRATUAL. 1-Réus que deixaram de efetuar integralmente e com regularidade os pagamentos dos aluguéis e seus encargos, o que motivou a rescisão contratual e a extinção da locação, com o conseqüente decreto de despejo.2-É fato incontroverso nos autos, afirmado pelos réus-apelantes em sua contestação e confirmado pelo autor-apelado em sua réplica, que o imóvel locado se encontrava vazio e à disposição do último em após a citação dos primeiros. Assim, as responsabilidades dos réus-locatários pelos alugueres e demais encargos locatícios atingem até o dia 09 de agosto de 2000, data essa avençada para término do prazo da locação, segundo reza a cláusula segunda do contrato firmado pelas partes.3-Caberia aos réus a prova de que inexistem débitos relativos aos tributos e demais encargos incidentes sobre o imóvel, o que não ocorreu.4-A multa moratória de 20% (vinte por cento) foi prevista na cláusula terceira do contrato de locação, e com a qual anuiram os réus.5-Doutrina e jurisprudência assentadas no sentido de que o Código de Defesa do Consumidor não é aplicável às relações locatícias, sobretudo nos casos de locação comercial.6-Recurso parcialmente provido.

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2007.001.06911 - APELACAO CIVEL - 1ª Ementa

DES. ROBERTO GUIMARAES - Julgamento: 27/06/2007 - DECIMA PRIMEIRA CAMARA CIVEL

APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE DESPEJO POR FALTA DE PAGAMENTO CUMULADA COM A COBRANÇA DE ALUGUÉIS E ACESSÓRIOS. LOCAÇÃO NÃO RESIDENCIAL. LOJA EM SHOPPING CENTERS. RELAÇÃO LOCATÍCIA NÃO REGULADA PELAS REGRAS DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. A ALEGAÇÃO DE ABUSIVIDADE DE CLÁUSULAS E EXCESSO DE COBRANÇA SÃO MATÉRIAS PARA SEREM VENTILADAS EM AÇÃO PRÓPRIA. EMPRESA LOCATÁRIA E FIADORES QUE HÁ CERCA DE 20 (VINTE) ANOS FIRMARAM CONTRATOS COM O SHOPPING LOCADOR, SEM DISCUTIREM AS CLÁUSULAS CONTRATUAIS. DESPROVIMENTO DO APELO DOS RÉUS. AS LOCAÇÕES DE LOJAS EM SHOPPING CENTERS TEM AJUSTE DIFERENCIADO DE ALUGUEL. CLÁUSULAS NÃO ABUSIVAS. AS PENALIDADES DEVIDAS EM RAZÃO DO INADIMPLEMENTO DEVEM OBEDECER AOS DITAMES PREVISTOS NO CONTRATO. SENTENÇA QUE SE REFORMA. PROVIMENTO DO RECURSO AUTORAL.

2007.001.09607 - APELACAO CIVEL - 1ª Ementa

DES. HENRIQUE DE ANDRADE FIGUEIRA - Julgamento: 02/05/2007 - DECIMA SETIMA CAMARA CIVEL

PROCESSO CIVIL. EMBARGOS DE DEVEDOR. FIANÇA. MORTE DO FIADOR. PENHORA. BEM DE FAMÍLIA. MULTA CONTRATUAL. Possível a penhora do bem imóvel da fiadora mesmo depois de seu óbito para garantia da dívida de aluguel formada no período de validade e eficácia do contrato, quando ainda viva a fiadora. A alegação de impenhorabilidade do imóvel por ser bem de família é insustentável, pois o óbito da fiadora não altera a natureza das obrigações constantes no contrato de fiança, nos quais não prevalece aquele benefício legal. As disposições do Código de Defesa do Consumidor não se aplicam no contrato de locação, regido por lei específica, por isso prevalece a multa de 10% (dez por cento) sobre o valor da dívida prevista no contrato de locação.Recurso desprovido.

2003.001.16415 - APELACAO CIVEL - 1ª Ementa

DES. PAULO GUSTAVO HORTA - Julgamento: 22/07/2003 - QUINTA CAMARA CIVEL ENTREGA DAS CHAVES C.DE DEFESA DO CONSUMIDOR INOCORRENCIA

JULGAMENTO CONJUNTO DE AÇÕES DE RESCISÃO DE CONTRATO DE LOCAÇÃO NÃO RESIDENCIAL, CONSIGNAÇÃO DAS CHAVES E DE DESPEJO. Ação de rescisão do contrato de locação ajuizado pela autora, que não conseguiu Instalar na loja locada, por falta de habite-se o negócio de Armarinho Papelaria e Artigos de Bazar Perdas e danos não comprovados e, por Isso, não concedidas Consignação das chaves do imóvel em Juízo e ação de despejo julgada Improcedente. Inocorrência da alegada anulação da sentença por julgamento Citra petita Questão jurídica que não envolve relação de consumo, descabendo a aplicação do CDC. Recurso não provido.

Grifos nossos

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BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

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pesquisa realizada em 28 de março de 2008.

(2) http://www.italiamiga.com.br/noticias/artigos/cabeca_de_porco.htm

pesquisa realizada em 28 de março de 2008.

(3) http://pt.wikipedia.org/wiki/C%C3%B3digo_Civil_Brasileiro

pesquisa realizada em 29 de março de 2008.

Anexo: http://www.stj.jus.br/SCON/

E http://www.tj.rj.gov.br/

pesquisa realizada em 29, 30 e 31 de março de 2008.

http://www.miguelreale.com.br/

Artigo: A boa-fé no Código Civil.

Pesquisa realizada em fevereiro de 2008.

ABREU, Mauricio de Almeida – Evolução Urbana do Rio de Janeiro – IPP

–Instituto Municipal de Urbanismo Pereira Passos – Secretaria Municipal de

Urbanismo – SMU – Prefeitura da cidade do Rio de Janeiro, 2006 – 4ª Edição, p.

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BEVILAQUA, Clóvis – Teoria Geral do Direito Civil – Ministério da Justiça –

Serviço de Documentação – 4ª edição – 1972 – p.258.

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Código brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores

do Anteprojeto/ Ada Pellegrini Grinover... (et ali) – 8ª Edição – Rio de Janeiro:

Forense Universitára, 2005 – p. 56

Código de Defesa do Consumidor e o Código Civil de 2002:

convergências e assimetrias/ coordenadores Roberto Augusto Castellanos

Pfeiffer, Adalberto Pasqualotto. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005 –

(Biblioteca de direito do Consumidor; v. 26 – Dialogo das Fontes – Cláudia Lima

Marques – 11-82

MORAES, Maria Celina Bodin de. “A Caminho de um Direito Civil

Constitucional”, Revista de Direito Civil nº 65.

REALE, Miguel -O projeto do Código Civil, São Paulo: Saraiva, 1986, p. 9.

SLAIBI FILHO, Nagib – Comentários à Nova lei do inquilinato – Rio de

Janeiro: Forense, 9ª Edição – 1997, p. 1-21.

TEPEDINO, Gustavo - Código Civil Interpretado conforme a Constituição

da República - Vol. II – artigo 421– Ed. Renovar – 2006, p. 14.

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FOLHA DE AVALIAÇÃO

Nome da Instituição: Universidade Candido Mendes – Instituto A Vez do

Mestre.

Título da Monografia: LEI DO INQUILINATO, CONTRATO DE LOCAÇÃO E

CLÁUSULAS ABUSIVAS - ESTUDO COMPARADO – PERSPECTIVAS E

POSSIBILIDADES.

Autor: Silvia Mendes da Silva Pavan

Turma K 088 – Direito do Consumidor

Data da entrega: 31 de março de 2008

Avaliado por:

Conceito: