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Universidade Cândido Mendes Instituto “A Vez do Mestre” Curso Terapia de Família A IMPORTÂNCIA DA AUTO-ESTIMA NA PREVENÇÃO DA DEPRESSÃO Rio de Janeiro, 2006

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Universidade Cândido Mendes

Instituto “A Vez do Mestre”

Curso Terapia de Família

A IMPORTÂNCIA DA AUTO-ESTIMA NA PREVENÇÃO DA DEPRESSÃO

Rio de Janeiro, 2006

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Universidade Cândido Mendes

Instituto “A Vez do Mestre”

Curso Terapia de Família

A IMPORTÂNCIA DA AUTO-ESTIMA NA PREVENÇÃO DA DEPRESSÃO

Autora: Maria Rosalina Monteiro de Brito Orientador: Celso Sanches

Rio de Janeiro, 2006

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AGRADECIMENTOS

Agradeço em primeiro lugar a Deus por ter despertado em mim o

interesse por fazer o curso de Terapia de Família.

Em segundo lugar aos professores, que no decorrer do curso foram

pacientes, generosos e compreensivos.

Agradeço ainda, aos meus familiares, amigos e colegas do curso, que me

apoiaram e trocaram comigo experiências, as quais me ajudaram no meu auto-

conhecimento e na própria elaboração da monografia.

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DEDICATÓRIA

Dedico esta monografia à pessoa que tem me incentivado a crescer como

pessoa e profissional há trinta e sete anos, meu marido Antônio Carlos.

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RESUMO

Este trabalho discutiu a influência da auto-estima na prevenção da

depressão, focando-se nas novas organizações familiares pobres, cujos

membros nasceram e residem no município do Rio de Janeiro. Chegou-se a

conclusão que realmente a auto-estima elevada previne o surgimento da

depressão nas pessoas. E que existe necessidade de políticas públicas

voltadas para esse problema de saúde.

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METODOLOGIA

A partir do tema escolhido “A importância da auto-estima na família,

como prevenção ao surgimento da depressão”, pesquisaremos e

selecionaremos bibliografia que dê conta de responder à hipótese e aos

objetivos propostos, privilegiando autores que forneçam embasamento teórico-

metodológico, que propiciem um maior e melhor entendimento sobre o que nos

propusermos a investigar.

Coletaremos dados através de pesquisa bibliográfica que enfoquem visão

sistêmica de família, auto-estima, rede social, depressão e Psicoterapia

Cognitivo-Comportamental.

Minhas fontes de levantamento dos dados necessários para a elaboração

do trabalho, serão: livros, artigos e trabalhos realizados nas diversas disciplinas

ao longo do curso de Terapia de Família.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO

8

CAPÍTULO I

CONCEITOS DE FAMÍLIA

10

CAPÍTULO II

AUTO-ESTIMA 16

QUAL A IMPORTÂNCIA DA AUTO-ESTIMA?

16

CAPÍTULO III

DEPRESSÃO 20

QUADRO CLÍNICO 21

SINTOMAS E DIAGNÓSTICO 22

TRATAMENTO FARMACOLÓGICO

24

CAPÍTULO IV

PSICOTERAPIA COGNITIVO-COMPORTAMENTAL 26

TCC DE GRUPO

CONCLUSÃO

BIBLIOGRAFIA

ANEXO

27

32

33

34

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INTRODUÇÃO

A importância da auto-estima na família, como prevenção ao surgimento

da depressão.

A família numa visão sistêmica é mais que a soma de suas partes. Para

seu equilíbrio é fundamental a interação entre seus membros para que haja

relações interpessoais saudáveis.

“Quando aparecem sintomas que coloquem em risco a estrutura familiar,

esta interagirá continuamente e usará vários métodos para manter sua

organização” (Nicholis e Schwartz; Terapia Familiar – Conceitos e métodos:

artmed ed.)

A interferência de terceiros, no caso o terapeuta familiar, propiciará

subsídios para que os indivíduos pertencentes ao sistema, encontrem

caminhos próprios de enfrentamento de suas dificuldades. Deve ser mais

valorizada a interação dos membros da família, do que a qualidade individual

daquelas.

No relacionamento familiar, segundo a psicanalista Anna Freud, “nada

existe que a afeição não possa curar” (Françoise Dolto ; 06/01/04). Em

determinada fase do ser humano, há necessidade do rompimento de idéias e

ideais dos tempos da infância, introduzidos pelos pais, para que o indivíduo

cresça psicologicamente e que dessa fora, possam ser removidas restrições

que o impeçam de trilhar o caminho do desenvolvimento normal.

É fundamental que sejam criados vínculos afetivos entre os membros da

família, os quais servirão para uma análise comportamental do indivíduo numa

perspectiva psicossocial.

Um dos objetivos no trabalho psicoterápico é captar o vínculo que o

indivíduo estabelece com o terapeuta, para poder inferir, a partir daí, o tipo de

relação do objeto e a natureza dos processos internos que funcionam dentro

daquele. Daí vê-se como o vínculo forma uma estrutura perfeitamente visível e

controlável, possível de investigação pelos métodos da psicologia social.

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Neste sentido, o presente trabalho investigará as novas organizações

familiares sob o aspecto psicossocial, privilegiando um olhar sistêmico.

Abordaremos a Psicoterapia Cognitivo-Comportamental dos indivíduos

que apresentam depressão, o qual atualmente está sendo difundido em larga

escala no tratamento dessa patologia tão comum da sociedade

contemporânea.

Fará também parte deste trabalho, a investigação da importância da rede

social, como coadjuvante na identificação dos “atores” que poderão fornecer

dados significativos que ajudem o terapeuta familiar a identificar para

diagnosticar a patologia apresentada pelo paciente, de forma que possa ajudá-

lo a desenvolver sua auto-estima, que acreditamos ser o pano de fundo da

maioria das doenças mentais e emocionais.

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CAPÍTULO I

CONCEITOS DE FAMÍLIA

A partir do Séc. XV, as realidades e os sentimentos da família se

transformariam: uma revolução profunda e lenta, mal percebida tanto pelos

contemporâneos como pelos historiadores, é difícil de reconhecer. E, no

entanto, o fato essencial é bastante evidente: a extensão da freqüência escolar.

Na Idade Média a educação das crianças era garantida pela aprendizagem

junto aos adultos, e que, a partir de sete anos, as crianças viviam com uma

outra família que não é a sua. Dessa época em diante, ao contrário, a

educação passou a ser fornecida cada vez mais pela escola. Essa substituição

da aprendizagem exprime uma aproximação da família e do sentimento da

infância, outrora separados.

No início do século XVII, como mostrou o Pe. de Dainville, criou-se uma

rede muito densa de instituições escolares de importância diversa. Em torno de

um colégio com a série completa de classes, estabelecia-se um sistema

concêntrico formado por alguns poucos colégios de Humanidades (sem classe

de filosofia) e de um maior número de escolas latinas (com apenas algumas

classes de gramática). As escolas latinas forneciam alunos para as classes

superiores dos colégios de Humanidades e dos colégios com a série completa

de classes.

Alguns contemporâneos inquietaram-se com essa proliferação das

escolas. Ela correspondia no mesmo tempo a essa necessidade de educação

teórica, que substituía as antigas formas práticas de aprendizagem, e ao

desejo dos pais e não afastar muito as crianças, de mantê-las perto o mais

tempo possível. Esse fenômeno comprova uma transformação considerável da

família: esta se concentrou na criança, e sua vida confundiu-se com as

relações cada vez mais sentimentais dos pais e dos filhos. Não será surpresa

descobrir que esse fenômeno situa-se no mesmo período em que vimos

emergir da família em torno do casal e das crianças.

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Nesse cenário, os problemas morais da família apareceram sob um luz

nova.

Os progressos do sentimento da família seguem os progressos da vida

privada na história da família moderna. Essa evolução por muito tempo se

limitou aos nobres, aos burgueses, aos artesãos e aos lavradores ricos.

Ainda no início do século XIX, uma grande parte das famílias, as mais

pobres e mais numerosas viviam em diferentes condições, como ocorre em

nossos dias atuais.

A antiga sociedade concentrava um número máximo de gêneros de vida

num mínimo de espaço, e aceitava - quando não procurava - a aproximação

barroca das condições sociais mais distantes. A nova sociedade, ao contrário,

assegurava a cada gênero de vida um espaço reservado, cujas características

dominantes deviam ser respeitadas: cada pessoa devia parecer com um

modelo convencional, com um tipo ideal, nunca se afastando dele, sob pena de

excomunhão.

O sentimento da família, o sentimento de classe e talvez, em outra área, o

sentimento de raça surgem portanto como as manifestações da mesma

intolerância diante da diversidade, de uma mesma preocupação de

uniformidade.

A família monogâmica se baseia ao poder do homem, com a finalidade

precípua de procriar filhos de paternidade incontestada; e essa paternidade é

exigida porque os filhos, na qualidade de herdeiros diretos, devem um dia se

apossar da fortuna paterna.

A monogamia, segundo Engels não foi de modo algum um fruto do amor

sexual individual, com o qual não tinha absolutamente nada em comum, já que

o casamento continuou a ser o que fora no passado, algo baseado

simplesmente em uma convenção. Esse tipo de organização familiar foi um

grande progresso histórico, mas ao mesmo tempo inaugurou - ao lado da

escravidão e da propriedade privada - esta época que se prolonga até nossos

dias, na qual cada progresso é ao mesmo tempo um relativo regresso, onde a

felicidade e o desenvolvimento de uns se realizam às custas da infelicidade e

da opressão dos outros.

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A direção familiar se transformou em serviço privado, a mulher tornou-se à

primeira criada, excluída de qualquer participação na produção social. Só a

grande indústria de nossos dias abriu-lhe novamente o caminho da produção

social. Só a grande indústria de nossos dias abriu-lhe novamente o caminho da

produção social, mas apenas para as mulheres do proletariado.

A família individual moderna se baseia na escravidão doméstica, mais ou

menos aberta, da mulher, e a sociedade moderna é uma massa cujas

moléculas são representadas precisamente pelas famílias individuais.

A família atual sofre ataques profundos em sua estrutura, apressando as

mudanças, no conjunto das mutações que revoluciona o comportamento social,

abalando velhas estruturas e tradições.

É certo que existe uma moral social, coletiva, cultural. São crenças,

costumes e leis que estabelecem os limites da relação entre as pessoas, nas

quais s família se insere. Pois a moral, em resumo, é a maneira como cada um

se relaciona consigo mesmo e com os outros.

A paternidade realça o valor do homem para si mesmo, tanto quanto a

maternidade eleva a mulher no seu próprio conceito. São estados de

consciência que gratificam o Espírito, preparando-o para movimentar energias

e possibilidades. (Amor, Casamento e Família. Jaci Régis, pág. 69).

Assim a palavra família, por exemplo, embora designe uma estrutura bem

conhecida, essencialmente, tem entendimento diferente e contraditório quanto

a sua real significação. Dessa forma, podemos dizer que a família, antes de

tudo, é um encontro.

A própria instituição do casamento formal, legal é questionada por muitos.

Todavia, o anseio de construir uma família e a procura de uma convivência

duradoura, dominam o cenário. Novas formas no relacionamento entre os

conjugues decorrerão do nivelamento mental, moral e até profissional dos

parceiros. A antiga família contemplava a supremacia do homem, o cabeça da

família, o que saía para prover os recursos e a submissão da mulher que devia

ficar na casa para os serviços domésticos. O novo panorama exige a mudança

desse modelo, com funções compartilhadas pelo casal. O casamento do futuro

será baseado no afeto e no amor.

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As novas organizações familiares não têm papéis sociais definidos. São

pessoas diferentes, lidando de diferentes maneiras com seus desejos e com a

construção de suas histórias. Sem papéis normativos e sem conceitos de

normalidade, a família passou a se estruturar de várias e novas maneiras.

Famílias monoparentais. Famílias de recasamento. Famílias formadas por um

casamento do mesmo sexo. Famílias formadas através de inseminação

artificial de doadora. Famílias formadas através de útero de mães substitutas.

Famílias inter-raciais, de grupo de irmãos etc, formadas através da adoção.

A família monoparental, onde o progenitor vive com seu(s) filho(s) em um

mesmo lar e que está diretamente envolvido com sua criação, cuidados e

educação. Essa nova organização familiar é o que se chama de “Família

Vivida”, onde as pessoas que convivem numa ligação afetiva, pensam em

inúmeras possibilidades de convivências, com valores diferentes da “Família

Pensada”, na qual sua organização pressupunha a união de um homem, uma

mulher, filhos e a impossibilidade do divórcio.

Segundo estudos já realizados, as Famílias Vividas só apresentam

problemas maiores com relação à situação financeira desfavorável, o que

geralmente acontece nas famílias pobres, que quando não são invadidas pela

pobreza, são tão bem sucedidas quanto as “Famílias Pensadas”.

Nas Famílias Vividas existe maior participação de seus membros. O que

importa, na verdade, é como acontece a interação entre eles, como aquela se

organiza para vencer os obstáculos e as adversidades.

No caso de ter havido um divórcio nesse tipo de organização familiar, é

preciso ter muita atenção com os filhos pois eles precisam ser protegidos e

para isso é necessário que se mantenha a sociedade parental funcionando,

pelo menos, razoavelmente bem, para que os filhos continuem a ser amados,

protegidos e cuidados, por ambos os pais. E para que tal aconteça, tem que ter

havido o “divórcio emocional” adequado.

O modelo de família que estamos nos referindo deve criar as condições

para cada qual assumir livremente a sua identidade, agindo com base no

escolhido e auto-inventado centro de si mesmo (e ser, no bom sentido,

autocentrado), o indivíduo tendo ensinamentos voltados para sua sobrevivência

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na sociedade e como não submeter-se à ela. Desenvolver experiências mais

profundas de criatividade espontânea, dos jogos inventivos e do livre

desenvolvimento de sonhos e fantasias.

O que se pretende colocar em evidência neste trabalho, é que partindo da

premissa de que não existe uma família genérica, a eficácia no trabalho

psicoterápico com famílias exige a definição de seu papel e a adequação de

conceitos e técnicas. O que só poderá ser efetuado, a partir de uma visão

ecossistêmica, que considere os fatores de gênero, classe social, geração e a

multiplicidade étnico – cultural que constitui a sociedade brasileira.

Assim, a família objeto da atenção no tratamento Psicoterápico Cognitivo-

Comportamental, na classe menos favorecida, multiproblemática, geralmente

de raça negra ou miscigenada, tem que ter por parte dos terapeutas um olhar

especial, levando em conta, que essa família possui uma singular organização,

que é produto: de sua origem africana, da experiência incorporada

culturalmente de sobreviver às rupturas familiares impostas pela escravidão,

das estratégias de sobrevivência em função dos inúmeros fatores de estresse,

causados pela pobreza e o desamparo, aos quais estão submetidas.

Como conseqüência, as etapas desenvolvimentais do seu ciclo de vida

familiar, são específicas e, exigem uma conceituação original que abarque as

características de sua realidade. Dessa forma, se configura um ciclo de vida

familiar reduzido, dividido em três estágios: adolescência/adulto jovem solteiro;

a família com filhos pequenos e a família em um estágio posterior de vida.

Perceber as múltiplas variáveis que constituem o perfil da família pobre

urbana brasileira, nascida e residente nos município do Rio de Janeiro, conduz

a percepção de que o planejamento, a implementação e a utilização de

técnicas no trabalho Psicoterápico Cognitivo-Comportamental com os

indivíduos dessas famílias, exigem a reflexão cuidadosa e a criação de

metodologias simples, onde o público alvo possa participar efetivamente de

todo processo do tratamento, e dessa forma poderem atuar como sujeitos de

sua própria história de vida.

Assim com este trabalho dentro da rede pública de saúde, haverá a

possibilidade de inclusão das pessoas carentes, ao tratamento já exposto, que

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é breve e barato, levando-se em conta que a Psicoterapia Cognitivo-

Comportamental Grupal no tratamento da depressão, demanda menos

profissionais, os quais devem estar atentos para a necessidade de um

cotidiano reflexivo voltado para as reais dificuldades dessas pessoas que

apresentam depressão, patologia esta, tão comum em nossos dias.

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CAPÍTULO II

AUTO-ESTIMA

Auto-estima é: se aceitar, se respeitar e confiar em si.

A auto-estima é a opinião, o conceito e o sentimento que cada pessoa tem

por si mesma e pelo seu interior. Através dela é que a valorização ocorre, pela

consciência, crença e confiança de suas habilidades e referenciais próprios.

Quando auto-estima está rebaixada, o ser humano sente-se vulnerável e

inadequado perante a vida, tendo a sensação de ser incapaz e de estar sempre

errado. Há um tripé de sustentação da auto-estima constituído pelo auto-

respeito, auto-aceitação e auto-confiança. Relações parentais e sociais, desde

a infância podem estruturar de modo favorável ou não a auto-estima. Inclusive

até os bem sucedidos se desvalorizam constantemente, quando têm baixa

auto-estima.

Em alguns casos não houve um suporte psico-afetivo amplo por parte dos

pais, confirmando e demonstrando suas qualidades e contestando os aspectos

negativos impostos pelo coletivo.

O ambiente pode ser um modulador importante na auto-estima daí

também a necessidade de que fatores sociais e econômicos desfavoráveis

sejam melhorados ou transformados pelas políticas públicas.

Além de fatores genéticos e comportamentais individuais, o estresse vindo

do mundo externo contribuem para a baixa auto-estima.

Qual a importância da auto-estima?

A auto-estima quando não faz parte da estrutura psíquica das pessoas

propicia o surgimento da depressão.

A estrutura de personalidade e as relações que as pessoas estabelecem

com os seus mundos interno e externo influenciam na auto-estima.

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Os processos de singularização, ou seja, o poder viver, o sobreviver num

determinado lugar, num determinado momento, têm a ver com a maneira

como, em princípio, todos os elementos que constituem o ego de uma pessoa,

funcionam e se articulam.

Não há como negar que aspectos coletivos como a crise sócio-

econômica, desemprego, distribuição desigual de renda, condições precárias

de moradia e violência repercutem diretamente na saúde e auto-estima das

pessoas. O tipo de trabalho e o nível de estresse associado ao mesmo também

é um importante fator de risco para a auto-estima.

Garantir a auto-estima é garantir qualidade de vida e promover a saúde da

população. Gastos imensos poderiam ser poupados, direta ou indiretamente.

Segundo Michael Marmot, autor de um pesquisa recentemente publicada

no British Medical Journal, a baixa auto-estima pode encurtar a vida. Pessoas

deprimidas têm uma expectativa de vida reduzida, com diminuição da atividade

do sistema imunológico e, consequentemente, maior risco para várias doenças,

como por exemplo: a depressão.

A baixa auto-estima pode influenciar seriamente o comportamento dos

indivíduos, levando-os à depressão, ao suicídio e até assassinatos,

principalmente, em países onde as desigualdades pessoais e coletivas são

discrepantes. Atualmente, a depressão é a quarta maior causa de

incapacitação no trabalho, levando a sérios prejuízos.

Hoje sabemos que além das questões biológicas, o meio ambiente

também é fundamental na manutenção da saúde mental das pessoas. Aí é que

devemos salientar a responsabilidade das instituições governamentais, que

reduzem os gastos com o tratamento dos transtornos mentais e principalmente

com a prevenção, não havendo um investimento maciço em atenções e ações

concretas na área de saúde pública. Esse pelo menos é o retrato atual, que

todos esperamos que seja modificado nos próximos anos.

Investir em auto-estima é investir no ser humano e contra as mazelas da

sociedade, como a violência. Sem querer ser reducionista, será que teríamos

tantos casos de depressão, se houvesse uma política voltada para o bem estar,

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manutenção e elevação da auto-estima? Será que teríamos tantos problemas

de saúde pública?

Em busca de um modelo que corresponda às exigências impostas por

nossa sociedade, os indivíduos se apóiam em crenças, costumes e leis que

estabelecem os limites das relações interpessoais e estas são influenciadas

pela auto-estima de cada indivíduo.

As pessoas desamparadas e oprimidas muitas vezes percebem o controle

como externo, e essa percepção pode aprofundar seus sentimentos de

resignação. É exatamente o que o pesquisador Martin Selignon (1975,1991) e

outros descobriram em experimentos com animais e pessoas. Quando

cachorros ficam presos em coleiras e recebem choques repetitivos, sem

oportunidade de evitá-los, adquirem um sentimento de desamparo. Quando

mais tarde colocados em outra situação, na qual podem escapar da punição,

apenas pulando uma cerca, eles se encolhem sem esperança.

Confrontadas com repetitivos eventos traumáticos, sobre os quais não

têm controle, as pessoas também passam a se sentir desamparadas, sem

esperança e deprimidas. Essa resignação passiva é chamada de desamparo

adquirido. Em contraste, os animais capazes de escapar aos choques, na

primeira situação aprendem o controle pessoal e escapam facilmente dos

choques na nova situação.

Em campos de concentração, e prisões, até mesmo em fábricas, colégios

e clínicas bem intencionadas para idosos, as pessoas às quais se concede

pouca experiência de controle têm um decréscimo similar no ânimo e aumento

do estresse. Parte do choque que sentimos numa cultura desconhecida é um

senso de redução de controle, quando não sabemos como vão reagir as

pessoas no novo ambiente (Triandis, 1994).

Esses estudos mostram que as pessoas que vivem em países

democracias estáveis informem maiores níveis de felicidade (Ingle 1990).

A auto-estima também está ligada à questão do otimismo, à forma como o

ser humano encara as dificuldades. Se sente capaz ou não para enfrentar as

situações conflitantes e formular estratégias de enfrentamento das dificuldades

que possam surgir no seu cotidiano.

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Em um estudo de otimismo e comportamento, Seligman Peter Schulman

(1986) compararam vendas efetuadas por novos corretores de seguros de vida

que eram mais ou menos otimistas em suas perspectivas. Aqueles que

conferem um tom otimista aos contratempos considerando-os um mero

momento difícil ou sugerindo uma nova abordagem, em vez de encará-los

como sinais de incompetência vendiam mais apólices no primeiro ano e tinham

a metade da probabilidade de desistir. A descoberta de Seligman foi

confirmada pessoalmente para ele, quando um dos calouros otimistas que se

tornaram corretores, depois de fazerem o teste de otimismo, mais tarde

telefonou-lhe e vendeu-lhe uma apólice.

A saúde também se beneficia de um otimismo básico, na medida que este

está ligado intrinsecamente à auto-estima. O desamparo deprimido reduz a

eficácia do sistema imunológico, que combate as doenças, inclusive a

depressão. Em vários estudos já foi provado que os otimistas vivem mais que

os pessimistas, ou vivem com menos doenças.

Se o pensamento positivo diante da adversidade dá resultado, o mesmo

acontece com uma pitada de realismo.

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CAPÍTULO III

DEPRESSÃO

Sob o ponto de vista epidemiológico a depressão é uma das doenças que

mais crescem em prevalência no mundo. Dados americanos da metade da

década passada indicam que 15% da população desenvolve ao menos um

episódio depressivo ao longo da vida, podendo chegar a 25% se estudarmos

apenas a população feminina. Pode ocorrer numa infinidade de situações

clínicas. Desse modo, o episódio depressivo pode ocorrer isoladamente, pode

ser um fato recorrente na vida da pessoa (vários episódios ao longo da vida),

fazer parte do transtorno bipolar de humor, ocorrer em comorbidade com outros

diagnósticos psiquiátricos (como o transtorno obsessivo-compulsivo ou o

transtorno do pânico), fazer parte do quadro clínico de doenças orgânicas

(como o hipertiroidismo) e alterações hormonais (gravidez, menopausa),

ocorrer em intercorrência psiquiátrica em outras situações clínicas (exemplos:

demências, doença de Parkinson, câncer ou qualquer outra doença terminal,

infecções, AIDS, e etc.), ser conseqüência de intoxicação por drogas e também

causada por medicamentos (como corticóides). Sendo assim a depressão pode

ocorrer em qualquer faixa etária.

Embora existam fatores genéticos e orgânicos indubitavelmente

associados à depressão, a própria extensão de sua ocorrência não deixa

dúvidas de que os fatores psicossociais são mais do que apenas um fato

associado à doença. É difícil imaginar. Por exemplo, que um episódio

depressivo que ocorra num paciente logo após este ter sua perna amputada

devido a um acidente de carro seja causada apenas por fatores orgânicos.

Contudo, está mais do que provado que apesar da importância com a qual os

mecanismos subjetivos inconscientes e os acontecimentos da vida cotidiana

(perda de emprego, fim de relacionamentos amorosos, infelicidade na vida,

perdas financeiras e etc.) influenciam na ocorrência do episódio depressivo, os

fatores orgânicos também possuem uma parcela de influência. Desse modo, do

ponto de vista científico a principal hipótese em voga hoje em dia, credita à

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baixa de serotonina na fenda sináptica a ocorrência da depressão. Isto deve-se

principalmente ao fato de que praticamente todos os medicamentos

antidepressivos atuem, por diferentes mecanismos de ação, no aumento da

concentração deste neurotransmissor na referida fenda. Outro

neurotransmissor recentemente implicado, e ainda menos estudado talvez

menos importante, é a noradrenalina.

A depressão sempre existiu na humanidade, porém devido a

discriminação e ao preconceito, a família onde existia essa patologia omitia o

diagnóstico, o qual era associado à loucura.

Na antiguidade, isolava-se o doente acometido de depressão e isso

impossibilitava o tratamento, uma vez que essa patologia denotava fragilidade

biológica. Os tratamentos eram a base de choques elétricos, o que trazia

imenso sofrimento para o paciente.

Quadro Clínico

Para se dizer o diagnóstico de depressão é importante que os sintomas

encontrados tenham uma duração mínima de 15 dias. Isto é importante, pois

atualmente o termo depressão já faz parte do vocabulário popular e é costume

a pessoa usar os termos depressão e tristeza como sinônimos. A tristeza é

uma emoção natural do ser humano, e pode até fazer parte do quadro

depressivo, mas de forma alguma este se reduz a ela, sendo desnecessários a

presença de alguns sintomas para podermos fazer o diagnóstico de episódio

depressivo.

Os sintomas mais comuns da depressão são humor deprimido (presente

em praticamente todos os casos) ou ansioso, perda de interesse pelas coisas,

fatigabilidade excessiva e cansaço, concentração e atenção reduzidas, auto-

estima e confiança reduzidas, idéias de culpa e inutilidade, idéias de ruína,

pessimismo, idéias ou atos auto-lesivos ou de suicídio, insônia, apetite

diminuído e lentificação do curso do pensamento. Outros sintomas como

desorientação e perda de memória podem estar presentes em casos mais

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graves, sendo necessário o diagnóstico diferencial com doenças orgânicas.

Alem disso, podem ocorrer ainda sintomas psicóticos associados, como delírios

(geralmente de culpa ou paranóides) e alucinações.

De acordo com a intensidade dos sintomas os episódios depressivos devem

ser classificados de leve, moderado ou grave. Os casos com sintomas

psicóticos por definição são sempre considerados graves, e nesta situação a

classificação correta é episódio depressivo grave com sintomas psicóticos. Se

o episódio for considerado grave, mas sem a presença desses sintomas, deve-

se classificá-lo como episódio depressivo grave sem sintomas psicóticos.

Sintomas e Diagnóstico

A depressão é conhecida como sinônimo de transtorno depressivo maior

(TDM). Também referido como depressão unipolar ou depressão maior é um

transtorno de humor, caracterizado pela combinação de sintomas que

interferem na habilidade para trabalhar, estudar, comer, dormir, e apreciar

atividades agradáveis, inclui-se ainda tipos diferenciados de depressão, como

depressão grave, depressão psicótica, depressão atípica, depressão

endógena, melancolia, depressão sazonal. A etiologia é multi-fatorial: fatores

genéticos, bioquímicos, hormonais, psicológicos e sociais podem causar ou

iniciar, em pessoas com pré-disposição, o aparecimento da depressão maior.

Apesar de ser um dos transtornos psiquiátricos mais comuns em serviços

de atenção primária à saúde, a depressão freqüentemente é sub-tratada ou

não diagnosticada. Isto acontece porque pacientes deprimidos freqüentemente

apresentam queixas de sintomas físicos ao invés de queixas de sintomas

emocionais. Como resultado, a depressão muitas vezes não é reconhecida e

há atraso no recebimento por parte do paciente de tratamento adequado

(quando o recebe). Entretanto, os sintomas físicos são cada vez mais

reconhecidos como manifestações comuns da depressão.

Na depressão a intensidade do sofrimento é intensa, durando a maior

parte do dia por pelo menos duas semanas, nem sempre sendo possível saber

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porque a pessoa está assim. O mais importante é saber como a pessoa sente-

se, como ela continua organizando a sua vida e como ela está se relacionando

com outras pessoas. Freqüentemente o indivíduo deprimido sente-se

desanimado abatido ou na “fossa”. Muitas pessoas com depressão negam a

existência de tais sentimentos que podem aparecer de outras maneiras tais

como sentimentos de raiva persistente, ataques de ira, tentativas constantes de

culpar os outros ou ainda com inúmeras dores no corpo, sem causa médica

que justifique. Pode ocorrer também uma perda de interesse por atividades que

antes eram prazerosas. O sono e a alimentação são alterados, podendo haver

diminuição ou aumento do apetite: em relação ao sono pode ocorrer insônia,

dificultando o indivíduo a dormir.

Muitas pessoas podem apresentar dificuldades em pensar, em

concentrar-se sentindo-se incapazes de tomar decisões que antes pareciam

ser rotineiras. Freqüentemente a pessoa pode pensar muito em morte, em

pessoas que já morreram ou na sua própria morte. Ocorre um desejo suicida

com tentativas de se matar, achando ser a única saída para se livrar do

sofrimento. A pessoa sente-se inútil sendo um peso para os outros.

Os sintomas são persistentes e graves o suficiente para interferir de forma

significativa na vida diária. Apesar da causa da depressão ser desconhecida, a

teoria bioquímica é a mais amplamente aceita, segunda a qual, uma disfunção

no sistema nervoso central é a responsável pela depressão. A diminuição de

dois neurotransmissores – a serotonina e a noradrenalina no sistema nervoso

central é responsável tanto pelo aparecimento dos sintomas emocionais quanto

físicos da depressão. Sabe-se que tanto a serotonina quanto à noradrenalina

atuam nas vias descendentes mediadoras da dor. Agentes que atuem apenas

em um dos dois neurotransmissores podem proporcionar, por meio de um

mecanismo pseudo-específico, certo alívio dos sintomas físicos dolorosos

associados à depressão.

Embora a depressão cause sintomas somáticos, como alteração do sono

e do apetite, não existe nenhum teste ou exame de laboratório que detecte

alterações específicas e que possa ser usado como método diagnóstico. O

método para diagnosticar depressão é a entrevista diagnóstica do paciente,

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onde o médico investiga: sintomas, história do paciente, história familiar,

diagnóstico diferencial e sempre que possível o médico complementa com

relatos familiares. O diagnóstico depende de alterações clínicas acompanhadas

de humor deprimido e do grau e duração do comprometimento associado.

Depressão é muito mais do que alteração de humor. É uma doença que

afeta mente e corpo. Apesar de se caracterizar por sintomas emocionais, como

perda de interesse e prazer, os pacientes também apresentam sintomas

físicos. Sintomas físicos: baixa energia, alterações no sono, dores vagas e

difusas, cefaléia, alterações no apetite, alterações gastrintestinais, alterações

psicomotoras. Sintomas emocionais: tristeza, perda de interesse, ansiedade,

desesperança, estresse, culpa e ideação suicida.

Apesar de poder ocorrer em pessoas de qualquer faixa etária, raça ou

grupo étnico, mulheres tem probabilidade duas vezes maior de ter depressão

do que homens. A depressão pode ter um impacto substancial na vida do

indivíduo e resultar, por exemplo, em dificuldades de relacionamento no

ambiente de trabalho, no casamento e na família.

Tratamento Farmacológico

O tratamento médico sempre se faz necessário, geralmente

medicamentoso (com medicações antidepressivas), ou psicoterápico, ou a

combinação de ambos, de acordo com a intensidade da doença e a

disponibilidade dos tratamentos.

A base do tratamento é feita com antidepressivos. A potência das

diferentes classes medicamentosas é praticamente a mesma, devendo a

escolha ser feita a partir do perfil de efeitos colaterais e do preço. Para todos os

antidepressivos espera-se um tempo médico para o início de sua ação por

volta de 15 dias. Outra classe medicamentosa comumente utilizada é a dos

benzodiazepínicos, seja para combater a insônia ou para aliviar a ansiedade

diurna. Nos casos onde houver sintomas psicóticos associados é imperioso o

uso de antipsicóticos, geralmente de alta potência.

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Pesquisas revelam que o tratamento conjugado de medicação e terapia,

em especial a TCC, é o mais eficaz e rápido para uma melhora ou remissão do

quadro de depressão (Riso et al. 1997. Blackburn e Moore, 1997). Para a

prevenção de novos episódios depressivos, a TCC é mais efetiva do que o

tratamento medicamentoso (Teasdake et al. 1993).

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CAPÍTULO IV

PSICOTERAPIA COGNITIVO-COMPORTAMENTAL

Terapia Cognitivo-Comportamental em grupo para pessoas

com depressão

A proposta da Terapia Cognitivo-Comportamental é a união entre

procedimentos educacionais (tarefas, exercícios formais, etc) e psicológicos

(modelagem, monitoramento de pensamentos negativos, etc.). É um programa

de treinamento de habilidades psicoeducacionais (Sank e Shaffer, 1984). Esse

modelo de terapia tem como objetivo ensinar de forma didática, ou seja, passo

a passo, como o cliente pode adquirir novo repertório de habilidade em termos

comportamentais e cognitivos e, com isso, melhorar sua qualidade de vida

(Free, 1999).

A Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) constitui-se na integração de

técnicas comportamentais com cognitivas e fundamenta-se no pressuposto de

que o afeto e o comportamento do indivíduo são determinados pelo modo

como ele estrutura seu mundo em termos cognitivos. Tem como característica

a natureza didática e educacional, ou seja, todos os aspectos da terapia são

explicados ao cliente que, juntamente com o terapeuta, irá trabalhar em uma

relação de cooperação na qual há o planejamento de estratégias para enfrentar

problemas claramente definidos. Assim o cliente adquire um repertório de

técnicas comportamentais e cognitivas que poderá utilizar para resolver seus

problemas, mesmo após o término da terapia.

A TCC é voltada para a solução de problemas e atenta para os fatores

mantenedores das dificuldades, e não para suas origens. Além disso, utiliza-se

de métodos indutivos por meio dos quais o cliente aprende a considerar

pensamentos e crenças como hipóteses cuja validade podem ser testadas. Em

sua estrutura formal, a TCC é uma abordagem diretiva e dura por tempo

limitado.

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Um dos objetivos é facilitar a aprendizagem de novos comportamentos e

cognições durante as sessões bem como a generalização destes para o

cotidiano do cliente. Com o auxílio dos terapeutas e/ou dos demais clientes, se

o formato for de grupo e com tarefas de casa, cuja importância é central na

TCC, os clientes aprendem a observar e registrar seus comportamentos e

cognições, após efetuar análises e treinos de procedimentos nas sessões que

facilitam a aquisição de novos repertórios.

TCC de Grupo

Os grupos de terapia apresentam uma série de fatores considerados

terapêuticos por facilitarem a aprendizagem de novos comportamentos e

cognições, bem como a extinção de antigos padrões.

Um grupo, além de se beneficiar das técnicas da terapia individual,

oferece um setting no qual podem ocorrer interações entre o terapeuta e o

cliente, assim como entre os próprios membros. Dessa forma, além das

técnicas específicas e reforçamentos introduzidos pelos terapeutas, o próprio

grupo funciona como um instrumento de mudança, transformando-se em uma

fonte adicional de reforçamento. Ele será o ambiente ideal para a prática de

novos repertórios e cada membro terá a oportunidade de se relacionar com

pessoas que têm experiências e habilidades diferentes das suas. Também se

deparará com simpatias, antipatias, invejas, medos, atrações, agressões,

competitividades e receberá feedback do significado e do efeito das várias

interações, sempre sob a supervisão dos terapeutas. O grupo funciona como

um microcosmo social (Vinogradov e Yalom, 1992)

Os membros dos grupos vão obtendo progressos em momentos

diferentes. Observas a melhora de algum membro do grupo oferece esperança

quanto à própria melhora.

Os grupos de TCC utilizam o procedimento de fazer com que cada

membro estabeleça para si objetivos a serem alcançados. Nas sessões, os

terapeutas, assim como todos os clientes, podem estar medindo e avaliando, a

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todo momento, o progresso de cada um. Isto objetiva as sessões diminuindo a

tempo total da terapia.

Os grupos terapêuticos ajudam as pessoas a se sentirem pertinentes a

uma comunidade que divide com elas muitas semelhanças. Desaparece o

sentimento de solidão, de incapacidade e de estranheza resultante do

pensamento de serem as únicas com aquele tipo de problema.

O conceito de coesão refere-se à atração que os membros têm entre si e

pelo próprio grupo. Existe coesão quando os membros de um grupo são

reforçadores entre si, escutam uns aos outros com atenção, dão sugestões e

criam relacionamentos afetivos dentro do grupo. Formas aversivas de

comunicação, como falta de atenção e agressões, também ocorrem, mas não

interferem no funcionamento do grupo. Essa aliança entre os membros é tão

importante quanto aquela que existe entre terapeuta e cliente na terapia

individual. Por outro lado, desenvolver um coesão do grupo já é um treino de

habilidades sociais, uma vez que os comportamentos exigidos para tal são os

mesmos necessários para o indivíduo adaptar-se à sua vida social fora do

grupo (Vinogradov e Yalom, 1992)

A TCC exige participação ativa utilizando-se da análise funcional como

instrumento, os problemas relatados são analisados em termos de cognições-

comportamentos-emoções e estratégias de mudanças são planejadas. Os

clientes aprendem a realizar a análise funcional na sessão, e são discutidas as

possibilidades de mudanças e a maneira de fazê-las. Assim, o cliente tem

formas objetivas de analisar sua melhora, o que com clientes portadores de

depressão é muito importante em função da falta de credibilidade existente em

si mesmos quanto a capacidade de produzir algo com bons resultados.

O primeiro passo na TCC de grupo é o terapeuta definir as diretrizes de

seu trabalho.

É importante definir se o grupo terá um número de sessões limitadas (por

exemplo: 15 sessões) ou não, pois isto definirá planejamento de sessões e

escolha de técnicas diferentes.

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É necessário definir se novos elementos poderão entrar no grupo após

seu início, ou seja, se este será aberto ou fechado. A entrada de novas

pessoas, com o trabalho já em andamento, pode dificultar a coesão.

As depressões têm classificações diferentes (conforme DSM – IV). O

terapeuta deve decidir se o grupo será constituído de elementos com

depressão de intensidade diferentes (leve, moderada ou grave) e se terá

pessoas tanto com depressão maior quanto com transtorno bipolar. A inclusão

de depressões diferentes causará uma maior instabilidade no grupo e uma

maior dificuldade de manejo o que pode interferir na proposta de trabalho da

TCC de grupo.

Alguns critérios de inclusão e exclusão devem ser estabelecidos para

acertar a escolha dos membros que podem participar, como idade, sexo, tempo

de doença e gravidade da mesma. Alguns critérios possíveis de exclusão são

abuso de álcool e drogas, transtorno de personalidade, quadro de depressão

secundário e uma esquizofrenia, etc.

O terapeuta sempre poderá convidar um colega, desde que seja de

mesmo orientação teórica, para ajudá-lo a preparar e conduzir as sessões,

bem como para observar mais atentamente todos os membros do grupo. Ele

pode fazer observações sobre a sessão em andamento (incluindo expressões

faciais, corporais, conversas paralelas, escolha de lugares para sentar, etc.) e,

ao mesmo tempo, intercambiar de posição com o terapeuta.

Uma outra vantagem de dois terapeutas presentes é a divisão de tarefas,

como, por exemplo, a correção de tarefas de casa realizadas pelos membros

do grupo, otimizando o aproveitamento do tempo.

E vantajoso quando existe a possibilidade de se ter uma pessoa para

observar e anotar tudo que se possa nas sessões quando não existe o recurso

de gravações audiovisuais. O observador pode ser um aluno do final do curso

de psicologia e, por meio dessa experiência, ele terá oportunidade de uma

formação e de um treinamento profissional, já que compartilhará com o

terapeuta do processo de elaboração da terapia do grupo.

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Algumas técnicas e/ou exercícios podem facilitar a aquisição dos novos

comportamentos (por exemplo registro de atividades), cognitivas (por exemplo

reatribuição cognitiva) ou outras (por exemplo role – playing).

Alguns questionários ou inventários podem ser usados para avaliar a

melhora ou piora da depressão em termos quantitativos, como, por exemplo, o

inventário para Depressão de Beck (DDJ) e a Escala Hamilton para Depressão.

Durante o transcorrer das sessões em grupo, os terapeutas e os próprios

membros do grupo podem solicitar uma ou mais sessões individuais. O objetivo

é discutir algum aspecto pessoal que esteja ocorrendo e que, por algum

motivo, não esteja sendo trabalhado nas sessões de grupo.

O objetivo é conhecer o futuro membro e avaliar sua adequação para o

perfil estabelecido para o grupo. Além, disso, informa-se os objetivos, as

vantagens e as limitações da terapia em grupo, bem como os ganhos que cada

pessoa pode obter participando do trabalho.

Também são dadas informações sobre questões práticas (hora, local e

duração das sessões) e questões éticas, pois os participantes deverão ser

comunicados no caso das sessões em que os dados possam ser divulgados

em publicações ou congressos científicos, sendo necessária a assinatura de

um termo de concordância, com o objetivo de preservar e garantir a integridade

ética do cliente e da instituição.

Na sessão inicial, são estabelecidas as regras básicas para o

funcionamento do grupo, como limite de faltas, atraso, realização de tarefas,

preenchimento de inventários, etc, e os participantes são socializados a

respeito do modelo, da TCC, ou seja, é explicado o que é e como funciona.

Devem sempre conter em sua estrutura os seguintes itens:

1 – Síntese da sessão

2 – Roteiro da sessão

3 – Atualização e verificação do humor

4 – Revisão da tarefa de casa

5 – Discussão de tópicos do roteiro

6 – Estabelecimento de tarefas de casa

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7 – Resumo final

8 – Feedback

Nas sessões finais ocorrem:

1 - Avaliação das habilidades adquiridas por cada um dos participantes;

2 - Medicação da depressão pelos inventários ou por escalas;

3 - Agendamento com os participantes de sessões de follow up com o

objetivo de avaliar a manutenção dos ganhos obtidos com a terapia e avaliação

da depressão.

Uma vez iniciada a terapia, alguns problemas podem surgir e prejudicar o

desenvolvimento do grupo:

- Ausência

- Abandono

Algumas pessoas podem afetar o desenvolvimento do trabalho do grupo e

exigem que o terapeuta desenvolva estratégia para contornar tal situação.

Exemplos:

- O monopolizador

- O silencioso

- O queixoso

- O teórico

No decorrer da terapia pode surgir:

- Aparecimento de uma crise aguda (hipomania, sintomas psicológicos) de

um dos clientes;

- Formação de subgrupos;

- Conflitos.

A Psicoterapia Cognitivo-Comportamental por ser uma terapia breve,

propicia que um número maior de pessoas se beneficiem, na medida em que

há uma probabilidade menor de abandono do tratamento.

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CONCLUSÃO

Partindo da hipótese de que o sujeito com auto-estima elevada terá

condições de buscar alternativas que o ajudem no enfrentamento de

dificuldades e o auxiliem a reconhecer a importância do relacionamento

interpessoal sadio, o qual propiciará, dessa foram, um desenvolvimento de todo

seu potencial, ajudando este sujeito na formação de sua própria família.

Sendo assim concluímos diante do estudo realizado, que realmente a

auto-estima elevada previne o surgimento da depressão nas pessoas. E que

existe a necessidade de políticas públicas comprometidas com um trabalho

voltado para os interesses das classes menos favorecidas, as quais são mais

vulneráveis e , portanto, com maior probabilidade de desenvolverem doenças

mentais e emocionais, devido à qualidade de vida deficitária que são

submetidas.

Concluímos também o quanto é importante a participação da família na

intervenção do tratamento psicoterápico, pois sem esse auxílio, o sujeito sente-

se desamparado e com um grau maior de dificuldade para enfrentar as

adversidades da vida.

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BIBLIOGRAFIA

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Janeiro: LTC,1981.

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DOLTO, Françoise. A Causa do Adolescente. Nova Fronteira,1990.

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GONDENBERG, Miriam. A Arte de Pesquisar: Como Fazer Pesquisa

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JULIEN, Fhilippe. Abandonarás Teu Pai e Tua Mãe. Cia. de Freud, 2004.

MINAYO, Cecília. Pesquisa Qualitativa em Saúde.

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ZELDIN, Theodore. Uma História Íntima da Humanidade. Record, 1994.

Outras fontes

Entrevista com Doutor Silas Bourguignon, publicada na revista Isto É.

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Seminário 5, “As formações do Inconsciente.”

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ANEXO

VELOCIDADE E INTERVALO NO TEMPO DA SAÚDE

- Ei, você!

- Quem, eu?

- Sim, você! Lembra de mim?

- Ah sim!

Meio sem graça, logo emenda:

- Como vai?

- Vou bem! E você?

- Tudo bem! Bom, até logo!

Você já passou por algo parecido?

Andamos em um dia-a-dia tão corrido que não temos tempo para prestar

atenção nas pessoas, nas coisas ou nos lugares. Estamos sempre com pressa.

Não é mesmo?

Você tem feito ou recebido visitas de amigos ou familiares? Quando foi a

última vez que você se sentiu despreocupado e ficou por horas conversando

com alguém?

Os modos de viver, de trabalhar e de estabelecer relações com o outro

produzem nossos modos de sentir, falar, agir e estar na vida, no trabalho e nas

relações.

E na saúde? Como estamos produzindo o nosso trabalho e os nossos

modos de sentir, falar, agir e estar? Como estamos enfrentando as dores e os

sofrimentos, nossos e do outro?

No trabalho em saúde, não precisamos nos condenar ao peso da dor, do

sofrimento e das carências. Também não podemos limitar nosso olhar e nossa

escuta apenas ao que detectam nossos instrumentos de diagnóstico: ausculta,

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palpação, laboratório, imagenologia etc. Precisamos inventar, cada um à sua

maneira, formas para não nos deixarmos petrificar e não desaprendermos a ver

e ouvir afetos e vivências. Precisamos de leveza... Voar para outros espaços

de produção de ações de saúde, ressignificando o próprio trabalho e recriando

a vida.

Mas “qual saúde bastaria para libertar a vida em toda parte onde esteja

aprisionada pelo homem e no homem”, pergunta-nos Deleuze (1997).

Apostamos em nossa potencialidade criativa de inventar formas de libertar a

vida onde estiver aprisionada?

O que fazer da vida senão

viver? Busquemos a vida onde

se possa encontrá--la. Uma vez

que a tivermos encontrado, ela

mesma resolverá os problemas.

Cada vez que nós negamos a

vida a fim de resolver uma

dificuldade, fazemos nascer dez

outros problemas em vez do

primeiro [...] Quando os homens

buscarem em primeiro lugar a

vida, eles não buscarão mais as

terras nem o outro [...] Buscai a

vida e a vida trará a

mudança.../Tudo o que é a vida

é vulnerável, só o metal é

invulnerável.Combatei pelo

frágil desabrochar da vida, mas

então não cedei jamais.

(Lawrence, 1989, APUD

PELBART, 2000, p 67-68).

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Liberar a vida é faze-la passar pelas brechas e fissuras que se abrem no

cotidiano.

Mas onde estão essas brechas e fissuras?

Vivemos esse paradoxo, as brechas e fissuras estão no cotidiano e muitas

vezes nem as percebemos. E mais, é por elas que passam as forças do

desejo, desejo que nos move e nos põe em ação.

No cotidiano, nos vemos engolidos pela labuta, rotinas e modelos. Somos

capturados, atropelados, atravessados por solicitações sem sim, todas para

ontem, e não percebemos que isso é resultado de processos mais gerais da

sociedade – a subjetividade contemporânea – a instantaneidade, a velocidade,

a multiplicidade, a visibilidade, a serialidade – as quais veremos mais adiante.

Essa subjetividade contemporânea conforma também o cotidiano dos

serviços de saúde e nos afeta. O problema não é sermos afetados e, sim, não

percebemos que fomos capturados.

Façamos uma pausa...

“O sertão está em toda a parte”, Guimarães Rosa

E uma secura árida e cálida toca nossa pele fazendo-a grossa,

espessa e avessa ao toque.

Solidão, carência, imobilidade, consumo e pressa...

Viver correndo e o con-viver morrendo...

Onde mesmo precisamos chegar? O que há para alcançar?

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Passam os anos e ficamos todos assim, meio homogêneos, vestidos de

calça jeans, comendo hambúrgueres e passeando nos shopping centers. Há

uma certa força que nos faz agir assim, há um certo controle para que nos

enquadremos.

A sociedade produz subjetividades que nos fazem oscilar entre extremos

– a alienação e opressão ou a criação e expressão. A alienação passa pela

fabricação de subjetividades em série, passa por modos de viver constituídos

como numa esteira de um linha de produção, contínua homogeneização. A

criação e expressão são processos de liberação de vida, de singularização.

A vida? Então, a vida no modo capitalista de produção parece ter

equivalência com mercadorias e com coisas muito banais. Basta olharmos para

as manchetes de jornais e leremos notícias sobre assassinatos e muita

violência motivados por dívidas de jogo, brigas de trânsito e tráfico de drogas,

entre outros. Em alguns casos, sem motivo algum.

A vida está valendo quase nada, por muito pouco mata-se o outro como a

um inseto.

O espetáculo e a violência na saúde

E na saúde, onde está a vida?

Vida mercadoria?

Ta lá o corpo estendido no chão!

Entre a vida e morte severina.

Fragmentos. Procedimentos. Pacientes poliqueixosos?

Sangue, suor e cerveja.

Espetáculo? A violência na saúde? Espetáculo da violência na saúde?

Freqüentemente somos atravessados pela violência na saúde, seja pela

demanda (vítimas dela) que nos chega para atendimento, seja pela forma

violenta com que algumas pessoas encontram alternativa para ter direito ao

atendimento em saúde, seja pelo desrespeito, descaso, desatenção etc.

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Freqüentemente essas situações tomam uma visibilidade sobre a qual

precisamos refletir.

“O espetáculo não é um conjunto de imagens, mas uma relação social

entre pessoas, mediada por imagens” (Debord, 1997, p.14) Bom e ruim, feliz e

infeliz. Precisamos indagar: a serviço de que algo conforma-se como

espetáculo? Quem é o espectador? Quem é (são) o(s) protagonista(s)? “O

espetáculo é ao mesmo tempo o resultado e o projeto do modo de produção

existente” (Debord, 1997, p14) e expressa uma degradação da vida social do

ser para o ter, para o parecer.

Esse movimento parece também emergir de certas forças que regem as

sociedades contemporâneas, que as colocam em uma transição, da civilização

da culpabilidade para um civilização da vergonha (Enriquez, 1994 apud Sá,

2000). Na primeira, o sentimento de culpa provoca um luta interna nas pessoas

entre os sentimentos de agressividade, inveja e amor e, de certo modo, essa

luta “controla” a violência. Na civilização da vergonha, toleram-se atos

repreensíveis, desde que não sejam descobertos, levando-nos a viver um

mundo de aparências.

Nessa perspectiva, podemos identificar “uma certa tolerância” a ações

violentas, desrespeitosas, desonestas, desde que não sejam descobertas.

Estaríamos imersos na lógica da produção do espetáculo, na busca de

prestígio, de aplauso e admiração por termos feito o nosso trabalho na saúde?

Estaríamos imersos nessa lógica da civilização da vergonha, tolerando coisas,

mesmo às custas de sofrimentos e conflitos éticos?

É premente a necessidade dos trabalhadores de reconhecimento pelo

trabalho executado. Reconhecimento social, mas antes de tudo, do próprio

trabalhador. Reconhecer-se no que faz. Realizar-se por meio do trabalho,

implicar-se, responsabilizar-se, satisfazer-se.

O trabalho precisa fazer sentido para o trabalhador, para o usuário e para

a sociedade. No entanto, temos nos afastado do nosso fazer. Nossos gestos

são externos, procuramos proteção no distanciamento da dor do outro.

Utilizamos escudos para nos protegermos e não alcançamos nosso intento:

cuidar do outro no seu momento de dor e sofrimento.

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Agimos segundo regras e normas instituídas, duras, pouco flexíveis. Para

tudo há uma resposta prévia, uma conduta fixa, igual para todos. Assim, não

entramos em contato com o outro, com nossos sentimentos, nossa existência,

produzimos separação – nós, o resultado do nosso trabalho e o outro, o

usuário.

Agimos imersos em forças que regem as sociedades, essa mesma

sociedade que agride o corpo produzindo chacinas, produz o culto da

aparência, o espetáculo e a intensa valorização das formas esculturais de

corpo.

O envelhecimento é negado, as rugas odiadas, as marcas do corpo

apagadas e a morte adiada em unidades de terapia intensiva. O corpo esbelto

e esguio é perseguido a qualquer custo e em todas as idades. Dietas, personal

trainers ou contrato de especialistas para orientar jeitos fashion de se vestir,

são alguns dos objetos desejados para consumo, assim como o mais novo e

menor celular, o último modelo de carro, a mais nova técnica de cirurgia

plástica. A grande massa de trabalhadores desempregados ou em mercado

informal de trabalho luta para conseguir sobreviver, sonhando com o fast food,

a tv, o tênis da moda etc.

Desconfiados, tememos quando uma criança se aproxima do nosso carro

parado no semáforo. Sensação desconfortante a de ver um acidente ou alguém

pedindo ajuda e ter de suspeitar: será um assalto? Devo envolver-me?

Estamos imersos em um individualismo que corrompe cada iniciativa de

troca, de afago, de coletivo. O outro é só um concorrente, ou pior, uma

ameaça.

Esses aspectos aparecem na saúde? De que forma? Em

quais circunstâncias?

As cidades se constroem com cada vez mais muros e cercas, territórios

fechados. Condomínios exclusivos para os ricos com guaritas, câmeras de

vídeo e seguranças. Guetos de casas simples, muitas inacabadas, com

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moradores que convivem com toque de recolher mesmo não havendo guerra

explícita e anunciada.

A solidariedade está em baixa, muitos espaços públicos são privatizados.

A praça torna-se lugar só para alguns poucos, praias são fechadas com muros

e portões dos condomínios.

Ah! Que saudade dos tempos de conversas de vizinhos na calçada, do

cheiro de terra molhada pela chuva fina e das épocas das jabuticabas

compartilhadas por toda a criançada direto no pé. Essas situações estão se

tornando cada vez mais raras...

A Instantaneidade

Estamos na era das mídias, das telecomunicações instantâneas. A

internet que nos leva a qualquer lugar, o celular que acessa a internet. Vejam

só, o avião a essa altura até parece meio ultrapassado! Podemos em menos de

um minuto falar com alguém que esteja no outro lado do mundo.

Essa lógica se espalha por todo o campo e nos afeta de modo específico.

Como diz Virilio (1996), a velocidade nos faz habitar o não-lugar, um território

dinâmico, onde vamos lidar com a surpresa, com informações que já não

condizem com a realidade, pois, quando a informação nos chega, a realidade

já é outra. Todo esse dinamismo, essa velocidade, nos dá uma espécie de

vertigem, tira nosso chão, as nossas certezas, tudo passa muito rápido e

vemos uma fusão, homogeneidade de cores, de formas, de tudo, colocando-

nos na busca de novos sentidos nesse não-lugar.

Essa lógica da velocidade nos transforma em pessoas muito ocupadas,

sem tempo para nada. Essa lógica impõe uma pressa nos trabalhadores e nos

usuários; atendimentos rápidos, medicamentos com efeitos instantâneos,

desaparecimento imediato dos sintomas. Tudo correndo, tudo rapidinho!

Embora essa seja a proposição da lógica hegemônica, a lida na saúde

exige outros tempos. Estamos falando do tempo necessário para a construção

do trabalho em saúde, constituição de equipes, estabelecimentos de vínculos

com os usuários, famílias, coletividades locais. Esse tempo necessário não é o

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do relógio ou do calendário e nem é a supressão do tempo, mas o tempo dos

intervalos, das aprendizagens, da aceitação e da incorporação. É o tempo do

caminhar pelas ruas, do sentar no banco da praça, do demorar-se sob a água

do chuveiro... Olhos nos olhos, ouvir o choro, captar a dor, receber ou ofertar

um aceno amigo.

O tempo no trabalho em saúde requer uma certa lentidão, um certo torpor

corporal, um certo estado de se deixar sentir em que se deixe fluir o tempo até

que nesse fluir sinta-se o momento de agir. A clínica é o momento de decidir e

fazer acontecer. A equipe é um momento coletivo de produção.

Como suportar a pressão da lógica da instantaneidade de abrir espaço

para o fluir do tempo e para sentir o momento de agir ou para criar o sentido

coletivo?

Precisamos dar tempo para o pensamento, para a criação e para as

sensações. Precisamos aceitar diferentes temporalidades, ritmos e

movimentos. Precisamos perceber o próprio tempo e o tempo do outro e

respeitá-los.

Como lidar com o diverso, o desconhecido ou o não-saber se não os

permitimos aparecer? Precisamos enfrentar essa tensão permanente entre ser

instituído pelas regras da sociedade e querer auto-instituir-se, expressar e criar

formas de viver a vida que façam sentido.

Precisamos enfrentar as tensões e conflitos decorrentes do encontro de

diferentes temporalidades: da sociedade, das instituições, dos grupos e das

pessoas. Nesses encontros de temporalidades, podemos produzir conexões,

para abrir brechas na instantaneidade, brechas através das quais se possa

ressignificar as tensões, viver e curtir as dores e as delícias de uma vida vivida

como ato de coragem.

Há, nisso tudo, nesse grande sertão, veredas! Vontades e potências.