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UNIVERSIDADE BANDEIRANTE ANHANGUERA MARCELO DIAS PEREIRA UM ESTUDO SOBRE INTERPRETAÇÕES DAS DIRETRIZES CURRICULARES PARA O CURSO DE LICENCIATURA EM MATEMÁTICA POR UMA INSTITUIÇÃO FEDERAL DE SÃO PAULO São Paulo 2013

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UNIVERSIDADE BANDEIRANTE ANHANGUERA

MARCELO DIAS PEREIRA

UM ESTUDO SOBRE INTERPRETAÇÕES DAS

DIRETRIZES CURRICULARES PARA O CURSO DE

LICENCIATURA EM MATEMÁTICA POR UMA

INSTITUIÇÃO FEDERAL DE SÃO PAULO

São Paulo

2013

Page 2: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO · desenvolvimento da minha vida pessoal, carreira profissional e formação acadêmica, essenciais para a realização desta pesquisa, meus

MARCELO DIAS PEREIRA

DOUTORADO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA

UM ESTUDO SOBRE INTERPRETAÇÕES DAS

DIRETRIZES CURRICULARES PARA O CURSO DE

LICENCIATURA EM MATEMÁTICA POR UMA

INSTITUIÇÃO FEDERAL DE SÃO PAULO

Tese apresentada à Banca Examinadora

na Universidade Bandeirante Anhanguera,

como exigência parcial para a obtenção do

título de DOUTOR EM EDUCAÇÃO

MATEMÁTICA, sob a orientação do

Professor Doutor Ruy César Pietropaolo.

São Paulo

2013

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FOLHA DE APROVAÇÃO

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DEDICATÓRIA

Às minhas sobrinhas Yasmin e Isabelly

À minha avó Norma (in memoriam)

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AGRADECIMENTOS

A Deus, pela vida...

Aos meus pais, Rosemary e João, pelos cuidados, educação, confiança...

Aos meus irmãos, Sérgio e Raquel, pelo carinho, reconhecimento, incentivo...

À minha esposa, Débora, pelo companheirismo, paciência, apoio...

Ao meu Orientador, Prof. Dr. Ruy, pela confiança, incentivo, profissionalismo ...

Aos Professores da UFABC, Drª Virgínia e Dr. Márcio, pela atenção e entrevistas ...

Às Bancas de Qualificação e de Defesa, Professores Dr. Ruy, Dr. Armando, Dr.ª

Marlene, Dr.ª Lilian e Dr.ª Nielce, pela leitura do trabalho, contribuições,

questionamentos...

Aos Professores do Programa de Pós-Graduação em Educação Matemática da

Uniban Anhanguera, Educadores, pelas aulas, exposições de experiências,

discussões sobre a formação de professores...

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, CAPES, pelo

incentivo, em forma de bolsa de estudos...

A esses e a muitos outros que participaram direta ou indiretamente do

desenvolvimento da minha vida pessoal, carreira profissional e formação acadêmica,

essenciais para a realização desta pesquisa, meus sinceros e eternos

agradecimentos.

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RESUMO

O presente estudo tem como propósito analisar interpretações assumidas pela

Universidade Federal do ABC das atuais Diretrizes Curriculares para a formação de

professores de Matemática, de modo a identificar os pressupostos de formação do

Curso de Licenciatura em Matemática dessa instituição, sobretudo no que se refere

à dimensão prática. Essa Universidade foi escolhida pelo caráter inovador em

relação à trajetória de formação inicial de professores para a Educação Básica, no

Brasil: um estudante que deseja tornar-se professor de Matemática deverá iniciar

seus estudos em um Curso de Bacharelado em Ciência e Tecnologia, que não

oferece necessariamente uma formação profissional específica, para depois optar

pela Licenciatura em Matemática. A investigação desse caso foi de cunho

qualitativo, utilizando análises bibliográfica, documental e das entrevistas com

coordenador e docentes do curso. Apresenta também uma síntese das resoluções e

pareceres que normatizam ou normatizaram os cursos superiores brasileiros de

formação de professores para a Educação Básica, desde a segunda metade do

século 20, o que favoreceu a análise do Projeto Pedagógico do Curso investigado.

Para a análise, no tocante aos conhecimentos que devem ser de domínio do

professor, foram consideradas as categorias estabelecidas por Ball, Thames e

Phelps a respeito dos conhecimentos necessários ao professor para o ensino de

Matemática. Identificou-se que, a despeito do pretendido caráter inovador no

processo de formação do professor de Matemática, o plano pedagógico do Curso

não atende a pressupostos da formação docente, defendidos por muitos

educadores, como a adoção da unidade na relação entre a teoria e a prática, e,

tampouco, cumpre integralmente as atuais Diretrizes Curriculares Nacionais para as

licenciaturas em Matemática.

Palavras-chave: Formação de Professores. Teoria e Prática. Licenciatura em

Matemática. Diretrizes Curriculares. Universidade Federal do ABC.

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ABSTRACT

The purpose of this study was to analyze the interpretations of the Brazilian

Curricular Guidelines implemented by Federal University of ABC in its Mathematics

teacher certification program in order to identify the premises adopted by the

Mathematics teacher training this institution offers, especially with regard to practical

aspects. This university was chosen because of the innovative approach it has

established toward the initial training of elementary school teachers in Brazil: a

student who wishes to teach Mathematics must start by obtaining a Bachelor’s

Degree in Science and Technology, which does not necessarily provide professional

training in a specific field, before subsequently opting for a teaching certification in

Mathematics. This case study was undertaken with a qualitative perspective by

studying bibliography, documented evidence, and interviews with the program’s

coordinator and teaching staff. It also includes a summary of the resolutions and

opinions that regulate or have regulated, since the second half of the 20th century,

Brazilian post-graduate teacher training programs leading to degrees in Elementary

Education, which was instrumental in analyzing the educational project of the

program we investigated. For this analysis, with regard to the knowledge required of

a Mathematics teacher, the categories established by Ball, Thames and Phelps were

used to define the body of knowledge teachers must master. It was found that,

despite the innovative character intended for the Mathematics teacher training

program, the program’s educational plan does not meet the basic requirements of

teacher education championed by many educators, such as adopting a unity

between theory and practice, nor does it fully meet the current Brazilian Curricular

Guidelines established for Mathematics teacher certifications.

Keywords: Teacher Training. Theory and Practice. Mathematics Teacher

Certification. Curricular Guidelines. Universidade Federal do ABC.

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RESUMÉ

Le présent étude vise à analyser les interprétations que fait par l'Université fédérale

de l'ABC des actuelles Lignes Directrices National Curriculum des programmes de

formation des professeurs de mathématiques, afin d'identifier les hypothèses

retenues dans la formation initiale des enseignants à enseigner cette discipline à

l'école primaire et lycée, en particulier ce qui a trait à la dimension pratique. Cette

université a été choisie en raison du caractère innovant de la formation initiale des

professeurs en enseignement élémentaire au Brésil : un étudiant souhaitant devenir

professeur de mathématiques devra débuter ses études par un course en sciences

et technologie, n'offrant pas nécessairement une formation professionnelle

particulière, pour ensuite choisir la formation au titre de professeur de

mathématiques. L’enquête avait un caractère qualitatif, avec des analyses

biographiques et de documents ainsi que des entretiens avec le coordinateur et les

professeurs. Il présente également un résumé, depuis la seconde moitié du 20e

siècle, des résolutions et des avis qui ont établi ou établir des normes pour les cours

d'enseignement supérieur dans la formation des enseignants l'école primaire et

lycée. Dans le cadre de cette analyse, et en ce qui concerne les connaissances que

le professeur doit maitriser, on a pris en compte les catégories établies par Ball,

Thames et Phelps sur les connaissances nécessaires pour l’enseignement des

mathématiques. Malgré le caractère innovant du processus de formation au

professorat en mathématiques, il a été constaté que le project pédagogique du cours

ne répondait pas aux hypothèses de formation soutenues par de nombreux

éducateurs comme l'adoption de l’unité de la relation théorie-pratique ni ne répondait

intégralement aux lignes directrices nationales actuelles des programmes de

formation des professeurs de mathématiques.

Mots-clés: Formation de professeurs. Théorie et pratique. Formation de professeur

de mathématiques. Lignes Directrices National Curriculum. Universidade Federal do

ABC.

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RESUMEN

El presente estudio tiene como objetivo analizar interpretaciones asumidas por la

Universidad Federal del ABC sobre las actuales Directrices Curriculares para la

formación de profesores de Matemáticas, de forma que se pueda identificar los

fundamentos de formación adoptados en el Curso de Profesor de Matemáticas de

dicha institución, principalmente en lo que se refiere a su dimensión práctica. Esa

Universidad fue elegida por su carácter innovador en relación a la trayectoria de

formación inicial de profesores para la Educación Básica, en Brasil: un estudiante

que desea tornarse profesor de Matemáticas deberá iniciar sus estudios de

Licenciatura en Ciencia y Tecnología, que no ofrece necesariamente una formación

profesional específica, para luego optar por el Profesorado de Matemáticas. La

investigación de ese caso fue de orden cualitativa, empleando análisis bibliográfico,

documental y entrevistas con coordinador y docentes del curso. Presenta también

una síntesis de las resoluciones y pareceres que rigen o rigieron los cursos

superiores brasileños de formación de profesores para la Educación Básica, desde

la segunda mitad del siglo 20, lo que favoreció el análisis del Proyecto Pedagógico

del curso investigado. Para el análisis, en lo concerniente a los conocimientos que

deben ser de dominio del profesor, se consideraron las categorías establecidas por

Ball, Thames y Phelps en relación a los conocimientos necesarios para la

enseñanza de las Matemáticas. Se identificó que, a pesar del pretendido carácter

innovador del proceso de formación del profesor de Matemáticas, el plan pedagógico

del curso no atiende los requisitos de la formación docente, defendidos por muchos

educadores, como la adopción de la unidad en la relación entre teoría y práctica, ni

tampoco cumple integralmente con las actuales Directrices Curriculares Nacionales

para el profesorado de Matemáticas.

Palabras clave: Formación de Profesores. Teoría y Práctica. Profesorado de

Matemáticas. Directrices Curriculares. Universidade Federal do ABC.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABC – Região paulista formada pelos municípios de Santo André, São Bernardo e São Caetano

BC&H – Bacharelado em Ciências e Humanidades

BC&T – Bacharelado em Ciência e Tecnologia

CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

CCNH – Centro de Ciências Naturais e Humanas

CEB – Câmara de Educação Básica

CECS – Centro de Engenharia, Modelagem e Ciências Sociais

CES – Câmara de Educação Superior

CFE – Conselho Federal de Educação

CMCC – Centro de Matemática Computação e Cognição

CNE – Conselho Nacional de Educação.

CP – Conselho Pleno

DCN – Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica

ENEM – Exame Nacional do Ensino Médio

IES – Instituições/Instituição de Ensino Superior

LDB – Lei de Diretrizes e Bases

LDBEN – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996

MEC – Ministério da Educação

PIBID – Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência

PPabc – Projeto Pedagógico das Licenciaturas em Biologia, Física, Química e Matemática da UFABC

Prodocência – Programa de Consolidação das Licenciaturas

Prosup – Programa de Suporte à Pós-Graduação de Instituições de Ensino Particulares

SBEM – Sociedade Brasileira de Educação Matemática

SBM – Sociedade Brasileira de Matemática

SiSU – Sistema de Seleção Unificado

UFABC – Universidade Federal do ABC

UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura

USP – Universidade de São Paulo

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Fluxo de formação proposto pela UFABC ................................................ 39

Figura 2 – Domínios dos conhecimentos para o ensino de Matemática ................... 59

Figura 3 – Representação da relação de unidade entre a teoria e as práticas tendo como pressuposto de formação os domínios dos conhecimentos para o ensino de Matemática ................................................................................................................ 72

Figura 4 – Questões históricas que precisariam ser enfrentadas na definição das DCNs, indicadas na Proposta de Diretrizes ............................................................ 123

Figura 5 – Percurso da formação inicial dos professores especialistas .................. 133

Figura 6 – Cursos de licenciatura em Matemática no Estado de São Paulo, Brasil, em 2010, distribuição pela variável natureza .......................................................... 159

Figura 7 – Amostra dos cursos de licenciatura em Matemática no Estado de São Paulo, Brasil, em 2010, distribuição pela variável duração ..................................... 162

Figura 8 – Amostra dos cursos de licenciatura em Matemática no Estado de São Paulo, Brasil, em 2010, distribuição pela variável turno .......................................... 162

Figura 9 – Distribuição da carga horária das disciplinas obrigatórias e eletivas do Curso investigado pelas categorias de conhecimentos ........................................... 197

Figura 10 – Composição da carga horária das disciplinas obrigatórias e eletivas do Curso investigado .................................................................................................... 202

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Vinculação entre os cursos de formação específica e os bacharelados interdisciplinares da UFABC...................................................................................... 37

Quadro 2 – Associação possível dos conhecimentos necessários ao professor de Matemática com atividades relacionadas ao ensino desta disciplina na Educação Básica ....................................................................................................................... 65

Quadro 3 – Conhecimentos para o ensino de equações no Ensino Fundamental e domínios dos conhecimentos para o ensino de Matemática, de Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) – uma possível associação ...................................................... 66

Quadro 4 – Relação dos cursos superiores específicos de formação de professores de Matemática para a Educação Básica, de âmbito nacional, e os respectivos anos de suas normatizações ............................................................................................. 90

Quadro 5 – Comparativo das disciplinas matemáticas estudadas no curso formação de professores de Matemática para a Educação Básica na USP e no modelo nacional da Faculdade Nacional de Filosofia ............................................................ 96

Quadro 6 – Comparativo das disciplinas do Curso de Matemática no modelo 3+1 com as do Curso de Licenciatura em Matemática criado em 1962 ......................... 102

Quadro 7 – Comparativo das disciplinas fixadas nos currículos mínimos dos cursos de formação de professores de Matemática para a Educação Básica de 1962 e 1974 ................................................................................................................................ 116

Quadro 8 – Associação possível das competências ou habilidades indicadas no Parecer CNE/CES 1.302/2001, para os cursos de licenciatura em Matemática, com os domínios dos conhecimentos para o ensino de Matemática, de Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ................................................................................................ 152

Quadro 9 – Associação possível das disciplinas contendo conteúdos fixados para as atuais licenciaturas em Matemática pelo Parecer CNE/CES 1.302/2001 com os domínios dos conhecimentos para o ensino de Matemática, de Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ................................................................................................ 154

Quadro 10 – Vínculo entre as etapas do estágio curricular supervisionado e as disciplinas de Práticas de Ensino do Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC .................................................................................................................... 182

Quadro 11 – Sugestão de atividades extracurriculares e suas respectivas cargas horárias, indicadas no Projeto Pedagógico das Licenciaturas da UFABC .............. 183

Quadro 12 – Síntese da análise de elementos do Projeto Pedagógico do Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC ................................................................. 190

Quadro 13 – Associação possível das disciplinas obrigatórias e eletivas do Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC com pressupostos teóricos de formação de professores para a Educação Básica ...................................................................... 193

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Distribuição dos créditos, e seus correspondentes em horas, das atividades do BC&T da UFABC ................................................................................. 41

Tabela 2 – Distribuição dos créditos, e seus correspondentes em horas, das atividades do Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC .............................. 44

Tabela 3 – Proposta do MEC para a distribuição da carga horária de 3.200 horas entre as dimensões de formação em cursos superiores que teriam como egressos professores especialistas ........................................................................................ 132

Tabela 4 – Cursos de licenciatura em Matemática no Estado de São Paulo, Brasil, em 2010, distribuição pelas variáveis organização, natureza, regime e modalidade. ................................................................................................................................ 160

Tabela 5 – Amostra dos cursos de licenciatura em Matemática no Estado de São Paulo, Brasil, em 2010, distribuição pela variável carga horária ............................. 161

Tabela 6 – Fluxo ideal de curso das disciplinas obrigatórias da Licenciatura em Matemática da UFABC, com suas cargas horárias semanais e créditos ................ 176

Tabela 7 – Disciplinas eletivas do Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC ................................................................................................................................ 177

Tabela 8 – Disciplinas que compõem a prática como componente curricular no Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC ............................................................ 179

Tabela 9 – Composição do componente conteúdos curriculares de natureza científico-cultural do Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC ................. 181

Tabela 10 – Possível associação entre disciplinas obrigatórias do Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC e conteúdos indicados nas Diretrizes Curriculares específicas .......................................................................................... 185

Tabela 11 – Distribuição da carga horária do Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC pelos componentes curriculares estabelecidos pela Resolução CNE/CP 2/2002 ..................................................................................................................... 187

Tabela 12 – Percentuais relacionados às disciplinas associadas em cada domínio da categoria dos conhecimentos para o ensino de Matemática ................................... 200

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SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO ..................................................................................................... 16

1 JUSTIFICATIVA, PROBLEMÁTICA E PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS .. 20

1.1 Sobre as Motivações ....................................................................................... 20

1.2 Sobre o Tema, os Objetivos e a Justificativa ................................................... 25

1.3 Sobre os Procedimentos Metodológicos .......................................................... 32

1.3.1 Caracterização da Instituição proponente do curso investigado ............... 35

1.3.2 Caracterização do curso investigado ........................................................ 40

2 REFERENCIAIS TEÓRICOS E PESQUISAS SOBRE AS LICENCIATURAS EM MATEMÁTICA BRASILEIRAS APÓS A PUBLICAÇÃO DAS ATUAIS DIRETRIZES CURRICULARES ...................................................................................................... 46

2.1 A formação de professores na visão de alguns referenciais teóricos .............. 46

2.1.1 Os conhecimentos necessários ao professor, segundo Shulman ............. 47

2.1.2 Os conhecimentos para o ensino de Matemática, segundo Ball, Thames e Phelps ................................................................................................................ 57

2.2 Visões da relação entre a teoria e a prática na formação de professores ....... 66

2.3 Os conhecimentos para o ensino de Matemática e a relação de unidade entre a teoria e prática .................................................................................................... 70

2.4 O Processo de Bolonha ................................................................................... 73

2.5 Investigações sobre cursos de licenciatura em Matemática e as Diretrizes Curriculares gerais e específicas – uma revisão bibliográfica ............................... 75

3 UMA ANÁLISE DAS NORMATIZAÇÕES NACIONAIS PARA CURSOS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE MATEMÁTICA PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA E UM PANORAMA DESSES CURSOS NO ESTADO DE SÃO PAULO EM 2010 ... 88

3.1 Órgãos federais responsáveis pela normatização da educação superior e Cursos específicos de formação inicial de professores de Matemática ................. 89

3.2 Instituição das grades curriculares de cursos específicos de formação de professores de Matemática para a Educação Básica até 1960 ............................. 91

3.3 Normatizações nacionais que pautaram a formação de professores de Matemática para a Educação Básica brasileira das décadas de 1960 a 1990 ...... 97

3.4 Normatizações para os cursos de licenciatura em Matemática da década de 2000 ..................................................................................................................... 118

3.4.1 A Proposta de Diretrizes para a Formação Inicial de Professores da Educação Básica e alguns fatos que a antecederam ...................................... 119

3.4.2 As Diretrizes Curriculares Nacionais para os atuais cursos de licenciatura brasileiros ......................................................................................................... 134

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3.4.3 As Diretrizes Curriculares específicas para os atuais cursos de licenciatura em Matemática brasileiros ............................................................................... 150

3.5 Um panorama das licenciaturas em Matemática no Estado de São Paulo em 2010 ..................................................................................................................... 157

3.5.1 Uma análise descritiva das licenciaturas em Matemática no Estado de São Paulo ................................................................................................................ 158

3.5.2 Caracterização das licenciaturas em Matemática ativas no Estado de São Paulo ................................................................................................................ 163

4 ESTUDO DAS INTERPRETAÇÕES DADAS ÀS DIRETRIZES CURRICULARES DO CURSO DE LICENCIATURA EM MATEMÁTICA PELA UNIVERSIDADE FEDERAL DO ABC ................................................................................................. 166

4.1 Análise de elementos do Projeto Pedagógico do Curso investigado ............. 167

4.1.1 Os objetivos e o perfil dos egressos do Curso indicados no PPabc........ 168

4.1.2 A organização curricular indicada no PPabc ........................................... 173

4.1.3 Síntese da análise dos elementos do Projeto Pedagógico do Curso investigado ....................................................................................................... 190

4.2 Análise das disciplinas e da prática proposta no Curso investigado .............. 192

4.2.1 Relação entre os domínios dos conhecimentos para o ensino de Matemática e disciplinas indicadas na matriz curricular do Curso ................... 192

4.2.2 A prática explicitada no PPabc e nas entrevistas .................................... 202

4.2.3 Síntese da análise das disciplinas e da prática proposta no Curso investigado ....................................................................................................... 211

CONCLUSÕES ....................................................................................................... 213

REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 226

ANEXO A – Transcrição das entrevistas realizadas com a Coordenadora e Professora do Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC ........................... 231

ANEXO B – Transcrição da entrevista realizada com um Professor do Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC ................................................................. 248

ANEXO C – Parecer Consubstanciado do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Bandeirante de São Paulo ................................................................. 256

APÊNDICE I – Análise das ementas para a elaboração do Quadro 12 .................. 258

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APRESENTAÇÃO

O presente estudo tem como propósito investigar interpretações das

Diretrizes Curriculares Nacionais dos cursos superiores de formação inicial de

professores para a Educação Básica e Diretrizes Curriculares específicas para o

curso de licenciatura em Matemática, assumidas por uma instituição federal no

Estado de São Paulo.

Trata-se de uma investigação inserida na Linha de Pesquisa Formação de

Professores que ensinam Matemática, do Programa de Pós-Graduação em

Educação Matemática da Universidade Bandeirante Anhanguera, com fomento da

Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), por meio

do Programa de Suporte à Pós-Graduação de Instituições de Ensino Particulares

(Prosup).

Julgamos que a importância de temas que abordem interpretações das

Diretrizes Curriculares dos cursos de licenciatura pode ser justificada pelas atuais

preocupações com a formação inicial de professores, demonstradas pelo Governo

Federal e por sociedades científicas, como a CAPES e a Sociedade Brasileira de

Educação Matemática (SBEM), respectivamente. Em 2007, a CAPES passou a

contribuir com a formação de professores para a Educação Básica e um de seus

programas visa ao fomento de projetos pedagógicos inovadores e que articulem a

teoria e as práticas; a partir de 2004, a SBEM passou a realizar fóruns regionais e

nacionais sobre as licenciaturas em Matemática para discutir, entre outros, as

Diretrizes Curriculares desses cursos e as mudanças que vêm sendo implementadas

por eles.

Impulsionadas, talvez, por essas ações da CAPES e da SBEM, observa-se

que algumas pesquisas estão sendo desenvolvidas com o objetivo de investigar

como a formação de professores de Matemática para a Educação Básica vem se

constituindo. O desenvolvimento dessas pesquisas pode ser comprovado por meio

de artigos publicados em, por exemplo, anais de eventos científicos, como nos do

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último Encontro Nacional de Educação Matemática, realizado em julho de 2013, em

Curitiba.

Os projetos pedagógicos inovadores impulsionados pela CAPES e as

mudanças que vêm sendo implementadas nas licenciaturas em Matemática,

estudadas pela SBEM, assim como pesquisas que estão sendo desenvolvidas com

o intuito de investigar como a formação de professores de Matemática para a

Educação Básica vem se constituindo, estão, em nossa concepção, relacionados às

mudanças que as atuais Diretrizes Curriculares1 visam implementar.

Com o intuito de contribuir para o processo de análise da implementação

dessas Diretrizes, apresentamos nossas reflexões sobre interpretações e

pressupostos adotados por uma instituição pública federal, na formação inicial de

professores de Matemática e, para isso, buscamos respostas para duas questões de

pesquisa, quais sejam:

Como são interpretadas, por uma instituição federal de educação

superior no Estado de São Paulo, as atuais Diretrizes Curriculares

para o curso de licenciatura em Matemática, sobretudo no tocante à

dimensão prática?

Quais são os pressupostos para a formação de professores de

Matemática adotados pela instituição federal proponente do Curso

investigado?

Por apresentar uma proposta de formação inicial de professores para a

Educação Básica diferenciada e pioneira no Brasil, optamos, como objeto de estudo,

pelo Curso de Licenciatura em Matemática da Universidade Federal do ABC2. Nesse

curso, um estudante que deseja tornar-se professor de Matemática deverá iniciar

seus estudos em um Curso de Bacharelado em Ciência e Tecnologia, que não tem

como objetivo uma formação profissional específica, para depois optar pela

Licenciatura em Matemática. Concluindo ambos os cursos, esse estudante terá duas

1 Neste estudo, utilizamos o termo Diretrizes Curriculares gerais para nos referirmos às Diretrizes

Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica, documento comum a todas as licenciaturas, e o termo Diretrizes Curriculares específicas para nos referirmos às Diretrizes Curriculares das licenciaturas em Matemática. 2 Sigla utilizada para identificar uma região paulista formada por três municípios: Santo André, São

Bernardo e São Caetano.

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titulações: uma de bacharel em Ciência e Tecnologia e outra de licenciado em

Matemática.

Buscando responder às questões apresentadas, organizamos este estudo em

quatro capítulos e uma seção para conclusões.

No capítulo 1, apresentamos as motivações que nos levaram a realizar este

estudo, a relevância e a justificativa para a escolha do tema. Como motivações,

abordamos parte de nossa trajetória profissional, relacionada à experiência que

tivemos como coordenador de um Curso de Licenciatura em Matemática, época em

que foi necessário nos aproximarmos de conhecimentos ainda em construção e

pouco discutidos no âmbito profissional, por se tratarem de assuntos relacionados às

atuais Diretrizes Curriculares, que acabavam de entrar em vigor. Anunciamos,

também nesse capítulo, os objetivos e comentamos as questões de pesquisa, além

de abordarmos os procedimentos metodológicos utilizados, subseção em que

também apresentamos a caracterização da Universidade Federal do ABC, assim

como do Curso de Licenciatura em Matemática por ela proposto.

No capítulo seguinte, abordamos os referenciais teóricos utilizados e

apresentamos uma revisão bibliográfica sobre as pesquisas com temas relacionados

às licenciaturas em Matemática. Como referenciais teóricos, adotamos os estudos

de Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) sobre os conhecimentos para o ensino de

Matemática, essenciais, em nossa concepção, na formação dos professores que

lecionarão Matemática na Educação Básica, por relacionarem teoria e prática. Pelo

fato de estudos desses pesquisadores estarem fundamentados nos estudos

realizados por Shulman (1986,1987) a respeito dos conhecimentos necessários ao

professor, esses estudos de Shulman também fazem parte de nossos referenciais,

juntamente com as visões sobre a relação entre a teoria e a prática, apresentadas

por Candau e Lelis (1993).

No capítulo 3, pelo fato de o nosso estudo estar relacionado às Diretrizes

Curriculares gerais para as licenciaturas e específicas para a licenciatura em

Matemática, apresentamos um histórico das resoluções e pareceres que

normatizaram os cursos de formação de professores para a Educação Básica,

desde a segunda metade do século 20. Damos especial atenção aos documentos

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relacionados aos cursos de formação inicial de professores de Matemática, para

melhor estudar interpretações que são feitas das atuais Diretrizes Curriculares. Esse

histórico nos favoreceu na análise do Projeto Pedagógico do curso investigado.

Caracterizamos, também nesse capítulo, os cursos de licenciatura em Matemática

no Estado de São Paulo, com base em pesquisa que realizamos com dados

coletados no ano de 2010, ao iniciarmos os trabalhos para a realização deste

estudo.

No capítulo seguinte, apresentamos as análises do Projeto Pedagógico do

Curso de Licenciatura em Matemática da Universidade Federal do ABC e das

entrevistas que realizamos. A análise do Projeto Pedagógico contribuiu para que

identificássemos, entre outros, os pressupostos de formação de professores de

Matemática dessa Universidade, ao passo que a análise das entrevistas contribuiu

para que entendêssemos como a teoria e a prática são relacionadas no Curso.

Finalizando, apresentamos nossas conclusões, compostas por uma síntese

da investigação que realizamos, pela organização das respostas às nossas

questões de pesquisa e por nossas reflexões que decorreram desta investigação.

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1 JUSTIFICATIVA, PROBLEMÁTICA E PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Neste capítulo, apresentamos as motivações que nortearam o

desenvolvimento deste estudo e a justificativa para a escolha do tema. Anuncio os

objetivos e as questões que norteiam o desenvolvimento deste trabalho e abordo,

também, os procedimentos metodológicos.

1.1 Sobre as Motivações

No ano de 1994 formei-me no curso de licenciatura em Ciências com

habilitação plena em Matemática e, em 1995, iniciei minha atuação no magistério

como professor de Matemática do então curso colegial. Três anos depois fui

convidado a lecionar uma disciplina de Álgebra, em um curso com as mesmas

características daquele em que me formei, em uma faculdade particular da grande

São Paulo, na qual atuei até o ano de 2011.

Naquela instituição tive a oportunidade de participar, no final da década de

1990, da transformação daquele curso para o curso de licenciatura em Matemática,

de graduação plena. Na época, não somente a instituição em que eu atuava, mas

todas as instituições de educação superior que tinham cursos de licenciaturas de

graduação curta e/ou plena tiveram de transformar esses cursos em novas

licenciaturas de graduação plena, por força da Lei de Diretrizes e Bases da

Educação Nacional, de 1996.

Na instituição em que eu atuava, o Curso de Licenciatura em Ciências, com

Habilitação Plena em Matemática, teve seu último vestibular em 1999. A partir do

ano 2000, o vestibular daquela instituição passou a oferecer vagas para o Curso de

Licenciatura em Matemática.

No ano de 2002, a convite da Diretoria daquela faculdade, e com a anuência

da maioria dos professores que compunham o corpo docente dos dois cursos – o de

Ciências e o de Matemática –, passei a exercer, além da docência, a função de

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coordenador de ambos os cursos. Naquele ano iniciou-se uma nova etapa na minha

carreira profissional, etapa essa que me aproximou mais da área de formação de

professores, uma vez que foi necessário me apropriar de novos conhecimentos

como, por exemplo, sobre gestão de cursos.

Durante o período em que estive como coordenador – 2002 a 2010 –,

juntamente com o corpo docente do Curso de Licenciatura em Matemática daquela

instituição, reformamos, por duas vezes, o Projeto Pedagógico desse curso: a

primeira vez para tentarmos reverter um processo de suspensão do curso, indevida

em minha opinião, determinada por uma Portaria Ministerial no final de 2001, e a

segunda vez para adequar o curso às Diretrizes Curriculares específicas dos cursos

de Matemática, estabelecidas em fevereiro de 2003.

A seguir, faço uma rápida abordagem sobre as experiências vividas em

ambas as reformas.

Em 1996, o Ministério da Educação (MEC) passou a avaliar, por meio de

provas, os estudantes dos últimos anos dos cursos superiores, com a justificativa de

levantar informações para orientar as ações da Secretaria de Educação Superior, no

sentido de estimular e fomentar iniciativas voltadas à melhoria da qualidade de

ensino. Essa avaliação, externa, foi denominada Exame Nacional de Cursos e ficou

popularmente conhecida como Provão. Em suma, o Provão analisava o

desempenho dos cursos, sendo esse inferido pelo desempenho dos alunos do

último ano desses cursos.

De acordo com os critérios fixados pelo MEC, cursos que tivessem obtido

reiteradamente desempenho insuficiente no Provão teriam seus reconhecimentos

suspensos e prazo de um ano para solicitar novo reconhecimento3. Nesse caso,

recebiam a visita de uma comissão para avaliação in loco do curso.

Especificamente para a área da Matemática, o Provão foi aplicado de 1998 a

2003, em todos os anos. Os cursos de licenciatura em Matemática e de licenciatura

em Ciências com habilitação em Matemática eram avaliados por uma mesma prova.

3 Artigo 36 do Decreto 3.860, de 9 de julho de 2001.

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Além disso, o Provão de uma mesma área com cursos de bacharelado e de

licenciatura, como a área de Matemática, por exemplo, continham questões que

eram comuns aos alunos desses cursos e questões específicas para cada um deles.

Nos Exames da área da Matemática, tanto os alunos da licenciatura naquela

área como os alunos da licenciatura em Ciências com habilitação em Matemática

respondiam a questões comuns às licenciaturas e bacharelado daquela área e a

questões específicas da licenciatura, pois o curso de Ciências, com aquela

habilitação, também formava o professor para lecionar Matemática na Educação

Básica.

Em decorrência de duas insuficientes e sucessivas notas, no antigo Provão,

dos alunos do Curso de Ciências com Habilitação Plena em Matemática da

instituição em que eu atuava, em dezembro de 2001 o Curso Ciências daquela

instituição teve seu reconhecimento suspenso, juntamente com o Curso de

Licenciatura em Matemática.

Autorizado pelo Ministério da Educação em 1999 e tendo sua primeira turma

matriculada no ano seguinte, aquela Licenciatura em Matemática ainda não havia

participado do Exame Nacional de Cursos, diferentemente do Curso de Ciências,

que participara do Provão desde 1998. Mas, mesmo assim, o MEC suspendeu sua

autorização, assim como a autorização do Curso de Ciências, que funcionava

apenas para que os alunos pudessem concluí-lo.

Uma das tarefas a mim delegadas em 2002, ao assumir a coordenação de

ambos os cursos, foi o de reverter aquele processo de suspensão, especialmente

para o Curso de Matemática, uma vez que o de Ciências, a partir de 2003, não mais

teria alunos. Para tanto, eu e os docentes do curso elaboramos uma nova matriz

curricular para a Licenciatura em Matemática e reformulamos o seu Projeto

Pedagógico, com base nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de

Professores da Educação Básica (DCN), as quais já tinham sido discutidas pelo

Conselho Nacional de Educação em 2001 e oficializadas no início do ano de 2002.

Com a apresentação do novo Projeto Pedagógico ao MEC e a reestruturação

do corpo docente, este a cargo da Direção da instituição, a reversão do processo de

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suspensão da Licenciatura em Matemática foi publicada no ano de 2004 e, no ano

subsequente, aquele Curso voltou a ser oferecido no vestibular.

Mas se fazia necessário, novamente, reformular o Projeto Pedagógico

daquele Curso, em virtude do estabelecimento das Diretrizes Curriculares

específicas para os Cursos de Matemática, oficializadas no ano de 2003.

Em ambas as reformulações dos Projetos, foram necessários estudos e

discussões, com o corpo docente do curso, sobre as DCNs e/ou as Diretrizes

Curriculares específicas para cursos de Matemática. Para tanto, alguns materiais

complementares às normas, contidas nas Diretrizes, foram também identificados e

utilizados, como o artigo Reflexões sobre os cursos de licenciatura em Matemática,

de Pires (2002), publicado no periódico Educação Matemática em Revista.

Tal artigo, publicado no ano de 2002, fez parte de uma edição especial

daquele periódico, que é uma publicação da Sociedade Brasileira de Educação

Matemática. Aquela edição especial, número 11A, apresentou somente artigos

relacionados à reorganização dos cursos formadores de professores de Matemática

para a Educação Básica, reorganização essa decorrente da definição e oficialização

das DCNs, pelo Ministério da Educação.

Além dos materiais complementares, foram estudados alguns projetos

pedagógicos de cursos de licenciatura em Matemática de instituições consideradas,

pelo corpo docente do Curso de Licenciatura em Matemática e Direção da

instituição, mais experientes na formação de professores. Porém a maior parte delas

também estava passando pelo mesmo processo de reformulação, devido à recente

normatização, e tais estudos não nos proporcionaram muitos conhecimentos novos.

Diante das modificações acarretadas por aquelas novas Diretrizes, deparamo-

nos com algumas dificuldades para a realização de ambas as reformulações. Cito,

por exemplo, a não explicitação das bases teóricas utilizadas na elaboração das

normas estabelecidas, principalmente nas Diretrizes Curriculares dos cursos de

Matemática.

Por outro lado, surgiam também dúvidas quanto a, por exemplo, como montar

um curso com a carga horária de 2.800 horas, fixada como mínima para um curso

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de licenciatura, distribuídas em três anos de duração, também fixado como mínimo.

Com o ano contendo 200 dias letivos, isso significaria uma carga média diária de

quatro horas e 40 minutos de atividades, em um curso noturno, o que era

impraticável, uma vez que o horário das aulas noturnas da instituição em que eu

atuava era das 19h às 22h30, com dez minutos de intervalo.

Para resolver tal problema teríamos de aumentar a quantidade de dias letivos

ou propor um curso com duração maior que três anos ou, ainda, propor atividades

externas ao horário das aulas, uma vez que aumentar a carga horária diária das

atividades em uma hora e 20 minutos não era possível, devido ao turno.

Percebi, então, que dificuldades e dúvidas como essas não eram particulares

e passei, com o decorrer do tempo, a me aprofundar mais sobre os assuntos

relacionados às DCNs e Diretrizes Curriculares específicas para os cursos de

Matemática.

Esse aprofundamento me levou, por exemplo, ao desenvolvimento, em 2005,

no Mestrado, de um estudo que foi posteriormente utilizado para constituir uma

disciplina, quando da segunda modificação do Projeto Pedagógico para a

Licenciatura que eu coordenava. Tal disciplina estava baseada nas Diretrizes, tanto

gerais quanto específicas para os cursos de Matemática, mais exatamente à

interpretação que fizemos – eu e o corpo docente do curso – sobre a inclusão de

conteúdos matemáticos presentes na Educação Básica, no currículo das

licenciaturas.

Daquele estudo, pude identificar os conhecimentos sobre equações que os

alunos ingressantes no Curso de Licenciatura em Matemática que eu coordenava

traziam e, por meio desses conhecimentos, construímos parte do programa de uma

disciplina que havíamos denominado Complementos de Matemática, proposta no

primeiro semestre do curso. Tal disciplina tinha como objetivo, conforme nossa

interpretação das Diretrizes Curriculares, abordar conceitos e procedimentos, assim

como apresentar pesquisas e discutir sobre o processo de ensino e aprendizagem

de assuntos da Educação Básica que seriam objetos de ensino dos futuros

professores.

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Já decorridos, em média, pouco mais de dez anos das determinações das

Diretrizes Curriculares específicas para os cursos de Matemática e das DCNs, ainda

me vejo discutindo interpretações e pertinências das normas contidas nessas

Diretrizes, para os cursos de licenciatura em Matemática. E tenho consciência de

que não estou só, conforme pudemos constatar nos encontros regionais e nacionais

da SBEM sobre esses cursos.

Associadas às dificuldades que tive para entender partes das normas

nacionais e aplicá-las na elaboração de Projetos Pedagógicos de uma Licenciatura

em Matemática, as discussões da SBEM também me motivaram na realização deste

estudo.

Entendo que conhecer como são interpretadas as atuais leis que embasam

esses cursos, assim como conhecer a formação que é proposta por eles, pode

melhor qualificar os envolvidos na elaboração de toda a estrutura dessas

licenciaturas. Pode, também, melhor qualificar os envolvidos nas avaliações

externas, que, por meio de reflexões baseadas em exemplos e contraexemplos,

poderão melhor direcionar suas atividades a fim de contribuir, com conhecimentos

significativos, na reformulação de projetos pedagógicos. Entendo que ambas as

qualificações citadas poderão implicar a proposição de cursos mais eficientes para a

formação de futuros professores, capazes de reverter o estado negativo da nossa

Educação Básica, principalmente no que se refere ao processo de ensino e

aprendizagem de Matemática.

1.2 Sobre o Tema, os Objetivos e a Justificativa

Este estudo trata da formação de professores e tem como tema

interpretações das Diretrizes Curriculares Nacionais e Diretrizes Curriculares

específicas para o curso de licenciatura em Matemática, apresentadas por uma

instituição federal de educação superior no Estado de São Paulo.

Nosso objetivo é analisar, com base no estudo do Projeto Pedagógico do

curso de licenciatura em Matemática proposto por essa instituição e do estudo de

entrevistas a professores desse curso, interpretações assumidas das Diretrizes

Curriculares Nacionais e Diretrizes Curriculares específicas do curso, de modo a

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identificar pressupostos relacionados à formação inicial de professores de

Matemática para a Educação Básica, sobretudo no que se refere à dimensão

prática.

Pretendemos, com este estudo, contribuir com reflexões sobre as

interpretações dadas às Diretrizes Curriculares elaboradas pelo Ministério da

Educação, e que são apresentadas por instituições diretamente administradas pelo

mesmo Ministério, interpretações essas que podem ou não servir como parâmetros

para futuras reflexões sobre a formação de professores de Matemática para a

Educação Básica.

Temas associados à formação de professores são, em nossa opinião, de

grande interesse para a área da Educação, haja vista o grande número de

pesquisas e de trabalhos que vêm sendo realizados, sobretudo a partir dos anos de

1990.

Naquela década, houve um grande número de estudos cujo objetivo era

analisar a relação entre as concepções/crenças dos professores e sua prática

pedagógica, e estudos mais recentes procuram investigar os conhecimentos

profissionais dos professores em exercício, partindo do pressuposto de que os

docentes produzem saberes práticos sobre a matemática escolar, currículos e

atividades de ensino.

Com a nova atribuição conferida à CAPES, em 2007, ela passou a contribuir

com a formação de professores para a Educação Básica por meio, por exemplo, do

Programa de Consolidação das Licenciaturas (Prodocência) e do Programa

Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID). Entre outros objetivos, o

Prodocência visa ao fomento de projetos pedagógicos que renovem a estrutura

acadêmica e curricular de cursos de licenciatura e o fomento a propostas de

articulação entre teoria e práticas que integrem a Educação Superior com a

Educação Básica. Já o PIBID busca inserir os futuros professores no cotidiano de

escolas públicas, para proporcionar-lhes oportunidades de criação e participação em

experiências metodológicas, tecnológicas e práticas docentes, com o intuito de

superar problemas no processo de ensino-aprendizagem.

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Em nosso entendimento, a estrutura acadêmica e curricular de cursos de

nível superior, assim como a articulação entre a teoria e a prática, um dos objetivos

de ambos os projetos – o Prodocência e o PIBID – são elementos que estão

diretamente relacionados à interpretação que é dada das Diretrizes Curriculares dos

cursos de formação de professores para a Educação Básica, pelas instituições de

ensino superior.

Dessa forma, estudos com temas que abordem interpretações das Diretrizes

Curriculares dos cursos de licenciatura e que identifiquem pressupostos de formação

utilizados no ensino de suas disciplinas podem contribuir, por exemplo, para

promover reflexões nos processos de reformulação, ratificação ou construção de

projetos pedagógicos inovadores na estrutura acadêmica e curricular, propiciando

uma melhor articulação entre a teoria estudada na Educação Superior e a prática a

ser desenvolvida na Educação Básica.

No que diz respeito à formação inicial de professores de Matemática para a

Educação Básica brasileira, embora haja pesquisas sobre essa formação, há

necessidade de estudos abordando interpretações e reflexões sobre as atuais

Diretrizes Curriculares, gerais e específicas, e que busquem identificar eventuais

mudanças que vêm sendo implementadas nesses cursos, em face das demandas

do sistema educacional brasileiro.

Tal fato pode ser comprovado, por exemplo, nos Fóruns Regionais e

Nacionais de Licenciaturas em Matemática, realizados pela SBEM, que discutem,

entre outros assuntos, as Diretrizes gerais e específicas desse curso.

No resumo do último Fórum Nacional de Licenciatura em Matemática,

realizado em abril de 2011 na Faculdade de Educação da Universidade de São

Paulo, a Professora Doutora Maria Elisabette Prado, responsável por sintetizar a

produção realizada nos subgrupos de discussão, destacou, dentre outras categorias

discutidas, a de currículo da licenciatura, e nela os seguintes assuntos abordados,

mas que ainda mereciam reflexões futuras: o delineamento do objeto de ensino da

licenciatura em Matemática, a ressignificação das horas de prática de ensino, a

reflexão sobre a reconstrução das disciplinas, a integração do conhecimento

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pedagógico com o conhecimento matemático, entre outros. (COMISSÃO

ORGANIZADORA, 2011)

Da mesma forma, entendemos que esses temas destacados pela Prof.ª

Elisabette Prado podem estar diretamente relacionados às interpretações que se

fazem das Diretrizes Curriculares gerais e específicas da licenciatura em

Matemática, ou ainda podem estar negligenciados nessas normas, como, por

exemplo, a questão do delineamento do objeto de ensino dessas licenciaturas.

No entanto, identificamos que poucos são os estudos que abordam essas

interpretações sobre a formação inicial de professores, para cursos de licenciatura

em Matemática. Isso talvez possa ser justificado por serem recentes as

normatizações de cursos da educação superior que têm como objetivo apenas

oficializar um conjunto de princípios, fundamentos e procedimentos que devem ser

observados na organização institucional, assim como na elaboração de projetos

pedagógicos desses cursos, ao invés de fixarem suas normas rígidas de criação e

funcionamento, ou estabelecerem cursos como modelo, conforme ocorrido no

decorrer do século 20, como se pode observar ao se fazer um estudo desses

documentos.

Se partirmos de uma análise dos diferentes decretos, pareceres e resoluções

relacionadas à Educação Superior, elaborados ao longo da história, poderemos

identificar a existência de momentos em que os projetos pedagógicos dos cursos de

formação de professores para a Educação Básica deveriam ser únicos, não

poderiam variar de instituição para instituição, pois tinham, inclusive, fixadas as listas

dos conteúdos que deveriam ser trabalhados em cada disciplina, também fixada.

Outros momentos em que apenas eram fixadas as disciplinas e os períodos em que

deveriam ser estudadas. Poderemos identificar, também, momentos em que nada

era fixado ou que apenas foram determinadas as diretrizes para serem observadas,

possibilitando, assim, diferentes interpretações e, consequentemente, a existência

de diferentes propostas de formação, como nos dias de hoje.

Por meio da referida análise, poderemos observar que em dado momento da

história, houve, em cursos de formação de professores de Matemática para a

Educação Básica, a inclusão de conteúdos da matemática dos atuais Ensinos

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Fundamental e Médio por meio de disciplina fixada com o nome de Fundamentos de

Matemática Elementar e que, com o passar do tempo, essa inclusão foi suspensa

para retornar, com novo enfoque, nas atuais Diretrizes Curriculares. Dessa forma, o

que anteriormente fora trabalhado com caráter de revisão, apesar de ter sido fixado

com outros objetivos além desse, saiu de cena por um período de tempo para

depois retornar, com novos objetivos, que poderão ser alcançados tendo, como

base, um referencial de formação de professores de Matemática para a Educação

Básica, como os estudos de Ball, Thames e Phelps (2007, 2008).

Também poderemos observar, ainda nessa análise, como a teoria e a prática

se relacionaram na formação inicial de professores para a Educação Básica. Em

dado momento da história, a prática coexistiu com a teoria, de forma totalmente

dissociada dessa, com uma lógica própria e independente, configurando dois polos

na formação de um professor, uma visão dicotômica, portanto. Houve também

momentos em que a prática foi vista como uma aplicação da teoria, uma visão

também dicotômica, mas que associava, de certa forma, teoria e prática, sendo a

prática subordinada à teoria à qual era conferida um grau de importância bem maior.

Além desses, houve momentos em que a teoria e a prática passaram a ser vistas

como uma unidade indissociável, portanto dependentes uma da outra.

Nessa última visão, Candau e Lelis (1993, p. 56) afirmam que “o primado é da

prática, com a diferença de que esta prática implica em um grau de conhecimento da

realidade que transforma e das exigências que busca responder. E este

conhecimento da realidade é fornecido pela teoria [...]”, que da prática se constrói,

ou seja, mesmo tendo prioridade, a prática não se subordina à teoria e, tampouco,

vice-versa.

Portanto, entendemos que este estudo é relevante, especialmente em um

momento no qual a SBEM e a Sociedade Brasileira de Matemática (SBM) vêm

realizando, desde 2011, reuniões conjuntas para escrever uma proposta única de

Diretrizes Curriculares para o curso de licenciatura em Matemática, que será

encaminhada para apreciação do MEC, uma vez que ambas entendem que as

Diretrizes específicas precisam ser revisadas.

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Particularmente, também somos a favor da revisão das Diretrizes Curriculares

específicas para as licenciaturas em Matemática, uma vez que as Resoluções e

Pareceres que tratam das normas desses cursos são, em nossa opinião,

documentos generalistas em alguns aspectos e omissos em outros. Generalistas,

por exemplo, na determinação, em um mesmo documento, de normas para dois

cursos de naturezas distintas, não deixando clara a identidade de cada curso.

Omissos em não indicarem investigações específicas sobre a formação inicial de

professores para lecionar Matemática, como os conhecimentos necessários ao

futuro docente para exercer sua função, assim como não abordar a relação que

deve – ou não – existir entre esses tipos de conhecimentos e os conteúdos de nível

superior, listados como comuns a todas as licenciaturas. Tal omissão pode, por

exemplo, levar a interpretações equivocadas sobre a formação inicial do professor

de Matemática para a Educação Básica.

Pela revisão dessas Diretrizes Curriculares específicas, entendida como

necessária pela SBEM e pela SBM, e pela não especificidade e omissão contidos

nesse documento, reforçamos a necessidade de estudos como o que apresentamos,

pelo papel que eles podem desempenhar na melhoria das licenciaturas em

Matemática.

Para atingir os objetivos que anunciamos anteriormente, construímos duas

questões de pesquisa. A primeira questão procura identificar a relação entre o

projeto pedagógico de um curso de licenciatura em Matemática com as Diretrizes

Curriculares desse curso:

Como são interpretadas, por uma instituição federal de educação

superior no Estado de São Paulo, as atuais Diretrizes Curriculares

para o curso de licenciatura em Matemática, sobretudo no tocante à

dimensão prática?

A resposta a essa questão não se fixará apenas nos aspectos legais, mas

buscaremos também entender como a instituição relaciona a dimensão prática da

formação do professor de Matemática para a Educação Básica com as teorias

estudadas no seu curso de licenciatura em Matemática.

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A segunda questão procura identificar a relação entre a formação proposta

por uma licenciatura em Matemática com estudos sobre a formação inicial de

professores para atuar na Educação Básica, em especial, para lecionar Matemática:

Quais são os pressupostos para a formação de professores de

Matemática adotados pela instituição federal proponente do Curso

investigado?

Intrínseca a essa questão, buscamos identificar, além de outros aspectos, em

que medida o curso de licenciatura em Matemática investigado concebe, em seu

projeto pedagógico, disciplinas com características de contemplar conhecimentos

necessários ao ensino de Matemática.

Para responder a essas questões, será necessária a análise dos principais

documentos que abordam as Diretrizes Curriculares Nacionais e as Diretrizes

Curriculares dos Cursos de Matemática, assim como a análise da interpretação que

é dada a essas Diretrizes, por uma instituição de educação superior. A instituição de

educação superior escolhida foi a Universidade Federal do ABC, e os documentos

em questão correspondem a: (1) duas resoluções e os pareceres que as

fundamentam, todos elaborados e aprovados pelo Conselho Pleno do Conselho

Nacional de Educação – a Resolução n.º 1 de 2002, que institui Diretrizes

Curriculares Nacionais para a Formação de Professores para a Educação Básica,

com base no Parecer n.º 9 de 2001, e a Resolução n.º 2 de 2002, que institui a

duração e a carga horária desses cursos, que tem como base o Parecer n.º 28 de

2001 –; e (2) uma resolução, fundamentada no seu respectivo parecer, elaborada e

aprovada pela Câmara de Educação Superior do Conselho Nacional de Educação –

a Resolução n.º 3 de 2003, que estabelece as Diretrizes Curriculares para os Cursos

de Matemática e o Parecer n.º 1.302 de 2001.

Para a análise da interpretação que é dada às Diretrizes Curriculares pela

Universidade Federal do ABC, serão necessários referenciais teóricos que abordem

a formação inicial de professores para a Educação Básica, mais especificamente de

professores de Matemática. E em se tratando do que é proposto nas atuais

Diretrizes Curriculares, gerais e específicas para a formação na área de Matemática,

entendemos que os estudos desenvolvidos por Deborah L. Ball, Mark H. Thames e

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Geoffrey Phelps, a respeito dos conhecimentos para o ensino de Matemática, são

essenciais para nossa investigação, pois associam, no nosso entendimento, teoria e

prática, principal aspecto, a nosso ver, que diferencia as Diretrizes Curriculares

atuais para os cursos de formação de professores para a Educação Básica das

normatizações anteriores.

Cabe ressaltar que os referidos estudos de Ball, Thames e Phelps têm suas

bases teóricas nos artigos que abordam os conhecimentos necessários ao

professor, de Lee S. Shulman, artigos esses que não poderíamos deixar de abordar,

dada a importância deles no referencial citado no parágrafo anterior. Por outro lado,

como entendemos que esses referenciais associam a teoria à prática, faz-se

também necessária a presença, no estudo que apresentamos, de uma referência

que aborde visões sobre a relação entre esses dois elementos, considerados

indispensáveis na formação docente – teoria e prática. Para tanto, utilizamos um

artigo de Vera Maria Candau e Isabel Alice Lelis.

Dessa forma, os trabalhos de Shulman (1986, 1987), de Ball, Thames e

Phelps (2007, 2008) e o artigo de Candau e Lelis (1993) constituem referenciais

para as análises que fazemos.

1.3 Sobre os Procedimentos Metodológicos

Pesquisar é mostrar-se. Pesquisar é um exercício para entendermos o mundo.

Vicente Garnica4

Este estudo não tem como objetivo explicar ou fazer generalizações sobre um

fato, mas analisar, com base no estudo do Projeto Pedagógico de um curso de

licenciatura em Matemática proposto por uma instituição federal e do estudo de

entrevistas a professores desse curso, interpretações assumidas por essa instituição

das Diretrizes Curriculares Nacionais e Diretrizes Curriculares específicas do curso,

de modo a identificar pressupostos relacionados à formação inicial de professores

de Matemática para a Educação Básica, sobretudo no que se refere à dimensão

prática.

4 GARNICA, Antonio Vicente Marafioti. Algumas notas sobre Pesquisa Qualitativa e Fenomenologia.

Interface – Comunicação, Saúde, Educação. Botucatu, v.1, n. 11: UNESP, 1997.

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Para tanto, analisamos o projeto pedagógico de uma dessas licenciaturas, em

funcionamento no Estado de São Paulo, com base nas DCNs, nas Diretrizes

Curriculares específicas para os cursos de licenciatura em Matemática e em

pressupostos teóricos relacionados à formação de professores de Matemática para

a Educação Básica, defendidos por muitos pesquisadores em educação matemática,

sobretudo no que diz respeito aos conhecimentos necessários para o exercício da

docência.

Nossa opção por uma instituição federal se justifica no fato de considerarmos

necessária a identificação de interpretações dessas Diretrizes, normatizadas por

órgão vinculado ao Ministério da Educação – o Conselho Nacional de Educação –,

por instituições de Educação Superior também vinculadas ao MEC e

supervisionadas pela Secretaria Executiva desse Ministério. Entendemos que,

supostamente, as instituições federais de Educação Superior deveriam ser

exemplos, no que se refere ao cumprimento das normatizações elaboradas e fixadas

pelo Governo Federal e, por esse motivo, identificar as interpretações que elas

fazem dessas normatizações é, em nossa concepção, conveniente.

Dessa forma, escolhemos o Curso de Licenciatura em Matemática da

Universidade Federal do ABC (UFABC). Essa escolha se deve ao fato de essa

instituição apresentar uma proposta de formação diferenciada e pioneira no Brasil,

em que o aluno inicia seus estudos em um Curso de Bacharelado em Ciência e

Tecnologia, que não tem como objetivo uma formação profissional específica, para

depois fazer a Licenciatura em Matemática.

Em uma primeira leitura, a proposta de formação da UFABC, que por um lado

inova a estrutura acadêmica e curricular dos cursos de licenciatura, conforme

incentiva o Prodocência, por outro lado parece ir de encontro com as DCNs5. Ao

mesmo tempo, o Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC é reconhecido

pelo Ministério da Educação, ou seja, tem um parecer favorável de funcionamento,

elaborado por uma Comissão de Avaliadores do MEC, que analisou o Projeto

5 De acordo com as Diretrizes Curriculares Nacionais, que são discutidas no capítulo 3, a prática

como componente curricular deve estar presente em todo o decorrer dos cursos de licenciatura. Isso parece não ocorrer no Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC, conforme análise que é apresentada no capítulo 4.

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Pedagógico do Curso e o aprovou com nota máxima: uma contradição, a nosso ver,

se realmente essa proposta de formação não contemplar aspectos das DCNs.

Com relação à coleta dos dados, pautamo-nos no Projeto Pedagógico do

referido Curso e nas informações disponibilizadas nas páginas eletrônicas da

respectiva instituição que propõe o Curso, assim como nas informações

disponibilizadas nas páginas eletrônicas do Ministério da Educação. Guiamo-nos,

também, pelas entrevistas que foram realizadas com a coordenadora do curso e

com os seus docentes, as quais foram fundamentais para a análise que

apresentamos no capítulo 4.

Essas entrevistas foram do tipo semiestruturada que, segundo Lüdke e André

(1986, p. 34), “se desenrola a partir de um esquema básico, porém não aplicado

rigidamente, permitindo que o entrevistador faça necessárias adaptações”. Partimos

de um roteiro básico, contendo somente as questões norteadoras, e deixamos que

os entrevistados discorressem sobre os assuntos que já estavam previamente

determinados nesse roteiro. Nos casos em que as falas dos entrevistados não

abordaram espontaneamente todos os tópicos que pretendíamos registrar,

questionamos sobre tais tópicos.

Quanto à análise dos dados, ela foi realizada com base nos referenciais

teóricos adotados, identificados na subseção anterior, e nas Diretrizes Curriculares

gerais para as licenciaturas e específicas para a licenciatura em Matemática.

Pelo exposto, nossa investigação contempla aspectos da abordagem

qualitativa de pesquisa, apresentadas por Lüdke e André (1986), sobretudo por

envolver, pelo contato direto do pesquisador com a situação estudada, a obtenção

de dados predominantemente descritivos e pela análise desses dados seguir um

processo indutivo, em que não se procura buscar evidências para comprovar

hipóteses previamente definidas, mas sim identificar entendimentos a respeito de

aspectos abordados nas atuais Diretrizes Curriculares dos cursos de licenciatura.

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1.3.1 Caracterização da Instituição proponente do curso investigado

A Universidade Federal do ABC, com sede na cidade de Santo André,

município do Estado de São Paulo, foi criada por uma Lei Federal6 no ano de 2005 e

contava, em 5 de março de 2013, com 27 cursos autorizados, conforme consta do

sítio do Ministério da Educação7, dentre eles o curso de Bacharelado em Ciência e

Tecnologia e o Curso de Licenciatura em Matemática.

O ingresso de alunos na UFABC se dá somente pelo Sistema de Seleção

Unificado (SiSU), que tem o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) como o

processo de seleção nacional.

Ao se cadastrar para concorrer a uma das 1.960 vagas anuais oferecidas pela

UFABC, o candidato tem apenas duas opções de cursos: o Bacharelado em Ciência

e Tecnologia (BC&T) e o Bacharelado em Ciências e Humanidades (BC&H), ambos

bacharelados interdisciplinares8, com carga horária de 2.400 horas, cada um, e

duração mínima de três anos.

Teoricamente9, após ter cursado aproximadamente 35%10 da carga horária

total do BC&T ou da carga horária total do BC&H, o aluno poderá optar por outros

cursos de nível superior. Tais cursos são identificados no decorrer dessa subseção.

Do total de vagas disponibilizado por ano para o ingresso na UFABC, 50%

são destinados a alunos oriundos das escolas públicas e 50% são destinados para

ingresso universal, conforme afirma Rosa (2013), pró-reitor de graduação da

instituição, ao fazer uma apresentação dos bacharelados interdisciplinares da

UFABC.

Ambos os bacharelados têm disciplinas obrigatórias comuns, o que possibilita

a integração de alunos desses cursos, em algumas disciplinas oferecidas.

6 Lei Federal n.º 11.145, de 26 de julho de 2005.

7 http://emec.gov.br.

8 Abordamos sobre esse tipo de bacharelado mais à frente.

9 Ao aluno é proposta uma ordem de disciplinas a cursar. Entretanto, ele não é obrigado a seguir essa

ordem. 10

Neste ponto o Projeto Pedagógico do BC&T diverge do Projeto Pedagógico do Curso de Licenciatura em Matemática. No Projeto da Licenciatura, após cursar 25% da carga do BC&T, o aluno pode optar pelo Curso.

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Conforme constava, em março de 2013, no sítio do MEC, o BC&T, o mais

antigo dos dois bacharelados interdisciplinares da UFABC, cujo início se deu em

2006, tem autorização para receber anualmente 1.560 novos alunos, distribuídos

nos períodos diurno e noturno11. Desse total, 1.125 vagas são destinadas para o

campus de Santo André e as demais vagas são destinadas para o campus de São

Bernardo do Campo, outro município do Estado de São Paulo. Já o BC&H, iniciado

em 2009, pode receber anualmente 400 alunos, distribuídos nos períodos diurno e

noturno, somente no campus de São Bernardo do Campo.

Uma vez cursando o BC&T ou o BC&H, denominados pela UFABC de cursos

de ingresso, o aluno, ao concluir parte das disciplinas obrigatórias, conforme

explicitamos acima, poderá escolher até três outros cursos de graduação da UFABC

para uma formação específica. Ao concluí-los, os alunos poderão obter um segundo,

um terceiro, ou um quarto diploma de graduação, uma vez que ambos os

bacharelados interdisciplinares concedem diplomas de nível superior aos seus

egressos.

Consta dos Projetos Acadêmicos das graduações da UFABC que todos os

cursos por ela propostos contêm disciplinas obrigatórias, disciplinas de opção

limitada – disciplinas que constam de uma relação preestabelecida – e disciplinas de

opção livre – disciplinas em que o aluno pode escolher dentre todas as disciplinas

oferecidas pela UFABC. As disciplinas obrigatórias do BC&T e do BC&H são parte

das disciplinas obrigatórias para os cursos de formação específica que o aluno

poderá optar, ao passo que algumas disciplinas dos cursos de formação específica –

licenciaturas, por exemplo – podem ser contadas como de opção limitada ou de

opção livre para o BC&T ou o BC&H.

O Quadro 1 apresenta os cursos existentes na UFABC, em 2013, e a

vinculação entre os cursos de formação específica e os dois cursos de ingresso, os

bacharelados interdisciplinares. Todos os cursos são propostos por três centros: o

Centro de Ciências Naturais e Humanas (CCNH); o Centro de Matemática,

Computação e Cognição (CMCC); e o Centro de Engenharia, Modelagem e Ciências

11

As informações sobre os períodos foram identificadas no Projeto Pedagógico e em Rosa (2013).

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Sociais (CECS). Os bacharelados interdisciplinares não são de responsabilidade de

um único Centro e congregam professores desses três Centros.

Os cursos oferecidos pelo CCNH são os Bacharelados e as Licenciaturas em

Ciências Biológicas, em Física, em Química e em Filosofia. Os oferecidos pelo

CMCC são o Bacharelado e a Licenciatura em Matemática e os Bacharelados em

Ciência da Computação e em Neurociências. Já os cursos oferecidos pelo CECS

são os Bacharelados em Ciências Econômicas, em Planejamento Territorial, em

Políticas Públicas e em Relações Internacionais, além dos oito cursos de

Engenharia.

Quadro 1 – Vinculação entre os cursos de formação específica e os bacharelados interdisciplinares da UFABC

Bacharelados interdisciplinares (cursos de ingresso)

Cursos Vinculados (cursos de formação específica)

Bacharelado em Ciência e Tecnologia Bacharelado em Ciências Biológicas (BC&T) Bacharelado em Física

Bacharelado em Matemática Bacharelado em Química Bacharelado em Ciência da Computação Bacharelado em Neurociência Licenciatura em Ciências Biológicas Licenciatura em Física Licenciatura em Matemática Licenciatura em Química Engenharia Aeroespacial Engenharia Ambiental e Urbana Engenharia Biomédica Engenharia de Energia Engenharia de Gestão Engenharia de Informação Engenharia de Instrumentação, Automação e Robótica Engenharia de Materiais

Bacharelado em Ciências e Humanidades Bacharelado em Filosofia (BC&H) Bacharelado em Planejamento Territorial

Bacharelado em Políticas Públicas Bacharelado em Relações Internacionais Bacharelado em Ciências Econômicas Licenciatura em Filosofia

Fonte: Página eletrônica da graduação da UFABC: http://prograd.ufabc.edu.br/cursos

O ingresso de docentes na UFABC é realizado por meio de concursos.

Somente professores com titulação mínima de doutorado, conforme estatuto interno,

é que podem participar dos concursos. Portanto, todos os docentes dessa instituição

são, no mínimo, doutores formados.

A UFABC não é organizada por departamentos, como outras universidades.

Os concursos ocorrem para seleção de professores das disciplinas dos 26 cursos e

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os docentes selecionados são vinculados, normalmente, ao Centro responsável pelo

curso. Sendo assim, podem existir, por exemplo, professores das áreas de

Matemática, Física e Química nos três Centros.

Os bacharelados interdisciplinares não tinham, até março de 2013, Diretrizes

Curriculares específicas normatizadas pelo Conselho Nacional de Educação. São

cursos novos no rol de cursos de graduação brasileiros e propostos pela primeira

vez no ano de 2006, tendo como pioneira a UFABC. Dessa forma, essa instituição

se pautou em resoluções e leis já existentes para construir os Projetos Pedagógicos

do BC&T e do BC&H.

O BC&T da UFABC somente teve seu reconhecimento pelo MEC no ano de

2012, após o CNE se manifestar sobre essa modalidade de bacharelado por meio

de um Parecer12 que examinou os Referenciais Orientadores para os Bacharelados

Interdisciplinares e Similares, documento produzido por um Grupo de Trabalho

designado pelo MEC, em 2010.

Os Bacharelados de Ciência e Tecnologia e de Ciências e Humanidades da

Universidade Federal do ABC estão autorizados pelo MEC a conceder os títulos de

Bacharel em Ciência e Tecnologia e Bacharel em Ciências e Humanidades,

respectivamente. Porém esses títulos não qualificam profissionalmente os egressos

desses cursos para uma profissão específica, uma vez que esses bacharelados não

têm como objetivo a graduação profissionalizante, que ficaria a cargo de um

segundo ciclo de estudos.

A Figura 1 apresenta o fluxo de formação proposto pela UFABC envolvendo

os bacharelados interdisciplinares e as graduações de formação específica.

12

Parecer CNE/CES n.º 266, de 6 de julho de 2011.

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Figura 1 – Fluxo de formação proposto pela UFABC Fonte: Rosa (2013, p. 21)

Conforme consta dos Referenciais Orientadores para os Bacharelados

Interdisciplinares e Similares, a implementação dos bacharelados interdisciplinares

foi inspirada na proposta para concepção da Universidade de Brasília, de Anísio

Teixeira na década de 1960, no Processo de Bolonha e nos Colleges americanos.

Esses cursos têm como objetivo proporcionar, antes de uma formação superior

específica, “[...] uma formação com foco na interdisciplinaridade e no diálogo entre

as áreas de conhecimento e entre componentes curriculares, estruturando as

trajetórias formativas na perspectiva de uma alta flexibilização curricular”. (BRASIL,

2010, p. 4)

O propósito de o aluno cursar primeiro um bacharelado interdisciplinar e após

um curso de formação específica, de acordo com os autores dos Referenciais

Orientadores para os Bacharelados Interdisciplinares e Similares, é o de oferecer um

primeiro ciclo de formação com bases conceituais, éticas e culturais, nas grandes

áreas que congregam campos de saberes, práticas, tecnologias e conhecimentos,

como Ciência e Tecnologia. Essa formação objetivaria o desenvolvimento de um

conjunto de competências, habilidades e atitudes, capazes de alicerçar um segundo

ciclo de formação, que seria específica, porém não obrigatória, ou até mesmo

alicerçar um terceiro ciclo de formação, de pós-graduação Lato Sensu ou até mesmo

Stricto Sensu, dependendo da área. (BRASIL, 2010)

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Dessa forma, deveria ter, ainda segundo os mesmos autores, um currículo

flexível, possibilitando o diálogo entre disciplinas do primeiro com o segundo ciclo,

dando, assim, liberdade para que o aluno pudesse escolher sua trajetória de

formação. (BRASIL, 2010)

1.3.2 Caracterização do curso investigado

O Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC é uma graduação de

formação profissional em área específica do conhecimento, vinculado ao

Bacharelado de Ciência e Tecnologia. Corresponde a um segundo ciclo de formação

universitária que tem como primeiro ciclo o BC&T.

Sendo assim, um aluno somente é aceito nessa licenciatura após cursar parte

do Curso de Bacharelado em Ciência e Tecnologia. Dessa forma, para caracterizar o

Curso de Licenciatura em Matemática da UFAB, faz-se necessário caracterizar,

antes, o BC&T dessa IES.

O BC&T da UFABC é um curso com carga horária total de 2.400 horas, com

duração mínima de três anos, conforme já abordamos.

Além de ser o pioneiro dos bacharelados interdisciplinares, o BC&T da

UFABC, assim como todos os cursos dessa instituição, apresenta uma característica

pouco adotada por cursos de nível superior brasileiros: tem periodicidade

quadrimestral.

O objetivo geral desse Bacharelado é atender às novas demandas da

sociedade, contemplando os cenários e as oportunidades do mundo moderno, com

uma proposta diferente, segundo a UFABC, daquela que prioriza as disciplinas

clássicas ou que simplesmente incorpora a essas novas disciplinas.

(UNIVERSIDADE FEDERAL DO ABC, 2009b)

Quanto aos objetivos específicos, o curso pretende:

Ampliar o currículo básico em extensão e profundidade no que diz respeito à Informática, Computação científica, às Ciências Naturais, às Ciências de Engenharia e à Matemática.

Estruturar o currículo profissional de modo a atender as demandas das tecnologias modernas e emergentes e incorporar disciplinas que

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permitam uma inserção mais rápida dos formandos na sociedade moderna.

Incorporar disciplinas como a História da Ciência, História da Tecnologia e História do Pensamento Contemporâneo com o intuito de desenvolver a capacidade crítica no exercício da atividade profissional e da cidadania.

Estimular e desenvolver nos estudantes as habilidades de descobrir, inventar e criticar, características respectivamente das Ciências Naturais, das Engenharias e das Matemáticas.

Personalizar, ainda que parcialmente, o currículo de modo que o aluno possa desenhar sua formação profissionalizante de acordo com sua vocação e suas aspirações. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO ABC, 2009b, p. 6)

Como perfil do egresso, espera-se, por meio de “[...] uma formação com forte

base científica e tecnológica [...]” (UNIVERSIDADE FEDERAL DO ABC, 2009b, p.

8), que o egresso do BC&T esteja habilitado a aplicar os conhecimentos construídos

na realização de tarefas e solução de problemas em organizações públicas, privadas

ou do terceiro setor. Tais conhecimentos poderão ainda ser aplicados, segundo a

UFABC, em atividades de pesquisa em Ciência e Tecnologia e na continuidade dos

seus estudos em cursos de formação específica.

Quanto à organização curricular, as disciplinas obrigatórias, de opção limitada

e de opção livre, assim como as atividades extracurriculares, são contabilizadas por

créditos, sendo cada unidade de crédito correspondente a 12 horas de atividades

acadêmicas: as disciplinas obrigatórias correspondem a 90 créditos; as de opção

limitada correspondem a 57 créditos; as de opção livre correspondem a 43 créditos;

e as atividades extracurriculares correspondem a dez créditos.

A tabela a seguir apresenta a relação entre os créditos e a carga horária das

atividades que compõem o BC&T.

Tabela 1 – Distribuição dos créditos, e seus correspondentes em horas, das atividades do BC&T da UFABC

Atividades Número de créditos Correspondente em horas

Disciplinas obrigatórias 90 1.080 Disciplinas de opção limitada 57 684 Disciplinas de opção livre 43 516 Atividades extracurriculares 10 120

Total 200 2.400

Com relação às disciplinas obrigatórias, elas organizam, segundo a UFABC,

os conhecimentos de cinco dos seis eixos de formação existentes no BC&T. Esses

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cinco eixos são os responsáveis pela formação científica e tecnológica, ao passo

que um sexto eixo é o responsável pela formação humanística do indivíduo.

Os eixos da formação científica e tecnológica são identificados como:

Comunicação e Informação; Estrutura da Matéria; Energia; Processos de

Transformação; e Representação e Simulação. O eixo da formação humanística é o

de Humanidades e Ciências Sociais Aplicadas. Não há no Projeto Pedagógico do

BC&T, de forma explícita, quais as disciplinas que se relacionam a cada um desses

seis eixos. Por outro lado, Rosa (2013) afirma que as disciplinas obrigatórias

contemplam todos os seis eixos e indica a qual (ou quais) eixo(s) cada disciplina

obrigatória está associada: todas as disciplinas de Matemática fazem parte do eixo

Representação e Simulação.

Com o objetivo de orientar os alunos na escolha da ordem das disciplinas

obrigatórias, consta do Projeto do curso de BC&T a apresentação de um perfil de

formação. Nesse perfil são indicadas, até o quarto quadrimestre, um total de 20

disciplinas a serem cursadas: cinco por quadrimestre.

No quinto, no sexto e no nono quadrimestres, respectivamente, são indicadas

quatro, uma e uma, disciplinas obrigatórias a serem cursadas, e é sugerido que o

aluno complete o total de cinco disciplinas, do quinto ao nono quadrimestre, com as

disciplinas de opção limitada e de opção livre. Portanto, as disciplinas obrigatórias

são em número de 26 e as disciplinas de opção livre ou opção limitada são em

número de 19.

Pelo fluxo de disciplinas proposto no perfil de formação, pode-se afirmar

teoricamente que, a partir do quinto quadrimestre, o aluno já pode fazer as escolhas

de disciplinas visando ao segundo ciclo de formação, uma vez que a maioria das

disciplinas de opção limitada faz parte das graduações vinculadas ao BC&T, por

exemplo, Didática ou Matemática Discreta, ambas obrigatórias no Curso de

Licenciatura em Matemática da UFABC.

Quanto às atividades extracurriculares, a carga horária de 120 horas pode ser

constituída por atividades predeterminadas e distribuídas em três grupos: de

complementação da formação social, humana e cultural; de cunho comunitário e de

interesse coletivo; e de iniciação científica, tecnológica e de formação profissional.

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Com relação ao estágio, o Projeto Pedagógico do BC&T o coloca como não

obrigatório, mas incentiva o aluno a realizá-lo, como complementação de sua

formação e ajuda para as escolhas profissionais. Caso o aluno opte por realizá-lo,

deve observar uma resolução interna que normatiza tais estágios não obrigatórios.

Após essa visão geral do BC&T, passamos a descrever o Curso de

Licenciatura em Matemática da UFABC.

Em funcionamento desde setembro de 2006, o Curso de Licenciatura em

Matemática da UFABC teve seu reconhecimento concedido pelo MEC no ano de

2012, mais especificamente no mês de outubro, e a renovação desse

reconhecimento concedida, automaticamente, em dezembro de 2012, em virtude

das avaliações do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior terem sido

satisfatórias, no Ciclo Avaliativo que aplicou o Exame Nacional de Cursos nos

bacharelados e licenciaturas em Matemática no ano de 2011. Apesar de constar no

sítio do MEC a data de funcionamento em setembro de 2006, o curso não teve,

necessariamente, sua primeira turma constituída naquele ano.

De acordo com as informações contidas na página eletrônica do Ministério da

Educação, a Licenciatura em Matemática da UFABC está autorizada a receber

anualmente 40 alunos ingressantes, tem carga horária de 2.808 horas – sendo 1.080

horas de disciplinas do BC&T – e duração de 12 quadrimestres, o que corresponde

a quatro anos. A Licenciatura em Matemática tem disciplinas que são oferecidas nos

turnos matutino e noturno.

Segundo informações da coordenadora, o Projeto Pedagógico para as

licenciaturas daquela IES foi elaborado por quatro professores, três deles

ingressantes na instituição em 2008. A primeira “tarefa” específica daqueles quatro

docentes, na UFABC, foi construir o referido documento.

Um único Projeto Pedagógico foi elaborado para as Licenciaturas em

Ciências Biológicas, Física, Matemática e Química, as primeiras Licenciaturas da

UFABC, e dessa construção participou um professor de cada uma das áreas de

ensino envolvidas, dentre eles, um Educador Matemático. Esse Projeto apenas

apresenta particularidades a cada um dos cursos, ao abordar a distribuição das

disciplinas específicas deles.

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A organização curricular do Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC

é composta por disciplinas obrigatórias, disciplinas eletivas – que são as disciplinas

de opção limitada – e disciplinas de opção livre, além do estágio supervisionado e

das atividades complementares, que são denominadas atividades acadêmico-

científico-culturais.

As disciplinas obrigatórias, por sua vez, são formadas por disciplinas do

BC&T, por disciplinas comuns a todas as licenciaturas – denominadas também de

didático-pedagógicas comuns – e por disciplinas específicas da Licenciatura em

Matemática, divididas em didático-pedagógicas específicas e de conteúdo

específico.

Assim como no BC&T, a Licenciatura em Matemática e todos os demais

cursos da UFABC utilizam o sistema de créditos para a contagem da carga horária,

em que cada crédito corresponde a 12 horas de atividades. Na Licenciatura em

Matemática, no total, são 184 créditos de disciplinas, que correspondem a 2.208

horas, e mais 600 horas divididas em estágio supervisionado e atividades

acadêmico-científico-culturais.

A tabela a seguir apresenta informações sobre a distribuição da carga horária

total das 2.808 horas pelos grupos de disciplinas, com seus respectivos créditos,

quando existentes.

Tabela 2 – Distribuição dos créditos, e seus correspondentes em horas, das atividades do Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC

Atividades Número de

créditos Número de

horas

Disciplinas obrigatórias

do BC&T 90 1.080

didático-pedagógicas comuns 21 252

específicas didático-pedagógicas 13 156 conteúdos específicos 38 456

Disciplinas eletivas – opção limitada 12 144 Disciplinas de opção livre 10 120 Estágio supervisionado --- 400 Atividades acadêmico-científico-culturais --- 200

Total 184 2.808

Consta do Projeto Pedagógico uma matriz curricular ideal13 para ser cursada

pelo aluno da Licenciatura em Matemática. Por esse fluxo ideal, que é apresentado

13

O termo ideal é utilizado no Projeto para indicar um fluxo proposto pela UFABC, ou uma carga horária ou duração previamente fixada, mas não necessariamente obrigatórias.

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no capítulo 4, esses alunos podem optar por essa Licenciatura a partir do quarto

quadrimestre do BC&T14. As atividades acadêmico-científico-culturais,

diferentemente do estágio supervisionado, não fazem parte do fluxo ideal proposto

e, conforme consta do referido Projeto, devem ser realizadas fora dos horários das

aulas. Entretanto, atividades cursadas no período em que o aluno está matriculado

podem ser aceitas, mediante autorização da coordenação do curso.

No capítulo 4 fazemos uma apresentação detalhada do Projeto Pedagógico

da Licenciatura em Matemática da UFABC.

14

Nesse ponto, os Projetos Pedagógicos do BC&T e da Licenciatura em Matemática não convergem: no fluxo ideal contido no Projeto do BC&T essa escolha ocorre, como vimos, somente a partir do quinto quadrimestre.

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2 REFERENCIAIS TEÓRICOS E PESQUISAS SOBRE AS LICENCIATURAS EM MATEMÁTICA BRASILEIRAS APÓS A PUBLICAÇÃO DAS ATUAIS DIRETRIZES CURRICULARES

Neste capítulo, abordamos os referenciais teóricos utilizados neste estudo e

apresentamos uma revisão bibliográfica sobre pesquisas que discutem cursos de

formação de professores de Matemática para a Educação Básica e aspectos

aludidos nas atuais Diretrizes Curriculares para as licenciaturas.

Ocupamo-nos também do Processo de Bolonha que, conforme consta da

caracterização da UFABC, faz parte das bases para a implementação dos

bacharelados interdisciplinares no Brasil. Ressaltamos que para um aluno ingressar

no Curso investigado, faz-se necessário iniciar seus estudos em um bacharelado

interdisciplinar – o Bacharelado em Ciência e Tecnologia da UFABC. Por esse

motivo, julgamos ser necessária essa abordagem.

2.1 A formação de professores na visão de alguns referenciais teóricos

Nos anos de 1986 e 1987, Lee S. Shulman publicou um artigo que seria

considerado um marco na discussão sobre a formação de professores. Nele, o autor

discutiu os conhecimentos considerados necessários para uma boa formação

docente.

Vinte anos depois, tendo como base os trabalhos de Shulman, Deborah L.

Ball, Mark H. Thames e Geoffrey Phelps publicaram, a nosso ver, um importante

estudo para a área da Educação Matemática abordando os conhecimentos para o

ensino de Matemática, necessários aos professores de Matemática da Educação

Básica para o desenvolvimento da sua profissão.

Sobre esses dois estudos é o que discutimos a seguir.

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2.1.1 Os conhecimentos necessários ao professor, segundo Shulman

Alguns aportes teóricos sobre a formação inicial e continuada de professores

têm suas bases nas ideias de John Dewey (1859–1952), filósofo e pedagogo norte-

americano. Shulman (1986, 1987) é um deles quando se refere aos conhecimentos

necessários ao professor para exercer sua profissão docente15.

Para Dewey, o conhecimento e o seu desenvolvimento estão diretamente

relacionados ao meio social, e, por este motivo, não poderiam ser abordados por

uma filosofia da educação que privilegiasse a dicotomia entre o indivíduo e a

sociedade. Em outras palavras, a educação estaria em função das necessidades

sociais e não deveria ficar restrita à transmissão de conteúdos, uma vez que as

disciplinas escolares, ensinadas como verdades e apartadas da experiência e ação

do aluno, refletiriam o dualismo filosófico entre o indivíduo e o mundo. (CUNHA,

2007)

Dessa forma, para fazer jus ao termo conhecimento, Dewey propôs o

desenvolvimento do método experimental de formação, também denominado

método de descoberta e prova ou, ainda, pensamento reflexivo, como ficou mais

conhecido.

O pensamento reflexivo de Dewey tinha a experimentação como principal

elemento, mas não a experimentação às cegas, e sim aquela em que as condições

presentes do ambiente poderiam ser observadas de modo a se construir

conhecimentos para serem utilizados em situações similares futuras: o aprender

fazendo.

Apoiado em uma das obras de Dewey, intitulada The Child and the Curriculum

e que abordava a diferença entre a compreensão lógica e a compreensão

psicológica – a segunda relacionada aos conhecimentos necessários para se

ensinar e a primeira ao conhecimento próprio dos cientistas –, Lee S. Shulman

apresentou, em 1986, sua hipótese sobre o conhecimento pedagógico do conteúdo.

Formado em Filosofia e em Psicologia, Shulman defendeu a existência de

conhecimentos inerentes à formação do professor. Nos seus estudos, Shulman

15

http://www.leeshulman.net/domains-pedagogical-content-knowledge.html

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acompanhou o desenvolvimento de professores de variadas disciplinas para o

Ensino Secundário norte-americano. Tal acompanhamento se deu desde uma parte

final da formação inicial dos professores até o primeiro ano de atuação deles.

Em um artigo de 1986 Shulman apresenta três categorias de conhecimentos

como fundamentais e necessárias para que um professor pudesse exercer sua

profissão: a categoria de conhecimento do conteúdo; a de conhecimento pedagógico

do conteúdo e a categoria de conhecimento do currículo. Tais categorias são

abordadas um pouco mais à frente.

Em outro artigo, publicado em 1987, Shulman amplia esse número de

categorias ao concluir que deveria existir uma base de conhecimentos necessários

para lecionar disciplinas do Ensino Secundário e, que nesta base, sete categorias de

conhecimentos precisariam, no mínimo, estar presentes. Estas categorias são:

Conhecimento do conteúdo; Conhecimento pedagógico geral, com especial referência aos princípios e estratégias de gerenciamento e organização de sala de aula; Conhecimento do currículo, com compreensão especial dos materiais e programas que servem como "ferramentas de trabalho" para professores; Conhecimento pedagógico do conteúdo, o amálgama especial do conteúdo e da pedagogia e que está exclusivamente relacionado à area dos professores – a sua própria forma especial de compreensão profissional; Conhecimento de estudantes e as suas características; Conhecimento de contextos educacionais, que vão desde o funcionamento da instituição ou da sala de aula, a governança e o financiamento dos distritos escolares, para o caráter das comunidades e culturas; Conhecimento dos fins educacionais, propósitos e valores, e suas bases filosóficas e históricas (SHULMAN, 1987, p. 8, tradução nossa16)

16

• Content knowledge; • General pedagogical knowledge, with special reference to those broad principles and strategies of classroom management and organization that appear to transcend subject matter; • Curriculum knowledge, with particular grasp of the materials and programs that serve as “tools of the trade” for teachers; • Pedagogical content knowledge, that special amalgam of content and pedagogy that is uniquely the province of teachers, their own special form of professional understanding; • Knowledge of learners and their characteristics; • Knowledge of educational contexts, ranging from workings of the group or classroom, the governance and financing of school districts, to the character of communities and cultures; • Knowledge of educational ends, purposes, and values, and their philosophical and historical grounds.

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Para a construção da referida base de conhecimentos, Shulman (1987)

destacou a necessidade da observância de quatro fontes que deveriam ser levadas

em consideração:

(1) métodos de estudos em disciplinas de conteúdo, (2) materiais e definições do processo institucionalizado de educação, [...] (3) pesquisas sobre a escolaridade, as organizações sociais, a aprendizagem humana, o ensino e seu desenvolvimento, e outros fenômenos sociais e culturais que afetam o trabalho dos professores, e (4) a sabedoria da prática em si. (SHULMAN, 1987, p. 8, tradução nossa17)

A primeira fonte citada, a de métodos de estudos em disciplinas de conteúdo,

está associada, segundo Shulman (1987), à categoria de conhecimento do conteúdo

e alicerçada em duas bases: na literatura e estudos acumulados nas áreas do

conteúdo; e nos estudos históricos e filosóficos sobre a natureza do conhecimento

nessas áreas.

Além de conhecer o conteúdo que ensinará, o professor, segundo o autor,

deve entender as estruturas deste conteúdo, os princípios da sua organização

conceitual e os princípios de investigação relacionados aos conteúdos, objetos de

ensino. Deve ter, não apenas uma compreensão profunda sobre tais objetos, mas

uma ampla educação que servirá tanto para estruturar os conhecimentos anteriores,

quanto para facilitar a apropriação de novos conhecimentos.

Shulman (1987) ainda afirma que, devido à diversidade dos alunos, o

professor deve ter uma compreensão flexível e multifacetada do conteúdo que

ensina, a fim de poder explicar um mesmo conceito de formas variadas.

Sobre a segunda fonte, a dos materiais e definições do processo

institucionalizado de educação, Shulman (1987) indica que ela inclui, por exemplo,

os programas de ensino, os livros didáticos, as organizações escolares e

financiadoras da educação, bem como a estrutura da profissão docente. Segundo o

autor, os professores trabalham, necessariamente, em uma matriz criada com vários

elementos para fazer avançar os objetivos da escolaridade e como deles se utilizam,

17

(1) scholarship in content disciplines, (2) the material and settings of the institutionalized educational process, ... (3) research on schooling, social organizations, human learning, teaching and development, and the other social and cultural phenomena that affect what teachers can do, and (4) the wisdom of practice itself.

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assim como também são utilizados por eles, os princípios, as políticas e os fatos

constituintes de tais elementos precisam fazer parte do conhecimento do futuro

professor. Alguns desses elementos, citados por Shulman (1987), são: os materiais

e as estruturas de aprendizagem, contendo os programas de ensino com suas

possibilidades de utilização e sequências; as organizações profissionais de

professores e suas atividades – como os sindicatos, por exemplo –; as agências

governamentais e seus deveres com relação às instituições de ensino; entre outros.

De acordo com Shulman (1987) não há uma literatura específica para

sustentar a necessidade desta fonte, “mas, se um professor tem de ‘conhecer o

território’ do ensino, então é a paisagem de tais materiais, instituições, organizações

e mecanismos com os quais ele ou ela deve se familiarizar” (SHULMAN, 1987, p. 9,

tradução nossa18). Em outras palavras, reconhecida a naturalidade do fato, esta

fonte deveria, espontaneamente, fazer parte da construção da base de

conhecimentos necessários para a formação inicial do professor.

Quanto à terceira fonte, a das pesquisas sobre a escolaridade, as

organizações sociais, a aprendizagem humana, o ensino e seu desenvolvimento, e

outros fenômenos sociais e culturais que afetam o trabalho dos professores – ou

método de estudo educacional formal –, de acordo com Shulman (1987), ela está

diretamente associada à compreensão e exploração dos resultados de pesquisas.

Está também associada à literatura acadêmica nas áreas do ensino e

aprendizagem, do desenvolvimento humano e nos fundamentos normativos,

filosóficos e éticos da educação.

Segundo Shulman (1987), aspectos normativos e teóricos do conhecimento

acadêmico sobre o ensino, amplamente abordados nos cursos de formação de

professores, são, talvez, os mais importantes, porém representam apenas uma parte

do conhecimento relacionado a esta fonte e, por esse motivo, não podem ser os

únicos aspectos abordados nesses cursos.

Já sobre a última fonte, da sabedoria da prática em si, Shulman (1987) afirma

que ela envolve princípios, ações e padrões elaborados pelos próprios professores

ao longo de sua vivência. De acordo com o autor, é a fonte menos codificada de

18

But if a teacher has to "know the territory" of teaching, then it is the landscape of such materials, institutions, organizations, and mechanism with which he or she must familiar.

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todas e, por esse motivo, mereceria ser a inspiradora de estudos para o

desenvolvimento de representações codificadas sobre a sabedoria da prática de

professores, pelas comunidades de pesquisa, a fim de contribuírem com elementos

factíveis de serem abordados nos cursos de formação inicial.

Das sete categorias mínimas que comporiam uma base de conhecimentos

necessários na formação inicial de um professor, Shulman (1987) reitera aquelas

três que indicou em 1986 como as principais para o seu estudo: a categoria de

conhecimento do conteúdo, a categoria de conhecimento pedagógico do conteúdo e

a categoria de conhecimento de currículo. Sobretudo, indica a de conhecimento

pedagógico do conteúdo como a que mais lhe interessava, naquele momento.

Por outro lado, Shulman (1986, 1987) deixa claro que a não inclusão de mais

categorias, assim como outros conhecimentos pedagógicos não identificados por

ele, não tinha a intenção de diminuir a importância da compreensão e da habilidade

pedagógica, pois “um mero conhecimento do conteúdo é provável que seja tão inútil,

pedagogicamente, quanto a habilidade sem conteúdo”. (SHULMAN, 1986, p. 8,

tradução nossa19)

No que segue, apresentamos uma abordagem das três categorias indicadas

por Shulman como as principais para o seu estudo.

Categoria de conhecimento do conteúdo

Shulman (1986, p. 9, tradução nossa20) explica que ela “se refere à

quantidade e organização do conhecimento em si na mente do professor”. Segundo

o autor, este conhecimento não pode apenas estar relacionado aos conceitos de um

conteúdo específico, mas também à compreensão das suas estruturas substantivas

e sintáticas: as segundas sendo o conjunto de formas em que a verdade ou

falsidade, validade ou não validade são estabelecidas, e as primeiras a variedade de

maneiras em que os conceitos e princípios básicos da disciplina são organizados.

Relacionando essas estruturas às responsabilidades do professor, Shulman

(1987) afirma que:

19

Mere content knowledge is likely to be as useless pedagogically as content-free skill. 20

This refers to the amount and organization of knowledge per se in the mind of the teacher.

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[...] o professor tem responsabilidades especiais em relação ao conhecimento do conteúdo, servindo como fonte primária de compreensão dos assuntos, pelo aluno. A maneira pela qual essa compreensão é comunicada transmite aos alunos o que é essencial sobre um assunto e o que é periférico. [...] O professor também comunica, conscientemente ou não, as ideias sobre as maneiras em que a “verdade”, em um campo, é determinada, além de um conjunto de atitudes e valores que influenciam marcadamente a compreensão do aluno. Esta responsabilidade coloca exigências especiais sobre a profundidade de compreensão, pelo próprio professor, das estruturas do assunto, bem como sobre as atitudes de entusiasmo do professor em relação ao que está sendo ensinado e aprendido. (SHULMAN, 1987, p. 9, tradução nossa21)

Dessa forma, a compreensão das estruturas substantivas pelo professor

poderia lhe proporcionar aquela visão flexível e multifacetada sobre o conteúdo,

possibilitando-o explicar o mesmo conceito de formas diferenciadas, a fim de

atender à heterogeneidade dos alunos. Por outro lado, a compreensão das

estruturas sintáticas poderia proporcionar ao futuro professor a comunicação das

ideias capazes de justificar os fatos relacionados à disciplina.

É ainda relacionada à compreensão destas estruturas pelo futuro professor a

sua capacidade de, além de entender que determinado conceito é daquela forma,

“entender por que ele é daquela forma, por quais motivos sua sentença pode ser

afirmada e sob quais circunstâncias a crença na sua justificativa pode ser

enfraquecida e até mesmo negada”. (SHULMAN, 1986, p. 9, tradução nossa22)

Assim, conhecer o conteúdo, para Shulman (1986, 1987), não é apenas ter o

domínio conceitual da disciplina a ser ensinada.

Categoria de conhecimento pedagógico do conteúdo

Shulman (1986) afirma que ela compreende aspectos que vão além da

categoria de conhecimento do conteúdo. Tais aspectos, ainda segundo o autor,

21

The teacher has special responsibilities in relation to content knowledge, serving as the primary source of student understanding of subject matter. The manner in which that understanding is communicated conveys to students what is essential about a subject and what is peripheral. […] The teacher also communicates, whether consciously or not, ideas about the ways in which “truth” is determined in a field and a set of attitudes and values that markedly influence student understanding. This responsibility places special demands on the teacher’s own depth of understanding of the structures of the subject matter, as well as on the teacher’s attitudes toward and enthusiasms for what is being taught and learned. 22

The teacher must further understand why it is so, on what grounds its warrant can be asserted, and under what circumstances our belief in its justification can be weakened and even denied.

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estão relacionados à capacidade de tornar os conteúdos ensináveis: analogias,

ilustrações, exemplos, explanações, demonstrações, enfim, toda forma de

representação e formulação, derivada das investigações e da sabedoria prática, que

possa tornar os assuntos compreensíveis para os alunos.

Alem desses aspectos, Shulman (1986) ainda afirma que esta categoria inclui

também “uma compreensão sobre o que faz a aprendizagem dos tópicos serem

fáceis ou difíceis” (SHULMAN, 1986, p. 9, tradução nossa23). Para tanto, segundo o

autor, nessa categoria de conhecimento estão incluídos estudos de concepções e

pré-concepções de alunos sobre os conteúdos mais ensinados, o que poderia

proporcionar aos futuros professores um cabedal sobre estratégias para serem

utilizadas com o objetivo de reorganizar a compreensão dos seus alunos, quando

tais concepções e pré-concepções fossem equivocadas. Deve, ainda, incluir estudos

dos erros mais comuns de alunos, relacionados aos objetos a serem ensinados, o

que poderia dotar o professor de conhecimentos para antecipar-se aos erros e saber

lidar com eles. É nessa categoria, segundo Shulman (1986), que as atividades

fazem com que pesquisas sobre ensino e pesquisas sobre aprendizagem caminhem

lado a lado.

Para Shulman (1987), o raciocínio pedagógico de um professor em atividade,

relacionado ao conteúdo, ocorre em um processo subordinado tanto aos meios para

a educação, quanto aos fins, ou seja, subordinados aos métodos e estratégias

utilizadas para o ensino, e os seus efeitos. Segundo o autor, esse processo contém

seis fases: compreensão, transformação, instrução, avaliação, reflexão e nova

compreensão.

Na compreensão, de acordo com Shulman (1987), espera-se que o professor

compreenda criticamente, de várias formas, quando possível, o que vai ensinar.

Segundo o autor, são deveres do professor entender como determinados tópicos se

relacionam com outros, da mesma área e de áreas diferentes, e compreender os

propósitos do ensino da disciplina.

Porém, segundo Shulman (1987), compreender o conteúdo, assim como seus

propósitos, não distingue um professor de uma disciplina de outra pessoa, e aqui

23

Pedagogical content knowledge also includes an understanding of what makes the learning of specific topics easy or difficult.

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reside, segundo o autor, a ideia central do amálgama do conteúdo e da pedagogia,

que leva à próxima fase: a da transformação.

Na transformação, as ideias compreendidas pelo professor, segundo Shulman

(1987), devem ser adaptadas para serem ensinadas. Neste processo de preparação

da compreensão pessoal do professor para a compreensão do aluno é que repousa,

segundo o autor, a essência do raciocínio pedagógico.

Nessa fase, o autor indica a existência de uma série de atividades:

preparação de material, com base em um repertório de materiais didáticos

existentes, envolvendo exame e interpretação do texto a ser utilizado; representação

das ideias-chave na forma de analogias, metáforas, simulações e outros; seleção de

métodos de ensino; adaptações das ideias para contemplar a diversidade de alunos,

não somente de habilidades, mas de concepções, expectativas, culturas,

motivações, e outros. (SHULMAN, 1987)

A próxima fase, a de instrução, decorre das fases anteriores, e deve resultar,

segundo Shulman (1987), em um plano ou conjunto de estratégias para lecionar

determinado ponto de uma matéria, unidade de um livro ou mesmo um curso em sua

totalidade. Inclui muitos dos aspectos da pedagogia e envolve, de acordo com o

autor, a organização e a gestão da sala de aula, com todas as suas características

observáveis, documentadas na literatura sobre ensino e aprendizagem.

Por derivar das duas fases anteriores, Shulman (1987) conjectura, baseado

em algumas evidências, que as técnicas de ensino utilizadas na instrução somente

tornam-se acessíveis ao professor quando ele compreende um assunto e o

transforma para ser ensinado.

Não apenas para fornecer notas, conforme afirmou Shulman (1987), a

próxima fase, a da avaliação, deve também fornecer ao professor feedback das

fases anteriores.

Para entender o grau de compreensão de um aluno sobre determinado

assunto, um professor deverá ter uma profunda compreensão do conteúdo ensinado

e do processo de aprendizagem. Por outro lado, a avaliação deve atingir também, de

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acordo com o autor, o próprio ensino e, como consequência, as fases anteriores.

Somente assim o professor poderia ter acesso à próxima fase, a da reflexão.

Para Shulman (1987), a reflexão é:

[...] o que um professor faz quando ele ou ela revê o ensino e a aprendizagem que ocorreu e reconstrói, reencena, e/ou recaptura os eventos, as emoções, e as realizações. É um conjunto de processos pelo qual um profissional aprende com a experiência. (SHULMAN, 1987, p 19, tradução nossa24)

De acordo com o autor, esse conjunto de processos pode ser efetuado em

grupo ou somente pelo professor, com base em conhecimentos analíticos sobre seu

próprio trabalho a fim de revisar o ensino, observando os meios utilizados e sua

finalidade.

Uma vez revisado o ensino, chega-se, segundo Shulman (1987), ao novo

começo, à fase da nova compreensão dos propósitos do ensino, dos conteúdos a

serem ensinados e dos processos pedagógicos a eles – conteúdos – relacionados.

Mas Shulman (1987) alerta que a nova compreensão não ocorre de forma

automática após a fase da avaliação: ela demanda estratégias de documentação,

análise e discussão. Alerta também que o processo para o raciocínio pedagógico

não ocorre, necessariamente, nessa ordem que foi apresentada ou perpassa por

todas essas fases, mas que a formação inicial de um professor, na sua concepção,

deve contribuir para que o futuro docente pudesse gerenciar esse processo.

Por outro lado, a categoria de conhecimento pedagógico do conteúdo tem

sido defendida, por muitos pesquisadores, como necessária na formação inicial de

professores, pelo fato de ser a única categoria de saber profissional relacionada

exclusivamente à docência, por conectar os conhecimentos do conteúdo com a

prática de ensino.

Categoria de conhecimento do currículo

Para Shulman (1986),

24

... is what a teacher does when he or she looks back at the teaching and learning that has occurred, and reconstructs, reenacts, and/or recaptures the events, the emotions, and the accomplishments. It is that set of processes trough which a professional learns from experience.

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O currículo é representado por toda a gama de programas criados para o ensino de determinado assunto e os tópicos em um determinado nível, a variedade de materiais didáticos disponíveis em relação a esses programas, e o conjunto de características que servem tanto como indicações quanto como contraindicações. (SHULMAN, 1986, p. 10, tradução nossa25)

Portanto, não deve ser visto apenas como um rol de conteúdos a serem

abordados, pois tudo o que revela orientações e recomendações para o

desenvolvimento de um conteúdo, exploração de materiais didáticos, recursos e

estratégias alternativas para o ensino e outros, está relacionado, de acordo com

Shulman (1986), ao currículo.

O autor afirma esperar de um profissional experiente a compreensão de

várias formas de abordagens de um mesmo tópico. Espera também que ele seja

capaz de fazer a ligação entre o tópico que está sendo estudado e outros tópicos da

mesma área, assim como que ele esteja familiarizado com os assuntos ensinados

em outras disciplinas, para fazer as possíveis ligações entre aqueles assuntos e o

que está ensinando.

Desta forma, Shulman (1986) distingue dois tipos de conhecimentos nesta

categoria: o conhecimento curricular vertical, o qual permite a articulação entre o que

será estudado e o que já foi, ou que ainda deverá ser estudado, na disciplina ou

área, e o conhecimento curricular lateral, o qual permite a articulação entre o que

será estudado e tópicos que serão estudados simultaneamente em outras disciplinas

ou áreas.

A formação inicial de professores contribuiria, em nossa visão, para a

apropriação, pelos futuros docentes, dos conhecimentos curriculares vertical e

lateral, se abordasse os currículos prescritos por órgãos responsáveis pela

normatização do ensino.

Oliveira (2004) investigou sobre a possibilidade de se conduzir uma disciplina

de conteúdo específico da Matemática, de modo a possibilitar a apropriação do

25

The curriculum is represented by the full range of programs designed for the teaching of particular subject and topics at a given level, the variety of instructional materials available in relation to those programs, and the set of characteristics that serve as both the indications and contraindications …

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conhecimento pedagógico do conteúdo, definido por Shulman (1986,1987), por

alunos que cursavam Geometria Espacial em uma Licenciatura em Matemática.

De acordo com a referida pesquisadora, a condução de uma disciplina com o

objetivo apresentado no parágrafo anterior proporcionou a aproximação de

licenciandos com a escola básica, no sentido de identificarem, por meio da

observação, dificuldades dos estudantes do Ensino Médio ao trabalharem com a

geometria espacial. Essa observação, por exemplo, direcionou os futuros docentes a

investigarem o papel do erro na aprendizagem de conteúdos específicos da

Geometria e, para isso, várias ações foram necessárias, como o estudo de conceitos

geométricos, a identificação e discussão de reflexões sobre questões relacionadas

ao ensino e aprendizagem da geometria, e outros. Dessa forma, os alunos puderam

exercitar, de acordo com Oliveira (2004), a capacidade de transformar em

ensináveis conteúdos da Geometria.

2.1.2 Os conhecimentos para o ensino de Matemática, segundo Ball, Thames e

Phelps

Com o objetivo de adaptar os estudos de Shulman (1986, 1987) para a

formação inicial do professor de Matemática, Deborah L. Ball, Mark H. Thames e

Geoffrey Phelps apresentaram, em uma das conferências de um simpósio sobre o

desenvolvimento profissional, no ano de 2007, alguns resultados das pesquisas que

vinham realizando no sentido de identificar domínios dos conhecimentos para o que

denominaram de conhecimentos para o ensino de Matemática. Tal conferência se

transformou, no ano seguinte, em um artigo mais detalhado, publicado pelo Journal

of Teacher Education. Ambos os trabalhos receberam o mesmo título.

Criticando a falta de continuidade dos estudos apresentados por Shulman

(1986, 1987), principalmente para melhor definir alguns conceitos por ele propostos,

Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) alertaram que o termo conhecimento

pedagógico do conteúdo vinha sendo utilizado, nos mais de vinte anos após os

estudos daquele autor, de forma ampla. Abrangia vários aspectos diversificados, nas

mais diferentes disciplinas ou áreas, ou até mesmo de forma genérica, como se

todas as disciplinas ou áreas tivessem exatamente as mesmas necessidades.

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Alertaram também sobre a inexistência de estudos que comprovassem que os

conceitos propostos por Shulman (1986, 1987) poderiam ser utilizados em

disciplinas ou áreas específicas, uma vez que o trabalho desenvolvido por aquele

autor se pautou em extensas observações de ensino de diversas disciplinas.

Dessa forma, justificaram que, na falta de dados importantes, as ações de

reformulação dos cursos de formação de professores ficavam limitadas às ideias das

pessoas que, sem uma base teórica específica, indicavam e fixavam os conteúdos

que achavam necessários à formação inicial de um professor para lecionar uma

determinada disciplina.

Para tentar minimizar esta situação, Ball, Thames e Phelps (2007, 2008)

apresentaram as definições que já haviam construído para alguns domínios

identificados até então, relacionadas aos conhecimentos para o ensino de

Matemática, com base na análise das respostas que obtiveram de duas questões de

pesquisa:

1. Quais são as tarefas recorrentes e os problemas do ensino de matemática? O que fazem os professores enquanto ensinam matemática? 2. Quais conhecimentos matemáticos, habilidades e sensibilidades são necessários para gerenciar essas tarefas? (BALL; THAMES; PHELPS, 2008, p. 395, tradução nossa26)

Para chegarem às definições que almejavam, os autores estruturaram os

conhecimentos para o ensino de Matemática em termos do trabalho que os

professores executam e não sobre a Matemática em si, uma vez que era fato

incontestável, para eles, que o professor daquela disciplina, assim como das

demais, precisaria saber aquilo que ele ensinaria.

Assim, Ball, Thames e Phelps (2007) entendem que contribuiriam para

identificar, principalmente nas disciplinas Matemáticas da formação inicial, o que os

futuros professores precisariam estudar, a fim de que tais disciplinas pudessem

contribuir na sua formação profissional, além da formação acadêmica. Isso, na

concepção dos autores, levaria ao estabelecimento das prioridades do que deveria

26

1. What are the recurrent tasks and problems of teaching mathematics? What do teachers do as they teach mathematics? 2. What mathematical knowledge, skills, and sensibilities are required to manage these tasks?

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ser estudado nos cursos de formação e aumentaria a probabilidade de os futuros

professores utilizarem o que aprenderam, quando estivessem ensinando.

Para Ball, Thames e Phelps (2007, 2008), os conhecimentos para o ensino de

Matemática deveriam envolver alguns domínios, e estes comporiam duas das três

categorias do conhecimento relacionado ao conteúdo, proposto por Shulman (1986,

1987). A figura a seguir apresenta o diagrama que os autores propuseram com os

domínios identificados até o ano de 2008, e os relacionam com as categorias do

conhecimento pedagógico do conteúdo e conhecimento do conteúdo, essa última

também denominada por Shulman (1986) como conhecimento específico do

conteúdo.

Figura 2 – Domínios dos conhecimentos para o ensino de Matemática Fonte: Ball, Thames e Phelps (2008, p. 403) – tradução e adaptação

27

27

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60

Para compor a categoria do conhecimento específico do conteúdo de

Shulman (1986, 1987), Ball, Thames e Phelps (2007) propuseram como domínios o

conhecimento comum do conteúdo e o conhecimento especializado do conteúdo. No

artigo apresentado em 2008, os mesmos autores acrescentam o domínio do

conhecimento horizontal do conteúdo que não constava no trabalho de 2007.

Já para compor a categoria que Shulman (1986, 1987) denominou de

conhecimento pedagógico do conteúdo, Ball, Thames e Phelps (2007, 2008)

propuseram o domínio do conhecimento de conteúdo e de alunos e o domínio do

conhecimento de conteúdo e de ensino. Incluíram também, nesta categoria, a

categoria que Shulman (1986, 1987) denominara conhecimento de currículo, mas no

artigo de 2008 indicaram que esta inclusão estava sendo reestudada.

Apresentamos, a seguir, as definições dos domínios dos conhecimentos

propostos por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008).

Conhecimento comum do conteúdo

Este domínio é definido por Ball, Thames e Phelps (2008, p. 399, tradução

nossa28) como “[...] o conhecimento matemático e as habilidades utilizados em

outros contextos [além] do de ensino”. Por esse motivo, não é um conhecimento

restrito aos professores de Matemática: outras pessoas podem tê-lo, tão bem quanto

esse profissional. Mas é, na concepção dos autores, um domínio necessário para os

docentes que lecionarão Matemática como disciplina escolar.

Esse conhecimento é caracterizado pela compreensão básica da Matemática,

de forma a capacitar o professor no domínio das tarefas que são propostas aos

alunos, na utilização correta de representações, notações e ideias, e na identificação

de erros ou inadequações em materiais didáticos e em produções de alunos.

Conhecimento especializado do conteúdo

Definido por Ball, Thames e Phelps (2008, p. 400, tradução nossa29) como

“[...] conhecimento matemático e habilidades unicamente [utilizados] para o ensino”,

28

… it as the mathematical knowledge and skill used in settings other than teaching. 29

… is the mathematical knowledge and skill unique to teaching.

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este domínio, segundo os autores, faz-se necessário e é exclusivo dos cursos de

formação de profissionais para o ensino de Matemática.

Conforme caracterizado muito bem por Corbo (2012, p. 47), o conhecimento

especializado do conteúdo

[...] constitui-se da capacidade não apenas de perceber os erros, mas de analisar e identificar prováveis causas desses erros e apresentar, imediatamente, aos alunos, esclarecimentos precisos e respostas convincentes, a fim de ajudá-los a enfrentar e superar suas dificuldades.

Por estar estritamente relacionado ao ensino, que é a prática docente, difere-

se, de acordo com os autores, do conhecimento especializado do Matemático. Por

outro lado, não pode ser considerado na categoria de conhecimento pedagógico do

conteúdo, pois não requer conhecimentos relacionados à aprendizagem dos alunos.

Conforme afirmam Ball, Thames e Phelps (2007, 2008), este domínio abrange

exigências específicas do trabalho do professor, relacionadas a requisitos

matemáticos bastante específicos que fazem parte de um corpo de conhecimentos

não tipicamente ensinado aos alunos, como conhecer a estrutura matemática de

erros cometidos por alunos. Tais conhecimentos não fazem necessariamente parte

do rol de conteúdos que o futuro professor vai ensinar, mas são necessários a esse

profissional para que desempenhe, com eficiência, a sua principal tarefa: ensinar.

Para nós, a estrutura algébrica dos conjuntos numéricos é um conhecimento

especializado do conteúdo, pelo fato de ela fundamentar, por exemplo, a resolução

de equações pelo procedimento de fatoração, ou seja, embora o professor não

explicitamente ensine aos seus alunos do Ensino Básico essas estruturas, esse

conhecimento é necessário ao professor para que ele produza argumentos

convincentes a fim de mostrar ao aluno que se a, b e c pertencem ao conjunto dos

números reais e cba , então não é sempre que ca ou cb . Não é raro

encontrarmos alunos que fazem, por exemplo, em 111 xx . , o procedimento

incorreto de igualar cada fator do primeiro membro a 1 e responder que 2x ou

0x , na resolução da equação 112 x , como se estivesse procedendo

corretamente à resolução da equação 012 x .

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Conhecimento horizontal do conteúdo

Conforme explicado por Ball, Thames e Phelps (2008, p. 403, tradução

nossa30), esta dimensão de conhecimento específico do conteúdo refere-se à

[...] consciência de como estão relacionados temas matemáticos sobre a extensão da matemática incluída no currículo. Professores de primeiro grau, por exemplo, podem precisar saber como a matemática que ensinam está relacionada com o que os alunos irão aprender no ensino médio, para serem capazes de definir a base matemática para o que virá depois.

Difere-se, em nosso entendimento, do conhecimento curricular lateral definido

por Shulman (1986, 1987), pois, para Shulman, tal conhecimento proporcionaria

uma relação interdisciplinar. Diferencia-se, também, do conhecimento curricular

vertical, definido pelo mesmo pesquisador, pelo seguinte aspecto: o conhecimento

curricular vertical contribuiria para uma articulação entre o que seria estudado e o

que já foi, ou entre o que seria estudado e o que ainda deveria ser. Ou seja,

capacitaria o professor a mostrar e utilizar, quando em exercício de ensino, as

possíveis ligações entre o conteúdo em estudo com os que já foram ou que ainda

seriam estudados, na mesma disciplina. Já o domínio do conhecimento horizontal do

conteúdo, de Ball, Thames e Phelps (2007, 2008), serviria de base para que o

professor pudesse conscientizar-se sobre o que e como deveria ensinar um

conteúdo, de modo a contribuir para que os alunos possam se apropriar de futuros

conhecimentos.

Assim, o conhecimento curricular vertical e o conhecimento horizontal do

conteúdo têm, em nossa visão, objetivos distintos: o primeiro, definido por Shulman

(1986, 1987), capacitaria o futuro professor da Educação Básica para uma atividade

explícita com seus alunos, que é fazer relações entre conteúdos, por exemplo,

matemáticos, ao passo que o segundo, definido por Ball, Thames e Phelps (2008),

capacitaria esse futuro docente de Matemática para uma atividade implícita e própria

do docente, que é definir como ensinar determinados conteúdos, com o objetivo de

propiciar aprendizagens matemáticas que serão necessárias para futuras outras. E

30

Horizon knowledge is an awareness of how mathematical topics are related over the span of mathematics included in the curriculum. First grade teachers, for example, may need to know how the mathematics they teach is related to the mathematics students will learn in third grade to be able to set the mathematical foundation for what will come later.

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para isso, certo conhecimento sobre o currículo é indispensável, como, por exemplo,

a ordenação dos assuntos e a relação entre eles.

Pode-se observar que as três dimensões até agora definidas tratam de

conhecimentos matemáticos com aspectos que não dependem dos conhecimentos

sobre alunos ou sobre ensino, mas aspectos que exigem, segundo Ball, Thames e

Phelps (2007, 2008), um saber de como o conhecimento é gerado e estruturado, o

que é vital para o ensino.

Os demais domínios, constituintes da categoria de conhecimentos

pedagógicos do conteúdo de Shulman (1986, 1987), relacionam-se, segundo os

autores, às duas dimensões centrais daquela categoria: conceitos e pré-conceitos

que alunos de diferentes idades e origens trazem sobre o aprendizado e formas de

representação e formulação de assuntos para torná-los compreensíveis para os

alunos.

Conhecimento de conteúdo e de alunos

Este domínio é definido por Ball, Thames e Phelps (2008, p. 401, tradução

nossa31) como o que “[...] combina o saber sobre os alunos e o saber sobre a

Matemática”. Associa, portanto, a compreensão da Matemática do futuro professor

ao conhecimento sobre o pensamento matemático dos alunos, consequência das

suas experiências e que é apresentado na literatura acadêmica. O resultado dessa

associação, segundo os autores, seria a capacitação do professor a antecipar e

interpretar erros típicos, a buscar estratégias para a superação deles, pelos alunos,

a escolher exemplos interessantes e motivadores, a prever o que os alunos acharão

fácil ou difícil, entre outros.

No tocante aos erros, por exemplo, Ball, Thames e Phelps (2008) observam

que reconhecê-los faz parte do conhecimento comum do conteúdo, ao passo que

avaliar a sua natureza, principalmente se esse erro for desconhecido, faz parte do

conhecimento especializado do conteúdo, pois exige habilidade de pensamento,

atenção a padrões e outros. Já o prever qual dos erros os alunos estarão mais

propensos a apresentar em determinado ponto da matéria faz parte do

conhecimento de conteúdo e de alunos. Mas os autores afirmam que as fronteiras

31

… is knowledge that combines knowing about students and knowing about mathematics.

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64

entre essas dimensões, assim como das demais, são linhas tênues, que permitem

interpretações distintas a respeito dos conhecimentos necessários ao ensino de

Matemática.

Conhecimento de conteúdo e de ensino

Ball, Thames e Phelps (2008, p. 401, tradução nossa32) definem o último

domínio proposto em seus estudos como o que “[...] combina o saber sobre o ensino

e o saber sobre a Matemática”, ou seja, a compreensão de conteúdos específicos de

Matemática combinada à compreensão dos contextos pedagógicos capazes de

interferir no processo de ensino e aprendizagem.

Atividades como fazer uma pausa para esclarecimentos necessários em

determinado tópico e usar uma observação de aluno para fixar um conceito

matemático são exemplos de tomadas de decisões pedagógicas que podem

contribuir na compreensão de conteúdos matemáticos pelos alunos. A escolha de

exemplos para abordar um assunto e a avaliação das vantagens e desvantagens da

utilização de determinadas representações para ensinar algum assunto também são

exemplos de tomadas de decisões didáticas. Essas e outras atividades relacionadas

ao processo de ensino e aprendizagem fazem parte, de acordo com os autores,

desse domínio de conteúdo.

As dimensões do conhecimento especializado do conteúdo, do conhecimento

de conteúdo e de alunos e do conhecimento de conteúdo e de ensino estão, a nosso

ver, diretamente ligadas às pesquisas em Educação Matemática.

Os estudos de Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) contribuíram, a nosso ver,

no sentido de complementar os estudos de Shulman (1986, 1987), associando a

estes elementos para o desenvolvimento de atividades intelectuais e práticas que

permitem ao professor de Matemática melhor exercer a sua profissão.

Particularmente, em um curso de formação de professores de Matemática

para a Educação Básica, entendemos como necessária a presença dos domínios ou

das categorias de conhecimentos definidos, respectivamente, por Ball, Thames e

Phelps (2007, 2008) e por Shulman (1986, 1987), para o desenvolvimento de

32

... combines knowing about teaching and knowing about mathematics.

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65

atividades inerentes aos futuros docentes, uma vez que eles, em nossa concepção,

poderiam melhor relacionar teorias estudadas na Licenciatura em Matemática com

atividades associadas à prática como componente curricular. Sobre essa relação,

fazemos uma abordagem na subseção 2.3, ao relacionarmos o estudo de Ball,

Thames e Phelps (2007, 2008) com uma das visões que vinculam teoria e prática,

de Candau e Lelis (1993), visões essas apresentadas na próxima subseção.

No quadro a seguir, apresentamos nossa interpretação sobre os estudos de

Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) e de Shulman (1986, 1987), sob os rótulos de

duas perguntas, as quais constam no cabeçalho das colunas.

Quadro 2 – Associação possível dos conhecimentos necessários ao professor de Matemática com atividades relacionadas ao ensino desta disciplina na Educação Básica

33

Quais conhecimentos seriam necessários ao professor para

ensinar Matemática?

Para que, por exemplo, esses conhecimentos seriam necessários?

Conhecimentos matemáticos utilizados não somente em contextos de ensino

Dominar as tarefas propostas aos alunos; utilizar corretamente representações, notações e ideias matemáticas; identificar erros e inadequações em materiais didáticos e em produções de alunos.

I

A Conhecimentos matemáticos utilizados especialmente para o ensino

Compreender estruturas matemáticas necessárias para o ensino.

II

Conhecimentos matemáticos e as relações entre os assuntos estudados nos diferentes anos

Definir o que e como ensinar, de modo a preparar o aluno para o que virá futuramente, em termos de conteúdos.

III

Conhecimentos que articulam saberes dos alunos e conteúdos matemáticos

Identificar conhecimentos prévios dos alunos; buscar estratégias e exemplos para antecipar-se a erros típicos cometidos por alunos; prever o que os alunos acharão fácil ou não.

IV

B

Conhecimentos sobre saberes do ensino de conteúdos matemáticos

Tomar decisões pedagógicas com o objetivo de contribuir na compreensão dos conteúdos como: utilizar exemplos que facilitem a compreensão de determinado assunto e avaliar as vantagens e desvantagens da utilização de determinadas representações na sua abordagem.

V

Conhecimentos sobre currículos elaborados para o ensino de Matemática

Identificar, compreender e analisar pressupostos do currículo que irá desenvolver; conhecer como um dado tema pode ser desenvolvido nas diferentes séries e graus de ensino e sua relação com outros temas matemáticos e de outras disciplinas; conhecer as orientações, as recomendações, as estratégias para o ensino e como explorar diferentes materiais didáticos.

VI C

A: Conhecimento específico do conteúdo, segundo Shulman. B: Conhecimento pedagógico do conteúdo, segundo Shulman. C: Conhecimento do currículo, segundo Shulman. I: Conhecimento comum do conteúdo, segundo Ball, Thames e Phelps. II: Conhecimento especializado do conteúdo, segundo Ball, Thames e Phelps. III: Conhecimento horizontal do conteúdo, segundo Ball, Thames e Phelps. IV: Conhecimento de conteúdo e de alunos, segundo Ball, Thames e Phelps. V: Conhecimento de conteúdo e de ensino, segundo Ball, Thames e Phelps. VI: Conhecimento de conteúdo e de currículo, segundo Ball, Thames e Phelps.

33

Assumimos, nesse quadro, com base no artigo de Ball, Thames e Phelps (2008), e com base nas categorias de conhecimentos, definidas por Shulman (1986, 1987), que o domínio de conhecimento de conteúdo e de currículo está contido na categoria de conhecimento do currículo.

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66

Com base nas interpretações contidas no quadro anterior, apresentamos um

exemplo de possível associação entre conteúdos que podem ser vinculados ao

assunto equações no Ensino Fundamental e domínios dos conhecimentos para o

ensino de Matemática, de Ball, Thames e Phelps (2007, 2008). Entretanto,

observamos que não temos a pretensão de admitir essa associação como a única

possível. Nesse sentido, lembramos que Ball, Thames e Phelps (2007, 2008)

afirmam serem tênues as linhas divisórias dos domínios dos conhecimentos que

definiram.

Quadro 3 – Conhecimentos para o ensino de equações no Ensino Fundamental e domínios dos conhecimentos para o ensino de Matemática, de Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) – uma possível

associação

Domínio dos conhecimentos para o ensino de Matemática

Conhecimento para o ensino de equações

Conhecimento comum do conteúdo

Conceito de equação. Procedimentos de resolução de equações do 1.º e 2.º graus (raízes de polinômios de 1.º e de 2.º graus).

Conhecimento especializado do conteúdo

Propriedades e Leis associadas às estruturas algébricas. Esses conhecimentos podem contribuir para a não utilização, pelo professor, de procedimentos incorretos na resolução de equações, assim como para ele identificar causas de erros

cometidos por alunos ao resolverem equações, por exemplo, fazer 71x e

71x na resolução da equação 71x.1x , no universo dos reais.

Conhecimento horizontal do conteúdo

Diversos procedimentos de resolução de equações do 2.º grau. Esse conhecimento, quando associado à noção de como são distribuídos os conhecimentos relacionados às equações no Ensino Básico, pode contribuir na definição de bases matemáticas para abordagens futuras sobre resolução de equações. Por exemplo, algumas equações de grau maior que dois podem ser resolvidas pela fatoração. Dessa forma, um professor, ao ensinar aos alunos procedimentos de resolução de uma equação do 2.º grau, pode contribuir para aprendizagens futuras desses alunos abordando, se, além da “fórmula de Bhaskara”, ensinar procedimentos de fatoração na resolução dessas equações.

Conhecimento de conteúdo e de alunos

Erros comuns (conceituais, procedimentais e atitudinais) relacionados a equações e

resolução de equações, apresentados por alunos, como a indicação de 27 x ,

na resolução da equação 7 x2 . O conhecimento sobre esses erros pode

contribuir, por exemplo, na busca de melhores estratégias para o ensino, pelos professores.

Conhecimento de conteúdo e de ensino

Estratégias e recursos associados ao ensino de equações, como as possibilidades e restrições do uso da balança para abordar a equivalência na resolução de equações. Esses conhecimentos podem auxiliar o professor na seleção, organização e elaboração de atividades com o objetivo de promover o domínio, pelos alunos, dos assuntos relacionados a equações.

Conhecimento de conteúdo e de currículo

Indicações curriculares sobre o ensino de equações ao longo das séries; análise dos contextos e das estratégias propostas, visando à intra e a interdisciplinaridade.

2.2 Visões da relação entre a teoria e a prática na formação de professores

Nos trabalhos de Shulman (1986,1987) e de Ball, Thames e Phelps (2007,

2008), pode-se observar que a teoria e a prática estão, quase sempre,

explicitamente relacionadas. Por exemplo, Shulman (1986,1987) afirma que estudos

sobre concepções e pré-concepções de alunos sobre os conteúdos ensinados são

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67

uma das bases para o desenvolvimento da categoria de conhecimento pedagógico

do conteúdo que pode proporcionar ao professor a apropriação de noções sobre a

prática letiva. Já Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) apontam os estudos

relacionados aos erros cometidos pelos alunos, como base para o desenvolvimento

das dimensões do conhecimento comum do conteúdo, do conhecimento

especializado do conteúdo e do conhecimento de conteúdo e de alunos, todos eles

também responsáveis pela possível apropriação, pelos professores, de noções

relacionadas à prática letiva.

Sendo assim, não poderíamos deixar de abordar as visões sobre a relação

entre a teoria e a prática, uma vez que essa relação está presente, não somente no

referencial teórico que utilizamos neste estudo, mas também nas DCNs.

A relação entre a teoria e a prática é discutida, segundo Gamboa (1995),

desde a Antiguidade.

Derivada da palavra grega práxis, a prática, na Grécia, não estava

relacionada ao verbo produzir e sim ao verbo agir, uma ação inter-humana

consciente, com fim em si mesma e não produtiva, como o fazer bem ao próximo. Já

a teoria era concebida como uma atividade de estudo, de contemplação de espírito,

de meditação, atividades intelectuais que produziam algo e, portanto, opostas à

prática. Toda atividade produtiva e não intelectual como o trabalho, por exemplo,

não era considerada práxis – prática – e, tampouco, teoria. Era sim poiésis e

somente exercida por trabalhadores, escravos ou não. (CANDAU; LELIS, 1993;

GAMBOA, 1995)

Dessa forma, a práxis consistia no agir, a teoria no contemplar, no estudar, ao

passo que a poiésis consistia no produzir.

Segundo Gamboa (1995), Platão admitia que a política seria a única práxis

digna, desde que fosse impregnada de teoria, ou seja, admitia a vinculação entre a

teoria e a prática, uma vez que essa vinculação transformaria o saber puro em uma

função social. Por outro lado, Aristóteles, um dos discípulos de Platão, defendia que

“a atividade política não poderia ser guiada por princípios absolutos da razão teórica”

(GAMBOA, 1995, p. 33), pois a arte de dirigir os assuntos públicos necessitava da

experiência, ou seja, de um saber fazer as coisas para se alcançar os fins

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almejados, o que chamou de tékhne – técnica. Assim, não haveria atividade, para

Aristóteles, que relacionasse a teoria e a prática, como eram concebidas. Têm-se,

então, duas visões diferentes para a relação entre a teoria e a prática: uma que as

vinculava e dava primazia à teoria, fazendo da prática a projeção das ideias, e outra

que as isolava e relacionava a prática com a técnica.

A partir do Renascimento, a concepção de prática passou a ser reformulada,

uma vez que o trabalho humano ganhava valor, assim como a técnica. Com o

marxismo, essa concepção se fixa como “uma atividade humana que produz objetos

ou transformações sociais na realidade”. (GAMBOA, 1995, p. 35) Dessa forma, a

práxis passa a consistir em agir, mas não uma ação inter-humana e sim para

produzir algo. Ganha, então, hegemonia sobre a teoria, uma vez que a partir da

prática, selecionadas as ações significativas e compreensivas, passam-se a

desenvolver teorias sobre a ação social. Tem-se, portanto, uma terceira visão sobre

a relação entre a teoria e a prática: ambas caminham juntas, vinculadas e unidas,

oferecendo, uma a outra, elementos para o seu desenvolvimento. John Dewey foi

um dos defensores dessa visão.

De forma geral, as várias maneiras de se conceber a relação teoria e prática

podem ser agrupadas, de acordo com Candau e Lelis (1993), nas três visões

apresentadas, sendo duas delas dicotômicas e uma de unidade.

As visões dicotômicas afirmam haver a separação da teoria e da prática. Na

mais radical, denominada por Candau e Lelis (1993) de dissociativa, o pensar, o

elaborar, o refletir, o planejar, destina-se aos teóricos, ao passo que o executar, o

agir, o fazer, destina-se aos práticos, ou seja, a teoria e a prática são componentes

isolados e cada um deles tem sua própria lógica, como se fossem polos opostos: “a

teoria ‘atrapalha’ aos práticos, que são homens do fazer, e a prática ‘dificulta’ aos

teóricos, que são homens do pensar” (CANDAU; LELIS, 1993, p. 53)

No que se refere à formação dos professores para a Educação Básica, a

teoria e a prática, nessa visão, podem coexistir nos cursos, com a hegemonia da

teoria. Nesse caso, dá-se prioridade à formação teórica, que é feita, em primeiro

lugar, por meio do estudo de autores clássicos para a “aquisição” dos

conhecimentos acumulados pela sociedade, sem se preocupar como esses

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conhecimentos serão necessários à prática docente. Por outro lado, a prática é

apenas destacada nas poucas disciplinas instrumentais que não se articulam às

disciplinas da formação teórica, pois a máxima é que “para [se] formar um educador

é necessário inseri-lo na prática [docente] e esta irá ditando o processo” (CANDAU;

LELIS, 1993, p. 58). Ou seja, a prática e a teoria estariam desvinculadas e cada uma

teria sua própria lógica: a teoria estudada nas disciplinas não faria menção à prática

e tampouco dela necessitaria; e a prática somente seria iniciada quando o aluno

entrasse em contato com a sala de aula, ou seja, nos estágios.

Particularmente, entendemos que a teoria, nesse caso, seria composta tanto

pelas disciplinas responsáveis pela formação não pedagógica, quanto pela formação

pedagógica. Por exemplo, na formação do professor de Matemática para a

Educação Básica, Cálculo Diferencial e Integral e Didática Geral seriam disciplinas

de base teórica e caberia unicamente ao aluno transpor o que estudou nelas, na

prática docente: não há, nos cursos, a articulação entre elas.

A segunda visão dicotômica é denominada por Candau e Lelis (1993) de

associativa. Nela, a teoria e a prática estão vinculadas, porém a prática é vista como

uma aplicação da teoria, teoria essa que fornece à prática um conjunto de regras e

de normas a fim de “dominar, manipular e controlar a realidade natural e social”.

(CANDAU; LELIS, 1993, p. 53) Nessa visão, há uma relação de autoridade em que,

se houver desvios no produto final, então é a prática que deve melhor se adequar à

teoria para corrigir esses desvios por meio de tecnologias adequadas que, nessa

visão, têm um papel fundamental, pois elas mediarão a passagem da ciência para a

ação, ou seja, elas proporcionarão a aplicação da teoria – a prática.

No que concerne à formação de professores para a Educação Básica, a visão

associativa, também denominada por Candau e Lelis (1993) de visão positivo-

tecnológica, coloca a ênfase na aquisição das tecnologias, pois, segundo essas

autoras, elas proporcionarão o estudo da prática educacional como a aplicação das

teorias pedagógicas.

Sendo assim, entendemos que, nessa formação, existiriam disciplinas

especialmente responsáveis por abordar técnicas de ensino aos alunos, disciplinas

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essas que estariam vinculadas à prática, mas subordinadas à teoria, que continuaria

sendo composta por disciplinas pedagógicas e não pedagógicas.

A terceira visão de relação entre a teoria e a prática é denominada, por

Candau e Lelis (1993), de visão de unidade. Nessa visão, segundo as referidas

autoras, não há apenas a vinculação entre a teoria e a prática, mas também a união

entre elas, união essa indissociável. Ao mesmo tempo que elas são distintas e

relativamente autônomas, estão associadas por uma relação de dependência

recíproca, em que não é mais a teoria que tem a primazia ou que a prática seja a

sua aplicação. Aqui, a teoria depende da percepção da prática para pensar o

progresso humano e, por sua vez, a prática depende dessa teoria, pois passa a ser

“uma atividade objetiva e transformadora da realidade social” (VASQUEZ apud

CANDAU; LELIS, 1993, p. 56) e, sendo transformadora, ela também cria soluções,

únicas, para dadas realidades.

Na formação de professores para a Educação Básica que adota a visão de

unidade, teoria e prática são trabalhadas simultaneamente com a finalidade inicial de

conscientizar o futuro professor do papel social que ele deverá desempenhar e

sobre sua responsabilidade e compromisso para com a melhoria da qualidade do

ensino. Para expressar a unidade entre os conteúdos teóricos e práticos, todas as

disciplinas do curso seriam pensadas de modo a articular o que ensinar, como

ensinar, para quem ensinar e para que ensinar, levando o professor a compreender

a unicidade entre o pensar e o agir, para que possa desenvolver uma prática

docente criadora de soluções específicas para cada uma das diversas realidades

que ele encontrará. (CANDAU; LELIS, 1993)

2.3 Os conhecimentos para o ensino de Matemática e a relação de unidade

entre a teoria e prática

Os domínios dos conhecimentos para o ensino de Matemática, definidos por

Ball, Thames e Phelps (2007, 2008), podem possibilitar, em nossa concepção, que a

teoria e a prática caminhem juntas e se relacionem de modo a uma depender da

outra e vice-versa, o que caracteriza a visão de unidade, como apresentada por

Candau e Lelis (1993).

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Antes de justificarmos a afirmação do parágrafo anterior, faz-se necessário

apresentarmos nossa concepção sobre a prática, concepção essa fundamentada no

Parecer n.º 15, de 2 de fevereiro de 2005, da Câmara de Educação Superior do

Conselho Nacional de Educação34.

De acordo com o relator do referido Parecer, ao “[...] conjunto de atividades

formativas que proporcionam experiências de aplicação de conhecimentos ou de

desenvolvimento de procedimentos próprios ao exercício da docência”, atividades

essas que devem fazer parte das disciplinas de um curso ou ser o núcleo delas, dá-

se o nome de prática como componente curricular. (BRASIL, 2005, p. 3) Nessas

atividades, ainda segundo o relator, os conhecimentos, as competências e as

habilidades que são abordados ou desenvolvidos no curso de formação, devem ser

colocados em uso no “âmbito do ensino”, ou seja, na área ou campo do ensino.

Entendemos que as atividades em questão podem ser realizadas por meio de

seminários, análises de situações reais ou hipotéticas de ensino, entre outros.

Por outro lado, os estágios supervisionados são, conforme consta do referido

Parecer, “[...] um conjunto de atividades de formação, [...] em que o estudante

experimenta situações de efetivo exercício profissional”. (BRASIL, 2005, p. 3, grifo

nosso)

Dessa forma, entendemos que a prática dos cursos de graduação destinados

à formação professores é um conjunto de atividades em que o futuro docente terá a

possibilidade de ensaiar a aplicação de conhecimentos e de procedimentos próprios

ao exercício da docência ou a possibilidade de experimentar situações reais da

profissão. Portanto, é composta por todas as atividades associadas à prática como

componente curricular e ao estágio supervisionado, conforme definidos no Parecer

n.º 15 da Câmara de Educação Superior do Conselho Nacional de Educação.

Levar em conta os domínios dos conhecimentos para o ensino de Matemática

como pressupostos na formação dos professores para a Educação Básica implica,

em nossa concepção, a utilização de um processo de avaliação do aluno em que o

maior peso não pode ser dado à teoria. Nesse processo, julgamos que a teoria –

34

O Conselho Nacional de Educação, que é apresentado e tem seus objetivos e estrutura abordados no capítulo 3, é um órgão do Ministério da Educação com a responsabilidade de normatizar a educação brasileira e tratar de assuntos relacionados a ela.

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disciplinas não pedagógicas e pedagógicas que servirão de base para a docência –

e a prática têm pesos iguais.

Além disso, para proporcionar o desenvolvimento dessa prática, o que em

nossa visão é o grande diferencial dos cursos de formação de professores para a

Educação Básica, seriam necessários conhecimentos que são construídos sobre

investigações da prática docente, como estudos dos erros cometidos por alunos ao

resolverem equações. Assim, esses conhecimentos que emergem da prática

docente também contribuem para o desenvolvimento da teoria, que pode embasar

novas práticas para os cursos de licenciatura e, consequentemente, novas práticas

docentes, gerando uma relação de dependência entre teoria e prática, o que

contempla a visão de unidade, apresentada por Candau e Lelis (1993).

Na figura a seguir procuramos representar a referida dependência.

Figura 3 – Representação da relação de unidade entre a teoria e as práticas tendo como pressuposto de formação os domínios dos conhecimentos para o ensino de Matemática

Fonte: acervo do autor

Identifica-se na figura, por exemplo, que a prática docente contribuiria para o

desenvolvimento da teoria, que fornece elementos para os futuros professores se

apropriarem dos domínios dos conhecimentos para o ensino da Matemática. Esses

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domínios, por sua vez, contribuiriam para o desenvolvimento das práticas nas

Licenciaturas em Matemática, e essas prática contribuiriam para o desenvolvimento

da Prática docente, que é um objeto de estudo da Educação Matemática. Neste

processo, entendemos haver uma relação de unidade, apresentada por Candau e

Lelis (1993), uma vez que a prática contribui para o desenvolvimento da teoria,

assim como a teoria contribui para o desenvolvimento da prática.

Observamos que na figura 3, há direções que indicariam relações em ambos

os sentidos, tendo as mesmas palavras-chave. Nesse caso teríamos, por exemplo,

que a Psicologia, a Sociologia e a História contribuiriam para o desenvolvimento da

Teoria necessária para a formação dos professores e estruturantes para a Educação

Matemática. Por sua vez, a Educação Matemática contribuiria, também, para o

desenvolvimento da Teoria.

2.4 O Processo de Bolonha

Conforme informamos na subseção 1.3.1, o Processo de Bolonha é um dos

elementos que embasam a implementação dos bacharelados interdisciplinares no

Brasil, conforme consta dos Referenciais Orientadores para os Bacharelados

Interdisciplinares e Similares.

Pelo fato de um bacharelado interdisciplinar – o Bacharelado em Ciência e

Tecnologia – ser o curso que permite ao aluno o acesso à Licenciatura em

Matemática da UFABC, julgamos necessária uma abordagem do Processo de

Bolonha para que melhor possamos entender o caminho para a formação do

professor de Matemática para a Educação Básica, proposto pela Universidade

Federal do ABC.

O Processo de Bolonha:

A Declaração de Bolonha, documento assinado em 1999, propõe reformar a

educação superior europeia com o principal objetivo de possibilitar a “livre circulação

de membros da comunidade universitária num espaço europeu [...], com vistas à

futura consolidação de uma zona de grande mobilidade profissional”.

(UNIVERSIDADE ABERTA, [200-], p. 2)

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Na referida Declaração, foi proposta a adoção, pelas universidades europeias,

de um sistema de ensino superior cuja formação para o exercício de uma profissão

seria composta de dois ciclos: um primeiro ciclo de graduação, com duração mínima

de três anos, e um segundo, de pós-graduação em nível de mestrado. No decorrer

dos anos, documentos intitulados Comunicados foram assinados por países

europeus no sentido de complementar a Declaração de Bolonha. Em um desses

documentos, o Comunicado de Berlim, de 2003, foi proposta a inserção de um

terceiro ciclo nessa formação: o doutorado.

Os documentos constituintes do Processo de Bolonha abordam, reiteradas

vezes, sobre a importância da aprendizagem ao longo da vida, uma vez que o futuro

“[...] profissional não pode sair de um curso superior com todos os conhecimentos de

que possa vir a necessitar no decurso de sua profissão já que o atual ritmo da

evolução científica, técnica e tecnológica origina [...] rápida desatualização dos

saberes.” (UNIVERSIDADE ABERTA, [200-], p. 9) Em outras palavras, os referidos

documentos ressaltavam a importância da formação continuada que, segundo nossa

concepção, poderia ocorrer por meio da constante reflexão sobre a prática

profissional.

Três grandes princípios são considerados como orientadores do Processo de

Bolonha, de modo a levar os sistemas de ensino superior dos países europeus, cada

vez mais, a convergirem para um processo de formação único, permitindo, assim, a

livre circulação de estudantes, professores e demais membros da counidade

universitária pelas instituições de ensino europeias. Dois desses princípios são: a

generalidade versus a especialidade de formação; e a flexibilidade dos modelos de

formação.

A generalidade ficaria a cargo do primeiro ciclo de formação – a graduação,

que seria desenvolvida de forma interdisciplinar – ao passo que a especialidade

ficaria a cargo do segundo ciclo – o mestrado. A investigação seria a principal

finalidade do terceiro ciclo – o doutoramento.

O desenho de formação com três ciclos, sendo o primeiro ciclo responsável

por uma formação generalista, poderia proporcionar ao aluno, por exemplo, na visão

dos signatários dos documentos do Processo de Bolonha, um maior leque de

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opções profissionais. Para tanto, algumas estratégias deveriam ser consideradas.

Dentre elas, citamos:

Centrar o ensino em atividades que levariam ao desenvolvimento de

competências, sobretudo, relacionadas à capacidade de refletir, de

resolver problemas, de trabalhar em equipes, entre outras;

Flexibilizar os currículos: os planos de estudos seriam fixados por

áreas de conhecimento, com disciplinas que integrariam o núcleo do

curso, disciplinas que serviriam de suporte a esse núcleo, e disciplinas

que seriam opcionais ou subsidiárias a esse núcleo, com múltiplas

combinatórias possíveis;

Centrar a carga horária no trabalho que o estudante tem de realizar

para adquirir uma determinada formação. Para tanto, essa carga seria

contabilizada em créditos, que seriam associados aos resultados da

aprendizagem do estudante. A quantidade necessária de créditos para

completar cada ciclo de formação, a partir do segundo, poderia ser

efetuada por meio da validação das aprendizagens anteriores.

No que se refere à formação de professores, esse Processo propôs

transformações significativas na estrutura dos cursos superiores europeus com esse

fim. Além disso, propôs mudança na qualificação para um profissional poder assumir

uma sala de aula, nos países signatários dos documentos do Processo de Bolonha:

a necessidade da titulação mínima de mestre.

2.5 Investigações sobre cursos de licenciatura em Matemática e as Diretrizes

Curriculares gerais e específicas – uma revisão bibliográfica

Decorridos, em média, pouco mais de dez anos da implementação das DCNs

e das Diretrizes Curriculares específicas para os cursos de Matemática, poucos são

os estudos que abordam as interpretações dessas Diretrizes, evidenciadas nos

projetos pedagógicos de cursos de formação de professores para a Educação

Básica, sobretudo de professores de Matemática.

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No sistema de Banco de Teses da CAPES identificamos três pesquisas em

Educação Matemática, em nível de doutorado, relacionadas, de certa forma, a

interpretações feitas dos referidos documentos, por instituições de ensino superior

(IES): Wolff (2007), Marcatto (2012) e Barbosa (2012).

Em se tratando de artigos publicados e que podem ser relacionados a

interpretações, por instituições de ensino superior, das Diretrizes Curriculares dos

cursos de formação de professores de Matemática para a Educação Básica, citamos

o de Moriel Júnior e Cyrino (2009) e o de Ferreira (2013).

Por outro lado, Gatti e Barretto (2009), a convite da Organização das Nações

Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), apresentaram uma

análise da estrutura curricular de 165 cursos presenciais do país que promovem –

ou promoveram – a formação inicial de professores para a Educação Básica, sendo

31 deles cursos de formação de professores de Matemática.

A referida análise, baseada em dados coletados em uma pesquisa realizada

em 2008 por Bernadete Gatti e Marina Nunes, identificou que em aproximadamente

21% dos cursos de formação de professores de Matemática pesquisados, os

conteúdos comuns, indicados nas Diretrizes Curriculares específicas da licenciatura

em Matemática e relacionados ao Cálculo Diferencial e Integral, à Álgebra Linear,

aos Fundamentos de Análise, aos Fundamentos de Álgebra, aos Fundamentos de

Geometria e à Geometria Analítica, eram supostamente trabalhados em disciplinas

ligadas às práticas como componente curricular, indo ao encontro do que é indicado

nas DCNs, que abordamos no capítulo 3. Identificou também que assuntos da

Educação Básica, conforme consta das Diretrizes Curriculares, eram abordados em

todos os 31 cursos, mas que existiam casos em que as ementas das disciplinas

responsáveis por tratá-los indicavam apenas livros dirigidos aos estudantes do

Ensino Médio como referência bibliográfica. Em nossa opinião, esse fato mostra

indícios de que tais assuntos não estariam sendo abordados sob a óptica do seu

ensino e sim sob a óptica da revisão.

Gatti e Barretto (2009) apresentam, ainda, que em todos os cursos havia

disciplinas que procuravam atender à indicação das DCNs quanto à prática como

componente curricular, mas que pertinente a essas disciplinas elas não encontraram

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77

“[...] um projeto intencional que relacionasse aspectos de formação para a docência.”

(GATTI; BARRETTO, 2009, p. 144) Ou seja, essas disciplinas não estavam

necessariamente conectadas à formação profissional do futuro professor.

No que se refere à incorporação da pesquisa na formação do futuro professor,

Gatti e Barretto (2009) registraram que poucos cursos ofereciam disciplinas que

abordavam questões relacionadas a investigações em Educação Matemática, outro

aspecto indicado como essencial na formação do professor para a Educação Básica,

nas Diretrizes Curriculares.

Ao concluir, as referidas pesquisadoras registraram que os 31 cursos

pesquisados estavam formando professores de Matemática para a Educação

Básica, com perfis diferenciados: alguns com formação profunda de Matemática,

que não seria o suficiente para a docência, e outros com formação pedagógica

desconexa da formação Matemática. Para os primeiros futuros professores, Gatti e

Barretto (2009) afirmam que, talvez, eles não se sentissem preparados para

lecionar, ao passo que para os demais, eles necessitariam buscar, por seus meios

próprios, as inter-relações de ambas as formações – Matemática e pedagógica.

Mesmo não estando diretamente relacionado a interpretações que as IES

fizeram das Diretrizes Curriculares, o texto de Gatti e Barretto (2009) mostra,

indiretamente, como algumas IES supostamente colocaram em prática aspectos

indicados, naqueles documentos, como essenciais na formação do professor de

Matemática para a Educação Básica, dentre eles: a inclusão de disciplinas que

abordam conteúdos prescritos para a Educação Básica e da prática como

componente curricular.

Com relação à inclusão de disciplinas que abordam conteúdos prescritos para

a Educação Básica, há indícios de que esses conteúdos eram apenas abordados

como revisão. Quanto à prática, evidenciam-se cursos que, provavelmente,

poderiam conceber teoria e prática como uma relação de unidade – sete dos 31

cursos estudados. Mas também se evidencia a existência de cursos em que a teoria

e a prática estariam ou desvinculadas ou vinculadas, mas de forma dicotômica,

visões dissociativa e associativa da relação entre a teoria e a prática, herdadas das

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normatizações dos cursos de formação de professores das décadas de 1960 e

1970, como é abordado no capítulo 3.

Sobre esse mesmo aspecto da relação entre a teoria e a prática, Marcatto

(2012), ao estudar 30 projetos pedagógicos de cursos de licenciatura em

Matemática brasileiros, identificou que em apenas metade deles as atividades

relacionadas à prática como componente curricular eram distribuídas em todo o

decorrer do curso, como especificado nas DCNs. Mas essas atividades não

necessariamente estavam inseridas em todas as disciplinas.

Identificou, ainda, que os 30 projetos pedagógicos poderiam ser agrupados

em três conjuntos disjuntos, os quais foram denominados modelos A, B e C. Esses

modelos eram distintos pela forma de distribuição da carga horária destinada à

prática como componente curricular, pelas disciplinas dos cursos.

No modelo A, as disciplinas associadas à prática como componente curricular

tinham a carga horária integralmente contabilizada para essa atividade; no modelo

B, os projetos continham algumas ou todas as disciplinas com parte da carga horária

contabilizada como prática; e nos projetos do modelo C, havia disciplinas cuja carga

horária era totalmente contabilizada como prática e outras com apenas parte da

carga. Os números de projetos pertencentes aos modelos A, B e C eram,

respectivamente, 11, sete e 12.

Entendemos que as IES cujos projetos pedagógicos pertencem ao modelo A

não necessariamente vinculam a teoria à prática, uma vez que contam com

disciplinas associadas à prática e disciplinas não associadas a ela. Mesmo que haja

vinculação entre a teoria e a prática, em nossa opinião, essas instituições

provavelmente não concebem a relação entre esses componentes como de unidade.

Por outro lado, não podemos afirmar como verdade que, no modelo B, exista

instituição que conceba teoria e prática como uma relação de unidade, pois nos

cursos de licenciatura desse modelo, a prática pode estar servindo como aplicação

da teoria, o que vincula teoria e prática, mas as concebe como elementos

independentes, configurando, portanto, uma relação dicotômica. O mesmo ocorre

para as IES cujos projetos pedagógicos pertencem ao modelo C.

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Marcatto (2012) informa que apenas um, dos 30 cursos estudados, distribui a

carga horária de prática como componente curricular em todas as disciplinas do

curso, exceto no estágio curricular supervisionado. Nesse curso, a pesquisadora

relata que não foi possível identificar, nas ementas das disciplinas, as ações que

seriam associadas à prática. Porém, por meio do estudo do projeto pedagógico do

referido curso, Marcatto (2012) identificou haver um núcleo responsável pelo

planejamento das atividades relacionadas à prática, composto por todos os docentes

e coordenado por um deles. Essas atividades, denominadas de Práticas Educativas,

eram definidas como

[...] situações didáticas em que os futuros professores coloquem em uso os conhecimentos que aprenderam. A PE [Prática Educativa] deverá iniciar na própria instituição formadora, a partir da problematização de questões relacionadas com a prática docente, através dos componentes curriculares da formação, no espaço da sala de aula, podendo variar de uma simples simulação de um problema como também poderá extrapolar para o âmbito das escolas de Educação Básica, aprendendo a lidar com o real, de acordo com o planejamento das atividades. (MARCATTO, 2012, p. 108)

Sendo assim, a IES proponente desse curso pode ter interpretado a relação

entre a teoria e a prática tanto como associativa, em que a prática seria uma

aplicação da teoria, como de unidade: caso a “problematização de questões

relacionadas com a prática docente” fosse pensada como a elaboração de situações

em que a teoria estudada fosse simplesmente aplicada, por meio ou não de

técnicas, teríamos uma relação associativa; caso se partisse dessa problematização,

de ensino e/ou aprendizagem, para serem estudadas e discutidas investigações da

área da Educação Matemática, com o objetivo de buscar possíveis soluções,

poderíamos ter uma relação de unidade.

Supõe-se então, pelo estudo de Marcatto (2012), que a maioria dos cursos de

licenciatura por ela investigados não concebe a relação entre a teoria e prática como

uma relação de unidade, assim como ficou evidenciado na apresentação de Gatti e

Barretto (2009).

Diferentemente de Gatti e Barretto (2009) e de Marcatto (2012), que

realizaram seus estudos com base em amostras de 30 ou mais cursos de

licenciatura em Matemática, Wolff (2007) e Barbosa (2012) têm seus estudos

vinculados, cada um deles, a um único curso, em Estados brasileiros distintos.

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Wolff (2007) também discutiu a relação entre a teoria e prática, proposta no

Curso de Licenciatura em Matemática de uma Universidade particular, instalada no

Estado do Rio Grande do Sul.

Na Licenciatura em Matemática em questão, a prática como componente

curricular, conforme apresenta Wolff (2007), está presente ao longo da formação,

por meio de determinadas disciplinas que destinam parte de sua carga horária para

essa prática.

As atividades relacionadas à prática, em algumas dessas disciplinas, são

apresentadas por Wolff (2007) e, a partir dessa apresentação, a própria

pesquisadora conclui não haver, necessariamente, vínculos dessas atividades com

os conteúdos estudados nas disciplinas. Um exemplo que citamos são as atividades

relacionadas à prática e que estavam associadas à disciplina Fundamentos de

Álgebra: seleção de problemas lógicos em livros didáticos e entrevistas com

professores do Ensino Fundamental e do Ensino Médio, com o objetivo de coletar

suas visões sobre a validade de tais problemas na formação dos estudantes da

Educação Básica; o produto que deveria ser entregue é a análise das respostas dos

professores entrevistados, com considerações particulares dos alunos, futuros

professores, sobre a importância do tema pesquisado para a escola básica.

(WOLFF, 2007)

Nota-se a total desvinculação entre os conteúdos matemáticos que,

provavelmente, eram estudados na referida disciplina, com a atividade relacionada à

prática como componente curricular, e não somente isso: poderíamos questionar,

por exemplo, sobre o real objetivo dessa atividade “prática” na formação de um

professor de Matemática.

Além de analisar o Projeto Pedagógico do Curso estudado, Wolff (2007)

entrevistou professores que ministravam disciplinas em que a prática fazia parte da

carga horária, com o objetivo de identificar a concepção de prática que tinham. Entre

os professores entrevistados, a pesquisadora encontrou quem não soube articular

sobre o assunto e defendeu a exclusão das atividades relacionadas à prática das

disciplinas; encontrou quem concebia aquela prática como algo que somente

poderia ser trabalhada colocando o licenciando em contato com a escola, com a sala

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de aula e com o aluno, não necessariamente ministrando aula, mas observando

para ir pensando como atuar futuramente; e quem defendia a prática como

atendimento a alunos com dificuldades em aprendizagem, para que pudesse

orientá-lo e, para isso, demandaria do futuro professor ações de investigação.

Pode-se observar que, mesmo fazendo parte do Projeto Pedagógico do Curso

estudado por Wolff (2007), os professores desse curso têm interpretações distintas,

ou mesmo nenhuma interpretação, sobre prática como componente curricular:

alguns a concebem como atividade que deveria ser realizada em ambiente externo à

universidade e outros a concebem associada à pesquisa, por exemplo.

Sobre a primeira concepção, pode-se sugerir que esteja relacionada à

maneira como a formação de professores vem sendo tratada, desde o século

anterior: houve momentos em que a prática se resumia na Prática de Ensino e esta

era, na maior parte, realizada fora da instituição proponente do curso, apenas em

estágios, como é abordado no capítulo 3.

Do trabalho de Wolff (2007), pode-se inferir que a suposta prática como

componente curricular, mesmo estando presente no interior de todas as disciplinas

do Curso estudado, parece ser atividade desvinculada dos conteúdos das

disciplinas, uma atividade com fins em si mesma, finalidades essas que podem

inclusive ser questionadas sobre a real importância na formação do futuro professor.

A falta de vínculo entre o conteúdo e a atividade prática, proposto, em uma

mesma disciplina, indica a provável coexistência da teoria e da prática, mas com

objetivos e fins que não convergem, o que poderia caracterizar uma visão

dissociativa da relação entre a teoria e prática.

Com objetivo mais abrangente que o de Wolff (2007), a pesquisa de Barbosa

(2012) buscou compreender o processo de implementação do Curso de Licenciatura

em Ciências Naturais e Matemática de um Campus de uma Universidade Federal na

Região Centro-Oeste do Brasil. Consideramos esse objetivo mais abrangente, pelo

fato de o pesquisador não se fixar somente no que diz respeito à relação entre a

teoria e a prática, mas analisar, também, a organização curricular com relação à

formação em Matemática.

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O Curso estudado por Barbosa (2012) tem como finalidade formar o professor

de Ciências Naturais e Matemática para os anos finais do Ensino Fundamental e, ou

o professor de Matemática, ou o de Física ou o professor de Química, para o Ensino

Médio, buscando superar a disciplinaridade35 na formação e assumindo a

responsabilidade da produção de “[...] práticas que superem a organização curricular

disciplinar e compartimentada do conhecimento [...]”, pelos professores formadores.

(BARBOSA, 2012, p. 15)

No seu estudo, Barbosa (2012) focou a formação de professores de Ciências

Naturais e Matemática para o Ensino Fundamental e de Matemática para o Ensino

Médio. Nesse Curso, o aluno tem uma formação básica nos dois primeiros anos,

comum a todos os futuros professores de Matemática, Física e Química do ensino

básico, e uma formação específica nos dois últimos anos.

Na formação básica, Barbosa (2012) observou que em cada um dos quatro

semestres, havia uma única atividade que trabalhava a prática como componente

curricular, ou seja, essa prática não constava no interior das disciplinas do curso. O

mesmo esquema ocorria na formação específica para o professor de Matemática

para o Ensino Médio.

De acordo com a análise de Barbosa (2012), somente nessas atividades e

nos estágios supervisionados é que era trabalhada a formação profissional do

professor, por meio de, por exemplo, discussão sobre a metodologia de resolução

de problemas, temas atuais sobre educação e seminários, em que os alunos

preparavam e apresentavam aulas com conteúdos da Educação Básica.

Com relação à formação Matemática proposta no Curso, Barbosa (2012)

identificou a existência de “duas matemáticas distintas” e que foram denominadas

pelos alunos entrevistados de matemática da escola e de matemática do

matemático.

35

Conforme Tarcísio Padilha, a disciplinaridade supõe uma clara definição dos contornos dos diversos saberes e obedece a metodologias com limites igualmente demarcados. Para mais esclarecimentos, sugerimos a leitura do artigo intitulado “Da disciplinaridade para a transdisciplinaridade: uma proposta pedagógica”, publicado pela Academia Brasileira de Letras, em: http://www.academia.org.br/abl/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=2880&sid=433.

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Com relação à matemática da escola, ela seria, na concepção dos alunos

entrevistados por Barbosa (2012), a matemática estudada na formação básica, em

forma de revisão e acompanhada por “algumas coisas mais avançadas”, atividades

relacionadas à justificação, à generalização e a perguntas, do tipo “como funciona?”,

“funciona sempre?”, “por quê?”, relacionadas aos conteúdos que foram

supostamente estudados pelos futuros professores na Educação Básica. Já com

relação à matemática do matemático, ela seria, ainda na concepção dos alunos, a

matemática estudada na formação específica e caracterizada pela prática do rigor

em demonstrações, que, aparentemente, para os alunos entrevistados, não

guardava relação com a matemática da escola e com a formação profissional do

docente para a Educação Básica. (BARBOSA, 2012)

Baseado na apresentação do estudo de Barbosa (2012) não se pode afirmar

que o Curso pesquisado trabalhe teoria e prática de forma articulada. Por outro lado,

com as informações apresentadas pelo pesquisador, poderíamos afirmar que o

curso estudado, especialmente nos dois últimos anos de formação específica, tem

características que mais o aproxima de um bacharelado em Matemática. Não por

cobrar o rigor em demonstrações, mas por não relacionar a suposta matemática do

matemático à formação profissional do docente para a Educação Básica.

Cabe salientar que não somos contra a presença de demonstrações e rigor

matemáticos em cursos de formação inicial de professores de Matemática para a

Educação Básica, desde que essas atividades contribuam para a formação, não

apenas acadêmica, mas também profissional do professor. Portanto, nós

compartilhamos o entendimento de Pietropaolo (2005) sobre a (res)significação da

demonstração em Matemática nos cursos de formação de professores. Para este

Educador Matemático,

[...] as demonstrações nos cursos de professores do ensino básico devem ter um enfoque bem mais amplo do que tem sido dado. Essa amplitude pode ser alcançada se os cursos não utilizarem as provas apenas para [o aluno] aprender mais ou com o objetivo de desenvolver o raciocínio lógico, mas também em sua perspectiva didática, curricular e histórica. Uma das possibilidades seria, por exemplo, refletir sobre a “evolução” do pensamento matemático, no qual se inclui a demonstração, indispensável à Matemática. (PIETROPAOLO, 2005, p. 222)

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Faria parte dessa amplitude citada pelo referido pesquisador, por exemplo, a

utilização das demonstrações com a perspectiva da compreensão e aprofundamento

de conceitos e procedimentos que, juntamente com a perspectiva pedagógica,

contribuiriam na formação docente para a construção ou utilização de exemplos e

contraexemplos no ensino, para criação de sequências didáticas com atividades

bem ordenadas, para validação das resoluções de situações-problema, entre outras

ações, necessárias à atuação profissional dos docentes da Educação Básica.

(PIETROPAOLO, 2005)

Também com o objetivo de analisar a relação entre a teoria e a prática em

cursos superiores de formação inicial de professores, Moriel Júnior e Cyrino (2009)

apresentam em seu artigo estudo de seis projetos pedagógicos de cursos de

licenciatura em Matemática do Estado do Paraná, em que a teoria e a prática se

revelavam, de acordo com os referidos pesquisadores, articuladas. Das análises que

fizeram, emergiram quatro características que baseavam essa articulação.

A primeira característica consistia na inserção do futuro professor na

realidade escolar, com o objetivo de coletar informações para serem analisadas no

interior de disciplinas do curso. A segunda característica previa o engajamento do

estudante em trabalho de conclusão de curso, abordando tema relacionado à

atividade escolar do professor ou à Educação Matemática. Segundo os

pesquisadores, nessa segunda característica era oferecida a oportunidade para que

o futuro professor relacionasse teorias estudadas ao longo do curso com aspectos

da sua futura profissão, assim como aspectos da área da Educação Matemática.

Quanto à terceira característica, ela consistia em engajar o licenciando na

compreensão e aprofundamento dos conceitos matemáticos que seriam os objetos

de ensino na Educação Básica. A quarta e última característica previa a vivência do

futuro professor em uma formação didático-pedagógica que consideraria a dimensão

matemática, ao invés da formação genérica do ensino, ou seja, uma formação que

estaria diretamente relacionada a conceitos didáticos e pedagógicos da Educação

Matemática e não da educação em geral.

A primeira e a quarta características identificadas por Moriel Júnior e Cyrino

(2009) mostram, segundo nosso entendimento, indícios de interpretação da prática

como componente curricular como uma relação de unidade entre a teoria e a prática,

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uma vez que a teoria estaria vinculada à prática, mas não teria sobre ela prioridade

e sim dela dependeria, assim como a prática dependeria da teoria, ou seja, uma

relação indissociável.

Já sobre a segunda e a terceira características, não podemos afirmar o

mesmo. Engajar o futuro professor em uma atividade de trabalho de conclusão de

curso, com o objetivo que esse aluno relacione a teoria a aspectos práticos da sala

de aula, parece ser um indicativo de uma visão dissociativa da relação entre a teoria

e a prática. Nessa atividade, será o próprio licenciando que deverá encontrar formas

de associar o que foi estudado na sua formação de nível superior – provavelmente a

teoria – com a prática docente que ele não necessariamente experimentou e que

seria, talvez, observada e estudada em atividades de estágio, por exemplo. Quanto

ao engajar o licenciando no estudo aprofundado dos conceitos matemáticos que

futuramente ensinará, não parece relacionar teoria à prática, mas sim proporcionar

aos estudantes formação relacionada ao domínio do conhecimento comum do

conteúdo, dos estudos de Ball, Thames e Phelps (2007, 2008).

Seria contradição a não presença de atividades para proporcionar formação

no domínio do conhecimento comum, em um curso de formação inicial de

professores de Matemática, apesar de termos ciência de que esse aspecto nem

sempre seja levado em consideração nesses cursos. Mas apenas engajar o

licenciando na compreensão e no aprofundamento de conceitos matemáticos que

serão objetos de ensino na Educação Básica, em nossa opinião, não é o suficiente

para que o futuro professor compreenda os aspectos relacionados ao ensino desses

objetos matemáticos.

Especificamente relacionado à investigação sobre a prática proposta por

universidades federais do Estado de Minas Gerais, o artigo de Ferreira (2013) traz

uma análise das matrizes curriculares dos cursos de licenciatura em Matemática

oferecidos por cinco universidades. Nesse artigo, há a caracterização desses

cursos, de acordo com a concepção que as IES apresentavam sobre a prática como

componente curricular e sobre os estágios.

Nessas caracterizações, é possível identificar cursos em que a prática como

componente curricular era oferecida apenas em parte do curso e não em toda sua

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duração, como proposto nas DCNs. É também possível identificar que estágios

supervisionados não eram oferecidos no período indicado nas Diretrizes Curriculares

Nacionais, ou seja, a partir do início da segunda metade do curso.

A conclusão de Ferreira (2013) é de que

A prática docente, os saberes que a compõem, a matemática da escola e todo o universo que permeia o cotidiano da Educação Básica nas escolas, ainda parecem pouco considerados na maioria dos cursos. Os documentos analisados sugerem que as disciplinas ainda são agrupadas em conteúdo específico e conteúdos pedagógicos, com tendência a valorizar mais o primeiro grupo que o segundo, mesmo em se tratando da formação do professor de Matemática e não do bacharel em Matemática. (FERREIRA, 2013, p. 12)

Dessa conclusão, pode-se considerar que a relação entre a teoria e prática,

assumida pelas instituições estudadas por Ferreira (2013), também não é a de

unidade.

Os trabalhos de Wolff (2007), de Barbosa (2012) e de Marcatto (2012), assim

como a apresentação de Gatti e Barretto (2009) e os artigos de Moriel Júnior e

Cyrino (2009) e de Ferreira (2013) são, a nosso ver, relevantes para reflexões sobre

a formação de professores de Matemática para a Educação Básica, sobretudo para

embasar reflexões acerca de como as instituições vêm interpretando a questão da

prática como componente curricular, que é um dos aspectos abordados nas DCNs.

No entanto, esses estudos não focam, necessariamente, um aspecto que

julgamos importante para vincular a prática da licenciatura em Matemática com a

teoria estudada nesse curso, proporcionando-lhes uma dependência recíproca que

caracteriza uma relação de unidade: a presença dos conhecimentos necessários ao

professor que lecionará na Educação Básica, nesse caso, conhecimentos para o

ensino de Matemática, embora parte desses conhecimentos seja levada em

consideração nos citados estudos.

Entendemos que estudos sobre a presença desses conhecimentos sejam

também necessários para identificar se, e compreender como, as pesquisas que

abordam a formação profissional do professor de Matemática para a Educação

Básica estão sendo implementadas nos cursos de licenciatura, por intermédio das

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interpretações que vêm sendo feitas das DCNs. E nesse sentido é que colocamos

nosso olhar sobre o referido aspecto, mas não somente nele, para que, juntamente

com as pesquisas que citamos, possamos contribuir na busca de melhorias nos

cursos iniciais de formação dos professores de Matemática que atuarão na

Educação Básica.

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3 UMA ANÁLISE DAS NORMATIZAÇÕES NACIONAIS PARA CURSOS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE MATEMÁTICA

PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA E UM PANORAMA DESSES CURSOS NO ESTADO DE SÃO PAULO EM 2010

O objetivo deste capítulo é abordar a constituição das normatizações para os

cursos de graduação específicos de formação de professores de Matemática para a

Educação Básica, do século 20 até a primeira década do século 21, identificando,

por meio de análises comparativas, continuidades e descontinuidades existentes nas

leis, pareceres ou outros documentos oficiais que subsidiaram concepções e

implementações desses cursos.

Para tanto, identificamos, em uma primeira subseção, os referidos cursos

específicos e fazemos uma apresentação dos órgãos do Governo Federal que foram

encarregados de normatizar a educação superior: o Conselho Federal de Educação,

que elaborou e modificou, nas décadas de 1960 e 1970, os currículos mínimos dos

cursos superiores; e o Conselho Nacional de Educação, que elaborou as atuais

Diretrizes Curriculares desses cursos.

Após essa introdução, abordamos alguns aspectos do primeiro curso superior

de Matemática do Brasil, na Universidade de São Paulo, e, em seguida, aspectos

das primeiras normas nacionais que instituíram os currículos mínimos para os cursos

específicos de formação inicial de professores de Matemática para a Educação

Básica das últimas quatro décadas do século passado.

No que se refere à primeira década do século 21, apresentamos o documento

que embasou as atuais DCNs – a Proposta de Diretrizes para a Formação Inicial de

Professores da Educação Básica, em Cursos de Nível Superior – e fatos que

antecederam a criação desse documento. Após, abordamos as DCNs e as Diretrizes

Curriculares específicas para o atual curso de licenciatura em Matemática.

Observamos que o termo currículo, nesse capítulo, é utilizado para indicar as

disciplinas constantes de um curso – grade curricular. Observamos também que

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utilizamos o termo Educação Básica conforme definido na Lei de Diretrizes e Bases

da Educação Nacional de 1996, ou seja, para nos referir aos níveis de educação

anteriores ao nível superior, mesmo que, no decorrer do século 20, esses níveis

tivessem diferentes nomenclaturas e atendessem a diferentes faixas etárias das

definidas hoje para o Ensino Fundamental e Ensino Médio.

3.1 Órgãos federais responsáveis pela normatização da educação superior e

Cursos específicos de formação inicial de professores de Matemática

A Educação Superior, assim como a Educação Básica, é atualmente regida

pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 199636 (LDBEN) e por

normas determinadas pelo Conselho Nacional de Educação (CNE), órgão normativo

e deliberativo de assessoramento ao MEC, com atribuições de “formular e avaliar a

política nacional de educação, zelar pela qualidade do ensino, velar pelo

cumprimento da legislação educacional e assegurar a participação da sociedade no

aprimoramento da educação brasileira.” (BRASIL, 2011)

Criado em 1994 e oficializado em 1995, o CNE, após a promulgação da

LDBEN, formulou e fixou as Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos

superiores, dentre eles as atuais licenciaturas, responsáveis pela formação dos

professores para a Educação Básica brasileira.

Desde a sua oficialização, o CNE é composto pela Câmara de Educação

Básica (CEB), pela Câmara de Educação Superior (CES) e pelo o Conselho Pleno

(CP), e suas atribuições são normativas, deliberativas e de assessoramento ao

Ministério da Educação.

O Conselho Nacional de Educação sucedeu outro órgão federal que teve

papel fundamental na formulação e fixação de normas para a educação brasileira

nas últimas quatro décadas do século anterior: o Conselho Federal de Educação

(CFE).

36

Lei Federal n.º 9.394, de 20 de dezembro de 1996.

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90

Instituído pela Lei de Diretrizes e Bases (LDB) de 196137, o CFE fixou, dentre

outros, os currículos mínimos e a duração dos cursos de formação de profissionais

liberais e de profissões de cargo público, inclusive os dos cursos superiores de

formação de professores para os então ginásio e científico ou clássico, também

criados por força da LDB de 1961.

Durante a atuação do CFE ocorreram três normatizações no sistema de

ensino de grau superior, relacionadas aos cursos de formação de professores para a

Educação Básica: duas na década de 1960, decorrentes da LDB de 1961 e da falta

de docentes para lecionar no antigo ginásio, e outra na década de 1970, decorrente

de uma Reforma Universitária, fixada em 1968, e da LDB, de 197138.

Anterior ao CFE, portanto antes da década de 1960, não existiu, no Brasil, um

órgão específico com a responsabilidade de normatizar a educação superior: ela era

regulamentada por decretos federais ou estaduais.

Especificamente para formar professores de Matemática para a Educação

Básica, foram normatizados, em âmbito nacional, cinco cursos de nível superior, a

partir do final da década de 1930: o primeiro foi normatizado por decreto; os três

cursos posteriores foram normatizados pelo CFE; e o último curso, o que está

atualmente em vigor, foi normatizado pelo CNE. No quadro a seguir, relacionamos

esses cursos e os respectivos anos de suas normatizações.

Quadro 4 – Relação dos cursos superiores específicos de formação de professores de Matemática para a Educação Básica, de âmbito nacional, e os respectivos anos de suas

normatizações

Cursos Ano da

normatização

Curso de Matemática, bacharelado e licenciatura (Normatizado por decreto-lei federal – o modelo 3+1)

1939

Curso de Licenciatura em Matemática (Normatizado pelo CFE)

1962

Curso de Licenciatura em Ciências de 1.º grau (Normatizado pelo CFE e reformulado em 1972, pelo mesmo conselho)

1965

Curso de Licenciatura em Ciências de curta duração e de licenciatura plena (Normatizado pelo CFE)

1974

Curso de Licenciatura em Matemática (Normatizado pelo CNE)

2003

37

Lei Federal n.º 4.024, de 20 de dezembro de 1961. 38

Lei Federal n.º 5.692, de 11 de agosto de 1971.

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Anterior a 1939, alguns estados brasileiros puderam criar e normatizar, na

década de 1930, cursos de graduação específicos para formação de professores.

Para lecionar Matemática na Educação Básica, o estado paulista, ao inaugurar a

Universidade de São Paulo (USP), criou e regulamentou, em 1934, o primeiro curso

de Matemática brasileiro: o Curso de Ciências Matemáticas da USP. Sobre a criação

e normatização desse curso, e dos que estão relacionados no quadro anterior, é o

que abordamos nas subseções seguintes deste capítulo.

3.2 Instituição das grades curriculares de cursos específicos de formação de

professores de Matemática para a Educação Básica até 1960

Até a década de 1930, os professores que tinham formação superior e

lecionavam Matemática na Educação Básica eram, em maior parte, egressos de

cursos de engenharia, os quais tinham como principal modelo os cursos da Escola

Politécnica do Rio de Janeiro. O processo para se estabelecer uma formação

específica para esses profissionais iniciou-se em 1925, com a Reforma João Luiz

Alves/Rocha Vaz39, a qual, entre outras ações, autorizou a criação de universidades

em alguns estados brasileiros, dentre eles, o Estado de São Paulo, que seria o

pioneiro na implementação de um curso de Matemática, no Brasil.

Apesar de a referida autorização ter ocorrido em 1925, somente em 1931 o

Decreto Federal n.º 19.851, que fez parte da Reforma Francisco Campos,

regulamentou a criação de universidades brasileiras e com essa regulamentação os

estados e as instituições particulares passaram a criar e manter essas instituições de

educação superior.

Para a constituição da congregação de uma universidade, o citado Decreto

fixou, entre outras exigências, a existência de, pelo menos, três institutos de ensino

superior, dentre quatro fixados: Faculdade de Direito, Faculdade de Medicina,

Escola de Engenharia e Faculdade de Educação Ciências e Letras. Essa fixação

contribuiu, sobretudo, para a criação de cursos superiores específicos que passaram

a formar professores para a Educação Básica.

39

Decreto Federal n.º 16.782 A, de 13 de janeiro de 1925.

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Além disso, o Decreto Federal n.º 19.851 de 1931 também determinava que o

programa, a duração e o funcionamento dos cursos de nível superior deveriam ser

fixados pelo Conselho Universitário ou pelo Conselho Técnico Administrativo das

instituições de ensino, ambos também regulamentados nele, ou seja, às instituições

de ensino superior foi atribuída a responsabilidade pela criação do currículo, este no

sentido etimológico de percurso, dos seus cursos.

Uma consequência direta da Reforma Francisco Campos para a educação

superior foi a criação da Universidade de São Paulo, em 1934, que ao invés de

congregar uma Faculdade de Educação Ciências e Letras a desdobrou em uma

Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras e um Instituto de Educação. Esse Instituto,

a Antiga Escola Normal da Praça, conforme era conhecida em São Paulo, ou

Instituto Caetano de Campos, fora incorporado pela USP, na sua criação,

juntamente com suas escolas anexas destinadas à experimentação, à prática de

ensino e ao estágio profissional. Essa incorporação teve papel fundamental na

criação de cursos superiores de formação inicial de professores para o que

denominamos atualmente de Ensino Fundamental II e Ensino Médio, alguns desses

cursos considerados precursores em nível nacional. A importância desse Instituto de

Educação para a formação inicial de professores brasileiros, especialmente

paulistas, é citada por Ferreira e Santos (2007, p. 76), no artigo intitulado

Contribuições ao estudo da construção da metodologia do ensino de Matemática

como disciplina escolar no Brasil:

A contribuição do Instituto de Educação à USP foi inestimável. Embora se perceba uma nítida separação entre os institutos, buscou-se, por meio de um pensamento renovador, oferecer aos professores primários e secundários uma formação em nível superior. O Instituto de Educação assumiu a responsabilidade em formar professores, voltado exclusivamente para a formação pedagógica, enquanto que a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP ficou restrita à formação teórica e científica oferecida em seus cursos.

Historicamente importante no que se refere à formação específica de

docentes para a Educação Básica, a USP, por meio de seus cursos, promoveu uma

formação, digamos, dualista para os futuros professores: a formação pedagógica e

prática ministrada em um instituto e a formação não pedagógica e não prática

ministrada em outro instituto ou faculdade, formações não necessariamente

vinculadas.

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O Decreto Estadual paulista n.º 6.283, de 25 de janeiro de 1934, que criou a

USP, também fixou a grade curricular e a duração do primeiro curso de Matemática

brasileiro: o Curso de Ciências Matemáticas, ministrado na Faculdade de Filosofia,

Ciências e Letras. De acordo com o artigo 10.º do referido Decreto, esse curso

deveria ser seriado, com duração de três anos, sendo estudadas as seguintes

disciplinas:

Primeiro ano: Geometria (projetiva e analítica) e Análise Matemática;

Segundo ano: Análise Matemática, Cálculo Vetorial e Elementos de

Geometria Infinitesimal, e Física Geral e Experimental;

Terceiro ano: Mecânica Racional e Elementos de Mecânica Celeste,

Física Geral e Experimental, e História das Matemáticas.

Cabe salientar que em Análise Matemática deveriam ser incluídos, de acordo

com o referido Decreto paulista, os estudos sobre o cálculo de probabilidades e

sobre a estatística.

Para receber a licença para o magistério secundário, o aluno, ao completar o

terceiro ano de qualquer um dos cursos da Faculdade de Filosofia, Ciências e

Letras, dentre eles o Curso de Ciências Matemáticas, precisaria concluir o Curso de

Formação Pedagógica do Instituto de Educação. Esse curso poderia, também, ser

estudado de forma concomitante ao terceiro ano dos cursos da citada Faculdade.

Sobre o Curso de Formação Pedagógica, o decreto de criação da USP não

explicita as disciplinas que deveriam ser estudadas. Apenas indica, no artigo

terceiro, que:

A seção de Matérias de Ensino para os candidatos ao professorado secundário constituirá uma seção autônoma da de prática de ensino e terá por fim o estudo teórico-prático: a) da metodologia da matéria, das dificuldades que lhe são inerentes, e das técnicas e processos para removê-las; b) da importância da matéria para formação mental do adolescente; c) da história do ensino da matéria; d) da correlação de cada matéria com as demais; e) dos princípios e da prática da organização dos programas escolares. (SÃO PAULO, 1934)

Tem-se, portanto, uma primeira fixação de currículo para formação de

professores para lecionar Matemática na Educação Básica, em curso específico no

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Estado de São Paulo. Embora não possa ser considerado um currículo nacional, o

desenho da formação de professores de Matemática para a Educação Básica que

se propunha na USP foi um exemplo para outras instituições brasileiras. Esse

desenho era o de estudar disciplinas de conhecimento matemático, como

Geometria, Análise Matemática e Cálculo Vetorial, disciplinas de uma área afim à

Matemática, a área da Física, uma disciplina de História da Matemática, além de

uma formação pedagógica de um ano, em um Instituto desvinculado da Faculdade

responsável em ministrar o Curso de Ciências Matemáticas. Essa última formação

era baseada em técnicas e procedimentos, e que levava em consideração, pelo

menos na teoria, a importância da Matemática para a formação dos alunos da

Educação Básica e a relação dessa disciplina com as demais disciplinas que seriam

estudadas pelos alunos nos atuais Ensinos Fundamental e Médio.

Na configuração apresentada, ou seja, três anos de um primeiro curso na

Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras e um ano de formação pedagógica no

Instituto de Educação, concomitante ou não ao primeiro curso, os cursos de

formação de professores para a Educação Básica vigoraram, na USP, segundo

Ferreira e Santos (2007), de 1934 a 1938.

No ano de 1938, o Instituto de Educação da USP foi extinto em decorrência

de novas diretrizes federais para a formação de professores para a Educação

Básica, em cursos de nível superior, implementadas no Regime de Estado Novo.

Nesse Regime, uniformizaram-se os cursos de formação de professores para

a Educação Básica brasileira tomando-se por base os cursos da Faculdade Nacional

de Filosofia, criada em 1937, no Rio de Janeiro, e reorganizada em 1939, para servir

como modelo nacional. Por esse novo modelo, a formação inicial desses

professores, em nível superior, deveria ser totalmente realizada nas próprias

faculdades de filosofia, ciências e letras, por meio de um curso de Didática,

ministrado àqueles que tivessem concluído o curso de bacharelado: surgia, desse

modelo, a diferença entre os títulos de bacharelado e de licenciatura, de nível

superior, sendo esse segundo conferido apenas ao aluno concluinte do curso de

Didática. (BRASIL, 1939)

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A Faculdade Nacional de Filosofia era composta, conforme instituído pelo

Decreto-Lei Federal n.º 1.190, de 4 de abril de 1939, por quatro seções

fundamentais, sendo elas Filosofia, Ciências, Letras e Pedagogia, e uma seção

especial, a seção de Didática.

O Curso de Matemática pertencia à seção de Ciências e tinha três anos de

duração. As disciplinas estudadas nesse Curso, fixadas pelo Decreto-Lei Federal n.º

1.190 de 1939 e, portanto, não mais a cargo de serem escolhidas pelas instituições

proponentes desse curso, eram assim distribuídas:

Primeiro ano: Análise Matemática, Geometria Analítica e Projetiva,

Física Geral e Experimental;

Segundo ano: Análise Matemática, Geometria Descritiva e

Complementos de Geometria, Mecânica Racional, e Física Geral e

Experimental;

Terceiro ano: Análise Superior, Geometria Superior, Física

Matemática e Mecânica Celeste.

Já o Curso de Didática, de um ano, constituía-se das disciplinas Didática

Geral, Didática Especial, Psicologia Educacional, Administração Escolar,

Fundamentos Biológicos da Educação e Fundamentos Sociológicos da Educação.

Quanto ao estágio, nada é abordado sobre sua obrigatoriedade no referido

Decreto. Há apenas a indicação de que as aulas práticas seriam realizadas em

laboratórios, gabinetes ou museus. (BRASIL, 1939)

Conforme os artigos 48.º e 49.º do Decreto-Lei Federal n.º 1.190 de 1939, ao

aluno que concluísse o Curso de Matemática de três anos era concedido o diploma

de bacharel em Matemática e a esse, ao concluir o curso de Didática, o diploma de

licenciado em Matemática.

Como a duração dos cursos oferecidos na Faculdade Nacional de Filosofia

era de três anos, com exceção do curso de Didática que tinha duração de um ano,

esse modelo ficou conhecido no Brasil como esquema 3+1. Nesse modelo, em

quatro anos um aluno poderia receber um diploma de bacharel e outro de licenciado,

nessa ordem.

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No que se refere à formação de professores de Matemática para a Educação

Básica nesse modelo 3+1, pode-se afirmar, com base no Decreto-Lei Federal n.º

1.190 de 1939, que o pressuposto para exercer a função docente era de que o

professor deveria ser um bacharel em Matemática, com um curso complementar de

Didática, ou seja, teoricamente, esse professor deveria ter uma formação acadêmica

que ia além da formação do bacharel. Dessa forma, no primeiro modelo nacional de

formação, não há identidades distintas nos cursos que teriam como egressos o

bacharel e o licenciado em Matemática.

Se comparadas as disciplinas matemáticas do Curso de Ciências

Matemáticas proposto pela USP com as do Curso de Matemática do modelo

nacional 3+1, pode-se observar, por exemplo, que o segundo curso apresenta uma

quantidade maior de disciplinas relacionadas à Geometria, Análise e Física, e a

ausência da disciplina de História da Matemática.

Quadro 5 – Comparativo das disciplinas matemáticas estudadas no curso formação de professores de Matemática para a Educação Básica na USP e no modelo nacional da Faculdade Nacional de

Filosofia

USP

(de 1934 a 1938) Faculdade Nacional de Filosofia

(a partir de 1939)

1º ano Geometria (projetiva e analítica)

Análise Matemática

Análise Matemática Geometria Analítica e Projetiva

Física Geral e Experimental

2º ano

Análise Matemática Cálculo Vetorial e Elementos de Geometria

Infinitesimal Física Geral e Experimental

Análise Matemática Geometria Descritiva e Complementos de

Geometria Mecânica Racional

Física Geral e Experimental

3º ano

Mecânica Racional e Elementos de Mecânica Celeste

Física Geral e Experimental História das Matemáticas

Análise Superior Geometria Superior Física Matemática Mecânica Celeste

Com relação à formação pedagógica, uma diferença que pode ser identificada

é a de que no curso proposto pela USP, essa formação poderia ocorrer

concomitantemente com o terceiro ano do curso, ao passo que no modelo 3+1 ela,

obrigatoriamente, ocorria após o aluno estudar o terceiro ano. Especialmente sobre

os estágios, mesmo que nada fosse abordado sobre sua obrigatoriedade no modelo

3+1, o Decreto Estadual paulista n.º 9.268-A, de 25 de junho de 1938, que extinguiu

o Instituto de Educação da USP e instituiu, nas Faculdades de Filosofia, Ciências e

Letras, a seção de Educação para ministrar o curso de Didática, determinou que os

exercícios práticos dos alunos dessa seção poderiam ser efetuados nos então

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cursos ginasiais do Estado. Sendo assim, os estágios, que eram feitos nas escolas

anexas ao Instituto de Educação, com sua extinção, passaram a não ser mais

realizados na USP.

As formações do professor de Matemática para lecionar na Educação Básica,

propostas pela USP, até 1938, e pelo modelo 3+1, que passou a vigorar em 1939,

tinham, no nosso entendimento, o mesmo desenho curricular: propunham uma

formação dualista, sendo uma específica em Matemática e outra pedagógica e de

caráter prático40, cursadas à parte da primeira, sem que houvesse vinculação

explícita entre elas. Esse desenho curricular de formação, em que não há conexão

da teoria com a prática, mas ambas coexistem no mesmo curso, configura, a nosso

ver, a visão dissociativa da relação entre a teoria e a prática, abordada por Candau e

Lelis (1993), na qual se enfatiza a formação teórica.

Até 1960, a instituição dos currículos e a duração dos cursos superiores de

formação inicial de professores para a Educação Básica – e consequentemente os

de Matemática – seguiram o caminho indicado pela Faculdade Nacional de Filosofia,

ou seja, o modelo 3+1.

3.3 Normatizações nacionais que pautaram a formação de professores de

Matemática para a Educação Básica brasileira das décadas de 1960 a 1990

Com a promulgação da primeira Lei de Diretrizes e Bases, em 1961, o

sistema de ensino brasileiro foi dividido em três níveis denominados graus:

O grau Primário, composto pela educação pré-primária, para as

crianças com idades até sete anos, e pelo ensino primário, obrigatório,

com duração mínima de quatro anos e possibilidade de ser estendido

para seis anos;

O grau Médio, que abrangia os cursos secundário, técnicos e de

formação de professores para o grau Primário – cada um deles

composto pelos ciclos ginasial, com quatro anos, e colegial com três

anos; e

40

Desenvolvida apenas na forma de estágios.

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O grau Superior, composto, entre outros, por cursos de formação dos

professores para o grau médio, nas faculdades de filosofia, ciências e

letras de universidades ou de faculdades isoladas.

Para normatizar esse sistema de ensino, a LDB de 1961 criou o Conselho

Federal de Educação e atribuiu-lhe, entre outras funções, a função de elaborar os

currículos mínimos para cursos de grau Superior. Para tanto, esse Conselho

organizou alguns pareceres41 que orientaram o cumprimento das suas funções.

Em um desses pareceres, o de número 292, de 14 de novembro de 1962, o

seu relator faz menção à diferenciação que deveria existir entre os cursos de

bacharelado e de licenciatura, afirmando que esse segundo “é um grau apenas

equivalente ao bacharelado e não igual a este mais Didática, como acontecia até

então no esquema 3+1” (CONSELHO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, 1979, p. 48,

grifos do autor). Ainda sobre a diferenciação entre os cursos, o mesmo relator se

utilizou de uma linguagem lógico-matemática para justificar a criação e existência de

três eixos de disciplinas nos cursos de licenciatura – o de conteúdo, o de método e o

de aluno –, assim como a não dissociação das disciplinas relacionadas a eles, como

vinha sendo realizado até então:

Na linguagem da fórmula “ensinar “X” a João”, soa-nos tão absurdo o restritivo “ensinar “X””, em que se ignora totalmente o aluno ao erigir o conhecimento à categoria de fim em si mesmo, quanto o dispersivo “ensinar a João” de certo pedagogismo que vai desaparecendo em nossos dias. Impossível como é abstrair qualquer desses três elementos, sem produzir mutilações irreparáveis, não vemos como fugir às duas únicas soluções possíveis: a de “ensinar X a João”, admissível em determinadas circunstâncias, e a definição geral de “ensinar a João X”, em que João tem precedência sobre X, e ambos ao ensinar. Como este se ajusta a João pela via de X, segue-se que desde logo temos como indiscutível a predominância funcional da matéria sobre o método. Afinal, o “que ensinar” preexiste ao “como ensinar” e de certo modo o condiciona, o que não implica negar validade à metodologia teórica e prática da Educação. Do contrário, já não se cogitaria sequer de um treinamento didático, porque este fluiria, então, inteiramente, das próprias matérias encaradas como tais. (CONSELHO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, 1979, p. 45, grifos do autor).

41

Cabe aqui ressaltar que todas as normas elaboradas e votadas pelos Conselhos de Educação foram, e ainda são, publicadas via resoluções e cada resolução é embasada em pareceres elaborados pelos conselheiros relatores. De certa forma, os pareceres são mais ricos em detalhes do que as resoluções, que muitas vezes apenas oficializam, de forma resumida, os pareceres.

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De certa forma, o relator combatia a ideia de se deixar por último o estudo das

disciplinas pedagógicas, modelo que era utilizado, até então no Brasil, nos cursos

superiores de formação de professores para a Educação Básica. Para o relator,

teoricamente, essas disciplinas deveriam estar associadas às demais disciplinas dos

cursos de formação de professores. Porém, como veremos adiante, somente em

uma das disciplinas fixadas em cursos de formação de professores de Matemática

para a Educação Básica há, de forma explícita, menção de se abordar

conhecimentos relacionados aos objetos de ensino dos futuros professores, ou seja,

o “X” a que se refere o relator. Logo, se essa disciplina não estivesse presente no

decorrer de todo o curso, as disciplinas de formação pedagógica continuariam, em

nossa opinião, desvinculadas e restritas a si próprias, mesmo não sendo propostas

somente no final do curso.

Outro assunto também abordado no Parecer CFE 292/62 é o estágio

supervisionado. De acordo com o seu relator:

A Prática de Ensino, esta deve ser feita nas próprias escolas da comunidade, sob a forma de estágios, como os “internatos” do curso de Medicina. Só assim poderão os futuros mestres aplicar os conhecimentos adquiridos, dentro das possibilidades e limitações de uma escola real, e ter vivência do ato docente em seu tríplice aspecto de planejamento, execução e verificação. (CONSELHO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, 1979, p. 46).

Mediante esse extrato, observa-se que a prática de ensino deveria estar

restrita aos estágios, que teriam como objetivo principal proporcionar ao aluno o

exercício prático. Percebe-se também, desde aquela época, a intenção de utilizar a

experiência das residências dos cursos de Medicina para o estágio nos cursos

superiores de formação inicial de professores, assunto que é atualmente discutido

no Senado, desde 2007, e que começou a ser implementado no Estado de São

Paulo em abril de 2012, por meio de um decreto estadual42.

Ressaltamos, ainda do Parecer CFE 292/62, o discurso inicial do seu relator:

Os currículos mínimos dos cursos de licenciatura compreendem as matérias fixadas no bacharelado, convenientemente ajustadas em sua amplitude, e os estudos profissionais que habilitem ao exercício do magistério dos estabelecimentos de ensino médio. (CONSELHO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, 1979, p. 45, grifo nosso).

42

Decreto Estadual (SP) n.º 57.978, de 18 de abril de 2012.

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Com base em todos os argumentos que apresentou, a proposta do relator, no

Parecer CFE 292/62, era de que as licenciaturas mantivessem a duração de quatro

anos, mas não da forma 3+1 como até então ocorria. Desses quatro anos, foi

proposto um mínimo de um oitavo para disciplinas de preparação pedagógica, ou

seja, meio ano, abrangendo: Psicologia da Educação – Adolescência e

Aprendizagem, Elementos de Administração Escolar, Didática, e Prática de Ensino

sob a forma de estágio supervisionado. Essas disciplinas não deveriam ser

agrupadas em um único ano ou semestre, mas deveriam ser distribuídas durante os

quatro anos do curso.

Ao comparar a duração relacionada à formação pedagógica do curso que

propunha no Parecer CFE 292/62 com a dos cursos no modelo 3+1, o relator

indicava que ainda restava um oitavo dessa duração e que esse um oitavo deveria

ser utilizado para “o aprofundamento das especialidades relativas aos diversos

cursos” (CONSELHO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, 1979, p. 47).

Na prática, o relator propôs, no Parecer CFE 292/62, um curso com o

correspondente a três anos de disciplinas específicas da área e um ano de

disciplinas pedagógicas e de aprofundamento da área específica, as quais deveriam

perpassar a duração total do curso, ao invés de ficarem agrupadas no último ano.

Quanto à atividade de prática de ensino, ela deveria ser cumprida somente na forma

de estágio e o conteúdo não pedagógico deveria estar baseado no conteúdo do

bacharelado, porém devidamente adaptado à duração do curso.

Tendo como base o Parecer CFE 292/62, tal como redigido e aprovado, e o

Parecer do Conselho Federal de Educação n.º 295 de 14 de novembro de 1962,

este último que tratava especificamente do currículo mínimo para o curso de

licenciatura em Matemática, esse curso foi normatizado pela Resolução CFE sem

número, de 14 de novembro de 1962, com carga horária de 2.200 horas,

integralizada entre três anos letivos, no mínimo, e sete anos letivos, no máximo, com

o seguinte currículo mínimo fixado:

Desenho Geométrico e Geometria Descritiva;

Fundamentos de Matemática Elementar;

Física Geral;

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Cálculo Diferencial e Integral;

Geometria Analítica;

Álgebra;

Cálculo Numérico; e

Disciplinas pedagógicas, de acordo com o Parecer CFE n.º 292/62.

Quanto aos programas para abordar cada uma dessas disciplinas, de acordo

com a LDB de 1961, eles deveriam ser organizados sob a forma de planos de

ensino, pelos respectivos professores das disciplinas, e aprovados pela

congregação de cada instituição.

Sobre os Fundamentos de Matemática Elementar, o Parecer CFE 295/62

indicava que seriam destinados para:

[...] análise e revisão dos assuntos lecionados nos cursos de Matemática do ginásio e dos colégios não só tendo em vista dar aos licenciandos um conhecimento mais aprofundado desses assuntos como ainda para procurar enquadrá-los no conjunto das teorias matemáticas estudadas [...] (CONSELHO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, 1979, p. 622)

De certa forma, podem-se notar, nesse trecho, duas possíveis preocupações

do relator: a primeira é de garantir, ao futuro professor de Matemática, caso ainda

não tivesse, uma formação de conteúdos conceituais dos assuntos que ele

futuramente lecionaria; a segunda é registrar a associação dos conteúdos

matemáticos com as discussões sobre o ensino, decorrentes da Educação

Matemática que se fazia presente no Brasil desde o final da década de 1920, pelas

realizações de Euclides Roxo. Destaca-se, ainda, que nos anos de 1955 e 1957,

conforme Sangiorgi (apud PIRES, 2005), discussões a respeito da Matemática

Moderna ocorreram nos Congressos de Ensino de Matemática, e que no Congresso

de 1962, no Rio de Janeiro, foram aprovadas decisões no sentido de se

experimentar aquela inovação que modificou o panorama do ensino de Matemática

na década seguinte.

Além da disciplina Fundamentos de Matemática Elementar, não houve, de

forma explícita, indicação dos conteúdos a serem abordados nas demais disciplinas.

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Se comparados o currículo mínimo fixado para o curso de licenciatura em

Matemática, criado em 1962, com o do Curso de Matemática, no modelo 3+1, pode-

se identificar grande diferença. No que se refere às disciplinas matemáticas,

conforme se pode observar no quadro a seguir, inclui-se o desenho geométrico,

mantém-se a geometria analítica e a geometria descritiva, mas exclui-se a geometria

projetiva e os complementos de geometria, em que poderiam ser abordadas a

Geometria Plana e Espacial, por exemplo; reduzem-se as disciplinas relacionadas à

Física; excluem-se as disciplinas relacionadas à Análise Matemática; e incluem-se

disciplinas para se trabalhar o Cálculo Diferencial e Integral, a Álgebra e o Cálculo

Numérico, além de uma disciplina para serem abordados conhecimentos

relacionados aos objetos de ensino da Educação Básica.

Quadro 6 – Comparativo das disciplinas do Curso de Matemática no modelo 3+1 com as do Curso de Licenciatura em Matemática criado em 1962

Curso de Matemática no modelo 3+1, criado em 1939

Curso de licenciatura em Matemática criado em 1962

Dis

cip

linas m

ate

máticas

Análise Matemática ---

Geometria Analítica e Projetiva Geometria Analítica

Geometria Descritiva e Complementos de Geometria

Desenho Geométrico e Geometria Descritiva

Mecânica Racional ---

Física Geral e Experimental Física Geral

Análise Superior ---

Geometria Superior ---

Física Matemática ---

Mecânica Celeste ---

---

Fundamentos de Matemática Elementar

--- Cálculo Diferencial e Integral

--- Álgebra

--- Cálculo Numérico

Dis

cip

linas p

edag

ógic

as

Didática Geral Didática

Didática Especial ---

Psicologia Educacional

Psicologia da Educação – Aprendizagem e Adolescência

Administração Escolar

Elementos de Administração Escolar

Fundamentos Biológicos da Educação

---

Fundamentos Sociológicos da Educação

---

---

Prática de Ensino sob a forma de Estágio

---

Disciplinas para o aprofundamento das

especialidades relativas ao curso

Com relação às disciplinas pedagógicas, não há a indicação de uma didática

específica para o ensino da Matemática, como havia no modelo 3+1, e também são

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excluídas disciplinas que fundamentariam, supostamente, aspectos básicos da

educação, como os sociológicos. Por outro lado, incluiu-se, explicitamente, o

estágio, que seria a única atividade responsável pela formação, digamos, prática do

futuro professor.

Entendemos que não mais se poderia considerar um licenciado, egresso

desse curso de licenciatura em Matemática de 1962, como um bacharel com algo

mais, como no Curso de Matemática do modelo 3+1, uma vez que a quantidade de

disciplinas matemáticas de nível superior, dessa licenciatura, é visivelmente menor,

quando comparada à quantidade do Curso de Matemática de 1939.

Por outro lado, com a indicação de que os conteúdos das disciplinas do curso

de licenciatura em Matemática seriam os conteúdos do bacharelado, porém

convenientemente ajustados, e com o com o agravante dos conteúdos pedagógicos

não estarem vinculados a esses conteúdos ajustados, não há como afirmar que

esse curso teria conseguido se desvencilhar do bacharelado em Matemática,

criando uma identidade própria. Parece mais ser um bacharelado suavizado, com

algo mais – as disciplinas pedagógicas –, o que não deixa de ir ao encontro da fala

registrada pelo relator, no Parecer CFE 292/62, em que afirmava que a licenciatura

não poderia ser igual ao bacharelado mais Didática, como no modelo 3+1, e sim um

curso equivalente, apenas em grau, ao bacharelado.

Entretanto, não se pode negar a fixação de uma importante vertente na

formação do professor de Matemática para a Educação Básica, que é a criação de

disciplina relacionada a estudos de conhecimentos relacionados aos objetos de

ensino do profissional em formação, mesmo que essa disciplina não tenha sido

utilizada, nas IES, para esse fim e sim para, apenas, revisar esses objetos. Também

não se pode negar a mudança de rumo no que diz respeito à concentração da

formação pedagógica no final do curso, mesmo que essa formação não tenha sido,

necessariamente, vinculada à formação matemática do futuro professor. Vemos, na

normatização do curso de licenciatura em Matemática de 1962, o que podemos

chamar de início de uma mudança de modelos na formação do professor de

Matemática para a Educação Básica.

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Após três anos da normatização do curso de licenciatura em Matemática de

1962, devido à necessidade de se formar rapidamente professores para ciclo

ginasial, demanda criada em decorrência da obrigatoriedade do ensino de grau

Primário, estabelecida pela Constituição de 1934 e reafirmada nas Constituições de

1937 e 1946, assim como pela LDB de 1961, uma nova modalidade de curso de

formação de professores para a Educação Básica foi criada: as licenciaturas

destinadas à formação de professores para o ciclo ginasial, intituladas licenciaturas

de 1.º grau.

No entanto, cabe o esclarecimento de que nem todos os alunos tinham

acesso ao ginásio em função do exame de admissão ao grau Médio de ensino. Com

a extinção do exame de admissão, iniciada em 1969, e a ampliação significativa do

número de vagas, a necessidade por professores passou a ser muito maior,

sobretudo a partir de 1971, ano em que foi criada a escola obrigatória de oito anos –

escola de 1.º grau, conforme abordamos à frente.

As licenciaturas de 1.º grau, no total de três – Letras, Estudos Sociais e

Ciências – formariam professores para o ciclo ginasial nas seguintes áreas: Línguas;

História e Geografia, Organização Política e Social; Ciências Físico-Biológicas e

Matemática.

Pela urgência em se formar professores de iniciação às Ciências Físico-

Biológicas para o ciclo ginasial, disciplina que fora criada pelo CFE na década de

1960, o curso de licenciatura de 1.º grau em Ciências foi o primeiro a ser efetivado.

No Parecer do Conselho Federal de Educação, n.º 81 de 12 de fevereiro de

1965, que aborda o currículo mínimo do curso de Ciências, o seu relator justifica a

criação prioritária desse curso e caracteriza os seus alunos egressos como

professores polivalentes:

[...]. Teríamos dessa forma uma espécie de professor polivalente que se justificaria sob vários aspectos: em primeiro lugar, o professor ginasial não há de ser um especialista; em segundo lugar, do ponto de vista pedagógico formativo, o ideal seria que, no primeiro ciclo, o mesmo mestre pudesse ocupar-se de mais de uma disciplina; finalmente, porque viria contribuir para resolver o problema da falta de professores. (CONSELHO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, 1979, p. 563)

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Criavam-se dessa forma duas categorias de professores habilitados a lecionar

Ciências, Matemática, Biologia, Física e Química no curso secundário: o professor

polivalente, com uma visão limitada sobre conteúdos específicos do curso

secundário, mas, teoricamente, alargada sobre as Ciências em nível do ciclo

ginasial, e que poderia atuar, preferencialmente, nesse ciclo lecionando Ciências ou

Matemática; e o professor especialista, com uma visão, teoricamente, mais alargada

sobre conteúdos específicos do curso secundário, porém limitada sobre as Ciências

para o ciclo ginasial, e que poderia atuar tanto nesse ciclo, com as disciplinas ou

Ciências ou Matemática, quanto no ciclo colegial, lecionando uma de quatro

disciplinas: Matemática, Biologia, Física ou Química. A primeira categoria de

professores seria formada no curso de licenciatura de 1.º grau em Ciências, ao

passo que a segunda categoria seria formada nas licenciaturas específicas para

cada disciplina.

Diferentemente da duração do curso de licenciatura em Matemática, o curso

de licenciatura de 1.º grau em Ciências teve sua duração fixada em três anos.

Quanto à carga horária, nada foi especificado no Parecer CFE 81/65. Mas, por meio

de uma Indicação43 da década de 1970, que abordava a necessidade da revisão da

carga horária dos cursos de licenciatura de 1.º grau, é possível identificar que a

carga horária do referido curso de Ciências era de 2.430 horas.

O Parecer CFE 81/65 trazia, também, uma sugestão de conteúdos e a

distribuição das disciplinas para o curso de Ciências: a Matemática seria estudada

em dois anos, contendo álgebra, aritmética e teoria dos números, geometria

analítica, cálculo, probabilidade e estatística; a Física seria estudada em dois anos e

abordaria a acústica, o calor, a óptica, o magnetismo e a eletricidade, e a mecânica

geral; a Química também seria estudada em dois anos e conteria química geral,

inorgânica, orgânica e analítica; as Ciências Biológicas seriam estudadas nos três

anos e abordariam a biologia geral, a zoologia e a botânica; o Desenho Geométrico

e os Elementos de Geologia seriam estudados em um ano cada; a Instrumentação

para o Ensino seria ministrada juntamente com a Física; e para a Didática do ensino

das Ciências deveria ser dada especial ênfase, com o objetivo de instrumentar o

professor à iniciação do adolescente aos conhecimentos das Ciências.

43

Indicação CFE n.º 7, de 9 de dezembro de 1971. As Indicações eram documentos elaborados pelos Conselheiros com o objetivo de orientar os trabalhos realizados pelos membros do CFE.

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A Portaria Ministerial n.º 46 de 26 de fevereiro de 1965, que normatizou o

curso de Ciências, licenciatura de 1.º grau, diferentemente do Parecer, fixou, de

forma sucinta, o currículo mínimo por meio da seguinte lista de disciplinas:

Matemática;

Física Experimental e Geral;

Química – Geral, Inorgânica e Analítica, Orgânica;

Ciências Biológicas – Biologia Geral, Zoologia, Botânica;

Elementos de Geologia;

Desenho Geométrico; e

Matérias pedagógicas, de acordo com o Parecer CFE n.º 292/62.

No seu quarto e último artigo, a referida Portaria fixava que:

Enquanto não houver número suficiente de professores com quatro anos de curso e sempre que se registre esta falta, os concluintes da

licenciatura de Ciências poderão lecionar, no 2.º ciclo44

, as

disciplinas estudadas no currículo. (CONSELHO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, 1979, p. 564)

Sendo assim, a formação de professores para lecionar Matemática em ambos

os ciclos do antigo curso secundário passou a ser aquém da formação proposta na

licenciatura em Matemática criada em 1962, uma vez que as disciplinas

relacionadas à área específica da Matemática, quando comparadas às disciplinas do

curso normatizado em 1962, foram reduzidas. Quanto à formação pedagógica,

manteve-se o que era previsto no Parecer CFE 292/62.

Não bastasse a redução das disciplinas de conhecimento matemático, em

1972, o curso de licenciatura de 1.º grau em Ciências teve sua carga horária

reduzida de 2.430 horas para 1.500 horas, pela Resolução do Conselho Federal de

Educação n.º 1, de 17 de janeiro de 1972, devido a uma solicitação da diminuição de

um ano em todos os cursos superiores do país, feita pelo então Ministério da

Educação e Cultura ao Conselho Federal de Educação. A nova carga horária do

curso deveria ser integralizada em, no mínimo, um ano e meio e, no máximo, em

quatro anos letivos, mantendo-se o currículo mínimo fixado em 1965.

44

Atual ensino médio.

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As normatizações para os cursos de licenciatura em Matemática e de

licenciatura de 1.º grau em Ciências, que formaram professores de Matemática para

a Educação Básica nas décadas de 1960 e 1970, vigorariam, teoricamente, até

meados de 1970. Tais cursos deveriam ter sido gradativamente extintos devido à

criação de apenas um único curso com o objetivo de formar professores de Ciências

e Matemática para o ciclo ginasial e ou Matemática, ou Física, ou Química ou

Biologia para o ciclo colegial do antigo curso secundário: o curso de licenciatura

curta em Ciências, com suas habilitações plenas.

Decorrente de uma Reforma Universitária ocorrida em 1968 – Lei Federal n.º

5.540, de 28 de novembro de 1968, e Decreto-Lei Federal n.º 464, de 11 de

fevereiro de 1969 – e de uma nova Lei de Diretrizes e Bases promulgada em 1971,

uma nova estruturação dos cursos de formação de professores para a Educação

Básica, assim como uma nova nomenclatura para as etapas do sistema de ensino

brasileiro, foram implementadas.

Quanto aos dois primeiros níveis do referido sistema, a LDB de 1971 os

nomeou de Ensino de 1.º grau, com oito anos de duração, o primeiro nível, que seria

ministrado aos alunos dos sete aos 14 anos, e de Ensino de 2.º grau, com duração

de três ou quatro anos, dependendo das habilitações específicas, o segundo nível.

No seu artigo 30.º, a LDB de 1971 fixou a formação mínima dos docentes

para lecionar nas séries do Ensino de 1.º grau e do Ensino de 2.º grau:

Exigir-se-á como formação mínima para o exercício do magistério: a) no ensino de 1.º grau, da 1.ª à 4.ª séries, habilitação específica de 2.º grau; b) no ensino de 1.º grau, da 1.ª à 8.ª séries, habilitação específica de grau superior, ao nível de graduação, representada por licenciatura de 1.º grau, obtida em curso de curta duração; c) em todo o ensino de 1.º e 2.º graus, habilitação específica obtida em curso superior de graduação correspondente a licenciatura plena. § 1.º Os professores a que se refere a letra "a" poderão lecionar na 5.ª e 6.ª séries do ensino de 1.º grau se a sua habilitação houver sido obtida em quatro séries ou, quando em três, mediante estudos adicionais correspondentes a um ano letivo que incluirão, quando for o caso, formação pedagógica. § 2.º Os professores a que se refere a letra "b" poderão alcançar, no exercício do magistério, a 2.ª série do ensino de 2.º grau mediante estudos adicionais correspondentes no mínimo a um ano letivo.

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§ 3.º Os estudos adicionais referidos aos parágrafos anteriores poderão ser objeto de aproveitamento em cursos ulteriores. (BRASIL, 1971)

De acordo com o artigo 31.º da LDB de 1971, as licenciaturas de 1.º grau e os

estudos adicionais referidos no artigo imediatamente anterior deveriam ser

ministrados em universidades ou em faculdades isoladas que manteriam cursos de

duração plena. Indiretamente, determinava-se a existência de duas modalidades de

formação em um mesmo curso: a licenciatura de 1.º grau e a licenciatura plena.

Tal fato teve como consequência a Indicação nº 22, de 8 de fevereiro de

1973, do Conselho Federal de Educação, no sentido de orientar os princípios e as

normas a serem observadas na reorganização dos cursos de licenciatura para se

adequarem à LDB de 1971.

Na referida Indicação 22, o Conselheiro que a elaborou observa que, de

acordo com a Lei de Diretrizes e Bases de 1971, as habilitações para o exercício do

magistério deveriam ser cumulativas: formação mínima de 2.º grau para exercício

docente até a quarta série do 1.º grau; mais um ano letivo sobre a formação anterior

para o exercício até a sexta série; licenciatura de 1.º grau, em cursos de Educação

Superior, para exercício docente até a oitava série; mais um ano letivo sobre o ano

anterior para o exercício até a segunda série do 2.º grau; e licenciatura plena para o

exercício docente até o último ano do 2.º grau. Nas palavras do referido Conselheiro,

“pode o menos, quem pode o mais, desde que para um e outro possua habilitação

específica”. (CONSELHO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, 1979, p. 29, grifo nosso)

Utilizando a observação que fizera sobre as habilidades cumulativas e citando

um dos artigos da Reforma Universitária de 1968, o Conselheiro que elaborou a

Indicação CFE 22/73 justificou a necessidade da reorganização das licenciaturas

existentes na época, as quais, ou formavam o professor para as séries finais do

Ensino de 1.º grau, ou formavam o professor para o Ensino de 1.º e 2.º graus. Tal

reorganização deveria ser no sentido de propor, em um mesmo curso, habilitação

geral, que formaria professores para o primeiro caso, e específica, que formaria o

professor para o segundo caso. Isso faria com que o número de cursos de formação

inicial de professores para a Educação Básica fosse menor.

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Quanto à constituição dessas novas licenciaturas, o referido Conselheiro

assim explicou na Indicação CFE 22/73:

Em cada licenciatura haverá, portanto, duas ordens de habilitações: a habilitação geral, que denomina o próprio curso e que determina o campo, e habilitações específicas, tantas quantas possíveis e proporcionadas pelo estabelecimento, relacionadas com partes daquele campo cujo estudo se aprofunda, em duração plena, para o ensino de disciplina ou o exercício de especialidade pedagógica. (CONSELHO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, 1979, p. 32)

Com relação às duas ordens de habilitações, denominou-se licenciatura de 1.º

grau, de curta duração, mais conhecida como licenciatura curta, a que se

encarregaria da habilitação geral, e licenciatura plena a que se encarregaria, além

da geral, de uma habilitação específica.

Tendo por base todas as disciplinas fixadas pelo CFE para os Ensinos de 1.º

e de 2.º graus, cinco licenciaturas foram propostas, em outra Indicação45 de 1973, o

que teoricamente reduziria o número de cursos superiores de formação inicial de

professores para menos de um terço do total que existia à época. Tais cursos foram

denominados Licenciaturas de Educação Geral e distribuídos em três campos:

Campo de Ciências:

(1) Licenciatura em Ciências – habilitação geral em Ciências e específica

em, ou Matemática, ou Física, ou Química, ou Biologia.

Campo de Estudos Sociais:

(2) Licenciatura em Estudos Sociais – habilitação geral em Estudos

Sociais e específica em, ou Geografia, ou História, ou Organização

Social e Política do Brasil, ou Educação Moral e Cívica.

Campo de Comunicação e Expressão:

(3) Licenciatura em Letras – habilitação geral em Letras e específica em,

ou Língua Portuguesa, ou Língua Estrangeira Moderna, ou Língua

Clássica, todas com os necessários estudos literários;

(4) Licenciatura em Educação Artística – habilitação geral em Educação

Artística e específica em, ou Música, ou Artes Plásticas, ou Desenho,

ou Artes Cênicas;

45

Indicação CFE 23, de 8 de fevereiro de 1973.

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(5) Licenciatura em Educação Física – habilitação geral em Educação

Física e específica em, ou Ginástica e Atletismo, ou Técnicas

Desportivas, ou Recreação.

No que se segue, abordamos o curso de licenciatura em Ciências,

especificamente com relação à formação do professor para lecionar Matemática na

5.ª a 8.ª séries do então Ensino de 1.º grau – licenciatura curta – ou no Ensino de 2.º

grau – licenciatura plena.

Diferentemente do ocorrido na década de 1960, o novo curso de licenciatura

em Ciências foi o segundo a ser normatizado na década de 1970, sendo o primeiro,

o curso de Educação Artística.

Aprovado em 7 de junho de 1974, o Parecer do Conselho Federal de

Educação n.º 1.687 embasou a Resolução n.º 30, do mesmo Conselho, de 11 de

julho de 1974, que normatizou o novo curso de licenciatura em Ciências.

Conforme consta do Parecer CFE 1.687/74, a regra para a criação daquelas

licenciaturas era a formação para uma área do Ensino de 1.º grau e para uma

disciplina do Ensino de 2.º grau. Dessa forma, o curso de licenciatura em Ciências

deveria contar com um currículo contendo uma parte comum, uma parte

diversificada, a Instrumentação para o Ensino – que deveria estar presente em

ambas as partes –, e a formação pedagógica, podendo ser ministrada a posteriori,

em instituições em que o curso de licenciatura em Ciências fosse de modalidade

plena.

A parte comum teria dois objetivos particulares: (1.º) oferecer, por meio de

uma apresentação abrangente do universo científico, bases para o prosseguimento

de estudos com vistas a uma ciência como habilitação específica; e (2.º) constituir-

se de um núcleo suficiente ao preparo do professor polivalente que lecionaria a

disciplina de Matemática e a disciplina de Ciências Físicas e Biológicas e Programas

de Saúde, no Ensino de 1.º grau.

Já a parte diversificada teria como objetivo dar formação específica aos

professores polivalentes para que pudessem lecionar, no Ensino de 2.º grau, uma e

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somente uma das seguintes disciplinas, dependendo da habilitação estudada:

Matemática, Física, Química ou Biologia.

Para a parte comum, a Resolução CFE 30/74 fixou, como currículo mínimo,

as seguintes disciplinas: Matemática, Física, Química, Elementos de Geologia e

Biologia. Já no Parecer CFE 1.687/74 encontra-se, de forma mais detalhada, o que

deveria ser abordado em cada uma dessas disciplinas:

Matemática: além de uma visão das abordagens clássica e moderna,

conceitos e técnicas do cálculo diferencial e integral, da álgebra das

matrizes e de probabilidade e estatística;

Física: também o clássico e o moderno juntamente com o

experimental e o teórico, formando um conjunto integrado de

conhecimentos;

Química: os principais tópicos da química geral, inorgânica e orgânica;

Elementos de Geologia: os processos endógenos e exógenos de

constituição e evolução do globo terrestre; e

Biologia: conhecimentos de botânica e de zoologia, com ênfase nos

aspectos dinâmicos, e ecologia.

Quando comparada a disciplina Matemática desse currículo mínimo da parte

comum com a disciplina Matemática, fixada em 1965 para o curso de licenciatura de

1.º grau em Ciências, a qual continha álgebra, aritmética e teoria dos números,

geometria analítica, cálculo e probabilidade e estatística, observa-se a supressão da

aritmética e teoria dos números e da geometria analítica, além da troca da álgebra

pela álgebra das matrizes. Especialmente essa troca é devida ao Movimento da

Matemática Moderna que inscreveu o assunto Matrizes no rol da matemática

escolar.

Para a parte diversificada, especificamente para habilitação em Matemática,

foram fixadas, como mínimo, cinco disciplinas, as quais poderiam ser desdobradas:

Cálculo Diferencial e Integral, Álgebra, Análise Matemática, Geometria e Matemática

Aplicada.

Assim como na parte comum, o Parecer CFE 1.687/74 aborda com maior

precisão o que deveria, no mínimo, ser estudado em cada uma das cinco disciplinas.

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Em se tratando do Cálculo Diferencia e Integral e da Análise Matemática, a

fixação dos mínimos indicava que o primeiro deveria ser abordado no sentido mais

prático e a segunda abordaria o rigor matemático e forneceria a base teórica para o

primeiro, conforme pode ser observado no extrato a seguir, do Parecer CFE

1.687/74:

Cálculo Diferencial e Integral – Em prosseguimento ao estudo iniciado na parte comum, abrangendo derivada e integrais de funções de diversas variáveis. Devem fixar-se os conceitos básicos simultaneamente à apresentação das técnicas imprescindíveis à sua aplicação. Uma apresentação rigorosa e dedutiva dos assuntos focalizados será feita na Análise Matemática. [...] Análise Matemática – Compreendendo os principais tópicos tratados no Cálculo Diferencial e Integral, agora com maior rigor. A matéria servirá para fornecer base teórica ao Cálculo estudado anteriormente com sentido mais prático. (CONSELHO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, 1979, p. 126)

Pode-se entender que no Cálculo Diferencial e Integral da parte comum

seriam objetos de estudo as derivadas e integrais de funções de uma variável, e que

tanto na parte comum quanto na diversificada, os conceitos e as técnicas deveriam

ser priorizados.

Por sentido mais prático, supomos que talvez a aplicação ocorresse no

interior da própria Matemática, como no cálculo de áreas, no cálculo de volumes e

no estudo das curvas. Essa suposição deve-se ao fato de que a disciplina de

Matemática Aplicada, conforme consta do Parecer CFE 1.687/74, garantiria a

aplicação dos conceitos matemáticos em outras áreas:

Matemática Aplicada – Comportando o estudo das equações diferenciais, com integração de disciplinas matemáticas para análise de problemas do mundo real. É desejável que se focalizem temas da Física, da Biologia e de outros campos com a matemática necessária para resolvê-los. Isto ensejará a abordagem funcional da álgebra das matrizes, das séries de Fourier, das transformadas de Laplace e de Fourier, das equações diferenciais ordinárias e parciais. Também nesta matéria incluem-se os tópicos de Matemática Finita, que geralmente se iniciam com a análise combinatória e conduzem ao estudo de probabilidades (teoria dos conjuntos, permutações e combinações de funções discretas, primeiras noções de “grafos”, redes e álgebra de Boole); o que não impede a sua apresentação individualizada nos currículos plenos, conforme o plano de cada instituição. (CONSELHO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, 1979, p. 126)

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Nota-se no extrato anterior a possibilidade do desmembramento da disciplina

em mais de uma para a abordagem do conteúdo fixado. Além disso, entendemos

que presença da probabilidade na parte comum seria a introdução para a sua

aplicação mais abstrata na parte diversificada.

Quanto ao ensino da Álgebra, o Parecer CFE 1.687/74 deixa clara a

importância de se apresentar para o aluno a aplicação da Álgebra Linear em outras

áreas, como a Economia, por exemplo:

Álgebra – Incluindo Álgebra Linear e Estruturas Algébricas (grupos, anéis e corpos). Importa considerar as inúmeras aplicações que a primeira, pela via da teoria das matrizes e da programação linear, vem encontrando na Economia, na Sociologia, nas Ciências Agrárias e na Engenharia. (CONSELHO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, 1979, p. 126)

Por outro lado, a fixação do mínimo em Álgebra pode ter delineado

oficialmente as tradicionais disciplinas de Introdução à Álgebra, com o estudo dos

grupos, dos anéis e dos corpos, conforme atualmente ainda se observa nas

licenciaturas em Matemática e também nos bacharelados, não somente de

Matemática.

Já com relação à Geometria, ela deveria se basear, por exemplo, no modelo

de Hilbert, em nível de revisão da Geometria Elementar, porém não a abordando

somente de forma axiomática, mas trabalhando sua importância na história, assim

como a importância da Matemática na cultura do mundo ocidental.

Geometria – Consistindo numa revisão da geometria elementar, de um ponto de vista avançado, com um modelo axiomático (v.g.: Hilbert). O estudo terá um sentido histórico, crítico filosófico, dando-se ênfase à importância da matéria, e da Matemática em geral, na cultura do mundo ocidental. (CONSELHO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, 1979, p. 126)

No que se refere à Instrumentação para o Ensino, o Parecer CFE 1.687/74

deixava claro, pela primeira vez, que ela deveria estar presente em todas as

disciplinas do curso e que todos os professores dela se encarregariam, desde a

parte comum do currículo até a parte diversificada, uma vez que o objetivo

relacionado a essa atividade era o de preparar o futuro professor para sua atuação

profissional. Para tanto, essa instrumentação deveria ocorrer por meio da

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[...] montagem, avaliação, crítica e melhoria de experiências adequadas à escola de 1.º e de 2.º graus, pelo desenvolvimento de recursos auxiliares para o ensino e pela familiarização do aluno com as técnicas de excursão e outras formas de realizar a pesquisa escolar ou observar aplicações de ciência. (CONSELHO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, 1979, p. 127-128)

No que concerne à parte comum, a instrumentação, de acordo com o relator

do Parecer CFE 1.687/74, deveria “infundir ao aluno-mestre a vivência do método

científico em si mesmo e como objeto de ensino” (CONSELHO FEDERAL DE

EDUCAÇÃO, 1979, p. 128), ou seja, deveria proporcionar ao aluno a apropriação

das regras básicas de procedimentos necessários à sua própria formação e

formação dos seus futuros alunos, uma visão positivista de ciência, baseada em

uma “perspectiva técnica que concebe o ensino como uma ciência aplicada”

(PEREZ GOMES, 1998, p. 353). À parte diversificada, caberia dar foco às

características particulares e implicações metodológicas do campo, no caso, o

ensino da Matemática (CONSELHO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, 1979). Nesse ponto

específico da parte diversificada, consideramos um avanço na normatização do

curso de licenciatura em Ciências de 1974 em relação à normatização do curso de

licenciatura em Matemática de 1962, uma vez que para focar os aspectos indicados

seriam necessários, teoricamente, conhecimentos sobre pesquisas da área da

Educação Matemática.

Por outro lado, questionamo-nos: como associar a instrumentação para o

ensino a disciplinas da parte diversificada que não explicitamente abordariam

conhecimentos relacionados aos objetos de ensino do futuro professor, e os

Fundamentos de Matemática Elementar não mais fariam parte do currículo mínimo

do curso? A resposta a essa pergunta não é dada nos documentos do CFE e, talvez

pela falta de uma resposta específica, em alguns cursos – talvez na maioria deles –

essa instrumentação não ocorrera da forma como foi fixada, como é o caso do curso

no qual nos formamos.

Parece-nos familiar essa proposta da Instrumentação para o Ensino, no que

se refere à sua associação a todas as disciplinas do curso, quando a comparamos

com a prática como componente curricular, que consta das Diretrizes Curriculares

Nacionais, conforme abordamos na próxima subseção. E, talvez, pelas mesmas

dificuldades que nos deparamos atualmente, como a de associar essa prática à

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grande parte das disciplinas da atual licenciatura em Matemática, é que essa

instrumentação não tenha ocorrido da forma como foi normatizada.

Teoricamente, conforme consta no artigo terceiro da Resolução CFE 30/74, a

Instrumentação para o Ensino deveria ser o alicerce para a formação pedagógica,

que era composta pelas disciplinas de Psicologia da Educação, de Didática e de

Estrutura e Funcionamento do Ensino de 2º Grau, além da Prática de Ensino sob a

forma de Estágio. Assim como a Instrumentação para o Ensino, a formação

pedagógica não poderia ser entendida como um curso a parte do currículo da

licenciatura em Ciências, mas sim “combinar-se aos aspectos de conteúdo e com

eles formar um todo homogêneo”. (CONSELHO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, 1979,

p. 128).

Quanto à duração mínima para a formação pedagógica, fixou-se um oitavo da

duração total fixada como horas de trabalho acadêmico do curso de Ciências.

Para se trabalhar todo esse currículo mínimo determinado pelo CFE, a

duração do curso de licenciatura em Ciências foi fixada em 2.800 horas da seguinte

forma:

1.800 horas integralizadas em tempo total variável de dois a quatro

anos letivos, para a licenciatura curta; e

2.800 horas integralizadas em tempo total variável de três a sete anos

letivos, com termo médio de quatro anos, para a licenciatura plena,

admitindo-se aproveitamento de estudos da licenciatura curta.

Na prática, significou que, após cursar a licenciatura curta, com um acréscimo

de 1.000 horas de estudos, o aluno poderia completar a carga para uma habilitação

específica e receberia o diploma de licenciatura plena. Grosso modo, o aluno

estudaria, na melhor das hipóteses, todas as disciplinas do currículo mínimo fixado

para a parte diversificada em Matemática nessas 1.000 horas, o que,

particularmente, consideramos pouco tempo para o conteúdo e atividades que foram

fixados.

Ao se comparar o currículo mínimo do curso de licenciatura em Ciências de

1974 com o fixado para o curso de licenciatura em Matemática de 1962, percebe-se

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grande diferença entre ambos os cursos que formaram professores de Matemática

para a Educação Básica. O quadro a seguir poderá ajudar na identificação dessas

diferenças.

Quadro 7 – Comparativo das disciplinas fixadas nos currículos mínimos dos cursos de formação de professores de Matemática para a Educação Básica de 1962 e 1974

Curso de licenciatura em Matemática

de 1962 Curso de licenciatura plena em Ciências

de 1974

Form

ação n

ão

pe

dag

ógic

a

Desenho Geométrico e Geometria Descritiva

---

Instr

um

enta

ção

para

o E

nsin

o

Fundamentos de Matemática Elementar: análise e revisão de conteúdos da Educação Básica

---

Física Geral

Física: o clássico e o moderno juntamente com o experimental e o

teórico

Cálculo Diferencial e Integral Cálculo Diferencial e Integral

Geometria Analítica ---

Álgebra Álgebra

Cálculo Numérico --

--- Análise Matemática

--- Geometria

--- Matemática Aplicada

---

Matemática: cálculo diferencial e integral, álgebra das matrizes,

probabilidade e estatística

--- Química: geral, orgânica e inorgânica

--- Elementos de Geologia

--- Biologia: botânica, zoologia e ecologia

Form

ação

peda

góg

ica

Psicologia da Educação – Aprendizagem e Adolescência

Psicologia da Educação

Elementos de Administração Escolar

Estrutura e Funcionamento do Ensino de 2.º grau

Didática Didática

Prática de Ensino sob a forma de Estágio

Prática de Ensino sob a forma de Estágio

Disciplinas para o aprofundamento das

especialidades relativas ao curso ---

No que se refere à formação não pedagógica, observa-se, em primeiro lugar,

uma reserva do currículo para a formação, básica que seja, nas áreas de Biologia,

Química e Geologia, além da Física que já se fazia presente desde os primeiros

cursos de formação de professores de Matemática para a Educação Básica.

Em se tratando especificamente de Matemática, foram excluídas as

disciplinas de Desenho Geométrico e Geometria Descritiva, Fundamentos de

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117

Matemática Elementar, Geometria Analítica e Cálculo Numérico. Por outro lado,

foram acrescidas as disciplinas de Geometria e Matemática aplicada, além do

retorno da disciplina Análise Matemática. Diferentemente da fixação do currículo

mínimo do curso de licenciatura em Matemática de 1962, não se sabe os conteúdos

que as disciplinas deveriam abordar.

Ressalta-se a exclusão da disciplina Fundamentos de Matemática Elementar,

incluída no currículo de 1962 para abordar conhecimentos relacionados aos objetos

de ensino dos futuros professores. A falta dessa disciplina acarretaria, em nossa

opinião, dificuldades na implementação da Instrumentação para o Ensino, assim

como havia sido proposta no Parecer CFE 1.687/74 e oficializada na Resolução CFE

30/74, uma vez que, teoricamente, essas eram as únicas disciplinas que abordariam

conteúdos da Educação Básica.

Com relação à formação pedagógica, não há grandes diferenças a serem

pontuadas: apenas observa-se a mudança do nome da disciplina Elementos de

Administração Escolar para Estrutura e Funcionamento do Ensino de 2.º grau, dado

ao fato, segundo consta em documentos do CFE, de que o foco, com o nome fixado

em 1962, fora dado apenas ao aspecto administrativo da escola e era necessário,

além desse aspecto, abordar o seu funcionamento e objetivos.

Pontuamos o que, em nossa opinião, fora um grande diferencial na fixação do

currículo mínimo do curso de Ciências, da década de 1970, quando comparado aos

outros currículos: a Instrumentação para o Ensino, que pode ser considerada uma

inovação. Nessa inovação, procurou-se, teoricamente, abordar aspectos

relacionados ao ensino de Matemática na Educação Básica por meio da montagem

de atividades, da crítica e da melhoria de experiências, entre outros.

Entendemos que essa instrumentação, ainda que o objetivo proposto para

essas atividades estivesse baseado em uma perspectiva técnica de ensino,

significou o início de um avanço na formação do professor de Matemática para a

Educação Básica. Esse avanço pode ser considerado os primeiros passos no

sentido do que Shulman (1986, 1987) denominou de categoria de conhecimento

pedagógico do conteúdo. Ao mesmo tempo, observamos uma contradição na

proposição dessa Instrumentação para o Ensino e a exclusão de disciplinas, do

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118

currículo mínimo, que abordariam conhecimentos relacionados aos objetos de

ensino do futuro professor.

Entretanto, mesmo sendo um diferencial, a presença da Instrumentação para

o Ensino em todo decorrer do curso, assim como fixada, não corrobora para que a

teoria e a prática estivessem vinculadas, de modo a satisfazer a visão de unidade

apresentada por Candau e Lelis (1993), uma vez que é nitidamente visível a não

relação entre os supostos conteúdos que seriam trabalhados nas disciplinas e as

atividades explicitadas no Parecer CFE 1.687/74, com relação à referida

instrumentação.

Com a estrutura e currículo mínimo para o curso de licenciatura em Ciências,

fixados em 1974, as instituições de ensino superior teriam, de acordo com uma

Resolução46 do CEF, até o ano de 1978 para adequar-se ao novo curso de

licenciatura em Ciências, transformando os cursos anteriormente criados. Porém,

como veremos na próxima subseção, isso não ocorreu.

O curso de formação de professores de Matemática para a Educação Básica,

criado na década de 1970, com habilitação curta em Ciências e habilitação plena em

Matemática, formou professores, juntamente com os dois cursos criados na década

de 1960, até o inicio dos anos 2000 quando, por força da Lei de Diretrizes e Bases

da Educação Nacional de 1996, foram extintos, dando lugar aos atuais cursos de

licenciatura em Matemática.

3.4 Normatizações para os cursos de licenciatura em Matemática da década de

2000

O objetivo nesta subseção é abordar as Diretrizes Curriculares gerais para os

cursos superiores de formação de professores para a Educação Básica e Diretrizes

Curriculares específicas, para os cursos de licenciatura em Matemática, decorrentes

da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, de 1996.

Antes, porém, abordamos um documento elaborado por um Grupo de

Trabalho instituído pelo Ministério da Educação e que foi discutido em âmbito

46

Resolução CFE n.º 37, de 14 de fevereiro de 1975.

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119

nacional, utilizado como base para a definição das DCNs: a Proposta de Diretrizes

para a Formação Inicial de Professores da Educação Básica, em Cursos de Nível

Superior, à qual denominamos neste texto de Proposta de Diretrizes.

A importância desse documento – talvez o primeiro documento elaborado e

discutido, em nível nacional, com entidades representativas da educação e a

sociedade, em geral – nos motiva a abordá-lo de forma específica, uma vez que as

DCNs estão alicerçadas nele.

3.4.1 A Proposta de Diretrizes para a Formação Inicial de Professores da

Educação Básica e alguns fatos que a antecederam

O curso de licenciatura em Ciências, proposto no ano de 1974, foi alvo de

críticas, principalmente por não garantir formação científica e pedagógica mínimas

aos futuros professores dos antigos Ensinos de 1.º e 2.º graus, dado ao

descompasso entre a amplitude do currículo mínimo prescrito pelo Conselho Federal

de Educação e a duração para a integralização do referido curso de Ciências47.

(Curi, 2000)

Ante as críticas e a prematura formação demonstrada por egressos desses

cursos, comentada por Curi (2000), no ano de 1978 uma Resolução48 do CFE

prorrogou, até ulterior deliberação, o prazo para que as instituições transformassem

seus cursos de Ciências de 1.º grau, de licenciaturas em Matemática, Física,

Química, e Ciências Biológicas, em licenciatura em Ciências, de graduação curta

e/ou plena, conforme era previsto em resolução do CFE, de 1975. Essa prorrogação

tinha como objetivo, de acordo com o contido nos documentos oficiais, discutir

melhor esse curso de Ciências.

47

Sobre esse motivo, conjecturamos que os autores da referida crítica a fizessem, não com base no limite máximo de duração de sete anos, mas no termo médio ou no limite mínimo de duração, de quatro e três anos, respectivamente, uma vez que essa duração máxima não fora praticada pela maioria das faculdades particulares e universidades públicas. Entendemos que um curso de licenciatura com cinco, seis ou sete anos, teria menos procura que um curso de três ou quatro anos de uma instituição concorrente, no caso das particulares, e que um curso de sete, seis ou cinco anos não atrairia candidatos para se formar como licenciado nas IES públicas. 48

Resolução CFE n.º 5, de 16 de junho de 1978.

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Como a ulterior deliberação não ocorreu49, pode-se afirmar que, da década de

1960 até meados da década de 2000, a formação inicial de professores de

Matemática para os atuais anos finais do Ensino Fundamental e Ensino Médio

ocorrera em vários tipos de curso: pode ter ocorrido em cursos de licenciatura em

Matemática, criado em 1962, cursos de licenciatura em Ciências de 1.º grau, criado

em 1965 e reformulado em 1972, ou cursos de licenciatura em Ciências, criado em

1974. Todos esses cursos citados, teoricamente, tiveram seu funcionamento regular

até o ano 2005, prazo dado pelo Ministério da Educação50 para que as instituições

de ensino superior obrigatoriamente tivessem que se adequar a uma nova legislação

educacional.

Além dos cursos mencionados no parágrafo anterior, é sabido que os

professores de Matemática para a Educação Básica também puderam ter sua

formação obtida nos Programas Especiais de Formação Pedagógica. Tais

programas foram criados em 199751, com o objetivo de formar, como professores, os

portadores de diplomas de nível superior em cursos relacionados à habilitação

pretendida, tendo em vista a falta de docentes habilitados para atuar na Educação

Básica.

Os referidos Programas foram normatizados com carga horária de 540 horas

e estruturados em três núcleos: o núcleo contextual, que abordaria o processo de

ensino e aprendizagem; o núcleo estrutural, que abordaria, dentre outros, os

conteúdos específicos, sua organização sequencial e avaliação; e o núcleo

integrador, que abordaria os problemas concretos enfrentados pelos alunos, na

prática de ensino52.

49

Tal fato pode ser comprovado por alguns documentos, como no histórico do Curso de Licenciatura em Química da Universidade Federal de Mato Grosso, que cita a consulta feita em 1984 ao Conselho Federal de Educação em que o Reitor solicita a reconversão do Curso de Licenciatura em Ciências para as antigas Licenciaturas de Matemática, Física, Química e Biologia, o que foi autorizado pelo Secretário Executivo do Conselho Federal de Educação, com base na Resolução CFE n.º 5 de 1978, ou seja, como não havia até aquele ano a obrigatoriedade de conversão, a Universidade Federal de Mato Grosso pôde reconverter o Curso de Ciências para as antigas Licenciaturas em Matemática, Física, Química e Biologia. 50

Resolução CNE/CP nº 2, de 27 de agosto de 2004. 51

Resolução CNE/CP n.º 2, de 26 de junho de 1997. 52

Tais cursos serviram também para “capacitar” os licenciados em Ciências de 1.º grau e de Ciências de curta duração a lecionarem no ensino médio, pois qualquer aluno com um diploma de ensino superior poderia cursar esses Programas Especiais para obter uma licença equivalente à licenciatura plena. Esse fato pode ser comprovado no Mérito do Parecer CNE/CP n.º 26 de 2001, em que o

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Faz-se pertinente registrar que esses Programas, além da formação de

professores da Educação Básica, substituíram os antigos Cursos Superiores de

Formação de Professores de Disciplinas Especializadas no Ensino de 2.º Grau,

Esquemas I e II, criados em 197153, para formar professores dos cursos técnicos do

então 2.º grau, nas áreas econômicas primária, secundária e terciária. Dessa forma,

professores de Matemática para a Educação Básica também puderam ter sua

formação nesses cursos, não específicos para essa formação, mas que foram

utilizados para “capacitar” professores a lecionarem algumas disciplinas na

Educação Básica.

Com a promulgação da Constituição de 1988, uma nova lei federal para

constituir as diretrizes e bases da educação nacional foi sancionada. Tal lei, a Lei de

Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996, tinha como objetivo, entre outros,

resolver problemas originados nas normatizações anteriores da Educação Superior,

como os do curso de licenciatura em Ciências, que foi duramente criticado e não

implementado na maior parte das instituições públicas de Educação Superior.

De acordo com o estabelecido pela LDBEN, o ensino brasileiro passou a ser

composto pela Educação Básica – tendo como integrantes a educação infantil, o

Ensino Fundamental e o Ensino Médio – e pela Educação Superior.

Diferentemente da LDB de 1971, que abordou indiretamente a Educação

Superior ao estabelecer as formações mínimas para o exercício da profissão

docente, a LDBEN tratou diretamente o Ensino de nível Superior em capítulo

específico que estabeleceu finalidades e abrangências da Educação Superior,

indicou critérios para o funcionamento de cursos e ainda determinou as atribuições

das instituições de ensino superior. Além disso, abordou elementos relacionados aos

profissionais da educação, em título específico, estabelecendo, dentre outras, a

formação desses profissionais.

relator indica a interpretação inadequada da Resolução que criara aqueles Programas Especiais, o que serviu como uma via rápida para a plenificação de licenciaturas curtas. 53

Portaria Ministerial n.º 432, de 19 de julho de 1971. Esses Cursos deveriam ter sido transformados em Curso de Graduação de Professores da Parte de Formação Especial do Currículo de Ensino de 2.º Grau, licenciatura plena, até 1980, por força da Resolução CFE n.º 3, de 28 de fevereiro de 1977. Mas, na prática, isso não ocorreu em todo o território nacional.

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122

No que tange às atribuições concedidas às IES pela LDBEN, a fixação das

grades curriculares, observadas as diretrizes gerais pertinentes, foi uma delas, ou

seja, os currículos mínimos dos cursos de nível superior não mais seriam

determinados pelo CFE.

No artigo 62.º da LDBEN, observam-se os novos rumos indicados para a

formação dos professores para a Educação Básica:

Art. 62. A formação de docentes para atuar na Educação Básica far-se-á em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em universidades e institutos superiores de educação, admitida, como formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental, a oferecida em nível médio, na modalidade Normal. (BRASIL, 1996, p. 27.839)

Decretava-se, portanto, o fim das licenciaturas de 1.º grau e licenciaturas

curtas, criadas, respectivamente, nas décadas de 1960 e 1970, uma vez que a

formação dos profissionais para atuar em sala de aula, especificamente nos anos

finais do Ensino Fundamental e no Ensino Médio, deveria ocorrer em cursos de

licenciatura de graduação plena. Com relação à formação dos profissionais para

atuarem na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, o

Ministério da Educação proporia, em um documento do ano 2000, que ela também

deveria ser efetuada em curso de nível superior, ao invés do Ensino de nível Médio,

conforme previsto no artigo 62.º da LDBEM.

No Decreto54 que regulamentou, em 1999, o artigo 62.º da LDBEN, é

oficializado que o Conselho Nacional de Educação, o CNE, que substituiu o CFE em

1994, seria o responsável por definir as diretrizes curriculares nacionais para a

formação de professores para a Educação Básica. Além disso, nesse decreto é

indicado que essas diretrizes deveriam “[...] assegurar formação básica comum,

distribuída ao longo do curso, atendidas as diretrizes curriculares nacionais definidas

para a Educação Básica e tendo como referência os parâmetros curriculares

nacionais [...]”, ou seja, deveriam levar em conta os citados documentos na definição

das diretrizes para a formação inicial do futuro professor, profissional que teria esses

mesmos documentos como base para sua função docente. (BRASIL, 1999, p. 5)

54

Decreto n.º 3.276, de 6 de dezembro de 1999.

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123

Com base no estabelecido pela LDBEN e nas experiências vivenciadas

historicamente, no ano 2000 um documento intitulado Proposta de Diretrizes

Curriculares para a Formação Inicial de Professores da Educação Básica, em

Cursos de Nível Superior foi encaminhado pelo Ministério da Educação ao CNE para

que fosse avaliado. Esse documento resultou do trabalho de um Grupo composto

por representantes das então Secretarias de Educação Fundamental, de Educação

Média e Tecnológica, e de Educação Superior, do MEC.

Para os autores da Proposta de Diretrizes, algumas questões históricas nos

campos institucional e curricular precisariam ser enfrentadas na elaboração de

diretrizes para os novos cursos de formação inicial de professores para a Educação

Básica, que seriam criados no início deste século. Para identificar essas questões,

elaboramos a Figura 4.

Figura 4 – Questões históricas que precisariam ser enfrentadas na definição das DCNs, indicadas na Proposta de Diretrizes

Dessas questões, abordamos as seguintes:

Campo institucional:

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124

A submissão da proposta pedagógica à organização educacional.

Na Proposta de Diretrizes, a organização institucional deveria dar condições à

organização curricular e não determiná-la, como até então ocorria. Exemplo desse

fato, citado no documento, era o funcionamento das licenciaturas como anexos dos

bacharelados, em que se aproveitavam professores e disciplinas comuns, o que

contribuiu para a falta de identidade dos cursos de formação de professores para a

Educação Básica.

Outro aspecto citado pelos autores da Proposta de Diretrizes é a falta de

espaços institucionais para a realização de um planejamento entre as IES e os

campos de estágios que recebem os futuros profissionais da educação.

Lembramos que na fixação dos currículos mínimos, nas décadas de 1960 e

1970, os estágios foram previstos, porém nada fora oficialmente fixado com relação

à responsabilidade de as IES instituírem espaços institucionais para sua realização,

por meio de parcerias com as escolas de Educação Básica que receberiam os

estagiários. Dessa forma, os alunos eram – e ainda continuam sendo, na maior parte

das licenciaturas brasileiras – os responsáveis pela busca de um campo para

estagiar. E, conforme é de conhecimento público, muitas vezes os possíveis campos

para estágios não aceitam a realização dessas atividades ou, quando do contrário,

têm a maior parte dos seus docentes não vendo com bons olhos a presença dos

estagiários em sala de aula, o que acaba contribuindo para a concepção de visões

deturpadas dessa atividade.

Distanciamento entre os cursos de formação e o exercício da

profissão.

A falta de articulação entre os cursos de formação e as escolas de Ensino

Fundamental ou Médio impede, segundo os autores da Proposta de Diretrizes, que o

objetivo de formação profissional dos estágios seja alcançado, uma vez que a falta

de parcerias e convênios, com responsabilidades definidas e compartilhadas, faz

com que os campos de estágio não participem ativamente de um projeto de

formação.

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125

Seria necessário, portanto, que as IES com cursos de formação de

professores se aproximassem das instituições de Educação Básica para, em

conjunto, proporcionarem formação adequada aos futuros professores (BRASIL,

2000) e essa aproximação poderia oferecer as condições para a criação dos

espaços institucionais abordados na segunda questão, anteriormente abordada.

Distanciamento entre as instituições de formação de professores e

os sistemas de ensino da Educação Básica.

Para que os futuros professores pudessem ser inseridos no exercício

profissional, com autonomia, os autores da Proposta de Diretrizes advertem que os

alunos das licenciaturas deveriam ser apresentados aos documentos oficiais da

Educação Básica, como Diretrizes, Parâmetros e Referenciais Curriculares,

elaborados pelo Ministério da Educação, assim como as propostas curriculares

estaduais e municipais e demais materiais pedagógicos oficiais. O propósito seria de

se tornarem aptos a trabalhar com eles, tanto em sala de aula quanto nas

preparações de suas atividades. Desse modo, tais documentos precisariam fazer

parte da formação do futuro professor e não renunciados como até então eram,

conforme afirmam os autores da Proposta de Diretrizes.

Vemos, nessa questão a ser enfrentada, a defesa dos autores para a inclusão

de uma das três categorias de conhecimento eleitas por Shulman (1986) como

necessárias à formação do professor: conhecimento do currículo.

Campo curricular:

Tratamento inadequado do conteúdo.

“Uma coisa é conhecer um assunto como mero usuário e outra é analisar

esse mesmo assunto como um professor que vai ensiná-lo.” (BRASIL, 2000, p.26)

Na perspectiva do tratamento inadequado, a Proposta de Diretrizes contém

indicações de que seria necessário quebrar a rotina de se colocar o foco do Ensino

de nível Superior exclusivamente nos conteúdos da área científica em que se

formará o futuro professor. De acordo com autores da referida proposta, os cursos

de formação precisariam contemplar o estudo de conhecimentos relacionados aos

objetos de ensino do futuro professor, considerando-se a transposição didática, de

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forma a habilitá-lo a identificar obstáculos epistemológicos, obstáculos didáticos55,

relação entre os objetos de ensino e situações do mundo real, entre outros, que não

podem ser ignorados na formação inicial de um professor.

Observa-se, na Proposta de Diretrizes, a crítica que era feita com relação à

falta de disciplinas que teriam como objetivo trabalhar conhecimentos relacionados

aos objetos de ensino dos futuros professores. Como vimos na subseção anterior,

disciplinas com esse objetivo não foram fixadas nos currículos mínimos, assim como

nos currículos dos cursos criados antes das décadas de 1960 e 1970. Quando

aparentemente fixados, como no caso da disciplina de Fundamentos de Matemática

Elementar, no curso de licenciatura em Matemática de 1962, não foram

necessariamente cumpridos os objetivos determinados, que era dar, aos futuros

professores, um conhecimento mais aprofundado dos assuntos matemáticos

lecionados na Educação Básica, e procurar enquadrar esses assuntos no conjunto

das teorias matemáticas. Conjecturamos, com base em nossa experiência e leituras,

que essa disciplina, na maioria dos cursos, tenha servido mais para revisar

conteúdos da Educação Básica.

Desarticulação entre conteúdos pedagógicos e conteúdos de

ensino.

A ideia de dois grupos de disciplinas, um relacionado à formação específica

da área, como ciência, e outro relacionado à formação pedagógica, precisaria ser

superada, assim como a abordagem, apenas, de questões de ordem geral da

didática nas áreas, pois é necessária, para a docência na Educação Básica, a

articulação entre os conteúdos e os seus respectivos tratamentos didáticos. Por

esse motivo, indicavam os autores da Proposta de Diretrizes, a relação entre a

aprendizagem dos conteúdos e a aprendizagem de suas especificidades didáticas

deveria ser o lema na formação de professores. (BRASIL, 2000)

Cumpre lembrar que mesmo presente nos cursos do modelo 3+1 e nos

currículos mínimos fixados nas décadas de 1960 e 1970, as disciplinas de formação

pedagógicas não necessariamente estiveram articuladas às demais disciplinas dos

55

Apesar de os autores da Proposta Curricular não identificarem diretamente as bases conceituais utilizadas para o termo obstáculos, deduzimos que esse termo esteja baseado nos trabalhos de Guy Brousseau, autor relacionado na bibliografia da referida proposta.

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cursos, sobretudo nos cursos de formação de professores de Matemática, que

tiveram a maioria de suas disciplinas voltadas à Matemática de nível superior. Um

exemplo explicitamente apresentado pelos autores da Proposta de Diretrizes é o

caso da Didática: em nenhum currículo fixado pelo Ministério da Educação na

segunda metade do século anterior há, oficialmente, disciplina de didática específica

da área em que se pretende formar o professor.

Concepção restrita de prática.

A visão “aplicacionista da teoria”, derivada do polo que supervaloriza os

conhecimentos teóricos e acadêmicos e despreza a prática, e a “ativista da prática”,

derivada do polo que despreza a dimensão teórica dos conhecimentos e

supervaloriza os conhecimentos pedagógicos, proporcionam, segundo os autores da

Proposta de Diretrizes, cursos diferentes. A primeira visão proporcionaria cursos de

teorias prescritivas e analíticas que utilizariam os momentos de estágios para a

aplicação dessas teorias na prática. A segunda proporcionaria cursos em que teoria

e prática coexistiriam, mas totalmente desvinculadas (BRASIL, 2000, p. 29). Esses

cursos podem ser associados, respectivamente, às visões associativa e dissociativa

da relação entre a teoria e a prática, abordadas por Candau e Lelis (1993).

Ainda na visão dos referidos autores, uma concepção mais ampla de prática

precisaria ser levada em consideração. Nela, a prática deveria ser entendida como

uma dimensão do conhecimento que estaria presente nos momentos em que se

trabalha a reflexão sobre a atividade profissional e, dessa forma, permearia toda a

formação e não apenas o momento dos estágios. Assim, a ideia que deveria ser

superada é de que a sala de aula é o espaço reservado à teoria, ao passo que no

estágio é que se daria conta da prática. (BRASIL, 2000)

A superação dessa questão apontada pelos autores da Proposta de Diretrizes

acabaria tornando-se a principal característica que diferenciaria a normatização dos

cursos de formação de professores para a Educação Básica, elaborada na primeira

década do século 20, das demais normatizações que já abordamos.

Inadequação do tratamento da pesquisa;

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Os novos cursos de formação de professores precisariam superar a visão de

professor como aplicador de teorias e passar a enxergá-lo como “um profissional

com domínio sobre sua prática, com autonomia e capacidade para produzir

conhecimento pedagógico e para tomada de decisões.” (BRASIL, 2000, p. 30) Para

tanto, seria necessário, na visão dos autores da Proposta de Diretrizes, que os

novos cursos de formação não apenas apresentassem algumas pesquisas

desenvolvidas na área, mas que capacitassem os futuros professores a interpretá-

las e as utilizá-las na prática pedagógica.

Com a finalidade de enfrentar essas questões históricas – do campo

institucional e do campo curricular –, a vinculação entre a formação e o exercício

profissional deveria ser, na concepção dos autores do documento em questão, a

base para as diretrizes dos cursos de formação inicial de professores para a

Educação Básica. Sendo assim, a relação entre a teoria e a prática precisaria,

conforme consta da Proposta de Diretrizes, permear os novos cursos e, portanto, a

concepção de competências56 deveria ser o núcleo dessas diretrizes, uma vez que

competência estaria relacionada à forma de atuação e não poderia ser construída

apenas pela comunicação de ideias. (BRASIL, 2000)

Para a construção dessas competências, algumas ações deveriam ser

consideradas, segundo os autores da Proposta e Diretrizes, a fim de que as

dimensões de atuação do professor pudessem ser trabalhadas nas licenciaturas,

proporcionado, dessa forma, o aprendizado, dentre outros, dos diferentes domínios

do conhecimento profissional. Com relação a essas ações, os referidos autores

indicam:

Oferecer aos futuros professores, sempre que necessário, condições

de aprendizagem dos conhecimentos da escolaridade básica;

Articular os conteúdos a serem ensinados na Educação Básica com

suas respectivas didáticas;

Ir além da seleção dos conteúdos de ensino da Educação Básica;

Ter as avaliações como orientadoras do trabalho dos formadores.

56

Da mesma forma que os autores da Proposta Curricular não identificam diretamente as bases conceituais utilizadas para o termo obstáculos, não abordam sobre qual concepção de competências estariam utilizando. Entretanto, nas referências bibliográficas são relacionados trabalhos de Perrenoud.

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Quanto às competências, no total de 30, os autores da Proposta de Diretrizes

as listam em seis dimensões de atuação do professor, a saber: o comprometimento

com os valores estéticos, políticos e éticos, inspiradores da sociedade democrática;

a compreensão do papel social da escola; o domínio dos conteúdos a serem

socializados; o domínio do conhecimento pedagógico; o conhecimento de processos

de investigação; e o gerenciamento do próprio desenvolvimento profissional.

Já como diferentes domínios do conhecimento profissional do professor, os

respectivos autores relacionam: a cultura geral e profissional; os conhecimentos

sobre crianças, jovens e adultos; o conhecimento sobre a dimensão cultural, social,

política e econômica da educação; os conteúdos da área de ensino; o conhecimento

pedagógico; e o conhecimento experiencial.

Sobre a cultura geral, ela abrangeria desde as diferentes produções da

cultura de massa e da cultura popular e erudita, até as informações atualizadas

sobre o que acontece no país e no mundo. Já com relação à cultura profissional, ela

estaria relacionada com aquilo que é próprio do exercício da profissão do docente,

incluindo, por exemplo, o conhecimento sobre as organizações sindicais e as

associações de caráter científico e cultural que congregam os profissionais da

educação. (BRASIL, 2000) Esse domínio de conhecimento, em nossa concepção,

teria como fonte de estudos os materiais e definições do processo institucionalizado

de educação, uma das quatro fontes citadas por Shulman (1987) como necessárias

na construção de uma base de conhecimentos para a formação de professores que

lecionarão disciplinas na Educação Básica. Dentre outras, essa fonte abrangeria a

estrutura da profissão docente, conforme abordamos no segundo capítulo deste

estudo.

Quanto aos conhecimentos sobre crianças, jovens e adultos, os autores da

Proposta de Diretrizes destacam que seria importante que ela enfatizasse uma visão

global, independentemente da etapa da escolaridade que o futuro professor atuaria,

e aprofundasse os estudos sobre as especificidades da faixa etária com o qual se

trabalhará.

Assim como no domínio anterior, entendemos que esse domínio teria como

base de estudos fonte citada por Shulman (1987): a fonte das pesquisas sobre a

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escolaridade, as organizações sociais, a aprendizagem humana, o ensino e seu

desenvolvimento, e outros fenômenos sociais e culturais que afetam o trabalho dos

professores que, dentre outras, está associada à literatura acadêmica das áreas do

ensino e aprendizagem e do desenvolvimento humano.

Com relação ao conhecimento sobre a dimensão cultural, social, política e

econômica da educação, ela envolveria, por exemplo, conhecimentos sobre o papel

social do professor, a importância dos símbolos, costumes, atitudes, expressões e

valores que os jovens, adultos e crianças utilizam ou confrontam no ambiente

escolar. Ou seja, envolveria assuntos que permitissem que o futuro professor

compreendesse os significados que os alunos, suas famílias e a comunidade

atribuem à escola e aos elementos a ela relacionados, como o ensino e a

aprendizagem, por exemplo57. (BRASIL, 2000)

Sobre os conteúdos das áreas de ensino, os autores do documento advertem

que nas diretrizes não apenas fosse indicado o estudo dos conteúdos conceituais

das áreas de ensino da Educação Básica, denominados por eles de conteúdos

específicos da área, mas também que fossem indicados conteúdos que

possibilitariam ao futuro professor o desenvolvimento do seu trabalho em uma

perspectiva disciplinar e interdisciplinar. Para tanto, as ciências humanas e sociais, a

cultura, as artes e os conhecimentos sobre aspectos da realidade e questões

sociais, constituiriam conhecimentos essenciais para que o futuro professor pudesse

criar as condições e mediações necessárias para o ensino como, por exemplo, as

contextualizações. (BRASIL, 2000)

Em se tratando do penúltimo domínio do conhecimento profissional indicado

na Proposta de Diretrizes – o conhecimento pedagógico –, os autores desse

documento listam vários temas que o comporiam, como, por exemplo, a

transposição didática; o currículo e desenvolvimento curricular; a avaliação das

aprendizagens; e a pesquisa dos processos de aprendizagem e produção de

conhecimento pedagógico pelo professor.

57

Embora não citado nas referências bibliográficas pode-se identificar, nesse domínio de conhecimento profissional, a preocupação investigada por Bernard Charlot, sobre a relação com o saber, que procura, em linhas gerais, compreender como um sujeito dá sentido à sua experiência, principalmente escolar, e como apreende o mundo para construir-se e transformar-se.

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131

Dessa forma, esse domínio teria como base três das quatro fontes de estudos

indicadas por Shulman (1987) como necessárias na construção de uma base de

conhecimentos para a formação de professores que atuarão na Educação Básica, a

saber: (1) métodos de estudos em disciplinas de conteúdo; (2) materiais e definições

do processo institucionalizado de educação; e (3) pesquisas sobre a escolaridade,

as organizações sociais, a aprendizagem humana, o ensino e seu desenvolvimento,

e outros fenômenos sociais e culturais que afetam o trabalho dos professores.

Com relação ao último domínio, o conhecimento experiencial, ele seria

referente ao conhecimento construído na experiência e não poderia ser substituído

por conhecimentos sobre a experiência. Seria o elo entre a teoria e a prática, uma

vez que “[...] saber – e aprender – um conceito, ou uma teoria é muito diferente de

saber – e aprender – a exercer um trabalho. Trata-se, portanto, de aprender a ‘ser’

professor” (BRASIL, 2000, p. 58) e teria como fonte de estudos a sabedoria da

prática em si, a quarta fonte citada por Shulman (1987) como necessária na

construção de uma base de conhecimentos para a formação de professores que

atuarão na Educação Básica.

Esses dois últimos domínios de conhecimento – conhecimento profissional e

conhecimento experiencial – podem ser associados, em nossa visão, à categoria de

conhecimento pedagógico do conteúdo, definido por Shulman (1986, 1987).

Além disso, entendemos que as quatro fontes de estudos, definidas por

Shulman (1987) e defendidas por ele como necessárias na apropriação de

conhecimentos para a formação de professores que atuarão na Educação Básica,

se fazem presentes na constituição dos diferentes domínios do conhecimento

profissional do professor, indicados pelos autores da Proposta de Diretrizes.

Ao abordarem a organização curricular, os autores da Proposta de Diretrizes

indicam que a parte prática, fixada em 800 horas por uma Resolução de 199958,

deveria permear todo o curso de formação inicial de professores, em três diferentes

tempos e espaços. O primeiro seria no interior das disciplinas, espaço em que a

aprendizagem deveria ser orientada pela ação-reflexão-ação, cuja principal

estratégia didática seria a resolução de situações-problema. O segundo seria em

58

Resolução CNE/CP n.º 1, de setembro de 1999.

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132

estágios, que deveriam ser efetuados em escolas da Educação Básica, com o

principal objetivo de abordar as diferentes dimensões profissionais. E o terceiro seria

em tempo e espaço curricular específico, que deveria ser uma atividade relacionada

aos estágios, mas realizada nas IES, com a participação de todos os docentes do

curso, além dos alunos, em que se promoveria a articulação dos diferentes

conteúdos de formação, mediante a reflexão das vivências pessoais dos

licenciandos, principalmente, nos estágios.

Ainda com relação à organização curricular, consta do referido documento

enviado pelo MEC ao CNE, em 2000, que as DCNs deveriam prever diferentes

dimensões de formação para garantir: (a) uma formação que seria comum a todos

os futuros professores, independentemente das etapas da Educação Básica; (b)

uma formação que seria comum a todos os futuros professores especialistas, ou

seja, aqueles que lecionariam nos anos finais do Ensino Fundamental e no Ensino

Médio; (c) uma formação que seria específica para todos os professores da mesma

área; e (d) uma formação em campos específicos de atuação, que poderiam ser

escolhidos pelas IES. A tabela a seguir apresenta como seria dividida a carga

horária de 3.200 horas, definida na mesma resolução que fixou a carga da parte

prática, entre as dimensões de formação em um curso para professores

especialistas em uma disciplina, como Matemática.

Tabela 3 – Proposta do MEC para a distribuição da carga horária de 3.200 horas entre as dimensões de formação em cursos superiores que teriam como egressos professores especialistas

Dimensões Razão Carga horária

Formação comum a todos os professores da Educação Básica 20% 640 horas Formação comum a todos os professores especialistas 5% 160 horas Formação específica dos professores das diferentes áreas/disciplinas de conhecimento

62,5% 2.000 horas

Formação em campos específicos de atuação 2,5% 80 horas Estágios 10% 320 horas

Total 100% 3.200 horas

Fonte: Brasil (2000), adaptado.

Para orientar o percurso da formação inicial dos professores especialistas, os

autores da Proposta de Diretrizes apresentam um quadro indicando o quanto de

cada dimensão de formação deveria ser contemplado, em cada ano do curso. A

figura a seguir ilustra essas quantidades para um curso com duração de quatro

anos, conforme era proposto.

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133

1.º ano do curso

A A C C C

E

2.º ano do curso

A B C C C

E

3.º ano do curso

A C C

C D

E D

4.º ano do curso

C C D D

D

E

A Formação comum a todos os professores da Educação Básica

B Formação comum a todos os professores especialistas

C

Formação específica dos professores das diferentes áreas/disciplinas de conhecimento – conteúdos ampliadores (o ir além)

D

Formação específica dos professores das diferentes áreas/disciplinas de conhecimento – perspectiva do ensino e da aprendizagem, incluindo a formação em campos específicos

E Estágios

Figura 5 – Percurso da formação inicial dos professores especialistas

Fonte: Brasil (2000), adaptado.

Observa-se, nas informações contidas na figura anterior, que durante toda a

duração do curso, a especificidade da área ou da disciplina deveria prevalecer em

relação aos conteúdos comuns.

Em ocasiões anteriores ao início da década de 2000, acreditamos não ter

havido, por parte dos órgãos responsáveis pela definição de leis e normas para a

Educação Superior, trabalhos com o objetivo igual ao do que foi realizado pelo

Grupo de Trabalho designado pelo MEC e entregue ao CNE, em 2000, para análise.

Embora não diretamente citados, mas presentes nas ideias apresentadas e,

consequentemente, constituintes das referências bibliográficas, a Proposta de

Diretrizes trazia consigo, mesmo que de forma implícita, conceitos discutidos por

educadores renomados, como, por exemplo, sobre a formação e o desenvolvimento

profissional, de Imbernón, sobre desenvolvimento de competências, de Perrenoud,

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sobre formação de profissionais reflexivos, de Schön, e sobre formação reflexiva de

professores, de Zeichner.

Caso fornecesse pistas de como articular esses conceitos, particularmente

acreditamos que o referido documento pudesse ter sua utilidade exponencialmente

valorizada.

3.4.2 As Diretrizes Curriculares Nacionais para os atuais cursos de licenciatura

brasileiros

Atualmente, todas as licenciaturas plenas determinadas pela Lei de Diretrizes

e Bases da Educação Nacional de 1996 são normatizadas por documentos gerais e

documentos específicos para cada área ou disciplina ao qual se destina o curso de

formação do professor.

Os documentos gerais para todas as atuais licenciaturas brasileiras

constituem-se da Resolução aprovada pelo Conselho Pleno do Conselho Nacional

de Educação, número 1 de 18 de fevereiro de 2002, que institui Diretrizes

Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica e a

Resolução aprovada pelo mesmo Conselho, número 2, de 19 de fevereiro de 2002,

que institui a duração e carga horária mínimas dos cursos de licenciatura.

A Resolução CNE/CP 1/2002 tem por base o Parecer CNE/CP número 9, de

8 de maio de 2001, com nova redação para o item 3.6, que aborda os estágios, dado

pelo Parecer CNE/CP número 27, de 2 de outubro de 2001. Já a Resolução CNE/CP

2/2002 tem por base o Parecer CNE/CP número 28, de 2 de outubro de 2001.

Nesta subseção abordamos esses documentos, dando, às vezes, maior

ênfase aos pareceres, pois neles temos condições de fazer análises mais apuradas,

uma vez que, geralmente, as resoluções apenas oficializam, de forma resumida, o

que nos pareceres é abordado de forma mais detalhada. É também nos pareceres

que encontramos, na maioria das vezes, os aspectos históricos, as justificativas e a

fundamentação dos elementos que embasam as normas oficializadas pelas

resoluções.

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135

Conforme consta do relatório no Parecer CNE/CP 9/2001, uma comissão

formada por conselheiros das duas Câmaras do CNE – Câmara de Educação

Básica e Câmara de Educação Superior – fez 21 reuniões, no período de agosto de

2000 a maio de 2001, para avaliar a Proposta de Diretrizes encaminhada ao

Conselho Nacional de Educação, em maio de 2000, pelo MEC. Dessas reuniões,

participaram, também, dois dos sete integrantes do Grupo de Trabalho que elaborou

a referida Proposta.

Além dessas reuniões internas, nos meses de março e abril de 2001 a

Proposta de Diretrizes foi submetida à apreciação da comunidade educacional em

cinco audiências públicas regionais, uma reunião institucional, uma reunião técnica e

uma audiência pública nacional, as quais congregaram participantes de várias

associações nacionais, sociedades brasileiras – dentre elas, a Sociedade Brasileira

de Educação Matemática –, vários conselhos nacionais, fóruns e outros.

De tais reuniões e audiências, um documento final foi apresentado ao

Conselho Pleno do CNE, que fez a última análise e o colocou em votação,

originando, dessa forma, o Parecer CNE/CP 9/2001, que utiliza, em grande parte, o

texto e a estrutura da Proposta de Diretrizes, com as devidas complementações e,

algumas vezes, supressões ou modificações.

O referido Parecer é iniciado com uma rápida análise do contexto educacional

das décadas de 1980 e 1990, com o objetivo de embasar a proposta das Diretrizes

Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica, objeto

desse documento.

Na citada análise inicial é destacada a preparação inadequada do professor

como uma das dificuldades encontradas na elaboração de ações para a melhoria da

Educação Básica, elaboração essa vista como uma importante etapa “para a

promoção do desenvolvimento sustentável e para a superação das desigualdades

sociais.” (BRASIL, 2001b, p. 4)

Consta do Parecer CNE/CP 9/2001 que, devido às determinações da LDBEN

e em virtude da elaboração dos Subsídios para a Elaboração das Diretrizes

Curriculares para os Cursos de Formação de Professores, conduzida pela Secretaria

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136

de Educação Superior do MEC, as licenciaturas deveriam ganhar “[...] terminalidade

e integralidade própria em relação ao Bacharelado [...]”. (BRASIL, 2001b, p. 6).

Com relação à integralidade própria, entendemos que as licenciaturas não

mais poderiam depender dos bacharelados; seriam cursos independentes, o que

demandaria a definição de currículos próprios que não poderiam ser confundidos

com os do bacharelado e, tampouco, com os dos cursos caracterizados pelo modelo

3+1.

Já quanto à terminalidade, entendemos que as licenciaturas não mais

poderiam ser oferecidas com habilitações obtidas a partir da complementação de

estudos, ou seja, não mais deveriam ser curtas, com a possibilidade de habilitações

complementares, como até então as normas autorizavam, mas sim serem

licenciaturas plenas.

Para tanto, três princípios orientadores foram indicados no sentido de se

transformar a formação de professores em uma formação profissional, sendo essa

entendida como a “preparação voltada para o atendimento das demandas de um

exercício profissional específico que não seja uma formação genérica e nem apenas

acadêmica.” (BRASIL, 2001b, p. 29). Tais princípios eram:

Que a concepção de competência fosse nuclear;

Que houvesse coerência entre a formação oferecida e a prática

esperada do futuro professor, no que concerne, principalmente, à

simetria invertida59 e às concepções de aprendizagem, conteúdo e

avaliação; e

Que a pesquisa fosse um elemento essencial.

Esses princípios já denotariam a diferença entre o curso de formação de

professores para a Educação Básica que era proposto e os cursos que foram

criados anteriormente.

59

Uma explicação sobre o conceito de simetria invertida é apresentada no próprio Parecer CNE/CP 9/2001. Em poucas palavras, o professor aprende a lecionar em lugar similar àquele em que vai atuar, mas em uma situação invertida e isso faz com que deva haver coerência entre aquilo que é feito na formação e o que desse profissional se espera, futuramente. Além disso, o futuro professor viveu, como aluno, a etapa da escolaridade em que vai atuar e, certamente, toda sua trajetória escolar será utilizada para constituir o papel docente que ele exercerá (Brasil, 2001b).

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137

Sobre a concepção de competência utilizada, novamente não há

explicitações, assim como na Proposta de Diretrizes. Apenas há a indicação de que

a um profissional não basta ter o conhecimento sobre o seu trabalho, mas que é

fundamental que esse profissional saiba mobilizar tais conhecimentos,

transformando-os em ação e que para se adquirir as competências necessárias a

um professor, há a necessidade da articulação entre a teoria e a prática, por meio da

reflexão. (BRASIL, 2001b)

Com relação à simetria invertida, a relatora do Parecer CNE/CP 9/2001

enfatiza que não se trata de infantilizar a formação inicial do professor, mas sim de

tornar coerente o que se faz na formação e o que se espera que o aluno,

futuramente, desempenhe como docente. Já com relação às concepções de

aprendizagem, conteúdo e avaliação, a relatora reforça a ideia dos autores da

Proposta de Diretrizes ao indicar que todas elas estão relacionadas a competências

para o desenvolvimento da atividade profissional: a primeira, na construção de

significados e na compreensão das razões explicativas relacionadas a determinados

fatos; a segunda, no que se refere ao tratamento das três dimensões dos conteúdos,

essenciais para a aprendizagem – a conceitual, a procedimental e a atitudinal –; e a

terceira, no diagnóstico das lacunas da aprendizagem.

Com relação à pesquisa, é indicado, no Parecer CNE/CP 9/2001, que se deve

focar “o próprio processo de ensino e de aprendizagem dos conteúdos escolares na

Educação Básica” (BRASIL, 2001b, p. 35).

Identificados esses três princípios orientadores, conceber e organizar um

curso de formação inicial de professores para a Educação Básica, de acordo com o

contido no Parecer CNE/CP 9/2001, implicaria “[...] definir um conjunto de

competências necessárias à atuação profissional [...]” do futuro docente e tomá-lo

como norteador “[...] tanto da proposta pedagógica, em especial do currículo e da

avaliação, quanto da organização institucional e da gestão da escola de formação.”

(BRASIL, 2001b, p. 36-37)

Com relação à organização institucional, não abordada explicitamente sob

esse título na Proposta de Diretrizes do MEC, é reafirmado, no Parecer CNE/CP

9/2001, que os cursos de formação de professores da Educação Básica deveriam

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138

ser realizados autonomamente, em licenciaturas plenas com identidades próprias,

cujos formadores teriam, em sua jornada de trabalho, tempo e espaço para a

realização de atividades coletivas e individuais de formação. Essa formação, ainda

segundo o referido Parecer, se daria por meio de estudos e investigações sobre

questões relacionadas à aprendizagem dos futuros docentes.

Às instituições proponentes desses cursos, caberiam, conforme conta do

Parecer CNE/CP 9/2001, ações para tornar possível o trabalho de intercâmbios

sistemáticos entre as licenciaturas e as escolas básicas, por meio de projetos de

formação compartilhados, assim como iniciativas, parcerias e convênios para a

promoção de atividades culturais e acadêmicas. Comparada às propostas

apresentadas nos Pareceres que embasaram as normatizações dos cursos criados

na segunda metade do século anterior, observa-se, teoricamente, um avanço no que

diz respeito aos estágios, uma vez que há um indicativo de que essa atividade

deveria ocorrer por meio de parcerias que seriam buscadas pelas IES com as

escolas de ensino básico, não cabendo mais ao aluno a busca de um campo para

estagiar.

No que se refere à organização da matriz curricular, o Parecer CNE/CP

9/2001 difere da Proposta de Diretrizes do MEC que indicava quatro dimensões de

formação60 e, juntamente com os estágios, especificava a razão que cada um teria

de participação no curso. No referido Parecer, há a indicação de seis eixos em torno

das quais se articulariam as dimensões que deveriam ser contempladas nas

licenciaturas, bases pelas quais seriam indicados os tipos de atividades de ensino e

aprendizagem que direcionariam o planejamento e a ação dos professores

formadores dos futuros docentes da Educação Básica.

Tais eixos, cujas razões da duração total não constam indicadas, são:

Eixo articulador dos diferentes âmbitos de conhecimento profissional;

Eixo articulador da interação e comunicação e do desenvolvimento da

autonomia intelectual e profissional;

Eixo articulador entre disciplinaridade e interdisciplinaridade;

60

Formação comum a todos os futuros professores, de todas as etapas da Educação Básica; formação comum a todos os futuros professores especialistas; formação específica para todos os professores da mesma área; e formação em campos específicos de atuação.

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139

Eixo articulador da formação comum e da formação específica;

Eixo articulador dos conhecimentos a serem ensinados e dos

conhecimentos educacionais e pedagógicos que fundamentam a ação

educativa; e

Eixo articulador das dimensões teóricas e práticas.

Desse Parecer CNE/CP 9/2001, originou-se a Resolução CNE/CP 1/2002.

Porém, antes da aprovação dessa Resolução, o Parecer CNE/CP 27/2001

reformulou parte do contido no eixo articulador das dimensões teóricas e práticas,

mais especificamente o estágio: de acordo com essa reformulação, os estágios

deveriam iniciar a partir da segunda metade do curso e não no inicio dele, como

proposto no Parecer CNE/CP 9/2001 e na Proposta de Diretrizes do MEC.

De certa forma, essa modificação, a nosso ver, fazia sentido, uma vez que,

teoricamente, no início do curso os alunos não estariam, talvez, preparados para

algumas ações que constituem atividades como essa. E mesmo para as ações

possíveis, como a investigação documental de instituições de Educação Básica, por

exemplo, a falta de uma visão clara, pelo aluno, dos objetivos associados a essas

ações, acaba, muitas vezes, em nossa opinião, fazendo do estágio um conjunto de

atividades desconexas, sem sentido real para quem o faz.

Sobre a Resolução CNE/CP 1/2002, que basicamente oficializou o Parecer

CNE/CP 9/2001, destacamos alguns artigos.

No artigo primeiro é definido o que são as Diretrizes Curriculares Nacionais e

sua abrangência. Juntamente com o artigo sétimo, define-se o grau61 que os cursos

de formação de professores da Educação Básica, de nível superior, deveriam ter –

licenciatura plena –, mesmo os que seriam destinados à formação de professores

para a educação infantil e anos iniciais do Ensino Fundamental. Nota-se que a

fixação do Ensino Médio como formação mínima para os profissionais atuarem na

educação infantil e anos iniciais do Ensino Fundamental, conforme consta do artigo

62.º da LDBEN, que citamos anteriormente, foi modificada pelo CNE, de acordo com

a Proposta de Diretrizes.

61

Para o MEC, bacharelados, licenciaturas, tecnológicos, são os graus dos cursos de nível superior.

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Além disso, o artigo sétimo institui que essas licenciaturas deverão ser

autônomas, com identidades próprias, as quais fariam intercâmbios com as escolas

de Educação Básica, com o objetivo de desenvolver projetos que auxiliassem a

formação docente.

Art. 1.º As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica, em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, constituem-se de um conjunto de princípios, fundamentos e procedimentos a serem observados na organização institucional e curricular de cada estabelecimento de ensino e aplicam-se a todas as etapas e modalidades da Educação Básica. [...] Art. 7.º A organização institucional da formação dos professores, a serviço do desenvolvimento de competências, levará em conta que: I - a formação deverá ser realizada em processo autônomo, em curso de licenciatura plena, numa estrutura com identidade própria; [...] IV - as instituições de formação trabalharão em interação sistemática com as escolas de Educação Básica, desenvolvendo projetos de formação compartilhados; [...] (BRASIL, 2002a, p. 8)

Com relação aos projetos que deveriam ser construídos em parceria com as

escolas básicas, entendemos que eles poderiam funcionar com dupla finalidade: por

exemplo, nos estágios, poderia prever tanto a formação inicial dos licenciandos,

quanto a formação em serviço dos professores da escola básica, que não apenas

receberiam esses alunos como observadores, mas que participariam da sua

formação por meio de reflexões conjuntas com os estagiários e também com os

formadores das licenciaturas.

O artigo segundo da Resolução CNE/CP 1/2002 institui algumas orientações

que norteiam a organização curricular e, de forma implícita, indicam os objetivos

gerais das licenciaturas plenas. Esses objetivos deveriam, por sua vez, ser a base

para seleção de atividades que estariam em torno dos eixos articuladores das

dimensões que precisariam ser consideradas – os seis eixos indicados no Parecer

CNE/CP 9/2001, apresentados no 11.º artigo.

Art. 2.º A organização curricular de cada instituição observará [...] outras formas de orientação inerentes à formação para a atividade docente, entre as quais o preparo para: I - o ensino visando à aprendizagem do aluno; II - o acolhimento e o trato da diversidade; III - o exercício de atividades de enriquecimento cultural;

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IV - o aprimoramento em práticas investigativas; V - a elaboração e a execução de projetos de desenvolvimento dos conteúdos curriculares; VI - o uso de tecnologias da informação e da comunicação e de metodologias, estratégias e materiais de apoio inovadores; VII - o desenvolvimento de hábitos de colaboração e de trabalho em equipe. [...] Art. 11. Os critérios de organização da matriz curricular, bem como a alocação de tempos e espaços curriculares se expressam em eixos em torno dos quais se articulam dimensões a serem contempladas, na forma a seguir indicada: I - eixo articulador dos diferentes âmbitos de conhecimento profissional; II - eixo articulador da interação e da comunicação, bem como do desenvolvimento da autonomia intelectual e profissional; III - eixo articulador entre disciplinaridade e interdisciplinaridade; IV - eixo articulador da formação comum com a formação específica; V - eixo articulador dos conhecimentos a serem ensinados e dos conhecimentos filosóficos, educacionais e pedagógicos que fundamentam a ação educativa; VI - eixo articulador das dimensões teóricas e práticas. [...] (BRASIL, 2002a, p. 8)

Com relação à seleção dos conteúdos, assim como à ordem que cada

atividade/disciplina deveria ser proposta na matriz curricular dos cursos, o artigo

décimo da Resolução CNE/CP 1/2002 outorga às instituições de ensino superior a

competência para tais ações, encerrando, teoricamente62, o estabelecimento de

currículos mínimos. Por outro lado, recaía sobre essas instituições a transposição

didática dos conteúdos e, para isso, entendemos que elas deveriam guiar-se pelos

três princípios norteadores propostos no Parecer CNE/CP 9/2001 e instituídos no

terceiro artigo da Resolução CNE/CP 1/2002 – a competência como concepção

nuclear na orientação do curso; a coerência entre a formação oferecida e a prática

esperada do futuro professor; e a pesquisa com foco no processo de ensino e de

aprendizagem. (BRASIL, 2001b, 2002a)

Art. 10. A seleção e o ordenamento dos conteúdos dos diferentes âmbitos de conhecimento que comporão a matriz curricular para a formação de professores, de que trata esta Resolução, serão de competência da instituição de ensino, sendo o seu planejamento o primeiro passo para a transposição didática, que visa a transformar os conteúdos selecionados em objeto de ensino dos futuros professores. (BRASIL, 2002a, p. 8, grifo nosso)

62

Sobre essa competência, observamos que ela não foi totalmente outorgada às instituições, pois, conforme abordamos na subseção 3.4.3, existem, para os cursos de Matemática, conteúdos comuns obrigatórios a todas as licenciaturas, como também a todos os bacharelados.

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Sobre os diferentes âmbitos – ou domínios – de conhecimentos a que se

refere o artigo décimo, eles não são caracterizados na Resolução CNE/CP 1/2002 e

tampouco são explicitamente identificados: eles apenas são citados no parágrafo

terceiro do artigo sexto e somente com a leitura prévia do Parecer CNE/CP 9/2001,

é que se pode identificá-los.

Art. 6.º Na construção do projeto pedagógico dos cursos de formação dos docentes, serão consideradas: [...] § 3.º A definição dos conhecimentos exigidos para a constituição de competências deverá, além da formação específica relacionada às diferentes etapas da Educação Básica, propiciar a inserção no debate contemporâneo mais amplo, envolvendo questões culturais, sociais, econômicas e o conhecimento sobre o desenvolvimento humano e a própria docência, contemplando: I - cultura geral e profissional; II - conhecimentos sobre crianças, adolescentes, jovens e adultos, aí incluídas as especificidades dos alunos com necessidades educacionais especiais e as das comunidades indígenas; III - conhecimento sobre dimensão cultural, social, política e econômica da educação; IV - conteúdos das áreas de conhecimento que serão objeto de ensino; V - conhecimento pedagógico; VI - conhecimento advindo da experiência. (BRASIL, 2002a, p. 8)

Em se tratando da presença dos conteúdos da Educação Básica nos

currículos dos atuais cursos de licenciatura, o artigo quinto indica como deve ser

essa presença e também oficializa que esses cursos superiores têm, como um dos

seus objetivos, garantir a formação das competências do ensino básico ao aluno do

curso superior que ainda não as constituiu, conforme consta da Proposta de

Diretrizes.

Art. 5.º O projeto pedagógico de cada curso, [...], levará em conta que: I - a formação deverá garantir a constituição das competências objetivadas na Educação Básica; [...] III - a seleção dos conteúdos das áreas de ensino da Educação Básica deve orientar-se por ir além daquilo que os professores irão ensinar nas diferentes etapas da escolaridade; IV - os conteúdos a serem ensinados na escolaridade básica devem ser tratados de modo articulado com suas didáticas específicas; [...] Parágrafo único. A aprendizagem deverá ser orientada pelo princípio metodológico geral, que pode ser traduzido pela ação-reflexão-ação e que aponta a resolução de situações-problema como uma das estratégias didáticas privilegiadas. (BRASIL, 2002a, p. 8)

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Dos incisos III e IV podemos entender que os cursos de formação de

professores devem tratar com profundidade os conteúdos específicos das áreas de

formação, mas, sempre que possível, relacionando os conceitos estudados em nível

superior aos conteúdos que o futuro professor ensinará no Ensino Básico – os

conteúdos ampliadores abordados na Proposta de Diretrizes do MEC.

Já o parágrafo único do artigo quinto indica uma das metodologias que

deveriam estar presentes na maior parte do ensino nas licenciaturas plenas. Por

ação-reflexão-ação, pode-se melhor entender o que seria a prática no interior das

disciplinas, que é abordada nos artigos 12.º e 13.º da Resolução CNE/CP 1/2002.

Art. 12. Os cursos de formação de professores em nível superior terão a sua duração definida pelo Conselho Pleno, em parecer e resolução específica sobre sua carga horária. § 1.º A prática, na matriz curricular, não poderá ficar reduzida a um espaço isolado, que a restrinja ao estágio, desarticulado do restante do curso. § 2.º A prática deverá estar presente desde o início do curso e permear toda a formação do professor. § 3.º No interior das áreas ou das disciplinas que constituírem os componentes curriculares de formação, e não apenas nas disciplinas pedagógicas, todas terão a sua dimensão prática.

Art. 13. Em tempo e espaço curricular específico, a coordenação da dimensão prática transcenderá o estágio e terá como finalidade promover a articulação das diferentes práticas, numa perspectiva interdisciplinar. § 1.º A prática será desenvolvida com ênfase nos procedimentos de observação e reflexão, visando à atuação em situações contextualizadas, com o registro dessas observações realizadas e a resolução de situações-problema. § 2.º A presença da prática profissional na formação do professor, que não prescinde da observação e ação direta, poderá ser enriquecida com tecnologias da informação, incluídos o computador e o vídeo, narrativas orais e escritas de professores, produções de alunos, situações simuladoras e estudo de casos. § 3.º O estágio curricular supervisionado, definido por lei, a ser realizado em escola de Educação Básica, e respeitado o regime de colaboração entre os sistemas de ensino, deve ser desenvolvido a partir do início da segunda metade do curso e ser avaliado conjuntamente pela escola formadora e a escola campo de estágio. (BRASIL, 2002a, p. 8)

Nos três parágrafos do artigo 12.º fica evidente que o estágio não deverá ser

o único momento em que a prática estaria presente: ela permearia todo o curso e

estaria presente em todas as disciplinas, o que basearia o trabalho indicado nos

incisos III e IV do artigo quinto, anteriormente comentado – seria o elo entre os

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conceitos estudados no ensino superior e os conteúdos a serem ensinados pelos

futuros professores na Educação Básica, o que, talvez, no nosso entendimento,

seria um dos promotores do conhecimento pedagógico do conteúdo de Shulman

(1987).

Já o artigo 13.º indica como essa prática deveria ser conduzida: por meio da

observação e reflexão; e por meio do tratamento da utilização da tecnologia na

prática profissional, assim como do estudo da produção de alunos e a discussão

sobre as práticas de professores. Entendemos que a observação poderia ser

efetuada nos estágios e a reflexão iniciada nessa atividade fosse ampliada, no

coletivo, nas escolas de formação, a partir de discussões para a compreensão da

prática letiva. Quanto à produção de alunos e a discussão sobre as práticas de

professores, entendemos que ela não necessariamente precisaria emergir da

observação direta nos estágios, mas de pesquisas sobre o ensino das disciplinas

das áreas das licenciaturas: seria uma forma de colocar o aluno em contato com as

pesquisas, conforme um dos princípios norteadores propostos no Parecer CNE/CP

9/2001 e instituído no artigo terceiro da Resolução CNE/CP 1/2002.

Especialmente quanto ao estágio curricular, é instituído, conforme previsto na

Proposta de Diretrizes e no Parecer CNE/CP 9/2001, o sistema de colaboração

entre as escolas formadoras e as escolas básicas e que sua avaliação deveria ser

efetuada tanto por uma quanto por outra.

No que concerne à duração e carga horária das licenciaturas, a Resolução

CNE/CP 2/2002, que trata dessas matérias, teve como base o Parecer CNE/CP

28/2001, que consideramos rico em informações.

Cabe salientar que o Parecer CNE/CP 28/2001 dá nova redação ao Parecer

CNE/CP 21/2001. O motivo para essa substituição é indicado no histórico do

Parecer CNE/CP 28/2001: a existência de contradições entre o parecer substituído e

o conjunto das resoluções e pareceres que baseiam a formação docente,

contradições essas identificadas pela Assessoria Técnica da Coordenação de

Formação de Professores, da Secretaria de Educação Superior do MEC.

No Parecer CNE/CP 28/2001 são propostas, entre outros, definições para os

termos duração e carga horária de cursos superiores, sendo o primeiro, “[...] o tempo

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145

decorrido entre o início e o término de um curso de ensino superior necessário à

efetivação das suas diretrizes traduzidas no conjunto de seus componentes

curriculares [...]” e o segundo o “[...] número de horas de atividade científico-

acadêmica, [...] expresso em legislação ou normatização, para ser cumprido por uma

instituição de ensino superior, a fim de preencher um dos requisitos para a validação

de um diploma [...]”. (BRASIL, 2001c, p. 2)

Quanto à duração, o relator do Parecer CNE/CP 28/2001 enfatiza que ela é

um tempo mínimo que deve ser observado e não um tempo ideal que deva ser

necessariamente padronizado. Esse tempo ideal, na nossa concepção, deve se

adequar às variações dos Projetos Pedagógicos dos cursos, das condições em que

os cursos são oferecidos, do histórico de aproveitamento dos alunos, e outras

variáveis.

Com o objetivo de justificar a carga horária que estava sendo proposta, o

relator do Parecer CNE/CP 28/2001 citou alguns documentos, como o Parecer

CNE/CP 9/2001 e a LDBEN.

De acordo com o artigo 65.º da LDBEN, na formação docente, exceto a

formação para a educação superior, um mínimo de 300 horas deveria ser utilizado

para a prática de ensino, sendo essa prática discutida no Parecer CNE/CP 9/2001.

Com base na referida discussão, o relator do Parecer CNE/CP 28/2001 julgou

melhor fazer a distinção entre os termos prática de ensino e prática como

componente curricular, deixando o primeiro termo relacionado diretamente ao

estágio.

Quanto à prática como componente curricular, o relator a definiu como “uma

prática que produz algo no âmbito do ensino” que deverá ser planejada logo na

elaboração do projeto pedagógico e estar presente em todo curso, desde o seu

início. (BRASIL, 2001c, p. 9) Era essa a prática que deveria ser entendida como a

prática de ensino indicada na LDBEN. Pela sua importância na formação inicial do

docente, abordada no Parecer CNE/CP 9/2001, a carga horária de 300 horas

deveria, na concepção do relator, ser acrescida em um terço. Dessa forma, foi

proposto um total de 400 horas para essa atividade.

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146

Chamou-nos atenção a forma como o relator do Parecer CNE/CP 28/2001

abordou a prática nos cursos de formação de professores para a Educação Básica:

A prática não é uma cópia da teoria e nem esta é um reflexo daquela. A prática é o próprio modo como as coisas vão sendo feitas cujo conteúdo é atravessado por uma teoria. Assim a realidade é um movimento constituído pela prática e pela teoria como momentos de um dever mais amplo, consistindo a prática no momento pelo qual se busca fazer algo, produzir alguma coisa e que a teoria procura conceituar, significar e com isto administrar o campo e o sentido desta atuação. (BRASIL, 2001c, p. 7)

De certa forma, pode-se afirmar que essa concepção de prática insere-se na

categoria de conhecimento pedagógico do conteúdo, abordado por Shulman (1986,

1987), uma vez que a busca para se fazer algo e produzir alguma coisa que a teoria

procura conceituar, em um curso de formação de professores, pode estar

relacionado ao trabalho dos futuros professores tornarem compreensíveis e

ensináveis, aos seus futuros alunos, os objetos de ensino. Esse trabalho,

entendemos fazer parte do amálgama especial entre o conteúdo e a pedagogia,

conforme afirmou Shulman (1987).

Com relação ao estágio, o relator defendeu a nomenclatura de estágio

curricular supervisionado de ensino pelo fato de ser um “tempo de aprendizagem

que, através de um período de permanência, alguém se demora em algum lugar ou

ofício para aprender a prática do mesmo e depois poder exercer uma profissão ou

ofício.” (BRASIL, 2001c, p. 10) Para tanto, uma relação pedagógica deveria existir

entre um profissional formado e um aluno estagiário.

Segundo o relator do Parecer CNE/CP 28/2001, o principal objetivo do estágio

curricular supervisionado de ensino deveria ser a “capacitação em serviço”, o que

exigiria, do futuro professor, a presença nas unidades escolares e o exercício do

papel do professor nas atividades que lhe são devidas, a fim de que esse pudesse

se apropriar de conhecimentos em situação de trabalho. (BRASIL, 2001c, p. 10)

Com relação à carga horária relacionada à atividade de estágio, o relator

utilizou como base um decreto de 1982 que regulamentou a Lei do Estágio63,

sancionada em 1977. O referido decreto, especificamente no seu artigo quarto,

63

Lei Federal n.º 6.494, de 7 de dezembro de 1977, regulamentada pelo Decreto n.º 87.497, de 18 de agosto de 1982.

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fixava como mínimo um semestre letivo para essa atividade. Dessa forma, o relator

do Parecer CNE/CP 28/2001 propôs um mínimo de 400 horas64 para o estágio

curricular supervisionado de ensino, que deveria ser iniciado a partir da segunda

metade do curso, conforme instituído na Resolução CNE/CP 1/2002.

Após propor a carga para as duas atividades relacionadas à prática, o relator

do Parecer CNE/CP 28/2001 propôs mais uma atividade curricular: o trabalho

acadêmico. Essa atividade seria encarregada de apresentar as bases para o

desenvolvimento das atividades relacionadas à prática como componente curricular

e para o estágio curricular supervisionado de ensino, que deveriam ser regidos pelo

“princípio ação-reflexão-ação”. (BRASIL, 2001c, p. 11)

Conforme consta do Parecer CNE/CP 28/2001, o ensinar a ser professor

deveria ser a principal tarefa das licenciaturas. Para esse aprendizado, ӎ

imprescindível um saber profissional, crítico e competente e que se vale de

conhecimentos e de experiências.” (BRASIL, 2001c, p. 12) Para a apropriação

desses conhecimentos, assim como suporte para a participação das experiências,

uma base teórica, de acordo com o relator de o referido Parecer, seria necessária e

o componente curricular trabalho acadêmico teria como objetivo oferecer essa base,

por meio do ensino presencial.

Para tanto, o relator propôs uma carga de 1.800 horas para o ensino

presencial relacionado ao trabalho acadêmico. Porém, diferentemente das cargas

anteriormente propostas, cujas bases documentais preexistiam e, portanto,

justificava, em parte, a carga horária proposta, não identificamos no Parecer

CNE/CP 28/2001 respostas para o porquê da carga proposta para o referido

componente curricular.

Da mesma forma, não identificamos justificativas para a proposição de 200

horas para o quarto componente curricular, nomeado pelo relator do Parecer

CNE/CP 28/2001 de atividades de caráter acadêmico-científico-cultural.

64

Conjecturamos que essa carga horária tenha sido obtida, por aproximação, levando-se em consideração que um semestre letivo passou a contar, a partir da LDBEN, com 100 dias, e que um período dos cursos de nível superior tem, geralmente, de três horas e meia a quatro horas.

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Tal componente abarcaria atividades como: seminários, participação em

eventos científicos, visitas, monitorias, estudos de extensão, entre outras, com

orientação docente. De acordo com o relator do Parecer CNE/CP 28/2001, essas

atividades também fariam parte do processo formativo do futuro professor, mas não

precisariam, necessariamente, ser realizadas em sala de aula ou laboratórios no

interior das IES. Juntamente com o trabalho acadêmico, as atividades de caráter

acadêmico-científico-cultural formariam o núcleo de atividades científico-

acadêmicas.

Logo, com os quatro componentes curriculares identificados, os cursos de

licenciatura deveriam ter, no mínimo, 2.800 horas de atividades. Esse número é

menor que as 3.200 horas, contido na Proposta de Diretrizes.

Para o desenvolvimento da carga horária proposta de 2.800 horas, o relator

do Parecer CNE/CP 28/2001 propôs que a duração desses cursos não poderia

ocorrer em tempo inferior a três anos. A justificativa utilizada para essa fixação de

três anos foi o fato de que, até aquele momento, curso algum de graduação havia

sido proposto com duração menor que aquela. (BRASIL, 2001c)

A carga horária e a duração das atuais licenciaturas, propostas no Parecer

CNE/CP 28/2001, foram aprovadas e oficializadas pela Resolução CNE/CP 2/2002,

com quatro artigos, dos quais dois são citados a seguir:

Art. 1.º A carga horária dos cursos de Formação de Professores da Educação Básica, em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, será efetivada mediante a integralização de, no mínimo, 2800 (duas mil e oitocentas) horas, nas quais a articulação teoria-prática garanta, nos termos dos seus projetos pedagógicos, as seguintes dimensões dos componentes comuns: I - 400 (quatrocentas) horas de prática como componente curricular, vivenciadas ao longo do curso; II - 400 (quatrocentas) horas de estágio curricular supervisionado a partir do início da segunda metade do curso; III - 1800 (mil e oitocentas) horas de aulas para os conteúdos curriculares de natureza científico-cultural; IV - 200 (duzentas) horas para outras formas de atividades acadêmico-científico-culturais. Parágrafo único. Os alunos que exerçam atividade docente regular na Educação Básica poderão ter redução da carga horária do estágio curricular supervisionado até o máximo de 200 (duzentas) horas. Art. 2° A duração da carga horária prevista no Art. 1.º desta Resolução, obedecidos os 200 (duzentos) dias letivos/ano dispostos

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na LDB, será integralizada em, no mínimo, 3 (três) anos letivos. (BRASIL, 2002b, p. 1)

Comparado à Proposta de Diretrizes do MEC, a Resolução CNE/CP 2/2002

fixou, não somente carga horária menor que a sugerida no documento encaminhado

para análise do CNE, em 2000, mas também período de duração menor.

Entretanto, cabe ressaltar que esses números correspondem aos mínimos e,

de acordo com o relator do Parecer CNE/CP 28/2001, conforme citamos, os

números ideais deveriam estar relacionados às variações dos Projetos Pedagógicos

dos cursos, considerando-se as condições em que os cursos são oferecidos, o

histórico de aproveitamento dos alunos, entre outras variáveis.

Quanto ao período para os cursos se adequarem às novas diretrizes, ele foi

fixado em dois anos. Como a Resolução CNE/CP 1/2002 passou a vigorar em 9 de

abril de 2002, data da sua republicação65, as IES teriam até março ou abril de 2004

para se adaptarem às Diretrizes Curriculares Nacionais. Porém, o artigo 15.º da

Resolução CNE/CP 1/2002, que tratava desse prazo de adequação, foi alterado por

uma Resolução66 de 2004 e nova data foi fixada para 15 de outubro de 2005.

Particularmente, entendemos que as normatizações para os atuais cursos de

licenciatura brasileiros, decorrentes das Resoluções CNE/CP 1/2002 e 2/2002, vão

ao encontro dos estudos realizados por Shulman (1986, 1987), conforme

identificamos no decorrer das últimas subseções. Essa convergência se faz presente

pela decisão de se tornar obrigatória a prática como componente curricular nos

cursos superiores de formação de professores e, de certa forma, explicitar o objetivo

dessa atividade nos referidos cursos.

No entanto, observamos haver descompassos entre as citadas normatizações

e as Diretrizes Curriculares específicas para as licenciaturas em Matemática, as

quais são abordadas na subseção que segue.

65

A Resolução CNE/CP n.º 1 de 2002 foi primeiramente publicada no Diário Oficial da União em 4 de março de 2002. Mas como continha erro de publicação, foi republicada em 9 de abril de 2002. 66

Resolução CNE/CP n.º 2, de 27 de agosto de 2004.

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150

3.4.3 As Diretrizes Curriculares específicas para os atuais cursos de

licenciatura em Matemática brasileiros

Além das Diretrizes Curriculares Nacionais, que normatizam todas as

licenciaturas, cada licenciatura para as diferentes áreas do ensino têm Diretrizes

Curriculares específicas que devem ser levadas em consideração.

A diretriz específica para os atuais cursos de licenciatura em Matemática

brasileiros constam da Resolução CNE/CES número 3, de 18 de fevereiro de 2003,

que estabelece as Diretrizes Curriculares para os Cursos de Matemática,

Licenciatura e Bacharelado. Essa Resolução tem fundamentação no Parecer

CNE/CES número 1.302, de 6 de novembro de 2001.

Para entender a Resolução CNE/CES 3/2003, faz-se necessária a leitura do

Parecer CNE/CES 1.302/2001. Tanto um como o outro documento abordam

diretrizes não somente para a licenciatura, mas também para o bacharelado em

Matemática.

Para esta subseção, fixamos-nos nesses dois documentos, no que diz

respeito à licenciatura e no que são comuns a ambos os cursos e, quando

necessário, fazemos algumas comparações entre as normas específicas fixadas

para o bacharelado e para a licenciatura.

Análise dos referidos documentos:

No primeiro parágrafo do Parecer CNE/CES 1.302/2001, o relator procura

deixar evidente que o objetivo do bacharelado difere-se do objetivo da licenciatura

em Matemática:

Os cursos de Bacharelado em Matemática existem para preparar profissionais para a carreira de ensino superior e pesquisa, enquanto os cursos de Licenciatura em Matemática têm como objetivo principal a formação de professores para a Educação Básica. (BRASIL, 2001a, p. 1)

A leitura desse primeiro parágrafo pode deixar a impressão de que as

licenciaturas são cursos que não dão direito ao futuro professor da Educação Básica

de, assim como aos bacharéis, investir em sua formação com o objetivo de lecionar

no ensino superior e realizar pesquisas. Mas ao identificar as competências e

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habilidades que se esperam desenvolver nos alunos desses cursos, essa impressão

pode ser superada.

Ao indicar o perfil que se pretende dos egressos de ambos os cursos, são

relacionadas, para os bacharéis, as seguintes qualidades: “uma sólida formação de

conteúdos de Matemática” e “uma formação que lhes prepare para enfrentar os

desafios das rápidas transformações da sociedade, do mercado de trabalho e das

condições de exercício profissional”. (BRASIL, 2001a, p. 3).

Já para os licenciados, as qualidades relacionadas são:

visão de seu papel social de educador e capacidade de se inserir em diversas realidades com sensibilidade para interpretar as ações dos educandos;

visão da contribuição que a aprendizagem da Matemática pode oferecer à formação dos indivíduos para o exercício de sua cidadania;

visão de que o conhecimento matemático pode e deve ser acessível a todos, e consciência de seu papel na superação dos preconceitos, traduzidos pela angústia, inércia ou rejeição, que muitas vezes ainda estão presentes no ensino-aprendizagem da disciplina. (BRASIL, 2001a, p. 3)

No que se refere às competências ou habilidades que devem ser

desenvolvidas nos cursos de licenciatura em Matemática, no Parecer CNE/CES

1.302/2001 não há maiores esclarecimentos sobre atividades que poderiam ser

propostas nesses cursos para desenvolvê-las.

Para identificar essas competências ou habilidades e associá-las aos

possíveis domínios dos conhecimentos para o ensino de Matemática, de Ball,

Thames e Phelps (2008), que, em nossa opinião, promoveriam o desenvolvimento

dessas competências ou habilidades, elaboramos o Quadro 8. Porém, antes de

apresentá-lo, salientamos que não é nossa pretensão indicar essa associação como

única: ela foi elaborada com base na nossa interpretação dos estudos de Ball,

Thames e Phelps (2007, 2008), interpretação essa apresentada na subseção 2.1.2.

Além disso, estamos cientes de que as competências ou habilidades apresentadas

no Parecer CNE/CES 1.302/2001 podem ser associadas a conhecimentos não

abordados por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008), e tampouco por Shulman (1986,

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1987). Entretanto, esses conhecimentos não foram levados em conta para a

elaboração do referido quadro.

Quadro 8 – Associação possível das competências ou habilidades indicadas no Parecer CNE/CES 1.302/2001, para os cursos de licenciatura em Matemática, com os domínios dos conhecimentos

para o ensino de Matemática, de Ball, Thames e Phelps (2007, 2008)

Competência ou habilidade

Domínio dos conhecimentos para o

ensino de Matemática e atividades relacionadas

I II III IV V VI

Capacidade de expressar-se escrita e oralmente com clareza e precisão

X

Capacidade de trabalhar em equipes multidisciplinares X

Capacidade de compreender, criticar e utilizar novas ideias e tecnologias para a resolução de problemas

X X

Capacidade de aprendizagem continuada, sendo sua prática profissional também fonte de produção de conhecimento

--- --- --- --- --- ---

Habilidade de identificar, formular e resolver problemas na sua área de aplicação, utilizando rigor lógico-científico na análise da situação-problema

X X

Estabelecer relações entre a Matemática e outras áreas do conhecimento

X

Trabalhar na interface da Matemática com outros campos do saber X X

Contribuir para a realização de projetos coletivos dentro da escola básica

X

Conhecimento de questões contemporâneas --- --- --- --- --- ---

Educação abrangente necessária ao entendimento do impacto das soluções encontradas num contexto global e social

--- --- --- --- --- ---

Participar de programas de formação continuada --- --- --- --- --- ---

Realizar estudos de pós-graduação X

Elaborar propostas de ensino-aprendizagem de Matemática para a Educação Básica

X X X X X X

Analisar, selecionar e produzir materiais didáticos X X X X X X

Analisar criticamente propostas curriculares de Matemática para a Educação Básica

X X X X X X

Desenvolver estratégias de ensino que favoreçam a criatividade, a autonomia, e a flexibilidade do pensamento matemático dos educandos

X X X X

Perceber a prática docente de Matemática como um processo dinâmico, carregado de incertezas e conflitos, um espaço de criação e reflexão, em que novos conhecimentos são gerados e modificados continuamente

X X X

I: Conhecimento comum do conteúdo: dominar as tarefas propostas aos alunos; utilizar corretamente representações, notações e ideias matemáticas; identificar erros e inadequações em materiais didáticos e em produções de alunos. II: Conhecimento especializado do conteúdo: compreender estruturas matemáticas necessárias para o ensino. III: Conhecimento horizontal do conteúdo: definir o que e como ensinar, de modo a preparar o aluno para o que virá futuramente, em termos de conteúdos. IV: Conhecimento de conteúdo e de alunos: identificar conhecimentos prévios dos alunos; buscar estratégias e exemplos para antecipar-se a erros típicos cometidos por alunos; prever o que os alunos acharão fácil ou não. V: Conhecimento de conteúdo e de ensino: tomar decisões pedagógicas com o objetivo de contribuir na compreensão dos conteúdos VI: Conhecimento de conteúdo e de currículo: identificar, compreender e analisar pressupostos do currículo

que irá desenvolver; conhecer como um dado tema pode ser desenvolvido nas diferentes séries e graus de ensino e sua relação com outros temas matemáticos e de outras disciplinas; conhecer as orientações, as recomendações, as estratégias para o ensino e como explorar diferentes materiais didáticos.

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Destacamos que a indicação da realização de pós-graduação contribui

diretamente para a superação da possível impressão indicada que se pode ter na

leitura do primeiro parágrafo do Parecer CNE/CES 1.302/2001.

Com relação às competências ou habilidades não relacionadas a um domínio

do conhecimento no quadro apresentado, cumpre esclarecer que elas estão

associadas ao gerenciamento da formação continuada do futuro profissional ou

outra característica não necessariamente relacionada aos conhecimentos para

ensinar Matemática na Educação Básica. Assim, entendemos que os domínios dos

conhecimentos para o ensino de Matemática, de Ball, Thames e Phelps (2007,

2008), não têm como finalidade contemplar todas as competências ou habilidades

indicadas como desejáveis ao professor de Matemática, nos documentos oficiais.

Por outro lado, a identificação, pelo professor egresso de um curso de

licenciatura em Matemática, da necessidade de melhorar sua formação em um ou

mais domínios dos conhecimentos definidos por Ball, Thames e Phelps (2007,

2008), pode levá-lo a buscar uma formação continuada.

Em se tratando da estruturação dos conteúdos curriculares dos cursos, há a

indicação, no Parecer CNE/CES 1.302/2001, de que na licenciatura devem constar

conteúdos comuns a todos os cursos de licenciatura em Matemática do país,

relacionados ao Cálculo Diferencial e Integral, à Álgebra Linear, aos Fundamentos

de Análise, aos Fundamentos de Álgebra, aos Fundamentos de Geometria, e à

Geometria Analítica.

Além dos referidos conteúdos, são indicados, no Parecer CNE/CES

1.302/2001: conteúdos matemáticos presentes na Educação Básica nas áreas de

Álgebra, Geometria e Análise; conteúdos de áreas afins à Matemática, que são

fontes originadoras de problemas e campos de aplicação de suas teorias; e

conteúdos da Ciência da Educação, da História e Filosofia das Ciências e da

Matemática.

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No que concerne aos conteúdos da Educação Básica, o relator do referido

Parecer deixa claro que eles devem fazer parte dos conteúdos profissionais, ou seja,

que devem ser abordados com o objetivo do ensino pelos futuros professores67.

Com o objetivo de estabelecer uma possível associação entre as disciplinas

contendo os conteúdos fixados para os cursos de licenciatura em Matemática pelo

Parecer CNE/CES 1.302/2001 e os domínios dos conhecimentos para o ensino de

Matemática, de Ball, Thames e Phelps (2008), elaboramos o quadro a seguir, que

identifica, em nossa concepção, o(s) principal – ou principais – domínio(s) ao qual

poderiam estar associadas essas disciplinas.

Quadro 9 – Associação possível das disciplinas contendo conteúdos fixados para as atuais licenciaturas em Matemática pelo Parecer CNE/CES 1.302/2001 com os domínios dos conhecimentos para o ensino de Matemática, de Ball, Thames e Phelps (2007, 2008)

Disciplinas

Domínio dos conhecimentos para o ensino de Matemática

I II III IV V VI

Disciplinas contendo Cálculo Diferencial e Integral X

Disciplinas contendo Álgebra Linear X

Disciplinas contendo Fundamentos de Análise X

Disciplinas contendo Fundamentos de Álgebra X

Disciplinas contendo Fundamentos de Geometria X

Disciplinas contendo Geometria Analítica X

Disciplinas de conteúdos matemáticos presentes na Educação Básica nas áreas de Álgebra, Geometria e Análise

X X X

Disciplinas de conteúdos de áreas afins à Matemática

--- --- --- --- --- ---

Disciplinas da área da Ciência da Educação --- --- --- --- --- ---

Disciplinas da área História e Filosofia das Ciências e da Matemática

X

I: Conhecimento comum do conteúdo II: Conhecimento especializado do conteúdo III: Conhecimento horizontal do conteúdo IV: Conhecimento de conteúdo e de alunos V: Conhecimento de conteúdo e de ensino VI: Conhecimento de conteúdo e de currículo

Entendemos que as disciplinas com o principal objetivo de promover

apropriação de conhecimentos comuns do conteúdo deveriam também promover

apropriação de conhecimentos especializados do conteúdo. Caso contrário,

teríamos os futuros objetos de ensino do professor de Matemática abordados

67

Particularmente, acreditamos que a formação de conceitos e procedimentos relacionados à Matemática da Educação Básica, conforme explicitado na Proposta de Diretrizes do MEC, no Parecer CNE/CP 9/2001 e, consequentemente, na Resolução CNE/CP 1/2002, deva fazer parte dessa formação profissional, pois é sabido, especialmente das instituições particulares, que muitos alunos não têm apropriados certos conhecimentos da Matemática da Educação Básica.

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155

apenas em nível de revisão. Esse entendimento implica que essas disciplinas

também teriam de promover a apropriação de conhecimentos relacionados a

conteúdo e ensino.

Em se tratando das disciplinas de conteúdos de áreas afins à Matemática,

elas poderiam contribuir no sentido de o professor identificar as possíveis aplicações

da Matemática em áreas não matemáticas, proporcionando o exercício da

interdisciplinaridade. Porém essas disciplinas não poderiam, em nossa concepção,

ser relacionadas ao conhecimento de conteúdo e de currículo, uma vez que não

fazem parte da área específica da Matemática.

As disciplinas da área da Ciência da Educação, por sua vez, não estão

associadas ao ensino de uma determinada disciplina ou área, mas sim ao ensino

como geral, e, na maioria das vezes, quando não sempre, não levam em conta as

especificidades de cada área. Assim, essas disciplinas também não poderiam, em

nossa opinião, estar relacionadas a um dos domínios dos conhecimentos para o

ensino de Matemática, definidos por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008), pois todos

eles levam em consideração conteúdos matemáticos.

Não podemos afirmar, com base nas informações disponibilizadas no quadro

anterior, que as disciplinas contendo conteúdos fixados no Parecer CNE/CES

1.302/2001 se concentram no domínio do conhecimento especializado do conteúdo,

pelo fato de o número de disciplinas, com suas cargas horárias, poder variar de

curso para curso, de acordo com o projeto pedagógico de cada IES. Por outro lado,

não identificamos disciplinas que pudessem estar relacionadas aos domínios do

conhecimento horizontal do conteúdo, do conhecimento de conteúdo e de alunos, e

do conhecimento de conteúdo e de currículo.

Com relação ao estágio e às atividades complementares, essa última

referindo-se aos conteúdos curriculares de natureza científico-cultural, o Parecer

CNE/CES 1.302/2001 não apresenta novidades com relação ao que foi abordado no

Parecer CNE/CP 9/2001, oficializado pela Resolução CNE/CP 1/2002.

Sem mais orientações que pudessem contribuir na elaboração dos projetos

pedagógicos das licenciaturas em Matemática pelas instituições de ensino superior,

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156

do Parecer CNE/CES 1.302/2001 resultou a Resolução CNE/CES 3/2003, que tem

seus dois primeiros artigos citados a seguir:

Art. 1.º As Diretrizes Curriculares para os cursos de bacharelado e licenciatura em Matemática, integrantes do Parecer CNE/CES 1.302/2001, deverão orientar a formulação do projeto pedagógico do referido curso. Art. 2° O projeto pedagógico de formação profissional a ser formulado pelo curso de Matemática deverá explicitar: a) o perfil dos formandos; b) as competências e habilidades de caráter geral e comum e aquelas de caráter específico; c) os conteúdos curriculares de formação geral e os conteúdos de formação específica; d) o formato dos estágios; e) as características das atividades complementares; f) a estrutura do curso; g) as formas de avaliação. (BRASIL, 2003, p. 01)

Com a publicação da Resolução CNE/CES 3/2003, contrariou-se, em parte,

em nossa opinião, o artigo décimo da Resolução CNE/CP 1/2002, citado

anteriormente, na qual transferia às instituições a competência para a seleção de

conteúdos, uma vez que alguns desses conteúdos, para a licenciatura em

Matemática, foram fixados.

Por outro lado, entendemos que houve avanços quando se comparam as

normatizações ocorridas na primeira década do século 21 e a normatizações

ocorridas nas décadas de 1960 e 1970.

Uma delas é a presença de atividades relacionadas à prática no decorrer de

todo o curso, o que ampliou a concepção de prática, que durante muito tempo

esteve associada apenas ao estágio. Essa ampliação de concepção é, em nossa

visão, a principal característica de modificação entre as duas últimas normatizações,

não somente para os cursos de formação de professores de Matemática para a

Educação Básica, mas de todos os cursos que se propõem a formar professores

para atuar no Ensino Fundamental e Ensino Médio.

Outro avanço que, em nossa opinião, pode ser identificado é a oficialização

da presença de conteúdos relacionados aos objetos de ensino do futuro professor,

nos cursos formação inicial. Essa presença, juntamente com a ampliação da

concepção de prática, possibilita, por exemplo, a elaboração de projetos

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157

pedagógicos que levam em consideração estudos relacionados à formação de

professores, como o realizado por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008), que,

conforme defendemos na subseção 2.3, possibilita a aplicação da relação de

unidade, entre a teoria e prática, conforme apresentada por Candau e Lelis (1993).

Entretanto, para fazer desses avanços melhorias na referida formação,

fazem-se necessárias reflexões sobre interpretações das DCNs e das Diretrizes

Curriculares específicas.

Finalizando essa subseção, não podemos deixar de fazer um último

comentário:

Pelo fato de tanto se reforçar a independência dos cursos de licenciatura dos

cursos de bacharelado, apontada em documentos como a Proposta de Diretrizes do

MEC e o Parecer CNE/CP 9/2001, gostaríamos de entender o porquê da definição

de Diretrizes Curriculares específicas, tanto para o bacharelado como para a

licenciatura em Matemática, em um único documento. O mesmo ocorre para os

demais cursos que compunham o antigo urso de Ciências: Ciências Biológicas,

Física e Química. Conforme já nos posicionamos no capítulo 1, acreditamos que

documentos generalistas, como é o caso do Parecer CNE/CES 1.302/2001,

oficializado pela Resolução CNE/CES 3/2003, contribuem de forma negativa para a

criação das identidades dos cursos.

3.5 Um panorama das licenciaturas em Matemática no Estado de São Paulo em

2010

Ao iniciar os estudos para este trabalho, interessamo-nos por conhecer, em

primeiro lugar, como as licenciaturas e os bacharelados em Matemática do Estado

de São Paulo estavam estruturados, após seis anos da normatização das Diretrizes

Curriculares específicas desses cursos. Nosso objetivo era de identificar como as

instituições de ensino, nesse Estado, estavam interpretando as Resoluções CNE/CP

1/2002 e 2/2002 e a Resolução CNE/CES 3/2003, no que se refere, especialmente,

à estrutura das licenciaturas.

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158

Para tanto, nos meses de setembro, outubro e novembro de 2009, por meio

do portal eletrônico do MEC68, realizamos a coleta de dados dos cursos de

Matemática autorizados pelo Governo Federal, em âmbito nacional. Especialmente

em relação ao Estado de São Paulo, os dados coletados foram conferidos e

atualizados em junho de 2010, gerando o nosso Banco de Dados de São Paulo.

No mês de setembro de 2010, as informações contidas no Banco de Dados

de São Paulo foram confrontadas com as informações disponibilizadas nos sítios

das instituições de ensino superior. Nessa fase, um novo banco de dados foi gerado:

o Banco de Dados da População Ativa, contendo, além das informações do Banco

de Dados de São Paulo, as informações disponibilizadas pelas instituições de ensino

superior. Todos os cursos de Matemática propostos por instituições paulistas ou

federais atuantes no Estado de São Paulo, identificados nesse confronto,

independentemente de constarem ou não como autorizados no sítio do Ministério da

Educação, passaram a fazer parte do segundo banco de dados.

No ano de 2011 publicamos um artigo contendo as análises quantitativas das

licenciaturas e dos bacharelados constituintes do Banco de Dados da População

Ativa. Nesse artigo caracterizamos os 173 cursos de Matemática daquele banco de

dados, os quais eram propostos por 98 instituições paulistas ou federais. Desse total

de cursos, 140 diplomavam licenciados, 30 diplomavam bacharéis e três conferiam

diplomas de bacharelado/licenciatura. (PEREIRA; PIETROPAOLO, 2011)

A seguir, apresentamos as informações relacionadas apenas às licenciaturas

em Matemática, tanto as identificadas no sítio do Ministério da Educação – cursos

autorizados – quanto as identificadas nos sítios das IES – cursos ativos.

3.5.1 Uma análise descritiva das licenciaturas em Matemática no Estado de São

Paulo

Com base na análise das informações do Banco de Dados da População

Ativa, identificamos 150 cursos de licenciatura em Matemática, autorizados pelo

Ministério da Educação, e 140 cursos ativos nas instituições de ensino superior.

68

http://emec.mec.gov.br/

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159

Todos esses cursos são, na figura a seguir, distribuídos de acordo com a natureza,

em instituições públicas e instituições privadas.

Figura 6 – Cursos de licenciatura em Matemática no Estado de São Paulo, Brasil, em 2010, distribuição pela variável natureza Fonte: Pereira e Pietropaolo (2011)

De acordo com as informações disponíveis no sítio do Ministério da

Educação, em 2010, dos 150 cursos autorizados no Estado de São Paulo, em

instituições paulistas ou federais, oito eram oferecidos na modalidade a distância, e

142 na modalidade presencial. Desses 150 cursos, um estava estruturado com

regime trimestral, 118 com regime semestral, 28 com regime anual, um com regime

modular e em dois deles o regime não era indicado. Eram ministrados por 110

instituições, sendo 95 privadas – 45 faculdades, 24 centros universitários e 26

universidades – e 15 públicas – seis faculdades municipais, um centro universitário

municipal, uma universidade municipal, três universidades estaduais, três

universidades federais e um Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia.

Já de acordo com as informações que estavam disponíveis nos sítios das

IES, os 140 cursos identificados como ativos no Estado de São Paulo, não

necessariamente em funcionamento, eram oferecidos por 96 instituições paulistas

ou federais, sendo 83 particulares – 39 faculdades, 21 centros universitários e 23

universidades – e 13 públicas – cinco faculdades municipais, um centro universitário

municipal, uma universidade municipal, três universidades estaduais, duas

universidades federais e um Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia –.

Destes 140 cursos, sete eram oferecidos a distância. Com relação ao regime, um

era oferecido com regime trimestral, 76 com regime semestral, 13 com regime anual,

um com regime modular e, em 49 deles, o regime não era indicado.

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160

Na Tabela 4 observa-se a distribuição dos cursos, ativos e autorizados, de

acordo com a organização – faculdades, centros universitários, universidades ou

instituto federal de educação, ciência e tecnologia –, a natureza – instituições

privadas ou públicas –, o regime – cursos anuais, semestrais, trimestrais ou

modulares – e a modalidade – presencial ou a distância.

Tabela 4 – Cursos de licenciatura em Matemática no Estado de São Paulo, Brasil, em 2010, distribuição pelas variáveis organização, natureza, regime e modalidade.

Organização/ Regime Presencial EAD Total

Natureza

Ativo Autorizado Ativo Autorizado Ativo Autorizado

Faculdade/ Semestral 26 34 - 1 26 35

Privada Anual 2 8 - - 2 8

Modular - - 1 1 1 1

Não

indicado 10 2 - - 10 2

Centro Universitário/ Semestral 15 23 1 - 16 23

Privada Anual 3 4 - 1 3 5

Não

indicado 4 - - - 4 -

Universidade/ Semestral 17 42 2 4 19 46

Privada Anual 2 7 - 1 2 8

Não

indicado 31 - 3 - 34 -

Instituições Privadas Total 110 120 7 8 117 128

Faculdade/ Semestral 3 4 - - 3 4

Publica Municipal Anual 2 2 - - 2 2

Centro Universitário/ Semestral 1 1 - - 1 1

Publico Municipal

Universidade/ Anual 1 1 - - 1 1

Pública Municipal

Universidade/ Semestral 6 5 - - 6 5

Pública Estadual Anual 3 4 - - 3 4

Não

indicado 1 - - - 1 -

Universidade/ Trimestral 1 1 - - 1 1

Pública Federal Semestral 3 2 - - 3 2

IFET/ Pública Federal

Semestral 2 2 - - 2 2

Instituições Públicas Total 23 22 - - 23 22

Total 133 142 7 8 140 150

EAD: Ensino a distância

IFET: Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia

Com base nas informações contidas na tabela anterior é possível concluir

que, dos 49 cursos ativos cujo regime não é indicado, apenas um é oferecido por

uma universidade pública estadual. Os demais são oferecidos por instituições

privadas, a maioria por universidades.

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161

Ainda com base nas informações da Tabela 4, é possível perceber que a

maioria dos cursos de licenciatura em Matemática, independentemente da

organização e da natureza, são oferecidos em regime semestral – 76 de 140 ativos

e 118 de 150 autorizados.

No que se refere a informações sobre a carga horária, foi constatado que ela

estava disponível em 103 cursos ativos e 148 cursos autorizados. Uma possível

distribuição desses cursos pelas cargas horárias pode ser observada na Tabela 5.

Faz-se necessário informar que o curso, tanto ativo quanto autorizado, que

consta com carga horária acima de 500 até 1.000 horas é um curso com grau de

Programa Especial de Formação Pedagógica de Docentes, com habilitação em

Matemática, na modalidade a distância.

Tabela 5 – Amostra dos cursos de licenciatura em Matemática no Estado de São Paulo, Brasil, em 2010,

distribuição pela variável carga horária

Número de cursos

Carga horária, em horas* Ativos Autorizados

Acima de 500 até 1.000 1 1 Acima de 2.000 até 2.500 4 8 Acima de 2.500 até 3.000 67 107 Acima de 3.000 até 3.500 28 24 Acima de 3.500 até 4.000 3 6 Acima de 4.000 até 4.500 - 2

Total 103 148

* não necessariamente de 60 minutos

Tomando-se como parâmetro a carga horária mínima de 2.800 horas, fixada

pela Resolução CNE/CP 2/2002, das amostras de 103 cursos ativos e 148 cursos

autorizados resultam: sete ativos e 13 autorizados com carga horária inferior, 30

ativos e 48 autorizados com carga horária igual, e 66 ativos e 87 autorizados com

carga horária superior.

Em se tratando da duração dos cursos, foi possível identificar, nos sítios, a

integralização de 95 cursos ativos e 148 cursos autorizados e, conforme as

informações contidas na figura a seguir, pode-se afirmar que a duração que ocorre

com maior frequência nos cursos ativos e nos cursos autorizados é de três anos,

considerado o mínimo, segundo a Resolução CNE/CP 2/2002.

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162

1

69

3

17

4

1

1

117

2

25

1

1

1

1 ano

3 anos

3 anos e meio

4 anos

4 anos e meio

5 anos

7 anos

Autorizados Ativos

Figura 7 – Amostra dos cursos de licenciatura em Matemática no Estado de São Paulo, Brasil, em 2010, distribuição pela variável duração

Fonte: Pereira e Pietropaolo (2011)

Já com relação à variável turno, informação disponível em 103 cursos ativos e

142 cursos autorizados, que é representada graficamente na figura seguinte, foi

constatado que a maioria das licenciaturas em Matemática do Estado de São Paulo

é oferecida no período noturno e que existem instituições que oferecem o mesmo

curso em dois turnos. Nesses casos, identificou-se não haver diferenças entre as

cargas horárias e durações do mesmo curso oferecido em turnos distintos.

3

22

2

75

1

2

31

8

99

1

1

Integral

Matutino/Noturno

Matutino

Noturno

Vespertino/noturno

Vespertino

Autorizados Ativos

Figura 8 – Amostra dos cursos de licenciatura em Matemática no Estado de São Paulo, Brasil, em 2010, distribuição pela variável turno Fonte: Pereira e Pietropaolo (2011)

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163

3.5.2 Caracterização das licenciaturas em Matemática ativas no Estado de São

Paulo

Antes de caracterizar os cursos de licenciatura em Matemática ativos no

Estado de São Paulo, devemos citar dois documentos que são essenciais para os

comentários que apresentamos logo em seguida.

Em 2007, com o intuito de conceituar horas como unidade de carga horária,

diferentemente do conceito hora-aula que estava sendo utilizado para a composição

da carga horária das graduações por algumas instituições, a Resolução CNE/CES

3/2007, especialmente no seu artigo terceiro, pôs fim às interpretações ambíguas

sobre o assunto ao registrar que a carga horária mínima de todos os cursos

superiores, tratadas em resoluções e/ou pareceres que abordavam a matéria, é

mensurada em horas relógio, ou seja, o correspondente a 60 minutos.

Por sua vez, a Portaria Normativa n.º 40 de 2007, do MEC, especialmente no

artigo 32.º, indicou que o projeto pedagógico dos cursos, além de outros

documentos e informações, deveriam ser disponibilizados à sociedade em meio

impresso, na biblioteca das instituições de ensino superior, e em páginas eletrônicas

próprias.

Caracterizando-se as licenciaturas em Matemática ativas no Estado de São

Paulo, podemos afirmar que são, na maioria, cursos noturnos, oferecidos por IES

privadas e integralizados em três ou três anos e meio, sendo três anos o mínimo

fixado por resolução do MEC.

Já com relação à carga horária, foram observados indícios da existência de

mais de sete cursos ativos com carga horária inferior a 2.800 horas, instituída como

mínima pela Resolução CNE/CP 2/2002. Alguns dados coletados nas páginas

eletrônicas de IES apontam a possível utilização do conceito de hora-aula de 50

para informar a carga horária de cursos de licenciatura em Matemática, ao invés da

hora de 60 minutos, conforme ratificado pela Resolução CNE/CP 3/2007.

Dessa forma, mesmo tendo supostamente 96 cursos ativos e 135 cursos

autorizados com carga horária igual ou superior a 2.800 horas, não é possível

afirmar quantos desses cursos cumprem efetivamente a Resolução CNE/CP 2/2002,

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no que se refere à carga horária, pois, por exemplo, um curso com 3.300 “horas”

indicadas nos sítios, tanto do MEC quanto das IES, pode estar estruturado em

apenas 2.750 horas relógio69.

Um possível procedimento que poderia informar se as cargas horárias

indicadas nos sítios são referentes à hora-aula ou hora relógio seria a análise dos

projetos pedagógicos dos cursos ou das suas matrizes curriculares que estavam, em

2010, disponíveis nos sítios das IES em apenas 63 cursos. Mesmo assim, em muitos

casos, não era possível identificar a real carga horária, pois em alguns desses 63

documentos eram apresentados somente os componentes curriculares, sem suas

respectivas cargas horárias, e isso parece não contrariar o artigo segundo da

Resolução CNE/CES 3/2003, já citado, que normatiza as informações que os

projetos pedagógicos dos cursos de Matemática devem explicitar.

Mas se observadas algumas Diretrizes Curriculares específicas mais atuais,

como a dos Cursos de Direito70, de 2004, veremos que a carga horária das

atividades deve estar visível nos projetos pedagógicos.

Dessa forma, a maior parte das IES não cumpriam, em 2010, o que determina

o artigo 32.º da Portaria Normativa n.º 40 de 2007, no que se refere às informações

disponíveis em páginas eletrônicas. E, se levarmos em consideração que essa

portaria é um dos documentos oficiais que devem ser atendidos para a solicitação

da autorização ou da renovação da autorização dos cursos superiores, podemos

afirmar haver indícios de que ela estava sendo, até 2010, parcialmente

desrespeitada pelas IES.

Por outro lado, em face das divergências de informações existentes nos sítios

do MEC e das IES – conforme é possível observar nas tabelas e gráficos

apresentados nesta subseção – e também em virtude de indicativos de que alguns

documentos estejam sendo desrespeitados, podemos ainda afirmar que há indícios

de que avaliadores do MEC, que deveriam utilizar os documentos oficiais daquele

Ministério para o processo de autorização e de reconhecimento dos cursos, talvez

não estivessem utilizando tais documentos na sua totalidade, até 2010.

69

3.300 × 50 60 70

Resolução CNE/CES n.º 9, de 29 de setembro de 2004.

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Entendemos que, mesmo havendo a necessidade de reflexões para propor

possíveis modificações no sentido de melhor adequar os documentos oficiais do

MEC para a formação inicial de professores de Matemática, o descumprimento,

ainda que parcial, dos documentos oficiais hoje existentes pode, entre outros

aspectos, dificultar a realização de um debate sobre a real qualidade dos cursos de

licenciatura em Matemática no Brasil.

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166

4 ESTUDO DAS INTERPRETAÇÕES DADAS ÀS DIRETRIZES CURRICULARES DO CURSO DE LICENCIATURA EM MATEMÁTICA

PELA UNIVERSIDADE FEDERAL DO ABC

Neste capítulo apresentamos um estudo das interpretações dadas pela

Universidade Federal do ABC às Diretrizes Curriculares Nacionais e Diretrizes

Curriculares específicas para os cursos de licenciatura em Matemática.

Para tanto, analisamos o Projeto Pedagógico do Curso de Licenciatura em

Matemática oferecido pela UFABC e as entrevistas realizadas com a professora e

coordenadora do referido Curso e com um segundo professor, que atua na

Licenciatura e no Bacharelado em Matemática da referida instituição. A publicação

de ambas as entrevistas, que têm suas transcrições como Anexos A e B,

respectivamente, conta com as autorizações dos entrevistados, inclusive para

divulgação de seus nomes. Além disso, o roteiro para as entrevistas conta com a

aprovação do Comitê de Ética da Universidade Bandeirante Anhanguera, assim

como este estudo, no geral.

De forma a atingir o objetivo traçado para esta pesquisa, explicitado no

primeiro capítulo, que é analisar, com base no estudo do Projeto Pedagógico do

Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC e no estudo de entrevistas a

professores desse curso, interpretações assumidas por essa instituição das

Diretrizes Curriculares Nacionais e Diretrizes Curriculares específicas do curso, de

modo a identificar pressupostos relacionados à formação inicial de professores de

Matemática para a Educação Básica, sobretudo no que se refere à dimensão

prática, analisamos:

(1.º) três elementos do Projeto Pedagógico do referido Curso:

objetivos, perfil do egresso e organização curricular. Para essa

análise, tomamos como base as Resoluções CNE/CP 1/2002 e 2/2002

e a Resolução CNE/CES 3/2003, com os respectivos Pareceres que

as fundamentam;

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(2.º) a prática proposta no referido Curso, composta por atividades

relacionadas à prática como componente curricular e ao estágio

supervisionado, explicitados no Projeto Pedagógico do referido Curso

e delineados nas entrevistas. Para essa análise, tomamos como base

os estudos de Ball, Thames e Phelps (2007, 2008), e de Candau e

Lelis (1993).

Com os resultados dessas análises, respondemos às duas questões de

pesquisas anunciadas no capítulo 1, quais sejam:

Como são interpretadas, pela UFABC, as atuais Diretrizes

Curriculares para o curso de licenciatura em Matemática, sobretudo

no tocante à dimensão prática?

Quais são os pressupostos para a formação de professores de

Matemática adotados pela UFABC?

4.1 Análise de elementos do Projeto Pedagógico do Curso investigado

Conforme informado no capítulo 1, quatro Licenciaturas da UFABC

compartilham o mesmo Projeto Pedagógico (PPabc): Biologia, Física, Matemática e

Química. Esse documento apenas é personalizado para cada um desses Cursos, ao

abordar a organização curricular e as ementas de suas disciplinas.

Analisamos do PPabc os seguintes elementos: objetivos do curso, perfil do

egresso e organização curricular. Para tanto, estabelecemos duas unidades de

análise:

Os objetivos e perfil do egresso do Curso indicados no PPabc; e

A organização curricular indicada no PPabc.

No que segue, apresentamos a análise de cada uma das unidades

identificadas.

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168

4.1.1 Os objetivos e o perfil dos egressos do Curso indicados no PPabc

Nesta unidade, nosso objetivo é analisar a relação entre o que é indicado no

Projeto Pedagógico do Curso investigado e o que está registrado nas atuais

Diretrizes Curriculares para a licenciatura em Matemática, quanto aos objetivos e ao

perfil do egresso para esses cursos.

Nossa análise teve como finalidade identificar se os objetivos e o perfil do

Curso investigado contemplam plenamente o que orientam as atuais Diretrizes

Curriculares, contemplam parcialmente, ou não as contemplam.

Os objetivos do Curso indicados no PPabc:

No Projeto Pedagógico das primeiras quatro Licenciaturas da UFABC, não é

apresentado um objetivo específico para a Licenciatura em Matemática.

Como objetivo geral às quatro licenciaturas – Ciências Biológicas, Física,

Matemática e Química – consta, no PPabc, a formação do aluno em conteúdos

básicos, capazes de fazê-lo alcançar as competências e habilidades necessárias

para lecionar “nas áreas de Ciências Naturais e Matemática” do Ensino Fundamental

II e em uma das modalidades Biologia, Física, Matemática ou Química, no Ensino

Médio. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO ABC, 2009a, p. 6)

Como objetivos específicos, no PPabc consta, também de modo geral às

quatro licenciaturas, o seguinte trecho:

Tendo em vista as mudanças pelas quais passa a sociedade, [...], os cursos de licenciatura da UFABC, têm como metas:

[1.º] Proporcionar ao licenciando uma formação ampla, diversificada e sólida no que se refere aos conhecimentos básicos de suas áreas específicas;

[2..º] Promover, por meio das atividades práticas e dos estágios curriculares vivenciados em diversos espaços educacionais, a integralização dos conhecimentos específicos com as atividades de ensino;

[3.º] Promover a imersão dos licenciandos em ambientes de produção e divulgação científicas e culturais no contexto da educação em ciências e matemática;

[4.º] Formar o educador consciente de seu papel na formação de cidadãos sob a perspectiva educacional, científica, ambiental e social;

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[5.º] Capacitar os futuros professores para o auto-aprimoramento pessoal e profissional constante. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO ABC, 2009a, p. 6)

Observa-se, pela natureza ampla do PPabc, que os objetivos, tanto geral

quanto específicos, não focam uma determinada área e sim a formação do professor

para lecionar na Educação Básica, nas áreas de Ciências Naturais ou Matemática.

Dessa forma, parece não haver uma identidade própria de objetivos para a

Licenciatura em Matemática e tampouco a qualquer outra Licenciatura, das quatro

que compartilham o mesmo Projeto Acadêmico.

Por outro lado, observa-se, de forma explícita, a inclusão de elementos que

eram identificados como questões a serem enfrentadas no campo curricular, na

Proposta de Diretrizes do MEC, como a concepção restrita da prática aos estágios e

a inadequação do tratamento da pesquisa: ambos estariam representados,

respectivamente, pelo segundo e pelo terceiro objetivos específicos citados.

Observam-se, também, nos objetivos específicos, elementos constitutivos do

Processo de Bolonha, como o indicativo da aprendizagem ao longo da vida, que

pode ser associado ao último objetivo específico citado.

O perfil do egresso indicado no PPabc:

Com relação ao perfil pretendido, assim como nos objetivos do Curso, não há

uma indicação específica para o egresso da Licenciatura em Matemática da UFABC,

mas sim para todos os egressos das quatro licenciaturas que compartilham o

mesmo Projeto Pedagógico.

O PPabc indica 11 competências que, segundo os autores daquele

documento, sintetizam as competências gerais estabelecidas na Resolução CNE/CP

1/2002 e em Pareceres do CNE que abordam as Diretrizes Curriculares dos cursos

de licenciatura em Ciências Biológica, Física, Matemática e Química.

Essas 11 competências são distribuídas em cinco dimensões:

Na dimensão política - atuar profissionalmente com base nos princípios de uma sociedade democrática, que respeita a diversidade social, cultural e física de seus cidadãos.

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- avaliar criticamente a sua realidade social e participar da tomada de decisões a respeito dos rumos da sociedade como um todo, a partir da consciência de seu papel.

Na dimensão social -promover uma prática educativa que identifique e leve em conta as características de seu meio de atuação, suas necessidades e desejos. -envolver-se e envolver a comunidade escolar por meio de ações colaborativas.

Na dimensão pedagógica -reconhecer e atuar considerando a complexidade do fenômeno educativo que envolve, além dos aspectos técnicos, outros tais como éticos, coletivos e relacionais. -transformar seus conhecimentos acadêmicos específicos em conhecimento escolar. -atuar em diferentes contextos de seu âmbito profissional, fazendo uso de recursos técnicos, materiais didáticos e metodológicos variados. -estar habilitado para enfrentar com sucesso os desafios e as dificuldades inerentes à tarefa de despertar os jovens para a reflexão. -adotar uma atitude de pesquisa baseada na ação-reflexão-ação sobre a própria prática em prol do seu aperfeiçoamento e da aprendizagem dos alunos.

Na dimensão científica -dominar e atualizar-se a respeito dos conhecimentos de sua área específica, assim como perceber e realizar a articulação desses saberes com o contexto mais amplo da cultura.

Na dimensão pessoal e profissional -gerenciar seu próprio desenvolvimento profissional, adotando uma postura de disponibilidade e flexibilidade para mudanças. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO ABC, 2009a, p. 7-8)

Observa-se que as dimensões que constam do PPabc estão relacionadas a

algumas das dimensões71 gerais de atuação do professor, identificadas na Proposta

de Diretrizes, no Parecer CNE/CP 9/2001, e na Resolução CNE/CP 1/2002, no seu

artigo sexto, conforme abordamos no capítulo 3. As dimensões política e social do

PPabc podem ser relacionadas ao comprometimento com os valores inspiradores da

sociedade democrática; a dimensão pedagógica, com o domínio do conhecimento

pedagógico; a dimensão científica do PPabc com o conhecimento de processos de

investigação; e a dimensão pessoal e profissional com o gerenciamento do próprio

desenvolvimento pessoal.

71

O comprometimento com os valores inspiradores da sociedade democrática; a compreensão do papel social da escola; o domínio dos conteúdos a serem socializados, aos seus significados nos diferentes contextos e sua articulação interdisciplinar; o domínio do conhecimento pedagógico; o conhecimento de processos de investigação que possibilitem o aperfeiçoamento da prática; e o gerenciamento do próprio desenvolvimento profissional.

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171

Especificamente quanto ao perfil dos egressos das licenciaturas em

Matemática, não identificamos, no PPabc, elementos que fizessem menção ou que

indicassem as competências e habilidades específicas indicadas no Parecer

CNE/CES 1.302/2001 e por nós identificadas na subseção 3.4.3.

A não explicitação das habilidades e competências específicas relacionadas

aos egressos de cada um dos cursos que compartilham itens do PPabc pode

dificultar, ou até mesmo impedir, a identificação das finalidades que essa instituição

propõe para cada licenciatura, pelos que têm interesse em conhecer melhor a

proposta de formação apresentada pela UFABC – alunos, sociedade e

pesquisadores, por exemplo. Segundo o artigo terceiro da Resolução CNE/CP

1/2002, um dos princípios norteadores da formação é ter as competências como

concepção nuclear para orientar a escolha das atividades do curso. Essa escolha,

em nossa concepção, será primordial para atingir as finalidades dos cursos. Dessa

forma, análises que procuram identificar relações entre as competências e

habilidades específicas que se esperam ser desenvolvidas e as atividades propostas

nas licenciaturas, podem ser impossibilitadas.

Relação entre o que é indicado no Projeto Pedagógico do Curso

investigado e o que é indicado nas atuais Diretrizes Curriculares

Consta do Parecer CNE/CES 1.302/2001 que “[...] os cursos de Licenciatura

em Matemática têm como objetivo principal a formação de professores para a

Educação Básica.” (BRASIL, 2001a, p. 1) Presume-se, portanto, professores de

Matemática.

Por outro lado, o objetivo geral do Curso de Licenciatura em Matemática da

UFABC é, conforme consta do PPabc, formar professores para atuar nos anos finais

do Ensino Fundamental, com as disciplinas de Matemática e Ciências, e para atuar

no Ensino Médio, com a disciplina Matemática.

A referida formação não pode ser presumida por meio da leitura dos objetivos

específicos explicitados no PPabc, uma vez que esses objetivos são abrangentes e

podem ser associados a qualquer curso de formação de professores. Mesmo que

alguns objetivos específicos respondam positivamente a questões que deveriam ser

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172

enfrentadas no campo curricular, indicadas na Proposta de Diretrizes do MEC, o

objetivo geral explicitado no PPabc parece repetir o passado. No antigo curso de

licenciatura em Ciências, que foi normatizado na década de 1970, os egressos que

optavam pela habilitação plena em Matemática recebiam as mesmas licenças que

são concedidas pelo Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC.

Levando-se em consideração que a promulgação da LDBEN implicou a

extinção do curso de Ciências e a instituição de licenciaturas específicas, como a de

Matemática que tem como objetivo formar professores dessa disciplina para a

Educação Básica, não podemos afirmar que os objetivos do curso de Licenciatura

em Matemática da UFABC, explicitados no PPabc, estejam plenamente em acordo

com os objetivos da Parecer CNE/CES 1.302/2001, que normatiza cursos como a

Licenciatura estudada.

Em se tratando do perfil do egresso, não há relações visíveis que podem ser

identificadas entre as competências e habilidades indicadas no PPabc e as

explicitadas no Parecer CNE/CES 1.302/2001, sobre o mesmo assunto.

Embora haja algumas relações entre as dimensões que agrupam as

competências explicitadas no PPabc e as dimensões gerais de atuação do

professor, identificadas em documentos que normatizam as licenciaturas brasileiras,

a falta de especificidade no Projeto Pedagógico do Curso investigado,

especialmente em relação ao perfil do egresso, leva-nos a afirmar que o referido

documento não contempla explicitamente o que é normatizado pelas Diretrizes

Curriculares específicas da licenciatura em Matemática, sobre o referido assunto.

Concluímos assim que, com relação aos objetivos do Curso de Licenciatura

em Matemática identificados no PPabc, esse documento contempla parcialmente o

que é indicado nas atuais Diretrizes Curriculares específicas para esse curso. Já

com relação ao perfil do egresso, o PPabc não contempla o que é indicado nas

mesmas Diretrizes. Entretanto, pode-se identificar, nos objetivos específicos e no

perfil do egresso indicados no PPabc, respostas propositivas a questões que foram

indicadas, nas Proposta de Diretrizes, como problemas a serem enfrentados nas

novas licenciaturas. Além disso, pode-se também identificar a contemplação de

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173

dimensões gerais que foram indicadas como de atuação do professor, nesse

documento ou nas atuais Diretrizes Curriculares Nacionais.

4.1.2 A organização curricular indicada no PPabc

Nesta unidade, nosso principal objetivo é analisar a relação entre o que é

indicado no Projeto Pedagógico do Curso investigado e o que é indicado nas atuais

Diretrizes Curriculares da licenciatura em Matemática, quanto à organização

curricular. Portanto, dividimos essa unidade em categorias, a saber: carga horária,

duração, componentes curriculares e a distribuição das suas cargas horárias, e

conteúdos obrigatórios.

Com relação à carga horária, tendo como base a indicação de 2.800 horas

nas atuais Diretrizes Curriculares Nacionais, nossa análise teve como finalidade

identificar se a carga horária do Curso investigado é menor que 2.800 horas relógio,

igual, ou maior.

Para a duração, a principal finalidade da nossa análise foi identificar se o

Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC tem duração menor, igual ou maior

que três anos, duração mínima indicada nas atuais Diretrizes Curriculares Nacionais

para os cursos de licenciatura:

Em se tratando dos componentes curriculares e a distribuição das suas

cargas horárias72, nossa análise teve como finalidade, além de identificar a

existência ou não desses componentes com as cargas horárias a eles destinadas,

identificar se as atividades relacionadas à prática como componente curricular e ao

estágio curricular supervisionado ocorrem nos tempos definidos pelas Diretrizes

Curriculares.

Na categoria conteúdos obrigatórios73, tivemos como finalidade, com base em

nossa análise, identificar se o Curso investigado propõe disciplinas com o objetivo

72

400 horas de prática como componente curricular no decorrer de todo o curso; 400 horas de estágio curricular supervisionado, a partir do início da segunda metade do curso; 1.800 horas de conteúdos curriculares de natureza científico-cultural; e 200 horas de atividades acadêmico-científico-culturais. 73

Relacionados ao Cálculo Diferencial e Integral, à Álgebra Linear, aos Fundamentos de Análise, aos Fundamentos de Álgebra, aos Fundamentos de Geometria, à Geometria Analítica, aos assuntos

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174

de abordá-los, de fato. A forma como são abordados esses conteúdos será

analisada, também, na subseção 4.2.

Para cada uma das quatro categorias de análise apresentadas indicamos,

com base em nossas análises, se o PPabc contempla plenamente o que é

normatizado pelas atuais Diretrizes Curriculares, contempla parcialmente, ou não

contempla esses documentos.

Organização curricular indicada no PPabc

A distribuição das atividades curriculares é o único elemento do PPabc com

particularidades a cada uma das quatro Licenciaturas que compartilham o mesmo

documento.

Conforme abordamos no capítulo 1, a matriz curricular do Curso de

Licenciatura em Matemática da UFABC é composta por disciplinas obrigatórias,

disciplinas eletivas – que são as disciplinas de opção limitada – e disciplinas de

opção livre, além do estágio supervisionado e das atividades acadêmico-científico-

culturais.

Reproduzimos a Tabela 2, apresentada no capítulo 1, no sentido de

resgatarmos algumas informações sobre o Curso investigado.

Distribuição dos créditos, e seus correspondentes em horas, das atividades do Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC

Atividades Número de

créditos Número de

horas

Disciplinas obrigatórias

do BC&T 90 1.080

didático-pedagógicas comuns 21 252

específicas didático-pedagógicas 13 156 conteúdos específicos 38 456

Disciplinas eletivas – opção limitada 12 144 Disciplinas de opção livre 10 120 Estágio supervisionado --- 400 Atividades acadêmico-científico-culturais --- 200

Total 184 2.808

Tabela apresentada no capítulo 1 – reprodução.

matemáticos presentes na Educação Básica – áreas de Álgebra, Geometria e Análise –, às áreas afins à Matemática, e à História e Filosofia das Ciências e da Matemática.

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175

Com relação à carga horária, a Licenciatura em Matemática da UFABC tem

2.208 horas de disciplinas – 184 créditos – e mais 600 horas de atividades, divididas

em estágio supervisionado e atividades acadêmico-científico-culturais.

Adicionando-se a carga horária das disciplinas didático-pedagógicas comuns

à carga horária das disciplinas didático-pedagógicas específicas, têm-se, como total,

408 horas – 34 créditos. Essas disciplinas são consideradas, pela UFABC,

atividades de prática como componente curricular, dimensão fixada pela Resolução

CNE/CP 2/2002. Adicionando-se a carga horária das disciplinas obrigatórias do

BC&T com as cargas horárias das disciplinas de conteúdo específico, das disciplinas

eletivas e das disciplinas de opção livre têm-se, como total, 1.800 horas – 150

créditos. Essas disciplinas compõem o componente conteúdos curriculares de

natureza científico-cultural, fixado na mesma Resolução.

Observa-se, nas informações da tabela anterior, a suposta presença de

estratégias adotadas para atingir objetivos do Processo de Bolonha. Uma delas é a

flexibilização do currículo, sendo esse composto por disciplinas que integram o

núcleo do Curso – as disciplinas obrigatórias –, disciplinas que servem de suporte a

esse núcleo – as disciplinas de opção limitada, as quais o aluno faz suas escolhas a

partir de uma lista pré-fixada – e disciplinas opcionais ou subsidiárias a esse núcleo

– as disciplinas de opção livre, que também são escolhidas pelo aluno, mas de

forma livre. A segunda estratégia que pode ser observada é a validação de

aprendizagens ocorridas em formação anterior à formação específica. A UFABC

considera que as disciplinas obrigatórias de um primeiro ciclo de formação – o

BC&T, um curso de formação generalista – compõem a matriz curricular de um

segundo ciclo de formação – a Licenciatura em Matemática, uma formação

específica. Entretanto, diferentemente do Processo de Bolonha, o segundo ciclo de

formação proposto pela UFABC não é um curso de mestrado.

Com relação à distribuição de disciplinas nos quadrimestres, consta no PPabc

uma matriz curricular ideal74 para ser cursada pelo aluno. A tabela a seguir

apresenta esse fluxo ideal com as disciplinas obrigatórias a serem cursadas na

74

Fluxo proposto pela UFABC. Também se refere à carga horária ou duração, previamente fixadas, mas não necessariamente obrigatórias, conforme nota de rodapé no capítulo 1.

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Licenciatura em Matemática, suas cargas horárias semanais, seus créditos e suas

respectivas classificações nos grupos de disciplina do curso.

Tabela 6 – Fluxo ideal de curso das disciplinas obrigatórias da Licenciatura em Matemática da UFABC, com suas cargas horárias semanais e créditos

Quadrimestre Disciplina obrigatória

Carga horária

semanal T-P-I

Créditos Grupo

1.º Base Experimental das Ciências Naturais 0-3-2 3 B Bases Computacionais da Ciência 0-2-2 2 B Bases Matemáticas 4-0-5 4 B Estrutura da Matéria 3-0-4 3 B

Origem da Vida e Diversidade dos Seres Vivos

3-0-4 3 B

2.º Fenômenos Mecânicos 3-2-6 5 B Funções de Uma Variável 4-0-6 4 B Geometria Analítica 3-0-6 3 B Natureza da Informação 3-0-4 3 B

Transformações nos Seres Vivos e Ambiente

3-0-4 3 B

3.º Bases Epistemológicas da Ciência Moderna 3-0-4 3 B Fenômenos Térmicos 3-1-4 4 B

Introdução às Equações Diferenciais Ordinárias

4-0-4 4 B

Processamento da Informação 3-2-5 5 B Transformações Químicas 3-2-6 5 B

4.º Comunicação e Redes 3-0-4 3 B Fenômenos Eletromagnéticos 3-2-6 5 B Funções de Várias Variáveis 4-0-4 4 B Transformações Bioquímicas 3-2-6 5 B Educação Científica, Sociedade e Cultura 4-0-4 4 DC

5.º Introdução à Probabilidade e à Estatística 3-0-4 3 B Energia: Origens, Conversão e Uso 2-0-4 2 B Física Quântica 3-0-4 3 B Políticas Educacionais 3-0-4 3 DC Matemática Discreta 4-0-4 4 CE

6.º Interações Atômicas e Moleculares 3-0-4 3 B Desenvolvimento e Aprendizagem 4-0-4 4 DC

Geometria Plana e Construções Geométricas

4-0-4 4 CE

Álgebra Linear 6-0-5 6 CE

7.º Estrutura e Dinâmica Social 3-0-4 3 B Didática 4-0-4 4 DC Teoria Aritmética dos Números 4-0-4 4 CE

8.º Ciência, Tecnologia e Sociedade 3-0-4 3 B

Práticas de Ensino de Ciências e Matemática no Ensino Fundamental

4-0-4 4 DC

Cálculo Numérico 4-0-4 4 CE Estágio Supervisionado --- --- ---

9.º Projeto Dirigido 0-2-10 2 B

Práticas de Ensino de Matemática no Ensino Fundamental

4-0-4 4 DE

Fundamentos de Análise 4-0-4 4 CE Estágio Supervisionado --- --- ---

10.º Educação Inclusiva LIBRAS 2-0-2 2 DC Práticas de Ensino de Matemática I 3-0-4 3 DE Fundamentos de Álgebra 4-0-4 4 CE Estágio Supervisionado --- --- ---

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11.º Práticas de Ensino de Matemática II 3-0-4 3 DE Evolução dos Conceitos Matemáticos 4-0-4 4 CE Estágio Supervisionado --- --- ---

12.º

Práticas de Ensino de Matemática III

3-0-4

3

DE

Fundamentos de Geometria 4-0-4 4 CE Estágio Supervisionado --- --- ---

Total 144-18-195 162 T: número de horas em aulas expositivas presenciais. P: número médio de horas em laboratórios, aulas práticas ou aulas de exercícios, presenciais. I: estimativa do número de horas de trabalhos adicionais, extraclasse. B: Disciplina do BC&T. DC: Disciplina didático-pedagógica comum. DE: Disciplina didático-pedagógica específica. CE: Disciplina de conteúdo específico.

Mesmo tendo como duração ideal 12 quadrimestres, há, no PPabc, uma

indicação de que o aluno, dependendo do seu fluxo de estudos e disponibilidade,

pode concluir qualquer uma das quatro licenciaturas no prazo mínimo de três anos,

ou seja, nove quadrimestres, uma vez que a UFABC “[...] visa dar ao estudante a

possibilidade de individualizar, ainda que parcialmente, o currículo de modo que o

aluno possa desenhar sua formação profissionalizante [...]”. (UNIVERSIDADE

FEDERAL DO ABC, 2009a, p. 6) Essa informação de nove quadrimestres não

consta do sítio do MEC, que, conforme vimos no capítulo 1, indica periodicidade

única de 12 quadrimestres para o Curso investigado.

A partir do sexto quadrimestre, pelo fluxo ideal, o aluno inicia suas escolhas

pelas disciplinas eletivas e disciplinas de opção livre, sempre totalizando cinco

disciplinas estudadas em cada quadrimestre.

Tabela 7 – Disciplinas eletivas do Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC

Disciplina eletiva Carga horária semanal

T-P-I Créditos

Análise Real 1 4-0-4 4 Anéis e Corpos 4-0-4 4 Funções de Variáveis Complexas 6-0-6 6 Geometria Não-Euclidiana 4-0-4 4 Grupos 4-0-4 4 Introdução à Criptografia 4-0-4 4 Introdução à Inferência Estatística 4-0-4 4 Programação Matemática 4-0-4 4 Sequências e Séries 4-0-4 4 Teoria dos Grafos 4-0-4 4 Topologia 1 4-0-4 4 História da Matemática 4-0-4 4 Tendências em Educação Matemática 4-0-4 4

Total 54-0-54 54

T: número de horas em aulas expositivas presenciais. P: número médio de horas em laboratórios, aulas práticas ou aulas de exercícios, presenciais. I: estimativa do número de horas de trabalhos adicionais, extraclasse.

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Na lista de disciplinas eletivas que o aluno pode escolher, consta um número

de 13 disciplinas. A tabela anterior apresenta essas disciplinas com suas respectivas

cargas horárias semanais e créditos correspondentes.

No que se refere às disciplinas de opção livre, o aluno pode escolher, dentre

todos os cursos da UFABC, quaisquer disciplinas que não estejam listadas como

disciplina obrigatória e disciplinas eletivas do Curso.

As ementas das disciplinas obrigatórias e eletivas são analisadas na próxima

subseção, ao analisarmos a prática proposta no Curso investigado. Entretanto, cabe

neste momento um registro. Particularmente, questionamo-nos sobre a importância

de algumas disciplinas do BC&T na formação do professor de Matemática para a

Educação Básica, como Estrutura da Matéria. Essa disciplina, obrigatória, estuda,

por exemplo, a Teoria Atômica e a Energia Relativista. Esses conteúdos, estudados

em um primeiro ciclo de formação, portanto geral, fundamentariam conteúdos

necessários ao professor para ensinar Matemática? Ou seriam, conforme vimos nos

capítulos 1 e 2, conteúdos de bases conceituais que desenvolveriam um conjunto de

competências para oferecer ao aluno um maior leque de opções profissionais, como

consta dos Referenciais Orientadores para os Bacharelados Interdisciplinares e

Similares ou é defendido no Processo de Bolonha, para um primeiro ciclo de

formação? Não conseguimos argumentos suficientes para responder sim à primeira

opção.

Conforme já abordamos nesta subseção, consta do PPabc que apenas as

disciplinas pedagógicas comuns e as disciplinas pedagógicas específicas compõem

a prática como componente curricular. Essas disciplinas são identificadas na tabela

a seguir. Com base nas informações da referida tabela, pode-se identificar que das

408 horas da prática como componente curricular, a maior parte, 252 horas, é

composta por disciplinas didático-pedagógicas comuns às quatro Licenciaturas que

compartilham o mesmo Projeto Pedagógico. Assim, apenas 156 das 408 horas são

destinadas a disciplinas didático-pedagógicas específicas para a Licenciatura em

Matemática. Levando-se em consideração a carga horária total de 2.808 horas do

curso, tem-se que pouco menos de 5,6% é utilizada para abordar disciplinas

didático-pedagógicas específicas e pouco menos de 9% para abordar disciplinas

didático-pedagógicas comuns. Essa distribuição faz com que aspectos relacionados

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179

à didática e à pedagogia gerais tenham predomínio sobre aspectos relacionados à

didática e à aprendizagem em Matemática. Em nossa concepção, a didática e a

aprendizagem específicas deveriam prevalecer sobre a didática e a pedagogia

gerais, em licenciaturas que têm como objetivo formar o professor para lecionar

disciplina(s) uma determinada área.

Tabela 8 – Disciplinas que compõem a prática como componente curricular no Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC

Disciplina Carga horária

(em horas)

Frequência relativa da

carga horária do

componente curricular

Frequência relativa da

carga horária do

Curso

Educação Científica, Sociedade e Cultura – DC 48 11,8% 1,7% Políticas Educacionais – DC 36 8,8% 1,3% Desenvolvimento e Aprendizagem – DC 48 11,8% 1,7% Didática – DC 48 11,8% 1,7% Práticas de Ens. de Ciênc. e Matem. no Ens. Fund. – DC 48 11,8% 1,7% Práticas de Ens. de Matem. no Ens.Fund. – DE 48 11,8% 1,7% Educação Inclusiva LIBRAS – DC 24 5,8% 0,8% Práticas de Ensino de Matemática I – DE 36 8,8% 1,3% Práticas de Ensino de Matemática II – DE 36 8,8% 1,3% Práticas de Ensino de Matemática III – DE 36 8,8% 1,3%

Total 408 100% 14,5%

DC: Disciplina didático-pedagógica comum. DE: Disciplina didático-pedagógica específica.

Observa-se, ainda com relação à prática como componente curricular, que

nos três primeiros quadrimestres não há atividades relacionadas a esse componente

curricular, e que as disciplinas didático-pedagógicas específicas, que compõem esse

componente, estão concentradas nos últimos quatro quadrimestres do curso.

Com o objetivo de identificar os assuntos abordados nas disciplinas didático-

pedagógicas específicas, apresentamos a seguir as ementas das disciplinas

Práticas de Ensino de Matemática:

Práticas de Ensino de Matemática no Ensino Fundamental: O papel

da linguagem na educação matemática. A seleção de conteúdos no

ensino fundamental. Modalidades didáticas: aula expositiva, utilização

de mídia impressa, filmes e outros recursos audiovisuais, literatura,

jogos, debates, estudos do meio, quadrinhos, músicas, entre outros. A

experimentação e a matemática: os laboratórios de ensino. A

resolução de problemas no ensino da matemática. Tendências e

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práticas de pesquisa em educação matemática. Avaliação em

educação matemática.

Práticas de Ensino de Matemática I: DCN, PCN e PCN+ para

Matemática no Ensino Médio. Temas Estruturadores da Matemática.

Programa e Currículo de Matemática para o Ensino Médio. Livro

Didático e Livro Paradidático. Matemática e Tecnologias aliadas para

o ensino. Planejamento e Avaliação associados aos conteúdos:

Conjuntos; Números Naturais e Números Reais; Funções Afins,

Quadráticas e Polinomiais; Funções Exponenciais e Logarítmicas;

Funções Trigonométricas.

Práticas de Ensino de Matemática II: Matemática: linguagem, ciência

ou componente lúdica do conhecimento humano? Contextualização.

Matemática e Mídia. Jogos e Artes para estudo da Matemática.

Laboratórios de Ensino de Matemática. Resolução de Problemas e

Olimpíadas. Planejamento e Avaliação associados aos conteúdos:

Progressões; Matemática Financeira; Análise Combinatória;

Probabilidade; Geometria Espacial: estrutura axiomática,

perpendicularismo, distância e ângulos; Poliedros; Áreas e Volumes;

Superfícies Regradas e Sólidos de Revolução.

Práticas de Ensino de Matemática III: Pesquisa para formação do

professor-educador. Etnomatemática. Educação Matemática.

Modelagem Matemática. História da Matemática. Planejamento e

Avaliação associados aos conteúdos: Geometria Analítica Plana;

Geometria Analítica Espacial; Sistemas de Equações Lineares;

Matrizes e Determinantes; Números Complexos; Equações

Algébricas.

Com relação ao componente conteúdos curriculares de natureza científico-

cultural, conforme vimos nesta subseção, ele é composto pelas disciplinas do BC&T,

pelas disciplinas de conteúdo específico, pelas disciplinas eletivas e pelas disciplinas

de opção livre, cujas cargas horárias totalizam 1.800 horas. A maior parte da carga

horária desse componente curricular é composta por disciplinas do BC&T, como se

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pode identificar na tabela a seguir, que apresenta informações sobre a composição

desse componente.

Tabela 9 – Composição do componente conteúdos curriculares de natureza científico-cultural do Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC

Atividades Carga horária

(em horas)

Frequência relativa da

carga horária do

componente curricular

Frequência relativa da

carga horária do

Curso

Disciplinas do BC&T 1.080 60% 38,5% Disciplinas de conteúdo específico 456 25,3% 16,2% Disciplinas eletivas 144 8% 5,1% Disciplinas de opção livre 120 6,7% 4,3%

Total 1.800 100% 64,1%

Consta como de conteúdo específico no PPabc um total de nove disciplinas:

Matemática Discreta, Geometria Plana e Construções Geométricas, Álgebra Linear,

Teoria Aritmética dos Números, Cálculo Numérico, Fundamentos de Análise,

Fundamentos de Álgebra, Evolução dos Conceitos Matemáticos e Fundamentos de

Geometria. Com exceção de Álgebra Linear, com carga horária de 72 horas, as

demais disciplinas são ministradas em carga horária de 48 horas, cada uma.

Entendemos que a composição do componente conteúdos curriculares de

natureza científico-cultural do Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC

privilegia disciplinas da área da Tecnologia, Biologia, Física e Química.

Considerando-se as disciplinas com conteúdos matemáticos provenientes do

BC&T75, a carga horária de conteúdos matemáticos é de 864 horas, o que

corresponde a 48% da carga de 1.800 horas. Lembramos que nas disciplinas de

opção livre o aluno não é obrigado a escolher disciplinas matemáticas.

Dessa forma, o componente conteúdos curriculares de natureza científico-

cultural do Curso investigado, de acordo com nossa análise, não privilegia,

necessariamente, uma formação matemática.

No que se refere ao componente estágio curricular supervisionado, sua carga

horária total é de 400 horas e suas atividades são divididas em cinco quadrimestres,

com cargas horárias de 80 horas cada, a partir do oitavo quadrimestre.

75

Bases Matemáticas (48h), Funções de Uma Variável (48h), Geometria Analítica (36h), Introdução às Equações Diferenciais Ordinárias (48h), Funções de Várias Variáveis (48h) e Probabilidade e Estatística (36h).

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182

Recomenda-se, no PPabc, que as matrículas em cada uma das cinco etapas

do estágio sejam vinculadas às matrículas nas disciplinas de Práticas de Ensino.

Esse vínculo é apresentado na tabela a seguir:

Quadro 10 – Vínculo entre as etapas do estágio curricular supervisionado e as disciplinas de Práticas de Ensino do Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC

Etapas do estágio Disciplinas vinculadas

I do nível fundamental Práticas de Ensino em Ciências e Matemática no Ensino Fundamental II do nível fundamental Práticas de Ensino em Matemática no Ensino Fundamental I do nível médio Práticas de Ensino de Matemática I II do nível médio Práticas de Ensino de Matemática II III do nível médio Práticas de Ensino de Matemática III

Entendemos que a ideia de associar cada etapa do estágio a uma disciplina

da prática como componente curricular é bem pensada. Entretanto, pela flexibilidade

curricular que é oferecida ao aluno, ele não tem, necessariamente, de realizar essas

atividades de forma vinculada. Isso, na nossa concepção, pode levar o estágio a ser

realizado com fins em si mesmo, ou seja, com atividades desconexas das demais

atividades práticas do curso.

No PPabc constam propostas para as atividades a serem realizadas em cada

uma das cinco etapas do estágio supervisionado.

Para a primeira etapa do Ensino Fundamental são recomendadas a

observação da unidade escolar, por meio do reconhecimento do espaço físico, do

projeto pedagógico e do calendário escolar, e a observação da sala de aula, por

meio do contato com o(s) e professor(es) da área de Matemática e Ciências e do

contato com os planejamentos das disciplinas e da observação da sala de aula.

Além dessas duas observações, são recomendadas uma pesquisa sobre os

recursos materiais e didáticos em diferentes espaços educativos, como museus,

editoras, mídias eletrônicas e televisivas, e uma investigação sobre as possíveis

intervenções que podem ser feitas na unidade escolar em que se está estagiando.

Na segunda etapa do Ensino Fundamental são recomendados a observação de

aulas, o planejamento de uma intervenção didática e a própria intervenção, por meio

da regência de uma atividade. Para a primeira etapa do Ensino Médio, recomendam-

se as mesmas atividades relacionadas na primeira etapa do Ensino Fundamental,

porém com foco no Ensino Médio. Já para a segunda e a terceira etapas do Ensino

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183

Médio, recomendam-se, em ambas, com foco naquele nível de ensino, as mesmas

atividades relacionadas na segunda etapa do Ensino Fundamental.

Com diretrizes gerais constando no PPabc, cada uma das quatro

Licenciaturas assume as atividades de estágio supervisionado relacionadas à sua

área de formação. Especificamente para a Licenciatura em Matemática, são os

educadores matemáticos que assumem quatro das cinco etapas do estágio

supervisionado: a primeira etapa do Ensino Fundamental, ora é assumida por

educador matemático, ora é assumida por um professor da área de Ciências

Naturais, e ora é assumida por ambos.

Em se tratando do componente atividades acadêmico-científico-culturais,

consta do PPabc que o objetivo principal das atividades relacionadas a esse

componente é a “[...] imersão dos futuros educadores em ambientes de produção

científica do conhecimento [...]”, contribuindo para a formação do docente reflexivo

em sua prática. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO ABC, 2009a, p. 21)

Além do objetivo principal, também é indicada a pretensão de que o aluno

participe de atividades que tenham como finalidade a difusão do conhecimento ao

público geral e a formação continuada e, para isso, no PPabc, são sugeridas

atividades com essas características, algumas delas oferecidas na própria IES.

Essas atividades, juntamente com as respectivas cargas horárias, constam de um

quadro no referido documento, o qual é reproduzido a seguir.

Quadro 11 – Sugestão de atividades extracurriculares e suas respectivas cargas horárias, indicadas no Projeto Pedagógico das Licenciaturas da UFABC

Atividade Carga horária

Participação em mini-cursos, oficinas, cursos de extensão, palestras, congressos, semanas pedagógicas e/ou culturais, na UFABC ou em outras universidades.

Carga horária do certificado

Monitoria nas disciplinas da UFABC 50 horas do total, contadas uma única vez

Visitas a exposições, museus, espaços culturais diversos,...

2 horas por espaço visitado

Assistir a filmes do cine-club UFABC e participar dos debates

2 horas por filme, limitada a 10 horas

Assistir ou participar de peças de teatro 2 horas por peça, limitada a 10 horas

Participação em grupos de estudo ou pesquisa 30 horas no total

Participação como voluntário em projetos educacionais e/ou comunitários

3 horas por participação

Participação em visitas técnicas e estudos do meio A critério do professor que acompanha

Participação em projetos de iniciação científica 100 horas por ano, podendo ser contados uma única vez

Fonte: UNIVERSIDADE FEDERAL DO ABC, 2009a, p. 20-21, adaptado.

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Todas as atividades complementares, segundo o que consta no PPabc,

devem ser acompanhadas de relatório e, a priori, ser realizadas fora do período de

aulas, admitindo-se, quando em período de aulas, somente as atividades

autorizadas pela coordenação do Curso. Não há, no PPabc, indicação de que as

atividades realizadas no BC&T possam ser consideradas na Licenciatura em

Matemática ou vice-versa.

No tocante aos conteúdos que as licenciaturas em Matemática têm de

contemplar, identificamos, por meio das ementas das disciplinas obrigatórias da

Licenciatura investigada, quais disciplinas desse Curso poderiam ser associadas a

eles. Na Tabela 10 apresentamos essa possível associação.

Porém, antes da apresentação da referida tabela, cabe salientar que

disciplinas cujas ementas indicam assuntos que podem ser associados a mais de

uma categoria de conteúdo curricular, foram associadas na categoria cuja maior

parte dos assuntos era evidenciada. Apenas duas disciplinas obrigatórias e

específicas de Matemática não constam da tabela: Matemática Discreta e Cálculo

Numérico. Em Matemática Discreta, não foi possível identificar a categoria que seria

evidenciada pela maior parte dos assuntos: na ementa constam, dentre outros,

assuntos da Matemática presente na Educação Básica, como a análise

combinatória, e assuntos da Álgebra, como relações de equivalência e de ordem. Já

em Cálculo Numérico, a maior parte dos assuntos da ementa não pode ser

associados a alguma das categorias indicadas nas Diretrizes Curriculares

específicas da licenciatura em Matemática, uma vez que essa disciplina implicaria

outra categoria, distinta das existentes no referido documento.

Salienta-se, também, que as ementas das disciplinas de Prática de Ensino de

Matemática I, II e III relacionam conteúdos matemáticos da Educação Básica, mas

não com o objetivo de estudar o ensino e a aprendizagem desses conteúdos e sim

estudar planejamentos e processo de avaliação relacionado a eles. As ementas

dessas Práticas de Ensino de Matemática são analisadas na próxima subseção.

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Tabela 10 – Possível associação entre disciplinas obrigatórias do Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC e conteúdos indicados nas Diretrizes Curriculares específicas

Conteúdo curricular relacionado ...

Disciplina Carga horária

(em horas)

Carga horária

total (em horas)

Frequência relativa da

carga horária total do Curso

ao Cálculo Diferencial e Integral

Funções de Uma Variável

48

144 5,1% Introdução às Equações Diferenciais Ordinárias

48

Funções de Várias Variáveis

48

à Álgebra Linear Álgebra Linear 72 72 2,6%

aos Fundamentos de Análise Fundamentos de Análise

48 48 1,7%

aos Fundamentos de Álgebra

Fundamentos de Álgebra

48

96 3,4% Teoria Aritmética dos Números

48

aos Fundamentos de Geometria

Geometria Plana e Construções Geométricas

48

96 3,4%

Fundamentos de Geometria

48

à Geometria Analítica Geometria Analítica 36 36 1,3%

aos assuntos matemáticos presentes na Educação Básica nas áreas de Álgebra, Geometria e Análise

Bases Matemáticas 48 48 1,7%

às áreas afins à Matemática

Bases Experimentais das Ciências Naturais

36

204 7,3%

Fenômenos Mecânicos

60

Fenômenos Térmicos 48

Fenômenos Eletromagnéticos

60

à História e Filosofia das Ciências e da Matemática

Bases Epistemológicas da Ciência Moderna

36

84 3,0% Evolução dos Conceitos Matemáticos

48

Total 828 29,5%

Das informações da tabela, pode-se observar que, em se tratando de

conteúdos matemáticos, os relacionados ao Cálculo Diferencial e Integral parecem

ter preponderância sobre os demais, como na maioria das licenciaturas em

Matemática, conforme é de conhecimento público: mesmo sendo uma proposta

diferenciada de formação, o Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC

parece reservar, no que se refere aos conteúdos matemáticos da Educação

Superior, maior carga para o Cálculo Diferencial e Integral.

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Por outro lado, observa-se que a Geometria não é a área que menos tem

carga horária no grupo das disciplinas matemáticas, como geralmente ocorre em

algumas licenciaturas em Matemática, que também é de conhecimento público.

Entretanto, observamos a ausência da Geometria no espaço, ou Geometria

Espacial, que não faz parte da relação das disciplinas obrigatórias e tampouco parte

das disciplinas eletivas. Aliás, não faz parte também das disciplinas de opção livre,

uma vez que, analisando-se o catálogo das disciplinas de todos os cursos da

UFABC, não é possível identificar Geometria Espacial ou disciplina semelhante em

cursos dessa instituição, ou mesmo disciplinas que abordem diretamente o assunto.

Apenas na ementa da disciplina Prática de Ensino de Matemática II consta a

Geometria Espacial, mas com o objetivo de estudar planejamentos e processo de

avaliação relacionado a ela, conforme registramos acima.

Relação entre o que indicado no Projeto Pedagógico do Curso

investigado e o que é indicado nas atuais Diretrizes Curriculares

o Carga horária

O Curso investigado está estruturado com carga horária de 2.808 horas

relógio. Portanto, tem carga maior que 2.800 horas relógio, indicada como mínima

na Resolução CNE/CP 2/2002, que compõe as atuais Diretrizes Curriculares para os

cursos de licenciatura brasileiros. Sendo assim, o PPabc contempla plenamente o

que é indicado nas atuais Diretrizes Curriculares, para essa categoria.

Ressalta-se que as oito horas acima do indicado como carga horária mínima

pelas Diretrizes Curriculares são justificadas pela utilização de unidade de créditos

pela instituição, na contagem das disciplinas cursadas pelo aluno. Essa unidade

corresponde a 12 horas.

o Duração

Com relação à duração do Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC

observa-se não haver uma determinação de que o Curso deva ser ministrado em um

período fixo de anos. No PPabc, consta que o Curso tem duração ideal de 12

quadrimestres, o que corresponde a quatro anos. Mas o mesmo documento acena

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com a possibilidade de o aluno concluí-lo em três anos, conforme a duração mínima

fixada pelas atuais Diretrizes Curriculares. Portanto, a duração do Curso de

Licenciatura em Matemática da UFABC é maior que três anos, indicado como

mínima na Resolução CNE/CP 2/2002, documento que compõe as atuais Diretrizes

Curriculares dos cursos de formação de professores para o Ensino Fundamental II e

Ensino Médio. Dessa forma, para a categoria duração o PPabc contempla

plenamente o que é indicado nas atuais Diretrizes Curriculares.

Destaca-se que, embora informações do PPabc indiquem que o aluno possa

cursar a Licenciatura em Matemática da UFABC em três anos, no sítio do Ministério

da Educação consta que esse Curso tem periodicidade de 12 quadrimestres.

o Componentes curriculares e a distribuição das suas cargas

horárias

Os quatro componentes curriculares fixados na Resolução CNE/CP 2/2002 –

prática como componente curricular; estágio curricular supervisionado; conteúdos

curriculares de natureza científico-cultural; e atividades acadêmico-científico-

culturais – estão presentes na estrutura curricular da Licenciatura em Matemática da

UFABC, conforme abordamos. A tabela a seguir apresenta a carga horária que cada

um desses componentes contribui no curso.

Tabela 11 – Distribuição da carga horária do Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC pelos componentes curriculares estabelecidos pela Resolução CNE/CP 2/2002

Componentes curriculares

Carga mínima

estabelecida pelo CNE (em horas)

Carga praticada no Curso

da UFABC (em horas)

Frequência relativa

Prática como componente curricular 400 408 14,53% Conteúdos curriculares de natureza científico-cultural 1.800 1.800 64,10% Estágio curricular supervisionado 400 400 14,25% Atividades acadêmico-científico-culturais 200 200 7,12%

Total 2.800 2.808 100%

Observa-se que, com exceção da dimensão prática como componente

curricular, os demais componentes contribuem com cargas horárias mínimas,

conforme estabelecidas pela Resolução CNE/CP 2/2002. Assim, pode-se afirmar

que o Curso de Licenciatura da UFABC propõe os quatro componentes curriculares

com as cargas horárias mínimas fixadas nas Diretrizes Curriculares.

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188

Por outro lado, a Resolução CNE/CP 2/2002 estabelece que as atividades

que compõem a prática como componente curricular devem ser vivenciadas ao

longo das licenciaturas. De forma mais específica, o Parecer CNE/CP n.º 28 indica

que essas atividades devem estar presentes desde o início até o final da duração do

processo formativo. Já a Resolução CNE/CP 1/2002 indica que não apenas

disciplinas pedagógicas, mas todas as disciplinas que constituem os componentes

curriculares de formação para a docência deverão ter sua dimensão prática.

Ademais, as Diretrizes Curriculares indicam que as atividades do estágio curricular

supervisionado devem ser implementadas no início da segunda metade dos cursos.

Logo, se levarmos em consideração o total de 12 quadrimestres, conforme indicado

no sítio do MEC, o estágio, no Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC,

deveria iniciar junto ao início do sétimo semestre.

Ao observarmos o fluxo ideal do Curso, apresentado na Tabela 6,

identificamos que é apenas a partir do quarto quadrimestre que as disciplinas

didático-pedagógicas comuns ou específicas são oferecidas. Levando-se em

consideração que são essas as disciplinas que compõem a prática como

componente curricular do Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC,

entende-se que as atividades relacionadas a esse componente estão presentes em

75% dos quadrimestres. Além disso, com base nas informações contidas no PPabc,

identificamos que a dimensão prática não está presente em todas as disciplinas de

formação para a docência, como é o caso, por exemplo, da disciplina Geometria

Analítica. Entendemos que essa disciplina, assim como outras da área da

Matemática, faz parte da formação específica para lecionar Matemática na

Educação Básica, uma vez que contribuiria para a apropriação, pelo futuro

professor, de conhecimentos defendidos como necessários ao ensino, como o

conhecimento especializado do conteúdo, definido por Ball, Thames e Phelps (2007,

2008).

Em relação ao estágio curricular supervisionado, ao observarmos o fluxo de

curso da UFABC – Tabela 6 – constamos que ele tem suas atividades iniciadas no

oitavo quadrimestre, estendendo-se até o final do Curso. Logo, o estágio curricular

supervisionado, no referido Curso, inicia-se mais tarde do que o estabelecido nas

Diretrizes Curriculares.

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No que se refere aos conteúdos curriculares de natureza científico-cultural,

embora a organização curricular indicada no PPabc contemple a carga horária

mínima especificada para esse componente, 1.080 das 1.800 horas – 60% –

correspondem a disciplinas do BC&T . Considerando que a finalidade do BC&T não

é, necessariamente, proporcionar uma formação específica para um futuro professor

de Matemática lecionar na Educação Básica, não podemos afirmar que o domínio

dos conteúdos curriculares de natureza científico-cultural do Curso de Licenciatura

em Matemática da UFABC forneça as bases para o desenvolvimento das atividades

relacionadas à prática como componente curricular e para o estágio curricular

supervisionado, conforme consta do Parecer CNE/CP 28/2001.

No que diz respeito ao componente curricular atividades acadêmico-científico-

culturais, entendemos que elas podem contemplar o que é especificado no Parecer

CNE/CP 28/201. No referido documento consta que esse componente abarcaria

atividades como: seminários, participação em eventos científicos, visitas, monitorias,

estudos de extensão, entre outras, com orientação docente e essas atividades

constam do quadro apresentado no PPabc, que por nós foi reproduzido neste estudo

como Quadro 10.

Concluímos então, sobre a categoria de análise componentes curriculares e a

distribuição das suas cargas horárias, que o PPabc do Curso de Licenciatura da

UFABC contempla parcialmente o que é indicado nas atuais Diretrizes Curriculares.

o Disciplinas contendo conteúdos obrigatórios

Os conteúdos curriculares fixados pelo Parecer 1.302 – conteúdos comuns a

todas as licenciaturas, conteúdos matemáticos presentes na Educação Básica nas

áreas de Álgebra, Geometria e Análise, conteúdos de áreas afins à Matemática, e

conteúdos da História e Filosofia das Ciências e da Matemática – estão presentes

em ementas de disciplinas do Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC.

Dessa forma, com relação a essa categoria, concluímos que o PPabc do

Curso de Licenciatura da UFABC contempla plenamente o que é indicado nas atuais

Diretrizes Curriculares.

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Ressaltamos a inexistência de disciplina para o ensino de conteúdos

relacionados à Geometria Espacial, em nossa concepção, indispensável em cursos

que têm como objetivo formar professores de Matemática para a Educação Básica.

4.1.3 Síntese da análise dos elementos do Projeto Pedagógico do Curso

investigado

No quadro a seguir, apresentamos a síntese da análise de elementos do

Projeto Pedagógico do Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC.

Quadro 12 – Síntese da análise de elementos do Projeto Pedagógico do Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC

Categorias de Análise Síntese da análise: o PPabc ...

Un

idad

es d

e a

náli

se

Ob

jeti

vo

e

perf

il d

os

eg

res

so

s

Objetivos do Curso

... contempla parcialmente o que é indicado nas atuais Diretrizes Curriculares

Perfil do egresso ... não contempla o que é indicado nas atuais Diretrizes Curriculares

Org

an

ização

cu

rric

ula

r

Carga horária

... contempla plenamente o que é indicado nas atuais Diretrizes Curriculares

Duração

... contempla plenamente o que é indicado nas atuais Diretrizes Curriculares

Componentes curriculares e a distribuição das suas cargas

horárias

... contempla parcialmente o que é indicado nas atuais Diretrizes Curriculares

Conteúdos obrigatórios

... contempla plenamente o que é indicado nas atuais Diretrizes Curriculares

Por meio das análises até aqui realizadas, é possível identificar alguns

elementos que embasam as respostas para nossas questões de pesquisa, dentre

eles indicamos:

A UFABC considera que apenas as disciplinas didático-pedagógicas,

um total de dez, compõem a prática como componente curricular do

curso investigado, componente que está presente em apenas 75% da

duração do Curso, conforme o fluxo ideal de disciplinas a cursar. Além

dessas disciplinas, somente no estágio curricular, que está presente a

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partir do oitavo quadrimestre do curso, há explicitamente a indicação

da existência da dimensão prática.

Conforme o fluxo ideal de curso proposto pela UFABC, a prática como

componente curricular está presente a partir do quarto quadrimestre, de um Curso

com duração prevista de 12 quadrimestres. Não há, explicitamente, dimensão

prática em todas as disciplinas: essa dimensão está restrita em um grupo de

disciplinas pedagógicas gerais e específicas e nos estágios, que são iniciados a

partir do oitavo quadrimestre do Curso.

A UFABC não considera haver perfil diferenciado para os egressos

das Licenciaturas que compartilham o mesmo Projeto Pedagógico.

O perfil dos egressos, com as competências e habilidades, é apresentado de

forma geral para os quatro cursos que compartilham o mesmo Projeto Pedagógico.

Não há um delineamento especifico para os alunos da Licenciatura em Matemática.

Além dos elementos acima relacionados, nossa análise permite afirmar que

mesmo respondendo positivamente a questões que deveriam ser enfrentadas no

campo curricular, indicadas na Proposta de Diretrizes do MEC, como a concepção

restrita da prática aos estágios e a inadequação do tratamento da pesquisa, alguns

problemas indicados no mesmo documento são identificados na UFABC.

Um deles, no campo institucional e que foi abordado na subseção 3.4.1, é a

submissão da proposta pedagógica à organização educacional. Há apenas um

Projeto Pedagógico para quatro Licenciaturas, que é subordinado à organização

institucional da UFABC ao ter parte da matriz curricular comum a quatro licenciaturas

distintas fixada com disciplinas de um Curso de Bacharelado. Em nossa visão, esse

fato contribui de forma negativa para que o Curso de Licenciatura em Matemática

investigado construa sua identidade, uma vez que parte da sua carga horária – mais

de 38% – é composta por disciplinas de Matemática, Ciências Naturais e

Tecnologia, com o objetivo de formar o aluno para diferentes cursos da instituição.

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4.2 Análise das disciplinas e da prática proposta no Curso investigado

Nesta subseção analisamos as disciplinas obrigatórias e eletivas do Curso de

Licenciatura em Matemática da UFABC e a prática proposta indicada no PPabc e

delineada nas entrevistas que realizamos.

Sendo assim, elegemos duas unidades de análise:

Relação entre os domínios dos conhecimentos para o ensino de

Matemática e disciplinas indicadas na matriz curricular do Curso; e

A prática explicitada no PPabc e delineada nas entrevistas.

4.2.1 Relação entre os domínios dos conhecimentos para o ensino de

Matemática e disciplinas indicadas na matriz curricular do Curso

Nesta unidade nosso objetivo é analisar a relação existente entre referenciais

teóricos da formação de professores para a Educação Básica, sobretudo de

Matemática, e disciplinas que são indicadas no Projeto Pedagógico do Curso

investigado.

Para tanto, analisamos as ementas das disciplinas obrigatórias e das

disciplinas eletivas e elaboramos o Quadro 13, que apresenta uma associação

possível dessas disciplinas aos domínios dos conhecimentos definidos por Ball,

Thames e Phelps (2007, 2008), às categorias definidas por Shulman (1987), ou a

uma categoria que denominamos de outros conhecimentos, formada por disciplinas

cujas ementas contêm assuntos relacionados, dentre outros, à Tecnologia, à

Biologia, à Física, à Química, e à própria Matemática, como área de conhecimento.

Para a elaboração do referido quadro, procuramos responder à seguinte

pergunta, ao analisar a ementa de cada disciplina: os assuntos relacionados podem

contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de

conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento

definido por Shulman (1987)?

Se a resposta foi não, então associamos a disciplina oferecida à categoria de

outros conhecimentos. Caso contrário, buscamos elementos para associar a

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disciplina aos domínios dos conhecimentos para o ensino de Matemática, conforme

nossa interpretação desse referencial teórico, caracterizada no Quadro 2 da

subseção 2.1.2, ou para associar a disciplina às categorias de conhecimento de

Shulman (1987). Essa associação pode ser visualizada no Apêndice I. Nele é

possível identificar a qual domínio de conhecimento de Ball, Thames e Phelps (2007,

2008), ou categoria de conhecimento de Shulman (1987), cada assunto, contido nas

ementas analisadas, foi associado.

Com as informações do Quadro 13, montamos um diagrama para identificar a

possível relação existente entre as disciplinas oferecidas na matriz curricular

indicada no PPabc do Curso investigado e pressupostos teóricos de formação de

professores para a Educação Básica.

Chamamos a atenção para a possibilidade de uma mesma disciplina poder,

ao mesmo tempo, dependendo de sua ementa, ser associada a mais de um domínio

dos conhecimentos definidos por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008), a mais de

uma categoria de conhecimento definida por Shulman (1987), ou ainda à categoria

por nós denominada de outros conhecimentos.

Lembramos que essa análise está limitada às disciplinas obrigatórias, em

número de 45, e disciplinas eletivas, em número de 13, totalizando 58 disciplinas do

Curso investigado.

Quadro 13 – Associação possível das disciplinas obrigatórias e eletivas do Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC com pressupostos teóricos de formação de professores para a Educação

Básica

Disciplina – Grupo/Carga horária (em horas)

Domínio dos conhecimentos para o ensino de Matemática

S OC

I II III IV V VI

Ob

rig

ató

ria

s

Base Experimental das Ciências Naturais – B/36 X

Bases Computacionais da Ciência – B/24 X

Bases Matemáticas – B/48 X X X

Estrutura da Matéria – B/36 X

Origem da Vida e Diversidade dos Seres Vivos – B/36 X

Fenômenos Mecânicos – B/60 X

Funções de Uma Variável – B/48 X X

Geometria Analítica – B/36 X X X

Natureza da Informação – B/36 X

Transformações nos Seres Vivos e Ambiente – B/36 X

Bases Epistemológicas da Ciência Moderna – B/36 X

Fenômenos Térmicos – B/48 X

Introd. às Equações Diferenciais Ordinárias – B/48 X

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Processamento da Informação – B/ 60 X

Transformações Químicas – B/60 X

Comunicação e Redes – B/36 X

Fenômenos Eletromagnéticos – B/60 X

Funções de Várias Variáveis – B/48 X

Transformações Bioquímicas – B/60 X

Educação Científica, Sociedade e Cultura – DC/48 X

Introdução à Probabilidade e à Estatística – B/36 X X X

Energia: Origens, Conversão e Uso – B/24 X

Física Quântica – B/36 X

Políticas Educacionais – DC/36 X

Matemática Discreta – CE/48 X X X

Interações Atômicas e Moleculares – B/36 X

Desenvolvimento e Aprendizagem – DC/48 X

Geometria Plana e Construções Geométricas – CE/48 X X X

Álgebra Linear – CE/72 X X X

Estrutura e Dinâmica Social – B/36 X

Didática – DC/48 X

Teoria Aritmética dos Números – CE/48 X X

Ciência, Tecnologia e Sociedade – B/36 X

Prát. de Ens. de Ciênc. e Matem. no Ens. Fund. – DC/48 X X X X

Cálculo Numérico – CE/48 X X X

Projeto Dirigido – B/24 X

Prát. de Ens. de Matemática no Ens. Fund. – DE/48 X X

Fundamentos de Análise – CE/48 X X

Educação Inclusiva LIBRAS – DC/24 X X

Práticas de Ensino de Matemática I – DE/36 X X X

Fundamentos de Álgebra – CE/48 X X X

Práticas de Ensino de Matemática II – DE/36 X

Evolução dos Conceitos Matemáticos – CE/48 X

Práticas de Ensino de Matemática III – DE/36 X

Fundamentos de Geometria – CE/48 X X X

Ele

tiv

as

Análise Real 1 – CE/48 X X X

Anéis e Corpos – CE/48 X X

Funções de Variáveis Complexas – CE/72 X X X

Geometria Não-Euclidiana – CE/48 X X X

Grupos – CE/48 X X

Introdução à Criptografia – CE/48 X

Introdução à Inferência Estatística – CE/48 X

Programação Matemática – CE/48 X

Sequências e Séries – CE/48 X X

Teoria dos Grafos – CE/48 X

Topologia 1 – CE/48 X

História da Matemática – CE/48 X

Tendências em Educação Matemática – CE/48 X

Total de disciplinas 13 18 1 1 10 3 5 44 I: Conhecimento comum do conteúdo II: Conhecimento especializado do conteúdo III: Conhecimento horizontal do conteúdo IV: Conhecimento de conteúdo e de alunos V: Conhecimento de conteúdo e de ensino VI: Conhecimento de conteúdo e de currículo S: Categoria de conhecimento definido por Shulman (1986, 1987) OC: Outros conhecimentos

Do Quadro 13 pode-se identificar que do total de 58 disciplinas obrigatórias ou

eletivas, 30 foram associadas a referenciais teóricos de formação de professores ao

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passo que 44 disciplinas foram associadas à categoria por nós denominada de

outros conhecimentos. Dessas 44 disciplinas, 28 foram somente associadas à

categoria de outros conhecimentos. Fazem parte dessas 28 disciplinas sete da área

da Matemática, que são identificadas no decorrer desta subseção.

No tocante a essas sete disciplinas da área da Matemática, entendemos, com

base na nossa interpretação dos estudos de Ball, Thames e Phelps (2007, 2008),

que em suas ementas somente há assuntos que não teriam vinculação imediata

com os conteúdos que o futuro docente irá lecionar, ou seja, seriam não

imprescindíveis para a atuação do professor na Educação Básica. Como exemplo de

conhecimentos matemáticos classificados como outros, citamos conteúdos

constantes na ementa da disciplina Funções de Várias Variáveis: derivadas parciais,

derivada direcional, regra da cadeia, gradiente, fórmula de Taylor, noções de

integrais múltiplas, integrais de linha, teorema da divergência e teorema de Stokes.

Os assuntos que compõem a referida ementa, não se associam diretamente a

algum domínio dos conhecimentos para o ensino de Matemática, definidos por Ball,

Thames e Phelps (2007, 2008). O mesmo ocorre com os assuntos das seis demais

disciplinas, assuntos esses que podem ser identificados no Apêndice I.

Cumpre lembrar que nossa análise não se baseou apenas nos nomes das

disciplinas e sim nos assuntos propostos nas suas ementas, o que foi decisivo para

a associação, por exemplo, da disciplina Funções de Variáveis Complexas a dois

domínios dos conhecimentos para o ensino da Matemática e à categoria de outros

conhecimentos. A ementa dessa disciplina contém assuntos como números

complexos, função exponencial, função trigonométrica, logaritmo e integral de linha.

Os quatro primeiros assuntos contribuiriam para a apropriação de conhecimentos

comuns e especializados do conteúdo76, ao passo que o último assunto contribuiria

para a apropriação de outros conhecimentos, nesse caso, matemáticos, mas não

imprescindíveis para a formação do futuro professor para ensinar na Educação

Básica.

76

Lembramos que de acordo com nossa interpretação dos estudos de Ball, Thames e Phelps (2007, 2008), as disciplinas que promoveriam a apropriação de conhecimentos comum do conteúdo também promoveriam a apropriação de conhecimentos especializados.

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Assunto que suscita discussões a respeito de como deveria ser abordado em

cursos de formação inicial de professores de Matemática para a Educação é o

relacionado a limites. Nosso posicionamento sobre esse assunto é de que o estudo

de conteúdos relacionados a limites, nas licenciaturas em Matemática, é importante.

Particularmente, não associaríamos esse assunto ao domínio de conhecimento

comum do conteúdo, uma vez que ele não é mais objeto de ensino na Educação

Básica, mas o associaríamos ao domínio de conhecimento especializado do

conteúdo, durante o momento em que ele fosse tratado de maneira intuitiva.

Entendemos que para um futuro professor de Matemática da Educação Básica, que

terá as funções como um dos objetos de ensino, o estudo intuitivo de limites pode

contribuir para que ele se aproprie de conhecimentos relacionados à continuidade de

funções, estudo da variação de funções e outros conteúdos associados às funções.

Em se tratando da definição formal de limites, demonstrações das suas

propriedades, e conteúdos mais aprofundados sobre o assunto, entendemos que

fariam parte de conhecimentos, importantes sim, mas que não teriam vinculação

imediata com os conteúdos que o futuro docente lecionaria, ou seja, seriam não

imprescindíveis para a atuação do professor na Educação Básica, mas

imprescindíveis para que esse profissional pudesse dar andamento à sua formação

pós-graduada.

Sendo assim, deixamos clara nossa posição de que não somos contra a

existência de disciplinas abordando assuntos matemáticos que possam contribuir na

formação Matemática, como área de conhecimento, do futuro professor da

Educação Básica. Estamos de acordo com a especificação contida na Proposta de

Diretrizes e oficializada na Resolução CNE/CP 1/2002, abordadas no capítulo 3, que

determina a presença de conteúdos ampliadores nas licenciaturas, ou seja,

conteúdos que vão além do que o futuro professor ensinará na Educação Básica.

Além do objetivo que consta nos documentos citados, que é relacionar os conceitos

estudados em nível superior aos assuntos que o futuro professor lecionará no

Ensino Básico, entendemos que os conteúdos ampliadores teriam também como

objetivo oferecer bases matemáticas para que o futuro professor pudesse prosseguir

sua formação em nível de pós-graduação. Por outro lado, entendemos, também, que

esses conteúdos ampliadores não poderiam exceder, em carga horária, os

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conteúdos relacionados aos conhecimentos necessários para o ensino na Educação

Básica, definidos e defendidos por educadores, sobretudo, matemáticos.

Com o objetivo de representar a distribuição das cargas horárias das

disciplinas obrigatórias e eletivas pelas três grandes categorias de conhecimentos

utilizadas na elaboração do Quadro 13, elaboramos a seguinte figura.

Figura 9 – Distribuição da carga horária das disciplinas obrigatórias e eletivas do Curso investigado pelas categorias de conhecimentos

Fonte: acervo do autor

Na composição da carga horária da categoria outros conhecimentos, que

totaliza 1.968 horas, identificamos que 864 horas correspondem a carga destinada

somente a assuntos da Tecnologia, da Biologia, da Física ou da Química. Das 1.104

horas restantes:

336 horas são destinadas a sete disciplinas da área da Matemática

cujas ementas são compostas somente por assuntos que entendemos

ser não imprescindíveis, ou seja, que não teriam vinculação imediata

com os conteúdos que o futuro docente irá lecionar na Educação

Básica. Compõem esse grupo as seguintes disciplinas: Introdução às

Equações Diferenciais e Ordinárias, Função de Várias Variáveis,

Introdução à Criptografia, Introdução à Inferência Estatística,

Programação Matemática, Teoria dos Grafos e Topologia 1;

24 horas são destinadas à disciplina LIBRAS, cuja ementa contém

assuntos relacionados por nós a outros conteúdos e assuntos

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relacionados a uma categoria de conhecimento definida por Shulman

(1987): a categoria de conhecimento de estudantes e suas

características; e

744 horas são destinadas a disciplinas Matemáticas em cujas

ementas foram por nós identificados assuntos relacionados a

domínios dos conhecimentos definidos por Ball, Thames e Phelps

(2007, 2008) e assuntos não imprescindíveis à formação do futuro

professor para a Educação Básica. Compõem esse grupo as

disciplinas Bases Matemáticas, Funções de Uma Variável, Geometria

Analítica, Introdução à Probabilidade e Estatística, Matemática

Discreta, Álgebra Linear, Cálculo Numérico, Fundamentos de Análise,

Fundamentos de Álgebra, Análise Real 1, Anéis e Corpos, Funções de

Variáveis Complexas, Geometria Não-Euclidiana, Grupos e

Sequências e Séries.

Comparadas as ementas das disciplinas do Curso investigado com os

assuntos matemáticos fixados no Parecer CNE/CES 1.302/2001, que estabelece as

Diretrizes Curriculares específicas para a licenciatura em Matemática, observamos

que disciplinas que abordam esses assuntos fixados, com exceção dos assuntos

relacionados à Geometria, constam do último grupo de disciplinas identificadas

acima. Esse fato vai ao encontro da nossa expectativa que decorre da interpretação

que fazemos dos estudos de Ball, Thames e Phelps (2007, 2008), registrada na

subseção 3.4.3, por meio do Quadro 9, de que as disciplinas que abordariam os

assuntos fixados nas Diretriz Curriculares específicas dos cursos e Matemática

poderiam contemplar domínios dos conhecimentos Matemáticos para o ensino,

definidos pelos respectivos educadores.

Com relação às disciplinas que foram associadas somente à categoria de

conhecimentos definidos por Shulman, identificamos que suas ementas contêm

assuntos que podem contribuir, segundo nossa análise, para a apropriação dos

seguintes conhecimentos, definidos pelo respectivo educador no artigo publicado em

1987: conhecimentos de fins educacionais, conhecimentos de contextos

educacionais, conhecimento pedagógico geral, e conhecimento de estudantes e

suas características. As disciplinas às quais nos referimos são: Políticas

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Educacionais, Desenvolvimento e Aprendizagem, Didática e Educação Inclusiva:

LIBRAS.

Entendemos que a presença de três das quatro disciplinas identificadas no

parágrafo anterior é necessária na formação do futuro professor, não somente de

Matemática, mas de todas as disciplinas para a Educação Básica, por tratarem de

assuntos comuns à formação de docentes de quaisquer disciplinas desse nível de

ensino. Portanto, partilhamos o que preconizaram os autores da Proposta de

Diretrizes e que foi fixado pela Resolução CNE/CP 1/2002. No primeiro documento,

é recomendado que nos cursos de formação de professores fosse reservada carga

horária para tratar assuntos necessários a todos os professores da Educação

Básica, especialistas ou não, o que foi oficializado no segundo documento por meio

da fixação dos eixos que articulariam as dimensões a serem contempladas nas

licenciaturas, sendo um deles, o eixo articulador das formações comum e específica.

Logo, uma das dimensões que devem ser contempladas nas licenciaturas é a

formação comum, da qual entendemos fazer parte as disciplinas Políticas

Educacionais, Desenvolvimento e Aprendizagem e Educação inclusiva: LIBRAS.

Com relação à disciplina Didática, cuja ementa no Curso investigado aborda a

didática geral, entendemos que ela poderia ceder lugar à Didática da Matemática,

uma vez que, além da abordagem de didática específica, nela poderiam ser

abordados, caso necessário, aspectos relacionados à didática geral.

Em se tratando da composição da carga horária da categoria dos

conhecimentos para o ensino de Matemática, que totaliza 1.236 horas, 744 horas

correspondem a uma subcategoria já identificada. A carga horária complementar, ou

seja, de 492 horas, é composta por três tipos de disciplinas: disciplinas Matemáticas

cujos assuntos relacionados nas ementas foram todos associados a domínios dos

conhecimentos definidos por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008); disciplinas

denominadas Práticas de Ensino; e disciplinas de História da Matemática ou da

Educação Matemática. Dez disciplinas compõem essa categoria, a saber: Geometria

Plana e Construções Geométricas, Teoria Aritmética dos Números, Prática de

Ensino de Ciências e Matemática do Ensino Fundamental, Práticas de Ensino de

Matemática I, Práticas de Ensino de Matemática II, Evolução dos Conceitos

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Matemáticos, Práticas de Ensino de Matemática III, Fundamentos de Geometria,

História da Matemática e Tendências em Educação Matemática.

Com o intuito de identificar a fração correspondente de cada um dos seis

domínios dos conhecimentos para o ensino de Matemática com relação ao número

de disciplinas desta categoria e com relação ao número total de disciplinas

obrigatórias e eletivas, elaboramos a tabela a seguir.

Tabela 12 – Percentuais relacionados às disciplinas associadas em cada domínio da categoria dos conhecimentos para o ensino de Matemática

Domínio Quantidade

de disciplinas

Frequência relativa do número de disciplinas

da categoria (29)

Frequência reativa do

número total de disciplinas obrigatórias e eletivas do

Curso (58)

Conhecimento comum do conteúdo 13 44,8% 22,4% Conhecimento especializado do conteúdo 18 62,1% 31,0% Conhecimento horizontal do conteúdo 1 3,4% 1,7% Conhecimento de conteúdos e de alunos 1 3,4% 1,7% Conhecimento de conteúdos e de ensino 10 34,5% 17,2% Conhecimento de conteúdos e de currículo 3 10,3% 5,2%

Observa-se que todos os domínios dos conhecimentos definidos por Ball,

Thames e Phelps tiveram disciplinas associadas, e que a maior parte das disciplinas

foi associada ao domínio de conhecimento especializado do conteúdo, ao passo que

os domínios de conhecimento horizontal do conteúdo e de conhecimento de

conteúdo e alunos tiveram apenas uma disciplina associada a cada um.

Embora contemplem todos os domínios dos conhecimentos para o ensino de

Matemática, as disciplinas associadas a esses domínios tendem a abordar mais

assuntos relacionados à Matemática como área de conhecimento e menos assuntos

relacionados à formação do docente para a Educação Básica. Associado ao fato de

que a carga horária correspondente às disciplinas associadas somente à categoria

de outros conhecimentos ultrapassar 46% da carga horária total das disciplinas

obrigatórias e eletivas, entendemos que o Curso investigado privilegia a formação

matemática e científica e coloca em segundo plano a formação para lecionar

Matemática na Educação Básica que requer, conforme é defendido por educadores

matemáticos, conhecimentos como os definidos por Ball, Thames e Phelps (2007,

2008).

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Em se tratando das disciplinas que abordam conhecimentos relacionados a

assuntos matemáticos que serão objetos de ensino dos futuros professores na

Educação Básica, elas foram associadas ao domínio de conhecimento comum do

conteúdo e são em número de 13: Bases Matemáticas, Geometria Analítica,

Introdução à Probabilidade e à Estatística, Matemática Discreta, Geometria Plana e

Construções Geométricas, Álgebra Linear, Teoria Aritmética dos Números, Cálculo

Numérico, Fundamentos de Álgebra, Fundamentos de Geometria, Análise Real,

Funções de Variáveis Complexas e Geometria Não Euclidiana.

Das 13 disciplinas identificadas no parágrafo anterior, foi possível associar

apenas duas à dimensão do conhecimento de conteúdo e de ensino: Geometria

Plana e Construções Geométricas e Fundamentos de Geometria. Na subseção

seguinte é apresentada justificativa para essa associação.

Dessa forma, seriam apenas duas as disciplinas que abordam, ao mesmo

tempo, os domínios do conhecimento comum do conteúdo, do conhecimento

especializado do conteúdo e do conhecimento de conteúdos e de ensino. Associado

à nossa interpretação dos estudos de Ball, Thames e Phelps (2007, 2008)77, esse

fato corrobora para a seguinte conclusão: a maior parte dos assuntos matemáticos

relacionados ao Ensino Fundamental e Ensino Médio e que constam das ementas

de algumas disciplinas do Curso investigado é abordada em caráter de revisão, e

mesmo que não seja abordada com esse caráter, aspectos relacionados ao ensino

desses assuntos na Educação Básica pouco são abordados pelos docentes dessas

disciplinas.

Ressalta-se que nas ementas analisadas, das disciplinas matemáticas que

abordam conteúdos que serão objetos de ensino dos futuros professores da

Educação Básica, não é possível identificar se a dimensão do conhecimento de

conteúdo e de ensino se faz presente nessas disciplinas. Sendo assim, seria

necessário conhecer a prática de cada docente que ministra essas disciplinas.

Entretanto, informações das entrevistas realizadas, que serão objetos de estudo na

77

Na subseção 3.4.3 apresentamos parte de nossa interpretação sobre os respectivos estudos indicando que as disciplinas com o principal objetivo de promover apropriação de conhecimentos comuns do conteúdo deveriam também promover apropriação de conhecimentos especializados do conteúdo, caso contrário, teríamos os futuros objetos de ensino do professor de Matemática abordados apenas em nível de revisão. Isso implicaria que essas disciplinas também teriam de promover a apropriação de conhecimentos relacionados a conteúdo e ensino.

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202

próxima subseção, nos oferecem o suporte para a conclusão que foi registrada no

parágrafo anterior.

Para encerrar essa subseção, sintetizamos, na figura a seguir, a composição

da carga horária de 2.592 horas de disciplinas obrigatórias ou eletivas do Curso

investigado, que decorre da nossa análise.

Figura 10 – Composição da carga horária das disciplinas obrigatórias e eletivas do Curso investigado Fonte: acervo do autor

4.2.2 A prática explicitada no PPabc e nas entrevistas

Nesta subseção fazemos as análises de três entrevistas realizadas com

docentes da UFABC que lecionam ou coordenam o Curso de Licenciatura em

Matemática dessa instituição, para entender como a dimensão prática é

desenvolvida no Curso, a fim de identificar a relação entre a teoria e a prática.

Para isso buscamos, nas transcrições das entrevistas que são apresentadas

como Anexos A e B, indícios que revelaram como as atividades associadas à

dimensão prática do Curso são conduzidas, o que possibilitou entendê-la e, assim,

pudemos identificar a qual visão da relação entre a teoria e a prática, apresentada

por Candau e Lelis (1993), o Curso investigado mais se aproxima.

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As três entrevistas realizadas foram concedidas na própria Universidade

Federal do ABC. Por meio de um roteiro básico contendo somente as questões

norteadoras, deixamos que os entrevistados discorressem sobre os assuntos que já

estavam previamente determinados. Nos casos em que as falas dos entrevistados

não abordaram espontaneamente os tópicos que pretendíamos registrar,

questionamos sobre tais tópicos. O áudio da entrevista foi gravado e posteriormente

transcrito.

Aos entrevistados foi dada a opção de não se identificarem, opção essa

descartada pelos professores, conforme registrado nos Termos de Consentimento

Livre e Esclarecido assinados, os quais são apresentados nos Anexos A e B, junto

às transcrições das entrevistas.

Sobre os entrevistados:

As três entrevistas foram realizadas com dois professores doutores.

Duas entrevistas, em momentos diferentes, foram concedidas pela Professora

Dr.ª Virgínia Cardia Cardoso, Licenciada em Matemática pela Universidade de São

Paulo, Mestre em Educação Matemática pela Universidade Estadual Paulista Júlio

de Mesquita Filho e Doutora em Educação pela Universidade Estadual de

Campinas. A Prof.ª Dr.ª Virgínia está, desde 2010, como Professora Adjunto na

Universidade Federal do ABC e, atualmente, coordena o Curso investigado e

leciona, nele, disciplinas didáticas específicas, História da Matemática, Evolução dos

Conceitos Matemáticos ou Tendências em Educação Matemática, além de orientar

estágios.

Na primeira entrevista, cuja duração aproximada foi de duas horas, nosso

principal objetivo foi entender o funcionamento do Curso explicitado no Projeto

Pedagógico. Alguns elementos a respeito da dimensão prática puderam também ser

identificados na entrevista. Entretanto, em nossa análise, houve necessidade de

aprofundar essa dimensão. Desse modo, uma segunda entrevista foi realizada, três

meses depois. Ela teve duração aproximada de 45 minutos.

A terceira entrevista foi concedida pelo Professor Dr. Márcio Fabiano da Silva,

Licenciado em Matemática pela Universidade de São Paulo, Mestre e Doutor em

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Matemática pela mesma Universidade. O Prof.º Márcio está como Professor Adjunto

na Universidade Federal do ABC, desde 2008, e leciona disciplinas relacionadas à

Geometria, no Bacharelado e na Licenciatura em Matemática.

A prática no Curso investigado:

Conforme identificamos no capítulo 2, entendemos a prática como um

conjunto de atividades em que o futuro docente terá a possibilidade de ensaiar a

aplicação de conhecimentos e de procedimentos próprios ao exercício da docência

ou a possibilidade de experimentar situações reais da profissão. Essas atividades

estariam associadas à prática como componente curricular e ao estágio

supervisionado.

No Curso investigado, conforme já indicamos ao analisar a organização

curricular na subseção 4.1.2, o estágio é regido por um documento único que norteia

as atividades a serem realizadas, dentre elas, a regência. Para essa regência, o

aluno tem, em primeiro lugar, de realizar uma investigação sobre as possíveis

intervenções que podem ser feitas na escola em que está estagiando e, com base

nessa investigação, planejar uma intervenção didática e colocá-la em prática – a

regência. Entendemos que esse conjunto de atividades vai ao encontro da nossa

concepção sobre prática, uma vez que coloca o aluno em situação real da profissão.

Por outro lado, bases teóricas seriam necessárias para o exercício de planejar uma

intervenção didática, e essas bases seriam oferecidas por meio da vinculação,

indicada da Proposta Pedagógica do Curso, das cinco etapas do estágio às cinco

disciplinas de Práticas de Ensino, conforme apresentado no Quadro 10.

Teríamos, então, de acordo com nossa concepção, uma relação entre a teoria

e a prática que poderia ser classificada como de unidade, em que, de acordo com

Candau e Lelis (1993), teoria e prática são trabalhadas simultaneamente com a

finalidade de articular o o que ensinar, o como ensinar, o para quem ensinar e o para

que ensinar.

Entretanto, os alunos do Curso investigado não são obrigados a realizar as

etapas do estágio juntamente com as Praticas de Ensino, uma vez que lhes é

concedida a escolha das disciplinas que querem estudar. Dessa forma, são poucos

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os alunos que realizam as etapas do estágio juntamente com as Práticas de Ensino,

e isso faz com que a relação entre a teoria e a prática, nesse caso, não ocorra como

planejado e proposto, conforme afirma a coordenadora do Curso investigado:

Nós temos um planejamento geral de estágio, são cinco estágios, ou seja, um estágio dividido em cinco etapas, e o aluno, preferencialmente, tem que fazer junto com as Práticas de Ensino. Mas isso não acontece: na prática não ocorre; depois de todas as disciplinas é que ele terá um tempinho para fazer o estágio. Mas nós indicamos ao aluno: nesse estágio você vai ter que fazer em uma escola de Ensino Fundamental, com tais atividades: horas de regência, horas de observação... [...] Nós fazemos reuniões quinzenais e nessas reuniões eles [os alunos] falam o que viram na escola, o que eles fizeram, como eles acham que poderia ser, por que é assim, por que não é, então, eles têm oportunidade de discutir. O que não temos muito é a oportunidade deles fazerem um estudo mais profundo a respeito daqueles problemas que eles veem lá na escola, como eles poderiam resolver, e de que maneira as teorias que eles viram aqui na UFABC poderiam ajudar: isso nós não temos muito a oportunidade de fazer. Se eles fizessem direitinho, junto com as Práticas de Ensino, teria até como fazer, mas, na prática, não é isso, não funciona. (Prof.ª Virgínia – Anexo A)

Pode-se observar, pelo extrato da transcrição acima, que a liberdade que é

concedida ao aluno para escolher sua trajetória de curso pode invalidar, neste caso,

o plano de formação idealizado no PPabc, de aliar a teoria à prática.

Sendo assim, relacionado ao estágio curricular supervisionado, não se pode

afirmar haver, no plano prático, relação de unidade entre a teoria e a prática.

Em se tratando das disciplinas associadas à prática como componente

curricular, que conforme indicamos na Tabela 8 são em número de dez, analisamos

as disciplinas de Práticas de Ensino de Matemática, cujas ementas foram

apresentadas na subseção 4.1.2.

De acordo com informações da transcrição da entrevista concedida pela Prof.ª

Virgínia, nas disciplinas de Práticas de Ensino de Matemática os alunos apresentam

seminários utilizando recursos metodológicos adequados para o ensino de

conteúdos matemáticos. Além do exercício de elaboração e apresentação desse

seminário consta das ementas dessas disciplinas, por exemplo, a experimentação

em laboratórios de ensino em Matemática. Essas atividades caracterizam, em nossa

concepção, a presença da dimensão prática nessas disciplinas, uma vez que para

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elaborar um seminário como o que é apresentado nessas disciplinas faz-se

necessário o planejamento de aulas, ou seja, há o ensaio e a aplicação de

conhecimentos e de procedimentos próprios ao exercício da docência.

Nas ementas dessas disciplinas – que podem ser visualizadas na subseção

4.1.2 ou no Apêndice I –, identifica-se a presença de, por exemplo, tendências e

práticas de pesquisa em Educação Matemática, avaliação em Educação

Matemática, jogos e artes para estudo da Matemática e Modelagem Matemática.

Esses assuntos, a nosso ver, constituem bases para atividades da dimensão prática

e fazem parte, portanto, da teoria, que embasará a elaboração dos seminários pelos

futuros professores.

Logo, nas disciplinas de Práticas de Ensino de Matemática, há uma relação

não dicotômica entre a teoria e a prática, ou seja, a teoria e a prática estão

relacionadas, mas a segunda não é simples aplicação da primeira, o que nos

possibilita a afirmar que a relação entre a teoria e a prática existente nessas

disciplinas se aproxima da visão de unidade, conforme discutida por Candau e Lelis

(1993).

Entretanto, nessa relação há pouca participação da área da Matemática, que

teria como responsabilidade fornecer os fundamentos matemáticos para os

conteúdos apresentados nos seminários, como pode ser constatado no extrato a

seguir, em que a Prof.ª Virgínia responde ao questionamento da relação entre as

disciplinas Matemáticas e as disciplinas das Práticas de Ensino da Matemática:

No que se refere às questões didáticas ou metodológicas, diferente de questões institucionais e de outra ordem, nós não temos um diálogo muito grande com os professores que lecionam disciplinas de Matemática, tanto as três específicas para a Licenciatura, quanto as que são compartilhadas com os alunos do Bacharelado, pois, até o momento, todas elas foram ministradas por professores que não ingressaram na UFABC pela área do Ensino e sim por áreas do Bacharelado em Matemática. Até o hoje, não conseguimos que um de nós [educadores matemáticos] assumisse as disciplinas matemáticas específicas da licenciatura, que são os Fundamentos de Análise, Fundamentos de Álgebra e Fundamentos de Geometria, porque estamos sempre com as disciplinas da prática, como as Práticas de Ensino e História da Matemática. Sendo assim, o que acontece: nem todo professor formado no bacharelado em Matemática e que fez o mestrado e o doutorado também nessa área, pura, ou aplicada, tem a visão de que devamos discutir e compartilhar atividades. Daí esse tipo de atividade acaba não

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ocorrendo: não conseguimos, ainda, que todos os professores da Matemática considerassem algo da prática de ensino em suas aulas e também o contrário, pois não sabemos exatamente o que tem sido feito nas aulas de Matemática. (Prof.ª Dr.ª Virgínia – Anexo A)

Questionado sobre assunto semelhante, o Prof.º Márcio afirma que a sua

participação em atividades das disciplinas de Práticas de Ensino de Matemática

depende muito de quem leciona essas Práticas. A pergunta dirigida ao Professor

consistia em identificar se havia alguma “conversa” entre as disciplinas da Geometria

que ele leciona e as disciplinas de Prática de Ensino de Matemática:

Isso depende de quem trabalha a disciplina de Prática. Conheço uma professora que trabalha com essa disciplina e que em alguns momentos do curso convida alguns colegas, para participarem, apresentarem temas para os alunos, e mais do que isso, para assistir às apresentações dos trabalhos que os alunos estão produzindo. Então sim, existe essa prática, de alguns professores de Prática aqui da universidade. (Prof.º Dr. Márcio – Anexo B)

Desses extratos, pode-se afirmar que os elementos para as atividades

práticas das disciplinas de Práticas de Ensino – a teoria – são fornecidos por

disciplinas Pedagógicas específicas ou gerais do Curso investigado e que as

disciplinas Matemáticas somente oferecem esses elementos quando solicitada. Esse

fato revela que não ocorre a vinculação entre áreas Pedagógica e Matemática do

Curso ou, quando acontece, é de forma espontânea, não planejada.

Entendemos que em um curso de licenciatura em Matemática, a vinculação

entre as áreas Matemática e Pedagógica deva existir mediante reflexão, tendo como

base a Educação Matemática.

Um fato que nos chamou a atenção na análise das entrevistas e que está

associado à relação entre as disciplinas Pedagógicas e Matemáticas do Curso

investigado é o de nos ementários das disciplinas de Prática de Ensino de

Matemática constarem o planejamento e a avaliação de assuntos matemáticos

presentes na Educação Básica. Esses assuntos, presentes nas ementas de

disciplinas Matemáticas do Curso, constituem os temas indicados para os

seminários. Entretanto, esses assuntos não são necessariamente abordados no

Curso com perspectivas ao ensino:

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Até agora ninguém da área da Educação Matemática conseguiu dar essas disciplinas [matemáticas], pois estão sempre ocupados com as Práticas de Ensino. Por isso precisamos de mais gente dando aula, senão elas sempre ficarão nas mãos dos Matemáticos. Isso é muito ruim, pelo seguinte: existem disciplinas que são obrigatórias no Bacharelado, mais não são na licenciatura, como é o caso, por exemplo, dessa Análise Real I. A ementa dela é muito parecida com a de Fundamentos de Análise [que é obrigatória para a Licenciatura em Matemática] [...] e, geralmente quem dá uma, quer dar a outra também, mas de forma igual. Então acaba não dando nenhum curso diferente e nós sabemos que isso é ruim para o Projeto Pedagógico e para a formação do aluno: uma visão diferente da disciplina, ele não vai ter. (Prof.ª Dr.ª Virgínia – Anexo A)

Assim, assuntos que serão objetos de ensino do futuro professor na

Educação Básica são abordados no Curso, mas não sob o ponto de vista didático e

pedagógico. Isso, em nossa visão, influencia diretamente a formação do futuro

professor, cuja formação deveria ter a simetria invertida como um dos três princípios

orientadores das licenciaturas, conforme consta do Parecer CNE/CP 9/2001,

abordado na subseção 3.4.2.

A conclusão que decorre da nossa análise, sobre a relação entre a teoria e a

prática nas disciplinas de Práticas de Ensino de Matemática, é de que há uma

relação que se aproxima da visão de unidade entre a teoria e a prática. Faltaria, para

complementar essa relação, a participação dos docentes da área da Matemática, no

sentido de que a prática de todos esses docentes fosse coerente com o que se

espera da prática do futuro professor na Educação Básica, principalmente ao

abordarem os conteúdos que constituirão os objetos de ensino dos futuros

professores.

Além das disciplinas associadas à prática como componente curricular,

identificamos, por meio da análise das entrevistas, atividades que podem ser

associadas à dimensão prática em três disciplinas do Curso investigado: História da

Matemática, lecionada pela Prof.ª Virgínia, e Fundamentos de Geometria e

Geometria Plana e Construções Geométricas, lecionadas pelo Prof.º Márcio.

Em entrevista concedida, o Prof.º Márcio, docente que leciona há quase três

anos as disciplinas Fundamentos de Geometria e Geometria Plana e Construções

Geométricas, afirma abordar, além do conteúdo relacionado nas ementas dessas

disciplinas, aspectos associados ao ensino de Geometria na Educação Básica. Esse

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fato nos levou a classificar ambas as disciplinas, na subseção anterior, ao domínio

do conhecimento de conteúdo e de ensino.

Questionado sobre fazer ou não a relação da Geometria estudada no Ensino

Superior com a Geometria que o futuro docente lecionaria na Educação Básica, o

Professor respondeu que a todo o momento ele procura fazer essa relação. No

entanto, o Professor tem uma prática docente que poderia ser considerada

tradicional para o ensino da Geometria, mas que aborda questões relacionadas ao

seu ensino:

Para o curso de Geometria Plana, a gente segue a teoria axiomática de toda a Geometria e, naquele primeiro momento de contato com os alunos, o importante é que eles esqueçam tudo o que sabem sobre aquilo, pois vamos construir essa teoria. E quando os elementos começam a surgir, ângulo, quadrado, enfim, é o momento de refletir como isso apareceu para eles, como foi ensinado, e como é ensinado no Ensino Básico, para que eles façam as relações e depois possam levar isso, também, como professores para a escola. (Prof.º Dr. Márcio – Anexo B)

Para nós, a prática letiva adotada pelo Prof. Márcio pode contribuir no sentido

de levar o futuro professor a conhecer a Geometria do ponto de vista axiomático,

uma vez que na Educação Básica, provavelmente esse aluno não estudou a

Geometria por esse ponto de vista. Por outro lado, solicitar aos alunos para

esquecerem o que sabem sobre o assunto, parece-nos contraditório com a prática

que se deseja desses futuros professores. Pela fala do Professor, pode-se afirmar

que ele aborda a dimensão prática de formação, pois procura discutir assuntos

relacionados ao ensino. Todavia, não foi possível identificar, pela entrevista, como o

Prof.º Márcio relaciona essa prática com a teoria.

Identificou-se, pela entrevista, que o Professor acompanha as propostas

curriculares da educação básica e que ele prima o ensino de conceitos à

apresentação de técnicas ou procedimentos, os quais, segundo o Professor,

decorrem do aprendizado dos conceitos. Para ele, a escola básica “peca” no sentido

de, na maioria das vezes, não ensinar conceitos matemáticos e sim apresentar

técnicas ou procedimentos para a resolução das situações propostas.

Pode-se concluir que a contribuição do Prof. Márcio na Licenciatura em

Matemática da UFABC é fazer com que os futuros professores discutam questões

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sobre ensino e entendam que os conceitos são mais importantes que as técnicas ou

os procedimentos, conforme o extrato da entrevista, a seguir:

[...] na escola, em geral, o que é feito com função inversa é uma técnica que te ensina a inverter função, mas a escola básica peca nesse sentido, de não abordar os conceitos, e para mim nós aprendemos com os conceitos; a técnica é importante, mas o que fica são os conceitos e isso tem que ser bem trabalhado [...] quando eu vou ensinar função [inversa], a técnica vai aparecer, mas a pergunta é: qual é o conceito disso e como isso apareceu para você? O que é função? [...] Acho que esse é um grande erro, as coisas valem, mas não sabemos por quê. E aqui é o momento de aproveitar a técnica e, com o conceito, mostrar o porquê que isso funciona. Isso aparece em qualquer curso que eu dou. (Prof. Dr. Márcio – Anexo B)

No que se refere à prática letiva da Prof.ª Virgínia, identificamos, por meio das

entrevistas, que em algumas aulas da disciplina História da Matemática, a

Professora discute temas importantes e essa discussão é ampliada pelos seminários

que são realizados pelos alunos. Esses seminários são constituídos de duas partes:

a primeira parte é composta de uma pesquisa para complementar as aulas da

Professora e embasar a segunda parte; a segunda parte é composta por

apresentação de uma aula. Além disso, a avaliação realizada pela professora tem

como objetivo refletir sobre os seminários apresentados e sobre as aulas

ministradas pela Professora, conforme podemos observar do extrato a seguir:

[...] em História da Matemática, eu acabo utilizando mais que as primeiras aulas para exposição de conteúdos. Após as apresentações dos seminários, a turma avalia cada um deles e indica o que acharam mais interessante e o que poderia ser melhorado. No fim, eu aplico uma prova escrita, não cobrando conteúdo específico, mas sim reflexão sobre o que foi apresentado, tanto nos seminários quanto nas minhas aulas expositivas. [...] Nessa disciplina, para os seminários, os alunos têm que apresentar uma primeira parte contendo uma pesquisa histórica relacionada ao tema e uma segunda parte apresentando uma aula relacionada ao tema, em que a História da Matemática é utilizada como recurso metodológico. (Prof.ª Dr.ª Virgínia – Anexo A)

Com base no que é apresentado pela Prof. Virgínia, pode-se afirmar que nas

aulas de História da Matemática há o ensaio da aplicação de conhecimentos e de

procedimentos próprios ao exercício da docência, que, de acordo com nossa

concepção, é uma característica de atividades associadas à dimensão prática. Além

disso, a prática letiva da Prof.ª Virgínia contribui, a nosso ver, para relacionar teoria e

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prática como unidade, uma vez que a prática, presente principalmente na segunda

etapa do seminário apresentado pelos alunos, é pautada pela teoria, que é

pesquisada na primeira parte do seminário ou estudada nas aulas expositivas da

Prof.ª Virgínia. Por sua vez, a teoria necessária para o desenvolvimento dos

seminários é determinada pela prática que será realizada, ou seja, há uma relação

de dependência mútua entre ambas. Além disso, os alunos são estimulados a

buscar parte da teoria, o que também faz parte da dimensão prática do professor.

Em suma, teoria e prática, no nosso entender, estão unidas, a julgar pelo discurso

da Professora, de forma indissociável, contribuindo para a formação do futuro

professor.

Em se tratando de disciplinas que não fazem parte do grupo da prática como

componente curricular, concluímos que há, em algumas delas, atividades que

podem ser associadas à dimensão prática da formação do professor. Concluímos

também que, em pelo menos uma delas, é observada a relação de unidade entre a

prática proposta e a teoria abordada ou associada a ela.

4.2.3 Síntese da análise das disciplinas e da prática proposta no Curso

investigado

Utilizando como base os pressupostos teóricos sobre os conhecimentos para

o ensino de Matemática, de Ball, Thames e Phelps (2007, 2008), identificamos que o

Curso investigado privilegia a formação matemática e científica e coloca em

segundo plano a formação para lecionar Matemática na Educação Básica, uma vez

que em mais de 46% da carga horária das disciplinas obrigatórias e eletivas são

abordados assuntos das áreas de Tecnologia, de Biologia, de Física, de Química e

da Matemática pura. Identificamos também que muitos dos assuntos matemáticos

relacionados à Educação Básica, que constam das ementas de algumas disciplinas,

são abordados em caráter de revisão. Cabe ressaltar, também, que nas disciplinas

com assuntos relacionados à Educação Básica, aspectos associados ao ensino

pouco são abordados pelos docentes.

No que se refere à dimensão prática da formação do futuro professor,

identificamos que há atividades relacionadas a essa dimensão em três grupos de

disciplinas ou atividades: em cinco das dez disciplinas que compõem, no Projeto

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Pedagógico do Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC, a prática como

componente curricular; no estágio curricular supervisionado; e em pelo menos três

disciplinas que não fazem parte do grupo da prática como componente curricular.

Com relação à unidade entre a teoria e a prática, pode-se afirmar que ela ocorre nas

cinco das dez disciplinas da prática como componente curricular e em apenas uma

das três disciplinas que não fazem parte desse grupo. No que concerne ao estágio

curricular supervisionado, nada se pode afirmar em relação a essa unidade, tendo

em vista a possibilidade de o estudante não realizar as etapas do estágio

concomitantemente com disciplinas da prática como componente curricular,

conforme previsto no Projeto Pedagógico do Curso.

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213

CONCLUSÕES

Nesta seção apresentamos uma síntese da investigação que realizamos e

organizamos as respostas às nossas questões de pesquisa, que de certa forma

estão implícitas no capítulo 4 do nosso trabalho. Apresentamos também nossas

reflexões que decorreram desta investigação e destacamos aspectos que, a nosso

ver, necessitam de aprofundamento em investigações futuras, indicando, assim,

possíveis questões de pesquisa não abordadas neste trabalho.

Uma síntese da investigação realizada:

O objetivo estabelecido para o desenvolvimento da presente investigação foi

analisar, com base no Projeto Pedagógico de um curso de licenciatura em

Matemática proposto por uma instituição federal e no estudo de entrevistas a

professores desse curso, interpretações assumidas por essa instituição das

Diretrizes Curriculares Nacionais e Diretrizes Curriculares específicas do curso, de

modo a identificar pressupostos relacionados à formação inicial de professores de

Matemática para a Educação Básica, sobretudo no que se refere à dimensão

prática.

Para tanto, escolhemos o Curso de Licenciatura em Matemática da

Universidade Federal do ABC, pelo fato de essa Universidade apresentar uma

proposta de formação diferenciada e pioneira no Brasil. Em uma primeira leitura,

essa proposta inova a estrutura acadêmica e curricular dos cursos de licenciatura,

conforme incentiva órgãos federais de educação. Mas, por outro lado, parece ir de

encontro com as Diretrizes dos cursos de licenciaturas brasileiros e, mesmo assim,

tem o Curso de Licenciatura em Matemática reconhecido pelo Ministério da

Educação, com nota máxima.

A fim de construir uma base para analisar o Projeto Pedagógico do Curso

investigado e as entrevistas realizadas, que constituíram a nossa base de dados,

realizamos, por meio de pesquisa bibliográfica, estudos sobre pressupostos teóricos

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da formação de professores para a Educação Básica e estudos sobre as resoluções

e pareceres que normatizam ou normatizaram os cursos superiores brasileiros de

formação de professores.

No tocante aos pressupostos teóricos, optamos por escolher o estudo de Ball,

Thames e Phelps (2007, 2008), pelo fato de entendermos que os domínios dos

conhecimentos definidos por esses pesquisadores poderiam melhor relacionar

teorias estudadas na licenciatura em Matemática com atividades associadas à

prática docente. O estudo desses pressupostos e a reflexão sobre eles nos levou ao

exercício de identificar e relacionar conhecimentos associados ao ensino de

equações aos seis domínios de conhecimentos para lecionar Matemática, definidos

por esses pesquisadores, o qual contribuiu para analisarmos as ementas das

disciplinas do Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC. No entanto, para

esse exercício, foi necessário ampliar ou ressignificar o domínio do conhecimento

especializado do conteúdo. Consideramos que os objetos matemáticos a serem

ensinados na Educação Básica, e que fazem parte do domínio do conhecimento

comum do conteúdo, devam também fazer parte do domínio do conhecimento

especializado do conteúdo. Consideramos também nesse domínio a inclusão de

conhecimentos matemáticos que, embora o professor dificilmente vá ensinar na

Educação Básica, seriam necessários para o desenvolvimento de estratégias de

ensino, articulação entre diferentes representações do objeto a ser ensinado e

outros. Para analisar a relação entre a teoria e a prática, escolhemos Candau e Lelis

(1993), que afirmam que essa relação pode ser classificada em três categorias:

dissociativa, associativa e unidade. Entendemos que essas categorias podem

favorecer uma análise profícua de como se estabelece a relação entre teoria e

prática em uma licenciatura em Matemática.

Construída a base para a análise, iniciamos o exame dos dados que

coletamos, a fim de identificar subsídios para responder às nossas indagações.

Respostas às nossas questões de pesquisa:

Com base nas análises que constam do capítulo 4, apresentamos, a seguir,

respostas às nossas questões de pesquisa e algumas reflexões provenientes

dessas respostas.

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Sobre como são interpretadas, pela UFABC, as atuais Diretrizes

Curriculares para o curso de licenciatura em Matemática, sobretudo no

tocante à dimensão prática:

Relembrando o que foi registrado na subseção 1.2, a resposta a essa questão

de pesquisa não tem como finalidade apenas identificar se os aspectos legais,

estabelecidos pelas Diretrizes Curriculares, são cumpridos pela Universidade

Federal do ABC, mas buscar entender como a instituição relaciona a dimensão

prática da formação do professor de Matemática para a Educação Básica com as

teorias estudadas, no seu Curso de Licenciatura em Matemática.

No tocante aos aspectos legais, a UFABC cumpre parcialmente o que é

estabelecido pelas Diretrizes Curriculares Nacionais e Diretrizes Curriculares

específicas dos cursos de Matemática.

Nossa análise revelou que a UFABC não indica, no Projeto do Curso, o perfil

dos egressos e os objetivos específicos da formação inicial de professores de

Matemática para a Educação Básica. A indicação desses aspectos, no Projeto, é

fixada pelas Diretrizes Curriculares específicas dos cursos de Matemática.

Entretanto, no Projeto Pedagógico elaborado pela UFABC, são estabelecidos

objetivos específicos e perfil do egresso apenas de forma geral para quatro

Licenciaturas que compartilham o mesmo documento – Biologia, Física, Matemática

e Química. Esse fato, a nosso ver, não possibilita identificar e analisar a

especificidade e a identidade de cada um dos quatro Cursos.

Por outro lado, identificamos na matriz curricular do Curso disciplinas que

trabalhariam com todos os conteúdos fixados pela referida Diretriz. No entanto, há

um acúmulo de carga horária reservada a disciplinas que não abordariam conteúdos

fixados nessa Diretriz e, tampouco, poderiam ser associados ao ensino de

Matemática na Educação Básica, como é o caso das disciplinas Estrutura da Matéria

e Física Quântica. Ao mesmo tempo, a carga horária das disciplinas associadas ao

ensino de Matemática é pequena. Nossas análises revelaram que não chega a 200

horas a carga horária das disciplinas obrigatórias que, explicitamente em suas

ementas, abordariam o ensino da Matemática, o que acreditamos ser contraditório

em uma Licenciatura em Matemática.

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216

Um fato que nos chamou a atenção é a licença que é concedida aos egressos

da Licenciatura em Matemática da UFABC. De acordo com o Projeto Pedagógico, os

alunos formados nesse Curso podem lecionar Matemática e Ciências nos anos finais

do Ensino Fundamental e Matemática no Ensino Médio, licença idêntica à concedida

pelos antigos cursos de Ciências, normatizados na década de 1970 e extintos na

primeira década deste século. Embora não explicitada nas Diretrizes Curriculares

específicas dos cursos de Matemática, entendemos que a licença concedida por um

curso de licenciatura em Matemática tenha de se restringir à sua área de ensino, de

modo a não repetirmos o passado, neste caso, representado pelo citado curso de

Ciências. A possibilidade de um egresso da Licenciatura em Matemática da UFABC

lecionar Ciências no Ensino Fundamental implica a reserva de uma carga horária do

Curso para o estudo de disciplinas relacionadas às áreas de Biologia, Física e

Química. Como é sabido, isso ocorre no Curso que investigamos e acreditamos que,

em decorrência desta reserva, a carga horária para os assuntos relacionados ao

ensino da Matemática fique reduzida.

No que se refere à organização curricular, o Curso de Licenciatura em

Matemática da UFABC contempla parcialmente os quatro componentes curriculares

estabelecidos nas Diretrizes Curriculares Nacionais e as respectivas cargas horárias

mínimas, exigida pelo MEC.

Com relação às atividades acadêmico-científico-culturais, entendemos que o

que é indicado no Projeto Pedagógico vai ao encontro das atividades indicadas nas

Diretrizes Curriculares e não é contraditório ao objetivo que é estabelecido no

referido Projeto.

No tocante ao estágio curricular supervisionado, a instituição propõe que ele

seja iniciado quando mais de 58% do curso tiver ocorrido. Reiteramos que essa

proposta contraria as Diretrizes Curriculares Nacionais, como indicamos no capítulo

4. De acordo com o que é normatizado pela referida Diretriz, as atividades do

estágio devem ser implementadas no início da segunda metade do Curso, o que

corresponde, nesse caso, ao sétimo quadrimestre e não oitavo, uma vez que o curso

investigado tem duração ideal de 12 quadrimestres.

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217

Apesar de contrariar as Diretrizes Curriculares, entendemos que o início tardio

das atividades do estágio não acarretaria dificuldades na formação do futuro

professor, pelo contrário. Conjecturamos que esse início seja justificado pela

vinculação das cinco etapas do estágio às disciplinas de Práticas de Ensino, como é

proposta no Projeto Pedagógico, a fim de relacionar a teoria, que supostamente

seria abordada nas disciplinas de Práticas de Ensino, às atividades da dimensão

prática da formação docente, que supostamente seriam propostas nas etapas do

estágio. Essa vinculação, a nosso ver, contribuiria para com a formação do futuro

professor de Matemática da Educação Básica. Entretanto, parece-nos que no plano

prático a referida vinculação pouco ocorre.

Apesar de sabermos que não é este um princípio adotado pela UFABC,

entendemos que, para garantir a suposta relação entre a teoria e a prática proposta

no Projeto Pedagógico, a Universidade poderia cobrar, dos alunos do Curso, o

estudo concomitante de cada uma das cinco etapas do estágio e suas respectivas

disciplinas de Práticas de Ensino.

Em se tratando da prática como componente curricular, reiteramos que a

Universidade Federal do ABC centraliza a carga horária de 408 horas em dez

disciplinas pedagógicas, ao invés de distribuir essa carga em disciplinas

constituintes da formação para a docência, como consta nas Diretrizes Curriculares

Nacionais. Entendemos que essa centralização não contribui para a formação

docente, pois, dessa forma, não há, no Projeto Pedagógico, indicação clara de que

as disciplinas que abordariam assuntos matemáticos que comporiam os objetos de

ensino do futuro professor teriam, necessariamente, de estudar aspectos

relacionados ao ensino desses futuros objetos. Uma vez não tratados esses

aspectos nas disciplinas de Matemática, dificilmente serão tratados nas disciplinas

de Práticas de Ensino, dado o fato de a carga horária dessas disciplinas ser,

praticamente, mínima.

Das dez disciplinas que compõem a prática como componente curricular,

sendo cinco pedagógicas específicas e cinco pedagógicas gerais, temos dúvidas se

quatro delas realmente abordariam assuntos relacionados à dimensão prática de

formação, conforme nossa concepção dessa dimensão. Na análise das ementas

dessas quatro disciplinas, todas pedagógicas gerais, identificamos apenas assuntos

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que seriam mais relacionados à teoria, como na disciplina Didática. Isso nos leva a

dois entendimentos. O primeiro é de que seria necessária a observação dessas

aulas, no sentido de identificar se há assuntos relacionados à dimensão prática,

abordados em sala de aula, e que não estão explicitamente indicados nas ementas.

O segundo é a necessidade de compreender qual a concepção de dimensão prática

adotada pela UFABC, que faz com que sejam associadas disciplinas, a nosso ver,

puramente de caráter teórico ao grupo de prática como componente curricular.

Entendemos que o simples fato de ser pedagógica não qualifica uma disciplina para

ser associada a esse componente curricular. Por outro lado, entendemos que esse

componente não deva ser somente composto por disciplinas classificadas como

pedagógica.

Sendo assim, uma disciplina de Geometria Analítica, por exemplo, poderia ter

parte da sua carga horária associada à prática como componente curricular se

abordasse aspectos da dimensão prática do professor, como a discussão sobre o

ensino das retas na Educação Básica, do ponto de vista algébrico. Isso, a nosso ver,

justificaria a distribuição da carga horária do grupo de prática como componente

curricular nas disciplinas de formação para a docência e, segundo nossa concepção,

Geometria Analítica poderia ser uma delas.

Nossa forma de entender as atividades associadas à prática como

componente curricular contribuiria, por exemplo, para que esse componente

pudesse permear todo o curso e não apenas estar presente em parte dele, nas

poucas disciplinas que o comporiam, como ocorre no Curso de Licenciatura em

Matemática da UFABC que, conforme abordamos no capítulo 4, tem a prática como

componente curricular presente em somente 75% dos 12 quadrimestres e em

apenas dez disciplinas. Por outro lado, essa forma de entendimento demandaria a

presença de docentes nas disciplinas de formação para a docência, com

permanente preocupação com aspectos de ensino de conteúdos matemáticos na

Educação Básica.

Não podemos deixar de registrar que entendemos ser pequena a efetiva

carga horária reservada a disciplinas específicas da prática como componente

curricular do Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC. Reiteramos que

somos a favor, por exemplo, da substituição da disciplina Didática, pela disciplina

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Didática da Matemática, conforme abordamos no capítulo 4. Essa substituição

contribuiria para o aumento da referida carga horária.

Com relação aos conteúdos curriculares de natureza científico-cultural,

acreditamos que sua composição não privilegia a formação de futuros professores

de Matemática. Como já apresentado na seção anterior, a maior parte da carga

horária do Curso de Licenciatura em Matemática é composta por disciplinas do

Bacharelado em Ciência e Tecnologia. Por outro lado, a maior parte das disciplinas

desse Bacharelado está associada a áreas distintas da área do Ensino de

Matemática, dentre elas, as áreas de Biologia, de Física e de Química. Como esse

Bacharelado não tem como finalidade a formação para a docência na Educação

Básica, essas disciplinas também não são abordadas tendo como finalidade a

formação para o ensino e, portanto, não se pode afirmar que contribuiriam

diretamente na formação para o egresso do Curso de Licenciatura em Matemática

lecionar Ciências nos anos finais do Ensino Fundamental, como registramos acima,

ao abordar a licença que é concedida pelo referido Curso.

No que se refere às disciplinas matemáticas, a falta da abordagem de

aspectos relacionados ao ensino de assuntos que estão presentes nas ementas,

que constituirão os objetos de ensino do futuro professor de Matemática, nos leva a

acreditar, conforme já registramos no capítulo 4, que esses assuntos são estudados

como revisão ou de forma diferente daquela que se espera que esse futuro

professor ensine. Isso, a nosso ver, não contribui na formação do professor, uma

vez que esse modelo de ensino poderia diretamente influenciar a prática letiva do

futuro docente. Não se pode negar a questão da simetria invertida em cursos de

formação de professores.

Sendo assim, a formação proposta nas disciplinas que compõem o grupo de

conteúdos curriculares de natureza científico-cultural não está necessariamente

associada ao ensino de assuntos matemáticos na Educação Básica e, por esse

motivo, esse componente curricular não caracterizaria uma licenciatura em

Matemática. Tampouco caracterizaria um Bacharelado em Matemática, dada a

presença considerável de disciplinas do Bacharelado em Ciência e Tecnologia.

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Em pelo menos duas disciplinas pertencentes ao grupo dos conteúdos

curriculares de natureza científico-cultural, relacionadas ao estudo da Geometria,

identificamos atividades que, mediante nossa concepção, podem ser associadas à

dimensão prática. Além delas, também identificamos atividades de dimensão prática

em uma disciplina de opção limitada, a História da Matemática. Logo, a dimensão

prática está presente no Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC, não

apenas no estágio curricular supervisionado e na prática como componente

curricular. De certa forma, isso evidencia que a dimensão prática, mesmo quando

não explicitamente identificada nas ementas das disciplinas, é trabalhada por alguns

docentes do Curso, o que entendemos ser positivo para a formação de professores

e reforça nosso entendimento sobre a possibilidade da existência de atividades da

dimensão prática na maior parte das disciplinas de uma licenciatura.

Entretanto, a relação entre as atividades da dimensão prática e as teorias

abordadas no Curso ocorre de forma distinta nas diferentes situações em que essa

dimensão foi identificada. A existência da relação de unidade entre a teoria e a

prática em algumas dessas situações é, a nosso ver, um aspecto que favorece a

formação do futuro professor de Matemática para a Educação Básica. Porém

entendemos que são poucas as situações em que é possível identificar essa

relação. Pela importância que acreditamos ter a relação de unidade na formação do

futuro docente e pelo fato de ela ser perceptível em poucas situações no Curso de

Licenciatura em Matemática da UFABC, entendemos que essa relação mereça

maior estudo e reflexão pelos docentes do referido Curso, de modo que possa ser

exercida de forma coerente por todos e aperfeiçoada continuamente.

Por outro lado, registramos que somente foi possível identificar a relação de

unidade entre a teoria e a prática em disciplina não pertencente ao grupo da prática

como componente curricular mediante entrevista realizada com docentes do Curso.

Entendemos ser importante, como forma de continuidade da investigação que

fizemos, a realização de pesquisas com base em novas entrevistas, com outros

docentes do Curso, para identificar a concepção desses docentes sobre dimensão

prática e identificar se, na prática letiva dos docentes entrevistados, a relação de

unidade entre a teoria e a prática ocorre.

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Sobre os pressupostos para a formação de professores de Matemática

adotados pela UFABC:

Para identificar esses pressupostos, foi necessária a análise das ementas de

todas as disciplinas do Curso de modo a constatar em que medida elas contemplam

conhecimentos diretamente relacionados ao conteúdo que o futuro professor de

Matemática irá ensinar na Educação Básica.

Nossa análise identificou que a maior parte das disciplinas do Curso pode ser

associada ao domínio do conhecimento comum do conteúdo ou ao domínio do

conhecimento especializado do conteúdo, pertencentes à base dos conhecimentos

para o ensino de Matemática, definidos por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008).

Entretanto, poucas são as disciplinas do Curso que podem ser associadas aos

quatro demais domínios pertencentes a essa base. Esse fato confirma que a UFABC

adota pressupostos de formação no Curso, que não estão necessariamente

atrelados ao ensino da Matemática na Educação Básica.

Conforme registramos na resposta da questão anterior, para UFABC, o

professor de Matemática da Educação Básica deverá ter condições de lecionar

Ciências nos anos finais do Ensino Fundamental. Para tanto, a proposta dessa

instituição é a de que o licenciando em Matemática deva ter formação dita

interdisciplinar para que possa entender de conteúdos básicos de Biologia, Física e

Química, e seu ensino no Ensino Fundamental, além de entender um pouco da

tecnologia e dominar conteúdos da Matemática e seu ensino na Educação Básica.

Essa proposta de formação tem uma característica diferenciada em relação à

trajetória de formação de professores, abordada no capítulo 3, tendo em vista que

propõe mais de uma formação de graduação em um mesmo curso, ao passo que o

movimento dos estudos em formação de professores indica a necessidade das

especificidades desses cursos.

Entendemos que a interdisciplinaridade seja um fator importante na formação

profissional do professor para a Educação Básica. Esse fator proporcionaria

conhecimentos para trabalhar, por exemplo, com projetos, o que possibilitaria,

dentre outros, a aplicação de conteúdos de diferentes áreas, contribuindo, assim,

para que o aluno possa compreender a importância social dos conhecimentos

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vinculados às disciplinas que estuda na escola básica. Para tanto, é fundamental

uma atitude dos professores formadores frente às demandas necessárias para a

ocorrência dessa abordagem. Entretanto, questionamos se a formação que é

proposta pela UFABC é realmente interdisciplinar para formar um professor de

Matemática ou se é uma justaposição de disciplinas, deixando a cargo do futuro

professor o desenvolvimento de uma postura interdisciplinar.

Para Japiassu (1976, p. 74), “a interdisciplinaridade caracteriza-se pela

intensidade das trocas entre especialistas e pelo grau de integração real das

disciplinas no interior de um mesmo projeto de pesquisa.” Nesse sentido, Fazenda

(1979, p. 32) considera que o conhecimento interdisciplinar deve ser uma “lógica da

descoberta, uma abertura recíproca, uma comunicação entre os domínios do saber,

uma fecundação mútua e não um formalismo que neutraliza todas as significações,

fechando todas as possibilidades.” Além disso, se o processo educativo for iniciado

em uma perspectiva interdisciplinar, então o exercício de uma educação

permanente, prolongamento da formação geral e profissional ao longo da vida, terá

melhores condições (PIRES, 2005). Compartilhando desses referenciais, o curso de

Licenciatura de Matemática da UFABC, em nossa visão, não apresentaria uma

abordagem interdisciplinar e sim multidisciplinar.

A formação de professores de Matemática para a Educação Básica necessita,

além de conhecimentos da área da Matemática, conhecimentos relacionados, por

exemplo, à Sociologia, à Psicologia, à História. Essas áreas não estão presentes ou

estão pouco presentes no Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC. O

pressuposto de “interdisciplinaridade” da UFABC, para o seu Curso de Licenciatura

em Matemática, é de que o futuro professor, egresso desse Curso, teria de contar

com uma formação “básica” em Ciência e Tecnologia, com uma complementação

Matemática e pedagógica. Como a ênfase dada às Ciências Naturais e Tecnologias

é grande, e não necessariamente voltada ao ensino na Educação Básica, a

Licenciatura em Matemática da UFABC parece ser um curso complementar a um

bacharelado “interdisciplinar” em ciência e tecnologia que, a nosso ver, não é

caracterizado pela interdisciplinaridade.

O pressuposto de uma formação “básica”, realizada por um Bacharelado

Interdisciplinar em Ciência e Tecnologia e complementada por uma formação

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específica em Licenciatura em Matemática, pode estar fundamentado no Processo

de Bolonha, que tem como princípios, conforme apresentamos na subseção 2.4, a

generalidade versus a especialidade de formação e a flexibilidade dos modelos de

formação. Como estratégias para que os princípios pudessem ser considerados, as

instituições, de acordo com o referido Projeto, teriam de, dentre outras ações,

centrar o ensino em atividades que levariam ao desenvolvimento de competências e

flexibilizar os currículos, fixando os planos de estudos por áreas de conhecimento,

com disciplinas que integrariam o núcleo do curso, disciplinas que serviriam de

suporte a esse núcleo e disciplinas que seriam opcionais ou subsidiárias a esse

núcleo, com múltiplas combinatórias possíveis.

A centralização do ensino em atividades com o objetivo de levar o futuro

professor a desenvolver competências é um dos três princípios indicados, também,

nas Diretrizes Curriculares Nacionais e, portanto, deveriam fazer parte de todas as

licenciaturas brasileiras. No entanto, reiteramos que as competências específicas

para o egresso do Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC não são

identificadas no Projeto Pedagógico. Dessa forma, não sabemos quais são as

competências adotadas pela UFABC para desenvolver um futuro professor de

Matemática.

Por outro lado, a flexibilização do currículo é efetuada apenas em parte pela

UFABC. Essa flexibilização ocorreria somente em disciplinas de opção livre e de

opção limitada, uma vez que a maior parte das disciplinas obrigatórias de cada curso

dessa Universidade é composta pelas disciplinas obrigatórias dos bacharelados

interdisciplinares, responsáveis pela formação “geral”. Com relação ao Curso de

Licenciatura em Matemática da UFABC entendemos ser necessária a reavaliação do

peso que a carga horária das disciplinas da formação “geral” tem na composição da

carga horária total do Curso. Além disso, e o que entendemos ser mais urgente, é a

reavaliação de o Bacharelado em Ciência e Tecnologia ser a formação “básica” para

a Licenciatura em Matemática. Reiteramos que a Educação Matemática é composta,

também, por conhecimentos da área de Humanas.

Palavras finais:

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224

Além do Projeto de Bolonha, acreditamos que o pressuposto de formação da

UFABC pode ter sua justificativa em outros aspectos relacionados à educação

brasileira e que merecem ser investigados, uma vez que é sabido que a proposta de

formação pioneira da UFABC é cogitada para ser implementada em outras

instituições de Educação Superior.

Temos ciência, e é amplamente divulgado, que a Educação Básica não

estaria conseguindo atingir objetivos a ela estabelecidos e entendemos como

consequência a dificuldade de acesso dos seus egressos à Educação Superior,

sobretudo pública. Isso faz com que se torne necessário ao poder público tomar

algumas providências, como o estabelecimento de quotas e o financiamento

estudantil, a fim de garantir aos egressos da Educação Básica o estudo de nível

superior. Nesse sentido uma formação em dois ciclos, sendo um primeiro básico,

seria uma forma de promover ao futuro profissional bases para a formação em um

curso de graduação específica. Sendo assim, ao mesmo tempo que garantiria a

constituição das competências objetivadas na Educação Básica, conforme consta do

artigo quinto das Diretrizes Curriculares Nacionais, as instituições de ensino superior

reconheceriam a fragilidade do ensino da Educação Básica.

Em se tratando do plano institucional, uma formação em dois ciclos poderia,

por exemplo, resolver o problema das vagas ociosas existentes em alguns cursos de

graduação. No Estado de São Paulo, algumas licenciaturas fazem parte desse grupo

de cursos.

Instituindo cursos interdisciplinares, como os Bacharelados de ingresso da

UFABC, cursos de formação geral, sem pretensões de formação específica, o

número de alunos ingressantes nas instituições de Ensino Superior poderia ser

aumentado. Isso, em nossa opinião, contribuiria para resolver o problema de acesso

à Educação Superior e a ociosidade de vagas, principalmente de cursos de

instituições públicas. Por outro lado, a realidade da UFABC mostra um possível

problema: todo ano ingressa o número total de alunos na instituição, mas o número

de egressos dos cursos é pequeno. Assim, haveria a necessidade de identificar o

motivo pela qual a UFABC não vem formando alunos no mesmo ritmo em que eles

ingressam na instituição.

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Ao realizar a análise das entrevistas, pudemos identificar que há a intenção

de se reformular o Projeto Pedagógico do Curso de Licenciatura em Matemática da

UFABC, no sentido de acrescentar mais carga horária, aumentando o número de

disciplinas voltadas à formação profissional do futuro professor. Para isso, ações

vêm sendo realizadas, como reuniões para discussão das ementas das atuais

disciplinas e para a escolha de novas disciplinas. Dessas reuniões, participam

professores de algumas áreas, dentre elas, da Matemática e da Educação

Matemática, que na UFABC é denominada Ensino de Matemática. Dessa forma,

vemos um engajamento para a melhoria da formação docente.

A nosso ver, ações como as citadas mostram que, mesmo o Curso tendo o

reconhecimento do MEC com nota máxima, seus docentes estão engajados no

sentido de repensar ou criar elementos para oferecer formação de professores de

Matemática para a Educação Básica com qualidade. Entendemos que mesmo tendo

sua Proposta Pedagógica submissa à organização educacional da UFABC, os

docentes do Curso de Licenciatura em Matemática dessa instituição saberão

administrar as modificações que julgarem necessárias a fim de proporcionar uma

melhor formação aos alunos desse Curso.

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a serem adotados quanto ao conceito de hora-aula, e dá outras providências. Brasília: Diário Oficial da União, 3 jul. 2007a.

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ANEXO A – Transcrição das entrevistas realizadas com a Coordenadora e Professora do Curso de Licenciatura em

Matemática da UFABC

Dados da entrevistada:

Prof.ª Dr.ª Virgínia Cardia Cardoso.

Licenciada em Matemática pela Universidade de São Paulo, Mestre em Educação

Matemática pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho e Doutora

em Educação pela Universidade Estadual de Campinas. Atualmente é professora

Adjunto I da Universidade Federal do ABC. Tem experiência na área de Educação,

com ênfase em Filosofia da Educação, atuando principalmente com Educação

Matemática, Ensino de Matemática, História da Matemática, Filosofia da Educação

Matemática e Formação de Professores. (Currículo Lattes – adaptado)

Primeira entrevista:

Marcelo: Como é organizada administrativamente a UFABC e como funciona a distribuição/atribuição das aulas?

Prof.ª Virgínia: Aqui na UFABC nós não temos departamentos. Normalmente nas universidades, existem as faculdades e cada uma delas tem seus departamentos que se responsabilizam pelos seus cursos. Aqui é diferente: quando um professor entra por um concurso, ele entra pela vaga de um determinado curso e é vinculado, normalmente, a um determinado centro. Aqui nós temos três centros: o Centro de Matemática, Computação e Cognição, que é o que nós estamos, o CMCC, o Centro de Ciências Naturais e Humanas, e o Centro de Engenharia, Modelagem e Ciências Sociais. Quando vem para cá [para a UFABC] uma pessoa formada em Matemática, um Matemático, um pesquisador em Matemática, ele pode ser de qualquer um dos centros: em todos os centros existem Matemáticos, Físicos, Químicos. Por exemplo, tem Biólogos aqui no CMCC. Então a questão das áreas de conhecimento não está muito definida como de forma tradicional. No CMCC estão associados quatro cursos de graduação: Bacharelado em Matemática, Licenciatura em Matemática, Bacharelado em Neurociências, que é um curso mais novo, e tem o Bacharelado em Computação, por enquanto. Se algum grupo de professores quiser, poderá montar mais cursos de graduação vinculados a esse centro. Temos também [no CMCC] alguns cursos de pós-graduação: Mestrado de Matemática Pura e Aplicada, Mestrado em Ciência da Computação, Mestrado e Doutorado em Neurociências, e tem um curso que não é somente da responsabilidade do CMCC, mas também do CCNH, que é o Curso de Pós-Graduação em Ensino, História e Filosofia das Ciências e Matemática [Mestrado]. A maior parte dos professores desse curso é do CCNH, que tem os cursos de Bacharelado e Licenciatura em Física, Química, Biologia e Filosofia. Então o pessoal da área de ensino [que ingressa na UFABC] vai predominantemente para lá: de educação tem mais gente lá do que aqui. Aqui no CMCC nós temos, por enquanto, somente quatro professores da área de Educação Matemática, que no caso, aqui, chamam de Ensino de Matemática: o Prof.º Plínio Táboas, que foi o primeiro que entrou, no primeiro concurso para

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essa área, em 2008; eu, que fiz concurso em 2009 e assumi em 2010, não foi o segundo concurso, foi o terceiro ou quarto, porque depois do concurso do Plínio, ninguém passou; o Alessandro, que entrou no concurso de 2010; e, de lá para cá, nós fizemos outros dois concursos, em que não entrou ninguém. Amanhã começa um próximo, que espero que entre alguém: são duas vagas. Nós temos, no total, oito vagas para essa área de ensino, sendo que sete são para professor adjunto e uma para professor titular. O concurso para professor titular, nós já pedimos a vaga e já foi aprovada, mas nós ainda não conseguimos abrir, pelo fato de que, no ano passado, em decorrência da greve, ocorreu uma reformulação na carreira do magistério, em todo o Brasil, com novas regras para contratar professor no ensino superior nas universidades federais. E aí o cargo de professor titular passou por essa reformulação e a reitoria terá que aguardar para que essa lei seja implementada, que é a partir de primeiro de março, para contratar o professor titular dentro dessa nova lei. Nesse concurso que começa amanhã, se tiver alguém aprovado e as pessoas assumirem antes de primeiro de março, conseguiremos ainda contratar pela antiga lei, que é um pouco mais vantajosa para quem está entrando, pois a carreira de professor no ensino superior inicia, se não me engano, como auxiliar, depois você passa para professor assistente, depois para adjunto e depois para associado. Nós, como somos todos doutores, já iniciamos como professor adjunto. Só que com essas novas regras, isso não vai mais poder acontecer: mesmo que a pessoa tenha condições de ser adjunto, ela iniciará a carreira do zero, iniciará como auxiliar. Aí não sei mais quanto tempo chegará a professor assistente e depois a professor adjunto. O salário nessa nova lei até que melhorou um pouquinho, muito menos do se estava pedindo, mas em compensação, para quem está começando, ficou pior. E para nós é ruim, pois ficou mais complicado para contratar professor. Se nós já não tínhamos candidatos em outros concursos, agora, então, será muito complicado um professor se interessar nessas condições, pois também não é só isso: a aposentadoria também mudou, pois para uma aposentadoria total o funcionário terá que pagar uma complementação.

Marcelo: Quando a senhora assumiu as aulas, em 2010, o Curso de Licenciatura em Matemática já existia e tinha o Projeto Acadêmico elaborado?

Prof.ª Virgínia: Sim, o curso já existia, assim como o Projeto. A Universidade abriu em 2006 e tinha algumas diretrizes políticas: uma delas é que aqui tivesse cursos de licenciatura. Não lembro bem, mas desde 2006 ou 2007 parece que houve um esforço do MEC em abrir, em faculdades federais, cursos de licenciatura. Tanto é que naquela época, enquanto não tinha a UFABC, mas tinha a Escola Técnica Federal de São Paulo, que passou a se chamar Instituto Federal, eles começaram a oferecer cursos de licenciatura: lá tem agora Licenciatura em Física, Licenciatura em Geografia, Licenciatura em Matemática. E antes, o que acontecia? A escola era uma escola técnica e começou a oferecer cursos; primeiro mais na área técnica, de engenharia, tecnológicos, mas parece que, por determinação do MEC, não sei te dizer bem, essas escolas técnicas federais passaram a institutos federais de ensino superior e a oferecer cursos de educação superior junto com os da área técnica, inclusive a oferecer licenciaturas. E, quando a UFABC foi implementada, já havia essa determinação política: vai ter curso de engenharia, porque a ideia é abrir um polo tecnológico aqui, e licenciaturas. Feito isso, o que aconteceu: as primeiras pessoas que foram contratadas em 2008, como no caso do Plínio, tiveram como a primeira tarefa fazer o Projeto Pedagógico das Licenciaturas, pois antes não havia projeto algum: tinha o Projeto do Bacharelado em Ciências e Tecnologia; estavam fazendo, já, os das Engenharias; mas não havia pessoas contratadas da área da educação para fazer os Projetos Pedagógicos das Licenciaturas. E nesse concurso de 2008 foram contratadas quatro pessoas: um da área da Educação Matemática, o Plínio Táboas; outra da área da Educação em Biologia, que se chama Rosana Louro Ferreira; uma professora da área da Química, Maísa Gonçalves; e um da área de Física, que acho que foi contratado no concurso anterior a 2008, que se chama Marcelo Zanotello.

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Marcelo: Então foi contratado um professor de cada licenciatura e eles elaboraram o Projeto Pedagógico das Licenciaturas, é isso?

Prof.ª Virgínia: Sim. Eles fizeram um único Projeto Pedagógico, congregando quatro licenciaturas. Esse Projeto Pedagógico foi aprovado em 2009, pelo ConsUni, que é o Conselho Universitário, pelo ConsEP, o Conselho de Ensino e Pesquisa, e passou a vigorar em 2009, agosto ou setembro. Era um Projeto Pedagógico só, mas para as quatro licenciaturas: a de Matemática, de Física, de Química e de Biologia. Então, nesse Projeto, existia uma parte comum, que ainda existe, ainda funciona, para as licenciaturas, que é a maior parte do curso, e depois tem uma parte específica para cada licenciatura.

Marcelo: Essa primeira parte é o BC&T que consta do Projeto?

Prof.ª Virgínia: É o BC&T e não apenas isso. Sabe aquelas 400 horas de disciplinas pedagógicas que na lei consta como prática de ensino? Então, essas 400 horas fazem parte do núcleo comum, mas não do BC&T. O BC&T é um curso comum não somente para as licenciaturas, mas para as Engenharias, para os Bacharelados de Matemática, Física, Química...

Marcelo: Então todo aluno faz o BC&T como curso introdutório?

Prof.ª Virgínia: Ou o BC&T ou o BC&H: são dois os cursos introdutórios. O aluno, para entrar aqui, faz primeiro o ENEM, não tem vestibular, e escolhe a vaga dele no SiSU. Ele pode escolher a UFABC aqui em Santo André ou em São Bernardo [do Campo], escolhe o período da manhã ou da noite e escolhe um dentre dois cursos apenas: ou o Bacharelado em Ciência e Tecnologia, ou o Bacharelado em Ciência e Humanidades, que é o mais recente. O que surgiu primeiro, em 2006, foi o BC&T. [Se o aluno escolheu o BC&T], então ele vai fazer 90 créditos de disciplinas comuns obrigatórias, como por exemplo, Funções de Uma Variável, que é o Cálculo I. Essas disciplinas do núcleo comum são tanto para as licenciaturas quanto para os bacharelados e para as engenharias. Se um aluno vai fazer Engenharia de Gestão, então ele vai fazer essas disciplinas também; Licenciatura em Matemática também, assim por diante. Se um aluno escolheu o BC&H, então ele vai fazer outro conjunto de disciplinas, com 96 créditos. A ideia é a mesma: ele faz um núcleo de disciplinas comuns, escolhe o curso específico dele e vai cumprir as disciplinas específicas. Para quem faz o BC&T, tem à disposição, se não me engano, 23 cursos que pode escolher. Ele pode fazer até três cursos juntos. Vamos supor: eu quero fazer Licenciatura em Matemática, Bacharelado em Biologia e Engenharia de Gestão. Ele pode e vai levando esses cursos específicos. Dependendo do curso específico que ele entrar, ele tem também outro núcleo de disciplinas, não tão comum. Por exemplo, nas engenharias, ele tem alguns créditos que valem para todas as engenharias. Então, vamos supor que tenha uma disciplina que chame desenhos e projetos: ela valeria para todas as engenharias. No caso das licenciaturas, ele vai fazer disciplinas que são comuns a todas as licenciaturas, que correspondem àquelas 400 horas de prática de ensino. São aquelas disciplinas como: Desenvolvimento e Aprendizagem; Políticas Educacionais; tem uma prática de ensino que é comum a todas, que é Prática de Ensino de Ciências e Matemática; Educação Científica, Sociedade e Cultura e Cultura; Libras; Didática; tem uma quantidade [de disciplinas] que, independente da licenciatura escolhida, ele vai ter que fazer. Depois, ele vai fazer as disciplinas que são mais específicas daquele curso. No caso da [Licenciatura em] Matemática, nós temos ainda algumas disciplinas que são compartilhadas com o Bacharelado em Matemática, que são obrigatórias tanto para quem faz a licenciatura quanto para quem faz o bacharelado, como: Teoria Aritmética dos Números; Matemática Discreta; Álgebra Linear; Cálculo Numérico; Evolução dos Conceitos Matemáticos. Então existem disciplinas que, na mesma classe, tem alunos tanto do Bacharelado quanto da Licenciatura em Matemática. A Geometria Plana e Construções Geométricas, os Fundamentos de Álgebra, de Análise e de Geometria, são disciplinas somente da licenciatura. Alunos somente da Licenciatura, veremos, por exemplo, na disciplina de Fundamentos de Álgebra, ou então em uma turma de Prática de Ensino em Matemática. Agora, além dessas, o aluno

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deve complementar os seus créditos mínimos para se formar fazendo disciplinas que chamamos de opção limitada e outras que são chamadas de opção livre. Então, por exemplo, o aluno tem que fazer 12 créditos [de disciplinas] desse grupo [disciplinas eletivas – opção limitada – da licenciatura em Matemática, Tabela 6 do Projeto, p. 10-11]. E também tem algumas disciplinas que, aí sim, ele pode escolher à vontade. Por exemplo: eu quero fazer uma da Filosofia, eu quero fazer uma da Engenharia, do Bacharelado de Química, enfim, ele tem 10 créditos que tem de cumprir desse jeito, escolhendo disciplinas que são dadas em qualquer outro curso, que ele pode escolher livremente. Então se ele começou a fazer e não gostou daquela e quer mudar, então muda, pois ele não tem que refazer aquela, porque é livre, ele pode escolher livremente, ele tem é que fazer algumas para completar os 10 créditos.

Marcelo: Essas disciplinas em que têm alunos do Bacharelado e da Licenciatura em Matemática, ao mesmo tempo, são ministradas por Matemáticos ou por Educadores Matemáticos?

Prof.ª Virgínia: Via de regra por Matemáticos. Por quê? Em primeiro lugar, porque temos pouquíssimos professores da área de ensino, trabalhando nessa área [de Educação Matemática]. Para você ter uma ideia, por enquanto, sou eu, e mais três professores: um deles estava ocupando um cargo administrativo e então estava com poucas aulas. Do final do ano para cá, tivemos um professor visitante, que não cheguei a falar. Não é um cargo definitivo: dura um ano e pode ser renovado por mais um ano, e nós esperamos tê-lo por dois anos; ele está nos ajudando, dando aula nos cursos de licenciatura. Por enquanto, o que estamos conseguindo fazer? Estamos dando conta apenas das atividades relacionadas à prática. Estamos com as disciplinas de Práticas de Ensino e orientando os Estágios. Por enquanto, a única disciplina fora dessas que eu consegui dar é Evolução dos Conceitos Matemáticos, que tem mais a ver com História que também é minha área, História e Filosofia [da Matemática].

Marcelo: Essa disciplina tem algo a ver com esta de História da Matemática, que está como eletiva? A História é uma continuação dela?

Prof.ª Virgínia: Não. A Evolução não é trabalhar somente com História da Matemática; nós trabalhamos também a Filosofia da Matemática, com conceitos mais fundamentais: como é que se define de um jeito, como se define de outro jeito, como poderia se pensar de maneira diferente [do ponto de vista matemático]. Essa ementa foi criada mais para um Curso de Bacharelado em Matemática. Então não se colocou [na ementa] nada relacionado à Educação Matemática: usar aquele ponto de vista como recurso pedagógico. Quando eu dei aula dessa disciplina, eu procurei colocar isso: olha, a gente está vendo isso aqui porque na escola básica isso poderia ser tratado dessa maneira, ou então poderia ter essa visão de determinado conteúdo. Por que fiz isso? Porque essa disciplina também é obrigatória para a licenciatura e, mesmo que não tenha na ementa, acho que essa disciplina tem que ter uma entonação para isso, não é? Agora, em outras disciplinas que precisariam também fazer isso, como Fundamentos de Álgebra e de Análise, isso não é feito. Por quê? Porque acabam sendo dadas por Matemáticos.

Marcelo: Essa seria minha próxima pergunta: se existe nas disciplinas Matemáticas a relação entre a teoria e a prática. Existe?

Prof.ª Virgínia: Depende de quem vai dar essa disciplina. Até agora ninguém da área da Educação Matemática conseguiu dar essas disciplinas, pois estão sempre ocupados com as Práticas de Ensino. Por isso precisamos de mais gente dando aula, senão elas sempre ficarão nas mãos dos Matemáticos. Isso é muito ruim, pelo seguinte: existem disciplinas que são obrigatórias no Bacharelado, mais não são na licenciatura, como é o caso, por exemplo, dessa Análise Real I. A ementa dela é muito parecida com a de Fundamentos de Análise [que é obrigatória para a Licenciatura em Matemática]. A ementa delas difere muito pouca coisa e, geralmente quem dá uma, quer dar a outra também, mas de forma igual. Então

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acaba não dando nenhum curso diferente e nós sabemos que isso é ruim para o Projeto Pedagógico e para a formação do aluno: uma visão diferente da disciplina, ele não vai ter.

Marcelo: As disciplinas são escolhidas pelos professores?

Prof.ª Virgínia: Aqui, o problema principal é a falta de professores. O planejamento inicial, quando a universidade foi criada, era de 750 e até agora ela não tem isso: acho que não chega a 500. Só que temos capacidade máxima de alunos no BC&T: entram 1.500 por vez e ninguém sai, porque o pessoal entra e ninguém se forma, pois com essa história de poder fazer três cursos ao mesmo tempo, eles querem mesmo fazer os cursos e não tem como [impedir]. Então não temos aquele fluxo normal de alunos. Assim, existe a necessidade de todos os cursos racionarem as disciplinas e não temos condições de oferecer todas, na frequência como gostaríamos de oferecer. Então acabamos fazendo assim: aqui no Projeto Pedagógico não é obrigatório uma ordem específica das disciplinas, o aluno poderia fazer em qualquer ordem. Mas é sugerida uma ordem nessa tabela aqui [quadro do item 6.2 do Projeto, páginas 11 e 12]. Aqui nós trabalhamos por quadrimestre, então temos aqui os quadrimestres ideais [referindo-se as disciplinas constantes da tabela] e nós procuramos oferecer somente as disciplinas do quadrimestre ideal, porque nós não temos capacidade para dar mais que isso. Por exemplo, nesse quadrimestre em que estamos [primeiro de 2013], por causa da greve, é o terceiro quadrimestre do ano. Então estamos oferecendo disciplinas desse segundo quadrimestre ideal [referindo-se ao quadro no Projeto Pedagógico], do quinto e do oitavo [os alunos ingressantes entram no segundo quadrimestre do ano, o que correspondente ao primeiro quadrimestre ideal. Assim, no terceiro quadrimestre do ano eles estão no segundo quadrimestre ideal].

Marcelo: Então são oferecidas, em princípio, as disciplinas que constam da programação que é proposta ao aluno?

Prof.ª Virgínia: Sim. No primeiro quadrimestre do ano, quais são os quadrimestres ideais? O terceiro, o sexto, o nono e o 12.º, e aí vai, na sequência. Então, dos quadrimestres ideias, nós oferecemos as obrigatórias. Quando sabemos que haverá possibilidade de oferecer disciplinas de opção limitada, ou então uma que está fora do quadrimestre [ideal] e que poderia servir para alguém adiantar seus créditos, nós oferecemos. É o caso, por exemplo, de Fundamentos de Geometria que estamos oferecendo nesse quadrimestre, pois teve um professor que se dispôs a dar isso, e tem também Tendências em Educação Matemática. Essa disciplina não é obrigatória para o Bacharelado e nem consta, na relação deles, como disciplina que poderiam fazer como créditos; seria uma disciplina livre para eles. Agora, para nós, é uma disciplina que é importante [é uma disciplina eletiva], só que é uma disciplina que conseguimos somente oferecer uma vez, que foi no primeiro quadrimestre de 2011; e só agora que vamos oferecer novamente. Quer dizer, em 2012 não foi oferecida e quem estava fazendo disciplina e terminou o curso, acabou ficando sem ela. Agora estamos com esperança de que entrem dois professores novos, e estamos oferecendo para o primeiro quadrimestre de 2013 essa disciplina de Tendências em Educação Matemática.

Marcelo: Como a senhora já disse, quando assumiu, o Projeto Pedagógico já existia. A senhora saberia indicar a origem desse Projeto, como ele surgiu, era um Projeto que veio do Ministério?

Prof.ª Virgínia: Não era um Projeto vindo do Ministério. O grupo daqueles quatro professores foi quem elaborou. Eles pegaram o Projeto do Bacharelado em Ciência e Tecnologia, que foi elaborado em 2006 e teve várias reformulações, a última em 2009, e juntaram às disciplinas obrigatórias desse Projeto de 2009 com outras que achavam ser importantes [para as licenciaturas], ou seja, foi obra desses quatro professores mesmo. Não sei se eles tiveram inspiração de outro lugar: eu imagino que não, pois esse Projeto é diferente dos de outros lugares, mesmo porque, para ser um Projeto para quatro licenciaturas, isso é diferente mesmo.

Marcelo: Eu tenho como ter acesso aos programas das disciplinas?

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Prof.ª Virgínia: Tem. Na página [eletrônica] da UFABC, você tem um link, na graduação, o Catálogo de Disciplinas da Graduação. Vou até te mostrar aqui [a professora mostrou, em seu computador o caminho para acessar o documento]. Todo ano sai uma nova versão, constando todas as ementas de todas das disciplinas da UFABC. Acontece que elas [as disciplinas] mudam, e de vez em quando há uma reformulação nesse catálogo. Aqui nós temos, por exemplo, as Práticas de Ensino, de Biologia, de Ciências e Matemática, de Matemática; você tem as ementas. Só que esse catálogo ainda não está completo, porque como nós estamos fazendo a revisão, acabamos não incluindo aqui as bibliografias; por enquanto tem só as ementas mesmo. Sabemos que esse Projeto tem, na nossa ideia, muitas falhas: falta muita coisa que um professor de Matemática deveria saber e não temos oportunidade de discutir. Então estamos fazendo uma reformulação. Olhe [referindo-se à ementa de uma disciplina do Catálogo, em seu computador]: aqui tem Prática de Ensino em Matemática, o que seria pré-requisito, e aqui o que procuramos trabalhar.

Marcelo: Quando a senhora fala em fazer essa remodelagem, a senhora consegue se juntar com o grupo da Matemática e pensar juntos, ou isso não ocorre?

Prof.ª Virgínia: Ocorre, ocorre sim. O que fazemos é o seguinte: no nosso curso, tem o Colegiado, tem um grupo de professores que é associado ao curso, tem a Plenária, então juntamos os professores, inclusive os Matemáticos puros e aplicados, e até Físicos, para pensarmos na reformulação do Projeto do Curso de Licenciatura em Matemática. Estamos prevendo uma reformulação tanto das disciplinas – quais são disciplinas que devem ser colocadas ou não, ampliar o número de créditos, pois a quantidade total de horas do curso é 2.808 e queremos ampliar um pouco, para 3.000, pois em um curso de quatro anos dá para fazer isso – como também mexer nas ementas, porque sabemos que a primeira concepção do curso ficou ótima, por ser a primeira, mas temos sempre que fazer uma reformulação. Tem também outros problemas que apareceram ao longo do caminho e que antes não estavam previstos. De 2009 para cá todos os cursos de graduação da UFABC já receberam visitas do INEP para fazer a avaliação do curso; alguns fizeram com alguma recomendação, outros não. O nosso curso foi aprovado com louvor, tiramos nota cinco, mas, mesmo assim, nós podemos melhorar. Agora, o pessoal da Biologia, por exemplo, recebeu uma equipe do INEP que fez uma crítica: o curso não pode ter um Projeto Pedagógico unificado com os outros cursos; seria uma espécie de anomalia. As outras equipes não falaram nada, mas o pessoal da Biologia falou que cada curso tem que ter o seu Projeto Pedagógico específico. Então estamos também fazendo essa mudança para atender também essa legalidade: não sabemos se não pode realmente ou se era apenas a opinião daquele grupo [de avaliadores do INEP].

Marcelo: Corre-se o risco de se modificar totalmente a ideia de um período básico para todos?

Prof.ª Virgínia: Em princípio não, porque vamos continuar aceitando aquela parte obrigatória do BC&T e também continuarão valendo aquelas disciplinas comuns a todas as licenciaturas. O que vamos mexer é na parte mais específica da Licenciatura em Matemática, assim como o pessoal da Biologia está mexendo mais na parte específica da Biologia, o que o pessoal da Química já fez e o da Física está fazendo. A estrutura, no geral, não vai mudar. O que vai mudar é a quantidade de disciplinas que será oferecida naquela parte específica do curso e também as ementas dessas disciplinas.

Marcelo: Com relação às disciplinas mais específicas para a Licenciatura em Matemática, o grupo de professores da UFABC consegue abordar alguns pressupostos de ensino e de aprendizagem? Consegue aliar a prática com a teoria?

Prof.ª Virgínia: Por enquanto, tanto eu, quanto o Francisco e o Alessandro, que estamos nas Práticas, estamos tendo que dar conta de tudo o que se relacione com a Matemática. Então, por exemplo, falamos nas aulas de práticas, sobre a História da Educação Matemática, da Didática da Educação Matemática, das práticas de pesquisa em Educação Matemática, acabamos falando de tudo. Mas não era esse o objetivo das Práticas: o objetivo era de eles

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[os alunos] fazerem a prática; e vimos que não dá muito tempo para eles fazerem isso, pois, mesmo com uma quantidade pequena de alunos, eles têm que fazer os seminários, têm que fazer os trabalhos deles e apresentar isso na prática, e vemos que o tempo deles é suficiente para fazerem somente um: não dá tempo de eles reformularem essa prática deles, ou de adquirirem realmente a prática. Então, nessa reformulação do Projeto Pedagógico, o que queremos fazer é exatamente isso: deixar as Práticas de Ensino para eles terem uma prática de ensino, ter uma possibilidade de fazerem essa discussão a respeito da prática que ele vai ter dando aula: dele preparar a aula, de analisar um livro didático, dele preparar o material que vai oferecer na aula. Nós queremos deixar as disciplinas de Prática de Ensino para isso e, assim, oferecer outras disciplinas que não existem [no Projeto Pedagógico], que não estão aqui, e que poderiam dar conta dessa parte teórica: seriam mais informativas, mais formativas, para discutir a respeito das teorias didáticas da Educação Matemática, de abordar as tendências de pesquisa em Educação Matemática. Uma das coisas que queremos é tornar essa disciplina de Tendências em Educação Matemática como uma disciplina obrigatória; outra é colocar uma disciplina chamada Didática da Matemática; outra é colocar uma História, com aspectos mais históricos mesmo. Nas Práticas de Ensino queríamos ter mesmo o aluno na prática, o trabalho dele na prática; que ele pudesse dar a aula dele e que ele tivesse a possibilidade de reformular sua aula.

Marcelo: O estágio para os alunos, futuros professores de Matemática, faz parte de um Projeto comum a todas as licenciaturas ou é específico para a Licenciatura em Matemática? Além disso, vocês conseguem fazer o casamento dos Estágios com as Práticas de Ensino?

Prof.ª Virgínia: O estágio faz parte de um Projeto Comum, não está relacionado a alguma área [específica]. Ele foi organizado pelos quatro professores e nós vamos, aos poucos, aperfeiçoando. Nós temos um planejamento geral de estágio, são cinco estágios, ou seja, um estágio dividido em cinco etapas, e o aluno, preferencialmente, tem que fazer junto com as Práticas de Ensino. Mas isso não acontece: na prática não ocorre; depois de todas as disciplinas é que ele terá um tempinho para fazer o estágio. Mas nós indicamos ao aluno: nesse estágio você vai ter que fazer em uma escola de Ensino Fundamental, com tais atividades: horas de regência, horas de observação... Sempre no primeiro estágio do Ensino Fundamental e no primeiro do Ensino Médio, ele tem que ver o projeto pedagógico da escola, analisar as características da escola, e nos últimos de cada nível ele tem que fazer as regências. Também tem que visitar alguns espaços alternativos, como um museu de Ciências, uma feira de Ciências, uma escola específica para alguma coisa. As orientações relativas à Matemática, Física, Química, Biologia são separadas, e os professores de Matemática entram no estágio dos alunos de Matemática, e cada um faz na sua área. O que fazemos é discutir o que o aluno viu na escola, como ele vê isso na prática, como ele explica isso com alguma teoria, como ele poderia fazer diferente. Ele também tem que fazer atividades na escola, como por exemplo, preparar aula, dar aquela aula, analisar o material que o professor usa na escola, tudo isso ele tem oportunidade de discutir. Nós fazemos reuniões quinzenais e nessas reuniões eles [os alunos] falam o que viram na escola, o que eles fizeram, como eles acham que poderia ser, por que é assim, por que não é, então, eles têm oportunidade de discutir. O que não temos muito é a oportunidade deles fazerem um estudo mais profundo a respeito daqueles problemas que eles veem lá na escola, como eles poderiam resolver, e de que maneira as teorias que eles viram aqui na UFABC poderiam ajudar: isso nós não temos muito a oportunidade de fazer. Se eles fizessem direitinho, junto com as Práticas de Ensino, teria até como fazer, mas, na prática, não é isso, não funciona.

Marcelo: Na maior parte das instituições de ensino superior os alunos têm que procurar as escolas para realizar os estágios: não há uma parceria dessas instituições com o poder público para colocar os alunos em estágios. Como a UFABC trabalha isso? O aluno tem que procurar campos para os estágios? Tem que ser em escola pública, ou pode ser em escola particular?

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Prof.ª Virgínia: Aqui o aluno tem que procurar as escolas em que ele vai fazer os estágios. Pode ser em escola particular, mas nós orientamos que seja, preferencialmente, em escola pública, até porque a atividade de regência, em escola particular, não acontece. Geralmente é só participação, observação da aula: na escola particular fica sempre mais difícil. Mesmo assim alguns alunos já fizeram em escolas particulares em que já eram monitores, professores, e então acabaram fazendo nessas escolas. Uma coisa que é interessante anotar é que nós temos uma Resolução do ConsUNI para estágios, elaborado por aquele grupo de quatro professores que, quando elaboraram o Projeto Pedagógico, já elaboraram a Resolução para ser aprovada no ConsUNI e no ConsEP. Essa Resolução foi aprovada em 2010 e eu já estava aqui e lembro-me da discussão. Na Resolução constava que os alunos somente poderiam fazer em escolas públicas. E os conselheiros do ConsEP reclamaram disso, pois existiriam alunos que poderiam perder chance de emprego em escolas particulares. Então o próprio ConsUNI colocou um item que poderia ser em escolas públicas, preferencialmente, ou em escolas particulares. Quando nós orientamos os estágios tentamos fazer com que eles façam em escolas públicas e a maioria faz, realmente. Só que é o próprio aluno quem vai buscar: então tem aluno que prefere fazer perto de onde mora, ou então próximo de onde trabalha; mas a maioria faz aqui nas escolas próximas do UFABC. Uma coisa interessante é que, quando eu entrei, em 2010, foi a primeira turma de alunos que teriam que fazer estágios; então eu já orientei a primeira turma de estagiários. E tivermos muita dificuldade que as escolas próximas aceitassem os estagiários: os professores não querem os alunos na sala de aula, pois acham que vão atrapalhar, vão ter interferência, enfim. Nós tivemos certa resistência: tem uma escola próxima que chegou a recusar os estagiários dessa primeira turma. Então eles tiveram que ir para escolas um pouco mais longe. Depois, no final de 2010, início de 2011, começou o PIBID. Aí, um grupo de professores daqui foi nas escolas, fez as parcerias, inclusive com essa, e várias outras. E agora, estamos de bem, os estágios estão ocorrendo às mil maravilhas: alguns alunos vão às escolas para fazer o PIBID e outros vão para fazer os estágios. Após o PIBID tivemos parcerias excelentes com as escolas. Mas o problema que eu vejo é o seguinte: muitos alunos que vêm fazer a licenciatura querem também fazer o PIBID e eles acabam fazendo os estágios nas mesmas escolas que o PIBID, o que acaba sendo a repetição do mesmo tipo de atividade; uma hora a atividade é paga pelo PIBID e outra hora, no estágio, não é paga. Assim o aluno não muda de ambiente, não vê outra realidade. Uma coisa que discutimos, na Matemática, seria a possibilidade de fazermos uma espécie de parceria com outras escolas, que não sejam do PIBID, para que os alunos pudessem fazer estágios em locais diferentes, porque outro problema que nós enfrentamos, logo no início, é que muitas dessas escolas em que os alunos fizeram os estágios eram escolas não muito boas, pouco organizadas, que tinham a falta de muitos professores, em que os estagiários chegavam lá para fazer as observações e eram colocados na sala de aula, para dar aulas, porque os professores tinham faltado: isso aconteceu em várias ocasiões. Queríamos mudar para escolas que seriam como escolas modelo, em que pudéssemos recorrer a ela para os alunos fazerem estágios. Só que isso também ficou complicado pela quantidade pequena de professores que nós temos e o acúmulo de atividades. Agora, também tem um dado que nós soubemos até pelo fato do PIBID: escolas públicas, pelo menos estaduais, não fazem parcerias com ninguém, nem com universidades públicas, nem com outro tipo de universidade. O único tipo de parceria que foi feito com escolas públicas, pelo menos as estaduais – não sei as dos municípios, pois cada município é uma lei –, que a Secretaria Estadual de Educação aceitou, foi a do PIBID. E agora tem uma espécie de PIBID estadual também, não me lembro do nome. Fora isso, não tem como você estabelecer uma parceria formal. E não sendo formal, fica muito dependente do bom humor de quem te atende na escola, do professor que vai atender esse aluno: não dá para dizer que temos convênio com essa escola para fazerem o estágio.

Marcelo: A senhora chegou a comentar, na questão da possível reformulação, de ampliar a carga horária do curso. O que vocês entendem da lei sobre a carga mínima de 2.800 horas e sobre o período mínimo de duração de três anos? O que

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especialmente o Curso de Licenciatura da UFABC entende sobre esses mínimos, sobre a interpretação das Diretrizes Curriculares?

Prof.ª Virgínia: Vou dar uma interpretação minha. Eu acho que 2.800 horas, sendo 1.800 horas de disciplinas e as outras 1.000 com atividades práticas, estágios e atividades complementares, é pouco para você formar um professor. Na minha interpretação é uma quantidade de horas muito pequena, ainda mais em um prazo de integralização mínima de três anos. Por quê? Bom, quando eu era coordenadora em uma instituição particular, nós cumpríamos o mínimo do mínimo, caso contrário não conseguíamos alunos: abrir um curso de licenciatura com quatro anos? Imagina, não haveria clientes. E é muito complicado, por que – isso é uma visão minha também – quem é o público que vai fazer licenciatura? Nas universidades particulares é aquele público que não tem como cursar cinco anos de uma engenharia, que é um curso mais extenso. Então vai fazer um curso mais rápido – agora existem os tecnológicos que são mais rápidos ainda: antigamente os mais rápidos eram de três anos –, vai fazer licenciatura, porque depois vai ter um emprego, um curso de nível superior, em um prazo mínimo possível. E é geralmente o pessoal que não tem uma formação básica muito boa, deficitária, estudou em escola pública durante a vida toda, já não tem aquela formação ideal. Então o primeiro ano desses três anos seria uma espécie de alfabetização entre aspas: seria um curso que você teria que preencher lacunas dos conteúdos que ele já deveria saber e, depois, passaria dois anos em um curso mais específico de licenciatura, de nível superior. Então eu acho que três anos, com essa carga horária, é pouco para formar um professor. Para que aceitemos esse público, nós realmente temos que preencher essa lacuna para depois dar um curso que seja suficiente para ele ser professor: ele vai ter que ensinar aquilo. Então tem um tempo de formação aqui que precisa ser ampliado; os dois anos que sobram não são suficientes para formar aquele aluno como professor. E quando eu vim para a UFABC, para um curso de licenciatura de quatros anos, ao conhecer o Projeto Pedagógico me perguntei: por que somente 2.808 horas? – Só para explicar o porquê dessas oito horas, como a unidade de crédito aqui tem 12 horas, então a carga horária é múltipla de 12 –. Então por que colocar uma carga horária mínima? Se o curso é de quatro anos, poderiam ampliar essa carga. E o pessoal do grupo mesmo explicou que, na época da elaboração do Projeto Pedagógico, eles não tinham a perspectiva de quantos professores teriam em cada licenciatura; então eles não podiam ampliar muito a carga horária para depois não ter professores para dar aula nas disciplinas. Dessa forma, num primeiro momento, resolveram deixar essa carga horária mínima. Agora, pela quantidade de professores, ou pelo menos de vagas para contratar professores, já vai ser suficiente para podermos ampliar essa carga horária. E por que nós queremos ampliar essa carga horária? Porque vimos que essas disciplinas que são mais específicas para a licenciatura, e principalmente nas disciplinas em que temos chance para discutir a prática, a didática, os conteúdos que formariam o professor, não somente de Matemática, mas o conhecimento profissional, são mínimas, e assim temos pouca chance de ter contato com isso. Então pensamos que deveria mesmo ser ampliada essa carga, e nessas disciplinas mesmo, e não colocar mais Matemática, mais Física, mais BC&T, mas dar oportunidade para o aluno pensar naquilo que vai fazer na sala de aula, enquanto professor, e nos recursos que ele vai ter. Para você ter uma ideia, nas Práticas de Ensino, nós conseguimos, somente em uma das práticas, falar a respeito, por exemplo, do GeoGebra: em uma aula, baixamos aqui o programa e trabalhamos com ele. Nosso caso aqui na UFABC não é falta de material: nós temos recursos e material com tranquilidade. O que falta é oportunidade para poder estar com o aluno para discutir aquilo; em compensação, Cálculo eles têm até demais: Cálculo, Álgebra, Geometria...

Marcelo: Se, de repente, a senhora quisesse lecionar em uma disciplina de Cálculo neste semestre, haveria problemas com os Matemáticos?

Prof.ª Virgínia: Não, não teria, porque Cálculo faz parte do BC&T e quando é oferecido é oferecido com 30 turmas. Pelo contrário, eles vão dizer ainda bem! Se você quer dar aula de Cálculo vai dar aula daquilo que gosta.

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Marcelo: Então não haverá problemas se um Educador Matemático escolher uma disciplina, digamos assim, dura do núcleo da Matemática para dar aula?

Prof.ª Virgínia: Terá problemas se eu escolher uma disciplina específica do Bacharelado, por exemplo, Análise Real, Geometria Diferencial: aí tem problemas, porque tem, lá no pessoal da Matemática, um professor que sempre quer dar aula daquilo, que é aquela a formação dele, então por que é que você vai querer minha disciplina? Ou então, se você quer dar aula disso, tudo bem, mas sou eu que vou falar pra você como você vai dar aula, enfim. Aqui nós temos um problema contrário: nas disciplinas que são do núcleo do BC&T, todos dão graças a Deus quando alguém quer ficar com uma turma de lá [do bacharelado], agora as disciplinas específicas, todo mundo quer cuidar do seu canteiro. E mesmo para o Curso de Licenciatura, é difícil nós encontrarmos alguém que queira dar aula, mesmo nas disciplinas de Matemáticas: são poucos os professores da Matemática que acabam dando essas aulas, que acabam colaborando. Porque quem entrou numa área mais Matemática mesmo, acha que tem que dar aula de toda Matemática. Não sei em outras universidades, não é uma coisa aberta, mas aqui existe um preconceito: bacharelado é como se fosse a estrela da casa enquanto que a licenciatura, o patinho feio. Não é só na Matemática, mas em outras áreas também é assim: eu pensei que era somente na Matemática, mas na Biologia é assim, na Física, na Química, até na Filosofia.

Marcelo: Levando em consideração que no último exame (ENADE) tanto a Licenciatura quanto o Bacharelado foram as melhores notas do Estado de São Paulo – e parabéns por isso – por que só o bacharelado é a estrela?

Prof.ª Virgínia: Ah, obrigado! Pois é: aí todo mundo ficou feliz, tanto eu quanto eles; mas tem, assim, uma espécie de opinião que bacharelado dá status e licenciatura não. E é muito estranho esse tipo de raciocínio, porque como trabalhei muito em escolas particulares, nós sempre trabalhamos com alunos que visam o mercado de trabalho. Por que nas escolas particulares não existem bacharelados em Matemática? Porque não tem mercado de trabalho para bacharéis em Matemática! E aqui, na Universidade, pelo menos nessa, os alunos querem fazer o bacharelado. E eu pergunto a eles: por que você quer fazer o bacharelado? E eles respondem: porque eu quero fazer o mestrado, o doutorado... Ah, então depois você vai dar aula no ensino superior, não é? Não, quero ser pesquisador. Mas, não existe isso aqui: no Brasil, quem é pesquisador é professor e tem que fazer as duas coisas, e o aluno acaba achando que é possível evitar. E não é pouca gente que acaba tendo essa visão; fora do meio acadêmico, não existe emprego para bacharel em Matemática, existe emprego, e muito, para os licenciados em Matemática. O bacharel em Matemática vai ter que dar aula, do mesmo jeito. Talvez porque os alunos aqui não têm necessidade de se formar rapidamente, eles ainda não pensam no mercado de trabalho.

Marcelo: Bom, uma pergunta que é geral para todas as entrevistas, mesmo conhecendo que na UFABC todos os professores são doutores...

Prof.ª Virgínia: Sim, aqui todos os professores são concursados e doutores. Isso não acontece em outras universidades federais, que têm outra forma de ingresso e que aceitam professores sem doutorado, mas aqui é do regimento interno da universidade, essa é uma determinação.

Marcelo: Uma curiosidade me surgiu. Quando o aluno termina o BC&T, ele tem algum tipo de certificado de conclusão?

Prof.ª Virgínia: Sim, ele tem um diploma, pois o BC&T é um curso superior: é um bacharelado, com 2.400 horas, um curso superior mesmo. Aí, se ele terminar o curso de licenciatura, ele vai ter um diploma da licenciatura.

Marcelo: Então são dois diplomas que o aluno que cursa a Licenciatura em Matemática na UFABC recebe?

Prof.ª Virginia: Sim, são dois diplomas. Mesmo que ele opte somente pela Licenciatura em Matemática, ele vai ter dois diplomas. Ao mesmo tempo em que as disciplinas específicas

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da licenciatura são obrigatórias, para o Bacharelado de Ciência e Tecnologia elas constam como disciplinas de opção limitada ou disciplinas de opção livres. Então, por exemplo, o aluno faz Prática de Ensino de Matemática, com quatro créditos: conta para a Licenciatura em Matemática e para o BC&T; é uma carga horária que conta, ao mesmo tempo, para dois cursos de graduação. E não tem como ele fazer os de licenciatura, terminar o curso de licenciatura, antes que tenha terminado os do bacharelado: obrigatoriamente, ele tem que ter terminado o bacharelado antes.

Marcelo: Existem algumas disciplinas, digamos, de nivelamento, fora do BC&T, para trabalhar as dificuldades dos alunos que entram na Federal?

Prof.ª Virgínia: Não. Como eu falei, o BC&T mudou de grade várias vezes. Até 2008, não tinha nenhum tipo de disciplina de nivelamento. Na matriz curricular de 2009, você tem as disciplinas Bases Matemáticas, Bases Experimentais das Ciências, e essas são as chamadas de nivelamento. Elas foram incluídas no currículo, porque eles perceberam que o aluno, quando entrava já no estudo de Funções de Uma Variável, Cálculo I, tinha já uma série de deficiências. O problema é que, na prática, isso não funcionou. Na prática, precisaria das Bases das Bases Matemáticas, porque essa disciplina acabou se tornando um novo Cálculo, um Cálculo zero, mas ficou sendo tão difícil quanto o Cálculo I ou Cálculo II, porque quem pega essas disciplinas são também os Matemáticos, que acham que aquelas coisas assim, como integral de linha, por exemplo, os alunos já nasceram sabendo. Nós recebemos alunos com formações variadas e, via de regra, eles vão mal em Matemática. A estimativa, aqui no BC&T, de reprovação em disciplinas é próximo dos 60%, em Matemática; mesmo essa disciplina de Bases Matemáticas. Então os alunos, em geral, acabam sentindo dificuldades, e como ninguém ainda aceitou colocar bases em cima de bases, incorporar isso no currículo, então não têm [disciplinas de nivelamento]. Agora o que acontece: nesse ano de 2013 é um ano atípico, pois por causa da greve estamos fazendo reposição e os alunos que ingressarão aqui na UFABC, neste ano, somente iniciarão no final de julho, início de agosto. Então eles ficarão, praticamente, seis meses antes de começar o curso de graduação. E assim, a pró-reitoria de graduação resolveu fazer uma espécie de curso de nivelamento, que não é obrigatório, o aluno se inscreve se quiser, não vai contar crédito pra ele, mas tem a função de introduzir os alunos, aos poucos, na Universidade. E não será apenas Matemática nesse curso, mas há também outros assuntos e a Matemática Básica que ele precisaria para poder enfrentar um curso superior.

Marcelo: Mas isso é atípico, que surgiu de uma questão que vocês estão enfrentando esse ano que é iniciar o ano letivo mais tarde.

Prof.ª Virgínia: É. Geralmente ele inicia tarde mesmo: inicia em maio o ano letivo aqui. Na verdade, o ano letivo começa em fevereiro, só que ainda não saiu o resultado do SiSU. Então nós não teríamos como matricular os ingressantes, logo em fevereiro. Assim nós os matriculamos em maio, que é o segundo quadrimestre. Agora, esse ano, vai ser mais tarde ainda por causa da greve. Então nós ofereceremos, neste semestre, esse curso de nivelamento, mas com caráter de nivelamento mesmo e não é um curso obrigatório, o aluno vem se quiser.

Marcelo: Os Educadores Matemáticos darão aulas nesse curso?

Prof.ª Virgínia: Não, nenhum deles, pois estão com muitas aulas e não têm como assumir esse curso.

Marcelo: Então eles não assumirão por estarem sem condições, é isso?

Prof.ª Virgínia: Isso, mas algo que é digno de nota é que a nenhum dos Educadores Matemáticos foi perguntado a respeito de como deveria ser o currículo, o que deveria ser incluído e como deveria ser abordado. Tudo bem, nós não poderemos dar essas aulas, mas podemos dar um palpite, uma dica, uma indicação do conteúdo que seria importante para ser dado nesse tipo de curso. Não sei de quem foi o Projeto, mas não foi assim: vamos pensar com as licenciaturas... Isso não teve: nem da pró-reitoria de graduação, nem com as

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outras coordenações. As outras coordenações de licenciatura sofrem o mesmo problema que sofremos: têm falta de professores, estão cheias de matérias para oferecer, e não têm conseguindo contratar todos os docentes necessários.

Marcelo: Bom Professora, por hora eu estou satisfeito com nossa conversa e se a senhora quiser colocar mais alguma coisa que não tenhamos abordado, ou alguma observação, enfim. Gostaria de saber se há problemas de identificá-la, no estudo, assim como a UFABC.

Prof.ª Virgínia: Não, não há problema algum. Apenas quero acrescentar que a reformulação de que tratamos está em estudo ainda. Nós constituímos um grupo de trabalho e nesse grupo está eu, alguns professores da Educação Matemática, outros da Matemática e outra da Ciência da Computação. Então estamos ainda fazendo esse estudo e, após ele, ainda tem um longo processo burocrático que temos de enfrentar, até a implantação chegar realmente ao currículo e, nesse meio tempo, pode ser que ainda o Projeto sofra outras modificações: não é uma coisa como favas contadas. Eu espero que não mude muito, mas não é sempre assim o que acontece.

Informações obtidas após a primeira entrevista:

Número total de alunos cursando a Licenciatura em Matemática, no primeiro semestre de 2013: 07 (sete alunos)

Período em que o Curso é oferecido: matutino e noturno.

Carga horária de uma aula: sessenta minutos.

Segunda entrevista:

Marcelo: A senhora poderia comentar sobre as disciplinas práticas que constam no Projeto do curso?

Profª Virgínia: No Projeto atual, nós temos cinco disciplinas que são as Práticas de Ensino. Juntamente com outras disciplinas da parte pedagógica do Curso, elas compõem as 400 horas de prática como componente curricular, embora nem todas as disciplinas desse conjunto sejam práticas [de ensino] de fato: somente as cinco disciplinas recebem esse nome de Prática de Ensino de Matemática. Na verdade, das cinco, a primeira delas chama-se Prática de Ensino de Ciências e Matemática no Ensino Fundamental, que é uma disciplina ministrada para todos os alunos das licenciaturas de Biologia, de Química, de Física e de Matemática. É um professor, ou às vezes dois que a dividem, e que ministram essas aulas para todos os alunos juntos. Essa disciplina tem um foco mais geral, pois trata um pouco da avaliação nas disciplinas de Ciências e de Matemática no Ensino Fundamental, um pouco da análise de livros didáticos, e outros. Desde quando eu entrei na UFABC, em apenas duas ocasiões nós conseguimos fazer uma dobradinha de um professor de Matemática [educador matemático] com um professor de Ciências Naturais: a primeira vez que essa disciplina foi oferecida, com o Prof.º Plínio e a Prof.ª Rosana, da Biologia, e no início desse ano [2013], com o Prof.º Alessandro e com a Prof.ª Cândida, da Física; em todas as outras ocasiões, essa disciplina ficou a cargo de professores das Ciências Naturais. E nisso, é evidente que o professor acaba dando uma ênfase maior para a disciplina da sua área e acaba não dando foco à Matemática. A segunda disciplina é a Prática de Ensino de Matemática para o Ensino Fundamental e nela são abordados conteúdos específicos da Matemática, relacionados ao Ensino Fundamental como, por exemplo, os recursos metodológicos para ensinar determinado conteúdo, com seminários em que os alunos apresentam recursos diferentes da lousa e giz, por exemplo, software, lousa digital, materiais manipuláveis, que temos no Laboratório de Matemática e que é bem equipado. Nós costumamos os alunos a trabalharem com esses materiais na Prática do Ensino Fundamental – esse laboratório é para práticas de ensino de Matemática e cognição. Depois, temos mais três disciplinas denominadas Práticas de Ensino, I, II e III, que são voltadas ao Ensino Médio. De acordo com as ementas, elas são divididas por conteúdos do

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Ensino Médio, não necessariamente em uma ordem específica – Prática I com disciplinas do 1º ano do Ensino Médio, Prática II com disciplinas do 2º ano, e Prática III, do 3º ano –, mas divididas em grandes tópicos do Ensino Médio para não deixar nenhum deles defasado. A ideia é trabalhar também recursos metodológicos diferenciados para os alunos poderem lecionar conteúdos desses tópicos. E nesse caso, fica um pouco mais difícil, pois nem todo recurso como jogos e materiais manipulativos podem ser utilizados nos conteúdos do Ensino Médio. Mas a ideia é também de os alunos apresentarem seminários, fazerem leituras relacionadas a esses conteúdos, como metodologias de ensino, recursos de ensino. Por enquanto, essas disciplinas foram ministradas por quem entrou na área de Ensino de Matemática, que é a área da Educação Matemática: o Prof.º Plínio, eu, o Prof.º Alessandro, o Prof.º Francisco e a Prof.ª Vivili, estes dois últimos, que entraram no concurso realizado após a primeira entrevista que concedi a você.

Marcelo: Nessas disciplinas de Prática de Ensino estuda-se, em algum momento, relação do que o aluno vê em Matemática com o que poderia ser utilizado por ele para ensinar na Educação Básica?

Prof.ª Virgínia: No que se refere às questões didáticas ou metodológicas, diferente de questões institucionais e de outra ordem, nós não temos um diálogo muito grande com os professores que lecionam disciplinas de Matemática, tanto as três específicas para a Licenciatura, quanto as que são compartilhadas com os alunos do Bacharelado, pois, até o momento, todas elas foram ministradas por professores que não ingressaram na UFABC pela área do Ensino e sim por áreas do Bacharelado em Matemática. Até o hoje, não conseguimos que um de nós [educadores matemáticos] assumisse as disciplinas matemáticas específicas da licenciatura, que são os Fundamentos de Análise, Fundamentos de Álgebra e Fundamentos de Geometria, porque estamos sempre com as disciplinas da prática, como as Práticas de Ensino e História da Matemática. Sendo assim, o que acontece: nem todo professor formado no Bbacharelado em Matemática e que fez o mestrado e o doutorado também nessa área, pura, ou aplicada, tem a visão de que devamos discutir e compartilhar atividades. Daí esse tipo de atividade acaba não ocorrendo: não conseguimos, ainda, que todos os professores da Matemática considerassem algo da prática de ensino em suas aulas e também o contrário, pois não sabemos exatamente o que tem sido feito nas aulas de Matemática. E aqui na UFABC, nós temos outro problema: o aluno tem um currículo sugerido, ou seja, uma ordem de disciplinas a serem estudadas que é sugerida, mas nem sempre eles as cumprem nessa ordem e sim na ordem que querem. Muitas vezes, os alunos fazem todas as práticas e somente no final do curso fazem os estágios, que são sugeridos para serem feitos juntos; muitas vezes eles fazem uma prática, depois fazem duas ou três de Matemática, algumas de Engenharia, depois fazem mais uma de prática, ou seja, o aluno que faz a prática de ensino nem sempre é o aluno que está fazendo as disciplinas de Matemática; não podemos contar que é o mesmo aluno que está fazendo essas duas disciplinas ao mesmo tempo [Prática e Matemática]. E nas Práticas de Ensino temos uma coisa curiosa: não sei se por uma questão de encaixe de disciplinas na disponibilidade do aluno ou então por ser considerada uma disciplina mais leve, embora isso seja um tanto pejorativo para alguns alunos, nós temos muitos deles que estão cursando essas disciplinas, mas não querem ser professores e sim engenheiros, e acabam fazendo essas disciplinas para compor a carga horária de disciplinas livres, pois entendem que não serão trabalhosas, não serão difíceis, enfim. Quando o Projeto da UFABC foi pensado, a intenção era de que o aluno pudesse ficar um pouco mais especializado em questões da própria área como, por exemplo, o aluno que quisesse ser um engenheiro espacial, poderia escolher, como disciplina livre, uma disciplina que não constasse como obrigatória ou de opção limitada, mas que agregaria um conhecimento que lhe poderia ser útil. Mas não é isso que acontece: como eles podem fazer qualquer disciplina, tem muito aluno das engenharias que vem fazer disciplinas da prática porque acham que são disciplinas que não vão pesar tanto. E dessa forma, ocorrem alguns problemas: um deles é que, de início, alguns alunos não vêm interessados nas discussões que acontecem nas Práticas de Ensino, e quando descobrem que tem que fazer leituras, apresentar seminários em que devem defender suas

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ideias e expor seus argumentos – coisas difíceis para alunos da área de exatas – vários abandonam essas disciplinas, e isso acontece com frequência. Por exemplo, algumas turmas que iniciam com 10 alunos – considerada uma turma grande para as Práticas de Ensino – acabam encerrando com apenas cinco alunos. Na disciplina de História da Matemática que estou ministrando agora, que iniciou com 50 alunos, hoje temos apenas 30, e ainda nem começamos as apresentações dos seminários; poucos vêm com o interesse em educação, como os alunos da licenciatura em Matemática especificamente. Por outro lado, ocorrem também situações boas: acabamos, às vezes, ganhando alunos, pois tem alunos que cursam aquelas disciplinas com intenção apenas de cumprir a carga de disciplinas livres e acabam sendo conquistados pela forma de pensar diferente e, com isso, percebem que, na verdade, gostam da área do ensino, fazem outras disciplinas dessa área até mesmo para certificarem de que têm gosto pela educação e acabam concluindo a Licenciatura em Matemática.

Marcelo: Constam das ementas das disciplinas de Práticas de Ensino de Matemática I, II e III o Planejamento e Avaliação de conteúdos do Ensino Médio. Esses conteúdos do Ensino Médio são também abordados nessas disciplinas?

Prof.ª Virgínia: Nessas disciplinas de Prática são discutidos métodos de ensino para os conteúdos do Ensino Médio. Discutir ou ensinar esses conteúdos aos alunos da Licenciatura não são objetivos nessas disciplinas.

Marcelo: Tendo em vista que já atuou nas disciplinas de prática, a senhora poderia contar um pouco como são suas aulas nessas disciplinas?

Prof.ª Virgínia: Na primeira aula eu me apresento, peço para os alunos se apresentarem, faço uma apresentação do programa da disciplina e também do que faremos no decorrer do quadrimestre. Geralmente, deixo as primeiras aulas do curso para exposição de conteúdos, por mim mesma, e as demais aulas para apresentação de seminários, cujos temas já são definidos nas primeiras aulas. Nas aulas das disciplinas Práticas de Ensino, eu costumo fazer seminários individuais, pois a quantidade de alunos é pequena. Nesses seminários, o aluno tem que utilizar recursos metodológicos adequados para o ensino do conteúdo que ele apresentará. Nas primeiras aulas, eu abordo sobre a História da Educação Matemática, como ela se constituiu aqui no Brasil, abordo o Projeto Pedagógico da UFABC, indicando qual é a importância da disciplina no Curso, falo a respeito da legislação relacionada ao ensino de Matemática, sobre os Parâmetros Curriculares, sobre os Programas Curriculares do Estado de São Paulo, e fazemos, por exemplo, a análise de livros didáticos, observando o que é que tem nesses livros, relacionado aos itens do PNLD, enfim, comento sobre esses assuntos. Já houve turma em que discutimos alguns recursos, como a resolução de problemas e a utilização do GeoGebra e de materiais manipulativos: teve uma turma que gostou muito de trabalhar com o ábaco. Já em História da Matemática, eu acabo utilizando mais que as primeiras aulas para exposição de conteúdos. Após as apresentações dos seminários, a turma avalia cada um deles e indica o que acharam mais interessante e o que poderia ser melhorado. No fim, eu aplico uma prova escrita, não cobrando conteúdo específico, mas sim reflexão sobre o que foi apresentado, tanto nos seminários quanto nas minhas aulas expositivas.

Marcelo: Além dessas disciplinas relacionadas à prática, há outras disciplinas que abordam características pedagógicas no curso?

Prof.ª Virgínia: Depende muito de quem está lecionando, mas existe uma disciplina que é obrigatória para a licenciatura e para o bacharelado em Matemática que é denominada Evolução dos Conceitos Matemáticos. Quando eu lecionei essa disciplina, e foi somente uma vez, eu também abordei o aspecto pedagógico, pois como é uma disciplina com um apelo histórico grande, acabei comentando como a História da Matemática poderia funcionar como recurso metodológico para seu ensino. A maior parte dos alunos não estava interessada em fazer licenciatura, mas alguns acabaram pensando nessa ideia como uma possibilidade. Além dessa, há a História da Matemática, que não é obrigatória para o

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bacharelado e nem para a licenciatura, mas tem sempre uma quantidade grande de matrícula. Nessa disciplina, para os seminários, os alunos têm que apresentar uma primeira parte contendo uma pesquisa histórica relacionada ao tema e uma segunda parte apresentando uma aula relacionada ao tema, em que a História da Matemática é utilizada como recurso metodológico.

Marcelo: Quando o aluno ingressa na UFABC ele o faz por meio de um dos dois bacharelados interdisciplinares. A Universidade tem como identificar quantos alunos ingressam com vistas a determinado curso, após o bacharelado interdisciplinar?

Prof.ª Virgínia: Não, a Universidade não tem esses números. O que existe é a quantidade de vagas por curso, que no caso das licenciaturas, são 20 para o período diurno e 20 para o noturno. Esses números, de todos os cursos, compõem o número total de alunos que ingressam anualmente na UFABC, ou seja, do número total de ingressantes, são previstos 40 para cada licenciatura, o total de vagas de cada engenharia, e assim por diante. Mas isso não significa que todo ano entra 40 alunos que cursarão futuramente, por exemplo, a Licenciatura em Matemática: pode ser mais ou menos. Os alunos entram e se matriculam em um dos bacharelados interdisciplinares e muitos deles apenas se matriculam no curso específico quando estão terminando esse curso, ou seja, já cursaram diversas disciplinas. Dessa forma, pelo que eu saiba, não há como fazer essa pesquisa no ingresso do aluno na UFABC.

Marcelo: Pelo que a senhora respondeu, então não há como identificar o momento em que um aluno começou a cursar uma licenciatura da UFABC, há?

Prof.ª Virgínia: Não, não há.

Marcelo: Eu posso afirmar que um egresso de uma licenciatura da UFABC começou a cursar essa licenciatura quando entrou em um dos bacharelados interdisciplinares?

Prof.ª Virgínia: A rigor sim, pois um aluno que está se formando em licenciatura começou a cursar quando? Quando ele ingressou aqui, pelo ENEM, mas eu só vou saber que este aluno existe como licenciando, lá no final do curso. Inclusive, pela própria estrutura montada pela Universidade, o aluno não precisa estar matriculado em um determinado curso para fazer disciplinas desse curso. Quando ele tiver uma quantidade grande de créditos, ele pode solicitar a matricula nesse curso, formalmente.

Marcelo: Então a rigor, a prática como componente curricular fica restrita ao se optar por iniciar a licenciatura, é isso?

Prof.ª Virgínia: Ele opta por cursar essas disciplinas. Nem todos que cursam essas disciplinas farão a licenciatura, alguns são das engenharias. Nós temos uma disciplina que é obrigatória para todas as licenciaturas, que é denominada Desenvolvimento e Aprendizagem, cuja ementa aborda a psicologia aplicada à educação, que trata de teorias pedagógicas. Eu não sei dizer o porquê, mais essa disciplina tem uma quantidade de matriculados muito grande. Tanto é que em cada quadrimestre nós oferecemos 50 vagas no período da manhã e mais 50 no período da noite e já tiveram quadrimestres que tivemos que abrir duas turmas no período da manhã e duas no período da noite para dar conta das solicitações dos alunos. Quer dizer, tem uma procura muito grande pelos alunos. Só que a maioria desses alunos não vai fazer licenciatura. Outra disciplina também muito procurada é Libras: tivemos, na primeira vez que ela foi oferecida, mais de 150 solicitações para cursá-la, em cada período – manhã e noite – e nosso problema é que só temos uma professora com certificação para lecionar Libras e, por esse motivo, não tivemos como atender a essa demanda. Muitos que fizeram essa disciplina não eram de cursos de licenciatura. Por outro lado, nas disciplinas obrigatórias de Matemática, para a licenciatura em Matemática, são poucas as procuras: em média dois ou três alunos por quadrimestre.

Marcelo: A respeito das disciplinas relacionadas à prática, a senhora gostaria de comentar mais alguma coisa?

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Prof.ª Virgínia: Acredito que não.

Marcelo: Sendo assim, agradeço mais uma vez pela entrevista.

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ANEXO B – Transcrição da entrevista realizada com um Professor do Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC

Dados do entrevistado:

Prof. Dr. Márcio Fabiano da Silva

Licenciado em Matemática pela Universidade de São Paulo, Mestre em Matemática

pela Universidade de São Paulo e Doutor em Matemática pela Universidade de São

Paulo. Desde fevereiro de 2009 trabalha como Professor Adjunto no Centro de

Matemática, Computação e Cognição da UFABC, em Santo André. Tem experiência

na área de Matemática, com ênfase em Geometria Diferencial, atuando

principalmente nos seguintes temas: problemas isoperimétricos, superfícies de

curvatura média constante, espaço hiperbólico e construção de superfícies mínimas.

(Currículo Lattes – adaptado)

Entrevista

Marcelo: Professor, conte um pouco sobre sua formação e trajetória até chegar à Universidade Federal do ABC.

Prof.º Márcio: Sou formado em Licenciatura em Matemática, pelo Instituto de Matemática e Estatística da USP, ingressei em 1996 e me formei em 1999. Durante a Licenciatura eu conheci alguns professores e me interessei em fazer iniciação científica na área de Geometria Diferencial. Tive uma bolsa da FAPESP durante o último ano da Licenciatura e, com isso, o meu caminho foi mudando um pouco em relação ao que eu imaginei quando ingressei no curso, que era ser professor e buscar formação e ferramentas que pudessem me ajudar em sala de aula. Na USP fui conhecendo alternativas, ainda para lecionar, mas com a possibilidade de fazer pesquisas, não na área de Educação, mas em Matemática Pura. Por causa da bolsa e como já estava muito envolvido com esse projeto, acabei tendo a bolsa de mestrado quase que automaticamente aprovada pela FAPESP e segui a pós-graduação, mestrado e doutorado na Matemática, em Geometria Diferencial. Quando estava terminando o doutorado, como tenho um vínculo grande com o interior de São Paulo e por causa da minha família, acabei decidindo por procurar emprego por lá. Consegui em uma universidade municipal, onde trabalhei por 2 anos, até que surgiu a possibilidade de conhecer a UFABC, que tinha sido implantada há pouco tempo: era um projeto inovador e eu tinha amigos que trabalhavam aqui e me convidaram para prestar o concurso. Prestei o concurso em Análise Numérica. Embora eu tenha sido um dos dois candidatos que foram até a última fase do concurso, fui reprovado, juntamente com o outro candidato, por não termos o perfil da área. Mas naquela ocasião fui convidado para me inscrever no processo de professor visitante, onde fui aprovado e ingressei na UFABC, em 2008. No final de 2008 teve um concurso para Geometria, onde prestei e fui aprovado, me tornando professor oficial da UFABC.

Marcelo: Na universidade municipal do interior de São Paulo o senhor lecionou em quais cursos?

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Prof.º Márcio: Lecionei nos cursos de Administração e Licenciatura em Matemática. No primeiro semestre eu tinha duas turmas na Administração e somente uma na Matemática. Depois a coordenadora conheceu um pouco mais do meu trabalho e peguei o turno completo, com todas as noites e sábados o dia todo, basicamente na Licenciatura. Inclusive fui coordenador de um projeto de especialização, que foi aprovado, mas naquele momento acabei me afastando para prestar o concurso da UFABC.

Marcelo: Na Educação Básica o senhor chegou a lecionar?

Prof.º Márcio: Não, oficialmente nunca. Eu sempre estudei em escola pública e a minha decisão pela licenciatura em Matemática e pela carreira de professor foi bem precoce. Aos 13 anos eu já sabia que queria ser professor de Matemática, mesmo sem entender muito qual seria o caminho para isso. E acho que isso estava um pouco relacionado, também, à minha personalidade e coisas que eu fazia na escola: desde a 7.ª série eu ajudava os professores nas atividades, ia para a escola nos horários complementares para estudar com os amigos, até chegar ao ponto de alguns professores, durante o colegial, pedirem para que eu desse aulas, para a minha turma, devido a minha postura autodidata. Isso ocorreu durante dois anos. Isso tudo, claro, nada profissional e sim com a postura de auxiliar as pessoas e a turma.

Marcelo: Na licenciatura que o senhor trabalhou no interior, quais as disciplinas que o senhor lecionou?

Prof.º Márcio: A coordenadora primeiro perguntava qual disciplina eu gostaria de escolher, dentre as que eram oferecidas, e com a minha formação em Geometria eu sempre optava por disciplinas dessa área. Mas como a grade da Geometria não era tão grande, eu acabava também pegando outras disciplinas de formação básica. Já lecionei Cálculo I, Cálculo II, Cálculo III e Cálculo IV, Variáveis Complexas, que também tem muita ligação com a Geometria. Existia um curso oferecido para o último ano, de atividades complementares, mas com a ideia de perceber o que estava faltando para aquelas pessoas, futuros professores, identificando temas que seriam importantes para a formação e que ainda não haviam sido muito bem trabalhados. A ementa era decidida logo na primeira semana, fazendo avaliação diagnóstica e conversando com os alunos.

Marcelo: Nessa época, o senhor chegou a trabalhar com práticas de ensino? As disciplinas que o senhor lecionava estavam associadas à prática, no geral?

Prof.º Márcio: Existia uma orientação nos cursos de licenciatura, que vem do MEC, de que deve-se incluir a prática como sendo componente pedagógico, mesmo nas disciplinas básicas. Então, embora eu não tenha sido professor de prática de ensino, eu conversava com os professores do curso e nós trazíamos isso para as disciplinas. Por exemplo, nas disciplinas de Cálculo, nós buscávamos dar a oportunidade para os alunos discutirem, em sala, os problemas ligados a atuação profissional do professor - não era a típica aula de cálculo. Em grande parte do tempo tínhamos a ementa para cumprir, mas, em alguns momentos, em algumas aulas, tínhamos essa possibilidade, de os alunos resolverem exercícios, de proporem soluções, de discutirem dificuldades que poderiam existir com os seus alunos, e fazer a ligação com alguns outros temas mais básicos. Então, de fato, a prática sempre aparecia nas disciplinas que eu fui professor, mas como um componente pedagógico. Essa era a orientação que tínhamos e eu procurava seguir.

Marcelo: Na UFABC, quais as disciplinas que o senhor leciona e em quais cursos?

Prof.º Márcio: Atualmente, na graduação, temos a obrigação de estar vinculado a um dos dois bacharelados interdisciplinares, que são o Bacharelado em Ciência e Tecnologia e o Bacharelado em Ciências e Humanidades, e nos cursos específicos, podemos nos credenciar em até dois cursos. Eu estou credenciado no Bacharelado em Ciência e Tecnologia, no Bacharelado em Matemática e na Licenciatura em Matemática, isso para a graduação. Na pós-graduação, sou vinculado como docente permanente no curso de Matemática e no Mestrado Profissional em Matemática. A ideia da UFABC, considerando

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seu projeto pedagógico, é que possamos atuar em uma quantidade maior de disciplinas, abranger o conhecimento e tentar abrir o leque e não ficarmos presos a uma subárea. Sou da área de Matemática, mas não fico só com a Geometria. Então nas disciplinas básicas, quase todos nós acabamos atuando: eu já lecionei Funções de Uma Variável, Funções de Várias Variáveis, Cálculo Vetorial e Tensorial, Álgebra Linear, Geometria Analítica. Na Licenciatura, eu tenho sido a pessoa que tem atuado mais com a Geometria, até pela dificuldade: não temos muitos geômetras aqui. De certa forma, tenho conduzido, há quase 3 anos, as disciplinas de Geometria da Licenciatura. No Bacharelado, sou professor de Geometria Diferencial.

Marcelo: As disciplinas de Geometria da Licenciatura têm alguma similaridade com a Geometria que o senhor leciona no Bacharelado ou são totalmente diferentes?

Prof.º Márcio: Especificamente as disciplinas de Geometria do Bacharelado e da Licenciatura são distintas. Por exemplo, a Geometria Plana é uma disciplina oferecida para a Licenciatura e não para o Bacharelado. Claro que o aluno do Bacharelado tem a possibilidade de fazê-la, como uma disciplina optativa, mas ela não consta no currículo do Bacharelado, justamente pela proposta que a disciplina tem. O Bacharelado está buscando, na área de Geometria, aqueles temas que ainda são atuais e são os principais para quem quer se tornar um pesquisador. Então para a área de Geometria, a formação tem que vir basicamente da Geometria Diferencial. A Licenciatura tem a formação para fundamentos ou para construções, já no sentido de trabalhar a Geometria para a formação do professor. Eu tenho essa preocupação ao preparar as aulas: penso nessa necessidade do professor. Então elas são distintas do Bacharelado, não somente na metodologia de trabalho.

Marcelo: O senhor tocou no assunto da metodologia. Atuando, tanto no Bacharelado quanto na Licenciatura, existe, nessa atuação em sala de aula, metodologias ou estratégias diferenciadas para ambos os cursos?

Prof.º Márcio: Devido à formação em licenciatura que tenho, acho que acabo, talvez, pecando no Bacharelado, porque a preocupação com a formação, e mais do que isso, da relação dos temas presentes e que são comuns no ensino universitário com os temas do Ensino Médio, eu acabo levando, também, para o Bacharelado. Acho que isso é uma preocupação que deve haver para o professor que trabalha com as licenciaturas. Então acho que na Licenciatura eu tenho essa atuação e preocupação, só que acabo levando essa metodologia também para os bacharelados. Até porque na UFABC, por exemplo, neste quadrimestre, estou dando o curso de Geometria Plana e Construções Geométricas para 10 alunos e, desses 10 alunos, apenas um é da Licenciatura. Pelo projeto da UFABC, e pelas possibilidades que o aluno tem, acabamos não conseguindo separar isso: estou dando aula em um curso de Licenciatura e tenho ali pessoas que não são da Licenciatura, mas que têm um interesse pelo tema ou até pelo curso. Então minha preocupação é no sentido de olhar para a proposta do curso e quais são os seus objetivos e tentar seguir isso, chamando a atenção, não só para os problemas que deveriam ser do professor, mas também de forma a poder agregar o conhecimento de outras áreas e fazer com que as pessoas se interessem, de alguma forma, por aquilo que leciono. De certa forma, você perde essa noção de que está especificamente num curso de Licenciatura, embora seja da Licenciatura e isso tem que ser levado em consideração: o público acaba sendo muito diferenciado.

Marcelo: Então aquela prática que o senhor tinha na universidade do interior, o senhor a trouxe, um pouco, para a UFABC, mais pela sua formação, é isso?

Prof.º Márcio: Acho que o que foi decisivo para isso é realmente a minha formação, que na verdade foi aperfeiçoada no curso de Licenciatura da USP. Mas, de certa forma, está muito ligada à minha personalidade e aos meus ideais. Essa formação foi muito importante, e acho que ela é que dá essa direção, essa consolidação. Acho que isso vem muito do que eu já praticava, antes de entrar na USP.

Marcelo: Ainda relacionado a essa preocupação com a formação, o senhor trabalha com questões atuais do ensino, como por exemplo, tenta fazer relação entre a

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Geometria do Ensino Superior com a Geometria que, provavelmente, o aluno ensinará na Educação Básica?

Prof.º Márcio: A todo momento isso acontece, e não só nos cursos da Licenciatura. Sempre procuro resgatar a formação que o aluno tem: isso é muito importante, é um elemento que eu levo em consideração nos meus cursos. Então, acho que nos primeiros contatos, das primeiras aulas, é importante nesse sentido: de saber como aquilo foi trabalhado. E eu tenho, também, acompanhado os currículos do ensino básico. Sempre que possível, eu olho para isso, até porque tenho sobrinhos que estão estudando, então eu acompanho. Mas eu sempre começo, quando vou tratar de sistemas, por exemplo, chamando atenção sobre como isso, em geral, é ensinado, como isso é feito lá no Ensino Básico, e qual a proposta que temos para aquele momento. Para o curso de Geometria Plana, a gente segue a teoria axiomática de toda a Geometria e, naquele primeiro momento de contato com os alunos, o importante é que eles esqueçam tudo o que sabem sobre aquilo, pois vamos construir essa teoria. E quando os elementos começam a surgir, ângulo, quadrado, enfim, é o momento de refletir como isso apareceu para eles, como foi ensinado, e como é ensinado no Ensino Básico, para que eles façam as relações e depois possam levar isso, também, como professores para a escola. Isso eu faço, também, por exemplo, no curso de Bases Matemáticas, que tem uma proposta de trabalhar com conteúdos básicos, como função. Quando eu trato de função inversa – na escola, em geral, o que é feito com função inversa é uma técnica que te ensina a inverter função, mas a escola básica peca nesse sentido, de não abordar os conceitos, e para mim nós aprendemos com os conceitos; a técnica é importante, mas o que fica são os conceitos e isso tem que ser bem trabalhado – então, quando eu vou ensinar função, a técnica vai aparecer, mas a pergunta é: qual é o conceito disso e como isso apareceu para você? O que é função? Então, ao fazer a função inversa, tem-se a definição daquilo e mostro porque a técnica funciona, e às vezes isso não é feito na escola. Acho que esse é um grande erro, as coisas valem, mas não sabemos por quê. E aqui é o momento de aproveitar a técnica e, com o conceito, mostrar o porquê que isso funciona. Isso aparece em qualquer curso que eu dou.

Marcelo: Quando o senhor assumiu as disciplinas na UFABC, especificamente na Licenciatura, os programas ou ementas já existiam ou foram construídos pelo senhor? Como ocorreu a construção desses programas: houve uma integração entre os matemáticos e educadores matemáticos?

Prof.º Márcio: Na verdade, o curso de Licenciatura foi aprovado depois que eu já era professor aqui na UFABC. Então existia uma proposta, mas o reconhecimento veio a posteriori. Acho que isso é uma prática comum, começa-se a implementar o curso, tem-se uma estrutura, e depois pede-se autorização e reconhecimento. Mas eu estive presente nessa estruturação da Licenciatura, tentando contribuir pessoalmente para as disciplinas que estavam mais vinculadas à minha área. Então, em certo momento, teve sim uma chamada, por parte da coordenação da Licenciatura, para podermos discutir. E esse é um processo que continua: hoje, a Licenciatura está reconhecida com um conceito máximo, mas nesse momento estamos discutindo, dessa primeira etapa, o que ainda é possível melhorar e onde é que devemos interferir. Eu faço parte de um grupo de trabalho e, nesse momento, estou reformulando e revisando as ementas dos cursos de Geometria, na Licenciatura. Estamos fazendo uma revisão do Projeto Pedagógico da Licenciatura, mais especificamente das disciplinas, propondo reformulações. A Licenciatura não traz, por exemplo, a Geometria Espacial nos conteúdos, e eu acho que a presença dela é essencial para trabalhar alguns conceitos que são fundamentais para o professor: o volume, as técnicas para se calcular volumes, e outros. Então, nesse momento, estamos discutindo isso.

Marcelo: No curso de Licenciatura existem algumas disciplinas que são chamadas de Práticas. Existe alguma “conversa” entre as disciplinas que o senhor leciona na Licenciatura e essas disciplinas de Prática, ou seja, as disciplinas se inter-relacionam?

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Prof.º Márcio: Isso depende de quem trabalha a disciplina de Prática. Conheço uma professora que trabalha com essa disciplina e que em alguns momentos do curso convida alguns colegas, para participarem, apresentarem temas para os alunos, e mais do que isso, para assistir às apresentações dos trabalhos que os alunos estão produzindo. Então sim, existe essa prática, de alguns professores de Prática aqui da universidade.

Marcelo: Falando um pouco dos alunos, o senhor consegue identificar características diferentes entre um aluno de Licenciatura e um aluno de Bacharelado? Os alunos demonstram características diferenciadas?

Prof.º Márcio: Na verdade, vou falar por aqueles alunos que eu já conhecia, que eles já declararam-se da Licenciatura e já estavam matriculados. Então, fui o professor também de alguns desses alunos e eu percebia, na verdade, que eles tinham sim um diferencial e que vinha pela formação pedagógica. Mesmo durante os cursos, quando você tem um aluno e sabe que ele já fez a opção pela Licenciatura, você consegue sim diferencia-lo, porque ele tem outros elementos que traz para a sala de aula. E pelos questionamentos que fazem, você percebe esse diferencial do licenciando, de uma pessoa que já está fazendo disciplinas da Licenciatura, inclusive as pedagógicas. Nesse sentido existem [características diferenciadas]. Agora, se você olhar do ponto de vista conteudista, de resultados obtidos, por exemplo, é mais difícil perceber diferenças: pelos resultados não dá para perceber se um aluno é ou não da Licenciatura; mas pelos questionamentos que são feitos, sim, você consegue diferenciar o perfil – questionamentos pedagógicos, questionamentos de preocupação sobre o que vai ser abordado no curso, enfim.

Marcelo: Com relação à formação que trazem da Educação Básica, daria para identificar esse perfil diferenciado do licenciando?

Prof.º Márcio: Por causa da proposta de formação da UFABC, não dá para identificar, pois os alunos, antes de se matricularem na Licenciatura, fazem o Bacharelado em Ciência e Tecnologia. Assim, somente os que concluíram grande parte do primeiro curso chegam à Licenciatura ou ao Bacharelado em Matemática e, por sinal, são alunos muito bons, que conseguem acompanhar os cursos. Logo, não há como identificar se esses alunos tinham ou não defasagens na formação da educação básica. Para se ter essa informação, seria necessário, logo no início, quando o aluno entra na UFABC, se fazer uma pesquisa sobre a intenção de curso e uma avaliação diagnóstica para conhecer a formação dos alunos. E como isso não é feito, é difícil dar uma resposta a essa pergunta.

Marcelo: Então o Bacharelado em Ciência e Tecnologia acaba sendo uma formação básica para que os alunos tenham possibilidade de estudar em qualquer curso da UFABC, é isso?

Prof.º Márcio: Exatamente. Até pelas possibilidades que o aluno tem, ele pode optar por qualquer engenharia, ou por qualquer outro curso: pode escolher Matemática, pode escolher Biologia, e outros. Nesse momento, dadas as condições de mercado e todas as informações que temos sobre a valorização do professor, quando chega o momento e se opta por um curso como a licenciatura, realmente esse aluno é uma pessoa que tem interesse na área da educação. A minha experiência tem me revelado que esses alunos são muito bons, têm se desenvolvido muito bem e conseguido alcançar resultados muito bons. Por exemplo, se considerarmos o ENADE como instrumento – podemos até fazer críticas a ele, mas é o instrumento que temos –, os alunos foram muito bem nessa avaliação, tiveram resultados muito bons, e em todos os cursos, não somente as licenciaturas.

Marcelo: Aproveitando o encaminhamento que foi dado na resposta anterior, eu pediria que o senhor comentasse sobre a proposta da UFABC, em que primeiro o aluno cursa um bacharelado interdisciplinar e depois um curso de formação profissional.

Prof.º Márcio: Dado ao histórico de como evoluiu a formação de professores, da revolução que foi feita para se pensar em como dissociar as licenciaturas dos bacharelados, questões

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que foram muito discutidas durante minha graduação na USP – eu cursei na USP em um momento em que as disciplinas da Licenciatura não eram mais compartilhadas com as do Bacharelado e as disciplinas pedagógicas eram feitas na Educação, juntando-se todos os cursos –, de fato, quando eu ingressei na UFABC, que tem uma proposta diferente, em que o aluno ingressa em um bacharelado, não de Matemática, mas em Ciências e Tecnologia e depois faz uma opção por uma licenciatura, eu acabei me encantando pela proposta. O ideal é que se tenha um professor de Matemática que consiga lidar com problemas de Química, de Física e de Biologia, e que de alguma forma possa levar isso para a sala de aula, e principalmente possa conversar com as pessoas quando se decide fazer um projeto interdisciplinar. Eu acho que uma pessoa que tenha formação na sua área, mas que também tenha uma visão geral, que consiga olhar as coisas com uma visão mais abrangente, seja desejável pela sociedade moderna. Então temos atuado nesse sentido: de discutir problemas das outras áreas e discutir com colegas aqui de dentro da universidade, pois dentro de um mesmo centro, temos pessoas da Matemática, da Computação e da Cognição. Temos psicólogos, com formação também diferenciada, que podem dar aulas nos cursos de computação, em programação, enfim, o perfil do professor daqui também já é mais abrangente. Então eu sou favorável ao projeto: acho que é muito bem vinda essa formação inicial. Mesmo que o aluno entre aqui querendo ser professor de Matemática, acho que é muito proveitoso que conheça outras áreas e os problemas que existem. Muitas disciplinas partem da crítica do contínuo, mas existem outras disciplinas que abordam os problemas sociais, algumas delas obrigatórias, e entendo que isso contribua bastante para a formação do professor. Mas a realidade tem mostrado que não acontece bem assim. Nossos alunos vêm de um modelo – claro que diferente daquele modelo em que tive da escola pública, que foi até 1995 – em que as questões de interdisciplinaridade surgem com mais força na escola, mas quando o aluno entra aqui, no bacharelado interdisciplinar, ele já tem sim uma intenção de curso e compete a nós, professores, mostrar que ele tem outras possibilidades e que ele pode fazer mais de um curso. Como já disse, sou favorável ao projeto, acho que ele é fantástico, mas penso que, na prática, é muito difícil de ser executado, pois acabamos vivenciando alguns problemas como, por exemplo, os docentes serem, de certa forma, protetores da sua área, ou seja, a pessoa que vai lecionar Matemática quer ensiná-la como se todos os alunos estivessem em um Bacharelado ou Licenciatura em Matemática; o físico tem essa mesma postura: todos têm que ser físicos; o biólogo também; então acabamos exagerando, eu falo por mim e também por muitos colegas. Acabamos trazendo uma força para nossa disciplina e sobrecarregando o aluno de informações, de conteúdos, de avaliações. E a universidade tem mostrado que os alunos não têm conseguido se desenvolver naquele espaço de tempo que é considerado ideal, por exemplo, no curso do BC&T, se formar em três anos – pouquíssimos alunos tem conseguido isso. Como esse projeto é inovador e a universidade ainda é jovem, eu acredito e trabalho no sentido de contribuir para discutirmos o Projeto Pedagógico, de aperfeiçoá-lo, de modo a cumprir o propósito de formação. Acredito sim que a UFABC tem um projeto diferenciado e que tende muito a contribuir na formação dos seus egressos.

Marcelo: Professor, além do que conversamos o senhor gostaria de acrescentar algo?

Prof.º Márcio: Não, acredito que nossa conversa abrangeu meu trabalho aqui na UFABC e como eu tenho atuado no curso de Licenciatura em Matemática. E estou à disposição para esclarecer outras dúvidas que possam surgir.

Marcelo: Há algum problema se eu publicar essa entrevista com o seu nome?

Prof.º Márcio: Não há problema algum.

Marcelo: Eu agradeço pela entrevista.

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ANEXO C – Parecer Consubstanciado do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Bandeirante de São Paulo

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APÊNDICE I – Análise das ementas para a elaboração do Quadro 12

Critério para a análise

Com base na análise das ementas, responder à seguinte pergunta:

Os assuntos relacionados podem contribuir para que futuros professores de

Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e

Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)?

Se a resposta for NÃO, associar a disciplina à categoria de outros conhecimentos.

Caso contrário, associar a disciplina às seguintes categorias:

Domínios dos conhecimentos definidos por Ball, Thames e Phelps (2007,

2008), com base no quadro:

Conhecimentos matemáticos utilizados não somente em contextos de ensino I

Conhecimentos matemáticos utilizados especialmente para o ensino II

Conhecimentos matemáticos e as relações entre os assuntos estudados nos diferentes anos III

Conhecimentos que articulam saberes dos alunos e conteúdos matemáticos IV

Conhecimentos sobre saberes do ensino de conteúdos matemáticos V

Conhecimentos sobre currículos elaborados para o ensino de Matemática VI

I: Conhecimento comum do conteúdo, segundo Ball, Thames e Phelps. II: Conhecimento especializado do conteúdo, segundo Ball, Thames e Phelps. III: Conhecimento horizontal do conteúdo, segundo Ball, Thames e Phelps. IV: Conhecimento de conteúdo e de alunos, segundo Ball, Thames e Phelps. V: Conhecimento de conteúdo e de ensino, segundo Ball, Thames e Phelps. VI: Conhecimento de conteúdo e de currículo, segundo Ball, Thames e Phelps.

Identificação dos conhecimentos nas ementas:

I: Conhecimento comum do conteúdo. Obs. A ocorrência de I, implica a ocorrência de II

II: Conhecimento especializado do conteúdo.

III: Conhecimento horizontal do conteúdo.

IV: Conhecimento de conteúdo e de alunos.

V: Conhecimento de conteúdo e de ensino.

VI: Conhecimento de conteúdo e de currículo.

Categorias de conhecimentos definidas por Shulman (1987), quais sejam:

o Conhecimento do conteúdo;

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o Conhecimento pedagógico geral, com especial referência aos princípios e estratégias de gerenciamento e organização de sala de aula;

o Conhecimento do currículo, com compreensão especial dos materiais e programas que servem como "ferramentas de trabalho" para professores;

o Conhecimento pedagógico do conteúdo, o amálgama especial do conteúdo e da pedagogia e que está exclusivamente relacionado à area dos professores – a sua própria forma especial de compreensão profissional;

o Conhecimento de estudantes e as suas características; o Conhecimento de contextos educacionais, que vão desde o funcionamento da

instituição ou da sala de aula, a governança e o financiamento dos distritos escolares, para o caráter das comunidades e culturas;

o Conhecimento dos fins educacionais, propósitos e valores, e suas bases filosóficas e históricas

Categoria de outros conhecimentos.

Análise das ementas

Base Experimental das Ciências Naturais (0-3-2)

Recomendação: Não há.

Ementa: O método experimental; Química, Física e Biologia experimentais. Experimentos

selecionados.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? NÃO

Bases Computacionais da Ciência (0-2-2)

Recomendação: Não há.

Ementa: Conceitos básicos da computação e a sua relação com a ciência. Modelagem e simulações

por computador, através da integração com as disciplinas de Base Experimental das Ciências

Naturais e Matemática Básica.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? NÃO

Bases Matemáticas (4-0-5)

Recomendação: Não há.

Ementa: Matrizes e Sistemas Lineares. Conceitos Elementares de Probabilidade. Funções: Definição

e propriedades. Polinômios, Funções Racionais, Funções Trigonométricas, Exponencial e Logaritmo.

Introdução ao Conceito de Limite e Derivada. Técnicas e Exemplos de Derivação.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? ALGUNS – I, II

Estrutura da Matéria (3-0-4)

Recomendação: Não há.

Ementa: Macro ao micro (estruturas). Micro ao macro (interações). Teoria Atômica. Modelo de Dalton/

Gay-Lussac. Princípios de conservação de massa e volume. Constante de Avogadro. Loschmidt.

Faraday. Tabela Periódica (Mendeleev). Corpo Negro/Efeito fotoelétrico. Movimento Browniano.

Millikan. Radiações (Röntgen, Becquerel, Curie, Rutherford). Energia relativística. Espectros atômicos

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(Fraunhoffer a Bohr). Propriedades Ondulatórias: Reflexão, Difração e Interferência e Natureza

ondulatória da matéria. Princípio da Incerteza.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? NÃO

Origem da Vida e Diversidade dos Seres Vivos (3-0-4)

Recomendação: Não há.

Ementa: Teorias sobre origem da vida. História do pensamento evolutivo. Taxonomia e filogenia.

Adaptação ao meio e seleção natural. Origem de procariotos e eucariotos. Diversificação dos

organismos vivos. Noções de desenvolvimento embrionário e diferenciação celular. Níveis de

organização dos seres vivos. Organismos e ecossistemas. Biodiversidade e economia.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? NÃO

Fenômenos Mecânicos (3-2-6)

Recomendação: Não há.

Ementa: Leis e grandezas físicas. Noções de cálculo diferencial e integral. Movimento de uma

partícula. Noções de geometria vetorial. Força e inércia. Leis da dinâmica. Trabalho e energia

mecânica. Momento linear. Colisões.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? NÃO

Funções de Uma Variável (4-0-6)

Recomendação: Bases Matemáticas.

Ementa: Limites. Definições. Propriedades. Sequencia e Séries. Limites de sequencia e séries.

Definição do limite via sequencia e séries. Continuidade. Derivadas. Definição. Interpretações

geométrica, mecânica, biológica, econômica, etc. Regras de derivação. Derivadas de funções

elementares. Derivadas de ordem superior. Diferencial da função de uma variável. Aplicações de

derivadas. Fórmula de Taylor. Máximos e mínimos, absolutos e relativos. Análise do comportamento

de funções através de derivadas. Regra de LHôpital. Crescimento, decrescimento e concavidade.

Construções de gráficos. Integral indefinida. Interpretação geométrica. Propriedades. Regras e

métodos de integração. Integral definida. Teorema fundamental do cálculo. Aplicações da integral

definida. Técnicas de Primitivação: Técnicas Elementares. Integração por partes. Mudança de

variáveis e substituição trigonométricas. Integração de funções racionais por frações parciais.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? ALGUNS – II

Geometria Analítica (3-0-6)

Recomendação: Não há.

Ementa: Vetores, Coordenadas, Retas, Planos, Circunferência, Cônicas e Quádricas.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? ALGUNS – I, II

Natureza da Informação (3-0-4)

Recomendação: Bases Computacionais da Ciência.

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Ementa: Dado, informação e codificação. Teorias da Informação. Entropia. Sistemas de Numeração.

Representação analógica e digital. Armazenamento da informação, Noções de semiótica. Introdução

às ciências cognitivas. Informações Biológicas.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? NÃO

Transformações nos Seres Vivos e Ambiente (3-0-4)

Recomendação: Não há.

Ementa: Introdução. Meio físico e biomas. Energia e ciclos biogeoquímicos. Adaptação em ambientes

variantes. Ciclos de vida, sexo e evolução. Comportamento social. Estrutura de populações. Modelos

de crescimento e dinâmica populacional. Predação, competição e modelos matemáticos. Coevolução

e mutualismo. ComEixo s. Sucessão ecológica. Biodiversidade, conservação e sustentabilidade.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? NÃO

Bases Epistemológicas da Ciência Moderna (3-0-4)

Recomendação: Não há.

Ementa: Conhecimento científico e tecnológico. Metodologia, racionalidade e avaliação de teorias.

Valores e ética na prática científica. Eixos epistêmicos e formas de pensamento. Epistemologia da

experimentação, observação e simulação.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? NÃO

Fenômenos Térmicos (3-1-4)

Recomendação: Não há.

Ementa: Temperatura, calor e primeira lei da Termodinâmica; Teoria cinética dos gases; Entropia e

segunda lei da Termodinâmica.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? NÃO

Introdução às Equações Diferenciais Ordinárias (4-0-4)

Recomendação: Funções de uma Variável.

Ementa: Introdução às equações diferenciais. Noções básicas e terminologia. Modelos matemáticos.

Equações diferenciais de primeira ordem: introdução. Separação de variáveis. Equações

homogêneas. Equações lineares. Equação de Bernoulli. Equações diferenciais lineares de ordem

superior e sistemas lineares. Equações lineares homogêneas com coeficientes constantes. Método

dos coeficientes indeterminados. Aplicação de equações diferenciais de segunda ordem: modelos

mecânicos e elétricos: oscilações, ressonância, movimento ondulatório, princípio de superposição.

Modelos compartimentais. Aplicações: dinâmica populacional, sistemas de interação entre espécies e

modelos de epidemiologia.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? NÃO

Processamento da Informação (3-2-5)

Recomendação: Bases Computacionais da Ciência; Natureza da Informação.

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Ementa: Noções de organização de computadores. Lógica de programação, algoritmos e

programação (teoria e prática): sequenciamento de operações, decisões e repetições, modularização

e abstração de dados. Processamento de vetores e matrizes.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? NÃO

Transformações Químicas (3-2-6)

Recomendação: Não há.

Ementa: Interações e estados da matéria. Transformações químicas. Aspectos cinéticos das

transformações químicas. Equilíbrio químico.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? NÃO

Comunicação e Redes (3-0-4)

Recomendação: Natureza da Informação; Processamento da Informação.

Ementa: Teorias da Comunicação. Capacidade de canal. Transmissão, Propagação; Ruído. Redes

com fio e sem fio; fibras ópticas (reflexão e refração da luz). Funcionamento da Internet. Meios de

comunicação e difusão de informação. Redes Sociais.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? NÃO

Fenômenos Eletromagnéticos (3-2-6)

Recomendação: Não há.

Ementa: Carga elétrica; lei de Coulomb; campo elétrico; lei de Gauss para o campo elétrico; potencial

elétrico; capacitância; corrente elétrica e resistência elétrica; circuitos elétricos; campo magnético;

campo magnético devido a corrente elétrica (lei de Biot-Savart); lei de Ampère, lei de Gauss para o

campo magnético; lei de Faraday (indução e indutância); corrente de deslocamento, Lei de Ampère-

Maxwell e equações de Maxwell na forma integral.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? NÃO

Funções de Várias Variáveis (4-0-4)

Recomendação: Geometria Analítica; Funções de uma Variável.

Ementa: Convergência e continuidade. Derivadas Parciais. Derivada direcional. Regra da Cadeia.

Gradiente. Máximos e mínimos. Fórmula de Taylor. Noções de integrais múltiplas. Integrais de linha.

Teorema da divergência. Teorema de Stokes.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? NÃO

Transformações Bioquímicas (3-2-6)

Recomendação: Não há.

Ementa: Introdução ao universo das transformações da matéria que ocorrem em sistemas biológicos

a fim de desenvolver uma visão crítica da estreita relação estrutura/propriedades/funções das

biomoléculas nos seus mais diversos níveis e correlacionar processos bioquímicos com as

características macroscópicas dos seres vivos, bem como suas implicações nos diversos ramos do

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conhecimento científico e tecnológico.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? NÃO

Educação Científica, Sociedade e Cultura (4-0-4)

Recomendação: Não há.

Ementa: Possibilidades de atuação do educador (licenciado) e da educação científica na sociedade

atual. Percepção pública da ciência e tecnologia. Divulgação científica. Alfabetização científica:

articulações com a cultura e a construção da cidadania. Globalização e cultura científica. Conexões

entre arte e ciências. A Ciência na sociedade e na cultura: espaços formais e informais de educação

científica.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? NÃO

Introdução à Probabilidade e à Estatística (3-0-4)

Recomendação: Funções de uma variável.

Ementa: Introdução à Estatística. Estatística descritiva. Probabilidade. Variável aleatória discreta e

contínua: binomial, Poisson, normal e exponencial. Teorema do limite central e intervalos de

confiança.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? ALGUNS – I, II

Energia: Origens, Conversão e Uso (2-0-4)

Recomendação: Não há.

Ementa: Parte I – Origem: Introdução à estrutura da matéria; Conservação de massa em reações

físicas e químicas; Recursos Energéticos primários. Parte II – Conversão: Interação de reação com a

matéria; Conversão de calor em energia mecânica; Conversão de energia potencial gravitacional e

cinética de um escoamento em energia mecânica; Conversão de energia mecânica em energia

elétrica; Introdução às usinas de potência; Motores a combustão interna; Armazenamento de energia;

Eficiência energética. Parte III – Uso da Energia: Transporte de Energia; Uso final de energia; Matriz

energética.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? NÃO

Física Quântica (3-0-4)

Recomendação: Não há.

Ementa: Bases experimentais da Mecânica Quântica. Quantização. Modelo de Bohr e átomo de

hidrogênio. Equação de Schrodinger: função de onda, potenciais simples. Equação de autovalores

para potenciais simples. Tunelamento. Relação de incerteza. Átomos. Momento Angular. Números

quânticos. Energia de ionização e Spin. Dipolos magnéticos. Tabela Periódica. Lasers.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? NÃO

Políticas Educacionais (3-0-3)

Recomendação: Não há.

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Ementa: A Educação escolar brasileira no contexto das transformações da sociedade. Análise das

políticas educacionais e dos planos e diretrizes para a Educação Básica. Estrutura e organização do

sistema de ensino brasileiro. Políticas educacionais e legislação de ensino: LDB, DCNs, PCNs.

Avaliação na educação básica e os instrumentos oficiais: SAEB e ENEM.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? SIM – conhecimento de contextos educacionais e conhecimento dos fins educacionais (Shulman)

Matemática Discreta (4-0-4)

Recomendação: Funções de Uma Variável.

Ementa: Teoria Intuitiva dos Conjuntos. Operações com Conjuntos. Álgebra de Conjuntos. Relações.

Relações de Equivalência. Relações de Ordem. Funções. Coleções de Conjuntos. Conjuntos

Numéricos. Cardinalidade. Técnicas de Demonstração: Prova Direta. Prova por Contradição. Indução

Finita. Introdução à Análise Combinatória. Princípio multiplicativo. Princípio aditivo. Permutação,

arranjo, combinação. Princípio de inclusão e exclusão. O princípio da casa dos pombos. Funções

geradoras. Partição de um inteiro. Relações de recorrência.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? ALGUNS – I, II

Interações Atômicas e Moleculares (3-0-4)

Recomendação: Estrutura da Matéria; Transformações Químicas; Física Quântica.

Ementa: A disciplina trata do estudo das propriedades dos átomos, moléculas, e estados

condensados da matéria através do entendimento das ligações químicas que formam os líquidos e os

sólidos e as consequências dessas nas propriedades dos materiais. Os principais tópicos abordados

são: Estrutura de átomos e moléculas (abordagem mecânico-quântica), Princípios de ligações

químicas (abordagem mecânico-quântica), Gases reais, Líquidos e Sólidos Moleculares.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? NÃO

Desenvolvimento e Aprendizagem (4-0-4)

Recomendação: Não há.

Ementa: Estudo das teorias psicológicas do desenvolvimento humano e da aprendizagem em Piaget,

Vygotski e Wallon. Aprendizagem e subjetividade. Psicologia do desenvolvimento e relações com a

prática educativa: discussão de problemas de aprendizagem. Consequências para a legislação

educativa.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? SIM – conhecimento de estudantes e suas características (Shulman)

Geometria Plana e Construções Geométricas (4-0-4)

Recomendação: Não há.

Ementa: Axiomática da Geometria Euclidiana. Congruência de Triângulos. Desigualdades

Geométricas. O postulado das Paralelas. Semelhança de Triângulos. Circunferências. Áreas.

Construções Geométricas. Lugares Geométricos. Isometrias. Homotetias.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática

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apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? SIM – I, II (considerar também V, em decorrência de uma das entrevistas)

Álgebra Linear (6-0-5)

Recomendação: Geometria Analítica.

Ementa: Sistemas de Equações Lineares: Sistemas e matrizes; Matrizes escalonadas; Sistemas

homogêneos; Posto e Nulidade de uma matriz. Espaço Vetorial: Definição e exemplos; Subespaços

vetoriais; Combinação linear; Dependência e independência linear; Base de um espaço vetorial e

mudança de base. Transformações Lineares: Definição de transformação linear e exemplos; Núcleo e

imagem de uma transformação linear; Transformações lineares e matrizes; Matriz mudança de base.

Autovalores e Autovetores: Polinômio característico; Base de autovetores; Diagonalização de

operadores.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? ALGUNS – I e II

Estrutura e Dinâmica Social (3-0-4)

Recomendação: Não há.

Ementa: Estrutura social e relações sociais; Dinâmica cultural, diversidade e religião; Estado,

Democracia e Cidadania; Dimensão econômica da sociedade; Desigualdade e realidade social

brasileira.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? NÃO

Didática (4-0-4)

Recomendação: Não há.

Ementa: Teorias de ensino e aprendizagem. Abordagens da relação mediadora entre professor, aluno

e o conhecimento. Formação do professor reflexivo. Organização do trabalho pedagógico na escola.

Projeto pedagógico e planejamento de ensino. Natureza do trabalho docente e profissionalização do

professor. Interdisciplinaridade e educação. Recursos e modalidades didáticas. Questões críticas do

ensino: indisciplina, drogas, diversidade. Avaliação da Aprendizagem.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? SIM – conhecimento pedagógico geral (Shulman)

Teoria Aritmética dos Números (4-0-4)

Recomendação: Matemática Discreta.

Ementa: Axiomas de Peano. Indução Matemática. Construção do Conjunto dos Inteiros.

Divisibilidade. Números Primos. Equações Diofantinas. Relação de Congruência. Construção do

Conjunto dos Números Racionais.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? SIM – I, II

Ciência, Tecnologia e Sociedade (3-0-4)

Recomendação: Não há.

Ementa: Evolução bio-cultural do ser humano: técnicas e tecnologias como dimensões da

humanidade. Metodologia, racionalidade e relativismo. Ciência, tecnologia e inovação como fato

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social. Indivíduo, Estado e sociedade. Política científica e tecnológica. Valores e ética na prática

científica. Controvérsias científicas.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? NÃO

Práticas de Ensino de Ciências e Matemática no Ensino Fundamental (4-0-4)

Recomendação: Não há.

Ementa: Concepções de um bom professor de Ciências e Matemática. Tendências do ensino de

Ciências Naturais e Matemática em diferentes momentos históricos no Brasil e no mundo. Aspectos

teórico-práticos sobre a construção do conhecimento na escola. Propostas curriculares de Ciências e

Matemática no ensino fundamental. Transposição didática. Novas tecnologias e ensino de ciências e

matemática. O livro didático de ciências e matemática: história, pesquisa e referenciais do PNLD.

Identificação e análise de projetos pedagógicos e planos de ensino desenvolvidos na rede municipal,

estadual e particular no ensino fundamental II nas áreas de Ciências e Matemática.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? SIM – IV, V, VI, conhecimento pedagógico geral (Shulman)

Cálculo Numérico (3-1-4)

Recomendação: Funções de Uma Variável.

Ementa: Aritmética de ponto flutuante: Erros absolutos e relativos; Arredondamento e truncamento.

Zeros de Funções Reais: Métodos de quebra – bisseção / falsa posição; Métodos de ponto fixo –

iterativo linear / Newton-Raphson; Métodos de Múltiplos passos – secantes. Resolução de Sistemas

de Equações Lineares: Métodos diretos – Cramer / eliminação de Gauss, decomposição A = LU;

Métodos iterativos – Jacobi /Gauss-Seidel. Ajustamento de Curvas pelo Método dos Mínimos

Quadrados: Interpolação Polinomial: Existência e unicidade do polinômio Interpolador; Polinômio

interpolador de: Lagrange, Newton e Gregory-Newton; Estudo do erro. Integração numérica: Métodos

de Newton-Cotes; Trapézios; Simpson; Estudo do erro.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? ALGUNS – I, II

Projeto Dirigido (0-2-10)

Recomendação: Não há.

Ementa: Desenvolvimento de projeto teórico, experimental ou computacional a ser desenvolvido sob

a orientação de um ou mais professores da UFABC. Poderá ser utilizada uma pesquisa desenvolvida

em Iniciação Científica prévia (com ou sem bolsa).

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? NÃO

Práticas de Ensino de Matemática no Ensino Fundamental (4-0-4)

Recomendação: Não há.

Ementa: O papel da linguagem na educação matemática. A seleção de conteúdos no ensino

fundamental. Modalidades didáticas: aula expositiva, utilização de mídia impressa, filmes e outros

recursos audiovisuais, literatura, jogos, debates, estudos do meio, quadrinhos, músicas, entre outros.

A experimentação e a matemática: os laboratórios de ensino. A resolução de problemas no ensino da

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matemática. Tendências e práticas de pesquisa em educação matemática. Avaliação em educação

matemática.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? SIM – V, VI, conhecimento pedagógico geral (Shulman)

Fundamentos de Análise (4-0-4)

Recomendação: Funções de Uma Variável; Funções de Várias Variáveis.

Ementa: Construção dos Racionais a partir dos Inteiros. Conjunto dos Reais, Noções de Topologia na

Reta. Conjuntos enumeráveis e não enumeráveis. Limites e sequências numéricas, Sequências de

Cauchy. Séries Numéricas. Critérios de Convergência. Funções Reais. Limites Laterais e Operações.

Funções Deriváveis. Teorema do Valor Médio. Fórmula de Taylor.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? ALGUNS – II

LIBRAS (2-0-2)

Recomendação: Não há.

Ementa: Surdez – concepção médica e concepção social; história da comunicação do surdo –

Oralismo, Comunicação Total e Bilinguismo; Modalidade de língua oral e de língua de sinais; LIBRAS

– introdução ao idioma e noções básicas; a escrita do surdo; o papel do intérprete de LIBRAS na

educação do surdo.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? ALGUNS – conhecimento de estudantes e suas características (Shulman)

Práticas de Ensino de Matemática I (3-0-4)

Recomendação: Não há.

Ementa: DCN, PCN e PCN+ para Matemática no Ensino Médio. Temas Estruturadores da

Matemática. Programa e Currículo de Matemática para o Ensino Médio. Livro Didático e Livro

Paradidático. Matemática e Tecnologias aliadas para o ensino. Planejamento e Avaliação associados

aos conteúdos: Conjuntos; Números Naturais e Números Reais; Funções Afins, Quadráticas e

Polinomiais; Funções Exponenciais e Logarítmicas; Funções Trigonométricas.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? SIM – III, V, VI

Fundamentos de Álgebra (4-0-4)

Recomendação: Teoria Aritmética dos Números.

Ementa: Conjuntos e Operações Binárias. Definição de Grupos e exemplos. Subgrupos.

Homomorfismos. Classes Laterais. Grupos Quocientes. Definição de Anéis e exemplos. Subanéis.

Homomorfismo de Anéis. Ideais e Anéis Quocientes. Anéis Euclidianos. Anéis de Polinômios.

Aritmética dos Anéis de Polinômios.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? ALGUNS – I, II

Práticas de Ensino de Matemática II (3-0-4)

Recomendação: Práticas de Ensino de Matemática I.

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Ementa: Matemática: linguagem, ciência ou componente lúdica do conhecimento humano?

Contextualização. Matemática e Mídia. Jogos e Artes para estudo da Matemática. Laboratórios de

Ensino de Matemática. Resolução de Problemas e Olimpíadas. Planejamento e Avaliação associados

aos conteúdos: Progressões; Matemática Financeira; Análise Combinatória; Probabilidade; Geometria

Espacial: estrutura axiomática, perpendicularismo, distância e ângulos; Poliedros; Áreas e Volumes;

Superfícies Regradas e Sólidos de Revolução.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? SIM – V

Evolução dos Conceitos Matemáticos (4-0-4)

Recomendação: Não há.

Ementa: Matemática anterior e exterior à Grécia Helênica e a natureza empírica; Matemática da

Grécia Clássica e Helênica; O sistema lógico, a noção de prova legítima: indução e dedução e a

abstração conceitual; Os Elementos de Euclides: geometria e números e aplicação do método

axiomático material e rigor; O cálculo e o sistema de números reais: a diferente caracterização dos

objetos e métodos; Matemática abstrata e aplicação da matemática; Estruturas algébricas e o caráter

algébrico e abstrato dos objetos; Geometria não-euclidiana; Método axiomático formal e abstração;

Teoria de conjuntos e fundamentos da matemática.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? SIM – V

Práticas de Ensino de Matemática III (3-0-4)

Recomendação: Práticas de Ensino de Matemática II.

Ementa: Pesquisa para formação do professor-educador. Etnomatemática. Educação Matemática.

Modelagem Matemática. História da Matemática. Planejamento e Avaliação associados aos

conteúdos: Geometria Analítica Plana; Geometria Analítica Espacial; Sistemas de Equações

Lineares; Matrizes e Determinantes; Números Complexos; Equações Algébricas.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? SIM – V

Fundamentos de Geometria (4-0-4)

Recomendação: Geometria Plana e Construções Geométricas.

Ementa: O Pensamento Geométrico. Geometria das Transformações. Simetrias: Rotações,

Reflexões, Translações. Ladrilhos e Pavimentações.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? SIM – I, II (considerar também V, em decorrência de uma das entrevistas)

Análise Real I (4-0-4)

Recomendação: Sequencias e Séries.

Ementa: Números reais: propriedades e completeza. Sequencias e séries de números reais.

Topologia da Reta: conjuntos abertos e fechados, pontos de acumulação, conjuntos compactos e

conjunto de cantor. Limite de funções reais. Funções contínuas: definição, funções contínuas num

intervalo, funções contínuas em conjuntos compactos e continuidade uniforme. Funções deriváveis:

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definição de derivada, derivada e crescimento local, funções deriváveis num intervalo, fórmula de

Taylor, aplicações da derivada, concavidade e convexidade.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? ALGUNS – I, II

Anéis e Corpos (4-0-4)

Recomendação: Teoria Aritmética dos Números.

Ementa: Definição de Anéis e exemplos. Domínios de integridade e corpos. Subanéis.

Homomorfismos. Ideais e anéis quocientes. Isomorfismos. Corpo de Frações. Anéis Euclidianos. O

anel dos inteiros de Gauss. Anéis de Polinômios. Aritmética do anel dos polinômios. Corpos

numéricos e finitos. Elementos da Teoria de Galois.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? ALGUNS – II

Funções de Variáveis Complexas (6-0-5)

Recomendação: Funções de Varias Variáveis.

Ementa: Números complexos. Funções complexas: limite, continuidade, derivação, condições de

Cauchy-Riemann, funções harmônicas. Funções exponencial, trigonométricas e hiperbólicas.

Funções multivalentes, logaritmo. Integral de linha, teorema de Cauchy-Goursat. Formula integral de

Cauchy e consequências. Sequencias e series de funções. Series de Taylor e de Laurent.

Singularidades e Resíduos: Classificação das singularidades de funções complexas. Zeros de uma

função analítica. Cálculo de resíduos e aplicação no calculo de integrais de funções reais.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? ALGUNS – I, II

Geometria Não Euclidiana (4-0-4)

Recomendação: Não há.

Ementa: Conceitos primitivos e sistemas de axiomas: incidência, ordem, congruência, continuidade,

paralelismo. Geometria Absoluta: teorema dos ângulos interiores, existência de perpendiculares,

casos de congruência de triângulos e desigualdade geométrica. Espaço Elíptico: trigonometria, áreas,

projeção de Mercator e fórmula dos navegadores. Espaço Hiperbólico: ângulos de paralelismo,

defeitos angulares de triângulos, ultraparalelismo, pontos no infinito, isometrias e modelos do plano

hiperbólico. Espaço projetivo: dualidade, c.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? ALGUNS – I, II

Grupos (4-0-4)

Recomendação: Teoria Aritmética dos Números.

Ementa: Definição de Grupos e exemplos: grupos cíclicos, simétricos e diedrais. Subgrupos. Classes

laterais. Teorema de Lagrange. Subgrupos normais e grupos quocientes. Homomorfismos e

Isomorfismos. Grupos de Permutação. Ação de Grupos. Teoremas de Sylow. Grupos Solúveis.

Grupos Nilpotentes. P-Grupos.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? ALGUNS – II

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Introdução à Criptografia (3-1-4)

Recomendação: Não há.

Ementa: Criptografia clássica. Tópicos em Teoria dos Números aplicada à Criptografia. Criptografia

de bloco simética: DES, Twofish, IDEA, AES. Criptografia de bloco assimétrica ou de chave pública:

RSA e ElGamal. Modos de operação da Criptografia de bloco. Autenticação de mensagens e

assinaturas digitais.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? NÃO

Introdução à Inferência Estatística (3-1-4)

Recomendação: Introdução à Probabilidade e Estatística.

Ementa: Variáveis aleatórias contínuas: função densidade de probabilidade e função de distribuição

acumulada. Interpretação geométrica da probabilidade. Média e variância de variáveis aleatórias

contínuas. Modelos probabilísticos para variáveis aleatórias contínuas: uniforme, gaussiano,

exponencial, qui-quadrado, t de Student e F de Snedecor. Aproximação normal e o Teorema Limite

Central. População, amostra, parâmetros e estatísticas: os problemas da inferência estatística.

Distribuição amostral da média e da variância. Estimação por ponto e intervalo. Propriedades dos

estimadores. Testes de hipóteses: Erros de 1ª e 2ª espécies. Nível descritivo (P-valor). Testes para

proporções. Testes de Hipóteses para média e Comparação de duas médias (com variância

conhecida e desconhecida). Testes qui-quadrado (aderência, homogeneidade e independência).

Testes para variância.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? NÃO

Programação Matemática (3-1-4)

Recomendação: Álgebra Linear.

Ementa: Introdução: Revisões de álgebra linear e conjuntos convexos. Programação linear:

Modelagem; Resolução Gráfica; Teoremas Básicos; O método simplex; Simplex revisado; Dualidade;

Algoritmos primal-dual e dual-simplex; Análise de sensibilidade.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? NÃO

Sequencias e Séries (4-0-4)

Recomendação: Introdução às Equações Diferenciais.

Ementa: Sequencias e Séries; Limites e Convergência, Continuidade; Sequencias de Cauchy;

Critérios de Convergência; Reordenação de Séries; Séries de Funções; Convergência Pontual

Convergência Uniforme; Representação de funções por séries de potência; Teoremas de Taylor;

Solução em Séries para EDOs: Método de Frobenius.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? ALGUNS – II

Teoria dos Grafos (3-1-4)

Recomendação: Processamento da Informação.

Ementa: Introdução: Noções básicas; grafos orientados, não-orientados, bipartidos; grafos conexos e

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não conexos; Subgrafos e hipergrafos; Estruturas de dados para a representação de grafos.

Caminhos e circuitos em grafos: Circuitos Eulerianos e Hamiltonianos; Caminhos de comprimento

mínimo. Percursos em grafos: Em profundidade; Em largura. Árvores: Conceitos básicos; Árvores

geradoras de grafos; Árvores geradoras mínimas. Exemplos de problemas: Coloração de vértices;

Clique máximo; Conjunto independente de vértices; Caixeiro viajante; Problema do fluxo máximo em

redes.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? NÃO

Topologia I (4-0-4)

Recomendação: Análise Real I.

Ementa: Topologia do espaço euclidiano, abertos e fechados, aplicações contínuas,

homeomorfismos. Aplicações quociente. Conjuntos conexos e conexos por caminhos. Conjuntos

compactos. Superfícies topológicas. Colagem de superfícies, soma conexa. Classificação das

Superfícies Compactas. Topologia geral, abertos e fechados, bases e prébases. Funções contínuas e

homeomorfismos. Axiomas de Separação e Axiomas de Enumerabilidade. Componentes conexas e

componentes conexas por caminhos. Espaços localmente conexos, localmente conexos por

caminhos. Espaços compactos, sequencialmente compactos e BW-compactos.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? NÃO

História da Matemática (4-0-4)

Recomendação: Não há.

Ementa: Origens da matemática; a matemática no Egito e na Babilônia; a matemática Grega; a

matemática Hindu- Chinesa; os Árabes na matemática; A matemática na idade média; a álgebra de

Viete; Fermat e Descartes; origens e desenvolvimento do Cálculo; Newton e Leibniz; a era Bernoulli;

Euler; Cauchy e Gauss; Abel e Galois; Geometrias não-Euclidianas; a passagem do Cálculo para a

Análise; fundamentos: Boole, Cantor e Dedekind; a matemática do século 20 e a matemática

contemporânea.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? SIM – V

Tendências em Educação Matemática (4-0-4)

Recomendação: Não há.

Ementa: Etnomatemática. O campo de investigação que compreende História, Matemática e

Educação: História da Matemática, História da Educação Matemática e História na Educação

Matemática. Filosofia da Educação Matemática. Informática e Educação Matemática. Educação

Matemática de Jovens e Adultos. Modelagem Matemática na Formação do Educador.

Os assuntos relacionados na ementa podem contribuir para que futuros professores de Matemática apropriem-se de conhecimento definido por Ball, Thames e Phelps (2007, 2008) ou conhecimento definido por Shulman (1987)? SIM – V