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UNIDADE TEMÁTICA INVESTIGATIVA EM HISTÓRIA O MOVIMENTO SOCIAL MESSIÂNICO EM CANUDOS Nível de ensino: Ensino Médio Conteúdo estruturante: Relações de poder Conteúdo básico/tema histórico: Movimentos sociais, políticos e culturais e as guerras e revoluções Conteúdo específico: O movimento social messiânico na revolta de Canudos no século XIX PRIMEIRA FASE: O ENSINO E A INVESTIGAÇÃO DAS IDÉIAS HISTÓRICAS PRÉVIAS DOS ESTUDANTES Finalidades em relação aos conceitos movimentos sociais messiânicos e Canudos: 1. Investigar as idéias históricas que os jovens estudantes já possuem sobre o movimento social messiânico de Canudos. 2. Verificar se e como o movimento social messiânico de Canudos aparece na vida cotidiana dos jovens estudantes. 3. Investigar as várias perspectivas teóricas referentes ao movimento social messiânico de Canudos. Finalidades em relação às idéias relacionadas ao desenvolvimento do pensamento histórico: 4. Desenvolver a construção do pensamento histórico: evidência histórica a partir de fontes, explicação histórica a partir da historiografia e produção de narrativas históricas pelos jovens estudantes. Demarcação espaço-temporal: Brasil república do final do século XIX (Bahia). Sujeitos históricos: sertanejos (camadas populares dos sertões da Bahia), membros da elite clerical, econômica e militar deste Estado e da República do Brasil. ATIVIDADE 1) Escreva uma narrativa histórica sobre o que você sabe do movimento social messiânico de Canudos. 2) O professor deverá categorizar as respostas considerando: a) se o estudante conhece o movimento social messiânico de Canudos; b) como ele compreende esse movimento; c) se este movimento de Canudos tem algum significado para a vida contemporânea dos jovens; d) se, para eles, o movimento de Canudos se refere apenas a elementos religiosos ou se refere também a outros aspectos; e) se eles conhecem alguns movimentos sociais messiânicos na atualidade e se eles existiram em outros momentos históricos. A partir das idéias prévias construídas por meio da categorização das narrativas históricas prévias produzidas pelos estudantes propor uma intervenção pedagógica. Esta será estruturada por fontes históricas e narrativas historiográficas. É importante que esta categorização seja comunicada aos estudantes e, se possível, construída junto com eles. A INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA DO PROFESSOR Agora que o professor fez a recolha das idéias prévias dos estudantes é o momento da sua intervenção pedagógica. Para que o estudante fundamente as diversas perspectivas geradas por suas narrativas históricas é necessário que o professor construa uma intervenção pedagógica a partir dos teóricos e da historiografia de referência sobre o movimento social de Canudos. Para isto, o professor deverá fazer uso de fontes históricas e de fragmentos de textos teóricos e de narrativas historiográficas que se

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UNIDADE TEMÁTICA INVESTIGATIVA EM HISTÓRIA

O MOVIMENTO SOCIAL MESSIÂNICO EM CANUDOS

Nível de ensino: Ensino MédioConteúdo estruturante: Relações de poderConteúdo básico/tema histórico: Movimentos sociais, políticos e culturais e as guerras e revoluçõesConteúdo específico: O movimento social messiânico na revolta de Canudos no século XIX

PRIMEIRA FASE: O ENSINO E A INVESTIGAÇÃO DAS IDÉIAS HISTÓRICAS PRÉVIAS DOS ESTUDANTES

Finalidades em relação aos conceitos movimentos sociais messiânicos e Canudos:

1. Investigar as idéias históricas que os jovens estudantes já possuem sobre o movimento social messiânico de Canudos.

2. Verificar se e como o movimento social messiânico de Canudos aparece na vida cotidiana dos jovens estudantes.

3. Investigar as várias perspectivas teóricas referentes ao movimento social messiânico de Canudos.

Finalidades em relação às idéias relacionadas ao desenvolvimento do pensamento histórico:

4. Desenvolver a construção do pensamento histórico: evidência histórica a partir de fontes, explicação histórica a partir da historiografia e produção de narrativas históricas pelos jovens estudantes.

Demarcação espaço-temporal: Brasil república do final do século XIX (Bahia).Sujeitos históricos: sertanejos (camadas populares dos sertões da Bahia), membros da elite clerical, econômica e militar deste Estado e da República do Brasil.

ATIVIDADE1) Escreva uma narrativa histórica sobre o que você sabe do movimento social messiânico de Canudos.2) O professor deverá categorizar as respostas considerando: a) se o estudante conhece o movimento social messiânico de Canudos; b) como ele compreende esse movimento; c) se este movimento de Canudos tem algum significado para a vida contemporânea dos jovens; d) se, para eles, o movimento de Canudos se refere apenas a elementos religiosos ou se refere também a outros aspectos; e) se eles conhecem alguns movimentos sociais messiânicos na atualidade e se eles existiram em outros momentos históricos.

A partir das idéias prévias construídas por meio da categorização das narrativas históricas prévias produzidas pelos estudantes propor uma intervenção pedagógica. Esta será estruturada por fontes históricas e narrativas historiográficas. É importante que esta categorização seja comunicada aos estudantes e, se possível, construída junto com eles.

A INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA DO PROFESSOR

Agora que o professor fez a recolha das idéias prévias dos estudantes é o momento da sua intervenção pedagógica.

Para que o estudante fundamente as diversas perspectivas geradas por suas narrativas históricas é necessário que o professor construa uma intervenção pedagógica a partir dos teóricos e da historiografia de referência sobre o movimento social de Canudos. Para isto, o professor deverá fazer uso de fontes históricas e de fragmentos de textos teóricos e de narrativas historiográficas que se

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confrontem e/ou dialoguem entre si.

Durante a instituição da República a partir de 1889 ocorreu uma série de revoltas urbanas e rurais no Brasil. No entanto, o que mobilizou a sociedade urbana, incluindo a imprensa e as forças armadas, foi a radicalidade da recusa de parte da sociedade sertaneja do Brasil deste novo regime e as transformações que ela causou no seu modo de vida. Dessa recusa radical surgiu um grande movimento: Canudos. Por que este movimento exprimiu elementos religiosos na luta social contra a República? E quais as consequências deste movimento para a formação da sociedade brasileira contemporânea?

FONTES

História em quadrinhos

Fonte 1

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(DINIS, André; AGUIAR, José. A revolta de canudos. São Paulo: Escala Editorial, 2008, p. 6-11).

Filme

Fonte 2GUERRA DE CANUDOS. Drama. Direção de Sérgio Resende. Brasil: Morena Filmes, 1997. DVD (169 min.): son., color. Fragmentos relativos aos discursos de Antônio Conselheiro e dos sertanejos de Canudos.

Canções

Fonte 3 Fonte 4Eu vi a fumaça da pólvoraDomínio PopularArranjo baseado no Reisado Boi do Piauí(Quixeramobim - CE)

Eu tava na ponta da ruaEu vi a rua se fecharEu vi a fumaça da pólvoraEu vi a corneta bradarEu vi Antônio ConselheiroLá no Alto da BahiaEu vi Antônio ConselheiroLá no Alto da BahiaCom 180 praçasÉ falta da monarquiaEu tava na ponta da rua

Reisado a São JoséDomínio PopularAdaptação de Raimundo Monte Santo

Ô de casa, ô de foraÔ de casa, ô de foraMaria vai ver quem éMaria vai ver quem éSão os cantador de ReisSão os cantador de ReisQuem mandou foi São JoséQuem mandou foi São JoséCanta Reis não é pecadoCanta Reis não é pecadoSão José também cantôSão José também cantô

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Eu vi a rua se fecharEu vi a fumaça da pólvora

Eu vi a corneta bradarEu vi Antônio Conselheiro Lá no Alto da Favela Com 180 praçasÉ amor já passou por rebela Eu tava na ponta da ruaEu vi a rua se fecharEu vi a fumaça da pólvoraEu vi a corneta bradarEu vi Antônio Conselheiro Lá no Alto do Tambor Com 180 praçasÉ amor, é amor, é amor.

(Eu vi a fumaça da pólvora. Jurema Paes. Canudos e Cantos do Sertão, Estúdios WR, 1996).

São José também cantô

Neste dia de alegriaMas depois de muito tempoSão José também chorouPorque viu seu filho moçoPregado numa cruz por tanto amor

(Reisado a São José. Fábio Paes. Canudos e Cantos do Sertão, Estúdios WR, 1996).

Obra literária: cartas, poesias e profecias dos sujeitos envolvidos

Fonte 5Profecia de Antônio Conselheiro

“Em verdade vos digo, quando as nações brigam com as nações, o Brazil com o Brazil, a Inglaterra com a Inglaterra, a Prussia com a Prussia, das ondas do mar D. Sebastião sahirá com todo o seu

exercito.Desde o principio do mundo que encantou com todo o seu exercito e o restuitui em guerra.

E quando encantou-se afincou a espada na pedra, ella foi até os copos e elle disse: Adeus mundo!Até mil e tantos a dois mil não chegarás!

Neste dia quando sahir com o seu exercito tira a todos no fim da espada deste papel da Republica.O fim desta guerra se acabara na Santa Casa de Roma e o sangue hade ir até a junta grossa...”

(Recolhido por CUNHA, Euclides da. Os sertões. São Paulo: Círculo do livro, 1965, p. 133).

Fonte 6Oração ao Santo Protetor dos sertanejos seguidores de Antônio Conselheiro

Do céu veio uma luzQue Jesus Cristo mandou.Santo Antônio AparecidoDos castigos nos livrou!

Quem ouvir e não aprenderQuem souber e não ensinar

No dia do JuízoA sua alma penará!

(Recolhido por Sílvio Romero. A poesia popular no Brasil apud CUNHA, Euclides da. Os sertões. São Paulo: Círculo do livro, 1965, p. 151).

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Fonte 7Circular do Arcebispo da Bahia dirigida a todos os párocos em 1882

“Chegando ao nosso conhecimento, que pelas freguesias do centro deste arcebispado, ainda um indivíduo denominado Antônio Conselheiro, pregando ao povo, que se reúne para ouvi-lo, doutrinas supersticiosas e uma moral excessivamente rígida com que está perturbando as consciências e enfraquecendo, não pouco, a autoridade dos párocos destes lugares, ordenamos a V. Rvma., que não consinta em sua freguesia semelhante abuso, fazendo saber aos Paroquianos que lhes proibimos absolutamente, de se reunirem para ouvir tal pregação, visto como, competindo na igreja católica, somente aos ministros da religião, a missão santa de doutrinar os povos, um secular, quem quer que ele seja, ainda quando muito instruído e virtuoso, não tem autoridade para exercê-lo. Entretanto sirva isto para excitar cada vez mais o zelo de V. Rvma., no exercício do ministério da pregação, a fim de que os seus paroquianos, suficientemente instruídos, não se deixem levar por todo o vento de doutrina, etc.”

(Circular dirigida em 16 de fevereiro de 1882, ao clero baiano pelo Arcebispo D. Luís apud CUNHA, Euclides da. Os sertões. São Paulo: Círculo do livro, 1965, p. 135).

Fonte 8

Ofício dirigido em 1886 ao chefe de polícia da Bahia pelo delegado de Itapicuru

“...Fez neste termo seu acampamento e presentemente está no referido arraial construindo uma capela a expensas do povo. Conquanto esta obra seja de algum melhoramento, aliás dispensável, para o lugar, todavia os excessos e sacrifícios não compensam este bem, e, pelo modo por que estão os ânimos, é mais que justo e fundado o receio de grandes desgraças. Para que V. S. saiba quem é Antônio Conselheiro, basta dizer que é acompanhado por centenas e centenas de pessoas, que ouvem-no e cumprem suas ordens de preferência às do vigário da paróquia. O fanatismo não tem mais limites e assim é que sem medo de erro, e firmado em fatos, posso afirmar que adoram-no, como se fosse um Deus vivo. Nos dias de sermões, terços e ladainhas, o ajuntamento sobe a mil pessoas. Na construção desta capela, cuja féria semanal é de quase cem mil réis, décuplo do que devia ser pago, estão ocupados cearenses, aos quais Antônio Conselheiro presta a mais cega proteção (...), e esse dinheiro sai dos crédulos e ignorantes, que, além de não trabalharem, vendem o pouco que possuem e até furtam para que não haja a menor falta. Havendo desinteligência entre o grupo de Antônio Conselheiro e o vigário de Inhambupe, está aquele municiado como se tivesse de ferir uma batalha campal, e consta que estão à espera que o vigário vá ao lugar denominado Junco para assassiná-lo. Faz medo aos transeuntes passar por alto, vendo aqueles malvados munidos de cacetes, facas, facões, clavinotes; e ai daquele que for suspeito de ser infenso a Antônio Conselheiro”.

(Ofício dirigido em novembro de 1886 ao chefe de polícia da Bahia pelo delegado de Itapicuru apud CUNHA, Euclides da. Os sertões. São Paulo: Círculo do livro, 1965, p. 135-136).

ATIVIDADE3) Selecione apenas três fontes históricas que se relacionam com o tema movimento social messiânico de Canudos (este processo de escolha pode ser em grupo).4) Procure relacionar as fontes históricas selecionadas com o movimento de Canudos considerando os seguintes procedimentos metodológicos:

Abordar os contextos históricos de produção de cada fonte histórica Se for o caso, abordar o contexto histórico representado por estas fontes Abordar o contexto histórico do estudante leitor

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As seguintes perguntas poderão nortear esta abordagem:• Qual é a natureza dessa fonte histórica? Como ela é?• Você reconhece algum sujeito e situação do passado nesta fonte histórica? Quais?• O que estes sujeitos e situações do passado representam para você?• Em que conteúdos históricos você incluiria estes sujeitos e situações do passado?• Qual a relação destes sujeitos e situações do passado com a sua vida cotidiana?• Você encontrou algum anacronismo em algumas dessas fontes históricas? Em quais? Por

quê?

Importante:

Neste momento é fundamental que o professor permita que os estudantes produzam livremente suas inferências e até mesmo a sua empatia com as fontes. É a partir das inferências históricas (ou seja, os conceitos históricos prévios em relação a estas fontes) destes sujeitos que o professor montará a sua intervenção.

Este momento é necessário para que o estudante compreenda a diversidade de perspectivas que os sujeitos de uma determinada época possuem em relação a determinados acontecimentos históricos. As fontes históricas são vestígios do passado no presente para que os historiadores tenham algum acesso às outras temporalidades e aos outros períodos. Agora o estudante deverá produzir uma narrativa histórica sobre o tema abordado a partir das fontes escolhidas.

ATIVIDADE5) Faça de conta que você é um historiador do século XXI e que tenha que escrever uma narrativa histórica sobre o movimento de Canudos para um determinado público. Mas para isso você tem as três fontes escolhidas por você ou sua equipe.

Como foi dito anteriormente é muito importante que os estudantes produzam livremente suas inferências históricas a partir de sua imaginação, mas desta vez a sua narrativa estará balizada pelas fontes históricas escolhidas. Esta narrativa tem como finalidade comunicar as idéias históricas prévias dos estudantes para a sua turma e seu professor.

ATIVIDADE6) Leia para a turma a primeira versão da narrativa baseada em fontes históricas produzidas por você ou sua equipe. Depois anote as considerações de seus colegas e do seu professor para a produção futura de uma segunda versão narrativa sobre o movimento de Canudos.

HISTORIOGRAFIA

Utilizo aqui os textos de uma socióloga brasileira especializada em movimentos messiânicos no Brasil e no mundo (narrativas 1 e 3), um fragmento de uma narrativa histórica de um historiador inglês especializado na história de movimentos populares (narrativa 2) e um fragmento de uma narrativa produzida por um historiador estadunidense sobre o movimento social de Canudos (narrativa 4). Durante a leitura procure compreender os conceitos de forma aberta, ou seja, busque perceber como os textos dialogam entre si no que eles tanto no que eles se confrontam e quanto em os seus acordos.

Narrativa 1 O Reino Messiânico é em geral um reino futuro, espera-se por ele. Tanto poderá ser algo de inteiramente novo, como poderá reproduzir uma Idade de Ouro que já tenha existido no passado, mas em ambos os casos os mesmos caracteres de santidade e perfeição. (...) A vinda é apressada pela atividade dos adeptos, isto é, por um movimento sócio-religioso de que o messias é o personagem

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central. Derivando da insatisfação humana diante das imperfeições do mundo, (...) o Reino Celeste terá sempre as características de terreno, mas será santificado e perfeito. Como descreve DESROSCHE, os dois conceitos de messias e de Milênio implicam “uma ligação essencial de fatores religiosos com fatores sociais, do espiritual com o temporal, dos valores celestes com os valores terrestres, tanto da desordem de que preconizam a abolição quanto na nova ordem de que anunciam a instauração”. Outra característica fundamental das idéias messiânicas é que não destinam salvação e paraíso a indivíduos, e sim a coletividades. O nome de Reino Celeste na terra (...) ― a terra se transforma não para um homem, mas para a humanidade ― é um Reino. Assim, o sofrimento de uma comunidade e não o sofrimento de indivíduos é objeto da esperança de salvação. Completa-se a definição de messias: não é qualquer salvador, é o redentor que traz uma salvação coletiva e terrena. Hans KOHN, encerra todos os traços privativos do messianismo: “é a crença na vinda de um redentor que porá fim à ordem presente de coisas, universalmente ou para um só grupo, instituindo neste mundo uma nova ordem de justiça e felicidade”.

(QUEIROZ, Maria Isaura Pereira de. O messianismo no Brasil e no mundo. São Paulo: Dominus, 1965, p. 9-10).

Narrativa 2 As tradições se perpetuam em grande parte mediante a transmissão oral, com seu repertório de anedotas e narrativas exemplares. Sempre que a tradição oral é suplantada pela alfabetização crescente, os produtos impressos de maior circulação — brochuras com baladas populares, almanaques, panfletos, coletâneas de “últimas palavras” e relatos anedóticos de crimes — tendem a se sujeitar a expectativas da cultura oral, em vez de desafiá-las com novas opções. Essa cultura transmite com vigor — e possivelmente também gera — desempenhos ritualísticos e estilizados, na recreação ou em formas de protesto. Essa cultura (...) recorria a costumes tradicionais e procurava reforçá-los. (...) Temos uma cultura costumeira que não está sujeita, em seu funcionamento cotidiano, ao domínio ideológico dos governantes. Temos (...) uma cultura tradicional que é, ao mesmo tempo, rebelde. A cultura conservadora da plebe quase sempre resiste, em nome do costume, às racionalizações e inovações da economia (...) que os governantes, os comerciantes ou os empregadores querem impor. A inovação é mais evidente na camada superior da sociedade, a inovação do processo capitalista, e é quase sempre experimentada pela plebe como uma exploração, a expropriação de direitos de uso comum costumeiros, ou a destruição violenta de padrões valorizados de trabalho e lazer. Por isso a cultura popular é rebelde, mas o é em defesa dos costumes. Esses pertencem ao povo, e alguns deles se baseiam realmente em reivindicações muito recentes. Contudo, quando procura legitimar seus protestos, o povo retorna frequentemente às regras paternalistas de uma sociedade mais autoritária, selecionando as que melhor defendam os seus interesses tradicionais.

Outro aspecto dessa cultura (...) é a prioridade concedida, em certas áreas, ao “não-econômico”, em detrimento das sanções, trocas e motivações monetárias diretas. Este aspecto é hoje estudado amplamente sob a designação de “economia moral”. (...) O processo do capitalismo e a conduta não-econômica baseada nos costumes estão em conflito, um conflito consciente e ativo, como que numa resistência aos novos padrões de consumo, às inovações técnicas ou à racionalização do trabalho que ameaçam desintegrar os costumes e, algumas vezes, também a organização familiar dos papéis produtivos. (...). Como o capitalismo (ou seja, o mercado) recriou a natureza humana e as necessidades humanas, a economia política e seu antagonista revolucionário passaram a supor que esse homem econômico fosse eterno. Nunca retornaremos a natureza humana pré-capitalista; mas lembrar como eram seus códigos, expectativas e necessidades alternativas pode renovar nossa percepção da gama de possibilidades implícita no ser humano. Isso não poderia até nos preparar para uma época em que se dissolvessem as necessidades e expectativas do capitalismo e do comunismo estatal, permitindo que a natureza humana fosse reconstruída sob uma nova forma? (...) Seria invocar a possibilidade da redescoberta, sob novas formas, de um novo tipo de “consciência costumeira”, quando mais uma

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vez as gerações sucessivas aprendessem umas com as outras.

(THOMPSON, Edward P. Costumes em comum: estudos sobre a cultura popular tradicional. São Paulo: Companhia das Letras, 1998, p. 18-19, 21, 23-24).

Narrativa 3 A comunidade formada em torno do Conselheiro encontrava base na solidariedade desenvolvida a partir da crença em seus poderes messiânicos. Assim, vemos colorir-se de tonalidades religiosas, todos os pontos de atrito com a sociedade mais ampla e o grupo restrito dos adeptos: razões políticas, econômicas, rivalidade entre estrutura eclesiástica e o prestígio do Conselheiro, tudo se justificava em nome do valor sagrado atribuído ao líder e ao seu verbo. Não era a República como instituição que combatia, era a República como representante do diabo. Não eram as propriedades dos ricos que eram depredadas, eram as propriedades dos que tinham optado pelo Anticristo. Não era a Igreja que se hostilizava, eram os padres “heréticos e maçons”, que interpretavam erroneamente a santa doutrina de Cristo. E os jagunços sempre se consideravam excelentes católicos. Detentores das verdades religiosas, formavam então um grupo de “eleitos”, derivando sua posição da adesão às crenças divinamente reveladas pelo messias, que reforçavam a unidade do grupo. (...) Estavam inteiramente convencidos de que “se morressem, ressuscitariam logo depois para gozar, neste ou noutro mundo melhor, existência folgada em meio de delícias e prazeres entontecedores”. (...) O “tempo do Conselheiro” adquiriu conotação de Idade de Ouro, na região: “havia de tudo por estes arredores. Dava de tudo, e até cana-de-açúcar de se descascar com a unha nascia bonitona por esses lados. Legumes em abundância e chuvas à vontade (...) Esse tempo parece mentira...” Hoje, no entanto, o quadro mudou, “as secas assolando tudo, o terreno de Canudos não dando para nada”.

(QUEIROZ, Maria Isaura Pereira de. O messianismo no Brasil e no mundo. São Paulo: Dominus, 1965, p. 218-219).

Narrativa 4 Canudos era pacífica e calma. Os canudenses não eram sectários. (...) A cidade era um refúgio organizado em bases teocráticas, mas ligada de forma pragmática ao ambiente circundante — um feito que por si só já demonstra a flexibilidade do Conselheiro e de seus auxiliares. Para o sertão, nem as maneiras nem o comportamento do Conselheiro como pregador mendicante pareciam algo exótico. Sua carreira seguiu os mesmos padrões comuns a qualquer missionário apostólico e, no entanto, ao fundar Canudos e tirar seus seguidores de suas casas ele abalou a vida econômica da região, deixando de ser bem-vindo. O Conselheiro nunca pretendeu ser o Messias, conquanto exercesse forte influência sobre o seu rebanho. (...) O Conselheiro rompeu com o sistema tradicional de controle social e ofereceu aos fiéis a possibilidade de uma nova vida, especialmente quando estava no seu auge, antes do ataque à comunidade. Canudos nunca foi um movimento revolucionário; apresentou apenas algumas alternativas milenaristas para a tradição religiosa (e política). Apesar de não ter conseguido manter as alianças que inicialmente formou com alguns dos proprietários de terra e coronéis do sertão e tirar proveito delas, o Conselheiro não era um idealista utópico. (...) Milenaristas como ele não rejeitavam pura e simplesmente a hierarquia e a distribuição desigual da riqueza; na verdade, eles condenavam o egoísmo e as ações imorais de novos tipos (ameaçadores) de patrões. O sebastianismo pode ter influenciado a religião sertaneja, porém, no século XIX, ele atuava basicamente no inconsciente. Os residentes de Canudos não eram (...) impulsionados por um fanatismo religioso ensandecido. A depressão econômica as conseqüências da seca, o uso cada vez maior da polícia estadual em problemas políticos e a queda da Monarquia juntamente com o desaparecimento da autoridade tradicional que esta representava acabaram tornando desejável a vida estruturada prometida por Conselheiro.

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Os moradores de Canudos agiam de maneira racional. Para entrar na cidade santa do Conselheiro, abandonaram corajosamente e obstinadamente seus antigos lares. Belo Monte não foi (...) uma versão patética da prática carnavalesca pela qual os pobres se tornam ricos e protagonizam sonhos de inversão social. Os que optaram por viver na austera comunidade do Conselheiro estavam motivados pela aceleração do processo de mudanças desestabilizadoras que atingia o sertão e pela dureza de suas vidas.

(LEVINE, Robert M. O sertão prometido: o massacre de Canudos. São Paulo: Edusp, 1995, p. 323-325).

ATIVIDADE7) Responda as seguintes questões sobre o movimento de Canudos:a) Explique com suas palavras, o sentido de cada narrativa apresentada.b) Os autores das narrativas 1 e 2 concordam ou discordam quanto ao conceito do que seja um movimento messiânico? Por quê?c) Os autores das narrativas 3 e 4 se complementam ou defendem idéias completamente diferentes? Por quê?d) Em sua opinião a narrativa 2 poderia fundamentar qual das outras narrativas? A narrativa 3 ou a 4? Por quê?e) Em sua opinião, qual ou quais dos autores frisa a revolta de Canudos como um movimento puramente messiânico? Você concorda com essa visão? Por quê?f) Qual(is) narrativa (ou narrativas) você considera mais plausível(is) em relação ao movimento de Canudos? Por quê?g) Como as 3 fontes históricas escolhidas por você para construir sua primeira narrativa poderiam ajudar a fundamentar ou a refutar sua escolha em relação a(s) sua(s) narrativa(s) mais plausível(is)?

SEGUNDA FASE: A APRENDIZAGEM E A COMUNICAÇÃO DAS IDÉIAS HISTÓRICAS ELABORADAS PELOS ESTUDANTES

Agora é fundamental que o professor verifique se seus estudantes produziram narrativas históricas elaboradas. Para isso é necessário repetir, em seus aspectos gerais, em um nível mais sofisticado as questões apresentadas na Atividade 5.

ATIVIDADE8) Novamente, faça de conta que você é um historiador do século XXI e que tenha que escrever uma narrativa histórica sobre o movimento de Canudos para um determinado público. Mas para isso você tem as três fontes escolhidas por você ou sua equipe, as narrativas produzidas anteriormente por você e as quatro narrativas históricas apresentadas por seu professor. Procure compará-las ao construir sua nova narrativa histórica.

ATIVIDADE9) Leia para a turma a última versão da narrativa histórica sobre o movimento de Canudos produzida por você ou sua equipe. Depois anote as considerações de seus colegas e do seu professor. • Ao invés de uma leitura, o professor pode sugerir aos estudantes aqui a construção de

seminários, debates, encenações, poesias e canções, provas com consulta e questões abertas, etc. É importante que estas comunicações sejam fundamentadas em fontes históricas e pela historiografia de referência sobre o movimento de Canudos.

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TERCEIRA PARTE: AVALIAÇÃO DA METACOGNIÇÃO HISTÓRICA DOS ESTUDANTES

A metacognição histórica é o momento de o professor investigar o aprendizado histórico do estudante. É o momento em que o estudante poderá compreender se aprendeu e como aprendeu sobre o movimento de Canudos. Esta metacognição apresenta dois momentos. A primeira sobre o aprendizado do conteúdo e dos princípios do pensamento histórico (evidência histórica a partir de fontes e narrativas históricas a partir de narrativas historiográficas explicativas) e a segunda sobre o que o estudante aprendeu em relação a sua consciência histórica.

Antes disso, é importante que o professor sistematize uma comparação entre as primeiras e as últimas narrativas históricas produzidas pelos estudantes com a finalidade de investigar se houve mudanças nas idéias históricas destes sujeitos.

ATIVIDADE11) Responda:a) O trabalho com fontes históricas na aula de História fornece pistas para entender como funciona o ofício do historiador? Por quê?b) O trabalho com narrativas históricas de diversos autores com visões diferentes sobre o movimento de Canudos permite aprender e pensar em História? Por quê?

ATIVIDADE:12) Responda: a) O que você aprendeu sobre o movimento social de Canudos que se relaciona com a compreensão do nosso presente?b) O que você aprendeu sobre o movimento social de Canudos que se relaciona com a compreensão dos nossos projetos de futuro?

Importante:É fundamental que todo este processo da Unidade Temática Investigativa em História seja

devidamente inventariado e arquivado (material e/ou digitalmente) na escola para que você ou até mesmo outros professores utilizem este processo como fonte onde os estudantes leiam e/ou vejam as narrativas de outros estudantes e de seus professores de História.

REFERÊNCIAS

Fontes

Canções popularesEu vi a fumaça da pólvora. Jurema Paes. Canudos e Cantos do Sertão, Estúdios WR, 1996.Reisado a São José. Fábio Paes. Canudos e Cantos do Sertão, Estúdios WR, 1996.

FilmeGUERRA DE CANUDOS. Drama. Direção de Sérgio Resende. Brasil: Morena Filmes, 1997. DVD (169 min.): son., color.

História em quadrinhosDINIS, André; AGUIAR, José. A revolta de Canudos. São Paulo: Escala Editorial, 2008.

Obra literáriaCUNHA, Euclides da. Os sertões. São Paulo: Círculo do livro, 1965.

Referências Bibliográficas

FERNANDES, Lindamir Zeglin. A Reconstrução de aulas de História na perspectiva da Educação Histórica: da aula oficina à unidade temática investigativa. In: Anais do VIII Encontro Nacional de

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Pesquisadores de Ensino de História: Metodologias e Novos Horizontes. São Paulo: FEUSP - Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, 2008. LEVINE, Robert M. O sertão prometido: o massacre de Canudos. São Paulo: Edusp, 1995.QUEIROZ, Maria Isaura Pereira de. O messianismo no Brasil e no mundo. São Paulo: Dominus, 1965.THOMPSON, Edward P. Costumes em comum: estudos sobre a cultura popular tradicional. São Paulo: Companhia das Letras, 1998.

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