uma proposta de projeto · a apresentação de uma proposta completa neste artigo tem a finalidade...

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Texto produzido em 1997 1 1 UMA PROPOSTA DE PROJETO COM NARRATIVAS LITERÁRIAS 1 Rosa Maria Antunes de Barros * Rosaura Angélica Soligo * 1. Conversando sobre o assunto... Por que um projeto de narrativas na escola? Projetos porque... Os conteúdos e atividades escolares, do ponto de vista didático, podem ser organizados de diferentes formas: em sequências de atividades, em atividades permanentes, em situações independentes que podem ser ocasionais ou de sistematização e em projetos 2 . Todas têm seu lugar na prática educativa e são complementares: respondem a diferentes objetivos que lhes dão sentido. Dentre as diferentes formas de organizar o trabalho na escola, os projetos oferecem algumas vantagens didáticas que justificam sua defesa como uma modalidade privilegiada. “A característica básica de um projeto é que ele tem um objetivo compartilhado por todos os envolvidos em sua realização, que se expressa num produto final em função do qual todos trabalham” 3 . Essa característica parece ser responsável pelos bons resultados que os projetos têm garantido em muitas práticas escolares, pois favorece o engajamento e o compromisso dos alunos com o trabalho a ser desenvolvido e com a própria aprendizagem. Além disso, uma proposta pedagógica que privilegia o trabalho com projetos, se justifica por outros princípios que se expressam em necessidades de natureza didática: a compreensão do aluno enquanto sujeito da própria aprendizagem; a elaboração junto com os alunos de propostas a serem implementadas na classe; a construção de algumas certezas compartilhadas e a discussão de muitas incertezas, o que permite maior compreensão da natureza de um empreendimento coletivo e melhor relacionamento entre o grupo . a contextualização das propostas de ensino, considerando que a aquisição de conhecimento é sempre mediada pelo modo de aprender dos alunos e pelo modo de ensinar dos professores; a máxima aproximação entre “versão escolar” e “versão social” do conhecimento, o que requer o planejamento de situações escolares à semelhança das práticas sociais, com o cuidado de não produzir simplificações ou distorções nos conhecimentos a serem trabalhados; o fato de a ação educativa ter que responder ao mesmo tempo a objetivos de ensino e objetivos de realização do aluno nem sempre coincidentes 4 . 1 Texto produzido em 1997 para a publicação Projetos na Escola, da Secretaria de Estado da Educação do Paraná. * Professora da Escola Cooperativa e assessora de projetos pedagógicos de redes públicas e de unidades escolares. * Coordenadora Pedagógica da Escola Cooperativa, assessora de projetos pedagógicos de redes públicas e membro da Equipe de Elaboração dos Parâmetros Curriculares Nacionais - Documento de Língua Portuguesa / MEC. 2 Conforme a pesquisadora em didática, Délia Lerner, in “É possível ler na escola?” - Revista Lectura y Vida - 1996. 3 Parâmetros Curriculares Nacionais - Documento de Língua Portuguesa - MEC, Agosto/1996. 4 Os objetivos de ensino representam capacidades que se pretende que os alunos desenvolvam e os objetivos do aluno relacionam-se a necessidades pessoais, quase sempre de realização imediata. Por exemplo, quando o professor lê diferentes (e bons) textos para os alunos todos os dias, certamente pretende que eles tenham contato com a diversidade textual, que se familiarizem com a linguagem, que se interessem pela

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Texto produzido em 1997

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1

UMA PROPOSTA DE PROJETO

COM NARRATIVAS LITERÁRIAS1

Rosa Maria Antunes de Barros*

Rosaura Angélica Soligo*

1. Conversando sobre o assunto...

Por que um projeto de narrativas na escola?

Projetos porque...

Os conteúdos e atividades escolares, do ponto de vista didático, podem ser organizados de diferentes formas:

em sequências de atividades, em atividades permanentes, em situações independentes – que podem ser ocasionais ou

de sistematização – e em projetos2. Todas têm seu lugar na prática educativa e são complementares: respondem a

diferentes objetivos que lhes dão sentido. Dentre as diferentes formas de organizar o trabalho na escola, os projetos

oferecem algumas vantagens didáticas que justificam sua defesa como uma modalidade privilegiada. “A característica

básica de um projeto é que ele tem um objetivo compartilhado por todos os envolvidos em sua realização, que se

expressa num produto final em função do qual todos trabalham”3. Essa característica parece ser responsável pelos

bons resultados que os projetos têm garantido em muitas práticas escolares, pois favorece o engajamento e o

compromisso dos alunos com o trabalho a ser desenvolvido e com a própria aprendizagem.

Além disso, uma proposta pedagógica que privilegia o trabalho com projetos, se justifica por outros

princípios que se expressam em necessidades de natureza didática:

• a compreensão do aluno enquanto sujeito da própria aprendizagem;

• a elaboração junto com os alunos de propostas a serem implementadas na classe;

• a construção de algumas certezas compartilhadas e a discussão de muitas incertezas, o que permite maior

compreensão da natureza de um empreendimento coletivo e melhor relacionamento entre o grupo.

• a contextualização das propostas de ensino, considerando que a aquisição de conhecimento é sempre mediada

pelo modo de aprender dos alunos e pelo modo de ensinar dos professores;

• a máxima aproximação entre “versão escolar” e “versão social” do conhecimento, o que requer o planejamento

de situações escolares à semelhança das práticas sociais, com o cuidado de não produzir simplificações ou

distorções nos conhecimentos a serem trabalhados;

• o fato de a ação educativa ter que responder ao mesmo tempo a objetivos de ensino e objetivos de realização do

aluno – nem sempre coincidentes4.

1 Texto produzido em 1997 para a publicação Projetos na Escola, da Secretaria de Estado da Educação do Paraná. * Professora da Escola Cooperativa e assessora de projetos pedagógicos de redes públicas e de unidades escolares. * Coordenadora Pedagógica da Escola Cooperativa, assessora de projetos pedagógicos de redes públicas e membro da Equipe de Elaboração dos

Parâmetros Curriculares Nacionais - Documento de Língua Portuguesa / MEC. 2 Conforme a pesquisadora em didática, Délia Lerner, in “É possível ler na escola?” - Revista Lectura y Vida - 1996. 3 Parâmetros Curriculares Nacionais - Documento de Língua Portuguesa - MEC, Agosto/1996. 4 Os objetivos de ensino representam capacidades que se pretende que os alunos desenvolvam e os objetivos do aluno relacionam-se a

necessidades pessoais, quase sempre de realização imediata. Por exemplo, quando o professor lê diferentes (e bons) textos para os alunos todos

os dias, certamente pretende que eles tenham contato com a diversidade textual, que se familiarizem com a linguagem, que se interessem pela

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Na área de Língua Portuguesa, “os projetos são situações em que linguagem oral, linguagem escrita, leitura e

produção de textos se inter-relacionam de forma contextualizada, pois quase sempre envolvem tarefas que articulam

esses diferentes conteúdos. São situações linguisticamente significativas, em que faz sentido, por exemplo, ler para

escrever, escrever para ler, ler para decorar, escrever para não esquecer, ler em voz alta em tom adequado...”5

A língua se realiza no uso social. É pelo uso e pela reflexão sobre suas características que se pode aprender a

utilizá-la com eficácia. Cabe ao professor organizar propostas didáticas que possam se converter em verdadeiras

situações de aprendizagem. Se acreditamos nessas premissas, então teremos de trazer para o interior da escola as

práticas linguísticas à semelhança do que ocorre fora dela. Os projetos podem se constituir em uma valiosa

contribuição nesse sentido.

Narrativas porque...

Poderíamos dizer que a narrativa nasceu quando nasceu o primeiro ser humano com capacidade de contar

histórias. A narrativa é a possibilidade de manifestar ou construir através da linguagem as histórias que se deseja

contar: é a arte, possível apenas ao homem, de narrar suas histórias. Talvez seja essa a principal razão de todos –

crianças, adolescentes e adultos – terem fascínio pelas narrativas. Por isso – e pelo fato de grande parte do patrimônio

cultural da humanidade ser feito de histórias – os textos narrativos assumem importância fundamental no ensino de

Língua Portuguesa.

Dentre a diversidade de gêneros que circulam socialmente há uma enorme variedade de textos que são

narrativos: contos, fábulas, romances, lendas, mitos, crônicas, anedotas, relatos, cartas... Desses, muitos são

literários6. Cada um deles tem uma forma própria de se organizar que precisa ser ensinada e aprendida.

Se é tão importante para o ser humano conhecer e contar histórias – se a própria História é uma grande

narrativa em contínua construção – é justo que nos dediquemos a instrumentalizar nossos alunos para que escrevam-

nas com qualidade, com elegância, com linguagem literária.

leitura em função do que se pode “ganhar” através dela, que compreendam algumas características dos diferentes gêneros... Para o aluno, os

objetivos já são de outra natureza: ele com certeza busca emoções provocadas pelo conteúdo dos textos (se forem literários) ou novos

conhecimentos (se forem informativos). 5 Parâmetros Curriculares Nacionais - Documento de Língua Portuguesa - MEC, Agosto/1996. 6 Conforme Ana Maria Kaufman e Maria Elena Rodriguez: os textos literários são aqueles em que “interessa primordialmente como se

combinam, de acordo com padrões estéticos, os diferentes elementos da língua, para dar uma impressão de beleza. No processo de construção dos

textos literários (...) o escritor detém-se na própria escrita, joga com os recursos linguísticos, transgredindo, com frequência, as regras da

linguagem para liberar sua imaginação e fantasia na criação de mundos fictícios.”

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Projeto NARRATIVAS LITERÁRIAS porque...

Não podemos, sob o pretexto de trabalhar com a diversidade textual, deixar de definir os objetivos e as

prioridades do ensino em cada série. Como se costuma dizer, muitas vezes o tudo é o nada. O propósito de garantir a

diversidade textual na sala de aula não pode ter como consequência – como teve em algumas práticas – a

subestimação do papel do professor: só o contato com os textos não garante as aprendizagens necessárias, pois, nesse

sentido, não há nada que tenha efeito mais profícuo do que uma intervenção pedagógica eficaz. E isso não é possível

sem um planejamento cuidadoso do trabalho a ser desenvolvido. Nessa perspectiva, é fundamental que a equipe de

educadores da escola, principalmente por ocasião do planejamento anual das atividades, defina coletivamente os

objetivos e conteúdos específicos de cada série7.

Em toda a escolaridade é importante trabalhar com a variedade de textos narrativos, especialmente literários.

Mas em que série é adequado fazer um trabalho mais sistemático com cada tipo? E, sendo necessário garantir o

mesmo tipo em diferentes séries – contos de fada no Ciclo Inicial, por exemplo – como distribuir e sequenciar o

trabalho?

Em situação de leitura feita pelo professor, praticamente todo texto é adequado, pois há a possibilidade de

mediação entre o texto e os alunos. Já em situação de leitura feita pelos próprios alunos, é preciso considerar a

capacidade deles compreenderem o texto autonomamente, condição para qualquer pessoa se dispor a ler um texto por

inteiro. Se a situação for de produção do texto, então as possibilidades se restringem um pouco mais, pois não se

pode produzir bem textos com os quais não se tenha familiaridade, por exemplo. E mais ainda se a situação for de

produzir textos por escrito8, que requer a coordenação de procedimentos complexos relacionados tanto ao

planejamento do que se pretende expressar como à escrita propriamente.

Garantir a diversidade de textos na sala de aula não significa, portanto, que seja possível propor aos alunos

que desenvolvam todo tipo de atividade com qualquer texto. Por isso a discussão coletiva da equipe de educadores da

escola é condição para um trabalho mais sequenciado, mais “distribuído” entre todos.

Considerando essas questões, entendemos que um projeto de narrativas envolvendo toda a escola, composto

por vários projetos que atendem às necessidades específicas de cada série, é uma possibilidade de, ao mesmo tempo,

articular todos os educadores em torno de um empreendimento comum e responder às demandas colocadas por cada

classe.

A sugestão é organizar uma coleção composta de várias coletâneas produzidas pelos alunos das diferentes

séries, cujo destino é a biblioteca escolar ou, se não houver biblioteca, o acervo da escola. A definição das propostas

de projetos por série (relacionadas a seguir) tem como critério a adequação do gênero à faixa etária, em termos da

produção do texto – ou seja, dentre a diversidade de textos narrativos, buscou-se aqueles gêneros que, se supõe, os

alunos teriam condições de produzir melhor, seja pelo interesse no conteúdo ou pelas características linguísticas.

7 Em relação ao trabalho com a diversidade textual sugerimos, como contribuição, que se elabore uma tabela de dupla entrada com todas as

séries/todos os tipos de texto que se julga pertinente garantir no Ensino Fundamental a ser preenchida coletivamente, como produto da discussão

de “quem vai trabalhar o que quando”. 8 A distinção entre produzir textos e produzir textos por escrito deve-se ao entendimento de que são dois diferentes processos: é possível produzir

oralmente um texto da forma como são os textos escritos mesmo sem ainda saber escrevê-los de próprio punho. Um aluno que ainda não sabe ler

e escrever, se tiver ouvido a leitura de muitas histórias pode criar histórias como as dos livros, utilizando, inclusive, a linguagem que se usa para

escrever. Evidentemente, o registro escrito desse texto teria que ser feito uma pessoa alfabetizada.

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Coleção NARRATIVAS LITERÁRIAS

Ciclo Básico Inicial: Di-versões de Chapeuzinho Vermelho

Ciclo Básico Continuidade: Con-fabulando

3ª série: Assombracontos

4ª série: Causos da minha terra: verdade ou mentira?

5ª série: Aventurando

6ª série: Histórias que os poetas contam

7ª série: Um outro lado da história...

8ª série: Será possível?

O que são esses projetos?

Cada projeto implica produção de um gênero específico de narrativa. Assim, para o Ciclo Básico Inicial,

está proposto o conto de fada; para o Ciclo Básico Continuidade, a fábula; para a 3ª série o conto de terror; para a 4ª

série o relato de casos populares; para a 5ª série o conto de aventura; para a 6ª série o conto “criado” (a partir de

poemas que contam histórias); para a 7ª série o conto clássico ou mito (com subversão da trama original); para a 8ª

série a crônica. Isso não significa que não se possam remanejar alguns projetos (em séries próximas) ou mesmo

substituí-los por outros que pareçam mais interessantes e adequados. A apresentação de uma proposta completa neste

artigo tem a finalidade de, sem a pretensão de esgotar todas as possibilidades, tratar dos principais aspectos

envolvidos em um projeto da unidade escolar. Cada projeto está brevemente descrito a seguir, sendo que o primeiro

deles aparece detalhado no Anexo 1.

Di-versões de Chapeuzinho Vermelho

Coletânea, em forma de livro, de diferentes versões do conto Chapeuzinho Vermelho produzidas pelos alunos da

turma. É um projeto de leitura e escrita (que também pode ser de leitura e produção oral – nesse caso, o produto final

seria uma fita cassete com as versões gravadas).

Con-fabulando

Coletânea das fábulas, em forma de livro, criadas pelos alunos da classe. É um projeto que envolve leitura de uma

grande diversidade de textos desse gênero – diferentes fábulas e diferentes versões de uma mesma fábula – e

produção de textos. O trabalho de produção tem três dimensões: reescrita dos textos repertoriados através da leitura

pessoal e do professor, transformações de determinados aspectos do texto (desfecho, personagens, ponto de vista etc)

e criação de textos próprios a partir de uma moral escolhida entre várias possibilidades.

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Assombracontos

Coletânea, em forma de livro, de contos de assombração reescritos pelos alunos da classe. É um projeto que envolve

leitura de diferentes textos de suspense e terror, análise das características próprias do gênero (em termos de

conteúdo e forma) e reescrita de um conto preferido. O destino dos textos, além do livro para a biblioteca escolar,

pode ser também uma “Roda de Histórias” a ser apresentada em um evento do tipo Dia das Bruxas, Semana do

Folclore ou Feira Cultural, onde os alunos leriam seus assombracontos para o público presente. Outra possibilidade

seria a leitura para alunos da 1ª série em determinado dia da semana, por um certo período, permitindo a cada aluno

ler o seu texto. A vantagem da leitura pública de textos é que ela, ao mesmo tempo, requer e contextualiza a

necessidade de ensaio prévio: o aluno precisa ler várias vezes até “dominar” o texto, até sentir-se à vontade para uma

apresentação pública, até acertar a entonação e o tom de voz adequado, etc. É importante que isso seja feito na

própria classe, em algumas aulas durante algumas semanas, como atividade de aprendizagem da leitura oral: o aluno

lê para ter sua leitura avaliada pelo grupo e os que ouvem (inclusive o professor) têm a tarefa de avaliar a adequação

da leitura e propor correções necessárias considerando a situação comunicativa em que ela estará inserida. Nesse

caso, a gravação em audio ou vídeo é um recurso que contribui bastante para a análise do grupo pois permite “voltar

sobre o texto lido”, o que não é possível de outra forma.

Causos da minha terra: verdade ou mentira?

Coletânea, em forma de livro, de lendas e contos populares da tradição oral (os chamados “causos”) resgatados na

comunidade pelos alunos da classe. É um projeto que envolve um tipo específico de pesquisa – escuta e registro de

causos contados por adultos da região –, leitura de textos desse gênero já documentados por escrito, análise das

características desses textos (com ajuda do professor), registro escrito de um causo ouvido, respeitando as

características próprias da linguagem que se usa para escrever. Variações possíveis para esse projeto: o trabalho de

produção pode ser de reescritas de causos lidos em livros – no lugar de registro escrito de causos ouvidos – e o

produto final pode ser uma fita cassete dos causos escolhidos pelos alunos: que seria um registro em áudio,

respeitando as características próprias da linguagem escrita pois as histórias gravadas em discos ou fitas são, na

verdade, textos escritos lidos.

Aventurando

Coletânea, em forma de livro, de contos de aventura produzidos pelos alunos da classe. É um projeto que envolve

leitura de diferentes histórias de aventura, análise das características do gênero (em termos de conteúdo e forma) e

produção de um conto de aventura. A vantagem oferecida pelos contos de aventura é que, em geral, são textos mais

longos, que apresentam uma trama central e várias outras secundárias. Além disso, há outra característica importante

que é o fato de muitos desses contos terem, como protagonistas, grupos de crianças ou adolescentes, o que favorece

uma certa identificação com os personagens (em função da faixa etária) e, consequentemente, o interesse na leitura de

vários textos do gênero. Dessa forma, amplia-se o repertório dos alunos e as possibilidades de escrita de um texto do

mesmo tipo.

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Histórias que os poetas contam

Coletânea, em forma de livro, de contos criados pelos alunos da classe a partir de “poemas que contam histórias”. É

um projeto que envolve leitura de diferentes poemas desse tipo e, a partir da escolha de um preferido, produção de

um conto narrando a história que o poema traz. O cuidado necessário nesse tipo de trabalho refere-se à seleção dos

poemas, visto que não é qualquer tipo de texto poético que possibilita a criação de uma narrativa sobre seu conteúdo9.

Esse também é um projeto que pode ter, como desdobramento, uma apresentação pública de leitura (como a descrita

no Assombracontos). Isso poderia acontecer num sarau onde, além de ler as narrativas, os alunos declamariam os

poemas previamente decorados. O trabalho de preparo da apresentação envolveria, no caso, também a avaliação da

qualidade da declamação, não apenas da leitura oral.

Um outro lado da história...

Coletânea, em forma de livro, de textos produzidos pelos alunos da classe: contos clássicos ou mitos “subvertidos” –

ou seja, com a trama modificada porque trabalhada a partir de outro ponto de vista. É um projeto que envolve leitura

de muitos contos e mitos, escolha daquele que vai ser “subvertido”, análise do conteúdo e da estrutura do discurso –

perspectiva em torno da qual a narrativa se organiza, personagens beneficiados e prejudicados pela perspectiva do

narrador, núcleo da trama que precisa ser garantido, possibilidades de “subversão” etc. – e produção do texto. Como

a ideia é que cada aluno escolha um texto para modificar, é preciso propor alguns exercícios coletivos de “subversão”

da trama para criar algumas referências que favoreçam a qualidade do resultado. Ainda assim, o trabalho de produção

pessoal precisa ser monitorado pelo professor para que os alunos possam receber sugestões e possam incorporá-las a

seus textos. Essa proposta pode ter como resultado narrativas na primeira pessoa – quando se optar, por exemplo, por

um narrador-personagem. Se assim for, é imprescindível que os alunos tenham acesso a uma grande diversidade de

textos produzidos na primeira pessoa, especialmente literários. Isso porque, embora sejam muito comuns relatos orais

na primeira pessoa, o mesmo não ocorre em relação aos escritos: eles precisam ser selecionados e postos à disposição

dos alunos para que leiam e analisem. Não é possível escrever bem um tipo de texto que não se pôde conhecer

anteriormente, seja através da leitura pessoal ou da leitura feita por outras pessoas. E, nesse caso, o que menos

interessa é que o aluno, por falta de modelos de referência, se baseie nos inúmeros relatos orais (que, sem dúvida,

ouviu) para produzir seu texto escrito. Algumas possibilidades de tramas “subvertidas” poderiam resultar em: Os três

porquinhos maus; O patinho lindo; Sansão, o anão; A verdadeira história do Rei Midas; A traição de Penélope...

Será possível?

Coletânea, em forma de livro, de crônicas produzidas pelos alunos da classe. É um projeto que envolve leitura de

uma grande diversidade de crônicas, observação das temáticas mais frequente, análise da linguagem utilizada e de

como o cronista faz literatura a partir de fatos simples do cotidiano, produção de algumas crônicas, análise da

qualidade delas e escolha daquela que receberá tratamento de texto a ser publicado para compor a coletânea. Como

não é nada fácil produzir boas crônicas, além da necessidade de criar ou ampliar o repertório desse gênero através da

leitura, é preciso que o professor sugira possibilidades aos alunos em termos de conteúdo e de linguagem. Por isso é

importante que eles produzam várias crônicas, comparem, analisem, reescrevam, submetam-nas à avaliação de outras

pessoas... Uma proposta que pode contribuir para compor um banco de ideias é solicitar que os alunos colham, nos

9 No Anexo 2 há uma bibliografia com sugestões de alguns poemas adequados.

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noticiários, fatos que possam ser tratados nas crônicas. Outra é que escolham lugares onde habitualmente acontecem

coisas inusitadas e fiquem, por um tempo, observando “o movimento” – por exemplo: estação rodoviária,

estabelecimento bancário com porta giratória, festa de aniversário, comemoração cívica, quermesse, exposição

pública etc. É interessante que os fatos observados sejam relatados na classe pois além de criarem bons momentos de

intercâmbio entre os alunos, permitem o “aproveitamento” do que foi visto pelos colegas na produção das crônicas. E

é importante discutir com os alunos que o portador tradicional das crônicas é o jornal – usualmente as coletâneas são

uma segunda publicação, com várias crônicas de um mesmo autor, já publicadas em um jornal.

Caracterização dos principais gêneros a serem produzidos10

Conto

A capacidade humana “de reter na memória tudo o que é enunciado pela voz já representou, para as

civilizações que não conheciam a escrita, a mais alta tecnologia de preservação da cultura...”11 Pode-se dizer que a

narrativa literária nasceu do relato oral. Antigamente “as histórias eram contadas em voz alta por um narrador a um

grupo de pessoas, estabelecendo-se uma interação direta entre ele e seus ouvintes. A fala do narrador se transformava

em uma espécie de escritura invisível que se fixava na memória do ouvindo, garantindo a reprodução futura. Durante

a Idade Média, as histórias, muitas vezes de autores desconhecidos, eram divulgadas oralmente pelos contadores que

percorriam longas distâncias para realizar suas apresentações. A composição oral sempre foi caracterizada como um

texto de muitas vozes, de muitos autores. O próprio ouvinte, no momento da escuta, já elabora o seu modo de

interpretar o que ouve, tornando-se também um possível criador. Tudo isso é uma das mais importantes heranças que

a literatura recebeu.”12

Com a invenção da escrita, as histórias da tradição oral puderam ser registradas e ganharam outro tipo de

permanência. Além disso, as fórmulas de composição dessas histórias modelizaram as outras que foram sendo

criadas e recriadas por escrito. Uma fórmula bastante característica e bem definida é a do conto.

O conto “é um relato em prosa de fatos fictícios. Consta de três momentos perfeitamente diferenciados:

começa apresentando um estado inicial de equilíbrio; segue com a intervenção de uma força, com a aparição de um

conflito, que dá lugar a uma série de episódios; encerra com a resolução desse conflito que permite, no estágio final, a

recuperação do equilíbrio perdido.

Todo conto tem ações centrais, núcleos narrativos, que estabelecem entre si uma relação causal. Entre estas

ações aparecem elementos de recheio, cuja função é manter o suspense. Tanto os núcleos como as ações secundárias

colocam em cena personagens que as cumprem em um determinado lugar e tempo. Para a apresentação das

características destas personagens, assim como para as indicações de lugar e tempo, apela-se a recursos descritivos.

Um recurso de uso frequente nos contos é a introdução do diálogo das personagens, apresentado com os

sinais gráficos correspondentes (os travessões – ou aspas – para indicar a mudança de interlocutor).

10 Estas informações se destinam ao professor, para que, conhecendo as características principais dos textos a serem produzidos em razão dos

projetos, possa preparar intervenções pedagógicas que ajudem os alunos a escreverem melhor. Não devem ser transmitidas diretamente aos

alunos. 11 Irene A. Machado in “Literatura e Redação”, Ed. Scipione (1994). 12 Idem.

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A demarcação do tempo aparece, geralmente, no parágrafo inicial. Os contos tradicionais apresentam

fórmulas características de introdução de temporalidade difusa: ‘Era uma vez...’, ‘Certa vez...’.

Os tempos verbais desempenham um papel importante na construção e na interpretação dos contos. Os

pretéritos imperfeito e perfeito predominam na narração, enquanto que o tempo presente aparece nas descrições e nos

diálogos.

O narrador é uma figura criada pelo autor para apresentar os fatos que constituem o relato, é a voz que conta

o que está acontecendo. Essa voz pode ser de uma personagem, ou de uma testemunha que conta os fatos na primeira

pessoa ou, também, pode ser a voz de uma terceira pessoa que não intervém nem como ator nem como testemunha.

Além disso, o narrador pode adotar diferentes posições, diferentes pontos de vista: pode conhecer somente o

que está acontecendo, isto é, o que as personagens estão fazendo ou, ao contrário, saber de tudo: o que fazem,

pensam sentem as personagens, o que lhes aconteceu e o que lhes acontecerá. Estes narradores que sabem de tudo são

chamados oniscientes.”13

Fábula14

De origem muito antiga, a fábula era escrita em verso até o século XVIII, passando posteriormente a se

expressar em prosa. Era cultivada na Antiguidade Clássica por Esopo – um escravo grego do Século IV a.C. – e por

Fedro – um escritor latino do Século I. A partir de 1668 tornaram-se conhecidas as fábulas de La Fontaine,

considerado o mais importante fabulista dos últimos tempos.

A fábula é uma narrativa curta que, assim como o conto, possui uma fórmula de composição que sobrevive a

todo tipo de modificação. Tem duas características importantes, herdadas da cultura popular: um componente moral –

implícito ou explícito – e uma construção simbólica do enredo, em que os animais agem, sentem e pensam, em geral,

à semelhança dos seres humanos.

A moral, que tradicionalmente encerra o texto, costuma referir-se a comportamentos humanos genéricos ou

experiências vividas por todos os seres humanos: por esta razão, os personagens das fábulas não têm nomes, não são

individualizados. A moral geralmente reproduz um provérbio, o que revela o parentesco da fábula com a tradição

oral. O provérbio é uma criação anônima da cultura oral que encerra uma experiência e têm característica literária; é

uma fala sem sujeito, sem autor nem tempo, porque não é criação de um indivíduo, mas da linguagem de uma

comunidade. Os provérbios são textos facilmente memorizados porque apresentam construções verbais propícias a

essa finalidade: frases curtas com um mesmo tipo de estrutura sintática, linguagem figurada, trocadilhos, rimas, ritmo

melodioso etc.

13 Ana Maria Kaufman e Maria Elena Rodriguez in “Escola, leitura e produção de textos”, Ed. Artes Médicas/1995. 14 Serviram de fonte bibliográfica para esta definição os autores Massaud Moisés (1988) e Irene A. Machado (1994), cujas definições encontram-

se respectivamente nas seguintes publicações: “Aprender e ensinar com textos” Vol. 2 – da trilogia coordenada por Lígia Chiappini – Editora

Cortez (1997) e “Literatura e Redação”, Ed. Scipione (1994).

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Crônica

Para compreender melhor a natureza da crônica brasileira é preciso conhecer o contexto em que ela nasceu.

Em meados do século passado, muitos escritores só tinham oportunidade de publicar suas criações literárias em

jornais (na ocasião, muitos romances foram publicados em capítulos nos folhetins15) e vários deles acabavam

desenvolvendo outras atividades na imprensa da época. Essa circunstância, em que se misturava notícia e literatura,

talvez tenha sido a maior responsável pelo surgimento da crônica em nosso país.

Assim, a crônica surgiu no Brasil (na verdade, no Rio de Janeiro), como um gênero jornalístico, na segunda

metade do século XIX, à época do romantismo e do desenvolvimento da imprensa. “A princípio, com o nome de

folhetim, designava um artigo de rodapé sobre assuntos do dia – políticos, sociais, artísticos, literários. Aos poucos

foi encurtando e se afastando da intenção de informar e comentar. Sua linguagem tornou-se mais poética, ao mesmo

tempo que ganhou uma certa gratuidade, pois parecia desvinculada dos interesses práticos e das informações que

caracterizam as demais partes de um jornal. Do folhetim para cá, a crônica ganhou prestígio entre nós e pode-se até

dizer que constitui um gênero brasileiro, tal a naturalidade e originalidade com que aqui se desenvolveu.”16

A crônica é uma manifestação de linguagem que faz com que acontecimentos simples do cotidiano

transformem-se em literatura. Na verdade, é “um gênero híbrido que oscila entre a literatura e o jornalismo. A

crônica é resultado da visão pessoal, subjetiva do cronista diante de um fato qualquer, colhido no noticiário do jornal

ou no cotidiano. É uma produção curta, apressada, redigida numa linguagem descompromissada, coloquial, muito

próxima do leitor. Registrando o circunstancial do nosso cotidiano mais simples, acrescentando, aqui e ali, fortes

doses de humor, sensibilidade, ironia, crítica e poesia, o cronista, com graça e leveza, proporciona ao leitor uma visão

mais abrangente que vai muito além do fato; mostra-lhe, de outros ângulos, os sinais de vida que diariamente

deixamos escapar.”17 “Tanto como registro do passado quanto como flagrante do presente, a crônica é sempre um

resgate do tempo.”18

Como gênero que pertence tanto ao jornalismo como à literatura, a crônica tem uma característica difícil de

encontrar em outros gêneros: a ambiguidade. Diferentemente dos contos e fábulas que possuem uma estrutura textual

própria, característica: “a estrutura da crônica é uma desestrutura; a ambiguidade é sua lei. A crônica tanto pode ser

um conto, como um poema em prosa, um pequeno ensaio, como as três coisas simultaneamente. Os gêneros literários

não se excluem: incluem-se.”19 A crônica permite “ao prosador que seja também poeta, ao jornalista que seja filósofo

ou místico, ao contador de casos que seja um historiador do cotidiano...”20

Há inúmeros tipos de crônica e classificá-las é sempre um risco, pois significa classificar o indefinível, o

que, em si é uma contradição. No entanto, com a ressalva de que todos os tipos se misturam, fundindo traços

característicos uns dos outros, de que não são puros porque nenhum gênero é, transcrevemos uma classificação de

alguns tipos, com finalidade puramente referencial. São eles: “a crônica narrativa, cujo eixo é uma história, o que a

aproxima do conto; a crônica metafísica, constituída de reflexões mais ou menos filosóficas sobre os acontecimentos

ou os homens; a crônica-poema em prosa, de conteúdo lírico, mero extravasamento da alma do artista ante o

15 Segundo Ilka Laurito in “Crônica: história, teoria e prática”: Folhetim era um espaço livre no rodapé dos jornais do século passado, destinado a

entreter o leitor e a dar-lhe uma pausa de descanso em meio a enxurrada de notícias graves e pesadas que ocupavam as páginas dos jornais. Com

o tempo, a acolhida do público com relação a esse espaço foi aumentando e o folhetim passou a ser um chamariz para atrair leitores. 16 William R. Cereja e Thereza A. C. Magalhães in “Português: linguagens - literatura, gramática e redação”, Ed. Atual. 17 Idem. 18 Ilka Laurito. 19 Millôr Fernandes. 20 Flora Bender in “Crônica: história, teoria e prática”, Ed. Scipione (1993).

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espetáculo da vida, das paisagens ou dos episódios para ele significativos; a crônica-comentário dos

acontecimentos”21.

Um gênero tão aberto “à experimentação da linguagem não poderia de modo algum reprimir as expressões

da linguagem popular cotidiana como palavrões, gírias, xingamentos e alguns tipos de expressões grosseiras.

Contudo, é importante lembrar que a crônica é uma elaboração literária: o material linguístico usado pelo autor tem

que contribuir para ampliar o campo de significação da palavra e da ideia e não apenas chocar o leitor.”22

Algumas características mais: o foco narrativo pode ser de primeira ou terceira pessoa (e até mesmo

segunda, dependendo do caso). Pode acontecer de o sujeito ser indeterminado ao longo de todo o texto. Pode ter

vocativos que se referem ao “leitor” ou que se dirijam a um destinatário especificamente – como em um tipo carta-

resposta, por exemplo. Pode ser um texto com ou sem diálogo. Pode ter os acontecimentos narrados em tempo

presente ou em tempo passado. Qualquer lugar pode ser cenário dos acontecimentos (mas o predomínio é do espaço

urbano). Pode remeter-se a outros textos ou fazer uso deles: títulos, manchetes, notícias, slogans, jargões, provérbios,

frases infelizes ditas por políticos etc. Os elementos descritivos lhe caem bem pois são um recurso privilegiado para

tornar grandioso o até então despercebido. Também lhe cai bem um tom intimista, que cria cumplicidade com o

leitor (um recurso característico, inclusive). De um modo geral, pode-se dizer que são características desse gênero o

pitoresco, a crítica, o humor, o lirismo, a paródia; e que, nesse caso, os grandes heróis – quando existem – são os

seres humanos comuns (os reles mortais) que vivem episódios casuais do cotidiano.

A crônica, na verdade, pode muito. E, evidentemente, o cronista também. Mas “é paradoxalmente dono e

prisioneiro de sua liberdade. Livre para escrever o que quiser e escravo de um papel a ser preenchido. E dessa

dualidade, dessa tensão é que emanam os grandes textos, não mais puramente jornalísticos mas da melhor qualidade

literária.”23

E talvez tenha sido a obrigação do cronista escrever para o jornal, aliada à eventual falta de assunto, que

tenha feito surgir um tipo peculiar e muito interessante de crônica: a que trata dela própria – a crônica da crônica.

Aquela em que o autor realiza um exercício de metalinguagem: reflete sobre o ato de escrever, analisa criticamente o

gênero, sua relação com o leitor, a própria criação...

21 Afrânio Coutinho. 22 Irene A. Machado in “Literatura e Redação”, Ed. Scipione (1994). 23 Flora Bender.

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Algumas questões metodológicas

Abaixo estão relacionados alguns “cuidados metodológicos” e algumas sugestões para viabilizar os projetos

propostos e boas práticas relacionadas a eles.

Uma questão importante que merece ser tratada diz respeito à capacidade de produzir bons textos escritos. A

concepção de que, é ao aprender a ler e escrever, que o aluno torna-se capaz de produzir textos já não se sustenta

mais. Trata-se de processos diferentes. Um analfabeto pode produzir textos como os escritos sem saber escrever – é o

que faz quando dita cartas, às vezes com expressões bastante formais, características da linguagem escrita, como

‘Venho por meio desta missiva...’, ‘Esperamos encontrar a todos gozando de bom estado de saúde...’ etc. E uma

pessoa que tenha aprendido a ler e escrever pode não ser capaz de produzir textos que não os funcionais do convívio

cotidiano: recados, bilhetes, agenda de compromissos... (às vezes até mesmo a situação de preencher um formulário

torna-se assustadora). Ou seja, é possível produzir textos sem saber escrever e saber escrever mas não produzir

textos.

É fundamental, portanto, que possamos ajudar nossos alunos tanto a ler e escrever como a redigir diferentes

tipos de texto. Algumas possibilidades estão descritas a seguir.

A leitura e sua importância para a produção de textos

Para produzir bem os diferentes tipos de textos é preciso conhecê-los (e a seus portadores), tanto por meio da

leitura com da análise de suas características. Para isso é necessário ler muito para os alunos nas diferentes séries

(quando isso ocorre na escola, frequentemente é apenas nas séries iniciais); propor que eles leiam diariamente;

analisar com eles as características comuns a vários textos de um mesmo gênero (não colocar, a priori, a

caracterização, mas solicitar que eles próprios analisem para depois discutir coletivamente e sistematizar alguns

aspectos identificados com a ajuda do professor); pedir que analisem os próprios textos tendo como critério esses

aspectos identificados; propor que escrevam e submetam sua escrita à avaliação do professor e dos colegas

considerando os aspectos que precisam estar garantidos (em função do que se pretende dizer, do tipo de texto e do

interlocutor a que se destina); mostrar a eles que ler para revisar é diferente de ler simplesmente (numa leitura o

que se busca são as inadequações e na outra é o significado); ensiná-los a revisar seus próprios textos e ajudá-los

nessa difícil tarefa; criar situações para que possam incorporar os procedimentos de revisão na produção do

texto; fazer com que revisem textos já escritos há alguns meses para que identifiquem eventuais inadequações e

erros e para que percebam que é possível escrever as mesmas coisas de outro jeito; orientá-los para que façam

rascunhos e que os guardem para poderem analisar o próprio percurso criador; seduzi-los para a escrita de textos

com propostas contextualizadas, funcionais, significativas; ensiná-los que os textos são sempre provisórios... e

que – mesmo assim e por isso mesmo – vale a pena escrevê-los.

A leitura, apesar de, em si, não produzir bons escritores, tem um papel extremamente relevante para a produção

de textos – além, evidentemente, do papel que tem em relação à formação intelectual do aluno e em relação à

própria leitura. Sem muita leitura não se pode produzir bons textos. (Mas com muita leitura e sem intervenção

pedagógica também não – a menos que se tenha um talento bastante especial). Por isso, a primeira providência se

queremos que nossos alunos escrevam bem é organizar o acervo de livros e colocá-lo a seu serviço. É certo que o

Brasil é um país com muitas escolas sem bibliotecas e com muitas bibliotecas escolares fechadas. Mas é também

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um país em que a grande maioria dos professores acha que ler é perder tempo. Se essas situações não mudarem

dificilmente nossos alunos melhorarão sua formação intelectual e sua competência para ler e escrever. A proposta

que se segue já foi validada pelo sucesso e eficácia que teve em várias escolas24, é simples, barata e de fácil

implementação, havendo ou não biblioteca na unidade escolar. Trata-se de um acervo circulante. Faz-se a coleta

e/ou seleção de livros, tendo como critério a qualidade literária e a garantia de diversos textos/livros dos gêneros a

serem trabalhados nos projetos. Coloca-se tudo em uma ou várias caixas e relaciona-se todos os livros que

compõem o acervo, para efeito de controle. O próximo passo é fazer, entre a equipe de professores, um horário

que garanta 20 (ou 30) minutos de leitura diária em todas as classes, organizar o esquema de pegar e passar

adiante o acervo, e se convencerem todos de que esse será um tempo ganho e não perdido. Depois é só começar.

A proposta é de que o horário seja rigorosamente respeitado para não atrapalhar a rotina do próximo professor a

receber o acervo e, por isso, os alunos devem parar a leitura aonde estiverem – no dia seguinte os livros virão

novamente e eles poderão continuar lendo. Enquanto os alunos leem, o professor deve fazer a mesma coisa: nada

de “aproveitar o tempo” para outras atividades (e nada de dispensar o acervo “porque hoje eu tenho coisas mais

importantes a propor para a classe”). A condição principal para o sucesso dessa proposta é a disciplina para

realizá-la diariamente. Assim se garante uma prática permanente de leitura de livros na classe – fora todas as

outras que se pode planejar. Além disso é importantíssimo montar um acervo de materiais de leitura da classe,

que inclui outros impressos além dos livros. Isso pode ser feito com doações das famílias, da comunidade, dos

amigos etc. Mas se houver necessidade e possibilidade dos alunos comprarem um livro para compor esse acervo é

fundamental que cada um traga um título diferente: em uma classe de 36 alunos, por exemplo, se cada um trouxer

um livro diferente, todos terão oportunidade de ler pelo menos 36 livros, considerando apenas o acervo da classe.

A vantagem dessa proposta é que assim é possível o empréstimo para leitura em casa.

A leitura e a sua “insuficiência” para a produção de textos

Mas a capacidade de produzir os próprios textos não brota naturalmente da experiência como leitor. A leitura

oferecer os modelos de referência, a análise coletiva das características comuns aos gêneros potencializa o uso

desse conhecimento na própria criação, mas são as propostas de produção de textos, a intervenção do professor

quando os textos estão sendo e quando já foram escritos, e as situações de revisão propostas durante e após a

escrita, que vão contribuir decisivamente para melhorar a capacidade de redigir dos alunos. As sugestões a seguir

são apenas algumas possibilidades de trabalho nesse sentido:

- É muito importante apresentar aos alunos diferentes versões de uma mesma história. Isso mostra que um

mesmo conteúdo pode ser escrito de diferentes formas e que eles também podem escrever da sua maneira.

Mostra também alternativas de começo, de final, de descrição de lugares, de enfoque, de perspectiva

narrativa...

- As situações de rescrita de texto ou de produção parcial (a partir de um início dado, de um final ou

“meio”), se bem encaminhadas pelo professor, permitem que o aluno se esforce por criar modificações em

textos conhecidos. Esse tipo de circunstância também contribui para a reflexão sobre a diversidade de

alternativas de escrita que, espera-se, ajudem-no a produzir seus próprios textos.

24 Escolas estaduais da cidade de Mogi das Cruzes, na Grande São Paulo.

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- A priorização de alguns gêneros na série significa dar um zoom na diversidade e pôr a atenção do aluno

em textos. Nesse sentido, é necessário que o professor estude sobre o gênero para planejar atividades que

realmente foquem a atenção do aluno nas suas características: tipo de linguagem, temáticas principais,

expressões habituais, estrutura textual, recursos gramaticais, possibilidades de pontuação etc. É esse tipo de

atividade que pode se converter em situações de aprendizagem de recursos adequados ao tipo de texto a ser

escrito.

- O trabalho de revisão dos textos tem importância singular: toda pessoa que redige revisa sua escrita

considerando principalmente o que deseja que seu interlocutor entenda. Se houver a possibilidade do uso de

computadores para esse tipo de trabalho não se pode desperdiçar: no computador a escrita possui, ao mesmo

tempo, permanência e provisoriedade – pode-se voltar a ela para modificá-la, fazendo acréscimos e

supressões, sem o “sacrifício” que representa, muitas vezes, apagar todo escrito do papel e reescrever.

- A revisão final dos textos que comporão os livros produzidos em cada projeto deve ser feita pelos alunos

até o limite de suas possibilidades de enxergar as inadequações (evidentemente isso é muito diferente numa

1ª e numa 8ª série). Posteriormente, cabe ao professor realizar a função que, nas editoras, é desempenhada

pelos revisores profissionais: corrigir os aspectos que passaram despercebidos aos autores. Isso porque,

sendo uma publicação, não teria sentido permanecer com erros, mesmo considerando que os alunos

revisaram o máximo que puderam.

- Sempre que for preciso criar ilustrações para os textos é mais adequado que isso ocorra depois deles já

terem sido escritos pois a função da ilustração é ilustrar, não é dar ideias para a escrita nem substitui-la.

- Os textos podem ser resultado de produção individual ou coletiva. No entanto, é preciso analisar

cuidadosamente a pertinência ou não de propostas de parceria considerando a finalidade do texto, o

destinatário, o gênero, a possibilidade da interação entre os alunos ser produtiva etc

- E não se pode perder a perspectiva de aproximar – o mais possível – as condições de produção de texto na

escola das condições reais de produção fora dela. É certo que há situações na escola em que se faz coisas

para aprender a fazê-las, mas se queremos nossos alunos envolvidos com a aprendizagem do que

pretendemos lhes ensinar não podemos nos esquecer que nossas propostas devem fazer sentido para eles.

ENTÃO...

Dentre as várias modalidades organizativas de atividades e conteúdos escolares, os projetos têm a vantagem de

favorecer o engajamento dos alunos porque representam um “empreendimento” em função do qual todos trabalham.

Um projeto só faz sentido quando responde às necessidades de aprendizagem dos alunos. São, portanto,

fundamentalmente os objetivos da área de Língua Portuguesa que devem referenciar sua escolha e servir de critério de

avaliação da sua pertinência.

Um projeto que implica na produção de narrativas por todos os alunos da escola se justifica pela importância que têm

os gêneros narrativos no ensino de Língua Portuguesa. Mas precisa responder aos objetivos específicos da série; por

isso, nesse caso, a proposta não é de a escola toda trabalhar com o mesmo tipo de texto: alguns são potencialmente mais

adequados de serem produzidos em determinadas séries do que outros.

O conhecimento sobre o texto a ser produzido, necessário ao professor, é diferente e muito superior ao que é necessário

ao aluno.

Alguns cuidados metodológicos são imprescindíveis quando a finalidade é ensinar os alunos a produzirem bons textos

sem descaracterizar a linguagem enquanto objeto sociocultural.

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2. Algumas questões ou perguntas prévias

Os projetos, enquanto forma de articular os conteúdos e atividades escolares, não fazem parte da tradição

pedagógica brasileira. Por essa razão, frequentemente, a possibilidade (ou necessidade) de fazer projetos soa-nos

estranha, pouco atraente e extremamente trabalhosa. Na verdade, os projetos não são “bichos-de-sete-cabeças”.

Quando estamos convencidos de que representam boas alternativas didáticas e nos dispomos a realizá-los, o que na

verdade precisamos é de referência de como planejá-los e organizá-los. Porque não há, possivelmente, maior espaço

de aprendizagem para um professor do que a realização de projetos com seus alunos, frutos da criação de todos e de

cada um dos atores disso que é, na verdade, um grande texto coletivo.

Sendo assim, a questão que se coloca é Como viabilizar a proposta? Definido o projeto – e

consequentemente o produto final25 – é preciso levantar previamente desde as dificuldades mais elementares até as

enormes vantagens que ele oferece. Um planejamento cuidadoso, muitas vezes, revela a inviabilidade momentânea do

projeto escolhido, indicando as providências necessárias de imediato. Ou seja, é possível, por exemplo, concluir que

a excelente ideia que se teve só poderá tornar-se viável no semestre seguinte, o que demandará um trabalho de

preparo até então. Nessas circunstâncias há que se fazer um plano para a viabilização da ideia – pois não teria

sentido desistir de algo, considerado adequado aos objetivos que se tem, pelo fato das condições de realização não

estarem todas dadas a priori.

É preciso identificar as eventuais dificuldades, por exemplo: acervo incompleto ou inexistente, quantidade

insuficiente de pessoas para ajudarem na infraestrutura da produção final dos livros (quando o projeto é produzi-los),

falta dos equipamentos necessários (quando for o caso), trabalho adicional dos professores etc. Essas dificuldades

devem ser postas na categoria de necessidades,26 para as quais se identifica as devidas providências. E isso,

necessariamente, deve ser resultado da discussão entre todos os educadores responsáveis pela realização do projeto –

e quando for pertinente, essa discussão deve ser “reproduzida” com os alunos. Seguem alguns exemplos das

previsões que uma proposta como a do projeto NARRATIVAS LITERÁRIAS requer.

NECESSIDADES PROVIDÊNCIAS/ENCAMINHAMENTOS

Compor um acervo de livros ou

ampliar o já existente.

Levantamento do material disponível.

Organização de campanha de arrecadação de fundos para compra do acervo.

Realização de feira de livros que implique em doação para a escola.

Realização de outros tipos de evento para angariar fundos para a compra do

material necessário.

Dispor de recursos materiais

necessários.

Listar tudo que é necessário (quantidade de papel, equipamentos, recursos para

impressão, recursos humanos para a colaborar com a infraestrutura etc).

Discutir possíveis soluções ou alternativas com os responsáveis diretos.

Colaboradores internos. Divisão de tarefas entre a equipe da escola.

25 Como o produto final é a razão de ser de um projeto, definir um projeto é definir seu produto final. 26 Quando identificamos algo como necessidade, nossa tendência é buscar atendê-la. Quando identificamos como dificuldade, nossa tendência,

muitas vezes, é utilizar isso como justificativa para o não-fazer.

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Colaboradores externos. Identificação de colaboradores potenciais na comunidade (pais, comerciantes que

possam contribuir financeiramente, pessoas conhecidas que possam ajudar etc)

Contato direto ou através de correspondência.

3. Preparação para o projeto

Encaminhadas as providências com vistas a viabilização do projeto, o próximo passo é planejar o seu

desenvolvimento. Em um projeto como o NARRATIVAS LITERÁRIAS – e em qualquer outro da área de Língua

Portuguesa – isso implica em:

Relacionar os objetivos específicos do projeto inicial: se os objetivos de Língua Portuguesa definem o projeto,

esse define outros objetivos que lhe são específicos. Por exemplo, o desenvolvimento da capacidade de produzir

bons textos narrativos no Ciclo Inicial referencia a escolha de um projeto como o Di-versões de Chapeuzinho

Vermelho que, por sua vez, define como objetivos que os alunos sejam capazes de: reconhecer as diferenças

essenciais entre versões distintas da mesma história, analisar a qualidade literária das diferentes versões, produzir

uma versão própria da história etc.

Detalhar os conteúdos e atividades de Língua Escrita (leitura e produção de texto), de Língua Oral e de Análise

Linguística.

Articular esses conteúdos com os demais a serem trabalhados na área de Língua Portuguesa, não tratados no

projeto.

Planejar algumas intervenções necessárias considerando os objetivos e conteúdos definidos.

Precisar as condições do “portador”: se o produto final vai ser um livro, uma apresentação pública, uma fita

cassete ou de vídeo ... como deverá “ficar”?

Prever o tempo de duração do projeto, considerando todas as variáveis já identificadas: data de início possível,

tempo estimado para o trabalho com todos os conteúdos previstos e atividades necessárias, data de finalização do

produto. Esse é um aspecto fundamental de qualquer projeto: o controle do tempo. Nesse sentido é importante

ENTÃO...

Um projeto é um espaço privilegiado de aprendizagem e gratificação não só para os alunos mas também para os

professores.

Antes de dar início a qualquer projeto é preciso planejá-lo cuidadosamente: considerar as dificuldades, as possíveis

soluções e os encaminhamentos necessários.

Um projeto que envolve toda a escola só se torna viável se for discutido e planejado coletivamente.

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levar em conta o tempo necessário para o atendimento das necessidades identificadas e o tempo verdadeiramente

disponível até o término do trabalho.27

Relacionar os conhecimentos que precisarão ser aprofundados (pelo professor) considerando os objetivos e

conteúdos definidos para o projeto. Em muitos casos será necessário estudar melhor o tipo de texto a ser

trabalhado. É importante que isso ocorra antes do trabalho ter início e também durante a sua realização, conforme

surgem as demandas. Por exemplo, para contribuir com a qualidade do texto dos alunos que não produzem bem, é

preciso sugerir a eles melhores alternativas de uso da linguagem. Se o projeto for de criação de fábulas, será

necessário ao professor conhecer bem o gênero, seja através da leitura pessoal de muitas fábulas e análise de suas

características, seja pela leitura e discussão (com os colegas que também desenvolvem o mesmo projeto) de

algum subsídio a respeito, seja pela discussão com um professor ou especialista que tenha maior conhecimento

sobre o assunto. Outro exemplo: se já se sabe que uma das grandes dificuldades dos alunos é o uso da pontuação,

será preciso estudar sobre o sistema de pontuação para poder ajudá-los – até porque, em se tratando de textos

literários, muitas vezes a pontuação comporta inúmeras possibilidades28.

Organizar um instrumento funcional de registro do projeto.

Organizar os recursos didáticos para as diferentes etapas do projeto (por exemplo: diferentes papéis e lápis que

serão usados, equipamentos necessários, gravuras que podem servir como referência etc)

Estabelecer critérios de seleção do material a ser utilizado (por exemplo: diversidade de modelos de texto de um

mesmo gênero e de textos de um mesmo autor, quando for o caso; qualidade da linguagem, do texto, da

ilustrações etc).

Selecionar os materiais necessários: para leitura, para consulta, para análise das características do texto e do

portador, para observação de ilustrações (se for o caso) etc

27 Uma sugestão é organizar uma rotina semanal em que todas as atividades de todas as áreas a serem trabalhadas estejam previstas. Dessa forma

é possível contabilizar o tempo semanal disponível para o trabalho específico com o projeto o que, multiplicado pelas semanas que se têm pela

frente, permite um cálculo mais realista do tempo necessário até a finalização do produto. Nesse sentido, é fundamental considerar também as

variáveis que não dizem respeito diretamente ao projeto e que interferem na sua realização: feriados, semanas de avaliação etc. 28 A literatura é um espaço de transgressão da norma, de criação de possibilidades, inclusive em relação à pontuação.

ENTÃO...

Não é possível desenvolver um projeto sem planejamento prévio.

Todo projeto demanda estudo e pesquisa do professor.

Quanto mais o professor souber sobre o que pretende ensinar, melhores condições terá de planejar intervenções

pedagógicas que favoreçam a aprendizagem.

A boa qualidade do material a ser utilizado é fundamental pois os materiais se constituem em modelos de referência

para os alunos.

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4. Da proposta aos desdobramentos

Compartilhando o trabalho com os alunos

Quanto mais compartilhado for um projeto maiores chances terá de interessar os alunos e comprometê-los

com sua realização. Essa é uma das principais razões para discuti-lo com a classe. Evidentemente, discutir uma

proposta com os alunos não significa submetê-la à sua decisão. Não cabe a eles selecionarem os conteúdos que lhes

serão ensinados – isso é função da escola – mas é muito importante que compreendam a finalidade do trabalho

realizado e que participem da discussão dos seus encaminhamentos. Por isso, é necessário:

Apresentar o projeto à classe: por que foi escolhido, o que está previsto como produto final, alguns conteúdos e

atividades planejadas.

Discutir e planejar com os alunos o “projeto do projeto”: a duração possível, as etapas, a utilização dos recursos

materiais, as providências que lhes dizem respeito, as formas de contato com possíveis colaboradores externos

etc. Esse tipo de discussão, além de possibilitar um maior compromisso com a realização do projeto, permite o

exercício de um procedimento extremamente complexo: planejar coletivamente um empreendimento

considerando todas as variáveis identificadas como relevantes.

Redimensionamento o projeto a partir das contribuições (se for o caso).

Compartilhar com os alunos, ao longo do trabalho, as razões de determinadas alterações em relação ao projeto

definido anteriormente (se houver alterações).

Refletindo sobre o trabalho

Outra variável muito importante para o sucesso de um projeto – e de qualquer trabalho – é a reflexão permanente

dos professores sobre o seu desenvolvimento. É isso que vai permitir a eventuais alterações na rota prevista,

“sacadas” interessantes, aperfeiçoamento em relação à proposta inicial. Além disso, é muito importante também a

pesquisa e discussão dos professores sobre os aspectos que podem contribuir para uma melhor qualidade do

projeto. Para tanto é preciso:

Registrar o planejamento, as observações sobre os desdobramentos, algumas “falas” significativas dos alunos,

as principais dificuldades, os encaminhamentos, os “furos”, as propostas de redirecionamento em função da

dinâmica do trabalho etc

Selecionar subsídios que aprofundam os conhecimentos que vão se mostrando necessários para o professor

e/ou para os alunos (identificados a priori ou durante o desenvolvimento do projeto), estabelecendo

prioridades em função das demandas mais imediatas.

Discutir com os colegas as dúvidas, as dificuldades, as descobertas, os eventuais equívocos, as propostas que

se mostraram mais produtivas, as conquistas...

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5. O mesmo projeto e os muitos jeitos de fazer

Uma mesma proposta certamente tem desdobramentos diferentes. Cada professor tem sua maneira específica

de agir, cada aluno tem necessidades e contribuições peculiares, as interações sociais que se estabelecem criam

sempre novas possibilidades, a interlocução também. Portanto, uma mesma proposta de projeto terá sempre

diferentes trajetórias a cada vez que se realiza: não há experiência cem por cento replicável. É isso que faz a beleza

de uma mesma proposta ter sempre como resultado projetos únicos.

5.1. NARRATIVAS LITERÁRIAS: muito jeitos de fazer...

Um projeto como esse pode vir a constituir-se numa rica experiência de reflexão não só sobre a sua natureza

e mérito, mas também sobre a variáveis que incidem nos resultados de uma proposta pedagógica. Ainda que a

intervenção do professor seja a variável mais importante, questões como a qualidade das atividades, a diversidade de

material, o nível de informação e disponibilidade dos alunos, o uso racional do tempo são outros fatores que

interferem positiva ou negativamente nos resultados de qualquer prática de ensino. É por isso que, quanto mais

abrangente for o planejamento, maiores são as condições de se fazer previsões que ajudem a cercar algumas

eventualidades e esboçar alguns encaminhamentos. Ainda assim, evidentemente, um planejamento bem elaborado

não tem o poder de controlar todo o processo de desenvolvimento dos projetos (ou de qualquer proposta) pois a

dinâmica das relações que se estabelecem, considerando todos os aspectos envolvidos no trabalho, tem um

importante papel – às vezes, decisivo – na direção que vai sendo dada a ele.

A possibilidade de vários professores assumirem o desafio de implementarem a mesma proposta tem a

vantagem de permitir um rico debate sobre questões do tipo: ‘por que na sua classe isso deu certo e na minha não?’,

‘por que meus alunos não se envolveram e os seus estão tão animados, se a proposta é a mesma?’, ‘meus alunos estão

lendo muito, por que será que os seus não?’, ‘consegui bons resultados encaminhando esta proposta dessa maneira –

não seria interessante vocês tentarem algo parecido?’... Sem dúvida, se esse diálogo for se estabelecendo desde o

ENTÃO...

Não é possível a aprendizagem se os alunos não tiverem interesse em aprender. E para despertar seu interesse é preciso

que as propostas pedagógicas sejam significativas para eles, que lhes façam sentido. Compartilhar um projeto contribui

para esse desafio.

Refletir sobre a prática desenvolvida é sempre uma necessidade se estamos preocupados com sua eficácia. Mas se torna

uma condição quando assumimos o compromisso de realizar algo novo. Por isso é extremamente importante o registro

do trabalho, o estudo e a discussão coletiva – recursos fundamentais à reflexão.

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início do trabalho, e de forma permanente, contribuirá para que a equipe de educadores da escola tome nas mãos os

projetos, aprenda com eles, encontre caminhos que só a discussão coletiva pode apontar.

Uma mesma proposta pedagógica, quando realizada por professores diferentes ou pelo mesmo professor em

diferentes momentos (ou para turmas diferentes) terá sempre outros resultados. Sabemos todos disso. Além da

constatação sobre essa maravilhosa e inevitável circunstância, é preciso não se acomodar a ela e extrair as necessárias

lições: o desafio é ir descobrindo (e discutindo coletivamente), dentre todas as variáveis didáticas, quais as que mais

interferiram nos rumos dos projetos.

6. Avaliar para continuar... ou não

Avaliar é o procedimento didático mais importante para tomar decisões. É, portanto, necessário avaliar

continuamente: o que os alunos já sabiam ou não, o que aprenderam ou não, as maiores dificuldades enfrentadas pelo

professor e pelos alunos, o efeito das intervenções pedagógicas na aprendizagem, os aspectos mais significativos do

trabalho, os resultados parciais e o resultado final do projeto...

Ou seja, a avaliação deve incidir sobre três dimensões do trabalho – diferentes, porém complementares: a

aprendizagem dos alunos, os procedimentos didáticos do professor e o projeto propriamente.

A aprendizagem dos alunos deve sempre ser avaliada em relação ao que se pretendia que aprendessem – os

objetivos de ensino. Isso implica em considerar três aspectos fundamentais: os conhecimentos prévios dos alunos em

relação aos conteúdos trabalhados no projeto; os conhecimentos que estão em processo de apropriação durante ou

mesmo após o término do trabalho; e os conhecimentos que os alunos já conseguem fazer uso adequado. Implica

também em elaborar instrumentos de avaliação para cada tipo de situação.

Os procedimentos didáticos do professor devem sempre ser avaliados do ponto de vista de sua eficácia: se

garantiram ou não o efeito pretendido. Nesse sentido, é imprescindível considerar, como variáveis, o desempenho dos

alunos, os objetivos colocados, os encaminhamentos frente as dificuldades encontradas, diferentes encaminhamentos

para o mesmo objetivo.

O projeto, em si, deve constituir-se também em objeto de avaliação: o tema, a duração, os objetivos e

conteúdos, os desdobramentos e todos os demais aspectos cuja análise possa contribuir tanto para seu aprimoramento

como para consolidar uma prática consistente de projetos na escola.

É a avaliação dessas diferentes dimensões do trabalho o que permite verificar a adequação e validade do

projeto desenvolvido e a pertinência ou não de manter a proposta para o período/ano seguinte.

6.1. Re-propor NARRATIVAS LITERÁRIAS?

Certamente uma proposta como essa pode ser desenvolvida mais do que uma vez. Do ponto de vista dos

alunos seria extremamente rico: se considerarmos, por exemplo, a possibilidade da proposta se manter por vários

anos, poderiam participar da elaboração de diferentes livros e produzir, para publicação, vários tipos diferentes de

narrativas literárias.

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Do ponto de vista da relevância dos gêneros sugeridos também se justifica manter uma proposta desse tipo:

as narrativas literárias são fundamentais no currículo escolar e devem ser trabalhados de forma contextualizada.

Mas há que se considerar também a questão do destino e do destinatário da produção final dos projetos.

Talvez não seja adequado, em se mantendo a proposta, que os livros (ou fitas, ou o que for que se defina como

produto final) sejam encaminhados sempre para o mesmo lugar: a biblioteca escolar. É preciso, portanto, discutir

seriamente esse aspecto pois uma das características mais importantes de um projeto é que o aluno sabe, desde o

princípio, quem é o interlocutor real de seus textos e para onde vai o resultado de seu trabalho. Se todo ano a

produção final vai para o mesmo lugar pode tornar-se artificial – e escolar (no mau sentido da palavra). Nesse

sentido, vale lembrar que o produto de um projeto não necessariamente precisa ficar na escola: às vezes o mais

adequado é que salte os muros e ganhe a rua.

Outro cuidado necessário é com a troca de projetos nas séries. Em princípio não tem problema que

determinados projetos passem a outra série. No entanto é preciso verificar se essa modificação não terá como

consequência que os mesmos alunos realizem novamente o mesmo tipo de trabalho.

Entretanto, se há algo que não se pode prever em absoluto, é que uma proposta ainda não realizada vale a

pena ser mantida no futuro. Só é possível definir pela manutenção ou não de um projeto após avaliá-lo em relação aos

objetivos que lhe deram sentido.

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ANEXO 1

Exemplo de planejamento de um projeto29

ÁREA: Língua Portuguesa

TIPO DE PROPOSTA: Projeto de leitura e escrita

NOME DO PROJETO: Di-versões de Chapeuzinho Vermelho

PRODUTO FINAL: Coletânea, em forma de livro, de diferentes versões da história Chapeuzinho Vermelho,

produzidas pelos alunos da classe, em duplas

DESTINATÁRIOS: Pais de alunos30

DURAÇÃO: 4 meses

INÍCIO: agosto

RECURSOS MATERIAIS

livros de histórias

textos que não estão em livros de história

papel pautado, lápis, borracha, lápis de cor, canetas hidrocor, papel sulfite, cartolina...

máquina para reprodução: copiadora ou mimeógrafo.

BIBLIOGRAFIA31

OBJETIVOS32

As atividades propostas neste projeto devem se organizar de maneira que os alunos, progressivamente

tornem-se capazes de:

Ler autonomamente os textos propostos.

Compreender o sentido nos textos ouvidos e lidos.

Produzir textos coesos e coerentes, considerando o destinatário e o objeto da mensagem.

Escrever textos legíveis, preocupando-se com a segmentação, com a forma ortográfica e com a pontuação.

Incorporar, cada vez mais, os procedimentos de revisão no ato de produção de seus textos.

Considerar a necessidade de rascunhos e empenhar-se em produzir os que forem necessários, com ajuda do

professor.

Utilizar a linguagem oral com eficácia em situações do tipo: conversar no grupo-classe ou pequenos grupos,

expressar sentimentos e opiniões, defender pontos de vista, relatar acontecimentos...

Participar das diferentes situações de comunicação oral decorrentes do projeto, acolhendo e considerando as

opiniões alheias e respeitando as diferentes opiniões e formas de expressar ideias e de falar.

29 O instrumento de registro deste projeto pode ser um modelo de referência também para outros projetos. 30 Uma boa proposta de entrega do livro aos pais é em um sábado de autógrafos, sempre que possível, com um chá. 31 A bibliografia encontra-se no Anexo 2. 32 São as capacidades que se pretende desenvolver com este projeto.

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CONTEÚDOS POSSÍVEIS33

Linguagem oral

Participação em situações de intercâmbio oral que requeiram: ouvir com atenção, intervir sem sair do assunto

tratado, formular e responder perguntas, explicar e ouvir explicações, manifestar e acolher opiniões, adequar as

colocações às intervenções precedentes, propor temas.

Exposição oral de sentimentos, experiências, ideias e opiniões, de forma clara e ordenada.

Interesse por ouvir e manifestar sentimentos, experiências, ideias e opiniões.

Preocupação em fazer-se entender, adequando a fala ao nível de conhecimento do interlocutor.

Narração de fatos considerando sequência lógica e cronológica.

Reconto oral buscando aproximação com as características discursivas do texto-fonte.

Descrição de personagens, lugares e fenômenos e objetos que compõem a narrativas lidas/ouvidas.

Leitura

Valorização da leitura como fonte de informação, entretenimento e gratificação.

Cuidado com os livros e demais materiais escritos.

Socialização das experiências de leitura.

Interesse por:

- ouvir textos lidos pelo professor;

- ler diferentes tipos de texto e diferentes versões de um mesmo texto;

- compartilhar opiniões, ideias e preferências (ainda que com ajuda);

- tomar emprestado livros do acervo da classe/escola.

Atribuição de sentido coordenando texto e contexto: interrogar o texto, buscando no contexto elementos para

antecipar ou verificar o sentido atribuído (com ajuda do professor).

Utilização de indicadores para fazer antecipações e inferências em relação ao conteúdo (sucessão de

acontecimentos, paginação do texto, organização tipográfica, etc.).

Emprego dos dados obtidos através da leitura para confirmação ou retificação das suposições de sentido feitas

anteriormente.

Utilização de recursos para resolver dúvidas na compreensão: consulta ao professor ou aos colegas, formulação

de uma suposição a ser verificada adiante, etc.

33 O conceito de conteúdo presente neste artigo é amplo: não diz respeito apenas aos fatos e conceitos, mas também aos

procedimentos/habilidades e atitudes que precisam ser ensinados. Em outras palavras, conteúdo aqui significa tudo que o professor precisa

ensinar ou criar condições para que os alunos aprendam o que se pretende que eles progressivamente saibam ou sejam capazes de fazer. Nesta

relação de conteúdos, conceitos, procedimentos e atitudes aparecem descritos de forma articulada. Serviu de referência para o detalhamento deste

item, os Parâmetros Curriculares Nacionais - Documento de Língua Portuguesa - MEC/1996.

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Produção, revisão e escrita de textos

Planejamento da produção escrita, com ajuda do professor.

Preocupação com a qualidade das produções escritas próprias, tanto no que se refere aos aspectos textuais como à

apresentação gráfica.

Produção de rascunhos até conseguir um texto satisfatório (com ajuda do professor).

Utilização progressiva do conhecimento sobre os seguintes aspectos:

- sistema de escrita (correspondência fonográfica);

- separação entre palavras;

- divisão do texto em frases, utilizando recursos do sistema de pontuação: maiúscula inicial, ponto final,

exclamação, interrogação e reticências;

- separação entre discurso direto e indireto e entre os turnos do diálogo, através da utilização de dois pontos e

travessão ou aspas;

- regularidades ortográficas (inferência das regras) e a constatação de irregularidades (ausência de regras),

principalmente em palavras mais frequente na escrita.

- uso de dicionário e outras fontes escritas impressas para resolver dúvidas ortográficas;

- organização das ideias de acordo com as características de cada gênero;

- substituição do uso excessivo de “e”, “aí”, “daí”, “então”... pelos recursos coesivos oferecidos pelo sistema

de pontuação e pela introdução de conectivos mais adequados à linguagem escrita e expressões que marcam

temporalidade e causalidade;

- recursos descritivos.

Preocupação com a revisão do texto durante e após a produção, considerando a necessidade de compreensão do

leitor.

Releitura de trechos já escrito para manter a coerência do texto e fazer modificações necessárias (com ajuda do

professor).

Consulta durante a escrita (ao professor, aos colegas, aos materiais impressos disponíveis).

Incorporação de sugestões à melhoria do texto (com ajuda do professor).

Revisão global do texto (com ajuda do professor) depois de terminada uma versão aceitável realizando as

reorganizações e correções necessárias.

Solicitação de apreciação crítica a um ou mais leitores (inclusive pessoas que não participam deste projeto)

buscando sugestões para melhorá-lo.

Empenho em realizar as tarefas necessárias para uma boa e bem cuidada apresentação do trabalho final.

Criação de ilustrações relacionadas ao texto escrito.

Análise linguística

Análise da qualidade da produção oral, alheia e própria (com ajuda do professor), considerando a

presença/ausência de elementos necessários à compreensão de quem ouve.

Exploração das possibilidades e recursos da linguagem que se usa para escrever a partir da observação e análise

de textos impressos utilizados como referência ou modelo (com ajuda do professor).

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Em relação ao gênero contos:

Identificação da ordem cronológica e causal na sucessão de acontecimentos.

Reconhecimento de algumas características típicas do tipo de texto: temática, organização interna e vocabulário.

Identificação de regularidades nos contos conhecidos.

Reconhecimento da trama narrativa.

Identificação dos diferentes tempos verbais: presente nos diálogos e pretérito nas narrações.

Diferenciação da linguagem utilizada em contos clássicos e modernos.

Reconhecimento de algumas características literárias de determinados autores.

SEQUÊNCIA DE ATIVIDADES

Apresentação do projeto para os alunos, incorporando sugestões, se houver.

Apresentação dos materiais de leitura já selecionados.

Levantamento de contribuições dos alunos para compor o acervo.

Seleção dos materiais a serem lidos.

Elaboração de um calendário preliminar de leituras a serem feitas pelos alunos e pela professora.

Discussão, após as leituras feitas pelo professor, de algumas características do texto.

Reconto oral após a leitura feita pelo aluno, dos trechos que são diferentes das versões ouvidas – o lugar onde se

passa a história, por exemplo.

Listagem de todos os contos lidos e socializados na classe.

Seleção da versão preferida: os alunos escolhem a história que mais gostaram – o que pode ser critério para a

formação das duplas. A escolha da versão é apenas um referencial para a produção, pois eles poderão introduzir

as modificações que desejarem – por exemplo, escrever a versão dos Irmãos Grimm, mudando o sexo dos

personagens: o Chapeuzinho, o pai, a loba, o vovô, a caçadora...

Definição de tarefas nas duplas: quem vai ditar e quem vai escrever (no caso de haver, na classe, alunos com

escrita não-alfabética, eles podem ser os responsáveis por recuperar o texto oralmente e ditar a um parceiro que já

sabe escrever).

Planejamento do tempo para:

- Escrever as produções: é razoável duas vezes na semana nunca excedendo 30/40 minutos. Uma intervenção

possível é definir antes o que deve se escrito. Por exemplo: “Hoje vamos escrever o começo da história, até a

parte... que a Chapeuzinho encontra o lobo...”

- Revisar o trabalho final: embora a revisão deva ocorrer nos diferentes momentos da produção: durante a

escrita, quando retoma-se o trabalho para dar-lhe continuidade e após a escrita, é ao final que se pode

planejar atividades específicas de revisão do texto com vistas à publicação. É razoável duas vezes por

semana.

- Passar a limpo: é necessário que o trabalho seja passado a limpo mesmo que vá ser datilografado ou digitado:

é importante que os alunos se preocupem sempre com a legibilidade de seus textos e que se defrontem com

um produto final de qualidade (o que dá um outro status aos trabalhos).

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- Ilustrar: a ilustração também merece atenção especial. Também nesse caso é necessário planejamento do que

será feito e de que forma. Se, por exemplo, as produções puderem ser copiadas em xerox, o fato das cópias

serem em preto e branco requer certos cuidados na pintura dos desenhos para que não fiquem pesados.

- Reproduzir os materiais: é uma etapa que consome bastante tempo, principalmente quando coincide com a

reprodução de outros trabalhos; portanto, é preciso considerar essa circunstância, bem como a

disponibilidade das pessoas que ajudarão neste momento.

- Montar o livro: isso pode ser feito com ou sem os alunos, mas, quando com eles, permite a participação em

um momento muito especial: a produção do portador de seus trabalhos.

- Apresentar a leitura aos pais: para o grande dia, são necessários alguns preparativos em relação ao ambiente,

à infraestrutura, à dinâmica do encontro com os familiares, etc.

Observações

1. Se a opção de produto final for de fitas cassete gravadas e não livros, é preciso readequar alguns aspectos deste

planejamento.

2. Procuramos elaborar um registro bem completo de planejamento para que possa servir de referência para outros

projetos. Evidentemente, quando começamos a trabalhar nesta perspectiva, nem sempre conseguimos planejar – e

menos ainda realizar – tudo que está aqui proposto. Mas é possível, em um semestre, trabalhar com todos os

conteúdos aqui propostos, se tivermos claro que a apropriação que se espera é progressiva e não total.

3. As práticas propostas neste texto são implementadas na instituição em que trabalham as autoras.

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ANEXO 2

Bibliografia

Subsídio para os Projetos

A seguir estão relacionados alguns livros e textos como sugestão para o trabalho com dois projetos: aqueles

para os quais consideramos que uma bibliografia de apoio poderia contribuir mais. A bibliografia específica para os

professores (no final) tem como objetivo indicar outras publicações que subsidiam um trabalho didático como o

proposto neste artigo além das especificadas nas notas de rodapé.

1. Subsídios para o Projeto Di-Versões de Chapeuzinho Vermelho

Chapeuzinho Vermelho. In: “Contos de Grimm”, Ed. Paulinas.

Chapeuzinho Vermelho. In: “Contos de Perrault”, Ed. Itatiaia.

Chapeuzinho Vermelho, poesia de Pedro Bandeira.

Chapeuzinho Vermelho de raiva. In: “Criatividade - Redação Escolar”, Mario Prata, Ed. Saraiva.

Mamãe me conta aquela. In: “Treze contos”, Edson Gabriel Garcia, Ed. Atual.

Chapeuzinho Vermelho - texto teatral. In: “Como fazer teatrinho de bonecos”, Maria Clara Machado. Ed.

AGIR

Falsa Avó. In: “Fábula Italiana”, Italo Calvino, Cia. das Letras.

O caçador. In: “Que história é essa?”, Flávio de Souza, Cia. das Letras.

Chapeuzinho Vermelho e o lobo-guará, Angelo Machado, Ed. Melhoramentos.

Chapeuzinho Vermelho e o lobo mau, Pedro Bandeira, Ed. Moderna.

A menina da fita verde, João Guimarães Rosa, Ed. Nova Fronteira.

Peça de Teatro In: “Teatro I”, Maria Clara Machado, Ed. Agir.

Chapeuzinho Vermelho e outros contos de Grimm, Ana Maria Machado, Ed. Agir.

2. Subsídios para o Projeto Histórias que os poetas contam

Berimbau e outros poemas, Manuel Bandeira, Ed. José Olímpio.

Rosa do Povo, Carlos Drummond de Andrade e Mário Quintana, Ed. Record.

Semente de Sol, Carlos Queiroz Telles, Ed. Moderna.

Para gostar de ler, volume 6, poesias, Ed. Ática.

Antologia Poética, Vinicius de Moraes, Ed. Melhoramentos.

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Bibliografia específica para os professores

ALMEIDA, N. M. Gramática metódica da língua portuguesa. 39. ed. São Paulo: Saraiva, 1994.

BROUSSEAU, G. Os diferentes papéis do professor In: PARRA, C. e SAIZ, I. Didática da Matemática - reflexões

psicopedagógicas. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995.

FERREIRO, E. Chapeuzinho Vermelho aprende a escrever, São Paulo: Ática, 1986.

GERALDI, J. W. (org.). O texto na sala de aula: leitura e produção. Cascavel: Assoeste, 1984.

__________. Portos de passagem. São Paulo: Martins Fontes, 1993.

KLEIMAN, A. B. Texto e leitor. Campinas: Pontes/Unicamp, 1989.

__________. Leitura. Ensino e pesquisa. Campinas: Pontes, 1989.

__________. Oficina de leitura. Campinas: Pontes/Unicamp, 1993.

__________. (org.). Os significados do letramento. Campinas: Mercado de Letras, 1995.

KOCH, I. V. e FÁVERO, L. L. A coesão textual. Mecanismos de constituição textual. A organização do texto.

Fenômenos da linguagem. São Paulo: Contexto, 1989.

__________. A coerência Textual. Sentido e compreensão do texto. Fatores de coerência textual. Tipologia de

textos: 2o grau e vestibular. São Paulo: Contexto, 1991.

__________. Linguística textual: introdução. São Paulo: Cortez, 1994.

KOCH, I. V. e TRAVAGLIA, L. C. Texto e coerência. São Paulo: Cortez, 1989.

MORAIS, A. G. Escrever como se deve. In: TEBEROSKY, A. & TOLCHINSKY, L. Além da alfabetização. São

Paulo: Ática, 1995.

PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS, Documento de Língua Portuguesa: MEC, 1996 (no prelo).

REGO, L. L. B. Literatura infantil: uma nova perspectiva da alfabetização na pré-escola. São Paulo: FTD, 1988.

TEBEROSKY, A. Psicopedagogia da linguagem escrita. São Paulo: Trajetória/Unicamp, 1989.

________________. Aprendendo a escrever. São Paulo: Ática, 1994.

________________. Compor textos. In: TEBEROSKY, A. e TOLCHINSKY, L. Além da alfabetização. São Paulo:

Ática, 1995.

TEBEROSKY, A. e CARDOSO, B. (org.). Reflexões sobre o ensino da leitura e da escrita. São Paulo:

Trajetória/Unicamp, 1989.

WEISZ, T. Por trás das letras. São Paulo: FDE, 1992 (4 vídeos didáticos e um livro).