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    UMA INTERPRETAO DE ARIEL A PARTIR DE KOSELLECK E

    LACAPRA

    RENATA BALDIN MACIEL

    Mestranda do PPG-Histria UFSM

    [email protected]

    Introduo

    Jos Enrique Rod (1871-1917) foi um intelectual uruguaio nascido em

    Montevidu. Destacou-se como ensasta, crtico, jornalista, educador e poltico.

    Conquistou projeo internacional aps a publicao de Ariel (1900). Rod foi um dos

    principais membros da gerao dos 9001 da literatura uruguaia e deixou como legado o

    movimento que ficou conhecido como arielismo.

    Rod preocupo-se com a histria da nao e relatou as situaes que

    ameaaram s soberanias nacionais, tais como o imperialismo dos Estados Unidos, o

    esprito utilitrio e a degenerao da democracia.

    A obra Ariel (1900) constitui o cerne dessa discusso, porm considerando a

    necessidade de uma anlise que contemple o corpus do escritor, seus principais

    fundamentos foram comparados s obras Motivos de Proteo (1909), Liberalismo y

    Jacobinismo. La expulsin de los crucifijos (1906) e a alguns textos escolhidos do livro

    El Mirador de Prspero (1913).

    Esse trabalho foi constitudo a partir de uma perspectiva eu privilegia a anlise

    interna das obras de Rod. Essa noo envolve a problematizao das ideias contidas

    nas obras do autor, ou seja, as interpretaes partem do que est contido no texto, das

    direes sugeridas pelo prprio Rod em sua narrativa. Dessa forma, os aspectos da

    cultura, poltica ou sociedade da poca de Rod e sua relao com as obras no faro

    1 Nova promoo de escritores uruguaios, cronologicamente equivalente a gerao de 98 na Espanha.

    Possui como principal preocupao o destino nacional e da Amrica. Ver: Jos Enrique Rod. Obras

    Completas. Introduo, p.67-79. Produo que se insere no contexto do processo de modernizao do

    Uruguai. Gerao que produzem uma literatura que visa responder ao novo Uruguai, que surge a partir

    das primeiras dcadas do sculo XX com o modelo bastllista (seu projeto defendia a cincia como base

    de uma conduta racional com base na justia distributiva .e eliminao da pobreza. Ver tese de Elvira

    Blanco Blanco, La creacin de um imaginario. LaGeneracin literrio del 45 en Uruguay, p.21-22.

    mailto:[email protected]

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    parte desse artigo, pois inserem-se no que pode ser chamado de anlise externa que

    contempla outros nveis de interpretao dos textos histricos.

    O eixo interpretativo desse trabalho remete a filosofia da Histria rodoniana.

    Esta foi discutida a partir do corpus do escritor a fim de perceber as continuidades ou

    rupturas no seu pensamento histrico.

    Proposies tericas: Koselleck e LaCapra

    As noes de espao de experincia, de horizonte de expectativa, de tempo

    histrico e de progresso trabalhadas por Reinhart Koselleck (2006) so fundamentais

    como guia terico-metodolgico para abordagem proposta. Como possibilidade para

    interpretar a histria, Koselleck construiu duas categorias: espao de experincia e

    horizonte de expectativa, que, como categorias histricas, equivalem s de espao e

    tempo. Koselleck definiu a experincia como sendo o passado atual, no qual

    acontecimentos foram incorporados ou podem ser lembrados. Na experincia

    encontram-se as elaboraes racionais e as formas inconscientes de comportamento,

    nela, por exemplo, esto contidas as experincias de geraes anteriores que os

    indivduos incorporam em suas vidas. A partir desse raciocnio, o autor conclui que a

    prpria histria pode ser entendida como uma forma de conhecimento construdo por

    experincias alheias. Em relao expectativa, Koselleck afirmou que ela est ligada

    pessoa e ao interpessoal e que se realiza no hoje. Essa pode ser vista como um futuro

    presente, voltado para o que ainda no aconteceu ou ao que pode ser apenas previsto.

    Koselleck salientou que apesar desses conceitos se relacionarem, eles no so

    complementares, pois apresentam formas bem diferentes. Segundo o autor, passado e

    futuro jamais coincidem, assim como, uma expectativa jamais pode ser deduzida

    totalmente da experincia. Para o autor, a experincia realizada torna-se completa na

    medida em que suas causas so passadas enquanto que a experincia futura, antecipada

    na forma de expectativa, se decompe em uma infinidade de momentos temporais. O

    que Koselleck tentou mostrar que h diferenas entre a presena do passado e a do

    futuro. A principal delas encontra-se no fato de que presena do passado espacial e

    no pode ser cronologicamente mensurvel, ela no cria continuidade no sentido de uma

    elaborao ativa do passado.

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    Como horizonte de expectativa, Koselleck compreendeu uma espcie de linha

    que gera no futuro um novo espao de experincia que ainda no pode ser contemplado.

    As expectativas podem ser revistas enquanto as experincias realizadas so recolhidas e

    podem ser repetidas e confirmadas no futuro. O que distingue uma da outra o fato da

    experincia ter elaborado acontecimentos passados podendo torn-los presentes. Em

    suma, experincia e expectativa no so conceitos opostos, mas possuem caractersticas

    distintivas cujas tenses resultam no chamado tempo histrico.

    Essas duas categorias indicam a condio humana universal, ou seja, tanto a

    experincia quanto a expectativa fornecem os subsdios necessrios para lidarmos com

    o tempo histrico, pois ambas entrelaam passado e futuro. Esses conceitos permitem

    que a histria avance e que o nosso conhecimento histrico decifre a execuo concreta

    da histria. Pode-se dizer que experincia e expectativa remetem temporalidade do

    homem, e meta-historicamente a prpria temporalidade da histria. O tempo histrico

    entendido a partir da relao dinmica entre experincia e expectativa. Para Koselleck a

    Histria (Geschichte), se tornou disponvel ao homem quando do ponto de vista

    histrico-lingustico as vrias histrias (Historie), se transformaram em uma nica

    Histria (Geschichte), o que indicaria um novo espao de experincia e um novo

    horizonte de expectativa. Ele afirmou que o tempo histrico embora esteja ligado ao

    tempo natural, no coincide com o mesmo, pois est muito mais atrelado ao mbito

    poltico e social. Esse tempo seria, portanto, fruto das experincias e expectativas de

    homens e instituies cujas aes engendram no um tempo nico e universal como o

    proporcionado pela cronologia, mas diversos ritmos temporais que lhes so prprios.

    Em suma, o tempo histrico seria ento, resultado da tenso entre experincias e

    expectativas; tenso essa que pode ser analisada atravs da relao histrica entre

    passado e futuro.

    Sobre essa relao do tempo com a natureza e a cronologia, Norbert Elias e

    Benedict Anderson fizeram importantes contribuies. Norbert Elias (1998) chamou a

    ateno para o fato de que a preeminncia da fsica do ponto de vista naturalista

    relativamente recente, visto que at a poca de Galileu o tempo ou mesmo a natureza

    centrava-se nas comunidades humanas. Em suma, o tempo servia aos homens como

    forma de orient-los na sociedade e como modo de regulao de sua coexistncia. Foi

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    somente h pouco tempo que os relgios passaram a desempenhar um papel importante

    no estudo dos fenmenos naturais. Para o autor, a experincia humana do que

    chamamos "tempo" modificou-se ao longo do passado, e continua a se modificar no de

    um modo histrico ou contingente, mas de modo estruturado, orientado e, como tal,

    passvel de explicao. Enquanto isso, Benedict Anderson (2008) ao discutir as origens

    do nacionalismo sustentou que a possibilidade de analisar a nao historicamente surgiu

    quando e onde trs2 concepes culturais perderem domnio sobre a mentalidade dos

    homens. A terceira delas remete a uma concepo da temporalidade em que a

    cosmologia e a histria se confundem. A noo de simultaneidade foi substituda pelo

    que Walter Benjamin chamou de tempo vazio e homogneo em que a simultaneidade

    cruza o tempo, marcada no pela prefigurao e pela realizao, mas pela coincidncia

    temporal, medida pelo relgio e pelo calendrio.

    a partir da relao ou tenso entre experincias e expectativas que o discurso

    de Rod pode ser investigado. Seu horizonte de expectativa est baseado em uma

    confiana no futuro, que abrir as portas para a condio de progresso.

    Para Koselleck a concepo de progresso na modernidade determinou a

    diferena entre a experincia e a expectativa. Segundo o autor, esse conceito foi criado

    no sculo XVIII, em um momento onde procurou-se reunir um grande volume de novas

    experincias dos trs sculos anteriores. Esse progresso visto como nico e universal

    fundamentava-se em inmeras experincias novas individuais de progressos setoriais

    que interferiam cada vez mais na vida das pessoas. Esse progresso aglutinava

    experincias e expectativas afetadas pelo tempo. Um novo grupo, um pas, uma classe

    social tinham conscincia de estar frente dos outros, ou ento procuravam os outros ou

    ultrapass-los (KOSELLECK, 2008, p.317). Foi por essa via que o Imperialismo se

    justificou, tendo em vista que aqueles povos possuam um grau superior de civilizao

    julgavam-se no direito de dirigir os povos menos desenvolvidos. Enfim, compreende-se

    que essa concepo de progresso estava direcionada para uma transformao ativa do

    mundo e no mais do alm, tal como anteriormente propunha a expectativa crist de