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1 Uma Catequese de Inspiração Catecumenal Palestrante: Pe. Guilhermo Daniel Micheletti Introdução: A atual situação social requer atenção à situação de (passar) da pertença aceita e não questionada, a uma participação escolhida, alicerçada numa decisão consciente e que se desenvolva gradualmente (Episcopado de França). O Papa Francisco [2013], afirmava que nos encontramos numa nova etapa evangelizadora, que deve estar marcada pela alegria e deve indicar rumos novos para a caminhada da Igreja. Diz ainda, é urgente a revisão de todos os processos de transmissão da fé. É um desafio que interpela a todos e realiza-se, fundamentalmente, em três âmbitos: da pastoral ordinária, dos batizados que não vivem as exigências do Batismo e daqueles que não conhecem ou recusam o Evangelho. Isto implica tomar a sério cada pessoa e o projeto que Deus tem para ela. De fato, durante um longo período da sua história, a Igreja “ficou acomodada”, apoiada na “cristandade”. Hoje, precisamos de novos processos de conversão pastoral e de aprendizagem. “É lamentável que, por séculos, a Igreja, na ilusão de que o mundo todo já fora evangelizado e que a sociedade fosse cristã, tenha descurado a Iniciação” [Antônio Almeida] A revisão dos processos de transmissão da fé é um desafio que interpela a todos. É necessário pensar e construir um novo paradigma pastoral. É exigência do nosso tempo. Vivemos à procura de respostas sobre a vida, seu sentido e, no fundo, sobre nós mesmos. Queremos saber quem somos, por que estamos neste mundo, que sentido têm as escolhas que a vida exige de nós. Há anseios no coração humano que apontam a sede de Deus. Na mudança de época em que nos encontramos, a opção religiosa é uma escolha pessoal. Já não é mais uma tradição herdada desde o núcleo familiar. Hoje se evangeliza por atração. Já na publicação do Diretório Nacional de Catequese [2006] a Igreja optou por motivar a importância da catequese inspirada no processo catecumenal... Em 2009, foi publicado o Estudo 97 sobre a IVC, oferecendo oportunas sugestões para a IVC.

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Uma Catequese de Inspiração Catecumenal

Palestrante: Pe. Guilhermo Daniel Micheletti

Introdução:

A atual situação social requer atenção à situação

de (passar) da pertença aceita e não questionada,

a uma participação escolhida, alicerçada numa

decisão consciente e que se desenvolva

gradualmente (Episcopado de França).

O Papa Francisco [2013], afirmava que nos encontramos numa nova etapa

evangelizadora, que deve estar marcada pela alegria e deve indicar rumos novos

para a caminhada da Igreja. Diz ainda, é urgente a revisão de todos os processos

de transmissão da fé.

É um desafio que interpela a todos e realiza-se,

fundamentalmente, em três âmbitos: da pastoral

ordinária, dos batizados que não vivem as

exigências do Batismo e daqueles que não

conhecem ou recusam o Evangelho. Isto implica

tomar a sério cada pessoa e o projeto que Deus

tem para ela.

De fato, durante um longo período da sua história, a Igreja “ficou acomodada”,

apoiada na “cristandade”.

Hoje, precisamos de novos processos de conversão pastoral e de aprendizagem.

“É lamentável que, por séculos, a Igreja, na ilusão de que o mundo todo já fora

evangelizado e que a sociedade fosse cristã, tenha descurado a Iniciação” [Antônio

Almeida]

A revisão dos processos de transmissão da fé é um desafio que interpela a todos.

É necessário pensar e construir um novo paradigma pastoral. É exigência do

nosso tempo.

Vivemos à procura de respostas sobre a vida, seu sentido e, no fundo, sobre nós

mesmos. Queremos saber quem somos, por que estamos neste mundo, que

sentido têm as escolhas que a vida exige de nós. Há anseios no coração humano

que apontam a sede de Deus.

Na mudança de época em que nos encontramos, a opção religiosa é uma escolha

pessoal. Já não é mais uma tradição herdada desde o núcleo familiar. Hoje se

evangeliza por atração.

Já na publicação do Diretório Nacional de Catequese [2006] a Igreja optou por

motivar a importância da catequese inspirada no processo catecumenal...

Em 2009, foi publicado o Estudo 97 sobre a IVC, oferecendo oportunas sugestões

para a IVC.

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Aprendamos da história:

Hoje somos desafiados a promover um novo encontro luminoso, um novo diálogo,

com novos interlocutores, reconhecendo que nos encontramos num momento

histórico de transformações profundas e de interlocuções novas.

O Documento de Aparecida fala deste momento como de “mudança de época”.

Jesus formou discípulos e discípulas, instruindo-os com a sua

original atitude de acolhida, de compreensão e de valorização

das pessoas, principalmente, as marginalizadas.

A vida de Jesus transformou de tal modo essas mulheres e

esses homens que, aos poucos, foram compreendendo que a

salvação cristã é vida concreta, existência quotidiana, de

relação pessoal com Deus e com os irmãos e irmãs.

É, também, libertação das injustiças e das limitações

humanas. A expressão ‘novo’ é fundamental nas atitudes de Jesus: odres novos

(Mateus 9,17), mandamento novo (João 13,34), nova aliança (Lucas 22,20). Tudo

isto teve seu ponto alto na entrega pessoal de Jesus, da sua própria vida na cruz,

na certeza da sua ressurreição, para permanecer conosco para sempre.

O conteúdo essencial do primeiro anúncio (querigma) trata da

vida de Jesus de Nazaré, sua pessoa, mensagem e missão, e do

seu momento culminante de morte e ressurreição (páscoa). Por aí

passou a formação progressiva de novos discípulos. Nesse

processo, contavam sempre com a ação do Espírito Santo e com a

força do testemunho de vida dos que já faziam parte das

comunidades cristãs.

A partir do II século, a Igreja, aos poucos, foi estruturando um

processo para a iniciar novos membros a uma nova identidade, como cristãos

inseridos na comunidade eclesial, prontos a celebrar a fé e assumir a missão. Tal

processo de iniciação, mais tarde, foi denominado Catecumenato, organizado em

um itinerário processual de quatro tempos sucessivos. Essa instituição eclesial

foi se aperfeiçoando até meados do século quinto.

A finalidade pela qual a Igreja pensou em estruturar a forma de um itinerário

Catecumenal foi a de possibilitar, por meio de um percurso específico de

iniciação, a preparação, de pessoas adultas, que haviam manifestado o desejo de

assumir a “fé da Igreja”.

Para isso, ao longo do itinerário catecumenal havia uma série de ensinamentos,

um conjunto de práticas cultuais e litúrgicas (imposição das mãos, exorcismos,

entregas simbólicas, etc.) e, de modo especial, uma séria demonstração de vida

cristã através da participação na vida da comunidade.

Portanto, é claro que ser católico não é algo que acontece de

forma tão automática [pela herança]. Precisamos de um novo

tipo de evangelização onde as pessoas possam de fato fazer

uma verdadeira opção [propositiva] por Jesus.

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O que já conseguimos fazer...

A Igreja do Brasil acolheu estas orientações elaborando e

publicando vários documentos: Catequese Renovada [1983]

e o Diretório Nacional de Catequese [2006]. Além, destes

textos, o Estudo 97 Iniciação à Vida Cristã [2009] e o

Itinerário Catequético [2014]) têm nos auxiliado a assumir a

inspiração catecumenal como eixo condutor de toda ação

evangelizadora, pastoral, litúrgica e missionária de nossas

dioceses, paróquias e comunidades eclesiais.

A urgência de um novo processo de Iniciação à Vida

Cristã:

A atual situação exige que o anuncio de Jesus Cristo não

seja mais pressuposto, porém explicitado continuamente.

O estado permanente de missão só é possível a partir de

uma efetiva iniciação à vida cristã (CNBB, Diretrizes

Gerais da Ação Evangelizadora).

A realidade nos revela que a experiência de fé cristã se

encontra hoje numa espécie de estado generalizado de busca e de recomeço. Fica

para trás um determinado modelo eclesial, marcado pela segurança da sociedade

de cristandade e desponta um processo de renascimento a um modelo eclesial da

Igreja simples, em saída missionária para as periferias geográficas e existenciais.

O Papa diz que o anúncio do Evangelho acontecerá com a devida atenção aos

desafios da realidade: a economia da exclusão, a idolatria do dinheiro, a

desigualdade social que gera violência, a cultura do provisório, a proliferação de

novos movimentos religiosos fundamentalistas, a promoção de uma

espiritualidade sem-Deus, a perda do compromisso com o comunitário, o

relativismo moral, a fragilidade dos vínculos familiares [Evangelii Gaudium].

Destaquemos alguns aspectos:

A fragilidade dos vínculos familiares é uma marca dos nossos tempos

O caminho da família vem passando por diversas mudanças, difíceis, até mesmo

de serem elencadas. Vivemos o crescente perigo de que o individualismo

exagerado desvirtue os laços familiares.

A perda do sentido do sagrado e da transcendência, o que gera uma cultura que

deixa de lado valores capazes de dar sentido à vida;

A perda do sentido do comunitário, provocada pelo individualismo

que “favorece um estilo de vida que debilita o desenvolvimento e a

estabilidade dos vínculos entre as pessoas”, levando um

considerável número de pessoas a se afastar da

comunidade eclesial ou “esconder-se e livrar-se dos

outros”. Como diz Charles Taylor sobre a “promoção do eu

impermeabilizado, alérgico aos compromissos relacionais”.

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Tudo isso, nos estimula a reconhecer que há caminhos novos que o Espírito

Santo trilha, para chegar ao coração das pessoas. Mesmo que a familiaridade com

o mistério cristão se tenha diluído em nossos dias, hoje nos urge propor a fé na

alegria do Evangelho. O encontro com o Messias [João 1,35-51], no mundo

contemporâneo é possível. Mas precisa ser proposto de maneira a cativar mais as

pessoas, para que aconteça uma experiência impactante da verdadeira adesão a

Jesus.

A IVC, caminho ainda a ser percorrido:

Estes tempos, à luz da fé, exigem de nós humildade,

atitude de acolhida, criatividade e capacidade dialogal

que, a exemplo do que aconteceu no encontro entre

Jesus e a samaritana, possibilitem um itinerário que

facilite a caminhada rumo à conversão. E isto sinaliza a

necessidade da conversão pastoral. Estar em constante

movimento de saída, sem nos apegarmos a um modelo

único e uniforme.

A inspiração catecumenal necessita da consciência da verdade expressa por

Tertuliano: “os cristãos não nascem, se fazem [constroem-se progressivamente]”.

Ou ainda, como diz Documento de Aparecida, citando o Papa Bento XVI: “não se

começa a ser cristão por uma decisão ética ou uma grande ideia, mas pelo

encontro com um acontecimento, com uma Pessoa, que dá novo horizonte à vida

e, com isso, uma orientação decisiva”.

Os processos de iniciação supõem uma Igreja em estado permanente de missão,

dedicada não apenas ao anúncio (falar), mas também com a busca de caminhos

que consolidem a vida cristã. Nesse sentido, a IVC expressa a força da Igreja

missionária e, ao mesmo tempo, gera novos missionários para a Igreja. “O estado

permanente de missão só é possível a partir de uma efetiva IVC”.

A IVC é lugar privilegiado de animação bíblica da vida e da

pastoral.

Os processos de iniciação cristã se alimentam da Sagrada

Escritura, educam para a escuta da Palavra de Deus e a

leitura orante, evidenciando uma estreita relação entre Bíblia

e catequese.

A Igreja, “comunidade de comunidades” é quem realiza a IVC

É ela que acolhe, orienta e gera novos filhos e filhas e promove a fraternidade

entre eles. É dela e em seu nome que os agentes da IVC recebem o mandato

eclesial para introduzir ao mistério de Cristo Jesus e da sua Igreja. A comunidade

eclesial é o lugar da IVC e da educação da fé dos adultos, jovens, adolescentes e

crianças.

“O Evangelho da vida está no centro da mensagem de Jesus”, por isso, a missão

dos discípulos está a serviço da vida plena para todos.

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A IVC nos insere na vida plena de Deus, realizada em Cristo,

e que se expressa em atitudes concretas de missão e testemunho de fraternidade,

solidariedade, justiça social, paz, salvaguarda da criação, diálogo ecumênico,

construção de um mundo melhor para todos. A iniciação conduzirá a atitudes

concretas de missão e testemunho transformador das estruturas desumanizantes

e injustas.

A IVC com inspiração catecumenal

Sabemos que por longo tempo privilegiou-se um

modelo de iniciação direcionado à preparação

”AOS” Sacramentos em detrimento de uma

iniciação ”PELOS” Sacramentos. Sem ponderar a

dimensão sistemática de todo processo de

Iniciação Cristã.

A missão de iniciar na fé os adultos e jovens,

adolescentes e crianças coube inicialmente à liturgia e à catequese. A liturgia

organizava os tempos e etapas de um caminho progressivo e mistagógico

conduzindo à celebração dos três sacramentos de Iniciação. Por sua vez, a

catequese cuidava mais da dimensão da conversão pessoal, da instrução e da

aprendizagem da doutrina cristã e da moral.

Há mais que isso: É preciso envolver a comunidade inteira no processo da IVC na

formação continuada dos fiéis

A atual mudança de época exige que o anúncio de Jesus Cristo seja explicitado

continuamente e que os processos de Iniciação, inspirados na tradição

catecumenal, sejam assumidos de modo criativo e adequado, incluindo novos

temas (como ecumenismo, ecologia, comunicação moderna, questões sociais) e

tendo flexibilidade para atender às situações concretas dos catecúmenos.

A IVC e a formação contínua se apresentam hoje como desafios urgentes; uma

obra a ser realizada, por toda a Igreja, com dedicação, paixão formativa e

evangelizadora, com coragem e criatividade. Não se trata, porém, de uma pastoral

a mais, mas de uma instituição central, um instrumento vital na missão

evangelizadora e pastoral. Tem como objetivo a formação inicial e permanente do

discípulo missionário de Jesus Cristo, para viver e anunciar a fé cristã no coração

da civilização em mudança.

Iniciação – mergulho pessoal no mistério de Deus:

Em nossos dias, o termo “iniciação” não nos é mais habitual.

Mas o ser humano continua tendo que ser “iniciado” quando algo vai mudar na

sua vida, como, por exemplo: na preparação profissional, na adaptação do

migrante a uma nova cultura, no treinamento esportivo, na vivência da criação de

filhos... São situações que nos transformam em pessoas novas e exigem

preparação.

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IVC – mergulho no mistério de Cristo:

A igreja, em sua fase inicial de anúncio do Evangelho,

lançou mão dessa realidade tão humana e arraigada nas

culturas da época: os mistérios e seus processos

iniciáticos. Por isso, o cristianismo foi até confundido com

uma das tantas religiões iniciáticas que se multiplicavam

no Oriente Médio. Por mistério ou sacramento cristão

entendia-se o plano divino da salvação que Deus realiza

na história da humanidade.

Assim, o acolhimento do mistério da pessoa de Jesus exigia a participação fiel e

responsável, na vida e missão da comunidade eclesial,

fazendo escolhas éticas coerentes com a fé cristã. Começava aí um caminho de

conversão, uma mudança de mentalidade e de vida, que implicava o todo da

pessoa.

Diferentes dimensões teológicas da IVC

A iniciação cristã significava imersão numa nova realidade nova e inesperada que

nos introduz, em primeiro lugar, ao mistério de Cristo Jesus em sua paixão, morte,

ressurreição, assunção, envio do Espírito Santo e retorno glorioso (dimensão

cristológica). O mistério de Cristo, entre a ascensão e a parusia final, é

constituído pela missão do Espírito que o Senhor glorioso envia do Pai sobre a sua

comunidade. Cristo torna-se o “sacramento” da difusão do Espírito no mundo.

Na iniciação cristã, em segundo lugar, apresenta-se o mistério da Igreja,

comunidade que, pela ação do Espírito, vive e revela a presença do Ressuscitado

no mundo (dimensão eclesiológica). A Igreja, mediante sinais, celebra e manifesta

a vida do Ressuscitado da qual é portadora. Enquanto “mistério de Cristo”, a

Igreja é uma realidade “sacramental” que depende essencialmente do Senhor

glorioso e da ação do Espírito que Ele derramou. A graça que se realiza nas suas

ações é um evento transbordante da páscoa do seu Senhor.

A IVC é graça benevolente e transformadora, que nos precede e nos cumula com

os dons divinos do Pai, em Cristo, pelo Espírito. Ela se desenvolve dentro do

dinamismo trinitário: os três sacramentos da Iniciação, numa unidade

indissolúvel, expressam a unidade da obra trinitária na iniciação cristã: no

Batismo assumimos a condição de filhos do Pai, a Crisma nos confirma no

Espírito em nossa opção de sermos cristãos e a Eucaristia nos alimenta com o

próprio Cristo, o Filho.

É importante compreender bem essa dimensão eclesial do processo de Iniciação,

que se desdobra numa formação continuada.

As pessoas são iniciadas no Mistério de Cristo e na vida da Igreja. Não é como um

curso que termina em festa de formatura, nem se trata de mera devoção

particular. Quem é iniciado se torna parte da Igreja e assume os compromissos

da missão a que ela se dedica.

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A IVC requer a decisão livre da pessoa. Pela obediência da fé a pessoa se entrega

inteira e livremente a Deus e lhe oferece a homenagem total de sua inteligência e

vontade. No processo de iniciação é envolvida inteiramente em todas as esferas e

dimensões de sua vida. O fracasso ou a falta de perseverança no caminho da fé é,

sem dúvida, uma realidade complexa e se deve, muitas vezes, à falta deste

envolvimento total dos iniciandos.

Na experiência e incorporação ao mistério pascal, se vive a essência da IVC: é seu

princípio, meio e fim. O interlocutor é conduzido à dinâmica treva-luz, pecado-

graça, escravidão-libertação, morte-vida, que vai se realizando através de vários

momentos relevantes do processo catecumenal e prossegue ao longo de toda a

sua vida.

O banho batismal é a maneira de expressar o início de uma nova identidade: a

pessoa se purifica, deixa de lado o que era sinal de afastamento de Deus e de

morte, para vincular-se, definitivamente, através da graça, ao Ressuscitado, que

agora vai ser o centro da sua vida. O batizado é, por isso, chamado de neófito

(brotinho) e iluminado pela claridade do Senhor (fotosmates): “banhados em

Cristo, somos uma nova criatura... somos nascidos de novo!” (cf. Gálatas 3,27).

Neste processo gerador a comunidade tem um papel importantíssimo, ajudando

“os catecúmenos pelo seu exemplo a obedecerem com maior generosidade aos

apelos do Espírito Santo”, que age de três formas fundamentais no processo

catecumenal, propiciado pela comunidade: é precursor (impulsiona); é

acompanhante (está presente em cada momento, dando “olhos para ver e ouvidos

para ouvir” o mistério de Deus); é continuador (leva para diante, aperfeiçoando

progressivamente a identidade plena do discípulo de Cristo).

Aqui estamos diante de uma das dimensões centrais da IVC, a dimensão da

presença permanente do Espírito Santo (pneumatológica). É isso que faz da Igreja

uma comunhão no Espírito Santo (2Coríntios 13,13), já que todos confessam

Cristo como Senhor na força do mesmo Espírito (1Coríntios 12,3); todos são

ungidos pelo Espírito Santo (1João 2,20), que lhes proporciona autêntico “sentido

da fé”; todos são agraciados com carismas diversos em vista da “edificação

comum” (1Coríntios 14,26).

Daí que todos os membros da Igreja, chamados a testemunhar Jesus Cristo, a

participar ativamente de sua ação missionária, a realizar a vocação universal à

santidade, a constituir um ‘sacerdócio comum’. Experimentar Deus Trindade é

ser comunhão, é criar comunhão e participar da vida na comunidade.

A imersão no mistério de Cristo mediante a Igreja:

É na Igreja que podemos falar em IVC. Mais que

entrar na Igreja, o candidato é acolhido por ela.

Colocar em primeiro plano a dimensão eclesial

mostra como a relação com Cristo, dado nos

processos de iniciação, não exclui a referência à

Igreja, mas eles acontecem exatamente através

dela e da pertença a ela. Tal referência eclesial

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representa a “raiz” sobre a qual se enxertam todas as relações que estruturam a

identidade cristã.

O sujeito primordial dos processos de IVC é toda a comunidade cristã

Ela é responsável pelo rosto que a Igreja vai apresentar a quem dela se aproxima;

é necessário recuperarmos esta convicção e com ela sermos coerentes. O processo

de IVC requer a acolhida, o testemunho, a responsabilidade da comunidade.

Quem busca Jesus precisa viver uma forte e atraente experiência eclesial. A

Iniciação dos chamados ao discipulado se dá pela comunidade e na comunidade.

A Igreja: uma comunidade querigmática e missionária

A inspiração catecumenal representa, para a Igreja,

uma mudança no modo de se apresentar, porque a

faz assumir a sua natureza originária: ser Igreja

querigmática (anunciadora da verdade fundamental

manifestada em Cristo) e missionária. Só é possível

assumir os processos de IVC dentro de uma Igreja

voltada para o essencial, que supere o modelo de

cristandade e os processos rotineiros ainda vigentes

em nossa prática pastoral.

Uma Igreja querigmática e missionária é uma Igreja peregrina, samaritana,

misericordiosa

Igreja que não está preocupada em condenar, mas tem o Evangelho no coração e

nas mãos e acolhe quem está desnorteado, caminha com as pessoas em situações

difíceis, cura feridas. Ela compreende que é tempo de permanecer vigilante e

fixar-se no essencial da fé.

Numa Igreja querigmática e missionária, a IVC assume um rosto evangelizador

que favorece a verdadeira experiência de fé. Promove o encontro pessoal e

comunitário com Jesus Cristo, a inserção na comunidade eclesial, a participação

na vida litúrgico-sacramental e o engajamento na transformação da sociedade.

A estreita relação entre o itinerário catecumenal e a comunidade se manifesta em

dois momentos que se complementam: Primeiro, a Iniciação encontra na

comunidade eclesial o seu ambiente próprio; aí o discípulo missionário de Jesus

nasce e se fortalece.

E, Segundo, a comunidade é também a meta a ser atingida pela Iniciação: o

itinerário catecumenal educa para a vida de fé na comunidade, alimenta-a e

renova. A comunidade é ajudada neste itinerário para crescer na fé e, ao mesmo

tempo, exerce a “função maternal” de gerar novos filhos.

A Igreja: uma comunidade mistagógica e materna

A ação do Espírito Santo faz, por meio da IVC, com que a Igreja se torne Mãe,

geradora de filhos que à medida que vão sendo inseridos no mistério de Cristo,

tornam-se, ao mesmo tempo, crentes, profetas, servidores e testemunhas. No

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exercício de sua função materna, a Igreja vai além das fronteiras étnicas,

culturais e sociais.

Para realizar sua missão a Igreja é geradora de ministérios a serviço de todos. É

ministerial por vocação, por origem, por essência e por finalidade: ela traz

impresso em seu ser o sinal da diaconia = serviço (João 13,15). As dimensões de

comunidade, comunhão e serviço, consideradas em sua unidade, são as

características que garantem o reconhecimento da vocação de todos os batizados,

devendo estar presentes ao longo de todo processo catecumenal participativo e no

exercício da ação missionária.

A comunidade cristã, em sua totalidade, é o sujeito primordial da ação

evangelizadora, sob o influxo do Espírito, ela congrega os carismas, serviços,

tarefas e funções, de tal modo que ninguém (pessoa, instituição, estrutura ou

movimento) possa arrogar-se uma centralidade com pretensões de absoluto. O

centro da ministerialidade reside na comunidade crente, que, por seu caráter

sacramental, movida pelo Espírito, é ao mesmo tempo fonte, mediação e lugar do

dinamismo salvífico.

Necessitamos de formas litúrgico-catequéticas que integrem

verdadeiramente os processos da IVC.

O Documento de Aparecida é enfático: “ou educamos na fé, colocando as pessoas

realmente em contato com Jesus Cristo e convidando-as para seu seguimento, ou

não cumpriremos nossa missão evangelizadora”. Sentimos, hoje, a necessidade

de uma revisão profunda da nossa prática evangelizadora, formadora e pastoral,

para estabelecer uma verdadeira IVC.

A passagem de um tempo para o

outro é marcada por três momentos

celebrativo: graus ou passagens, ou

ETAPAS:

1. o RITO de ADMISSÃO ao

catecumenato;

2. o RITO da ELEIÇÃO ou inscrição

do nome dos que irão celebrar os

Sacramentos da IVC; e

3. a CELEBRAÇÃO dos SACRAMENTOS. E há também os ritos das bênçãos,

entregas, exorcismos,

escrutínios, que

acontecem ao longo de

todo o processo,

vejamos no quadro:

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Hoje a Igreja assume o compromisso prioritário de evangelizar adultos que não

passaram pelo processo de IVC; aí estão incluídos os que, embora batizados, se

afastaram da Igreja ou que se apresentam com formação insuficiente. É

especialmente para estes adultos que o RICA foi criado. O RICA tornou-se não

apenas o ritual para o batismo de adultos, mas descreve, em seu primeiro e

principal capítulo, o longo caminho mistagógico e catequético que um adulto deve

percorrer para sua plena IVC, culminando nos sacramentos do Batismo, Crisma e

Eucaristia.

A Igreja propõe que também para os jovens, adolescentes e crianças se ofereçam

processos de Iniciação à Vida Cristã com inspiração catecumenal. Para isso, já

existem alguns itinerários catequéticos, adaptados às várias idades, inspirados no

RICA, com tempos, objetivos, passos, eixos temáticos, celebrações e outras

indicações práticas.

Os Sacramentos da IVC:

Não se chega a ser cristão apenas pelo Batismo; pois, na

verdade, chegamos a ser cristãos plenamente com o Batismo e

a Confirmação para unir-nos ao Corpo Vivente do Cristo em

cada Eucaristia”.

Há um nexo profundo entre a realidade dos sacramentos da

iniciação e o itinerário catecumenal que a eles conduz. Em

determinados períodos da história da Igreja foram até

chamados conjuntamente de “o sacramento da iniciação”. Isso

é importante para que superemos a atual fragmentação

existente entre os três sacramentos da iniciação cristã:

Batismo, Crisma e Eucaristia.

Os processos iniciáticos, que culminam nos sacramentos da IVC, introduzem o

crente no mistério de Cristo e da Igreja. Neste sentido, a expressão “IVC”, se refere

tanto ao caminho catequético catecumenal de preparação aos sacramentos,

quanto aos próprios sacramentos da iniciação.

Sendo os sacramentos atos do próprio Cristo na ação ritual da Igreja, é Ele quem

inicia, quem nos torna cristãos, quem nos introduz no relacionamento com a

Trindade e com o corpo eclesial. É o próprio Jesus que conduz cada neófito ao

encontro profundo com seu mistério pascal e, com isso, ao encontro da sua

própria realização como ser humano.

Urge recuperarmos a unidade pastoral entre os três sacramentos da IVC.

Integrados no mesmo caminho de fé, como experiência vital e de crescimento no

seio de uma comunidade eclesial. São etapas de um único processo de vida

iluminada por Cristo e testemunhada na Igreja.

Tudo isso implica favorecer uma compreensão mais unitária do percurso de IVC.

Daí, recordamos a orientação de Bento XVI: “a situação atual no que diz respeito

aos três Sacramentos da IVC, não deixa de ter consequências: apesar da sua

unidade teológica, são pastoralmente diversos. Nas comunidades eclesiais essas

diferenças não são de caráter doutrinal, mas de critério pastoral.

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Em nossa prática pastoral, por motivos históricos e culturais, os três

sacramentos da IVC estão, em geral, desconectados e fragmentados. Mas, a Igreja

é convicta de que esses sacramentos formam uma unidade. Assim afirma o RICA:

“de tal modo se completam os três sacramentos da iniciação cristã, que

proporcionam aos fiéis atingirem a plenitude de sua estatura no exercício de sua

missão de povo cristão no mundo e na Igreja (AG 14)”.

Batismo e Crisma se direcionam para a Eucaristia. Na Eucaristia se atualiza a

expressão máxima do amor trinitário: nela, nós nos tornamos portadores da vida

eterna e participantes do grande sacrifício universal da Cruz. O Batismo é a

promessa de Eucaristia e tendência vital para Ela. A Crisma é, por sua vez,

exigência de Eucaristia, uma vez que a força vital da unção crismal vem de Cristo

e do seu Espírito.

A Eucaristia é, pois o sacramento da plenitude; realiza plenamente o que os

outros dois sacramentos anunciam.

Do ponto de vista dos três sacramentos da iniciação, a Eucaristia é uma

culminância, um sinal de plena e definitiva inserção na Igreja. Participando da

mesa eucarística, o cristão se alimenta e se sente cada vez mais membro ativo da

Igreja.

Propondo algumas pistas e caminhos ...

É preciso considerar uma gradualidade nas propostas, pois algumas são

diretrizes urgentes e independem dos contextos e processos vividos em cada

região do país. Outras são proposições que podem ser acolhidas de acordo com as

possibilidades de cada situação e servem de inspiração, podendo ser ajustadas às

diferentes situações pastorais.

Priorizar a IVC com adultos, considerando as adaptações necessárias que

garantam o processo adequado a cada situação;

Organizar o planejamento anual da IVC, garantindo um calendário que organize a

ação em vista dos objetivos a serem alcançados;

Garantir recursos destinados ao desenvolvimento da IVC, particularmente da

formação de pessoas e provisão de materiais.

Integração com a liturgia

Inspirados pelos objetivos das celebrações do RICA, organizar as diversas etapas

da iniciação, procurando a adequada correspondência entre Bíblia, catequese,

liturgia e comunidade. A inspiração que vem do RICA não significa imitar ou

copiar o que lá se apresenta, mas perceber as celebrações como passos

importantes para a superação da prática pastoral que visa apenas a recepção dos

sacramentos. Certos ritos devem ser reservados aos não batizados que percorrem

o caminho que leva à iniciação cristã.

Os candidatos adultos que vão receber os três sacramentos da iniciação cristã

devem fazê-lo preferencialmente na Vigília Pascal.

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O RICA orienta, porém, que os adultos já batizados poderão recebê-los em outra

ocasião mais adequada, de acordo com o cronograma proposto pela comunidade

paroquial.

Nas celebrações eucarísticas e da Palavra, considere-se que na assembleia

litúrgica participam pessoas que estão iniciando a caminhada cristã. Por isso,

quem preside precisa considerar que sua intervenção deve ser clara, objetiva e

catequética. Celebrações com crianças e jovens supõem maior atenção aos

recursos de linguagem, símbolos e referenciais utilizados.

O Papa Francisco diz:

“É preciso ter a coragem de encontrar os novos sinais, os novos símbolos, uma

nova carne para a transmissão da Palavra”.

Na IVC, a piedade mariana há de ser valorizada, reconhecendo em Nossa Senhora

o modelo de fidelidade a Deus.

A educação na fé supõe, também, respeito outras Igrejas e religiões,

discernimento na busca de Deus, presente na religiosidade popular, sempre que

conduzidas ao Mistério Pascal.

O Querigma:

As barreiras existentes entre o povo de Jesus e a

Samaritana levavam a esperar mais desencontro que

diálogo. Mas Jesus foi ao encontro dela e a tratou de modo

a facilitar a apresentação do dom de Deus. Como naquele

tempo, também hoje é preciso dialogar com as pessoas e,

diante de suas necessidades, apresentar-lhes Jesus Cristo.

As pessoas precisam de um primeiro anúncio sobre Jesus

Cristo, que seja capaz de lhes fazer arder o coração (Lucas

24, 32).

No centro do processo formativo, celebrativo e missionário da Igreja, está

essencialmente uma pessoa: “Jesus de Nazaré, Filho único do Pai”. Por isso, de

cada discípulo, na comunidade cristã, deve nascer o testemunho de uma

experiência capaz de contagiar outros: “O que vimos e ouvimos, o que as nossas

mãos tocaram da Palavra de Vida [...] isso nós vos anunciamos” (1João 1,1).

Alguns têm denominado de querigma, por exemplo, um anúncio que se limita a

um reavivamento religioso, uma busca por milagres sem compromisso profético e

sem o seguimento. Mas o importante é formar discípulos que praticam a

fraternidade e o amor ao próximo e queiram ir sempre mais adiante no caminho

de Jesus: “No próprio coração do Evangelho, aparecem a vida comunitária e o

compromisso com os outros. O conteúdo do primeiro anúncio tem uma

repercussão moral imediata, cujo centro é a caridade”.

Como vivenciar o querigma?

As formas do primeiro anúncio são múltiplas, podendo ser:

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1. narrativa e testemunhal – quem anuncia Jesus Cristo narra sua própria

história, mostra a força e a beleza da sua conversão, de modo tal que desperta,

no ouvinte, uma abertura ao dom da fé;

2. atraente – quem anuncia, proclama a fé cristã de maneira, ao mesmo tempo,

breve, inteligente e convincente (a exemplo de Filipe ao Eunuco de Candace -

Atos 8,26-40);

3. expositiva – pode-se apoiar num catecismo para adultos, propor reflexão a partir

de uma obra teológica, apresentar de modo interessante a biografia de um santo,

uma história de conversão ou fatos da vida de hoje que mostrem como é bom

crer;

4. estética – por meio da contemplação da natureza ou de uma obra de arte

(pintura, escultura, música, cinema, teatro, poemas, parábolas do mundo

moderno), pode-se estimular a busca de Deus;

5. dialógica – pelo intercâmbio de argumentos entre pessoas, que, juntas, se

interrogam sobre o sentido da vida e se esforçam para dar a razão de suas

convicções, é possível despertar o interesse pela fé;

6. litúrgica – as celebrações do Batismo, Matrimônio, Exéquias, etc., frequentadas,

geralmente, por pessoas afastadas da fé, podem ser oportunidades para

aproximá-las da comunidade;

Um monge do deserto, chamado Serapião, tinha como única propriedade um

exemplar do Evangelho, que vendeu para alimentar os pobres. E disse: vendi

inclusive a própria Palavra que me ensinou: Vai, vende tudo e dá-lo aos pobres...

7. caritativa – o contato com os pobres, os excluídos e os sofredores, pode facilitar

uma experiência da misericórdia de Jesus Cristo e o engajamento pela

transformação social.

Quem apresenta o querigma?

O Primeiro Anúncio é realizado por cristãos que

fizeram a experiência do encontro com o Senhor

e se tornaram discípulos missionários. Não são

pessoas prontas ou perfeitas no discipulado,

mas são membros da comunidade que desejam

que outros participem da alegria de seguir o

caminho. Especialmente os “introdutores”

devem cuidar do querigma.

Para o catecumenato, a elaboração de subsídios adaptados à realidade local é de

grande valor, mas é preciso garantir os elementos essenciais próprios do processo

de IVC: o Símbolo dos Apóstolos e a narração da História da Salvação, vividos

como instrumentos do nosso compromisso com Jesus, constituem o conteúdo

prioritário da IVC [Santo Agostinho].

A pluralidade de materiais produzidos para o tempo do catecumenato é uma

riqueza; contudo há um mínimo de condições para que um subsídio seja

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elaborado ou adotado. As dioceses que têm materiais em uso são convidadas a

revisarem seus textos de acordo com os seguintes critérios:

Fidelidade à doutrina dos apóstolos (Creio);

Centralidade na Palavra de Deus, especialmente com a

Leitura Orante da Palavra (História da Salvação);

Inspiração catecumenal: mais do que fixar-se nas etapas e

tempos do RICA, estabelecer uma metodologia que

favoreça o encontro pessoal e comunitário com Jesus

Cristo, a inserção na comunidade e o compromisso com a

justiça e a caridade;

Integração com a liturgia da comunidade e a interação fé e vida por meio de

celebrações que permitam iniciar o candidato na dimensão celebrativa da Igreja;

Metodologia interativa, com diálogos, vivências e troca de experiências, evitando o

estilo escolar;

Iniciação à vida de oração pessoal e comunitária, desenvolvendo uma

espiritualidade capaz de perceber a presença de Deus em todos os setores da

vida;

Estímulo ao compromisso com a justiça e o serviço à caridade, propondo

participação ativa e consciente na política, na cidadania, na opção preferencial

pelos pobres e no cuidado da criação;

Visão global da pastoral, não deixando de lado nenhuma dimensão do trabalho

proposto pela Igreja (ação social, vida familiar, diálogo ecumênico, vivência

comunitária, missão...).

A comunidade dos fiéis, os padrinhos e os ministros ordenados ajudem com

atenção e amizade os recém-batizados nos primeiros passos na vida cristã, para

assegurar-lhes uma completa e feliz integração na comunidade.

O bispo poderá, uma vez por ano, reunir os que celebraram os sacramentos da

iniciação e presidir a Eucaristia. No aniversário do Batismo, a comunidade

poderá reunir os que celebraram os sacramentos da iniciação “para agradecer a

Deus, partilhar sua experiência espiritual e renovar suas forças”.

Formação para a Iniciação à Vida Cristã

Na formação dos introdutores, catequistas e ministros da comunidade, é

primordial o conhecimento da Bíblia, fonte primeira da catequese. Igualmente é

preciso valer-se do Catecismo da Igreja Católica e do Compêndio de Doutrina

Social da Igreja, além dos principais Documentos do Magistério relativos à

Iniciação à Vida Cristã. Esse conhecimento deve estar ligado à vida, com suas

alegrias e problemas, que devem ser iluminados pelo conteúdo da nossa fé.

O processo catecumenal supõe uma catequese “impregnada e embebida de

pensamento, espírito e atitudes bíblicas e evangélicas, mediante um contato

assíduo com os próprios textos sagrados”. É importante que todo cristão tenha

uma Bíblia para uso pessoal. É importante também promover uma interpretação

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adequada da Bíblia, com conhecimento do contexto e da intenção de cada parte

da Escritura, evitando a leitura fundamentalista ou desligada da vida.

A Leitura Orante da Palavra de Deus é um recurso muito

importante para iniciar novos cristãos e, ao mesmo tempo,

manter toda a comunidade no caminho da escuta

obediente da Palavra, permitindo confrontar o seguimento

de Jesus Cristo com a experiência do cotidiano e o estímulo

à mudança de vida, segundo a vontade de Deus.

As dioceses e paróquias facilitem o acesso a subsídios apropriados para que as

comunidades possam se reunir em torno da Palavra de Deus, seguindo a

metodologia da Leitura Orante, que garante uma pedagogia interativa, da qual

todos podem participar e nela crescer, fortalecendo a formação continuada, a

caridade e a formação da consciência crítica.

Os catequistas tenham um contato frequente com o Catecismo da Igreja Católica,

como material de consulta e consolidação dos conteúdos fundamentais da fé

cristã.

Formação litúrgica inicial e continuada

A Iniciação à Vida Cristã depende da integração entre o processo formativo e a

liturgia. A Liturgia é fonte inesgotável de formação do discípulo missionário, e as

celebrações, pela riqueza de suas palavras e ações, mensagens e sinais, podem

ser consideradas como “Catequese em ato”. Não somente os catequizandos e os

que seguem outros processos formativos, mas toda a comunidade precisa ser

constantemente formada para a vida litúrgica. A Liturgia, com a riqueza do Ano

Litúrgico, é ocasião privilegiada de formação continuada.

Crescimento na fé mediante a beleza e a arte

A fé cristã sempre encontrou no belo e na arte formas excelentes de expressar a

necessidade humana de ir além do que se vê e manifestar a nossa sede de

infinito. Atualmente, é urgente recuperar o valor da beleza e da arte na liturgia e

em todo processo formativo dos fiéis.

Cuidar da beleza do espaço litúrgico e catequético é

uma tarefa sempre mais urgente. A arte e a beleza

dos templos são meios capazes de anunciar o amor

e a bondade do Criador nos mistérios de Cristo. Na

memória do passado, o templo remete o cristão ao

futuro.

O local destinado à formação dos fiéis não se improvisa; deve ser um espaço

simples e adequado a essa importante missão. Pode ser uma sala específica, um

espaço adaptado no salão paroquial, mas sempre devidamente preparado.

Atualização da formação

Visando a formar uma nova mentalidade sobre a IVC, pode-se desperdiçar muita

energia em atos, ações e eventos que não geram processos. É preciso promover

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uma metodologia capaz de envolver as pessoas no saber, no sentir, no optar, no

viver, no fazer e no ser dos cristãos.

Organizar escolas bíblico-catequético-litúrgicas diocesanas, integrando os

conteúdos e metodologias à perspectiva da IVC que levem à conversão pessoal,

comunitária e pastoral no processo da formação de discípulos missionários.

Família

O Papa insiste que a educação dos filhos deve “ser

marcada por um percurso de transmissão da fé que

se vê cada vez mais dificultado pelos horários de

trabalho, pela complexidade do mundo atual, onde

muitos têm ritmo frenético para sobreviver”. A família

é lugar de iniciação, onde se aprende a rezar e a viver

os valores da fé. Aos pais cristãos cabe a primeira

responsabilidade pela formação de seus filhos no seguimento de Jesus Cristo.

O batismo das crianças é uma excelente oportunidade

para uma experiência catecumenal. Mais do que um

“curso para pais e padrinhos”, de efeitos muito limitados,

é ocasião para um acompanhamento personalizado da

família. Os catequistas de batismo visitam a família para

acolher suas motivações e anunciar o amor de Deus,

revelado em Jesus Cristo (querigma).

Esse acompanhamento visa renovar a fé da família e

integrá-la à comunidade. Outro elemento importante é a apresentação da criança

à comunidade, antes da celebração do sacramento. Trata-se de despertar, na

comunidade eclesial, a alegria por acolher novos filhos.

Uma boa opção é propor encontros com a Leitura Orante da Palavra de Deus com

pais cujos filhos percorrem o itinerário catecumenal na comunidade. Assim, a

família poderá ser estimulada em sua missão de educar seus filhos na fé. É bom

recordar que não há uma receita comum que sirva igualmente para todos.

Pode-se apresentar um itinerário de formação cristã com adultos para os pais das

crianças que participam do processo catequético. Essa pode ser uma excelente

oportunidade de reforçar a fé das novas famílias e de integrá-las à comunidade.

Uma atenção específica precisa ser dada à preparação ao Sacramento do

Matrimônio

Adotar um itinerário que forneça aos noivos os elementos necessários para

amadurecer o projeto de vida matrimonial em Cristo. Esse itinerário poderia

oferecer propostas que ultrapassem a mera instrução e se converter num

autêntico acompanhamento por parte da comunidade cristã. Cada casal que

busca esse sacramento deve ser bem acolhido na comunidade e acolhe-los de

modo amistoso e gratificante.

Outra preocupação pastoral:

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refere-se ao acolhimento das “pessoas que vivem em situação familiar

canonicamente irregular. Partindo de sua situação, podem-se abrir portas para o

engajamento, para a experiência de fé, para o serviço na comunidade, ajudando-

as a aceitar e viver o amor em sua situação real”, superando a simples procura

pelos sacramentos.

Adultos

Buscam a Iniciação Cristã por decisão pessoal, procurando o sentido da vida, do

mundo, da morte, que não encontra em si e nas propostas do mundo. A iniciação

de adultos à vida cristã requer o envolvimento e a responsabilidade de toda a

comunidade de fé. Exerce grande influência positiva o testemunho da

participação da comunidade nas celebrações que realizam a experiência de Deus,

iniciada na escuta da Palavra.

Adolescentes e Jovens

O trabalho evangelizador desenvolvido com adolescentes e jovens precisa ir além

da sensibilização e do entretenimento, priorizando o crescimento espiritual, a

educação para a responsabilidade pessoal e social, a ética nas relações humanas,

profissionais, afetivas e sexuais, e a orientação vocacional.

O desafio do processo de IVC para adolescentes e jovens está, sobretudo, no

modo de apresentar-lhes Jesus como alguém que vale a pena ser seguido, como

um amigo muito próximo. Apresentar biografias de santos, sobretudo santos

jovens, salientando o seguimento de Jesus e suas atitudes evangélicas.

O convite às atividades das comunidades paroquiais, o auxílio em eventos e nas

ações pastorais são bons desafios que conduzem à percepção do envolvimento

dedicado à vida em comum. O voluntariado missionário também é um caminho

muito rico que leva à experiência da doação de si aos que mais precisam e que

desperta para um sim generoso em vista de um mundo justo, solidário e de paz.

Especialmente jovens e crianças vivem na cultura digital que liga com pessoas e

lugares de todo o mundo. Os novos meios de comunicação social são excelentes

instrumentos para a ação evangelizadora, com seus benefícios e vantagens para a

vida cristã. Isto não substitui a beleza do encontro, da proximidade e da

convivialidade presencial que são essenciais na família, na sociedade e na

comunidade.

Há jovens e crianças vivendo situações difíceis, como por exemplo: violência

familiar, exclusão social, carência afetiva, baixa autoestima, doenças, vícios e

deficiências... Nesses casos, a acolhida e a capacidade de escuta da comunidade

são ainda mais essenciais. A Igreja precisa ser o lugar onde se sentem

valorizados, apoiados e capazes de vencer os desafios que a vida lhes apresenta.

Podem ser também preparados para mais tarde dar ajuda a outros.

Crianças

Elas são capazes de manter uma relação com Deus e o faz de forma muito

espontânea e pura. Consegue perceber a beleza, a justiça e a bondade de Deus,

ao reconhecer a Criação, a amizade e os gestos de valorização da vida. O que

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aprende por meio de dinâmicas e músicas, literatura infantil e o que experimenta

pelos ritos e pela escuta da Palavra de Deus tende a repercutir por toda a vida.

No processo de IVC com crianças, devem predominar a convivência em clima de

fé, o amor como caminho para a experiência do transcendente e a relação do que

lhe é comunicado sobre Deus com a vida prática. As histórias bíblicas e

parábolas podem envolver as crianças de forma atrativa e sensível, levando-as a

acolher o que lhes é anunciado. Isso supõe também uma escolha de textos

bíblicos adequados à compreensão e aos sentimentos de cada idade.

Pessoas com deficiência

Para acolher estas pessoas é necessário escuta-

las, procurando saber como ela habitualmente

realiza suas atividades na vida diária em todos os

ambientes. No caso das crianças, pode-se também

conversar e envolver a família. É preciso procurar

na comunidade, alguém da área da educação

especial ou da psicopedagogia.

Não devemos formar grupos apenas com pessoas com deficiência; elas devem

estar incluídas nos grupos existentes.

Na comunidade paroquial, devem ser consideradas as questões referentes à

acessibilidade atitudinal, comunicacional, locomoção ... a fim de garantir o bem-

estar de todos.

Comunidade

Diante do pluralismo religioso e cultural, muitos

procuram viver a fé cristã de modo privatizado,

multiplicando devoções pessoais e espiritualidades

intimistas. Contudo, “a fé não é um fato privado, uma

concepção individualista, uma opinião subjetiva”. É

impossível crer sozinho. Deve haver uma unidade no

meio da diversidade dos sentimentos e estilos de cada um. Tal unidade é

encontrada sobretudo na liturgia, ponto comum de chegada e de partida da fé e

da vida cristã.

Catequistas e agentes de Pastoral

Como discípulos missionários, os catequistas e os agentes de pastoral aprendem

também com seus catequizandos e com os participantes da ação pastoral. Isso

acontece ao escutarem, com eles, a Palavra de Deus, orarem, partilharem a vida e

ação desenvolvidas. O diálogo é importante, gera um aprendizado mútuo e faz

parte da formação continuada, da conversão pessoal e da vida de fé e missão...

Para bem transmitir a fé é preciso estar atento aos atuais desafios de contextos

que exigem humildemente a busca de novos processos e metodologias.

Sugere-se oferecer um itinerário gradual para a formação de catequistas, em que

os candidatos a catequistas sejam convidados a vivenciar o processo formativo de

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inspiração catecumenal antes de assumirem a responsabilidade catequética.

Nesse processo formativo é importante que eles acompanhem outros catequistas

no desenvolvimento dos encontros, das celebrações e demais atividades,

convidados a vivenciar o processo formativo de inspiração catecumenal antes de

assumirem a responsabilidade catequética.

Integrar na comunidade: com o seu dom de atrair especialmente pessoas

afastadas e vivenciar com elas o querigma, é preciso que iniciem seus membros

na comunidade em modo a não arrebanhar adeptos para si mesmos, senão

promover uma eclesiologia de comunhão e participação;

Agir em sintonia: cuidar para que seu estilo próprio de ser e agir esteja em

sintonia com as diretrizes da ação evangelizadora da diocese; assim, as liturgias,

as formações e o estilo de vida da comunidade manifestem o estilo de

comunidade eclesial.

Assumindo plenamente o processo de IVC, não estamos suprimindo o Batismo

das crianças recém-nascidas em famílias que já têm vivência cristã e pedem o

sacramento. Ao crescer, elas também serão evangelizadas de acordo com os

procedimentos da Iniciação. Suas famílias, ao acompanhar o processo, poderão

reafirmar seu compromisso de fé.

Conclusão:

As indicações aqui apresentadas sinalizam a necessidade de uma conversão

pessoal e da vida da comunidade eclesial.

O que está diante de nós é o desafio de consolidar esse paradigma pastoral da

IVC.

Devemos ser capazes de integrar aspectos de acolhimento, de mergulho no

mistério cristão, de acompanhamento e integração na comunidade eclesial.

Não faltarão dificuldades, porém, é com humildade e disponibilidade, de modo

comunitário, criativo e profético, ouvir o que o Espírito Santo diz à Igreja.

A IVC precisa ser compreendida e entendida mais como proclamação e vivência

do Evangelho, do que uma ação pastoral de um grupo eclesial específico.

Nesse novo paradigma, a catequese está a serviço da IVC

As propostas aqui apresentadas são portas abertas para que nossas paróquias

encontrem inspiração para que sejamos a “Casa da IVC”. Para isso é preciso:

Formação continuada da comunidade, os ministros ordenados, os catequistas

propriamente ditos;

Compreensão da importância da Iniciação à Vida Cristã na ação evangelizadora;

Valorização da dimensão litúrgica;

Pastoral de conjunto e projetos pastorais;

Promoção da unidade dos sacramentos de IVC;

Articulação entre o processo de IVC e missão da comunidade eclesial.