uma casa de xango no rio de janeiro

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Uma casa de Xango no Rio de Janeiro Escrito em colaboração por uma pesquisadora e um ogã da casa, este artigo objetivo reencontrar a memória de um dos mais tradicionais terreiros do Grande Rio, o Axé Opô Afonjá de Coelho da Rocha. Baseados em fontes orais e documentais, os autores reconstituem o percurso geográfico dos locais que abrigaram sucessivamente a casa de Xangô no Rio de Janeiro e dedica-se a retratar as grandes figuras das mães-de-santo e dos dignitários que vêm zelando pelo Axé desde sua fundação. Na área das chamadas religiões afro-brasileiras, são poucos os estudos que tratam especificamente da história dos terreiros¹. Nos diversos trabalhos etnográficos até hoje publicados, encontram-se informações geralmente esparsas, ainda que valiosas². Nesse panorama, destaca-se a monografia de Deoscóredes M. dos Santos, Axé Opô Afonjá (1962), “Notícia histórica de um terreiro de Santo da Bahia”, que apresenta a notável peculiaridade de ter sido redigida por sacerdote da própria casa. Por conseguinte, ao mesmo tempo em que fornece rico acervo de informações, oferece a possibilidade de ser lida em vários níveis e, particularmente, com ilustração do paradigma da “pureza nagô”³. Esse aspecto é tanto mais nítido enquanto se trata do terreiro mais “pesquisado” da Bahia, cujas características proporcionaram aos antropólogos grande parte do material utilizado para construção do padrão nagô de qualidade (4). O presente artigo não escapa por completo dessa ambigüidade. Escrito em parceria por um ogã da casa e uma pesquisadora com formação acadêmica, mas também filiada à comunidade, conta a história de um rebento (5) do próprio Axé Opô Afonjá. Tem o mesmo nome, que significa “casa cuja força vem de Xangô”. As grandes figuras ancestrais são as mesmas. Documentos escritos, poucos, permitem situar com segurança fatos ocorridos a partir da década de trinta (6) sobre os primórdios da casa, só temos o testemunho das pessoas mais antigas que tiveram a oportunidade de conviver com a fundadora. Tais informações, obtidas de modo assistemático, ao longo de conversas informais, sofrem todas as dubiedades das tradições orais. Expressam antes de mais nada preocupações legitimadoras. Como tais, não deixam obviamente de fornecer subsídios para a compreensão do sistema de valores do terreiro, da importância das “raízes”, ou seja, de recriar-se uma tradição ligada diretamente às fontes africanas. Deste modo, houve, por parte dos autores, o cuidado de transmitir, de modo mais fidedigno, as percepções do próprio grupo a respeito de suas grandes figuras heróicas, e a participação dos deuses na vida cotidiana. As anedotas, a ênfase dada pelos informantes a determinados pormenores de comportamento ou de expressão verbal, permitem compor retratos bastante vivos das personagens que tiverem (e têm) relevante papel na vida da comunidade. Ou, melhor dizendo, ao longo da pesquisa, essas figuras foram-se tornando pessoas concretas e reais. Daí o empenho dos autores em redigir o presente artigo em estilo que de alguma maneira resgatasse o sabor próprio da fala do povo-de-santo(7). 1. As Origens Tudo começou na Pedra do Sal. Situada no Morro da Conceição, no bairro da Saúde, bem perto do Cais do Porto, a Pedra do Sal servia de marco de referência para os viajantes que chegavam ao Rio de Janeiro. No fim do século, importante núcleo de famílias baianas havia se constituído em torno dela e, embora os bairros centrais do Rio já contassem, naquele tempo, com

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Uma casa de Xango no Rio de Janeiro Escrito em colaboração por uma pesquisadora e um ogã da casa, este artigo objetivo reencontrar a memória de um dos mais tradicionais terreiros do Grande Rio, o Axé Opô Afonjá de Coelho da Rocha. Baseados em fontes orais e documentais, os autores reconstituem o percurso geográfico dos locais que abrigaram sucessivamente a casa de Xangô no Rio de Janeiro e dedica-se a retratar as grandes figuras das mães-de-santo e dos dignitários que vêm zelando pelo Axé desde sua fundação.

Na área das chamadas religiões afro-brasileiras, são poucos os estudos que tratam especificamente da história dos terreiros¹. Nos diversos trabalhos etnográficos até hoje publicados, encontram-se informações geralmente esparsas, ainda que valiosas². Nesse panorama, destaca-se a monografia de Deoscóredes M. dos Santos, Axé Opô Afonjá (1962), “Notícia histórica de um terreiro de Santo da Bahia”, que apresenta a notável peculiaridade de ter sido redigida por sacerdote da própria casa. Por conseguinte, ao mesmo tempo em que fornece rico acervo de informações, oferece a possibilidade de ser lida em vários níveis e, particularmente, com ilustração do paradigma da “pureza nagô”³. Esse aspecto é tanto mais nítido enquanto se trata do terreiro mais “pesquisado” da Bahia, cujas características proporcionaram aos antropólogos grande parte do material utilizado para construção do padrão nagô de qualidade (4).O presente artigo não escapa por completo dessa ambigüidade. Escrito em parceria por um ogã da casa e uma pesquisadora com formação acadêmica, mas também filiada à comunidade, conta a história de um rebento (5) do próprio Axé Opô Afonjá. Tem o mesmo nome, que significa “casa cuja força vem de Xangô”. As grandes figuras ancestrais são as mesmas.

Documentos escritos, poucos, permitem situar com segurança fatos ocorridos a partir da década de trinta (6) sobre os primórdios da casa, só temos o testemunho das pessoas mais antigas que tiveram a oportunidade de conviver com a fundadora. Tais informações, obtidas de modo assistemático, ao longo de conversas informais, sofrem todas as dubiedades das tradições orais. Expressam antes de mais nada preocupações legitimadoras. Como tais, não deixam obviamente de fornecer subsídios para a compreensão do sistema de valores do terreiro, da importância das “raízes”, ou seja, de recriar-se uma tradição ligada diretamente às fontes africanas. Deste modo, houve, por parte dos autores, o cuidado de transmitir, de modo mais fidedigno, as percepções do próprio grupo a respeito de suas grandes figuras heróicas, e a participação dos deuses na vida cotidiana.As anedotas, a ênfase dada pelos informantes a determinados pormenores de comportamento ou de expressão verbal, permitem compor retratos bastante vivos das personagens que tiverem (e têm) relevante papel na vida da comunidade. Ou, melhor dizendo, ao longo da pesquisa, essas figuras foram-se tornando pessoas concretas e reais. Daí o empenho dos autores em redigir o presente artigo em estilo que de alguma maneira resgatasse o sabor próprio da fala do povo-de-santo(7).

1. As Origens

Tudo começou na Pedra do Sal.Situada no Morro da Conceição, no bairro da Saúde, bem perto do Cais do Porto, a Pedra do Sal servia de marco de referência para os viajantes que chegavam ao Rio de Janeiro.No fim do século, importante núcleo de famílias baianas havia se constituído em torno dela e, embora os bairros centrais do Rio já contassem, naquele tempo, com grande número de genuínas casas-de-santo, é constante a preocupação, por parte dos informantes, em ligar a fundação deste ou daquele terreiro a grandes figuras tradicionais do candomblé baiano, por um processo de legitimação no qual a Pedra do Sal parece representar o pólo ordenador. Na medida em que o povo-de-santo valoriza sobremodo as raízes, e se empenha em ressaltar a continuidade da tradição, sublinhando os vínculos com os grandes antepassados e com a África, delimitar com precisão o início do funcionamento de um terreiro a partir da tradição oral assemelha-se ao reconhecimento das fontes de um grande rio: são inúmeros filetes de água que se cruzam, formam riachos, subdividem-se e se juntam, até que, de repente, divisa-se o rio. Do mesmo modo, os testemunhos entrecruzam-se, versões diferentes são colocadas com a mesma tranqüilidade, mas todas convergem para o mesmo sítio e o mesmo tempo: a Pedra do Sal, no fim do século dezenove.Persistente tradição oral do terreiro associa as origens da “Casa cuja força vem de Xangô”, do Rio de Janeiro, à figura de Tio Joaquim Vieira da Silva, Obá Sayã ”africano legítimo”, no dizer de

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sua neta, “que veio diretamente da África para o Recife e casou com uma pernambucana” antes de dirigir-se à Bahia onde se fixaria como veremos adiante.

Em 1886, Tio Joaquim teria feito uma viagem ao Rio de Janeiro, na companhia do tio Rodolfo Martins de Andrade, Bamboxê, africano trazido de Kêto para a Bahia por Marcelina da Silva, Obá Tossi, e que teve relevante participação nos primórdios da Casa Branca do Engenho Velho (8). Ambos os tios teriam fundado casas-de-santo no bairro da Saúde, retornando em seguida para Salvador (9). Alguns anos mais tarde, chegaria ao Rio de Janeiro a mãe-de-santo que viria a ser fundadora do Axé Opô Afonjá, Mãe Aninha.Eugênia Ana dos Santos, Obá Biyi, Mãe Aninha, nascera em Salvador em 13 de julho de 1869, filha de um casal de africanos da nação de Grúncis, e fora iniciada em casa de Maria Julia Figueiredo, filha da primeira Iyá Nassô, em 1884, tendo Obá Tossi e Bamboxê participado de sua iniciação. Permaneceu junto à Casa Branca, até que certos desentendimentos provocaram uma cisão entre as pessoas do Engenho Velho, ocorrendo, a partir daí, a fundação de diversos outros terreiros (10). Aninha fez parte daqueles que se afastaram, indo para a “roça” de Tio Joaquim, no Rio Vermelho. Ficou lá bastante tempo até que, por um problema particular de família, Aninha deixou definitivamente a companhia de Tio Joaquim, indo para a casa de parentes, no “Cerriachito”, no Centro de Salvador, e, em seguida, fixando residência na Ladeira da Praça.Tudo deixa supor que foi nesse entremeio que Aninha resolveu viajar para o Rio de Janeiro. Há quem diga que, ao chegar, foi à procura da casa fundada por Obá Sayã, encontrando tudo no mais completo abandono. Reuniu alguns tios e, com a ajuda deles, tratou primeiro de limpar o terreiro e recolocar tudo nos devidos lugares.

Conforme depoimento da atual Yalorisá da casa, Mãe Aninha em sua primeira viagem ao Rio de Janeiro já “botou iaô” (ou seja, procedeu a algumas iniciações) em casa de uma senhora baiana que morava na Pedra do Sal (11). Muitas pessoas de santo foram se agrupar em torno de Aninha: Tia Joana Obasse, de Obá; Tia Sanan, de Oxossi; Tia Oxum Toqui, Tia Liberata, Oloyá, de Iansã; Tia Josefa Rica, de Oxum; Tia Bombala, de Iansã; Tia Paulina, Oxum Kere; Tia Amélia e Tia Bambala, ambas filhas de Oman Oxaguiã; e Mãe Oyá Bomin, ialorixá do Axé da Rua João Caetano, 69.Nessa época, havia algumas pessoas com apelidos curiosos, tais como: “Calú Boneca do Estácio”, filha de Oxossi, “Calú Boneca da Estrela”, de Oxum e “Calú Boneca do Mercado”, de Oxalufã. Um dos nossos informantes supõe tratar-se de senhoras de posses, que ajudavam as ialorixás, e que mantinham esses nomes “que indicavam o local onde elas poderiam ser mais facilmente encontradas” (12).A respeito de uma delas conta-se o seguinte: “Calú Boneca de Oxossi”, filha de santo da falecida Yambá Maria Júlia, morreu de repente. Os parentes, que nunca lhe deram atenção em vida, logo apareceram, apoderando-se de todos os valores, dinheiro e jóias. Pegaram o assentamento de Oxossi (13), embrulharam em jornal e mandaram entregar a uma de suas irmãs de santo, a Tia Henriqueta, que, de imediato, providenciou a entrega a Mãe Aninha. Esta, ao receber o embrulho, exclamou: “Ouro, dinheiro, e nem um pano de costa para cobrir o assentamento!”.Tratou de fazer o que era preciso, e foi saber de Oxossi o que ele queria. Surpreendentemente, apareceu no àté (jogo de búzios) (14) o Egun (espírito) da falecida, pedindo a Mãe Aninha que oferecesse um porco para Oxossi; caso contrário, o espírito dela não se salvaria. Aninha atendeu ao pedido e logo após chegou ao quintal, abriu os braços para o céu e disse: “Agora pode descansar em paz! Este assentamento encontra-se no Axé”.

Não se sabe ao certo porque, nessa época Aninha resolveu voltar à Bahia. Em 1907, faleceu Tio Joaquim, e muito do pessoal antigo reúne-se em volta dela. Decide então adquirir uma roça, no Alto do Retiro, em São Gonçalo, nos arredores de Salvador. Juntando suas economias, ajudada também por várias pessoas e, sobretudo, animada por inquebrantável tenacidade, consegue levar adiante o seu intento, mudando-se para a roça no final do ano de 1909 e construindo várias edificações para abrigar seu pessoal de santo e instalar os assentamentos que ainda tinham ficado na cidade de Salvador. No entanto, fixou sua residência particular à Ladeira do Pelourinho, 77, bem no Centro, onde tinha uma quitanda de artigos africanos (15) junto à Igreja de Nossa Senhora do Rosário, de cuja irmandade era membro destacado.No ano de 1910, com a roça já bem organizada, deu-lhe o nome de Axé Opô Afonjá. Foi em setembro do mesmo ano que Mãe Aninha fez a primeira iniciação de uma iyawo no novo terreiro. Tratava-se de Agripina de Souza, (Obá Deyi) filha de Xangô, que mais tarde viria a ser iyalorixá na casa do Rio de Janeiro.Daí para diante Mãe Aninha não parou mais, recolhendo iyawo, confirmando Ogãs e Obas,

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fazendo todas as obrigações da “seita”.A roça de São Gonçalo, é bom lembrar, não congregava apenas novas filhas-de-santo e dignitários recém elevados. Muitas velhas tias africanas, contemporâneas de Bamboxê e de tio Joaquim Vieira nela tinham encontrado abrigo dando tradição e continuidade à obra de Aninha.

Foi por isso que, decorridos longos anos de pleno funcionamento do terreiro, Mãe Aninha não hesitou em voltar novamente para o Rio de Janeiro, a fim de visitar os amigos que deixara por aqui. Consultando o oráculo, Xangô mostrou-se favorável à viagem. Aninha chamou as velhas tias, deu-lhes as instruções necessárias para o melhor desempenho das obrigações, e viajou tranqüila.Chegando ao Rio em princípio de 1925, hospeda-se em casa de uma grande amiga, Maria Ogalaá, de Oxaguiã, que morava à Rua São Luiz Gonzaga, 49 em São Cristóvão. Lá viviam várias pessoas que Aninha já encontrara em sua viagem precedente, outras eram antigas conhecidas da Bahia que se haviam fixado no Rio. Em Santo Cristo, na Rua Comendador Leonardo, Aninha fez a iniciação de Maria da Conceição, filha de Omulu, com a ajuda de Maria Ogalaá, que era mãe de criação dessa iaô.Mãe Aninha, que decididamente não esquentava lugar, retorna rapidamente à Bahia para reiniciar as obrigações na roça mas volta logo em 1930 para o Rio de Janeiro, passando a morar em casa da Rua Alegre (atual Felipe Camarão, 23-A, onde conhece novos amigos que viriam desempenhar importante papel no funcionamento do terreiro, entre os quais o Professor Agenor Miranda, Babalawo, filho-de-santo do velho Pai Abedê (16). Nessa época, já estava instalada no Rio Filhinha de Oxum, filha-de-santo de Aninha, “feita” na roça de São Gonçalo em 1921, bem como sua irmã carnal, Agripina de Souza, que se mudara para cá com o marido.Com uma casa bem organizada no Rio, Aninha atende a todos quantos a procuram. Não deixa tampouco de cumprir os seus deveres de boa católica. Torna-se membro tanto da Irmandade de Nossa Senhora da Boa Morte, como do Rosário, indo à missa quase que diariamente e tomando parte destacada na ocasião das festas religiosas.

Vale assinalar que ao adquirir a roça de São Gonçalo já deixara claro seu compromisso com a Igreja Católica, chegando a dizer que parte das terras, mais precisamente a baixada, “seria da Irmandade do Sagrado Coração de Jesus”.A atuação de Mãe Aninha dá-se em todos os níveis da sociedade que então vivia na capital federal. Conta-se que, “certa tarde, sem que ninguém esperasse, Oxum se manifestou na cabeça de tia Filhinha. Mãe Aninha surpreendeu-se, pois não contava com a chegada deste orixá. Oxum chamou-a e disse para fazer um trabalho (ebó) para uma grande autoridade do Governo, que corria perigo de vida. Após explicar tudo que tinha de ser feito, Oxum despediu-se e foi embora”. Este caso deu-se na presença de Alberto Lobo e Helena de Moura, que ainda hoje estão servindo ao Axé.Mãe Aninha cumpriu as ordens do orixá e aguardou o resultado. Passados dias, a referida autoridade regressava de um fim de semana em Teresópolis, acompanhada do seu ajudante de ordens, com quem resolveu, de supetão, trocar de lugar ao entrar no carro. Na descida da serra, enorme bloco de pedra desprendeu-se, rolou e atingiu o carro em cheio. Apenas o ajudante de ordem se machucou, fraturando as pernas, ao passo que motorista e autoridade saíram ilesos.Ao saber do acontecido, Mãe Aninha foi consultar os búzios acerca do aviso de Oxum. Verificou-se então que aquela grande figura política era filho de Xangô (17).No ano de 1932, muda-se a iyalorixá para uma casa mais espaçosa, na Rua Barão de Mesquita, 494, e em seguida, Rua Araújo Lima, 92, pois o nº de pessoas que a cercam cresce sem parar. Em 1935, chamam Aninha de volta a Salvador. Ela consulta Xangô que recomenda que não vá.

Apesar do aviso contrário, a mãe-de-santo teima em viajar. Faz um grande “trabalho” e embarca no navio para Salvador. Não mais voltará ao Rio, ao convívio dos amigos, às casas às quais dedicara tanta energia e tanto zelo.Logo no início de 1936 adoece, não consegue melhoras e falece em 03 de Janeiro de 1938.

2. Tempos de AgripinaAntes de partir para a derradeira viagem, Mãe Aninha chamou as filhas mais chegadas e atribuiu os encargos: “Você, Paulina, fica com a Agripina para jogar (os búzios) quando ela precisar, foi para isto que te ensinei”. Chamou Agripina no quarto e, entregando-lhe uma “tigela branca” (que continha a força sagrada da casa, axé, cuja guarda constitui privilegio da zeladora do templo), disse-lhe que tomasse conta.Este encargo provocou ciúmes, de tal maneira que a primeira filha-de-santo se afastou da casa,

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sem cumprir as ordens de Mãe Aninha, e Agripina teve de arcar sozinha com a pesada tarefa de zelar pelo Axé.Enquanto viva ficou, Mãe Aninha continuou ajudando, mandando seguidas cartas com todas as instruções de que Agripina necessitava para desempenhar-se adequadamente de seus deveres (18). Quando ela faleceu, viu-se sozinha, cercada por um punhado de amigos fiéis, para tomar conta de uma herança sagrada, alvo da intriga dos invejosos. Pior ainda; passado o período das obrigações que seguem ao falecimento de uma mãe-de-santo, nova iyalorixá veio presidir aos destinos da roça de São Gonçalo; logo que tomou posse, dizem os mais velhos que ela mandou de Salvador um baú, para que Mãe Agripina nele colocasse tudo o que Mãe Aninha deixara. Era uma maneira não muito sutil de manifestar seu desejo de ver encerradas as atividades do Axé no Rio.

Agripina Soares de Souza, Obá Deyi, filha de Xangô Aganjú, nascida a 28 de março de 1890, em Santo Amaro da Purificação, Bahia, nada fazia antes consultar o orixá. Xangô respondeu no ate que não mandasse coisa alguma, no que, obviamente, foi obedecido. Nos anos seguintes, houve diversas tentativas, mais ou menos veladas, de acabar com o terreiro, mas o apoio de Xangô não deixou que isso acontecesse.Com todos esses problemas, não foi mais possível arcar com o aluguel da casa da Rua Araújo Lima, e Mãe Agripina mudou-se primeiro para a Rua Senador Alencar, 22 e, mais tarde, para a Rua Bela de São João, 183, em São Cristóvão.No ano de 1943, ao aproximar-se a época das festas de Xangô (final de junho), Mãe Agripina foi perguntar-lhe o que deveria ser feito, e recebeu, espantada, a notícia de que o orixá não queria mais obrigações na cidade, porque já tinha “roça” no Rio. O ano em curso seria o último em que isso ocorreria.No ano seguinte, estava Mãe Agripina a cuidar do Oxalá da falecida “Sinhá” Maria Ogalaá, que ficara de herança para Mãe Aninha, e que fora instalado no “Pavilhão Obá”, barraco de sapé localizado na Rua Cecília, em Coelho da Rocha. Este barraco pertencia a Conceição de Omulu, filha de criação de Maria Ogalaá. Na época de sua iniciação, Conceição já residia neste local, e após a “feitura”, foi trazida de volta para casa por Mãe Aninha, Sinhá Maria, e outras pessoas da seita. Foi então que Aninha resolveu batizar o barraco de “Pavilhão Obá”. Isso aconteceu em fins de 1925.

Voltando ao ano de 1944, encontramos, pois, Agripina fazendo obrigações de Oxalá no Pavilhão Obá. Consultando Xangô sobre o que deveria ser feito, Mãe Agripina recebeu do orixá a resposta de que o mesmo pretendia permanecer em Coelho da Rocha, voltando talvez para a Rua Bela após a celebração das águas de Oxalá. Depois dessa festa, no entanto, Xangô mandou dizer que não mais voltaria para a cidade, pois ele já tinha uma roça. Conta um Ogã da casa: “Ninguém sabia desta roça. Foi Omulu que, pegando uma estaca, saiu porta fora, com todos acompanhando. Ele parou em um terreno próximo ao Pavilhão Obá e fincando a estaca, disse ser ali, a “roça”.Descobriu-se que o terreno era propriedade de Filhinha de Oxum, irmã de Agripina (19). Logo se construiu um barraco onde Xangô foi colocado e, até hoje, lá se encontra, à Rua Florisbela, 1029, em Coelho da Rocha, Município de São João de Meriti, RJ.Em 1947 teve início a construção do atual barracão e dos quartos dos santos, com muito esforço de Mãe Agripina e com a ajuda de pessoas amigas, ficando tudo pronto em 1950 (20).

Foi no ano seguinte que Mãe Agripina, com a ajuda de suas irmãs-de-santo, entre elas Cantulina de Airá, que sucedera a Tia Filhinha no cargo de mãe-pequena da casa, recolheu seu primeiro “”barco” de iaôs: Helena, de Ogun; Juanita, de Oxaguiã; Maria Engrácia, de Oxum e Noca, de Iansã; em 1954 fez a iniciação de Bernardo, descendente da nação de Grúncis e filho de Oxulafã; em 1957, de Clarice de Oxossi, Reinaldo de Airá, Ademar de Oxaguiã, Dirce de Oxum e Mirinha, também de Oxum; em 1959 recolheu Alaíde de Ogun, Nilson de Ossaim, Amauri de Oxalufã, Dalva de Oxum, Railda de Oxum, Julia de Iansã, Diva de Iansã e Regina de Iemanjá; em 1960 foi a vez de Antonieta de Oxum e Lili de Xangô; em 1961, Miguel de Xangô, Maria de Iansã, Georgina de Omolu e Hugo, também de Omolu além da iniciação de Maria Engrácia de Ogun e Edith de Oxum; em 1962 fez a iniciação de Dinorá de Oxossi, Joaquim de Omolu e Rita de Iemanjá. Foi em 1965 que Mãe Agripina recolheu seu último “barco” de iaôs, composto por Fortunata de Oxum, Guiomar de Oxum, Juraci de Oxum, Evonir de Nanã e Sérgio de Omolu.Desde que se encarregara de zelar pelo axé, Mãe Agripina vinha também confirmando vários ogãs, cujo apoio foi fundamental para manter a casa. Foram eles: Gervásio Protasio de Assis, confirmado Ogã de Xangô ainda na Rua Senador Alencar; Marcelino Leandro Silva, confirmado

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Ogã de Ogun nos tempos do Pavilhão Obá. Entre os ogãs confirmados na casa atual encontra-se: Sérgio do Nascimento, Ogã de Xangô, Oswaldo do Nascimento, Ogã de Oxalá, Jorge, Ogã de Oxum, Fernando dos Passos, Ogã de Oxum, Olegário, Ogã de Oxalá, Luiz de França, Ogã de Xangô; Albino, Ogã de Oxum, muitos deles já falecidos ou hoje afastados. Entre os Ogãs de mais freqüente presença destaca-se Guilhermano da Conceição, “Pai Bila”, Ogã de Omolu, Alabê, que acompanha o Axé desde a casa da Rua Comendador Leonardo, sendo filho de Conceição de Omolu e afilhado de Sinhá Maria Ogalaá. Um dos autores deste artigo é também Ogã do Xangô de Mãe Agripina.

Falta ainda nessa relação a figura inesquecível de Edgard Brandão (1900-1983), Ogã de Xangô que, criança ainda, fora levado pela mãe para a roça de São Gonçalo. Passando a acompanhar os passos de Mãe Aninha, veio junto com ela para o Rio de Janeiro e ficou dando aqui todo o apoio a Mãe Agripina, assim como depois à sua sucessora, até o dia de seu falecimento que ocorreu em dezembro de 1983.Em 1966, Mãe Agripina foi convidada a viajar para Brasília onde se submeteu a uma operação cirúrgica que foi bem sucedida. Hospedada em casa de uma filha-de-santo, disse que não voltaria tão cedo para o Rio de Janeiro e mandou para a mãe-pequena da casa, Cantulina Pacheco, uma carta pedindo que se encarregasse das obrigações de Oxossi (21). Iniciou-se uma troca de cartas orientando Cantulina para que tudo corresse bem, como de fato aconteceu.De repente, os filhos do Axé receberam a notícia do falecimento de Mãe Agripina ocorrido a 23 de dezembro de 1966.

3. A Casa de Xangô hoje.

Pela própria vontade da falecida, sua sucessora já estava designada. Quando das obrigações de praxe, no momento em que geralmente se faz necessário consultar o oráculo para ter certeza que a escolha atende realmente à vontade dos orixás, Mãe Menininha do Gantois jogou búzios e mandou comunicar a resposta de Xangô Aganjú. O Oluô Agenor Miranda também encontrou resposta semelhante, a Mãe Cantulina foi confirmada como nova ialorixá do terreiro.Não se pode deixar de transcrever os próprios termos da mensagem recebida de Xangô e transmitida por Mãe Menininha: “Xangô se apresentou e disse que ele continua sendo o dono da roça e está de pé acompanhado de Oxalá. Que Cantulina ficará sendo a zeladora, porque se ela se afastar ele não ficará satisfeito, então todos se preparem para uma guerra com ele”.Toda mudança de poder, em cada terreiro, dá ensejo a brigas, comentários, dissensões. Não faltaram tampouco naquela oportunidade. Mas, quando os desígnios dos deuses são expressos de modo tão claro, como divergir? Opor-se à vontade do Rei Xangô, quem há de?Nascida na Bahia em 16 de março de 1900, Cantulina Garcia Pacheco, “Mãe Cantú”, Airá Tola, é neta carnal de Tio Joaquim Vieira, e possui consciência nítida de que lhe cabe prosseguir a obra dele: “Eu estava na barriga de minha mãe, ela sabia que eu tinha que fazer o santo, por causa do meu avô (...). Ele mandou mensagem, disse que tinha morrido antes de cumprir tudo o que ele tinha que fazer. Ele precisava de eu fazer o santo para ele poder desencarnar”.

Mesmo assim, só foi fazer o santo, após muitos percalços, em 18 de junho de 1936, na roça de São Gonçalo. Do mesmo modo que Aninha, sua mãe-de-santo, Cantulina passou por diversas idas e voltas entre Salvador e Rio de Janeiro, até que se fixou de vez nesta última cidade, em 1949. Em suas viagens já participara diversas vezes das atividades da casa de Mãe Agripina, sendo que, em maio de 1951, veio a substituir a Tia Filhinha no cargo de Ia kekerê, mãe-pequena: “de ordem de Aganjú, por motivo de cansaço e sua idade, o cargo de Filhinha passa para a Airá Tola”(23). A partir desta data, Mãe Cantú vai ajudar Mãe Agripina em todas as suas atividades e, particularmente, nos trabalhos de “feitura” de noviças.Logo após sua definitiva confirmação como ialorixá, Mãe Cantulina reativa a vida do Axé com a iniciação de iaôs: em 1969, Regina Lúcia de Iemanjá e Edith de Oxalá; em 1971, Maria Eunice de Iansã, Dilu de Oxum e Cristina de Oxaguiã; em 1972, Marlene de Omolu; em 1973, Acácio de Ogum; em 1975, Neide de Oxalufã e Paulo César de Airá; em 1977, Ary de Xangô e dois “barcos” em 1982: o primeiro, em fevereiro, Ary de Xangô e dois “barcos” em 1982: o primeiro, em fevereiro, com Detinha de Ogun, Oswaldo de Oxaguiã, Marilene de Oxum, Isabel de Iemanjá e o segundo, em agosto, com Lea de Omolu e Rosângela de Iansã.É preciso registrar também a confirmação, em 1983, de José Beniste, Ogã de Iemanjá, em celebração muitíssimo concorrida, devido ao alto conceito deste designatário em meio a todo o povo de santo.Em julho de 1985, foi preenchido um cargo da casa de Xangô com a entronização de José

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Gomes, Oju Obá (“os Olhos do Rei”) e a iniciação de Georgete de Oxum, e Vera Lucia de Oxumare.

Muitos filhos antigos da casa, dos tempos de Agripina, e até mesmo pessoas iniciadas por outras mães, mas que se identificam com o Axé, recorrem constantemente aos cuidados de Mãe Cantú para realização de suas obrigações.Além dos Ogãs já mencionados, Cantulina conta com o apoio do Babá ewé, Alberto Lobo, Zinsy, que acompanha o Axé desde os tempos de Aninha. “Pai Alberto” veio a conhecer a fundadora em 1926, numa das viagens que ela fizera ao Rio. Passou a acompanhá-la em suas atividades católicas, ajudando-a a organizar a procissão de Nossa Senhora da Boa Morte, e só entrou no candomblé em 1931, tornando-se assíduo freqüentador da casa da Rua Alegre. Já em 1931, recebeu de Aninha a “mão de faca”, com ordem de “sacrificar até elefante, caso houvesse necessidade”, e, em 1934, o posto de Otun Asogbá, cargo da casa de Omolu. Pai Alberto seguiu Aninha em várias de suas viagens mas acabou fixando-se no Rio ao lado de Mãe Agripina. Hoje é o braço direito da mãe-de-santo em todas as atividades litúrgicas.Como se vê, a vida atual do terreiro é toda ela apoiada na tradição que vem diretamente da fundadora e, através desta, dos grandes feitos ancestrais. Não se trata, porém de mera repetição de rituais. As celebrações, tanto públicas como restritas, objetiva o acréscimo da força da comunidade, sua expansão, sua permanência. Raízes vivas continuam brotando.

1. O levantamento bibliográfico efetuado por Carlos Eugênio M. de Moura (1982) é bem ilustrativo a esse respeito, ainda que se possam acrescentar alguns trabalhos acadêmicos mas recentes, tais como a dissertação de mestrado de Beatriz Góes Dantas (1982) baseada em estudo etnográfico de um terreiro de Sergipe.2. Podem-se dar como exemplos a história da Fundação das primeiras casas de Kêto da Bahia, em Verger (1981) e, sobretudo, a grande quantidade de dados recolhidos por Vivaldo Costa Lima (1976, 1981 e 1982) junto a informantes de terreiros jeje-nagô, também da Bahia. Informações de grande valia, restritas, porém aos terreiros de Egungun da Ilha de Itaparica, podem ser encontradas em Deoscóredes M. dos Santos (1981).3. “O que me parece é que a “pureza nagô”, assim como a etnicidade, seria uma categoria nativa utilizada pelos terreiros para marcar suas diferenças e expressar suas rivalidades, que se acentuam na medida em que as diferentes formas religiosas se organizam como agências num mercado concorrências de bens simbólicos” (Dantas, 1982a, p.17).4. Excetuando-se Nina Rodrigues (1900) e Artur Ramos (19510, MAIS LIGADOS AO Gantois, os autores que contribuíram para a construção desse paradigma foram (estão) de alguma maneira afiliada ao Axé Opô Afonjá de São Gonçalo do Retiro: Martiniano do Bonfim (1935), Edison Carneiro (1961), Donald Pierso (1945), Roger Bastide (1978) , Pierre Verger (1981), Vivaldo Costa Lima (1981), Juana Elbein dos Santos (1976) e, é claro, Deoscóredes M. dos Santos (1962). Cabe observar que a grande maioria desses pesquisadores ligou-se à casa de São Gonçalo durante o reinado de Mãe Senhora (de 1941 a 1967) que soube, com extrema sedução e habilidade, cercar-se de intelectuais e artistas para assegurar o respeito do terreiro pela sociedade mais ampla.

5. Embora, como será visto mais adiante, pretenda ser talvez mais antigo.6. O documento mais antigo que encontramos entre os guardados” do terreiro é um recibo da missa de São Cosme e Damião, Crispim e Crispiniano, de 27.09.1930. “contratada por D. Eugênia (Eugênia Ana dos Santos), no valor de 20 mil réis, pago em duas vezes”. Leva a assinatura de Frei (ilegível), Rio. Fica, portanto, confirmada a permanência da fundadora no Rio de Janeiro, no ano de 1930, como será visto adiante. Para o ano de 1931, temos cartão de agradecimento de uma filha-de-santo pelo bori à “sua mãezinha querida Eugênia Ana dos Santos” (Rio de Janeiro, 4/2/1931). Em seguida, encontram-se cartas recebidas por Agripina de Souza (ver adiante) de julho de 1935 até meados de 1937, correspondendo à volta de Aninha para a Bahia. Tais cartas, que a fundadora ditou, por analfabeta, constam essencialmente de conselhos e recomendações para o bom andamento das obrigações religiosas. Documentos posteriores, até nossos dias, são cartas de personalidade ligadas à vida do terreiro.7. No que diz respeito à redação definitiva deste artigo, os autores 8. De acordo com Verger (1957, p. 315), Bamboxê teria sido um grade mágico: “mandava socar um galo no pilão, deitava no chão a papa assim obtida, cobria com cesto e pano vermelho. Dançava por cima, sacudindo o Sere e, levantando o cesto, o galo saía vivo, cantando cocoricó. Um dia que, em casa, só tinha um obi e um orogbo, mandou cortá-los em pedacinhos que distribuiu entre os presentes. Botou um pedacinho de cada em recipiente que fixou na parede,

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coberto por um pano vermelho. Quando pegou na caixa de volta, ela estava cheia de obi, orogbo e de verdes folhas de cajazeira”.

9. R. Moura (1983, p.65) escreve que a casa de João Alabá, onde a Tia Ciata era mãe-pequena, “continuaria com o candomblé nagô que havia sido iniciado na Saúde por um africano, Quimbambochê, o Bambochê, que depois voltaria para a Bahia e depois para a África”, baseado em informação fornecida por D. Carmem Teixeira da Conceição que, com 106 anos; parece ser a decana das baianas que chegaram ao Rio no início deste século. Essa concordância entre os depoimentos, no entanto, só parece garantir o empenho em legitimar o funcionamento do terreiro carioca pelo estabelecimento de ligação com mais antigo terreiro de Salvador.10. Esse processo foi descrito detalhadamente por D.M. dos Santos (1952) e F. Carneiro (1961).11. Explicando melhor, nas próprias palavras da informante “No jogo (de búzios), diz que tem que fazer o santo, eu sou mãe-de-santo mas não tenho casa aberta. Você tem, então vou recolher meus filhos-de-santo na tua casa. Para todos os efeitos, são meus filhos-de-santo”. Por esse depoimento verifica-se que apesar da tradição que afirma que a casa teria sido fundada por Tio Joaquim, Aninha, na época, não dispunha de “chão” próprio no Rio de Janeiro.12. Cabe registrar que essas personagens também aparecem nas reportagens de João do Rio (1951) como por exemplo, Calú Boneca, citada como uma das “50 mães-de-santo, contando com as falsas” (p.30): Oyá Bomin, “filha e mãe-de-santo atual da Casa de Abedê” (p. 35); Oxum Toqui é por ele arrolada entre “as feiticeiras” (p. 35).13. Descrição pormenorizada das atividades litúrgicas, bem como da caracterização dos diversos orixás pode ser encontrada em Augras (1983).14. 14. Conforme W. Bascom, Sixteen Cowries, Blomington and London Indiana University Press, 1980, até é a peneira (basketry tray) onde se joçam os búzios

15. Escreve Pierson, grande admirador de Mãe Aninha; “ Possui na cidade uma pequena loja, onde vende vários artigos. Inclusive os usados nos rituais do culto; e sabendo os membros do mundo afro-brasileiro que esses artigos devem ser legítimos, uma vez que são vendidos por ela, a loja faz um bom negócio” (1945, p. 358).16. Abedê aparece repetidas vezes entre os “feiticeiros” arrolados por João do Rio (1951).17. De acordo com R. Bastide (1973) caso semelhante teria sido contado no Gantois, em relação à mesma figura política.18. Como foi assinalado na nota 6, grande parte das cartas do acervo documental é constituída por conselhos de Mãe Aninha e sua filha Agripina para que tudo corra bem; “Faça tudo sem zoada, faça tudo como eu faço sem zoada e direitinho, a fim de evitar consumição (carta de 27.09.1935).19. Foi por intermédio de Conceição, amiga do proprietário, João Cavalcante, que Filhinha adquiriu o Lote 141 da Rua Florisbela, “pelo preço de 450 contos de réis, uma fortuna na época”. Por motivos não explicados, deixou o terreno ao abandono, daí pouca gente saber, naquele momento, da existência dessa “roça”.20. Quando se iniciou a construção, o custo do barracão e da edificação da moradia foi orçado em CR$ 137.500,00. Mãe Agripina pagou aos poucos, “por vezes”, mesmo assim, sobrou uma dívida importante que teve de ser saldada por Mãe Cantú, sua sucessora.21. Carta de, 26.04.1966, de Agripina para Cantulina.22. Carta do jogo de Menininha, mandada para o Professor Agenor, por intermédio de Gildete de Ogun, com data de 10.03.1967.23. Transcrição da mensagem de Xangô Aganjú, documento datado de 05.05.1951.

AgradecimentosOs autores registram aqui sua gratidão pelo apoio recebido por parte da atual ialorixá do terreiro, Iyá Airá Tola, por autorizar a publicação deste artigo.Referências BibliográficasAUGRAS, M. – O Duplo e a Metamorfose. Petrópolis, Vozes 1983.BASTIDE, R. – Estudos Afro-brasileiros. São Paulo, Perspectiva, 1978.BONFIM, M.E.do – Os Ministros de Xangô, in Estudos Afro-brasileiros, RJ, Ariel, p. 233-238, 1935.CARNEIRO, E. – Candomblé da Bahia. Rio de Janeiro, Conquista, 1961COSTA LIMA, V. O Conceito de “Nação”no candomblé jeje-nagô da Bahia.Afro-Ásia,Salvador,p.12:65-90, 1976.Os Obás de Xangô, in olóòrisà, Escritos sobre a religião dos orixás. SP, Agora, p. 87-126, 1981Organização do grupo de candomblé. Estratificação, senioridade e hierarquia, in Bandeira de Alairá, SP, Nobel, p. 79-122, 1982.

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DANTAS, B.G.Repensando a pureza nagô. Religião e Sociedade, RJ, p. 8:15-20, 1982 aVovó Nagô e Papai Branco: Usos e abusos da África no Brasil. Dissertação de Mestrado, Universidade Estadual de Campinas, SP 1982 bMOURA, C.E.M.Candomblé, Xangô, tambor-de-mina, batuque, Pará e babassuê: bibliografia prévia, in bandeira de Alairá, São Paulo, Nobel, p. 123-191, 1982MOURA, R.Tia Ciata e a pequena África no Rio de Janeiro. RJ, FUNARTE, 1983NINA RODRIGUES, R.L’animisme fétichiste des nègres de Bahia. Salvador, Reis, 1900 NINA RODRIGUES, R.L’animisme fétichiste des nègres de Bahia. Salvador, Reis, 1900PIERSON, D.Brancos e Pretos na Bahia. SP, Companhia Editora Nacional, 1945.RAMOS, A.O Negro Brasileiro. SP, Companhia Editora Nacional, 1951RIO, J. deAs religiões no Rio. RJ, Organizações, Simões, 1951SANTOS, D.M. dosAxé Opô Afonjá, Notícias históricas de um terreiro de santo da Bahia. RJ, Instituto Brasileiro de Estudos Afro-Asiáticos, MEC, 1962SANTOS, J.E. dosOs Nagô e a morte. Petrópolis, RJ, Vozes, 1976.SANTOS, D.M. dos e SANTOS, J.E. dosO culto dos ancestrais na Bahia: o culto dos Egun, in Olóòrisà, escritos sobre a religião dos orixás. SP, Nobel, p. 155-188, 1981.VERGER, P.Notes sur le Culte des Orisa et Vodun, Mémoires de l’Institut Français d’Afrique Noire, nº 51,Dakar, 1957.Orixás, Deuses Yorubas na África e no Novo Mundo. Salvador, Corrupio, 1981.

TEMPLO DO AXÉ OPÔ AFONJÁEstudos e Ensaios

Estado do Rio de Janeiro, 05 de maio de 1957

A mando do meu Pai Aganjú, eu Airá Deiuè, escrevo:1º: que o cargo de tia Filhinha de Iyá Kekere, por motivo de doença e idade fica para Airá Tola.2º: que dará oiê a todos que estão presente e abaixo assinado.3º: que todas Abian da casa subissem para fazer obrigação.

Testemunhas:

Amanda MachadoRegina SouzaGeorgina BrandãoMatilde GomesInacia SilvaCantulina PachecoGervasio de AssisHelena FerreiraAnita FerreiraClarice FeitosaEngrácia ConceiçãoJuana Magalhães de AssisMaria dos SantosEdmar Neves de PauloSérgio GuimarãesCleonice Costa

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Reinaldo de Carvalho