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Anais do XXI Encontro Estadual de História –ANPUH-SP - Campinas, setembro, 2012. Uma análise de algumas imagens da Independência Mexicana e o início da construção do "culto a Iturbide" O processo de emancipação da Nação mexicana teve reflexo direto nas artes. Até o início das lutas pela Independência em 1810, a Real Academia de São Carlos vinha começando a implementar os estudos do Neoclassicismo no México. No entanto, devido às transformações políticas e sociais decorrentes das lutas pela Independência, os estudos estagnaram e as artes pararam de florescer. É por esta razão que as artes que retrataram os eventos cruciais do período compreendido entre 1821 e 1824 são consideradas por especialistas como de "nível mediano" 1 . Nas palavras de Inmaculada Moya essas obras costumam ser "(...) pequenas telas com grande número de personagens, realizadas por artistas anônimos, de escassa qualidade pictórica, mas de grande valor documental, dado que refletem a euforia do momento" 2 . Desta forma, as artes do período pós-independência possuem características estéticas bastante particulares que também incluem o retorno do indigenismo e o uso de elementos da escola neoclássica europeia 3 . A figura 1 mostra o momento em que, em 27 de Setembro de 1821 o exército Trigarante 4 , liderado por Agustín de Iturbide, entra vitorioso na Cidade do México. A entrada do exército Trigarante foi considerada o momento da consumação da Independência. Lembremos que Iturbide era um militar de origem criolla 5 que trabalhava a serviço da coroa espanhola lutando contra os insurgentes. As lutas pela Independência haviam começado em 1810 com líderes populares como Miguel 1 MOYA, Inmaculada Rodríguez. El Retrato En Mexico, 1781-1867: Heroes, Ciudadanos Y Emperadores Para Una Nueva Nacion. Sevilla: Universidad de Sevilla, 2006. P. 23. 2 Tradução livre da autora. No original: “Son lienzos por lo general de pequeño tamaño con gran número de personajes, realizados por autores anónimos, de escasa calidad pictórica pero de gran valor documental, puesto que reflejan la euforia del momento.” Id. Ibid. P. 288. 3 Id. Ibid. P. 288. 4 O "Exército Trigarante" foi formado pela fusão do exército espanhol de Iturbide com o exército dos insurgentes liderados por Vicente Guerrero, que a principio eram rivais, mas que num dado momento se uniram na luta pela Independência do México. O nome "Trigarante" significava "Três garantias" que defendiam a religião Católica, a Independência do México e a União dos povos. As três garantias constavam do Plano de Iguala. Fonte: http://portal2.edomex.gob.mx/edomex/estado/historia/bicentenariodelaindependenciademexico/ejercit otrigarante/index.htm Acesso em: 13/05/2012. 5 No caso de Iturbide, nascido no México mas de ascendência espanhola.

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Page 1: Uma análise de algumas imagens da Independência Mexicana e ...€¦ · classes sociais, proclamou a Independência do México. Figura 1- Solemne e pacifica entrada del exército

Anais do XXI Encontro Estadual de História –ANPUH-SP - Campinas, setembro, 2012.

Uma análise de algumas imagens da Independência Mexicana e o início da

construção do "culto a Iturbide"

O processo de emancipação da Nação mexicana teve reflexo direto nas

artes. Até o início das lutas pela Independência em 1810, a Real Academia de São

Carlos vinha começando a implementar os estudos do Neoclassicismo no México.

No entanto, devido às transformações políticas e sociais decorrentes das lutas pela

Independência, os estudos estagnaram e as artes pararam de florescer. É por esta

razão que as artes que retrataram os eventos cruciais do período compreendido

entre 1821 e 1824 são consideradas por especialistas como de "nível mediano"1.

Nas palavras de Inmaculada Moya essas obras costumam ser "(...) pequenas telas

com grande número de personagens, realizadas por artistas anônimos, de escassa

qualidade pictórica, mas de grande valor documental, dado que refletem a euforia

do momento"2. Desta forma, as artes do período pós-independência possuem

características estéticas bastante particulares que também incluem o retorno do

indigenismo e o uso de elementos da escola neoclássica europeia3.

A figura 1 mostra o momento em que, em 27 de Setembro de 1821 o exército

Trigarante4, liderado por Agustín de Iturbide, entra vitorioso na Cidade do México. A

entrada do exército Trigarante foi considerada o momento da consumação da

Independência.

Lembremos que Iturbide era um militar de origem criolla5 que trabalhava a

serviço da coroa espanhola lutando contra os insurgentes. As lutas pela

Independência haviam começado em 1810 com líderes populares como Miguel

1 MOYA, Inmaculada Rodríguez. El Retrato En Mexico, 1781-1867: Heroes, Ciudadanos Y Emperadores Para Una Nueva Nacion. Sevilla: Universidad de Sevilla, 2006. P. 23. 2 Tradução livre da autora. No original: “Son lienzos por lo general de pequeño tamaño con gran número de personajes, realizados por autores anónimos, de escasa calidad pictórica pero de gran valor documental, puesto que reflejan la euforia del momento.” Id. Ibid. P. 288. 3 Id. Ibid. P. 288. 4 O "Exército Trigarante" foi formado pela fusão do exército espanhol de Iturbide com o exército dos insurgentes liderados por Vicente Guerrero, que a principio eram rivais, mas que num dado momento se uniram na luta pela Independência do México. O nome "Trigarante" significava "Três garantias" que defendiam a religião Católica, a Independência do México e a União dos povos. As três garantias constavam do Plano de Iguala. Fonte: http://portal2.edomex.gob.mx/edomex/estado/historia/bicentenariodelaindependenciademexico/ejercitotrigarante/index.htm Acesso em: 13/05/2012. 5 No caso de Iturbide, nascido no México mas de ascendência espanhola.

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Hidalgo e José Maria Morelos6, que são considerados pela historiografia como os

"pais da Independência". Até o ano de 1820 a coroa havia conseguido sufocar

esses levantes, mas num dado momento o próprio general Iturbide voltou-se contra

a Espanha e, ancorado em seu "Plano de Iguala"7 e com o apoio de todas as

classes sociais, proclamou a Independência do México.

Figura 1- Solemne e pacifica entrada del exército de las tres Garantias em la capital do México el dia 27de setiembre del memoravel año de 1821. Séc. XIX, anônimo.

6 Miguel Hidalgo e José Maria Morelos foram padres que promoveram o levante das camadas populares (índios e mestiços) contra os espanhóis e as elites da Nova Espanha. Ambos foram executados pelas tropas reais. ANNA, Timothy E. The Mexican empire of Iturbide. Nebraska: University of Nebraska Press, 1990. P. 3. 7 O "Plano de Iguala" foi um projeto de reforma política composto por vinte e três artigos, sendo que os mais importantes eram as "três garantias": Religião (católica), Independência e União. A partir do plano criou-se o exército Trigarante, que combateria em nome da Independência e garantiria a implementação do Plano. Um aspecto interessante do Plano era que um dos artigos pregava que o rei espanhol Fernando VII deveria ser o rei do México. Se este não aceitasse, outro rei da mesma família tomaria seu lugar. Ou seja: de acordo om o Plano de Iguala o México seguiria sendo uma monarquia, governada por um nobre espanhol, no entanto seria constitucionalista e não absolutista. O Plano de Iguala também protegia a propriedade privada e mantinha os privilégios do Clero, o que garantiu o apoio das classes mais abastadas à causa da Independência. Id. Ibid. P. 4.

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O artista retrata o momento em que Agustín de Iturbide e Vicente Guerreiro8,

seguidos pelo Exército Trigarante, passam sob o arco triunfal construído para a

celebração da conquista da Independência. O arco está decorado com "guirlandas

de flores, alegorias, bandeiras e o novo escudo do México"9. Nos muros que

ladeiam os pilares do arco, há cenas alegóricas. Numa delas, Iturbide é

representado entregando a coroa a uma personificação da América e, na outra, o

herói rompe as correntes que, simbolicamente, uniam o novo ao velho mundo. O

público é distribuído em forma de cortejo e alguns agitam bandeiras com as novas

cores do Império: o verde simbolizando a Independência, o branco a Religião e o

vermelho a União10. Apesar da inserção das novas cores e símbolos e da alusão ao

rompimento com o velho mundo, a historiadora Inmaculada Moya observa que a

celebração não conseguiu se desvencilhar da tradição espanhola:

"A entrada triunfal do exército que havia conquistado a Independência se

comemorou na Cidade do México, seguindo a cerimônia tradicional das entradas

dos vice-reis. A sociedade mexicana aprovava assim um novo governo que

começou adotando em suas formas propagandísticas as cerimonias próprias das

monarquias do Antigo Regime."11

Importante lembrarmos que a tradição da passagem sob o arco triunfal após

uma vitória militar também era utilizada por Napoleão Bonaparte (figura 2). No

Brasil de D. Pedro I, temos um exemplo visual registrado por Johann Moritz

Rugendas12 em que D. Pedro também passa sob o arco no cortejo de sua coroação

(figura 3).

8 Vicente Guerrero (1782-1831) foi mais um líder insurgente que lutava pela Independência desde 1810, quando se uniu a José Maria Morelos. A princípio, Guerrero foi perseguido pelo general Iturbide, mas num dado momento ambos uniram forças e firmaram o "Plano de Iguala", e proclamaram a Independência. Suas tropas unidas entraram na Cidade do México no fatídico 27 de setembro de 1821, evento retratado nesta obra. Fonte: http://www.personajesdelaindependencia.com/2011/08/vicente-guerrero-en-la-independencia-de.html Acesso em: 11/05/2012. 9 MOYA, Opus Cit. P. 289. 10 CORDINACH, Guadalupe Jiménez. México: su tiempo de nacer, 1750-1821, México: Fomento Cultural Banamex, 2001. Ps. 253 e 254. 11 Tradução livre da autora. No original: “La entrada triunfal del ejército que había conseguido la independencia se conmemoró en Ciudad de México siguiendo la cerimonia tradicional de las entradas de virreyes. La sociedad mexicana daba su aprobación así a un nuevo gobierno que comenzó adoptando en sus formas propagandísticas las cerimonias propias de las monarquías del Antiguo Régimen.” MOYA, Opus Cit. P. 289. 12 Johann Moritz Rugendas (1802-1858) foi pintor, gravador e desenhista alemão. Em 1822 esteve pela primeira vez no Brasil como desenhista e documentarista da expedição do Barão de Langsdorff.

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Figura 2 – Napoleão em Brandemburgo, 1810. Charles Meynier. Óleo sobre tela. Col. Versailles-Musée National du Châteaux et des Trianons. Figura 3 – Desenho a lápis e bico de pena, representando o cortejo da coroação de D. Pedro I, por Johann Moritz Rugendas. Col.: Biblioteca Municipal de São Paulo.

Enquanto no caso de Iturbide a celebração da Entrada do Exército segue o

modelo espanhol, D. Pedro adota referências arquitetônicas do modelo napoleônico,

como podemos notar com a presença da quadriga sobre o arco. A aproximação de

D. Pedro com este modelo pode indicar uma intenção de aliviar a carga absolutista

que a solenidade da coroação trazia. Já no caso de Iturbide, nota-se que a

celebração da Independência bastava. Desta forma, a iconografia não precisava

indicar um rompimento com o sistema monárquico, mas sim com a metrópole, como

vemos na alegoria em que Iturbide rompe a corrente que unia o México à Espanha.

Apesar da semelhança compositiva entre as três representações, lembremos

que somente Iturbide e Napoleão eram heróis militares que marcharam vitoriosos

sobre a cidade "conquistada". No caso de D. Pedro, o herói não chegava de uma

guerra e nem conquistara uma cidade. Ele estava apenas sendo retratado no cortejo

de sua coroação, conforme ditavam os rituais da corte. Desta forma, a utilização do

modelo triunfal de Napoleão daria ao cortejo um sentido mais militar e heroico.13

Um mês após a entrada do exército, aconteceu na mesma cidade o

Juramento, que foi representado na tela "Jura Solene na Plaza Mayor da Cidade do

México" feita também por artista anônimo. (Figura 4).

ZENHA, Celeste. O Brasil de Rugendas nas edições populares ilustradas. In http://www.ifcs.ufrj.br/~ppghis/pdf/topoi5a5.pdf Acesso em 26/03/2012. 13 Os arcos do triunfo eram utilizados desde o período romano como símbolos comemorativos das vitórias dos grandes Imperadores, e Napoleão mandou construir diversos deles para celebrar as suas conquistas.

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\ Figura 4 – Jura Solene na Plaza Mayor da Cidade do México, 1821. Autor Anônimo. Colección del Museu de Historia de La Ciudad de México.

A cena reconstrói o momento do Juramento da Independência14 que tomou

lugar na Praça das Armas, no Coração da Cidade do México, no dia 27 de outubro

de 1822. Segundo Maria del Carmen Mantecón, esta celebração também fora

pautada pelos rituais de juramento dos vice-reis espanhóis e teria reverberado por

todo o território do novo Império.

No primeiro plano está retratado o público que vem representado por uma

mistura de pessoas de diversos estratos sociais que se aglomeram ao redor de um

coreto estrategicamente erigido sobre a estátua equestre do rei Carlos IV15. A nova

estrutura também cobre parcialmente a catedral barroca ao fundo, que ainda se

mantém imponente, mostrando que a religião católica era um dos pilares da nova

Nação.

Novamente, nota-se a referência ao arco do triunfo no centro do coreto que

estava ornamentado por colunas da ordem coríntia, e encimado por um pedestal

14 O Juramento servia para legitimar e sustentar o Plano de Iguala e os Tratados de Córdoba. MANTECÓN, Maria del Carmen Vázquez “Las Fiestas para el Libertador Y Monarca de México Agustín de Iturbide, 1821 – 1823”. Estudios de Historia Moderna Y Contemporánea de México, n. 36. Julio-diciembre 2008. Disponível em: http://www.ejournal.unam.mx/ehm/ehm36/EHM000003602.pdf Acesso em: 12/03/2012. P. 55. 15 A estátua de Carlos IV, símbolo do domínio espanhol, teria sido protegida para evitar que fosse destruída pela ira do povo. MOYA, Opus Cit. P. 290.

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onde ficava a águia mexicana, simbolizando a "liberdade da Nação"16. Esta nova

estrutura arquitetônica implantada na tradicional e barroca Praça das Armas, era

carregada de recursos simbólicos e figuras alegóricas que introduziam as virtudes

do novo Império.

Mantecón descreve:

"Em sua base (coreto) foram postas algumas telas cheias de figuras alegóricas

que representavam 'a elevação da América setentrional à categoria de nação

independente livre', simbolizada por um trono sobre o qual estavam o cetro e a

coroa imperial. Também 'a América que subia alguns degraus conduzida por

Iturbide' e outra com os generais do Exército Trigarante com plumagem e banda

tricolor. Por último pintaram vários 'gênios' com arco, flechas e macana17 - em

alusão aos guerreiros do México antigo – que sustentavam um letreiro que dizia:

Al solio augusto ascende, que ya de nadie tu corona pende."18

As festas serviam para legitimar a construção do novo poder perante o

público e, desta forma, deveriam apresentar os recursos necessários para passar a

mensagem à nova Nação19: De acordo com as descrições da solenidade do

Juramento, diversos recursos foram aplicados. A presença das divindades

mitológicas da Antiguidade Clássica e as cenas alegóricas que eram utilizadas nas

festas de legitimação dos vice-reis traziam um sistema simbólico já conhecido pelo

povo, porém adaptado às características da nova Nação.20 A figura do indígena

guerreiro também é inserida na nova retórica das artes como elemento legitimador

da identidade mexicana "(...) vários gênios com arco, flechas e macana (...)". As

insígnias reais (trono, cetro e coroa) aludem à continuidade da tradição monárquica.

Não menos importante, nota-se que o sistema alegórico evocava Iturbide como o

16 MOYA, Opus Cit. P. 290. 17 Arma feita de madeira com a ponta afiada usada por antigos povos indígenas do Mexico e do Peru. 18 Tradução livre da autora. No original: “En su base pusieron uns lienzos llenos de figuras alegóricas que representaban “la elevación de América septentrional al rango de nación independiente y libre”, simbolizada por un trono en el cual estaban el cetro y la corona imperial. También “la América que subía unas gradas conducida por Iturbide” y outra con los generales del Ejército Trigarante con plumaje y banda tricolor. Por último pintaron vários “genios” con carcaj, flechas y macana – en alusión a los guerreros del México antiguo – que sostenían un letrero que decía: “Al solio augusto ascende, que ya de nadie tu corona pende”. MANTECÓN, Opus Cit. P. 53. 19 KEULLER, Adriana T. A. Martins. "As festas nacionais e seus objetos simbólicos na Corte Imperial: perspectiva de uma 'tradição inventada'". In Revista de História – n. 8 – Vitória: Edufes – 1º semestre/1999. P. 18. 20 MOYA, Opus Cit. P. 290.

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consumador da Independência ao representá-lo conduzindo a América "(...) que

subia alguns degraus (...)".

Este mesmo sistema de referências iconográficas que aludem à uma "nova

era" acontece no Brasil de D. Pedro I. O "Pano de Boca do Teatro São João"21

(Figura 5), por exemplo, faz uma síntese dos diversos elementos que configurariam

a nova Nação. O artista Jean-Baptiste Debret22 produz uma cena alegórica em que

uma figura feminina, coroada, representa o governo imperial. Nas mãos desta

figura, a constituição, simbolizando o caráter liberal do novo governo. Bem como na

imagem mexicana, aqui também se utilizam os gênios alados que pairam sobre a

figura coroada, sustentando a inicial do nome de D. Pedro. No caso da decoração

mexicana, os gênios tomavam a forma dos antigos guerreiros indígenas, o que

demonstra que o sistema legitimador do novo Império buscava referências heroicas

dentro da própria pátria. No caso do Brasil, o artista parece evocar a figura do

indígena e das outras raças que compunham o povo brasileiro para mostrar que

todos apoiavam e aceitavam o novo Imperador23.

Figura 5 - Pano de boca do Teatro da Corte, 1822. Jean-Baptiste Debret.

21 Executado por Debret em 1822 por ocasião da apresentação teatral celebrativa da coroação de D. Pedro. O “Real Theatro São João”, hoje Teatro João Caetano, localizado na Praça Tiradentes, no Rio de Janeiro, foi inaugurado em 13 de outubro de 1813 por D. João VI. 22 Jean-Baptiste Debret (1768-1848) foi o principal pintor de história da corte de D. Pedro I. In http://www.suapesquisa.com/biografias/jean_debret.htm Acesso em: 05/10/2012. 23 Fonte: http://www.dezenovevinte.net/obras/jbd_monike.htm Acesso em 12/05/2012.

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Mas voltemos ao México. Tanto os rituais como suas representações

demonstram o início de uma transformação visual que Iturbide levaria a cabo um

ano mais tarde, ao se tornar imperador. O biógrafo Timothy Anna acredita que

Iturbide não precisou criar para si uma imprensa favorável, pois o "culto a Iturbide"24

teria surgido naturalmente, e até mesmo seus opositores o olhavam com respeito e

admiração. Timothy menciona alguns títulos que a imprensa teria usado para se

referir a Iturbide após a conquista da Independência, como "Libertador imortal",

"Herói imbatível", "novo Moisés”, "protetor da Igreja", "O grande homem de Deus", e

até mesmo "Tocha luminosa de Anáhuac". Essas referências apontam para um

fenômeno de "messianização" do herói, que ficou conhecida pela expressão "culto

a Iturbide".

A gravura anônima, também feita no ano de 1821 (Figura 6), apresenta

Iturbide oferecendo a coroa à personificação da América. Por sobre ambos, a águia

mexicana alça vôo e, ao fundo, lê-se na paisagem montanhosa com o sol raiando as

palavras: "todo renace". Esta alegoria propõe de forma mais direta que Iturbide deu

a liberdade à Nação. Até então havíamos visto representações dos eventos

históricos, onde ele aparece como consumador da Independência, à frente de seu

exército. Aqui, Iturbide aparece com a coroa nas mãos em uma nova referencia à

monarquia como o sistema escolhido para a Nação.

Figura 6– La Ressurrección política de América. 1821. Gravura anônima. Figura 7- Gravura anônima, julgando por seu enquadramento, trata-se de um exemplar avant la lettre. Dim.: 94 mm x 145 mm (chapa: 98 mm x 149 mm) Col.: Patrimônio Histórico e Artístico Nacional do Rio de Janeiro (arquivo).

24 O "culto a Iturbide" é descrito por Timothy E. Anna como algo que aconteceu naturalmente, sem precisar de ser construído. Fala-se sobre o "endeusamento" do Libertador decorrente de uma "(...) vitória rápida e não sangrenta sobre as forcas espanholas (...)", que acabou reverberando entre os populares como algo "messiânico". ANNA, Opus Cit. P. 28.

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Figura 8– Tema alegórico: Homenagem a Bolívar. Séc. XIX Gravura anônima. Fundación John Bulton, Caracas.

Este tipo de alegoria, em que a figura do libertador interage com a do

indígena, reverberou na iconografia dos libertadores das Américas. Os exemplos de

D. Pedro I (Figura 7) e de Simon Bolívar (Figura 8) também ilustram esta temática.

No caso de Iturbide, a figura do indígena é uma personificação da América, que

recebe a coroa das mãos do Libertador, numa referência simbólica à entrega da

liberdade ao México por Iturbide. O sol aparece iluminando um futuro cheio de

esperanças. No caso de D. Pedro, o indígena é utilizado como elemento legitimador

de sua Aclamação como Imperador, juntamente com povos de outras raças,

característicos da realidade brasileira. Observa-se que na alegoria de D. Pedro, os

personagens são colocados como elementos de apoio ao Imperador que, apesar de

ter dado a Independência ao Brasil, seguia sendo um monarca português. A

liberdade é aludida de forma mais branda, pelas algemas rompidas e jogadas ao

chão. D. Pedro recebe uma coroa de louros da deusa Nike, como rezava a

iconografia clássica do imperador vitorioso, presente também nas moedas romanas

da antiguidade. Atrás do Imperador vemos o encosto do trono que ele irá ocupar e,

à sua volta, pessoas das diversas raças que compõem o povo brasileiro.

Curiosamente, o artista acrescentou as figuras do paulista, do indígena e dos

portugueses, mas deixou de fora a do negro escravo. Debret, em seu Pano de Boca

(figura 5) incluiu os negros em seu discurso. As algemas rompidas no primeiro plano

aludem à liberdade conquistada, e as armas, ao poderio militar.

No caso de Bolívar, a gravura representa uma cena em que diversos

personagens de diferentes grupos raciais como indígenas, mestiços e criollos,

dançam em torno do busto de Simon Bolívar, celebrando-o como herói da

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Independência.25 Devemos lembrar, no entanto, que Bolívar jamais teve pretensões

de se tornar um monarca. No pedestal que sustenta o busto vemos a frase "Viva

Bolivar", e o sol raiando no fundo também vem aludir à liberdade. Apesar de todas

as diferenças históricas que envolvem as figuras de D. Pedro, Bolívar e Iturbide,

devemos considerar que os elementos que recaíram sobre suas iconografias têm

origem em um lugar comum, pois todos utilizam a figura do indígena para se

legitimar. No caso de D. Pedro, nota-se a inserção de alguns elementos locais, mas

também as referências a Portugal, simbolizadas pelo grupo de homens "civilizados"

à direita, e a presença da nau que aparece do lado esquerdo, por trás da divindade.

A figura 9 retrata o momento em que Iturbide foi proclamado Imperador

Agustin I na madrugada do dia 19 de maio de 1822.

O artista apresenta uma vista em perspectiva da rua em frente ao Palácio de

Jaral y Berrio26 na Cidade do México. Do lado direito da tela, na varanda do Palácio,

o novo soberano recebe os vivas do povo e de seu exército, aceitando o título de

Imperador Agustín I. O exército ainda em formação se estende até o horizonte da

composição. A cena se passa de madrugada, e a representação deixa claro o

caráter inesperado e imprevisto do acontecimento.

Figura 9 – "Es proclamado Iturbide Primer Emperador de México", 1822. Artista anônimo. Col.: Museu Nacional de Historia de la Ciudad de México.

25 ADES, Dawn. Art in Latin America. The Modern Era 1820 – 1980. New haven and London: Yale University Press, 1989. P. 16. 26 O Palácio de Jaral y Berio, "Palacio de Iturbide" (hoje denominado Palacio da Cultura Banamex) é um prédio em estilo barroco mexicano (de influência italiana) construído no séc. XVIII. Foi em uma de suas varandas que Iturbide foi proclamado primeiro Imperador do México (Agustin I). O palácio se localiza no centro histórico da Cidade do México na Rua Madero, n. 17. Fonte: http://www.sic.gob.mx/ficha.php?table=museo&table_id=854&estado_id=9&municipio_id=15 Acesso em: 13/03/2012.

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Esta imagem reflete os adjetivos usados por Moya para descrever a arte

típica do período: "grande quantidade de personagens", "baixa qualidade pictórica",

"prioridade da perspectiva", "figuras humanas quase que irreconhecíveis", "grande

valor documental".

Os personagens que o aclamam são compostos por militares, ainda em

formação, e por pessoas aparentemente de estratos mais baixos que agitam

bandeiras e erguem os braços em direção à Iturbide, que aparece na varanda do

palácio. Moya acrescenta que Iturbide parece abrir os braços em um gesto de

perplexidade, mostrando surpresa pela sua nomeação.

Nota-se que a imagem não demonstra cuidado no tratamento anatômico dos

personagens e dos cavalos, mas ainda assim consegue desenvolver com acuidade

a arquitetura e o céu da madrugada. Há também um notório contraste entre a

rigidez dos militares e da arquitetura, e a desordem dos manifestantes do público

civil, que transmite ao observador a idéia da imprevisibilidade do momento, como se

o povo tivesse sido chamado às ruas de última hora.

Esta obra parece querer enfatizar o peso da estrutura militar por trás da

escolha de Iturbide, pois apresenta o exército bastante numeroso e ainda em

formação.

Alguns dias após a Proclamação, o Congresso começou a construir o Império

de Iturbide, estendendo os títulos monárquicos à sua família, iniciando a cunhagem

de moedas com o busto do Imperador e elaborando um sistema legitimador que

contava com festas nacionais e rituais típicos de corte27.

Cinco meses após a Proclamação de Iturbide como Imperador do México, D.

Pedro era aclamado Imperador do Brasil. O debate entre a Proclamação, no

Méxino, e a Aclamação, no Brasil, se torna frutífero ao considerarmos que,

enquanto Iturbide precisou construir uma monarquia sem raízes legitimas, D. Pedro,

que era legítimo herdeiro da coroa, precisava distanciar-se do modelo português e

criar uma nova identidade nacional.

Na obra da Aclamação de D. Pedro I (figura 10) feita por Jean-Baptiste

Debret, poderemos verificar como os novos modelos foram aplicados.

27 MANTECÓN, Opus Cit. P. 57.

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Figura 10 – Litografia da obra de Debret Acclamation de Don Pedro 1.er Empereur duBrésil; / au camp de S.ta Anna, à Rio-de-Janeiro. 3. e. Partie Pl. 47. J. B. Debret del.t Lith. De Thierry Frères. Dim.: 230 mm x 313 mm (mancha: 192 mm x 300 mm).

O desenho representa o momento em que D. Pedro I sai à varanda do

Palacete do Campo de Santana para ser aclamado Imperador do Brasil. Debret

divide o desenho em duas partes: na metade à esquerda, o artista apresenta uma

ritmada sequência de pórticos, a partir dos quais se projeta a varanda do palacete

onde se localizavam os personagens do poder. O povo vem distribuído no quarto

inferior direito da obra, respondendo aos vivas levantados pelo presidente do

Senado.28

Debret parece ter sido incumbido de eternizar as inovações do novo sistema,

legitimando o Brasil como Nação soberana perante o mundo. Isto se nota em sua

(re)construção pictórica da cena da Aclamação, pois o artista adota um ângulo de

representação que centraliza a figura do "rei-soldado" em uniforme militar,

destacando também a comitiva imperial com suas novas fardas "verde garrafa" e as

insígnias que representam o "estilo nacional"29. Esta forma de representação

bastante didática do que viria a ser o novo Império vem legitimar a afirmação na Ata

da Aclamação como "o primeiro dia da Independência do Brasil". Nota-se também

que na obra da Aclamação, Debret introduz os elementos que configurariam a nova

Nação, como as novas cores, a bandeira, os uniformes e os novos símbolos. 28 Gazeta do Rio N. 127. Terça-feira, 22 de outubro de 1822. 29 RIBEIRO, Maria Eurydice de Barros. Os Símbolos do Poder. Brasília: UNB, 1995.

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No caso da imagem da proclamação de Iturbide, fica claro que o objetivo era

o de "recriar a cena como prova de legitimidade do feito"30, um registro rápido que

documenta sua proclamação como Imperador, ainda sem a inserção dos elementos

legitimadores que recairiam sobre a sua imagem a partir de então. A construção

iconográfica de Iturbide como Imperador começa a acontecer logo após o evento da

proclamação.

O ápice da carreira política de Iturbide foi o momento de sua coroação que

aconteceu no dia 21 de julho de 1822, e foi eternizado numa aquarela de pequenas

dimensões, por um artista anônimo. (Figura 11).

Figura 11 – Solene Coroação de Iturbide na Catedral do México, 1822. Anônimo. Aquarela sobre seda, 49 x 63,5cm. Museu Nacional de Historia, INAH, México DF.

A solenidade seguiu o "Proyecto del Cerimonial que para la inauguración,

consagración y coronoación de su Majestade l emperador Agustín Primero"31 que foi

elaborado por uma comissão de deputados. Mantecón nota que o ritual foi pautado

30 MANTECÓN, Opus Cit. P. 60. 31 Para mais detalhes sobre o projeto, verificar no link: http://archive.org/details/proyectodelcere00unseguat

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pelos cerimoniais de coroação da corte espanhola, seguindo as etapas do Pontifical

Romano.

Iturbide foi coroado pelo presidente do Congresso, o senhor Rafael Mangino,

que em seu discurso teria recordado o Imperador de que seu poder seria sempre

limitado pela Constituição. Após receber a coroa, Iturbide teria coroado ele mesmo a

sua mulher, imitando o ritual introduzido por Napoleão Bonaparte.32

A tela que reproduz o momento da coroação foi feita em aquarela sobre

seda, e traz na parte inferior a legenda: "Solemne Coronación de Yturbide e la

catedral de México día 21 de julio de 1822".

Nas palavras de Inmaculada Moya:

"A Perspectiva nos oferece uma vista da nave principal da catedral do México,

sob cuja cúpula localiza-se o antigo ciprés barroco. À sua frente, o presidente do

Congresso Mexicano durante este mês, don Rafael Mangino, coroa Agustín I, que

com capa de arminho – levada por dois meninos – ajoelha-se perante ele."33

Sob os dosséis vermelhos colocados ao longo da nave encontra-se, ao lado

esquerdo, a família de Iturbide, ao direito, os deputados do Congresso, "reafirmando

que se tratava de uma monarquia constitucional"34.

Importante destacar a colocação estratégica da bandeira tricolor,

simbolizando as três garantias, que pende, em primeiro plano, da cúpula da

Catedral, reafirmando a importância do "Plano de Iguala" para o que seria a nova

Nação.

Seguindo a tradição das representações mexicanas deste período, a

arquitetura toma conta da composição e os personagens parecem pequenos

bonecos distribuídos numa estreita faixa na parte inferior do quadro. A cena da

coroação acontece no último plano da obra e os olhos do observador são guiados

pela sequencia ritmada dos arcos e colunas que estruturam o interior da Catedral. O

artista utiliza tons de vermelho para os móveis e ornamentos e tons de branco e

32 MANTECÓN, Opus Cit. P. 62. 33 Tradução livre da autora. No original: “La perspectiva nos ofrece la vista de la nave principal de la catedral de México, bajo cuya cúpula está el antiguo ciprés. Frente a él, el presidente del Congreso Mexicano durante ese mês, don Rafael Mangino, corona a Agustín I, que con capa de armiño – recogida por dos muchachos – se arrodilla ante él.”. MOYA, Opus Cit. P. 295. 34 MANTECÓN, Opus Cit. P. 65.

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preto para as vestimentas dos personagens, demonstrando pobreza e simplicidade

na composição das cores e dos detalhes.

A obra mexicana da coroação careceu da técnica e do detalhamento que

estiveram presentes nas obras de Debret e de Jacques-Louis David, do mesmo

tema. Na coroação de D. Pedro, Debret conseguiu, apesar das dificuldades, aplicar

os preceitos compositivos neoclássicos apreendidos com seu mestre e tio Jacques-

Louis David demonstrando "(...) a preocupação do pintor de história com a exatidão

na descrição da cena observada, em que recupera todos os detalhes da

composição individualmente, para depois reconstruí-los à sua maneira (...)"35.

Desta maneira, mais uma vez se nota que a arte mexicana exerceu a sua

função de registrar o momento e legitimá-lo, mesmo sem ter a qualidade e a técnica

que o Brasil da mesma época possuía com os artistas pensionistas da Missão

Artística Francesa.

A vista escolhida por Debret mostra o detalhamento dos personagens, das

vestimentas, das insígnias e de todos os símbolos e cores que compunham a

solenidade. No caso da representação de Iturbide, o artista localizou a cena e

posicionou os personagens no fundo da tela fazendo com que mal se notassem as

diferenças entre eles.

A análise das obras representativas dos momentos cruciais da política

mexicana após a Independência demonstra que as artes tiveram um grande papel

documental na reprodução dos eventos, apesar de carecerem de uma estrutura

acadêmica apropriada. Contrariamente ao Brasil de D. Pedro I, que contava com

artistas de alto nível técnico que haviam estudado na França e servido ao Império

Napoleônico, o México de Iturbide precisou improvisar uma arte legitimadora e

inventar uma monarquia. O resultado disso foi uma mistura dos elementos da

tradição monárquica espanhola que se revela nos cerimoniais e no uso dos

símbolos como trono, cetro e coroa, unidos a elementos do imaginário napoleônico

como as entradas triunfais, as roupas e as insígnias que foram construídos sobre os

fortes e robustos alicerces de um passado Imperial Asteca.

35 DIAS, Elaine. “A representação da realeza no Brasil: uma análise dos retratos de D. João VI e D. Pedro I, de Jean-Baptiste Debret”. Anais do Museu Paulista – História e Cultura Material, São Paulo, v. 14, n. 1, p. 243-261, jan.-jun, 2006. P. 97.

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