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Um olhar sobre a implementação da Reforma Educativa em Angola Estudo de caso nas províncias de Luanda, Huambo e Huíla M. Azancot de Menezes Luanda, Janeiro de 2010

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Um olhar sobre a implementação da

Reforma Educativa em Angola

Estudo de caso nas províncias

de Luanda, Huambo e Huíla

M. Azancot de Menezes

Luanda, Janeiro de 2010

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Um olhar sobre a implementação da Reforma Educativa em Angola. Estudo de caso nas Províncias de

Luanda, Huambo e Huíla. M. Azancot de Menezes (2010) 2

AGRADECIMENTOS

Gostaria de agradecer a todos os directores de escola, subdirectores

pedagógicos, professores, funcionários administrativos das escolas e das

repartições municipais de educação, inspectores escolares, encarregados de

educação e a outros agentes educativos, por me terem ajudado a melhor

compreender a problemática em torno da implementação do programa da

Reforma Educativa através dos vários diálogos educacionais, muito

construtivos, mantidos durante as entrevistas ocorridas nos meses de

Novembro e Dezembro de 2009 em diversas escolas das periferias urbanas

e nas zonas rurais das províncias de Luanda, Huambo e Huíla. A todos eles,

apesar das condições de trabalho não serem as melhores, desejo que

continuem a educar com muita dedicação e competência profissional.

Um agradecimento ao Exmo. Senhor Doutor Pinda Simão, membro

do Governo de Angola e representante do Ministério da Educação, e ao

Técnico Superior do INIDE ligado à Reforma Educativa pelas entrevistas

concedidas.

Algumas conversas muito especiais contribuíram também para a

elaboração deste estudo, por isso, os meus agradecimentos aos alunos do

ISCED de Luanda, a minha grande fonte de inspiração, aos excelentes

agentes educativos da ADRA e aos colegas do ISCED de Luanda, com

realce para a Prof. Luísa Filomena Araújo.

Finalmente, não poderia deixar de mencionar, uma palavra de

reconhecimento muito especial à APN-Angola (Ajuda Popular da Noruega

a Angola) pelo facto de ter apoiado financeiramente este estudo.

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Um olhar sobre a implementação da Reforma Educativa em Angola. Estudo de caso nas Províncias de

Luanda, Huambo e Huíla. M. Azancot de Menezes (2010) 3

ÍNDICE

Capítulo 1

Introdução

1.1. Apresentação do problema 4

1.2. Questão de estudo 6

1.3. Objectivos 7

1.4. Importância do estudo 8

1.5. A política de bem-estar social delineada pelo governo no domínio

da educação até 2025 9

1.6. A reforma educativa na perspectiva do governo 15

1.7. Breves considerações teórico-conceptuais sobre reforma

educativa, inovação curricular e reforma curricular 19

1.8. A avaliação da qualidade das escolas 21

1.9. Referencial utilizado no estudo para a avaliação da implementação

da reforma educativa 22

Capítulo 2

Metodologia

2.1. Paradigma de investigação utilizado no estudo - Abordagem qualitativa 24

2.2. Questões de ordem ética 25

2.3. Campo de investigação e participantes do estudo 27

2.4. Técnicas e instrumentos de recolha de dados 29

Capítulo 3

Apresentação, Análise e Interpretação dos Resultados

3.1. Apresentação dos resultados da Província de Luanda 31

3.2. Apresentação dos resultados da Província do Huambo 41

3.3. Apresentação dos resultados da Província da Huíla 50

3.4. Análise e Interpretação dos Resultados 57

Capítulo 4

Discussão e Conclusão

4.1. Discussão dos resultados obtidos por referência à questão de estudo,

ao PANETP e ao programa de implementação da reforma educativa 61

4.2. Algumas considerações sobre a validade dos resultados do estudo 66

4.3. Conclusão 67

4.4. Recomendações 69

Referências Bibliográficas 73

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Capítulo 1

Introdução

1.1. Apresentação do problema

O Governo de Angola criou a LBSE - Lei de Bases do Sistema de Educação (Lei

nº 13/01 de 31 de Dezembro de 2001) e tomou um conjunto de decisões estratégicas até

2025 para o sistema sócio-cultural, tendo por base quatro incertezas críticas, “os valores

e comportamentos dominantes na sociedade, a recomposição da sociedade civil, atitudes

e comportamentos da juventude, e o papel da mulher na sociedade” (Angola 2025, Um

País de Futuro). Na expectativa de encontrar soluções para a resolução dos problemas

inerentes às incertezas no domínio concreto da educação, neste mesmo documento,

afirma que se pretende atingir um conjunto vasto de resultados, nomeadamente, situar a

taxa de escolaridade bruta colocando-a acima do nível médio observado nos Países de

desenvolvimento humano médio em 10 a 15 pontos percentuais e elevar o número de

professores no ensino primário e secundário por forma a que o número de alunos por

turma se reduza de 35 para 20. Traçadas as políticas educativas de âmbito estratégico,

teve início o consequente processo da reforma educativa em todo o país, perspectivado

para ocorrer em cinco fases (fonte: INIDE - Instituto Nacional de Investigação e

Desenvolvimento da Educação, 2009): preparação (2002-2012), experimentação (2004-

2010), avaliação e correcção (2005-2012), generalização (2006-2011) e avaliação global

(2012). Segundo os propósitos governamentais, a LBSE “obriga à realização de uma

reforma total, abrangendo todos os aspectos da educação em Angola” (INIDE, 2009),

principalmente, melhorias ao nível da expansão da rede escolar e da qualidade de

ensino, da eficácia do sistema de educação e da sua equidade.

A operacionalização de tais propósitos, entre outros aspectos, implica a

reformulação dos planos curriculares inadequados, a melhoria de condições necessárias

ao processo de ensino-aprendizagem (salas de aula apetrechadas, manuais escolares em

qualidade e quantidade, instrumentos de avaliação contínua, etc.), a formação inicial e

contínua de professores, gestores e inspectores escolares, a garantia da igualdade de

oportunidades a todos os cidadãos mediante um ensino primário de qualidade e gratuito,

bem como, a produção de legislação específica sobre educação e de outros mecanismos

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de regulação no sentido de serem criadas condições para que as escolas promovam a

gestão curricular e a concepção de projectos educativos contextualizados.

No entanto, apesar de se ter criado a LBSE e dos propósitos do Governo realçarem a

importância de que a reforma educativa deveria abranger todos os aspectos da educação,

a verdade é que, observações empíricas, mostram, por um lado, que o relacionamento

das instâncias decisoras (Delegações Provinciais de Educação e Repartições

Municipais/Comunais) com as escolas, em particular as primárias, é distante e tem

demonstrado que existe apenas colegialidade administrativa e burocrática, havendo

muitos obstáculos característicos das estruturas centralizadas, por outro lado, não

obstante termos terminado 2009 (6º ano da reforma educativa), parecem persistir sérios

problemas ao nível da inovação e qualidade de ensino propostos pela reforma educativa,

como por exemplo, a inexistência de professores capacitados para o ensino resultante da

extensão do ensino primário de quatro para seis anos, a falta de professores com

formação específica para leccionarem as disciplinas de educação laboral, educação

física e outras matérias introduzidas no âmbito da reforma, a não generalização dos

novos materiais pedagógicos pelo País e a sua gratuitidade, a carência acentuada de

instrumentos de avaliação (cadernetas de avaliação contínua dos alunos) e, para citar

apenas outro exemplo, a falta de condições para a prática da avaliação contínua dos

estudantes por causa da ausência de salas ou, tendo por referencial o plano de reforma

educativa (máximo de 30 a 35 alunos por sala), devido ao excesso de alunos por turma.

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1.2. Questão de estudo

As considerações anteriores e outras afins podem suscitar várias inquietações

relacionadas com os pontos de crise do sistema, em que se destaca na área

administrativa a exagerada centralização e burocracia do Governo e das suas

Delegações, a ausente democratização na gestão das escolas primárias detectável pelo

não envolvimento dos professores, famílias, associações locais e outros agentes

educativos na direcção e gestão das escolas (com distinção inequívoca entre “funções de

direcção” e “funções de gestão”), mas, também, a carência de directores de escola, de

inspectores escolares e de professores com formação adequada numa perspectiva

pluridimensional. Partindo destes pressupostos, no âmbito de um estudo sobre a

implementação da reforma educativa no País, considera-se pertinente colocar a seguinte

questão de estudo:

Será que o programa de implementação da reforma educativa em curso resultou de

um diagnóstico suficientemente exaustivo para se identificarem os pontos de crise do

sistema, a fase de preparação foi suficientemente ajustada e o cronograma estabelecido

para as actividades previstas nas diferentes fases da reforma foi o mais adequado no

sentido de se garantirem as melhores condições para a execução do programa,

nomeadamente, o envolvimento, a formação qualitativa e a quantitativa dos principais

actores educativos (professores, directores de escola, inspectores escolares,

encarregados de educação e outros agentes da educação), a elaboração de novos

currículos e a sua distribuição atempada e em quantidade, a aquisição de meios de

ensino e equipamentos, a construção e reabilitação de escolas em todas as províncias,

municípios e comunas do País, correspondendo às expectativas dos profissionais da

educação, das famílias e da sociedade em geral?

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1.3. Objectivos

Na expectativa de melhor se compreender as inquietações expressas na questão de

estudo e identificar alguns dos problemas essenciais do sistema educativo angolano,

num contexto de estudo de caso, entendeu-se pertinente definir os seguintes objectivos:

1.3.1. Objectivo geral

Compreender o processo de implementação da reforma educativa no âmbito do

ensino primário, na perspectiva de directores, professores e outros agentes educativos

das províncias de Luanda, Huambo e Huíla, identificando potencialidades, limites e

desafios futuros tendo em vista a melhoria significativa da qualidade da educação no

País.

1.3.2. Objectivos específicos

a. Reflectir sobre as opiniões de directores, professores, inspectores escolares e

outros agentes educativos em relação à problemática da educação em geral e

sobre a implementação do programa da reforma educativa no âmbito do

ensino primário em particular;

b. Analisar os progressos alcançados na melhoria da qualidade de ensino com a

implementação da reforma educativa do ensino primário nas províncias em

estudo;

c. Identificar os principais constrangimentos do programa;

d. Reflectir sobre as condições actualmente existentes para a implementação do

programa de reforma educativa.

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1.4. Importância do estudo

A importância de um estudo sobre a implementação da reforma educativa no

País parece justificada, entre outras, por três razões.

Em primeiro lugar, com esta pesquisa pretende-se compreender a percepção dos

agentes educativos directamente envolvidos, nomeadamente, directores e professores de

escolas primárias. Sem a participação motivada de professores e directores de escola

não é possível implementar-se com êxito qualquer reforma educativa, portanto,

considerou-se que a auscultação directa dos actores envolvidos na reforma assume uma

importância determinante.

Um pouco nesta linha de pensamento, eis uma outra razão, acredita-se que o

paradigma de investigação que serve de suporte ao estudo, assente principalmente na

abordagem qualitativa, porque o objectivo é obter-se a compreensão mais profunda dos

problemas, investigar o “interior” de certos comportamentos, convicções, crenças,

atitudes e sentimentos, etc., contribuiu para a importância deste estudo. Efectivamente,

salvo melhor opinião, os estudos de avaliação sobre a implementação da reforma

educativa executados pelo Governo são pouco divulgados e os resultados mais

conhecidos, apesar da sua óbvia utilidade para determinados fins, por vezes denotam a

subjugação da vertente pedagógica à perspectiva da abordagem quantitativa, através de

tabelas com números, gráficos e estatísticas, portanto, pouco ou nada esclarecedores em

relação ao que realmente pensam os actores educativos directamente envolvidos na

implementação do programa da reforma educativa, ou seja, ignorando a complexidade

da instituição escolar.

Finalmente, um outro aspecto não menos importante, o estudo em questão

realiza-se no quadro de uma iniciativa da ADRA (Acção para o Desenvolvimento Rural

e Ambiente), uma instituição externa ao Governo. Esta Associação, sediada em Luanda,

tem intervenção em várias províncias do País, nomeadamente no domínio da educação,

através de um projecto de intervenção (Projecto Onjila) que tem como principal linha de

força a formação contínua de professores, de directores de escola e de outros agentes

educativos na perspectiva da capacitação de quadros sensibilizados para a promoção e a

implementação de um modelo pedagógico que privilegie a contextualização e a relação

escola-família. Sendo uma instituição virada para a inovação e a mudança qualitativa,

acredita-se que através deste e de outros estudos similares pode ter muita utilidade e

auxiliar o Governo nas tomadas de decisão em matéria de políticas educativas.

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1.5. A política de bem-estar social delineada pelo Governo no domínio da

educação até 2025

No âmbito da política de bem-estar social, na vertente da educação, tendo por

base questões fundamentais como o “baixo nível educacional da população, a reduzida

escolaridade e o elevado analfabetismo; a desarticulação entre os sistemas de educação

e de formação e entre estes e as necessidades de desenvolvimento do país; a necessidade

de interligar a procura do acesso à educação com a procura de conhecimentos,

competências e qualificações; a articulação entre os diferentes subsistemas de ensino; o

baixo nível de rendimento e eficiência com elevadas taxas de repetência e abandono”

(Estratégia Angola, 2025, Um País de Futuro), o Governo delineou vários objectivos

estratégicos e específicos, metas e opções estratégicas. Os pontos que se seguem

abordam esses aspectos e são importantes como referencial a tomar em consideração no

estudo em causa porque é suposto terem por base os resultados da consulta pública

sobre o Plano de Acção Nacional de Educação para Todos (PANEPT) e as

Recomendações do Colóquio sobre o Ensino em Angola (2004).

1.5.1. Objectivos do Governo baseados nos resultados da Consulta Pública

sobre o Plano de Acção Nacional de Educação para Todos (PANEPT) e nas

Recomendações do Colóquio sobre o Ensino em Angola (Maio de 2004)

O Governo, tendo estabelecido como objectivo global promover o

desenvolvimento humano e educacional do povo angolano, com base numa educação e

aprendizagem ao longo da vida para todos os angolanos, definiu um conjunto vasto de

objectivos específicos, segundo o próprio, baseados nos resultados da Consulta Pública

e nas recomendações do Colóquio sobre o Ensino em Angola (2004). Tal como se

referiu anteriormente, todos estes aspectos consideram-se fundamentais no âmbito desta

pesquisa porque constituem referenciais úteis na medida em que melhor se percebe se

os resultados esperados estão a ser atingidos de forma desejável.

Dos objectivos específicos baseados na Consulta Pública sobre o PANEPT e nas

Recomendações do Colóquio sobre o Ensino em Angola definidos pelo Governo,

destacam-se os seguintes:

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a. “Criar um sistema educativo equitativo e orientado para a igualdade de

oportunidades de acesso à educação e formação para o exercício de uma

cidadania activa e plena para todos os angolanos;

b. Assegurar a educação pré-escolar;

c. Assegurar o ensino primário obrigatório e gratuito para todos;

d. Estimular crescentes taxas de escolaridade em todos os níveis de ensino, com

redução de diferenciações de género, em particular no ensino básico;

e. Reduzir assimetrias sociais e territoriais no acesso ao sistema de ensino;

f. Melhorar de forma substancial o desempenho e a eficiência do sistema de

ensino, com forte redução da repetência e abandono escolar;

g. Promover um abrangente e eficaz sistema de informação e orientação

profissional e uma transição adequada entre o sistema escolar e as necessidades

do mercado de trabalho;

h. Assegurar a formação de recursos humanos qualificados, necessários ao

desenvolvimento da economia, inovação e conhecimento, melhorando

substancialmente a formação média e superior e a formação avançada;

i. Assegurar o cumprimento dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio na

área educativa, até 2015;

j. Desenvolver currículos e metodologias de ensino e aprendizagem, em todos os

graus de ensino, adaptados às necessidades específicas de Angola;

k. Formar professores com perfil adaptado a novos currículos e métodos de ensino

e aprendizagem, verdadeiros profissionais do ensino;

l. Transformar a Escola em Centro Local de Aprendizagem dotada de autonomia

contratualizada, aberta a crianças, jovens e adultos, dotada de recursos e capaz

de facilitar o acesso ao conhecimento e à qualificação e ao reconhecimento de

competências em contexto de Rede Educativa;

m. Criar um sistema educativo aberto à participação de vários agentes públicos,

privados e cooperativos, coexistindo diferentes modelos de financiamento e

formas de parceria;

n. Implementar uma política efectiva de acção social escolar, no sentido de permitir

a melhoria das condições de acesso e de diminuição do nível de abandono

escolar;

o. Reabilitar, construir e apetrechar Escolas Polivalentes e Profissionalizantes;

p. Reforçar a capacidade institucional e a cobertura escolar do Ensino Especial;

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q. Criar uma capacidade nacional de produção e edição de manuais escolares e de

outros materiais pedagógicos e de ensino”.

1.5.2. Metas do Governo estabelecidas no domínio da educação para 2015

(PANEPT) e no âmbito da “Estratégia Angola 2025”

As metas estabelecidas pelo Governo são consideradas ambiciosas. No âmbito

do ensino primário, o nível de ensino a que se refere este estudo, o Governo pretende

que em 2025 o número de alunos do ensino primário se aproxime dos 4,3 milhões

(segundo dados do GEPE/MED, em 2008 havia 3.757.677 alunos matriculados no

ensino primário). Tendo por referência o PANEPT, o Governo pretende que a taxa

líquida de escolaridade aumente de 47% em 2004 para 100% em 2015, a taxa de

conclusão progrida de 24% para 100%, a taxa de repetência baixe de 25% para 10% e a

de abandono de 22% para 5%.

1.5.3. Opções estratégicas do Governo no quadro da “Estratégia Angola

2025”

As opções estratégicas do Governo no quadro da “Estratégia Angola 2025”

foram traçadas com base em determinados objectivos, princípios e acções prioritárias.

Dando cumprimento à linha de raciocínio introduzida neste estudo, de seguida

apresentam-se algumas dimensões preconizadas pelo Governo no quadro das opções

estratégicas e que também servirão de referência para uma melhor compreensão sobre o

processo de implementação do programa da reforma educativa. As dimensões

consideradas pertinentes para este estudo são sete. (1) o conceito, modelo de

organização e evolução do sistema educativo, (2) o desenvolvimento curricular –

conteúdos e metodologias de ensino-aprendizagem, (3) professores – perfil, formação,

qualificação e valorização, (4) rede educativa, instituições, espaços, material de ensino e

equipamentos, (5) conceito e modelo de organização, gestão e autonomia e avaliação

das escolas, (6) modelo de prestação e de financiamento dos serviços educativos e (7)

integração das tecnologias de informação e comunicação na educação.

Em relação à primeira dimensão, (1) conceito, modelo de organização e

evolução do sistema educativo, segundo o documento, o Governo defende um “sistema

de ensino centralizado na visão e descentralizado na acção”, ou seja, a ideia consiste no

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Governo concentrar e decidir sobre as grandes linhas estratégicas de actuação mas com

uma gestão descentralizada possibilitando aos actores locais intervir ao nível da

regulação operativa. Em relação à LBSE, é reafirmado o empenho na realização da

escolarização de todas as crianças em idade escolar, a redução do analfabetismo de

jovens e adultos e o aumento da eficácia do sistema educativo e a sua readaptação.

Note-se que, internacionalmente, Angola ratificou praticamente as principais

Convenções, Declarações e Pactos Internacionais, onde os Estados assumem o

compromisso de garantir a todos os seus cidadãos o direito à educação. De entre alguns

documentos ratificados destacam-se a “Convenção sobre os Direitos da Criança”, a

“Declaração Mundial da Educação para Todos”, o “Quadro de Acção de Dakar-

UNESCO” e, no âmbito da SADC, o “Protocolo sobre Educação e Formação”, ou seja,

assumiu um compromisso no sentido de responder aos desafios produzidos pelos

diversos organismos regionais e internacionais em matéria de educação.

A segunda dimensão (2) desenvolvimento curricular - conteúdos e metodologias de

ensino/aprendizagem, refere-se à importância da flexibilização curricular. De acordo

com o documento, ao nível do currículo, o Governo, traça vastos princípios e acções

prioritárias. Como referencial para este estudo, por exemplo, destaca-se o facto do

Governo defender a importância da diversidade económica, social e cultural na

concepção do currículo. Nestes termos, preconizam a seguinte combinação:

a. “Uma componente nacional uniforme (70 a 75% dos tempos lectivos);

b. Uma componente territorial específica (currículo local), correspondendo à

natureza própria de cada região/província (20 a 25% dos tempos lectivos);

c. Uma componente aberta (3 a 5% dos tempos lectivos) à iniciativa de cada

escola, visando a afirmação da sua identidade, nomeadamente, em matéria de

formação de competências e de atitudes e valores próprios” (Op.cit.).

A terceira dimensão (3) Professores – perfil, formação, qualificação e valorização,

tem como objectivo “adequar o perfil de competências profissionais dos professores,

formadores e educadores em geral, às mudanças de contexto cultural e educativo como

condição indispensável e determinante para a redução dos elevados níveis actuais de

insucesso escolar, a melhoria da qualidade do ensino e o primado das competências e da

aprendizagem” (Op.cit.). Segundo o documento deverá atribuir-se importância à

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profissionalização do docente, a ser olhado como “professor mediador”. Eis alguns dos

princípios e acções prioritárias preconizados:

a. “Recentrar a função do professor na actividade de ensino;

b. Transitar do especialista de disciplina para um professor membro de uma equipa

responsável pela gestão descentralizada do currículo;

c. Integrar nos curricula e programas, as cada vez mais solicitações à escola nos

domínios da saúde, educação sexual, educação cívica, educação ética ou

educação ambiental, etc.;

d. Estruturar a formação de professores numa base interdisciplinar ou

multidisciplinar, apontando para a aprendizagem de competências transversais

integradas e contínuas ao longo da vida profissional;

e. Desenvolver relações de cooperação e parcerias de formação entre os

estabelecimentos de ensino superior e as escolas básicas e secundárias;

f. Organizar programas especiais de aperfeiçoamento e reciclagem para docentes

sem habilitação profissional;

g. Estabelecer novas e estimulantes condições de trabalho para os novos tipos de

professor” (Op.cit.).

A quarta dimensão (4) rede educativa, instituições, espaços, material de ensino e

equipamentos prende-se com o objectivo de “fazer evoluir o conjunto de redes

escolares, centros profissionais e ou centros educativos para uma rede educativa”

(Op.cit.). Neste domínio, segundo o Governo, deve existir um programa de reabilitação

e construção de escolas para os vários níveis de ensino não superior e um programa de

equipamento e mobiliário essencial, como quadros e carteiras. Também, de acordo com

o documento governamental, defende-se a ideia de que cada escola deve ter um

programa de abastecimento que possibilite, a nível profissional, aquisições em

condições bonificadas.

A quinta dimensão (5) conceito e modelo de organização, gestão, autonomia e

avaliação das escolas, tem como principal objectivo “reforçar a autonomia das escolas

envolvendo a devolução e responsabilização das comunidades pela gestão e controlo

das escolas públicas” ( Op.cit.). É aqui defendido que após 2015 deverá existir de forma

generalizada um modelo de “escola autónoma”, na medida em que irá assegurar a

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gestão curricular e a existência de “programas mais contextualizados e adaptados às

realidades e necessidades locais” (Op.cit.). A grande preocupação, segundo o

documento, é que as direcções das escolas passem a ter uma preocupação pedagógica

centrada nos resultados de aprendizagem.

A sexta dimensão (6) modelo de prestação e de financiamento dos serviços

educativos tem dois objectivos. Em primeiro lugar, garantir “a universalidade,

obrigatoriedade e gratuitidade do ensino básico obrigatório (leia-se: ensino primário)”,

por outro lado, assegurar a “diversidade eficiente de modelos de prestação e de

financiamento de serviços educativos” (Op.cit.). De acordo com o mesmo documento,

salientam-se os seguintes princípios e acções prioritárias:

a. A “escolaridade obrigatória, que tenderá a ser de 6 anos e posteriormente de 9

anos, deverá ser gratuita, havendo isenção de taxa de inscrição e propinas,

cedência, por empréstimo do manual escolar e distribuição regular de material

didáctico, cadernos, lápis, esferográficas e borrachas;

b. Deverá existir “um sistema de bolsas de estudo, de acordo com as condições de

rendimento das famílias, para suportar outros custos, casos de manuais

escolares, materiais didácticos, alimentação e transporte”. Segundo o documento

governamental, pretende-se garantir a “equidade no acesso e progressão no

sistema educativo e o combate ao insucesso, absentismo e abandono escolar”.

A sexta dimensão (6) integração das tecnologias de informação e comunicação na

educação, tem como um dos objectivos, a utilização das Tecnologias de Informação e

Comunicação (TIC’s) para a “melhoria dos processos de ensino-aprendizagem” e a

“universalização de um conjunto de competências básicas em TIC´s para o exercício de

uma cidadania activa nas sociedades baseadas no conhecimento”.

A sétima dimensão (7), no âmbito que interessa a este estudo, o ensino primário, há

um objectivo fundamental defendido no documento que reforça a ideia de se “assegurar

a educação pré-escolar e o ensino primário obrigatório e gratuito para todos” e “elevar a

taxa líquida de escolaridade da educação básica para cerca de 100%).

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1.6. A Reforma educativa na perspectiva do governo: (I) objectivos (II)

cronograma e (III) actividades desenvolvidas no âmbito da implementação do

novo sistema de educação

O governo coordenou e o INIDE (2009) editou uma brochura explicativa do

projecto da reforma educativa. Este documento espelha aspectos relacionados com os

objectivos preconizados com a reforma educativa, o cronograma e as actividades

desenvolvidas no âmbito da sua implementação, desde 2004 (1º ano da reforma

educativa) a 2008. A avaliação, outra dimensão constante do documento, não é aqui

referenciada, por duas razões. Em primeiro lugar, trata-se de uma avaliação da

responsabilidade das autoridades centrais, com critérios desconhecidos, pelo que, não

faz qualquer sentido proceder a juízos de valor. Em segundo lugar, não se integra na

finalidade deste estudo. Assim, na linha de raciocínio seguida até ao momento, com

base na brochura do INIDE (2009) intitulada “Informação sobre a Implementação do

Novo Sistema de Educação – Reforma educativa do Ensino Primário e Secundário”,

passa-se de seguida, com base no documento, a descrever os objectivos, o cronograma e

as actividades desenvolvidas na implementação do novo sistema de educação.

(I) Objectivos da reforma educativa na óptica do governo

Os grandes objectivos da reforma educativa são a “expansão da rede escolar, a

melhoria da qualidade de ensino, o reforço da eficácia do sistema de educação e a

equidade do sistema de educação” (INIDE, 2009). Tomando em consideração estes

objectivos, no âmbito deste estudo, interessa realçar os seguintes aspectos:

No que diz respeito à “expansão escolar”:

a. “Universalização da classe de iniciação e do ensino primário de seis classes;

b. Introdução e generalização da carta escolar do ensino primário e secundário;

c. Integração das crianças com necessidades educativas especiais no sistema

nacional de ensino” (INIDE, 2009).

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Em relação à “melhoria da qualidade de ensino”:

a. “Reformulação, em profundidade, dos objectivos gerais da educação, programas

escolares, conteúdos, métodos pedagógicos, estruturas e meios pedagógicos

adequados à realidade angolana;

b. Melhoria das aprendizagens e enquadramento pedagógico dos alunos;

c. Formação inicial e em exercício dos professores;

d. Modernização e reforço da inspecção escolar;

e. Melhoria da qualidade e quantidade de manuais escolares;

f. Melhoria do trabalho metodológico e do processo docente-educativo das

escolas;

g. Garantia da participação da comunidade nos trabalhos da escola, isto é, da

relação entre a escola e a comunidade” (INIDE, 2009).

Quanto ao “reforço da eficácia do sistema de educação”:

a. “Construção de um sistema de monitoria e avaliação dos resultados do processo

ensino-aprendizagem;

b. Melhoria do sistema de informação para a gestão educativa;

c. Formação de gestores escolares;

d. Melhoria na circulação de informação dos dados do processo e ensino-

aprendizagem” (INIDE, 2009).

Em relação à “equidade dos sistema de educação”:

a. “Garantia da igualdade de oportunidades a todos os cidadãos através de um

ensino primário de qualidade, atingindo particularmente as classes mais

desfavorecidas;

b. Redução das disparidades de género, atingindo particularmente os portadores de

deficiências psicossomáticas e as assimetrias regionais no acesso à educação”

(INIDE, 2009).

(II) Cronograma de Implementação do Novo Sistema de Educação

O Decreto nº2/05 de 14 de Janeiro aprova o plano de implementação progressivo do

novo sistema de educação. Conforme expressa o decreto, através do seu artigo 2º, a

implementação do novo sistema de educação far-se-á em 5 Fases (1. Preparação, 2.

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Experimentação, 3. Avaliação e Correcção, 4. Generalização e 5. Avaliação Global),

podendo as mesmas coexistirem entre elas.

1. Fase de preparação. Com esta etapa pretendeu-se criar condições e realizar

actividades para a aplicação do novo sistema de educação, nomeadamente:

a. “Elaboração de novos planos e programas curriculares;

b. Formação do pessoal docente e gestores escolares;

c. Aquisição de meios de ensino e de equipamentos escolares;

d. Adequação de sistemas de administração e gestão de instituições de ensino;

e. Construção e reabilitação de estabelecimentos de ensino” (Artigo 3º).

2. Fase de experimentação. Esta fase serviu para aplicar experimentalmente os

novos planos e programas curriculares e os materiais pedagógicos em escolas

seleccionadas.

3. Fase de Avaliação e Correcção. Esta fase serve para identificar insuficiências

e a adequação dos currículos.

4. Fase de Generalização. Esta fase traduz-se na aplicação dos novos currículos

(perfis de saída, planos de estudo, programas de ensino e materiais pedagógicos) em

todos os estabelecimentos de ensino não superior do País.

5. Fase de Avaliação Global. Nesta fase procede-se à avaliação de todo o

sistema.

Note-se que, a fase de experimentação teve início em 2004, e obedece a um

plano de extinção progressiva das classes. O Governo justifica o faseamento por razões

essencialmente financeiras. Tendo em consideração apenas o ensino primário (1ª, 2ª,

3ª,4ª, 5ª e 6ª classes), o plano de extinção progressiva de classes obedece ao seguinte

cronograma:

a. Em 2004, em regime de experimentação, a 1ª classe;

b. Em 2005, em regime de experimentação, a 2ª classe;

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c. Em 2006, em regime de experimentação, a 3ª classe. Em regime de

generalização a 1ª classe;

d. Em 2007, em regime de experimentação, a 4ª classe. Em regime de

generalização a 2ª classe;

e. Em 2008, em regime de experimentação, a 5ª classe. Em regime de

generalização a 3ª classe;

f. Em 2009, em regime de experimentação, a 6ª classe. Em regime de

generalização a 4ª classe;

g. Em 2010 entra em generalização a 5ª classe;

h. Em 2011 entra em generalização a 6ª classe.

(III) Actividades desenvolvidas sob coordenação do Governo no âmbito da

implementação do novo sistema de educação

As informações possíveis de recolher junto das autoridades centrais do Governo,

nomeadamente através do INIDE (2009), mostram que ao nível do ensino primário

(âmbito deste estudo) terão sido desenvolvidas de forma faseada um conjunto de

actividades no âmbito da implementação do novo sistema de educação, como se segue:

No 1º ano da reforma educativa (2004), ocorreu a “experimentação dos novos

materiais pedagógicos da 1ª classe” e a “formação de professores experimentadores dos

novos materiais pedagógicos da 1ª classe” (INIDE, 2009);

No 2º ano da reforma educativa (2005), ocorreu a “experimentação dos novos

materiais pedagógicos da 2ª classe”, a “formação de professores experimentadores dos

novos materiais pedagógicos da 3ª classe” e a “1ª supervisão nacional da reforma

educativa” (INIDE, 2009);

No 3º ano da reforma educativa (2006), ocorreu a “experimentação dos novos

materiais pedagógicos da 3ª classe”, a “avaliação e correcção dos materiais pedagógicos

da 2ª classe”, a “generalização dos materiais pedagógicos da 1ª classe a nível das

províncias” e a “2ª supervisão nacional da reforma educativa” (INIDE, 2009);

No 4º ano da reforma educativa (2007), procedeu-se à “experimentação dos

novos materiais pedagógicos da 4ª classe”, à “avaliação e correcção dos materiais

pedagógicos da 3ª classe”, à “generalização dos materiais pedagógicos da 2ª classe”, à

“formação de professores experimentadores dos novos materiais da 2ª classe a nível das

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províncias” e ao “diagnóstico da implementação da reforma educativa em 6 províncias”

(INIDE, 2009);

No 5º ano da reforma educativa (2008), procedeu-se à “experimentação dos

novos materiais pedagógicos da 5ª classe”, à “avaliação e correcção dos materiais

pedagógicos da 4ª classe”, à “generalização dos materiais pedagógicos da 3ª classe”, à

“formação de professores experimentadores dos novos materiais pedagógicos da 6ª

classe e formação de professores que generalizam os novos materiais da 3ª classe a nível

das províncias” e ao “diagnóstico da implementação da reforma educativa em 2

províncias” (INIDE, 2009).

Segundo os dados do INIDE (2009):

A “fase de experimentação dos novos materiais pedagógicos no âmbito da

reforma educativa está implementada a 95% (faltando, apenas, em 2009, os

materiais da 6ª classe);

A fase de avaliação dos materiais está implementada a 75% (estão por avaliar os

materiais das 5ª e 6ª classes);

A fase de generalização dos novos materiais pedagógicos e a implantação do

novo sistema educativo no ensino primário está executada a 80% (faltam

generalizar as 4ª, 5ª e 6ª classes), no 1º e 2º ciclos do ensino secundário estão

generalizados.

1.7. Breves considerações teórico-conceptuais sobre reforma educativa,

inovação curricular e reforma curricular

Em todo o mundo existem reformas educativas. Nas décadas de 80 e 90,

respectivamente no Japão e nos EUA, surgiu um grande debate em torno da reforma

educativa, da sua significação, muitas vezes, de forma errada, confundida com reforma

curricular e inovação curricular.

Fullan (1991), citado por Pacheco (1996), refere que “a natureza da mudança

educacional é explicada por quatro conceitos: mudança, inovação, reforma e

movimento. A inovação é frequentemente utilizada para referir mudanças curriculares

específicas enquanto o termo reforma diz respeito a mudanças fundamentais e globais”

(p. 150). Esta diferenciação entre inovação e reforma, desde logo, implica assumir que

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uma reforma pressupõe alterações ao nível normativo-jurídico dependentes das

dimensões ideológicas, políticas, culturais e sociais, ou seja, uma reforma educativa

implica “uma estratégia planificada para a modificação de certos aspectos do sistema

educativo de um país de acordo com um conjunto de necessidades, resultados

específicos, meios e métodos adequados” (Sack, 1981; González e Muñoz; 1987;

citados por Pacheco, 1996), enquanto que inovação deve ser entendida como “uma série

de mecanismos e processos mais ou menos deliberados e sistemáticos por intermédio

dos quais se procura introduzir e proporcionar certas mudanças nas práticas educativas

vigentes” (González e Muñoz, 1987; citado por Pacheco, 1996). Apesar desta distinção,

importa referir que a reforma também pode significar inovação, desde que se verifique

uma mudança ao nível mais específico das práticas pedagógicas dos professores,

directores de escola e de outros actores educativos. O conceito de reforma aponta para

“as mudanças estruturais, organizacionais, e o de inovação para a mudança, mais

qualitativa, de aspectos funcionais” (Pacheco, p. 151), contudo, o problema que se

coloca no que diz respeito à inovação curricular prende-se com a escola, isto é, reside

em saber se esta tem recursos materiais, humanos e financeiros para protagonizar

decisões estratégicas que provoquem a mudança.

A reforma curricular, como referiu o antigo ministro da educação de Portugal,

Roberto Carneiro (1987), é o vector principal de qualquer reforma educativa porque o

currículo é o elemento fundamental de um sistema educativo. Esta convicção, contudo,

não deve ser obsessiva, porquanto, uma reforma educativa não pode esgotar-se na

reforma curricular, porque a primeira, como se referiu anteriormente, tem implicações a

várias dimensões. Salvaguardado este aspecto, importa também referir que uma reforma

curricular também tem implicações em termos de “mudança” e de “inovação”.

Representa mudanças na organização curricular (registe-se no caso de Angola a nova

tipologia organizacional para o ensino primário e secundário), mudanças nos planos

curriculares (reorganização dos planos para, por exemplo, promover a

interdisciplinaridade), programas, materiais pedagógicos e no sistema de avaliação das

aprendizagens, mas, também, inovação ao nível do pensamento dos professores e da

suas práticas, sem descurar aspectos ligados à motivação e à formação dos mesmos.

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1.8. A avaliação da qualidade das escolas

A realização de trabalhos de investigação na área das ciências da educação,

nomeadamente sobre avaliação da qualidade das escolas, por envolverem a componente

humana, a incerteza e a subjectividade, implicam a tomada de decisões por vezes

polémicas e susceptíveis de interpretações ambíguas, pelo que, no âmbito deste estudo,

considera-se da maior pertinência explicitar o quadro conceptual relacionado com a

informação que se deve recolher relativamente à escola, aos professores, aos alunos e ao

trabalho de sala de aula, portanto, em relação ao conjunto variado de dados recolhidos

mediante diversos instrumentos sobre quais os factores de escola que mais

significativamente se associam aos resultados cognitivos e não cognitivos. Nesta

perspectiva, entendeu-se que seria razoável tomar por base a matriz proposta por

Mortimore (1988), defendida por Clímaco (2005), uma especialista que desenvolveu

larga actividade internacional na OCDE em projectos europeus e foi presidente da

Associação Internacional das Inspecções de Educação, e adaptar no âmbito deste

estudo. Nessa matriz (Quadro 1) são consideradas categorias de factores, as “variáveis

de partida / the given variables” (pela sua natureza não podem ser controladas ou

influenciadas pela escola), e as “varáveis de política / the policy variables”

(correspondem às características do processo em cada escola, sobre os quais se pode

agir e introduzir alterações).

Através do Quadro 1 é possível visualizar e reflectir sobre as variáveis

envolvidas no progresso e desenvolvimento dos alunos, portanto, em diversas áreas,

alguns dos principais factores que podem contribuir para aumentar a eficácia das

escolas. As variáveis consideradas poderiam ser complementadas com outras de

contexto, nomeadamente, os salários dos professores e directores, o tempo para

planeamento de aulas, a participação dos professores nas decisões, a formação e

idiossincrasia dos professores, os critérios de constituição de turmas, a assiduidade de

alunos e professores, o tipo e quantidade das tarefas de casa (TPC), o processo de

avaliação de alunos e de professores, etc.

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Quadro 1

Variáveis relacionadas com o progresso e desenvolvimento dos alunos

1. Variáveis de Partida (nível escola)

- Edifícios

- Estatuto

- Recursos

- População escolar

- Estabilidade

3. Variáveis de Partida (nível turma)

- Dimensão da turma

- Características da turma (idade, origem

social, percursos escolares, composição)

- Sala de aula

- Recursos

- Orientações curriculares

- Características dos professores

- Mudanças de docentes ao longo do ano

2. Variáveis de política (nível escola)

- Estilo de liderança

- Motivação dos professores e condições de

trabalho profissional

- Currículo

- Relações com as famílias/participação dos

encarregados de educação na vida da escola

- Igualdade de oportunidades

- Clima de escola

4. Variáveis de política (nível turma)

- Objectivos do(s) professor(es)

- Planeamento individual por professor

- Estratégias de cada professor e organização

do currículo

- Gestão da sala de aula

- Clima de trabalho

- Nível e tipo de comunicação entre professor

e alunos

- Participação dos encarregados de educação

- Organização de registos

Matriz de Mortimore (1988), defendida por Clímaco (2005) e adaptada pelo autor

1.9. Referencial utilizado no estudo para a avaliação da implementação da

reforma educativa

No ponto anterior, no âmbito da avaliação da qualidade dos sistemas educativos,

destacaram-se algumas das variáveis influenciadoras do progresso e desenvolvimento

do aluno, portanto, alguns dos factores que podem contribuir para a eficácia da escola.

Para além destes aspectos, de acordo com recomendações internacionais (SICI- The

Standing International Conference of Inspectorates, 2007), entende-se que a avaliação

da qualidade de uma escola deve tomar por referência as seguintes quatro áreas-chave

(adoptadas em termos genéricos neste estudo):

Contexto-Input: infra-estruturas, contexto financeiro, características dos novos

alunos, exigências legais, estruturas de apoio externas à escola;

Processo de ensino-aprendizagem: currículo, orientação dos alunos, qualidade

do ensino, avaliação, clima pedagógico;

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Gestão: gestão escolar, liderança, organização, comunicação, gestão do

pessoal);

Output: sucesso escolar, realização de objectivos, resultados.

Esta última área (Output), uma dimensão habitualmente considerada em estudos

sobre avaliação de escolas, não foi aqui considerada, em primeiro lugar, porque este tipo

de estudos é da competência dos Governos, geralmente mais interessados na procura de

estatísticas que possam contribuir para avaliar as políticas educativas delineadas ou para

dar satisfação a compromissos com as agências internacionais financiadoras de

projectos educativos. De resto, no quadro da reforma educativa em curso, esta

perspectiva de análise aqui defendida pode ser demonstrada com algumas estatísticas

divulgadas pelo INIDE (2009) sobre o apuramento da quantidade de estudantes

matriculados no ensino primário e a evolução dos alunos. Efectivamente, segundo esses

estudos, por exemplo, foi possível apurar que:

A quantidade de estudantes matriculados no ensino primário em 2004 passa de

3.022.461 alunos para 3.757.677 alunos (em 2008);

A evolução dos alunos (2002 a 2007) nas Províncias respeitantes a este estudo

será significativa, já que, na Província de Luanda passam de 392 para 486 mil

alunos; Na Província do Huambo de 283 para 359 e na Província da Huíla de

243 para 710 mil alunos.

Em segundo lugar, porque se trata de um estudo de caso nas províncias de Luanda,

Huambo e Huíla, com uma abordagem qualitativa, apenas com a finalidade de se

conhecerem as opiniões e sugestões dos principais actores envolvidos no processo de

implementação da reforma educativa.

Finalmente, por força do paradigma investigacional utilizado, apesar do estudo ser

bastante útil para a compreensão de outros contextos, o apuramento de resultados

baseado num número de participantes reduzido (estudo de caso), nunca daria

legitimidade para a generalização dos resultados e fazer inferências sobre o sucesso

escolar.

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Capítulo 2

Metodologia

Este capítulo refere-se à metodologia, aqui entendida como as directrizes que

norteiam qualquer pesquisa tendo sempre presente que a prática metodológica deve ser

vista como um espaço onde interagem quatro pólos, o pólo epistemológico, o pólo

teórico, o pólo morfológico e o pólo técnico. Efectivamente, tal como referem Hébert,

Goyette e Boutin (2008), o “modelo que representa o sistema de base de uma

investigação articula-se em volta de quatro pólos, ou instâncias, cuja interacção

constitui o aspecto dinâmico da investigação”. Esta parte do estudo referente a este

capítulo vai ter o seu enfoque no pólo técnico, responsável por recolher as informações

sobre a realidade que, por sua vez, são depois convertidas para utilidade da

problemática realçada na investigação. Concretizando e destacando-se outros aspectos,

neste capítulo começa-se por tecer algumas considerações sobre o paradigma utilizado,

a abordagem qualitativa, passando-se de seguida a referir aspectos concretos

relacionados com as questões de ordem ética, o campo de investigação, as técnicas e

instrumentos utilizados na recolha dos dados e, finalmente, algumas considerações

sobre o tratamento dos dados.

2.1. Paradigma de investigação utilizado no estudo – Abordagem qualitativa

Em relação ao paradigma da abordagem, entendeu-se mais apropriado explorar as

vantagens das técnicas de recolha de dados de pendor qualitativo. Para melhor se

entender a razão desta opção, veja-se a argumentação de Azancot-Menezes (2008):

Em educação, como referem Costa e Paixão (2004), a corrente positivista

predominou durante muito tempo e a investigação das questões educativas era realizada

por meio de um controlo preciso das variáveis em presença e na possibilidade de

estabelecimento de relações de causalidade. Neste modelo, a preocupação do

investigador assenta na quantificação, critérios de fiabilidade, previsão e replicação. O

paradigma quantitativo relaciona-se com o positivismo, isto é, os métodos quantitativos

“aparecem embebidos em noções como objectividade, precisão, estandardização, e são

estas noções que são apresentadas como científicas” (Levy, 1997). Considera-se que

“existe uma realidade objectiva que o investigador tem de ser capaz de interpretar

objectivamente; cada fenómeno deverá ter uma e só uma interpretação objectiva”

(Fernandes, 1991). Um dos aspectos mais marcantes deste tipo de investigação prende-

se com o facto de se valorizar a importância da generalização dos resultados obtidos,

pelo que, os seguidores do método quantitativo recorrem ao uso de técnicas para

seleccionar e dimensionar as amostras experimentais (a selecção aleatória é disso

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exemplo), formulam e testam hipóteses (testes estatísticos para a prevenção de erros).

Por todas estas razões, a investigação quantitativa tem como principal limitação o facto

do investigador, ao lidar com seres humanos (caso das ciências sociais e humanas), não

ser capaz de manipular ou controlar certas variáveis.

Sem desejar entrar em polémicas filosóficas relativamente às variantes

metodológicas (quantitativa, qualitativa ou mista), a verdade é que, apesar do modelo

quantitativo ter contribuído e continuar a ter um papel preponderante no avanço da

ciência, na área das ciências sociais e no campo específico do ensino e da educação,

como referi, parece apresentar algumas limitações porque nos estudos em educação não

se considera a existência de uma só interpretação (objectiva) da realidade, pois, as

interpretações da realidade dependem do investigador (chave de toda a investigação).

Efectivamente, ao invés do que se passa na investigação quantitativa, o grande objectivo

da investigação qualitativa é a compreensão mais profunda dos problemas, é investigar

o “interior” de certos comportamentos, convicções, crenças, atitudes, sentimentos, etc.

Nesta óptica, o investigador não está preocupado com a dimensão das amostras, nem

com a generalização dos resultados. Na metodologia qualitativa o investigador não

coloca o problema da validade e da fiabilidade dos instrumentos, pois, “o investigador é

o instrumento de recolha de dados por excelência; a qualidade (validade e fiabilidade)

dos dados depende muito da sua sensibilidade, da sua integridade e do seu

conhecimento” (Fernandes, 1991). Os dados recolhidos são designados por qualitativos,

o que significa serem ricos em pormenores descritivos relativos a pessoas, locais e

conversas, ou seja, “as questões a investigar não se estabelecem mediante a

operacionalização de variáveis, sendo, antes, formuladas com o objectivo de investigar

os fenómenos em toda a sua complexidade e em contexto natural” (Bodgan & Biklen,

1994), portanto, não faz sentido quantificar dados ou proceder a uma análise

quantitativa porque os dados que se obtêm (atitudes, sentimentos, hábitos, expectativas,

etc.), por pertencerem a diferentes pessoas, não poderem ser quantificados.

Pelo que acabei de expor, com a convicção profunda de que todos os

paradigmas têm lugares próprios no campo da investigação, mas, absolutamente

convencido da influência crescente dos métodos qualitativos no estudo de várias

questões educacionais, basta “tomar em consideração os padrões de financiamento dos

organismos governamentais, os programas dos congressos de educação, os títulos dos

livros da especialidade e os conteúdos das diversas revistas de educação” (Popkewitz,

1984), optimista em relação às políticas educativas emergentes, fico na expectativa e

faço votos para que as universidades angolanas optem por assumir posturas filosóficas,

didáctico-científicas e conceptuais mais flexíveis, adaptadas à sociedade actual,

consentâneas com a formação universitária pluridisciplinar e com a necessária inovação

dos centros de investigação em educação, condições imprescindíveis para a promoção e

o incentivo da produção qualitativa de novos trabalhos de investigação científica sobre

os múltiplos domínios inerentes à formação de professores, à organização e gestão

escolar, à pedagogia e à psicologia educacional, numa linha de investigação científica

de excelência, compatível com as exigências e o pluralismo intelectual defendido pela

comunidade científica internacional (artigo publicado no Jornal de Angola).

2.2. Questões de ordem ética

Após estas necessárias explicações relativamente à opção da abordagem

metodológica, é fundamental referir as questões de ordem ética tomadas em devida

atenção em todas as fases da investigação. Como mais adiante melhor se explicitará, os

participantes do estudo foram os principais agentes educativos directamente envolvidos

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na implementação do projecto da reforma educativa, nomeadamente, directores de

escola, subdirectores pedagógicos, professores, inspectores escolares, funcionários das

repartições municipais de educação e encarregados de educação. Para dar cumprimento

aos objectivos estabelecidos na pesquisa, respeitando as questões de ordem ética, a

principal preocupação do investigador foi auscultar a opinião desses agentes educativos

de forma honesta, espontânea, na expectativa de se garantirem depoimentos reais e,

portanto, para se proceder a um conjunto de recomendações com utilidade para os

responsáveis das políticas educativas do país.

Nestes termos, foi prometido a todos os participantes do estudo a garantia de

anonimato total durante a fase de inquérito (entrevistas e questionários) e no momento

da elaboração do relatório, quer em relação aos nomes dos inquiridos, quer em relação à

identificação das instituições, pois, na opinião do consultor, o relevante sob o ponto de

vista da investigação é apenas a opinião dos inquiridos e aspectos ligados à

contextualização. Esta opinião é defendida por Hébert, Goyette e Boutin (2008) ao

afirmarem que quando o investigador se dirige aos intervenientes na investigação «é

norteado por certos princípios éticos quando inicia o seu trabalho de campo e quando

efectua a recolha de dados», devendo «redigir o seu relatório mantendo uma

preocupação ética face ao impacto possível deste na reputação quer dos indivíduos, quer

da instituição em causa» (p. 133). De resto, as garantias de ordem ética foram um factor

fundamental para a obtenção de respostas livres, determinantes para o sucesso das

entrevistas.

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2.3. Campo de investigação e participantes do estudo

Conforme se referiu de início, está-se perante um estudo de caso efectuado durante

os meses de Novembro e de Dezembro de 2009 em alguns Municípios das Províncias

de Luanda, Huambo e Huíla. O investigador começou por manter encontros com um

responsável do Governo no dia 03 de Novembro de 2009 (Vice-ministro da Educação

para a reforma educativa) e com um técnico superior do INIDE e só depois iniciou o

estudo junto de outros agentes educativos.

Em relação à Província de Luanda, durante uma semana, visitaram-se várias

instituições, realizaram-se entrevistas a um chefe de Gabinete de Repartição Municipal -

Ensino Geral, um chefe de secretaria, dois directores, dois subdirectores pedagógicos,

cinco encarregados de educação e distribuíram-se 9 questionários com perguntas abertas

dirigidas a professores, como se segue (Quadro 2):

Quadro 2

Província de Luanda - Instituições visitadas e participantes inquiridos

Instituição visitada

Participante do estudo

Instrumento de recolha de

dados

Repartição Municipal de

Educação – R1

Chefe de Gabinete do Ensino

Geral

Entrevista

Escola Primária nº L1 Director Entrevista

Escola Primária nº L2 Subdirector pedagógico Entrevista

Escola Primária nº L3 Subdirector pedagógico Entrevista

Escola Primária nº L3 Chefe de Secretaria Entrevista

Escola Primária nº L4 Director Entrevista

Província de Luanda Encarregados de Educação

(5)

Entrevista

Província de Luanda Professores (9) Questionário

Na Província do Huambo, também durante uma semana, visitaram-se instituições

em zonas urbanas e rurais. Foram inquiridos 53 agentes educativos (Quadro 3),

nomeadamente, um chefe de repartição municipal de educação, uma subdirectora

pedagógica, quatro directores, um inspector escolar municipal, um administrador

comunal, um inspector escolar comunal e 44 professores (38 por questionário e 6 por

entrevista).

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Um olhar sobre a implementação da Reforma Educativa em Angola. Estudo de caso nas Províncias de

Luanda, Huambo e Huíla. M. Azancot de Menezes (2010) 28

Quadro 3

Província do Huambo - Instituições visitadas e participantes inquiridos

Instituição visitada

Participante do estudo

Instrumento de recolha de

dados

Repartição Municipal de

Educação – R2 Chefe da Repartição

Municipal de Educação

Entrevista

Escola Primária nº H1 Subdirectora pedagógica Entrevista

Escola Primária nº H2 Director Entrevista

Escola Primária nº H3 Director Entrevista

Escola Primária nº H4 Director Entrevista

Escola Primária nº H5 Director Entrevista

Província do Huambo Inspector escolar municipal Entrevista

Província do Huambo Administrador comunal Entrevista

Província do Huambo Inspector escolar comunal Entrevista

Província do Huambo Professores (6) e (38) Entrevista (6) questionário

(38)

Quanto à Província da Huíla, igualmente pelo mesmo período de tempo,

efectuaram-se visitas a seis escolas primárias (duas encontravam-se encerradas porque

após a realização das provas trimestrais os docentes abandonaram as escolas), onde se

entrevistaram três directoras, uma subdirectora pedagógica e cinco professores. Numa

Repartição Municipal também foram entrevistados um chefe de Recursos Humanos e

um inspector escolar municipal (Quadro 4). Por questões de ordem ética, atribuíram-se

códigos às escolas e às repartições, e omitiram-se as identificações dos respondentes.

Quadro 4

Província da Huíla - Instituições visitadas e participantes inquiridos

Instituição visitada

Participante do estudo

Instrumento de recolha de

dados

Repartição Municipal de

Educação - R3

Chefe de Recursos

Humanos

Entrevista

Província da Huíla Inspector Escolar

Municipal

Entrevista

Escola Nº Hu1 Directora Entrevista

Escola Nº Hu2 Subdirectora Pedagógica

Professora (1)

Entrevista

Entrevista

Escola Nº Hu3 Directora

Professores (4)

Entrevista

Entrevista

Escola Nº Hu4 Directora Entrevista

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Um olhar sobre a implementação da Reforma Educativa em Angola. Estudo de caso nas Províncias de

Luanda, Huambo e Huíla. M. Azancot de Menezes (2010) 29

Em resumo, numa perspectiva global, os participantes do estudo nas três Províncias

em estudo incluíram directores, subdirectores pedagógicos, professores, encarregados

de educação, um chefe de secretaria, inspectores escolares, membros de repartições

municipais e comunais, membros de ONG´s com intervenção na área da educação, um

membro do Governo e um técnico superior do INIDE (Quadro nº 5).

Quadro 5

Participantes do Estudo nas Províncias de Luanda, Huambo e Huíla

Participantes do Estudo Quantidade

Directores 9

Subdirectores pedagógicos 4

Professores 48

Encarregados de Educação 5

Chefe de Secretaria 1

Inspectores Escolares 3

Membros de Repartições Municipais e

Comunais

4

Membros de ONG´s com intervenção na área

da educação

6

Membros do Governo e INIDE 2

Identificados os participantes do estudo, no ponto que se segue são abordados os

aspectos referentes às técnicas e instrumentos de recolha de dados.

2.4. Técnicas e instrumentos de recolha de dados

As técnicas (inquérito, observação e pesquisa documental) e os instrumentos de

recolha de dados utilizados foram aqueles que são privilegiados nas metodologias

qualitativas, nomeadamente:

No modo de inquérito, optou-se pela entrevista, sem protocolo fixo, informal,

porque o que mais interessava eram opiniões sobre acontecimentos, sobre os

outros e sobre o próprio. Esta opção técnica implicou a selecção de inquiridos

aptos e disponíveis a responder e, acima de tudo, entrevistados com

representatividade. Para o sucesso da entrevista uma outra estratégia utilizada foi

optar pela entrevista orientada para a informação porque «visa circunscrever a

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Um olhar sobre a implementação da Reforma Educativa em Angola. Estudo de caso nas Províncias de

Luanda, Huambo e Huíla. M. Azancot de Menezes (2010) 30

percepção e o ponto de vista de uma pessoa ou de um grupo de pessoas numa

situação dada» (Hérbert, Goyette e Boutin, 2008, p. 162).

No modo de observação, a observação participante foi a opção. O tipo de

informação que interessava recolher eram factos tal como o são para

participantes observados. Esta opção técnica apesar de obrigar ao investigador o

uso de aptidões específicas, como boa intuição e percepção dos problemas,

permite recolher dados muito preciosos para o sucesso da investigação.

Na análise documental, explorou-se a análise qualitativa de conteúdo, para

triangulação dos dados, essencialmente junto de fontes oficiais (relatórios do

INIDE, etc.) e privadas (notas escritas pessoais de alguns dos inquiridos e

documentos das escolas e das Repartições Municipais de Educação).

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Um olhar sobre a implementação da Reforma Educativa em Angola. Estudo de caso nas Províncias de

Luanda, Huambo e Huíla. M. Azancot de Menezes (2010) 31

Capítulo 3

Apresentação, Análise e Interpretação dos Resultados

No capítulo anterior referiu-se que o trabalho de recolha de dados teve início com

duas entrevistas realizadas no mês de Novembro de 2009. A primeira foi com um

técnico superior do INIDE responsável pela área da reforma educativa. A segunda foi

com o Vice-Ministro da Educação para a Reforma educativa. A grande finalidade foi

ouvir a opinião do responsável pelas políticas educativas no campo da reforma

educativa e o técnico superior ao serviço da política. Os discursos são coincidentes na

sua generalidade e, como vão ao encontro do que tem sido anunciado publicamente,

entendeu-se que não faria sentido incluir nos resultados deste relatório.

Sendo assim, neste capítulo vão ser apresentadas as respostas que os dados obtidos

forneceram em relação à questão de estudo e aos objectivos definidos.

Em relação ao objectivo específico relacionado com as opiniões dos diversos

agentes educativos sobre a problemática da educação em geral e relativamente à

implementação do programa da reforma educativa foi possível obter respostas bastante

esclarecedoras sobre o entendimento dos inquiridos em relação à problemática da

reforma educativa.

Assim, após uma breve caracterização das instituições visitadas e dos inquiridos,

passa-se de seguida à apresentação dos resultados, listando algumas das respostas que

melhor podem contribuir para a compreensão da questão de estudo e dos objectivos

traçados.

3.1. Apresentação dos resultados da Província de Luanda

Nesta Província visitou-se uma Repartição Municipal de educação, visitaram-se três

escolas numa zona periférica industrial urbana e uma outra escola em local mais

afastado. O objectivo era entrevistar directores, subdirectores pedagógicos e outros

agentes educativos considerados úteis para a investigação. O Município não é

identificado por razões de ordem ética e às escolas referidas, pelas mesmas razões,

foram atribuídos os códigos L1, L2, L3 e L4.

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Um olhar sobre a implementação da Reforma Educativa em Angola. Estudo de caso nas Províncias de

Luanda, Huambo e Huíla. M. Azancot de Menezes (2010) 32

O chefe de Gabinete do Ensino Geral da Repartição Municipal de Educação

Depois de fazer uma breve informação sobre as escolas do Município onde trabalha,

respondeu a algumas questões colocadas. Destacam-se alguma delas, como se segue:

“Os manuais emprestados aos alunos não chegam porque há turmas numerosas e

as escolas é que têm culpa porque foram contra a orientação”;

“Por exemplo, há escolas primárias com turmas da 9ª classe. Como é que vão

passar os diplomas?”;

“Os professores recebem alunos a mais porque por pressão do povo que alega a

obrigatoriedade e gratuitidade do ensino primário. Eles têm razão.”;

Sobre se as escolas foram informadas em relação à reforma, respondeu ”as

orientações políticas são diferentes do que se faz na prática”;

“Não há formação de professores porque temos problemas financeiros”;

“Há diferenças entre a avaliação correcta e a que está no terreno porque às vezes

as delegações não informam”;

“As turmas do 1º ciclo precisam de laboratórios. Não há!”;

Em relação às queixas dos professores que se dizem mal enquadrados,

afirmou:”os docentes tiveram um período para apresentar as fichas com o último

nível académico, mas, também não há dinheiro para as novas categorias”.

O director da escola primária L1, com 49 anos de idade, concluiu o PUNIV em

1992, e exerce a função nesta escola desde 2003, tendo sido anteriormente professor

desde 1998.

Segundo o respondente, a sua escola, situada numa zona periférica urbana de

Luanda, tinha 6 salas de aulas mas foram obrigados a encerrar 2 salas porque os

“marginais atiravam pedras aos professores”. Declarou que ganha muito mal (37 mil

Kwanzas) e que não tem qualquer tipo de subsídio acrescido pelas funções que exerce.

A escola não tem qualquer tipo de apoio financeiro. Eis algumas das principais

declarações do entrevistado:

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Um olhar sobre a implementação da Reforma Educativa em Angola. Estudo de caso nas Províncias de

Luanda, Huambo e Huíla. M. Azancot de Menezes (2010) 33

“Antigamente pedia-se 50 Kwanzas a cada aluno por trimestre e conseguia-se

algum dinheiro para as limpezas; essa prática foi abolida; este ano lectivo nem

sequer distribuíram as folhas de provas”;

“Estou há quase 6 anos sem auxiliar de limpeza, eu é que varro todos os dias o

meu gabinete”;

“O nosso Município não tem merenda escolar;

“Existem manuais, mas não chegam”;

“Não temos projecto educativo porque não sabemos fazer”;

“Fiz apenas dois seminários de capacitação. É muito pouco”;

“Os professores não fazem formação. É raro!”;

“Não é possível fazer-se avaliação contínua. Como? Com 50 alunos por sala?”;

“As escolas neste município são penalizadas! Não percebemos a razão”;

“Ninguém veio falar comigo ou pedir a opinião sobre a reforma”;

“Seguimos o currículo à risca. Fazemos a gestão do currículo por iniciativa

própria”;

“O inspector escolar não avisa. Chega, vem à Direcção e diz que vai à sala de

aula. Faz perguntas, entrega-me o relatório. Melhorou, já não parece polícia”;

“Não há actividades extra-curriculares porque não há espaço. Os professores

estão muito desmotivados mas mesmo assim desenvolveram o programa

ambiental”;

“Não temos energia, nem água; Como manter a higiene?”

“Existe Comissão de Pais, mas pouco colaboram porque trabalham. Mas quando

os convocamos aparecem”.

O subdirector pedagógico da escola primária L2, com 30 anos de idade, concluiu o

INE, e exerce a função nesta escola há três anos. Eis algumas das principais

inquietações do entrevistado:

“Nunca fui consultado sobre a reforma educativa; o que soube foi pela

televisão”;

“A formação está sob responsabilidade da Repartição, mas, em outros períodos é

a direcção pedagógica da escola que organiza a formação”;

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Um olhar sobre a implementação da Reforma Educativa em Angola. Estudo de caso nas Províncias de

Luanda, Huambo e Huíla. M. Azancot de Menezes (2010) 34

“O problema é que eu não tenho formação para exercer o cargo de subdirector

pedagógico, nem sequer uma vez por ano!”;

“No âmbito da reforma todos os alunos têm que ter a caderneta e o relatório

descritivo para anotar a avaliação contínua dos alunos mas o material não existe

e a caderneta tem erros do INIDE”;

“Há conteúdos das disciplinas novas, por exemplo, educação musical, e os

professores não sabem porque é preciso formação específica”;

“De acordo com a reforma, na 4ª classe, todos têm que ter educação musical.

Quando o professor não sabe tem que dar outra coisa”;

“Os conteúdos da 4ª classe nas disciplinas de matemática, geografia, estão

reduzidos; os manuais da 4ª classe têm poucos conteúdos”;

“No âmbito da reforma deveríamos ter 30 a 35 alunos por sala e temos 40 a 45

porque as infra-estruturas não dão. O ensino é gratuito, como vamos rejeitar os

alunos?”;

“Para respeitar-se o estatuto da carreira docente, alguns professores passaram de

35 mil para 25 mil Kwanzas”;

“Os subdirectores pedagógicos e coordenadores não têm subsídio de chefia”;

“Cortaram a merenda escolar sem explicação e o rendimento baixou…o ano

passado havia resultados, pontualidade, assiduidade e fez-se um curso de

merenda escolar…para nada!”;

“Os manuais são insuficientes; na 4ª classe temos 500 alunos e só recebemos

100; da 5ª e 6ª classes não existem manuais!”;

“Há um divórcio entre a Repartição e as direcções das escolas;

“ Existe comissão de pais e a relação é boa, compram detergentes.”;

“O professores não estão motivados por causa dos salários”; é preciso resolver

os problemas dos professores com muitos anos de serviço e mal pagos!”;

“Um sargento das FAA, com a 3ª classe, ganha 118 mil Kwanzas!”;

“Os inspectores escolares perguntam pela legislação na direcção, vão às salas,

pedem o plano de aula, mas, nem querem saber o trabalho que a escola

desenvolve, parcerias, etc. não é só fiscalização!;

“Veja aquela menina a subir a mangueira e tirar uma manga, isso é fome!”;

“A escola deveria ser mais valorizada pelo Governo”.

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Luanda, Huambo e Huíla. M. Azancot de Menezes (2010) 35

A subdirectora pedagógica da Escola Primária L3, cursou o INE e frequenta uma

escola superior pedagógica. Tem 8 anos de experiência enquanto subdirectora e três

como docente. Esta escola tem recebido diversos apoios da ADRA. Tem auxiliares de

limpeza, pessoal administrativo e agentes de segurança. Eis algumas das suas principais

declarações:

“Nunca ninguém nesta escola ouviu falar em reforma antes dela avançar e há

problemas”;

“Há debilidades na área de recursos humanos. Por exemplo, existem

divergências entre os formadores cubanos e os que apareceram depois”;

“É impossível constituírem-se turmas de 35 alunos com escolas onde só há 3

salas de aula!”;

Havia praticamente 3 disciplinas agora há 7 disciplinas”;

“Faltam computadores, laboratórios e manuais. Quando se estava a dar a 5ª

classe experimental ainda não havia manual! Na 6ª classe só há manual para

professores”;

Devia haver professores especializados em educação laboral, educação musical

e educação física. Não pode ser na base do improviso”;

“As formações na escola do 1ª de Maio são das 8H às 12h. As pessoas chegam

tarde, é tudo muito rápido. Deveriam ser criados centros de formação nos

Municípios”;

“A avaliação contínua faz-se com cadernetas improvisadas pelo subdirector”;

“A relação escola-família é boa e participam. Arranjaram o tanque de água”;

“Não existe inspecção escolar porque não há transporte”;

Sobre se preferia o subdirector pedagógico ou o inspector na supervisão,

respondeu: ”preferia que fosse o subdirector pedagógico porque seria

supervisão sistemática e tem arquivos para comparar”;

Sobre a gestão do currículo respondeu: ”Adaptamos o currículo à realidade e

promovemos a interdisciplinaridade, graças à ADRA. Se falamos em água em

Língua Portuguesa, em Matemática e em História, falamos 3 vezes em água”;

“Temos actividades extra-curriculares, como a capoeira, ginástica rítmica,

teatro, etc.”.

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Luanda, Huambo e Huíla. M. Azancot de Menezes (2010) 36

A chefe de secretaria da escola primária L3 também deu uma breve entrevista. Eis

algumas das principais inquietações da inquirida:

“Há falta de manuais”;

“Não temos merenda escolar há 6 anos. Notou-se a diferença na assiduidade”;

“Não há nenhuma preocupação da Repartição com a formação do pessoal não

docente”;

“Antes da implementação da reforma deveriam ter formado o pessoal, por

exemplo nas disciplinas de Educação Musical e Educação Moral e Cívica”;

“As escolas do centro da cidade têm 45 alunos e na periferia 60”;

O director da Escola Primária Nº L4 tem 23 anos de experiência docente e quatro

como director. Na Província de Luanda foi um dos entrevistados que mais emoção

deixou transparecer. Em determinado momento da entrevista não conseguiu conter as

lágrimas devido ao sentimento de revolta que sentia devido à situação precária vivida

pela sua escola. Eis algumas das suas declarações:

“Existem muitos problemas. Não existe água, nem carteiras, os alunos sentam-

se no chão!”;

“Antes de avançarem com a reforma deviam ter ouvido os directores e os pais”;

“Eu tiro do meu salário para de vez em quando enchermos o tanque de água”;

“Não há merenda escolar”;

“Existem 10 professores mal enquadrados. Têm habilitações mas a categoria

não corresponde”;

“Existe comissão de pais e a comissão de bairro também trabalha com a

escola”;

“Não existe projecto educativo”;

“Não há inspecção escolar por falta de transporte. As mulheres são melhores

que os homens”;

“Existem manuais mas são poucos”;

“As escolas comparticipadas têm carteiras mas as do Estado não têm”;

“O Município recebe dinheiro mas as escolas nada recebem. Para onde vai o

dinheiro?”;

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Um olhar sobre a implementação da Reforma Educativa em Angola. Estudo de caso nas Províncias de

Luanda, Huambo e Huíla. M. Azancot de Menezes (2010) 37

Os encarregados de educação de várias escolas da Província de Luanda

Foi possível ouvir a opinião de cinco encarregados de educação de vários

Municípios e os depoimentos apontam todos no mesmo sentido, a saber:

Não apoiam os educandos por falta de tempo e por não terem condições

logísticas;

Consideram injusto o ensino ser gratuito e terem que pagar;

Defendem que os manuais escolares no ensino primário deveriam ser gratuitos;

Pensam que se houvesse merenda escolar o rendimento das crianças melhoraria;

Defendem que o Governo deveria fazer maior esforço para construir escolas e

apetrechar as existentes com salas de aula condignas, carteiras, água potável, etc.

Os professores da Escola Primária Nº L1

Distribuíram-se e recolheram-se questionários com perguntas abertas a 9 (nove)

professores desta escola. Os questionários foram codificados de C1 a C9. O principal

objectivo foi perceber se os professores inquiridos estavam satisfeitos com o salário

auferido. Para além das opiniões de cada professor constatou-se que muitos dos

professores preencheram os questionários com erros ortográficos. Este facto explica as

debilidades dos professores em matéria de língua portuguesa, pelo que, para melhor

ilustrar, entendeu-se pertinente aqui apresentar alguns desses exemplos. De seguida

descrevem-se algumas das respostas e os erros mais destacados:

Professor C1, 41 anos de idade, sexo masculino, 12ª classe, 22 anos de serviço,

coordenador de turma.

Alguns erros detectados nas respostas: “mercer”, “remoneração”, “compença”;

Eis algumas respostas:

o “A minha opinião sobre o cargo que desempenho deveria mercer

remoneração”;

o Em relação à pergunta considera-se bem enquadrado em termos

profissionais e salariais? respondeu: “Não, porque o salário não

compença ao atendimento básico”.

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Luanda, Huambo e Huíla. M. Azancot de Menezes (2010) 38

Professor C2, 39 anos de idade, sexo feminino, 11ª classe, 8 anos de serviço.

Alguns erros detectados nas respostas: “cubrir”, “dispezas”;

Eis uma das respostas:

o Em relação à pergunta considera-se bem enquadrado em termos

profissionais e salariais? Respondeu: “Não, porque o salário não é

suficiente para cubrir todas as dispezas durante o mês”.

Professor C3, 51 anos de idade, sexo feminino, 12ª classe, 18 anos de serviço.

Erro detectado na resposta: “salario”;

Eis uma das respostas:

o Em relação à pergunta considera-se bem enquadrado em termos

profissionais e salariais? “Não, porque o salario não satisfaz”.

Professor C4, 33 anos de idade, sexo feminino, 12ª classe, 7 anos de serviço.

Erros detectados na resposta: “salario”, “cubrir”, “dispezas”; frase mal

construída e erros gramaticais.

Eis uma das respostas:

o Em relação à pergunta considera-se bem enquadrado em termos

profissionais e salariais? “Não, porque os em termos salariais não.

Porque não vai de encontro as necessidades básicas. O salário é

insuficiente para cubrir todas as dispezas durante o mês”.

Professor C5, 35 anos de idade, sexo feminino, 9ª classe, 11 anos de serviço.

Eis uma das respostas:

o Em relação à pergunta considera-se bem enquadrado em termos

profissionais e salariais? “Não, porque na minha opinião sendo nós

educadores do futuro como salário mínimo: 1000 usd (100.000 Kz). Este

valor se enquadraria melhor para um profissional que luta a educar e a

formar grandes homens para uma Angola melhor”.

Professor C6, 35 anos de idade, sexo feminino, 12ª classe, 8 anos de serviço,

coordenador de turma.

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Um olhar sobre a implementação da Reforma Educativa em Angola. Estudo de caso nas Províncias de

Luanda, Huambo e Huíla. M. Azancot de Menezes (2010) 39

Alguns erros detectados nas respostas: “remoneração”, “compença”; e frase mal

construída;

Eis duas respostas:

o “A minha opinião sobre o cargo que desempenho deveria mercer

remoneração”;

o Em relação à pergunta considera-se bem enquadrado em termos

profissionais e salariais? respondeu: “Não, porque o salário não

compença o atendimento básico”.

Professor C7, 30 anos de idade, sexo feminino, 12ª classe, 9 anos de serviço,

coordenador de turma.

Alguns erros detectados nas respostas: “subcídio”, “salario”, “só” (ao invés de

sou); e frase mal construída;

Eis duas respostas:

o “As principais problemas só coordenadora das actividade extra-escolar

não recebo nenhum subcídio de coordenação””;

o Em relação à pergunta considera-se bem enquadrado em termos

profissionais e salariais? respondeu: “Não, porque o salário não

compensa o atendimento básico”.

Professor C8, 32 anos de idade, sexo masculino, Ensino Médio.

Eis uma das respostas:

o Em relação à pergunta considera-se bem enquadrado em termos

profissionais e salariais? “Não, porque actualmente não me encontro a

auferir o salário correspondente à categoria na qual consto e tenho

direito, e que consta no novo estatuto da carreira docente”.

Professor C9, 37 anos de idade, sexo feminino, 12ª classe, 2 anos de serviço,

coordenador de turma.

Alguns erros detectados nas respostas: “renumeração”, “ensentivar”.

Eis duas respostas:

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o “Ao desempenhar esse cargo deveria haver renumeração p/ ensentivar as

nossas obrigações”;

o Em relação à pergunta considera-se bem enquadrado em termos

profissionais e salariais? respondeu: “Não, não é compensado com os

rendimentos básicos”.

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3.2. Apresentação dos resultados da Província do Huambo

Nesta Província visitou-se uma Repartição Municipal de educação, visitaram-se

cinco escolas em zonas periféricas urbanas e em zonas rurais. Entrevistaram-se quatro

directores, uma subdirectora pedagógica, um chefe de repartição, um inspector escolar

municipal e um comunal, um administrador comunal e inquiriram-se por questionário

38 professores e 6 por entrevista. O Município não é identificado por razões de ordem

ética e às escolas referidas, pelas mesmas razões, foram atribuídos os códigos H1, H2,

H3, H4 e H5.

O administrador Municipal de Educação

O administrador em questão tem formação superior concluída no ISCED do

Huambo e mostrou-se muito seguro de si. Depois de fazer considerações genéricas

sobre o número de professores e de escolas, fez algumas declarações, onde se destacam

as seguintes:

“Tomei conhecimento do programa da reforma educativa num seminário de

formação de formadores”;

“145 professores baixaram de salário devido à incompatibilidade de dados, mas

depois terão direito aos retroactivos”;

“Não existem cadernetas para a avaliação contínua. Têm que ser os professores a

tratar disso”;

“Há turmas com 90 alunos no ensino primário. Mesmo com novas escolas não

se consegue baixar para os 35”;

“Há insuficiência de material didáctico”;

“No 2º ciclo os manuais chegam com insuficiência”;

“Havia 15 escolas com merenda escolar, agora só há 3”;

“No meio rural é que deviam implementar o projecto de merenda escolar”;

“Se existirem duas escolas (A e B) e se na A existir merenda os alunos saem da

B e matriculam-se na A. As mães enviam os irmãos para a merenda ser dividida

por todos”;

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Luanda, Huambo e Huíla. M. Azancot de Menezes (2010) 42

“A formação depende da Direcção Provincial. O ano passado houve dois

seminários de professores. Falta material e dinheiro”;

“Há muitos professores que não conseguem dar determinadas disciplinas

(Matemática, Desenho, etc.) e Educação Física (senhoras) e têm que se arranjar

outros professores”;

“No 2º ciclo não existem professores para as cadeiras de informática. É preciso

contratar técnicos de informática sem preparação pedagógica. Também não há

computadores. Como praticar?”;

“Sobre o sistema de avaliação os professores queixam-se que as fórmulas são

complexas e não se consegue fazer com muitos alunos. Imagine 4 turmas x 35

alunos daria…e no Huambo temos turmas com 145 alunos no Puniv”;

“Não estavam criadas as condições para a reforma educativa. Talvez se falasse

em inovação curricular e criar condições para avançar com a reforma”;

“Existem apenas duas escolas com autonomia financeira para formação de

professores”;

“A Repartição envia às escolas apenas giz, papel, não tem dinheiro e as escolas

não têm nada. Como é que o ensino é gratuito?”;

A subdirectora pedagógica da Escola Primária nº H1

A Escola Primária nº H1 está situada numa zona periférica urbana do Huambo. Tem

quatro salas de aulas mas como só têm 35 carteiras os meninos têm que trazer cadeiras.

A subdirectora pedagógica é uma antiga professora, com pouca formação, e

desempenha a função há dois anos. Fez algumas declarações, onde se destacam as

seguintes:

“Nunca fui consultada sobre a reforma”;

“Não existe merenda escolar e o bairro é muito carente em comida”;

“Os manuais não chegam. Em cada aula distribui-se e recolhe-se”;

“Não tenho subsídio pela função”;

“Nunca veio dinheiro da Repartição para a Escola. Os pais compram os

cadernos para as avaliações”;

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Um olhar sobre a implementação da Reforma Educativa em Angola. Estudo de caso nas Províncias de

Luanda, Huambo e Huíla. M. Azancot de Menezes (2010) 43

“Existe Comissão de Pais que aparece em casos de desistência dos alunos e

para comparticipar”;

“A passagem obrigatória na 3ª classe não é boa porque o aluno vai mal

preparado para a 4ª classe”;

“Temos 500 alunos; em cada sala há 40 a 45; é difícil trabalhar”;

“Queria pedir ao Governo merenda escolar porque aumenta o sucesso; os

alunos depois do recreio fogem porque têm fome, a mãe não deu o

matabicho”.

O director da Escola Primária nº H2

A Escola Primária nº H2 está situada numa zona periférica urbana do Huambo. Tem

seis salas de aulas, cerca de 2300 alunos e 45 professores. Das declarações produzidas

pelo director, destacam-se as seguintes:

“Existe comissão de pais, há reuniões mensais e a comunidade ajuda com

trabalho e comparticipação”;

“Quando se convocam os pais nem sempre aparecem, por falta de tempo; as

mães vão para as praças e os pais vão ao comércio”;

“Os professores estão mal enquadrados; falta de motivação; eu comunico à

Delegação Provincial e Repartição mas não se faz nada”;

“Os professores não foram ouvidos para a reforma”;

“Existia merenda escolar até o ano passado, fornecida pelo PAM (arroz e

conservas); nessa altura a desistência era reduzida”;

“Não existem cadernetas para a avaliação contínua, este é um dos grandes

problemas da reforma”;

“A formação que existe é curta, apenas um dia de refrescamento”;

“Temos projecto educativo mas não está a ser materializado porque aguardamos

autorização desde o início do ano”;

“O sistema de reforma é bem vindo o problema são as condições; as turmas têm

mais de 35 alunos, as infra-estruturas não são condignas e não existem fichas de

avaliação, nem cadernetas”;

“Não existem salas e por vezes tem que se pedir às igrejas”.

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Luanda, Huambo e Huíla. M. Azancot de Menezes (2010) 44

O director da Escola Primária nº H3

A Escola Primária nº H3 está situada numa zona periférica urbana do Huambo. Tem

três salas de aulas e uma zona de influência pedagógica, local de reuniões entre

professores e comunidade. O Director tem fraco nível de formação. Funciona com cerca

de 300 alunos e 7 professores. Das declarações produzidas, destacam-se as seguintes:

“Não temos merenda escolar e como os alunos vivem a mais de 2 km e não têm

transporte, faltam muito”;

“Temos bastantes dificuldades”;

“Apesar da Repartição fazer seminários de capacitação falta muita formação”;

“As actividades extra-curriculares são a campanha de limpeza com a família”;

“Não existem cadernetas para a avaliação contínua”;

“Não temos dinheiro, nunca recebemos e tenho que tirar do meu bolso”;

“Existe projecto educativo mas não funciona”.

O director da Escola Primária nº H4

Esta escola tem 3 salas de aula, 6 professores e situa-se também na zona periférica

urbana do Huambo. O director tem 54 anos de idade, tem a 8ª classe e 30 anos de

serviço. Entre outras, prestou as seguintes declarações:

“Nunca fui ouvido sobre a reforma educativa”;

“Não existem cadernetas para a avaliação contínua”;

“Não há projecto educativo”;

“Há comissão de Pais com 8 elementos e existe boa colaboração em resolução

de situações da escola, chapas de zinco, etc.”;

“Nunca recebemos dinheiro de entidades oficiais, recebemos apoio dos sobas e

da comissão de pais”;

“Não há merenda escolar”;

“Formação contínua houve apenas em 2005”;

“As actividades extra-curriculares envolvem encontros com outras escolas”;

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Luanda, Huambo e Huíla. M. Azancot de Menezes (2010) 45

“Cada turma deveria ter 35 alunos para a avaliação contínua; tenho uma turma

com 83 alunos, outras de 40 ou 70 alunos. Como fazer a avaliação contínua?”.

O director da Escola Primária nº H5

A escola nº H5 pertence a uma comuna numa zona rural do Huambo. Nesta comuna

existem cerca de 12 mil alunos e 180 professores. A escola em estudo tem 24

professores e 520 alunos. O director era um professor do 1º ciclo, tem agora 50 anos de

idade. Esta escola, talvez por estar numa zona do interior, foi a que apresentou

problemas mais complicados para a implementação do projecto da reforma educativa.

Eis algumas das declarações do seu director:

“A reforma na comuna está a dar muito trabalho; devia haver 35 alunos por sala

mas há 95 ou 100 alunos. Como fazer a avaliação contínua? Têm que aumentar

os professores para dividir os alunos, criarem-se mais turmas”;

“Não existem instrumentos de avaliação contínua dos professores; há poucos

manuais”;

“Não existe merenda escolar”;

“Há crianças oriundas de aldeias que residem aqui em cubatas construídas pelos

pais, sem condições, passam fome porque só comem quando os pais trazem

alimentos; no tempo do colono havia internatos”;

“Todos os professores deviam aumentar os seus estudos por causa da

monodocência”;

“Não existem manuais de Educação Musical e Educação Física”;

“Não há dinheiro, nem géneros alimentares”;

“As salas não têm carteiras”;

“Não existe legislação, nem a LBSE”;

“Da Repartição recebíamos giz, manuais, mas há 2 anos que não vem nada”;

“No princípio tínhamos uma lavra escolar, os produtos davam para os

professores estagiários aqui residentes, mas agora não temos”;

Os professores da 5ª, 6ª, 7ª e 8ª classes residem no Huambo, até aqui são 130

km, faltam muito!”;

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Luanda, Huambo e Huíla. M. Azancot de Menezes (2010) 46

“Existem 60 professores locais com a 10ª classe fizeram concurso para leccionar

na área mas não há respostas!”;

“Na nossa comuna existem 12 aldeias com crianças fora do sistema, sem

aulas!”;

“Outras crianças percorrem 10 a 20 km´s com chuva; quando chegam à escola

dormem, cansadas e com fome”;

“Deviam-se fazer lares para estudantes com o mínimo de condições e a

alimentação ficava por conta das famílias”;

“Devia-se fazer formação local para acabar com a anarquia das viagens”.

O administrador comunal

O administrador comunal prontificou-se a responder a todas as questões e

avançou com algumas queixas e propostas de solução. Destacam-se as seguintes:

“Como os professores vivem no Huambo (cidade), não aparecem, faltam,

mesmo com residências cá não funciona! A solução seria fazer-se formação de

professores locais ao nível das comunas”;

“Há 137 aldeias e muitas crianças não estudam por falta de professores; há cerca

de 150 crianças que vivem aqui porque residem a mais de 40 km mas não têm

condições de alojamento”.

O inspector comunal

Antigo professor, é inspector há 5 anos e tem 29 anos de idade. Tem uma boa

relação com os professores e com a direcção da escola. Proferiu algumas

declarações, nomeadamente:

“A reforma tem vantagens e desvantagens; vantagens porque está a avançar a

75%; desvantagens porque o material não chega a todos os professores, os meios

financeiros também não ajudam e dá muito trabalho (pautas, avaliação

contínua), é impossível”;

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Luanda, Huambo e Huíla. M. Azancot de Menezes (2010) 47

“Fazem avaliações semanais; por vezes passam 2 a 3 dias a fazerem a correcção

dos alunos”;

“Os alunos faltam e só aparecem para as provas”;

“Não existe material didáctico”;

“Não há professores”; há professores que faltam uma ou duas semanas porque

residem no Huambo; a opção de professores locais tem sido debatida mas não há

respostas”

“Há alunos que andam 15 a 20 km a pé, estudam só 4 ou 5 dias por semana.

Outras andam 35 km a pé; Em tempo de chuva é pior”;

“Os directores não têm legislação e os professores têm que comprar manuais”;

“Não existem professores formados em Educação Laboral, Educação Musical,

nem há instrumentos; e há problemas na monodocência em matemática”;

“Há muitos professores desmotivados, com problemas salariais; se estivessem

motivados trabalhavam”.

Os professores (6) residentes no Huambo e colocados numa zona rural

Entendeu-se que seria importante auscultar a opinião de professores residentes na

cidade mas destacados em escolas em zonas rurais. Sempre numa perspectiva de

entrevista livre, os seis professores deram várias opiniões, onde se destacam as

seguintes:

“O alojamento no princípio era muito difícil; Chegámos a ficar 15 professores,

homens e mulheres no mesmo quarto!”;

“O quarto era a sala de aula que tínhamos que arrumar e desarrumar todos os

dias”;

“Agora arranjaram-nos quartos vazios, dois por pessoa, sem nada, e como

chove lá dentro…”;

“Deixamos os filhos e a família no Huambo, os salários têm um atraso de 90

dias e quando se recebe é apenas um mês!”;

“Estamos isolados do mundo, sem TV, sem internet, não é fácil”;

“Não existe avaliação contínua porque não há cadernetas”;

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Luanda, Huambo e Huíla. M. Azancot de Menezes (2010) 48

“Temos que improvisar, sou professor de matemática mas tenho que dar

química”;

“Repare, olhe para o quadro… está todo cheio de pontos. Os alunos na aula de

matemática vão confundir o ponto de produto com o ponto do quadro

estragado”;

“Na Relação Escola-Família há problemas por causa da língua materna, não a

conhecemos…”;

“Estamos cá, uns, há dois anos, outros, há quatro; muitas vezes o nosso almoço

são bolachas ou nada!”;

“O inspector comunal é parceiro mas por vezes é mal encarado”;

Os professores (38) das várias escolas visitadas na Província do Huambo inquiridos

sobre os salários e a problemática da merenda escolar

Distribuíram-se questionários com perguntas abertas a 38 professores das escolas

primárias visitadas. As idades dos inquiridos vai dos 23 aos 66 anos, 28 são do sexo

feminino, 17 têm como habilitações académicas a 12ª classe (os restantes dos inquiridos

têm habilitações mais baixas, da 8ª à 10ª classe). O objectivo principal era saber se os

professores se sentiam motivados em termos de salário e se na escola onde leccionam

existia a merenda escolar. Apesar deste estudo ser de natureza qualitativa entendeu-se

que estes dados quantitativos poderiam ajudar a percepcionar o grau de satisfação dos

professores respondentes no domínio concreto do enquadramento salarial e sobre a

problemática da merenda escolar. Obtiveram-se os seguintes resultados:

Dos 38 professores inquiridos, 19 declararam não estar satisfeitos com o salário.

O facto de metade dos docentes manifestarem insatisfação em termos salariais

significa que este mesmo número de docentes tem problemas de falta de

motivação. Como os professores são determinantes para o sucesso de qualquer

reforma educativa, sem professores motivados, os objectivos da reforma

dificilmente serão alcançados.

Do número de professores referido, 36 afirmaram que nas suas escolas não havia

merenda escolar. Como está demonstrado que a existência de merenda escolar

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contribui para a resolução dos problemas de assiduidade e pontualidade, está-se

em crer que a resolução deste fácil problema poderia ser determinante para a

motivação das crianças com mais debilidades sociais.

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Luanda, Huambo e Huíla. M. Azancot de Menezes (2010) 50

3.3. Apresentação dos resultados da Província da Huíla

Nesta Província visitou-se uma Repartição Municipal de Educação, visitaram-se seis

escolas (duas estavam encerradas porque mal acabaram as provas a Direcção mandou

encerrar as escolas) em zonas periféricas. Entrevistou-se um chefe de Recursos

Humanos de uma Repartição Municipal, um inspector municipal de educação, três

directoras de escolas primárias, uma subdirectora pedagógica e cinco professores. Tal

como nos casos anteriores, o município não é identificado por razões de ordem ética e

às escolas em funcionamento, pelas mesmas razões, foram atribuídos os códigos Hu1,

Hu2, Hu3 e Hu4.

O chefe de recursos humanos de uma Repartição Municipal de Educação

As declarações deste membro da Repartição Municipal de Educação foram várias.

Destacaram-se algumas das consideradas mais pertinentes, como se segue:

“Como Secção Municipal de Educação não temos dinheiro; de vez em quando é

a Administração Central que envia apoios (carro, etc.) para o transporte de

material proveniente da Direcção Provincial e depois os directores das escolas

aparecem cá e transportam nas suas motos e nos carros dos agricultores para as

respectivas escolas”;

“As escolas não recebem dinheiro nenhum. A ADRA é que nos vai safando para

as actividades festivas como o dia da criança, etc.”;

“Há professores que não têm formação adequada, nem estão enquadrados”;

“Não existem cadernetas para a avaliação contínua e não temos forma de

fotocopiar; os directores entregam aos pais para fazerem cópias mas muitos

deles não têm dinheiro”;

“Existem seminários de capacitação promovidos pela ADRA e pela Repartição

sobre a reforma educativa”;

“Em relação aos manuais, há problemas com os da 5ª classe (nem todos têm),

caso da Matemática; e do 1º ciclo não há porque já é comercializável e nem

todos compram, para além de que não há em todas as disciplinas”;

“As escolas não têm LBSE e os directores não a lêem”;

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“Não existe merenda escolar”;

“Existem dificuldades com aqueles professores da monodocência que têm

dificuldades em ter que dar mais disciplinas porque a primária passou da 4ª para

a 6ª classe; há professores que querem pedir transferência para leccionar só

Educação Moral e Cívica”;

“Não existem professores nos quimbos com a 6ª classe, então a Repartição é que

coloca lá os professores; não têm condições, ficam num quarto do posto de

saúde; por vezes enquanto um fica a dar aulas o outro vai buscar água”;

“Alguns professores apanham dois táxis, depois andam 2 km a pé para irem dar

aulas“;

“Há alunos que andam a pé 15 km!”;

“O Governo disponibilizou carro mas apenas nas vias principais”;

“Há escolas que funcionam debaixo das árvores, quando chove tudo se molha e

não há aulas”;

“A reforma trouxe de bom a aprendizagem rápida, por causa do método de

ensino”.

O inspector municipal da educação

Falou-se um pouco com o inspector do Município em questão. Mostrou-se um

pouco reservado mas depois abriu-se e deixou desabafar alguns aspectos que o

preocupavam. Eis algumas das suas declarações:

“Ganho apenas como professor, nada recebo enquanto inspector”;

“Não tenho dinheiro para as deslocações, tiro do meu bolso”;

“Está a ver? Aquela escola está fechada, mas deveria estar aberta porque

receberam instruções para corrigirem as provas na escola; mas foram embora

porque estão desmotivados, não receberam o salário de Outubro e já estamos a

terminar Novembro”;

“Há problemas de assiduidade. Deviam-se comprar motas para os professores.

Andam quilómetros a pé”;

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A directora da Escola Primária nº Hu1

A Escola Primária Hu1 está situada numa zona rural da Huíla. Tem 32 turmas, sendo

que, funcionam 14 no edifício (7 de manhã e 7 de tarde) e as restantes por debaixo das

árvores. Há cerca de 1200 alunos, 32 professores e 8 funcionários (administrativos e

auxiliares de limpeza). A Directora tem 28 anos de experiência profissional docente,

aceitou ser entrevistada, tendo prestado os seguintes depoimentos:

“Existe Comissão de Pais e temos uma boa relação com eles; um pai ofereceu

sete quadros; também temos um computador, uma fotocopiadora, armários e

secretárias e um gerador oferecido pela ADRA”;

“Não existem condições para implementar a reforma; as salas têm 40 a 50

alunos; não há cadernetas para avaliar as classes de transição nem relatórios

descritivos para as classes de transição automática. Temos que pedir aos pais

para fazerem cópias”;

“Existem problemas com professores nas disciplinas de Educação Musical e

Educação Laboral”;

“Há professores das 6ªs classes mal preparados que escrevem com erros de

ortografia no quadro sendo necessários chamá-los à parte para corrigirem”;

“Não existe merenda escolar”;

“Só se faz avaliação escrita, a oral é difícil porque há muitos alunos”;

“O professores e os directores são mal pagos”.

A subdirectora pedagógica e a professora da Escola Hu2

A Escola Primária Hu2 está situada numa zona rural da Huíla. Tem 300 alunos, 20

professores e 5 salas de aula (os mais pequenos têm aulas no jango, sentados em

pedras). A subdirectora pedagógica concluiu o curso médio, tem 3 anos de experiência

profissional e aufere o salário apenas como professora. Foi entrevistada no meio do

mato em conjunto com outra professora, quando se deslocavam para as suas residências.

Algumas das declarações são as seguintes:

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A subdirectora pedagógica:

“Não há transporte e estamos mal enquadrados”;

“Não existe merenda escolar, nem cadernetas para a avaliação contínua; os pais

têm que dar dinheiro”;

“Existem manuais mas são insuficientes”;

“Os alunos do 1º ciclo vêm da cidade e os transportes são poucos”;

“Os seminários de capacitação são insuficientes”;

“Se não fosse a comissão de pais estávamos mal; eles é que construíram os

jangos”;

“As aulas à tarde terminam às 16h30, mas por lei deveria ser às 17h30; mas não

há transporte”;

A professora:

“Há problemas com a transição automática (1ª para a 2ª classe passam sem saber

e da 3ª para a 4ª classe também). Só reprovam da 2ª para a 3ª classe. No 1º ciclo

não sabem nada!”;

“Temos alguns problemas por causa da língua materna. As crianças só falam

nianeca entre elas e como não sabemos temos que improvisar; e os manuais são

todos em português”;

“O salários estão sempre atrasados e não há transportes; quando há operação

stop os táxis não funcionam ou estão cheios”;

“Não temos energia, nem água, nem biblioteca”.

A directora da Escola Hu3

A Escola Primária Hu3 é uma escola da zona rural da Huíla. A sua directora, com 45

anos de idade, exerceu a função de professora durante 26 anos, exercendo o cargo de

direcção há dois anos. A escola tem 516 alunos e 8 salas de aula (4 em espaço fechado e

outras 4 ao ar livre, por debaixo das árvores). Há 18 professores. Quando chove não há

aulas. Destacam-se as seguintes declarações:

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“Os professores não estão preparados para a reforma porque não sabem

preencher as cadernetas de avaliação do ensino primário para as 2ª e 4ª classes

nem os relatórios descritivos para as classes de transição da 1ª e da 3ª classes”;

“Há crianças na 3ª classe que não sabem ler. Nas aulas só falam a língua

nacional e isso dificulta na aprendizagem e na linguagem”;

“Por causa da língua, por exemplo, no pátio, se os professores tiverem que

ralhar, têm que ser em nianeca”;

“Antes da Reforma, na 1ª e 3ª classes tínhamos as disciplinas de Língua

Portuguesa, Ciências Integradas, Matemática e Educação Física. Com a reforma

passámos a ter as disciplinas de Língua Portuguesa, Estudo do Meio, Educação

Musical, Educação Manual e Plástica, Educação Física e Matemática. Há muitas

dificuldades nas disciplinas de Educação Musical, Educação Manual e Plástica e

Educação Física”;

“Há alunos da 3ª classe que só vieram às provas”;

“Os alunos faltam muito porque vão auxiliar os pais com o gado”;

“Há 50 alunos por sala. Como é que faço a avaliação contínua?”;

“E depois os pais têm que pagar pela caderneta 200 kwanzas e pelo Relatório

300 kwanzas. Os pais não pagam e os professores têm que desenrascar”;

“Há alguns professores mal enquadrados”;

“Não existe dinheiro, não há merenda escolar”;

“Os professores e os alunos têm que viajar muitos quilómetros a pé”;

“Temos casos de crianças que desmaiam na sala de aula porque estão com fome,

não jantaram no dia anterior”;

“Muito dos encarregados de educação são velhos e isso não ajuda”;

“Eu recebo apenas como professora”;

“A escola não tem projecto educativo”;

“A comissão de pais participa como pode”;

“Não recebemos qualquer tipo de legislação”.

Os professores (4) da Escola Hu3

Houve a oportunidade de se conversar com quatro professores da escola. Destacam-

se alguns dos seus depoimentos, como se segue:

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“Não existe água, nem energia”;

“Há crianças com fome e que desmaiam; outras não prestam atenção”;

“É preciso sonda para a água”;

“Também não temos merenda escolar nem posto médico”;

“É impossível fazer avaliação contínua nestas condições”;

“Antes de implementarem a reforma deviam preparar as condições”;

“Mesmo as classes de experimentação estão debaixo das árvores”;

“Os alunos lutam para entrar nas salas de aula e os mais frágeis ficam à chuva;

assim não é possível!”;

“Os alunos que habitualmente têm aulas debaixo das árvores quando por razões

especiais vão para as salas de aula ficam felizes e mais motivados”;

“Devia haver subsídio para os professores que vivem no Lubango”;

“Há circulares que se referem a subsídios, mas nada!”;

“Eu sou professora com a 8ª classe e ganho 25 mil kwanzas; para o transporte

gasto 10 mil kwanazas e para comida gasto 15 mil kwanzas; e as outras

necessidades?”.

A directora da Escola Hu4

A Escola Hu4 está localizada numa zona rural da Huíla. Tem 4 salas de aula, 19

professores e 615 alunos. A Directora tem 46 anos e exerce funções há 2 anos. Foi

entrevistada no meio da mata, a caminho de casa. Eis alguns dos seus depoimentos:

“Não temos LBSE nem chega legislação”;

“Não há merenda escolar”;

“Existe caderneta mas é paga pelos pais”;

“Há muitos alunos que vivem do outro lado do rio. Quando chove, como não

podem vir, faltam às aulas”;

“Não há transporte para mim nem para os professores e por isso chegam quase

sempre muito atrasados”;

“Se não fosse a sua boleia ia agora a pé e à chuva. Acontece sempre!”;

“Existem quatro turmas debaixo de árvores; quando chove não há aulas; e isso

acontece em Fevereiro, Março, até Maio”;

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Luanda, Huambo e Huíla. M. Azancot de Menezes (2010) 56

“Existem queixas sobre enquadramentos; há colegas que têm anos de serviço e

isso não é contemplado”;

“Há muitas crianças que nas aulas choram porque têm fome. É revoltante!”;

“As condições sociais das famílias são muito más!”;

“Existem problemas com os professores de Educação Musical”;

“Não há água potável. Os alunos bebem água do rio e ficam doentes”;

“Não existem carteiras. A comunidade faz bancos corridos para desenrascar.”;

“Os professores têm que ficar de pé! É muito cansativo.”;

“Tenho uma excelente relação com os professores”;

“Dou o meu melhor mas não tenho nenhum subsídio. Recebo apenas como

professora!”

Em relação às opiniões dos seis agentes de ONG´s com actividades ligadas à

educação, em todos os casos, as preocupações são análogas às dos professores e aos

directores de escola.

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3.4. Análise e Interpretação dos Resultados

A análise e interpretação dos resultados indiciam que há um longo caminho a

percorrer para se alcançarem os objectivos estabelecidos na política de bem-estar social

delineada pelo governo (ponto 1.5) e que o programa concreto da reforma educativa

perspectivado pelo Ministério da Educação (ponto 1.6) não parece ter tido o êxito que

seria desejável. Efectivamente, os resultados do estudo, desde logo, mostram que o

Ministério da Educação e as Delegações/Repartições de Educação se caracterizam por

possuir uma burocrática máquina administrativa, fortemente penalizadora para as

escolas. Notou-se não haver diálogo inter-institucional, as escolas não recebem

legislação educacional ou a que existe é em número reduzido, portanto, as escolas

visitadas baseiam-se muito num modelo racional, extremamente burocrático,

caracterizado pelo “centralismo na tomada de decisões, manifesta autoridade e

hierarquia, excessivo normativismo…” (Flores, 2005, p. 117), o que nada contribui para

a construção da escola democrática, “um projecto que não é sequer pensável sem a

participação activa de professores e de alunos, mas cuja realização pressupõe a

participação democrática de outros sectores e o exercício da cidadania crítica de outros

actores, não sendo, portanto, obra que possa ser edificada sem ser em co-construção

(Lima, 2000; citado por Flores, 2005, p. 16).

Tendo em atenção as questões empíricas colocadas aos inquiridos e a pesquisa

documental realizada para se fazer face aos dois primeiros objectivos específicos do

estudo, os resultados da análise documental (cadernetas de avaliação contínua,

convocatórias de reuniões sem actas desses encontros, etc.) e dos inquéritos

(questionários e entrevistas) mostram que o diagnóstico efectuado sobre a realidade

educativa ficou aquém do desejável porque há muitas dificuldades para a efectivação

das actividades lectivas e as opiniões dos directores, professores e outros agentes

educativos são muito desfavoráveis em relação à implementação do projecto de reforma

educativa porque consideraram que os progressos alcançados na melhoria da qualidade

de ensino são reduzidos. De facto, os respondentes deram a entender que há problemas

acentuados ao nível do input (infra-estruturas e contexto financeiro), do processo de

ensino-aprendizagem (qualidade do ensino, avaliação, clima pedagógico, etc.) e da

gestão (gestão escolar, organização, comunicação e gestão do pessoal). Por exemplo,

dos resultados da análise documental, constatou-se que as cadernetas de avaliação da 1ª,

2ª, 3ª, 4ª, 5ª e 6ª classes, editadas pelo INIDE, possuem alguns erros, havendo um muito

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Luanda, Huambo e Huíla. M. Azancot de Menezes (2010) 58

grave que se repete em todas as páginas (__”Trimestre ___ Semestre, de ___ à ____ de

___ de”) das duas cadernetas. Como se pode constatar (letra a negrito), há um erro

relacionado com o acento porque nestas circunstâncias não se deve colocar o acento em

“a”. Infelizmente, este erro é verificável no quotidiano, nas lojas, nos restaurantes, nos

serviços públicos e em documentos oficiais, estando este tipo de equívoco quase

“instituído” no país, o que reforça o argumento de que o Ministério da Educação terá

que prestar maior atenção a este género de situações.

No que diz respeito às infra-estruturas, concretamente sobre a “existência em

número satisfatório e o estado de conservação das salas de aulas”, no entender dos

inquiridos, há muito por fazer. Nesta vertente do problema que se prende com carência

de infra-estruturas, concretamente em relação à falta de salas aulas, esta fragilidade

compromete de forma significativa a componente da reforma educativa relacionada com

a avaliação das aprendizagens porque não é possível proceder à avaliação das

aprendizagens na perspectiva de avaliação contínua com turmas constituídas por um

número muito elevado de alunos e, simultaneamente, garantir as exigências de

qualidade pedagógica. Também, em relação ao equipamento necessário para a

concretização do ensino, bibliotecas, laboratórios, salas de refeitório e todas as outras

estruturas habituais e necessárias ao normal funcionamento das escolas, não existe ou é

extremamente precário, principalmente nas zonas rurais das províncias visitadas.

Conforme se pode depreender dos depoimentos dos inquiridos a qualidade do ensino

é discutível por várias razões. Em primeiro lugar, a começar pelos próprios agentes

educativos, há muitos aspectos que em nada contribuem para a motivação e o

envolvimento dos próprios. Consideram que os salários são mal pagos e nunca o

recebem de forma atempada, têm problemas graves ao nível da formação (inicial e

contínua) para utilização dos instrumentos necessários à implementação da reforma,

como por exemplo a utilização das cadernetas e relatórios para a avaliação contínua dos

alunos (uma das principais vertentes de incidência da reforma) não têm transporte para

as deslocações longas, situação agravada muitas vezes em tempo de chuva, portanto,

não estão motivados, nem parece haver progressos alcançados na melhoria da qualidade

de ensino com a implementação do programa de reforma educativa do ensino primário.

Segundo as respostas dos inquiridos e decorrente da análise dos resultados, é

possível identificar os principais constrangimentos do programa de implementação da

reforma educativa (objectivo específico c), a saber:

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Inexistência de escolas apetrechadas (salas de aula, bibliotecas, computadores,

etc.) e outros equipamentos educativos imprescindíveis à concretização do

processo de ensino-aprendizagem;

Não generalização e interrupção do programa de merenda escolar apesar de se

ter investido na formação de docentes nesta vertente e estar provado que o

programa contribuía de forma significativa para a diminuição das taxas de

absentismo dos alunos, bem como, para o aumento do sucesso escolar;

À excepção das escolas parceiras da ADRA onde foi visível o trabalho de outros

agentes educativos, notou-se a falta de envolvimento das famílias e da

comunidade nas actividades curriculares e extra-curriculares, portanto, há

ausência de trabalho sobre associativismo local na maior parte das zonas/escolas

visitadas, aspectos fundamentais para o desenvolvimento da escola e da própria

comunidade;

Escolas em funcionamento que estão muito afastadas das zonas de residência

dos alunos (principalmente nas escolas rurais do Huambo e da Huíla);

Qualidade das escolas existentes muito duvidosa porque não possuem condições

básicas como água potável, electricidade, salas de aula, carteiras e quadros

(principalmente nas escolas rurais do Huambo e da Huíla);

Inexistência (ou insuficiência) de seminários de capacitação e acções de

formação contínua para directores, inspectores escolares e professores, os dois

primeiros na área de políticas educativas e gestão escolar, e os últimos na

vertente de pedagogia;

Ausência de transporte escolar para docentes, discentes e outros agentes

educativos, absolutamente necessários nas escolas situadas em zonas rurais;

Os manuais escolares e outro material didáctico-pedagógico não são gratuitos e

não foram concebidos de forma a cobrir todas as necessidades e de forma

atempada;

Inexistência de legislação fundamental sobre educação (LBSE, informação sobre

concepção, execução e avaliação de um projecto educativo de escola, etc.) em

praticamente todas as escolas primárias visitadas;

Insuficiência de professores e outros técnicos da educação devidamente

preparados nas escolas situadas em zonas rurais;

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Um olhar sobre a implementação da Reforma Educativa em Angola. Estudo de caso nas Províncias de

Luanda, Huambo e Huíla. M. Azancot de Menezes (2010) 60

Inexistência de condições para alojar os professores residentes nas zonas urbanas

e que vão exercer docência nas escolas em zonas rurais;

Situação de pobreza das famílias, principalmente em zonas rurais;

Interrupção de aulas em tempo de chuva principalmente nas zonas rurais;

Acentuada falta de motivação dos directores, professores e outros agentes

educativos em termos pessoais, profissionais e salariais;

Falta de acompanhamento por parte das autoridades centrais, provinciais e

municipais da educação.

Os principais constrangimentos do programa de implementação da reforma educativa

acima referenciados são fundamentais para uma reflexão sobre as condições

actualmente existentes para a implementação do programa da reforma educativa

(objectivo específico d), pelo que, no ponto que se segue, procede-se à discussão dos

resultados obtidos por referência à questão de estudo, ao PANEPT e ao programa de

implementação da reforma educativa.

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Capítulo 4

Discussão e conclusão

4.1. Discussão dos resultados obtidos por referência à questão de estudo, ao

PANEPT e ao programa de implementação da reforma educativa

A questão de estudo colocou-se no sentido de se compreender se o “programa de

implementação da reforma educativa em curso resultou de um diagnóstico

suficientemente exaustivo para se identificarem os pontos de crise do sistema, se a fase

de preparação foi a mais adequada e se o cronograma estabelecido para as actividades

previstas nas diferentes etapas da reforma foi o mais ajustado no sentido de se

garantirem as melhores condições para a sua execução, nomeadamente, a formação

qualitativa e quantitativa de recursos humanos (professores, directores de escola,

inspectores escolares, encarregados de educação e outros agentes educativos), a

elaboração de novos currículos e a sua distribuição atempada e em quantidade, a

aquisição de meios de ensino e equipamentos, a construção e reabilitação de escolas em

todas as províncias, municípios e comunas do País, correspondendo às expectativas dos

principais actores envolvidos na educação e da sociedade em geral”.

Efectivamente, o Governo, desejando dar sequência aos propósitos estabelecidos no

“Plano de Acção Nacional de Educação para Todos”, estabeleceu um conjunto de

objectivos a concretizar com a reforma educativa, tais como:

A expansão da rede escolar;

A melhoria da qualidade de ensino;

O reforço da eficácia do sistema de educação;

A equidade do sistema de educação.

E estabeleceu um cronograma de trabalho para a sua operacionalização, nos termos

do Decreto nº 2/05 de 14 de Janeiro, baseado em 5 fases (Fase de Preparação, Fase de

Experimentação, Fase de Avaliação e Correcção, Fase de Generalização e Fase de

Avaliação Global).

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Um olhar sobre a implementação da Reforma Educativa em Angola. Estudo de caso nas Províncias de

Luanda, Huambo e Huíla. M. Azancot de Menezes (2010) 62

Numa perspectiva de problematização, após análise e interpretação dos resultados

da pesquisa, pode-se questionar se efectivamente a questão inicial de estudo se confirma

ou não, portanto, se os objectivos do Governo sobre a implementação da reforma

educativa foram ou não atingidos.

Como se expôs inicialmente está-se perante um estudo de caso e não faz sentido a

generalização dos resultados do estudo. Contudo, como é referido por muitos

metodólogos defensores dos paradigmas qualitativos, tese também perfilhada pelo

investigador, os estudos de caso podem ter muita utilidade porque são úteis para a

compreensão de outros contextos, pelo que, é nesta perspectiva que se podem retirar

algumas conclusões.

Em primeiro lugar, olhando para os objectivos definidos pelo Governo com base

na consulta pública sobre o PANEPT e nas recomendações do colóquio sobre o ensino

em Angola, pelo menos no contexto escolar das províncias visitadas:

Não existe igualdade de oportunidades de acesso à educação;

O ensino primário não é gratuito;

Pouco se está a fazer para transformar a escola em centro local de aprendizagem

dotada de autonomia e de recursos;

Não se está a implementar uma política efectiva de acção social escolar no

sentido de permitir a melhoria das condições de acesso e de diminuição do nível

de abandono.

Em segundo lugar, no domínio concreto dos docentes, não estão a ser

implementados os princípios e acções prioritárias no sentido de “adequar o perfil de

competências profissionais dos professores, formadores e educadores em geral, às

mudanças de contexto cultural e educativo como condição indispensável e determinante

para a redução dos elevados níveis actuais de insucesso escolar, a melhoria da qualidade

de ensino e o primado das competências e da aprendizagem”, pois:

Não estão a ser organizados programas especiais de aperfeiçoamento e

reciclagem em número desejável para docentes sem habilitação profissional;

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Não se estão a estabelecer novas e estimulantes condições de trabalho para os

novos tipos de professor;

Não se faz sentir o programa de reabilitação e construção de escolas, nem de

mobiliário escolar, nem a distribuição de merenda escolar.

Em terceiro e último lugar, em relação ao cronograma de implementação do novo

sistema de educação, para o estudo de caso que se realizou, a ter por base a opinião dos

respondentes e a análise dos resultados, a fase de preparação não terá ocorrido da

melhor forma, tendo tido repercussões nas fases seguintes, porquanto:

a. A “elaboração de novos planos e programas curriculares” parece ter atingido

algum sucesso, contudo, a sua distribuição pelas escolas, principalmente nas

zonas rurais, foi insuficiente e não ocorreu nos momentos previstos para a sua

experimentação em algumas classes;

b. A “formação do pessoal docente e gestores escolares” foi manifestamente

insuficiente;

c. A “aquisição de meios de ensino e de equipamentos escolares” e a

“construção e reabilitação de estabelecimentos de ensino” também ficou

muito aquém do desejável.

Alguns destes insucessos no processo de implementação da reforma educativa

podem ser ilustrados com os seguintes exemplos:

No 2º ano da reforma educativa (2005), segundo os dados do INIDE (2009) terá

ocorrido a “1ª supervisão nacional da reforma educativa”. De acordo com os resultados

deste estudo, a “1ª supervisão nacional da reforma educativa” não terá acautelado

muitas das preocupações e problemas aqui apresentados nos depoimentos dos

respondentes.

No 3º ano da reforma educativa (2006), segundo os dados do INIDE (2009), terá

ocorrido a generalização dos materiais pedagógicos da 1ª classe (recorde-se que a 7ª e

10ª classes não estão a ser contempladas neste estudo). Contudo, de acordo com a

opinião de todos os directores, subdirectores pedagógicos e professores inquiridos, o

relatório descritivo para as classes de transição automática (usado na 1ª e 3ª classes)

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Luanda, Huambo e Huíla. M. Azancot de Menezes (2010) 64

não foi distribuído às escolas, principalmente as localizadas em zonas rurais, ficando as

mesmas com a responsabilidade de fazer fotocópias ou envolver os pais no

financiamento desses encargos. Também, a “2ª supervisão nacional da reforma

educativa” anunciada pelo INIDE (2009), não terá acautelado e resolvido muitos dos

problemas apresentados pelos inquiridos.

No 4º ano da reforma educativa (2007), segundo os dados do INIDE (2009), terá

ocorrido a generalização dos materiais pedagógicos da 2ª classe e a formação de

professores experimentadores dos novos materiais pedagógicos generalizados (recorde-

se que a 8ª e a 11ª classes não estão a ser contempladas neste estudo). Contudo, de

acordo com a opinião de todos os directores, subdirectores pedagógicos e professores

inquiridos, a caderneta de avaliação contínua (usada na 2ª e 4ª classes) não foi

distribuída pelas escolas, principalmente as localizadas em zonas rurais, ficando as

mesmas com a responsabilidade de fazerem as fotocópias ou envolverem os pais no

financiamento desses encargos, para além de que, muitos dos respondentes expressaram

falta de competências específicas para concretizar a avaliação contínua com os novos

instrumentos alegando dificuldade no entendimento das fórmulas, principalmente por

falta de formação.

No 5º ano da reforma educativa (2008), terá ocorrido a generalização dos

materiais pedagógicos da 3ª classe e a formação de professores experimentadores dos

novos materiais pedagógicos generalizados (recorde-se que a 9ª e a 12ª classes não estão

a ser contempladas neste estudo). Contudo, de acordo com a opinião de todos os

directores, subdirectores pedagógicos e professores inquiridos, o relatório descritivo

para as classes de transição automática (usada na 1ª e 3ª classes) não foi distribuído

pelas escolas, principalmente as localizadas em zonas rurais, ficando as mesmas com a

responsabilidade de fazerem as fotocópias ou envolverem os pais no financiamento

desses encargos, para além de que, muitos dos respondentes expressaram falta de

competências específicas para concretizar a avaliação contínua com os novos

instrumentos alegando dificuldade no entendimento das fórmulas, principalmente por

falta de formação específica.

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Um olhar sobre a implementação da Reforma Educativa em Angola. Estudo de caso nas Províncias de

Luanda, Huambo e Huíla. M. Azancot de Menezes (2010) 65

É de notar também outros aspectos fundamentais que impossibilitaram a

utilização dos novos materiais pedagógicos (instrumentos de avaliação contínua e os

novos manuais), nomeadamente:

A inexistência de salas de aula (nas zonas rurais muitas das aulas são

ministradas debaixo de árvores) ou salas com 50 a 90 alunos, muito distante dos

35 preconizados na reforma educativa;

A falta de motivação de directores, professores e inspectores devido aos baixos

salários e aos problemas de enquadramento, bem como, a ausência de condições

de trabalho;

A fraca comparticipação dos pais e encarregados de educação na aquisição dos

materiais pedagógicos essencialmente por razões financeiras;

O número insuficiente de manuais distribuídos às escolas e a inexistência dos

mesmos nas escolas apesar destas estarem a implementar a reforma.

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4.2. Algumas considerações sobre a validade dos resultados do estudo

No que diz respeito à validade dos resultados deste estudo, para reforçar este

aspecto, por um lado, seguiram-se as sugestões de Blaxter, Hughes e Tight (2008), no

sentido de se garantir:

A interacção entre o investigador e os participantes do estudo;

A duração relativamente prolongada no campo de investigação;

A triangulação de dados.

Por outro lado, como a fidelidade da investigação baseia-se na explicitação dos

procedimentos da observação, as notas tomadas no campo de investigação pelo

investigador também constituíram um elemento fundamental para a verificação da

fidelidade.

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Luanda, Huambo e Huíla. M. Azancot de Menezes (2010) 67

4.3. Conclusão

Os resultados do estudo de caso sobre a implementação da reforma educativa no

País, apesar de não poderem ser generalizáveis por força do paradigma de investigação

adoptado, podem ter bastante utilidade para uma melhor compreensão da problemática.

Na área do currículo, numa perspectiva de reforma curricular, vector central de

qualquer reforma educativa, a conclusão sobre os resultados do estudo realizado pode

ser resumida em três pontos fundamentais:

As mudanças nos planos curriculares no sentido de promover a

interdisciplinaridade e outros aspectos pedagógicos pouco ou nada foram

implementados nas escolas por falta de recursos nas organizações escolares e

devido à falta de formação adequada dos professores;

A vontade muito rápida de mudar originou que as várias fases de preparação,

experimentação e generalização dos novos currículos secundarizaram aspectos

pedagógicos fundamentais como a formação adequada e atempada dos

professores experimentadores, os recursos das escolas, a distribuição gratuita

dos manuais escolares, dos programas e dos instrumentos de avaliação

(caderneta e relatório) por todos as escolas primárias.

Houve pouca ou nenhuma preocupação com a motivação dos professores

porque apesar do professor ser o protagonista de qualquer inovação curricular,

porquanto, compete a ele realizar o currículo e promover a interacção das

componentes socioeducativas, curriculares e didácticas, os resultados do estudo

mostram que o professor, enquanto agente curricular, não foi ouvido nem

motivado no âmbito da reforma educativa, esquecendo-se que ele é a chave do

sucesso ou insucesso de qualquer reforma ou inovação curricular.

Na área da administração e organização educacional, um vector fundamental de

qualquer reforma educativa e muitas vezes ignorado, apesar de se ter verificado que nas

escolas não se debatem questões centrais da política educativa e os diversos agentes

educativos (directores, professores, famílias, etc.) não concebem em conjunto os

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Luanda, Huambo e Huíla. M. Azancot de Menezes (2010) 68

instrumentos fundamentais de gestão escolar (projecto educativo de escola, plano de

actividades, regulamento, orçamento, etc.), os resultados do estudo mostram que não

foram apresentadas quaisquer propostas (por parte do Ministério da Educação) de

operacionalização da reforma na vertente da organização e gestão das escolas.

Na área da formação de professores, para além dos aspectos já apontados sobre a

ausência de formação contínua de professores (e gestores escolares) na maior parte das

escolas visitadas, concretamente no que diz respeito ao desenvolvimento profissional

dos professores, também não foram perceptíveis iniciativas do Ministério da Educação

conducentes à planificação, desenvolvimento e avaliação de actividades de

desenvolvimento profissional, sendo que, tal como refere Garcia (1999), “os processos

de desenvolvimento profissional são claramente determinados pela política educativa de

momento, sendo tal política concretizada em questões referentes ao currículo, à

organização e ao funcionamento das escolas” (p. 193).

Um último aspecto da análise dos resultados deste estudo prende-se com a política

de manuais escolares adoptada pelo governo que não está a salvaguardar como seria

desejável o direito de alunos e professores recorrerem a outras fontes de informação

importantes. Efectivamente, segundo a análise efectuada, na sequência da

obrigatoriedade dos manuais escolares serem reutilizáveis por vários alunos, tem-se

verificado que o material perde qualidade de forma considerável. Esta constatação

sugere que esta política do manual escolar parece não estar a produzir os melhores

resultados, pelo que, garantindo a qualidade científico-pedagógica, gráfica e de

durabilidade, o Ministério da Educação poderia admitir a vantagem da diversidade de

iniciativas editoriais de manuais escolares, melhorando a qualidade, racionalizando o

preço do manual escolar devido à concorrência, portanto, responsabilizando a sociedade

civil e garantindo a sua disponibilização gratuita no início do ano lectivo.

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Luanda, Huambo e Huíla. M. Azancot de Menezes (2010) 69

4.4. Recomendações

Os resultados deste estudo mostram que as fases de diagnóstico e de preparação

para a implementação da reforma educativa parece não terem decorrido da melhor

maneira, portanto, com repercussões nas fases posteriores. Efectivamente, apesar do

INIDE (2009) defender a tese de que a “fase de generalização dos novos materiais

pedagógicos e a implantação do novo sistema educativo no ensino primário está

executada a 80% (faltam generalizar as 4ª, 5ª e 6ª classes)” (p. 15), observações

empíricas e os resultados deste estudo de caso nas Províncias de Luanda, Huambo e

Huíla mostram que há muitas áreas educativas por trabalhar, pelo que:

Considerando as variáveis relacionadas com o progresso e desenvolvimento dos

alunos usadas como referencial neste estudo (edifícios, recursos, dimensão da turma,

sala de aula, motivações dos professores e condições e trabalho, igualdade de

oportunidades, gestão da sala de aula, clima de trabalho, etc.);

Considerando os objectivos defendidos pelo Governo com a reforma educativa

(expansão da rede escolar, melhoria da qualidade do ensino, reforço da eficácia do

sistema de educação e equidade dos sistema de educação);

Considerando o Plano de Acção Nacional de Educação para Todos (2004);

Considerando a estratégia geral para o sistema sócio-cultural (Angola 2025, Um

País de Futuro);

Considerando as áreas chave fundamentais para a avaliação da qualidade de uma

escola defendidas neste estudo (infra-estruturas, contexto financeiro, estruturas de apoio

externas à escola, qualidade de ensino, avaliação, gestão escolar, liderança, etc.);

Apesar de se considerar que há alguns aspectos positivos (aumento da população

escolar, construção de escolas, concepção de novos manuais escolares e realização de

alguns seminários de capacitação), foram identificados muitos constrangimentos do

programa (falta de escolas, escolas longe das residências dos alunos, escolas sem água,

luz, carteiras, bibliotecas, computadores e outras condições; falta de manuais e de

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instrumentos de avaliação, ausência de professores nas escolas situadas em zonas rurais,

falta de transportes para professores e alunos, pouca ou inexistente formação inicial e

continua de professores e directores de escola; inexistência de merenda escolar;

repartições municipais/comunais e escolas sem recursos financeiros para as

necessidades mais básicas; falta de motivação dos professores por questões salariais e

motivos profissionais; interrupção de aulas devido às chuvas; problemas sociais dos

alunos muito graves, etc.), pelo que, recomenda-se ao Governo no quadro da reforma

educativa que se esforce no sentido de:

No espírito e na letra dos protocolos sobre educação subscritos no quadro da

SADC, aumentar os valores do orçamento de Estado respeitantes à educação

passando dos actuais 8% para 18%, valor médio percentual dos países da SADC;

Aumentar de forma significativa a oferta de escolas devidamente apetrechadas

(água potável, energia eléctrica, refeitórios, salas de aula com carteiras e

quadros, bibliotecas, laboratórios, computadores, etc.) para o cumprimento do

objectivo “30 a 35 alunos por sala”, condições fundamentais para o processo de

ensino-aprendizagem e o sucesso escolar;

Permitir a autores e editores a concepção e edição de manuais escolares, com

qualidade (científico-pedagógica, gráfica e de durabilidade) e em quantidade

suficiente para que os mesmos estejam disponíveis de forma gratuita no início

do ano lectivo por todas as escolas primárias do país, de modo a respeitar os

interesses das famílias;

Disponibilizar mais cadernetas de avaliação e outros instrumentos, com mais

qualidade e em tempo útil, e que chegue a todas as escolas;

Resolver os problemas de transporte de alunos e professores, nomeadamente,

nas zonas rurais ou naquelas em que as escolas estão muito distantes das

residências;

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Proporcionar aos estudantes necessitados bolsas de estudo, residências e

merenda escolar em todas as escolas primárias do país;

Tendo em conta a estratégia de segurança alimentar aprovada pelo próprio

governo, não só persistir com o programa de merenda escolar, mas, também,

complementar com outros programas envolvendo os agentes educativos

municipais e comunais na utilização dos recursos da terra para a produção de

géneros alimentícios regionais no sentido de adequar os alimentos aos hábitos

alimentares das populações respectivas.

Encontrar soluções, em parceria com as autoridades municipais e comunais, para

proporcionar alojamentos com dignidade aos professores;

Reforçar a formação contínua para professores que estão deparados com as

disciplinas novas da reforma e com o aumento dos anos de escolaridade no

ensino primário de 4 para 6 anos;

Reforçar a formação contínua de directores de escola, inspectores escolares e

profissionais da educação não docentes (funcionários administrativos e

auxiliares de educação), nas Províncias e, em particular, nos Municípios e nas

Comunas;

Solicitar aos Institutos Superiores de Ciências da Educação e às Escolas

Superiores Pedagógicas que reforcem a formação inicial de professores com

vários perfis de saída (educação de infância, ensino primário e gestão escolar) e

promovam cursos de especialização e de pós-graduação.

Sensibilizar e apoiar as direcções de todas as escolas primárias para a

concepção, organização, promoção e execução de acções de formação para

encarregados de educação numa perspectiva de “escola de pais e encarregados

de educação”;

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Garantir recursos financeiros às escolas para que estas possam planificar e

materializar as políticas educativas;

No quadro do processo de descentralização administrativa e financeira, envolver

os agentes educativos na planificação e gestão dos processos educativos,

nomeadamente, através da integração das comissões de pais e de outros actores

dos conselhos de concertação e auscultação social dos municípios e das

comunas;

Aumentar com urgência os salários dos professores e resolver os problemas

pendentes de enquadramento profissional sem retirar direitos adquiridos;

Obrigar as escolas a criarem projectos educativos de escola concebidos,

executados e avaliados por todos os agentes educativos pertencentes à

comunidade educativa, e que reflictam a filosofia pedagógica da escola de forma

contextualizada em termos culturais, sociais e económicos;

Envolver e criar parcerias com ONG´s e outras associações credíveis e

interessadas em desenvolver estudos e projectos sobre educação.

Descentralizar a máquina burocrática e administrativa do Ministério da

Educação (e suas Repartições Municipais de Educação) e transferir

competências para as escolas envolvendo todos os agentes educativos na

direcção e gestão das escolas no sentido de fortalecer a autonomia das mesmas

na concepção, execução e avaliação dos projectos educativos de escola.

Repensar o novo papel do inspector escolar no contexto da escola autónoma

dirigida e gerida por todos os agentes educativos (projecto educativo de escola,

projecto curricular de turma, gestão do currículo, etc.).

Produzir propostas de legislação sobre escolaridade obrigatória e que a mesma

se aplique até à 9ª classe ou no momento em que o aluno perfaça 15 anos de

idade, garantido o Estado a gratuitidade do ensino.

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Um olhar sobre a implementação da Reforma Educativa em Angola. Estudo de caso nas Províncias de

Luanda, Huambo e Huíla. M. Azancot de Menezes (2010) 73

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