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UM ESTUDO TEÓRICO-EMPÍRICO SOBRE MODELOS E PRÁTICAS DE INOVAÇÃO Cássia Ercolin de Moura (UNISAL) [email protected] Gideon Carvalho de Benedicto (UNISAL) [email protected] Cândido Ferreira da Silva Filho (UNISAL) [email protected] O artigo tem como objetivo apresentar os conceitos e discutir as características dos modelos de inovação. Trata da importância da pesquisa e do conhecimento disponível na organização para o processo de inovação. O trabalho discute alguns moodelos de processos de inovação, bem como as formas de utilização dos conhecimentos empregados em cada um dos modelos. No que diz respeito à metodologia, inicialmente, realizou-se a coleta de material bibliográfico. A pesquisa bibliográfica compreendeu a leitura do texto, reflexão e crítica sobre os elementos que compõem os modelos de inovação, buscando identificar e analisar criticamente, entre outros pontos, os modelos de inovação utilizados por empresas reconhecidas pelo seu sucesso. Para o desenvolvimento da análise de caso foi escolhida uma companhia de capital aberto do setor de cosméticos e produtos de higiene e perfumaria. Os dados da pesquisa foram levantados por meio de entrevistas semi-estruturadas junto à empresa no 1º semestre de 2008. A preocupação fundamental foi levantar informações que possibilitassem estudar o modelo de inovação adotado pela empresa. Os processos de inovação propostos pelos modelos de primeira, segunda e terceira gerações partem da pesquisa como única fonte de informação para o início e desenvolvimento de um projeto. Neste sentido, o conhecimento é criado pela equipe de desenvolvimento de produto a partir de idéias pré-existentes. Nestes casos, não existe a participação de nenhum outro ator nem do ambiente interno ou externo da organização, que possam interferir no resultado da operação. No modelo funil de inovação os envolvidos interagem durante o processo. Palavras-chaves: Inovação. Modelos de Inovação. Processo de Inovação. XXVIII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO A integração de cadeias produtivas com a abordagem da manufatura sustentável. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 13 a 16 de outubro de 2008

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UM ESTUDO TEÓRICO-EMPÍRICO SOBRE MODELOS E PRÁTICAS DE

INOVAÇÃO

Cássia Ercolin de Moura (UNISAL) [email protected]

Gideon Carvalho de Benedicto (UNISAL) [email protected]

Cândido Ferreira da Silva Filho (UNISAL) [email protected]

O artigo tem como objetivo apresentar os conceitos e discutir as

características dos modelos de inovação. Trata da importância da

pesquisa e do conhecimento disponível na organização para o

processo de inovação. O trabalho discute alguns moodelos de

processos de inovação, bem como as formas de utilização dos

conhecimentos empregados em cada um dos modelos. No que diz

respeito à metodologia, inicialmente, realizou-se a coleta de material

bibliográfico. A pesquisa bibliográfica compreendeu a leitura do texto,

reflexão e crítica sobre os elementos que compõem os modelos de

inovação, buscando identificar e analisar criticamente, entre outros

pontos, os modelos de inovação utilizados por empresas reconhecidas

pelo seu sucesso. Para o desenvolvimento da análise de caso foi

escolhida uma companhia de capital aberto do setor de cosméticos e

produtos de higiene e perfumaria. Os dados da pesquisa foram

levantados por meio de entrevistas semi-estruturadas junto à empresa

no 1º semestre de 2008. A preocupação fundamental foi levantar

informações que possibilitassem estudar o modelo de inovação

adotado pela empresa. Os processos de inovação propostos pelos

modelos de primeira, segunda e terceira gerações partem da pesquisa

como única fonte de informação para o início e desenvolvimento de um

projeto. Neste sentido, o conhecimento é criado pela equipe de

desenvolvimento de produto a partir de idéias pré-existentes. Nestes

casos, não existe a participação de nenhum outro ator nem do

ambiente interno ou externo da organização, que possam interferir no

resultado da operação. No modelo funil de inovação os envolvidos

interagem durante o processo.

Palavras-chaves: Inovação. Modelos de Inovação. Processo de

Inovação.

XXVIII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO A integração de cadeias produtivas com a abordagem da manufatura sustentável.

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1. Introdução

O dinamismo do mercado é crescente. Isto obriga as organizações a desenvolverem sua flexibilidade e agilidade para enfrentar as transformações sociais, culturais, econômicas e tecnológicas. O ambiente organizacional exige das empresas mudanças e renovação em seus processos e produtos, para enfrentar a competitividade.

Um dos grandes desafios para as organizações é entender o papel que desempenham e o ambiente em que atuam, para possibilitar o desenvolvimento de práticas sistêmicas que conduzam a autotransformação, aplicando a inovação de forma constante em seus processos, produtos e serviços. A inovação requer agilidade, eficiência e eficácia para promover a competitividade e rentabilidade do negócio.

Os modelos de inovação têm sido estudados por vários autores. As diferentes propostas dos modelos de inovação sugeridos por Kline e Rosenberg (1986), Rothwell (1992), e Clark e Wheelwrigh (1993), constituem temas de grande interesse nos meios empresariais e acadêmicos. Interessa conhecer esses modelos e suas interpretações, mesmo porque, as inovações podem se transformar num diferencial que conduza à criação de valor e riqueza para a organização.

2. Objetivo e Metodologia

O artigo tem como objetivo apresentar os conceitos e discutir as características dos modelos de inovação, realizando uma reflexão sobre a importância da pesquisa e do conhecimento disponível na organização no processo de inovação. O trabalho discute alguns modelos de processos de inovação, bem como as formas de utilização dos conhecimentos empregados em cada um dos modelos.

No que diz respeito à metodologia, inicialmente, realizou-se a coleta de material bibliográfico. A pesquisa bibliográfica compreendeu a leitura do texto, reflexão e crítica sobre os elementos que compõem os modelos de inovação, buscando identificar e analisar criticamente, entre outros pontos, os modelos de inovação utilizados por empresas reconhecidas pelo seu sucesso.

Em seguida realizou-se a análise de um caso. Godoy (1995) e Yin (2001) afirmam que um estudo de caso tem como objeto uma unidade que se analisa profundamente. Para o desenvolvimento desta análise de caso foi escolhida uma companhia de capital aberto do setor de cosméticos e produtos de higiene e perfumaria. Os dados da pesquisa foram levantados por meio de entrevistas semi-estruturadas junto à empresa no 1º semestre de 2008. A preocupação fundamental foi levantar informações que possibilitassem estudar o modelo de inovação adotado pela empresa.

3. Referencial Teórico

3.1. Inovação e Conhecimento

Barbieri e Álvares (2003) distinguem invenção de inovação. A primeira é uma idéia original elaborada ou uma concepção mental que é apresentada por meio de fórmulas, modelos, protótipos, entre outros, que registram a idéia e deve referir-se a algo novo, inexistente,

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podendo ou não ser aceita no mercado. A inovação, por sua vez, é a invenção efetivamente incorporada pelo mercado. Isto significa que nem toda invenção se transforma em inovação, ou seja, em uma prática aceita e incorporada aos bens e serviços oferecidos ao mercado.

Todo processo de inovação demanda a incorporação de novos conhecimentos. Cabe à organização como um todo ser a facilitadora dessa ação. Em síntese, o resultado esperado de um processo de inovação é primordial para o comprometimento das pessoas e a geração do conhecimento.

Nonaka e Takeuchi (1997, p. 15) enfatizam a necessidade da criação de novos conhecimentos. Os autores afirmam que a característica peculiar das empresas japonesas é o fato de que nenhum departamento ou grupo de especialistas tem responsabilidade exclusiva pela criação do novo conhecimento. Funcionários da linha de frente, gerentes de nível médio e gerentes seniores – cada qual fazem sua parte. Porém, isso não quer dizer que não haja diferenciação entre esses três papéis. Na verdade, a criação do novo conhecimento é produto de uma interação dinâmica entre eles.

A tecnologia está inter-relacionada com a geração do conhecimento. Barbieri (2003) classifica a tecnologia como conhecimento aplicado e entende que nem todo conhecimento é tecnologia. Mas ao se referir à inovação a palavra tecnologia é agregada como se incorporando a definição da palavra e da ação. A tecnologia no processo de inovação é uma ferramenta auxiliar do homem que emprega o conhecimento.

É possível que não haja inovação sem antes de ter o domínio do conhecimento, das fases de criação do conhecimento e do resultado pretendido. Tálamo e Lenzi (2006) ressaltam que a inovação tecnológica para ocorrer de maneira satisfatória necessita do reconhecimento do setor produtivo dos termos de domínio da inovação, propiciando uma adequada interpretação na formulação das etapas para a ocorrência efetiva do processo.

Magalhães (2007) menciona que os gestores de inovação devem conhecer e mapear profundamente os processos, as pessoas, as tecnologias, os agentes e atores do mercado, e todas as redes e conexões ao seu redor para transformá-los em vantagens competitivas. Para isso, o êxito nos resultados de qualquer modelo de inovação está no envolvimento dessas premissas.

Portanto, a competitividade e a sobrevivência em longo prazo exigem aceleração nos processos de inovação. Completando essa idéia Capra (2002) afirma que as organizações de hoje precisam passar por transformações fundamentais. As empresas estão vivendo situações de grande competitividade, numa economia globalizada, em mercados desregulamentados, e para permanecerem no mercado precisam desenvolver novos modelos de gestão que favoreceram a inovação. Neste aspecto três pontos são fundamentais para o processo de inovação:

• fundamentos econômicos sólidos;

• superação da dependência externa; e

• elevação da produtividade, vista unicamente sob a forma de inovação e investimentos expressivos em conhecimento.

No entanto, a complexidade dos processos envolvidos nessas atividades dificulta sobremaneira a construção de modelos capazes de sustentar os processos de inovação.

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3.2. Modelo de Inovação de Primeira Geração

O modelo denominado de primeira geração originou-se no pós-guerra. A idéia expressa por este modelo é que toda a inovação é resultado do conhecimento científico, conforme Barbieri (2003). Embora seja muito utilizado na ciência, o modelo não responde as perguntas que procuram entender tanto o processo quanto às ocorrências organizacionais que necessitam da inovação.

Na figura 1 temos o modelo de inovação de primeira geração. O modelo é conhecido como modelo linear de inovação. Bush (1945) estabeleceu este paradigma que foi predominante entre os anos 1950-1965, sendo adotado pela grande maioria dos países industrializados. O modelo caracteriza a linearidade da ação. Observa-se que seu escalão é progressivo, desde a pesquisa básica que envolve o descobrimento científico (principal propulsor da inovação), passando pela pesquisa aplicada, desenvolvimento até a fabricação e lançamento do produto.

Para Conde e Jorge (2003), mesmo sendo este modelo muito utilizado pela ciência, ele não traz a verdadeira realidade da necessidade da inovação para a organização, pois a investigação trata o mercado como lugar no qual serão incorporados os resultados obtidos, não se preocupando com suas necessidades principais.

Fundamentado no modelo de inovação linear, tem-se as mudanças técnicas devem ser entendidas como mudanças de estágios, em que novos conhecimentos são agregados à pesquisa científica. Na seqüência, se desenvolve o processo de inovação com base nas atividades de pesquisa aplicada, resultando em um novo processo, produto ou serviços comercializáveis.

Fonte: Adaptado do OECD (1994)

Figura 1 - Modelo de inovação linear

Apesar da possibilidade de incorporação de novos elementos ao modelo de inovação linear, sua concepção e dinâmica de inovação continuam sendo a mesma, sendo possível apenas inverter o sentido da cadeia linear de acordo com a sua necessidade.

Nota-se na figura 1, que as três primeiras fases do modelo estão voltadas para pesquisa básica que por sua vez orienta para a criação do conceito, fundamentado na pré-existência do objeto.

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Em seguida na pesquisa aplicada, busca a renovação do conceito pesquisado na fase anterior e orienta para a construção da próxima fase, que é a busca pelo conhecimento.

Vale ressaltar que em nenhuma das três fases está contemplado o aspecto de interação com o mercado. A preocupação maior é com o desenvolvimento da pesquisa sobre o objeto, fruto da necessidade de inovação, ou seja, este modelo é ofertante de tecnologia, razão pela qual também é conhecido como modelo ofertista ou science push.

3.3. Modelo de Inovação de Segunda Geração

É conhecido como modelo de inovação linear da mesma forma que o anterior, porém linear reverso ou demand pull ou need pull. A partir deste modelo já se nota a preocupação com a necessidade do mercado, tornando-o diferente do modelo de Primeira Geração. Este modelo é considerado linear, pois se utiliza de um movimento de troca de conhecimento entre suas fases. A figura 2 a seguir ilustra os fundamentos do modelo.

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Fonte: Adaptado do OECD (1994)

Figura 2 - Modelo de inovação linear reverso

O modelo parte do levantamento das necessidades do mercado. Em seguida com o feedback inicia-se a fase de geração de idéias. Com a geração de idéias, o departamento responsável por pesquisa e desenvolvimento (P&D) estuda, analisa e dá início ao processo de desenvolvimento dessas idéias. Cada fase é interligada na experiência acumulada da etapa imediatamente anterior formando uma construção de conhecimento linear.

No primeiro modelo a análise de cada etapa leva geração do conhecimento por meio da pesquisa científica desde a sua origem até o lançamento comercial, não se importando com o tempo e o espaço necessário para sua condução. Neste modelo, a inovação se origina de uma necessidade. A experiência adquirida nesse processo é que impulsiona a fase seguinte, e assim sucessivamente até o lançamento do produto no mercado.

3.4. Modelo de Inovação de Terceira Geração

A partir de 1969 os modelos de inovação de primeiras e segundas gerações começaram a ser discutidos e repensados por causa de sua simplicidade diante da complexidade da inovação e por não interagirem com a necessidade do meio externo - sociedade e mercado. O Modelo de

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Inovação de Terceira Geração pode ser criado a partir de uma necessidade ou de uma disponibilidade da organização. Vários autores apresentaram modelos redesenhados como: Myers & Marquis (1969), Cooper (1979) e Rothwell (1992). Neste trabalho optou-se em apresentar o modelo deste ultimo autor, por ser o modelo mais recente dos três e por conter o mesmo princípio dos autores relacionados.

Esta nova proposta apresenta um procedimento mais completo, que intervém no que há de mais atualizado com respeito à tecnologia, produção, mercado, sociedade e capacidade interna da organização. Na figura 3 temos representado o modelo. Neste modelo há um aumento da possibilidade de geração do conhecimento para a preparação e desenvolvimento da inovação. Além disso, existe a preocupação em buscar informação sobre a necessidade do mercado, estimulando a criatividade e desenvolvendo de pesquisa, antes de utilizar a condução linear pura e simples, como nos modelos anteriores. Rothwell (1992) chama a atenção nesse modelo para a criação do conhecimento nas atividades de rotina, sendo esta compartilhada de uma forma abrangente por todos os membros da organização.

Fonte: Adaptado de Rothwell (1992, p.222)

Figura 3 – Modelo de inovação de terceira geração

3.5. Modelo de Kline e Rosenberg

Kline e Rosenberg (1986) apresentam uma seqüência lógica e nem por isso contínua ou linear, em que os processos voltam sempre que necessário na etapa anterior ou posterior, podendo ser divididas em séries funcionais, com etapas interdependentes e interativas.

O modelo desenvolvido por ests autores traz a novidade do compartilhamento de informações durante todo o processo. A concepção deste modelo chega mais perto do atendimento das necessidades do mercado ou a satisfação dos consumidores. A proposta dos autores começa por uma idéia que se materializa respondendo a uma necessidade do mercado. Neste ponto existe entre as etapas uma realimentação de informações (feedback). Quando não se obtém alguma informação, investiga-se para obtê-la. Existe em todo o processo uma relação estreita entre a ciência e a tecnologia. Neste modelo a inovação é considerada uma maneira de se encontrar as soluções para os problemas.

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Fonte: Adaptado de Kline (1978)

Figura 4 – Modelo de inovação de Kline e Rosenberg

Na opinião de Barbieri (2003) o modelo de Kline e Rosenberg indica que as relações entre a pesquisa científica e tecnológica e os processos de inovação, ocorrem em todos os sentidos e nos elementos da cadeia de inovação. Este modelo permite a troca de experiências, de conhecimento e de informações, durante seu desenvolvimento, propiciando as devidas correções em cada etapa e ampliando a possibilidade de buscar bons resultados.

Para Kline e Rosenberg (1986) ao aplicar o conhecimento no processo, fornece ao modelo a lógica do encadeamento de idéias. A proposta ilustrada na figura 4 inicia-se com a identificação de uma oportunidade de mercado, ou de uma demanda do mercado consumidor, ou seja, a renovação de um processo e caminha para a aplicação de uma ação explícita. A circulação da informação no processo de desenvolvimento do modelo propicia aos integrantes uma abrangência maior do aprendizado e os transforma em responsáveis pela disseminação de seu conhecimento.

3.6. Modelo Funil de Desenvolvimento

O modelo funil de desenvolvimento ou funil de inovações abre uma nova era na aplicação dos modelos de inovação. O modelo foi criado por Clark e Wheelwright (1993) e pode ser considerado um exemplo de desenvolvimento prescrito, que objetiva orientar as atividades dos agentes inovadores e principalmente das organizações na busca de soluções. O pressuposto do modelo permite a participação efetiva não somente da organização, mas também da sociedade como um todo, desde o fornecedor, os clientes e os não clientes.

Ao contrário dos modelos discutidos, ele exige uma ação eficaz que interage nas fases, progredindo ou retroagindo com informações (feedbacks) entre todos os elos do processo. Logo, são as trocas de informações entre estes atores, ou o estabelecimento de cooperação entre fornecedores e empresas, que possibilita o desenvolvimento da inovação, quanto à qualidade e desempenho dos processos e produtos.

A premissa do modelo é a geração de idéias, quanto mais idéias melhores é a seleção feita de acordo com a necessidade da organização por inovação. Na primeira fase de geração de idéias, as falhas são admissíveis para estimular a geração de criatividade (brainstorming).

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Clark e Wheelwright (1993, p.193) alertam que embora pareça simples à execução do modelo, na realidade a organização precisa adaptá-lo as suas necessidades, às vezes durante o desenvolvimento do funil, podendo ser necessários à criação de outros funis, para direcionar corretamente o objetivo a ser atingido. A figura 5 mostra as fases do funil e a troca de conhecimento entre essas partes. Nota-se que esta ação permite a correção dos erros em qualquer momento durante o desenvolvimento.

Fonte: Adaptado de Clark e Wheelwright, 1993, p.306)

Figura 5 - Modelo III criado por Clark e Wheelwright (1993, p.306)

3.7. Conhecimento Descritivo e Explicativo

De acordo com Nonaka e Takeuchi (1997) a percepção é uma interação entre o conhecedor (sujeito) e o conhecido (objeto). A observação dos fatos leva o sujeito a experimentá-los, a envolver as atividades e a transformá-las em experiências. Os autores completam a idéia dizendo que assim se obtém o conhecimento, por meio da manipulação das coisas, ou ação, e sua verdade deve ser demonstrada na prática. O conhecimento se justifica na utilização conjunta de seus benefícios na troca de informações, agregando maior qualidade pela correção continua.

Os autores definem as cinco fases de criação do conhecimento: (1) compartilhamento tácito; (2) a criação do conceito; (3) justificação; (4) construção de arquétipos; (5) difusão interativa. Isso se constitui num fator de grande importância no movimento de criação do conhecimento em qualquer modelo de inovação.

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Com base nos conceitos de inovação percebe-se que todo o conhecimento é perecível e, portanto cabível de renovação constante. O mercado é o ambiente de competição das organizações, e exige mudanças freqüentes. Por sua vez as organizações precisam desenvolver a habilidade de criar continuamente uma nova percepção das causas de um fenômeno, aptidão inerente ao capital humano de cada organização, a tecnologia não gera percepções, as cognições empregadas, disseminadas e difundidas se transformam na principal fonte de sustentação do ato de inovar.

4. Análise de Caso

A empresa estudada é uma empresa brasileira líder em toda a América Latina no setor de cosméticos e produtos de higiene e perfumaria. O seu portfólio tem mais de 450 produtos e 136 milhões de itens produzidos. Foi fundada há quase 40 anos, no 1º semestre de 2008 seu quadro de colaboradores contava com 2.700 funcionários e cerca de mil consultores distribuídos por todo o país.

É notável a sua capacidade de inovar. Observa-se que a inovação criada pela empresa possibilitou o desenvolvimento de uma linha de produtos capaz de disputar com as concorrentes multinacionais, com dotações orçamentárias destinadas à pesquisa muito maiores que a da empresa em estudo.

Outra questão observada é a sustentabilidade. Os seus funcionários são treinados para pensar dia e noite de diversas maneiras em preservar o meio ambiente ou de beneficiar as comunidades que de alguma forma são afetadas pelas atividades da empresa.

Um exemplo que valida o incentivo e a implementação do modelo funil de inovações na empresa é a experiência vivenciada no ambiente de trabalho e a troca de informação.

Durante a década de 80, a empresa se transformou em um dos maiores complexos nacionais de produção e distribuição de cosméticos, competindo com marcas multinacionais de longa tradição no mercado brasileiro. Essa expansão foi alicerçada em três fundamentos: (1) investimento em tecnologia; (2) qualidade e criação de novos produtos; e (3) esquema ágil de distribuição por meio de venda pessoal.

O crescimento das vendas proporcionou à necessidade de aumentar o ritmo dos lançamentos de novos produtos, para que as consultoras pudessem chegar ao mercado a cada novo mês com novidades em seu catálogo, criando expectativa no mercado consumidor.

O planejamento da empresa foi estruturado em um documento chamado de “Grade de Lançamentos”. A empresa dividiu o ano comercial em 17 ciclos, cada qual com 21 dias, tempo considerado suficiente para criação de novas idéias.

Desde o início de suas atividades, o lançamento de novos produtos foi baseado em conceitos inovadores e revolucionários. O processo de inovação da empresa é estruturado e formalizado com base no funil de desenvolvimento de Clark e Wheelwright (1993, p.293), este modelo foi adaptado ao já existente na empresa Pre-Briefing, Briefing – Plano Executivo I e Plano Executivo II, e é alimentado por dois fluxos: o tecnológico e o de marketing.

O fluxo tecnológico é regido pela ciência, pesquisas acadêmicas, patentes e concorrência (em nível mundial) e hábitos do consumidor. Neste caso, há um setor específico para esta análise. O fluxo de marketing é responsável em monitorar a concorrência e hábitos dos consumidores.

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O funil é aplicado nas seguintes fases:

1ª. Fase - Desenvolvimento de idéias exploratórias: busca criar idéias e oportunidades de uso e desenvolvimento de novas tecnologias para novos produtos. A responsabilidade de análise, assim como do Pré-Briefing é do Setor de Tecnologia e Conceitos Avançados (TCA).

2ª. Fase - Desenvolvimento de idéias factíveis: ocasião em que se pretende converter a tecnologia em protótipos; definir conceito técnico, mostrar interesse pelo consumidor e comercial. É responsabilidade do Gerente de Segmento a elaboração do Briefing assim como do Time de Projeto que acompanhará o desenvolvimento. Tipicamente, um Time de Projeto é composto de um Gerente/Coordenador de Produto; (MKT), engenheiro de processo e envase, pessoal do desenvolvimento de embalagens e do planejamento e controle logístico além de pessoas do P&D.

3ª. Fase - Operacionalização da Idéia: desenvolve os componentes do composto de produtos, quantificam o interesse pelo consumidor e as chances comerciais do produto. Cabe ao Time do Projeto especificar o design, o conceito e se tem apurada a rentabilidade esperada (Plano Executivo I).

4ª. Fase - Implantação da Idéia: aquisição de moldes e equipamentos, definição do composto final do produto e início da produção, o resultado desta etapa é o Plano Executivo II, onde ocorre a decisão estratégica de lançamento. Nesta fase já devem ter sido feito os testes qualitativos do produto. Esta fase também é de responsabilidade do Time de Projeto.

5ª. Fase - Lançamento: o produto é acompanhado até seis meses após o lançamento. Após esta fase, se encerra a responsabilidade do Time de Projeto, passando o produto para a responsabilidade da Vice Presidência Comercial.

Cada fase vencida os projetos são revisados e avaliada pelo Comitê de Negócios. Os casos mais importantes são submetidos ao Comitê de Inovações, principalmente quando envolvem linhas conceituais e estratégicas da empresa, conforme representado na figura 6. Mesmo nestes casos, o Comitê de Inovações somente participa da aprovação do Briefing e às vezes do acompanhamento posterior dos planos executivos.

Vale ressaltar que existe uma notável diferença da ação do funil em relação aos outros modelos de inovação, mesmo após o encerramento do processo de desenvolvimento do produto. Neste ponto, efetua-se a revisão do plano estratégico da empresa. Geralmente, o plano estratégico tem a duração de cinco anos e a revisão anual ocorre em um horizonte de três anos.

As informações de relevância extraídas do processo são incorporadas ao plano anual de estratégias. A troca de experiência e conhecimento acontece em todas as fases. Caso exista alguma interferência entre as fases de difícil solução são criados pequenos funis para o completo entendimento das ações (figura 6).

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5. Considerações Finais

Os quatro primeiros modelos expostos, por necessitar de um empenho coletivo para a sua execução são considerados macro modelos explicativos, muito utilizados para explicar cientificamente a ação dos modelos de inovação para as organizações. O seu desenho cartesiano pode impossibilitar às organizações a correção dos problemas durante o desenvolvimento do modelo.

Os processos de inovação propostos pelos modelos de primeira, segunda e terceira gerações partem da pesquisa como única fonte de informação para o início e desenvolvimento de um projeto. Neste sentido, o conhecimento é criado pela equipe de desenvolvimento de produto a partir de idéias pré-existentes. Nestes casos, não existe a participação de nenhum outro ator nem do ambiente interno ou externo da organização, que possam interferir no resultado da operação. Somente com o modelo denominado funil de inovação, é que os envolvidos no desenvolvimento da inovação interagem em todas as etapas do processo.

É inegável a necessidade das organizações gerarem inovações para elevar a competitividade, rentabilidade, crescimento sustentável, assegurarem a melhoria contínua. Portanto, é importante ressaltar que a escolha de um modelo de inovação deve contemplar a especificidade de cada organização. De qualquer forma, o modelo funil de inovações contribui de forma mais acentuada para melhoria do desempenho organizacional, pois utiliza todos os tipos de conhecimento.

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