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Um arcabouço generalizado para empacotamento de ramificações e outras estruturas combinatórias Mario Leston Rey T ESE APRESENTADA AO I NSTITUTO DE MATEMÁTICA E E STATÍSTICA DA U NIVERSIDADE DE S ÃO PAULO PARA OBTENÇÃO DO TÍTULO DE D OUTOR EM C IÊNCIAS Programa: Doutorado em Ciência da Computação Orientadora: Profa. Dra. Yoshiko Wakabayashi Durante o desenvolvimento deste trabalho o autor recebeu auxílio financeiro do CNPq São Paulo, novembro de 2012

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  • Um arcabouço generalizado paraempacotamento de ramificações eoutras estruturas combinatórias

    Mario Leston Rey

    TESE APRESENTADAAO

    INSTITUTO DE MATEMÁTICA E ESTATÍSTICADA

    UNIVERSIDADE DE SÃO PAULOPARA

    OBTENÇÃO DO TÍTULODE

    DOUTOR EM CIÊNCIAS

    Programa: Doutorado em Ciência da Computação

    Orientadora: Profa. Dra. Yoshiko Wakabayashi

    Durante o desenvolvimento deste trabalho o autor recebeu auxílio financeiro do CNPq

    São Paulo, novembro de 2012

  • Um arcabouço generalizado paraempacotamento de ramificações eoutras estruturas combinatórias

    Esta versão da tese contém as correções e alterações sugeridaspela Comissão Julgadora durante a defesa da versão original do trabalho,

    realizada em 22/11/2012. Uma cópia da versão original está disponível noInstituto de Matemática e Estatística da Universidade de São Paulo.

    Comissão Julgadora:

    • Profa. Dra. Yoshiko Wakabayashi - IME-USP

    • Prof. Dr. Jose Coelho de Pina Junior - IME-USP

    • Prof. Dr. Marcelo Henriques de Carvalho - UFMS

    • Prof. Dr. Orlando Lee - UNICAMP

    • Prof. Dr. Sóstenes Luiz Soares Lins - UFPE

  • Ao meu filho, Pedro, que iluminou aminha existência e a de meus pais.

    Ao meu irmão, Antonio, que éa luz que mais nos faz falta.

  • Agradecimentos

    À Yoshiko, pela orientação, compreensão, dedicação, cuidado, atenção, apoio, encorajamento,e, ademais, pela paciência em aturar um ser caótico e intermitente como eu.

    Aos professores José Coelho de Pina, Marcelo Henriques de Carvalho, Orlando Lee, e SóstenesLins, pelas inúmeras sugestões.

    Ao Paulo Feofiloff, um sujeito ímpar, lúcido e inspirador, responsável em grande parte (queiraele ou não) pelos lampejos de qualidade (se é que existem) deste trabalho. É uma honra e alegriatê-lo como amigo.

    Ao Pil, outro sujeito ímpar, que há muito tempo já deixou a categoria de amigo e tornou-seirmão, pela irmandade incondicional, por sempre me ouvir, apoiar, compreender e, principalmente,participar positivamente e decisivamente nas escolhas importantes de minha vida.

    Ao meus pais — sempre presentes, responsáveis pelas minhas qualidades, mas não pelos meusdefeitos — por todo apoio, dedicação, amor e por viabilizarem a realização deste trabalho. Emparticular, à minha incansável mãe, que além de cuidar de mim, cuida do meu filho e do meu pai.

    À minha Linda, por ser fonte de inspiração, e por todo amor, carinho, apoio, dedicação, enco-rajamento, e compreensão, sem os quais este trabalho não poderia ter sido realizado.

    Aos professores Marcelo Rezende, Dário Alliprandini e Sílvia Boarin da ESEG, por propor-cionarem um ambiente de trabalho amistoso, saudável, responsável e honesto. Ao Marcelo, emparticular, por toda a amizade e apoio, tanto em questões particulares quanto nas laborais.

    Ao Coelho, pelo apoio e pelas conversas.Ao Yoshiharu, ao Carlinhos, à Cris, ao Alair, ao Finger e a Gordana, pelas conversas e suges-

    tões.Ao Lymber, amigo já de muitos anos, por estar presente num momento crítico.Ao Ricardo Witte, o alemão, pela amizade incondicional.Aos amigos do IME, Elói, Renato do Carmo, Jair, Rozante e Fábio Martinez.Aos amigos da FIEO, Andrea Machion, Janice, Olímpio, Guardado e Fabiana. Ao Márcio

    Mathias e ao Sandro Verri, pela amizade e pela diversão que nossas conversas me proporcionam.À minha família em Pontevedra, e sobretudo à minha avó, por participarem de minha vida

    mesmo tão distantes.Ao meu filho, simplesmente por ser meu filho.Finalmente, ao meu irmão, minha maior influência e fonte de inspiração.

    i

  • ii

  • Resumo

    REY, M. L. Um arcabouço generalizado para empacotamento de ramificações e outras es-truturas combinatórias 2012. 91 f. Tese (Doutorado) - Instituto de Matemática e Estatística,Universidade de São Paulo, São Paulo, 2012.

    Nesta tese, estudamos um arcabouço, introduzido por Frank, que denominamos de sistemasgeneralizados de núcleos. Provamos teoremas sobre empacotamentos de certos objetos combina-tórios neste arcabouço, tanto para o caso inteiro quanto para o fracionário. Estes teoremas, em par-ticular, implicam em uma melhora nos limitantes superiores de Schrijver, para o empacotamentode ramificações, e de Gabow e Manu, para o empacotamento de arborescências. Além disso, tam-bém provamos que o problema de minimização num poliedro relacionado pode ser resolvido emtempo polinomial, dado um oráculo de separação.

    Palavras-chave: arborescências, ramificações, laminaridade, submodularidade, supermodulari-dade.

    iii

  • iv

  • Abstract

    Rey, M. L. A general framework for packing branchings and other combinatorial structures.2012. 91 f. Tese (Doutorado) - Instituto de Matemática e Estatística, Universidade de São Paulo,São Paulo, 2012.

    We study a framework, which we call a generalized kernel system, introduced by Frank. Weprove some integral and fractional packing theorems on this framework which, in particular, im-ply an improvement on the best upper bounds currently known, one due to Schrijver, for packingbranchings from a given root-sets, and another, due to Gabow and Manu, for packing spanningarborescences from a given root. We also establish the polynomial time complexity, modulo aseparation oracle, of a related minimization problem involving a polyhedron derived from this fra-mework.

    Keywords: arborescences, branchings, laminarity, submodularity, supermodularity.

    v

  • vi

  • Sumário

    Lista de Abreviaturas ix

    Lista de Símbolos xi

    1 Introdução 11.1 O problema do empacotamento . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11.2 Sistemas de biconjuntos intersectantes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31.3 Sistemas capacitados e irrestritos de núcleos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 61.4 Definições básicas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 91.5 Organização . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 10

    2 O arcabouço dos sistema generalizados de núcleos 132.1 Posets intersectantes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 132.2 Sistemas generalizados de núcleos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 152.3 Uma generalização das ideias de Lovász e Frank . . . . . . . . . . . . . . . . . . 182.4 Algumas consequências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22

    3 Sistemas generalizados de núcleos com a propriedade do cruzamento 313.1 Sistemas generalizados de núcleos com a propriedade do cruzamento . . . . . . . . 313.2 Um procedimento de descruzamento . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 323.3 Um algoritmo alternativo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33

    4 Sistemas generalizados de núcleos com uma família mista 374.1 Famílias mistas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 374.2 Alguns teoremas sobre empacotamentos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43

    5 Empacotamentos em sgnfm 475.1 Dois teoremas sobre empacotamentos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 475.2 Mais dois teoremas sobre empacotamentos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 58

    6 Alguns poliedros 656.1 Uma caracterização do politopo das coberturas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 656.2 A integralidade de um certo poliedro supermodular . . . . . . . . . . . . . . . . . 67

    vii

  • viii SUMÁRIO

    7 Considerações finais 73

    Referências Bibliográficas 75

    Índice Remissivo 76

  • Lista de Abreviaturas

    iposet Poset intersectantepim Propriedade da intersecção mistasgn Sistema generalizado de núcleossgnmf Sistema generalizado de núcleos com uma família mistasgn-c Sistema generalizado de núcleos com a propriedade do cruzamentosgn-c-fm Sistema generalizado de núcleos com a propriedado cruzamento e uma família mistaspi Sequência propriamente intersectante

    ix

  • x LISTA DE ABREVIATURAS

  • Lista de Símbolos

    ρu Conjunto dos arcos do núcleo uc(u) Capacidade de um núcleo uλK Capacidade de um sgn KΛK Conjunto dos núcleos de um sgn cuja capacidade é λKµS Demanda da parte ./-fechada Sp(u) Demanda do núcleo uΓF Conjunto dos núcleos u de F para os quais c(ρu) = p(u)> 0Γ0F Conjunto dos núcleos u de F para os quais c(ρu) = p(u)UF Conjunto dos núcleos u de F tais que p(u)> 0f+,supp f Suporte de uma função fχX Função característica de um conjunto XfreeSB Conjunto dos núcleos u de S tais que ρu = /0covSB Conjunto dos núcleos de S cobertos por B

    xi

  • xii LISTA DE SÍMBOLOS

  • Capítulo 1

    Introdução

    Neste capítulo, vamos definir os problemas que estudaremos nesta tese. Mostraremos tambémos resultados conhecidos e destacaremos algumas de nossas contribuições. Além disso, o capítulotambém tem por objetivo fixar a notação e definir alguns termos básicos que serão usados duranteeste trabalho. Salientamos, desde já, que para não interromper o fluxo da leitura, a definição dealguns termos é delegada para o final do capítulo.

    1.1 O problema do empacotamento

    Seja P um conjunto finito, cujos elementos denominamos de núcleos, e E um conjunto finito,cujos elementos denominamos de arcos e para os quais P∩E = /0. Ademais, seja ρ uma funçãoque leva cada elemento de P em um subconjunto de E. Vamos denominar a tripla K = (P,E,ρ)de sistema irrestrito de núcleos. Seja B uma parte de E. O conjunto dos núcleos cobertos por B,denotado covB, é o conjunto {u∈P | ρ(u)∩B 6= /0}. Dizemos B é uma cobertura de P se covB=P.Considere uma família disjunta B de coberturas de P. É claro que |B| 6 |ρ(u)| para todo u ∈ P,donde

    |B|6min{|ρ(u)| | u ∈ P}.

    É conveniente, então, definir λK :=min{|ρ(u)| | u∈ P}. Ademais, escrevemos ϕK para denotar acardinalidade de uma família disjunta máxima de coberturas de P. Não é difícil exibir um sistemairrestrito de núcleos para o qual ϕK< λK: tome, por exemplo,

    .({u1,u2,u3},{a,b,c},{(u1,{a,b}),(u2,{a,c}),(u3,{b,c})}

    ).

    Assim, é natural considerar o seguinte problema: encontrar sistemas irrestritos de núcleos K paraos quais ϕK = λK. Neste caso, ou seja, quando a desigualdade minimax vale com igualdade,dizemos que K empacota.

    Parte de nosso interesse, neste trabalho, está em produzir algoritmos eficientes para, por exem-plo, decidir se um determinado sistema irrestrito de núcleos empacota. Estes algoritmos tipica-mente necessitarão de certos oráculos para calcular um determinado tipo de objeto, que deixaremosexplícito no momento apropriado. No entanto, é natural agora, sobretudo em virtude dos exemplos

    1

  • 2 INTRODUÇÃO 1.1

    que seguem, estabelecer em que condições, módulo os tais oráculos, um algoritmo tem consumode tempo polinomial neste arcabouço. Dizemos que um algoritmo tem complexidade polinomialse seu consumo de tempo é um polinômio no número de arcos, módulo o número de chamadasaos oráculos destacados na descrição do algoritmo. Assim, é claro que qualquer algoritmo quedependa do tamanho do conjunto de núcleos não é polinomial.

    Vamos, agora, exibir alguns exemplos de sistemas irrestritos que empacotam. Começaremospelo clássico Teorema de Menger [Fra11]. Para isso, serão necessários alguns conceitos elementa-res de Teoria dos Grafos.

    Um digrafo é uma tupla (V,A, ι) em que V e A são conjuntos finitos e disjuntos, e ι : A→V×V .Cada elemento de V é denominado de vértice, e cada elemento de A, de arco. É conveniente definirfunções −ι , ι+ : A→V de tal forma que ι(a) = (−ι(a), ι+(a)) para cada arco a ∈ A. Para um arcoa em A, dizemos que −a := −ι(a) é a cauda de a, e a+ := ι+(a) é a cabeça de a. As pontas de umarco a em A são os componentes do par ι(a). Por brevidade, escrevemos (V,A) em vez de (V,A, ι)ficando então implícitas as funções que produzem a cauda e a cabeça de cada arco.

    Seja D = (V,A) um digrafo. Para uma parte X de V , o conjuntos dos arcos que entram em X , éo conjunto

    . {a ∈ A | a+ ∈ X ,−a /∈ X},

    denotado por ~δ (X). Para um subconjunto B de A, escrevemos ~δB(X) para denotar ~δ (X)∩B. Alémdisso, pomos ~d(X) := |~δ (X)| e, analogamente, ~dB(X) := |~δB(X)|. Para um vértice r de D, deno-tamos por VD(r̄), ou simplesmente V(r̄), o conjunto dos subconjuntos não-vazios de V que nãocontêm r. Analogamente, para vértices s e t de D, escrevemos V(s̄, t), para denotar o conjunto dossubconjuntos de V que contêm t e não contêm s.

    Podemos, agora, retomar a discussão sobre o Teorema de Menger. Seja D = (V,A) um digrafo,e s, t vértices distintos de D. Um st-caminho é uma cobertura minimal de V(s̄, t). O Teoremade Menger afirma que o sistema irrestrito de núcleos (V(s̄, t),A,~δ ) empacota. É evidente que oTeorema de Menger admite a seguinte reformulação:

    Teorema 1.1 (Menger) Seja D um digrafo, s 6= t vértices de D e k ∈N. Então existe uma famíliadisjunta P de st-caminhos tal que |P|> k se e só se ~d(X)> k para cada X ∈ V(s̄, t).

    O próximo exemplo é um teorema clássico de Edmonds [Edm73] envolvendo arborescênciasem digrafos. Seja, então, D um digrafo e r um de seus vértices. Uma r-arborescência é umacobertura minimal de V(r̄). A versão fraca do Teorema das Arborescências de Edmonds afirmaque o sistema irrestrito de núcleos (V(r̄),A,~δ ) empacota. A versão fraca do Teorema de Edmonds,similarmente ao Teorema de Menger, admite a seguinte reformulação:

    Teorema 1.2 (Edmonds [Edm73]) Seja D um digrafo, r um de seus vértices e k ∈N. Então existeuma família disjunta P de r-arborescências tal que |P|> k se e só se ~d(X)> k para cada X ∈V(r̄).

    Vamos, agora, exibir um arcabouço, introduzido por Frank [Fra79], que captura, dentre outrosobjetos combinatórios, tanto o empacotamento de st-caminhos como o de r-arborescências. SejaF uma família de partes de V . Dizemos que F é intersectante se para todo X ,Y ∈ F:

  • 1.2 SISTEMAS DE BICONJUNTOS INTERSECTANTES 3

    . X ∩Y 6= /0 implica que X ∪Y ∈ F e X ∩Y ∈ F.

    O par (D,F) é um sistema de núcleos se F é intersectante. O Teorema 1.3, a seguir, devido aFrank [Fra79], afirma que o sistema irrestrito de núcleos (F,A,~δ ) empacota. É essencial destacarque a prova de tal fato é uma generalização de uma prova de Lovász [Lov76] para a versão fraca doTeorema de Edmonds. Vale ressaltar também que o argumento usado na prova depende fortementedo fato de que a função ~d é submodular, isto é, para todo X ,Y ⊆V :

    ~d(X)+ ~d(Y )> ~d(X ∪Y )+ ~d(X ∩Y ).

    Teorema 1.3 (Frank [Fra79]) Seja (D,F) um sistema de núcleos e k ∈ N. Então D possui umafamília disjunta B de coberturas de F tal que |B|> k se e só se ~d(X)> k para cada X ∈ F.

    Há diversas formas de atacar o problema mencionado no início desta seção. Uma motivação éprocurar por arcabouços mais gerais (que os sistemas de núcleos) onde a essência da ideia envol-vida na prova de Lovász, da versão fraca do Teorema de Edmonds, pode ainda ser aplicada comsucesso. Uma parte importante desta tarefa foi desenvolvida inicialmente por Frank [Fra79], paraos sistemas de núcleos, e depois estendida por Szegő [Sze01], como veremos adiante. Há aindauma extensão de Bérczi e Frank [BF08] que inclui estes dois últimos arcabouços. Neste trabalho,vamos mostrar que as ideias de Lovász podem ser aplicadas num contexto ainda mais geral. Aseguir, para ilustrar, vamos apresentar um teorema — e sua respectiva prova — envolvendo umarcabouço que inclui como casos particulares os Teoremas 1.1, 1.2 e 1.3 e que servirá como umprenúncio da prova de um teorema mais geral que apresentaremos no Capítulo 2.

    1.2 Sistemas de biconjuntos intersectantes

    Vamos, agora, exibir uma prova de uma versão mais fraca de um Teorema de Frank [Fra09],que, em particular, contém como casos especiais os Teoremas 1.1, 1.2 e 1.3. A prova, cuja orga-nização é original, é uma extensão de uma prova de Frank [Fra79] do Teorema 1.3. Enfatizamos,todavia, que a prova serve como um prenúncio do que faremos adiante. Além disso, é importantedestacar que os sistemas de biconjuntos intersectantes, definidos no que segue, constituem umaabstração conveniente para lidar com problemas envolvendo vértice-conectividade em digrafos;veja, por exemplo, [Fra99, Fra09]. Antes de apresentarmos este resultado, necessitamos de algu-mas definições preliminares.

    Seja D = (V,A) um digrafo. Um biconjunto é um par X = (XI,XO) tal que

    . /0 6= XI ⊆ XO ⊆V .

    Para biconjuntos X e Y , escrevemos X v Y se XI ⊆ YI e XO ⊆ YO. Para uma família R de bicon-juntos, dizemos que X ∈ R é minimal (maximal) em R se Y ∈ R e Y v X (X v Y ) implicam queX = Y . Além disso, definimos

    . X tY := (XI ∪YI,XO∪YO) e X uY := (XI ∩YI,XO∩YO).

  • 4 INTRODUÇÃO 1.2

    É evidente que X uY é um biconjunto se, e só se, XI ∩YI 6= /0. Um arco a de D entra em X (oucobre X) se a ∈ ~δXI ∩~δXO. Uma parte B de A entra em X (ou cobre X) se existe a ∈ B tal quea entra em X . Vamos sobrecarregar a notação e escrever ~δX para denotar o conjunto dos arcosque entram em X . Além disso, estendendo-se naturalmente a notação previamente definida pomos~d(X) := |~δ (X)|. É fácil estabelecer que para todo par X ,Y de biconjuntos:

    ~dX + ~dY > ~d(X tY )+ ~d(X uY ).

    Vamos destacar algumas propriedades que, embora elementares, serão usadas frequentementena argumentação do teorema principal desta seção.

    (1.1) (i) Para cada tripla X ,Y,Z de biconjuntos e cada a ∈ A:se X v Y v Z e a entra em X e em Z, então a entra em Y .

    (ii) Para cada dupla X ,Y de biconjuntos e cada a ∈ A:se a entra em X tY , então a entra em X ou Y , e

    (iii) Para cada dupla X ,Y de biconjuntos e cada a ∈ A:se XI ∩YI 6= /0 e a entra em X uY , então a entra em X ou Y , e

    Sistemas de biconjuntos intersectantes Uma coleção F de biconjuntos é intersectante se paratodo X ,Y ∈ F:

    . XI ∩YI 6= /0 implica X tY,X uY ∈ F.

    Um sistema de biconjuntos intersectantes, ou simplesmente um sbi, é um par K= (D,F) em queD = (V,A) é um digrafo e F é uma coleção intersectante de biconjuntos. O grau de K, denotadoλK, é o número

    . min{~dX | X ∈ F}.

    Dizemos que K é não-trivial se λK > 0. Seja B uma parte de A. A família dos biconjuntos de Fcoberta por B é denotada por covB. Dizemos que B cobre F se covB = F, ou seja, B entra em Xpara cada X ∈ F. Também dizemos que X ∈ F de V é evitado por B se B∩~δX = /0. DefinimosKB := (D−B,F).

    Arbóreo Este é um conceito fundamental que aparecerá em outras ocasiões. Um subconjunto Bde A é arbóreo se para cada X ,Y ∈ F:

    . se X v Y e B entra em X , então B entra em Y .

    Lema 1.4 SejaK um sbi e B uma parte arbórea de A. Se U é um biconjunto maximal em F evitadopor B, e a ∈ ~δU, então B∪{a} é arbóreo.

    Prova. Suponha, por contradição, que exista um biconjunto U maximal que é evitado por B, e umarco a ∈ ~δU tal que B∪{a} não é arbóreo. Então existem X ,Y ∈ F tais que

    X v Y , B∪{a} entra em X , e B∪{a} evita Y .

  • 1.2 SISTEMAS DE BICONJUNTOS INTERSECTANTES 5

    Como B é arbóreo, então B evita X e Y . Assim, a entra em X e evita Y . Como a entra em X eX vY , então a+ ∈YI . Mas a evita Y , donde −a∈YO. Agora, a entra em U ,logo a+ ∈UI e −a /∈UO.Portanto, U tY A U . No entanto, a maximalidade de U implica que B entra em U tY , donde,devido a (1.1.ii), B entra em U ou Y , o que é uma contradição.

    Lema 1.5 Seja K= (D,F) um sbi não-trivial e B uma parte de A.Se B é arbóreo e λ (KB)≥ λK−1 e B não cobre F, então existe a ∈ ArB tal que

    (i) λ (KB∪{a})> λK−1,(ii) B∪{a} é arbóreo, e

    (iii) cov (B∪{a})⊃ covB.

    Prova. Suponha que B é arbóreo e não cobre F. Seja U um biconjunto maximal em F que B evita.É claro que ~δU =~δD−BU . Seja R := {X ∈ F | ~dD−B(X) = λK−1}. O objetivo agora consiste emmostrar que existe um arco que entra em U mas não entra em nenhum elemento de R.

    Fato 1.5.1 A família R é intersectante.

    • Sejam X ,Y ∈ R. Então

    λ −1+λ −1 = ~dD−B(X)+ ~dD−B(Y )> ~dD−B(X tY )+ ~dD−B(X uY )> λ −1+λ −1,

    e, por conseguinte, ~dD−B(X tY ) = ~dD−B(X uY ) = λ −1, donde X tY,X uY ∈ R. •

    Seja I := {X ∈ R | UI ∩XI 6= /0}. Suponha, primeiro, que I = /0. Como K é não-trivial e Bevita U , então existe a ∈ ~δU ; ademais, a evita cada biconjunto em R, o que estabelece (i). Mas,o Lema 1.5 implica que B∪ {a} é arbóreo, o que prova (ii). Além disso, B∪ {a} cobre U e,consequentemente, cov (B∪{a})⊃ covB, o que garante (iii).

    Suponha, agora, que I 6= /0. Seja R um biconjunto minimal em I.

    Fato 1.5.2 Existe a ∈ ~δU r~δR tal que a ∈ ~δ (U uR).

    • Como B é arbóreo e B entra em R, então R 6vU . Ademais, B arbóreo implica que B evita U uRe, consequentemente, ~dD−B(U uR) = ~d(U uR)> λ o qual, aliado à ~dD−B(R) = λ −1, implica naexistência de a ∈ ~δU r~δR tal que a ∈ ~δ (U uR). •

    Seja, então, a o arco cuja existência é garantida pelo Fato 1.5.2.

    Fato 1.5.3 Para todo S ∈ R: a evita S.

    • Suponha, por contradição, que a entra em S para algum S ∈ R. Ora, a entra em U uR, dondea+ ∈ RI∩SI . Mas, a evita R e, daí, −a∈ RO. Ademais, −a /∈ SO. Logo, RuS@ R. De R,S ∈R, peloFato 1.5.1, vem que RuS∈R. Agora, a entra em RuS. De fato, de −a /∈ SO, vem que −a /∈ RO∩SOo que, combinado com a+ ∈ RI ∩SI , implica que a entra em RuS. Finalmente, de a entra em U eem RuS vem que UI ∩ (RuS)I 6= /0, donde RuS ∈ I, o que contraria a minimalidade de R. •

  • 6 INTRODUÇÃO 1.3

    O Fato 1.5.3 implica que λ (KB∪{a}) > λK− 1, o que garante (i). O Lema 1.5 implica queB∪{a} é arbóreo — provando, assim, (ii) — e, finalmente, a escolha de a estabelece (iii), poiscov (B∪{a})⊃ covB. Isto completa a prova do lema.

    O próximo teorema pode ser obtido usando-se o lema anterior aliado a um argumento indutivocorriqueiro e, por isso, sua prova é omitida.

    Teorema 1.6 (Frank [Fra09]) Seja K= (D,F) um sbi, e k ∈N.Então existe uma família disjunta B de coberturas de F tal que |B|> k se e só se λK> k.

    1.3 Sistemas capacitados e irrestritos de núcleos

    Um sistema capacitado e irrestrito de núcleos é uma tupla K= (P,E,ρ,c), em que (P,E,ρ) éum sistema irrestrito de núcleos e c : E → R+. Quando a imagem de c está em N dizemos que osistema é inteiro. Estendemos, de forma natural, a noção de grau através da definição:

    . λK :=min{

    c(u) | u ∈ P}

    ,

    onde, por simplicidade, escrevemos c(u) := c(ρ(u)) := ∑[c(a) | a ∈ ρ(u)] para cada u ∈ P.Seja, agora, B a família das coberturas de P. Dizemos que y : B→ R+ é viável se

    . ∑[y(B)χB | B ∈B

    ]6 c.

    Além disso, seja ϕK := max{∑[y(B) | B ∈ B

    ]| y é viável} e considere o problema de decidir

    se K empacota, ou seja, se ϕK = λK. Se um tal y, que atinge o máximo existe, então dizemosque y é um empacotamento de K. Note que se K é inteiro e (P,E,ρ) empacota, então K tambémempacota. É claro que isto pode ser provado através da adição de c(a) cópias de cada arco a ∈ E.No entanto, o empacotamento produzido, digamos y, é tal que seu suporte, y+, tem tamanho λK,o que evidentemente não é, em geral, um polinômio em |E|. Assim, uma pergunta natural consisteem decidir se existem empacotamentos cujo suporte é um polinômio no número de arcos.

    Considere uma generalização natural da versão fraca do Teorema de Edmonds que envolve adi-cionar capacidades, isto é, números não-negativos aos arcos do digrafo. Seja, então, D = (V,A) umdigrafo e c : A→R+ uma função capacidade. Seja também r um vértice de D. Edmonds [Edm73]estabeleceu que o sistema capacitado e irrestrito de núcleos D := (V(r̄),A,~δ ,c) empacota. Gabowe Manu [GM98] provaram o seguinte teorema que garante a existência de um empacotamento compoucas coberturas.

    Teorema 1.7 (Gabow e Manu [GM98]) Seja D = (V,A) um digrafo, c : A → R+ uma funçãocapacidade, e r um vértice de D. Então (V(r̄),A,~δ ,c) possui um empacotamento y tal que

    (i) |y+|6 |A|.(ii) se c é inteiro, então y é inteiro e |y+|6 |A|+ |V |−2

    Vamos mostrar, no Capítulo 5, que é possível obter um empacotamento cujo suporte é não maisque |A|− |V |+2 e, no caso inteiro, não mais que |A|.

  • 1.3 SISTEMAS CAPACITADOS E IRRESTRITOS DE NÚCLEOS 7

    É conveniente, agora, discutir brevemente e de forma superficial, um algoritmo de Gabowe Manu [GM98] para o empacotamento fracionário de arborescências geradoras, uma vez quetal algoritmo será generalizado neste trabalho. Ressaltamos que este algoritmo foi estendido porBarahona [Bar04] para o problema do empacotamento fracionário de T -junções e, por Matsu-oka [Mat12], para o problema do empacotamento fracionário em clutters ideais.

    O algoritmo de Gabow e Manu [GM98], para o empacotamento fracionário de arborescên-cias, produz um empacotamento cujo suporte é não superior ao número de arcos do digrafo. Parauma parte B de A e um real positivo ε , seja cεB := c[B 3 a 7→ c(a)− ε]. O sistema capacitado eirrestrito de núcleos, obtido de D, pela remoção de ε cópias de B, isto é, (V(r̄),A,~δ ,cεB) é deno-tado por DεB. A ideia central do algoritmo consiste em selecionar uma r-arborescência B ⊆ c+ eremover um número máximo, digamos ε , de cópias de B de tal forma que λ (DεB)> λD−ε . Sur-preendentemente esta estratégia produz em empacotamento cujo suporte é não superior ao númerode arcos de D. A análise que garante este limitante depende de um certo subconjunto laminar de{X ∈ V(r̄) | c(~δX) = λ}. A cada iteração ou um arco é “zerado”, ou esta família laminar aumentade tamanho.

    Gabow e Manu [GM98] também desenvolveram um algoritmo para a versão inteira do pro-blema, produzindo, assim, um empacotamento inteiro. A ideia é similar a do algoritmo para em-pacotamento fracionário e consiste em selecionar uma r-arborescência B e remover um númerointeiro máximo, digamos k, de cópias de B. Se este número k é igual a ε , definido no parágrafoanterior, então empacotam-se estas k cópias e inicia-se uma nova iteração. Se k < ε então o algo-ritmo seleciona uma parte maximal J de B tal que λ ((DB)J) = λ ((DB)J)−1 e estende J para umar-arborescência J′ de D. Tal estratégia produz um empacotamento cujo suporte tem tamanho nãosuperior a |A|+ |V |−2.

    Empacotamentos simultâneos

    Vamos, agora, generalizar os modelos vistos anteriormente e considerar o problema do em-pacotamento simultâneo. Informalmente, são dados subconjuntos de núcleos e suas respectivasdemandas. O objetivo é o de encontrar, para cada um de tais subconjuntos, uma família de co-berturas e suas respectivas multiplicidades, de tal forma que a demanda de cada conjunto sejasatisfeita exatamente e, ademais, nenhum arco seja usado mais vezes que sua capacidade. No quesegue, vamos formalizar tais ideias. Suponha que K = (P,E,ρ,c) é um sistema capacitado e ir-restrito de núcleos. Seja µ : 2P→ R+ uma função demanda e para cada S ∈ 2P, seja BS a famíliadas coberturas de S. Para cada S ∈ 2P, seja yS : BS → R+. Finalmente, seja y a função que levacada S ∈ 2P em yS. Dizemos que y é um empacotamento de (K,µ) se

    (i) para cada S ∈ 2P : ∑[yS(B) | B ∈BS] = µS, e(ii) ∑[yS(B)χB | S ∈ 2P;B ∈BS]6 c.

    Vamos tecer alguns comentários antes de continuar. É claro que nossa definição de função de-manda, que envolve todos os subconjuntos de P, é mais uma conveniência que uma necessidade,

  • 8 INTRODUÇÃO 1.4

    afinal, como na descrição informal, basta fornecer o suporte de µ . Ademais, agora, um algoritmotem complexidade polinomial se seu consumo de tempo é polinomial no número de arcos e notamanho do suporte da função demanda (módulo oráculos). Este modelo captura, por exemplo,a versão forte, enunciada abaixo, do Teorema das Arborescências (ou das Ramificações) de Ed-monds [Edm73]. Seja D = (V,A) um digrafo. Para uma parte R de V , seja V(R̄) := {X ⊆ V |X ∩R = /0;X 6= /0}. Uma R-ramificação é uma cobertura minimal de V(R̄).

    Teorema 1.8 (Edmonds [Edm73]) Seja D um digrafo e R1, . . . ,Rk subconjuntos não-vazios de V .Então D possui subconjuntos B1, . . . ,Bk de E, dois a dois disjuntos, tais que Bi é uma Ri-ramifica-

    ção para cada i ∈ [k] se e só se ~d(X)> |{i ∈ [k] | Ri∩X = /0}| para cada /0 6= X ⊆V .

    É evidente que o Teorema 1.8 implica o Teorema 1.2. No entanto, não se conhece uma reduçãodo Teorema 1.2 para o Teorema 1.8. A seguinte generalização, que passamos a descrever, foiestabelecida por Schrijver [Sch03].

    Teorema 1.9 (Schrijver [Sch03]) Seja D = (V,A) um digrafo, c : A→N uma função capacidadee µ : 2V →N uma função demanda e D := (2V ,A,~δ ,c). Para cada U ⊆V , seja

    . p(U) := ∑[µ(R) | R ∈ 2V ,R∩U = /0].

    Se c(~δ (U))≥ p(U) para cada U ⊆V , então (D,µ) possui um empacotamento inteiro y tal que

    ∑[|y+S | | S ∈ 2V ]≤ |A|+ |µ+|+ |V |3.Vamos, no Capítulo 5, provar um resultado geral a respeito de empacotamentos em um arcabouçoque denominamos de sistemas generalizados de núcleos que, em particular, implica na existênciade um empacotamento cujo suporte é não superior a |A|+ |µ+|+ |V |−2.

    O arcabouço dos sistema de núcleos não contém (ao menos) diretamente a versão forte doTeorema das Arborescências de Edmonds. Para finalizar esta seção, vamos apresentar um arca-bouço, devido a Szegő [Sze01], que contorna esta possível limitação. Frisamos, no entanto, que ossistemas generalizados de núcleos, que passaremos a estudar no próximo capítulo, são uma gene-ralização deste e, também, de um outro arcabouço mais geral proposto por Frank e Bércsi [BF08].

    Seja D um digrafo e F1, . . . ,Fk famílias intersectantes, não necessariamente distintas, de sub-conjuntos de V . Dizemos que F1, . . . ,Fk satisfaz a propriedade da intersecção mista se para todoi, j ∈ [k] e todo X ∈ Fi e Y ∈ F j:

    . X ∩Y 6= /0 implica X ∩Y ∈ Fi∩F j.

    Para cada subconjunto X de V , seja p(X) := |{i ∈ [k] | X ∈ Fi}|. É claro que se para cada i ∈ [k]existe uma cobertura Bi de Fi e, ademais, Bi ∩B j = /0 para todo i 6= j ∈ [k], então ~d(X) > p(X)para toda parte X de V . Szegő [Sze01] estabeleceu que esta última condição além de necessária étambém suficiente.

    Teorema 1.10 (Szegő [Sze01]) Seja D um digrafo, k ∈N e F1, . . . ,Fk famílias intersectantes, nãonecessariamente distintas, de subconjuntos de V . Existe para cada i ∈ [k] uma cobertura Bi de Fital que Bi∩B j = /0 para todo i 6= j ∈ [k] se e só se ~d(X)> p(X) para toda parte X de V .

  • 1.4 DEFINIÇÕES BÁSICAS 9

    1.4 Definições básicas

    Para não tornar o texto repetitivo, vamos desde já estabelecer uma convenção a respeito danotação que vamos usar. Vamos lidar com diversos objetos, tais como digrafos. Para não sobrecar-regar a notação vamos tipicamente omitir, quando o contexto permitir, o objeto sobre o qual umacerta função está definida. Assim, por exemplo, o conjunto dos arcos que entram em um certo sub-conjunto X dos vértices de um digrafo D é denotado por~δ (X) em vez de~δD(X) ou, ainda,~δ (X ;D).Enfatizamos que tal convenção só será usada quando não houver possibilidade de confusão.

    Conjuntos

    Sejam X e Y conjuntos. Então X é uma parte, ou um subconjunto de Y se x ∈ X implica x ∈Y ;o conjunto X é uma parte própria de Y , denotado X ⊂ Y se X é uma parte de Y e Y não é umaparte de X . A diferença dos conjuntos X e Y , denotada por X rY , é o conjunto {x ∈ X | x /∈ Y}.Se X é parte de Y então X̄ , o complemento de X em Y , denota o conjunto Y rX ; é evidente quetal notação só será usada quando o conjunto em relação ao qual tomamos o complemento estiveróbvio do contexto.

    Vamos também, às vezes, confundir conjuntos unitários com os seus elementos. Por exemplo,vamos definir alguns conceitos envolvendo conjuntos e para simplificar, quando o conjunto forunitário, isto é, da forma {s}, vamos escrever s em vez de {s}.

    Uma família é um conjunto cujos elementos também são conjuntos. Assim, uma família éapenas um outro nome para um conjunto. Dizemos que uma família F é disjunta se

    . para todo X ,Y ∈ F: X 6= Y implica X ∩Y = /0.

    O conjunto dos naturais {0,1,2, . . .} é denotado por N; o conjunto dos reais é denotado por Renquanto que o conjunto dos reais não-negativos, isto é, {r ∈ R | r > 0} é denotado por R+. Paracada k ∈N, adotamos a abreviatura [k] := {1,2, . . . ,k}. Desta forma, [0] = /0.

    Funções

    Sejam X e Y conjuntos. Um subconjunto f de X×Y é uma função de X em Y , o que é denotadopor f : X → Y , se

    . para cada x ∈ X existe y ∈ Y tal que (x,y) ∈ f , e

    . para cada x ∈ X se (x,y) ∈ f e (x,y′) ∈ f então y = y′.

    Como de hábito, para cada x∈ X , o único y tal que (x,y)∈ f é denotado por f (x), ou simplesmentef x, quando não houver possibilidade de confusão.

    Seja U um conjunto, f : X→Y e h :U→Y . Escrevemos f [U 3 u 7→ h(u)] para denotar a funçãoque coincide com f nos elementos de X rU e coincide com h nos elementos de U . Formalmente,

    . f [U 3 u 7→ h(u)] :=(

    f r{(u, f (u)) | u ∈U ∩X})∪{(u,h(u)) | u ∈U}.

    Observe que f [U 3 u 7→ h(u)] : (X ∪U)×Y . Seja V um conjunto e h : V → Y . Então

  • 10 INTRODUÇÃO 1.5

    . f [U 3 u 7→ h(u),V 3 v 7→ g(v)]

    denota a função(

    f [U 3 u 7→ h(u)])[V 3 v 7→ g(v)]. Como de costume, quando U ′ = {x} paraalgum x ∈ X , por brevidade, escrevemos f [x 7→ h(x)]. Para cada y em Y , escrevemos ~yX , ou sim-plesmente~y, para denotar a função /0[X 3 x 7→ y].

    Para uma função f de X em R, o suporte de f , denotado f+, ou ainda supp f , é o conjunto{x ∈ X | f (x)> 0}.

    Finalmente, para um subconjunto X de um conjunto U , denotamos por χX , a função caracte-rística de X , onde para cada u ∈U :

    . χX(u) := se u ∈ X então 1, senão 0.

    Sequências

    Por vezes, vamos ter que lidar com sequências definidas sobre um conjunto. Nossas sequênciasserão finitas e por isso omitiremos tal adjetivo. Seja, então, X um conjunto e f uma sequênciasobre X , isto é, f : [k]→ X para algum k ∈N. Evidentemente, vamos adotar a convenção habituale escrever (f1, . . . , fk) para denotar a sequência f. No entanto, é conveniente também empregar anotação que segue. A sequência vazia, de forma não convencional, será denotada por /0, uma vezque os candidatos naturais, ε e λ , serão usados com outras finalidades. Se f é uma sequência finitasobre X e x é um elemento de X então f · x é a sequência obtida de f ao adicionarmos x como umúltimo elemento. Formalmente, f · x := f[(k+1) 7→ x]. Definimos também

    . para toda sequência f sobre X : f · /0 := f, e

    . para todo par f,g de sequências sobre X e todo x ∈ X : f · (g · x) := (f ·g) · x.

    É claro que (f · g) ·h = f · (g ·h) para quaisquer sequências f,g e h sobre X . Para simplificar, àsvezes, vamos omitir o operador · e escrever fg em vez de f · g. Sejam f e g sequências sobre X .Dizemos que g é prefixo de f se existe uma sequência h tal que f = gh. É conveniente confundir fcom o conjunto {f(i) | i ∈ [k]}. Assim, vamos, por exemplo, escrever f⊆Y , onde Y é uma parte deX , se a imagem de f é um subconjunto de Y . Ademais, a ∈ f é, então, uma abreviatura para existei ∈ [k] tal que a = f(i).

    1.5 Organização

    No Capítulo 2, vamos apresentar os sistemas generalizados de núcleos, que constituem o objetocombinatório sobre o qual dedicaremos grande parte deste trabalho. Neste capítulo estenderemosalgumas ideias de Lovász e Frank, cujas origens remontam à prova da versão fraca do Teoremade Edmonds, e provaremos alguns teoremas envolvendo tal arcabouço. No Capítulo 3, vamos exi-bir um arcabouço, que é uma restrição de um sistema generalizado de núcleos que permite umacerta operação de descruzamento. Com isso, poderemos lidar com a noção de conjuntos laminarese definir operações que permitem obter extensões de conjuntos laminares, usando esta operaçãode descruzamento. Esta operação permitirá deduzir um algoritmo alternativo para o problema do

  • 1.5 ORGANIZAÇÃO 11

    empacotamento neste arcabouço. No Capítulo 4, vamos introduzir os sistemas generalizados denúcleos com uma família mista (sgnfm), que generalizam os sistemas de biconjuntos com a pro-priedade da intersecção mista. Este últimos, por sua vez, generalizam o problema do empacota-mento de ramificações em digrafos. Provaremos diversas propriedades fundamentais dos sgnfmse, em particular, mostraremos um primeiro teorema envolvendo empacotamentos em tais arca-bouços. No Capítulo 5, vamos apresentar diversos teoremas sobre empacotamentos em sgnfms e,em sua versão mais restrita, aquela que possui a propriedade do cruzamento. Estes teoremas for-necerão melhores limitantes para o tamanho de um empacotamento, quando especializados parao problema do empacotamento de ramificações e de arborescências em digrafos. Finalmente, noCapítulo 6 vamos provar uma caracterização para o politopo das coberturas de um sistema gene-ralizado de núcleos e, além disso, vamos mostrar que é possível resolver, em tempo polinomial,módulo um oráculo de separação, o problema de minimizar uma função linear no poliedro de umsistema generalizado de núcleos com a propriedade do cruzamento delimitado por uma funçãosupermodular e positiva em seus membros intersectantes. O material contido nestes capítulos, amenos que dito o contrário, é original.

  • 12 INTRODUÇÃO 1.5

  • Capítulo 2

    O arcabouço dos sistema generalizados denúcleos

    Neste capítulo, vamos apresentar um arcabouço, devido a Frank [Fra99], que generaliza os di-versos arcabouços apresentados na introdução. O principal resultado deste capítulo está contido naProposição 2.6. Esta proposição generaliza algumas ideias de Lovász [Lov76], estendidas posteri-ormente, na ordem, por Frank [Fra79], Szegő [Sze01], e, finalmente, por Bérczi e Frank [BF08],a qual permitirá mostrar que tal arcabouço empacota. Além disso, tal proposição contém os in-gredientes necessários para estabelecer, como veremos no Capítulo 4, que é possível empacotarsimultaneamente, diante de certas condições, uma família de conjuntos, num sentido ainda maisgeral, que remete à versão forte do Teorema de Edmonds.

    2.1 Posets intersectantes

    Um poset é um par (P,4) em que P é um conjunto finito e 4 é uma relação binária sobre P talque para todo u,v,w ∈ P :

    . u4 u,

    . u4 w e w4 u implicam u = w, e

    . u4 v e v4 w implicam u4 w.

    Tipicamente vamos denominar cada elemento de P de núcleo. Para u,v ∈ P, escrevemos u≺ v,se u4 v e u 6= v. Para uma parte X de P, um núcleo u ∈ X é minimal em X (maximal em X) se nãoexiste t ∈ X tal que t ≺ u (u≺ t). Para um subconjunto X de P, o conjunto dos elementos minimais(maximais) de X é denotado por X̌ (X̂). Para cada v ∈ P, seja

    . v↓ := {u ∈ P | u4 v}.

    Dizemos que u,v ∈ P são comparáveis, denotado u∼ v, se u4 v ou v4 u. Também dizemos queu,v ∈ P são propriamente intersectantes, denotado u ./ v, se

    . u 6∼ v e u↓∩ v↓ 6= /0.

    13

  • 14 O ARCABOUÇO DOS SISTEMA GENERALIZADOS DE NÚCLEOS 2.1

    É conveniente, para simplificar, escrever u .̃/v se u ./ v ou u∼ v. Um subconjunto L de P é laminarse nenhum par de seus elementos é propriamente intersectante, isto é,

    . para cada `,m ∈ L: ` 6./ m.

    iposet Um poset P é intersectante, ou simplesmente um iposet, se P é munido de duas operaçõescomutativas ∨ e ∧, definidas sobre cada par (u,w) ∈ P×P tal que u .̃/w, e que satisfazem paracada u,w ∈ P:

    (o.1) se u4 w, então u∧w = u e u∨w = w,(o.2) se u ./ w, então u∧w≺ u e u∧w≺ w, e u≺ u∨w e w≺ u∨w.

    Há duas noções de conjuntos fechados que vamos usar. Seja, então, X uma parte de P. Dizemosque X é ./-fechada, se para cada u,w ∈ X :

    . u ./ w implica u∧w ∈ X e u∨w ∈ X .

    Por fim, dizemos que X é ∧-fechada, se para cada u,w ∈ X :

    . u ./ w implica u∧w ∈ X .

    Para simplificar, vamos sobrecarregar a notação, e quando o contexto permitir, vamos escrever Pno lugar do mais longo (P,4,∨,∧).

    O próximo lema será útil num vindouro procedimento de descruzamento. Vamos, no entanto,exibí-lo agora em virtude seu de caráter básico e por depender tão somente dos axiomas queacabamos de enumerar. Vamos, entretanto, necessitar da seguinte definição que será usada fre-quentemente nesta tese. Para uma parte laminar L de P, e u ∈ P, denotamos por Lu, o conjunto dosnúcleos maximais ` ∈ L tais que ` ./ u, ou seja, ` ∈ Lu se e só se

    ` ./ u e (m ./ u e m∼ ` implicam m4 `).

    Lema 2.1 Para cada iposet P, cada subconjunto ∧-fechado I de P, cada subconjunto laminar Lde I, e cada subconjunto X de I, se X 6= /0 então existe u ∈ X tal que

    para cada ` ∈ Lu e cada z ∈ I : z≺ ` implica z /∈ X.

    Prova. Suponha, por contradição, que existe um iposet P, um subconjunto ∧-fechado I de P, umaparte laminar L de I, e um subconjunto não-vazio X de I tais que

    para cada u ∈ X existem ` ∈ Lu e z ∈ X tais que z≺ `,

    Para cada u ∈ X , fixe arbitrariamente `u ∈ Lu e zu ∈ X tais que zu ≺ `u. Selecione u ∈ X para o qual`u é minimal, isto é, não existe v ∈ X tal que `v ≺ `u. Como zu ∈ X , então a laminaridade de L e aminimalidade de `u implicam

    `u 4 `zu , ou (`zu 6∼ `u e `↓zu ∩ `

    ↓u = /0).

    Lembre-se que, por definição, `zu ./ zu. Admita, primeiro, que `u 4 `zu . Neste caso, zu ≺ `u 4 `zucontradiz `zu ./ zu. Suponha, agora, que `zu 6∼ `u e `

    ↓zu ∩ `

    ↓u = /0. Como `zu ./ zu e I é ∧-fechado,

  • 2.2 SISTEMAS GENERALIZADOS DE NÚCLEOS 15

    então `zu∧zu está em I. Mas `zu∧zu≺ `zu e, ademais, `zu∧zu≺ zu≺ `u. Portanto, `zu∧zu ∈ `↓zu∩`

    ↓u,

    o que é uma contradição.

    É claro que a prova do lema anterior sugere o seguinte algoritmo que recebe um iposet P, umaparte laminar L de I, e um subconjunto não-vazio X de I, onde I é uma parte ./-fechada de P, edevolve um núcleo u ∈ X tal que

    para cada ` ∈ Lu e cada z ∈ I : z≺ ` implica z /∈ X .

    MIN-ESP (P,L,X)

    1 selecione um núcleo u ∈ X2 T := Lu3 enquanto T 6= /0 faça4 selecione ` ∈ T5 se Jexiste w ∈ (`↓r{`})∩XK então6 u := w7 T := Lu8 senão9 T := T r{`}

    10 devolva u

    É oportuno, agora, tecer um primeiro comentário sobre a complexidade computacional dosalgoritmos. Nesta tese, questões de complexidade computacional, embora fundamentais, não se-rão discutidas com profundidade. Nossa maior preocupação está em estabelecer polinomialidadeem função de certos oráculos, os quais, nos algoritmos que vamos descrever, serão exibidosenvolvendo-os com os símbolos “JK”; assim, no algoritmo precedente admitimos a existência deum oráculo que determina, se existe, um w ∈ (`↓r{`})∩X . Em relação ao algoritmo acima aindadispomos de poucos elementos para determinar quais parâmetros serão considerados para esta-belecer sua complexidade. É claro que o número de iterações do algoritmo está limitado por |L|.Além disso, se supusermos que P é parte da entrada e que o oráculo tem complexidade de tempopolinomial, então o algoritmo também tem consumo de tempo polinomial. No entanto, para asaplicações que veremos, P tipicamente terá tamanho exponencial em outro parâmetro de entrada.

    2.2 Sistemas generalizados de núcleos

    Seja P um iposet, E um conjunto finito, disjunto de P, cujos elementos são denominados dearcos, e ρ : P→ 2E uma função tal que para cada u,v,w ∈ P:

    (ρ.1) se u4 v4 w, então ρu∩ρw⊆ ρv,(ρ.2) se u ./ v, então ρ(u∨ v)∪ρ(u∧ v)⊆ ρu∪ρv, e(ρ.3) se ρu∩ρv 6= /0, então u .̃/v.

  • 16 O ARCABOUÇO DOS SISTEMA GENERALIZADOS DE NÚCLEOS 2.2

    Lembre-se que ρu é uma notação alternativa para ρ(u). Seja B uma parte de E. Escrevemos

    . ρB(u) := (ρu)∩B e dB(u) := |ρB(u)|

    para cada u ∈ P. Por brevidade, escrevemos d(u) em vez de dE(u) para cada u ∈ P. Tambémdefinimos para cada u ∈ P :

    . c(u) := c(ρu) := ∑[c(a) | a ∈ ρu],

    e esta notação é transportada para outros contextos onde uma função é definida sobre elementosde algum conjunto, e aplicamos a função a um subconjunto de elementos.

    Um sistema generalizado de núcleos, ou simplesmente um sgn é uma tupla

    . (P,4,∨,∧,E,ρ,c),

    onde (P,4,∨,∧) é um iposet, ρ satisfaz (ρ.0)− (ρ.3) e c : E → R+ é uma função capacidade.Quando c : P→N, dizemos que o sgn é inteiro. Isto completa a definição do arcabouço introduzidopor Frank [Fra99]. É conveniente também definir

    . λK :=min{c(u) | u ∈ P}, e

    . ΛK := {u ∈ P | c(u) = λK}.

    Dizemos que K é não-trivial se λK > 0. Note, entretanto, que λK = 0 e ρu 6= /0 para todo u ∈ Spodem, evidentemente, ser válidos simultaneamente. Quando o contexto permitir, vamos, como dehábito, escrever λ e Λ em vez de λK e ΛK.

    Vamos, tipicamente, denotar por K um sgn arbitrário e, além disso, devido à nossa convençãosobre denotação de iposets, supomos K = (P,ρ,c), deixando implícito o conjunto dos arcos — oqual, salvo o dito o contrário, será denotado por E — sobre o qual tanto ρ quanto c são definidas.Quando nenhuma função capacidade é dada, admitimos c = d e, neste caso, dizemos que K é não-capacitado. Vamos evitar, sempre que possível, o subscrito K nas funções que dependem de K.Para as funções ρ e d e também para as operações ∨,∧, o contexto deixará claro a qual sgn estasfunções se referem, donde nenhuma de tais referências será necessária.

    O próximo lema estabelece a submodularidade de certas funções que serão fundamentais paraos sistemas generalizados de núcleos.

    Lema 2.2 Seja K um sgn e u,w ∈ P com u ./ w. Então

    (i) para cada a ∈ E : d{a}(u)+d{a}(w)> d{a}(u∨w)+d{a}(u∧w),(ii) para cada B⊆ E : dB(u)+dB(w)> dB(u∨w)+dB(u∧w), e

    (iii) c(u)+ c(w)> c(u∨w)+ c(u∧w).

    Prova. Sejam u,w ∈ P tais que u ./ w. Para a prova de (i), seja a ∈ E. Se a ∈ ρ(u∧w)rρ(u∨w)ou a ∈ ρ(u∨w)rρ(u∧w) então, por (ρ.2), a ∈ ρu∪ρw e, portanto,

    d{a}(u)+d{a}(w)> d{a}(u∨w)+d{a}(u∧w).

    Suponha, agora, que a ∈ ρ(u∧w)∩ ρ(u∨w). De u∧w ≺ u,w ≺ u∨w vem, usando (ρ.1), quea ∈ ρu e a ∈ ρw, donde

  • 2.2 SISTEMAS GENERALIZADOS DE NÚCLEOS 17

    d{a}(u)+d{a}(w) = d{a}(u∨w)+d{a}(u∧w).

    o que estabelece (i).Para a prova (ii), seja B⊆ E. Então

    dB(u)+dB(w) = ∑a∈B

    d{a}(u)+ ∑a∈B

    d{a}(w)

    = ∑a∈B

    (d{a}(u)+d{a}(w)

    )> ∑

    a∈B

    (d{a}(u∨w)+d{a}(u∧w)

    )= ∑

    a∈Bd{a}(u∨w)+ ∑

    a∈Bd{a}(u∧w) = dB(u∨w)+dB(u∧w),

    onde a primeira desigualdade segue em virtude de (i).Para a prova de (iii), observe que

    c(u)+ c(w) = ∑a∈E

    c(a)d{a}(u)+ ∑a∈E

    c(a)d{a}(w)

    = ∑a∈E

    c(a)(d{a}(u)+d{a}(w))> ∑a∈E

    c(a)(d{a}(u∨w)+d{a}(u∧w))

    = ∑a∈E

    c(a)d{a}(u∨w)+ ∑a∈E

    c(a)d{a}(u∧w) = c(u∨w)+ c(u∧w),

    onde a primeira desigualdade vem de c> 0 e de (i). Isto completa a prova do lema.

    Lema 2.3 Seja K um sgn, e u,w núcleos em P tais que

    u ./ w e c(u)+ c(w) = c(u∨w)+ c(u∧w).

    Então

    (i) se a ∈ c+, então d{a}(u)+d{a}(w) = d{a}(u∨w)+d{a}(u∧w).(ii) se ρ(u)∪ρ(w)⊆ c+, então χρu +χρw = χρ(u∨w)+χρ(u∧w).

    Prova. É claro que χρv(a) = d{a}(v) para todo v ∈ P e todo a ∈ E. Observe, agora, que

    c(u)+ c(w)

    = ∑a∈E

    d{a}(u)c(a)+ ∑a∈E

    d{a}(w)c(a)

    = ∑a∈E

    c(a)(d{a}(u)+d{a}(w)

    )> ∑

    a∈Ec(a)

    (d{a}(u∨w)+d{a}(u∧w)

    )= c(u∨w)+ c(u∧w)= c(u)+ c(w),

    onde a desigualdade segue do Lema 2.2. Assim, vale a igualdade em todas as passagens e, por-tanto,

    (∗) ∑a∈E

    c(a)(d{a}(u)+d{a}(w)

    )= ∑

    a∈Ec(a)

    (d{a}(u∨w)+d{a}(u∧w)

    ).

    Seja a ∈ c+. Então, em virtude de (∗) e do Lema 2.2i, temos que

    d{a}(u)+d{a}(w) = d{a}(u∨w)+d{a}(u∧w),

  • 18 O ARCABOUÇO DOS SISTEMA GENERALIZADOS DE NÚCLEOS 2.3

    o que estabelece (i). Para a prova de (ii), suponha que ρu∪ρw⊆ c+. Seja a ∈ E. Se a ∈ c+ então,devido a (i), temos que

    χρu(a)+χρw(a) = χρ(u∨w)(a)+χρ(u∧w)(a).

    Se a /∈ c+ então a ∈ E r (ρu∪ρw), donde, em virtude de (ρ.2), a /∈ ρ(u∨w)∪ρ(u∧w) e daí

    χρu(a)+χρw(a) = χρ(u∨w)(a)+χρ(u∧w)(a),

    o que completa a prova de (ii).

    2.3 Uma generalização das ideias de Lovász e Frank

    Nesta seção, vamos provar que uma generalização de um algoritmo de Frank [Fra79], o qual éinspirado em algoritmo de Lovász [Lov76], pode ser usado para estabelecer que sistemas genera-lizados de núcleos empacotam. A generalização que vamos apresentar é suficiente também, comoveremos no Capítulo 4, para deduzir, em particular, um teorema, similar em espírito à versão fortedo Teorema de Edmonds, que mostrará que é possível empacotar simultaneamente coberturas deuma família de subconjuntos de núcleos. Antes, entretanto, vamos precisar de algumas definições.

    Seja K um sgn, B uma parte de c+ e u um núcleo em P. Dizemos que B cobre u se ρB(u) 6= /0,e para X ⊆ P, dizemos que B cobre X , ou é uma cobertura de X , se B cobre cada u ∈ X . Valerepetir que uma cobertura, por definição, contém somente elementos do suporte de c. Para umsubconjunto S de P, escrevemos covSB para denotar o conjunto

    . {u ∈ S | B cobre u}.

    Por outro lado, dizemos que B evita u se ρB(u) = /0, e B evita uma parte R de P se B evita cada umdos núcleos em R; finalmente, para um subconjunto S de P, o conjunto

    . {u ∈ S | B evita u}

    é denotado por freeSB. Para simplificar, quando S =P, escrevemos freeB e covB no lugar de freePBe covPB, respectivamente.

    Conjuntos arbóreos

    Os conjuntos arbóreos nos sgns constituem uma generalização dos conjuntos de arcos de umdigrafo que contêm ramificações. Eis sua definição formal. SejaK um sgn e S uma parte de P. Umsubconjunto B de E é S-arbóreo se

    . para cada u,v ∈ S: se u≺ v e B cobre u, então B cobre v.

    Quando S=P, para abreviar, dizemos que B é arbóreo. Além disso, para uma parte X de P dizemosque B é boa para X se

    . para cada x ∈ X : dB(x)6 1.

  • 2.3 UMA GENERALIZAÇÃO DAS IDEIAS DE LOVÁSZ E FRANK 19

    Lema 2.4 Seja K um sgn, e S uma parte ./-fechada de P. Para cada B⊆ c+, cada u maximal emfreeSB, e cada e ∈ ρu∩ c+,

    (i) se B é S-arbóreo, então B∪{e} é S-arbóreo, e(ii) se B é S-arbóreo e boa para Š, então B∪{e} é S-arbóreo e boa para Š.

    Prova. Para a prova de (i), admita que B é uma parte S-arbórea de c+ e suponha, por contradição,que existem u maximal em freeSB e e ∈ ρu∩ c+ tais que B′ := B∪{e} não é S-arbóreo. Entãoexistem `,m ∈ S tais que

    `≺ m, B′ evita m, e B′ cobre `.

    Como B′ evita m e B⊂ B′, então B também evita m. Note que u 6= m, pois e ∈ ρurρm. Ora, B éS-arbóreo, donde B evita `. No entanto, B′ cobre ` e, daí, e cobre `. De e ∈ ρu∩ρ`, usando (ρ.3),vem que u .̃/`.

    Fato 2.4.1 `≺ u.

    • Suponha, por contradição, que u ./ `. Lembre-se que B evita u e ` o qual, combinado com(ρ.2), implica que B evita u∨ `. Note que u∨ ` ∈ S, pois S é ./-fechado. Agora, devido a (o.2),u ≺ u∨ `, o que é uma contradição com a maximalidade de u em freeSB. Assim, u ∼ ` o que,aliado a ` ∈ freeSB e u maximal em freeSB, acarreta `4 u; além disso, `≺ u pois, caso contrário,u = `≺ m e m ∈ freeSB contraria a maximalidade de u em freeSB. •

    Temos, assim, que ` ≺ u e ` ≺ m. Se u 6∼ m, então u ./ m. De B evita u e m, combinado com(ρ.2), segue que B evita u∨m. No entanto, u∨m ∈ S, donde u∨m ∈ freeSB o que, mais umavez, contraria a maximalidade de u em freeSB. Logo, u ∼ m. Finalmente, a maximalidade de u em 6= u implicam que m≺ u e, consequentemente, `≺m≺ u. Agora, (ρ.1) e e ∈ ρ`∩ρu acarretame ∈ ρm, uma contradição. Portanto, B′ é S-arbóreo, como queríamos.

    Para a prova de (ii), suponha que B é S-arbóreo e bom para Š. O conjunto B′ é S-arbóreo,em virtude de (i). Falta verificar que B′ é bom para Š. Seja v ∈ Š. Então dB(v) 6 1. Suponha, porcontradição, que dB′(v)> 2. Neste caso, e∈ ρu∩ρv, donde u .̃/v; ademais, dB(v) = 1 o que, aliadoà dB(v) = 0, acarreta u 6= v. Ora, u 6./ v uma vez que v ∈ Š e S é ./-fechado e, consequentemente,u∼ v. A minimalidade de v em S implica que v≺ u. Entretanto, dB(v) = 1 e u∈ freeSB contradizemo caráter S-arbóreo de B. Concluímos, assim, que B é bom para Š, o que completa a prova de (ii) edo lema.

    Corolário 2.5 Seja K um sgn não-trivial, e S uma parte ./-fechada de P. Então K possui umacobertura de S boa para Š.

    Prova. Seja B uma parte maximal de c+ que é S-arbórea e boa para Š. Suponha que B não cobre S.Tome u maximal em freeSB. Como K é não trivial, então ρu∩ c+ 6= /0. Seja, então, e ∈ ρu∩ c+.Agora, o Lema 2.4 implica que B′ := B∪{e} é uma parte de c+ que é S-arbórea e boa para Š, oque contraria a maximalidade de B.

    É claro que a prova do Corolário 2.5 sugere o seguinte algoritmo que recebe um sgn não-trivialK e uma parte ./-fechada S de P e devolve uma cobertura de S, boa para Š.

  • 20 O ARCABOUÇO DOS SISTEMA GENERALIZADOS DE NÚCLEOS 2.3

    Algoritmo COBERTURA-BOA (K,S)

    1 B := /02 enquanto freeSB 6= /0 faça3 Jselecione u maximal em freeSBK4 selecione a ∈ ρu∩ c+

    5 B := B∪{a}6 devolva B

    Retomando-se a discussão do início do capítulo e relembrando-se os comentários do Capí-tulo 1, podemos agora mencionar com mais precisão alguns aspectos de complexidade compu-tacional. Os sgns são arcabouços bem gerais e para a maior parte de suas aplicações o conjuntodos núcleos será normalmente muito grande. Para as aplicações envolvendo digrafos tal conjuntoserá tipicamente exponencial no número de vértices. Assim, vamos dizer que um algoritmo temcomplexidade polinomial se seu consumo de tempo é um polinômio no número de arcos do sgn,módulo os oráculos utilizados pelo algoritmo. Lembre-se que vamos identificar nos algoritmosuma chamada a um oráculo colocando-a delimitada pelos símbolos “JK”. Desta forma, no algo-ritmo COBERTURA-BOA a operação “selecione u maximal em freeSB” constitui uma chamadapara o oráculo. Esta convenção será usada no decorrer de todo este texto e, por isso, não mais arepetiremos.

    Como de hábito, admitindo-se que o oráculo acima possui complexidade polinomial, é claroque o algoritmo também possui complexidade polinomial uma vez que o número de iterações estálimitado pelo número de arcos do sgn.

    A generalização

    No Capítulo 1, exibimos, implicitamente, um algoritmo que produz um empacotamento deum sistema de bi-conjuntos intersectantes. Vamos fazer uma breve digressão a respeito de talalgoritmo. Suponha, assim, que (D,F) é um sbi. A ideia central da prova, da qual é possível derivarum algoritmo, era manter uma parte arbórea B de A tal que λ (KB) > λK− 1 e mostrar que erapossível estender B através da adição de um arco a tal que B∪{a} é arbóreo e, ademais, não entraem nenhum bi-conjunto da família a ser evitada, a saber, {X ∈ F | ~dD−B(X) = λK− 1}. Vamosmostrar que podemos estender estas ideias para o arcabouço dos sgns. Já vimos no Lema 2.4 queconjuntos arbóreos podem ser estendidos de forma a produzir novos conjuntos arbóreos. Alémdisso, vamos identificar algumas propriedades do conjunto a ser evitado. A identificação destaspropriedades permitirá derivar diversas versões e estratégias para a determinação de coberturas emsgns.

    Seja K um sgn. Para uma parte B de E e um real positivo ε seja

    . cεB := c[B 3 a 7→ c(a)− ε] = c− εχB.

    Denotamos porKεB a tripla (P,ρ,cεB) a qual, evidentemente, é um sgn se e só se cεB> 0. Lembre-

  • 2.3 UMA GENERALIZAÇÃO DAS IDEIAS DE LOVÁSZ E FRANK 21

    se que um subconjunto R de P é ∧-fechado se para todo r,s ∈ R:

    . r ./ s implica r∧ s ∈ R.

    Seja B uma parte de c+, S uma parte ./-fechada de P, R uma parte de P e ε um número realpositivo. Dizemos que (R,S,B,ε) é evitável se

    (n.0) r ∈ R,s ∈ S e r .̃/s implicam r∧ s ∈ S,(n.1) R é ∧-fechado,(n.2) R∩ freeSB = /0,(n.3) para cada r ∈ R,s ∈ S com r .̃/s :

    freeSB 3 r∧ s≺ r implica cεB(r∧ s)> cεB(r), e(n.4) para cada r,s ∈ R :

    r ./ s implica cεB(r)+ cεB(s) = cεB(r∨ s)+ cεB(r∧ s).

    Proposição 2.6 Seja K um sgn não-trivial, R uma parte de P, S uma parte ./-fechada de P, Buma parte S-arbórea de c+, e ε um real positivo. Se (R,S,B,ε) é evitável e B não cobre S, entãoexiste a ∈ c+ tal que

    (2.1) (i) a evita R,(ii) B∪{a} é S-arbóreo,

    (iii) covS(B∪{a})⊃ covSB,(iv) se B é bom para Š, então B∪{a} também é bom para Š.

    Prova. Suponha que B não cobre S, e seja u um núcleo maximal em freeSB.

    Fato 2.6.1 Existe a ∈ ρu∩ c+ tal que a evita R.

    • Seja I := {t ∈ R | t .̃/u}. Suponha, primeiro, que I = /0. Como B evita u e K é não-trivial, entãocεB(u) = c(u) > 0 e, por conseguinte, existe a ∈ ρu com c(a) > 0. Seja t ∈ R. De I = /0, aliado à(ρ.3), vem que ρt ∩ρu = /0 e, portanto, a evita R, o que estabelece o Fato 2.6.1, neste caso.

    Suponha, no que segue, que I é não-vazio e seja r um núcleo minimal em I, isto é, r ∈ Ǐ.Observe que u∧ r ∈ S, em virtude de (n.0).

    Fato 2.6.1.1 u∧ r ≺ r e existe a ∈ (c+∩ρu∩ρ(u∧ r))\ρr.

    •• Note que u∧ r ∈ freeSB. De fato, como u∧ r 4 u então u∧ r = u ou u∧ r ≺ u. No primeirocaso, não há mais nada a provar. Suponha, pois, que u∧ r ≺ u. Neste caso, como B é S-arbóreo eu ∈ freeSB, então u∧ r ∈ freeSB, como queríamos. De r ∈ R e u∧ r ∈ freeSB segue, em virtude de(n.2), que u∧ r ≺ r. Assim, usando-se (n.3) obtemos que cεB(u∧ r) > cεB(r) e, portanto, existea ∈ ρ(u∧ r) \ρr com c(a) > 0. Note que (ρ.2) implica que a ∈ ρu, o que completa a prova doFato 2.6.1.1. ••

    Seja, então, a o arco cuja existência é garantida pelo fato acima.

    Fato 2.6.1.2 Para cada s ∈ R: se a ∈ ρs então s ∈ I e r ./ s.

  • 22 O ARCABOUÇO DOS SISTEMA GENERALIZADOS DE NÚCLEOS 2.4

    •• Seja s ∈ R e suponha que a ∈ ρs. Então r 6= s pois a /∈ ρr. Note, entretanto, que a ∈ ρs∩ρu edaí, em virtude de (ρ.3), segue que s .̃/u, donde s ∈ I.

    Resta provar que r ./ s. Vamos primeiro estabelecer que r 6∼ s. Suponha, por contradição,que r ∼ s. Como r ∈ Ǐ, s ∈ I e r 6= s, então r ≺ s. No entanto, u∧ r ≺ r ≺ s, a ∈ ρ(u∧ r)∩ρs, e(ρ.1) implicam a ∈ ρr, uma contradição. Assim, r 6∼ s. De a ∈ ρ(u∧ r)∩ρs segue, por (ρ.3), que(u∧ r) .̃/s. Suponha que (u∧ r)∼ s. Se u∧ r = s, então s = u∧ r 4 r contraria r 6∼ s. Se u∧ r ≺ s,então de u∧ r ≺ r segue que r ./ s. Se s ≺ u∧ r, então s ≺ u∧ r ≺ r implica s ≺ r, novamenteuma contradição com r 6∼ s. Admita, finalmente, que (u∧ r) ./ s. Então (u∧ r)∧ s está em S e de(u∧ r)∧ s≺ u∧ r≺ r e (u∧ r)∧ s≺ s vem que r ./ s. Isto completa a prova do Fato 2.6.1.2. ••

    Se a /∈ ρs para todo s ∈ R então não há mais nada a provar, pois a /∈ B. Suponha, então, quea ∈ ρs para algum s ∈ R. O Fato 2.6.1.2 implica que r ./ s. No entanto, como r,s ∈ R e R é ∧-fechado então r∧ s ∈ R. Vamos, agora, provar que a ∈ ρ(r∧ s). Como cεB(a) = c(a) > 0, então(n.4) e o Lema 2.3i acarretam

    d{a}(r)+d{a}(s) = d{a}(r∧ s)+d{a}(r∨ s),

    o que, por sua vez, combinado com a /∈ ρr e a ∈ ρs implicam que a ∈ ρ(r∧ s) ou a ∈ ρ(r∨ s).Suponha que a ∈ ρ(r∨ s). Então a ∈ ρ(u∧ r)∩ρ(r∨ s). Mas, u∧ r ≺ r ≺ r∨ s, e (ρ.1) implicamque a ∈ ρr, o que é uma contradição. Logo, a ∈ ρ(r∧ s). No entanto, como a ∈ ρ(r∧ s)∩ ρu,então (r∧ s) .̃/u. Assim, r∧ s ∈ I. Mas, de r ./ s vem que r∧ s ≺ r. Daí I 3 r∧ s ≺ r contraria aminimalidade de r. Concluímos, assim, que a evita R, completando a prova do Fato 2.6.1. •

    O Fato 2.6.1 estabelece (2.1i). Pelo Lema 2.4, B∪{a} é S-arbóreo, donde vale (2.1ii). Ademais,B∪{a} cobre u e B evita u estabelece (2.1iii). Finalmente, (2.1iv) também segue em virtude doLema 2.4.

    Desta forma, a Proposição 2.6 garante a existência de uma extensão de um conjunto arbóreodiante de certas restrições. A próxima subseção se dedicará a exibir algumas de suas consequên-cias.

    2.4 Algumas consequências

    Vamos agora examinar algumas consequências e aplicações da Proposição 2.6. Nos próximoscapítulos vamos investigar algumas aplicações um pouco mais sofisticadas.

    A definição seguinte será útil na derivação de consequências da Proposição 2.6. Seja K umsgn, B um subconjunto de E e ε um número real. Note que KεB é um sgn se e só se cεB > 0.Dizemos que o par (B,ε) é positivo se

    . 0 < ε 6min{c(e) | e ∈ B} e λ (KεB)> λK− ε .

    É evidente que se (B,ε) é positivo então B⊆ c+.

    Lema 2.7 SejaK um sgn inteiro, B⊆ E tal que (B,1) é positivo, e R := {u∈ P | cB(ρu) = λ −1}.Então

  • 2.4 ALGUMAS CONSEQUÊNCIAS 23

    (i) (R,P,B,1) é evitável, e(ii) se a ∈ c+ evita R, então (B∪{a},1) também é positivo.

    Prova. Vamos primeiro provar que R é ./-fechado. Sejam u,w ∈ R tais que u ./ w. Então

    λ −1+λ −1 = cB(u)+ cB(w)> cB(u∨w)+ cB(u∧w)> λ −1+λ −1,

    onde a primeira desigualdade é válida pelo Lema 2.2 e, a segunda, porque (B,1) é positivo. Assim,vale a igualdade em todas as passagens, donde u∨w,u∧w ∈ R.

    A propriedade (n.0) é válida, uma vez que P é ./-fechado; (n.1) é válida, pois R é ./-fechado;(n.2) é trivial; (n.3) é válida, uma vez que cB(u) > cB(r) para todo u ∈ freeB,r ∈ R; finalmente,(n.4) é válida, pois cB(u) = cB(w) para todo u,w ∈ R. Isto estabelece (i). Para ver (ii), admita quea ∈ c+ evita R. Se a cobre u ∈ P, então c inteiro implica cB(u) > λ e, daí, cB∪{a}(u) > λ − 1.Portanto, λ (KB∪{a})> λK−1, como queríamos.

    Teorema 2.8 Seja K um sgn inteiro e não-trivial.Então K possui uma cobertura B de P boa para P̌ tal que λ (KB) = λK−1.

    Prova. Seja B uma parte maximal de c+ que é arbórea, boa para P̌ e tal que (B,1) é positivo.Suponha, por contradição, que B não é uma cobertura de P. Seja R := {u ∈ P | cB(u) = λ −1}. OLema 2.7 implica que (R,P,B,1) é evitável e, assim, pela Proposição 2.6, existe um arco a ∈ c+

    que evita R e para o qual B∪{a} é arbóreo, bom para P̌ e cov (B∪{a}) ⊃ covB. No entanto, oLema 2.7 implica que (B∪{a},1) é positivo, o que é contrário a maximalidade de B. Isto estabelececovB = P, como queríamos.

    Note que o teorema admite a seguinte reformulação.

    Teorema 2.9 Seja K um sgn inteiro e não-trivial. Seja B uma parte arbórea de E, boa para P̌, talque (B,1) é positivo. Então existe uma cobertura B′ de P, boa para P̌, e tal que

    (2.2) B′ ⊇ B e λKB′ = λK−1. �

    Usando o Teorema 2.8, uma simples indução em λK estabelece o resultado seguinte.

    Teorema 2.10 Seja K um sgn não-capacitado.Então o número máximo de coberturas disjuntas de P que são boas para P̌ é igual a λK. �

    Ou ainda, mais geralmente:

    Teorema 2.11 Todo sgn inteiro empacota. �

    É claro que a discussão precedente sugere o seguinte algoritmo que recebe um sgn inteiro K edevolve um empacotamento de K.

  • 24 O ARCABOUÇO DOS SISTEMA GENERALIZADOS DE NÚCLEOS 2.4

    Algoritmo FDMC (K)

    1 y := /02 enquanto λK> 0 faça3 B := /04 enquanto freeSB 6= /0 faça5 Jselecione u maximal in freeBK6 selecione um arco a ∈ ρu∩ c+ tal que JλKB∪{a} > λK−1K7 B := B∪{a}8 y := y[B 7→ y(B)+1]9 K :=KB

    10 devolva y

    É claro que este algoritmo tem complexidade polinomial se K é não-capacitado. Ademais,neste caso, y+ é uma coleção disjunta de coberturas de P, boas para P̌. Observe, entretanto, que,em geral, o algoritmo não é polinomial.

    O Teorema 2.11 generaliza, dentre outros, os Teoremas 1.1, 1.2, 1.3 e 1.6 tanto em suas versõescapacitadas (inteiras) quanto, evidentemente, as não-capacitadas.

    Uma prova e um algoritmo alternativo para o Teorema 2.8

    Vamos exibir agora uma prova alternativa para o Teorema 2.8, cujo propósito é servir comoum prenúncio do que faremos em capítulos posteriores. Para isso, vamos precisar da definição quesegue. Seja K um sgn e L uma parte de P. Dizemos que L é afim-independente se o conjunto

    . {χρu | u ∈ L}

    é afim-independente1. A prova induzirá um algoritmo para determinar um empacotamento de K.A ideia do algoritmo consiste em manter, a cada iteração, uma parte arbórea B de c+ tal que (B,1)é positivo e uma parte L de ΛKB que é afim-independente. A cada iteração um dentre os conjuntos,B e L, é estendido. Ou B é estendido através da adição de um arco a de tal forma que B∪{a} éarbóreo e (B∪{a},1) é positivo, ou L é estendido através da adição de um núcleo w ∈ ΛKB talque L∪{w} é afim-independente.

    Lema 2.12 SejamK um sgn inteiro e não-trivial, J := B∪{e} uma parte arbórea de c+, boa paraP̌, e L uma parte de ΛKB \ P̌ tais que

    (2.3) (i) λ (KB)> λK−1,(ii) λ (KJ) = λK−2,

    (iii) e evita L.

    Então existe w ∈ P tal que1Um conjunto finito X de vetores em Rn é afim-independente se para todo λ ∈ RX , ∑x∈X λxx = 0 e ∑x∈X λx = 0

    implicam que λ =~0.

  • 2.4 ALGUMAS CONSEQUÊNCIAS 25

    (2.4) (i) w /∈ L∪ P̌,(ii) w ∈ ΛKB, e

    (iii) se L é afim-independente, então L∪{w} é afim-independente

    Prova. Existe, devido à (2.3ii), w ∈ P tal que cJ(w) = λK− 2 o qual, por sua vez, implica quedJ(w) > 2 e, portanto, w /∈ P̌; ademais, e evita L e entra em w, donde w 6∈ L, o que prova (2.4i).No entanto, (2.3i) implica que cB(w) = λK−1, o que prova (2.4ii). Para a prova de (2.4iii), noteprimiero que cB(`) = λK− 1 para todo ` ∈ L. Suponha que L é afim-independente e seja L′ :=L∪{w}. Suponha, por contradição, que L′ não é afim-independente. Como L é afim-independente,então χρw é uma combinação afim de L. Então existe δ : L→ R tal que

    ∑u∈L δu = 1 e χρw = ∑u∈L δuχρu.

    Segue daí que

    λ −2 = cJ(w) = ∑[δucJ(u) | u ∈ L

    ]= ∑[δu(λ −1) | u ∈ L

    ]= λ −1,

    o que é uma contradição. Isto estabelece (2.4iii) e completa a prova do lema.

    Proposição 2.13 Seja K um sgn inteiro e não-trivial, B uma parte arbórea de c+, boa para P̌, talque (B,1) é positivo, e L uma parte afim-independente de {u∈ P\ P̌ | cB(u) = λK−1}. Se freeB 6=/0, então existe a ∈ c+ tal que

    . a evita L, e

    . B∪{a} é arbóreo,

    e para o qual vale uma das alternativas:

    (i) λKB∪{a} > λK−1, ou(ii) existe w ∈ P tal que cB(w) = λK−1, w /∈ L e L∪{w} é afim-independente.

    Prova. Observe primeiro que L ⊆ {u ∈ P | cB(u) = λK−1}=: R e (B,1) é positivo, donde, pelaProposição 2.6 e pelo Lema 2.7, existe a ∈ c+ que evita R e, portanto, evita L. Suponha que nãovale (i). Neste caso, o Lema 2.12 implica (ii).

    Prova do Teorem 2.8 Eis, então, uma prova alternativa para o Teorema 2.8: tome uma partearbórea B de c+, boa para P̌, e uma parte afim-independente L de ΛKB r P̌ tais que

    . (B,1) é postivo, e

    . |B|+ |L| é máximo.

    Como |B|+ |L| é máximo, então, de acordo com a Proposição 2.13, B cobre P, donde λKB =λK−1, o que estabelece o Teorema 2.8. •

    A discussão precedente sugere o seguinte algoritmo para determinar um empacotamento deum sgn K:

  • 26 O ARCABOUÇO DOS SISTEMA GENERALIZADOS DE NÚCLEOS 2.4

    EMP-SGN (K)

    1 L := /0;y := /02 enquanto λK> 0 faça3 B := /04 enquanto freeB 6= /0 faça5 Jselecione u maximal em freeBK6 selecione a ∈ ρu∩ c+ que evita {` ∈ L | cB(ρ`) = λK−1}7 J := B∪{a}8 se JλKJ > λK−1K então9 B := J

    10 senão11 Jseja w ∈ P tal que cJ(ρw) = λK−2K12 L := L∪{w}13 K :=KB

    14 y := y[B 7→ y(B)+1]15 devolva y

    Capacidade de um conjunto de arcos

    Vamos, agora, definir a noção de capacidade de um conjunto de arcos. A ideia aqui é a seguinte:dado um sgnK e um conjunto de arcos B definir um número ε > 0 tal que λ (KεB)> λK−ε; um talε naturalmente satisfaz 06 ε 6min{c(a) | a ∈ B}. Seja u núcleo em P. É claro que u é relevantese B cobre u. Assim, suponha que u ∈ covB. Se dB(u) = 1, então cεB(u) = c(u)− ε > λ − ε .Se dB(u)> 2, então

    λ − ε 6 cεB(u) = c(u)− εdB(u)

    se e só se

    ε 6c(u)−λdB(u)−1

    .

    Esta discussão motiva as definições que seguem. Um núcleo u ∈ P é especial para B se dB(u)> 2.A capacidade de um núcleo u, especial para B, é o número

    . cap(u;B) := capK(u;B) :=c(u)−λdB(u)−1

    .

    A capacidade de B, denotada por αK(B), ou simplesmente αB, é o número

    (2.5) min({c(a) | a ∈ B}∪{cap(u;B) | u ∈ P é especial para B}

    ).

    O próximo lema, embora trivial, resume algumas propriedades importantes de função capaci-dade.

    Lema 2.14 Seja K um sgn não-trivial, e B uma parte de c+, boa para ΛK. Então

    (i) λK(αB)B > λK−αB, e

  • 2.4 ALGUMAS CONSEQUÊNCIAS 27

    (ii) se B é uma cobertura de P, então λ (KεB) = λK− ε para cada 06 ε 6 αB.

    Prova. Note que (ii) segue de (i) da definição (2.5). Para a prova de (i), escreva K′ := K(αB)B.Tome u ∈ P. Se dB(u)6 1, então B bom para Λ implica c′(u)> λ −αB. Suponha que dB(u)> 2.Como αB6 cap(u;B), então c′(u)> λ −αB, devido à definição (2.5). Isto estabelece (i).

    Lema 2.15 Seja K um sgn, B⊆ E tal que (B,αB) é positivo, e R := Λ∩ covB. Então

    (i) (R,P,B,αB) é evitável, e(ii) se a ∈ c+ evita R, então (B∪{a},α(B∪{a})) é também positivo.

    Prova. A propriedade (n.0) é trivial, assim como (n.2) e (n.3). Além disso, B bom para Λ e R⊆Λimplicam (n.4). Resta, pois, provar (n.1). Primeiro observe que (B,αB) positivo implica em Bbom para Λ. Sejam u,w ∈ R tais que u ./ w. Como R⊆ Λ, então

    c(u)+ c(w) = c(u∨w)+ c(u∧w).

    Seja a ∈ B. Como (B,αB) é positivo, então c(a)> 0 o que, aliado ao Lema 2.3i, implica que

    (∗) d{a}(u)+d{a}(w) = d{a}(u∨w)+d{a}(u∧w).

    A prova de que R é ./-fechado é por indução em |B|. O caso B = /0 é trivial. Assim, suponha queB 6= /0. Seja e ∈ B, defina B′ := B \ {e} e seja R′ := Λ∩ covB′. É claro que (B′,αB′) é positivo,donde, por hipótese de indução, R′ é ./-fechado. Sejam u,w ∈ R tais que u ./ w. Se u,w ∈ R′,então não há nada a provar. Se u,w ∈ RrR′, então e cobre u e w o que, aliado à (∗), implicaque e cobre u∨w e u∧w e, portanto, u∨w e u∧w estão ambos em R. Daqui para frente, vamosadmitir que exatamente um, dentre u e w, digamos u, está em RrR′. Desta forma, w ∈ R′ e, assim,um dos arcos em B′, digamos f , é tal que f ∈ ρw. Ademais, e ∈ ρur ρw pois B é bom paraΛ. Como u /∈ R′, então temos também que f /∈ ρu. Agora, de e ∈ ρur ρw combinado com (∗)vem que e ∈ ρ(u∨w) ou e ∈ ρ(v∧w). Se e ∈ ρ(u∨w) então f /∈ ρ(u∨w) pois B é bom para Λ.Mas f ∈ ρwrρu, f /∈ ρ(u∨w) e (∗) fornecem f ∈ ρ(u∧w). Portanto, u∨w,u∧w ∈ R, comoqueríamos. O caso remanescente — quando e ∈ ρ(u∧w) — segue de forma análoga. Isto prova(n.1). Finalmente, o item (ii) é trivial, por isso omitimos sua prova.

    Usando o Lema 2.15, e imitando a prova do Teorema 2.8, podemos derivar o teorema quesegue.

    Teorema 2.16 Seja K um sgn não-trivial.Então existe uma cobertura B de P, que é boa para P̌, tal que αB > 0 e λK(αB)B = λK−αB.

    Observe que a cobertura garantida pelo teorema é, na verdade, boa para P̌∪ΛK. O próximolema constitui uma forma alternativa de derivar o Teorema 2.16.

    Lema 2.17 Seja K um sgn não-trivial, B uma parte de E tal que (B,αB) é positivo, e

    R := {u ∈ P | c(αB)B(u) = λK−αB}.

  • 28 O ARCABOUÇO DOS SISTEMA GENERALIZADOS DE NÚCLEOS 2.4

    Então

    (i) (R,P,B,αB) é evitável, e(ii) se a ∈ c+ evita R, então (B∪{a},α(B∪{a})) é também positivo.

    Prova. Eis a prova de (i). As propriedades (n.0),(n.2),(n.3) e (n.4) seguem trivialmente. Resta,assim, verificar (n.1). Vamos provar que R é ./-fechado. Para abreviar, escreva ε := αB. Sejamu,w ∈ R com u ./ w. Então

    λ − ε +λ − ε = cεB(u)+ cεB(w) > cεB(u∨w)+ cεB(u∧w) > λ − ε +λ − ε.

    A primeira igualdade é válida pois u e w estão em R. A primeira desigualdade segue do Lema 2.2.A segunda desigualdade é verdadeira, pois (B,ε) é positivo. Assim, vale a igualdade em todasas passagens e, por conseguinte, u∨w,u∧w ∈ R. Isto estabelece que R é ./-fechado e, portanto,também (n.1). Finalmente, observe que (ii) segue diretamente da definição de capacidade.

    Note, entretanto, que derivar a versão minimax para capacidades arbitrárias, ou seja, estabe-lecer que um sgn K empacota, garantindo que o número de coberturas é polinomial no númerode arcos não é imediato. Exibimos, abaixo, um algoritmo baseado na derivação do Teorema 2.16.Surpreendentemente, como veremos no contexto de um arcabouço mais geral, este algoritmo pro-duz um empacotamento com um número de coberturas polinomial (linear) no número de arcos.No algoritmo que segue podemos tomar, a cada iteração,

    RB := Λ(K)∩ covB ou RB := {r ∈ P | c(αB)B(ρr) = λK−αB}.

    Algoritmo EMP-FRAC (K)

    1 y := /02 enquanto λK> 0 faça3 B := /04 enquanto freeSB 6= /0 faça5 Jselecione u maximal in freeBK6 selecione um arco a ∈ ρu∩ c+ que Jevita RBK7 B := B∪{a}8 y := y[B 7→ y(B)+αB]9 K :=K(αB)B

    10 devolva y

    O próximo lema, aliado ao Lema 2.14, permite produzir uma prova alternativa do Teorema 2.8.

    Lema 2.18 SejaK um sgn inteiro, B uma parte de E, e R := {u∈ P | c(αB)B(ρu) = λK−(αB)B}.Se (B,αB) é positivo, e αB> 1 então (B∪{a},α(B∪{a}) é positivo e α(B∪{a})> 1 para cadaarco a ∈ c+ que evita R.

    Prova. Suponha que (B,αB) é positivo e αB > 1. Seja a ∈ c+ tal que a evita R. Seja ε := αB eB′ := B∪{a}. O Lema 2.17 implica que (B∪{a},α(B∪{a})) é positivo. Note que c > 1. Logo,é suficiente mostrar que

  • 2.4 ALGUMAS CONSEQUÊNCIAS 29

    cap(z;B′)> 1 para cada z ∈ P com dB′(z)> 2.

    Seja, então, z∈ P com dB′(z)> 2. Se a evita z, então dB(z) = dB′(z) e, daí, cap(z;B′) = cap(z;B)>1. Agora, admita que a cobre z. O arco a evita R mas cobre z, donde cεB(ρz)> λ−ε . Se dB′(z) = 2,então c(z)−ε = cεB(ρz)> λ−ε o que acarreta que c(z)> λ . Daí, a integralidade de c e λ implicaque cap(z;B′) = c(z)−λ > 1. Finalmente, suponha que dB(z)> 3. Ora,

    λ − ε < cεB(ρz) = c(z)− εdB(z)

    e, de ε > 1 vem que c(z)−λ > dB(z)−1. Por integralidade,

    cap(z;B′) =c(z)−λ

    dB′(z)−1> 1,

    como queríamos.

    Finalmente, o Teorema 2.16, aliado a um argumento de compacidade, fornece o seguinte teo-rema.

    Teorema 2.19 Seja K um sgn e B a família das coberturas de P, boas para P̌. Então

    max{ ∑B∈B

    y(B) | y>~0; ∑B∈B

    y(B)χB 6 c}= λK.

  • 30 O ARCABOUÇO DOS SISTEMA GENERALIZADOS DE NÚCLEOS 2.4

  • Capítulo 3

    Sistemas generalizados de núcleos com apropriedade do cruzamento

    Neste capítulo, vamos introduzir um novo tipo de arcabouço, obtido de um sistema generali-zado de núcleos pela adição de um axioma que permitirá definir uma operação de descruzamento.Esta operação possibilitará, como exibiremos no Capítulo 5, fornecer um melhor limitante supe-rior para o tamanho de um empacotamento. Este novo arcabouço ainda contém, como uma desuas instâncias, os sistemas de bi-conjuntos intersectantes e, portanto, os resultados aqui obtidospodem ser aplicados, para por exemplo, deduzir propriedades a respeito do empacotamento dearborescências geradoras em digrafos, e também como veremos em um capítulo posterior, sobre oempacotamento de ramificações em digrafos.

    3.1 Sistemas generalizados de núcleos com a propriedade docruzamento

    Eis a definição formal do arcabouço deste capítulo. SejaK um sistema generalizado de núcleos.Dizemos que K satisfaz a propriedade do cruzamento se

    (ρ.4) para cada u, `,k ∈ P: se ` ./ u,k ./ (u∨ `) e k 6./ `, então k ./ u.

    Na falta de um nome melhor vamos denotar um tal sgn pela sigla sgn-c.

    Sequências propriamente intersectantes Durante este capítulo vamos ter que lidar com se-quências de núcleos. Lembre-se que /0 denota a sequência vazia. Fixe um sgnK. Para uma sequên-cia f ⊆ P e um núcleo v em P, escrevemos f · v para denotar a sequência obtida de f pela adiçãode v como último elemento, e dizemos, neste caso, que v é um núcleo de f · v, ou está em f · v.Definimos, recursivamente, para cada u,v ∈ P e cada sequência f⊆ P:

    (3.1) • u∨ /0 := u.• u∨ (f · v) := (u∨ f)∨ v.

    31

  • 32 SISTEMAS GENERALIZADOS DE NÚCLEOS COM A PROPRIEDADE DO CRUZAMENTO 3.2

    Note que u∨ f pode não estar bem definido. A próxima definição estabelece uma restrição sobre fque garantirá que u∨ f faz sentido. Seja M uma parte de P, f⊆M uma sequência e u ∈ P. Dizemosque f é uma sequência propriamente intersectante em relação a u, ou simplesmente um u-spi, sef = /0 ou existe uma sequência f′ e um núcleo ` ∈ P tais que

    . f = f′ · `, ` ./ u∨ f′ e f′ é uma u-spi.

    3.2 Um procedimento de descruzamento

    É apropriado, agora, relembrar algumas definições. Seja K um sgn, L uma parte de P e u umdos núcleos de K. Dizemos que L é laminar se u,w ∈ L implica u 6./ w. Denotamos por Lu oconjunto dos núcleos maximais ` de L para os quais ` ./ u.

    Lema 3.1 Seja K um sgn-c, I uma parte ./-fechada de P, L um subconjunto laminar de I, e u umnúcleo em I. Então existe uma u-spi f⊆ Lu tal que

    u∨ f ∈ I e L∪{u∨ f} é laminar.

    Prova. Vamos, primeiro, provar o seguinte fato:

    Fato 3.1.1 Para cada M ⊆ Lu existe uma u-spi f⊆M tal que

    (∗) para cada m ∈M : m 6./ (u∨ f) e u∨ f ∈ I.

    Prova. A prova é uma indução em |M|. Para M = /0, o resultado é óbvio. Suponha, assim, queM 6= /0. Seja ` ∈ M e M′ := M r {`}. Por hipótese de indução, existe uma u-spi f′ ⊆ M′ para aqual

    para cada m ∈M′ : m 6./ u∨ f′ e u∨ f′ ∈ I.

    Se ` 6./ (u∨ f′), então não há mais nada a provar. Suponha ` ./ (u∨ f′) e seja f := f′ · `. É evidenteque f é uma u-spi. O núcleo u∨ f está em I, pois I é ./-fechado. Além disso, ` 6./ (u∨ f). Assim,seja k ∈ M′, e suponha, por contradição, que k ./ (u∨ f). Ponha w′ := u∨ f′. Então k 6./ w′ poisk ∈M′. Finalmente,

    ` ./ w′, k ./ w′∨ `, e ` 6./ k,

    combinado com (ρ.4), fornece k ./ w′ o qual, por sua vez, contraria k 6./ w′. •

    O Fato 3.1.1 implica que existe uma u-spi f tal que u∨ f ∈ I e m 6./ (u∨ f) para cada m ∈ Lu. Opróximo fato estabelece que L∪{u∨ f} é, de fato, laminar.

    Fato 3.1.2 L∪{u∨ f} é laminar.

    Prova. De fato, suponha que este não é o caso. Então existe k ∈ L tal que k ./ (u∨ f). Afirmamosque k ./ u. Suponha, por contradição, que k 6./ u. Seja f′ um prefixo mínimo de f dotado dasseguintes propriedades:

  • 3.3 UM ALGORITMO ALTERNATIVO 33

    k 6./ (u∨ f′) e k ./ (u∨ f′)∨ `,

    onde ` ∈ Lu é tal que f′ · ` é também um prefixo de f. Um tal prefixo existe uma vez que k 6./ u ek ./ (u∨ f). De k, ` ∈ L vem que k 6./ `. Ponha w′ := u∨ f′ e, assim, k 6./ w′. Ora, ` ./ w′ pois f éuma u-spi. Por hipótese, k ./ w′∨ `. Agora, (ρ.4) implica k ./ w′, uma contradição. Logo, k ./ u e,pelo Fato 3.1.1, k /∈ Lu o qual, por sua vez, implica que existe m ∈ Lu com k ≺ m. Como m ∈ Lu,então o Fato 3.1.1 implica que m 6./ (u∨ f). Assim, vale exatamente uma das alternativas

    (a) m∼ (u∨ f) ou (b) m 6∼ (u∨ f) e m↓∩ (u∨ f)↓ = /0.

    Suponha que vale a alternativa (a). Se m 4 u∨ f, então k ≺ u∨ f, o que contraria k ./ u∨ f. Se,por outro lado, u∨ f ≺ m, então u ≺ m, o que contraria m ./ u. Assim, não vale a alternativa (a),ou seja, m 6∼ u∨ f . Finalmente, de k ./ (u∨ f) e k ≺ m segue (u∨ f)∧ k ∈ m↓ ∩ (u∨ f)↓, o que éuma contradição e, desta forma, a alternativa (b) também não vale. Concluímos, assim, que um talnúcleo k não existe e, portanto, L∪{u∨ f} é laminar. •

    Isto completa a prova do lema.

    É claro que a prova do lema precedente induz um algoritmo que recebe um sgn K, uma partelaminar L ⊆ I, e u ∈ I, onde I é uma parte ./-fechada de P, e devolve w ∈ I tal que L∪{w} élaminar. Observe, entretanto, que w pode ser um elemento de L.

    Algoritmo EXT (K,L,u)

    1 w := u2 para todo ` ∈ Lw faça3 se w ./ ` então4 w := w ./ `5 devolva w

    3.3 Um algoritmo alternativo

    Nesta seção, vamos exibir um algoritmo alternativo. que produz um empacotamento em umsgn-c inteiro. Como é de se esperar, tal algoritmo, em geral, não é polinomial. No entanto, emsgn-cs não-capacitados, o algoritmo tem complexidade polinomial. É importante destacar que estealgoritmo é uma generalização de um algoritmo de Gabow e Manu [GM98] para a versão não-capacitada do empacotamento de arborescências geradoras em digrafos.

    Vamos fazer uma descrição informal do algoritmo para ressaltar suas ideias fundamentais.Cada iteração do algoritmo começa com dois objetos: (1) uma parte B de c+, boa para P̌, tal que(B,1) é positivo e (2) uma parte laminar L de Pr P̌ cujos elementos são justos, conceito esteque definiremos posteriormente. Cada iteração seleciona um arco a que evita L. Se (B∪{a},1) épositivo, então começamos uma nova iteração com B∪{a} no lugar de B. Caso contrário, usamoso Lema 3.1 para determinar um núcleo w que está fora de L∪ P̌ e para o qual L∪{w} é laminar ecomeçamos uma nova iteração com L∪{w} no lugar de L.

  • 34 SISTEMAS GENERALIZADOS DE NÚCLEOS COM A PROPRIEDADE DO CRUZAMENTO 3.3

    Lema 3.2 SejamK um sgn-c, J := B∪{e} uma parte arbórea, boa para P̌, e L uma parte laminarde (ΛK∪ΛKB)r P̌ tais que

    (3.2) (i) λ (KB)> λK−1,(ii) λ (KJ) = λK−2, e

    (iii) e evita {` ∈ L | cB(`) = λK−1}.

    Então existe w ∈ P tal que

    (3.3) (i) w /∈ L∪ P̌,(ii) L∪{w} é laminar, e

    (iii) cB(w) = λK−1.

    Prova. Observe, primeiro, que (3.2i) e (3.2iii) implicam que cJ(`)∈{λK,λK−1} para todo `∈ L.Seja X := {u ∈ P | cJ(u) = λK− 2}. Claramente, por (3.2.ii), X é não-vazio donde o Lema 2.1implica que existe u ∈ X tal que para cada ` ∈ Lu e z ∈ P, se z ≺ `, então z /∈ X , ou equivalente-mente,

    cJ(u) = λK−2, epara cada ` ∈ Lu,z ∈ P: se z≺ ` então cJ(z)> λK−1.

    Note que cJ(u) = λK−2 implica dJ(u)> 2; mas, J é bom para P̌ e, daí, u /∈ P̌. Agora, seja f⊆ Luuma u-spi tal que L∪{u∨ f} é laminar, cuja existência é garantida pelo Lema 3.1. Vamos provarque u∨ f /∈ L. Devido à (3.2.iii), é suficiente estabelecer que cJ(u∨ f) = λK− 2. A prova disto épor indução no comprimento de f. Se f = /0, não há nada a provar. Admita, pois, que f = f′ · ` paraalguma u-spi f′ e algum ` ∈ Lu. Por hipótese de indução, cJ(u∨ f′) = λK− 2. Como de hábito,escreva λ := λK. Dois casos necessitam consideração:

    Caso 1 J evita `

    Neste caso, cJ(`) = λ . Ademais, J evita (u∨ f)∧ ` pois J é arbóreo. Segue daí que cJ((u∨f)∧ `)> λ . Então

    λ −2+λ = cJ(u∨ f′)+ cJ(`)> cJ((u∨ f′)∨ `)+ cJ((u∨ f′)∧ `)> λ −2+λ ,

    donde cJ(u∨ f) = λ −2.

    Caso 2 J cobre `.

    Neste caso, em virtude de (3.2iii), temos que cJ(`) = λ − 1. Como (u∨ f)∧ ` ≺ `, então aescolha de u e `∈ Lu acarretam cJ((u∨ f)∧`)> λ −1. Usando submodularidade obtemos

    λ −2+λ −1 = cJ(u∨ f′)+ cJ(`)> cJ((u∨ f′)∨ `)+ cJ((u∨ f′)∧ `)> λ −2+λ −1,

  • 3.3 UM ALGORITMO ALTERNATIVO 35

    e, uma vez mais, cJ(u∨ f) = λ −2.

    Agora, cB(u∨ f) = λ −1 devido à (3.2.i), o que prova (3.3iii); ademais, u∨ f /∈ P̌ pois u 4 u∨ f eu /∈ P̌. Isto completa a prova do lema.

    Proposição 3.3 SejaK um sgn-c inteiro e não-trivial, B uma parte arbórea de c+, boa para P̌, talque λKB > λK−1, e L uma parte laminar de (ΛK∪λKB)r P̌. Se freeB 6= /0, então existe a ∈ c+

    tal que

    . a evita R1 := {` ∈ L | cB(ρ`) = λK−1}, e

    . B∪{a} é arbóreo e bom para P̌,

    e para o qual vale uma das alternativas:

    (i) λKB∪{a} > λK−1, ou(ii) existe w ∈ ΛKB tal que w /∈ L∪ P̌ e L∪{w} é laminar.

    Prova. Observe primeiro que R1 ⊆ {u ∈ P | cB(u) = λK−1}=: R e (B,1) é positivo donde, pelaProposição 2.6 e pelo Lema 2.7, existe a ∈ c+ que evita R e, portanto, evita R1. Além disso, oconjunto B∪{a}, pelo Proposição 2.6, é arbóreo e bom para P̌. Suponha que não vale (i). EntãoλKB∪{a} = λK− 2. Ora, o Lema 3.2 implica que existe w ∈ ΛKB tal que w /∈ L∪ P̌ e L∪{w} élaminar e, portanto, estabelecendo (ii).

    É evidente que esta proposição implica no seguinte fato, que é um caso especial do Teo-rema 2.8:

    Fato 3.3.1 Se K é um sgn-c inteiro e não-trivial, então existe uma cobertura B de P, boa para P̌,tal que λ (KB) = λK−1.

    No entanto, esta mesma proposição fornece um algoritmo alternativo, descrito no que segue, paraconstruir uma tal cobertura.

  • 36 SISTEMAS GENERALIZADOS DE NÚCLEOS COM A PROPRIEDADE DO CRUZAMENTO 3.3

    EMP-SGN-C (K)

    1 L := /0;y := /02 enquanto λK> 0 faça3 B := /04 enquanto freeB 6= /0 faça5 Jselecione u maximal em freeBK6 selecione a ∈ ρu∩ c+ que evita {` ∈ L | cB(`) = λK−1}7 seja J := B∪{a}8 se JλKJ > λK−1K então9 B := J

    10 senão11 m := MIN-ESP (P,L,{v ∈ P | cJ(v) = λK−2})12 w := EXT(K,L,m)13 L := L∪{w}14 K :=KB

    15 y := y[B 7→ y(B)+1]16 devolva y

  • Capítulo 4

    Sistemas generalizados de núcleos com umafamília mista

    Neste capítulo, vamos introduzir os sistemas generalizados de núcleos com uma família mista,os quais constituem uma generalização do problema do empacotamento em sgns, e provar que talarcabouço empacota. Este arcabouço generaliza os sistemas de bi-