traços
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Agradecimentos : Ao grande amigo, incentivador e poeta Marcelo Ariel, militante na construção do humano e mais que humano,
na arte e na literatura, estabelecendo elos de luz entre os que cruzam o seu caminho.
Aos meus amigos pintores queridos Admilson Silva e Neuza Ladeira, grandes artistas da pintura e poesia.
Aos amigos e poetas Alberto Bresciani e Mariza Lourenço importantes fortalecedores da diversidade na criação literária,descobrindo e apoiando novos poetas e escritores..
Agradeço a generosidade e carinho de todos os que
mantém vivas as formas livres de expressão das mais variadas artes pessoais.. Aos que lêem, curtem e comentam nas redes, formando novos laços sociais.
Título : TRAÇOSAutora: Tânia Amares
Plataforma de leitura: ISSUULocal: São Paulo – BR
Ano: 2014Idioma: Portuguesn.. de Páginas: 16
Ilustrações: Admilson Silva Neusa Ladeira
2
poeminha sem esperanças
aos que voam nas dissertaçõesaos que brincam nas teses
aos que sofrem de cotuveloseaos que morrem
aos que morrem !
há os que contam sílabas, combinam rimasos que vestem branco ou usam luto
os que ficam putosos que choram rios
e os apaixonadosque se ardem rubros.
poetas não são viníciussão perdidos
oblíquosquerem sempre o que não tem
amam a mulher e o próximosobre qualquer tipo de coisa
cama, lama, areia, na hora da sobremesa
sempre querendo vinhosempre lembrando Baco
ah e como viajam!ora inferno, ora céu
ora a Casa do Caragliobeijam os pés da flor
rezam ao editor
evocam as doces musassantas, sonsas, salve as moças
Poesia gosta do novoquem gosta de velho
é História.
3
-ai, ai, ai,diz o Fernando
- q’ minh'alma não é p’quena,feche a matraca, ó ingrata,
inda se fosse Garotae estivesse em Ip’nema.
fazer poema não é o que façonem pode ser assim tão fácilrecomendam-me que desista
ou insistamas
sem esperanças
escultura de Romero Brito
4
Desamparo
minha mão estendida no araberta
palma voltada para o tempo futurodedos afastados
junta-se a outra mãosobrepôe-se à primeira
braços estendidosno vácuo
o caminho perde-se na curvaturva-se o céu
povoado de abismos
5
tela “Mãe” Admilson Silva
Chuva
Esperava com alegria cada pingoo rosto, voltado para o céu,olhos fechados, boca aberta.
Queria os que vinham ter a sua língua.
Saboreava-os, num êxtase de menina.Depois, roupa molhada, pés descalços,
brincava com as poças sentindo o gosto da felicidade.
Pintura de Neuza Ladeira
6
O Molde
Moldei um menino na massa do pão.Antes, enquanto amassava, pensava na mãe
brincando com braços, barriga e pernas,segurando, nomeando cada parte,
mesclando-se à cria,fazendo-se massa de eu.
Cada pedaço do menino,amassado, amaciado,
cuidadosamenteamansado no trato amoroso,sem tempo certo de preparo.
Muita farinha de beijo,descanso coberto de abraços.
Moldei um menino na massa do pão.Assei em fogo brando.
Depois de moreno, crescido e belo,já fora do forno, olhou minhas mãos,
sorriu e me abençoou.
quadro de Diego Rivera “Camponesa fazendo pão”
7
Horas mortas em setembro
Quando tudo começou, matava a noite meninaesfaqueava cada hora arrancando-lhe os minutos.
Passei, então, a trucidar manhãs,escalpelei seus verdes, sufoquei amarelos.
Logo passei a, incinerar tardes de sol, As cinzas, joguei todas no lixo.
Sobraram noite alta e madrugada,pouco a pouco, estraçalhadas
esgarçadas e dilaceradas.Caíram no chão aos pedaços.
O que sobrou do relógiodeixei na gavetinha
do criado mudo.
8
O espelho e a rosa
O olhar aflito percorreo reflexo do mundo
que se deteriora.
Blake? ela chama.Nenhuma voz responde,verme algum se esconde.
Aqui não háo tempo, querida,Esqueça o rastejante
deus da vida.
Agora, tens a corrubra, farta de vigor.
Seu eu carmim não desvanece.Aqui, nada desaparece.
Dentro do espelho, a rosa,em sua plenitude,
longe da primaveraenlouquece.
9
tela de Admilson Silva
As sete moradas
dentro do meu labirintoum minotauro
ouço Borgesbecos sem saída
um grande portal:arena do sacrifício
um ser adentra o recintosinto seu cheiro e choro
vem buscar meu segredocaçar minha fera
devoro-o puro instinto, fome
saio marcadahá sangue na luta
volto repleta, jamais completa
10
tela de Admilson Silva
Perversa
Nasci assim metálica e pervertida.Rosa dos Ventos em Moinhos,
discrepante e peripatética nos arredores da vida.
Inventei-me Dulcinéa.Amei as tristes figuras,delirantes Cavaleiros
moldados em armaduras.
Não gosto do jeito escancarado das notícias,bombas arreganhadas dilacerando fetiches.
Retoco a história a giz de cera.Enxerto retalhos de pano,mudo as cores do piano.
Dizem que é doce a escala,pra mim, a Clave é que fala,toca e embala meus bemóis.
A espada, o que tem de beloé o reflexo da fantasia,mantida a todo galope na irreverência do trote.
Alea jacta est, aproxima-se o fim.Saboroso êxtase da morte,Sade enforcando Masoch:
- Sofre, meu bem, por mim.
11
Bondade
por onde andas, na praiaposso ver pegadas
seu corpo afunda o mundodeixa nele suas marcas
sentada na muretaobservo a bondade do vento
sinto o sopro redimindo a areiada crueldade dos pesos
cada grão pisadorecebe das rajadas
a benção da liberdade
12
Pele
essa borda que não me limitame excita
enquanto, contentemeu inconscientecanta um blues
no jardim
pintura de Neusa Ladeira
13
O que quer uma maçã
o feminino habita o desejo da maçãprincípio de bocasessência de manhãs
em mim a menina lambeos lábios
de quem a morde
menina, mulhernão é preciso ensinar
toda a maçã é doceácidavulgar
abriga no ventre as sementesesconde vermes insistentes
seduz, balança e atraiapodrece
e cai
14
Poeira
não acredito em montanhassolidez prensada de pó
nenhum grão vibra sem calor
estrelas não geram areiaengendram leões
15
saudade
alguns momentos tendem à ausência de movimentoo tempo grávido chora
nessa hora, são pequenos soluçosque fazem vibrar o espaço
a velocidade esperaa pressa cora
Tânia Amares é psicóloga e educadora social, Tem poemas publicados na Revista Germina de Literatura e Arte e também naRevista de Poesia e Arte Contemporânea Mallarmargens. Publicou na plataforma de leitura ISSU o livro virtual “Coisias” de poemas para crianças..
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