os traços que fundam a lógica

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Moçambique, 2016 Página 1 OS TRAÇOS QUE FUNDAM A LÓGICA Ezequiel Esperado Artur [email protected] Universidade Pedagógica de Moçambique (Lichinga) Introdução Desde os tempos remotos o homem tem se preocupado na compreensão de toda a realidade que o rodeia, realidade esta que pode ser material ou espiritual, o acto de insatisfação como característico de todo o filósofo também se fez sentir na Antiguidade. Os filósofos antigos(Tales, Anaximandro, Anaxímenes, Platão, Aristóteles Heráclito Parménides e outros) tinham com preocupação primordial a compreensão do Universo, que significa conhece-lo partindo da causa da sua origem, vários contributos relacionados a inquietação foram dados pelos intelectuais do tempo. Foi a partir desta discussão que de uma forma inconsciente, acabavam traçando princípios para uma disciplina da filosofia denominada Lógica, ela surge nos argumentos que tinham por objectivo responder o problema que inquietava os filósofos antigos, na contraposição entre dois filósofos dos nomes: Heráclito e Parménides, e depois sistematizado por Aristóteles, em que uns o concebem como o pai da Lógica. O presente artigo ira abordar aquilo que são os primeiros passos desta disciplina com o objectivo geral de compreender a raiz dos traços que fundam a lógica, e os o específico procurar demonstrar as controvérsias ideologias dos filósofos Heráclito e Parménides, facilitando a melhor compreensão dos princípios lógicos. A Lógica Existe uma diversidade no que diz respeito a definição da lógica, mais em todas as abordagens, num contesto discursivo a lógica tem tido tendência de ser uma ciência que nos leva ao bom pensar e consequentemente ao discurso coerente do raciocínio e com a própria realidade. As questões lógicas associam-se numa perspectiva mais contextualizada a preposições por nos usadas quando pretendemos julgar e justificar a sentença de nos mesmos ou do outrem,

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Page 1: Os traços que fundam a lógica

Moçambique, 2016 Página 1

OS TRAÇOS QUE FUNDAM A LÓGICA

Ezequiel Esperado Artur

[email protected]

Universidade Pedagógica de Moçambique (Lichinga)

Introdução

Desde os tempos remotos o homem tem se preocupado na compreensão de toda a realidade que o

rodeia, realidade esta que pode ser material ou espiritual, o acto de insatisfação como

característico de todo o filósofo também se fez sentir na Antiguidade.

Os filósofos antigos(Tales, Anaximandro, Anaxímenes, Platão, Aristóteles Heráclito Parménides

e outros) tinham com preocupação primordial a compreensão do Universo, que significa

conhece-lo partindo da causa da sua origem, vários contributos relacionados a inquietação foram

dados pelos intelectuais do tempo. Foi a partir desta discussão que de uma forma inconsciente,

acabavam traçando princípios para uma disciplina da filosofia denominada Lógica, ela surge nos

argumentos que tinham por objectivo responder o problema que inquietava os filósofos antigos,

na contraposição entre dois filósofos dos nomes: Heráclito e Parménides, e depois sistematizado

por Aristóteles, em que uns o concebem como o pai da Lógica.

O presente artigo ira abordar aquilo que são os primeiros passos desta disciplina com o objectivo

geral de compreender a raiz dos traços que fundam a lógica, e os o específico procurar

demonstrar as controvérsias ideologias dos filósofos Heráclito e Parménides, facilitando a

melhor compreensão dos princípios lógicos.

A Lógica

Existe uma diversidade no que diz respeito a definição da lógica, mais em todas as abordagens,

num contesto discursivo a lógica tem tido tendência de ser uma ciência que nos leva ao bom

pensar e consequentemente ao discurso coerente do raciocínio e com a própria realidade.

As questões lógicas associam-se numa perspectiva mais contextualizada a preposições por nos

usadas quando pretendemos julgar e justificar a sentença de nos mesmos ou do outrem,

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expressões como“quem semeia vento colhe tempestade”, “você fez, então aguenta com o

prejuízo” e outras do carácter. Associado a isso, podemos ver queestas preposições assemelham-

se a questão de causa-efeito, em que quando temos o factor que pode causar alguma coisa

evidentemente esperamos as consequências da mesma.

Pressupõe-se que para se chegar a qualquer conclusão exista uma coerência do que prevíamos

partindo de causas conhecidas, com o que a posteriori vira acontecer relacionando-se com a

causa, esta que temos em mente. Caso isso falhe ou não aconteça entramos em pânico, pois a

nossa consciência nos alerta da existência de algum erro visto que não houve coerência da causa

e o efeito. Partindo duma das preposições acima usando-a como apoio para salientar isto, seria

absurdo plantar vento e colher algo muito diferente deste, por exemplo afirmar o seguinte “quem

semeia vento, colhe calor”.

A partir deste pressuposto nota-se a necessidade de existência de uma coerência, ou

concordância nos nossos discursos para que se tornem perceptivos e não entremos em

contradição nos ouvidos de quem nos houve e connosco mesmo, assim respeitando os princípios

da lógica.

CHAUI (2000, p.127),demonstra que as palavraslógicase lógico são usadas por nós para

significar:

1. Ou uma inferência: visto que conheçox, disso posso concluir ycomo consequência;

2. Ou a exigência de coerência: visto que xé assim, então é preciso que yseja assim;

3. Ou a exigência de que não haja contradição entre o que sabemos de x e a conclusão y a que

chegamos;

4. Ou a exigência de que, para entender a conclusão y, precisamos saber o suficiente sobre xpara

conhecer por que se chegou a y.

CHAUI (2000, p. 127) afirma que Inferência, coerência, conclusão sem contradições, conclusão

a partir de conhecimentos suficientes são algumas noções implicitamente pressupostas por nós

toda vez que afirmamos que algo é lógico ou ilógico.

No primeiro caso, se conhecemos a causa no seu acto vira a consequência.

Por exemplo:

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O açúcar consumido ao excesso faz mal.

Ora, o João consume demais o açúcar.

Então, o João passara mal.

No segundo caso, seria absurdo nos apoiando do exemplo acima concluir que o João passara

bem.

No terceiro caso, não estaria certo a não coerência do que sabemos com a conclusão, temos

conhecimento que “o açúcar consumido ao excesso faz mal”, virmos concluir algo contrário

como fruto do que conhecemos.

E no quarto caso, pressupõe-se que para conhecer o “mau estado de João” que é o efeito de algo,

haja necessidade de conhecermos a causa, neste caso o “consumo excessivo do açúcar”.

O aparecimento da Lógica: A contradição entre Heraclito e Parménides

Como muitas das outras descobertas, a Grécia surge como a primeira civilização que se

preocupou com a origem da Phisys (Universo, e tudo que tem nele), discussão esta que envolveu

vários filósofos antigos como Tales de Mileto, Anaximandro, Anaxímenes, Heraclito,

Parménides e outros. Estes dois últimos procurando expor as suas ideias filosóficas sobre a

origem do universo acabam dando alguns princípios essenciais da lógica. Esta preocupação

assentava-se na preocupação da procura da causa real, o que na Idade Media foi concebida como

algo Divino que os filósofos Medievais denominaram como o Motor imóvel, mas que move

todas as coisas (Deus).

Heráclito: Movimento = Mutação = Contraste = DEVIR.

Heráclito nasce em Éfeso na cidade Jónica, filosofo que evitou da todas as formar se influenciar

na política, desprezava os poetas do seu tempo, e foi um dos Filósofos mais solitários visto que

raramente se apresentava em multidões, um homem de carácter insocial.

Este filosofo, concebia que a única origem da tudo, neste caso, o Universo como algo que estava

em constante mudança, era a acção que no acto da movimentação surgia algo de novo, ou seja,

partindo de um movimento dos contrários surgia algo de novidade, em que esta novidade era o

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produto, e o movimento do produto surgia algo que também era novo e diferente. Para ele

somente isto era real, apenas o movimento é real.

Heraclito afirmava que somente o devir ou a mudança é real. O dia se torna noite, o inverno se torna primavera, esta se torna verão, o húmido seca, o seco humedece, o frio esquenta, o quente esfria, o grande diminui, o pequeno cresce, o doente ganha saúde, a treva se faz luz, esta se transforma naquela, a vida cede lugar à morte, esta dá origem àquela (CHAUI, 2000, p.127).

Este ponto de racionalidade desse filósofo se designava por “PantaRhei”, que significa: nada

esta imóvel. A harmonia dos contrários ou dos opostos é a única responsável pela ordem racional

do universo, ele demonstra isto numa das suas frases que diz o seguinte: “Nos somos e não

somos”, “ Não podemos emergir duas vezes no mesmo rio”, pois não seremos os mesmos e nem

a água do rio também.

O movimento contínuo é a harmonia, que é mutação, e este é o Devir. Existe uma autêntica

dinâmica dos contrastes, uma espécie de luta dos contrários, esta guerra é a mãe de todas as

coisas, a mãe do Universo.

Tudo se gera por meio de contrastes: A doença torna doce a saúde, há justiça porque existe a

ofensa ou a injustiça, existe a guerra por que também existe a paz. A harmonia dos opostos

mediante o movimento é o princípio, “o Ser não é mais do que o Não-Ser”.

Parménides: Identidade do Ser

Se tornou celebre por ter contrariado a concepção Heraclitiana acerca do Ser na discussão sobre

a origem do Universo. Este demonstra em seus argumentos a incapacidade das sensações, das

percepções e lembranças na aquisição da realidade, fazendo com que as pessoas confundam a

própria realidade. O que Heráclito concebia como o Ser, portanto a origem de todas as coisas

acaba sendo visto como o contrário e muito distante daquilo que ele pensava que fosse por

Parménides.

Parménides, porém, afirmava que o devir, o fluxo dos contrários, é uma aparência, mera opinião que formo porque confundimos a realidade com as nossas sensações, percepções e lembranças. O devir dos contrários é uma linguagem ilusória, não existe, é irreal, não é. É o Não-Ser, o nada, impensável e indizível. O que existe real e verdadeiramente é o que não muda nunca, o que não se torna oposto a si mesmo, mas permanece sempre idêntico a si mesmo, sem contrariedades internas. É o Ser (CHAUI, 2000, p.127).

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Defendia que há dois caminhos na concepção da verdade: O da Filosofia, que se baseava na

razão, e o caminho da Crendice, que é das opiniões pessoais, neste caso das aparências. O

caminho da Filosofia, o que os filósofos tinham que seguir era o da essência, o caminho que

existe o SER e não o NÃO-SER, existe o Ser e seria absurdo concebermos a sua não existência,

para este filosofo quando a realidade é pensada pelo caminho da aparência tudo se confunde em

função do movimento, a pluralidade e o Devir. Para que se fale de algo que move, ou que é a

causa do Universo, seria necessário que se determine, ou seja, não pode se conceber como a

causa do movimento algo sem Identidade, algo que esta em constante movimento, pois acabamos

não sabendo o que ele é e consequentemente não entrando em concordância com o nosso

objectivo, com isso, é aconselhável o esforço do filósofo em não aderir as realidades aparentes

como conhecimento verdadeiro.

Na contraposição entre estes dois filósofos da idade antiga com concepções diferentes acerca da

origem do Universo, emerge os princípios fundamentais da lógica, que depois são sistematizados

por Aristóteles, princípios que se denominam de Identidade, o de não-contradição e terceiro

excluído. O princípio de identidade: segundo esteprincípio alguma coisa é o que é e só deve ser

ele mesmo, “o que é, é”, “o que não é, não é”; o principio de não-contradição, é inconcebível

que algo seja, e não seja ao mesmo tempo, não podemos ser e não ser simultaneamente, “uma

coisa não pode ser, e não ser ao mesmo tempo” e o de terceiro excluído: “uma coisa é, ou não

é”, não existe a terceira alternativa.

Comparando a lógica do pensamento que estes filósofos tiveram na defesa das suas teses,

notamos uma forte alienação do dinamismo das coisas por parte de Heráclito e a firmeza da

aceitação estática das coisas que existe no pensamento Parmenidiano.

Definição da lógica

Como vimos nas páginas anteriores, existem varias definições da lógica mas todas tem por

conclusão uma finalidade unânime.

CUBAL (s/d, p.1), dá as seguintes definições da lógica:

A lógica é o estudo das inferências ou argumentos válidos;

A lógica estuda o processo de inferência para demonstrar a validade dos argumentos;

A lógica é a parte mais objectiva da Filosofia;

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A lógica é, no seu sentido etimológico, a ciência do logos (razão, discurso, norma,

fundamento);

A lógica é o estudo das condições de coerência do pensamento e do discurso.

Fazendo um estudo filosófico nestas definições, notamos que por mas numerosas que sejam, todas

nos induzem a uma única finalidade, que é: o bom pensar, o pensamento correto, a coerência do

pensamento, que pode ser no contexto formal ou material.

Divisão da lógica

Numa primeira fase a lógica surge como um saber a priori da filosofia, esta sendo a mãe de todo

o saber. Até aos finais da idade media com o surgimento de novas ciências como a Matemática,

Física, Biologia e outras, esta (lógica) passa a ser aplicada em outras áreas de saber fora da

Filosofia auxiliando a Cibernética, inteligência artificial a informática e outras.

A lógica, apesar da vasta aplicação, que leva para além dos limites de qualquer disciplina isolada, caminha com maior desenvoltura, especialmente na filosofia, na matemática, ciência da computação. Os padrões da crítica da lógica podem ser aplicados a qualquer campo de conhecimento (CERVO, 2016, p.81).

Alógica como ciência ela e dividida em grandes classificações denominadas por lógica formal e

a lógica material (menor), e a lógica material (maior).

Lógica formal

A lógica formal é a área do saber Lógico e Filosófico que se desenvolveu por Aristóteles no

século IV a.C. e tem como objectivo analisar as formas do correto pensar.

Na lógica formal, nos preocupamos com a coerência ou com a concordância formal do

discurso, esta preocupa-se com a questão do bem pensar na dimensão discursiva ou seja, na

questão formal.

Lógica material

No queserefere a lógica material, ela tem a preocupação de certificar o que se diz no contexto

formal com a realidade, ou seja, ela procura saberse há coerência entre o que é dito com o que se

vê, neste caso a realidade concreta, conforme Cervo (2016, p.82), analisa as condições de certeza,

relacionada à lógica maior ou material, o que se entende por verdade e erro, bem como os sofismase

o critério de certeza.

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Esta lógica tem como suas ferramentas ou instrumentos,os conceitos, juízos e raciocínio que poderão

funcionar correctamente mediante os princípios lógicos que vimos que são: princípio de identidade,

de não-contradição e do terceiro excluído que vimos acima.

Conclusão

Finalizando a revisão, conclui-se que a lógica não foi primeiramente colocada em um debate

com o propósito de procurar a forma de como deveria se fundar, mais surge duma forma

espontânea na discussão do problema que estava no centro das atenções na idade antiga.

Problema este que tinha por objectivo principal o conhecimento do universo, que teve lugar na

Grécia. Ela teve como principais figuras três filósofos que são Heraclito, Parménides e a

posteriori a sua sistematização por um discípulo de Platão de nome Aristóteles que muitos o

consideram como o pai da Lógica.

Bibliografia

CHAUI, Marilena. Convite à Filosofia, Ed. Ática, São Paulo, 2000.

CUBAL, Francisco. A lógica, s/ed, s/ed., s/d.

CERVO, Amauri Paulo. Algumas considerações sobre a lógica, saber Humano, ISSN 2446-6298, edição Especial: Caderno de Ontopsicologia, p.74-89, fev. 2016.