t(h)ree no ponto final em macau [pt]

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TER 30 de Março de 2010 8 Cultura Projecto T(H)REE vai ser lançado em Maio 33 projectos, 17 originais, 3 territórios, 1 álbum É um projecto único que pretende ser inspiração para músicos e para todos os que acreditam no poder das interacções culturais através da música. Algo como T(h)ree nunca antes havia sido feito, juntando músicos de Macau, Hong Kong e Portugal. O resultado da fusão está prestes a ser conhecido. T(H)REE Um Projecto Musical entre Macau, Hong Kong e Portugal Paulo Barbosa J untar pela primeira vez no mesmo projecto músicos de Macau, de Hong Kong e de Portugal. É esta a ideia sub- jacente ao projecto “T(h)ree”, cujo disco será lançado em Maio.Ao todo, estão envolvidas 33 bandas, 17 faixas originais e, na estimativa do mentor do projecto, David Valentim, cerca de 100 músicos. Todos foram desafiados a fazer parcerias com artistas de outras paragens,com que tivessem alguma afinidade estética. Valentim baralhou e deu as cartas. O resultado é único. “Em dois pontos diametral- mente opostos do mundo, duas pessoas fazem exactamente os mesmos gestos, entram em casa e a luz acende-se”, ouve- se na faixa “The Double Life of Jeremy Bentham”, que junta os portugueses Erro! aos A.O.S., de Hong Kong. A letra adequa-se ao tom que perpassa por todo o dis- co. Como não juntar criadores oriundos de“dois pontos diame- tralmente opostos do mundo” sem sentir uma certa estranhe- za? Mas a verdade é que, mes- mo em lugares tão distantes, os gestos podem ser os mesmos. E parcerias entre pontos opostos são frequentemente frutuosas, como reconhecem os promo- tores de “T(h)ree, que fazem a apologia do multiculturalismo: “É tempo de nos orgulharmos das nossas raízes culturais, pro- movê-las e partilhá-las com o mundo. Sem saudosismos, mas com o caminho delineado para o futuro como um novo meio de aproximar os povos. A música é uma das formas mais eficazes de interligação entre pessoas cul- turalmente distantes. Portugal, Hong Kong e Macau têm novas vozes, novas formas de expres- são prontas para serem ouvidas através das suas singulares mu- sicalidades.Estes músicos mere- cem ser escutados, promovidos e apreciados”. O primeiro volume deste projecto musical inédito está prestes a ver a luz do dia. Por esta altura, está a ser feita a re- masterização de todas as faixas e finalização do grafismo e dos textos que acompanharão o álbum. Mas não foi fácil juntar tanta gente no mesmo barco. O plano começou a ser gi- zado há 15 meses, após uma conversa entre David Valentim e músico dos Evade,uma banda electrónica de Macau que estava a trabalhar num álbum.“Como sou amigo deles, perguntaram- me se havia alguém que pudes- se fazer remisturas. Comecei a pensar em juntar uma banda portuguesa ou um DJ e também bandas de Hong Kong”,recorda o produtor. Fruto da sua experi- ência nos três territórios – é por- tuguês,já viveu em Macau e resi- de actualmente em Hong Kong, onde tem estado envolvido em vários iniciativas, entre elas a or- ganização do festival Flash, que foi realizado três vezes, duas em Macau e uma outra em Hong Kong –, Valentim começou a imaginar um projecto musical de fusão entre os três territórios. O mais próximo que disso tinha sido feito,segundo se lembra,foi uma gravação envolvendo o Rão Kyao e uma orquestra chinesa tradicional.Nada que tenha a ver com género musical deT(h)ree, mais alternativo e moderno. Contactados os músicos nos três locais, foi preciso tempo para fazer com que se moti- vassem, dado que “não lhes era dado nada a não ser a ideia”, re- memora DavidValentim. “Houve bandas que saíram e bandas que entraram ao longo de todo o processo. Ao princípio tínha- mos dez músicas, depois fui-me entusiasmando e convidei mais gente,para colmatar alguns esti- los musicais que não estavam a ser englobados.” O critério para escolha dos projectos envolvidos prendeu- se primeiramente “com a qua- lidade, depois com o grau de experimentalismo que todas as bandas conseguem dar nas suas obras e procurou-se juntar algumas bandas de carácter di- ferente para que no final o re- sultado seja muito diferente das músicas que estão habituados a mostrar em público”,descreve o produtor. “Escolhi as bandas nos três territórios que mais garan- tias me dão de qualidade e que exploram mais outros géneros musicais,para além daqueles em que estão inseridos”. O resultado de tantas com- binações foi, na visão de David Valentim, “uma espécie de ‘melting pot’, ninguém sabia, à partida, o que é que haveria de esperar, mas isso, por si só, era motivo de interesse”. O mentor de T(h)ree, que tem formação em arquitectura, destaca os mé- ritos do produto final que está prestes a ser apresentado ao público e que é composto, na grande maioria,por músicas que foram propositadamente feitas para o álbum, se bem que haja algumas versões originais,nunca antes publicadas Para além do disco,os promo- tores pretendem levar as bandas portuguesas que participam neste projecto a Hong Kong e Macau e fazê-las colaborar em palco com as bandas com quem fizeram parceria neste projecto, colocando o resultado das gra- vações ao vivo. Mas, ressalva Valentim, “bandas actuais, que estão a dar cartas hoje em dia e não nos anos 90 ou 80, como algumas que vão passando em Macau”. Outros dos objectivos anunciados passam por levar músicos de Macau e de Hong

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Reportagem nas páginas centrais sobre o Projecto T(h)ree, com entrevista a David Valentim, produtor do projecto. [30 MAR 2010]

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Page 1: T(h)ree no Ponto Final em Macau [pt]

TER 30 de Março de 2010

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Cultura

Projecto T(H)REE vai ser lançado em Maio

33 projectos, 17 originais, 3 territórios, 1 álbumÉ um projecto único que pretende ser inspiração para músicos e para todos os que acreditam no poder das interacções culturais através da música. Algo como

T(h)ree nunca antes havia sido feito, juntando músicos de Macau, Hong Kong e Portugal. O resultado da fusão está prestes a ser conhecido.

T(H)REEUm Projecto Musical entre Macau, Hong Kong e Portugal

Paulo Barbosa

Juntar pela primeira vez no mesmo projecto músicos de Macau, de Hong Kong e

de Portugal. É esta a ideia sub-jacente ao projecto “T(h)ree”, cujo disco será lançado em Maio. Ao todo, estão envolvidas 33 bandas, 17 faixas originais e, na estimativa do mentor do

projecto, David Valentim, cerca de 100 músicos. Todos foram desafiados a fazer parcerias com artistas de outras paragens, com que tivessem alguma afinidade estética. Valentim baralhou e deu as cartas. O resultado é único.

“Em dois pontos diametral-mente opostos do mundo, duas pessoas fazem exactamente os mesmos gestos, entram em

casa e a luz acende-se”, ouve-se na faixa “The Double Life of Jeremy Bentham”, que junta os portugueses Erro! aos A.O.S., de Hong Kong. A letra adequa-se ao tom que perpassa por todo o dis-co. Como não juntar criadores oriundos de “dois pontos diame-tralmente opostos do mundo” sem sentir uma certa estranhe-za? Mas a verdade é que, mes-mo em lugares tão distantes, os gestos podem ser os mesmos. E parcerias entre pontos opostos são frequentemente frutuosas, como reconhecem os promo-tores de “T(h)ree, que fazem a apologia do multiculturalismo: “É tempo de nos orgulharmos das nossas raízes culturais, pro-movê-las e partilhá-las com o mundo. Sem saudosismos, mas com o caminho delineado para o futuro como um novo meio de aproximar os povos. A música é uma das formas mais eficazes de interligação entre pessoas cul-turalmente distantes. Portugal, Hong Kong e Macau têm novas vozes, novas formas de expres-são prontas para serem ouvidas através das suas singulares mu-sicalidades. Estes músicos mere-cem ser escutados, promovidos e apreciados”.

O primeiro volume deste projecto musical inédito está prestes a ver a luz do dia. Por esta altura, está a ser feita a re-masterização de todas as faixas e finalização do grafismo e dos textos que acompanharão o álbum. Mas não foi fácil juntar tanta gente no mesmo barco.

O plano começou a ser gi-zado há 15 meses, após uma conversa entre David Valentim e músico dos Evade, uma banda electrónica de Macau que estava a trabalhar num álbum. “Como sou amigo deles, perguntaram-me se havia alguém que pudes-se fazer remisturas. Comecei a pensar em juntar uma banda portuguesa ou um DJ e também bandas de Hong Kong”, recorda o produtor. Fruto da sua experi-ência nos três territórios – é por-tuguês, já viveu em Macau e resi-de actualmente em Hong Kong, onde tem estado envolvido em vários iniciativas, entre elas a or-ganização do festival Flash, que foi realizado três vezes, duas em Macau e uma outra em Hong Kong –, Valentim começou a imaginar um projecto musical de fusão entre os três territórios. O mais próximo que disso tinha sido feito, segundo se lembra, foi

uma gravação envolvendo o Rão Kyao e uma orquestra chinesa tradicional. Nada que tenha a ver com género musical de T(h)ree, mais alternativo e moderno.

Contactados os músicos nos três locais, foi preciso tempo para fazer com que se moti-vassem, dado que “não lhes era dado nada a não ser a ideia”, re-memora David Valentim. “Houve bandas que saíram e bandas que entraram ao longo de todo o processo. Ao princípio tínha-mos dez músicas, depois fui-me entusiasmando e convidei mais gente, para colmatar alguns esti-los musicais que não estavam a ser englobados.”

O critério para escolha dos projectos envolvidos prendeu-se primeiramente “com a qua-lidade, depois com o grau de experimentalismo que todas as bandas conseguem dar nas suas obras e procurou-se juntar algumas bandas de carácter di-ferente para que no final o re-sultado seja muito diferente das músicas que estão habituados a mostrar em público”, descreve o produtor. “Escolhi as bandas nos três territórios que mais garan-tias me dão de qualidade e que exploram mais outros géneros

musicais, para além daqueles em que estão inseridos”.

O resultado de tantas com-binações foi, na visão de David Valentim, “uma espécie de ‘melting pot’, ninguém sabia, à partida, o que é que haveria de esperar, mas isso, por si só, era motivo de interesse”. O mentor de T(h)ree, que tem formação em arquitectura, destaca os mé-ritos do produto final que está prestes a ser apresentado ao público e que é composto, na grande maioria, por músicas que foram propositadamente feitas para o álbum, se bem que haja algumas versões originais, nunca antes publicadas

Para além do disco, os promo-tores pretendem levar as bandas portuguesas que participam neste projecto a Hong Kong e Macau e fazê-las colaborar em palco com as bandas com quem fizeram parceria neste projecto, colocando o resultado das gra-vações ao vivo. Mas, ressalva Valentim, “bandas actuais, que estão a dar cartas hoje em dia e não nos anos 90 ou 80, como algumas que vão passando em Macau”. Outros dos objectivos anunciados passam por levar músicos de Macau e de Hong

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Cultura

Forró político chega a Macau“Vem prá cá mulher madura / Vem prá cá mulher fogosa / Há um ditado que diz /Lavou, enxugou, tá nova...”. A estrofe é de um dos grandes êxitos de Frank Aguiar, músico e político brasileiro que actua em Macau a 9 de Abril. O concerto da estrela do forró nordestino está marcado para a sala The Lagoon, no hotel-casino Landmark.Aguiar, que já gravou 24 discos, é também um político activo, actualmente vice-prefeito da cidade de São Bernardo do Campo. Antes, em 2007, concorreu pelo Estado de São Paulo e foi eleito deputado federal com mais de 144 mil votos.O percurso de Frank, nascido em Itainópolis, interior do Estado do Piauí, faz-se na Universidade Federal do Piauí-UFPI, onde estudou Música. Formou-se depois em Direito pela Universidade Paulista. De acordo com o seu site oficial, começou a tocar em bares ainda criança. Em 1992, decide profissionalizar o que não passava de um hobbie e grava uma série discos. Músicas como “Mulher Madura” e “Prenda” são ainda hoje das preferidas do público, garante a biografia do autor disponível na sua página pessoal.Aguiar, que já actuou nos EUA e no Japão, chega agora a Macau trazido pelo Landmark, com o apoio da Casa do Brasil e de Freddie Ritchie, músico macaense radicado no Brasil. O concerto, informa o hotel-casino, contará com a presença de dançarinas brasileiras – haverá ainda comida típica do Brasil a a acompanhar a noite de ‘arrasta-pé’ ou ‘bate-chinela’.

Kong para a Europa e por criar uma continuidade, incentivan-do os músicos locais a produ-zir mais música, para que no futuro existam mais projectos do género. Continuidade essa que envolve a gravação de mais álbuns, sempre com Portugal e Macau como elos de ligação, sendo que o terceiro território poderá ir mudando.

Para que haja continuidade, serão precisos apoios e Valentim admite que talvez seja mais fácil obter obtê-los, para um projecto com este conceito, em Macau e Portugal. “Mas estou a obter apoios também em Hong Kong da parte dos media locais, que estão a prestar alguma atenção a este projecto, porque há mui-tas bandas reconhecidas a nível local envolvidas neste projecto”, descreve.

O projecto T(h)ree surge cunhado como um empreendi-mento da era da comunicação instantânea, em que artistas que

estão distantes fisicamente po-dem comunicar as suas ideias e criações através da Internet. O produtor concorda que este factor é decisivo para o concluir que T(h)ree não seria possível, por exemplo, há uma década. Mas acha que há também um factor qualitativo a considerar: ”A questão da Internet é incon-tornável, gerou-se tudo através da Internet. Mas há dez anos a qualidade das bandas a nível de Hong Kong e Macau não era tão elevada. Nos anos 90 em Portugal, as coisas estavam um bocado adormecidas. Em termos de música, essa década não foi também importante em Hong Kong e Macau. Hong Kong estava muito ligada à mú-sica britânica, tinha pouca ino-vação e as bandas que surgiam eram mais uma espécie de có-pia da música do Reino Unido. Em Macau, a música local era muito fraca, só no princípio desta década é que começaram

a surgir bandas mais ligadas à música electrónica, porque não há muitos locais de gravação, onde as bandas consigam pra-ticar a sua música. Portanto, é uma música feita de forma mais caseira, que pode ser feita em computador. Isso tem sido de-senvolvido a um grau muito ele-vado em Macau, o que muitos locais desconhecem. A música electrónica em Macau é muito apreciada em Hong Kong e é muito forte. Há 10 anos atrás isto era impossível fazer algo como “T(h)ree” em Macau ou em Hong Kong.”

Vendas para doarAntónio Falcão, o mentor da

Bloom, que vai editar o disco, concorda com essa impossibi-lidade de concretizar um pro-jecto deste género há uns anos. “É claro que há 10 anos já havia projectos de pessoas a trabalhar em sítios diversos. Mas era im-possível pôr pessoas a trabalhar

à distância”, refere.O fotógrafo confirma que

o projecto se encontra “em fase de angariação de patrocí-nios, não só para o disco, mas para possíveis concertos futu-ros”. Depois do lançamento em Hong Kong e Macau, está previsto que o álbum seja lan-çado em Portugal, no mês de Setembro. Para acompanhar o disco, estão a ser produzidos videoclips e imagens dos con-certos, e será criado um site próprio do projecto, para além do já existente endereço no Myspace (http://www.myspa-ce.com/projectothree).

O disco terá suporte financei-ro dos patrocinadores que estão a ser angariados nos três terri-tórios e não tem um propósito comercial. A maquia gerada pela venda do álbum vai ser doada a associações de intervenção social e cultural, designadamen-te a Unicef, em Hong Kong, a Anima – Sociedade Protectora

dos Animais de Macau e o pro-jecto ambiental Na Terra, que está a estabelecer uma base em Timor Leste.

Em termos de repertório, Falcão salienta que as “bandas foram escolhidas porque tinham alguma semelhança no estilo e conceito, não se juntaram ban-das muito distintas, tinha que haver sempre qualquer coisa que as pudesse unir”. Fruto das parcerias, terá havido algu-ma orientalização dos artistas europeus e europeização dos asiáticos? “Houve a tendência para fazer coisas mais fora do que aquilo que costumam fazer, dar um toque mais oriental. Há letras cantadas em chinês, por exemplo”, responde.

O rosto da Bloom esclarece que as bandas foram escolhi-das e emparelhadas por David Valentim, mas foi a editora que sugeriu alguns aspectos, tais como a integração de António Conceição, conhecido pelo

nome artístico de ‘O Monstro’, que já tinha editado um álbum com a Bloom, lançado em Portugal e actualmente esgota-do. Conceição surge creditado como um artista de Portugal, embora tenha raízes familiares em Macau, onde voltou a resi-dir recentemente. O facto de se exprimir em português leva-o a assumir-se como “cantautor português”, embora hoje, dada a mudança de residência, admita que possa ser visto “como um artista de Macau”. A sua parti-cipação no projecto T(h)ree resumiu-se a entregar uma com-posição que já tinha criado para que alguém – Lobo, um DJ de Macau – a remasterizasse. O mú-sico considera que o projecto “já é de sucesso pelo facto de ter conseguido juntar três pontos geográficos tão distintos” e refe-re que “interessa que as pessoas adiram pela causa [caritativa] e pelo produto que está associado à causa”.