texto fisiologia da dor

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I. Introdução I.1 - Fisiopatologia da Dor A dor é um mecanismo de proteção do corpo. Uma das funções mais importantes do sistema nervoso é fornecer informações sobre a ameaça ou ocorrência de lesão. A dor ocorre sempre na presença da lesão de qualquer tecido, o que leva a uma reação para eliminar o estímulo doloroso. A percepção corporal da dor é denominada nocicepção. I.1.1 Nocicepção Nocicepção é a percepção de um estímulo potencialmente lesivo aos tecidos. A percepção dolorosa é desencadeada por estímulos nocivos que são transformados em potenciais de ação e transferidos pelas fibras nervosas ao sistema nervoso central. Os nociceptores são terminações nervosas livres presentes nas fibras A e C, ativados por estímulos que ameaçam ou produzem lesão tecidual. Os nociceptores podem responder a uma modalidade exclusiva como substâncias químicas e ao calor, enquanto outros são sensíveis a vários estímulos nóxicos. Existem três tipos de nociceptores, os mecanorreceptores, sensíveis a estímulos mecânicos, os termorreceptores, sensíveis a estímulos térmicos e os polimodais que respondem a estímulos mecânicos, térmicos e químicos. Os nociceptores térmicos são ativados por temperaturas extremas, > 45ºC ou < 5º C e possuem fibras A δ que conduzem os sinais na velocidade de 5 a

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  • I. Introduo

    I.1 - Fisiopatologia da Dor

    A dor um mecanismo de proteo do corpo. Uma das funes mais

    importantes do sistema nervoso fornecer informaes sobre a ameaa ou

    ocorrncia de leso. A dor ocorre sempre na presena da leso de qualquer

    tecido, o que leva a uma reao para eliminar o estmulo doloroso. A percepo

    corporal da dor denominada nocicepo.

    I.1.1 Nocicepo

    Nocicepo a percepo de um estmulo potencialmente lesivo aos

    tecidos. A percepo dolorosa desencadeada por estmulos nocivos que so

    transformados em potenciais de ao e transferidos pelas fibras nervosas ao

    sistema nervoso central. Os nociceptores so terminaes nervosas livres

    presentes nas fibras A e C, ativados por estmulos que ameaam ou produzem

    leso tecidual. Os nociceptores podem responder a uma modalidade exclusiva

    como substncias qumicas e ao calor, enquanto outros so sensveis a vrios

    estmulos nxicos. Existem trs tipos de nociceptores, os mecanorreceptores,

    sensveis a estmulos mecnicos, os termorreceptores, sensveis a estmulos

    trmicos e os polimodais que respondem a estmulos mecnicos, trmicos e

    qumicos. Os nociceptores trmicos so ativados por temperaturas extremas, >

    45C ou < 5 C e possuem fibras A que conduzem os sinais na velocidade de 5 a

  • 30 m/s. Os nociceptores mecnicos tambm possuem fibras A, so ativados por

    uma presso intensa sobre a pele e conduzem os sinais na mesma velocidade. Os

    receptores polimodais so ativados por estmulos mecnicos, qumicos ou trmicos

    e possuem fibras C, que conduzem os sinais em velocidade inferior a 1.0 m/s.

    As trs classes de nociceptores so amplamente distribudas na pele e nos

    tecidos profundos e frequentemente atuam conjuntamente. As vsceras contm

    nociceptores silenciosos que no so ativados por estimulao nxica, todavia, o

    seu limiar intensamente reduzido na presena de inflamao e agresso

    qumica. Logo, a ativao dos nociceptores silenciosos pode contribuir para o

    desenvolvimento de hiperalgesia secundria e sensibilizao central.

    O mecanismo pelo qual os estmulos nocivos despolarizam as terminaes

    nervosas livres e geram potenciais de ao desconhecido. A membrana do

    nociceptor contm protenas que convertem os estmulos nxicos mecnicos,

    trmicos e qumicos em potencial eltrico de despolarizao.

    I.1.2 - Fibras aferentes primrias nociceptivas

    A partir dos nociceptores, as fibras nervosas aferentes primrias

    responsveis pela transmisso do estmulo doloroso at a medula espinhal, so

    denominadas fibras nociceptivas. De acordo com o seu dimetro, presena ou

    grau de mielinizao, velocidade de conduo e distribuio das fibras, os

    neurnios aferentes primrios podem ser classificados em A, B e C. As fibras A

    so subdividas em mielinizadas A, A, A e A, as fibras B so representadas

    pelos neurnios pr-ganglionares simpticos e as fibras C constituem as fibras no

  • mielinizadas. As fibras finas no mielinizadas C, e as de mdio calibre mielinizadas

    A detectam os estmulos nxicos qumicos, trmicos e mecnicos e transportam a

    informao nociceptiva principalmente para as lminas superficiais I e II e

    profundas V e VI do corno posterior, bem como para a lmina X. Por outro lado, as

    fibras de grande calibre, mielinizadas A transmitem a informao para as lminas

    mais profundas III a VI (Millan, 2002).

    I.1.3 - Corno dorsal

    O corno dorsal da medula espinhal o principal stio receptor das fibras

    aferentes primrias. As fibras aferentes nociceptivas terminam predominantemente

    no corno dorsal da medula espinhal onde fazem sinapse com as vias ascendentes

    transmitindo a informao ao crebro, que a base da percepo da dor. Alm

    disso, o corno dorsal contm circuitos neuronais que esto comprometidos na

    gerao dos reflexos locais. Na teoria do controle da dor, Melzack e Wall (1965)

    propuseram que interneurnios inibitrios localizados no corno dorsal

    desempenham um importante papel na informao sensorial. Durante os ltimos

    40 anos, estudos intensos tentam esclarecer sobre este circuito, que ainda

    pouco conhecido.

    O corno dorsal contm quatro principais componentes neuronais:

    1 terminaes centrais dos axnios aferentes primrios, que se ramifica em

    diferentes reas, dependendo do seu dimetro e dos diferentes estmulos a que

    eles respondem;

    2 neurnios intrnsecos que tem axnios que permanecem na medula espinhal,

    ou se estendem a outros segmentos espinhais.

  • 3 neurnios de projeo, que atravessam a substncia branca para alcanar

    vrias partes do crebro.

    4 axnios descendentes que se originam de diversas regies do crebro e tem

    um importante papel na modulao da informao nociceptiva.

    O corno dorsal pode ser dividido em seis lminas (I-VI), de acordo com a

    morfologia celular, bioqumica das unidades celulares, atividade celular por

    estmulos de diferente natureza ou em funo da origem das fibras de projeo

    suprassegmentares (Figura 1).

    Figura 1: Corno dorsal e suas lminas. Fibras aferentes 1rias

    e as respectivas sinapses: as fibras A

    fazem sinapse com neurnios da lmina I e V, as fibras C com os interneurnios da Lmina II e as

    A com os dendritos na lmina IV. Observar que o interneurnio faz sinapse com os neurnios de

    projeo.

    As lminas de VII a IX constituem o corno ventral ou anterior e a lmina X

    circunda o canal central.

  • Neurnios aferentes primrios, que transportam diferentes modalidades,

    terminam em lminas distintas do corno dorsal. H uma ntida correlao entre a

    organizao funcional e anatmica dos neurnios no corno dorsal. Os neurnios

    nociceptivos fazem sinapse na camada marginal, tambm chamada de lmina I e

    na substncia gelatinosa, lmina II. A maioria desses neurnios recebe impulsos

    diretamente de fibras mielinizadas A e indiretamente de fibras no mielinizadas C.

    Muitos dos neurnios da camada marginal respondem exclusivamente a

    estimulao nxica e, portanto so chamados de neurnios nociceptivos

    especficos e transmitem a informao aos centros superiores no crebro. Alguns

    neurnios nesta camada, chamados de neurnios de largo espectro (wide dynamic

    range), respondem de forma gradual a estimulao mecnica nxica e no nxica.

    A substncia gelatinosa constituda quase que exclusivamente de interneurnios

    excitatrios e inibitrios, que respondem exclusivamente a impulsos nociceptivos

    enquanto outros tambm respondem a estmulos no nxicos.

    A lmina III e IV localizadas na parte ventral da substncia gelatinosa

    contm neurnios que recebem impulsos das fibras A. Esses neurnios

    respondem predominantemente a estmulos no nxicos. A lmina V contm

    principalmente neurnios de largo espectro que retransmitem os sinais ao tlamo e

    tronco cerebral. Esses neurnios recebem impulsos monossinpticos de fibras A

    e A. Eles tambm recebem impulsos de fibras C diretamente de seus dendritos

    ou indiretamente via interneurnios, os quais recebem impulsos diretamente das

    fibras C. Muitos neurnios na lmina V recebem impulsos nociceptivos das

    estruturas viscerais.

  • A convergncia de impulsos nociceptivos somticos e viscerais para a

    lmina V poderia explicar a dor referida, uma condio onde a dor por leso em

    estrutura visceral deslocada para outras reas do corpo. A explicao para esse

    fenmeno que um nico neurnio de projeo recebe impulsos de ambas as

    regies. Como conseqncia os centros superiores no conseguem discriminar a

    origem do impulso e incorretamente atribuem a dor pele, possivelmente porque

    h predominncia do impulso cutneo.

    Os neurnios da lmina VI recebem impulsos de fibras aferentes de grande

    dimetro dos msculos e articulaes e respondem a manipulaes no nxicas

    das articulaes. Esses neurnios parecem que no contribuem para a

    transmisso das mensagens nociceptivas. Os neurnios das lminas VII e VIII,

    muitos dos quais respondem a estmulos nxicos, tm uma resposta mais

    complexa porque os impulsos nociceptivos desta lmina VII so polissinpticos.

    Alm disso, embora a maioria dos neurnios do corno dorsal recebam impulsos

    apenas de um lado do corpo, alguns neurnios da lamina VII respondem a

    estimulao de ambos os lados. Portanto, os neurnios da lmina VII, atravs suas

    conexes com a formao reticular do tronco cerebral pode contribuir para a

    natureza difusa de muitas condies dolorosas.

    I.1.4 Neurotransmissores

    Diversos neurotransmissores, aminocidos e neuropeptdeos so liberados

    pelas terminaes aferentes primrias no corno dorsal da medula espinhal,

  • interneurnios e nas vias supra espinhais, onde exercem estimulao e modulao

    da transmisso nociceptiva. A liberao de neurotransmissores excitatrios pelas

    fibras aferentes primrias promove a ativao dos neurnios de segunda ordem no

    corno dorsal, resultando em respostas reflexas espinhais e ativao dos tratos

    ascendentes responsveis pela transmisso da informao nociceptiva da medula

    espinhal para os centros cerebrais superiores.

    As principais substncias liberadas no corno dorsal so os aminocidos

    excitatrios,no glutamato e o aspartato, neuropeptdeos como as taquicininas, a

    substncia P, a neurocinina B, o peptdeo relacionado ao gene da calciotonina

    (CGRP), a colecistocinina, a somatostatina, a galanina, a adenosina, o cido

    gama-amino butrico (GABA), a glicina, as encefalinas e endomorfinas. O

    glutamato, o aspartato, a substncia P, e o CGRP tm efeitos excitatrios,

    enquanto os outros neuropeptdeos tm efeitos inibitrios. Mais recentemente, foi

    descrito o papel do xido ntrico no mecanismo central da nocicepo. O xido

    ntrico aumenta a liberao de substncia P e do glutamato.

    O principal aminocido excitatrio liberado pelas fibras A e C e pelas fibras no

    nociceptivas aferentes o glutamato. A liberao do glutamato produz um

    potencial ps-sinptico rpido no neurnio do corno dorsal ativando o receptor

    AMPA, enquanto a liberao de peptdeos produz potenciais excitatrios ps

    sinpticos lentos.

    As fibras aferentes primrias de pequeno dimetro no corno dorsal contm

    pequenas vesculas que armazenam glutamato ou grandes vesculas que

    armazenam neuropeptdeos. A substncia P a mais detalhadamente estudada e

  • liberada pelas fibras C em resposta a leso tecidual ou a intensa estimulao

    dos nervos perifricos.

    O glutamato e os neuropeptdeos so liberados juntos pelas terminaes

    aferentes primrias e tem diferentes aes fisiolgicas sobre os neurnios ps

    sinpticos, mas agem coordenadamente para regular a descarga dos neurnios

    ps-sinpticos. Os neuropeptdeos, incluindo a substncia P, parecem aumentar e

    prolongar a ao do glutamato.

    A ao destes transmissores tambm pode ser diferente. As aes do

    glutamato esto confinadas aos neurnios ps-sinpticos na vizinhana imediata

    das terminaes sinpticas como resultado da eficiente recaptao dos

    aminocidos na clula glial ou nervos terminais. Ao contrrio, os neuropeptdeos

    podem se difundir a considervel distncia porque no h um mecanismo

    especfico de recaptao. Portanto, a liberao de neuropeptdeos pode influenciar

    muitos neurnios ps-sinpticos do corno dorsal. Essa caracterstica, mais

    elevao do nvel dos peptdeos na dor persistente, sugere que a ao dos

    peptdeos contribui para a excitabilidade dos neurnios do corno dorsal e para o

    carter no localizado de muitas condies dolorosas.

    I.1.5 - Alteraes na sensibilidade nociceptiva

    A estimulao dos nociceptores envolve trs eventos que facilitam a

    manifestao e a transmisso da dor para os centros medulares. Estes so a

    sensibilizao dos nociceptores perifricos, denominada sensibilizao perifrica, a

  • reduo do limiar de percepo produzida pelas substncias mediadoras da dor, a

    hiperalgesia e a resposta reflexa segmentar provocada pela leso tecidual.

    Depois de repetidas aplicaes de estmulos mecnicos nxicos,

    nociceptores prximos que no respondiam previamente ao estimulo mecnico

    agora respondem, um fenmeno chamado sensibilizao. A sensibilizao de um

    nociceptor aps a injria ou inflamao resulta na liberao de substncias

    qumicas pelas clulas e tecidos lesados. Essas substncias incluem a bradicinina,

    histamina, prostaglandinas, leucotrienos, acetilcolina, serotonina e substncia P.

    Cada uma se origina de uma diferente populao de clulas, mas todas atuam

    para diminuir o limiar de ativao dos nociceptores. Alguns, entretanto, tambm

    ativam os nociceptores. Por exemplo, a histamina liberada pela desgranulao dos

    mastcitos em resposta a leso tecidual ativa os nociceptores polimodais.

    ATP, acetilcolina e serotonina so liberadas pelo dano das clulas

    endoteliais e plaquetas e agem isoladamente ou em combinao para sensibilizar

    os nociceptores atravs de outros agentes qumicos como as prostaglandinas e

    bradicininas. A prostaglandina E2 um metablico do cido araquidnico e

    gerada pela enzima ciclooxigenase liberada pelas clulas lesadas. A bradicinina

    um dos agentes mais ativos na produo da dor, pois ativa diretamente as fibras

    A e C e aumenta a sntese e liberao de prostaglandinas pelas clulas vizinhas.

    Os neurnios nociceptivos regulam seu meio qumico atravs dos

    mediadores sintetizados nas clulas do corpo e ento transportados para o

    terminal perifrico, onde so armazenados e liberados por despolarizao do

    terminal. A leso libera dois peptdeos neuroativos, a substncia P e o CGRP pelas

    terminaes sensoriais, que contribuem para a difuso do edema agindo

  • diretamente sobre as vnulas para produzir vasodilatao. Eles tambm

    contribuem para a hiperalgesia levando a liberao de histamina pelos mastcitos,

    os quais diminuem o limiar de ativao dos nociceptores.

    Os sinais cardinais da inflamao so calor, rubor e edema que podem ser

    reproduzidos pela aplicao local da substncia P. O calor e o rubor so

    produzidos pela dilatao dos vasos sanguneos perifricos, enquanto que o

    edema resulta do extravasamento do plasma, um processo no qual as protenas e

    as clulas deixam as vnulas acompanhadas de lquido. Esta inflamao

    mediada pela atividade neural sendo denominada inflamao neurognica.

    Antagonistas da substncia P bloqueiam completamente a inflamao neurognica

    em humanos, o que demonstra que o conhecimento dos mecanismos bsicos da

    nocicepo pode ter aplicao clinica.

    I.1.6 - Hiperexcitabilidade dos neurnios do corno dorsal

    Sob condies de severa e persistente injria, as fibras C so estimuladas

    repetitivamente e a resposta dos neurnios do corno dorsal aumenta

    progressivamente. Este fenmeno chamado de Wind up dependente da

    liberao de aminocidos excitatrios como o glutamato pelas fibras C e

    conseqente abertura ps-sinptica dos canais inicos voltagem dependente

    estimulando o funcionamento dos receptores N-metil-D-aspartato (NMDA). Desta

    forma o bloqueio da atividade do receptor NMDA, pode bloquear o wind-up. Desta

  • forma a estimulao nxica pode produzir alteraes duradouras nos neurnios do

    corno dorsal, semelhante a potencializao duradoura, um processo no qual

    alteraes de longa durao so produzidas no hipocampo e outras regies do

    crebro. O receptor NMDA tambm tem um papel hiperexcitabilidade dos

    neurnios do corno dorsal conseqente leso tecidual. Este fenmeno

    chamado de sensibilizao central, para distinguir da sensibilizao que ocorre nas

    terminaes perifricas dos neurnios sensoriais atravs da ativao da cascata

    do cido araquidnico.

    I.2 - Vias nociceptivas ascendentes

    A transferncia de informaes nociceptivas da medula espinhal para as

    estruturas enceflicas realizada por sistemas neuronais compostos de fibras

    longas, tais como a via espinotalmica, espinoreticular, espinomesenflica, via ps

    sinptica da coluna dorsal ou neurnios de segunda ordem da coluna dorsal, e

    espino-hipotalmica (Figura 2).

    A B C

  • Figura 2: Vias ascendentes. As trs principais vias que transmitem informao nociceptiva do corno

    dorsal para os centros mais altos. Em A, o trato espinotalmico, em B o trato espinorreticular e em

    C, o trato espinomesenceflico (Kandell e cols., 2000).

    As vias espinotalmica, espinorreticular e espinomesenceflica esto

    localizadas no quadrante antero lateral da medula espinhal com distribuio

    ascendente contralateral.

    A via espinotalmica a mais proeminente via nociceptiva ascendente na

    medula espinhal. Compreende os axnios nociceptivos especficos e os neurnios

    na lmina I e V - VII. Os axnios das clulas da via espinotalmica cruzam a

  • medula espinhal para o lado oposto, e ento ascendem para o encfalo nas

    colunas antero laterais. Algumas fibras terminam nas reas reticulares do tronco

    cerebral, mas a maioria segue at o tlamo. A estimulao eltrica da via

    espinotalmica resulta em dor enquanto que as leses da via resultam em

    acentuada reduo da sensao de dor no lado oposto da leso da medula

    espinhal (Kandel, 2000).

    A via espinorreticular compreende os axnios da lmina VII e VIII. Ele

    ascende no quadrante antero lateral da medula espinhal e terminam na formao

    reticular e tlamo. Ao contrrio da via espinotalmica, muito dos seus axnios no

    cruzam a linha mdia.

    A via espinomesencefalica compreende os axnios dos neurnios das

    laminas I e V e se projeta no quadrante antero lateral da medula espinhal para a

    formao reticular mesenceflica e para a substncia periaquedutal cinzenta. A via

    espinomesenceflica parece contribuir para o componente afetivo da dor.

    A via ps sinptica da coluna dorsal se origina dos neurnios no ncleo

    cervical lateral, localizada na substncia branca dos dois segmentos superiores da

    medula espinhal. O ncleo cervical recebe impulsos de neurnios nociceptivos nas

    lminas III e IV.

    A via espinohipotalmica compreende os axnios dos neurnios das

    lminas I e V, e se projeta diretamente no centro de controle autonmico supra-

    espinhal e acredita-se que ativa complexas respostas neuroendcrinas e

    cardiovasculares.

  • I.3 - Modulao central da dor

    Os sistemas inibitrios que participam da modulao da dor so as vias

    descendentes inibitrias (Figura 3), constituda das vias noradrenrgicas,

    serotoninrgicas e do sistema opiide.

    Figura 3 : Vias descendentes inibitrias: os neurnios provenientes da PAG (substncia

    periaqedutal cinzenta) e do locus coeruleus projetam para o corno dorsal da medula espinhal.

  • I.3.1 - Vias descendentes inibitrias

    A relao entre a intensidade da dor e o estmulo perifrico depende de

    variveis do hospedeiro, incluindo a presena de outros estmulos somticos e

    fatores psicolgicos influenciados pelas circunstncias. A modificao da resposta

    neural, comportamental e da dor subjetiva ao estmulo sensorial resulta da

    modulao do sistema nervoso central sobre a transmisso da aferncia

    nociceptiva.

    No inicio de 1911, Head e Holmes postularam a influncia modulatria sobre

    a dor. Eles propuseram que o tlamo seria o centro para a percepo da dor e o

    neocortex o centro da percepo discriminativa, modulando continuamente a

    resposta do tlamo aos estmulos nxicos. Estudos sobre modulao descendente

    da transmisso sensorial foram descritos posteriormente. Hagbarth e Kerr em 1954

    demonstraram que o stio supra espinhal controla a via ascendente. Entretanto, a

    existncia de um sistema modulatrio especfico da dor foi proposto por Melzack e

    Wall em 1965 com a teoria do controle do porto (Figura 4). Logo depois, Wall em

    1967 demonstrou que as estruturas do tronco cerebral inibem os neurnios

    nociceptivos da medula espinhal.

  • Figura 4: A Teoria do Controle do Porto, proposta por Melzac e Wall em 1965 (Adaptado de Bear

    e cols., 2001).

    A mais precoce evidencia de que o sistema descendente pode modular

    seletivamente a dor foi a descoberta da estimulao produzindo analgesia (Mayer

    e Price, 1976). A estimulao produzindo analgesia foi primeiramente produzida

    pela estimulao eltrica da substncia cinzenta periaqueductal (PAG).

    A descoberta do papel modulatrio da PAG foi decisivo no avano do

    conhecimento do mecanismo da modulao da dor. Pesquisas posteriores

    demonstraram que a PAG parte de um circuito do sistema nervoso central que

    controla a transmisso nociceptiva a nvel da medula espinhal.

    A sensao da dor pode ser modificada pelos sistemas inibitrios

    endgenos, principalmente atravs das vias descendentes noradrenrgica,

    Neurniode projeo

    Trato espinotalmico

    Coluna dorsal

    Interneurnio

    Fibra C

    Fibras ACorno dorsal

    Neurniode projeo

    Trato espinotalmico

    Coluna dorsal

    Interneurnio

    Fibra C

    Fibras ACorno dorsal

  • serotoninrgica e pelos opiides endgenos, como as endorfinas e as

    dinorfinas. A ativao do sistema descendente modifica acentuadamente a

    liberao do glutamato pelos neurnios aferentes primrios e interneurnios, e

    tambm a liberao do GABA e da glicina. Alm disso, a transmisso da

    informao nociceptiva aos centros superiores da dor pelos neurnios de projeo

    tambm significativamente alterada. Como conseqncia, a intensidade da

    percepo da dor reduzida drasticamente. O sistema descendente inibitrio ativo

    tonicamente pode controlar a liberao do glutamato, do GABA e da glicina, assim

    como a excitabilidade dos neurnios do corno dorsal (Yoshimura e Furue, 2006).

    Diversos lcus produzem efeitos antinociceptivos sobre a transmisso da dor como

    o crtex cerebral, hipotlamo, a substncia cinzenta periqueductal (PAG), medula

    rostroventral (RVM), ncleo parabraquial, ncleo trato solitrio, e noradrenrgico

    A5, A6 (locus coeruleus) e A7(subcoeruleus).

    I.3.2 - Sistema noradrenrgico.

    Os ncleos noradrenrgicos so divididos em A1 a A7 e esto localizados

    difusamente da ponte at o mesencfalo, nos quais um grande nmero neurnios

    em A5, A6 (lcus coeruleus) e A7 (subcoeruleus) estendem seus axnios at a

    medula espinhal atravs do funculo dorsolateral. As terminaes noradrenrgicas

    esto distribudas em todas as lminas do corno dorsal e estabelecem sinapses

    axo-somticas, axo-dendrticas, e axo-axnicas (Coggeshall e cols., 1997).

    Embora as terminaes noradrenrgicas se concentrem na superfcie do corno

    dorsal, principalmente na lmina I e na poro externa da lmina II, as terminaes

  • mais densas so encontradas no ncleo intermdio lateral, um pool de neurnios

    pr-ganglionares simpticos, e no corno ventral. As sinapses no corno dorsal se

    fazem principalmente com os interneurnios, mas as terminaes aferentes

    primrias tambm recebem impulsos do sistema noradrenrgico. Embora a origem

    do sistema noradrenrgico seja supra espinhal, alguns neurnios, principalmente

    os prximos ao canal central, tambm possuem ncleos noradrenrgicos. O

    sistema noradrenrgico produz inibio direta dos interneurnios e dos neurnios

    da substncia gelatinosa (Sonohata e cols. , 2004), e tambm conhecido que

    muitas terminaes noradrenrgicas fazem sinapses com neurnios de projeo

    que estendem seus axnios at o tlamo, indicando o controle direto dos

    neurnios de projeo ascendentes, bem como as modificaes da transmisso

    sensorial entre os interneurnios (Millan, 2002).

    Os principais receptores adrenrgicos so divididos em trs subtipos: 1, 2,

    e adrenoceptores. O receptor 1 foi posteriormente sub classificado em 1A, 1B,

    e 1D. A ativao desses receptores produz a abertura do canal de Ca++ com

    aumento da liberao dos neurotransmissores e ativao da fosfolipase C. Os

    receptores 1A esto expressos em maior densidade na medula espinhal, enquanto

    que os 1B tem uma densidade intermediria, e os 1D raramente esto presentes

    (Wada e cols., 1996). Os receptores 2 tambm foram sub classificados em 2A,

    2B e 2C. A ativao desses receptores produz a abertura do canal de K+ e

    depresso da condutncia ao Ca++, resultando em hiperpolarizao da membrana

    ou diminuio na liberao dos neurotransmissores. Desta forma, o 1

    adrenoceptor tem efeito excitatrio, enquanto 2 tem efeito inibitrio sobre a

    transmisso sensorial. Entretanto, deve ser notado que a inibio dos

  • interneurnios inibitrios resulta em excitao da transmisso. Essa espcie de

    excitao, chamada de dis-inibio e foi observada na PAG na qual a ativao dos

    receptores opiides produz a ativao do sistema modulatrio descendente (Bie e

    cols., 2003).

    Foram identificados trs subtipos receptores adrenrgicos 1, 2 e 3. A

    existncia de 4 tambm foi sugerida, mas ainda no foi clonado. Esses subtipos

    tm um papel excitatrio na transmisso sinptica. Entretanto, no foram relatadas

    claras evidncias eletrofisiolgicas sustentando o envolvimento do receptor no

    corno dorsal da medula espinhal. A ao inibitria da noradrenalina na sinapse

    entre os neurnios aferentes primrios e os neurnios do corno dorsal foi

    investigada nos neurnios do gnglio da raiz dorsal demonstrando depresso da

    corrente de Ca++ pela ativao os receptores 2. Essas observaes podem ser

    extrapoladas para as terminaes aferentes primrias onde a ativao dos

    receptores 2 diminui a liberao de glutamato, causando inibio nos impulsos

    nociceptivos nos neurnios do corno dorsal (Kawasaki e cols., 2003). Estudos

    recentes mostraram que os receptores adrenrgicos 2C localizados nas

    terminaes dos interneurnios excitatrios na lmina superficial do corno dorsal

    que entram em contato com neurnios de projeo espinomedular, possivelmente

    contribuem para antinocicepo noradrenrgica.

    Na clnica, a adrenalina utilizada na anestesia espinhal associada aos

    anestsicos locais para reduo na absoro do anestsico local do espao

    subaracnideo, por ocasionar vasoconstrio. Entretanto, a adrenalina produz

    analgesia quando injetada por via intratecal na ausncia de anestsico local. De

    fato, ela no altera significativamente a depurao do anestsico local no espao

  • subaracnideo. A clonidina, um 2 agonista sem efeitos vasoconstritores, prolonga

    a durao da anestesia. Portanto, possvel que a ao nociceptiva da adrenalina

    intratecal por ao direta no corno dorsal, possivelmente mimetizando a ao da

    via descendente noradrnergica.

    H evidncias cumulativas sustentando a idia de que a ativao do 2

    adrenoceptor produz uma profunda ao analgsica na dor crnica (Fairbanks CA

    e cols., 2002.). Estudos comportamentais demonstraram que os adrenoceptores 2

    medeiam analgesia espinhal e o sinergismo adrenrgico - opiide pode ser til no

    tratamento clnico da dor (Tallarida e cols, 2000).

    A ao antinociceptiva mediada pelo adrenoreceptor 2 foi relatada ser mais

    potente em condies patolgicas como a inflamao (Kingery e cols 2000). Os

    agonistas dos adrenoceptores 2 tambm so clinicamente usados nos pacientes

    que sofrem de dor crnica, inclusive a dor neuroptica.

    H evidncias que indicam uma ao antinociceptiva da noradrenalina no

    corno dorsal da medula espinhal. A noradrenalina ps-sinapticamente produz

    hiperpolarizao da membrana pela abertura do canal de potssio atravs da

    ativao do receptor 2 e despolarizao atravs da ativao do receptor 1. A via

    descendente noradrenrgica aumenta a liberao dos neurotransmissores

    inibitrios na substncia gelatinosa atravs da ativao dos receptores 1 pr-

    sinpticos, fornecendo assim um mecanismo bsico para o uso clinico dos

    agonistas 1 associados ao anestsico local na anestesia espinhal. Pr-

    sinapticamente, a noradrenalina aumenta os transmissores inibitrios atravs dos

    receptores 1 e diminui a liberao do glutamato pelas fibras aferentes A e C

    atravs dos receptores 2. (Figura 5).

  • Fig

    ura

    5:

    Via

    nor

    adr

    en

    rgic

    a e

    sina

    pse

    s a

    nvel do corno dorsal: NA ps-sinptica hiperpolariza e despolariza neurnios da SG pela ativao

    de 1 e 2, respectivamente. Pr-sinptica, a NA aumenta NTs inibitrios a partir de 1 e inibe a

    liberao dos NTs excitatrios a partir das fibras A e C, via receptores 2 (Traduzido e modificado

    de Yoshimura e Furue,2006).

    1 1

    1

    2 2

    2 Interneurnio Inibitrio

    i

    GABA

    Glicina Glut

    Glut

    Neurnio

    Corno dorsal

    Via descendente

    inibitria noradrenrgica

    Fibra A

    Fibra C

    Hiperpol Despol

  • I.3.3 - Sistema serotoninrgico

    O sistema descendente contendo fibras serotoninrgicas origina-se no

    ncleo magno da rafe. Igualmente ao sistema noradrenrgico, as fibras

    serotoninrgicas tambm so descendentes para a medula espinhal atravs do

    funculo dorsolateral. Os receptores serotoninrgicos foram classificados em 14

    subtipos e algumas subclasses so expressas na medula espinhal. Entre esses 14

    subtipos, os 5-HT1A, 5-HT1B, 5-HT1D e 5-HT3 so os mais abundantes na medula

    espinhal. Suzuki e cols. em 2004, observaram que a aplicao de serotonina (5-

    HT) no corno dorsal inibe as respostas nociceptivas, mas efeitos excitatrios

    menos frequentemente tambm foram relatados. As aes ps-sinpticas da

    serotonina so heterogneas, exibindo hiperpolarizao e despolarizao. Alguns

    neurnios mostram hiperpolarizao geralmente precedendo a despolarizao. A

    ao dual da serotonina parece ser devida a ativao seletiva de receptores

    distintos. Entre os receptores conhecidos, o 5-HT1A o predominante no corno

    dorsal. A administrao de serotonina causa hiperpolarizao em 50% dos

    neurnios da substncia gelatinosa; esse efeito inibitrio imitado pelo agonista

    de 5-HT1A 8-OH-DPAT e bloqueado pelo antagonista de 5-HT1A WAY100,635. A

    despolarizao da membrana, ao contrrio, observada em poucos neurnios da

    substncia gelatinosa, de modo que o receptor responsvel pela despolarizao

    ainda no foi identificado. Foi sugerido que a despolarizao da membrana

    antagonizada por um antagonista do receptor 5-HT3. A ativao do receptor 5-HT3

    produz uma rpida despolarizao dos neurnios do gnglio da raiz dorsal

    aumentando a condutncia de Na+, K+ e Ca++. A ativao do receptor 5-HT3,

  • portanto deve aumentar a liberao de transmissores pelas terminaes aferentes

    primrias na medula espinhal (Figura 6).

    Resumindo, ps-sinapticamente a serotonina produz hiperpolarizao da

    membrana pela interao com receptores 5-HT1A em cerca de 50% dos neurnios

    da substncia gelatinosa e despolarizao em poucos neurnios provavelmente

    por ao no receptor 5-HT3. A ao pr-sinaptica da serotonina aumenta os

    neurotransmissores inibitrios atravs do 5-HT3 ou talvez atravs do 5-HT2 e

    diminui a liberao de glutamato pelos aferentes primrios.

    Figura 6: Via serotoninrgica e sinapses a nvel do corno dorsal: 5-HT ps-sinaptica hiperpolariza e

    despolariza neurnios da SG pela ativao de 5-HT1A e 5-HT3(?), respectivamente. Pr-sinaptica, a

    5-HT aumenta NTs inibitrios a partir de 5-HT3 ou 5-HT2 (?) e inibe a liberao dos NTs excitatrios

    a partir das fibras A e C por receptor ainda no determinado. (Traduzido e modificado de

    Yoshimura e Furue, 2006).

    5-HT1A

    Interneurnio

    Inibitrio

    i

    GABA

    GlicinaGlut

    Glut

    Neurnio

    Corno dorsal

    Via descendente

    inibitria serotoninrgica

    Fibra A

    Fibra C

    Hiperpol Despol

    5-HT1B/D?

    5-HT1A-like

    5-HT3

    5-HT35-HT2?

  • Os sistemas descendentes noradrenrgico e serotoninrgico tm efeitos

    semelhantes na transmisso sinptica no corno dorsal, em particular na substncia

    gelatinosa. As questes que permanecem diferentes entre a noradrenalina e a

    serotonina so significativas em termos de transmisso nociceptiva no corno

    dorsal. A noradrenalina e serotonina produzem hiperpolarizao da membrana, ao

    mesmo tempo diminuem a liberao de transmissores inibitrios pelas fibras

    aferentes primarias A e C pr-sinapticamente e aumentam a liberao dos

    transmissores inibitrios GABA e glicina pelos interneurnios. O efeito final de

    ambos os sistemas descendentes inibitrios so, portanto anlogos. H,

    entretanto, algumas diferenas quantitativas. A administrao de serotonina

    produz hiperpolarizao da membrana em cerca de 50% dos neurnios da

    substncia gelatinosa, enquanto que a noradrenalina hiperpolariza mais de 80%

    dos neurnios da substncia gelatinosa. Considerando que os neurnios da

    substncia gelatinosa so heterogneos de acordo com a sua morfologia e

    contedo de transmissores excitatrios e inibitrios, a diferena quantitativa no

    nmero de neurnios hiperpolarizados por ambos os transmissores parece

    depender da sua especificidade na antinocicepo sobre as vrias modalidades.

    Presume-se que a noradrenalina controle os impulsos nociceptivos de uma

    maneira geral, enquanto que a serotonina controla os impulsos nociceptivos mais

    especificamente. H uma diferena significativa entre suas aes inibitrias pr-

    sinpticas sobre a liberao do glutamato. A serotonina deprime as fibras

    aferentes A e C sem qualquer diferena significativa na relao entre as fibras A

    e C. Ao contrrio, as fibras aferentes A so mais sensveis a noradrenalina que as

    fibras C. Portanto, a noradrenalina pode controlar mais a dor aguda do que a dor

  • crnica. No foi observada diferena significativa na liberao de transmissores

    inibitrios, tanto o GABA quanto a glicina so liberados.

    Os sistemas noradrenrgicos e serotoninrgicos no apenas descem para

    medula espinhal, mas tambm ascendem para os circuitos sensoriais superiores,

    inclusive para a crtex; logo o efeito completo desses sistemas deve ser mais

    complexo. Esses sistemas apresentam um papel importante na determinao de

    como os humanos se comportam em situaes crticas ignorando temporariamente

    a dor.

    I.4 Opiides

    Opiides como a morfina e a codena so analgsicos eficazes.

    Microinjees de morfina diretamente em regies especficas do crebro de ratos

    produzem excelente analgesia pela inibio da descarga dos neurnios

    nociceptivos no corno dorsal. A substncia cinzenta periaqueductal uma das

    regies mais sensveis para a produo da analgesia. A naloxona, antagonista

    opiide, administrada na PAG ou nos ncleos serotoninrgicos da rafe magna

    bloqueia a analgesia produzida pela estimulao, assim como a analgesia induzida

    pela morfina. O mesmo ocorre com a seco transversal do funculo lateral dorsal

    na medula espinhal. Essas observaes indicam que a morfina tambm produz

    analgesia pela ativao da via descendente inibitria. Esse achado sugere que o

    crebro contm receptores especficos para os opiides identificados como , , e

    . (Mansour A e cols. 1995). Os genes que codificam cada um desses receptores

    foram clonados e pertencem a classe dos receptores acoplados a protena G.

  • Os opiides produzem analgesia e outras alteraes comportamentais

    alterando a transmisso sinptica em muitos stios do SNC, incluindo o corno

    dorsal da medula espinhal. Atuando sobre receptores acoplados a famlia da

    protena G, como , , e e subtipos, estas substncias podem reduzir a atividade

    neuronal por uma variedade de mecanismos pr-sinapticos e ps- sinpticos (Law

    P-Y e cols., 2000; Yaksh, 1997).

    Esses receptores foram originalmente definidos com base na sua afinidade

    de ligao com os agonistas. Alcalides opiides, tais como a morfina, so

    potentes agonistas do receptor . Neste receptor h uma elevada correlao entre

    a potncia de um analgsico e sua afinidade para a ligao no receptor.

    Consistente com essa idia, o camundongo no qual o gene do receptor foi

    deletado, demonstrou insensibilidade a morfina e a outros agonistas do receptor .

    A naloxona se liga ao receptor , mas tem ao antagnica a morfina por desloc-

    la do receptor sem ativ-lo.

    Os receptores esto concentrados na substncia cinzenta periaqueductal,

    medula ventral, parte superficial do corno dorsal, locais importantes na regulao

    da dor. Tambm esto localizados em outros locais do sistema nervoso central e

    perifrico, juntamente com outros receptores opiides. A distribuio difusa desses

    receptores explica porque a morfina quando administrada sistemicamente altera

    outros processos fisiolgicos.

    As trs principais classes de peptdeos endgenos que interagem com os

    receptores opiides foram identificados como, -endorfina, encefalina e dinorfina.

    Esses peptdeos so gerados por precursores que so poliprotenas, codificados

  • em trs genes distintos, a proopiomelanocortina, a proencefalina, a, e a

    prodinorfina, respectivamente.

    Os peptdeos codificados pelos genes opiides esto distribudos em

    diferentes reas do sistema nervoso central relacionadas com o processamento ou

    modulao da nocicepo. Os neurnios e o terminal do axnio contendo

    encefalina e dinorfina so encontrados na substncia cinzenta periaqueductal,

    medula rostroventral e no corno dorsal, nas lminas I e II. A -endorfina est

    confinada principalmente nos neurnios do hipotlamo que enviam projees para

    a substncia periaqueductal cinzenta e ncleos noradrenrgicos no tronco

    cerebral.

    Um novo receptor like opioid rfo recentemente foi identificado, um

    peptdeo chamado de nociceptina, que lembra a dinorfina. Este receptor est

    amplamente expresso no sistema nervoso e parece participar na regulao da

    nocicepo e em vrias funes fisiolgicas e comportamentais.

    Os receptores opiides esto localizados em regies do sistema nervoso

    diferentes das reas relacionadas dor, de forma que muitos efeitos adversos dos

    opiides esto relacionados distribuio destes receptores. Na musculatura do

    intestino e esfncter anal so responsveis pela constipao, enquanto os

    receptores nas clulas do ncleo do trato solitrio, no tronco cerebral respondem

    pela depresso respiratria e alteraes cardiovasculares.

    Para minimizar os efeitos indesejveis da administrao sistmica, a

    morfina vem sendo administrada por via espinhal. O corno dorsal apresenta

    elevada concentrao de receptores opiides e a morfina inibe a descarga dos

    neurnios do corno dorsal em resposta aos estmulos nociceptivos. A injeo

  • intratecal ou epidural de morfina produz intensa e prolongada analgesia com

    mnimos efeitos colaterais, isto porque a droga no se difunde para longe do sitio

    da injeo, sendo utilizadas frequentemente no tratamento da dor ps operatria e

    dor crnica. A morfina mimetiza a ao dos opiides endgenos nesta regio. O

    corno dorsal contm alta densidade de interneurnios contendo encefalina e

    dinorfina, e as terminaes destas clulas esto junto da sinapse entre os

    neurnios aferentes primrios e os neurnios de projeo (Figura 7). As trs

    classes de receptores opiides so encontradas nos terminais dos aferentes

    primrios e nos dendritos ps-sinpticos dos neurnios do CD.

  • Figura 7: Sistema opiide a nvel do corno dorsal: a ativao das fibras C libera substncia P e

    glutamato que despolariza e ativa os neurnios de projeo com aumento do influxo de Ca++

    . A

    morfina pr-sinptica diminui o influxo de Ca++

    , inibindo a liberao dos NTs e ps-sinptica

    hiperpolariza a membrana dos neurnios do CD, por aumento da condutncia ao K+.

    O mecanismo pelo qual a morfina e os peptdeos endgenos regulam a

    transmisso nociceptiva constitudo de duas aes inibitrias, a inibio ps-

    sinptica, produzida parcialmente pelo aumento da condutncia do K+, e inibio

    pr-sinaptica pela inibio da liberao do glutamato, substncia P e outros

    transmissores pelas terminaes dos neurnios sensoriais.

    Neurnio

    Corno dorsal

    enc

    Fibra C

    i InterneurnioInibitrio

    glut

    SPHiperpol

    noradrenalina serotonina

    morfina

    Neurnio

    Corno dorsal

    enc

    Fibra C

    i InterneurnioInibitrio

    glut

    SPHiperpol

    noradrenalina serotonina

    morfina

    enc

    Fibra C

    i InterneurnioInibitrio

    glut

    SPHiperpol

    noradrenalina serotonina

    morfina

  • A contribuio dos receptores , , e para a completa ligao dos opiides

    na medula espinhal estimada em 70%, 24% e 6%, respectivamente (Besse e

    cols.,1990), sendo 70% na localizao pr-sinptica nas terminaes aferentes

    primrias das fibras C. O principal mecanismo da analgesia espinhal opiide, quer

    endgena ou exogenamente, ocorre pela ativao dos receptores pr-sinpticos,

    que atuam seletivamente diminuindo a liberao dos neurotransmissores pelos

    vias aferentes nociceptivas, e consequentemente a transmisso nociceptiva.

    Intratecalmente, a morfina diminui a liberao da substncia P e do peptdeo

    relacionado ao gene da calcitonina (CGRP) aps a estimulao nxica (Go e cols.,

    1987) e inibe a transmisso excitatria, mas no a transmisso sinptica inibitria

    na lmina II, por um mecanismo pr-sinptico (Kohno e cols., 1999).

    No corno dorsal, a ativao do receptor inibe a transmisso excitatria

    entre as fibras aferentes primrias e seu neurnio alvo (Jeftinija e cols., 1998),

    diferente do receptor , cuja modulao da transmisso inibitria entre neurnios

    do corno dorsal no est bem esclarecida. Vaughan e cols. em 1997 observaram

    que no hipocampo, no ncleo magno da rafe e na substncia periaqueductal

    cinzenta, a ativao do receptor opiide inibe a transmisso Gabargica. Um

    papel similar para o receptor foi demonstrado na substncia gelatinosa do

    gnglio trigmio espinhal de ratos (Grudt e Henerson, 1998), entretanto, na rea

    correspondente da medula espinhal em ratos, a transmisso inibitria no foi

    alterada pelo agonista do receptor opiide (Kohno e cols., 1999). Neste estudo o

    autor concluiu que a ativao seletiva do receptor inibe a transmisso inibitria

    entre neurnios do corno dorsal por mecanismo pr-sinptico independe da

    entrada Ca++. Esses dados identificam os receptores opiides como importante

  • modulador pr-sinptico da transmisso inibitria a nvel do corno dorsal (Kerchner

    e Zhuo, 2002). A diminuio na liberao dos transmissores causada pelos

    opiides pelos aferentes primrios resulta indiretamente na diminuio da entrada

    de Ca++, como resultado do aumento da condutncia do K+ ou diretamente pela

    diminuio da condutncia do Ca++.

    Os receptores opiides no esto somente nas terminaes aferentes

    primrias, mas tambm nas terminaes perifricas na pele, articulao e

    msculos. Desta forma, a administrao de morfina diretamente nestes locais

    produz analgesia com doses menores do que as necessrias por via sistmica,

    conseqentemente com menores efeitos adversos. A origem dos opiides

    endgenos que ativa os receptores nas terminaes perifricas no clara,

    Provavelmente porque as clulas cromafins na medula adrenal e clulas imunes

    migram para o local da leso como parte de um processo inflamatrio e ento

    ocorre a sntese de opiides endgenos. As clulas cromafins da adrenal secretam

    vrias substncias neuroativas, como catecolaminas e peptdeos opiides que

    produzem efeitos analgsicos no sistema nervoso central (Jeon e cols. , 2006). A

    reao inflamatria envolve sinais qumicos e moleculares que iniciam e mantm a

    resposta do hospedeiro. No tecido inflamado, as clulas do sistema imune geram

    peptdeos opiides que atuando sobre sensores perifricos especficos,

    contribuindo para uma potente analgesia (Pello e cols., 2006).

    Slide 1

  • FISIOLOGIA DA DORFISIOLOGIA DA DOR

    Fisiologia - 2008

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  • Slide 2

    DOR

    Somtica Visceral

    Superficial

    -pele

    Profunda

    -msculos

    -articulaes

    -tecido conjuntivo

    rgos

    -estmago

    -vescula

    -gastrite

    -clculo

    -apendicite

    -angina

    Inicial Tardia

    -aperto

    -picada

    -queimao

    -pulsao-cibra

    -artrite

    -reumatismo

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  • Slide 3

    Dor ReferidaReferncia dor de origem visceral na pele

    Convergncia de fibras aferentes

    viscerais sobre os neurnios de 2 ordem

    provenientes da pele

    Dor do membro fantasma

    Percepo da estimulao

    espontnea nos cotos nervosos

    remanescentes

    refere-se a dor do membro ausente

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  • Slide 4

    VIAS AFERENTES

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  • Slide 5

    SENSAES DOLOROSAS:

    Dor primria: dor rpida, aguda, localizada, inicia e termina rapidamente

    Ativao dos nociceptores das fibras nervosas A-delta

    Dor secundria: dor lenta em queimao, dura mais tempo que o

    estmulo que a causou, difusamente localizada

    Ativao dos nociceptores das fibras nervosas C

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    Dois tipos:

    mecanorreceptores (20%) terminaes nervosas das fibras A delta. Ativados por

    estmulos mecnicos intensos (nocivos);

  • nociceptores polimodais (80%) terminaes nervosas das fibras C. Ativados por

    vrios tipos de estmulos nocivos (mecnicos, trmicos, qumicos)

    VIAS DE CONDUO DA DOR

    * Neurotransmissores glutamato

    * Co-transmissores substncia P e neurocininas

  • Slide 6

    RECEPTORES DA DOR (NOCICEPTORES):

    Terminaes nervosas livres das fibras A delta e fibras C;

    No se adaptam;

    Alto limiar;

    Condies normais apresentam-se em down-regulation

    Sua sensibilizao up-regulation