texto de qualificação sem títulos
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RAFAEL RIBEIRO FERREIRA
OS QUATRO EPIGRAMAS PARA FLAUTA SOLO DE
CLUDIO SANTORO:
Texto de qualificao apresentado ao
curso de ps-graduao em Msica da
EM/UFMG.
BELO HORIZONTE
2010
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Sumrio:
1. Introduo: ....................................................................................................................... 3
2. A msica brasileira no incio do sculo XX e o surgimento do Grupo Msica Viva............. 13
2.1 As fases do Grupo Msica Viva ...................................................................................... 15
2.2 Cludio Santoro: relaes do compositor com o Msica Viva ........................................ 18
2.3 As fases estilsticas de Cludio Santoro ......................................................................... 18
3. Entre outras obras, a propsito dos Epigramas ................................................................ 20
3.1 Os epgrafos e a poesia na obra de Santoro ................................................................... 22
3.2 A relao entre os epigramas e outras obras para flauta solo ........................................ 24
3.3 Relao dos Quatro Epigramas de Santoro e a Density 21.5 de Varse: o fator
inediticidade ....................................................................................................................... 26
4. Contribuies na interpretao dos Quatro Epigramas em formato de anlise ................ 29
4.1 Anlise das sries dos Epigramas : ............................................................................... 34
5. Bibliografia: ..................................................................................................................... 36
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1. Introduo:
As obras compostas para flauta, em especial as do sculo XX, trouxeram novas
possibilidades de utilizar a tcnica do instrumento. Atravs da busca por uma nova
linguagem musical surgiram diferentes possibilidades sonoras denominadas tcnica
expandida. Tais tcnicas se diferem muito do uso tradicional do instrumento por
requisitarem do intrprete outras capacidades alm de emisso de notas com timbre,
afinao, dinmica e duraes corretas. Essas capacidades esto relacionadas ao
acrscimo de atividade corporal. No caso da flauta, o uso bastante efetivo da lngua e da
garganta, a capacidade de cantar e tocar ao mesmo tempo e a flexibilidade na
embocadura so exemplos dessa nova abordagem motora.
Robert Dick, flautista que dedica sua carreira a interpretao e ensino da msica
contempornea, mapeia inmeros recursos de tcnicas expandidas em um livro que
funciona como uma bula para flautistas:
Este volume organizado pedagogicamente. Flautistas encontraro o material mais
fcil apresentado em todos os captulos, e cada captulo a preparao para o prximo.
importante notar que muitos flautistas devem trabalhar novas sonoridades e tcnicas
beneficiando a tcnica tradicional. Prticas de novas sonoridades servem para
desenvolver fora e flexibilidade da embocadura. (Dick, 1975, pag V )1
O interesse em averiguar as possibilidades sonoras da flauta se deu em grande
parte pelo contato que tive com obras de um grupo: O Grupo Msica Viva. Um grupo
que surgiu por volta de 1939 que trazia a inteno de divulgar a msica que estava
1 Texto original em ingles: This volume is organized pedagogically. Flutists will find the easiest material
presented first in all chapters, to a degree, is a preparation for the next. In this light, it is also significant
to note that many flutists may find working with the new sonorities and techniques beneficial to their
traditional playing, especially in the area of tone development. Quite simply, practice of the new
sonorities serves to develop both the strength and suppleness of the embouchure
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sendo feita naquela poca no Brasil e no mundo fundado pelo alemo Hans Joachim
Koellreutter:
Em 1937 chegou ao Brasil o flautista alemo Hans Joachim Koellreutter, fugindo do
Nazismo. Desde sua chegada, Koellreutter procurou trazer para o Brasil a agitao
cultural que participou ativamente na Alemanha e na Suia. Fundou no Rio de Janeiro o
Grupo Msica Viva, em 1939. No incio de suas atividades, o grupo reuniu vrias
personalidades do meio musical brasileiro com a finalidade de incrementar a atividade
musical no Brasil. (Egg, 2005, pag 60)
A idia do grupo partiu de um movimento idealizado pelo regente alemo
Hermann Scherchen2, professor de Koellreutter. Segundo Mendes (2008, p?) Mais do
que uma revista a expresso Msica Viva correspondeu na Europa da dcada de trinta a
um movimento que objetivava a divulgao das obras de compositores do sculo XX.
Baseando-se nesse moldes, ao chegar ao Brasil em 1937, Koellreutter trazia consigo o
desejo de dar continuidade a esse movimento.
O Grupo Msica Viva passou por vrias fases rompendo e agregando-se a idias
e aos compositores. Essa primeira etapa, segundo Kter (2001), marcada pela
coexistncia interna de tendncias estticas e ideolgicas bastantes dessemelhantes....
Os primeiros contatos de Koellreutter no Brasil foram com os artistas freqentadores da
loja de msica Pingim na Rua do Ouvidor. Para Egg (2005) parece muito estranho
um grupo liderado por Koellreutter ser formado pela nata do Nacionalismo musical
crticos, musiclogos e professores do Instituto Nacional de Msica, porm, como o
prprio autor observa, o nico grupo no qual poderia encontrar apoio ou ressonncia
para idia de renovao era o dos prprios nacionalistas que representavam ento o
modernismo brasileiro.
Na segunda etapa, as divergncias de idias em relao ao nacionalismo, ao
ensino de msica no Brasil e valorizao de uma nova linguagem composicional
2 Regente e violista alemo,Scherchen se destacou por privilegiar estrias das composies de seus
contemporneos, alm de fazer partes de movimentos da msica do sculo XX.
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fizeram com o que os compositores nacionalistas se rompessem com o grupo e dessem
espao para a msica de vanguarda. Nessa fase, Cludio Santoro, Guerra- Peixe e
posteriormente Edino Krieger, alunos do professor Koellreutter, tiveram participao
ativa no grupo, apoiando idias de uma msica brasileira mais consistente. O Msica
Viva, segundo Jos Maria Neves (1981, p.90) [...] se transformaria logo na mais viva
clula de renovao musical do pas, contribuindo eficazmente na reviso dos
problemas relacionados com o ensino da msica (e especialmente da composio), com
a atividade musical de grupo (incentivando a formao de conjuntos de cmera) e com a
organizao de concertos.
Quando mais acima relatamos certo interesse no Grupo Msica Viva, nos
referamos especificamente ao compositor Cludio Santoro, uma das figuras que toma
ento um posto importante nessa segunda fase do grupo. Por volta de 1940, o
compositor tem seus primeiros contatos com o msico Koellreutter e confirma ento sua
grande simpatia com a tcnica de dozes sons de Schoenberg:
Lembro-me que quando fui estudar com Koellreutter em 1940 e meses depois lhe
apresentei o incio da minha sinfonia para duas orq. de cordas, que dava o nome de
Sinfonieta, e que este perguntou se chonhecia Schoenberg e a tcnica dos doze sons,
disseram-lhe que no como era a verdade,mas ele no acreditou muito porque disse:
isto parece escrito por quem conhece a tcnica dos dozes sons. ( Santoro, [194?]
(Entrevista concedida a Rangel bandeira, ACS)
Essa relao musical entre o flautista alemo e Cludio Santoro despertou certo
interesse. As tendncias do compositor, mesmo antes do contato com Koellreutter, eram
de usar os doze sons como material, mesmo que ainda no havia tido nenhum contato
com tal tcnica. Segundo Kter (2001, p.107), por volta de 1939, Koellreutter se
expressava ainda de maneira muito mais direta via esttica adotada por um
Hindemith do que aquela principiada por um Schoenberg. Atravs de relatos do
prprio Koellreutter notamos que o interesse da escrita dodecafnica partiu muito mais
do jovem Santoro:
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Foi com Santoro que aprofundei meus conhecimentos sobre o dodecafonismo. Ao
contrrio do que dizem no fui introdutor dessa tcnica no Brasil (Koellreutter. Apud:
Mendes, 2008 p.23)
neste contexto de introduo tcnica dodecafnica e na relao com um
professor interessado em difundir materiais que havia trazido da Europa, que Santoro
compe importantes obras para flauta. Acredito na hiptese de que essa relao com a
flauta se deu principalmente sobre influncia de Koellreutter, que apesar de se dedicar
aos estudos de composio trazia consigo a bagagem de um concertista de flauta:
Viajei por todo mundo como concertista de flauta. Sou originalmente flautista Fiz uma
turn com Milhaud pela a Europa. Era um grande compositor e pianista. Devido a
minha atividade pela msica moderna, ele me acompanhou. (Koellreutter 1999.
Entrevista concedida a Adriano, Vorobow. Folha mais)
Tambm h relatos de seus trabalhos como flautista no Brasil. Segundo Egg
(2005, p.63), em 1944, Koellreutter assumiu o posto de flautista substituto na
Orquestra Sinfnica Brasileira, o que permitiu que abandonasse outras atividades
profissionais secundrias.
Minha pesquisa enquanto flautista, aps traar um breve panorama histrico que
abrange a msica brasileira do sculo XX, o Grupo Msica Viva e a relao de
Koellreutter com o compositor Cludio Santoro, se interessar a partir de ento,
exclusivamente em uma das obras do compositor Cludio Santoro: Quatro Epigramas
para flauta solo. Coloco como foco, o objetivo de identificar os processos de tcnica
expandida, analisar a obra sobre um ponto de vista que colabore na interpretao e
trabalhar a hiptese de que o compositor conseguiu, com o uso de novas tcnicas, certa
inediticidade em relao a outras obras para flauta compostas no mesmo perodo.
Cludio Santoro nasceu em 1919, na cidade de Manaus e j em sua adolescncia
se mudou para o Rio de Janeiro para estudar violino. Foi no Rio que teve seu maior
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contato com processos composicionais e tambm em 1939 seus primeiros contatos com
Koellreutter.
A msica de Cludio Santoro esteve presente em importantes mudanas
estilsticas que se firmaram ao longo da histria da msica brasileira do sculo XX.
Segundo Neves (1981, p.138) Santoro foi durante muito tempo o grande smbolo da
nova msica brasileira, tanto como dodecafonista como no perodo nacionalista.
Partindo da consulta de seu catlogo de obras 3, foram encontradas 15 peas escritas
para flauta, em formaes que variam de solo, duos, trios at pequenos grupos de
cmera. As datas de composio das obras se estendem de 1941 (fase dodecafnica) a
1984 (fase de maturidade do compositor). Sendo Santoro, tido como um grande
compositor brasileiro
O crtico Eurico Nogueira Frana, contou uma vez, a histria das viagens de Copland ao Brasil: por duas vezes, e com longo intervalo de tempo ele teria perguntado qual era o
compositor jovem mais interessante, e em ambas as vezes o nome de Santoro foi o
primeiro citado. (Neves, 1981, p.138)
e sendo algumas peas para flauta situadas como obras de importncia no catlogo do
compositor4, minha investigao pretende preencher uma lacuna existente no que se
refere materiais acadmicos e divulgao de sua msica.
No decorrer de quase cinco dcadas, a msica de Cludio Santoro sofreu
alteraes no processo composicional. O prprio compositor delineia suas mudanas
atravs de suas correspondncias:
3 Catlogo retirado do site: Acesso em
26/04/2010.
4 Neves (1981, p.99) situa o Quinteto de sopros, a Sonatina a 3 e a Sonata para flauta e piano como
obras de importncia no catlogo do compositor.
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Como deve estar informado fui dodecafonista at 1946. Com raras excees toda minha
produo at esta data, est dentro dessa tcnica e se ligava a uma concepo esttica
formal. Da em diante h um perodo de transio e pesquisa,at o momento em que me afirmo dentro da corrente realista da msica utilizando uma tcnica moderna, mas sem
fugir as caractersticas rtmico-meldicas da nossa msica
nacional.(Santoro,1956)(Correspondncia a Apleby,ACS)
A fase dodecafnica (1939-1946) foi marcada pelo contato com o msico
Koellreutter e o engajamento do compositor ao Grupo Msica Viva. O papel do grupo
era bastante chamativo principalmente para os jovens compositores, como observa
Carlos Kter (2000, p.51): Se, no entanto as sociedades existentes realavam o virtuose
e o concerto, Msica Viva assume a diferenciada finalidade de divulgar o compositor e
sua obra, principalmente a contempornea . Foi nesse momento que Santoro comps
seis de suas obras para flauta, talvez pelo fato de seu professor Koellreuter ter sido
flautista5. Entre elas esto os 4 Epigramas para flauta solo e a sonata para flauta e
piano composta em 1941, que considerada por Neves (1981, p 99) a melhor
realizao do compositor dentro da nova tcnica composicional.
O perodo de transio (1946-1948) marcado pela ruptura de Santoro
com o Grupo Msica Viva. Segundo Kter (2000, p.83) A textura turva que vai
permeando as relaes internas do grupo produzir a partir do descompasso entre o
engajamento de tendncia partidria liderado por Santoro e a filosofia imprimida por
Koellreuter ao movimento -- a radicalizao de pontos de vista, esturio original do
processo desagregador do ncleo. A participao ativa de Santoro no 2 congresso
Internacional de Compositores e Crticos musicais em Praga, 1948, marcar
definitivamente sua posio em favor de um nacionalismo progressista, tomando uma
posio esttica de carter universalista. Data-se desse perodo uma nica composio
com flauta: o trio de flauta, clarineta e fagote.
A fase nacionalista (1949-1960) foi um momento no qual Santoro optou
por uma simplificao da linguagem para atingir as massas. Datam-se desse perodo
5 Neves (1981, p.105) *...+ (nota-se de passagem a enorme quantidade de obras para flauta dos
compositores ligados ao Msica Viva, lembrando que este era o instrumento de Koellreuter *...+
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poucas obras do compositor, sendo nenhuma delas para flauta. Nessa poca, Santoro
voltou suas energias para a pesquisa, que segundo Vasco Mariz (1921, p.74) A
necessidade de rever sua maneira de escrever, de estudar mais detidamente a msica
folclrica brasileira, que nunca havia merecido grande ateno sua, reduziram a duas
apenas as obras terminadas em 1949/50 [...].
na sua fase de maturidade, denominada por ele mesmo de o retorno ao
serialismo, (1960-1989) que foram compostas mais sete obras para flauta. Certo de que
suas fases anteriores foram fundamentais e que esse desejo do novo enriqueceria
nitidamente o desenvolvimento esttico-musical de suas obras, Santoro aventurava-se
novamente pela busca de um novo caminho.
Tenho escrito vrias coisas e estou mudando meu estilo.[...]Voltei um pouco ao
serialismo,embora,sempre a minha maneira.Isto , nunca de maneira escolstica nem dogmtica.Como voc sabe nunca me prendo a dogma.[...]Creio que minha experincia
nos ltimo anos foi muito interessante , mas esse meu esprito de sempre pesquisar,em
busca de novos caminhos, novos materiais, fez-me esperar um pouco e refletir para esperar criar novas obras.(Santoro,1962)(correspondncia a Bruno[?], ACS)
Concentrando-me nos Quatro Epigramas, no pretendo elaborar uma grande
discusso respeito das fases de Santoro, Em minha pesquisa, tal diviso se dispe
somente a expor a sua trajetria composicional. A fase dodecafnica exige maior
ateno, por se tratar do momento em que os epigramas foram escritos e da relao
entre o compositor e o flautista e professor Koellreutter.
Os Quatro Epigramas foram escritos em 1942. Segundo MARIZ (1970, p.178) a
primeira audio mundial da obra aconteceu em setembro de 1943 no Rio de Janeiro,
sendo interpretada por Koellreutter. Fora a partir das lies com seu professor em 1941
e dos primeiros contatos com a teoria de Schoenberg da tcnica de doze sons, que
Santoro pode aperfeioar melhor sua linguagem enquanto compositor serialista. Sobre
Os 4 Epigramas , Neves tece o seguinte comentrio:
Em comum a todas as obras desta fase, o rigor lgico da construo, o cerebralismo, a
ausncia de concesses sensibilidade primria. ( Neves,1981, p.99)
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Koellreutter tambm comenta sobre essa fase de Santoro em seu artigo sobre a
Msica Brasileira:
Na obra de Santoro, a msica Brasileira entra em crise, e define a msica deste
compositor como a arte de parte-pris, intencionalmente agressiva, constante, metlica,
de ritmos incisivos, implacvel, fatal. E ele conclui dizendo que a msica agora no
s para sentir, tambm para compreender. ( Koellreutter apud Neves, 1981, p.100)
Alm desse aprimoramento do compositor com a tcnica dos doze sons, notada
j por seus prprios contemporneos, aps mais de meio sculo de histria da msica,
nos deparamos com outro fator que traz ainda mais inediticidade para obra em questo.
No Epigrama IV, podemos citar processos de tcnica expandida bastante ricos e
inusitados se levarmos em considerao o ano em que foi composto. Gestos como
frullatos, harmnicos, trmolos alm de dois outros que, se comparado a outras obras
para flauta solo, se apresentam como uma grande novidade. O primeiro em questo
uma polifonia escrita para um instrumento meldico. O compositor escreve duas vozes
para serem executadas ao mesmo tempo na flauta. Na primeira voz um trmolo contnuo
e na segundo uma melodia descendente com acentos que interrompem o trmolo da voz
superior. O outro gesto uma indicao de quase pizz. aliado ao sinal que indica que as
chaves da flauta devem ser percutidas. No Epigrama II um gesto bastante caracterstico
um glissando acrescido de acento e frullato. Nos Epigramas I e III os harmnicos,
tcnica j utilizada em repertrios tradicionais, so decorrentes.
Tais recursos encontrados nessa obra possibilitaram a minha pesquisa propor um
dilogo com outras obras para flauta solo da mesma poca. Uma das obras mais
relevantes para o repertrio de flauta solo a Density 21.5 do compositor Edgard
Varse. Segundo Garcia6:
6 Professor e diretor da Escola de Msica da UFMG, Maurcio Freire Garcia explorou a obra Density 21.5
em sua tese de doutorado: Density 21.5: Beyond Pitch Organization. 2002 , New England Conservatory
,Boston,EUA
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Neste trabalho Varse explorou a flauta em um caminho completamente inovador,
lanando o instrumento a uma nova esfera de possibilidades e sonoridades. A pea
representa um dos mais revolucionrios trabalhos na literatura da flauta no sculo XX
entre Debussys Syrinx (1913) e Berios Sequenza I (1958). ( Garcia, 2002, p.1)7
Podemos encontrar nessa obra o mesmo recurso de chave percutida que Santoro
utilizou nos quatro epigramas. Tal recurso definido por Dick, que aponta Varse como
precursor da utilizao dessa tcnica:
Sons percussivos so produzidos pela batida de uma ou mais chaves da flauta e/ou por
ataques percussivos de lngua, que geram ressonncias no tubo da flauta. O mais
familiar som percussivo, Key- slaps em notas Staccato, foi introduzido na flauta por
Varse em 1936. (DICK, 1975, p.129)
Porm uma grande discusso a respeito dessa novidade foi gerada quando Freire,
em sua tese de doutorado, encontrou o manuscrito original de Density 21.5 e constatou
que:
... mas no compasso23 o mais inesperado fato ocorre: no h o efeito de clapping- keys!
A pea aclamada pela introduo dessa possibilidade de novo som na flauta, mas isso
foi claramente introduzido depois, rapidamente entre Abril e julho de 1946. ( Garcia,
2002, p.80)
7 Texto original em ingls: In this work Varse explored the flute in a completely innovative way,
launching the instrument to a new sphere of possibilities and sonorities. The piece represents one of the
great revolutionary works in the flute literature en the 20 century besides Debussys Syrinx (1913) and
Berios Sequenza I (1958).
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Com base nesses dados extrados da tese de doutorado de Freire pretendemos
buscar no acervo de Santoro o manuscrito dos Quatro Epigramas, para identificar se
havia j neste, o efeito de chaves percutidas. Caso essa hiptese seja confirmada a obra
que, por si s, traz uma carga de inmeras inovaes para a msica brasileira, trar
tambm uma inediticidade nos que diz respeito ao uso de tal tcnica expandida. Caso
Santoro tenha escrito esse recurso em 1942, essa obra ficar situada anteriormente
Density 21.5 de Varse no que tange questes de introduo do Clapping-keys.
Paralela a toda essa discusso bibliogrfica e contextual, utilizarei como
metodologia de anlise alguns princpios da Teoria dos conjuntos de Allen Forte8. Tal
procedimento, j aplicado em outras obras dodecafnicas inclusive obras brasileiras,
funcionar como um colaborador da performance da obra.
O Primeiro captulo da pesquisa discutir questes relacionadas ao momento em
que a obra foi escrita. Uma reviso bibliogrfica sobre o que j foi escrito sobre o
Grupo Msica Viva atravs de autores como Carlos Kter, Jos Maria Neves, Srgio
Nogueira Mendes, Andr Egg, Alice BelmVieira, Josye Dures,contribuir para
compreender e discutir a forma como Santoro desenvolveu a linguagem dodecafnica e
sua relao com o compositor e flautista Koellreutter.
No segundo captulo o foco ser os Quatro Epigramas. Uma pequena introduo
contendo a etimologia da palavra epigrama, uma relao com outras obras para flauta
solo contemporneas aos epigramas e o resultado da investigao do manuscrito da
obra. Com esse resultado, ser traado um dilogo com a obra Density 21.5 de Edgar
Varse.
No terceiro captulo atravs de uma anlise das sries utilizando a teoria dos
conjuntos de Allen Forte e da anlise das tcnicas expandidas utilizando Robert Dick,
Pierre Yves Artaud9 e Carin Levine
10, a pesquisa se interessar em oferecer uma
contribuio para execuo da obra.
8 Allen Forte professor emrito de teoria da msica no departamento de msica da Universidade de
Yales e tem 12 livros e 80 artigos publicados que tratam de Teoria da msica e anlise musical.
9 Premiado com o Primeiro Lugar em flauta e msica de cmera no prmio de Paris, Pierre Yves Artaud
professor do Conservatrio Nacional superior de Paris e Escola de Msica de Paris. Desenvolveu
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2. A msica brasileira no incio do sculo XX e o
surgimento do Grupo Msica Viva
Em um contexto de preservao das tcnicas composicionais herdadas na
Europa do sculo XIX, que podemos situar a msica brasileira no incio do sculo
XX. De acordo com Neves, sob a orientao direta de Mrio de Andrade e com
representao mxima na figura de Villa Lobos, uma escola nacional foi fundamentada
em cima dos seguintes padres:
As normas do tonalismo e as estruturas formais tradio clssico-romntica eram aceitas
sem discusso e usada de modos direto nas composies, obrigando a freqentes
deformaes do material folclrico original que, ele nem sempre prestava-se a
manipulaes exigidas por tais princpios tcnicos. ( Neves, 1981, p.77 )
Neste momento a msica brasileira se disps a uma popularizao da linguagem.
Com o intuito de uma msica facilmente compreendida pelo povo, compositores
mantiveram estruturas formais usadas no romantismo, assim como preservaram a idia
de tonalidade. Os temas folclricos e populares brasileiros eram introduzidos nas
estruturas romnticas sob a tica dos nacionalistas da poca, como uma forma de
enraizar a cultura nacionalista.
Apesar de grandes compositores, incluindo Villa-lobos, terem se destacado nesse
momento por suas composies, a msica brasileira de at ento, no se arriscava em
criar uma nova linguagem musical:
Falta msica brasileira deste perodo uma atitude de maior desconformidade com a
tradio, com os riscos e as descobertas que tal postura pode acarretar, o que poderia ser
definido, em outras palavras, como o abandono corajoso das tcnicas acadmicas e a
busca de novas proposies estticas e de novas solues tcnicas que levam a criao
de uma nova linguagem musical. (Neves, 1981, p. 77)
pesquisa em tcnicas de flauta tradicional e tcnicas expandidas. (site pessoal do flautista
acesso em 14-12-12)
10 Carin Levine flautista e estudou com Aurle NIcolet e Jack Wellbaum. Sua intensa atividade com
msica contempornea rendeu um livro sobre tcnicas estendidas intitulado The techniques off lute
Plaing.
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nesse contexto, que surge no Brasil a figura de um importante grupo que se
prope a uma inovao na msica que havia sendo produzida at ento. Pode-se se
dizer, segundo bibliografias consultadas, que a ideia do Grupo Msica Viva brotou do
contato de Koellreutter com seu professor Sherchen.
Atravs de Kter temos a seguinte colocao:
Como se sabe, os esforos de Scherchen foram desde cedo consagrados divulgao e
melhor compreenso da msica nova de todas as pocas -, cabendo a ele as primeiras
audies de obras fundamentais hoje totalmente incorporadas literatura
contempornea [...](Kter, 2000,p.45 )
Tambm ao falar sobre Koellreutter, Neves coloca a importncia desse contato
que esse teve com Scherchen:
Chegando ao Brasil, Koellreutter trazia uma slida bagagem musical recebida
especialmente de Kurt Thomas e de Hermann Scherchen, de quem foi discpulo dileto e
assistente. ( Neves, 1981, p. 84)
Foi de Scherchen a idia de um movimento criado na Europa em 1933 com o
nome de Musica Viva e que resultou tambm em um peridico musical que editou em
Bruxelas de 1933 a 193611
. Ao desembarcar no Brasil em 1937, o flautista e regente
Koellreutter, aps uma tourne artstica pela Amrica do sul12
, trazia consigo no s
toda a bagagem musical e cultural apreendida na Europa, mas tambm um desejo de
radicar no Brasil a nova linguagem composicional que at ento no havia sido
explorada sistematicamente no pas.
Para uma melhor compreenso dos processos composicionais de Cludio
Santoro ser traado um pequeno roteiro das fazes do Grupo Msica Viva, j que no
incio da carreira, este foi o grupo em que o compositor esteve inserido ativamente
contribuindo com suas obras e almejando a divulgao de uma nova linguagem musical.
11 Kter (2002, p.45)
12Neves (1981, p.84)
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2.1 As fases do Grupo Msica Viva
Podemos identificar nas bibliografias revisadas a respeito do grupo Msica Viva,
certa coincidncia nos limites temporais e estticos que delineiam as rupturas e
abrangncias no decorrer dos anos de existncia do grupo. Para uma melhor
organizao do texto utilizarei a proposta de Kter que divide o histrico do grupo em
trs momentos.
O primeiro momento marcado pelos contatos iniciais de Koellreutter com o
meio musical brasileiro. Atravs de Luiz Heitor Corra de Azevedo13
, o professor e
flautista que havia acabado de chegar ao Brasil, foi apresentado aos artistas
freqentadores da Pinguim14
.
Ali assiduamente se encontravam Braslio Itiber ( jovem compositor e professor do
conservatrio), Octvio Bevilcqua ( crtico musical de O Globo), Andrade Muricy (
escritor e crtico musical do Jornal Comrcio), Alfredo Lage ( membro da alta
sociedade e primeiro aluno de Koellreutter no Brasil), Werner Singer (maestro alemo,
refugiado no pas). Egydio (tambm compositor) e o prrpio Luiz Heitor, entre outros.(
Kater, 2000, p.49)
Nessa fase integradora, Koellreutter buscou se apoiar em artistas que
tradicionalmente, j estavam engajados com o meio musical brasileiro, apesar da
discrepncia de idias a respeito do nacionalismo e das tcnicas de composio:
Para ns que conhecemos os desdobramentos musicais do pas na dcada de 1940,
parece muito estranho um grupo liderado por Koellreutter ser formado pela nata do
nacionalismo musical crticos, musiclogos e professores do Instituto Nacional de
msica. No perodo, essa associao era mais que natural. Koellreutter chegou ao Brasil
ainda muito jovem (22 anos), mas j com uma formao humanstica e musical que
certamente o distinguia, com experincia de atuao num meio cultural muito mais
agitado que o brasileiro. J participava, na Europa, de atividades em favor da msica
contempornea e pretendia continu-las no Brasil. Ao chegar, trazia uma boa
experincia como instrumentista e contatos mais prximos com a msica recentemente
13 Luiz Heitor Crrea era chefe da seo de Msica da Biblioteca Nacional ( Kter, 2002, p.48)
14 Loja de msica localizada na Rua do Ouvidor freqentada por msicos e intelectuais da poca. (Kter,
2002, p.49)
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produzida na Europa. O nico grupo no qual poderia encontrar apoio ou ressonncia
para idias de renovao era dos prprios nacionalistas que representavam ento, o
modernismo brasileiro. ( Egg, 2005, p.61)
Nas primeiras publicaes da revista Msica Viva no era mencionado nada
sobre nacionalismo brasileiro. Certamente Koellreutter no queria tocar nesse ponto
delicado que comprometeria a opinio de muitos integrantes do grupo. Segundo Neves
(1981, p.90) Em comum, todos eles tinham apenas o desejo de prosseguir estudos e
discusses sobre os problemas da esttica e da evoluo da linguagem musical. O
mesmo observa Kter (2000, p.50) ao dizer que nessa primeira etapa, integradora por
excelncia, marcada pela coexistncia interna de tendncias estticas e ideolgicas
bastante dessemelhantes, tal como se manifestam na constituio original do grupo.
Atravs disso, notamos que esse primeiro momento se tratou muito mais de uma
disseminao das idias de Koellreutter no meio musical brasileiro, que at ento, era
composto por compositores nacionalistas que se utilizavam das tcnicas composicionais
advindas da tonalidade e estruturas formais europias do sculo XX. Essas idias se
resumiam em trs frentes de ao: formao, criao e divulgao da msica brasileira
em especial a msica contempornea.
Koellreuter, alm de flautista, dedicava sua vida ao estudo de composio e ao
chegar ao Brasil teve como primeiro aluno, o jovem compositor Cludio Santoro.
Posteriormente, Guerra-Peixe, Geni Marcondes, Eunice Katunda, Esther Scliar, Edino
Krieger entre outros jovens compositores15
. Koellreutter trazia consigo uma grande
bagagem europia que ainda no havia sido difundida no Brasil e que atraa tais
compositores. A tcnica dos dozes sons foi um marco para os novos compositores
atuantes no Msica Viva pois entrava em conflito com a linguagem tonal utilizada pelos
nacionalistas brasileiros da poca.
Ao criar esse interesse em introduzir na msica brasileira uma nova linguagem
musical, que colocava em cheque a tonalidade e estruturas formais at ento
estigmatizadas pelos compositores nacionalistas, o grupo Msica Viva, atravs do
Manifesto de 1944, esclarece e pontua sua definitiva ruptura com os nacionalistas:
Manifesto
O Grupo Musica Viva surge como uma porta que se abre produo musical
contempornea, participando ativamente da evoluo do esprito.
15 Neves (1981, p.90)
-
17
A obra musical, como a mais elevada organizao do pensamento e sentimentos
humanos, como a mais grandiosa encarnao da vida, est em primeiro plano no
trabalho artstico do Grupo Msica Viva.
Msica Viva, divulgando, por meio de concertos, irradiaes, conferncias e edies a
criao musical hodierna de todas as tendncias, em especial do continente americano,
pretende mostrar que em nossa poca tambm existe msica como expresso do tmepo,
de um novo estado de inteligncia.
A revoluo espiritual, que o mundo atualmente atravessa, no deixar de influenciar a
produo contempornea. Essa transformao radical que se fez notar tambm nos
meios sonoros, a causa da incomprenso momentnea frente a msica nova.
Idias, porm, so mais fortes do que preconceitos!
Assim o Grupo Msica Viva lutar pelas idias de um mundo novo, crendo na fora
criadora do esprito humano e na arte do futuro.16
Com o compromisso claro de apoiar a criao musical contempornea e a
afirmao de que a nova msica o reflexo e o retrato de um mundo novo que se cria
(Neves, 1981, p.94). Esse segundo momento interessa-se ento em divulgar as obras dos
jovens compositores que atravs de uma produo experimental e renovadora, j no
usavam mais a tonalidade como apoio composicional. Essa atitude,colocava a nova
msica como um reflexo de uma sociedade que j no se enquadrava mais nos padres
do sculo XIX.
O Terceiro momento, em 1946, marcado pela publicao do Manifesto de
1946 com o ttulo de Declarao de Princpios. Esse manifesto, aps dois anos, define
no somente a postura esttica do grupo como tambm envolve a discusso de
problemas sociais e econmicos relacionados arte.
Neves aponta os cinco pontos bsicos desse manifesto:
A msica como produto da vida social; a msica como exemplo de uma cultura e de
uma poca; a necessidade de se educar para nova msica; a concepo utilitria da arte;
a postura revolucionria essencial. (Neves, 1988, p.94)
a partir desse manifesto, este grande painel de idias, verdadeiro mural de
intenes da modernidade musical brasileira, que retrata com perfeio os engajamentos
assumidos, que ocorrero no grupo abalos consecutivo at a ruptura final.
16
Este manifesto est transcrito na ntegra em Kter (2000, p.54)
-
18
2.2 Cludio Santoro: relaes do compositor com o Msica Viva
Existe um ponto de interseco entre as fases do Grupo Msica Viva e as fases
composicionais de Cludio Santoro. Certamente podemos nomear esse ponto de
Koellreutter, que foi um professor de composio influente nas obras de Santoro e que
contribuiu efetivamente nas escolhas estticas do compositor.
O encontro de Santoro e Koellreutter se deu por volta de 1940. O jovem
compositor encontrou uma forma melhor de compreender e aplicar a linguagem que j
havia usando antes mesmo de conhecer a tcnica dos doze sons, atravs de seu
professor. Koellreutter. Este, ainda no utilizava a tcnica dodecafnica em suas obras,
ele se expressava de maneira muito mais direta via esttica adotada por um
Hindemith do que aquela principiada por um Schoenberg ( Kter, 2001, p.107) :
Durante um pouco mais de um ano ele receber aulas dirias
de Koellreutter, adquirindo notvel tcnica de escrita e abertura
esttica que faro dele o primeiro compositor brasileiro a empregar
corretamente a tcnica dodecafnica. ( Neves, 1988, p.99)
Sobre o dodecafonismo no Brasil, podemos dizer com certa preciso que
Koellreutter no introduziu tal tcnica na msica brasileira. Atravs do interesse de
Cludio Santoro, que j se utilizava desse procedimento, o professor apenas contribuiu
com a divulgao e o aperfeioamento da utilizao dos dozes sons, j que havia
chegado com materiais e a experincia da msica dodecafnica europia.
A adoo da tcnica dodecafnica pelos integrantes do Msica Viva,
uma das aes que distinguiram e caracterizaram o grupo, no ocorreu por uma
convico esttica de seu mentor mas est diretamente ligada ao interesse
pessoal de Santoro pelo assunto. (Mendes, 2009, p.23)
2.3 As fases estilsticas de Cludio Santoro
O Msica Viva esteve presente nas duas primeiras fases composicionais de
Santoro e certamente, a ruptura com o grupo, contribuiu para as mudanas de estilo que
se acarretaram nas prximas fases estilsticas do compositor.
-
19
Na abordagem das fases encontramos, em linhas gerais, as obras de Santoro
divididas em quatro fases: Serialismo dodecafnico (1939-1946), Transio (1946-
1948), Nacionalismo (1949-1960) e retorno ao serialismo (1961-1989). Mesmo que a
pesquisa no se interesse em discutir profundamente essa diviso e se limite apenas a
uma exposio das fases, usarei como fonte bibliogrfica a pesquisa de Mendes17
. Sua
pesquisa prope a diviso da ltima fase retorno ao serialismo- em mais duas fases:
Avant gard (1966-1977) e maturidade (1978-1989). Apesar de dividir em pequenas
fases individuais Mendes tambm prope uma percepo macroscpica da obra que
delineia o dodecafonismo, a transio e o Nacionalismo como uma primeira etapa; o
Retorno ao serialismo e a avant gard como uma segunda etapa; e a fase de maturidade
como o momento em que o compositor Cludio Santoro utilizou todos os materiais e
idias j trabalhados em outras fases.
Para concluir esse captulo farei reviso bibliogrfica da tese de doutorado de
Mendes e aps isso realizarei uma exposio das fases dando maior enfoque para a fase
dodecafnica que onde os Quatro Epigramas esto situados.
17 Tese de doutorado: O Percurso estilstico de Cludio Santoro: Roteiros divergentes e conjuno final.
Defendida por Srgio Mendes Nogueira em 2009 pela UNICAMP.
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20
3. A propsito dos Epigramas
Os Quatro Epigramas para flauta solo foram compostos em 1942 por Cludio
Santoro. Nesse momento, o compositor acabara de entrar para o Grupo Msica Viva,
logo aps tomar suas primeiras aulas de composio com Koellreutter.
Encontramos referncias respeito dos epigramas em diversos autores. Alguns
confirmam a data e outros pe em cheque a data de composio:
Neves situa a obra no perodo de 1942. Podemos confirmar isso ao ler o seguinte
trecho: A produo de Santoro neste perodo18 especialmente grande, mostrando
grande verdade de solues aos problemas composicionais. ( Neves 1980, p.99)
O mesmo ocorre com Mariz, que cita no prprio texto a data de composio: De
1942 salientamos ainda a Sonatina a trs, noviclssica, os Quatro Epigramas para flauta solo, e
a Toccata, para piano solo. (Mariz 1970, p.70)
Em um de seus artigos, ao analisar os Quatro Epigramas, Mendes observa que:
Ocupando-se de apenas trs transposies da srie, o compositor prefirir no incluir
nos 4 Epigramas p/ flauta em Sol, pea de 1942, passagens livremente concebidas e
independentes da ordenao original, mas se restringir a imprimir transformaes, mais
amenas ou mais severas, a cada um dos oito segmentos dispostos no primeiro
movimento. (Mendes, ? )
O que coloca em dvida tal data uma entrevista que Santoro concedeu e que se
encontra no Acervo Cludio Santoro:
A primeira obra escrita nesta tcnica ( minha maneira) foi a ento publicada Sonata p/ Violino Solo. Obra em que procurei com a dodecafonia dar ao violino as mesmas
possibilidades de uma oculta polifonia das Partitas e Sonatas de Bach. As obras mais
importantes da poca so a M sica 194 3 p/Piano e Orquestra,o 1o.Quarteto 1941,a 2a. Sinfonia 1945. A 1a. Sinfonia p/ 2 orq. de Cordas obra de estudante e
precisaria rev-la. [O grifo nosso] Outras obras menores mas que marcam uma poca
so 4 Epigramas p/Fl. solo 1941, 3 Stcke para Clarinete solo 1942, a Sonatina para
18
Esse perodo aqui se refere as obras do ano de 1942 citada no pargrafo anterior.
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21
obo e piano 1941, as 4 Peas p/ piano 1942 e as 6 peas 1946, o trio p/ Trp. Cl. e Cello
dedicada J.C. Paz, em 1946, Msica de Cmara 1946 publicada no Boletim Latino
Americano publicado por C. Lange. Outras obras de Cmara foram escritas mas no resistem a minha crtica como o Quinteto de Sopros, a Sonata p/ Cello, Violino e Piano,
Flauta e Piano etc. (Santoro, [194?]) (Entrevista concedida a Srgio [?], ACS)
Outra fonte importante que encontramos so citaes do prprio Santoro em
relao ao processo de composio dos Epigramas. Essas consideraes foram feitas em
cartas trocadas com Curt Lange19
. Em sete de Julho de 1942, Santoro escreve:
A ltima cousa que fiz foi um Epigrama para flauta solo que Koellreutter executar pela
segunda vez em S. Paulo por estes dias. Compuz um segundo Epigrama com a mesma
srie da primeira e enviarei a Kollreuter Talvez ainda amanh. (Apud: Vieira 2006,
p.20)
Ao que parece, Santoro escreveu separadamente cada Epigrama e mesmo suas
estrias aconteciam de acordo com o trmino de cada um deles. Em cinco de fevereiro
de 1943 temos o seguinte trecho:
Quanto a minha futura participao estou indeciso para escolher o que deveria editar.
Desejava uma sugesto de vossa parte. O que me sugere? Conhece minhas ltimas
composies excluindo o Quinteto de sopros, a Tocata para piano solo, as
Invenes a 2 vozes para piano slo, o Concerto para violino e orquestra de cmera
ainda no terminado e o Trio para cordas que vio s parte quando esteve aqui, mas
que j est terminado, esperando apenas tempo para copi-lo e enviar-lhe para ter sua
opinio, assim como estas outras cousas novas. Tenho tambm um Divertimento para
Flauta, Viola e Cello assim como 3 epigramas ara flauta solo que enviei ao Carlos Paz.
( Apud: Vieira 2006, p.22)
Santoro fala nessa carta sobre trs epigramas. At o dado momento no foi
encontrado nenhum registro sobre o quarto epigrama vindo das prprias palavras de
Santoro. A pesquisa ento se prope a uma visita ao acervo Curt Lange, localizado na
biblioteca Central da UFMG, para uma busca em cartas e notas de programa a respeito
da composio do ltimo epigrama.
19 Atravs de dados de Moya (2011, p.1), Franciso Curte Lange nasceu na Alemanha em 19O3
mudandose para a Amrica Latina em 1923. Formou-se em Arquitetura pela universidade de Munique.
Foi pesquisador da msica Latino America e em especial da msica Brasileira. Foi incentivador e mentor
de vrios compositores do grupo Msica Viva.
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22
3.1 Os epgrafos e a poesia na obra de Santoro
A palavra epigrama teve origem na Grcia. Segundo uma consulta no artigo de
Alexandre Agnolon o termo formado a partir da preposio grega epi, sobre, e gra/mma, marca grfica, coisa escrita, epigrama, portanto, substantivo neutro derivado de epgrafo, escrever sobre, inscrever. Seu antigo significado se resume a breves inscries feitas em tmulos:
A palavra, originariamente em grego, nomeia ento inscries especialmente tumulares, a indicar a identidade de quem est ali sepultado (por natural engenho de seus primeiros
autores, a fala narrativa do texto freqentemente a prpria lpide); e votivas, a apontar
o Deus para o qual se destina certo objeto, a identidade de quem faz o voto e para que o
faz. E a j referida brevidade advm, evidentemente, da necessidade de o discurso adequar-se s exguas dimenses de seu suporte material. (Agnolon, ?, p.2)
Leite (2008, p.48) fala que a prpria etimologia da palavra epigrama deixa clara
a sua origem: a inscrio em pedra. Segundo a autora, os epigramas gregos mais antigos
que chegaram at ns so inscries em potes um em uma jarra e outro em uma cuia. De um carter estritamente pragmtico, cujo uso restrito a circunstncias
especialmente fnebres e votivas, os epigramas passaram rapidamente a uma funo
literria. A esta funo literria que atribumos o fato do epigrama deixar de ser
grafado somente em tmulos ou objetos votados a um Deus e a partir da, ser grafado
em papel:
Para que o epigrama se convertesse em gnero potico era necessrio que o seu suporte
material deixasse de ser a pedra tumular ou o objeto votado a um Deus; e sua fruio, por seu turno, no fosse mais determinada pela realidade da morte ou das prticas
rituais, mas, agora na qualidade de poesia, se subordinasse mmesis. Embora seja
muito difcil determinar com preciso o momento exato deste desenvolvimento, ou mesmo quem teria sido o primeiro a faz-lo, certo, todavia, que os poetas gregos do
sculo IV a.C. e os helensticos do seguinte foram os responsveis por desprender o
epigrama de sua condio de inscrio e, enfim, convert-lo em gnero de poesia. ( Agnolon, ?, p.13)
Com tal evoluo, essa converso ao gnero potico passou a imprimir algumas
caractersticas peculiares aos epigramas. Leite (p.49) descreve esse gnero como leve, de ocasio, j que transferidos das pedras tumulares para os papis, os temas tratados agora, eram temas cotidianos:
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23
No epigrama literrio, portanto, a circunstancialidade da inscrio derivou em
preferncia por temas cotidianos um convite para jantar, um bilhete para um amigo, um agradecimento por um presente recebido, felicitaes pelo aniversrio de algum, uma breve mensagem por qualquer razo, uma piada suscitada por um assunto do
momento; todos estes so temas possveis para um epigrama, que torna-se assim um
gnero leve, de ocasio. ( Leite, 2008, p.49)
Vale salientar tambm outras caractersticas importantes relacionados ao humor
dos epigramas:
As caractersticas mais importantes que determinaro de vez a apreenso do gnero
epigramtico para a tradio posterior, como a agudeza e seu carter picante, jocoso e
amide acerbo, ingredientes que dependeriam tambm, segundo diversos autores, de sua unidade bsica (Cf. SULLIVAN, J. P., 1999, p. 79), consolidar-se-o no perodo
helenstico. (Agnolon, ?, p.4)
O dicionrio Aurlio da lngua portuguesa tambm nos d como definio: 1-
Poesia breve, satrica, stira. 2- Dito mordaz e picante. Notamos que tais definies
especificam os dois momentos discutidos pelos autores acima, onde o breve se relaciona
com o momento em que os epigramas tinham funo de comentrios em tmulos ou
todos aos deuses e j a stira, o picante, se identifica com as caractersticas dos
epigramas quando este, passou a ter uma funo potica.
Tais definies certamente podem ser relacionadas com os Quatro Epigramas de
Cludio Santoro. A questo do breve bastante explcita se olharmos pelo ponto de
vista da extenso da pea, tanto a escrita como a execuo. O Epigrama I possui apenas
quatro sistemas escritos e apesar de o andamento ser Semnima = 50 seu tempo no
ultrapassa a 140. O mesmo ocorre com o Epigrama III. Sete sistemas que duram aproximadamente 2. Os movimentos rpidos, II e IV Epigramas, tambm so um tanto quanto breves em sua execuo.
Sobre o satrico e picante, podemos voltar nossos olhares para os gestos musicais
e enxergar neles o humor dos epigramas poticos. Em todos os epigramas encontramos
dois gestos contrastantes que se dialogam:
FIGURA 1: Santoro, Epigrama I
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24
FIGURA 2 : Santoro, Epigrama I
Podemos perceber claramente certo humor ao ver dois gestos to contrastantes
no Epigrama I. O que Aurlio diz picante pode ser compreendido na partitura, quando Santoro insere em meio a notas de longa durao, uma agitao composta de quilteras
de semicolcheia.
FIGURA 3: Santoro, Epigrama II
FIGURA 4: Santoro, Epigrama II
FIGURA 5: Santoro, Epigrama II
FIGURA 6: Santoro, Epigrama II
No Epigrama II percebemos claramente o contraste entre esses dois motivos
estruturais. Podemos novamente relacionar esses motivos to curtos brevidade dos
epigramas, quando esses ainda tinham funes de inscrio em pedras. Alm disso, o
humor que o motivo a e c contm atravs das notas em pianssimo stacatto entre pausas
de colcheias podem se remeter ao que Leite (p.49) caracteriza como leve, de ocasio.
3.2 A relao entre os epigramas e outras obras para flauta solo
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25
O histrico das importantes obras para flauta solo pode ser encontrado nas
bibliografias de Cassia Carrascoza Bomfim20
e Julia Larson21
. O pedido da tese de
Larson encontra-se em andamento pelo COMUT da biblioteca da escola de Msica da
UFMG, motivo pelo qual ainda no elaborarei um dilogo nesse tpico. Segue ento
uma pequena exposio do que foi encontrado na dissertao de Bomfim a respeito
desse assunto.
Ao falar sobre o repertrio de flauta solo, Bomfim traa uma linha entre as obras
que considera de maior relevncia para o assunto. A respeito das obras compostas do
sculo XVII ao XIX , a autora faz a seguinte observao:
As primeiras obras especificamentes escritas para flauta transversal datam do final do
sculo XVII a partir dos surgimentos dos primeiros grandes virtuosos como Joaquim J.
Quantz (1697-1773), Jacques Hottererre (c. 1640/1650-c. 1772), Michel de La Barre
(1675-1745), Michel Blavet (1700-1768), entre outros. Num longo trajeto, compositores
e solistas desenharam a histria do repertrio para flauta, e grandes contribuies foram
feitas por indivduos que tomaram para si essas duas funes: compositor e intrprete,
como Guilio Briccialdi (1818-1881), Anton Doppler (1821-1883) e Jules-Auguste
Demerssman (1833-1866). (Bomfim, 2009, p. 17)
Em seguida, a autora expe uma evoluo do repertrio e da notao de obras
para flauta do sculo XX:
Syrinx escrita em 1913 por Debussy introduz materiais na linha meldicos
escalas de tons inteiros, escalas modais, trechos atonais e tambm a questo
cnica, j que foi composta para ser executada nos bastidores de um pea cnica
de Gabriel Mourey.
Em 1936, Bomfim (p.18) considera como um ano que transforma o curso dos
acontecimentos para flauta transversal e acrescenta tambm o fato de haver
um repertrio abundante e de qualidades sem precedentes. As obras Density
21.5 de Edgar Varse e Cinc Incantation de Andr Jolivet foram compostas
nesse ano. As contribuies mpares de Varse so descritos pela autora:
Varse, foi sem dvida, o primeiro compositor a utilizar a flauta nos limites de sua
tessitura. Em sua obra Density 21.5, explora ritmos, cores e modos de articulao inditos,
20
Defendeu seu Mestrado na USP em 2009 com a dissertao: A flauta solista na msica contempornea
brasileira: trs propostas de anlise tcnico-interpretativas
21 Dissertao defendida em 1990 pela Universidade de Maryland com o ttulo: Flute without
accompaniment: Works from Debussy: Syrinx (1913) to Varse Density 21.5 (1936).
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26
introduzindo na literatura pela primeira vez o uso do efeito de chaves percutidas. (Bomfim,
2009, p.19)
Jolivet acrescenta nas Cinc Incatations, o uso de rudos e sonoridades no
convencionais para poca.
Luciano Brios comps em 1958 as Sequenzas. A Sequenza I para flauta solo
uma das primeiras tentativas de sistematizar graficamente possibilidades sonoras
diferentes das tradicionais para os instrumentos do naipe de madeira.
Em 1974, Istvn Matuz comps Studium 1/974 trazendo como novidade o uso da
respirao contnua na flauta.
cerca das obras brasileiras, a autora mostra as seguintes obras:
Assobio a Jato (1950) de Villa-lobos
Epigramas (1942) de Cludio Santor
Flautatualf (1972) de Jorge Antunes
Retreto II de Gilberto Mendes
Redundantiae II de Jorge Antunes
Estudo op. 51 de Lindemberg Cardoso
Mitos de Ricardo Tacuchian
3.3 Relao dos Quatro Epigramas de Santoro e a Density 21.5 de
Varse: o fator inediticidade
A partir da leitura de livros que tratam das obras para flauta solo, das
bibliografias a respeito das tcnicas expandidas e da tese de doutorado de Maurcio
Freire Garcia que analisa a obra Density 21.5 de Varse, nos deparamos em meio a
pesquisa, com um dado intrigante no que diz respeito as datas de composio de
Density 21.5 e Quatro Epigramas. Ambas se dialogam pela proximidade na data que
foram compostas e por possurem em comum um efeito denominado por Dick como
Keys Clapping, traduzido para o portugus por Chaves Percutidas.
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27
FIGURA 7: Varse, Density 21.5
FIGURA 8: Santoro, Epigrama IV
Nas bibliografias consultadas encontramos um dado comum a todas elas: Varse
colocado como precursor do efeito de chaves percurtidas.
No Livro de Robert Dick sobre tcnica expandida para flauta temos o seguinte
dado:
Sons percussivos so produzidos pela batida de uma ou mais chaves
da flauta e/ou por ataques percussivos de lngua, que geram ressonncias no
tubo da flauta. O mais familiar som percussivo, Key- slaps em notas Staccato,
foi introduzido na flauta por Varse em 1936. (DICK, 1975, p.129)
Na dissertao de mestrado de Cssia Carrascoza Bomfim, a autora cita:
Varse, foi sem dvida, o primeiro compositor a utilizar a
flauta nos limites de sua tessitura. Em sua obra Density 21.5, explora
ritmos, cores e modos de articulao inditos, introduzindo na
literatura pela primeira vez o uso do efeito de chaves percutidas.
(Bomfim, 2009, p.19)
Composta em 1936, a obra de Edgard Varse, como foi apontado anteriormente,
considerada um marco na histria da flauta, por tratar de maneira inovadora a
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28
linguagem do instrumento. O uso do timbre como recurso estruturador da pea, a
abordagem rtmica e o uso da flauta em toda sua tessitura podem ser consideradas um
arqutipo para as peas que se desencadearam aps a composio de Density 21.5.
Porm de acordo com Garcia (2002, p.80) o efeito de chaves percutidas, que coloca
Varse como o primeiro compositor a utilizar tal recurso, foi acrescentado somente em
sua reviso em 1946.
FIGURA 9: Cpia do manuscrito original de Density 21.5
FIGURA 10 : Reviso de Density 21.5 (1946)
Analisando as figuras 9 e 10 conclumos que a partir de tal descoberta na
pesquisa de Freire, a questo inediticidade no uso do recurso de chaves percutidas passa
a ser questionada. Cludio Santoro comps os Epigramas e utilizou a mesma tcnica em
1942, quatro anos antes da obra de Varse ser revisada. H relatos no livro de Mariz
(1970, p.178) que a obra foi estreada por Koellreutter em 1943 no Rio de Janeiro. Para
dar prosseguimento a essa investigao os passos que tero incio em janeiro de 2012
sero:
Uma busca do manuscrito dos Quatro Epigramas na casa da viva de Santoro,
Sr Gisele Santoro. Atravs de contatos com os familiares do compositor e com
associao Cultural Cludio Santoro, descobrimos que todo o acervo de
manuscritos encontra-se alojado no apartamento da senhora Santoro.
Uma visita ao acervo Curt Lange. Atravs dos mesmos meios citados acima e de
pesquisadores do Grupo Msica Viva, tivemos notcias de que nesse acervo
encontram-se cartas que Cludio Santoro trocava com o editor de suas partituras.
H tambm exemplares da Revista Msica Viva programas de concertos e
materiais que ajudem a chegar nos manuscritos da obra em questo.
Concludo tais passos poderemos chegar a respostas mais precisas que
esclarecero a hiptese que confirmaria certa inediticidade no uso da tcnica de
chaves percutidas nos Quatro Epigramas.
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4. Contribuies na interpretao dos Quatro
Epigramas
Paralela a toda essa pesquisa histrica e musicolgica, um objetivo maior se traava
em relao execuo dos Quatro Epigramas. Todas as escolhas demonstradas logo
abaixo, so reflexas de voltas e voltas ao redor do meu objeto, que certamente
mostraram algumas possibilidades de como fazer e o que fazer com o material
apresentado na partitura.
A partir daqui apresento em uma tabela, os momentos que o compositor optou pelo
uso da tcnica expandida nessa obras e possibilidades de execuo segundo os livros de
Robert Dick, Pierres Yves Artaud, Carin Levine e Jorge Antunes:
NOME DA TCNICA EXPANDIDA FORMA DE EXECUO
Harmnicos: Um efeito mais usual, os harmnicos na flauta so executados atravs da variao
da velocidade e da direo da coluna de ar.
Em Artaud encontra-se uma lista com
todos os harmnicos e suas posies.
Segundo Levine (2005,p.18) A cada
dedilhao corresponde diversas notas da
srie harmnica, que se pode fazer soar
com um sopro bem dirigido e uma maior
ou menos intensidade de apoio.
FIGURA 11
Neste caso, Santoro quer que soe a nota r
com a posio na nota sol. Nota-se que o
compositor preferiu modificar o timbre da
nota r, j que o trecho est escrito em
dinmica decrescendo.
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30
22
Levine (2005, p.16)
FIGURA 12
Neste trecho h duas possibilidades de
execuo: 1- Posio em d (primeira
oitava) e r ( primeira oitava) para que se
soe duas oitavas acima as notas d e r. 2-
posio em f e sol para que soe as quintas
d e r. Pela facilidade no dedilhado e pelo
efeito que o compositor almeja estar
tambm relacionado a dinmica, sugiro a
segundo opo.
FIGURA 13
A nica opo aqui, que se faa a posio
de r (primeira oitava) para soar o
harmnico r (segunda oitava). Nota se
nesse trecho que a dinmica colocada de
um crescendo, diferentemente dos dois
trechos acima. Os harmnicos na primeira
oitavam deixam a nota mais preenchida e
brilhante.
FIGURA14
Duas possibilidades: 1- posio de mi
(primeira oitava) para soar o harmnico mi
( terceira oitava) 2- posio de l para soar
sua quinta uma oitava acima. Pelo ponto de
vista do dedilhado a primeira opo
melhor.
Frullato uma das tcnicas expandidas mais difundidas na nova msica e a mais
utilizada.22 Tanto Levine quanto Artaud
concordam nas duas possibilidades de
execuo: atravs da lngua ou da
garganta. Percebendo a discrepncia do
que cada um dos autores fala a respeito do
que melhor usar, chegamos a concluso
que isso depende muito mais do formato
de lngua e garganta de cada um e do
estudo realizado com os dois tipos. No
entanto no privilegiaremos nenhum
modo.
FIGURA 15
Nesse elemento, encontramos aliado ao
frullato, um glissando e um acento. Tal
gesto bastante incomum nas obras solos
pesquisadas. Nesse caso a lngua
contribuir na execuo do acento de
forma mas eficaz que a garganta. Nota-se
que o frullato permanece na glissando e
somente no si ele deve parar.
-
31
FIGURA16
Um frullato na regio aguda em dinmica f
seguindo na seqncia de semicolcheias.
Nota-se um certo cuidado na articulo do
d (terceira semicolcheia).
FIGURA 17
Nessas duas figuras 17 e 18 o compositor
nos deixa em dvida pela mudana de
padres na escrita. Nas anteriores, Santoro
escreve abaixo das notas Flatterz.
Indicando que se deve fazer o frullato. Mas
nas figuras 17 e 18 ele coloca apenas o
sinal o que deixaria a entender tambm
uma possibilidade de ataques duplos.
Porm se olharmos pela semelhana da
figura 18 e 19, por exemplo, podemos
concluir que o efeito de frullato
funcionaria melhor do que ataque duplo.
FIGURA 18
FIGURA 19
FIGURA 20
O mesmo efeito da figura 15, porm sem a
acentuao. Nesse caso a lngua ou a
garganta seriam possveis.
FIGURA 21
-
32
23 O mecanismo de Boehm se refere ao mecanismo da flauta transversal atual. Em 1847 Theobald
Boehm reconstruiu o sistema da flauta transversal se baseando em trs princpios: a flauta teria um
tubo cilndrico com exceo do bocal; os buracos no tubo seguem a escala cromtica; o mecanismo foi
construdo para que os dedos fossem capaz de controlar todas os buracos atravs das chaves.
FIGURA 22
Trmolos Os trmolos, segundo Levine (2005, p.50) so alternncias em duas notas em
intervalos mais amplos que uma segunda
maior. Muitas vezes para obter-se
resultados melhores necessrio a
utilizao de posies auxiliares para
execuo dos mesmos. Artaud ( (p.16)
mostra alguns trmolos impossveis de ser
executados com posio real no
mecanismo de Boehm23.
FIGURA 23
O trmolo em si tem fcil execuo. O
detalhe maior est nas articulaes escritas
antes e depois do trmolo.
FIGURA 24
Esse,assim como o da figura 23, no
apresenta dificuldades na execuo
FIGURA 25
Nota-se que o uso do stacatto aliado ao
trmolo comum na escrita de Santoro.
FIGURA 26
Uma posio que auxiliaria na agilidade
desse trmolo o La( 3 oitava posio
real) com o si ( 2 oitava ) no harmnico de
F #.
-
33
FIGURA 27
Uma observao importante na ateno
ao ler esse trecho. Apesar de os quatro
aparentarem ser trmolos, somente o
primeiro e o terceiro grupo de duas
colcheias o so.
FIGURA
28
A mesma ateno comentada na figura 27
deve-se ter aqui.
Chaves percutidas
Sobre o efeito de chaves percutidas no
temos o detalhamento necessrio para
tratar com clareza desse assunto que
acabou se tornando um assunto chave em
meu trabalho. Pretendo concluir atravs de
uma pesquisa mais intensa nas
bibliografias j citadas.
FIGURA 29
FIGURA 30
FIGURA
31
FIGURA 33
Polifonia Escrita
-
34
4.1 Anlise das sries dos Epigramas :
A partir de dados metodolgicos retirados de outras anlises de peas
dodecafnicas priorizamos em nossa pesquisa, uma anlise das sries a partir da
Teoria dos conjuntos.24
Tal procedimento nos permite obter uma matriz contendo
todas as permutaes, inverses e retrgrados, baseada na srie original.
I0 I4 I1 I10 I3 I8 I7 I2 I11 I6 I9 I5
P0 D F# D# C F A# A E C# G# B G R0
P8 A# D B G# C# F# F C A E G D# R8
P11 C# F D B E A G# D# C G A# F# R11
P2 E G# F D G C B F# D# A# C# A R2
P9 B D# C A D G F# C# A# F G# E R9
P4 F# A# G E A D C# G# F C D# B R4
P5 G B G# F A# D# D A F# C# E C R5
P10 C E C# A# D# G# G D B F# A F R10
P1 D# G E C# F# B A# F D A C G# R1
P6 G# C A F# B E D# A# G D F C# R6
P3 F A F# D# G# C# C G E B D A# R3
P7 A C# A# G C F E B G# D# F# D R7
RI0 RI4 RI1 RI10 RI3 RI8 RI7 RI2 RI11 RI6 RI9 RI5 25
24 Mtodologia baseada no livro de Allen forte: The structure of atonal music.
25 Matriz calculada atravs de uma programao de computador pelo site:
http://www.musictheory.net/calculators/matrix
-
35
Calculada a Matriz, podemos visualizar na obra o tratamento que Santoro deu as
sries identificar melhor a influncia das sries na construo de frases, na escolha da
articulao e dinmica entre outros fatores composicionais. Tais procedimentos
analticos ainda se encontram em procedimento.
-
36
5. Bibliografia:
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_______. Correspondncia a Cludio Santoro: fev/1947
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LANGE, Francisco Curt. Correspondncia a Cludio Santo. Srie 2. Subsries
2.1 e 2.2
SANTORO, Cludio. Correspondncia a Carlos Santoro: 4/07/1945
_______. Correspondncia a H.J. Koellreuter: 28/01/1947
_______. Correspondncia a H.J. Koellreuter: 14/02/1947
_______. Correspondncia a Bruno[?]: Braslia 24/09/62
Referncias na WEB
Associao Cultural Cludio Santoro:< www.claudiosantoro.art.br