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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE
CENTRO DE EDUCAÇÃO, FILOSOFIA E TEOLOGIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO
Templo de Salomão: um produto Made in Brazil
Rogério Barrios
São Paulo
2018
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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE
CENTRO DE EDUCAÇÃO, FILOSOFIA E TEOLOGIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO
Templo de Salomão: um produto Made in Brazil
Rogério Barrios
Dissertação apresentado em cumprimento às
exigências do Programa de Pós-Graduação em
Ciências da Religião da Universidade
Presbiteriana Mackenzie, para obtenção do título
de Mestre em Ciências da religião.
Orientador: Prof. Dr. Ricardo Bitun
São Paulo
2018
5
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus pela sua infinita bondade, misericórdia e paciência comigo.
A família abençoada que Deus me deu através das minhas amadas meninas, Andréa
(esposa), Mariana e Isabel (filhas), onde pude crescer e descobrir a beleza que é ser
esposo e pai.
Pela compreensão da ausência em muitos momentos.
Aos meus pais Miguel e Darci, sem as quais não poderia receber a luz da vida.
A família da Igreja Cristã Yeshua, que me faz diariamente relembrar o verdadeiro
motivo da busca na qualificação do Espírito, alma e domínio da carne.
Ao meu orientador, Prof. Dr. Ricardo Bitun, pela parceria e constante direção.
Aos membros da banca examinadora, Prof. Dr. Cristiano Camilo Lopes e Profa. Dra.
Renata da Silva Coelho, pela leitura exigente e aprendizado.
Ao Professor Lindberg Moares, responsável por fazer com que este título de mestre
pudesse ter se realizado dentro da Universidade Presbiteriana Mackenzie.
Por todos os professores que um dia fizeram parte da minha vida, desde a Escola
Municipal Cecília Meireles, localizada no bairro do Cangaíba na periferia da cidade de
São Paulo até a Universidade Presbiteriana Mackenzie.
Aos grandes escritores da humanidade, em especial a Apóstolo Paulo e João Calvino,
que fizeram com que a Letra que ensina a Palavra de Deus pudessem se tornar objetos
literários.
A todos que me ajudaram a viver cada momento na construção deste trabalho.
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RESUMO
Essa dissertação toma como objeto de reflexão o empreendimento religioso da Igreja
Universal do Reino de Deus (IURD) conhecido como Templo de Salomão Brasil. A
partir de uma leitura que articula ciências da religião e relações internacionais, procura-
se determinar em que medida esse empreendimento religioso pode ser lido como um
modelo de igreja/negócio. Para isso, debruçamo-nos sobre as origens do
pentecostalismo a fim de compreender sua complexa relação com o campo religioso
brasileiro e a lógica que transforma os bens religiosos em mercadorias.
Palavras-chaves: Neopentecostalismo. Templo de Salomão. Igreja/Negócio. Poder
Brando. Poder Brando Religioso.
ABSTRACT
This dissertation takes as object of reflection the religious enterprise of the Igreja
Universal do Reino de Deus (IURD) known as Temple of Solomon Brazil. From a
reading that articulates the sciences of religion and international relations, it is sought to
determine to what extent this religious enterprise can be read as a model of
churc/business. To this end, we focus on the origins of Pentecostalism in order to
understand its complex relationship with the Brazilian religious field and the logic that
transforms religious goods into commodities.
Keywords: Neopentecostalism. Temple of Solomon. Church / Business. Soft Power.
Soft Religious Power.
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Sumário
INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 7
CAPÍTULO 1
NEOPENTECOSTALISMO: UMA PLATAFORMA EMPRESARIAL CONCEBIDA
PELA IGREJA BRASILEIRA ............................................................................................ 10
1.1 A origem da Igreja Neopentecostal e sua relação com a cultura brasileira. .................. 15
1.2 A secularização da religião e o surgimento da igreja/negócio neopentecostal brasileira ... 23
CAPÍTULO 2
TRÂNSITO RELIGIOSO, ENTRETENIMENTO E CLIENTES DA FÉ ......................... 32
2.1 – Transito religioso e os mochileiros da fé: compreendendo a lógica da circulação. ... 32
2.2 – O Templo de Salomão como um modelo de Igreja/Negócio ..................................... 39
CAPÍTULO 3
TEMPLO DE SALOMÃO: UM PRODUTO MADE IN BRAZIL ...................................... 46
3.1 – Templo de Salomão: um produto Made in Brazil. ..................................................... 47
3.2 – O poder brande (Soft Power) e o poder brando religioso (Soft Religious Power) no
entretenimento religioso ...................................................................................................... 54
CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................................. 63
BIBLIOGRAFIA ................................................................................................................. 67
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INTRODUÇÃO
“A mente do homem é como um depósito de
idolatria e superstição; de modo que, se o homem confiar
em sua própria mente, é certo que ele abandonará a Deus
e inventará um ídolo, segundo sua própria razão.”
João Calvino
Essa dissertação tem como objetivo refletir sobre a relação entre religião e
mercado, tomando como eixo do debate o empreendimento religioso da Igreja Universal
do Reino de Deus (IURD), conhecido como Templo de Salomão Brasil.
A proposta consiste em determinar em que medida esse empreendimento
religioso pode ser lido como um modelo de igreja/negócio. Com base em buscar
elementos que provem que atualmente há uma modalidade que desenvolve novos
prosélitos adequados a tal igreja/negócio do século XXI, sendo esta plataforma o
chamado Neopentecostalismo.
Com base nesta proposta, pretende-se utilizar a consagrada “Teoria da
Interdependência Complexa” concebida pelo prof. de Harvard, Dr. Joseph Nye Jr, com
o objetivo de tentar compreender a relação que há entre religião e mercado.
Nesse sentido, uma teoria proposta para analisar o contexto das relações
internacionais será útil para compreendermos a lógica dos mercados consumidores, cujo
poder de convencimento pode ser lido como uma espécie de força aparentemente
invisível e branda, que é o Soft Power (Poder brando).
_________________________ 1 Fragmento encontrado no site https://www.pensador.com/frase/MTA3NzAxNQ/
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Sendo que esse invisível elemento de sofisticado poder (Soft Power) é utilizado
como um componente de conquista para a “venda dos valores” de nações ou empresas,
através de um catálogo de diversos Entretenimentos (cinema, música, parques
temáticos, castelos mágicos, etc.).
Assim, com o passar do tempo, o neopentecostalismo vai alicerçando cada vez
mais suas estruturas aos moldes de uma igreja secularizada, sofisticando a cada instante
a maneira de se produzir Entretenimento Religiosa. Se tornando cada vez mais aderente
as mentes sem pavimentação bíblica fundamentada. Isto é, aos que trocam a adoração
pela atração espetaculosa.
Desta maneira, esta dissertação estará abordando o principal ícone de todos os
entretenimentos neopentecostais que surgiram até os dias de hoje no Brasil, e porque
dizer, nos tempos atuais em todo o mundo, que é Templo de Salomão Brasil.
Sendo este reconfigurado de sua concepção original israelita pela chamada
igreja/negócio, concebida pela Igreja Universal do Reino de Deus – IURD, em um
sofisticado monumento faraônico as margens da Av. Celso Garcia na cidade de São
Paulo.
O Templo de Salomão Brasil é um verdadeiro “Castelo dos Sonhos dos
Evangélicos”, semelhante a um dos “Castelos dos Sonhos” de Wald Disney,
principalmente no que tange ao entretenimento convertido em lindos contos de fadas e
magia. Em que os desejos são prontamente realizados.
No caso americano, uma política bem orquestrada para amortecendo a razão
lógica do mundo, invadido pelo “imperialista” econômica norte-americana através do
entretenimento. Levando os valores da terra do “Tio San” às mentes e corações,
principalmente de crianças em formação que, um dia, serão governantes de suas
respectivas nações, e como fã inveterados de Mickey Mouse e sua turma, nunca mais
poderão afastar suas culturas da cultura do entretenimento americano, já que no limite
esta passa a ser uma cultura não mais de um país e sim mundial.
Procurando tratar da relação entre neopentecostalismo e mercado, os capítulos
desta dissertação estão organizados da seguinte forma: o primeiro capítulo procura
contextualizar as origens do pentecostalismo brasileiro, a fim de compreender os
processos de transformação; assim, é importante relacionar esse processo de
10
transformação ao processo de secularização. O segundo capítulo tem como objetivo
situar o neopentecostalismo no contexto do campo religioso brasileiro; para isso
utilizamo-nos do conceito de “trânsito religioso” para mostrar a lógica da mobilidade
entre as alternativas religiosas. Por fim, no terceiro capítulo procuramos explorar os
aspectos simbólicos e religiosos do Templo de Salomão a partir da teoria do Soft Power
de Joseph Nye. O argumento central consiste em demonstrar que o Templo de Salomão
pode ser lido como um modelo de igreja/negócio, um verdadeiro produto Made in
Brazil.
Assim, o objetivo central desta dissertação será buscar as provas que
demonstram esta mesma venda de valores através do entretenimento religioso, por meio
do Templo de Salomão Brasil, aos evangélicos de todas as partes do mundo, através do
Soft Power, proposta nas Teorias de Joseph Nye (2002a; 2002b).
Procuramos entender o quanto o Templo de Salomão Brasil, outrora um Templo
de propriedade moral, intelectual, histórica e espiritual dos filhos de Salomão e de toda
a humanidade, foi desmantelado, por uma jogada de marketing genial, deixando para
trás o próprio Phillip Kotler, pai do marketing moderno.
A busca em explicar tais movimentos do entretenimento religioso que emana
desta plataforma neopentecostal se dá em utilizar um instrumento atualizadíssimo da
diplomacia mundial, que é poder obtido através Soft Power. Decodificando, por sua vez,
as ações de uma igreja/negócio instalada no Brasil, com vistas no acúmulo de bens
(visíveis ou invisíveis) em todo mundo, e que parece capturar seus esforços
economicamente através de um produto palpável, que é o Templo de Salomão Brasil.
Imprimindo no mesmo o selo Made in Brazil, através do Reino Universal das
Maravilhas Religiosas.
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CAPÍTULO 1
NEOPENTECOSTALISMO: UMA PLATAFORMA EMPRESARIAL
CONCEBIDA PELA IGREJA BRASILEIRA
Este capítulo tem como objetivo contextualizar os desdobramentos do conceito
de neopentecostalismo na cultural brasileira, abrindo-nos possibilidades de descrever as
estratégias da Igreja Universal do Reino de Deus em torno do chamado Templo de
Salomão Brasil, localizada no bairro do Brás em São Paulo.
De acordo com uma série de pesquisas (FRESTON, 1992; MARIANO, 1999;
CAMPOS, 1999; BITUN, 2011) o neopentecostalismo passou a ocupar consideráveis
espaços no campo religioso, fundindo sua fronteira com secularizada sociedade
brasileira dos nossos dias.
Por isso, é preciso, pois, um panorama que nos permita situar essas questões.
Na tentativa de compreender a dinâmica do campo religioso brasileiro, a
literatura sociológica tratou de organizar as principais matrizes religiosas em distintas
classificações, especialmente em relação ao pentecostalismo.
De fato, um sistema tipológico fazia-se necessário diante da diversidade
institucional e segmentos doutrinários.
Assim, esse panorama sociológico acerca das classificações do pentecostalismo,
nos permite compreender a configuração dessa diversidade religiosa no campo
evangélico.
Nas décadas de 1970, Candido Procópio Camargo (1973) chamava atenção para
a dinâmica de crescimento dos pentecostais. Sua análise valia-se da tipologia weberiana
“igreja-seita” para descrever os tipos de relações que os pentecostais mantinham com a
sociedade. A distinção igreja-seita diz respeito aos modelos institucionais, sendo a
“igreja” o tipo mais aberto ao sistema vigente e a “seita” um tipo mais isolado.
A análise do Protestantismo brasileiro indica que este desenvolveu de
início certos aspectos característicos da “seita”, passando
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gradualmente a estabelecer-se como “igreja”, no tocante as principais
denominações “históricas”. A dinâmica dos grupos pentecostais
brasileiros, no entanto, indica que suas diferenças internas tornam
possível estabelecer variações escalonáveis entre as denominações
mais próximas à “seita” e à “igreja”. Assim, embora compartilhando
pontos doutrinários, diferem os extremos do “gradiente” proposto em
aspectos como os de ritual, manifestação dos dons espirituais, grau de
integração dos fiéis e estilo de liderança (CAMARGO, 1973, p. 153).
Emerson Giumbelli também se lembra do trabalho pioneiro de Beatriz Muniz de
Souza, umas das colaboradoras das pesquisas de Cândido Procópio Camargo. A
tipologia “igreja-seita” foi umas primeiras classificações para dar conta dessa
diversidade religiosa pentecostal, especialmente em relação às suas diferenças internas.
O trabalho de Beatriz Muniz de Souza (1969), pioneiro entre nós na
sua tentativa de inventariar os elementos que constituíam a
religiosidade pentecostal, é ilustrativo da situação. Ele dedica um
capítulo inteiro a uma discussão de tipologia e adota, a partir de
referências sociológicas que desenvolvem as elaborações de Weber,
Troeltsch e Niebuhr, um gradiente “seita-igreja” para dar conta da
diversidade interna aos pentecostais. Se observarmos os trabalhos
mais recentes, chegamos a uma dupla constatação. A tipologia
“igreja/seita” passa a ser vista como insuficiente para contemplar a
diversidade pentecostal e tende a dar lugar a locuções inéditas e
neologismos. Ao mesmo tempo, quando a referência ao conceito de
“seita” não é totalmente abandonada, geralmente incorpora elementos
que extrapolam a tradição sociológica que inspirou Souza. Em todo
caso, generalizou-se a percepção de que se tornou insuficiente definir
o universo pentecostal a partir apenas da contraposição às demais
denominações protestantes. O resultado é um verdadeiro debate a
respeito não só de como caracterizar o protestantismo dos
pentecostais, mas também de como apreender suas distinções internas
(GIUMBELLI, 2000, p. 90).
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Como podemos observar a tipologia “igreja-seita” com o tempo passa a ser
insuficiente para dar conta da diversidade do campo religioso pentecostal brasileiro.
Nesse sentido, os pesquisadores sugeriram novas classificações para explicar o
fenômeno que até apontava exponencial crescimento.
A categorização “neopentecostal”, uma das mais conhecidas tipologias do
pentecostalismo brasileiro, relacionam-se aos trabalhos de Paul Freston (1993) e
Ricardo Mariano (1999).
Freston parte da formulação da metáfora das três ondas com o objetivo de
ordenar a diversidade das transformações do pentecostalismo: a primeira onda foi
chamada de Pentecostalismo Clássico e compreendia as décadas de 1910 a 1950, sendo
representadas pelas igrejas Assembléia de Deus e Congregação Cristã no Brasil; estas
tinham como principais características a ênfase no batismo com Espírito Santo e o falar
em línguas, usos e costumes rígidos e rejeição ao mundo secular (inclusive à política)
em detrimento de um de uma recompensa no mundo escatológico.1
A segunda onda, de 1950 a 1970, ficou conhecida como deutero-
pentecostalismo ou pentecostalismo de segunda onda, sendo representado pelas igrejas
O Brasil para Cristo, Deus é Amor e Igreja do Evangelho Quadrangular; as principais
características seriam o evangelismo para além dos templos (cruzadas em ginásios,
estádios de futebol, etc), utilização dos meios de comunicação de massa (o rádio em
especial) e ênfase na cura divina.
A terceira onda, de 1970 à atualidade, seria identificada como neo-
pentecostalismo, caracterizado pela importação da chamada Teologia da Prosperidade2
surgida na América do Norte. Com vistas à rejeição do estigma causado pelos usos e
1 Acreditava-se que Jesus voltaria para estabelecer um reinado literal de mil anos sobre a Terra, e,
portanto, cabia-lhes anunciar o fim dos tempos que antecediam este reinado. O termo “escatologia” se
refere ao sistema de crença em relação ao futuro.
2 A Teologia da Prosperidade é uma adaptação cristã ao capitalismo. Diferente da teologia do
pentecostalismo clássico, que enfatizava uma “providencia” divina para o sofrimento humano, a teologia
da prosperidade enfatiza uma postura de “cobrança” diante das “promessas” de Deus na Bíblia.
Acreditam que os cristãos devem desfrutar de todos os bens terrenos; que não devem sofrer ou terem
enfermidades. Os cristãos que ainda estão nestas condições, precisariam exercer a fé e “cobrar” de Deus.
Um dos meios de colocar a fé em prática é estabelecendo uma relação de “troca” enfatizada por uma nova
interpretação do “dízimo”, configurando o “dar e receber”. Ver Ricardo Mariano (1996).
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costumes adotado pelos pentecostais anteriores, e na forte ênfase na fé e no tele-
evangelismo (rádio, TV, etc).
Por sua vez, Mariano procura desenvolver uma classificação mais precisa com o
termo neopentecostalismo, apresentando características específicas. Para esse autor:
O prefixo “neo” mostra-se apropriado para designá-la tanto por
remeter à sua formação recente, quanto ao caráter inovador do
neopentecostalismo. Embora recente entre nós, o termo
“neopentecostal” foi cunhado há vários anos nos EUA. Lá, na década
de 70, ele designou as dissidências pentecostais das igrejas
protestantes, movimento que posteriormente foi designado de
carismático (MARIANO, 1999, p. 67).
Conforme avaliação do prof. Dr Ricardo Bitun, esse sistema de classificação:
...facilita a visualização do campo pentecostal, dando maior clareza à
evolução do pentecostalismo brasileiro durante sua implantação em
território nacional, ao mesmo tempo em que permite enxerga, de uma
maneira bem distinta, as características que cada onda apresenta em
seu surgimento (2011, p. 58).
Emerson Giumbelli (2000) debruça-se sobre a literatura acadêmica a fim de
contextualizar os principais critérios das tipologias institucionais. Em um quadro geral,
essas formulações tornaram-se referenciais para descrição do pentecostalismo brasileiro
e suas mutações dinâmicas, a ponto de algumas tipologias não darem mais conta do
problema. Conforme nota esse autor:
Na verdade, essa preocupação classificatória é uma marca
praticamente congênita do campo protestante. Brandão (1988) já
notara como os próprios integrantes desse universo desenvolvem um
olhar sensível às divisões entre si e com os demais segmentos do
campo religioso. Os estudos, por sua vez, sempre reconheceram a
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heterogeneidade do protestantismo, sob diversos aspectos: correntes
teológicas, formas de implantação no Brasil, modos de expansão
religiosa, tipos de atuação social, etc. Mas até pouco tempo atrás, essa
heterogeneidade não adentrava o universo pentecostal, cujas
distinções internas, sem serem negadas, não conseguiam sofrer uma
categorização a partir dos mesmos critérios (GIUMBELLI, 2000, p.
90).
Portanto, os critérios tipológicos são datados e precisamos compreender seus
desdobramentos para fins analíticos. Desse modo, a tipologia neopentecostal passou por
uma série de transformações até ganhar o sentido atual. Giumbelli nos dá pistas sobre
esse processo:
Se nos interessarmos em resgatar a origem do termo
neopentecostalismo, seremos levados por várias referências (Corten
1999; Freston 1999; Domingues 1995) a formulações produzidas
primeiramente nos Estados Unidos. Concorda-se em afirmar que, na
década de 60, a categoria neopentecostalismo serviu para designar o
movimento carismático que atinge tanto as igrejas protestantes
históricas quanto a Igreja Católica. A categoria, no entanto, passou a
ser utilizada em outros contextos e a ganhar novos sentidos
(GIUBELLI, 2000, p. 91).
Portanto, com todas as ressalvas, por neopentecostalismo, estaremos nos
referindo especificamente à tipologia proposta por Freston e Mariano.
De modo específico, buscaremos tratar das estratégias de mercado da Igreja
Universal do Reino de Deus (IURD) em torno do Templo de Salomão Brasil. É nesse
sentido que nos aproximaremos de uma análise que relaciona neopentecostalismo e a
lógica de mercado.
Na segunda parte deste mesmo capítulo, definir-se-á o conceito de secularização,
o surgimento da igreja/empresa e sua vasta plataforma de oportunidades na condução
de eventos religiosos, em meio à privatização da religião, que passa a ter como base não
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mais o porvir celestial e sim o aqui e agora. E chamaremos essa lógica de
“entretenimento neopentecostal”.
1.1 A origem da Igreja Neopentecostal e sua relação com a cultura
brasileira.
O pentecostalismo brasileiro é o reflexo do movimento missionário originado
em Chicago por William H. Durham no final do século XIX.
De maneira breve, apenas como referência histórica, o chamado pentecostalismo
originou-se nos Estados Unidos em 1° de janeiro de 1901, em uma reunião de oração
que ocorrida no Colégio Bíblico Betel, no estado do Kansas.
Nesta ocasião, convencionou-se entre os presentes que, falar em línguas (dom de
glossolalia) seria um sinal bíblico do Batismo com o Espírito Santo. E isso passaria a
ser uma prova concreta de que alguém poderia ser um ministro do evangelho. Sendo
que o não falar em língua, automaticamente passava e até os dias de hoje faz com que
pessoas não possam fazer inúmeras tarefas dentro da Igreja.
No contexto norte-americano, o surgimento do movimento Pentecostal passou a
se popularizar quando o ex-escravo William Joseph Seymour viaja para Los Angeles
promovendo o famoso avivamento da Rua Azusa em 1906, assumindo a partir deste
momento dimensões internacionais (CAMPOS, 2005).
Desta maneira, há que se perceber que quando o movimento pentecostal
desembarcou em terras brasileiras, estava apenas no início, já que os seus missionários
tocados por este movimento chegaram à cidade de Belém do para em 1911.
Assim, não havia uma estrutura basilar sólida por trás deste movimento que
pudesse garantir sua preservação quanto aos conceitos do protestantismo reformado,
mas se encaixando como uma luva, com o passar do século XX, no fértil terreno da
cultura espiritualista brasileira.
Leonildo Silveira Campos descreve a inserção do pentecostalismo no Brasil nos
seguintes termos:
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O movimento pentecostal que chegou ao Brasil em 1910-11 veio dos
Estados Unidos, tratando-se então de uma expansão de um campo
religioso em direção a outros que ainda não conheciam a sua mensa-
gem. Esse “novo” movimento não era tão novo assim, pois dava
continuidade aos movimentos de reavivamento espiritual, santidade e
fundamentalismo, que dariam a feição e fisionomia para o
evangelismo daquele país durante todo o século seguinte. Todavia, 60
anos mais tarde, depois de se expandir à margem e dentro das
fronteiras do protestantismo tradicional, das práticas litúrgicas, das
teologias e das formas pentecostais de ver o mundo, chegou à Igreja
Romana, por meio da Renovação Carismática Católica, estudada no
Brasil, entre outros, por Reginaldo Prandi (1997) e Brenda Carranza
(2000). A introdução do pentecostalismo no Brasil, no entanto, a
despeito de ter as mesmas origens, criou membros da “família
pentecostal” que sequer se consideram parentes entre si. Assim, nada
mais distante da Congregação Cristã no Brasil do que os pentecostais
da Assembléia de Deus. Porém, o divisionismo seria iniciado somente
na Assembléia, que em 1930 viu nascer no Nordeste a Igreja de Cristo
e dois anos depois, também no Nordeste, a Igreja Adventista da Pro-
messa. Nos anos 40 mais um movimento pentecostal autônomo, este
originado por cisões entre metodistas paulistanos, dando origem à
Igreja do Avivamento Bíblico. Essa “família” somente iria crescer
com o advento dos pregadores de curas divinas e milagres, oriundos
da Igreja do Evangelho Quadrangular, início dos anos 50, em São
Paulo, quando surgem a Igreja do Evangelho Quadrangular, a Igreja
Pentecostal O Brasil para Cristo e a Igreja Pentecostal Deus é Amor,
entre uma multiplicidade de pequenas novas igrejas, seitas e
denominações. Os dados do último Censo realizado pelo IBGE (2000)
ilustram bem esse crescimento. Naquele ano, havia no Brasil 17,7
milhões de brasileiros incluídos na categoria de pentecostais, o que
equivale a 67,65% do total de 26,2 milhões de evangélicos. Desse
número de pentecostais, 47,47% pertenciam à Assembléia de Deus;
14,04% à Congregação Cristã do Brasil. Portanto, 61,5% dos
pentecostais faziam parte dos dois maiores e mais antigos movimentos
pentecostais no país e, curiosamente, os menos estudados pela
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academia (12). Ao terceiro grupo mais numeroso, a Igreja Universal
do Reino de Deus (Iurd), foi atribuído um total de 11,85%. Trata-se,
no entanto, de um dos ramos pentecostais mais novos, sincréticos,
dinâmicos e visíveis no espaço social (mídia e política). De acordo
com pesquisas de Mariano (1999), Oro, Corten e Dozon (2003),
Campos (1997) e tantos outros, a IURD é um tipo de religião que mais
se adapta a um contexto de globalização e internacionalização da
cultura e da economia (CAMPOS, 2005, 113).
Retomando a idéia posta anteriormente, percebeu-se então no roteiro histórico
do movimento pentecostal, desde o que foi originado no Texas e depois em particular, o
de maior proporção em Los Angeles, que a própria Bíblia foi tratada com parcialidade,
já que a despeito do dom da glossolalia, que separou e separa os pentecostais dos
demais grupos protestantes, houve práticas que a partir deste conceito (falar em
línguas), só os que possuíssem tal habilidade erram possuidores dos dons do Espírito.
É bom que se diga ainda que, não se está tratando o assunto do surgimento do
neopentecostalismo com medida de julgamento, mas sim como mero exercício
investigativo literário para que se tenha uma radiografia um pouco mais eficaz do
nascimento de tal movimento, em meio ao tempero cultural brasileiro.
De qualquer maneira, passa a ser importante destacar que, este mesmo
pentecostalismo que nasceu nos Estados Unidos e desembarcou no Brasil no decorrer
do século XX, desfilou pelos rincões da terra descoberta por Pedro Álvares Cabral se
deparando com outros matizes do conhecimento religiosos, se rendendo a modificações
com o passar do tempo, a ponto de alguns de seus adeptos mais tradicionais afirmarem
que houve uma descaracterização do movimento pentecostal origem.
Tal mistura talvez deva ter ocorrido porque suas raízes ainda não eram
profundas quando aqui chegaram, devido ao noviciado deste movimento ainda no seu
nascedouro, se transformando assim em vários modelos de pentecostalismos e outras
variações de doutrinas, sendo uma delas aquela que se passou a se chamar de
neopentecostalismo.
19
Desta forma, a chegada do pentecostalismo em terras brasileiras se dá a partir de
dois focos principais: o primeiro se estabelece ao norte do Brasil, sendo introduzidos
pelos missionários suecos Daniel Berger e Gunnar Vingren, em 1911, dando origem a
Assembléia de Deus (AD); o segundo se estabelece no sudeste do território nacional,
através do missionário italiano Louis Francescon, na década de 20, dando origem a
Congregação do Brasil (CCB). Assim, ambos os grupos dariam origens ao chamado
“pentecostalismo clássico”.
Passou-se então, a partir desta iniciativa, a serem construídas uma via deste
movimento protestante com matizes própria, mesmo que em boa medida com base em
outras matrizes de doutrinas não necessariamente protestantes.
Além disso, não podemos nos esquecer que ambas inseriram-se em um contexto
dominado por tradição católica posicionada em todo território nacional, e que nesta
relação, verificou-se uma série de transformações transculturais que se aproximavam
das práticas pentecostais às culturas populares que misturavam catolicismo e
espiritualismo múltiplo. Aflorando uma expressão da religiosidade popular brasileira,
com semelhanças de rituais vistos nas mais diferentes denominações e doutrinas
religiosas espalhadas pelo Brasil até os dias de hoje.
Se recorrêssemos a uma metáfora para ilustrar essa relação, diríamos que assim
como ocorrido com o povo de Israel ao chegarem à chamada “Terra Prometida”,
misturam-se com os costumes locais, de modo semelhante aconteceu com o
pentecostalismo ao estabelecer-se no Brasil. E que os efeitos dessas relações ainda são
percebidos nos dias de hoje em terras tupiniquins. Sendo que na ocasião da chegada do
pentecostalismo, pode-se dizer que eram inevitáveis que tais transformações deixassem
de ocorrer.
Nesse sentido, em relação à tradição protestante, o pentecostalismo brasileiro
distanciou-se dos vínculos da Reforma Protestante pronunciada por Martinho Lutero em
1517, apesar de se manterem algumas questões doutrinárias incipientes.
Em escala global, um dos fatores que contribuíram para essas transformações
pode ser associado ao capitalismo mundial, dando a sensação de que as práticas do
pentecostalismo cederam à lógica de mercado, transformando seus bens em produtos
disponíveis no mercado.
20
Assim, em suas mais variadas formas surgidas a partir das sementes do
pentecostalismo no Brasil, pouco se tem como realidade atual, das bases originais
daquilo que foi trazido pelos seus missionários, e este preâmbulo sobre o nascimento do
pentecostalismo brasileiro se faz necessário para que possamos entender os diversos
matizes que levaram o Brasil a desenvolver em sua sociedade o neopentecostalismo.
A partir desse ponto teremos condições de compreender a lógica do mercado
subjacente à plataforma empresarial que assumiu e chamaremos isso de “entretenimento
religioso”, tomando como modelo ideal o empreendimento do Templo de Salomão
Brasil.
Voltando ao entendimento sobre o surgimento do neopentecostalismo, se faz
necessário esclarecer que, assim como qualquer semente, muitas são as variáveis para
que ele germine em uma terra, caracterizado pelas diversas projeções culturais
existentes em um país continental como é o caso do Brasil. E devido a esta múltipla
continência de variáveis pela qual o pentecostalismo passou em mais de um século, os
desdobramentos coincidiu com as práticas relacionadas à lógica do capital.
Na prática é o que se encontra pendurado nas copas das árvores das igrejas
pentecostais brasileiras como fruto, após esta semente lançada no passado pentecostal
original.
Suas flores e frutos como o decorrer deste tempo, passaram a polemizar muito
mentes e doutrinas do que qualquer outro movimento protestante existente na história
da religiosidade brasileira. Isto é, muito difícil alguma igreja chamada “evangélica”
brasileira não possuir algum tipo de ingrediente do movimento pentecostal do inicio do
século XX.
Outro fator a ser mencionado nesse contexto diz respeito à lógica das rupturas,
fenômeno que acompanhou também as origens do protestantismo (MONTERO &
ALMEIDA, 2001; CAMPOS, 2005; BITUN, 2011).
Numa tentativa de compreender a dinâmica do pluralismo religioso no mundo
moderno, pesquisadores propuseram a metáfora do “trânsito religioso” como um modo
de apreender a mobilidade das religiões.
21
Proposta por Ronaldo Almeida e Paula Montero, a noção de trânsito religioso,
seria um modo de repensar a dinâmica desse fenômeno religioso.
Estes pesquisadores observam neste fenômeno religioso um duplo movimento
alimentado por um macro-processo contínuo, demarcado pela “circulação de pessoas
pelas diversas instituições religiosas”, e por outro lado, “uma metamorfose das práticas
e crenças”, num fluxo constante entre si (ALMEIDA & MONTERO, 2001, p. 93).
Desse modo, valendo-se da análise de dados gerais, como sócio-demográficos e
etnográficos, os pesquisadores contribuem para a compreensão e configuração do
trânsito religioso e suas principais tendências no Brasil.
Neste macro-processo demonstra-se um fluxograma onde aparecem as principais
instituições religiosas tidas como “doadoras” e “receptoras” de adeptos, bem como, a
“circulação de crenças” entre si.
Em outro artigo Ronaldo Almeida (2004) destaca três dimensões
complementares na reconfiguração do trânsito religioso: 1) Multiplicação das
alternativas. Nesta dimensão, destaca-se a diversificação do campo religioso, tomando
como base a formulação dos dados censitários que chegaram ao Censo de 2000 a propor
143 alternativas organizadas por tradições religiosas, a fim de dar conta dessa
diversidade (Idem, p. 16); 2) Mobilidades de pessoas entre as alternativas. Nesta
dimensão busca-se demonstrar a intensidade das mudanças de filiações religiosas; 3)
Trânsito de práticas e crenças. Esta terceira dimensão diz respeito não apenas a
circulação de pessoas pelas diversas alternativas, mas também a circulação de práticas e
crenças, implicando na mudança de forma e conteúdo entre as religiões em competição
(idem, p. 20).
Ricardo Bitun (2011) chamou esse fenômeno de “mochileiros da fé”, destacando
a constituição do nomadismo interinstitucional. Trata-se de uma modalidade de
expansão que consistem em sucessivas rupturas dentro do próprio campo religioso
marcado por concorrências, resultando nas variedades que conhecemos.
Além disso, a peregrinação dos fieis tornam essas rupturas ainda mais
dinâmicas.
22
Essas modalidades de expansão ocorrem paralelas ao um processo de
secularização, resultando cada vez mais em um processo de individualização. De acordo
com Antonio Flávio Pierucci:
Secularização, para mim, tem que ser vista como desenraizamento dos
indivíduos — e é por isso que os neoconservadores se perfilam entre
seus oponentes na prática, quando não na teoria. É apenas nessa
operação de arrancar de seu hábitat cultural o indivíduo que ela se põe
e se efetiva como dessacralização da cultura. Esta, se não for para
soltar o indivíduo das amarras tradicionais, descentrá-lo das lealdades
tradicionais, não tem sentido, não vale a pena. É preciso entender que
mobilizar religiosamente um indivíduo implica fazê-lo duvidar da
santidade da tradição religiosa, lançando-o no pós-tradicional,
abrindo-o para a apostasia. Ora, a primeira apostasia é já a
possibilidade de uma série, a virtualidade de experimentar tantas
outras quebras de lealdade quantas calharem (PIERUCCI, 1997, p.
49).
Nesse sentido, indivíduos e instituições são tomados pela lógica do capitalismo
fazendo com que todos se comportem como verdadeiros jogadores, na velocidade que a
dinâmica permite locomover.
Assim, nessa arena de disputa, a descentralização dos sujeitos dinamiza as
rupturas institucionais e a peregrinação dos indivíduos.
Pode-se ainda argumentar que a Teologia da Prosperidade é um dos mais
poderosos elementos dessa descentralização do sujeito. Sendo que, em meio a um
ambiente de forte concorrência capitalista, o entretenimento religioso passa a ser uma
das suas principais estratégias para retenção de clientes. Podendo ser vendida tal
estratégia apenas como uma despretensiosa e suposta distração recreativa através do
entretenimento religioso, aos simpatizantes das inúmeras doutrinas existentes ao
ambiente protestante brasileiro. Fazendo surgir assim a Teologia da Prosperidade.
Ricardo Mariano apresenta uma síntese pertinente acerca do contexto do
desenvolvimento da Teologia da Prosperidade entre os pentecostais brasileiros:
23
Enquanto seus fiéis foram esmagadoramente pobres e estiveram
privados de bens materiais, culturais e educacionais, o sectarismo e o
ascetismo pentecostal não geraram grandes tensões internas. Mas, com
a ascensão social de parte, ainda que minoritária, dos fiéis e com o
progressivo aumento da conversão de adeptos da classe média, as
tensões poderiam se intensificar, e muito, não fosse à acomodação ao
mundo ou a dessectarização que, nas ultimas décadas, começou a
tomar corpo em diversas igrejas pentecostais. Pois, diante da
mobilidade social de parte dos fiéis, das promessas da sociedade de
consumo, dos serviços de crédito ao consumidor, dos sedutores apelos
do lazer e das opções de entretenimento criadas e exploradas
competentemente pela indústria cultural, esta religião ou se mantinha
sectária e ascética, aumentando sua defasagem em relação à sociedade
e aos interesses ideais e materiais dos crentes, ou fazia concessões.
Frente às muitas mudanças ocorridas na sociedade, sobretudo na área
comportamental, e às novas demandas do mercado religioso, várias
lideranças optaram por ajustar gradativamente sua mensagem e suas
exigências religiosas à disposição e às possibilidades de cumprimento
por parte dos fiéis e virtuais adeptos (MARIANO, 1996, p. 27).
Sendo assim, também no campo religioso, e embarcado pelos jargões do
capitalismo constituído, fez com que surgissem, a partir do movimento pentecostal,
novos players, isto é, uma casta de clérigos evangélicos que através das referências e
necessidades de angariar diariamente uma população de prosélitos, propuseram vários
símbolos visíveis (mezuzah, menorá, arca da aliança, manto de oração, kipá, etc)
principalmente vinculados aos textos do Antigo Testamento, que passaram a contemplar
o gosto cultural religioso brasileiro ao movimento protestante. Um retorno a utilização
dos símbolos judaicos, fazendo com que seus “poderes espirituais” pudessem ser
legalizados, devido a uma específica interpretação da legalidade que há nos textos
veterotestamentários.
A validação de símbolos judaizantes oriundos de uma interpretação da Bíblia,
transformando-os em objetos evangélicos, passou a fazer parte do cenário dos cultos e
das práticas religiosas nos templos pentecostais brasileiros.
24
Exemplos disso são as réplicas da Arca da Aliança que passaram a enfeitar os
altares das igrejas pentecostais, além de uma infinidade de produtos que reproduzem a
fé judaica: água do Rio Jordão, pedaço do Muro das Lamentações, estrela de Davi, etc.
De todos estes objetos que tipificam este ressurgimento dos símbolos judaicos,
que na prática é o cartão de visitas da maioria das igrejas neopentecostais, o Templo de
Salomão, até o momento, é o que mais chama a atenção.
Assim, o que se colhe hoje é o fruto estabelecido no século XX pelo
pentecostalismo, que transformou o ambiente religioso protestante brasileiro em
diferentes modelos, sendo o mais latente até o momento o chamado movimento
neopentecosta.
1.2 A secularização da religião e o surgimento da igreja/negócio
neopentecostal brasileira
A relação entre religião e capitalismo é um clássico nas ciências sociais,
remontando ao notável trabalho de Max Weber, A ética protestante e o espírito do
capitalismo (2004), publicado em 1912.
Nessa obra Weber procura apresentar o desenvolvimento de um processo
histórico do capitalismo a partir do ascetismo protestante, cuja idéia de vocação
profissional (beruf) teria contribuído para a lógica do capital. Conforme Weber:
O capitalismo hodierno, dominando de longa data a vida econômica,
educa e cria para si mesmo, por via da seleção econômica, os sujeitos
econômicos – empresários e operários – de que necessita. E,
entretanto é justamente esse fato que exibe de forma palpável os
limites do conceito de “seleção” como meio de explicação dos
fenômenos históricos. Para que essas modalidades de conduta de vida
e concepção de profissão adaptadas à peculiaridade do capitalismo
pudessem ter sido “selecionadas”, isto é, tenham podido sobrepujar
outras modalidades, primeiro elas tiveram que emergir,
evidentemente, e não apenas em indivíduos singulares isolados, mas
25
sim como um modo de ver portado por grupos de pessoas (WEBER,
2004, p. 48).
Para Weber, esse “modo de ver” o mundo constituiu o que ele chama de
“espírito do capitalismo”, uma lógica que tornou possível o desenvolvimento do
capitalismo. Nesse sentido, o capitalismo e suas vastas produções industriais trouxeram
a necessidade de novos mercados consumidores, além da aglutinação das populações
nos grandes centros urbanos, contribuindo para a derrocada do modelo dogmático de
apresentar o cristianismo trazido pelo arcabouço católico, que em boa medida precisou
também se adaptar para não perder tanto fiéis, através de inúmeros movimentos, entre
eles o chamado movimento carismático.
O paradigma weberiano da secularização ainda suscita amplos debates por parte
dos cientistas sociais. Marcelo Camurça trata a questão do seguinte modo:
O paradigma da secularização – advindo do pensamento weberiano,
que nos seus desenvolvimentos originais esboçou-se como processo
complexo, imprevisível e paradoxal na relação de suas causas e efeitos
– foi, no entanto, consolidado de uma forma linear como
deslocamento de cena, progressivo e inevitável de uma religião
preexistente à cultura moderna. No entanto, esse modelo teórico foi
confrontado com a eclosão, nos anos de 1970 e 1980, dos chamados
novos movimentos religiosos, que, segundo alguns sociólogos
passaram a sugerir uma reorientação ou revisão completa do conceito
de secularização (CAMURÇA, 2004, p. 57).
De certo modo, o neopentecostalismo também foi afetado por esse processo de
transformações, tornando o ambiente favorável para que os bens religiosos pudessem
circular na lógica do mercado.
No contexto da circulação de pessoas e práticas, há que se ressaltar uma
migração não só de católicos ao neopentecostalismo, mas também de práticas dos cultos
afro-brasileiros, tal como se nos diversos ritos de passagem que são vistas dentro das
igrejas neopentecostais: rosas consagradas, objetos semanalmente distribuídos que
passam a servir como elementos sagrados.
26
A própria Escritura ganha outro status nesse contexto, servindo como regras para
essas liturgias.
Assim, esta aparente desvantagem humana em personalizar os símbolos de sua
fé, que para a Igreja Católica é depositada em imagens, passou a ser demonstração nas
vias evangélicas através da validação de objetos do Antigo Testamento, encampado
principalmente pelo movimento Pentecostal.
Em boa medida, tais ações têm como um dos intuitos o de buscar a validação de
tais objetos para que se pudessem atrair prosélitos advindos do universo católico,
confortavelmente acostumados aos símbolos religiosos, fazendo com que o
neoentecostalismo desenvolvesse, a partir desta tentativa de atração do clientelismo
católico, práticas distintas da tradição protestante. E por que não dizer das próprias
práticas bíblicas.
Por isso é que podemos tomar a liberdade de declarar que não se tem em
nenhum outro lugar do mundo algo parecido como o neopentecostalismo brasileiro.
Este movimento passou a ter cores próprias de um Brasil que se miscigenou não
apenas na cor da pele, ou nos diversos dialetos falados por este vasto território de
dimensões continentais, mais principalmente na religião, que faz desta terra o lugar de
uma tradição peculiar, exportando para todo o mundo uma religiosidade verde e
amarela.
E em meio a essas práticas da terra de Macunaíma, vemos um contingente de
pessoas se desloque de um lugar para o outro em suas peregrinações religiosas,
encontrando principalmente no neopentecostalismo descanso para as suas justificativas
de consumo dos bens simbólicos (BOURDIEU, 2011). E por que não dizer, em meio a
um ambiente altamente moldado pelas incertezas que o pós-modernismo trouxe debaixo
do conceito de secularização.
Conforme Bitun (2011), os nômades da fé neopentecostal peregrinam em busca
de caminhadas espirituais rasas, cheia de conveniências para o mundo secularizado que
oferecem nos dias de hoje.
Assim, em meio à privatização da religião, todo o arcabouço em que se alimenta
a secularização em seu principal fio condutor, que é o capitalismo, fez com que muitas
27
vezes a religião pudesse ser vista como um instrumento de necessidades reais e
instantâneas como qualquer outro produto que se adquire no tempo do fast-food.
Práticas de facilidade remotas encontrada em todos os seguimentos da sociedade
contemporânea, como por exemplo, trocar simplesmente os canais de uma televisão
através de um controle remoto, e no limite não se satisfazendo muitas vezes com os
mais 500 canais de conteúdo oferecido pelas TVs a cabo.
Estamos vivendo no olho do furacão da geração fast-food. Na busca de se
relacionar de maneira rápida com tudo que se faz, já que a profundidade no
entendimento das coisas trás o aparente engano de que não se possam fazer muitas
coisas ao mesmo tempo. E fazer mais passa a ser mais importe do que fazer melhor, já
que a economia trouxe a noção de produtividade como sendo algo fundamental para a
sobrevivência. E em meio a este ambiente de alta produtividade, vai se perdendo a
qualidade naquilo que se aprende.
Por isso, a dinâmica fast-food invadiu as igrejas brasileiras através da dinâmica
do movimento neopentecostal, já que o importante passou a ser ouvir o testemunho de
“sucesso das riquezas efêmeras” rapidamente do maior número de pessoas, sem que
depois disso algum ministro se envolva emocionalmente com os problemas estruturais
de tal indivíduo.
A missão é produzir “milagres” e “testemunhos” em massa, para atrair cada vez
mais matéria prima para novas produções: novos fiéis fast-food.
Este ambiente inclusive trousse a certeza de que muitas vezes o “mochileiro da
fé”, personagem padrão deste ambiente pós-moderno, nem saia de sua poltrona para
conhecer e visitar a próxima igreja que freqüenta, e se diz temporariamente seguidor, já
que os veículos de comunicação passam a ser o esteio em que se movimentam estes
nômades múltiplas seitas nascentes.
Como se observa na religião privatizada tudo é superficial e breve, como é
peculiar a tudo que não dura muito, também o custo de se obter tais supostos benefícios
divinos também não são tão caros em sua maioria das vezes. E é na dinâmica secular de
vender mais para um maior número de pessoas, a um preço menor e competitivo, que as
chamadas igrejas/negócio acumulam suas fortunas.
28
Na prática, a esmagadora maioria nem reclama dos gastos desprendido para o
investimento de receber seu “milagre”, já que inconscientemente o mochileiro da fé
possui uma prática de gastar pouco recurso em cada igreja/negócio, como se fosse um
cassino onde se apostando em que máquina (igreja/negócio) irá se alcançar o retorno do
recurso empregado.
Desta forma, em meio a volumes monetários pequenos individualmente, mas
imensos para que as igrejas/negócio se mantenham literalmente “no ar”, o target
(público alvo) passa a ser um contingente desassistido e desavisado de seus reais
direitos de uma Graça Divina que não se paga. Sendo que nesta lógica de mercado
religioso, os principais peixes que caem nesta rede de comunicação são os miúdos e sem
entendimento que os faça se desvencilharem desta pesca implacável.
E assim, uma rede que detêm peixes pequenos, traz um contingente de milhões
de ofertas. Passando a ser uma estratégia mercadológica perfeita para a venda do maior
número de produtos, sejam elem abstratos (milagres, campanhas, etc) ou físicos
(arquinhas da aliança, pedaço do tijolo do muro de Israel, água ungida do Rio Jordão).
O neopentecostalismo não trouxe apenas uma nova maneira de apresentar seus
produtos para os clientes, mas também o surgimento de uma infinidade de concorrentes
a participarem deste mercado religioso, já que todos passam a ter a oportunidade de se
apresentarem em meio aos veículos de comunicação, entre eles as mídias sociais.
Criando um ambiente de competição invejável para qualquer outro segmento de
mercadológico que busca emplacar seus serviços e produtos. Levando,
conseqüentemente o fim do monopólio doutrinário visto dos séculos IV ao XV,
encampado largamente pela Igreja Católica.
Assim, o neopentecostalismo, como todo movimento que usa o pano de fundo
religioso, buscou amparar-se em determinadas passagens da Bíblia para validar suas
práticas, encontrando tais composições litúrgicas principalmente nos textos do Antigo
Testamento, em que batalhas por poder, e entregas monetárias de reis e nobres
pautavam a relação dos homens com Deus.
Desta maneira, em meio à busca desenfreada pelas riquezas terrenas, o
neopentecostalismo desenvolveu seu celeiro em momentos bíblicos que apresentam a
prosperidade de um ser humano apenas para os limitados e transitórios motivos
29
terrenos, sendo nominada a teologia vendida por essas igrejas/empresas, a chamada
“Teologia da Prosperidade”.
Tal Teologia nas últimas três décadas fez com que surgisse uma qualidade de
pessoas na buscam alucinante de bilhetes premiados por “milagres” nas igrejas/negócio
em todos os cultos.
É bom que possamos lembrar que no caso das igrejas/negócio, os recursos
arrecadados vão diretamente para os empresários da religião, e não há nenhum tipo de
redistribuição dos valores empregados as empregas de fé. O que se espera quando se
entrega um valor monetário é o “milagre”. Diferentemente do que ocorrer nos jogos
onde se emprega um valor monetário, já que em algum momento alguém recebe o
montante de todos os que apostam em determinada loteria.
Com o passar do tempo algumas pessoas percebem que nada de sobrenatural
está acontecendo naquele lugar e ao invés de acordarem para a realidade dos fatos,
passam a buscas novas aventuras religiosas, já que sua breve vida terrena ainda não
mudou como ele gostaria. Levando seus recursos para outra igrejas/negócio.
Assim, este modelo passa a contribuir para o acúmulo de capital dos empresários
da religião, que cada vez mais ampliam seu poder de capitação de clientes, frente ao
grande volume de milhares de pequenos recursos angariados, em meio às campanhas e
chamamentos, que atraem mais e novos nômades da fé.
O capitalismo dos nossos dias fez com que as práticas religiosas deslocassem o
eixo espiritual motivacional, que se encontrava na pós-vida para o aqui e agora.
Fazendo com que a Teologia da Prosperidade derramasse sobre o sentimento das
pessoas uma auto-orientação, própria do ambiente pós-moderno, despertando gerações e
gerações de mochileiros da fé.
Nos dias atuais, apesar de milhares de igrejas/negócio espalhadas por todo
Brasil, a que talvez melhor represente esta Teologia da Prosperidade deva ser a Igreja
Universal do Reino de Deus, sendo esta a que conseguiu maior projeção na terceira
onda do pentecostalismo, que é o neopentecostalismo.
Para que esta estrutura se mantenha funcionando, é fundamental que veículos de
comunicação em suas emissoras de televisão e rádio fundamentem o passou a ser o
30
principal entretenimento para a captação de uma clientela de prosélitos. Em práticas que
são largamente adotadas nesta plataforma de passatempo religioso, entre elas a
promoção de filmes e novelas de roteiros bíblicos, muitas vezes fazendo lembrar a
própria Igreja Católica, que manipulou por séculos o pensamento dos fiéis através do
ensinamento das Escrituras através do latim, idioma exclusivamente clerical e sem largo
acesso popular.
Quem possui os veículos de comunicação, comunica o que quer ensinar,
doutrinado mentes e corações.
Para finalizar os esclarecimentos neste capítulo propostos para o entendimento
da corrente neopentecostal, em meio ao ambiente capitalista da religião, há que se
ressaltarem as práticas existentes dentro da IURD no que tange as promoções das
chamadas “batalhas espirituais”, promotoras de diálogos televisivos com “entidades
espirituais”. Sendo esta uma das práticas correntes deste movimento, que busca a todo o
momento justificar o insucesso financeiro das pessoas devido a uma assolação
demonizada decorrente da não entrega de dízimos e ofertas para a “igreja”.
Sem entrar no mérito, se estas cenas são reais ou não, verifica-se em suas
manifestações uma clara aproximação com as encontradas no espiritismo cultural
brasileiro, percebido em vários locais espalhados pelo território nacional, e mais
especificamente com as mesmas práticas ritualísticas encontradas nos chamados
“centros espíritas”. Já que se verificam nos programas televisivos IURD para todos que
queiram ver: sessões do descarrego, celebrações em que os “sacerdotes” estão vestidos
de branco, passagens pelo vale do sal, etc. Isto é, um sincretismo de várias religiões
espiritualistas brasileira.
Por fim, em meio a vários matizes do movimento neopentecostal, será na IURD
– Igreja Universal do Reino de Deus, em meio, ainda que aos pálidos conceitos do
secularismo e acentuado desempenho do capitalismo religioso, que esta dissertação
estará se detendo para discorrer sobre o neopentecostalismo Made In Brazil nas práticas
encontradas no Templo de Salomão Brasil.
Nesta tônica, pretende-se demonstrar, em meio a uma nação de mochileiros da fé
que vive sua superficialidade religião cristã, entender como o Templo de Salomão
31
Brasil pode ser o evento de entretenimento religioso mundial que possivelmente
demarcou o Brasil como sendo o fundador do modelo neopentecostalista.
O Templo de Salomão, até o momento, é o principal ícone do movimento
neopentecostal, esbanjando suas práticas capitalistas com toda suntuosidade que os
grandes empreendimentos regados pelo esplendor da riqueza material humana podem
trazer. Ostentando práticas do marketing 360°, que trazem em si um afiado conceito de
marketing de guerrilha, fazendo a ser este monumento o próprio pináculo do templo do
neopentecostal brasileiro. Minando as possibilidades de reação dos que concorrem nas
mesmas práticas, por estarem despreparados frente à opulência financeira necessária
para manter uma campanha publicitária revitalizada, em meio a um constante jogo de
poder midiático que despeja nas mentes e corações de milhares de mochileiros da fé o
conceito da prosperidade terrena.
Tudo isso em um exercício constante de captação e fomentado de recursos
advindo do proselitismo nacional, em sua grande maioria pequena em montantes
individuais, mas imensa quando juntos em uma única conta bancária, despejando
diariamente milhões de reais nesta dinâmica de negócio, e fazendo com que tais
recursos sejam alocados novamente em investimentos de mídia para a maçante
divulgação de suas plataformas empresarial/religiosa.
Levando inclusive, em meio a esta estratégia mercadológica a necessidade de se
ter uma emissora televisiva, não apenas como forma de investir o contingente de
recursos oferecidos para milagres pelos mochileiros da fé, que se convertem em
recursos que passam a beneficiar pessoalmente uma “dinastia sacerdotal familiar”.
Desta forma, de todos os instrumentos capitalistas já introduzidos no mundo
Neopentecostal, não há nada melhor para obtenção de recursos do que o entretenimento
de um povo, isto é, a famosa política do pão e do circo adotada largamente pelo Império
Romano, e transmitida de geração em geração na prática dos que tem o poder e querem
mantê-lo.
Como o dinheiro é o produto de maior valor no mundo secular, as trocas
capitalistas em posse deste produto passaram a requerer os supostos “milagres divinos”
colocando em seu arcabouço templário, colocando em suas prateleiras tais “milagres”
como que em um supermercado, sendo trocados por recursos financeiros delegadas a
32
suposto interveniente ao Universo do Reino de Deus, sendo que o pedágio para
participação desta rodovia, além de manter acessa a esperança do “milagre por vir ainda
na terra” capacita intermináveis campanhas em um looping infinito, que vão se
sobrepondo de maneira a não se perceber onde uma termina e se inicia a outra as
famosas campanhas para a obtenção dos benefícios celestiais.
33
CAPÍTULO 2
TRÂNSITO RELIGIOSO, ENTRETENIMENTO E
CLIENTES DA FÉ
Este capítulo pretende explorar a noção de igreja/negócio tomando como recorte
as estratégias de marketing da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD),
especialmente em torno de seu empreendimento arquitetônico, o Templo de Salomão.
Assim, buscaremos compreender a maneira que se comporta uma indústria do
entretenimento religioso.
Antes de avançarmos, seria interessante mapear os conceitos relacionados a
mobilidades dos fiéis em busca de soluções para os problemas de suas vidas. Vejamos o
conceito de “trânsito religioso” (MONTERO & ALMEIDA, 2001) a fim de
compreender um panorama do campo religioso brasileiro.
2.1 – Trânsito religioso e os mochileiros da fé: compreendendo a lógica
da circulação.
Ronaldo Almeida e Paula Montero (2001) abrem o texto apresentando dados
censitários que mostram a transformação do campo religioso brasileiro e a configuração
de uma diversidade de alternativas religiosas, bem como os desafios que esta nova
configuração apresenta à interpretação científica.
Em contraposição às abordagens teóricas, especialmente aquelas dependente do
modelo weberiano da secularização e do funcionalismo, cuja chave interpretativa
privilegia a dimensão cosmológica, responsável pela tipificação religiosa a partir das
doutrinas, os autores sugerem novas reflexões que abarquem também as dimensões das
práticas.
Segundo os autores, “as fronteiras parecem pouco precisas devido à intensa
circulação de pessoas pelas diversas alternativas, além da acentuada interpenetração das
34
crenças” (ALMEIDA & MONTERO, 2001, p. 92). Um olhar sobre os modos de
circulação de pessoas e crenças parece tornar à idéia de “fronteira” pouco provável.
O conceito weberiano de conversão, por exemplo, que pressupunha “um
processo subjetivo de adesão a um novo credo” (Idem, p. 92), não é mais suficiente para
explicar a dinâmica do fluxo religioso.
A noção de conversão weberiana implica na mudança cultural pela
internalização dos valores. Partindo do pressuposto de que a adesão a um novo sistema
de crenças implicaria num processo de substituição “racional” por outro, o modelo
weberiano não seria suficiente para explicar a nova configuração da “conversão” ou a
interpenetração de práticas e crenças, que aparentemente não apresentam aos religiosos
problemas “cognitivos”, isto é, problemas em torno da idéia de “contradição”.
Dito de outro modo, esta nova configuração e interpenetração de crenças, muitas
vezes díspares entre si, não acusaria “incongruências cognitivas”, segundo os autores.
Ou seja, aparentemente, os atores religiosos não as conceberiam como contraditórias,
sendo, portanto, impossível distingui-las no plano das práticas.
Outra chave explicativa, também ao desdobramento do paradigma weberiano da
secularização, é a metáfora do mercado. Subjacente a esta concepção estaria “a idéia de
a racionalização do sagrado no mundo moderno realizar-se-ia pela transformação das
crenças em mercadorias, a serem consumidas pelos adeptos” (Idem, p. 92). Tais
“produtos” estariam disponíveis para os consumidores religiosos, “segundo suas
necessidades imediatas” (Idem, p. 92).
Em outro artigo, Almeida (2004) classifica a literatura sociológica e
antropológica dos anos da década de 60 e 70 dentro desta preocupação.
Conforme Almeida, esta literatura problematiza o crescimento das religiões a
partir da industrialização, somado ao processo de migração. Nesse sentido, a adesão
religiosa seria uma espécie de resposta funcional aos estados de anomia social.
Os trabalhos de Beatriz Muniz de Souza (A experiência da salvação: os
pentecostais em São Paulo, 1961), Emilio Willems (Flowersofthe new faith: culture
change and therise of protestantism in Braziland Chile, 1967), Christian D’epinay (O
refúgio das massas, 1970) e Waldo Cesar (Urbanização e religiosidade popular: um
35
estudo da função da doutrina pentecostal na sociedade urbana, 1974), são classificados
nesta perspectiva teórica.
Almeida ainda chama atenção para o fato de que estes modelos teóricos, tanto os
de orientação weberiana quanto os funcionalistas, passaram a ser questionados pelo
trabalho de Peter Fry (Manchester, século XIX e São Paulo, século XX, dois movimentos
religiosos, 1982), por não compreender a lógica interna das religiões.
Do mesmo modo, Almeida e Montero apontam para os limites destas
interpretações, cuja base consistiria na impossibilidade de compreender a dinâmica das
transformações, deixando na sombra “os mecanismos particulares de ressignificação das
crenças religiosas” (ALMEIDA & MONTERO, 2001, p. 92).
Em outro artigo, Paula Montero critica esta abordagem, classificando de
“perspectiva externalista”, visto que “não permite compreender, do ponto de vista dos
sujeitos, a lógica inerente aos mecanismos particulares” (MONTERO, 2003, p. 35).
Desse modo, os autores se contrapõem a estas abordagens, argumentando que as
religiões estão em “permanente processo de reinvenção e rearticulação, muitas vezes
responsáveis pelo obscurecimento das fronteiras” (ALMEIDA & MONTERO, 2001, p.
92).
Ao apresentar a dinâmica do campo religioso brasileiro marcado pelo fluxo de
pessoas e crenças, chamado de “macro processo de contínua síntese e diferenciação”
(ALMEIDA & MONTERO, 2001, p. 93), os autores sugerem uma exploração e
caracterização do “trânsito religioso”.
Para Almeida o trânsito religioso, “não se limita ao trânsito de pessoas, idéias e
práticas religiosas”, mas se estende também a “modelos de gestão” regidos por uma
“competição de fiéis” e “cópia dos procedimentos dos concorrentes” (ALMEIDA, 2004,
p. 25).
Conforme Almeida e Montero, esta noção aponta para um duplo movimento:
A – Circulação de pessoas pelas diversas instituições religiosas. Neste nível os autores
privilegiam análise sociológica e demográfica como fontes interpretativas. Neste nível
de análise procuram caracterizar os aspectos institucionais a fim de descrever as
mudanças de filiações.
36
B – Metamorfose de práticas e crenças. Neste plano, os autores enfatizam trabalhos
etnográficos. Desse modo, buscam dar conta do aspecto mais “cognitivo”, isto é, das
“semelhanças e diferenças entre as representações dos universos religiosos”
(ALMEIDA & MONTERO, 2001, p. 93).
A partir desse duplo movimento, o objetivo dos autores consiste em “desenhar as
configurações atuais das principais tradições religiosas e seu caráter sócio
demográfico”, bem como “compreender alguns fluxos preferenciais nesse trânsito
generalizado de fieis e idéias religiosas” (Idem, p. 93).
Quanto à idéia de “fluxo preferencial”, os autores argumentam que a
“intensidade da circulação varia de acordo com as instituições envolvidas” (Idem, p.
93), motivo pelo qual sugerem um fluxograma deste esquema analítico.
A hipótese central do texto é que “as pessoas não mudam de religião de maneira
aleatória” (Idem, p. 93), pois de acordo com os dados, a movimentação ocorre em
“direções precisas, dependendo das instituições envolvidas” (Idem, p. 93).
Assim, conforme o fluxograma dessa movimentação haveria instituições que se
caracterizam como “doadoras” de fieis, enquanto outras seriam mais “receptoras”,
intensificando o que os autores chamam de “fluxos preferenciais”.
Embora o catolicismo mantenha-se como o “maior grupo religioso do Brasil”,
com 67,4% da população, é apontado pelos autores como o que mais tem perdido em
números de fiéis. Por esse motivo, é considerada uma espécie de “doador universal”.
Por outro lado, a consolidação do movimento carismático é visto pelos autores
como um movimento de “readesão” de fieis, uma vez que se apresenta basicamente com
a linguagem emocional típica dos evangélicos (ALMEIDA & MONTERO, 2001, p. 96).
Os autores distinguem tipos de “católicos”, que em termos práticos perfazem os
67,4%, fazendo surgir uma pergunto: quem são de fatos as pessoas que se
autodenominam católicas?
Os chamados “católicos não-praticantes” correspondem a uma parcela
considerável da população brasileira.
37
Para os autores, são “os católicos de batismos, casamentos e enterros, para os
quais os sacramentos atuam como ritos de passagens tradicionais na sociedade
brasileira” (Idem, p. 95).
Esta auto-identificação acionada pelos próprios religiosos, “deve-se a pouca
frequência aos serviços religiosos e a ausência de relações mais comunitárias” (Idem, p.
95).
Dependendo do dia em forem entrevistadas, estas pessoas podem também se
identificarem como “sem religião”, o que torna problemático uma rígida classificação.
Conforme os autores, esta religiosidade está mais relacionada às “práticas
rituais”, sem exigências do tipo comportamental, tal como a que caracteriza os
evangélicos (Idem, p. 95).
É preciso levar em conta que muitas pessoas ao serem entrevistas, devido à
estigmatização, tendem a omitir a religiosidade “privada”, confessando uma que não
causaria problemas públicos. Conforme os autores, “boa parte dos brasileiros mantém
uma religiosidade privada e outra (pública) como identidade pública” (Idem, p. 96).
Conforme interpretação dos censos realizados pelos autores, os que se
classificam como “sem religião”, “encontra-se mais entre jovens e adultos até 40 anos,
principalmente entre os homens [...] ao passo que a religiosidade é mais confessada
pelas mulheres” (Idem, p. 96).
Ao analisar os dados sócios demográficos, os autores chegam à conclusão de que
o “universo feminino tem um nível de filiação maior do que os dos homens” (Idem, p.
96). Desse modo, “são elas que mais mudam e, na maior parte das vezes, sempre
direcionadas para outras religiões” (Idem, p. 96).
Quanto às religiões, em números absolutos, o catolicismo é apontado como o
que mais perderam fiéis, sendo seguidos pelos “sem religião”, os protestantes históricos
e os pentecostais.
Por outro lado, os segmentos que mais receberam pessoas foram os pentecostais
(4 x mais que perderam), os “sem religião” (cerca de metade a mais) e os protestantes
38
históricos (quase igual ao que perderam). Em números menores, são enumerados o
catolicismo, o kardecismo e as religiões afro-brasileiras (Idem, p. 97).
Em suma, os autores apresentam que 26,5% mudaram de religião. A fim de
compreender os fluxos preferenciais, os autores sugerem um fluxograma com três
vértices principais de mudanças. Cada religião é a analisada em dois momentos, a saber,
as “receptoras” e as “doadoras”:
1 – Primeiro Vértice: O catolicismo.
Forma o primeiro vértice e é tido como “doador universal”, de onde os outros
segmentos arregimentam seus fiéis.
Os dados apontam que o fluxo preferencial dos católicos é o pentecostalismo,
vindo em seguida os “sem religião”.
Quanto à “recepção”, a maior parte das pessoas entrevistadas que aderiram ao
catolicismo, afirmam não terem “pertencido anteriormente a nenhuma religião ou que
eram pentecostais” (Idem, p. 98).
Trata-se de um “retorno” por meio da “readesão carismática”, uma vez que estas
pessoas que tendem a dizer que não eram religiosas, devido à “prática” não institucional
da religião. Conforme os autores, “trata-se de um catolicismo dado pela tradição” (Idem,
p. 98).
2 – Segundo Vértice: Os sem religião.
Formando o segundo vértice, encontra-se o segmento dos “sem religião”, como
um “receptor universal”, entendido pelos autores como marcas de uma “sociedade em
processo de secularização”, que “recebe pessoas de todas as confissões” (Idem, p. 98).
Entretanto, deve-se deixar claro de que não se trata de “um movimento em
direção ao ateísmo, mas sim, a composição de um repertório simbólico particular”, pois
a “não-filiação não significa necessariamente a falta de religiosidade” (Idem, p. 98).
39
3 – Terceiro Vértice: Os pentecostais.
Outro segmento apontado como “receptor universal”, ao lado dos “sem
religião”, é o pentecostalismo. O grande “celeiro dos pentecostais é formado pelo
catolicismo” (Idem, p. 99).
Um dos motivos apontados pelos autores, é que o repertório simbólico do
pentecostalismo abrange basicamente os estratos doutrinários de outros segmentos,
muito embora o faça por meio de sua inversão binária, isto é, por meio da construção de
um inimigo a ser combatido.
Um exemplo disso é a Igreja Universal do Reino Deus ao “elaborar um sistema
sincrético às avessas”, associando “as entidades da umbanda e orixás do candomblé ao
pólo negativo do cristianismo: o diabo” (Idem, p. 99).
Somado a isso, o repertório pentecostal também é apontado como um sistema de
crenças que mais se aproxima de uma explicação para os infortúnios, para o sofrimento,
etc.
Os autores concluem demonstrando que a pesquisa não teve a pretensão de
esgotar a temática, mas apenas sugerir um fluxograma exploratório da dinâmica do
campo religioso brasileiro.
Assim, procurou-se dar conta de um tipo especifico de circulação de pessoas e
crenças, bem como seus fluxos preferenciais. Uma vez que as pessoas não migram ou
mudam de religião de modo aleatório, deve-se perguntar pelas condições sociais que
geram multiplicidade nas opções religiosas.
Os autores partem do pressuposto de que elas possuem uma lógica interna, muito
embora se dediquem apenas a fazer breves apontamentos.
Conforme os próprios autores, “não se tentou assentar uma discussão nas lógicas
internas dos diferentes credos, mas sim compreender como estas rebatem umas nas
outras, em planos distintos” (Idem, p. 99).
O que os autores chamaram de “trânsito religioso” neste artigo, pode-se ser
submetido a outros tipos de análises. E de fato, os autores sugerem tal iniciativa,
especialmente aquelas dedicadas a compreender a lógica interna das migrações
religiosas.
40
2.2 – O Templo de Salomão como um modelo de Igreja/Negócio
A IURD é uma das instituições neopentecostais mais criativas no que diz
respeito à relação entre prática religiosa e lógica de mercado.
Fundada em 1977 por Edir Macedo, essa igreja já conta com mais de “23
emissoras de televisão, 40 emissoras de rádio e mais 19 empresas, entre elas dois jornais
diários, duas gráficas, uma agência de turismo, uma imobiliária, uma empresa de taxi
aéreo e uma empresa de seguro saúde” (BITUN, 2011, p. 61).
Por isso, pode-se dizer que é uma das instituições que mais se adaptou à lógica
de mercado.
Maurício Custódio Serafim também chama atenção para estas características
empresariais da IURD:
A busca de uma maior visibilidade pelas igrejas evangélicas por meio
de sua inserção na mídia, principalmente a eletrônica, pode ser
ilustrada com o caso da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD),
que comprou a Rede Record de Televisão em 1989, com cobertura
nacional e composta por 30 emissoras, e mais recentemente (setembro
de 2007), foi inaugurada a Rede Record News, primeiro canal aberto
de telejornalismo 24h no ar. Adicionalmente, a IURD é proprietária de
30 emissoras de rádio e da Universal Produções, que coordenada a
gravadora Line Records, a Editora Universal, uma produtora de vídeos
e CDs, a Folha Universal, jornal semanal com tiragem de 1,5 milhão
de exemplares, a Revista Éster (para o público feminino) e a Revista
Plenitude. Há ainda o portal Arca Universal (arcauniversal.com.br)
que disponibiliza a venda desses produtos pela Internet (SEFAFIM,
2008, p. 97).
Essas características contribuíram para que a IURD fosse concebida como um
verdadeiro modelo de empresa religiosa, desafiando inclusive os modernos métodos de
marketing.
41
É importante ressaltar que, em meio ao procedimento metodológico da pesquisa
apresentada, dever-se-á reposicionar o conceito do termo igreja/empresa, afinando-o
para algo que nos parece ser mais adequado, naquilo que representa a essência/alma de
toda “empresa”, que é a geração de “negócios”.
Por isso, passaremos a chamar esta modalidade de “igrejas” para igreja/negócio,
já que, como foi mencionada no parágrafo anterior, a alma de uma “empresa” é o seu
“negócio”, que de fato trás vida a empresa.
Desta forma, a atualização do termo “igreja/empresa” para “igreja/negócio”
nos parece fazer mais sentindo, na medida em que o desejo na realização do “negócio”
precede a ação de se constituir uma “empresa” de fato. Fazendo do “negócio” a força
motriz de uma “empresa”, e não o contrário.
O negócio resulta de uma ação deliberada conforme a lógica do mercado.
Assim, não se monta uma empresa para depois saber que negócios ela irá
realizar, e sim, tem-se um modelo de negócio para depois ser formada uma empresa,
como sendo sua personalidade jurídica, e o negócio sua personalidade intelectual.
Mais especificamente, o termo igreja/negócio, tal como utilizo, traz em seu
cerne a natureza descritiva das ações que fundamentam uma “Igreja/Negócio de
Entretenimento”, em suas reais habilidades no constante trabalho de retenção do
clientelismo religioso, fazendo do consumo dos “bens sagrados” seu “negócio”.
Nesse sentido, a “Igreja/Negócio de Entretenimento” nasce com a tarefa de
antecipar-se aos seus concorrentes e propor o melhor produto para seus clientes, devido
à alta concorrência que existe no mercado do entretenimento.
Pierre Bourdieu chama atenção para o modo como esse campo de disputa é
estruturado:
De um lado (1), este capital religioso depende do estado, em um dado
momento do tempo, da estrutura das relações objetivas entre a
demanda religiosa (ou seja, os interesses religiosos dos diferentes
grupos ou classes de leigos) e a oferta religiosa (ou seja, os serviços
42
religiosos de tendência ortodoxa ou herética) que as diferentes
instâncias são compelidas a produzir e oferecer em virtude de sua
posição na estrutura das relações de força religiosa (ou seja, em
função de seu capital religioso) e, de outro (II), este capital religioso
determina tanto a natureza, a forma e a força das estratégias que estas
instâncias podem colocar a serviço da satisfação de seus interesses
religiosos, como as funções que tais instâncias cumprem na divisão do
trabalho religioso, e em consequência, na divisão do trabalho político
(BOURDIEU, 1998, p. 57).
Portanto, as disputas seguem uma lógica da estrutura da demanda e da oferta. A
igreja/negócio constituiu-se em um campo de relações; não se trata de um elemento
isolado, mas parte de um contexto onde há consumidores.
Antônio Flávio Pierucci relacionava essa concorrência religiosa com os
desdobramentos do processo de secularização, responsável por dinamizar as relações
individuais e acirrar o consumo. A religião seria reduzida a bens de consumo na lógica
do capital:
A secularização relativiza esses compromissos, digamos assim,
abrindo a possibilidade de que sejam passageiros. Sendo a sociedade
moderna caracterizada pela vigência generalizada de padrões
burocrática impessoais de controle social, fica impedido um autêntico
“GreatAwakening”(Grande Despertar) capaz de transformar a
sociedade e a cultura. As novas religiões de hoje, então, encontram a
religião já reduzida a um item de consumo e botam mais lenha nessa
fogueira. O consumidor religioso escolhe uma e até mais de uma
experiência mística, ou solução espiritual, ou serviço religioso dentre
uma grande variedade de propostas provocantemente expostas no
“supermercado espiritual” (PIERUCCI, 1997, p. 49).
Serafim aproxima-se das análises de Peter Berger ao demonstrar a relação entre
secularização e religião.
43
Para Berger, a dinâmica da preferência do consumidor postula que os
conteúdos substantivos estão suscetíveis à mudança, mas não
determina a direção da mudança. Entretanto, há alguns fatores que
condicionam o caráter dessa mudança. Um deles é o reflexo da
secularização do mundo dos consumidores na preferência por
produtos religiosos, significando que preferirão produtos religiosos
que combinam com a sua consciência secularizada. Outra influência
sobre o caráter da mudança vem da relevância socialmente
significativa da religião. Como na Modernidade o significado da
religião se situa principalmente na esfera privada, as preferências da
clientela refletem as necessidades dessa esfera e o produto religioso
terá mais chances de ser comercializado na medida em que atender
essa preferência, ou seja, enfatizar que é mais relevante para a vida
privada do que para as instituições públicas (SERAFIM, 2008, p. 48).
Assim, com vistas a uma análise qualitativa das modalidades de um “negócio
religioso” que passa a sobreviver segundo a lógica de qualquer “negócio capitalista” no
fato de acumular capital (objetivando lucro e não filantropia no sentido puro da
palavra), retendo-os em diversos e diferentes tipos (financeiro, imobiliário, político,
diversão, entre outros capitais que podem ser obtidos), sob a aparência camuflada dos
conceitos da religiosidade.
Neste ambiente performático, o entretenimento passa a ser a principal plataforma
no desenvolvimento de componentes necessários naquilo que é o principal elemento que
um negócio bem-sucedido precisa ter para se manter viável e rentável, a retenção de sua
clientela. Em uma exorbitante quantidade de campanhas promocionais através de uma
dinâmica de testemunhais, principalmente televisivos, passando a ser a plataforma
utilizada na retenção de “fieis” que este projeto chamado de “Entretenimento Religioso”
desenvolveu como sendo sua principal marca de atuação.
Fazendo crescer assim no Brasil algo supostamente advindo do movimento
protestante, em meio aos contornos de movimentos religiosos que nascem a todo o
momento na diversidade mercadológica que há na vasta miscigenação da cultural
brasileira.
44
Desta forma, pode-se entender “marketing religioso” no sentido dado por
Eduardo Maranhão Filho que é: “o gerenciamento do mercado religioso com o objetivo
de detectar e atender demandas dos/as fiéis, produzindo e/ou comercializando produtos
e mercadorias e criando novas demandas para o público-alvo (ou outros que surgirem)”
(2013, p. 41).
De modo específico, tomaremos como recorte o mega empreendimento do
Templo de Salomão, principal monumento do Entretenimento Religioso Neopentecostal
de todos os tempos. Conforme análise de Ricardo Bitun:
O caráter empresarial empregado por Macedo na IURD é fortíssimo.
Macedo revela-se como exímio administrador de empresas. Há muita
discussão sobre essa acentuada “sensibilidade” empresarial. Seria a
IURD uma igreja com cunho empresarial ou seria uma empresa
religiosa? Por enquanto seu êxito numérico não permite uma
conclusão categórica quanto à sua eficácia administrativa, porém,
sabe-se com certeza que a IURD atua como uma empresa, competindo
em um mercado religioso altamente competitivo. Esta atuação requer
aplicação, profissionalismo e alto índice de produtividade resumido no
aumento da arrecadação e no número de congregações, fiéis, etc.
(BITUN, 2011, p. 63).
O caso do Templo de Salomão é um empreendimento que supera todas às
expectativas. Em 2010 a pesquisadora Elaine Rezende chamava atenção para esse
fenômeno:
A Universal investe maciçamente na construção de suas catedrais em
estilo greco-romano. A estratégia de comunicação visual foi mais
longe em 2010. Nesse ano, Edir Macedo iniciou a construção da
réplica do Templo de Salomão, com custo estimado em US$ 200
milhões. O local escolhido é o bairro do Brás, em São Paulo, que
também abriga a sede da Mundial. O bispo afirma que importou
pedras de Israel e que a altura do templo será duas vezes maior que a
do Cristo Redentor. Além disso, o projeto contempla uma cópia da
45
Arca da Aliança, estacionamento e estúdios de rádio e televisão. A
previsão de abertura do templo é 2014, ano da Copa do Mundo no
Brasil (REZENDE, 2010, p. 38-39).
Inaugurado em 31 de julho de 2014 pela Igreja Universal do Reino de Deus, o
Templo de Salomão Brasil tem posição central no jogo o Entretenimento Religioso
brasileiro, já que o mesmo parece ser o principal produto de Entretenimento Evangélico,
consolidando em seus pilares a chamada Teologia da Prosperidade.
A ousadia é tal que poderíamos descrever nos termos de uma invenção que
supera muitas técnicas do marketing moderno.
Além disso, a reprodução do Templo de Salomão no Brasil para os evangélicos
poderia ser equivalente para os católicos ao fato de uma igreja cristã qualquer promover
a construção de uma nova Praça de São Pedro, construindo no centro uma catedral,
colocando o nome de Vaticano.
Como diria um antigo ditado popular: “se Maomé não vai à montanha, a
montanha vai até Maomé”. Já que a viagem a terra de Jerusalém não se faz, mas
necessária, já que Jerusalém veio até o Brasil.
E assim também a todos que queriam levar o Templo de Salomão Brasil para
suas casas, podendo fazê-lo através das réplicas em miniatura que são vendidas dentro
do Templo. Uma jogada de mestre.
Nesse sentido, os símbolos judaicos exercem grande fascínio no sistema ritual
do neopentecostalismo e são re-significados em diferentes contextos. Edlaine Gomes
argumenta que:
Nesse contexto, destaca-se a concepção de espaço sagrado, reforçada
pela inserção de objetos rituais associados a Israel, principalmente os
vinculados à “Fogueira Santa de Israel”. (...) Em todas as igrejas da
IURD, tanto nesse período quanto em outros, grandes painéis com
imagens de montes sagrados são expostos, além da distribuição de
“água trazida do Rio Jordão”, “manto sagrado” com dizeres em
hebraico, entre outros (GOMES, 2011, p. 174).
46
O Templo de Salomão Brasil como distintos tipos (chaveirinhos, quadros,
bíblias, etc) e tamanhos de réplicas (o próprio prédio ou sua miniatura) do original
segue a mesma lógica e pode ser pensada nos termos que Eric Hobsbawn chamou de
“invenção da tradição”:
A “tradição” neste sentido deve ser nitidamente diferenciada do
“costume”, vigentes nas sociedades ditas “tradicionais”. O objetivo e a
características das “tradições”, inclusive das inventadas, é a
invariabilidade. O passado real ou forjado a que elas se referem
impõem práticas fixas, tais como a repetição. O “costume”, nas
sociedades tradicionais, tem a dupla função de motor e volante. Não
impede as inovações e pode mudar até certo ponto, embora
evidentemente seja tolhido pela exigência de que deve parecer
compatível ou idêntico ao precedente. “Sua função é dar a qualquer
mudança desejada a sanção do precedente, continuidade histórica e
direita naturais conforme o expresso da história” (HOBSBAWN,
2008, p. 10).
As estratégias de marketing religioso da IURD na elaboração da
“igreja/negócio” se reinventam a todo o momento em diversas campanhas e joguetes
publicitários donas de uma astronômica conta midiáticas.
Ao seu favor então é que se têm o Entretenimento Religioso (antiga política do
“Pão e Circo”, só que desta vez dentro da própria igreja/negócio), em uma venda
insaciável do sonho de enriquecimento terreno, recebidos pela obediência da “boa ação”
na entrega de dízimos e oferta, em ações visíveis que custem algum tipo de sacrifício ao
fiel, em sua grande maioria mochileiros da fé (BITUN, 2011).
47
CAPÍTULO 3
TEMPLO DE SALOMÃO: UM PRODUTO MADE IN BRAZIL
No capítulo 2 procuramos antecipar algumas questões que serão exploradas
nesse capítulo. Portanto, nossa proposta é verificar os rendimentos analíticos do
conceito igreja/negócio, tal como expusemos até aqui.
O objeto central deste estudo será buscar identificar o neopentecostalismo como
sendo a plataforma do entretenimento religioso brasileiro, e agente influenciador de
mentes e mercados nacionais e internacionais. Atuando no limite, na conversão de
prosélitos, e manutenção de indivíduos embrionários na percepção da fé cristã, a partir
do ícone religioso representado pelo Templo de Salomão do Brasil. Para isso, delimitar-
nos-emos ao universo do Entretenimento Religioso, analisado através das estratégias de
marketing da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD).
Além da invenção de uma tradição no sentido dado por Hobsbawn, é possível
analisar a utilização desses símbolos sagrados como uma estratégia de poder.
Joseph Nye Jr (2002a; 2002b) desenvolveu o conceito de “Teoria da
Interdependência Complexa” para analisar as relações diplomáticas internacionais,
tratando-se de uma estratégia de poder que consiste em conquistar mentes e mercados
através do Entretenimento, conhecido como Soft Power.
Assim, a modalidade em que o Entretimento Religioso pode trazer o sonho do
bilhete premiado a cada entrega de recurso, pode ser considerado como um produto
genuinamente brasileiro, conhecido com o nome de Neopentecostalismo, sendo que
suas práticas estão espalhadas em milhares de templos evangélicos. E em meio aos
conceitos do Soft Power, o Templo de Salomão Brasil é um local que se apresenta nos
termos das metáforas – teatro, templo e mercado – indicados por Leonildo Silveira
Campos (1997; 1999).
48
3.1 – Templo de Salomão: um produto Made in Brazil.
Há também quem diga, ironicamente, que tal empreendimento imobiliário
projetado no afamado bairro do Brás em São Paulo, tenha sido feito no lugar certo, já
que é a região paulistana que se fazem os principais negócios de compra e venda dos
mais inúmeros tipos de produtos, no atacado e no varejo. Sendo que, com a instalação
do Templo de Salomão Brasil naquele local, passa também a fazer parte deste comércio
o principal produto religioso judaico de todos os tempos, o Templo de Salomão.
Desta forma, o monumental efeito religioso do Entretenimento Neopentecostal,
passou a se colocar junto a dois outros produtos que reinam como entretenimentos
brasileiros em seus respectivos produtos com o reconhecido do selo Made in Brasil: o
samba e o futebol. Produtos estes que o Brasil se orgulha em exportar aos quatro cantos
do mundo. Formando, a partir de agora, o tripé ideal do entretenimento bem sucedido,
nas principais áreas de atividade humana para a venda de produtos, serviços e diversão
lúdica:
Esporte: Brasil país do futebol;
Música: Brasil, país do samba e do carnaval;
Religião: Brasil, país do Templo de Salomão.
No caso do entretenimento religioso, o Templo de Salomão Brasil, passou as ser
visto a partir desta dissertação através das lentes do Soft Power (poder brando),
desenvolvido pelo professor e ex-assessor de governo do então presidente dos Estados
Unidos da América, Bill Clinton, o renomado internacionalista Joseph Ney, que trata
em sua Teoria da Interdependência Complexa.
Assim, buscamos entender até que ponto o empreendimento religioso brasileiro
neopentecostal que leva o nome de Templo de Salomão Brasil, poderá passar a ser a
Disneylândia do “parque de diversos” religioso mundial, segundo as lentes da teoria de
Nye.
Pois além de ser visitado por milhares de pessoas de todos os lugares do mundo,
passa a carregar o estigma de levar o nome do principal palácio que existiu no centro
49
espiritual da humanidade, isto é, o umbigo espiritual abraâmico, que é a cidade de
Jerusalém.
Importante ressaltar que a IURD, inaugurou um Templo que leva o legado
religioso judaico, sem que fossem consultados aos seus precursores intelectuais se tais
referências culturais poderiam ser utilizadas, passando assim a almejar intrinsicamente o
resgate do título mundial de Centro Religioso Mundial.
Ainda em analogia ao samba e ao futebol como produtos Made in Brazil, os seus
templos de adoração localizados respectivamente no Rio de Janeiro (Maracanã e
Sambódromo), passa a recebe neste tripé do entretenimento brasileiro o Templo de
Salomão Brasil em São Paulo.
No que tange ao aspecto econômico, dos três ícones do entretenimento brasileiro
oferecem para os seus proprietários uma polpuda acumulação de capital e ampla
lucratividade, sendo que o entretenimento religioso se privilegia de algo que os outros
dois não conseguem competir, o Templo de Salomão Brasil é uma instituição privada, e
por isso não precisa dar satisfação à sociedade de seus ativos. Diferentemente do
Maracanã e do Sambódromo.
Embalado ainda nos privilégios do capitalismo privado, da mesma maneira que
os parques temáticos da Disney, em que suas histórias fantasiosas são despejadas aos
milhares de produtos de seus respectivos personagens viajando por todo mundo
(Mickey e sua ampla turma de personagens, Nemo em um mar de possibilidades da
felicidade que o reencontro trás, Piratas do Caribe e suas inúmeras e ingênuas trapaças
de um pirata alcoólatra e desajeitado, a Bela e a Fera na magia da reconciliação com o
sonho reavivado, e é claro, o clássico Pinóquio que passa a ser dono de um nariz grande
quando conta mentiras, entre outros entretimentos da animação fantasiosa), o “parque
temático religioso” brasileiro da IURD também tem, como a Disney, a pretensão de
perceber os movimentos e motivações auferidas no mais íntimo desejo dos seus fiéis na
realização dos seus sonhos terrenos.
Na tarefa de pesquisar tais motivações que levaram a construção deste
monumento religioso, buscou-se perceber os motivos sociológicos e antropológicos que
influenciam na tomada de decisões das massas populacionais para fazer parte deste
projeto, isto é, nem que pelo menos uma vez na vida visitar o Templo de Salomão
50
Brasil, podendo ser este público residente no ambiente nacional ou internacional. Sendo
ou não membro da IURD.
Desta forma, no centro deste ensaio está à discussão sobre a igreja/negócio se
localizar como plataforma do entretenimento, deslocando as fantasias de um reino dos
céus, para conquistas aqui e agora. Transferindo para a venda de sonhos que há em um
parque temático, a ilusão de fazer parte de um roteiro ideal, aqui e agora, e não mais no
futuro como está largamente ensinado na Bíblia, para que os sonhos ocorram no
presente e não no futuro que está por vir.
Assim, tais aspectos marcantes que formam o Neopentecostalismo fazem do
empreendimento da IURD um modelo que a igreja/negócio que se utiliza deste
mecanismo para a venda de seus diversos produtos. Em meio ao um mundo
economicamente formado pelo fundamento do capitalismo, e que precisa de expansão
de seus mercados para despejar seus produtos e marcas com vistas à sobrevivência do
próprio negócio, nada como um selo de qualidade que possa validar seus produtos,
imprimindo nele, até o momento exclusividade naquilo que faz.
Com tudo isso, o selo Made in Brazil, agora também em produtos religiosos
brasileiros, abrirá um universo de possibilidades não apenas para a IURD, para alcançar
novos mercados, e sim para todo o modelo de disputa neopentecostal, já que a
concorrência faz parte deste ambiente.
Interessante perceber que o modelo do Templo de Salomão Brasil,
qualitativamente trará novas divisas financeiras isenta de uma formal contribuição
fiscal, já que para todos os efeitos, diferentemente de qualquer outro produto, os
recursos angariados em eventos deste tipo de empresa religiosa são contribuições
voluntárias, isto é, não se tira nota fiscal para isso, dificultando a valoração de quanto
este produto pode custar ou gerar de receita, e consequentemente quanto de imposto irá
reverter para os cofres públicos, ou no limite, se na prática reverterá.
Em meio ao conceito do entretenimento internacional demandado pelo Soft
Power descrito pelo professor Nye, e em posse dos elementos do neopentecostalismo
advindos da secularização da religião no ambiente nacional, procuramos explicar os
pontos de convergência entre empresas do entretenimento mundial, como a afamada
Wald Disney, e a IURD no caso brasileiro, isto é, provedoras da fantasia coletiva que
51
leva milhares de mentes e corações sedentos de alivio emocional através de seus
palácios e templos encantados para ilusórias viagens dos sonhos.
Este projeto busca evidenciar assim, que o neopentecostalismo é o movimento
detentor da plataforma capitalista do entretenimento religioso brasileiro, forjado no
formato principal modelo da secularização da religião.
A consequente lógica econômica que permeia este negócio passa a gerar
recursos através de investimento imobiliário privado na formação de ambientes
temáticos religiosos, em busca de um retorno de seus lucros na venda de tais conceitos
neopentecostais. Podendo ser estes produtos categorizados como outrora já o foram
como sendo as indulgências materiais (suvenires que representam algum objeto bíblico),
passando hoje por carnês de campanhas, indo até a entrega “voluntária” de recursos de
várias modalidades: monetária, imobiliária, veicular, etc.
Importante ressaltar que, todos os negócios gerados pela indústria do
entretenimento religioso, dentro ou fora do Brasil, tais recursos monetários não passam
por um controle rigoroso pelo fisco brasileiro, já que o fruto de tais recursos é a doação.
Fazendo que com isso talvez venha alimentado ainda mais o afã pela tal indústria da
diversão religiosa.
Talvez esta prática fiscal mencionada que envolve o entretenimento religioso
não recebe atenção percebida em outros segmentos de mercado pelo fisco por serem
acompanhados de partidos políticos comandados por interesses da própria da
igreja/negócio, sustentando assim práticas que não sofram regulamentação amparada
pelas leis.
Na tentativa de entender, no limite, qual é de fato o gerador do principal ativo da
igreja/negócio, em meio às plataformas empresariais que a mantêm, percebe-se que os
seus atrativos espetaculosos, nomeado neste projeto como “Entretenimento Religioso
Neopentecostal” são a isca que despeja milhares de pessoas a consumirem os seus mais
múltiplos produtos. Fazendo suscitar, desta forma, o sustentáculo desta operação
meticulosa, que é a chamada Teologia da Prosperidade. Arcabouço responsável por toda
esta dinâmica negocial. Isto é, no fundo o que se objetiva vender de tangível é a
prosperidade.
52
E se isso de fato for constatado, através deste projeto e de outros que certamente
virão nesta mesma linha, em meio às teorias nacionais e internacionais embarcadas
pelos autores que ajudarão a estabelecer uma verdade constituída, poder-se-á conceituar
como esta dissertação passa a creditar ao serviço do movimento Neopentecostal, o
Templo de Salomão Brasil, sendo até o momento, início do século XXI, o principal
produto Made in Brazil.
E como prêmio máximo da competência carnavalesca que se tem arraigado na
população dos nascidos na Terra de Santa Cruz, no desenvolvimento de negócios em
meio a eventos espetáculos e populares, é que está posta talvez a principal herança
Neopentecostal de todos os tempos, e ícone do Entretenimento Religiosidade brasileira
para a retenção do clientelismo religioso, independentemente da religião ou doutrina
que se vive no momento, que é o Templo de Salomão Brasil.
O termo Templo de Salomão Brasil metodologicamente foi o termo utilizando
neste projeto para se referir ao complexo imobiliário de propriedade da Igreja Universal
do Reino de Deus (IURD), uma espécie de “Super Produto” na escala de todos os que já
foram criados outrora pelos gênios do marketing evangélico, nacional e/ou
internacional.
Leonildo Silveira Campos argumenta que a IURD é um dos empreendimentos
religiosos de maior expansão no mundo. O pressuposto desse argumento é que:
A IURD é um movimento neopentecostal, que se propaga numa
sociedade pluralista cujo campo religioso concorrencial e turbulento
facilita o surgimento de entidades ágeis, sintonizadas com as
necessidades e desejos de um público devidamente segmentado,
formando assim seu próprio mercado, empregando para isso
estratégias de marketing e de propaganda, que tomam corpo em uma
retórica e teologia adaptáveis aos interesses de uma sociedade
capitalista em processo de globalização (CAMPOS, 1999, p. 357).
53
A análise de Campos leva em conta três metáforas que dão conta de explicar o
sucesso de marketing da IURD: teatro, templo e mercado (1999). Por teatro Campos se
refere ao “espetáculo da fé” dramatizada por seus atores, pastores e fieis.
Em seu palco um pastor-ator tangibiliza as forças sagradas diante de
uma multidão que, como em um teatro de arena, também participa da
encenação, com gestos, no manejo de objetos corriqueiros
transformados em cúlticos, na movimentação das pessoas pelo espaço,
no balancear dos corpos, nas palmas ritmadas, nas cenas de exorcismo
e nas dramatizações de episódios bíblicos (CAMPOS, 1999, p. 360).
Nesse espetáculo do culto, a figura do pastor assume características distintas da
figura do pastor tradicional: o pastor-doutor é substituído pelo pastor-ator. A segunda
metáfora refere-se ao templo e está relacionado ao espaço geográfico onde se realiza a
dramatização do culto. Conforme Campos:
O templo é um “espaço energético” carregado de forças divinas
atribuídas ao Espírito Santo. Nele o espaço foi consagrado à Deus e
traz as marcas de sua ação vitoriosa sobre as forças do caos e da
desordem demoníaca, que vêm da rua. O templo é a “casa de Deus”, o
lugar “onde um milagre espera por você”, como afirma um de seus
slogans. Assim, num mundo habitado por demônios, o templo se
apresenta como um território sobre o qual os demônios não têm poder.
Adentrar-se a um templo iurdiano já é meio caminho andado em
direção à obtenção de um milagre desejado (CAMPOS, 1999, p. 361).
Por fim, complementando as metáforas anteriores, Campos argumenta que a
terceira é relacionado à idéia de mercado, chamando atenção para os problemas em
torno dessa noção.
Assim seria, apesar do risco de se transformar o campo religioso em
“mercadoreligioso”, principalmente quando o utilitarismo toma conta
54
das relações das pessoas com o templo, entre elas mesmas e o sagrado.
A despeito disso é temerário concluir que a IURD é apenas um
“balcão de milagres”. Daí a nossa proposta de substituição da
perspectiva de “mercantilização do sagrado” pela noção de “marketing
do sagrado”. A moderna teoria de marketing, a nosso ver, possui um
excelente potencial analítico para explicar as relações entre a IURD e
o mercado, relações que se expressam num contexto dominado por
uma mentalidade calculista e pluralista, resultante de uma “situação de
mercado”, que substitui à antiga “situação de monopólio”. A Igreja
universal possui uma refinada perspectiva de marketing, pois procura
conhecer o seu público, padronizar os “produtos”, transformar as
pessoas em participantes do processo de “produção”, segmentar a
audiência, oferecendo-lhes exatamente o que se pensa precisar e
desejar naquele momento. Isto é, ela não se contenta em oferecer um
“produto genérico”, que é o principal benefício esperado pelo
consumidor. Muito pelo contrário, ela oferece um “produto
ampliado”, o qual é desdobrado em outros produtos como cura,
prosperidade, comunidade de apoio e outros mais (CAMPOS, 1999, p.
362).
Como podemos observar, a partir dessas três metáforas, Campos considera a
moderna teoria do marketing uma ferramenta analítica com potencial para tratar das
práticas religiosas da IURD.
No caso do Templo de Salomão Brasil, em um só produto se encontram todos os
conceitos qualitativos para a conquista e retenção de clientela, principalmente no que
tange a plataforma do Entretenimento, fazendo dele um case de marketing, adorado por
muitos clientes assíduos, eventuais e concorrentes que fazem parte do jogo
Neopentecostal.
Assim, o original Templo de Salomão localizado em Jerusalém, patrimônio
histórico da humanidade, com os atributos culturais e religiosos constituídos desde a sua
primeira construção pelo povo judeu, por uma jogada de marketing passa a ser
reinaugurado em outro lugar, diferente do que havia inicialmente eleito nas Escrituras
Sagradas. Não mais em sua terra de origem, conhecida na Bíblia como Terra Prometida,
55
e pelos seus proprietários morais, mas sim, a mais de 10.600 km de distância, no bairro
do Brás, localizado na cidade de São Paulo, pelo movimento neopentecostal, em sua
plataforma do “Entretenimento Religioso”.
Há que se lembrar que nos discursos dos admiradores do Templo reproduzido no
Brasil, há os que digam que o Templo de Salomão de Israel nem existe mais, e
reproduzi-lo passa a ser uma maneira de não deixar morrer a história sagrada que
simboliza tal monumento religioso.
Fato é que, tal monumento religioso tem a tentativa de compreender quais os
efeitos que há na conexão com o “Entretenimento Religioso” como forma de retenção
do clientelismo em um mercado do chamado negócio espiritual, em meio ao domínio de
mentes e corações através de um poder de convencimento discursivo bíblico que se
exerce de maneira branda e silenciosa.
Para tanto, se faz necessário entender uma das principais teorias nascidas nos
Estados Unidos e que a diplomacia internacional utiliza, com vistas a reter inumeráveis
clientelas nacionais espalhadas pelo mundo. Na sua grande maioria não mais pela força
bruta da guerra, e sim pelo poder brando do convencimento discursivo do
entretenimento.
E é nesta referida teoria que este projeto irá buscar em sua última sessão, a
pretensão de abstrair em sua essência, como o movimento neopentecostal utiliza-se do
poder brando da religião para atrair e reter sua clientela, sendo também e não por acaso,
o entretenimento sua principal plataforma neste trabalho na política da diplomacia
internacional.
3.2 – O poder brande (Soft Power) e o entretenimento religioso
Para o melhor entendimento dos efeitos que as ações do entretenimento causam
nas pessoas, independentemente do segmento utilizado (comercial, cultural, econômico,
religioso, etc) se faz necessário tomar emprestado uma das principais teorias das
Relações Internacionais, nos jogos promovidos pela diplomacia, que é o conceito de
Soft Power (Poder Brando).
56
Para tanto, se faz necessário compreender o surgimento desta ferramenta
decifrada por Joseph S. Nye Jr., renomado professor de Serviços Distintos e ex-reitor da
Kennedy Schoolof Government de Harvard. Nye Jr adquiriu seu bacharelado
na Universidade de Princeton, depois de estudar filosofia, política e economia em
Exeter College na Universidade de Oxford, e obteve seu Ph.D. em Ciência
Política pela Universidade de Harvard.
Além de sua Teoria mais recente que fala sobre os conceitos do Soft Power, que
serão explicadas neste capítulo, Ney foi fundador junto com Robert Keohane das
renomadas “Teoria da Interdependência”, “Teoria da Interdependência Complexa
nas Relações Internacionais”, além da consagrada “Teoria do Neoliberalismo”.
Tais teorias exploram as relações transnacionais em um ambiente de política
mundial, fazendo do entretenimento um dos seus principais e poderosos instrumentos de
convencimento e manobra de massas populacionais, conquistando os seus corações,
mentes e principalmente as suas respectivas economias, haja vista que, a mais de 100
anos o dólar (moeda dos Estados Unidos) é o principal lastro monetário mundial.
O conceito de Smart Power (Poder inteligente), desdobramento do Soft Power
(Poder Brando) desenvolvida pelo Prof. Ney, também atuando como membro da
Coalizão de Orientadores para o Projeto de Segurança Nacional, tornou-se popular com
o uso desta frase por membros da administração Clinton, e mais recentemente na
administração Obama.
Em meio à vastidão dos pensamentos enriquecedores que há nas teorias escritas
pelo professor Ney, esta dissertação se limitará a discorrer sobre a teoria denominada
como Soft Power, descrita na obra Soft Power: the Meansto Success in World Politics
(2004). Sendo que o conceito de Soft Power traz em seu fundamento a capacidade de
afetar os outros atores para obter os resultados por meio da atração ao invés da força.
Para tanto, se tratando de uma nação, ambiente largamente estudado pelo
professor Nye, tal “Poder Brando” passa a influenciar através da cultura os valores
advindos de um país, em meio a ações de políticas internacionais. Desta forma,
surgindo o chamado “Poder Inteligente” (Smart Power), que combinam momentos de
brandura (Soft Power) e dureza (Hard Power) para conversão de corações e mentes dos
que passaram a admirar e obedecer aos donos desta política diplomática.
57
Esta relação de poder é tão convincente que fez com que a diplomacia
internacional norte-americana estivesse ao longo da história promovendo o Soft Power
em todas as nações do mundo, sendo esta essencial para que no momento conhecido
como Guerra Fria (1947-1991), o diálogo pode prevalecer em meio a poucas guerrasque
ocorreram na periferia do mundo. Se sustentando por quase meio século, sem que a
terceira guerra mundial pudesse ocorrer.
Trazendo rapidamente um pouco este conceito diplomático para o cenário atual,
e sem entrar no mérito diplomático, a luta contra o terrorismo transnacional parte de um
contexto que busca conquistar adeptos de ambos os lados desta fronte, aonde o Smart
Power (conjunção entre o Soft-brando e Hard-puro Power) busca equilibra esta guerra,
onde não há nem data nem local definido para o próximo confronto.
Assim, o Poder Brando (Soft Power) e por que não dizer poder intelectual,
através da venda de valores de uma nação é a capacidade de afetar os outros (nações ou
indivíduos) para obter os resultados de simpatia desejada, sem que um único míssil seja
disparado.
Em geral, a história diplomática mostra que se pode afetar o comportamento de
outras pessoas de três maneiras principais: primeiro é através de ameaças e coerção,
segundo é incentivando e utilizando algum tipo de pagamento/compensação, e terceiro
desenvolvendo uma atração que faz o outro querer ser o que você é, ou ter o que você
tem.
O Soft Power trabalha justamente no terceiro aspecto. Exportando os valores
culturais ou padrões morais idéias, comumente vendidos, entre outras coisas, pelas telas
dos cinemas de Hollywood e os inúmeros seriados que invadem o mundo.
Assim, um país pode obter os resultados que deseja na política mundial porque
outros países querem segui-lo, admirando seus valores e exemplos vendidos pelas tetas
do entretenimento, aspirando desta forma um nível de prosperidade e abertura como se
vê sendo um exemplo de modelo ideal. Mesmo que muitas vezes tudo isso na pratica
seja plástico e intangível.
Desta forma, para que este poder passe a influenciar um número ilimitado de
nações é fundamental definir uma agenda mundial, atraindo outros atores nesta política
58
mundial. E não os forçar a mudar através de ameaças militares ou pagamentos de
acordos comerciais. Sendo que muitas vezes esta coerção ou venda se faz necessária,
em meio às animosidades que o universo entre nações está sujeito se dispor, mas esta
prática fica cada vez mais rarefeita, em meio a influencias que se prendem a
disseminação de valores culturais, que trazem respeito e a não guerra em meio a uma
sociedade cada dia mais secularizada.
A política do Soft Power faz com que os demais atores passem a querer o mesmo
que o agente influenciador quer, aglutinando as pessoas e seus respectivos grupos ao
invés de coagi-las a fazer o que o líder quer que seja feito. Sendo que esta mesma ação
diplomática pode ser vista em meio às práticas da igreja/negócio, na conversão de
pessoas e suas comunidades que passam a querem o mesmo que seus agentes
influenciares quer que seja a mesma prosperidade e o enriquecimento financeiro,
utilizando para isso o espetaculoso mundo das maravilhas do entretenimento religioso.
No caso de todas as diplomacias, seja ela internacional ou religiosa, é
interessante entender o quanto o professor Ney foi perspicaz em decifrar que um poder
suave em meio aos que participam do pleito, passa a pairar de maneira mais eficaz sobre
a capacidade de moldar as preferências dos outros, segundo as expectativas de uma
liderança focada em entender que, em meio a um discurso de igualdade, existem os
tentáculos da velha e conhecida dominação entre a espécie humana.
Quando saímos do nível entre nações e passamos a patamares do cotidiano entre
pessoas, é sabido o quanto o jogo dos poderes da atração e da sedução influencia nas
decisões correntes.
Os poderes empresariais, políticos, religiosos, entre outros, há tempos praticam
este jogo, que advém da definição das agendas de debates, eventos, comícios e da
determinação da estrutura de uma interlocução que faz parecer que todos podem ter voz
em meio a uma sociedade democrática de direitos iguais.
Agendas em sua grande parte descontraídas para que se possa ter um ar de
entretenimento em meio ao caos social que se vive nos dias de hoje. Principalmente nos
meios urbanos, aonde todos são banhados por inúmeros eventos pagos que acontecem
por toda parte. Tendo como essência a venda de valores culturais segmentados, em uma
afinada e camuflada tônica etnocêntrica.
59
Os eventos a cada dia mais vão deixando as distorções que o passado recente
trazia na distinção das raças para o ajuntamento de pessoas, trazendo em nossos dias
uma nova e fresca distorção nos entretenimentos espalhados pelo séc. XXI, que são as
tribos, e suas respectivas etnias. Sendo cada uma desta, para si, um mundo ideal e a
parte das outras etnias, surgindo assim a cada dia, mais e mais a tal das distorções
etnocêntricas.
E em meio a estes pequenos nichos de influência, o Soft Power passou a ser um
marco da política democrática cotidiana. Agora não mais regulando as relações entre
nações e sim entre pessoas de um mesmo país.
A capacidade de estabelecer preferências tende a ser associada cada vez mais a
ativos intangíveis, como uma personalidade atraente, cultura, valores e instituições de
toda a sorte de atividades que são vistas como legítimas ou com autoridade moral acima
das demais. Sendo que o mais interessante é que umas se sobrepõe a outras com a
autoridade de uma suprema legitimidade, deixando de lado o respeito intelectual que
deveria pautar as relações entre iguais.
O que mais passa a ficar claro com o passar dos tempos, é que estes diversos
mundos sabem coabitar entre si, sem que guerras armadas se deflagrem em sua maioria
das vezes, já que o Soft Power prega a não guerra direta e sim silenciosa e cultural.
Ocorrendo também assim com as diversas denominações do chamado universo
evangélico, e por que não dizer, do mundo da Universal que orbita em torno do
principal elemento de Soft Power religioso mundial, o Templo de Salomão Brasil.
Na prática, o que se vê é o próprio Smart Power (Poder Inteligente) religioso,
que é a junção do Soft Power (Poder Brando) com o Hard Power (Poder Duro), já que,
em meio à brandura suntuosa vendida pelo Templo de Salomão Brasil, há uma dureza
no discurso das maldições demoníacas, que recairá sobre os que não entenderem os
propósitos das campanhas de prosperidade material.
Talvez o professor Nye, quando inaugurou o Smart Power, não se deu conta que
estaria fazendo uma vestimenta para além das Relações Internacionais, e que cairia
muito bem nas relações sociológicas contemporâneas, principalmente no tema das
Ciências da Religião.
60
Sem sombra de dúvidas, as contribuições do professor Joseph Ney Jr. foram um
presente da cátedra das Relações Internacionais para todas as áreas do conhecimento, e
principalmente para as Ciências da Religião quando a utilização do Soft Power,
modestamente posto nesta dissertação, que Passou a ter a pretensão de decifrar tanto os
aspectos sociológicos como religiosos de uma comunidade religiosa brasileira.
Esta contribuição Nye a área da religião é tão significativo que mostra algo que
vivemos todos os dias, já que se algum líber ou denominação religiosa pode fazer outras
pessoas quererem fazer algo sem que haja uma coerção explicita, e isto passa pelo
acumulo de capitais em meio a um mundo essencialmente faminto por prosperidade
financeira, este influenciador terá sem dúvidas uma campanha bem sucedida. Fazendo
parecer que isso vem do próprio consumidor e não do vendedor de sonhos,
desenvolvendo um enorme poder de atração através da venda de tais valores. Passando a
ser muito mais que um simples e mero poder de persuasão quando o Nome de Deus é
proclamado. Sendo que neste contexto surge outro tema: se o Nome de Deus está sendo
proclamado em vão ou não? Podendo ser este debate proposto para outro momento.
Assim, se comparada a igreja/negócio aos aspectos de comportamento entre
atores nas Relações Internacionais, pode-se dizer que o Soft Power é o próprio Poder
Atrativo (Attractive Power), podendo ser tal poder o principal ativo produzido pela
sociedade do séc. XXI em suas mais diversas comunidades, inclusive a religiosa. Já que
é deste poder de atração que se passa a controlar: corações, mentes, guerra e paz.
E se este ativo, tão poderoso em meio às sociedades contemporâneas, tem como
principal pano de fundo uma paz aparente através de eventos de entretenimento, pode-se
entender que os conceitos que regem a: sociedade, política, economia, comércio e
principalmente a religião, passam a estar associado a este poderoso ativo chamado
Poder Brando Religioso – Soft Religious Power.
E se este contingente de atrações múltiplas passa a captar interessem étnicos
específicos, produzindo resultados desejosos aos seus respectivos grupos
influenciadores, há que se ter uma visão mais aprumada para entender o papel do Soft
Religious Power (Poder Brando Religioso) em meio aos interesses de cada um desses
grupos: governamentais, internacionais, nacionais.
61
Se essa atração, por sua vez, produz resultados desejados de políticas que
movem o mundo, deve ser julgada em cada caso particular e respectiva área de atuação.
Sendo no caso específico desta dissertação o segmento da igreja/negócio.
Há uma composição entre poder medido em resultados comportamentais e poder
medido em termos de recursos, já que o comportamento de cada indivíduo faz
movimentar volumes de recursos, em que os agentes influenciadores são pessoas e seus
pares que possuem as mesmas necessidades/desejos.
No caso das ações que geram esta relação entre comportamento e recursos na
igreja/negócio, é a mesma necessidade/desejo por prosperidade financeira que passa a
movimentar seus comportamentos em busca de recursos, mas que na prática o volume
de recursos que se move pela massa de pessoas, para se obter um bilhete premiado de
prosperidade a cada encontro religioso, passa a transferido aos donos da igreja/negócio
milhões de reais.
No caso da política internacional, os recursos que produzem Soft Power surgem
em grande parte dos valores que uma organização ou país expressa em sua cultura, nos
exemplos que estabelece por suas práticas e políticas internas e na forma como lida com
suas relações com os outros.
A diplomacia pública é um instrumento que os governos usam para mobilizar
esses recursos para se comunicar e atrair os públicos de outros países, e não apenas seus
governos. A diplomacia pública tenta atrair chamando atenção para esses recursos
potenciais por meio principalmente do entretenimento (Cinema, Parques Temáticos,
Série, Esportes, Música, etc.) subsidiando exportações culturais, organizando trocas e
assim por diante.
E se o conteúdo da cultura, dos valores e das políticas de um país não for
atraente, a diplomacia pública que os “transmite” não pode produzir Soft Power, pode
produzir exatamente o oposto. E é por isso que amadores não têm espaço para se obter
uma boa política de Soft Power. Isso deve ser feito por profissionais, e para isso há que
se terem vultosos volumes de recursos financeiros.
Com base em buscar elementos que provem que atualmente há uma modalidade
que desenvolve novos prosélitos adequados a igreja/negócio do século XXI, este
62
projeto teve no decorrer de suas linhas a pretensão de utilizar na consagrada “Teoria da
Interdependência Complexa” concebida por Joseph Nye Jr, apresentando o conceito que
aborda tais bases teóricas internacionais de se conquistar mentes e mercado através de
uma força aparentemente invisível e branda, que é o Soft Power também dentro do
ambiente religioso.
Sendo que este elemento de poder, o Soft Power utiliza como principal arma de
ataque a “venda dos valores” de uma nação ou empresa, através principalmente do
Entretenimento (cinema, música, castelos mágicos, etc.). Assim, com o passar do
tempo, o neopentecostalismo vai alicerçando cada vez mais suas estruturas de uma
igreja secularizada o decorrer do tempo.
Sofisticando a cada instante a maneira de se produzir “Entretenimento
Religioso” através da política do Soft Religious Power (Poder Brando Religioso),
desvendada ineditamente por este projeto, em que se tornam cada vez mais aderentes as
tais práticas para dominar as mentes sem pavimentação bíblica fundamentada. Isto é,
aos que trocam a adoração pela atração espetaculosa em busca de compensações
financeiras com o Sagrado e não o bom fruto dos benefícios do por vir.
Desta maneira, este material finaliza o seu roteiro descritivo literário entendendo
ser o principal ícone de todos os “Entretenimentos Neopentecostais” surgidos até os
dias de hoje no Brasil, e por que dizer, nos tempos atuais em todo o mundo, o Templo
de Salomão Brasil.
Reconfigurado em sua concepção original israelita, como busca entender este
estudo, pela igreja/negócio que a concebeu (Igreja Universal do Reino de Deus –
IURD), em um sofisticado monumento circense, em seus premeditados e inúmeros
produtos que passam a derivar deste Templo principal.
Um verdadeiro “Castelo dos Sonhos dos Evangélicos”, semelhante a um dos
“Castelos dos Sonhos” de Wald Disney, principalmente no que tange o entretenimento
dos lindos contos de fadas e magia, representada na luta entre o bem contra o mal.
No caso específico da diplomacia norte-americano, uma política bem
orquestrada amortecendo a razão lógica do mundo, que passa a ser invadida pelo poder
econômico norte-americana através da diversidade do Entretenimento encontrado
63
naquela nação. Levando os valores da terra do “Tio San” às mentes, principalmente de
crianças em formação que, um dia serão governantes de suas respectivas nações, e como
fãs inveterados de Mickey Mouse e sua turma, nunca mais poderão afastar suas culturas
da cultura do “Entretenimento Americano”, já que no limite passaram a ser uma única
cultura, e não apenas dos Estados Unidos.
Assim, o objetivo central desta dissertação foi buscar as hipóteses que
demonstraram esta mesma venda de valores através do “Entretenimento Religioso”, por
meio do Templo de Salomão Brasil, aos evangélicos de todas as partes do mundo e não
só do Brasil. Tudo isso sendo demonstrada através do Soft Power, proposta nas teorias
de Joseph Nye.
Desta forma este projeto pretende entender o quanto o Templo de Salomão
Brasil, outrora um Templo de propriedade moral, intelectual, histórica e espiritual dos
filhos de Salomão, foi desmantelado, por uma jogada de marketing genial, deixando
para trás o próprio Phillip Kotler, pai do marketing moderno.
Por fim, na busca em explicar tais movimentos do Entretenimento Religioso que
emana da plataforma neopentecostal se dá em utilizar um instrumento atualizadíssimo
da diplomacia mundial, que é poder obtido através Soft Power, convertendo agora este
conceito naquilo que esta obra passa a chamar de Soft Religious Power (Poder Brando
Religioso).
Decodificando as ações de uma igreja/negócio instalada no Brasil, com atuação
em todo mundo, e que parece capturar seus esforços economicamente tangíveis, e nada
espirituais, através de um produto também palpável, que é o Templo de Salomão Brasil,
imprimindo neste empreendimento imobiliário o selo Made in Brazil, através do Reino
Universal da Maravilhas Religiosas.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esta dissertação teve a pretensão de fundamentar os conceitos que predominam
no discurso das igreja/negócio. Decifrando na linha da história o surgimento do
neopentecostalismo, como sendo a evolução da igreja pentecostal, temperada com os
diversos matizes religiosos presentes no Brasil, em meio à secularização que nos levou
a este formato de igreja presente no inicio do século XXI.
É de fundamental relevância para este estudo entender a sutileza que formou e
deu origem ao neopentecostalismo. Compreendendo, em meio a templos evangélicos,
igrejas católicas, espiritismos de várias correntes e culturas, como ocorreu esse tempero
cultural/temporal que deram ao neopentecostalismo a configuração do que conhecemos
hoje.
Para tanto tratamos das origens do pentecostalismo norte-americano, passando
brevemente pelos missionários que aqui chegaram, e as consequentes fases que traz este
produto com o paladar das coisas do Brasil. Temperado em meio a estas diversas
correntes místico/religiosas de nação continental.
Ao decorrer do século XX, o neopentecostalismo adotou forma, jeito e corpo,
passando a refletir seu ideário, como se apresenta nos dias de hoje. Porém o fator que
mais contribuiu para que esta verdadeira metamorfose espiritual ocorresse, foi sem
dúvidas alguma, o movimento de secularização em que a humanidade teve que se
dobrar, transformado a religião, que nos tempos da modernidade era um bem estatal,
passando a ser na pós-modernidade um bem privado, e por isso recebendo todas as
nuances desta consequente regulamentação empresarial. Sendo que, após estes dois
tempos da história (modernismo e pós-modernismo) a competição entre as igrejas pelos
clientes passou a dar a dinâmica de atuação das igrejas.
O conceito de “Soft Power” (poder brando) do professor de Harvard Joseph
Ney, renomado entre os diplomatas e internacionalistas de todo mundo também é
fundamental nesta dissertação.
O arcabouço teórico do professor Nye demonstra nas relações internacionais o
quanto os EUA utilizam no entretenimento a principal política “não armada”, sendo esta
65
agenda adotada pelo Partido Democrata, para dominar mentes e mercados espalhados
pelo globo, em uma ingênua e inofensiva plataforma de entretenimento vendida pelo:
cinema, música, parques temáticos, etc.
Não sendo então de se estranhar, a partir dessa informação, que todo super-herói
americano têm, não coincidentemente, seus trajes nas cores da bandeira norte-
americana, promovendo uma associação subliminar aos americanos como xerifes e
heróis mundiais.
Sendo que esta nada doce coincidência é a que pauta a Teoria da
Interdependência Complexa em que está contido o conceito de “Soft Power”, na qual
este projeta se debruçou para demonstrar uma associação a este Poder Brado (Soft
Power) Diplomática norte-americano e o Poder Brando Religioso (Soft Religious
Power), exercido pelo movimento neopentecostal através da Teologia da Prosperidade.
Para tanto tomamos emprestando o conceito descrito no capítulo 3 que descreve
o Soft Power decifrando com este poderoso instrumenta as práticas do movimento
neopentecostalismo, promovendo assim um corte didático na atuação da igreja/negócio
sob a batuta da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD), naquilo que é o principal
produto de Poder Brando Religioso (Soft Religious Power) encontrado no Brasil, sob a
égide do Templo de Salomão Brasil.
Transferindo para a diversão dos grandes palácios e templos do mundo da
fantasia, o império do abstrato mundo de das revelações espirituais (e por não dizer:
revelamentos), vendido na terra de Monteiro Lobato e seu folclore. Equivalente ao
mundo mágico de Wald Disney, uma prática de “dominação branda” através dos
conceitos de um Templo que leva o nome de Salomão, sem que antes isso pudesse ter
sido pedido ao povo judeu, proprietário histórico deste nome.
Percebendo-se a partir deste encontro entre as teorias de Joseph Ney Jr. e as
práticas empresariais da IURD, o quanto o conceito de Soft Power pode ser utilizado
neste modelo operado mentes, corações e mercado religioso.
Com o fim da Segunda Guerra Mundial, os Estados Unidos, detentores da
hegemonia bélica mundial, perceberam que seria muito mais lucrativo “sustentar” o
mundo através de políticas internacionais que vendessem o belo valor dos conceitos
66
democráticos norte-americanos, do que buscar dominar o mundo pela força armada ou
gruta (Hard Power- força bruta: política adotada pelos governantes do Partido
Republicano), como fizeram todos os impérios que o antecederam, com exceção de um,
que utilizou o Soft Power em menor escala, utilizando a da cultura grega, que foi
Alexandre O Grande.
Assim, a política “Soft Power” faz com que, através do entretenimento em seus
mais diversos e varados temas, os americanos fizessem com que o mundo todo passasse
a ser um pouco mais seus admiradores, já que seus valores são ilusoriamente
compartilhados no coração de todos através da fantasia que há no entretenimento.
Dominando desta forma: mentes, corações e mercados espalhados por todo
mundo. Tendo, no limite, uma sutil idéia muito bem engendrada neste conceito, o de
que todos passem a ser um pouco norte-americanos.
No caso da religião podemos também ver neste tipo de política de conquista pelo
“Poder Brando” incluir o Templo de Salomão no Brasil, pois a maioria dos cristãos
passa a se render ao apelo religioso da herança judaica, que por sua vez, um dia,
poderão entoar em uma só voz: “Eu sou a Universal”.
Um jogo slogan que aparentemente se demonstra ingênuo, mas visto no decorrer
das teorias apresentadas nesta dissertação, faz do termo “eu sou” um elemento exclusivo
da “Universal”, juntamente com a única replica do Templo de Salomão existente hoje
no mundo.
Assim, com base no Soft Power – Poder Brando da Teoria de Nye, surgiu neste
projeto o Soft Religious Power – Poder Brando Religioso, que é o entretenimento
religioso como sendo o grande captador de recursos da plataforma empresarial da
igreja/negócio Neopentecostal nos dias atuais, praticando seu domínio territorial através
de uma “Força Branda Religiosa”.
Envolvendo ao mesmo tempo: cidadania, religião, fé e recompensas intangíveis
para a esfera do imediato. O viver a plenitude dos sonhos aqui e agora.
Em termos religiosos estrategicamente utilizados pela IURD isso passa a ser o
Carpem Dean (viva ao máximo o dia de hoje e confie o mínimo possível no amanhã) do
século XXI. Já que a Teologia da Prosperidade transfere para a vida terrena o ápice da
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existência e sua premiação de bens materiais e financeiros. Tudo isso, em seu ícone do
entretenimento religioso chamado: Templo de Salomão Brasil.
Assim, esta dissertação preocupou-se em compilar todos os conceitos
percorridos em busca de conceituar do Templo de Salomão Brasil como sendo o “Super
Produto Religioso” brasileiro, digno de em si ser colocada a etiqueta: Made in Brazil.
Assim como o futebol e o carnaval, dois outros “cases” brasileiros.
Conceituar e entender o modus operandi da igreja/negócio que há na IURD,
transferindo Jerusalém para o Brás através do entretenimento religioso, em um conceito
de maior e mais importante Templo divino na terra dos viventes é a tarefa deste projeto.
Por fim, com base nos estudos do Soft Power descrito pela Teoria da
Interdependência Complexa é que esta dissertação teve a pretensão de lançar as bases
do surgimento do conceito de Soft Religious Power – Poder Brando Religioso.
E foi na busca de desenvolver as respostas para as fases deste novo “Poder
Brando Religioso” que se percorreu os caminhos do principal produto religioso
construído em solo brasileiro até os dias de hoje, o “Templo de Salomão Brasil: um
produto Made in Brazil”.
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