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21 ROTEIRO Médico precisa viajar para dar mais vida ao impreciso viver. Levando, como se deve, um mínimo de tudo: roupa, limpeza, notas, papéis e, sobretudo, ideias. À espreita de absorver o máximo de tudo: coi- sas, lugares, pessoas. À espreita do gesto que pode macular o branco de doer, ou ser. Há outra viagem mais impiedosa, a estática, a que se faz sem sair do lugar. Esse viajor, se decidido e rigoroso, percorre os caminhos mais insuspeitos, os de si próprio. Com suas evocações sofridas, experi- ências inconclusas e saudades diluídas por demoras. Sem autovitimização ou autoindulgência, ao cortar as correntes das dores antigas sobra a inconstância do eu, com opções diversas e incertezas tão presentes... E desejos tão incorretos. Sim, viajar é necessário e impreciso tal qual o baile da vida, mas os caminhos dúbios adotados devem ter o ardor da curiosidade, do desprendimento e do alargar-se. Essenciais para evi- tar a tristeza da síntese poética: “Viajar, viajar, todo o planeta é zero.” Entre a decepção e a alegria, todo roteiro é incerto, decerto o interior. Médico precisa viajar com esforço e disciplina, para dentro de si e do outro. E, às vezes, só com leveza e nonchalance, sem intenção. É a dupla via certa do dever e do prazer. “Um cantinho, um violão.” Tom, síntese da bossa, da simplicidade, do contato e do isolamento, de sentimentos misturados, do ócio com significado de ter tempo para criar e viver o sonho de existir. E se desdobrar no outro. SOBRE VIDA (Poesia de Tom e Vinicius) “A felicidade é como a pluma/Que o vento vai levando pelo ar/Via tão leve/Mas tem a vida breve/ Precisa que haja vento sem parar.” E sabemos que o vento nem sempre movimenta as folhas em sua previsibilidade imprevista. Tornado brisa, sente-se e evoca a suavidade do pressentido, mas é breve e recorrente, como tudo que é vida. Não sou crente, dos quais não tenho a fé; não sou ateu, dos quais não invejo a convicção; não sou agnóstico, dos quais não possuo a reflexão; sou um mero perplexo. Máxima religiosa para quem ainda não encontrou a luz. DO CADERNO VERDE tema “Ensinar não é só uma profissão, ensinar é uma arte. O ensino necessita da justiça de um verda- deiro juiz, da pureza de um verdadeiro sacerdote, da paciência de um verdadeiro médico. O professor é um médico espiritual, cura os erros do intelecto, livra a alma da ignorância. O ensino é uma profissão espiri- tual. O professor é o guia que nos leva pelos caminhos cheios de beleza, da ciência. Que imensa beleza, que enorme beleza existe no fato de tirar uma dúvida de um aluno, de um professor ensinar uma coisa nova a um aluno, de um professor ser justo e compreensivo.” Extraído de uma redação escrita em 1959 pelo estu- dante Caetano Veloso, aos 16 anos, e que mereceu do professor Nestor Oliveira o parecer: “Excelente prova, pode servir de modelo quanto a estrutura, quanto a substância”. ENTREMEIO ANTOLOGIA II

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21

ROTEIROMédico precisa viajar para dar mais vida ao

impreciso viver. Levando, como se deve, um mínimo

de tudo: roupa, limpeza, notas, papéis e, sobretudo,

ideias. À espreita de absorver o máximo de tudo: coi-

sas, lugares, pessoas. À espreita do gesto que pode

macular o branco de doer, ou ser.

Há outra viagem mais impiedosa, a estática, a

que se faz sem sair do lugar. Esse viajor, se decidido

e rigoroso, percorre os caminhos mais insuspeitos, os

de si próprio. Com suas evocações sofridas, experi-

ências inconclusas e saudades diluídas por demoras.

Sem autovitimização ou autoindulgência, ao cortar as

correntes das dores antigas sobra a inconstância do

eu, com opções diversas e incertezas tão presentes...

E desejos tão incorretos. Sim, viajar é necessário e

impreciso tal qual o baile da vida, mas os caminhos

dúbios adotados devem ter o ardor da curiosidade, do

desprendimento e do alargar-se. Essenciais para evi-

tar a tristeza da síntese poética: “Viajar, viajar, todo

o planeta é zero.” Entre a decepção e a alegria, todo

roteiro é incerto, decerto o interior.

Médico precisa viajar com esforço e disciplina,

para dentro de si e do outro. E, às vezes, só com leveza

e nonchalance, sem intenção. É a dupla via certa do

dever e do prazer.

“Um cantinho, um violão.”

Tom, síntese da bossa, da simplicidade, do contato

e do isolamento, de sentimentos misturados, do

ócio com significado de ter tempo para criar e viver

o sonho de existir. E se desdobrar no outro.

SOBRE VIDA

(Poesia de Tom e Vinicius)

“A felicidade é como a pluma/Que o vento vai

levando pelo ar/Via tão leve/Mas tem a vida breve/

Precisa que haja vento sem parar.”

E sabemos que o vento nem sempre movimenta as

folhas em sua previsibilidade imprevista. Tornado

brisa, sente-se e evoca a suavidade do pressentido,

mas é breve e recorrente, como tudo que é vida.

Não sou crente, dos quais não tenho a fé; não sou ateu, dos quais não invejo a convicção; não sou agnóstico, dos quais não possuo a reflexão; sou um mero perplexo.

Máxima religiosa para quem ainda não encontrou a luz.

DO CADERNO VERDE

tema

“Ensinar não é só uma profissão, ensinar é uma arte. O ensino necessita da justiça de um verda-

deiro juiz, da pureza de um verdadeiro sacerdote, da

paciência de um verdadeiro médico. O professor é um

médico espiritual, cura os erros do intelecto, livra a

alma da ignorância. O ensino é uma profissão espiri-

tual. O professor é o guia que nos leva pelos caminhos

cheios de beleza, da ciência. Que imensa beleza, que

enorme beleza existe no fato de tirar uma dúvida de

um aluno, de um professor ensinar uma coisa nova a

um aluno, de um professor ser justo e compreensivo.”

Extraído de uma redação escrita em 1959 pelo estu-

dante Caetano Veloso, aos 16 anos, e que mereceu do

professor Nestor Oliveira o parecer: “Excelente prova,

pode servir de modelo quanto a estrutura, quanto

a substância”.

ENTREMEIO

ANTOLOGIA II