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13 UNIVERSIDADE ESTADUAL DO MARANHÃO CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E NATURAIS DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA E GEOGRAFIA CURSO DE HISTÓRIA TATIANE DA SILVA SALES EDUCAÇÃO PARA O LAR: Instrução e condição social feminina em São Luís na Primeira República São Luís 2007

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO MARANHÃO CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E NATURAIS

DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA E GEOGRAFIA CURSO DE HISTÓRIA

TATIANE DA SILVA SALES

EDUCAÇÃO PARA O LAR:

Instrução e condição social feminina em São Luís na Primeira República

São Luís 2007

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TATIANE DA SILVA SALES

EDUCAÇÃO PARA O LAR:

Instrução e condição social feminina em São Luís na Primeira República

Monografia apresentada ao Curso de

História da Universidade Estadual do

Maranhão como requisito à obtenção do título

de licenciada em História.

Orientadora: Prof. Dr. Adriana Zierer

São Luís 2007

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TATIANE DA SILVA SALES

EDUCAÇÃO PARA O LAR: Instrução e condição social feminina em São Luís

na Primeira República

Monografia apresentada ao Curso de

História da Universidade Estadual do

Maranhão como requisito à obtenção do título

de licenciada em História.

Aprovada em: / /

BANCA EXAMINADORA

_____________________________________________________ Prof.ª Dr.ª Adriana Zierer

Professora do departamento de História e Geografia da Universidade Estadual do Maranhão

_____________________________________________________ Profª Ms. Elizabeth Abrantes

Professora do departamento de História e Geografia Universidade Estadual do Maranhão

_____________________________________________________ Profª Mary Ferreira

Professora do departamento de Biblioteconomia Universidade Estadual do Maranhão

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À três mulheres importantíssimas para minha vida, minha mãe e minhas avós.

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Mirem-se no exemplo daquelas mulheres de Atenas Vivem pros seus maridos, orgulho e raça de Atenas Quando amadas se perfumam Se banham com leite, se arrumam Suas melenas Quanfo fustigadas não choram, Se ajoelham, pedem, imploram Mais duras penas Cadenas

Mulheres de Atenas, Chico Buarque de Holanda

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a todas as pessoas que estiveram diretamente ou indiretamente relacionadas

com a elaboração deste trabalho.

Especialmente a minha mãe Zenita, pela força que tive em todos os momentos da

graduação, pelas palavras de apoio e por sempre acreditar naquilo que eu estudo. Você é minha

maior inspiração!

À minha família, meu pai, Osvaldo, e meus irmãos, Beto e Tássia, por

quase sempre compreender meus momentos incompreensíveis.

Aos meus queridos avós por me apoiarem sem reservas, inclusive

emprestando a casa quando eu precisa me isolar, também aos meus tios pela terna preocupação e

carinho. Ao tio Mauro, também historiador, pelo exemplo de superação que significa para mim.

À Yanne, minha fiel companheira de todas horas e de várias noites de

estudo, por nunca ter me abandonado e sempre ter me alegrado quando eu precisava. Você

sempre será minha filha querida!

À professora e orientadora Elizabeth Abrantes pelos momentos de

atenção, dedicação e apoio para confecção desta monografia, pelos domingos que lhe ocupei,

pelo empréstimo até de seu computador e pela orientação à distância. Você é um exemplo de

profissional apaixonada pelo que faz. Ao seu esposo, Silvio, por ter me ajudado e ter feito muitos

favores importantes.

Aos meus professores do departamento de História da UEMA, em especial à

Henrique Borralho, Alan Kardec e Adriana Zierer pela amizade e pelas importantes

contribuições em minha vida acadêmica . Alan, nunca esquecerei seu apoio e atenção.

Ao Programa de Pós-Graduação (PPGE) da Universidade Estadual do Maranhão e

pela bolsa de iniciação científica da UEMA (BIC/UEMA), pois forneceram importantes subsídios

para concretização deste trabalho.

Ao meu querido Reinaldo, namorado e companheiro, pelas importantíssimas

contribuições na elaboração deste trabalho. Agradeço ao intelectual, amigo e amante por ler,

ouvir e opinar. Sem você este trabalho teria sido bem penoso, obrigada por tudo!

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A todos meus amigos, credito a todos vocês grande parte do mérito que este trabalho

possa ter.

A todos companheiros de minha turma (2003.1), àqueles que cultivei no curso de

História, e que de certa forma deram apoio e torcida ao bom êxito desse trabalho.

Ao meu eterno amigo e companheiro Eduardo, por nossas conversas valiosas, por

sempre ouvir meus dilemas em relação a este trabalho e ter sempre alguma contribuição a dar.

Você é o grande intelectual de minha vida, obrigada amigo!

Aos meus amigos Rafael, Lélia, André, Cleonice, por acompanharem desde as

primeiras idéias deste trabalho e por chegarmos juntos até aqui.

À Glória, por nossos desabafos, dilemas e conquistas sempre compartilhados, pelas

pesquisas juntas e pelas idéias que nasceram de nossas conversas.

Ao Bruno por ser um dos meus mais especiais amigos e por ter me ouvido, mesmo

que não quisesse, nos momentos de felicidade e angústia.

A todos da Igreja do Evangelho Quadrangular, em especial a Fabrício, Alessandro,

Klécio, Rafael e Janaína, por entenderem minha ausência e por torcerem pelo meu sucesso

profissional.

A todo pessoal da Biblioteca Benedito Leite, por prontamente atenderem a meus

pedidos e colaborarem com a pesquisa.

Mais uma vez obrigada, obrigada mesmo a todos que de alguma forma estiveram

relacionados com este trabalho.

E finalmente agradeço a Deus, pois sei que sem Ele nada poderia fazer, obrigada

Senhor!

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RESUMO

Este estudo pretende discutir o papel desempenhado pela educação na formação da mulher nos moldes tradicionais, em meio a uma sociedade que se pretendia moderna, sob os auspícios da nova ordem republicana. As funções sociais que recaíam sobre as mulheres primavam ainda pelo âmbito doméstico, tendo o tripé filha, esposa e mãe como base na formação e orientação nas atribuições femininas. Apresenta-se as mudanças urbanas, sociais e educacionais ocorridas em São Luís, e suas implicações na contribuição dos modelos femininos segundo os ideais burgueses de família e sociedade.

Palavras-Chave: Educação Feminina. Esposa. Mãe. São Luís.

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ABSTRACT

This study it intends to argue the role played for the education in the formation of the woman in the traditional molds, in way to a society that if intended modern, under of the new republican order. The social functions that fell again on the women still primavam for the domestic scope, having the tripod son, wife and mother as base in the formation and prompt in the feminine attributions. One presents urban, social and educational the changes occured in São Luís, and its implications in the contribution of according to bourgeois ideal the feminine models of family and society.

Keywords: Feminine education. Wife. Mother. São Luís.

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Balanço da despesa da Intendência Municipal no exercício de 1905....................41

Tabela 2 – Divisão por sexo nos cursos da Escola Normal Primária.......................................44

Tabela 3 – A matrícula nas escolas públicas municipais da capital em 1919..........................44

Tabela 4 – Distribuição salarial por sexo nas disciplinas da Escola Normal em 1906............49

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Ilustração 1 – Rua da Estrela...................................................................................................17

Ilustração 2 – A Moda.............................................................................................................31

Ilustração 3 – O Namoro de Ontem.........................................................................................36

Ilustração 4 – O Namoro de Hoje............................................................................................36

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.......................................................................................................................13

1.0 ESPAÇO URBANO E FAMÍLIA NA SÃO LUÍS REPUBLICANA...........................16

1.1 O padrão Rio de Janeiro: o molde europeu para o corpo brasileiro.....................17

1.2 A República é feminina: A família para o Estado....................................................27

2.0 INSTRUÇÃO FEMININA EM SÃO LUIS....................................................................38

2.1 A República da educação em São Luís......................................................................39 2.2 Ensino Religioso X Ensino Laico...............................................................................45 2.3 Educação Feminina.....................................................................................................47 2.4“Ensinando nossas filhas no caminho em que devem andar”..................................52

3 A BOA ESPOSA, MÃE DE FAMÍLIA E DONA DE CASA...........................................57

3.1 Perfis femininos: Entre o ideal e o real.....................................................................59 3.2 Ser mãe........................................................................................................................64 3.3 Ser esposa e dona de casa...........................................................................................67

CONCLUSÃO.........................................................................................................................74

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..................................................................................75

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INTRODUÇÃO

Esta pesquisa relaciona-se a temática de gênero, uma vez que esta categoria de

análise permite focalizar “as relações entre homens e mulheres, mas também as relações entre

homens e entre mulheres, analisando como, em diferentes momentos do passado, as tensões, os

acontecimentos foram produtores do gênero”. (PEDRO, 2005, p. 88). Pensar um estudo sobre a

educação feminina na perspectiva de gênero implica considerar o aspecto relacional presente na

educação de homens e mulheres, para que tipo de homem se destinavam aquelas mulheres

preparadas de acordo com determinados princípios, que imagens e representações de homens e

mulheres se deparavam os educadores, intelectuais, autoridades em geral a ponto de pensar em

projetos sociais e pedagógicos específicos para os diferentes sexos (LOPES, 1994, p. 28).

Os estudos relativos as “mulheres e famílias” procuram por meio da análise dos

papeis entendidos pela sociedade como femininos, verificar como em tais papeis estaria o reforço

à maternidade com a visão de que a mulher foi “feita para ser mãe e boa mãe” (BADINTER,

1985, p. 15).

Procura-se nesses estudos discutir também o reforço da religião e da ciência na rigida separação

dos papeis sociais, em que o homem é entendido com cabeça do lar. O enquadramento do sexo e

suas posições dentro do casamento e do lar configuram-se como mecanismos de controle social e

elaboração de imagens sobre o feminino e o masculino em suas respectivas esferas de atuação.

A ordem social funciona como uma imensa máquina simbólica que tende a ratificar a dominação masculina sobre a qual se alicerça: é a divisão social do trabalho, distribuição bastante restrita das atividades atribuídas a cada um dos dois sexos, de seu local, seu momento, seus instrumentos.(BOURDIEU, 2005, p. 18)

A historiografia brasileira recente tem se dedicado a temática de gênero a

desmistificado a passividade da mulher frente à opressão. A historiadora Rachel Soieht afirma

que a análise de gênero tem se estendido a arquivos privados por meio da vida doméstica como

cartas, diários íntimos, blocos de notas, jóias, bibelôs, missais e fotografias. Assim, “as

dificuldades de pensar no passado feminino têm levado os historiadores a lançarem mão da

criatividade, na busca de pistas que lhes permitam transpor o silêncio e a inviabilidade que

perdurou por tão longo tempo neste terreno”. (SOIHET, 1997, p. 296)

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O presente estudo pretende analisar que tipo de mulher a sociedade ludovicense do

inicio do século XX procurou reforçar por meio da educação. As mulheres analisadas neste

trabalho compunham o segmento social das camadas médias e altas, sendo os principais alvos dos

discursos sobre os modelos femininos, bem como sendo sua maior exposição no espaço público

para o exercício de profissões ou para a elevação de sua instrução, motivo de preocupação e

tentativas de controles mais efetivos. Ressalte-se ainda o maior registro documental para os

discursos direcionados a essa classe de mulheres.

Para desenvolvimento deste estudo tivemos como principal influência o projeto de

pesquisa de iniciação cientifica O dote é a educação: Instrução feminina e pobreza em São Luís

na Primeira República1 tendo por objetivo analisar a educação como simbólo moderno de dote

feminino o que nos possibilitou leituras a respeito do tema e contato com as fontes.

Para a realização deste estudo como documentação as fontes de imprensa, a literatura,

legislação e as falas, mensagens e relatórios oficiais das autoridades do executivo.

Jornais e revistas contribuíram para uma visão geral da educação, sendo importantes

as matérias destinadas às mulheres, com temáticas como: missão feminina, voto feminino,

instrução, etc.; poemas contendo o perfil ideal de mulher. Livros escritos no inicio do século XX

por educadores e jornalistas apresentaram dicas para a educação das mulheres.

Falas e mensagens de governadores ofereceram um panorama educacional de São

Luís, com dados estatísticos, metas e objetivos da educação. O diário oficial forneceu material

relacionado a valores, gastos com a educação pública, a média de aprovação e freqüência escolar

por sexo.

O Trabalho foi desenvolvido com a delimitação espacial de São Luís na Primeira República.

Neste momento histórico a cidade presenciava um crescimento populacional e de sua industria

têxtil, com o comércio e serviços. Os registros do período apresentam inúmeras discussões em

torno da melhoria da infra-estrutura, com debates sobre a questão do progresso, os atrativos do

meio urbano, lojas de luxo, teatro, cinema, e demais atividades da população ludovicense, em

especial sua elite.

O trabalho está dividido em três capítulos. No primeiro, faz-se uma abordagem sobre

a situação geral da sociedade ludovicense do início do século XX e dos novos urbanos. Destaca-

se o que era prioridade na cidade, como os espaços eram ocupados, qual a concepção de

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progresso e quais perspectivas no âmbito de família despontavam em meio a um ambiente

político e social.

No segundo capítulo analisou-se a situação da educação formal em São Luís em seu

sentido mais amplo. Apresentam-se as correntes educacionais, o grau de investimento na

educação pública e a ampliação da mesma destinada às mulheres, bem como as novas atribuições

e responsabilidades que recaíram sobre esta educação.

No terceiro capítulo analisam-se as atividades entendidas como estritamente

femininas. Baseado em livros, poemas e matérias de jornais que se dedicavam ao reforço do

papel da mulher enquanto filha, esposa e mãe e dona de casa, verificando-se como a figura da

mulher estava atrelada a atividades do âmbito privado, com a exigência de uma mulher recatada e

tendo em Maria sue exemplo maior. A vida da mulher deveria consistir em sua preparação na

infância, no papel de filha, ao aprendizado de sua missão maior na sociedade – o papel de mãe

obtido por meio do matrimônio, uma vez que a sexualidade feminina só era permitida dentro do

casamento e para a procriação.

A discussão que propomos envolve o maior contato das mulheres com a educação, no

início do século XX, sob a ordem republicana, mostrando como essa ampliação da escolaridade

feminina era entendida como um meio de prepará-la para o melhor exercício de suas funções

“naturais” como esposa e mãe.

Apesar da ênfase desse estudo recair sobre a educação como disciplinadora,

controladora, não desconsideramos sua atuação na transformação social e emancipação feminina,

perspectiva a ser abordada em futuros estudos.

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1.0 ESPAÇO URBANO E FAMÍLIA NA SÃO LUÍS REPUBLICANA.

A cidade de São Luís, no início da República, a exemplo de outras capitais, também

abraçou o projeto republicano de modernização, abrindo suas portas para novas concepções de

viver e de prazer que embalavam todo o país. Muitos de seus casarões neste momento estavam

sendo habitados efetivamente, por fazendeiros do interior do estado que deixavam o já não mais

lucrativo negócio do campo pela vida urbana que despontava com novas oportunidades de

investimento, especialmente no setor fabril. Por outro lado, muitos casarões, devido a falência de

seus proprietários se transformaram em habitações coletivas para famílias pobres, os chamados

cortiços.

A vida parecia mudar com ares de rapidez. A sensação era de que os espaços estavam

se tornando cada vez mais próximos com o desenvolvimento dos transportes (bondes) e

comunicação (telégrafo e telefone). O desenvolvimento tecnológico no Brasil, ainda nas últimas

décadas do século XIX mostrava como era possível observar entre as principais cidades do país,

que alguns problemas que antes tinham dificuldade para serem resolvidos, a partir de então o

seriam com facilidade e certa comodidade.

No Brasil, timidamente, as novidades do tempo estarão presentes desde a década de 1860. Antes mesmo de abolir a escravidão, que se tornara um obstáculo real para o progresso material e desmentia a reputação de progressista perseguida pelo Império e pelo segundo imperador, aqui chegaram alguns lampejos suntuários das conquistas modernas. A fotografia, o telefone, o telégrafo e o fonógrafo causaram espanto e maravilha. A rede de estradas de ferro estendeu-se, unindo aos portos de escoamento para o mercado externo. (NEVES, 2003, p.25).

Tamanha relação com o novo proporcionava resultados diversos em cada um dos

moradores da zona urbana. A fotografia levava as recordações de um passado e a valorização

excessiva dos momentos pessoais para pessoas de classe média alta, entra em destaque para essa

classe social, o retrato e o papel do fotógrafo itinerante, uma vez que:

Nas fotografias de família – fossem elas produzidas em estúdio ou não - o que interessava era a representações dos papéis sociais. É com eles que se cria uma identidade de grupo e se institui a memória de seus membros. (BORGES, 2003, p.54).

Era também um novo testemunho das modificações de São Luís, como mostra o

álbum de 1905 onde são registradas as imagens de ruas, armazéns e praças como a Praça João

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Lisboa e a Rua da Estrela, com seus transeuntes. Os novos meios de comunicação (jornais,

revistas e rádio) promoviam uma aceleração no tempo, com as informações circulando mais

rapidamente. E as redes de estradas de ferro, a REFESA em São Luís, dinamizavam a

comercialização de produtos e o transporte de pessoas.

ILUSTRAÇÃO 1 – RUA DA ESTRELA

Fonte: Revista Elegante de 31 de setembro de 1898

1.1 O padrão Rio de Janeiro: o molde europeu para o corpo brasileiro.

O século XIX concedeu a alavancada necessária para que importantes modificações

fossem estabelecidas no século XX. O capital que sustentou a iniciativa industrial foi

primeiramente aquele proveniente dos cafezais. A expansão do café e a construção de estradas de

ferro proporcionavam o escoamento de produtos pelos portos, contribuindo para o nascimento de

novos núcleos urbanos e desenvolvendo os já existentes. O caminho do café foi um fator crucial

para desenvolvimento de um comércio mais intenso, pois:

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A economia cafeeira estimulou ainda os setores comercial e bancário, bem como promoveu gradativamente a integração do mercado interno nacional. Esse desenvolvimento foi particularmente acelerado após 1888 graças a três fatores principais: com a abolição da escravidão o governo imperial liberou créditos para a lavoura e adotou uma política emissionista mais flexível que, ao lado da enorme safra cafeeira e da entrada de capitais estrangeiros, provocou uma euforia nos negócios. (ARIAS, 2003, p.209).

Sem a mão-de-obra escrava os donos de terra e “os grandes e pequenos empresários”

precisavam investir na mão-de-obra livre e necessariamente assalariada, ansiando por concessões

financeiras. O resultado não poderia ser outro: as ações na liberação de crédito tornaram-se

inevitáveis, política obviamente continuada pela República – sobretudo durante a política de

encilhamento de Rui Barbosa2. As idéias e os recursos eram mais direcionados para o café,

resultando, inclusive, na transferência de mão-de-obra estrangeira para compor o novo quadro de

trabalhadores para a agricultura cafeeira e para a indústria.

Em fins do século XIX, verificou-se a expansão de capital e sua contribuição para as

alterações urbanas ocorridas em todo Brasil. Contudo, foi efetivamente no início do século XX

que o país começou a ganhar conotações burguesas, a vivenciar os padrões de “civilidade” e

sociabilidade, refinando-se com base no “bom gosto” da burguesia européia.

A partir de algumas considerações e exemplos das alterações que causaram espanto e

melhoria de vida urbana do Brasil, analisaremos a cidade do Rio de Janeiro que é vista como

espaço importante desse novo cenário, “palco principal de todo processo radical de mudança, a

capital centralizou ainda os principais acontecimentos desde a desestabilização paulatina do

Império até a consolidação definitiva da ordem republicana” (SEVCENKO, 2003, p.117).

Estruturou-se também a presença de novos atores sociais que atrelados à dinâmica

das cidades apresentaram ao resto do país um ambiente diversificado com intelectuais, mulheres

ocupando vagas no mercado de trabalho e “empregados e operários [que] redesenham os pólos

da conflitividade social, e [...] encontram nas greves e nos sindicatos a forma de reivindicar seus

direitos” (NEVES, 2003, p.20).

A cidade do Rio de Janeiro ganhava conotações cada vez mais européias, e

especificamente baseada no modelo francês. Uma de suas conotações, a estruturação da paisagem

urbana, incluiu reformas radicais como o alargamento das ruas e calçadas, embelezamento das

2 A Política de Encilhamento foi desenvolvida nos primeiros anos da República e voltava-se para o desenvolvimento do mercado interno através da concessão de crédito para os novos empreendimentos. Envolvia, então, uma alta taxa de especulação. Ver SEVCENKO, Nicolau. Literatura como Missão – tensões sociais e criação cultural na Primeira República. São Paulo: Companhia das Letras, 2003.

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casas com belas fachadas em altos prédios e a tentativa de pôr fim aos cortiços – seriam algumas

de suas modificações. Este fato fez com que moradores da classe baixa que habitavam em

residências consideradas esteticamente feias e higienicamente ameaçadoras à saúde pública,

fossem os mais prejudicados, visto que tiveram que abandonar suas únicas moradias em prol da

modificação do meio urbano e do discurso de melhoria incompreendido por aqueles que estavam

sendo remanejados.

O projeto de tornar a capital federal em uma “Paris” brasileira foi tão empolgante

para a elite nacional que muitas cidades também propuseram reformas em suas estruturas urbanas

– e São Luis foi uma delas. É bem evidente que tais mudanças não ocorreram apenas em busca do

ideal estético francês, fizeram-se também por todo um contexto de higienização das cidades.

Novamente, a capital federal direciona a ação evidenciada na expropriação da população carente,

remoção e demolição das casas, no afrancesamento dos costumes, da arquitetura e urbanização e

na padronização das lojas. Ou seja, reconstruía-se a arquitetura e proibiam-se hábitos

“grosseiros” no contexto de modernização do país.

O objetivo republicano de “Ordem e Progresso” deveria ser almejado e alcançado a

partir do bem estar da elite das cidades, fato este que contribuiu para alteração do cenário urbano

das mesmas e que se alastrou por todo território brasileiro, incluindo São Luís. Como o Rio de

Janeiro era a capital federal, tornava-se a vitrine do Brasil, devendo primar pela melhoria estética.

A elite governante do país entendia a necessidade da criação e melhoria dos portos, do

saneamento básico e da reforma urbana. Esse processo de modernização ocorrido no Rio de

Janeiro, tendo como carro-chefe a demolição dos cortiços, o chamado “bota-abaixo”, associado

ao controle epidêmico obrigando a vacinação da população, levou à maior revolta urbana da

Primeira República na capital federal, a revolta da Vacina Obrigatória3.

Além das obras de demolição e reconstrução sem precedentes na história dessa e de outras cidades brasileiras, um cipoal de leis e posturas procurou coibir ou disciplinar esferas da existência social refratárias à ação do Estado. A reforma urbana foi na realidade, o somatório não previsto das ações de força, humanas e não humanas. (BENCHIMOL, 2003, p.234).

3 A ‘revolta’ citada acima consistiu em adaptações que a saúde pública sofreu a partir do surto de doenças como a peste bubônica e varíola e refletiu-se na preocupação com o bem estar da cidade, partindo de trabalhos com limpeza e dedetização de grandes áreas, isolamento de doentes e a obrigatoriedade gradativa da vacina, fato este que gerou um grande clima de insatisfação entre a população carente de modo geral.

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As atitudes, portanto, não limitaram-se a um corpo de mudanças arquitetônicas, mas

avançaram, também, para um conjunto de modificações sistemáticas operadas no plano das

condutas, das leis, focadas para o plano da normatização e padronização das posturas. Assim, o

objetivo em assegurar o plano estético que lentamente se formava em prol de um processo

civilizador, buscando adequar os moldes das cidades em desenvolvimento ao molde estipulado

pela Capital Federal.

São Luís também adentrou na “política de higienização e padronização dos espaços

públicos” (BARROS, 2001, p.13). O aspecto de alteração da cidade se deu fortemente pela

influência de todo o contexto republicano e também pelas características peculiares do Maranhão,

dentre as quais se destacava a crise do sistema agroexpotador. Estes motivos, em fins do século

XIX, proporcionaram um movimento maior de pessoas direcionadas à cidade, uma gama de

novos investimentos na capital, resultando na modificação dos padrões mínimos de civilidade a

que estava submetida, tal como outras cidades do Brasil. Por todo o país existiam, nas principais

cidades, empréstimos públicos e investimentos diretos responsáveis por impulsionar “a

modernização de economias periféricas como a brasileira na segunda metade do século XIX,

aparelhando-as para responderem aos novos fluxos de matérias primas e produtos

industrializados” (BENCHIMOL, 2003, p.235).

Apesar dos avanços obtidos por São Luís na metade do século XIX, no começo da

República a cidade ainda possuía sintomas de uma certa “letargia”. Indícios de uma característica

provinciana que precisava ser superada em prol da modernidade e do modelo determinado pelo

Rio de Janeiro.

Os jornais do momento registraram muitas das insatisfações com a falta de condições

da cidade, tentando expor uma cidade “real” diante da cidade idealizada para as convenções. Os

jornais apresentavam opiniões sobre o estado da cidade, ora elogiando os avanços, ora criticando

os atrasos, a exemplo do jornal A Campanha, que fez uma comparação de São Luís com as

capitais do norte e nordeste4, e diz que estas cidades melhoraram suas condições em algum nível

de suas estruturas, enquanto São Luís permanecia com os mesmos problemas havia décadas.

4 Sobre a discussão do termo nordeste ver ALBUQUERQUE JUNIOR, 2001, visto que tal diferenciação data do início do século XX até então toda região era conhecida por norte.

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Todas as capitais do norte do país, desde S. Salvador até Manaus, se não tem muito prosperado, ao menos melhoraram consideravelmente de condições; só a nossa pobre S.Luís se conserva no mesmo estado em que estivera há trinta anos atrás: sempre este mesmo aspecto sombrio, sempre esta mesma construção sem arte, sempre estas mesmas ruas tortuosas, estreitas e mal calçadas. Invariavelmente em extremo, tem sido sempre um ninho abandonado nos ermos, que os pássaros deixaram à beira do caminho... O viajante, após a longa ausência de vinte anos, regressa a esta cidade, encontra tudo que deixou, e nada vê de novo. (A CAMPANHA, 13 de abr. de 1903, nº. 71, ano II)

Denunciar as mazelas da cidade que se pretendia bela e moderna, representava uma

forma de mostrar e levar para o debate as questões que ainda impediam São Luís de se tornar

uma cidade bem vista em nível nacional. A discussão sobre a iluminação pública acentua que o

governo nutria uma maior preocupação com o bem estar das elites, uma vez que a população

pobre, que era a mais atingida, pagava os impostos como iluminação pública e não era atendida

satisfatoriamente. As reclamações se davam em torno da falta de compromisso do governo e dos

abusos da Companhia de Gás.

Sobejamente, temos falado a respeito de tão interessante assunto. Contudo, nossos esforços têm sido baldados por que até agora não temos um serviço bem organizado de iluminação pública. É uma irregularidade cuja culpa cai totalmente sobre o governo que não sabe impor ao gerente da Companhia de Gás, a obrigação que ele tem de mandar fazer luz em toda cidade sem se aproveitar das sombras da lua. [...] O povo que além de pagar sua iluminação particular, tem de sustentar ainda a pública, que não faz bem, por que o governo não paga. [...] Havendo dinheiro para essas despesas e para fazer avenidas e jardins, as coisas são maravilhosamente. O resto que fique a ver navios, e sempre a olhar o mangue. O Estado, desse modo, a mais e mais se desacredita. (A CAMPANHA, 10/06/1903, nº. 121, ano II)

A iluminação a gás era vista como um atraso para a cidade, pois “logo que se

apagava a claridade do dia, ainda era a gás, com lampiões de ferro no canto das ruas, e em cuja

guarnição de vidro chiava uma chama muito viva, de cheiro de acre e de brilho azulado”.

(MONTELLO, 1983, p.22). Além do cheiro vivido de acre proporcionado pela pequena chama a

queimar nos altos postes da cidade, havia, ainda, o problema corriqueiro da vida curta desta

chama, apagada, ocasionalmente, por alguma lufada de vento forte ou pelo consumo e completo

do seu combustível. Desta forma, por vezes a fio, a cidade era levada pela completa escuridão ou

a uma penumbra leve permitida pelo luar da noite – de certa forma, neste momento, “cidade luz”

não seria uma de suas melhores designações.

A implantação da energia elétrica em 29 de setembro de 1918 mudaria um pouco

desse cenário. A expectativa não era apenas para a iluminação pública e doméstica, mas também

para a tração animal e força da viação urbana e, sobretudo, para o setor industrial impulsionando

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a modernização das máquinas para prensar o algodão. Contudo, tal esperança foi frustrada pois a

empresa licitada sofreu sérios problemas financeiros e abandonou a aplicação do serviço em São

Luís. “Enquanto isso, a iluminação da cidade, ao lado dos demais serviços de infra-estrutura

urbana, eram os piores possíveis. O serviço de bondes era alvo de piadas, pois continuava a

tração animal e, portanto, completamente obsoleto” (PALHANO, 1988, p.295). A iluminação

elétrica só foi efetivamente concretizada em São Luís no ano de 1923 com um contrato realizado

entre o governo do estado e a empresa inglesa Ulen.5

A idéia de progresso incluía não apenas a modernidade dos serviços públicos, como a

iluminação elétrica e bondes elétricos, mas também a expansão da cidade para novas áreas. Como

a do São Francisco, antiga vila de pescadores situada à margem direita do Rio Anil. O projeto de

construção da ponte data do início do século XX, no entanto, sua concretização só ocorreu em

1970.

A vila de São Francisco podia também representar oportunidade de alargamento da

cidade, pois São Luís:

Possuía, desde a sua fundação, uma ocupação urbana caótica. Nunca ocorrera um planejamento que orientasse a sua expansão. Dessa forma, o crescimento de São Luis sempre foi lento e com uma forte tendência a desenvolver-se de acordo com a sua topografia [...], seguindo o divisor de águas dos rios Anil e Bacanga. (BARROS, 2001, p.58)

Josué Montello, em seu romance Pedra Viva, apresenta através de um de seus

personagens essa visão de implementar o avanço de São Luis por intermédio da ponte ligando o

São Francisco. Em um certo diálogo acerca da necessidade de estabelecer o progresso,

Marcelino, um dos personagens do romance, ressalta que:

Não podemos cruzar os braços ao progresso! O progresso é o progresso! Está no lema de nossa bandeira: ordem e progresso! Precisamos progredir. E a ponte sobre o Anil é o progresso! A cidade necessita expandir-se! E há de expandir-se para o outro lado do rio, que fica ali, ali. (MONTELLO, 1983, p.23).

A idéia de uma ponte de concreto, cruzando a imensa passagem do Rio Anil, ligando

duas partes extremamente diversas, simbolizava a necessidade de progredir, como uma

necessidade inclusive da nação, quando se refere ao lema da bandeira republicana..

5 Sobre o processo de implementação de serviços de infraestrutura em São Luís ver PALHANO.

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Este progresso costumeiramente associado a dois momentos, opondo dois sentidos

contrários: era barbárie e civilização, tendo o último como o ideal e o modelo e seu oposto tido

como o obscuro e ofensivo:

[...] o tempo é visto como um continuum entre dois pólos que especificam seu ponto de partida e seu tê-los, situado no pólo que assinala a sempre renovada conquista do progresso e da civilização, marcado com um sinal de positivamente e oposto ao pólo do atraso e da barbárie, negativo. (NEVES, 2003, p.23)

O progresso era a busca do momento. Como alguns de seus elementos frisantes estão

as fábricas que surgiam no plano econômico do Maranhão.

São Luís ainda vivia a fase alvissareira do repentino surto industrial que fez erguer em diversos pontos da cidade as compridas chaminés de várias fábricas, com as quais a província pensou acudir à transformação do braço escravo em braço livre, ao fim da campanha da abolição do cativeiro.

As fábricas, um sinal de modificação do quadro urbano ajudaram a alterar a visão da

cidade, foram construídas ao seu redor muitas casas de operários, que necessitavam chegar cedo

às fábricas e saíam de lá geralmente ao anoitecer pois, “as condições objetivas de produção da

seção de fiação e a necessidade de maior volume de fios para a tecelagem, o trabalho durante o

intervalo do almoço e, após às 16:30 horas fazia parte da rotina diária obrigatória”

(MELO,1990,p.68).

Tais fábricas foram instaladas longe dos centros povoados pela elite, mesmo por que

ao redor dessas fábricas se formaria um contingente populacional grande, dando origem a bairros

operários como de fato aconteceu. Pessoas de vários pontos do interior se refugiaram na capital

em busca de novas oportunidades, até mesmo atraídas pelo fascínio urbano e em virtude de sua

baixa qualificação muitos acabaram por se refugiar no serviço das fábricas e a fixar moradia

próximo destas. Apesar disso, somente uma pequena parcela destas pessoas conseguiu emprego,

tornando-se a outra parte uma significativa parcela de indigentes, vivendo de pequenos ofícios e

serviços.

Viviam em uma série de subúrbios, espaços de pessoas pobres e com residências mal

construídas em péssimo estado de conservação, tornando-se esteticamente feias. Assim, a

implementação da indústria têxtil promoveu o alargamento dos núcleos de moradia e alterou a

dinâmica da cidade, como nos mostra a pesquisa de Barros sobre análise das imagens do

moderno em São Luis:

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Próximo ao centro de São Luis encontramos ruínas de fábricas, testemunhas do seu primeiro surto de industrialização. Assim, retomamos aos fins do séc. XIX, quando o algodão era o principal produto econômico da Maranhão. Enquanto os filhos das famílias mais abastadas tentavam inutilmente reproduzir hábitos europeus, após terem passado longas temporadas na Europa, os industriais locais compravam da Inglaterra maquinários fabris obsoletos. Paralelo a isso, os operários, em sua maioria ex-escravos ou descendentes destes, começavam a se aglomerar próximo às fábricas, formando os primeiros subúrbios: Madre Deus, Camboa, Anil. (BARROS, 2001, p.12).

Desenvolveu-se toda uma alteração e preocupação com a paisagística da cidade.

Desde o final do século XIX que se observa essa preocupação com o disciplinamento do espaço

urbano, a exemplo do Código de Posturas de 18666 que apresenta algumas normas e regras para a

construção de moradias na cidade, sendo que a questão estética se dava muito em parte pela

preocupação com a presença de seus visitantes. Era necessário apresentar uma cidade com altos

índices de civilidade, chegando até mesmo a proibir a construção de casas com teto de palha, pois

estas entrariam em contraste com a beleza dos casarões, e isso não seria bem recebido pelos

estrangeiros que por aqui passassem.

Os baixos de sobrados eram uma preocupação constante das autoridades, existiam até

regras para que se pudesse morar ali, e caso as regras fossem infringidas os moradores seriam

proibidos de habitar nos mesmos. O discurso era de busca da “sociabilidade sanitária”, uma vez

que esta não deveria ser alcançada por meio da “desobediência civil” (CORREIA, 2006, p.65).

Então, um dos outros problemas que passou a ser discutido pelas autoridades foi o advento de

doenças, que se desenvolviam bem mais nos lares pobres e nas ruas, até mesmo pelo

aparecimento de muitos ratos causando fedor e mal estar entre os moradores da ilha. Seria assim

o contraste entre a cidade ideal e a real.

Os questionamentos eram inúmeros, a população se queixava dos leprosos sempre a

mendigar, e que depois iriam para reclusão sem nenhuma expectativa de melhoria na qualidade

de vida, eram simplesmente retirados pela sociedade. Muitas são as insatisfações com a situação

da cidade e questões higiênicas tão cobradas das donas de casa, não se aplicam às ruas.

Lavagem de latrina ou de chiqueiro de porco, é a água que corre constantemente pela rua Formosa, saída do cano de um cortiço e de outras casas que há na rua da Saúde, de propriedade de um tal Ramos padeiro e outros. Os infelizes moradores desse pedaço de rua não podem mais suportar o fétido dessa água imunda e pesulenta (sic) a que estão condenados e já cansados de pedir providencias. (A CAMPANHA, 11 de ago. de 1903, nº. 172, ano II)

6 Note que ainda se trata da segunda metade do século XIX e a preocupação de regulamentar os hábitos da cidade já são presentes como parte de um processo de transformação significativo gerando resultados como o fim do Império e o começo da República.

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A miséria e falta de higiene das classes populares não era efetivamente a preocupação

do Estado. A estética nos esquemas de embelezamento desenvolvido com base na modernidade

era o objetivo final ao qual a elite ansiava por alcançar. O embelezamento da cidade, mesmo que

através da exclusão das classes menos abastadas era seu objetivo.

Muitas ruas eram preenchidas por uma água suja e fétida composta pelos

excrementos saídos das lavagens de latrinas ou dos chiqueiros de porcos essenciais para a

subsistência de vários núcleos familiares, afinal do porco poderia sair o alimento, com sua carne,

e a fertilização para alguma pequena horta. O desleixo da administração política era salientado,

pois as autoridades estavam mais preocupadas em cuidar de uma estética excludente da cidade

não atendem ao chamado dessas pessoas “já cansadas de pedir providências”.

Raimundo Palhano destaca que:

Ao longo de quase toda a década de 20, a maioria dos cerca de 60.000 habitantes de São Luís viviam uma situação de decadência urbana e, por isso mesmo, continuavam prisioneiros dos velhos problemas, como a contaminação da água, a poluição dos mananciais, o precário saneamento, a falta de luz, e sujeitos a doenças terríveis, como o tifo e a febre amarela. (PALHANO, 1988, p.154)

Podemos analisar este fato como uma forma de disfarçar as desigualdades e mazelas

de São Luís e também uma maneira de disciplinar a cidade que estava em pleno crescimento

populacional, e este de certa forma assustava as elites. Afinal, se dirigiam para a capital várias

pessoas em busca de melhores condições uma vez que o campo não oferecia maiores

oportunidades de mudanças e melhorias na condição de vida dos seus moradores, então um

elemento regulador para o grande e incômodo volume de pessoas.

O crescimento econômico e demográfico da cidade exigia do poder público medidas para disciplinar o espaço urbano, gerando condições para o bem-estar dos seus habitantes, especialmente das elites. Pelos códigos de postura do século XIX é possível acompanhar essa preocupação, sendo constante os cuidados com a regularização do traçado das ruas, das construções públicas e particulares, melhoria dos prédios públicos, a limpeza e saneamento da cidade, o comportamento dos moradores, especialmente os escravos que circulavam pelas ruas da cidade nas suas lidas diárias. (MORENO, 2005, p.15)

Além de uma preocupação geral com as mudanças de infraestrutura existentes em

todo o país, era também a representação de uma solução encontrada pela elite para que esta

estivesse em contato somente com áreas limpas, arejadas, etc. Orientava-se que até as ruas

fossem padronizadas, como ditava o Código de 1866, com fortes referências no início do século

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XX, determinando as larguras e espaços entre as casas que deveriam ser sempre retas,

uniformizando a paisagem para torná-la bem apreciável e própria para o prazer, como afirma

Glória Correia (2006, p.29), devemos “entender a cidade como ponto de intercessão entre a

idealidade e a concretude; como lócus privilegiado de relações sociais, as mudanças na

economia que constituía um dos seus fundamentos, não poderiam deixar de se exprimir na

ocupação do espaço”

A cidade era o local de diferenciação social, em seus espaços tais diferenças faziam-

se, e fazem até hoje, latentes. Primar pela qualidade do aspecto físico da cidade era tirar de vista

aquilo que incomodava a alta sociedade, ou seja, sua pobreza e falta de controle populacional.

Era permitir que se fugisse da realidade em algumas localidades da cidade, até porque o novo

cidadão urbano e republicano valorizava a ordem como elemento para o progresso.

Com uma maior quantidade de volume dos investimentos direcionados à

infraestrutura do meio urbano, o objetivo era que finalmente a cidade pudesse se encontrar

preparada para receber a diversificação do capital mercantil no setor de serviços e investimentos

e em atividades comerciais de exportação e importação, tendo neste período a modernização da

cidade com destaque para qualidade de vida do citadino e ampliação de negócios. (REIS, 1992).

A dinâmica de São Luís foi alterada, não apenas pelo viés do ambiente físico, mas

também pela transformação da família e de seu comportamento. Em geral, as referidas

transformações se relacionavam às mudanças implantadas com o advento da industrialização,

situação que resultou em novos hábitos e estilo de vida, ampliação da concepção de lazer e de

desfrutar dos benefícios alcançados pelo “progresso” avassalador que empolgava toda a cidade.

Essas mudanças eram incitadas pelos jornais ludovicenses que ovacionavam o novo momento.

É bem evidente que essas transformações se restringiam a uma pequena parcela da

população, à elite, ficando bem clara a distinção das duas cidades neste momento, uma inserida

totalmente nesses projetos e outra absolutamente à margem dos mesmos, a exemplo da classe

operária que mantinha situação dramática de sobrevivência nos bairros industriais como Madre

Deus e Camboa.

As mudanças operadas nesse momento incluíam a grande difusão de peças teatrais e

do cinema na cidade. Muitas foram as apresentações de peças e exibições de filmes pelo chamado

cinema ambulante7 no Teatro São Luís ou em espaço próximos, e estas contribuíram fortemente

7 Ver MATOS, que trata da experiência cinematográfica em São Luís no início do século XX.

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para difusão do modo de vida estabelecido na capital, e até mesmo pela difusão da cultura de

países europeus. Como mostram os jornais da época, vinham a São Luís vários atores e atrizes,

símbolos da modernidade, também cantores e cantoras, eram exibidos filmes acerca da

experiência de outras localidades e mais do que idealizar os romances apresentados nesses filmes,

a sociedade idealizava todo seu modo de vida, seus hábitos e seu cotidiano entendido como

“moderno”.

1.2 A República é feminina: a família para o Estado.

A república foi vista como o momento de “liberdade” política. Conforme o Jornal

Primavera de 14 de novembro de 1909, ao fazer uma análise do 15 de novembro de 1889

considerou o período desde a Proclamação da República como sendo “Vinte anos de liberdade,

vinte anos de Independência. 15 de novembro de 1889 é a verdadeira data da nossa

Independência absoluta. D.Pedro I proclamando a separação do Brasil de Portugal mudou, tão

somente; melhorou, talvez, a face do julgo que sofríamos”. Via o regime republicano como um

fator positivo para a história de um país que assumia a conotação de futuro e agora, após

finalmente estar “liberto” poderia exibir o lema positivista em seu símbolo pátrio maior: a

bandeira – “ordem e progresso”.

O positivismo significava uma profunda organização da sociedade para seu

desenvolvimento. Para tanto, acreditava-se num núcleo básico de organizaçãopara alcançar esse

fim: a família.

O programa político republicano, dada a influência da doutrina positivista, concentrou suas atenções no binômio família/cidade, base da proposta de estruturação do estado nacional onde o conceito de pátria se baseava na família, sendo a cidade vista como o prolongamento desta. (ARAÚJO,1993,p.30)

A boa organização da família resultava na boa organização da pátria. Um núcleo

organizado e distribuído com as funções de cada membro bem definido era a representação de

uma pretensa eficácia. A mulher cuidaria do “lar” em todo o seu potencial e o homem trabalharia

para o sustento deste lar, enquanto seus filhos seguiriam seus exemplos com atenção para suas

futuras funções. Assim sendo, a cidade poderia também seguir uma organização melhor,

ocasionando, uma melhoria na sua estrutura e funcionamento.

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Esta nova família então, “atravessou a fronteira do espaço privado da casa para o

espaço público da rua” (ARAÚJO, 1993, p.25). A diversão, o lazer, o prazer de freqüentar

praças, os teatros, cinemas e bailes amplificaram a vida noturna nesta sociedade, os espaços de

sociabilidade estavam para além das missas e procissões, somente desenvolvido aos domingos. O

publico alvo, era a elite que estava bem mais propícia a pagar por tais serviços oferecidos e

possuía meios para inserir-se na lógica do prazer.

A base principal da sociedade, é a família, a família é o laço que une os povos entre si no mais estreito congraçamento. É ela o fundamento da civilização e sem ela estaríamos todos a porta de um abismo. A mulher na família representa o elemento mais sólido e afogado; já como mãe carinhosa e já como esposa idolatrada. O homem na família é um lidador incansável; mas a mulher que é mãe, não há a excedê-la nessa humilde comunhão; se chora do nobre exemplo de ter com suas lágrimas constantes, remediado os seus males, assim como também o de ter ensinado a seus queridos filhos a serem sempre resignados. Se vemo-la contente a sobranceira, é por que tem ela consciência de haver praticado o bem, de ter cumprido fielmente seu dever, que é na família o mais santo e sublime. Conseguintemente, sem a família não poderia absolutamente existir sociedade. (JORNAL O JUVENIL, 24 de fev. de 1899)

“Base da sociedade” e “fundamento da civilização” são atributos consagrados à

família. À mulher recai o papel de “mãe carinhosa” e “esposa idolatrada”, ao homem o de

“lidador incansável” e “provedor”. A responsabilidade feminina tornava-se tão relevante dentro

do lar que lhe daria o direito de envaidecer-se, pois sem a família a sociedade não existiria, numa

espécie de compensação para a mulher, mostrando que somente no lar poderia ser superior ao

homem.

A família, no início do século XX, continua sendo entendida como fundamento da

sociedade, porém somente se estiver bem estruturada nas possibilidades de progresso para a

nação. Assim como a família, a mulher estava também enquadrada na concepção de progresso da

nação.

Amor, ordem e progresso; culto, dogma e regime; poesia, filosofia e política; a tríplice progressão, moral, intitula e prática, inerente à nossa tríplice natureza: tudo nela como que se requinta a primor. É que o amor, do que ela é a milagrosa padroeira, procura a ordem, de que ela é a suave mantenedora, consolida o amor e dirige o progresso, e o progresso, de que ela é a perfumosa essência, desenvolve a ordem e conduz ao amor. (SERRA, 1867, p.128).

O papel de influência feminina na sociedade sa daria por meio da família, uma vez

que se implantaria a ordem, o progresso e um sentimento considerado típico do mundo feminino -

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o amor. Seus principais atributos deveriam ser expressos na condição de esposa e mãe, que não

existiria sem a configuração da família. A família seria a base de sustentação da mulher ideal.

No entanto, no seio da família o poder de fato continuava a ser exercido pelo pai.

Michelle Perrot (1988, p.180) em seu estudo sobre a França, aponta que “a penetração da ordem

republicana nas aldeias veio acompanhada por um reforço do poder do pai, único cidadão

integral, sobre a mulher e os filhos”.

Para Antônio Manuel Hespanha, a família moderna baseia-se em uma relação igual e

desigual. Igual, em virtude do acordo mútuo realizado entre os cônjuges, da promessa acordada

diante do altar. Desigual, por que ao se unirem a hierarquia do relacionamento se faz presente e

as desigualdades naturais dos sexos também . “Na verdade, eles constituíam uma só carne; mas

nesta reintegração num corpo novamente único a mulher parece que tendia a retomar a posição

de costela do corpo de Adão”. (HESPANHA, 1993, p.963). Sob esta concepção formula-se a

idéia que põe o homem como o cabeça da família, e à mulher cabia apenas a função de

auxiliadora. Estaria ao lado, tal qual a costela.

Para muitos, a sociedade moderna trazia a ameaça ao casamento e principalmente à

família, ameaça que poderia inclusive se concretizar com o divórcio8. Os discursos dos jornais

ludovicenses estabeleciam a questão cristã para abominar o fim de algo que perante Deus se

pretendia indissolúvel. “Nós ainda somos cristãos e sem os mais veementes protestos não

passará esta lei iníqua e desmoralizadora. O divórcio é a negação da família e conseguintemente

da sociedade. O divórcio repugna ao direito natural”. (JORNAL A REGENERAÇÃO,

03.10.1898)

As cidades brasileiras esforçavam-se fundamentalmente para serem comparadas com

as principais capitais da Europa, exigindo dos segmentos sociais mais abastados um estilo de vida

digno de imenso prestígio. Então, não bastava apenas que São Luís obtivesse belos prédios

erguidos e prósperas fábricas a funcionar ou mesmo ruas milimetricamente calçadas. Seria

importante também refinar hábitos, costumes, seguir o bem estabelecido padrão burguês.

Partindo desse princípio, podemos associar a elite urbana e suas práticas, no início do século XX,

como participantes da dinâmica sofrida pela cidade no momento da implantação da República,

que vem a calhar com a inserção dos paradigmas da modernidade por meio dos elementos

adquiridos nos núcleos urbanos. Partindo da importância da cidade na formação do novo cidadão

8 A legalização do divórcio se deu somente em 16 de dezembro de 1977, lei nº 6515.

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foi elaborada uma série de serviços agora cada vez mais úteis à população elitizada com o intuito

de inserir São Luís neste padrão, e isto se desenvolveu a partir das instituições e serviços

prestados à população.

A cidade contava com uma Biblioteca Pública, com a Academia Maranhense de

Letras(1908), várias livrarias, gráficas, o Teatro São Luís, vários jornais, bancos, hotéis,

drogarias, joalherias, lojas de luxo, cabeleireiros, companhias prestadoras de serviços urbanos,

algumas fábricas de sabão, pilar arroz, azeite etc, e um Liceu para o ensino público secundário

dos meninos.

A implementação desses serviços já vinha sendo feita desde a segunda metade do

século XIX e é um indício de que desde o fim deste século, já havia na capital a implantação de

alguns dos mecanismos que ofereceram ao morador urbano da elite um bem estar, ensino e lazer

nos moldes da concepção burguesa de vida.

A mulher de elite vivenciou experiências desse novo mundo, e esteve incluída

também na concepção de prazer e felicidade, mesmo que de forma mais silenciosa que os

homens. Uma das vertentes que se manifestou por meio desse espaço público amplificado foi o

maior contato da mulher com acontecimentos fora do lar, a exemplo do teatro, avenidas e praças.

A “rainha do lar” anunciava sua majestade de forma cada vez mais freqüente, contudo, sua

“soberania” ainda estava profundamente enraizada apenas no lar. Outro importante exemplo de

que as mulheres estavam para além do ambiente doméstico, se refere a concursos de beleza

organizados por jornais, ou mesmo a exposição da beleza feminina através da pormenorização

da beleza em colunas intituladas de “Perfis Femininos”.

A educação adentrou também no contexto de modernização. Desde o fim do século

XIX foram estabelecidas várias alternativas, com iniciativa de entidades religiosas e

filantrópicas, para que filhos e filhas de pessoas de classe baixa pudessem estudar. Exemplos

desta iniciativa eram as Caixas Escolares9 que destinavam-se a doar roupas, calçados e material

escolar para crianças de escolas públicas.

O objetivo de inclusão das massas no processo educacional por meio da ampliação

das instituições de ensino se estendeu pelo século XX. Dentre as prioridades observadas em

discursos, falas e mensagens de governadores e autoridades que assumiam o governo, estava um

investimento na educação pública tanto na capital como no interior. Alguns homens e mulheres

9 Depósito de uma quantia mensal destinada a algumas crianças carentes.

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tiveram a oportunidade estudar um pouco mais que seus pais, fato este ocorrido inicialmente

com poucas famílias, mas suficiente para insuflar os discursos políticos.

Os filhos da elite completavam seus estudos de ensino superior em instituições de

estados da região sudeste do Brasil ou mesmo no próximo centro de Pernambuco. Juntamente

com a bagagem da instrução formal trazida por esses jovens, havia também outras formas

elementares para a educação como os usos e costumes que lhes eram impostos ao chegarem

nesses novos ambientes, bem como a maneira de se portar diante do meio público, de conversar e

regras de etiqueta usuais, além da moda ditada por revistas e jornais da capital.

Alguns desses jornais eram responsáveis por massificar as informações da moda

européia em São Luís, especialmente a moda pariense, e apresentavam em quase todos os

números figurinos da tendência que deveria ser seguida pela elite ludovicense, contribuindo para

manter um enorme grau de diferenciação da maioria dos moradores da cidade. O periódico “O

Jornal” foi um dos que contribuiu para deixar a elite maranhense em dia com a moda européia,

fato este comprovado por sua coluna intitulada “A Moda”. Esta coluna era responsável por trazer

sempre imagens de mulheres totalmente enquadradas no padrão estético europeu.

ILUSTRAÇÃO 2 – A MODA

Fonte: O Jornal – 15 de fev de 1923

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Não se tratava apenas de apresentar uma vestimenta, o espaço destinado pelos jornais

era aproveitado para esclarecer modos de comportamento ideais para o modelo de beleza e

refinamento. Havia forte influência também do padrão de beleza importado dos Estados Unidos

da América, principalmente por intermédio do cinema e de suas musas, alguns jornais traçaram

até um modelo de vida por intermédio das atrizes norte-americanas, as entrevistas mostravam

qual o ideal de vida dessas mulheres, o que acabava sobremaneira influenciando a vida de

algumas mulheres de classe alta do Brasil. A alta sociedade deveria estar à altura das convenções

estabelecidas, para tanto, os jornais funcionaram como instrumento pedagógico de refinamento

social, excluindo do convívio social da elite todo aquele que não estivesse enquadrado nos ditos

padrões.

Outro fator modelador do arquétipo do moderno em São Luis se refere à mobília e

arquitetura das residências. Mais uma vez a ação dos jornais é fundamental, neste caso, uma

revista que contribuiu para tal finalidade foi a “Revista Elegante” (1898/1905) apresentando uma

série de imagens de móveis à moda européia. O discurso que enquadram tais mobílias, tinha a

preocupação de levar à burguesia o que havia de mais refinado nos ditos principais pontos da

civilização.

A cidade seria o espaço entre o real e o idealizado. Era necessário apresentar aos

estrangeiros e visitantes uma São Luís repleta de prestígio, para tal nada melhor que modelar a

cidade maquiando sua pobreza, suas mazelas e suas doenças.

Notadamente dentre os diferenciais de poder dentro da cidade, a moradia ganhou

conotação especial. É então que diante dos finos casarões construídos, a elite tenta mais uma vez,

utilizando os Códigos de Postura, disfarçar e afastar a pobreza dos cortiços, insistentes e

competentes em desmoronar a cidade civilizada e idealizada pela elite do início da República

através da falta de finesse de suas construções. Entretanto, a elite não abandonaria tão fácil seu

projeto, mesmo tendo de levar a demolição de várias habitações populares. É evidente que essa

questão é sanitária, política, estética e social. Como nos mostra o trabalho de Maria da Glória

Correia:

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De acordo com o artigo 83º do Código de Posturas Municipais promulgado em 1893, ficava proibido o estabelecimento de cortiços no perímetro urbano, sendo multado quem infringisse essa postura. Ainda seria obrigado a demolir a construção. Por outro lado, os cortiços existentes que não oferecessem as mínimas condições de higiene seriam fechados [...] Quanto aos “baixos de sobrados”, determinava que aqueles que não tivessem abertura nas paredes para renovação do ar estavam proibidos para moradia, de acordo com o artigo 86º. (CORREIA, 2006, p. 47)

À primeira vista, parece uma interessante proposta de higienização dos lares carentes

de São Luís, no entanto, o governo simplesmente não propunha nenhuma solução para o

problema estabelecido, a não ser a imediata demolição dos cortiços não enquadrados nos

requisitos sanitários e estéticos. Afinal, o código parecia se justapor contra todo um conjunto de

pessoas menos favorecidas socialmente. A maior parte dos baixos sobrados não possuíam formas

de ventilação adequada. Sobre os cortiços, a problemática era interpretar de forma adequada as

“mínimas condições de higiene” capazes de resultar na demolição ou não da moradia. Sem

qualquer resolução para o problema, a questão configurava-se de forma menos sanitária e mais

estética.

Estabeleceu-se ainda a implantação do discurso médico nos lares, e as mulheres

seriam as responsáveis por implementar essa política. O papel social da mãe e esposa estaria

sendo alargado (ainda que permanecendo dentro do lar) para estabelecer a higiene necessária para

as moradias. Mais uma vez os jornais da época trazem uma configuração bem clara da

responsabilidade do papel da mulher.

As mulheres de classe baixa eram constantemente atacadas pelos jornais,

consideradas as maiores culpadas pelas péssimas condições de higiene e alimentação em seus

lares.

A errônea educação das mulheres, que se nota também já nas classes médias, irradia enfim até para as classes pobres e laboriosas, e estas já desconhecem os rudimentos do arranjo da casa. Tenho mostrado em casa de operários e de pessoas, não digo miseráveis, porém pobres; nelas encontrei alguma coisa que me impressionou mais do que a própria miséria – é a falta de asseio e o seu completo desalinho. Com toscos bancos de pinho e velhas mesas e cadeiras deslocadas, com pobres panelas de lata em uma cozinha velha que seja, pode fazer-se um interior agradável, se todo esse imobiliário pobre estivesse limpo e bem disposto. Pobreza não é vileza, mas, riqueza é limpeza. E a cozinha?A mulher pobre não pode dar ao marido e a seus filhos um lanto jantar de numerosos pratos. Mas o caldozinho, o perarucu bem assado, farinha bem torrada, uma boa fritada de camarão, o arroz, e Etc. Tudo isso pode ser bem feito. (REVISTA TOPOGRAPHICA, ago de 1911, nº5, ano V).

O comentário acima indica um problema com a educação oferecida às mulheres,

desde as de elite, educadas como “bonecas de salão”, mas também a educação destinada às de

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classe baixa, sobretudo no campo da higienização e da qualidade de vida nas moradias. O

objetivo maior dessa educação mais criteriosa estaria no cuidado com o lar, na preparação dos

alimentos e no cuidado com os filhos menores. Defendia-se, ainda, que mesmo a mulher sendo

pobre, seria possível oferecer um ambiente limpo e alimentos bem preparados.

Um dos aspectos significativos desta passagem é a separação entre as classes. As

“bonecas de salão” são rapidamente evidenciadas e criticadas de uma maneira irônica, através

desta denominação enfeitada por um certo humor sarcástico, esboçando-se a idéia de que esta

classe devia ser o modelo, o que daria uma responsabilidade a este segmento.

Logo em seguida, começa a colocação mais significativa da passagem em questão.

Nesse relato da Revista Topográfica sobre as mulheres pobres é destacado, antes de tudo, sua

condição de vida e higiene que “impressionou muito mais que a própria miséria”. As

considerações sobre o espaço privado da moradia, no plano particular, são extremamente

emblemáticas para as descrições das mazelas e da sujeira, da falta de asseio, afinal seu

comentário é bem claro, quando diz que “pode fazer-se um interior agradável, se todo esse

imobiliário pobre estivesse limpo e bem disposto”. A matéria refere-se a um ideal de vida

pautado no discurso médico de limpeza e asseio, mesmo em um ambiente pobre, e cabia à mulher

saber desempenhar esse papel dentro do lar.

Os jornais possuíam uma certa representação e eram veículos significativos do

discurso da ordem médica estabelecido até então. As exigências feitas pelo discurso médico sobre

as mulheres tanto para a mulher burguesa como para as mulheres pobres era bastante rígido.

A grande influência da ordenação médica se estabeleceu não apenas na concepção de

limpeza e saúde, mas também envolveu relações conjugais, escolha do cônjuge, cuidado e

educação dos filhos, etc.

A seleção do parceiro conjugal tornou-se uma questão capital para higiene. A saúde do filho não dependia apenas do trato que lhe fosse dado após o nascimento. Ela estava condicionada à saúde dos pais. [...] No casamento idealmente concebido pela higiene o casal olhava o futuro e não o passado. Seu compromisso era com os filhos e não com os pais. A escolha do cônjuge estava manietada a esta proposição. O cuidado com a prole converteu-se, por esta via, no grande paradigma da união conjugal. (COSTA, 1979, p.219).

A higienização do espaço urbano adentrava nos lares ludovicenses, regulando o

cotidiano dessa população, suas escolhas de lazer, prazer e seus parceiros conjugais. A partir de

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então o discurso da igreja ganha mais uma competição, o discurso do médico, e isto fez com que

muitas famílias procurassem agora bem mais os médicos para solução de suas moléstias.

O romance Pedra Viva já citado figura o exemplo de um casal que ansiava muito por

um filho e recorreram ao médico, seguindo à risca todas as suas instruções, tomando remédios,

melhorando sua alimentação e recolhendo-se em seu quarto todos os dias muito cedo. Tinha “sido

obrigado a mandar trocar as molas da cama, suscitando com isto o sorrisozinho um tanto

debochado do ferreiro da esquina” (MONTELLO, 1983, p.42).

No entanto, apesar de seguirem as prescrições médicas, não detinham o resultado

esperado. A situação para o casal já se tornava vexatória entre vizinhos e parentes, com

comentários freqüentes sobre a intensidade da relação sexual do casal. Como as orientações

médicas pareciam não fornecer nenhum resultado, a esposa (e sempre a mulher é apresentada

como a mais religiosa) resolveu apegar-se à sua santa, fazendo uma promessa.O resultado foi que

em três meses o filho estava no ventre. É bem claro que a literatura não pode ser tomada como

espelho para a realidade, porém apresenta importante contribuição para pensar questões típicas da

época, representadas por meio de outras fontes. Neste caso, o exemplo foi apresentado para

mostrar a forte influência ainda exercida pela igreja, embora a palavra do médico já representasse

uma grande autoridade.

A estrutura da família brasileira estava realmente sendo alterada. Primeiro pela

perspectiva de gerar um descendente saudável para a continuidade da família e para que pudesse

seguir o esquema de organização familiar construído pela estrutura positivista. E, por último, a

gestação também estava sendo tratada com atenção pelos médicos, tanto que as recomendações

eram de que homens e mulheres com faixa etária muito distante não se unissem em matrimônio.

A imagem que muito perdurou pelo século XIX, de homens velhos casados com

moças jovens demais, estava desaparecendo, até mesmo pela capacidade de procriação desta, pois

“a mulher jovem, pela imaturidade do aparelho reprodutor, arriscava-se a uma gestação ou

partos difíceis que podiam lesar o feto ou o recém-nascido. O velho tinha os órgãos reprodutores

‘enfraquecidos’ e com suas ‘funções perturbadas’, o que o tornava igualmente inapto a

procriar” (COSTA, 1979, p.220). Os critérios higiênicos forneciam as regras das relações antes e

durante o matrimônio, de escolha e seleção do cônjuge que já não eram estabelecidos pelos

mesmos padrões do século passado.

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Esperava-se de uma cidade neste momento que fosse capaz de associar

embelezamento e melhores condições de vida para seus moradores. Portanto, havia um principio

de preocupação da higiene dentro e fora do lar, da maternidade como garantia para a reprodução

saudável da família. Contudo, por vezes, o embelezar deixava outros assuntos ligados à ordem e a

moral para segundo plano. No exemplo fornecido por Maria da Glória Correia mostra como

reclamações dos moradores usavam o argumento de que os governos se importavam bem mais

em arrumar praças e jardins, calçamento de ruas e calçadas, enfeitar as faixas de prédios públicos

do que com o aparecimento de pessoas que namoravam demasiadamente nas praças feitas pelas

autoridades, cenas consideradas ousadas em pleno espaço público, o que logo foi alvo dos jornais

de então. (CORREIA, 2006).

O jornal O Dia preocupado com a questão dos namoros dos jovens publica uma

pequenas matéria em que a imagem fala mais que qualquer palavra, mostra o “namoro de ontem”

e o “namoro de hoje”, ressaltando que no passado o relacionamento era mais saudável e revestido

de um certo pudor, vergonha e por conta disso havia um encantamento maior. O namoro de hoje

por sua vez seria representado pela proximidade física, e nenhuma relação com a vergonha, nem

masculina , nem feminina.

ILUSTRAÇÕES 3 E 4 – NAMORO DE ONTEM E NAMORO DE HOJE

Fonte: O DIA de 05 de fevereiro de 1925 e 08 de fevereiro de 1925

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Modernidade e transformação foram vistas como sinônimos de República, pois esta

foi considerada divisor de águas no processo de urbanização do país. “Teorias de mudança social

formulam hipóteses explicativas genéricas sobre transformações do comportamento familiar,

usualmente atribuindo as inovações à influência da industrialização” (ARAÚJO, 1993, p.25).

A própria laicização do Estado brasileiro contribuiu para isto, “a lei de 1890 e o

Código Civil alteraram em alguns pontos o direito de família, mas não modificaram

substancialmente os preceitos de origem canônica do Código filipino de 1603. O homem era o

representante legal da família, tendo a tutela marital e o pátrio poder” (Id Ibid, p.44).

Tais alterações se fizeram tão latentes que alteraram os rumos da família como, por

exemplo, o dote que era uma instituição reguladora dos casamentos da elite, no início do século

XX já não era tão praticado. Na verdade, o dote ganhou uma nova conotação e roupagem, a

própria concepção de matrimônio foi alterada, pois entre os séculos XVI e XIX, o casamento era

enxergado como o modo em que “se formava uma nova empresa produtiva, em que o dote de

esposa proporcionava a maior parte dos meios de produção necessários para dar início a uma

nova comunidade” (NAZZARI, 2001, p.28).

A prática dotal era importante por objetivar contribuir para a vida do novo casal ou

unidade familiar, e isto era visto como responsabilidade do patriarca. A partir da relação dotal, é

perceptível as mudanças que permeavam as famílias em formação nos fins do século XIX.

À medida que o individualismo crescia e os negócios e a família se separavam, a prática do dote ia se tornando menos freqüente. O estudo da amostra dos inventários de São Paulo do século XIX demonstra que as poucas famílias que ainda dotavam suas filhas concediam-lhes dotes relativamente menores e se despojavam de parte menos significativa de seus bens em favor dos dotes. Além disso, o conteúdo dos dotes se alterou, refletindo a transformação da família, de uma unidade principalmente de produção para uma unidade principalmente de consumo. (NAZZARI, 2001, p.189)

Já no início do XX, o dote era assunto que pouco se comentava entre as famílias e

quase não há indícios de registro de concessões de dote material, mas há muitas indicações acerca

do novo legado deixado às mulheres (e este seria uma grande contribuição ao seu lar e para a

pátria mãe), a educação. Tal educação fornecida às mulheres ludovicenses estaria embutida de

uma concepção renovadora sobre cuidados com o lar, em que o papel feminino continua

enquadrado com os mesmos moldes, mas com articulações diferentes, onde a mulher galgaria um

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título honroso de “rainha do lar”, e para tanto deveria estar bem munida de conhecimentos dignos

dessa nova família.

É diante desse novo contexto da história do Brasil, de uma nova concepção de

casamento, cuidado com os filhos, relacionamento conjugal e instrução que nasce uma, por não

dizer, “nova mulher”. E esta mulher deveria abraçar papéis sociais e deveres considerados dignos

desse novo contexto, provocando um conflito entre a manutenção dos papéis tradicionais e as

novas sociabilidades que promovem um alargamento de espaço de atração feminina.

2 INSTRUÇÃO FEMININA EM SÃO LUIS

No início do século XX, as mudanças que caracterizavam o chamado “mundo

moderno” proporcionavam oportunidades recentes e inovadoras para a mulher além do âmbito do

lar. Lentamente, começava-se a ampliar seu campo de atuação e os velhos padrões previstos e

exercitáveis não eram mais suficiente. Contudo, havia formas da sociedade coibir suas ações e,

sobretudo, limitar essa emancipação. A educação se por um lado poderia cooperar na adaptação

do indivíduo com o mundo no seu enquadramento, por outro, poderia também funcionar como

uma hábil tentativa de ampliação da participatividade feminina.

A educação em São Luís, de uma forma geral, apresentou avanços na virada do século

e foram registradas melhorias na instrução em falas e mensagens de governantes e demais

autoridades. A mulher adentrou o século XX com uma educação mais ampliada, com maiores

vagas nas escolas, novas disciplinas oferecidas e até o direito de dividir a mesma sala com

homens, a chamada co-educação. A educação escolarizada contribuiu para o processo de

“conquista” do espaço público pela mulher e por conseqüência resultou na atuação desta nova

mulher para além dos espaços do lar e da igreja, únicos ambientes em que a ação feminina se

fazia mais concreta.

O século XX também despontou com uma série de mudanças para a família

brasileira, incluindo a concepção higiênica do lar, em que o médico passou a ter um importante

papel nas decisões do casal. O discurso médico considerado o discurso científico por excelência,

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influenciava os lares da elite, lentamente deslocando o discurso religioso, contribuindo com a

nova definição dos papéis masculinos e femininos, em que ser pai e mãe, como a finalidade única

do homem e da mulher dentro do matrimônio, passava a ter exigências com o bem-estar físico a

fim de ter uma prole saudável. (COSTA, p.238)

A concepção científica que adentrava os lares ludovicenses era em parte resultado da

maior freqüência de homens e mulheres à escola, tanto no que se refere ao ensino público, quanto

ao privado, locus privilegiado de disceminação desses novos saberes. Esse contato com a

educação laica teve influência não apenas na relação com o religioso, como ainda influenciou

uma nova relação com os espaços público e privado, desde o lar aos passeios nas praças e

avenidas, teatros, clubes, salões, etc.

2.1 A República da educação em São Luís

A República foi palco das transformações no campo educacional, e algumas reformas

alteraram a estrutura do ensino dividindo-o em primário, secundário e profissional. Outra

mudança se deu com a proibição da prática de castigos físicos na escola. O governo de Benedito

Leite no Maranhão (1906-1910) abriu algumas portas para a educação no estado, como a criação

de uma Escola Modelo, reformulações na escola Normal e a nova instalaçãopara a Biblioteca

Pública e Imprensa Oficial.

Contudo, a educação ainda era pautada por métodos tradicionais, em que as matérias

eram meramente decorativas e não atribuíam maiores significados aos alunos. Segundo um

depoimento de um ex-aluno, de 1901, as condições do ensino não estimulavam o raciocínio, a

reflexão, sobrecarregando os alunos com a tarefa de memorização de imensos trechos de

compêndios pedagógicos que seriam logo esquecidos depois da apresentação aos pais e mestres.

Bastaria interigarem-me para que os trechos da Gramática saíssem no próprio compêndio de Pedro de Souza Guimarães. Só receava um perigo: inverterem a ordem das perguntas ou fazerem-nas por forma diversa da do compêdio. Isso, todavia se me afigurava uma traição, de que, aliás, eu era vitima múltiplas vezes. O professor apenas ordenava que decorássemos, poupando-se ao trabalho extenuante de destrinçar-nos o texto ou de elucidá-los com exemplos. Tanto quanto podíamos compreender, a nossa educação resumia-se em transvasar para as nossas cabeças o que os livros continham e repeti-lo depois materialmente na aula, ou nos exames de fim de ano, perante uma assembléia de pais e parentes, embevecidos do nosso saber. Não havia interesse em exercitar-nos a inteligência, em adestrá-la na ginástica do raciocínio, em povoá-la de noções proveitosas e úteis a vida. (Revista do Norte, O Colégio Pires, 01 de set. de 1901)

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Neste depoimento fica destacada a superficialidade da educação pautada apenas no

decorar textos e levar castigos caso não os decorasse, pois, ainda segundo o denunciante,

“diariamente, depois da lição... e dos bolos, ouvia-se esta frase inalterável: ‘decore daqui até

ali’”. Na escola pública primária, que atendia aos segmentos mais baixos da população, essa

situação era agravada pelo pouco investimento em mais escolas, em melhores métodos de ensino

e conteúdos que objetivassem efetivamente em “noções proveitosas e úteis a vida”.

A questão da qualidade oferecida ao público e dos espaços onde tais escolas eram

instaladas, fazia parte dos debates travados na imprensa da capital, como neste artigo do jornal A

Escola de 10 de março de 1902.

O governo do Estado, nestes últimos tempos, procurando difundir e melhorar a nossa instrução primária, criou aqui na capital grande número de escolas providas de professores e adjuntas com grande peso para os cofres do erário público mas sem nenhum proveito para a infância, porque esses estabelecimentos faltos de aparelhos, moveis e utensílios próprios e até de casa-não passam de velhas escolas de outrora [...]. Melhor fora reduzir o número de escolas e com produto da conseqüente economia melhorar o material didático das restantes, assistindo a tudo isso grande critério na escolha dos professores só tendo em vista o preparo e sobretudo a dedicação deles.

A crítica se refere a ampliação do número de escolas sem a devida qualidade do

ensino, incluindo os aspectos de infraestrutura e dos recursos pedagógicos. A solução encontrada

para a boa aplicação dos recursos com a instrução primária era a diminuição de escolas e maior

investimento nas existentes, com destaque para o preparo dos professores e do material didático.

A discussão sobre educação incluia a questão dos seus objetivos. Na República,

estruturou-se um novo discurso sobre a educação, destacando-se seu papel de levar a consciência

da pátria, nação, ordem e progresso ao alunado:

A escola teria de conformar-se com a época que atravessa, acompanhando-lhe as mutações e as idéias e instituição social, como é, tem de elevar o seu ensino à compreensão da noção de pátria e dos deveres que esta exige, fazendo compreender ao mesmo tempo a função que cada indivíduo tem de nela representar, munindo-o dos conhecimentos gerais indispensáveis para desempenhar conveniente a sua missão. (GODOIS, 1910, p.86)

Havia também preocupação em melhorar a educação destinada às camadas populares,

sendo definido para os mais pobres uma educação gratuita com ênfase na formação profissional

como forma de torná-los homens úteis e capazes de contribuir para o crescimento da nação. A

educação também deveria garantir um controle social dos mesmos por via de uma ideologia

baseada no ensino e nos valores morais e cristãos.

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No entanto, mesmo com esse objetivo de controle social, entre o discurso de maior

investimento na educação das camadas populares e a prática através de ações concretas, havia um

grande distanciamento. Os propósitos educacionais para as camadas economicamente

desfavorecidas estavam pautados no controle social e na dominação das classes dominantes

perpetuando as diferenças sociais, e tal situação contribuía para o pouco investimento na criação

e manutenção de estabelecimentos de ensino.

A escola também era uma forma de “enquadrar” esses segmentos sociais mais baixos,

desejo continuamente expresso nas falas das autoridades políticas e de intelectuais em jornais,

para oferecer uma educação que influenciasse essa “massa” a desenvolver seus deveres para com

a pátria, recebendo uma instrução mínima que garantisse o bom cumprimento de seus papéis

subalternos. “Devemos nos convencer que todo o homem precisa de conhecer os mistérios que

encerram os caracteres do alfabeto. Esses mistérios constituem a felicidade da família e a

prosperidade da pátria” (O Postal, Pela Instrução, 18 de ago. de 1918, N° 43, ano III)

Ao comparar as despesas que os governos do estado e município mantinham com a

educação e com outros setores, notamos como a instrução pública estava relegada a segundo

plano, como mostra o exemplo da tabela abaixo:

Tabela 1: Balanço da despesa da Intendência Municipal no exercício de 1905

INTENDÊNCIA MUNICIPAL – DESPESA DE 1905

Verbas de Despesa Despesa Realizada

Com a Repartição da Câmara 1:640 $ 000

Com a Repartição da Intendência 2:150 $ 000

Com a Instrução Pública 650 $ 000

Com a Iluminação Pública 1: 500 $ 000

Estábulo e conservação de um touro 1: 000 $ 000

Fonte: Diário Oficial do Estado do Maranhão, 05 de junho de 1906.

Diante das despesas apresentadas pela Intendência Municipal, a educação estava

dentre os menores gastos, perdendo em investimento até mesmo na conservação de estábulo com

um touro.

As demonstrações das receitas e despesas dos governos estadual e municipal contidas

no Diário Oficial do mesmo período revelam que os gastos com o pagamento de pessoal do Liceu

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Maranhense, Escola Normal, Escola Modelo e outras escolas da capital e interior somadas não

chegavam nem próximo ao pagamento de pessoal que atuava na área de Tesouro.

Apesar das falas oficiais que indicavam grandes melhorias no setor educacional, os

dados também oficiais, apresentavam outra realidade contraditória do discurso, indicando que a

educação não era prioridade no setor público. Esse quadro também fez surgir algumas

instituições e organizações que recolhiam dinheiro para manutenção de escolas destinadas a

crianças pobres, as chamadas ‘Caixas Escolares’. Ou acreditando na educação como ideal de

dignidade, para alcançar uma sociedade mais responsável, ou acreditando na educação das

camadas populares como meio de evitar o crescimento de problemas sociais como a

criminalidade, algumas instituições destinaram-se ao auxílio material para crianças pobres, a

partir do discurso de que “se estes entezinhos não freqüentam uma escola, não poderão tornar-se

homens fortes e úteis. A pátria não deve esperar deles alguma coisa de proveitoso.” (JORNAL

ALMA NOVA, 07 de set. de 1929).

A problemática educacional em São Luís também chamava atenção para o fato de esta

cidade se proclamar como “Atenas Brasileira”. Seria incompreensível para uma terra de grandes

poetas do século XIX, cuja fama se sustentava no mito de ser uma terra de homens de letras, que

sustentavam o melhor uso do vernáculo, ter um número grande de pessoas longe da escola e

analfabetas. Seria uma incompatibilidade em relação ao seu passado de “esplendor”, uma vez que

“o Maranhão, lá fora, passa como sendo realmente uma Atenas, onde os governos são como que

novos Péricles a reformar, a reorganizar programas de ensino, intensificando a instrução por

todos os municípios e localidades do interior” (JORNAL O SERTÃO, jun. de 1921).

A transferência de responsabilidades sobre a educação das crianças pobres se fazia

notar no discurso que obrigava pais e tutores a condizirem seus responsáveis à escola, sem levar

em consideração as dificuldades de sobrevivência dos pobres da cidade, da impossibilidade de

assistir às aulas todos os dias devido a fome, falta de vestimenta e material escolar básico, bem

como a necessidade de trabalhar para ajudar a família. Muitos jornais reforçaram o discurso

oficial, mostrando que o governo oferecia escolas e que os professores “cumpriam bem o seu

dever”, e que bastava aos pais levarem seus filhos à escola.

Os debates acerca da educação no Maranhão envolviam o objetivo de normalizar

homens e mulheres para que pudessem viver bem em sociedade. Era defendido que na escola a

ação do mestre deveria ser relacionada a um desenvolvimento geral, e que a missão da escola é

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preparar para a vida, preparar para uma profissão. A instrução deveria dar condições mais dignas

aos filhos dos pobres por meio da aprendizagem de trabalhos manuais, sendo o lema “educar pelo

trabalho, para o trabalho”. Essa noção de que o trabalho dignificava o homem tornaria a

sociedade um espaço mais habitável e o valor concedido à educação se dava muito pelo fato de

que pudesse tornar o homem capaz de cumprir seus deveres cívicos, respeitando a pátria e a lei.

A República deu alguns passos importantes na construção de bases mais sólidas para a

educação. Estima-se que na implantação do regime republicano cerca de 2/3 da população era

analfabeta (ALMEIDA, 1998), comprometendo o ideal de uma nação que tinha como lema a

“ordem e o progresso”. Desta forma, não se poderia perder de vista a instrução dos filhos dos

operários e demais segmentos dos pobres urbanos.

No que concerne à organização escolar de instituições públicas, referente a matrícula e

frequência do alunado, nota-se na documentação um destaque para a grande evasão sendo este

um dos maiores problemas enfrentados. Os dados do relatório do então governador Antonio

Brício de Araújo (1917), mostram que o número de matrículas na “Escola Benedito Leite” foi de

98 para o sexo masculino e 151 do feminino. Os homens freqüentaram mais, com uma taxa de

6% de abandono diante do número de matriculados; já 30% das mulheres matriculadas deixaram

de ir à escola antes de completar o ano letivo. No entanto, o sexo feminino conseguiu uma média

de aprovação de 14,5% contra 3% do sexo masculino.

Os dados acima mostram que, apesar do número de meninos matriculados e evadidos

nesta escola ter sido menor que o de meninas, o nível de aprovação entre as meninas foi bem

superior. Segundo indicações das fontes bibliográficas que analisaram este tipo de dados, o

menor desempenho se dava pela intensidade de atividades paralelas de sobrevivência realizada

pelos meninos pobres desde muito cedo, acarretando em dificuldades para acompanhar os

estudos. Por outro lado, as meninas, possivelmente, abandonavam a escola em número maior

devido a necessidade de dedicar-se prioritariamente ao cuidado da família, de uma quantidade

grande de irmãos ou dos afazeres domésticos como a limpeza diária da casa ou o preparo

cotidiano da alimentação.

No que se refere à Escola Normal onde a presença masculina era realmente bem

inferior à presença feminina, haja vista que os baixos salários da profissão do magistério primário

eram pouco atrativos para os homens

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Observemos a seguinte tabela que mapeia as matrículas da Escola Normal entre os

anos de 1916 e 1920.

Tabela 2: Divisão por sexo nos cursos da Escola Normal Primária

ESCOLA NORMAL PRIMÁRIA

Curso primário Curso secundário Concluíram o primário ANO

masculino feminino masculino Feminino masculino feminino

1916 15 35 ---- 5 --- 6

1917 25 53 ---- 17 --- 9

1918 59 78 ---- 33 5 9

1919 80 100 5 45 5 14

1920 72 128 8 57 --- ---

FONTE: Relatório do Congresso Pedagógico – 1922

Como é possível perceber, na Escola Normal e seu colégio de aplicação, a Escola

Benedito Leite, as mulheres eram maioria desde o curso primário em todos os anos. Como

indicado acima, a profissão do magistério estava cada vez mais feminina e uma causa apontada

para essa feminização do magistério eram os baixos salários, argumento que também pode ser

visto como conseqüência, ou seja, os salários baixaram em virtude da maior presença feminina,

uma vez que o salário da mulher era visto sempre como renda complementar e não como

rendimento principal. Então é possível que, no caso da Escola Normal, os rapazes tenham evitado

ou abandonado essa escola em busca de uma profissão que fosse mais rentável.

Apesar do cerscimento de vagas para as mulheres nas escolas públicas e privadas,

um grande impedimento para as mulheres pobres era o ensino noturno, idéia criada com o

objetivo de oportunizar a educação dos trabalhadores pobres.

Tabela 3: A matrícula nas escolas públicas municipais da capital em 1919

MATRÍCULA EM 1919 – ESCOLAS PÚBLICAS

MATRÍCULA POR SEXO ESCOLA

MASCULINO FEMININO

Bairro de Santo Antônio 22 61

Bairro da Madre Deus 16 54

Bairro do Desterro 26 63

Bairro do Apicum 30 105

Escola Noturna 155 0

Bairro dos Remédios 35 12

FONTE: Relatório do Congresso Pedagógico - 1922

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Oa dados acima indicam uma maior presença feminina nas escolas, com exceção da

escola noturna onde a presença era 100% masculina, ou seja, a mulher de classe baixa em São

Luís que não tivesse condições de freqüentar uma escola no período diurno, por questões de

sobrevivência, cuidados com a casa ou irmãos menores, teria então que abrir mão dos estudos,

pois a moral não lhe permitia estudar à noite.

2.2 Ensino Religioso X Ensino Laico

Apesar do discurso republicano de ampliação da educação, não bastava educar por

educar, seria importante prezar por uma instrução que refletisse os ideais da sociedade. Este fato

suscitou importantes debates sobre a laicização do ensino ou a manutenção da forte influência do

cristianismo nos moldes educacionais. Muitos foram os jornais que adentraram nesta discussão

por estar diretamente relacionada à formação do caráter dos futuros cidadãos do país.

A Constituição republicana delibereva um ensino laico e apresentava uma educação

para o país pautada na descentralização e liberalismo do ensino, no entanto, “a legislação sobre o

ensino na Primeira República deixava larga margem de atuação à Igreja Católica, muito mais

apta do que os leigos, pela tradição e pela posse de quadros abituados ao magistério ”

(SAFFIOTI, 1976, p.214). Assim, de certa forma a educação não se “libertou” da influência

católica, embora a presença protestante tenha desenvolvido certa alteração no trato educacional.

De uma parte, o protestantismo mantinha com o espírito científico estreitas afinidades, derivadas da austeridade de seus procedimentos mentais e de sua tendência à análise. Isso lhe conferia o direito de coexistência com as idéias republicanas e lhe permitiria um florescimento no novo regime. De uma outra parte introduzindo a co-educação dos sexos no estabelecimento de classes mistas. (SAFFIOTI, 1976, p.215)

A implantação de escolas protestantes, principalmente as norte-americanas, no início

da república causou uma certa pertubação no cenário educacional, a própria inserção de algumas

mudanças na sala de aula, como por exemplo a permanência de meninos e meninas no mesmo

ambiente escolar e a ameaça à supremacia católica, representaram parte da problemática. Porém,

a forte influência da Igreja no domínio educacionaldo país, de fato, permaneceu quase que

inalterada.

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Por diversas vezes o tema educação se fazia presente nos meios de comunicação,

existindo aqueles que defendiam uma ligação entre o ensino e a religião, tendo como referência o

ideal de civilidade, ao estilo francês de forte ligação com o catolismo, como mostra a Revista de

Instrução e Educaçã (10 de nov. de 1877):

Organizar de diferente modo as escolas normais, fundar a educação do povo sobre base forte e nacional e imprimir-lhe caráter verdadeiramente francês e conseguinte católico. Fora do catolicismo não houve no pretérito, nem pode haver no futuro glória alguma, para a França – para esta nobre nação, cujo título de honra para com as nações do universo é o de cristianismo.

Os jornais ligados a ordens religiosas defendiam uma educação pautada nos valores

cristãos, a defesa de que uma educação sólida deveria ser antes de qualquer coisa religiosa, pois

só a religião tornaria a escola um local de respeito. Se colocando contra a questão da laicização

do ensino, o jornal O Labor, de 16 de julho de 1913 assume o seguinte posicionamento:

Vejamos entretanto o que deve ser o ensino. Não há negar que seja ele um elemento poderoso e decisivo na educação. [...] Eis por que a igreja católica zela de modo especial o precioso depósito da doutrina que lhes foi confiado por Nosso Senhor e condena todos os erros perniciosos. [...] Só diremos que à igreja, às famílias e aos Estados cumpre ministrar e proteger o ensino cristão.

Nesse discurso é revelador a tendenciosidade por parte da igreja católica em manter o

ensino sob sua responsabilidade, enfrentando, desta forma, aqueles interessados em afastar a

Igreja da educação regular, “os partidários de sua laicização”. Contudo, independente destes

partidários avessos a manutenção de um ensino guiado por clérigos, a Igreja continuava a afirmar

a necessidade da manutenção da educação sobre sua responsabilidade recorrendo, ainda,

continuamente, o discurso que indicava a “doutrina que lhes foi confiado por Nosso Senhor”.

Logo, a educação era um dos mais importantes pilares para transmissão dos valores e de forma

alguma a doutrina religiosa poderia abandoná-la.

Dada a importância da educação, os embates acerca dos ideais protestantes, católicos

e positivistas, defensores de uma instrução baseada em seus valores invadiam os jornais

ludovicenses. Porém, apesar de manifestarem orientações bem distintas no tocante à educação,

todas essas tendências concordavam que a educação feminina deveria ter um tratamento especial,

uma vez que a mulher estaria imbuída de importantes atributos e responsabilidades.

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2.3 Educação Feminina

Inseriu-se nesta nova proposta educacional republicana espaço maior para as

mulheres, sendo que o ensino implantado na visão positivista, estabelecia semelhanças e

diferenças entre os sexos, propagando o modelo de submissão da mulher ao homem. Defendeu

também importantes ampliações na educação feminina, desde que esta tivesse o papel

fundamental de estabelecer a figura da mulher ideal, tendo a educação uma conotação importante

na formação da mulher e sendo vista como seu dote moderno.

O dote era um antigo costume das famílias patriarcais e tinha um importante papel na

formação das famílias quando ainda se carregava a concepção de que tais núcleos eram unidades

de produção. Os pais costumavam dotar suas filhas com bens materiais que pudessem contribuir

para a formação do patrimônio e sobrevivência do novo casal. A partir do século XIX, o dote

entrou em declínio e a mulher deveria lançar-se ao casamento com novos atributos, um deles era

uma educação mais primorosa.

Vários fatores contribuíram para que o dote desaparecesse: “Paralelamente ao

crescimento do amor como incentivo para o casamento e a diminuição do controle dos genitores

sobre os casamentos de seus filhos, houve também transformações da mentalité no que diz

respeito ao papel adequado do marido no casamento” (NAZZARI, 2001, p.220).

Com a concessão do dote, os primeiros bens do casal eram formados a partir desse

patrimônio trazido pela mulher, com isso, e esta mantinha uma determinada posição dentro do

relacionamento, uma vez que tinha consciência de sua contribuição no lar. Porém, toda e

qualquer administração estava nas mãos do marido, que se mostrava como o administrador legal

dos bens recebidos e à mulher cabia apenas algumas quantias mensais.

No século XIX, baseadas na concepção de incapacidade feminina para administrar, as

Leis Civis do Império adotavam a posição de que “na constância do matrimônio compete ao

marido a plena administração do dote, as ações que se referirem a ele, o direito de exigi-lo e o

de perceber seus frutos.” (LEIS CIVIS, Art.2030, 1879). À mulher restaria receber “diretamente

para suas despesas miúdas, uma quota dos rendimentos ou rendimento de algum bem ou de

alguma espécie dos bens dotais”. (Id Ibid, Art. 2028).

Com a República e o desaparecimento do costume das famílias dotarem suas filhas

com bens materiais, a administração dos bens do casal continuavam sob o poder masculino. O

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Código Civil registrava que “na vigência da sociedade conjugal, é direito do marido: I –

Administrar os bens dotais” (Art. 289, 1917).

Com o reforço da concepção de que o homem deveria ser o provedor do lar, a

contribuição por parte da família da mulher através do dote paulatinamente deixava de ser

costume entre as famílias. Outro fator que cooperou para fortalecimento do fim do dote foi o

casamento por meio do amor, já que as importantes alianças entre famílias da elite não se davam

mais pela via matrimonial, mas podia ocorrer por meio da política partidária ou da sociedade de

negócios.

O surgimento do amor como razão principal para o casamento passou a ocorrer à medida que a família mudava de unidade primordialmente de produção para unidade de consumo, o que foi facilitado pela existência de profissões liberais ou outras carreiras que permitiam que os homens sustentassem as esposas sem herdar bens ou sem receber grandes dotes, e lhes proporcionava a opção viável de se casarem com moças sem nenhuma expectativa. Essa possibilidade fez aumentar o poder de negociação do marido diante da noiva, mesmo que ela pertencesse a uma família rica. (NAZZARI, 2001, p. 239).

No século XIX, a educação da mulher era justificada pela função social da mãe, com a

missão de ser a primeira educadora dos seus filhos, responsável pela transmissão dos valores

básicos daquela sociedade e formação dos futuros cidadãos. No início do século XX, o discurso

republicano não ofereceu grandes alterações com relação à instrução feminina. Segundo Oliveira

(1994, p. 64) em sua análise sobre a educação a educação feminina do início do século XX.

Cabia a mulher m papel de destaque a ser desempenhado no lar, e a Escola procuraria, órgão da educação, atraí-la para o lar, que é a sua verdadeira função social; e seria a partir do espaço privado que a mulher daria sua mais importante contribuição social, organizando a família.E para que esse papel fosse exercido com consciência, a mulher precisaria ser reeducada, munir-se de conhecimento em torno dos afazeres domésticos e da criação dos filhos, formulados sob concepções técno-ciêntíficos, como pueridades, química alimentar, dialética e gerenciamento do lar. (OLIVEIRA, 1994, p.64)

No caso das mulheres pobres era oferecida ou simplismente uma instrução básica, ou

esta instrução era renegada a segundo plano, tendo em vista que meninas de classe baixa

envolviam-se desde cedo com atividades domésticas, trabalho na roça, cuidados com os irmãos

menores, atividades estas vitais para a família, sendo que o estudo poderia ser adiado ou mesmo

esquecido.

As oportunidades de ensino aumentavam, a Escola Normal abriu chances para que a

mulher exercesse a profissão do magistério. Para as de classe baixa, lecionar representava a

oportunidade de melhorar a condição de vida e de freqüentar o meio público sem comprometer

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sua imagem. Algumas mulheres das camadas menos privilegiadas, podiam ajudar na renda

familiar e, na visão do então governador Jansen Ferreira, a Escola Normal “se tornou uma

instituição onde a mulher maranhense conseguia um título que nobremente lhe garantia a

subsistência” (1910).

No ano de 1929, o então governador do Maranhão apresentou uma ampla situação do

ensino, mostrando que no estado existia cerca de 174.867 pessoas em idade escolar e o número

de matrículas foi de 41.624, cerca de 23%. Existia no Estado 5 externatos, 146 escolas mistas, 12

grupos escolares e 17 escolas do sexo masculino.Continuando sua mensagem, informuo que na

escola Modelo Benedito Leite matricularam-se, durante o ano de 1929, no curso pré-escolar,

médio e complementar, 439 alunos, sendo:

Curso pré-escolar Masculino-------------31 Feminino--------------19 Curso Médio 1º ANO: Masculino---------54 Feminino----------39 2º ANO: Masculino---------39 Feminino----------34 3º ANO: Masculino---------30 Feminino----------29 4º ANO: Masculino---------27 Feminino----------29 5º ANO: Masculino---------21 Feminino----------33

Os dados acima mostram que a presença feminina no 5º ano do curso médio, por

exemplo, era maior que a presença masculina. Por sua vez, os salários destinados às mulheres que

exerciam o magistério eram bem menores que os dos homens, recebiam cerca da metade do

salário masculino.

Tabela 4: Distribuição salarial por sexo nas disciplinas da Escola Normal em 1906

DISTRIBUIÇÃO SALARIAL NA ESCOLA NORMAL EM 1906

Distribuição Vencimentos Anuais

01 professor de Português e Literatura 4: 800 $ 000

01 professor de Francês 3: 600 $ 000

01 professor de Aritmética, Álgebra e Geometria 4: 800 $ 000

01 professora de Caligrafia, Desenho aplicado às prendas femininas 2: 400 $ 000

01 Professora de Prendas femininas e Economia Doméstica 2: 400 $ 000

Fonte: Diário Oficial do Estado do Maranhão, 16 de out. de 1906

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Cabia à mulher as disciplinas consideradas de menor exigência intelectual e atividades

voltadas somente ao ensino de outras mulheres. Em virtude disso, ela recebia metade do salário

de um homem que ministrava disciplinas consideradas mais complexas, como os de português e

geometria que conseqüentemente recebia os maiores pagamentos por seus préstimos à educação

do Estado. Foi pensando nisso que no governo de Benedito Leite houve um aumento nos

vencimentos do magistério que tinha o objetivo de atrair elementos masculinos para a Escola

Normal (SALDANHA, 1992).

Podemos discutir qual o interesse do governo em incentivar o elemento masculino a

ingressar como professor na Escola Normal. O mesmo governo que aplaudia a mulher no ensino

primário se preocupava com o destaque que poderia obter em outras esferas do ensino, pois

talvez aquela professora que ministrava aulas de prendas domésticas conseguisse avanços para

outros níveis de ensino e isso tornaria-se uma invasão feminina em espaços estritamente

masculinos. Apesar dessa preocupação, deve-se levar em consideração que as professoras não

estavam qualificadas para ingressar no ensino secundário com as disciplinas de cálculo e nem era

interesse do Estado em dotá-las desses conhecimentos.

A parcela de mulheres pobres que tinha oportunidade de estudar era muito pequena e

por vezes a instrução tornava-se um dote simbólico para tais moças obterem subsistência. O

casamento, união oficializada juridicamente ou com as bênçãos da Igreja, não era freqüente entre

as mulheres das camadas mais pobres, era considerado um costume da elite pois na grande

maioria das vezes “as mulheres pobres não casavam, elas se concubinavam, o alto custo do

casamento era um dos motivos para isso, elas quase sempre usavam apenas o primeiro nome,

ficando no anonimato.” (SOIHET, 2000, p. 365)

A maioria dessas mulheres se dedicava ao trabalho para sobreviver. “As tarefas caseiras

tradicionalmente femininas, lavadeiras, engomadeiras, pareciam correr menos perigo moral do que as

operárias industriais, mas mesmo nesses casos, sempre ameaçava a acusação de serem mães relapsas”.

(FONSECA, 2000, p. 516) Este contato constante com a rua, com espaço público, que as mulheres pobres

se destinavam desde cedo, as fazia alvo de constante avaliação moral, permitia que muitas delas fossem

abusadas sexualmente por seus patrões e que a impunidade era a única resposta que tinham.

Segundo Glória Correia (2006), em seu trabalho sobre o operariado feminino em São

Luís no início do século XX:

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Tanto as mulheres abastadas como as despossuídas trilharão por este ‘novo’ lócus social, com as primeiras ocupando espaços públicos no ‘sacerdócio’ das atividades ligadas ao magistério, considerando uma extensão das funções maternas, bem como tendo uma educação voltada para o preparo das funções do lar, condicionado-as à boa formação de filhos, futuros homens e mulheres da sociedade da boa moral e dos bons costumes. Já as mulheres das classes populares, estariam nos espaços públicos para complementação da renda familiar através de tarefas domésticas como criados, lavadeiras, costureiras, também nas atividades ligadas as fábricas como operárias e ainda no comércio informal, sendo doceiras, floristas, etc.

Para as mulheres de camadas médias, a educação enquanto um dote simbólico

representou um legado importante que seria levado para o casamento. A instrução feminina

estava inserida no discurso republicano de valorização da educação, tanto no sentido da formação

intelectual, quanto na observação de valores relevantes para quem se pretendia esposa e mãe, e

era principalmente a partir deste último aspecto que o valor educacional ganhava conotação de

importância para as mulheres de camadas mais privilegiadas.

O magistério era uma profissão que iria requerer da mulher um preparo mais amplo,

isso se ela fosse responsável por ministrar as mais diversas matérias, mas à mulher cabia

“apenas” atividades relativas às primeiras letras ou a práticas domésticas. Então, quanto mais

distante de uma preparação mais completa a mulher estivesse, seria fácil mantê-la nas mesmas

esferas de ensino, ou seja, sempre inferior ao homem.

Estatísticas de freqüência da Biblioteca Pública “Benedito Leite” mostram que o

número de mulheres que tinham o hábito de freqüentá-la era praticamente nulo se comparado ao

dos homens, o que mostra que a educação formal das mulheres limitava-se ao período escolar e

não se expandia a outras atividades como o hábito da leitura em uma biblioteca pública.

O não incentivo à extensão do ensino para além da sala de aula tem demonstrado

como a instrução das mulheres ainda era muito restrita, sendo perigoso para o status quo tanto a

aquisição de mais conhecimentos fora do ambiente escolar, como a presença dessas mulheres em

espaços públicos que foram tradicionalmente ocupados por homens a exemplo da biblioteca

entendida como lugar de saber e de poder.

A seguir, os exemplos de freqüência de mulheres e homens na Biblioteca Benedito

Leite nos anos de 1905 e 1906:

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Movimento da Biblioteca Benedito Leite Mês de Dezembro de 1905 Masculina .............................................................................262 Feminina ..............................................................................019 (Fonte: Diário Oficial, 03 de jan. de 1906, n.° 03, ano I) Movimento da Biblioteca Benedito Leite Mês de Janeiro de 1906 Masculina .............................................................................260 Feminina ..............................................................................032 (Fonte: Diário Oficial, 04 de fev. de 1906, n.° 03, ano I) Movimento da Biblioteca Benedito Leite Mês de Abril de 1906 Masculina .............................................................................378 Feminina ..............................................................................027 (Fonte: Diário Oficial, 05 de maio de 1906, n.° 108, ano I)

2.4 “Ensinando nossas filhas no caminho em que devem andar”

Apesar de algumas permanências da submissão feminina, em novos moldes,

especialmente com o discurso científico positivista, a educação teve um importante papel no

processo da conquista feminina do espaço público, mesmo sendo utilizada para reforçar as

tradicionais diferenças entre homens e mulheres e seus papéis sociais. Os estudos relacionando

gênero e educação no Brasil tem demonstrado as diferenças nos conteúdos e estratégias de ensino

e nos objetivos que envolviam a educação de meninos e meninas.

Dessa forma, eram lançadas sobre as mulheres algumas exigências para que

“soubessem” seu papel na sociedade e o desempenhasse da forma mais honrosa possível. A

mulher deveria se estabelecer e se destacar no âmbito privado, realizando-se neste espaço, sua

contribuição social era organizar e zelar pelo bem estar da família, devendo munir-se de

conhecimentos acerca dos afazeres domésticos (prendas), criação dos filhos, higiene e

“gerenciamento” do lar dentre outros.

Com a implantação da República o encargo dos níveis de ensino superior e

secundário tornou-se responsabilidade da União, enquanto aos estados caberia cuidar da

educação primária. Segundo Bulcão (2002, p. 31) “a República não realizou uma transformação

no sistema educacional, que viesse a provocar uma renovação cultural e política que se fazia

necessário. Essa renovação não ocorreu, porque o comando político, econômico e cultural

permaneceu nas mãos da classe dominante”.

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O estudo era visto predominantemente como algo pertencente a elite e para a

“sociedade maranhense de base agrária, nas primeiras décadas do século XX, a escola pouco

representava.” (BULCÃO, 2002, p. 42) O ensino não possuía uma abrangência maior em virtude

da necessidade de sobrevivência que as pessoas de camadas populares tinham, não podendo

freqüentar ou mesmo permanecer por muito tempo na escola para completar seus estudos.

Este período representou alguns avanços para a instrução feminina, com um maior

número de estabelecimentos públicos e privados e a criação da Escola Normal que atraía

principalmente as mulheres para o magistério. Esse quadro tornou-se alvo de muitos debates, pois

a opinião masculina acerca do ensino feminino causava bastante polêmica em São Luís e os

jornais, um dos principais meios de difusão do pensamento da época, eram os palcos dessas

polêmicas discussões.

Como nessa opinião do jornal Avante, de 08 de fevereiro de 1910:

Será talvez desagradável para o marido que uma dona-de-casa ignore por completo a história, a psicologia, a ciência, mas será bem pior se ela não for capaz de dirigir a sua casa, de educar seus filhos e de cuidar do bem estar dos seus e da higiene caseira [...] não basta que a futura dona-de-casa saiba preparar mais ou menos gostosamente os alimentos; é preciso que saiba em que medida eles reparam as forças e quanto rendem a comparação do seu custo.

Constantemente reforçava-se, através dos veículos de comunicação da época, a idéia

da incapacidade feminina para os estudos de ciências exatas e a inutilidade desses estudos para os

afazeres domésticos: “Para que a mulher precisa saber aritmética, álgebra e geometria? Para

que diabo precisa saber biologia, antropologia, física e química?”. (O Combate, 15 de out. de

1906). No entanto, a opinião masculina convergia em um ponto: era necessário melhorar a

educação doméstica das moças, que por sua vez viam-se destinadas a serem boas esposas e mães.

A educação feminina era vista com muita cautela até mesmo por seus defensores,

pois era preocupante ver na mulher que estuda um aspecto “masculinizante” ou de perda da

“essência feminina”. A mulher, por intermédio da instrução, estaria por ocupar cargos dantes

ocupados apenas por homens e essa situação mostrava que os homens deveriam ter precaução

com o que era ministrado nas aulas. Abaixo, um exemplo de como a instrução poderia abrir

espaço às mulheres, gerando concorrência com os homens e que era visto como perigoso e uma

ameaça.

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De alguns anos para cá, o número de senhoras que se dedicam à arte de curar,doutorando-se em medicina ,aumenta de uma maneira prodigiosa. Na lista dos estudantes de medicina das faculdades européias e americanas, sobretudo do norte, o elemento feminino figura sempre com um contingente numeroso. Existe mesmo mulheres médicas que tem alcançado a celebridade como mme.Djire,a célebre neurologista, Lydia Rubanowich,higienista notável, além de muitas outras que vivem, especialmente, na Rússia, pátria de mme.Curie, a professora de Paris. Um país onde as mulheres médicas não eram numerosas era a Inglaterra; pois bem, agora as loiras miss estão se dedicando com afinco ao mister clínico. Segundo afirma o ‘Progrès Medical’ existem atualmente 750 mulheres que exercem praticamente o a medicina na Grã-bretanha, como internas chefes de clínica médicas de hospícios, escolas, instituições de caridade, etc. Ainda mais: há em Londres um hospital, construído à moderna, possuindo sessenta leitos, e que é dirigida exclusivamente por senhoras portadoras da esmeralda simbólica.. (A AVENIDA, 20 de out. de 1909)

A capacidade cognitiva da mulher era constantemente posta em xeque, situação essa

que servia de justificativa para que tais mulheres pudessem se desviar de conhecimentos

considerados muito elevados para sua capacidade cognitiva, e essa concepção era muito

difundida nos jornais e falas de autoridades, a exemplo do discurso proferido pelo Dr. Justo

Jansen Ferreira na Escola Normal por ocasião da entrega de diplomas em 1910:

É tempo, portanto, para deste lugar enaltecer o impulso da mulher maranhense tem dado ao ensino primário. Com este intento, embora, à primeira vista pareça paradoxal, posso tratar da brilhante e instrutiva conferência que o grande sociólogo italiano Ferrir fez no Rio de Janeiro para demonstrar cientificamente a inferioridade intelectual da mulher. O grande jurista da península itálica sustentou a sua tese, fundando-se no caráter anatômico do crânio, comparando a capacidade e a configuração do mesmo, no homem e na mulher, salientando, finalmente, o peso e o desenvolvimento da massa cerebral. Não pretendo combater a elevada opinião de Ferrir, aliás baseada em princípios científicos. [...] Ao fato de ocupar a mulher lugar intermediário entre a criança e o homem, pela estrutura, pela força muscular e pela voz explicam plenamente a comprovada superioridade com que ela exerce o professorado primário.

Com tais idéias tão cristalizadas na sociedade, todas as mulheres que fugissem a esse

padrão estabelecido, ou que não aceitassem ser tratadas como intelectualmente incapazes, seriam

alvo de sevaras críticas. Muitas pretendiam alcançar seus direitos civis e políticos, como o direito

a uma profissão e direito à cidadania plena através do exercício do voto.

Em 1916 na Revista Maranhense foi registrada uma matéria sobre mulheres

mineiras que decidiram fazer um requerimento à Câmara. Este documento fazia menção ao voto,

e o grupo de mulheres reivindicava a concessão ao voto feminino, ressaltando sua necessidade. O

jornal classificou essa reivindicação como um “absurdo por cima de absurdo” e que muito

provavelmente as propostas dessas mulheres mineiras não seria abraçadas por outras de outros

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estados, destacando ainda “que desse dia em diante se esfalecerá o lar que até então era o

paraíso das flores; pois a mulher poderá discernir dos ideais do marido, e sairá pelas ruas

pedindo votos para seu partido e contra o partido de seu esposo.” (REVISTA MARANHENSE,

nov. de 1916)

A sociedade recebia a idéia do voto feminino como uma certa ameaça ao lar, visto

que as eleições poderiam representar saídas mais constantes da mulher para o ambiente público

freqüentados até então apenas pelos homens.

O discurso normativo dos papéis femininos, antes defendidos pela Igreja, ganhava

cada vez mais o reforço da ciência, que contribuiu para enquadrar as mulheres em estereótipos.

Podemos observar a incorporação desses valores masculinos como verdade incontestável, numa

clara demonstração daquilo que o sociólogo Pierre Bourdieu (2005) chamou de “violência

simbólica” ou “violência suave”, “invisível e insensível” a suas próprias vítimas, em que a lógica

da dominação concentra-se no discurso dentro da unidade doméstica.

O jornal maranhense A Reação de agosto de 1913, realizou entrevista com uma

mulher de classe média de São Luís, Nirvana Bittencourt Chã, interrogando sobre os mais

diversos valores que a mulher deveria considerar, questões acerca do lar, família, livros e os

assuntos que seriam capazes de ilustrar o papel feminino:

Jornal A Reação: -Qual sua opinião sobre o lar? Nirvana Bittencourt: - O lar... é o céu da vida terrena, berço dos filhos e túmulo dos velhos, onde aqueles aprendem a ser fiéis, disciplinados, obedientes e honrados, se a família é constituída segundo os princípios da moral católica. Jornal A Reação: - Que julga ser a felicidade da mulher casada? Nirvana Bittencourt: - Casar-se é, dizem, comprar um bilhete de loteria, pode, no entanto a mulher encontrar, sempre a felicidade no casamento, desde que se conforme com a boa ou má direção dada pelo marido à vida comum de casal. Jornal A Reação: _ Que pensa dos livros modernos no ponto de vista da educação intelectual da mulher? Nirvana Bittencourt: Livros, há, que a mulher é melhor desconhecer e dessa espécie existem muitos entre os modernos.

Nota-se nesta entrevista a incorporação de uma visão sobre o feminino sem aparente

questionamento, tendo a religião um papel ainda importante para que os valores fossem

absorvidos pela família de forma que esta fosse bem estruturada. A entrevistada colocava a

felicidade do casamento por meio de uma condição, a de que a mulher se conformasse com o

direcionamento do marido no matrimônio, fosse ele bom ou ruim, o homem deveria ser o cabeça

da relação e a mulher se conformar com o papel de costela, que lhe foi designado na Bíblia.

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Dessa forma, “percebida e constituída como frágil, a mulher precisa ser protegida e controlada.

Toda e qualquer atividade fora do espaço doméstico poderia representar um risco” (REIS, 1994,

p. 453)

Como já salientado, havia uma defesa da responsabilidade materna na justificativa da

instrução das mulheres, futuras mães, reforçando a concepção de uma educação voltada para o

espaço doméstico, voltada para a grande missão atribuída à mãe de educar seus filhos e filhas,

seria muito importante que a mulher soubesse como conduzir a menina com a criação certa.

Como observa-se na matéria do Jornal A Lanterna, de 29 de setembro de 1918:

Deixe a mãe educadora que sua filha se expanda com toda candura da sua inocência. Essa inocência que deve zelar, com todas as suas forças, evitando-lhe as más companhias. [...] As tendências que mais cedo se desenvolvem na menina, são o orgulho e a vaidade. Essas tendências que no dizer de muitos são vícios orgânicos das mulheres que mais tarde, quase sempre, vão causar a desgraça do marido e a infelicidade dos filhos. [...] Que em vez de ter orgulho e vaidade de fitas, rendas e mais frivolidades, tenha vaidade de ser boa, refletida e instruída, sem contudo ser pedante.

Alguns jornais mostravam que a entrada da mulher em discussões diversas, poria a

ordem do lar em sério conflito, pois a grande ameaça seria a independência feminina, que poderia

ser alcançada por meio da educação, do voto, da freqüência da mulher nos espaços públicos, e

isto representava ameaça a estrutura da família. Um outro atributo negativo associado ao

feminismo estava ligado à mulher brutalizada e feia, pelo fato de estar se inserindo em discussões

genericamente masculinas, dizia-se que a mulher perderia a beleza e atrativo do sexo. Para que o

feminismo fosse moralmente aceito deveria estar enquadrado na visão de que a mulher deveria

estar preparada intelectualmente para colaborar junto ao homem e nunca independente dele.

Em discursos, falas e mensagens de autoridades o tema educação estava sempre

presente, em maior ou menor grau. Contudo, em grande parte das questões suscitadas ficavam

somente no nível do debate, não havendo propostas contextualizadas e realmente desafiadoras

para educação no Maranhão.

Assim, cabia às mulheres um papel de destaque a ser desempenhado no lar, e a

escola como instituição normativa, deveria atraí-la para o lar. A instrução seria considerada a

verdadeira preparação da mulher para desempenho de sua contribuição ao desenvolvimento da

nação, ou seja, era sumariamente importante que a mulher soubesse bem desempenhar seu papel

diante da sociedade. Seria a partir do espaço privado que a mulher daria sua mais importante

contribuição social, organizando a família e o bem viver desta. (OLIVEIRA, 1994, p.64).

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Nessa conjuntura social do início da república, em que o homem procurava cada vez

reafirmar-se enquanto “macho”, o chefe da família e do Estado, preocupado com essa maior

inserção das mulheres no espaço público, eram constantes as tentativas de enquadrar as mulheres

no espaço privado. Os jornais foram amplamente utilizados com este fim, isto é, regulamentavam

as ações femininas por meio de artigos que ressaltavam a boa qualidade da mulher que dividia

sua nobre missão entre dona de casa, mãe, esposa.

De forma geral, a educação formal ofereceu avanços para a mulher. A inserção, ainda

que lenta e gradual, em espaços e diálogos, no trabalho e no ambiente público são reflexos das

oportunidades abertas às mulheres por intermédio de sua formação.

3.0 A BOA ESPOSA, MÃE DE FAMÍLIA E DONA DE CASA

A passagem do século XIX para o XX trouxe modificações na estrutura da sociedade

brasileira, reforçando ideais burgueses da família, do casamento e do papel da mulher na

sociedade.

Do ponto de vista político, algumas dessas mudanças estavam explícitas na

Constituição Republicana que era o marco dessa nova ordem.

A Constituição inaugurou o sistema presidencialista de governo [...] Fixou-se o sistema do voto direto e universal, suprimindo-se o censo econômico. [...] A Constituição não fez referência às mulheres, mas considerou-se implicitamente que elas estavam impedidas de votar. [...] Extinguiu-se a pena de morte [...] Estado e Igreja passaram a ser instituições separadas. (FAUSTO, 2002, p.141).

No século XIX cristalizou-se a imagem da mulher como rainha do lar, que trazia para

si toda responsabilidade com as atividades do seu “reino”, como por exemplo, o cuidado dos

filhos, a alimentação, a higiene, a implantação de valores religiosos no seio do lar, a unidade

doméstica de uma maneira geral. O novo século lançou algumas exigências sobre as mulheres,

como a sabedoria para atrair o marido ao aconchego da casa, para educar melhor os filhos, sendo

uma esposa bem disposta, amável e sobretudo silenciosa. Essas imagens e ideais foram

importantes na formação das perspectivas sobre as mulheres no início do século XX.

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A educação era a grande reforçadora desses ideais, contribuindo para que a mulher

soubesse seu papel na estruturação da família. A educação formal, até então menos exigente

intelectualmente para a mulher, teve seus campos de estudo alargados. Ao lado da manutenção

das disciplinas femininas como as “Ciências Domésticas”, “Prendas Domesticas”, “Corte e

Costura” dentre outras, estava a inclusão das disciplinas que os meninos estudavam, como pode

se observar pelo currículo da Escola Normal de São Luís, criada em 1890, com as seguintes

disciplinas:

1º Gramática Portuguesa e Literatura Brasileira e Portuguesa 2º Aritmética e Álgebra 3º Geometria e Trigonometria

4º Elementos da Física, Química e Minerologia 5º Elementos de Botânica, Zoologia e Geologia 6º Geografia Geral e do Brasil 7º História Geral e do Brasil 8º Pedagogia e Instrução Moral e Cívica 9º Desenho 10º Música 11º Costuras, Bordados e princípios de economia. (IMPRENSA OFICIAL, 1890)

No caso desta última disciplina, de prendas domésticas, era exclusivo para as mulheres, do

primário ao secundário.

À mulher destinava-se o ensino de seu “dever”, perpassando pelos atributos de generosidade

considerada de essência feminina e que mantinham uma relação não com a mente (atributo

exclusivamente masculino), mas com o coração, área tipicamente direcionada para a mulher pelo papel do

sentimentalismo que foi convencionado.

À querida Amiga, a Mulher generosa, sem reservas, previdente e providente, a quem eu devo tudo e cuja doce e tocante imagem, tão suave quanto de indizível o homem pode dever à mulher; e cuja doce e tocante imagem, tão suave quanto bela, espelho fiel da sua alma paregrina, eu tinha invariavelmente em mente, ou melhor, no coração. (CASTRO, 1921, p.121)

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3.1 Perfis femininos: entre o ideal e o real

A mulher do novo século encontrava-se envolvida por uma esfera que, diante das

diversas mudanças trazidas pela ordem política e pela aceleração do processo de urbanização,

padronizava o perfil da mulher num modelo de perfeição para aquela sociedade, sendo

responsável pelo equilíbrio da família e da nação.

O dever ser das mulheres brasileiras nas três primeiras décadas do século foi, assim, traçado por um precioso e vigoroso discurso ideológico, que reunia conservadores e diferentes matizes de reformistas e que acabou por desumanizá-las como sujeitos históricos, ao mesmo tempo que cristalizava determinados tipos de comportamento convertendo-os em rígidos papéis sociais. (MALUFF; MOTT, 2006, p. 373 )

Em uma época marcada por novos espaços para a mulher, especialmente as de

segmentos médios e altos da sociedade, era necessária a formulação e difusão de imagens da

mulher ideal, encaixando-as em atividades que a reportassem para o seu “reino”. Foi a partir de

então que o século XX reforçou o tripé filha, esposa e mãe. “Assim, se ao marido cabia prover a

manutenção da família, à mulher restava a identidade social como esposa e mãe. A ele, a

identidade pública; a ela, a doméstica”. (MALUF; MOTT, 2006, p.379).

Referindo-se ao tipo de comportamento feminino que deveria ser desenvolvido, a

Revista Elegante constantemente traçava um perfil de mulher a ser seguido. Com a concepção de

candura e inocência, fruto da mentalidade cristã, medieval e ocidental, as mulheres eram

enquadradas em dois modelos bem definidos: o de Eva, a pecadora, e o de Maria, a redentora. A

revista supracitada traz um exemplo daquilo que a sociedade maranhense esperava de uma

mulher:

A mulher na família. A infância da mulher é a mais santa e a mais pura fase de sua existência: é quando ela é virgem. [...] Finalmente ela é a mulher, isto é, deixa de ser a virgem para chamar-se ‘esposa e mãe’, duplo qualitativo que lhe confere o mais elevado grau no importante ministério que lhe destinou na terra o Criador. (REVISTA ELEGANTE, de 30 de jun. de 1893, n.° 16, ano II) Grifo Nosso

Esses três qualificativos foram constantemente utilizados para dar significado ao

modelo feminino esperado pelos homens. Quando solteira, sua grande virtude era ser virgem e

pura, e a partir do momento em que casa-se sua imagem era compreendida pela figura de esposa

e mãe, entendida sempre como a concretização de sua missão divina.

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Desde o decorrer do século XIX que a situação feminina vinha sofrendo alterações, as

quais foram significativas para as formulações do século XX. Da abertura do espaço doméstico

para a realização de bailes e saraus, oportunizando um contato maior das mulheres com a vida

social, até o passeio pelas ruas e avenidas dos centros urbanos, acompanhadas ou sozinhas, para o

espanto da sociedade no início do século XX, os avanços em relação à emancipação feminina

foram acompanhados com preocupação e tentativas de disciplinamento.

A mulher de elite passou a marcar presença em cafés, bailes, teatros e certos acontecimentos da vida social. Se agora era mais livre [...], não só o marido ou o pai vigiavam seus passos, sua conduta era também submetida aos olhos atentos da sociedade. (D’INCAO, 2006, p.228)

A própria diferenciação cada vez maior de público e privado, da frequência de

amigos e parentes que visitavam o lar, das saídas femininas, fez com que recaísse sobre as

mulheres exigências educacionais e comportamentais, ao mesmo lado da rigidez dos costumes

patriarcais que se pretendia manter. Além dos tradicionais vigilantes do comportamento feminino

(família, igreja) estavam aqueles que observavam as mulheres no espaço público, ou seja, toda a

sociedade tornava-se guardiã dos passos femininos, bem como os olhos da lei.

Educação como contribuição na formação da mãe ideal, na verdade ela é usada como

arma para que as mulheres soubessem como exercer com propriedade o papel de mãe, na sua

contribuição com a pátria através da formação de bons cidadãos.

Esses papéis eram importantíssimos uma vez que dupla função era responsável pela

base da sociedade brasileira, a família. A estruturação do lar, criação dos filhos (futuro da nação)

eram atributos femininos considerados por muitos como uma missão, responsável pela

implantação da fé, do amor e da religião cristã católica no seio do lar. A concepção de que a

mulher tinha um importante papel a desempenhar na sociedade, por meio de sua casa, era nutrida

pela idéia de sua influência com a educação de seus filhos.

Em virtude do caráter “missionário” que toda mulher virtuosa teria que desempenhar

dentro do lar, esta era considera como santa, seguindo os desígnios da Igreja e se enquadrando

em um estereótipo perfeito de mulher, cultivando os atributos tidos como essencialmente

femininos, pois a vida fora do lar teria o efeito de virilizar a mulher.

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Ignoro o que ganhará o sexo forte em encontrar em toda parte exceto no lar, a mulher que ele desviou de seu destino. Mas ser o que perderá a mulher com esta abdicação e usurpação. À seus deveres estão ligados seus privilégios; se ela abandona uns, perderá os outros. A mulher masculina é uma espécie de fenômeno, e afasta de si toda a simpatia. (REVISTA FEMININA. O Feminismo, out. de 1916, N°29, p.12)

Entretanto, a sociedade não estava repleta de “santas mulheres”, era comum se ter

notícias daquelas que não deviam ser imitadas, que viviam mais em contato com o meio público

do que com o ambiente interno.

No geral essas mulheres eram de classes baixas e precisavam dedicar-se à

subsistência submetendo-se a trabalhos como empregadas domésticas, lavadeiras, engomadeiras,

doceiras etc., visto que o grau de instrução era baixíssimo ou inexistente. A necessidade de

trabalho fora do lar fazia com que estas mulheres não tivessem o tempo “necessário” para o

cuidado do lar e dos filhos que muitas vezes as acompanhavam em suas lides, haja visto a falta de

estrutura por parte do Estado que garantisse o cuidado das crianças na ausência das mães

trabalhadores, com a oferta de creches, por exemplo. Este “abandono” era visto como

responsáveis pelos lares desestruturados, bem como tendo efeito na formação dos filhos e seus

aspectos higiênicos.

Nessas famílias, em que as mães precisavam trabalhar, a alimentação e moradias

eram precárias, sem as mínimas condições de higiene, eram atribuídas à ignorância dos pobres.

Os jornais por vezes registravam a situação desses lares e a responsabilidade da situação era

colocada diretamente sobre a mãe.

Assim, o discurso republicano insistiu na ampliação do ensino, inclusive para

mulheres pobres, e parte do objetivo educacional destinado a essas mulheres estava na preparação

para se tornarem mães conscientes de suas funções.

As mães eram entendidas como multiplicadoras de conhecimento, de valores como a

honra, a verdade e a religião para seus filhos e principalmente para suas filhas. O destino de lares

futuros estariam nas mãos das mães que transmitiriam os conhecimentos básicos para a formação

da futura mãe e esposa. Mães que ensinassem suas filhas a se afastarem do orgulho, soberba,

vaidade, mentira, mundanismo, amizades erradas, conversas à toa, e qualquer outro fator que

pudessem desviar a conduta moral de uma menina.

Com a preocupação de bem orientar a mulher frente ao molde burguês-cristão, foi

elaborado o livro A Alma: Educação Feminina, de autoria do maranhense Coelho Neto, para

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direcionar a educação de meninas, destinando-se à conselhos apoiados em valores ‘morais e

cívicos’ vigentes.

Esta obra fazia uma elaboração do perfil de mulher a ser seguido pelas meninas,

instruindo acerca de vários prismas, como a questão da amizade, organização, higiene pessoal,

beleza, e todo um conjunto de quesitos influenciadores no processo de formação do caráter da

menina.

Segundo essa obra, a indiscrição é vista como a denúncia de “falha no caráter, que

deve ser inteiriço, por que é a couraça da honra [...] A boca, uma vez aberta, é a porta por onde

escapam todos os pensamentos se a Prudência não está de guarda para correr o ferrolho a tempo”

(COELHO NETO, 1911, p.27).

Deste pequeno trecho do livro, pode-se extrair uma palavra-chave, a “honra”. O texto

denota que a mulher honrada não deve ter nenhum defeito de caráter. Sendo costume considerar a

tagarelice uma característica feminina, e, portanto, um defeito, a mulher deveria saber a hora

certa de falar, denota um conselho para as normas de civilidade e controle dos “desregramentos

femininos”.

O perfil perfeito de mulher seria aquela capaz de prevenir-se quanto ao seu futuro, “a

mulher deve prevenir-se com uma reserva para o que possa acontecer de surpresa. Os dotes

melhores e mais seguros são o que dão o estudo, a experiência e o conhecimento da vida”

(COELHO NETO,1911, p.79). Não era negada a importância da instrução formal, desde que ao

lado desta estevesse a elaboração dos valores necessários à nova mulher, e que o estudo servisse

para obtenção de seu sustento em caso de falta de um apoio masculino, ou como refinamento para

ser uma boa esposa e mãe, ou seja, para exercer papel complementar junto ao homem.

A obra aborda também temáticas sobre conselhos de união familiar, amizade, ordem,

a simplicidade do traje, dicas para que as meninas aprendessem os elementos serenos embasados

na natureza. Destacava a missão da mulher na terra onde cada personagem dentro da história

tinha o espaço que lhe cabia “faça cada qual o que lhe compete e cumprirá a sua missão na terra.

À mulher cabe o governo da casa e nele está compreendido o preparo da geração futura”

(COELHO NETO, 1911, p.91).

A simplicidade era entendida como um atributo necessário para a menina, nada de

luxo no vestir, “nos dias comuns, os vestidos devem ser como as folhas: simples, mas limpos e

graciosos” (COELHO NETO, 1911, p.126). E ao lado da simplicidade estava mais uma vez a

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advertência com as conversas, pois a mulher perfeita lançava-se em conversas somente com

aquelas que eram igualmente instruídas, tendo que livrar-se das conversas que aviltavam.

A educação era vista como porta para elaboração da nova mulher, notadamente aquela

realizada nas escolas Coelho Neto elevava o papel da professora junto à menina, explicando que a

“professora fará a aluna apurar das narrativas a suma da moralidade e, leitura ou recitação, sempre

atenta aos valores prosódicos e explicando o sentido das palavras, procurará influir-lhes o gosto pela

boa linguagem” (COELHO NETO, 1911, p.03). A ligação do papel feminino com a pátria também era

ressaltado por Coelho Neto, ao afirmar que:

E à mulher, minha filha, o ser fraco, cabe a responsabilidade maior nesse trabalho, por que, como o senhor, no dizer dos livros, criou a alma do Homem infundindo-lhe no corpo o seu hálito divino, a mulher mãe deve inspirar ao coração do filho o bom exemplo, que é o gérmen da perfeição. Por isto convém que a educação da mulher seja guiada com todo escrúpulo, por que o seu destino na terra é continuar a vida, perpetuando o amor. (COELHO NETO, 1911, p.140)

Este livro era incentivador da instrução feminina, mas com a ressalva que fosse

feita com muito cuidado, para que a menina seguisse seu “passo natural” e que não se

fadigasse muito na leitura. “Se fizeres os teus estudos com o devido cuidado aproveitarás o

tempo sem cansar o cérebro [...] Tens ânsia de saber? Estuda. O livro deve subir ao cérebro

em essência – não em palavras, mas em idéias” (COELHO NETO, 1911, p.98/99)

As virtudes femininas deveriam ser refletidas na sociedade para benefício dos

homens. Ser bela para seduzir, ser verdadeira para esclarecer, coforme sua bondade, era o que

indicava a obra de Gomes de Castro, intitulada As Raças Humanas – A mulher da qual extraímos

o seguinte trecho.

Ora, a divindade feminina, por isso mesmo que o é, é bela, verdadeira e boa, a uma tempo: bela como a beldade; verdadeira como o axioma; e boa como a virtude. Como bela, nos seduz; como verdadeira, nos esclarece, e nos aperfeiçoa para o bem, o fito da sua bondosa natureza. (CASTRO, 1921, p.127)

Esta obra ressalta alguns dos dotes morais e físicos que deviam ser cultivados pelas

mulheres com “honra e louvor”, valorizando aquelas que não se importavam com a vaidade,

ressaltando o poder milagroso do amor.

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3.2 Ser mãe

Não bastava aprender sobre o ofício de ser mãe, era necessário tornar-se uma

efetivamente. Fato, este, que se transformava num dilema para aquelas mulheres que não

poderiam concretizar esse papel. Na obra literária de Josué Montello, que estamos utilizando

neste estudo, o romance Pedra Viva são apresentadas duas situações de mulheres casadas que não

podem ter filhos. Uma delas, Almerinda, faz promessas e mais promessas para alcançar esta

graça no matrimônio e reabilitar-se perante a sociedade, submetendo-se até mesmo ao “coito

diário” como se fosse um dever a ser cumprido dando inclusive o que falar na vizinhança.

A outra personagem, Odete, por não conseguir engravidar, inventou uma falsa

gravidez e no momento que seria do suposto parto, uma menina retirada da roda dos enjeitados

foi apresentada como filha legítima do casal. Esses exemplos indicariam a importância atribuída

à maternidade e os sacrifícios que uma mulher poderia fazer para ser cumpridora da “grande

missão” feminina na terra.

Uma obra literária não pode ser tomada como a verdade para análise de fatos

históricos, no entanto, apresenta fortes indícios de que tais pensamentos permeavam a sociedade

ludovicense, haja visto a semelhança dessas idéias com as que eram veiculadas nos meios de

comunicação da época e que podem ser encontrados diversas documentações produzidas no

período.

De forma geral podemos notar que a sociedade se encarregava de imbuir

constantemente sobre a mulher os papéis que deveria desempenhar. Isto ocorria com tal

intensidade, que denota uma necessidade de criação de um modelo. seria como se as mulheres

com o maior contato com público, com maior grau de instrução, estivessem interessadas a outros

atrativos que a vida fora do âmbito do lar proporcionavam e isto poderia significar uma mulher

fora dos padrões requisitados para a “mulher perfeita”. Daí a insistência em manter atualizado o

discurso da submissão feminina, destacando sempre seu aspecto “naturalizado”.

Na verdade, havia o receio de que a mulher perdesse sua “identidade materna” por

meio do contato com a rua ou com os estudos mais avançados. Dentro desse contexto, houve o

reforço de um modelo de mãe que estaria ligado ao exemplo cristão maior, Maria. A mãe de Deus

surgiria na imagem feminina como a redentora e fora desse padrão a mulher estaria enquadrada

por meio da pecadora Eva.

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A mulher não é mais identificada à serpente do Gênesis, ou a uma criatura astuta e diabólica que é preciso por na linha. Ela se transforma numa pessoa doce e sensata, de quem se espera comedimento e indulgência. Eva cede lugar docemente a Maria. A curiosa, a ambiciosa, a audaciosa metamorfoseia-se numa criatura modesta e ponderada, cujas ambições não ultrapassam os limites do lar. (BADINTER, 1985, p. 176)

Seguindo o exemplo de Maria, a mãe que abriu mão de sua própria vida e que

entregou-se totalmente ao seu sacerdócio, a mulher então deveria priorizar seu lar acima de tudo,

seu recôndito e reino. Sendo assim, apesar da imagem laica da República, o papel exercido pela

igreja na cristalização da imagem feminina atrelada à de Maria era fundamental, e as qualidades

marianas deviam estar presentes em todas as concepções de mulher ideal, repassadas para as

mulheres por via da educação formal ou não. Deixar os prazeres e viver a resignação de uma vida

devota aos seus filhos eram sinônimos de uma mãe perfeita, o tipo de cidadão que a nação

esperava seria formado a partir dos ensinamentos no lar, pois na mãe estaria a responsabilidade

pela formação dos cidadãos ativos.

O amor de mãe é o cofre dos mais santos afetos, o poema de cruciante dores e a grinalda de doces sorrisos! A mãe é um ente consagrado a seus filhinhos, desde o primeiro estremecimento que lhe agita o seio, até o último sopro de vida que lhe cerra os lábios. O amor de mãe vive da vida desses queridos e todo se enleva de suas graças e de seu sorrisos. – Com que ternura e meiguice olha se devota a seus filhinhos senhores de seu coração! (O TOCANTINS, 01 de ago. de 1915)

É interessante notar como o jornal apresenta um discurso repleto de adjetivos para a

relação mãe e filhos, desde o sofrimento que a mãe passaria em prol dos seus, até a sensação de

bem estar proporcionada pelo privilégio de ser o “ente sagrado” de seus filhos.

A educação feminina era direcionada para o exercício de sua contribuição social de

esposa e mãe, o matrimônio era entendido como o primeiro momento de realização da mulher. O

processo educacional cada vez mais voltado para as mulheres gerava um certo conflito e

preocupação, uma vez que temia-se que essa mulher cada vez mais recebendo conhecimentos

científicos, em vez de envolver-se somente com aquilo que corroborasse sua missão de mãe,

fosse estimulada a desenvolver outras atividades, como a profissional, o direito ao voto, ao

partidarismo político, etc.

De certa forma, era temido que a mulher ao aceitar e vivenciar propostas do ambiente

externo ao lar, perdesse sua essência e se desviasse de sua missão em virtude do saber e da

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participação política. Os resultados dessa ação poderiam ser os mais desastrosos, pois corria o

sério risco de desvinculação da mulher com os assuntos de interesse da família, considerada base

de toda nação e tendo na mulher um importante pilar.

À mulher cabia a organização da família e a partir do momento em que a esposa e mãe

passasse a se envolver em muitas atividades fora do ambiente considerado seu por natureza, o lar,

o espaço da mulher ficaria vazio e suas atribuições seriam levadas a segundo plano.

No caso do voto feminino, o forte argumento para sua negação era a divisão dos

interesses dos cônjuges, levando ao desentendimento do casal, e por consequência, a

desestruturação do lar e da educação dos filhos. A plena cidadania com a efetiva participação

política para as mulheres, era entendida como uma competição aos seus afazeres, uma vez que o

discurso republicano exaltava a considerada missão feminina, maximizando sua importância para

o meio social.

Alguém dirá, que desse dia em diante se esfalecerá o lar que até então era o paraíso das flores; pois a mulher poderá discernir dos ideais do marido, e sairá pelas ruas pedindo votos para o seu partido e contra o partido de seu esposo.Assim o resultado será discussões diárias, e má viver entre os dois, porque não se entenderão.Não duvido que isso aconteça (REVISTA MARANHENSE, nov. de 1916)

A educação seria uma importante arma na formação das futuras mães, mas para tanto,

deveria ser bem administrada e bem direcionada. Os jornais ludovicenses contribuíram fortem

ente para o direcionamento daquilo que a sociedade requisitava como de uma boa mãe. Matérias

nos mais diversos jornais chamam a atenção para a formação de uma mãe que pretendia-se ideal,

e justamente a mulher “na condição de donas de casa, jamais poderiam ultrapassar seus limites,

pois caso isso acontecesse seriam virtualmente corrompidas, sendo que a estrutura familiar seria

fatalmente abalada”. (MARTINS, 2004, p.12).

Com a educação e a mudança de alguns dos costumes na sociedade, a mulher estava

ultrapassando os limites do lar. Ao mesmo tempo, a mulher de elite entraria mais em contato com

os acontecimentos do espaço público estaria também mais envolvida pela vigilância masculina e

das instituições sociais, como igreja, a própria família, os médicos, a justiça, a escola. Todos os

critérios que formulariam uma mulher para dedicar-se ao sacerdócio materno deveriam ser bem

efetivados, pois “aquelas dotadas de erotismo intenso e forte inteligência, seriam despidas do

sentimento de maternidade, característica inata da mulher normal, e consideradas extremamente

perigosas.” (SOIHET, 2000, p.363).

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Envolvidas pelos valores que tornariam as mulheres aptas ao cargo da mãe, era

importante que a mãe moderna adquirisse alguns hábitos como higiene corporal, limpeza e

exercício físico, o que justificava uma maior presença dos médicos a partir do século XIX,

contribuindo fortemente para implementação desses fatores. (BADINTER, 1985, p.207). Hábitos

higiênicos deveriam ser acrescentados à área de interesse feminino, porque “o mundo feminino é

o mundo do orgânico e para descreve-lo é preciso falar a linguagem da medicina e da higiene”

(PERROT, 2005, p.177).

A forte influência da medicina na vida dos moradores urbanos de classe média, fez

com que muitas alterações ocorressem na formação e estrutura familiar. Novas regras para as

relações matrimoniais foram estabelecidas e uma das primeiras mudanças aconteceu em relação à

escolha do cônjuge, pois, por questões higiênicas passou-se a condenar as uniões consangüíneas,

e o casamento entre mulheres jovens demais com homens velhos demais (COSTA, 1979, p.220-

221). A prioridade no matrimônio seria antes de tudo com relação à prole, “a seleção do parceiro

conjugal tornou-se uma questão capital para a higiene. A saúde do filho não dependia apenas do

trato que lhe fosse dado após o nascimento. Ela estava condicionada à saúde dos pais. [...] O

cuidado com a prole converteu-se, por esta via, no grande paradigma da união conjugal”.

(COSTA, 1979, p.219).

3.4 Ser esposa e dona de casa

O matrimônio como instituição, consagrava-se no interior do lar. Era nele que as

relações de poder eram efetivamente estabelecidas. A própria casa possuía espaços de

diferenciação, pois “na casa, coexistem lugares de representação (o salão burguês), espaços de

trabalho masculinos (o escritório onde a mulher e os filhos só entram na ponta dos pés). A

fronteira entre público e privado é variável, sinuosa e atravessa até mesmo o micro-espaço

doméstico” (PERROT, 1988, p.180). Como ao homem cabia bem mais o ambiente da rua, o

espaço que lhe era destinado dentro do lar era sempre ralacionado a suas atividades públicas,

como por exemplo a biblioteca e o escritório.

Segundo Fábio Lessa, em sua obra Mulheres de Atenas: Mélissa do Gineceu à Agorá,

lares da cidade de Atenas, da Grécia Antiga, possuíam também claras definições do meio que

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cabia à mulher e ao homem. A este era destinado o local da residência mais próximo do contato

com a rua e no geral as casas possuíam uma parte térrea e outro piso. Aos homens era destinado o

térreo, pois o contato com a rua era facilitado, já à mulher cabia então o andar de cima limitando

seu contato com a rua.

Decálogos formulados para educação da mulher casada foram divulgados pelas

revistas destinadas ao público feminino de todo país. A Revista Feminina, um importante

periódico do São Paulo, prescreveu alguns critérios destinados à boa esposa, apresentados como

“mandamentos”.

Decálogo da esposa I – Ama teu esposo acima de tudo na terra e ama teu próximo da melhor forma que puderes [...]; II – Trata teu esposo como um precioso amigo; como um hóspede de grande consideração [...]; III – Espera teu esposa com o lar sempre em ordem e o semblante risonho; mas não te aflingas excessivamente se alguma vez ele não reparar nisso; [...] X – Se teu esposo se afastar de ti, espera-o. Se tardar em voltar, espera-o; ainda mesmo que te abandone, espera-o! Por que tu não é somente a sua esposa; es a honra do seu nome. E quando um dia ele voltar, há de abençoar-te. (REVISTA FEMININA, outubro de 1924, apud. MALUFF; MOTT, 2006, p.394 )

Percebamos que a idéia principal do exposto no texto acima, relaciona-se com a total

fidelidade da mulher para com o seu marido. Primeiro no que diz respeito ao amor, pois nada e

ninguém deveria tirar o lugar destinado ao marido no coração da esposa. A idéia de “hóspede”,

também poderia remeter a dois aspectos: o primeiro, apresentando o homem quase como um

estranho no ambiente doméstico, haja visto que a maior parte do tempo era passado longe deste

espaço, no escritório ou na rua; o segundo aspecto refere-se ao tratamento privilegiado, em que se

procurava agradar ao máximo, evitando aborrecimento ao marido. Logo o texto mostra que ao

chegar em casa, o esposo deve encontrar tudo na mais perfeita ordem, incluindo a própria esposa

que deve recebê-lo com ar de alegria, e por fim, mesmo que o esposo decidisse abandoná-la, ela

deveria esperá-lo com total fidelidade, dando a prova cabal de sua resignação.

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À GUILY Dia Do Seu Casamento Essa alegria que mostras Ao lado do esposo amado, Que com carinho sagrado Bem te soube cativar, Seja eterna e venturosa Por longos anos querida, Que o amor te enfeite a vida Na senda que vais trilhar. (MATTOS, 1899, p.95)

Algumas palavras na análise da primeira estrofe do poema são contundentes quanto

aos rumos que as mulheres deveriam tomar no seu relacionamento conjugal. “Alegria” e “carinho

sagrado” eram sentimentos que deveriam parecer comuns entre as mulheres próximas do

casamento, pois a presença do “esposo amado” faria parte da realização feminina, e diante desta

“felicidade” nada parecia mais justo que a mulher retribuir sendo terna e venturosa, cultivando

valores importantes para a boa manutenção do lar.

O casamento surge então como uma relação onde a mulher tinha sua tutela

transmitida do pai, irmão ou tio para o marido. O importante era manter a mulher sob julgo

masculino, pois “[...] por suas agitações subras nos revela que Deus fez a mulher fraca foi

confiando na generosidade do homem” (JORNAL A SINETA, 07 de set. de 1919).

A seleta alma feminina é um bonançoso céu azul, sem nuvens, um doce manancial de venturas, um lindo jardim de perfumosas flores, um plácido paraíso de magníficas delícias, um mundo de inqualificáveis maravilhas. E o gracioso corpo feminino, o adequado pedestal deste carabro peregrino. (SERRA, 1867, p.147)

O jornal O Téntame apresentou um breve histórico da situação feminina frente ao

matrimônio, explicando que “nos primeiros tempos” era entendida apenas como objeto de prazer

e que a sua natureza se encarregou de levá-la ao lar. A partir de então o homem passou a

conquistar a mulher especialmente pela força e logo se estabeleceu o casamento no regime

patriarcal.

Instituída a sociedade patriarcal, a organização do casamento variou. Ao rapto sucedeu a compra, ao poder das armas a intervenção da família, mas essa intervenção nada mais era do que comercial: os pais vendiam as filhas ao mais elevado lanço, e o casamento nada mais era do que um abrigo. Escrava era a mulher comprada, pois o marido adquiria sobre ela o direito de propriedade. Se, porém o regime patriarcal elevou a mulher, abaixou-a também: estabeleceu a união, mas privou à mulher todo direito toda liberdade. (JORNAL O TENTAME, 07 de dez. de 1919).

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No livro Alma do Sertão: Desafios a mulher julgada pelos homens, de Catullo Paixão

Cearense são apresentados uma série de opiniões masculinas sobre a mulher e de como alguns

homens gostariam que as mulheres se comportassem. Algumas concepções perpassam a idéia

cristalizada de inferioridade e dependência, de ridicularizarão da mulher e sua incapacidade de

direcionar sua vida, ou enfatizando o endeusamento por meio de elementos como honra,

castidade e etc.

A mulher é um planeta. Não tem luz própria. Vista de longe, com o telescópio da ilusão, é como a lua. Encanta! Mas, de perto, é um astro morto, sem vida. Ainda assim, ela é e será o sol do nosso sistema planetário. Quando não exerce a sua atração sobre o homem, ele, fatalmente, dispersa-se nas profundezas do Nada. (CEARENSE, 1928, p.126)

Usando a metáfora do sistema solar, apresenta a idéia de incapacidade feminina,

sendo, a mulher um planeta e seu objetivo, exercer atração sobre o homem. No entanto, a

comparação com um astro sem luz própria, um “astro morto” tentava motrar a incapacidade

feminina de auto-gestão ao mesmo tempo que sua comparação com o sol servia para mostrar sua

vitalidade em bebefício do homem.

Vejo que a mulher de hoje não vale a mulher do passado. A de hoje só quer ser doutora, professora, funcionária pública, aviadora, eleitora, senadora, deputada [...] o diabo a quatro, enquanto a outra era a doutora da casa, a funcionária da cozinha e a deputada do seu marido. Que saudade do passado, meus caros amigos! A mulher há de tornar a ser mulher, no dia em que deixar o atropelo da moda, a vaidade de ser doutora, e voltar pois, assim como vai, há de chegar um tempo em que ela não será mais nem homem nem mulher! Meus senhores: quereis a opinião de um rude sobre as mulheres? Panelas e mais panelas é o de que elas precisam. (CEARENSE, 1928, p.144/145)

Neste trecho fica evidente a preocupação do autor com a freqüência da mulher no

ambiente público, daquela que estava cada vez mais preocupada com sua profissão e que de certa

forma já não dedicava-se mais completamente ao lar, e nem limitava-se a seus muros, estudava

mais e tornava-se mais exigente na defesa do que considerava seus direitos. Essa relativa

emancipação feminina assustava os homens e os fazia sentir saudade do momento em que as

mulheres dedicavam-se exclusivamente aos filhos e lar, em que a reclusão no ambiente

doméstico era como uma garantia de sua fidelidade e dedicação exclusivas a seus filhos e marido.

Outro fator da preocupação masculina estava no fato das mulheres estarem ocupando

alguns cargos antes apenas preenchidos por homens. A educação mais primorosa que a mulher

estava recebendo, até mesmo com a chegada de algumas poucas no nível superior de ensino, fez

com que houvesse um cuidado maior com o “avanço” feminino em algumas profissões.

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É um fato que as mulheres estão nos fazendo grande mal, na competição das nossas profissões nos misteres que até agora só foram desempenhadas por homens [...]. Mas, no entanto, eu penso que a minha profissão devia ser exercida pelas mulheres e não pelos homens. Se um dia fundar um jornal, só admitirei repórteres de saia, por que a mulher, sem exceção, nasceu para repórter. Embora diminuindo-me diante do sexo fraco, gritarei com todas as forcas dos meus pulmões: a mulher veio ao mundo para fazer a reportagem dos homens. (CEARENSE, 1928, p.166)

Além da questão profissional, em que o autor demonstrou não estar satisfeito com a

atuação feminina fora do lar, aproveitou ainda para denegrir a imagem feminina em dois

aspectos: primeiro, na questão da mulher ter fama de falar muito, e, portanto, deveria dedicar-se a

profissão de reporter; e segundo, no que se refere ao homem desenvolver o papel de protagonista,

sendo que a mulher deveria limitar-se a escrever a história construída pelos homens.

A mulher é um navio. O mundo é um oceano. A todo momento, o homem está encontrando um porto de difícil entrada. Logo, o homem precisa ser um bom piloto. Conduza bem o seu navio, e verá como tudo lhe corre a vela solta.Terminando a minha opinião, só me resta dizer aos casados, aos viúvos e aos solteiros: Boa Viagem. (CEARENSE, 1928, p. 163)

Mais uma metáfora com a mulher, dessa vez com um navio que sem o condutor não

poderia navegar, este trecho também pode ser lido como uma crítica ao poder de decisão

entendido como um atributo exclusivamente masculino. Assim, a mulher precisaria do homem, e,

se este soubesse dar a devida direção ao seu “navio” seria capaz de evitar problemas na condução

da vida conjugal.

Voto a favor das mulheres, mas contra o ‘Bello Sexo’. Em mil mulheres há uma formosa, duas bonitas, três sofríveis e 994 ‘canhões’. A formosura é tão escassa, que quando aparece uma mulher, como Phyrnéa, o seu nome fica na história! ‘Bello Sexo’?! Não!! ‘Sexo Feio’. Sejamos lógicos. (CEARENSE, 1928, p.134)

A beleza também configurava-se como um importante atributo feminino para atração

masculina, e àquelas que não dispunham naturalmente de tal requisito a solução estaria em ser

limpa e higiênica. Por fim, a mulher ideal para o casamento, teria os seguintes predicados.

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UMA MULHER BOA Quando uma mulher é boa? Informe-te antes de tudo sobre a honradez de seus pais e da educação que estes lhe tem dado. Se achas que foi uma educação cristã, que quer dizer completa, podes sem receio seguir em diante. Procura então saber quais são as suas afeições, se ela prefere a igreja à exibição constante dos teatros. Aquela que é muito inclinada a divertir-se mal poderá conformar-se com as contrariedades da vida, que se encontram no estado do matrimônio e nunca poderá ser o que chamamos de uma mulher caseira. Por isso diz um filósofo: ‘Quando vais eleger aquela que há de ser tua mulher, não se procures, ó jovens entre as senhorias que ficam todos os dias passeando pelas ruas’.Pelo contrário, aquela que desde solteira foi devota e encontra consolação na oração, por força há de ser uma boa esposa e uma boa mãe. [...] Tão pouco te importa que a tua futura esposa saiba o francês. Contanto que ela entenda bem o português e saiba obedecer-te em tudo que pedires, basta. Também é preferível, que ela saiba bem costurar e cozinhar ao ter primores retóricos ou saber tocar piano e pintar e fazer versos a lua. Enfim, a mulher deve ser afeiçoada ao trabalho e acostumada à laboriosidade, uma boa qualidade mais será, ela não se importar com o que dizem os jornais nem os costumes da moda. Em resumo: Uma mulher cristã e laboriosa, eis uma boa mulher. (JORNAL A REGENERAÇÃO, 19 de jan. de 1900)

A educação mais uma vez era apontada como caráter seletivo mostrando-se bem mais

funcional. Já não era visto como interessante a mulher saber tocar piano, ou saber falar outras

línguas, o mais relevante era desempenhar seu papel de esposa, mãe e dona de casa com

propriedade, sendo laboriosa, realizando as atividades domésticas e obedecendo a seu marido em

tudo que ele pedisse. Também era importante a preocupação com seu passado no momento da

sua escolha pelo noivo, levando em consideração sua educação cristã e seus hábitos de “moça de

família”.

Para selecionar o cônjuge mais apropriado ao matrimônio, era necessário observar

alguns pontos relevantes como, por exemplo, o cumprimento dos papéis de cada um dentro do

lar. Os jornais enfatizavam bastante a preocupação que os jovens deveriam ter ao escolher seu

marido ou esposa, o jornal O Martello, de 01 de novembro de 1912, nº17, Ano II, apresentou aos

ludovicenses uma “humorada” matéria sobre aquelas pessoas que não deveriam ser escolhidas

para o matrimônio.

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Rapaz baixo é rotineiro Rapaz gordo é preguiçoso Rapaz alto é ciumento Rapaz calado é maluco Rapaz pedante é mofino Rapaz alvo é “corre-campo” Rapaz moreno é manhoso Rapaz magro é poeta Moça nervosa é preguiçosa Moça gorda é dorminhoca Moça baixa é perigosa Moça calada é bondosa Moça clara é ciumenta Moça alta é faladora.

Diante da possibilidade de formar uma família, era importante observar de que

maneira o homem e a mulher poderiam contribuir para que o lar pudesse realmente funcionar

como base da nação, e para que a família pudesse cumprir os seus deveres como a

responsabilidade na formação dos futuros cidadãos.

[...] Admiro a mulher compenetrando-se no papel de esposa e mãe, embora o lar seja pobre, sabe torná-lo feliz, já com a sua amabilidade para com eu esposo, já com os seus carinhos para com seus filhos. Admiro o homem que trabalha para a felicidade do lar, que é paciente e carinhoso com os filhos e verdadeiro amigo da esposa. O lar quando abriga duas almas nestas condições, encerra o que há de mais grato na vida. A felicidade. (O MARTELLO, O LAR, 01 de abr. de 1913, nº 25, Ano III).

O lar, ambiente entendido como base para toda sociedade, era pautado no bom

desempenho do papel do homem e da mulher. A família que tivesse uma esposa e mãe convicta

de sua missão, sendo por exemplo, amável e cuidadosa, e que tivesse um marido e pai que fosse

provedor e paciente, seria um lar que alcançaria a “felicidade”.

Por fim, a idéia de um lar feliz estava diretamente relacionada com a orientação da

esposa e mãe, devendo ela ser o equilíbrio do esposo e de seus filhos, por intermédio de seus

atributos e qualificações.

[...] Trazes para o infeliz, felicidade, E alentas o boemio lutador; Dando-lhe calma e tornando-o sonhador, Para lutar contra adversidade! Tenra qual o cântico de uma ave a voar, Sublime como uma criança a sonhar, E és da humanidade o supremu mister. E para se falar sempre a verdade, Diga-se que toda a humanidade, Depende só de um ponto, que é – a mulher. (O MARTELLO, A MULHER, 01 de jul. de 1914, N° 38, ano IV)

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CONCLUSÃO

Segundo Chartier (1994, p.108) “De maneira durável, a constrição da identidade

feminina tem-se enraizado na interiorização pelas mulheres de nromas enunciadas pelos

discursos masculinos”. A escola, um importante instruemento de transmissão de valores que

reforçam a divisão dos papéis sexuais que por sua vez estão disceminados no corpo social se

inscervendo nos pensamentos e corpos de homens e mulheres.

A educação destinada às mulheres no início do século XX estava marcada por um

paradoxo: Considerava-se que a mulher decessitava ampliar sua educação para cumprir melhor

seus papéis de esposa e mãe; por outro lado, desaprovava-se uma educação emancipadora que

conduzisse a mulher a sua plena autonomia, tronando-se uma concorrente do homem.

Em São Luís, na égide dos governos republicanos, verificou-se uma ampliação da

educação feminina escolarizada, com a criaçào da Escola Normal, preparando as moças para o

magistério primário, bem como as primeiras mulheres crusando o nível superior.

As mudanças que ocorriam na cidade sob o signo da modernidade, com mais espaços

se abrindo para mulheres das camadas médias e altas, circulando sozinhas nas praças e avenidas,

frequentando o cinema, teatro, lojas de luxo, geravam preocupações com a imagem feminina que

consequentemente atingiriam a ordem familiar. Neste momento, houve um recrudescimento do

discurso dos papéis femininos pautados no tripé filha, esposa e mãe. Seja com o aval científico ou

religioso, o discurso sobre a educação feminina era acompanhado pela idealização da mulher

como a missionária da implantação do amor, a Deus e a Pátria, da responsável pela harmonia da

família e pela educação dos filhos.

A identidade materna continuava sendo a grande representação feminina, responsável

pelo reforço da diferenciação entre os dois sexos, em que aos homens caberiam os direitos de

plena cidadania, com superioridade jurídica, uma vez que eram vistos como os chefes da família

e do Estado. Às mulheres eram oferecidos o trono doméstico, como rainha do lar, em que sua

submissão era “recompensada” pelo discurso da exaltação da mulher – mãe e pelos pretensos

privilégios da dona de casa.

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