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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Sung, Jung Mo, 1958- Conversando sobre ética e socied,ade / Jung Mo Sung e Josué Cândido da Silva. - Petrópolis, RJ: Vozes, 1995. ISBN 85-326-1546-5 1. Ética 2. Ética social 3. Sociedade I. Silva, Josué Cândido da. 11. Título. 95-2034 CDD-177 Índices para catálogo sistemático: 1. Ética social 177 172 5957c 032024 10ed. eX.4 JUNGMO SUNG e JOSUÉ CÂNDIDO DA SILVA CONVERSANDO SOBRE ÉTICA E SOCIEDADE 10" Edição \ EDITORA Y VOZES Petrópolis 2002

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Page 1: SUNG, J. M.; SILVA, J. C. Conversando sobre ética e sociedade. Ética e relações de gênero. p. 95-107

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Sung, Jung Mo, 1958-

Conversando sobre ética e socied,ade / Jung MoSung e Josué Cândido da Silva. - Petrópolis, RJ: Vozes,1995.

ISBN 85-326-1546-5

1. Ética 2. Ética social 3. Sociedade I. Silva,Josué Cândido da. 11. Título.

95-2034 CDD-177

Índices para catálogo sistemático:

1. Ética social 177

1725957c

032024

10ed.eX.4

JUNGMO SUNGe

JOSUÉ CÂNDIDO DA SILVA

CONVERSANDOSOBRE

ÉTICA E SOCIEDADE10" Edição

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Petrópolis2002

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ÉTICA E RELAÇÕESDE GÊNERO

Gênero e sexoi'Ninguém nasce mulher: torna-se mulher".

Esse famoso dito da filósofa feminista francesaSimone de Beauvoir tocou no ponto nevrálgíco deuma situação de dominação que já perdura mi-lhares de anos na história da humanidade e quenas últimas décadas foi trazido à tona na nossasociedade: a opressão dos homens sobre as rnu-

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lheres. Ou melhor dito, de varões sobre as mulhe-res.

rões e mulheres são socialmente construídas, e nãodeterminadas biologicamente.

A relação de gênero que vivemos hoje ê umarelação de desigualdade social e pessoal baseadana diferença entre os sexos e legitimada em nomede um determinismo biológico da superioridade deum dos sexos, o masculino, e de uma determinadaforma de viver a sexualidade, a heterossexual.Como sempre se busca legitimar a desigualdadesocialmente construída em nome de ciências danatureza, que, nesses casos, não são nada maisque ideologias travestidas de pseudocientificidade.Esta desigualdade social está articulada com ou-tras formas de desigualdades, distâncias e hierar-quias sociais.

A nossa língua está tão marcada pela domina-ção masculina que encontramos até dificuldadeslingüísticas para falarmos sobre este assunto. Es-tamos acostumados a utilizar o termo "homem"tanto para nos referirmos ao varão quanto para oser humano, no sentido universal. Todos aprende-mos desde cedo na escola que para nos referirmosa um grupo composto de um homem (varão) e demuitas mulheres. o plural deve estar no masculino.Este é um pequeno exemplo de como a nossa línguae toda a nossa cultura estão marcadas por estarelação de dominação.

Dizer que não se nasce mulher ou homem-va-rão, mas que se torna mulher e homem-varão édesmascarar a identificação feita entre o sexo (aidentidade natural) e o gênero. Como vimos nosdois primeiros capítulos deste livro, os seres hu-manos constroem um mundo humano para po-derem se relacionar entre si e com a natureza. Aidentidade sexual, a sexualidade e as relaçõesentre sexos diferentes também são construídassocialmente e são interpretadas a partir da cul-tura. Ninguém tem acesso à sua sexualidade e àdo(a) outro(a), nem aos seus instintos sexuais, de.uma forma direta e "pura". É sempre mediadopela cultura; são com os "óculos" de uma deter-minada cultura que "vemos" a nossa identidadesexual, a nossa sexualidade e a de outros(as), etomamos contato com os nossos instintos.

Patriarcalismo nas sociedades antigas

Nas sociedades da Antiguidade a família sepreocupava, em primeiro lugar, pela produção eco-nômica para a qual as mulheres e escravos deambos os sexos eram a força de trabalho. Osistemapatriarcal não se referia simplesmente a um siste-ma de relações sociais, econômicas, culturais elegais entre o varão - chefe de família - e outrosgrupos (mulheres, meninos e meninas, escravos eescravas) e com a propriedade de terras e animais.

o gênero é o sexo socialmente construído. Asrelações de gênero. as relações entre homens-va-

Nestes sistemas patriarcais da Antiguidade,como os de hoje, o status das mulheres variavasegundo sua classe social. As mulheres de classesdominantes desfrutavam de certos privilégios ecomodidades que as servas e escravas não pos-suíam. Entretanto, apesar dessas diferenças, to-

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teorias filosóficas. O grande pensador Aristóteles.por exemplo. dizia que havia pessoas destinadaspor natureza a serem escravas e que a mulherrepresentava a passividade. enquanto que o ho-mem. a força ativa. Na reprodução. o sêmen dehomem tinha a forma plena do filho. e a mulher sótinha um papel passivo. Somente um filho varãoera considerado como tendo a forma perfeita do serhumano. Uma filha era vista como resultado de umprocesso incompleto na formação do sêmen. Logo.a mulher era essencialmente defeituosa. não pos-suindo a natureza completa do ser humano. Suamente. sua vontade e seu corpo são débeis e,portanto, ela não podia ter autonomia, devia estarsujeita à soberania do varão.

das compartilhavam da situação de minoridade eopressão comum a todas as mulheres.

O primeiro papel das mulheres nestas socieda-des era o trabalho doméstico. Na economia pré-ín-dustrial, este papel era muito extenso. A mulher,mãe de família, não somente procriava e cuidavadas crianças, preparava comidas, lavava roupas elimpava a casa, mas produzia também alimentos.cultivando a horta, o pomar e remédios naturais.Além disso, fiava, tecia e costurava roupas, faziavelas, sabão e muitos outros utensílios domésticos.Nas famílias ricas a esposa, mãe de família, sededicava principalmente a dirigir este trabalho,que era realizado por serventes e escravos.

Todas estas duras condições se aplícavam tam-bém às escravas, mas de maneira mais intensa.Além da opressão no trabalho, elas não tinhamdireito algum sobre seu corpo ou vida. Realizavamo duro trabalho doméstico sob a direção da senhorada casa e além disso podiam ser violentadas, as-sassinadas ou vendidas a qualquer momento pelochefe de família ou seus filhos.

Esta situação das mulheres nas sociedadespatriarcais pré-modernas foimodificada nas socie-dades industriais contemporâneas. Como resulta-do da transferência dos meios de produção dafamília patriarcal aos donos da fábrica, as mulhe-res e os escravos passaram a ser desnecessáriospara a produção doméstica. Pouco a pouco a escra-vidão foi abolida, e as mulheres, com muita luta,foram conquistando os direitos civis.

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Mesmo que as mulheres produzissem muitosdos produtos de consumo da família, não tinhamdireito de usá-los como quisessem. Esses produ-tos, as mulheres e escravos pertenciam ao varão-chefe de família. Amulher como esposa ou filha nãotinha o direito de controlar seu próprio corpo ousua própria vida. Seu corpo era propriedade domarido para seu desfrute e procriação de filhos.

Nas sociedades modernas

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Essa realidade social tão chocante para nós eraassimilada pelos seus contemporâneos como "a"realidade e legitimado pelos mitos religiosos e pelas

É importante destacar que os principais movi-mentos libertários e emancipatórios dos séculosXIX e XX - sejam no campo capitalista ou nosocialista - sempre deram ênfase quase que exclu-siva à transformação econômica e política. Rele-gando para segundo plano, ou até mesmo negando,a questão da mulher.

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As mudanças nas sociedades modernas não i"

significaram de maneira alguma o fim do patríar- ,1111

calismo ou da dominação de varões sobre as mu- 1

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lheres. Houveuma melhora, mas não uma mudan- 11",1,

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Os líderes da Revolução Russa de 1917, porexemplo, escreveram leis que garantiam os mes-mos direitos civis às mulheres e aos homens.Porém, ao mesmo tempo, denunciaram os movi-mentos feministas como sendo somente um mo-vimento de mulheres da burguesia que buscavamos mesmos privilégios dos homens de sua própriaclasse. Para estas lideranças comunistas, o femi-nismo não era necessário para as mulheres ope-rárias. Nenhuma crítica de gênero seria neces-sária para a emancipação das mulheres operá-rias. A igualdade no ãmbito da produção seriasuficiente para a plena emancipação das mulhe-res trabalhadoras.

Diversas faces do patriarcalismo

No mundo ocidental- mesmo nos países quese orgulham da sua defesa dos direitos universaisdo homem e da democracia universal- as mulhe-res só passaram a ter direito a voto, isto é, seremconsideradas como cidadãs, depois de muitosanos de luta. A luta pelo voto das mulheres co-meçou na segunda metade do século XIX,e só nofinal da década de 1910 e no início dos anos 20começa a obter algumas vitórias. Nos EstadosUnidos, por exemplo, a emenda constitucionalque proibiu a discriminação política com base nosexo só foi introduzida em 1920. A partir dessaemenda as mulheres começaram a adquirir odireito a voto. No Brasil, a Constituição de 1934estabeleceu o sufrágio universal para homens emulheres alfabetizados a partir de 18 anos. Acondição "alfabetizados", numa época em que opaís tinha um alto índice de analfabetismo -principalmente entre as mulheres - mostra que osufrágio "universal" não era tão universal assim.

A violência contra as mulheres por parte dosseus companheiros ou pais infelizmente ainda ébastante comum, para acreditarmos que os proble-mas nas relações de gênero foram resolvidos coma industrialização e a modernização da economia.As recentes e poucas delegacias de mulheres mos-tram como o machismo ainda impera em nossasociedade, e o espancamento e estupro continuamfazendo parte do cotidiano da nossa cultura ma-chista.

Mesmo no campo da economia e da políticapercebemos a pouca presença das mulheres nospostos de comando ou de decisão, além do fato deque elas continuam, em geral, ganhando menos doque homens para fazer o mesmo serviço. Semcontarmos a sobrecarga de trabalho de muitasdessas mulheres. que ao voltarem às suas casastêm que dar conta dos serviços domésticos, comolavar, cozinhar, cuidar das crianças etc., e, se for ocaso, ainda dar atenção ao seu companheiro. Adupla ou tripla jornada é a dificil realidade damaioria das mulheres trabalhadoras pobres.

o patriarcalismo prevalece também nas igrejase nos movimentos religiosos, onde as mulheresconstituem a maior parte dos seus membros, esomente uma pequena parcela delas tem acesso

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l'. aos escalões médios ou SUP.eríores. São poucas as A luta das mulheres e a ética :.....1',

Igrejas cristãs que ordenam mulheres para funções 1.'1

'1de P,astora (ou equivalentes). É conhecida a posição A questão do gêner~ ~stá ligada: portanto, àq~i- 'Iii'da, IgreJ,'a catóh,'c,a, que" em nome da Tradiçã,o,e,de 10 q~~ se chamou de.c~Ihca~o patnarcad~, ou seja, !',.IDeus, não permite o acesso das mulheres ao sacer- a ~nt~c~do.pre?OmmIOda fI.guramasculina como 1,1

dócio. Esta situação de subordinação das mulhe- pnncipio dírecíonador e onentador das grandes "!I

res não é muito diferente em outras religiões. decisões econôrnícas, sociais, políticas e culturais. i!111

. . . . Além da afirmação de que a identidade sexual não 'IiApropna Imagem de Deus esta fortemente mar- está dissociada da identidade social, política, reli- I'

~a?~ pela figura. masculina, As religiões, que no gíosa etc. Na compreensão dos processos sociais !j,'ImcIOda humamdade adorava~ ~eusas e d~uses, acrescenta-se a variante do gênero à da situação rllrco~ o.passar do tempo foram ehmI~ando as fIgu~as de classe e de raça. Afinal, uma mulher negra e JIII~femínínas e se concentrando na figura masculína pobre é muito mais oprimida e marginalizada do 11'"

e patriarcal. Mesmo em religiões que se referem a que um homem branco e pobre. !,I'liDeus no gênero neutro (oque não temos na gramá- IIIItica portuguesa), acaba prevalecendo a visão pa - O declínio do patriarcalismo que vemos na nos- .ll!triarcal. Por isso, muitas teólogas, antropólogas, sa civilização, apesar de sua persistência, é frutolll'ji:sociólogas e historiadoras feministas estão resga- das lutas das mulheres. Não é uma simples evolu- ,.]1tando os mitos e a história das deusas e propondo ção da natureza ou uma concessão dos homens. <;:,1

uma imagem menos patriarcal, apresentando Deus Ess~ luta ~ o cons:qüente ~eclínio da nossa civili- f.i'~como Pai-Mãe ou como Mãe-Pai. zaçao patnarcal sao sem duvida uma das marcas I r

I'do nosso tempo. "1:Essa "releítura" do passado não se esgota so- i 111

mente na área religiosa. A própria história, como O movimento feminista não se restringe ao cam- Ili I

tantas outras ciências, está influenciada pelo pa- po das relações sociais. Questiona também todo o 11.li

~riarcalisI?o. Há um dito famoso que e~pre,ssa bem paradígma (modelo)de conhecimento ocidental mo- ·111.11

ISSO:"Atrás de todo grande homem esta uma gran- derno baseado somente na razão quantitativa e que 'lde mulher". Às mulheres sobrou a condição subal- exclui outras dimensões do conhecimento, como a Ililiterna e estereotipada de ficarem na retaguarda dos memória, a intuição e imaginação. A perspectiva do ·,~IIgrandes hom~ns. E as grandes mulheres, qu~.fo- gênero introduz u~a dimensão inclusiva também no tl~ram protagomstas no seu tempo. foram sendo es- campo do conhecímento. li,quecídas" pelas ciências oficiais e desaparecendo Li!dos livros sagrados das religiões ou dos livros de Uma das maneiras em que se pretende desca- :I!II,

história. racterizar o movimento feminista é transformar a II!icausa feminista em uma disputa entre homens- e rllmulheres para ver quem tem mais poder, muito a '.I!gosto dos meios de comunicação social. A luta das I1I

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de dominada, foi reduzida, junto com a sexualida-de, a mercadoria ou a objeto de desejo que promoveoutras mercadorias como carros, cigarros etc.

O patriarcalismo interiorizado impede tambémmuitos varões de usufruírem dos muitos aspectoshumanizantes da vida, como a emotividade, a sen-sibilidade, a expressão da afetividade, a intuição eo perdão.

Não se pode pretender acabar completamente,de uma hora para outra, com um tipo de relaçãoque já perdura milhares de anos. Porém, não sepode aceitar e ser conivente com a sua manuten-ção, em nome destes mesmos milhares de anos. Aduração no tempo não transforma o que é no quedeveria ser.

A exigência de ética que vimos no campo daeeonomia, da política e da ecologia também se fazpresente nas relações de gênero. O que significaque as mudanças exígídas não se reduzem aocampo social e público, mas também chegam aoãmbito privado das relações interpessoais e dafamília.

O dilema entre mudanças pessoais ou estrutu-rais não tem mais sentido. As lutas das mulheresmostraram que a vida é um feixe de relações com-plexas, onde as relações de dominação e lutasemancipatórias perpassam desde as relações ínter-pessoais até as macroestruturais. O que significaque devemos atuar, ao mesmo tempo, nos doiscampos. Buscando as revoluções "moleculares"que se articulam com os grandes processos demudanças sociais.

mulheres não é contra os homens, mas sim contraas relações sociais patriarcais, das quais os ho-mens também são vítimas. É uma luta que incluitambém homens insatisfeitos com a dominaçãomachista patriarcal. Pois, numa relação de gêneroopressiva não são só as mulheres que sofrem asconseqüências negativas, mas também os homens.

Se é verdade que as mulheres sofrem mais,também é verdade que os homens não podem serealizar plenamente na sua humanidade manten-do-se ou sendo coniventes com este tipo de relação.Pois, ele não consegue encontrar companheira queo complemente, mas somente subalterna. Compa-nheirismo só pode ocorrer numa relação onde osdiferentes se reconhecem como diferentes, masnão estabelecem hierarquias. Em outras palavras,companheirismo só é possível numa relação deigualdade entre os diferentes.

Homens e mulheres buscam companheiros ecompanheiras porque querem se realizar como se-res humanos superando o solipsismo ou a solidão.Infelizmente a interiorização de uma cultura ma-chista e patriarcal impele muitos a certa buscaimpossível de relação de companheirismo, quedeve ser, ao mesmo tempo, de subordinação ou dedominação.

A interiorização desse tipo de dominação é coe-rente com outras formas de dominação em outrostipos de relações sociais que interiorizamos. Porisso, fortalece a lógica da dominação e dificulta atransformação da nossa sociedade capitalista. Nãofoi o capitalismo que criou a desigualdade na rela-ção de gênero, mas foi, sem dúvida, o capitalismoo que melhor proveito tirou disso. A mulher, além

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o grito abafado, silenciado e calado das mulhe-res oprimidas por serem mulheres, e muitas delasoprimidas ainda mais por serem também negrasou índias e pobres, começa a ser ouvido cada vezmais forte no nosso mundo.

damos também um artigo da Maria Ríta Kehl, "Amulher e a lei", que faz parte do livro Ética, Ed.Companhia das Letras, organizado por Adauto No-vaes.

"Minha mãe teve 19 filhos, eu já estou no quinto. Umabarriga atrás da outra, até a gente agüentar ou até os homensse desinteressarem ... Será que vai ser a mesma coisa quandominhas filhas forem mulheres? Só agora que participo dogrupo de mulheres que começo a entender que o mundo temque mudar por minha e por causa delas" (Noemia, dona-de-casa, Camaragíbe, PEj.

"Meu nome é Tereza. Tenho 3 filhos. Sou aluna destaescola. Nem minha avó, nem minha mãe aprenderam a ler. Eucomecei este ano. Ontem meu sogro foi em casa reclamarporque soube que eu estava na escola. Disse: 'Onde já se viumulher depois de velha, depois de parideira inventar de estu-dar'. Eu disse: 'Seu Antonio, os tempos mudaram. Hoje em diaas mulheres têm seus direitos. Acabou o tempo de só se viverno fogão" (Tereza, 22 anos, dona-de-casa, Cabo, PEj.

Abrir os olhos é deixar a luz penetrar no corpo todo, étransfigurá-Ia situando-o diferentemente. As mulheres deolhos abertos começam a ir contra o 'destino' de mulher paraentrar na 'história' da mulher, pessoa de direitos e deveressociais reconhecidos".

Ivone Gebara. Letxznm-te e anda.São Paulo, Paulinas, 1989, p. 14.

sugestões de leituraA Editora Rosa dos Tempos tem uma coletânea

de artigos organizada por Cristina Bruschíní e O.Albertina, Uma questão do gênero, e uma outraorganizada por Seyla Benhabib e Drucilla Cornell,Feminismo como crítica da modernídade. Recomen-

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