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4 ESTUDO EXPLORATÓRIO
4.1 INTRODUÇÃO
Este estudo exploratório teve três objetivos principais (1) encerrar conclusivamente a
demonstração da hipótese de trabalho, ao evidenciar que nem mesmo a ferramenta mais
flexível dentre as existentes poderia ser utilizada satisfatoriamente no contexto brasileiro; (2)
ganhar experiência no procedimento de avaliação ambiental de edifícios, utilizando um
método internacional consolidado e com alto nível de detalhamento; e (3) verificar se e em
que extensão este método poderia ser incorporado para avaliar o módulo ambiental da
avaliação de sustentabilidade proposta para edifícios brasileiros.
A GBTool foi selecionada para o estudo por ser a única ferramenta existente de avaliação
ambiental de edifícios desenvolvida especificamente para permitir e facilitar a sua adaptação a
diferentes contextos. A definição da escala de desempenho requer que sejam conhecidos no
mínimo dois pontos: prática típica (benchmark, na definição do GBC, correspondente à nota
0,0) e prática de excelência (nota 5,0). A nota máxima para cada quesito pode ser definida
teoricamente com base na vanguarda de tecnologias, materiais e equipamentos existentes,
desconsiderando seu custo de implementação (COLE;LARSSON, 2002). Já a definição da
nota zero é um ponto crítico enfrentado, a cada ciclo, por todas as equipes do GBC, e cada
equipe adota uma abordagem própria 1.
Em muitos países participantes, a existência de um amplo e detalhado conjunto de normas
técnicas, ainda que não solucione completamente o problema, permite assumir valores para a
prática típica e padrões da indústria para boa parte dos itens relevantes. Adicionalmente,
alguns países já contam com inventários de ciclo de vida de materiais de construção, que
permitem informar com maior precisão a energia e emissões neles incorporadas. No caso
brasileiro, a defasagem ou ausência de normas técnicas e de dados nacionais em geral
dificultava sobremaneira a definição teórica dos benchmarks.
O estudo exploratório foi então desenhado para atender a um quarto objetivo: melhorar a
calibração das avaliações de edifícios brasileiros no âmbito do GBC, isto é: conhecer a faixa
da escala de desempenho da GBTool que corresponderia a edifícios resultantes de práticas
Capítulo 4 - Estudo exploratório 79
típicas de projeto e construção no Brasil. Estes níveis de desempenho passariam a constituir a
nota zero em avaliações futuras de edifícios de porte, tipologia e condições de uso
semelhantes.
4.2 DEFINIÇÃO DA AMOSTRA
A etapa de definição da amostra visava verificar se os edifícios disponíveis para o estudo
piloto eram casos elegíveis para avaliação nos termos propostos nesta pesquisa, quais sejam:
CARACTERÍSTICAS OBRIGATÓRIAS
• edifícios em operação (entre 1 e 3 anos). A maioria dos sistemas de avaliação estima o desempenho a partir da avaliação de projetos de edifícios (desempenho potencial), utilizando simulação de dados de consumo a partir de premissas de projeto. Em virtude da limitação de recursos para o desenvolvimento desta pesquisa, optou-se por trabalhar, no estudo exploratório, com edifícios em uso (acima de 80% da ocupação) e coletar os dados de consumo diretamente das contas emitidas pelas concessionárias de fornecimento de água e energia (12 meses consecutivos).
CARACTERÍSTICAS DESEJÁVEIS
• edifícios pertencentes ao maior número possível de categorias diferentes de edifícios comerciais que, ainda que não estatisticamente representativos, juntos compusessem o quadro de projeto e construção mais amplo possível para esta tipologia. A opção por edifícios reais substituiu a idéia inicial de definir um edifício típico conceitual.
Após consulta a um painel de especialistas, considerou-se satisfatório que três categorias fossem contempladas: edifícios comerciais de padrão simples, padrão médio e “padrão corporativo”. O termo “padrão” foi aqui utilizado para referir-se não apenas aos custos de construção, mas principalmente à qualidade das soluções tecnológicas e de projeto empregadas. Preocupações (de projeto ou execução) em reduzir o impacto ambiental do edifício não foram consideradas como um critério para seleção dos edifícios ou definição das categorias.
Os edifícios de padrão simples foram aqui definidos como aqueles caracterizados pelo emprego de equipamentos de condicionamento simples e nem sempre os mais eficientes (tipo unidade de janela ou split system, de controle manual), com pouca preocupação no atendimento de preceitos de qualidade de projeto e construção. Os edifícios de padrão médio caracterizam-se pelo emprego de soluções de condicionamento artificial mais eficientes, e de planejamento de projeto e execução, pautados pelos conceitos da qualidade e da série de normas ISO 9000. A categoria dos chamados edifícios corporativos procurava contemplar o fenômeno corrente de construção de edifícios de altíssimo padrão e com ampla utilização de
1 Que vai desde a busca de um edifício existente, com função e padrão de ocupação idênticos (Chile e Canadá), até
concentrar esforços para a definição sistemática de benchmarks apenas dos itens com maior peso (Canadá).
Capítulo 4 - Estudo exploratório 80
fachadas envidraçadas durante o desenvolvimento e consolidação dos novos “centros de negócios” na cidade de São Paulo. Houve uma oferta de um edifício padrão corporativo para avaliação, mas que foi posteriormente retirada, por receio do efeito que um eventual mau desempenho ambiental poderia ter na imagem do edifício, em franco lançamento. Por essa razão, esta categoria não pôde ser avaliada nesta pesquisa.
• edifícios executados por construtoras com certificação da série ISO 9000, por dois motivos. Primeiro, por entender que empresas e projetistas que tenham se preocupado em obter uma certificação da série de normas da qualidade estariam provavelmente mais próximos do perfil de um potencial interessado em obter uma certificação ambiental. Segundo, porque a condução de uma avaliação ambiental requer a disponibilização de uma grande quantidade de informações sobre o projeto e a execução do edifício, que tende a ser sensivelmente facilitada por procedimentos de documentação e arquivamento que tipicamente acompanham a implementação de sistemas de gestão da qualidade.
• edifícios concluídos há menos de 5 anos a contar do início da pesquisa, para evitar perda de informações pela desativação de arquivos e registros com o passar do tempo, alteração do corpo gerencial e de funcionários etc.
Dois edifícios foram selecionados para avaliação, sendo:
• edifício comercial padrão simples, localizado na cidade de Campinas – SP (Estudo de Caso 1). Trata-se de um conjunto horizontal (2 pavimentos), uso misto (escritório e hotel), parcialmente condicionado e com intenso uso de iluminação e ventilação naturais. A execução coube a uma construtora sem sistema de gestão da qualidade implantado, e foi concluída em 1996.
• edifício comercial padrão médio, localizado na cidade de São Paulo – SP (Estudo de Caso 2), vertical (14 pavimentos acima do solo), uso único (escritórios), totalmente condicionado artificialmente e com grande área envidraçada nas fachadas norte e sul. A execução coube à construtora-proprietária, portadora de certificação ISO 9000, e foi concluída em 2000.
A oferta limitada de edifícios para avaliação não permitiu, no período do estudo, a
constituição de uma amostra que fosse estatisticamente representativa ou que atendesse a
todas as características descritas acima, mas os resultados dos estudos de caso avaliados
constituem os números disponíveis para iniciar a discussão no tema. Com o aumento gradual
do número de avaliações, o armazenamento dos dados do conjunto de edifícios avaliados
permitirá delinear mais nitidamente um quadro típico de projeto e construção.
Capítulo 4 - Estudo exploratório 81
4.3 AVALIAÇÃO EXPLORATÓRIA
A GBTool (versão GBT2kV1.81, de junho de 2002) foi utilizada exatamente no estado em
que foi oferecida aos países participantes do terceiro ciclo do GBC (2000-2002). Os estudos
de casos aqui descritos foram realizados nos moldes das avaliações para a conferência
Sustainable Building 2002 (SB´02). Devido à dificuldade prática de se conduzir o volume de
avaliação completo dentro de limites de tempo e financeiros aceitáveis para as equipes no
GBC, era obrigatória a análise de apenas três temas: consumo de recursos, cargas ambientais
e qualidade do ambiente interno.
4.3.1 DEFINIÇÃO DE FATORES DE PONDERAÇÃO
A estratégia para a determinação sistemática de uma ponderação adaptada à realidade
nacional envolveu a composição de um pequeno painel de especialistas, que utilizou uma
ferramenta de suporte ao processo de análise hierárquica (AHP 2) desenvolvida em ambiente
MS EXCEL, com recursos básicos de MS Visual Basic3.
A vantagem decisiva da utilização do AHP é tornar o processo de ordenamento e seleção
muito transparente e revelar, em detalhe, o julgamento do agente de decisão. O procedimento
de consulta a painel de especialistas já foi utilizado em experiências semelhantes, como o
BREEAM, e é estimulada pela inclusão da planilha “VOTE” na GBTool.
4.3.1.1 DEFINIÇÃO DOS NÍVEIS HIERÁRQUICOS
O primeiro passo da aplicação da técnica AHP é a definição dos níveis hierárquicos do
problema de decisão. Assim, logo após uma tela de cadastro, foi apresentada aos votantes a
árvore hierárquica mostrada na Figura 1, definida seguindo a estrutura da GBTool. Esta
mesma hierarquia foi mantida na organização das telas de Ajuda e de Resultados.
2 AHP - Analytic Hierarchy Process.
3 Existem no mercado softwares AHP especializados, sendo o ExpertChoice® (CHAPMAN; MARSHALL; FORMAN, 1998) o
mais difundido deles, que poderiam ter sido utilizados para a derivação dos pesos.
Capítulo 4 - Estudo exploratório 82
Figura 1 – Definição dos níveis hierárquicos.
4.3.1.2 CONSTRUÇÃO DAS MATRIZES DE COMPARAÇÃO
Feito o cadastro e examinada a árvore hierárquica do problema apresentado, o votante chega
às duas matrizes de decisão quanto à importância relativa entre Temas de Desempenho 4. A
matriz completa inclui todos os temas de desempenho contemplados na GBTool (não utilizada
neste estudo, enquanto uma matriz parcial inclui apenas os temas obrigatórios para a SB´02
(Figura 2).
4 No total, são sete matrizes de decisão: duas delas para ponderação entre temas de desempenho, e outras cinco matrizes
para ponderação das categorias dentro dos temas Consumo de Recursos; Cargas Ambientais; Qualidade do Ambiente Interno; Qualidade dos Serviços; e Gerenciamento. Não há matrizes para os temas Desempenho Econômico, que é avaliada na GBTool através de um quesito único; e Comutação/transporte, ainda não implementado.
Nivel 1
Qualidade serviços
Temas de Desempenho
energia
solo
reuso
água
materiais externos
GHGs
ozônio
foto-oxid
acidific.
resíduos sólidos
efluentes líquidos
RCD perigosos
impacto vizinhos
qualid. ar
conforto térmico
acústica
iluminação
eletro-magnetismo
Nivel 2
Econômico Gerenciamento Comutação Transporte
Qualidade ambiente interno
Cargas ambientais
Consumo Recursos
processo
Verificação pré-entrega
operacional
Cat
ego
rias
flexibilidade
controlabilidade
privacidade
manuten ção do desempenho
impacto no terreno e
adjacências
amenidades
Capítulo 4 - Estudo exploratório 83
Para facilitar o entendimento daqueles não familiarizados com a terminologia utilizada,
hyperlinks levam a um arquivo de ajuda sintético, em que são listadas as categorias que
compõem cada Tema.
Figura 2 - Matriz de decisão quanto à importância relativa entre Temas de Desempenho avaliados pela GBTool, formato parcial.
Seguindo os preceitos do AHP, as matrizes foram desenhadas para permitir a análise de
importância sempre por comparação de pares de opções (uma linha x uma coluna). Somente
os campos do bloco triangular azul claro (porção superior direita da matriz) estão abertos à
interação com o usuário. Nestas células, apenas os valores presentes na escala de importância
são aceitos para digitação. Os campos recíprocos (bloco triangular cinza, na porção inferior
esquerda da matriz) e a coluna de importância relativa (pesos) são completados
automaticamente durante o preenchimento da matriz. Os pesos resultantes são enviados para a
tela Resultados, onde mensagens de erro alertam quanto a falhas no preenchimento das
matrizes.
Definida a importância relativa entre os Temas de Desempenho, segue-se a segunda série de
matrizes de comparação (Figura 3, Figura 4, Figura 5), onde, em procedimento idêntico ao
anteriormente descrito, o avaliador decide quanto à importância relativa das categorias dentro
de cada tema.
Capítulo 4 - Estudo exploratório 84
Figura 3 – Matriz de decisão quanto à importância relativa entre categorias do Tema Consumo de Recursos.
Figura 4 - Matriz de decisão quanto à importância relativa entre categorias do Tema Cargas Ambientais.
Capítulo 4 - Estudo exploratório 85
Figura 5 - Matriz de decisão quanto à importância relativa entre categorias do Tema Qualidade do Ambiente Interno (IEQ).
4.3.1.3 ESCALA DE IMPORTÂNCIA RELATIVA
A escala de importância relativa foi definida como mostrado na Tabela 1.
Tabela 1 – Definição da Escala de Importância Relativa nas matrizes de decisão.
Escala de Importância Relativa
Muito mais importante 4
Mais importante 2
Importância igual 1
Menos importante 1/2
Muito menos importante 1/4
A escala fundamental com 9 pontos originalmente proposta por SAATY (1980) não deixa
precisamente claro quão mais importante é um atributo em relação a outro, pois a transição de
um intervalo para outro pode ser bastante sutil. Alguns autores chegaram a desenvolver
definições lingüísticas para designar detalhadamente os intervalos da escala (DRAKE, 1998),
no entanto isto não significa que tais definições resultarão sempre nos mesmos pesos, já que
os termos lingüísticos são inevitavelmente imprecisos (fuzzy).
Capítulo 4 - Estudo exploratório 86
Para facilitar a assimilação por parte dos usuários, optou-se nesta pesquisa por modificar a
escala fundamental de SAATY (1980) e reduzir para 5 o número de intervalos da escala.
Seguindo a orientação de HAURIE (2001), uma escala multiplicativa (1/4, 1/2, 1, 2, 4) foi
utilizada em vez de uma escala linear, a fim de evitar os problemas de inconsistência que
poderiam surgir nos julgamentos (i.e. não proporcionalidade entre vetores-colunas da matriz
de comparação). Os termos lingüísticos: ”muito mais importante”, “mais importante”,
“importância igual”, “menos importante” e “muito menos importante” foram então
associados às descrições quantitativas dos intervalos da escala.
4.3.1.4 PESOS OBTIDOS COM O AUXÍLIO DA FERRAMENTA AHP
Os pesos utilizados nos dois estudos de casos estão reunidos na Tabela 2.
Tabela 2 – Pesos utilizados nos dois estudos de casos realizados.
R - Consumo de Recursos 38%
R1 - Uso de energia primária (líquida) ao longo do ciclo de vida 50
R2 - Uso de solo e alteração na qualidade do solo 5
R3 – Consumo (líquido) de água potável 35
R4 - Reuso de estrutura ou materiais (existentes no sítio) e/ou encaminhamento de materiais para reciclagem fora do sítio
0
R5 - Quantidade e qualidade de materiais (externos ao sítio) utilizados 10
L - Cargas Ambientais 25%
L1 - Emissão de gases causadores de efeito estufa 20
L2 - Emissão de substâncias nocivas à camada de ozônio 20
L3 - Emissão de gases causadores de acidificação 10
L4 - Emissões levando à formação de foto-oxidantes 12
L5 - Emissões com potencial de eutroficação 0
L6 - Resíduos sólidos 20
L7 - Efluentes líquidos 13
L8 - Resíduos perigosos 3
L9 - Impactos ambientais no sítio e propriedades adjacentes 2
Q - Qualidade do Ambiente Interno 37%
Q1 - Qualidade do ar e da ventilação 25
Q2 - Conforto Térmico 25
Q3 - Conforto lumínico 25
Q4 - Conforto Acústico 20
Q5 - Poluição Eletromagnética 5
Capítulo 4 - Estudo exploratório 87
Um painel de especialistas composto por seis votantes, utilizou a ferramenta AHP para
derivar pesos no nível hierárquico mais alto, isto é: entre os temas de desempenho. Para as
categorias dentro de cada tema, foram mantidos os pesos-default da GBTool, considerados
como razoáveis e pouco influenciados por variações contextuais5.
4.3.2 DEFINIÇÃO DE BENCHMARKS
Os benchmarks foram estimados com o maior rigor possível, considerando a limitação de
normalização e dados nacionais. De maneira geral, quando existentes, foram utilizados
valores de normas ABNT, códigos de obras, dados nacionais publicados e recomendações
sem poder normativo feitas por órgãos como o PROCEL. Como segundo recurso, foram
utilizados, onde aplicável, valores obtidos em normas ASHRAE e de ferramentas
internacionais, nominalmente o LCAid, o ATHENATM, o EnergyStar e o Austin GreenBuilder.
Finalmente, foram feitas consultas a especialistas, fabricantes de equipamentos e profissionais
do mercado.
Nos casos em que nenhuma destas fontes permitiu estimar valores nacionais, foram utilizados
os valores-default oferecidos pela ferramenta, com a ciência de que eles não necessariamente
refletiriam os números brasileiros. Especificamente:
1) Benchmarks gerais de projeto
Foram adotadas configurações mais comuns permitidas pelos códigos de obras (ex.: padrões
de ocupação e interferência em propriedades vizinhas permitidas ou resultado de omissões da
legislação) ou resultantes da prática comum observada (ex. 100% de área do terreno
impermeável (em função dos subsolos); 0 % de escavações de subsolo e 0% água de chuva
retidos no terreno).
Quando existentes, foram usados valores de normas e recomendações, ou os mais próximos
possíveis, dentre aqueles aceitos pela GBTool6:
• zonas de controle de dispositivos de iluminação: 12,5 m2, para zonas periféricas (valor da ferramenta mais próximo da recomendação de 13 m2 feita pelo PROCEL (2001)), e 25 m2, para zonas internas);
• nível de iluminação ambiente: a recomendação da NBR 5413 (ABNT, 1992) para ambientes de escritórios é de 500 a 1000 lux, no plano de trabalho, e 1/10
5 Nos níveis inferiores na hierarquia da GBTool (dentro das categorias), os pesos não são alterados pelo usuário, mas
divididos igualmente entre os critérios e, quando existentes, sub-critérios.
6 Em muitos casos, a GBTool usa lista de seleção (drop down), com valores pré-definidos e não editáveis.
Capítulo 4 - Estudo exploratório 88
disto (min 500 lux) para o restante do ambiente. Foi adotado 475 lux (valor máximo aceito pela GBTool).
Na ausência de normas específicas, os parâmetros típicos de projeto de iluminação e sistemas
de ar condicionado, conforto ambiental, entre outros, foram obtidos por consulta a
especialistas e profissionais do mercado.
2) Benchmarks de (reuso de) materiais e (geração e destinação de) resíduos:
Foram estimados valores a partir da prática comum: 0% de reuso de materiais; 100% do
resíduo de construção e demolição (RCD) necessitando disposição adequada; 70% do
revestimento interno atendendo a recomendações quanto à emissão de VOCs7; e 75% do
material adquirido localmente (raio de 150 km).
3) Benchmarks de energia incorporada e emissões:
No caso dos impactos associados aos materiais de construção (energia incorporada e
emissões), diante da ausência total de dados nacionais de LCA, foram tomados valores a
partir de dados-default e aceito o cálculo feito pelo estimador simplificado contido na
ferramenta, mantendo-se em mente que estes números poderiam ser muito diferentes daqueles
para os materiais brasileiros8.
Os valores de energia incorporada na estrutura e envelope do edifício foram estimados a partir
de um quadro na GBTool 2000, versão usada no ciclo 1998-2000, que relaciona a massa e a
complexidade do edifício a valores de energia incorporada (em GJ/m2). Para um edifício com
massa de 375 kg/m2 (laje de 15 cm de concreto com 2500 kg/m3), os níveis baixo e
convencional de complexidade foram arbitrados, respectivamente, como prática ótima (4,5
GJ/m2) e prática padrão (6 GJ/m2).
• Energia incorporada (prática padrão): 6,0 GJ/m2.
• Energia incorporada (prática ótima): 4,5 GJ/m2
• Emissões de substâncias causadoras de efeito estufa (GHG9) incorporadas nos materiais (conversão não refinada, com base na energia incorporada nos materiais) =
7 Não havia dados sobre o adesivo utilizado no carpete no piso (~30% do revestimento interno), mas considerou-se que os
70% do revestimento interno restantes (pintura a base de água nas paredes e forro de alumínio ou gesso) atendem a recomendações quanto à emissão de VOCs
8 Notavelmente no caso do cimento, em que a GBTool considera adição máxima de 15% de resíduos, enquanto no Brasil
utiliza-se correntemente cimento com até 75% de adições.
9 GHG - Greenhouse Gases.
Capítulo 4 - Estudo exploratório 89
72 kg CO210 eq./GJ energia incorporada (dado médio dos estudos de casos canadenses
apresentados no GBC’98, calculados pelo software ATHENATM).
4) Benchmarks de tipo de ocupação:
• densidade de ocupação: a ASHRAE 62 (2001) considera densidade máxima (em escritórios) de 7 pessoas/92 m2 (= no mínimo 13 m2 /pessoa), valor que foi adotado;
• resistência do concreto: 25 MPa (concreto de resistência normal);
• área de coleta e armazenamento de resíduos de uso: supondo serviço público de coleta diária considerou-se como típica, a previsão de pequena área cent ral para armazenamento separado de resíduos sólidos (5 m2) e lixo orgânico (2,5 m2).
5) Benchmarks para sistemas de ventilação natural:
• relação típica entre área de janelas e aberturas operáveis e área do piso: 20% (valor na lista drop down da GBTool mais próximo da relação 1/6 da área do piso (16,7%) adotada pela maioria dos códigos de obras para áreas de ocupação prolongada.
• Distância máxima (da zona de ocupação primária) até a linha de janelas que provê ventilação: 7m para ventilação unilateral, e 15m, para ventilação cruzada.
6) Benchmarks para sistemas mecânicos:
• energia para condicionamento, iluminação e equipamentos : eletricidade;
• % mínima de horas ocupadas em que o edifício foi projetado para manter faixas de conforto nas áreas de ocupação principa l: 90% (consulta a projetista);
• altura mínima do solo para pontos de tomada de ar externo: 2 m (consulta a projetista);
• distância mínima entre pontos de tomada de ar externo e saídas de exaustão e fontes de ar contaminado: 6 m (consulta a projetista);
• tipo e quantidade de refrigerante utilizado: HCFC11-22, consumido na proporção aproximada de 1 kg/35m2 (consulta a fabricante e projetista).
7) Benchmarks para sistemas de ventilação mecânica:
• área ventilada e condicionada mecanicamente: 100%
• Taxa mínima de renovação de ar (ocupação primária): 10 l/s*m2 (consulta a projetista; ASHRAE 62.1 (2001));
• Volume máximo de ar tipicamente recirculado (ocupação primária): 20% (consulta a projetista);
• UR mínima mantida durante aquecimento: 50% (recomendação PROCEL (2001);
• UR máxima mantida durante refrigeração: 60% (recomendação PROCEL (2001);
10 CO2 - Dióxido de carbono.
11 HCFC – Hidroclorofluorcarbono.
Capítulo 4 - Estudo exploratório 90
• setpoint de refrigeração: 26oC (valor usado nas simulações realizadas por SIGNOR (1999).
• Consumo de energia: Os benchmarks de consumo de energia foram embasados nos dados publicados por SIGNOR (1999), referentes à análise de uma amostra de 512 edifícios de escritórios climatizados artificialmente na cidade de São Paulo, sendo:
• Como prática padrão, foi adotada a média dos valores publicados por SIGNOR (1999): 406,8 MJ/m2*ano (~112,78 kWh/m2*ano); e
• Como prática ótima, foi adotado o menor consumo obtido por SIGNOR (1999) para a mesma amostra: 194,4 MJ/m2*ano (~53,89 kWh/m2*ano).
8) Benchmarks para uso de água:
• Uso de água fria: 83 l/pessoa*dia, menor consumo – antes da intervenção no âmbito do PURA12 - dentre os estudos de casos, série edifícios comerciais, divulgados na página da SABESP13.
Para o Estudo de Caso 1 (uso misto escritório e hotel), o benchmark (240l/pessoa*dia) foi estimado a partir do número de funcionários (151 x 83 l/dia) e de hóspedes potenciais (45 x 200 l/dia).
• Consumo de água para irrigação de jardins: 109,5 m3/ano*m2, estimativa do LCAid, considerando combinação de irrigação por spray e solo argiloso.
4.3.3 ESTUDO DE CASO 1: CONJUNTO COMERCIAL DE PADRÃO SIMPLES , USO MISTO (ESCRITÓRIO E HOTEL)
4.3.3.1 DESCRIÇÃO
O Estudo de Caso 1 (Figura 6) situa-se no distrito de Barão Geraldo, em Campinas. O terreno
faz divisa com uma fazenda, com o campus da UNICAMP e com um lago, do parque
ecológico anexo. Dos 121.000 m2 do terreno, apenas 30% podem ser construídos.
O conjunto de escritórios e hotel foi inaugurado em 1996, utilizando uma parcela de terreno
de 21.000 m2. O custo estimado para esta primeira etapa de desenvolvimento (incluindo
construção, mobiliário e equipamentos) foi de cerca de US$ 1.800.000,00. A expansão do
conjunto construído está atualmente em fase de projeto e inclui um centro de convenções e
um novo bloco de hotel.
12 PURA - Programa de Uso Racional da Água.
13 http://www.sabesp.com.br/pura/cases/escritorios_sede_sabesp.htm
Capítulo 4 - Estudo exploratório 91
Figura 6 - Vista externa do bloco de escritórios (esquerda) e vista do lago a partir do solarium no hotel
A área bruta dos dois blocos soma 4.420 m², distribuída em dois pavimentos em cada bloco.
Os 45 apartamentos do hotel são ocupados principalmente por professores visitantes ou
participantes das conferências realizadas no próprio hotel ou no centro de convenções da
Universidade. As instalações do hotel incluem piscina, sauna, quadras esportivas e uma
ligação ao parque ecológico.
Este exemplo explora o uso de iluminação e ventilação naturais (Figura 7, Figura 8 e Figura
9), potencialmente capazes de reduzir o consumo de energia do conjunto, se comparada com a
prática usual de projeto de escritórios: 100% da área é condicionada e iluminada
artificialmente14. Nos dois edifícios, os espaços são inundados pela iluminação natural
proveniente de grandes janelas e de aberturas na parte superior dos átrios. As janelas expostas
a luminosidade intensa receberam uma combinação de dispositivos de sombreamento
externos (brises) e filmes para evitar ofuscamento (Figura 7).
As áreas de trabalho (bloco de escritórios) e os apartamentos e auditórios (hotel) possuem
condicionamento artificial (aparelhos de janela ou tipo split system), que, somados,
correspondem a 69% da área bruta do conjunto. Os átrios e halls de entrada não são
condicionados. Sistemas de aquecimento de ambientes não são utilizados. Apenas uma
pequena parcela de energia renovável é utilizada: coletores solares, para o aquecimento de
água nos apartamentos e no restaurante do hotel; e células fotovoltaicas, para controle da
iluminação externa.
14 Segundo LAMBERTS;WESTPHAL (2000), em edifícios comerciais, o consumo para refrigeração corresponde, em média, a
cerca de 20% do consumo de energia do edifício; e a iluminação artificial, a aproximadamente 44%.
Capítulo 4 - Estudo exploratório 92
Figura 7 - Interior do bloco de escritórios: átrio. À direita, janelas com brises e filmes para sombreamento.
Figura 8 - Bloco do hotel: átrio e interior de apartamento típico.
Considerou-se que o valor ecológico do sítio não foi significativamente alterado pela a
construção do conjunto. O terreno era anteriormente não construído e praticamente plano.
Não houve remoção de cobertura vegetal considerável e o pequeno movimento de terra
realizado foi acomodado dentro dos limites do próprio terreno.
Basicamente materiais locais foram utilizados (considerados como locais materiais
provenientes de um raio de 150 km). As áreas de estacionamento são todas asfaltadas, e a
porção com paisagismo recebeu grama, com demanda por irrigação.
Não há sistema de reuso de águas servida (águas cinzas). A água da chuva que escorre sobre
os pavimentos impermeáveis é enviada para a rede pública, enquanto a parcela coletada nos
Capítulo 4 - Estudo exploratório 93
telhados dos edifícios é disposta no lago. A água do lago, por sua vez, é utilizada para
irrigação das áreas ajardinadas.
Figura 9 - Bloco do hotel: átrio central e clarabóias para iluminação natural.
4.3.3.2 RESULTADOS DA AVALIAÇÃO DO ESTUDO DE CASO 1
O resultado global da avaliação do Estudo de Caso 1 foi 1,1. Resultados parciais são
apresentados da Figura 10 a Figura 13. A linha vermelha (nota 0) nos gráficos indica o
desempenho de referência (benchmark).
Capítulo 4 - Estudo exploratório 94
0,6 0,5 2,1 0,0 0,0 0,0 0,0
-2,0
-1,0
0,0
1,0
2,0
3,0
4,0
5,0
Resources Loadings IEQ Service Quality Economics Management Transport
Figura 10 - Resultado dos temas Consumo de Recursos, Cargas ambientais e Qualidade do ambiente interno (os pesos dos temas não avaliados foram zerados).
0,8 1,0 0,4 0,0 0,0
-2,0
-1,0
0,0
1,0
2,0
3,0
4,0
5,0
Energy Land Water Building re-use
NewMaterials
Figura 11 - Desagregação do resultado de Consumo de Recursos (nota 0,6).
Temas de Desempenho
IEQ Transporte Desemp. Econômico
Qualid. Serviços
Gerenc. processo
Cargas ambientais
Consumo Recursos
Solo Água Materiais Energia Reuso edifício
Consumo de Recursos
Capítulo 4 - Estudo exploratório 95
-0,5
0,0 1,1 0,6 1,9 0,1
-2,0
-1,0
0,0
1,0
2,0
3,0
4,0
5,0
GHG ODS Acidification Solid waste Effluent Site impacts
Figura 12 - Desagregação do resultado de Cargas Ambientais (nota 0,5)15.
2,6 0,3 4,4 1,0 2,0
-2,0
-1,0
0,0
1,0
2,0
3,0
4,0
5,0
IAQ ThermalComfort
Illumination Acoustics EMF
Figura 13 – Desagregação do resultado de Qualidade do Ambiente Interno (nota 2,1)16.
15 GHG – Greenhouse gases (gases causadores de efeito estufa). ODS - Ozone depleting substance (substância danosa à
camada de ozônio troposférico)
16 EMF = electromagnetic field (campo eletromagnético).
IAQ Conf.
Térmico Conf.
Lumínico Conf.
Acústico EMF
ODS Acidificação Efluentes GHG Impactos no sítio
Resíduos sólidos
Cargas Ambientais
Qualidade do Ambiente Interno
Capítulo 4 - Estudo exploratório 96
Tabela 3 - Indicadores de sustentabilidade (adotados no GBC) referentes ao Estudo de Caso 1, normalizados por unidade de área e unidade de área e ocupação.
Indicadores de sustentabilidade do GBC Por área Por área e ocupação
5,1 ~1416 29,8 ESI-1 Consumo total de energia primária incorporada na
estrutura e envelope do edifício (50 anos), GJ GJ/m2 kWh/m2 GJ/(kaph/m2)17 101 ~28 597
ESI-2 Consumo anual de energia primária incorporada, MJ MJ/m2 kWh/m2 MJ/(kaph/m2) 362 ~100 2130
ESI-3 Consumo anual de energia primária para operação do edifício, MJ MJ/m2 kWh/m2 MJ/(kaph/m2)
80 ~22 473 ESI-4 Consumo anual de energia primária não-renovável para
operação do edifício, MJ MJ/m2 kWh/m2 MJ/(kaph/m2)
182 ~50 1070 ESI-5
Consumo anual de energia primária incorporada e energia primária não renovável para operação do edifício, MJ (ESI-2+ESI-4) MJ/m2 kWh/m2 MJ/(kaph/m2)
1,8 44,8 ESI-6 Área de solo consumida pela construção do edifício e
serviços relacionados, m2 m2/m2 m2/ocupante 41 42
ESI-7 Consumo anual de água potável para operação do edifício, m3 m3/m2 *ano m3/(aph/m2) *ano
0 0 ESI-8 Uso anual de água cinza e água da chuva para operação
do edifício, m3 m3/m2 *ano m3/(aph/m2) *ano
10 60 ESI-9 Emissão anual de gases de efeito estufa pela operação do
edifício, kg. CO2 equivalente kg CO2 eq/m2 *ano kg CO2
eq/(kaph/m2)*ano
0 0 ESI-10 Vazamento previsto de CFC-11
18 equivalente por ano, g
g CFC-11 eq/m2 *ano g CFC-11 eq/(kaph/m2)*ano
0 0 ESI-11
Massa total de materiais reutilizados empregados no projeto, vindos do próprio terreno ou de fontes externas, kg. kg/m2 *ano kg/(aph/m2) *ano
769 4530 ESI-12 Massa total de novos materiais (não reutilizados)
empregados no projeto, vindos de fontes externas, kg. kg/m2 *ano kg/(aph/m2) *ano
4.3.4 ESTUDO DE CASO 2: EDIFÍCIO COMERCIAL DE PADRÃO MÉDIO, USO ÚNICO (ESCRITÓRIOS)
4.3.4.1 DESCRIÇÃO
O Estudo de Caso 2 é um exemplo típico de edifício de escritórios de padrão médio na cidade
de São Paulo. Aspectos ambientais não foram parâmetros diretos de projeto. No entanto, as
fases de projeto e construção aplicaram princípios de coordenação de projeto e procedimentos
de controle de qualidade e racionalização de recursos, especialmente energia e minimização
de desperdício.
O edifício foi construído em um dos poucos vazios urbanos na Vila Olímpia, que têm
recebido crescente desenvolvimento comercial e de negócios. A operação do edifício teve
17 kaph = 1.000 horas anuais de ocupação. aph - annual person-hours of occupancy (horas anuais de ocupação por pessoa,
obtidas pela multiplicação do número de ocupantes do edifício pelo número de horas de ocupação anuais).
18 CFC – Clorofluorcarbono.
Capítulo 4 - Estudo exploratório 97
início em outubro de 2000. O bloco construído tem 3 pavimentos de garagem subterrâneos,
ocupando toda a área do terreno. Nos 14 pavimentos acima do nível do solo, cerca de 2.100
m2 são utilizados para escritórios, enquanto que a área funcional total (escritórios mais áreas
de serviço) é de cerca de 2.500 m2.
Figura 14 - Fachadas frontal (orientação sul) e lateral (oeste) do edifício.
A fachada principal é orientada para o sul, e não apresentaria maiores problemas por utilizar
grande área envidraçada. A fachada norte, no entanto, adota o mesmo conceito arquitetônico e
usa área envidraçada quase idêntica, porém em uma orientação desfavorável. Não há
dispositivos externos de sombreamento, e o controle solar e de ofuscamento baseia-se no uso
de vidros reflexivos. A fachada norte é parcialmente sombreada pelos edifícios no entorno,
mas a parte superior fica desprotegida da ação direta de raios solares (Figura 14).
A largura reduzida das plantas dos pavimentos (Figura 16, inferior) permite acesso a
iluminação natural e vistas externas em todas as áreas de escritórios. Ainda assim, utiliza-se
densidade de iluminação artificial de 14 W/m2 19 mesmo durante o dia, inclusive nos
pavimentos de garagem.
19 Estimada a partir do projeto de iluminação e tomadas.
Capítulo 4 - Estudo exploratório 98
Figura 15 – Vista de escritório duplex no 12o pavimento (esquerda), hall de entrada (direita, superior) e entrada secundária.
Figura 16 – Plantas no nível térreo e de uma das duas configurações de pavimento-tipo.
Capítulo 4 - Estudo exploratório 99
O Estudo de Caso 2 apresenta um consumo de água de 52 l/pessoa*dia, que o que corresponde
a uma redução de quase 40% em relação ao desempenho adotado como referência20. O
consumo anual bruto de eletricidade foi em torno de 163 MJ/m2/ano (~45 kWh/m2*ano), cerca
de 40% do benchmark adotado).
4.3.4.2 RESULTADOS DA AVALIAÇÃO DO ESTUDO DE CASO 2
O resultado global da avaliação do Estudo de Caso 2 foi 1,4. Resultados parciais são
apresentados da Figura 17 a Figura 20. A linha vermelha (nota 0) nos gráficos indica o nível
de desempenho típico de um edifício equivalente na mesma região (desempenho de referência
ou benchmark).
1,3 0,7 2,5 0,0 0,0 0,0 0,0
-2,0
-1,0
0,0
1,0
2,0
3,0
4,0
5,0
Resources Loadings IEQ Service Quality Economics Management Transport
Figura 17 - Resultado dos temas Consumo de Recursos, Cargas ambientais e Qualidade do ambiente interno (os pesos dos temas não avaliados foram zerados).
20 Foram considerados os dados dos estudos de caso do PURA (Programa de Uso Racional da Água), série edifícios
comerciais, divulgados na página da SABESP (http://www.sabesp.com.br/pura/cases/escritorios_sede_sabesp.htm).
Temas de Desempenho
IEQ Transporte Desemp. Econômico
Qualid. Serviços
Gerenc. processo
Cargas ambientais
Consumo Recursos
Capítulo 4 - Estudo exploratório 100
1,5
-1,0
1,7 0,0 0,0
-2,0
-1,0
0,0
1,0
2,0
3,0
4,0
5,0
Energy Land Water Building re-use
NewMaterials
Figura 18 -Desagregação do resultado do tema Consumo de Recursos (nota 1,3).
0,5 0,0 3,0
-0,3
0,0 0,9
-2,0
-1,0
0,0
1,0
2,0
3,0
4,0
5,0
GHG ODS Acidification Solid waste Effluent Site impacts
Figura 19 -Desagregação do resultado do tema Cargas Ambientais (nota 0,7).
3,0 0,4 4,7 0,9 5,0
-2,0
-1,0
0,0
1,0
2,0
3,0
4,0
5,0
IAQ ThermalComfort
Illumination Acoustics EMF
Figura 20 – Desagregação do resultado do tema Qualidade do Ambiente Interno (nota 2,5).
ODS Acidificação Efluentes GHG Impactos no sítio
Resíduos sólidos
IAQ Conf.
Térmico Conf.
Lumínico Conf.
Acústico EMF
Cargas Ambientais
Qualidade do Ambiente Interno
Água Materiais Energia Reuso
edifício
Consumo de Recursos
Solo
Capítulo 4 - Estudo exploratório 101
Tabela 4 - Indicadores de sustentabilidade (adotados no GBC) referentes ao Estudo de Caso 2, normalizados por unidade de área e unidade de área e ocupação.
Indicadores de sustentabilidade do GBC Por área Por área e ocupação
11,2 ~3111 73,6 ESI-1 Consumo total de energia primária incorporada na
estrutura e envelope do edifício (50 anos), GJ GJ/m2 kWh/m2 GJ/(kaph/m2)21 224 ~62 1471
ESI-2 Consumo anual de energia primária incorporada, MJ MJ/m2 kWh/m2 MJ/(kaph/m2) 429 ~119 2819
ESI-3 Consumo anual de energia primária para operação do edifício, MJ MJ/m2 kWh/m2 MJ/(kaph/m2)
95 ~26 626 ESI-4 Consumo anual de energia primária não-renovável para
operação do edifício, MJ MJ/m2 kWh/m2 MJ/(kaph/m2) 320 ~89 2098
ESI-5 Consumo anual de energia primária incorporada e energia primária não renovável para operação do edifício, MJ (ESI-2+ESI-4) MJ/m2 kWh/m2 MJ/(kaph/m2)
0,8 10,7 ESI-6 Área de solo consumida pela construção do edifício e
serviços relacionados, m2 m2/m2 m2/ocupante 15 17
ESI-7 Consumo anual de água potável para operação do edifício, m3 m3/m2 *ano m3/(aph/m2) *ano
0 0 ESI-8 Uso anual de água cinza e água da chuva para operação
do edifício, m3 m3/m2 *ano m3/(aph/m2) *ano
12 80 ESI-9 Emissão anual de gases de efeito estufa pela operação do
edifício, kg. CO2 equivalente kg CO2 eq/m2 *ano kg CO2
eq/(kaph/m2)*ano
0 0 ESI-10 Vazamento previsto de CFC-11 equivalente por ano, g
g CFC-11 eq/m2 *ano g CFC-11 eq/(kaph/m2)*ano
0 0 ESI-11
Massa total de materiais reutilizados empregados no projeto, vindos do próprio terreno ou de fontes externas, kg. kg/m2 *ano kg/(aph/m2) *ano
2441 16024 ESI-12 Massa total de novos materiais (não reutilizados)
empregados no projeto, vindos de fontes externas, kg. kg/m2 *ano kg/(aph/m2) *ano
4.4 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
Os resultados da GBTool são basicamente interpretados com base em dois grupos de
informações: (1) e pontuação global e por categoria (Tabela 5); e (2) indicadores de
sustentabilidade ambiental (Tabela 6, Figura 21 e Figura 22). A Tabela 5 detalha a pontuação
obtida nos dois estudos de casos.
21 kaph = 1.000 horas anuais de ocupação. aph - annual person-hours of occupancy (horas anuais de ocupação por pessoa,
obtidas pela multiplicação do número de ocupantes do edifício pelo número de horas de ocupação anuais).
Capítulo 4 - Estudo exploratório 102
Tabela 5 – Pontuação obtida pelos estudos de casos avaliados.
PONTUAÇÃO OBTIDA Estudo de Caso 1 Estudo de Caso 2
Consumo de Recursos (peso 38%) 0,6 1,3
Energia Solo
Água Reuso edifício
Materiais
0,8 1,0 0,4 0,0
0,0
1,5 -1,0 1,7 0,0
0,0
Cargas Ambientais (peso 35%) 0,5 0,7
GHG
ODP22
Acidificação
Resíduos sólidos
Efluentes Impactos no terreno
-0,5 0
1,1 0,6
1,9 0,1
0,5 0,0 3,0
-0.3
0 0,9
Qualidade do Ambiente Interno (peso 27%) 2,1 2,5
IAQ23
Conforto térmico
Conforto lumínico Conforto acústico
EMF24
2,6 0,3
4,4 1,0 2,0
3,0 0,4
4,7 0,9 5,0
Total (ponderado) 1,1 1,4
No Estudo de Caso 1, não estavam disponíveis quantitativos de materiais separados por bloco,
nem medição individualizada dos consumos correspondentes a cada bloco. Foi necessária,
portanto, a determinação de benchmarks de consumo específicos para a tipologia de uso misto
(escritório e hotel).
Por a pontuação do desempenho pela GBTool ser relativa a benchmarks para edifícios de uma
mesma tipologia e localizados numa mesma região, não é possível comparar diretamente os
resultados (do bloco de escritório) do Estudo de caso 1 com o Estudo de caso 2. Como estes
benchmarks são regionais, tampouco é apropriado comparar os perfis de desempenho ou as
notas obtidas pelos edifícios avaliados para a SB’02. Para esta finalidade, o GBC usa os
indicadores de sustentabilidade ambiental. É, no entanto, instrutivo situar a nota obtida pelo
Estudo de Caso 2 (1,4) em relação à amostra de edifícios de escritórios avaliados para a
SB’02, que representam projeto e construção ambientalmente avançados nos respectivos
22 ODP - Ozone Depleting Potential (Potencial de dano à camada de ozônio troposférico).
23 IAQ - Indoor Air Quality (Qualidade do ar interno).
24 EMF – Electromagnetic Field (Poluição eletromagnética).
Capítulo 4 - Estudo exploratório 103
países: Chile (1,9), Suécia (2,1), Estados Unidos (2,5 e 2,7), Coréia (2,5); Noruega (2,6),
Espanha (2,6) e Japão (1,1; 2,2; 2,3; 2,4; 2,5; e 2,7).
INDICADORES DE SUSTENTABILIDADE AMBIENTAL ADOTADOS NO GBC
Os indicadores de sustentabilidade ambiental (ESIs) são um conjunto limitado de medidas
absolutas de desempenho que caracterizam práticas de construção sustentável e facilitam a
comparação internacional de edifícios. Doze indicadores de sustentabilidade ambiental são
avaliados na versão da GBTool utilizada: 5 indicadores de uso de energia (incorporada e
operacional), 1 de uso do solo, 2 de uso de água (reuso e uso total), 2 de emissões durante a
operação do edifício (CO2 e CFC) e 2 de uso de materiais (reuso e novos materiais) (Tabela 3
e Tabela 4).
Estes indicadores correspondem à parte marcadamente de LCA da avaliação, indicando
números de consumo e emissões, que são normalmente importantes em qualquer contexto.
Como são números absolutos, não há interferência de benchmarks e é possível fazer uma
comparação direta entre edifícios de mesma tipologia. A Figura 21, a Figura 22, a Figura 23 e
a Figura 24 situam o Estudo de Caso 2 em relação aos demais edifícios de escritórios
avaliados na SB’02.
Para os indicadores normalizados apenas por unidade de área, o Estudo de Caso 2 apresentou
valores de indicadores de consumo de energia para operação (ESI-3, ESI-4 e ESI-5) muito
melhores que os demais edifícios avaliados; enquanto que os indicadores ESI-6 (uso do solo),
ESI-7 (uso de água) e ESI-8 (reuso de água) foram próximos das médias da amostra, e os
indicadores de energia primária incorporada (ESI-1 e ESI-2), de reuso de materiais (ESI-11),
e de uso de novos materiais (ESI-12), ficaram muito abaixo dela. As médias dos indicadores
de consumo de energia para operação (ESI-3, ESI-4 e ESI-5), no entanto, foram muito
elevadas pelos resultados dos edifícios asiáticos (Tabela 6). Excluídos estes edifícios da
análise (Figura 22), o desempenho com base em:
• ESI-1 e ESI-2 (energia incorporada) e ESI-3 (energia operacional) piora (valores
médios abaixaram);
Capítulo 4 - Estudo exploratório 104
• ESI-4 e ESI-525 se mantém melhor que a média, mas de forma menos expressiva
(valores médios aumentaram);
• ESI-6, ESI-7, ESI-8, ESI-9, ESI-10 se mantém praticamente inalterado;
• ESI-11 e ESI-12 continua ruim, porém menos distante das respectivas médias, que
diminuíram.
Tabela 6 - Desempenho do Estudo de Caso 2, em relação à média da amostra.
Normalizados apenas por área (m2)
Normalizados por área e por ocupaç ão (m2 *kaph)
Estudo Caso 2 Média
Média (excluindo asiáticos) Estudo Caso 2 Média
Média (excluindo asiáticos)
ESI-1 11,2 6 4 73,6 36 34
ESI-2 224 91 78 1471 579 558
ESI-3 429 1315 490 2819 8022 4371
ESI-4 95 1222 325 626 5864 3011
ESI-5 320 1314 403 2098 6513 3648
ESI-6 0,8 1 1 10,7 18 21
ESI-7 15 19 19 17 28 26
ESI-8 0 2 0 0,0 1 0
ESI-9 12 93 66 80 427 410
ESI-10 0,00000 0 0 0,00000 0 0
ESI-11 0 157 58 0,0 0 0
ESI-12 2441 1346 1132 16024 8267 7534
* Os ESIs em vermelho resultam de estimativas de energia incorporada feitas pela ferramenta com base em dados e princípios que podem levar a resultados pouco aderentes à realidade brasileira.
Discussão análoga aplica-se aos indicadores normalizados por ocupação e área (Figura 23 e
Figura 24), porém a normalização por ocupação revela desempenho melhor do edifício
brasileiro quanto aos consumos de energia operacional (ESI-3 e ESI-4), solo (ESI-6) e de
água (ESI-7).
25 Convém lembrar que os valores dos indicadores ESI-1, ESI-2 e ESI-5 são diretamente influenciados pelo cálculo estimado
de energia incorporada nos materiais, o que o torna de pouca validade para análise. 27
A listagem completa de atributos relacionados a edifícios desenvolvida por estes sub-comitês está incluída em CHAPMAN et al. (1998).
Capítulo 4 - Estudo exploratório 105
0
1000
2000
3000
4000
5000
6000
ESI-1 ESI-2 ESI-3 ESI-4 ESI-5 ESI-6 ESI-7 ESI-8 ESI-9 ESI-10 ESI-11 ESI-12
Brasil
Chile
EUA
EUA
Noruega
Espanha
Japão
Japão
Japão
Japão
Japão
Japão
Japão
Coréia
Média
Figura 21 - Indicadores normalizados apenas por unidade de área (unidade variável no eixo das ordenadas).
0
500
1000
1500
2000
2500
3000
ESI-1 ESI-2 ESI-3 ESI-4 ESI-5 ESI-6 ESI-7 ESI-8 ESI-9 ESI-10 ESI-11 ESI-12
Brasil
Chile
EUA
EUA
Noruega
Espanha
Média (-asiáticos)
Figura 22 - Indicadores normalizados apenas por unidade de área, excluindo edifícios asiáticos (unidade variável no eixo das ordenadas).
materiais novos
Capítulo 4 - Estudo exploratório 106
0,0
5000,0
10000,0
15000,0
20000,0
25000,0
30000,0
35000,0
40000,0
ESI-1 ESI-2 ESI-3 ESI-4 ESI-5 ESI-6 ESI-7 ESI-8 ESI-9 ESI-10 ESI-11 ESI-12
Brasil
Chile
EUA
EUA
Noruega
Espanha
Japão
Japão
Japão
Japão
Japão
Japão
Coréia
Média
Figura 23 - Indicadores normalizados por unidade de área e por ocupação (unidade variável no eixo das ordenadas).
0,0
5000,0
10000,0
15000,0
20000,0
25000,0
ESI-1 ESI-2 ESI-3 ESI-4 ESI-5 ESI-6 ESI-7 ESI-8 ESI-9 ESI-10 ESI-11 ESI-12
Brasil
Chile
EUA
EUA
Noruega
Espanha
Média (-asiáticos)
Figura 24 - Indicadores normalizados por unidade de área e por ocupação, excluindo edifícios asiáticos (unidade variável no eixo das ordenadas).
4.5 CONSIDERAÇÕES SOBRE O CAPÍTULO
Os estudos de casos aqui descritos foram apresentados na SB’02, em Oslo, e, portanto, foram
consideradas apenas as categorias de uso de recursos, cargas ambientais e qualidade do
ambiente interno. A GBTool foi selecionada para uso no estudo piloto por ser especificamente
desenvolvida para permitir sua adaptação a diferentes contextos de avaliação. Esta adaptação
centra-se na intervenção do usuário em dois pontos principais: a personalização de escala de
desempenho, através da definição de desempenhos de referência (benchmarks, nota 0) e de
desempenho de excelência (nota +5); e de ponderações específicas.
materiais novos
Capítulo 4 - Estudo exploratório 107
Os benchmarks foram estimados com o maior rigor possível, considerando a limitação de
instrumentos normativos e dados nacionais. Para a derivação de uma ponderação razoável
para estudos no Brasil, foi desenvolvida uma ferramenta AHP, utilizada para calcular os pesos
a partir da percepção de um painel de especialistas quanto à importância relativa dos
Temas/Categorias de desempenho considerados.
O estudo piloto permitiu a familiarização e estudo detalhado da GBTool. Em resposta à
questão posta pelos objetivos do estudo exploratório, concluiu-se, que, em condições ideais,
seria conveniente aproveitar a lógica e parte do conteúdo da GBTool para a composição do
módulo ambiental incluído no modelo de avaliação de sustentabilidade de edifícios proposto.
Os grandes temas nela apresentados são, além de abrangentes, basicamente os mesmos que
aparecem nas listagens de atributos de edifícios feitas pelos sub-comitês ASTM E06.05
(Whole-building Performance) e ASTM E06.81 (Building Economics)27. Naturalmente, é
necessária a revisão detalhada das referências adotadas pela ferramenta. Esta tarefa, assim
como o rastreamento de erros da ferramenta, é dificultada pela grande quantidade de fórmulas
distribuídas nas várias planilhas que compõem a GBTool, muitas delas calculadas
automaticamente e não acessadas pelo usuário.
Apesar de reduzir o esforço necessário para completar as avaliações, a grande quantidade de
automatização inserida na ferramenta aumentou significativamente o potencial de erros de
fórmulas, que podem diminuir a confiança do resultado obtido com a ferramenta. A maioria
dos erros foi corrigida enquanto as equipes participantes aplicavam a GBTool em seus estudos
de casos, entre dois e três meses antes da SB’02. Outros passaram, e um deles foi percebido
após a conferência, em razão do resultado suspeito obtido, naquela ocasião, para o Estudo de
Caso 2.
A flexibilidade idealizada para esta ferramenta tem virtudes teóricas importantes, como
rastreabilidade dos pesos utilizados e orientação da avaliação à mensuração de desempenho,
mas cria dificuldades práticas igualmente importantes:
• a definição dos benchmarks deve ser criteriosa, pois orienta todo o cálculo de resultados;
• para alguns itens, a faixa de valores aceitos pela GBtool não atende a normas brasileiras, como no caso de nível de iluminação ambiente, para o qual o valor máximo da ferramenta é ligeiramente inferior ao prescrito na NBR 5413 (1992);
• fatores importantes para o clima e hábitos locais, como simplesmente abrir janelas para ventilar, por exemplo; características geográficas (na nossa latitude, o fator de luz do dia-default é facilmente alcançável por aberturas mínimas, e a escala de pontuação é facilmente estourada); e tradição construtiva (a avaliação de RCD
Capítulo 4 - Estudo exploratório 108
considera apenas as perdas inerentes às tecnologias construtivas, e não desperdício, que é considerável no Brasil) não são adequadamente valorados.
• As avaliações ambientais utilizando a GBTool exigem uma quantidade realmente grande de informação, nem sempre prontamente disponíveis e organizadas no Brasil. Diversos cálculos são feitos automaticamente, a partir de um número mínimo de entradas dadas pelo usuário, o que torna os resultados obtidos questionáveis, quando, na falta de informações na quantidade, detalhamento e precisão consideradas na GBTool, são feitas adaptações e inferências pelo usuário ou pela própria ferramenta de avaliação;
• os intervalos da escala de desempenho são definidos com exatidão, a partir do desempenho de referência e da meta de desempenho estipulados para cada item, e têm uma sensibilidade alta, que destoa da qualidade dos dados disponíveis para a utilização; e
• as suposições-default da ferramenta podem levar a resultados descolados da realidade brasileira. Particularmente, não é possível confiar ou tirar conclusões a partir dos dados de energia e emissões incorporadas aos materiais calculados pela GBTool para nenhum dos estudos de casos brasileiros. A avaliação de energia incorporada nos materiais é feita com base em um estimador que, na falta de dados de LCA calculados, usa como padrão dados canadenses, que podem ser muito diferentes dos dados nacionais. A estimativa de GHG a partir da conversão da energia incorporada faz sentido apenas para os processos de produção que utilizem fontes fósseis de energia (óleo, gás, carvão...), o que nem sempre é o caso dos materiais brasileiros, em cuja produção é freqüente o emprego de (hidro)eletricidade e lenha 28. Uma avaliação correta depende necessariamente de dados de LCA, não disponíveis neste momento para materiais nacionais. Como nem o valor de energia incorporada, nem a taxa de conversão de energia incorporada para CO2 incorporado utilizados no cálculo foram obtidos de dados de LCA de materiais brasileiros, o cálculo induz a um acúmulo de erros que torna os dados pouco aproveitáveis.
A oferta limitada de edifícios para avaliação não permitiu a constituição de uma amostra
estatisticamente representativa, porém o estudo exploratório forneceu os primeiros números
nacionais, que podem ser utilizados para ajudar a balizar avaliações de outros edifícios de
mesma tipologia de uso e nas mesmas localizações dos estudos de casos. Apesar da realização
de julgamentos de importância relativa entre temas avaliados não ser uma atividade simples,
devido à interdisciplinaridade de conhecimento envolvida, a ferramenta AHP mostrou-se
como um facilitador da derivação sistemática de pesos entre temas de desempenho da
GBTool, sinalizando que um procedimento semelhante poderia ser utilizado positivamente no
desenvolvimento de um método nacional.
28 A queima de biomassa também libera CO2, mas considera-se que esta emissão é neutralizada pela absorção de CO2
durante seu crescimento.
Capítulo 4 - Estudo exploratório 109
4.5.1 SOBRE A NECESSIDADE DE DESENVOLVER UM MÉTODO BRASILEIRO
Este Estudo Exploratório encerra a demonstração, iniciada no Capítulo 3, de que não é
possível copiar, traduzir ou simplesmente aplicar um método estrangeiro no contexto
brasileiro ou de qualquer outro país, por maior que tenha sido o sucesso obtido em seu país
de origem. Certos aspectos perdem validade ou, por outro lado, itens nem sempre
considerados pelos métodos internacionais são importantes no nosso contexto e devem ser
incluídos na avaliação. Os exemplos citados em SILVA (2001) e SILVA et al. (2002)
ilustram bem esta discussão. Para mencionar apenas um deles:
Todos os métodos enfatizam a importância das emissões de CO2 durante o uso do edifício; o GBC é o único que vai além e permite considerar o CO2 incorporado nos materiais. Esta é claramente uma preocupação de países de clima frio (com grande demanda por aquecimento, durante períodos relativamente longos) e/ou que tenham matrizes energéticas fortemente centradas no uso de combustíveis fósseis, e que, por estas razões, têm compromissos rigorosos firmados no Protocolo de Kioto. No caso brasileiro, o controle de CO2 durante a operação do edifício não tem a mesma validade, já que (1) a emissão de CO2 pelos países em desenvolvimento é insignificante diante da dos países desenvolvidos e este reconhecimento impõe controle rigoroso sobre países que, metaforizando, já consumiram – ou mesmo extrapolaram - a sua “cota de destruição do planeta” durante seu processo de desenvolvimento, para que os outros países possam também se desenvolver, como é o caso do Brasil; e (2) na maior parte do território nacional, a energia utilizada é eletricidade proveniente principalmente de fontes hidráulicas e não poluentes (apesar da recente alteração de cenário, com maior participação de fonte termelétricas), e é possível que no ciclo de vida de edifícios no Brasil, a emissão de CO2 durante a produção dos materiais de construção seja preponderante.
Este trabalho defende a idéia de que a qualidade de um método de avaliação de edifícios é
determinada por quatro princípios essenciais:
• Para ser tecnicamente consistente, um método de avaliação deve ser adaptado a dados nacionais relevantes;
• Para ser viável praticamente, um método de avaliação deve ser adaptado ao mercado, práticas de construção e tradições locais;
• Para ser absorvido e difundir-se rapidamente, um método de avaliação deve ser desenvolvido em parceria com as principais partes interessadas: investidores, empreendedores/construtores, projetistas;
• Para ser apropriado ao contexto nacional, os itens avaliados no método devem ser ponderados para refletir prioridades e interesses nacionais.
Todos eles são definidos localmente. E todos eles são, portanto, contrariados pela importação
de métodos. Que fique claro que o problema não é a qualidade dos métodos existentes. Pelo
Capítulo 4 - Estudo exploratório 110
contrário, em seus contextos de origem, eles são apropriados e vêm experimentando alto grau
de sucesso. Apenas não é apropriado utilizá- los, como são, fora destes contextos.
A tentativa mais vigorosa de internacionalização de um método de avaliação foi feita com o
BREEAM. Mais recente, o LEED é aplicável em todo o território dos Estados Unidos, porém
são raros os casos de aplicação externa. Atualmente, porém, tanto o LEED quanto o
BREEAM evitam avaliar edifícios fora de seus países de origem. A prática demonstrou que a
dificuldade de adequação aos locais de avaliação ia além da retirada ou adição de aspectos a
avaliar e que os resultados das adaptações revelavam-se, na verdade, como novos sistemas,
muito diferentes dos métodos originais.
Estes sistemas podem até ser utilizados no Brasil – ou em outros países. Não há impedimentos
legais ou restrições oficiais além da devida comunicação ao BRE e ao USGBC,
respectivamente. No entanto, a maioria esmagadora dos aspectos seria julgada com base em
normas e práticas americanas ou britânicas, por sua vez definidas com base em traços
culturais, tradição construtiva, restrições legais e adesão a protocolos globais, que definem
determinadas prioridades e, juntas, formam um cenário que, em sua essência, pode ser
próximo do brasileiro em alguns aspectos (como eficiência no uso de recursos e redução da
poluição), mas que, em termos de rigor de metas e da abordagem escolhida para atingi- las (ex.
redução de CO2 para atender ao Protocolo de Kioto, meta que o Brasil não tem), tende a ser
muito descolado da nossa realidade.
O GBC investiu em um caminho diferente: criar uma ferramenta que fosse suficientemente
flexível e pudesse ser utilizada em diversos países. Aí está o papel fundamental dos
benchmarks, que contextualizam a avaliação e definem o fundo da escala de desempenho. E
aí está também o seu grande calcanhar de Aquiles, pois falhas na definição dos benchmarks
alteram diretamente o resultado da avaliação, e podem mesmo invalidá- la. Seria excelente se
fosse possível utilizar, no Brasil, uma ferramenta tão completa quanto a GBTool, mas
exatamente por sua abrangência e complexidade, ela está longe de ser um instrumento para
uso corriqueiro. Mais apropriado é utilizar a GBTool em seu propósito original, e desenvolver
um método local a partir do embasamento teórico-científico que ela oferece.
Retomando a ótica que orientou a discussão metodológica dos sistemas internacionais
existentes para avaliação ambiental de edifícios de escritórios feita no Capítulo 3, eles não são
adequados para aplicação no Brasil, porque:
• o que estes métodos avaliam é insuficiente: todos eles detêm-se na avaliação ambiental, e os itens ambientais avaliados não necessariamente refletem a agenda
Capítulo 4 - Estudo exploratório 111
brasileira. O Brasil exibe um conjunto de graves problemas sociais, traduzidos por indicadores alarmantes de desigualdade e de pobreza (INSTITUTO ETHOS, 2002; IBGE, 2002). O setor de construção brasileiro emprega milhões de trabalhadores. Este uso intensivo de mão-de-obra e a participação significativa no PIB posicionam o setor como um motor potencial na criação e distribuição de valor, com repercussão direta no alívio de pobreza, desenvolvimento humano e inclusão social; provisão de condições dignas e seguras de trabalho e de capacitação e treinamento técnico-ambiental continuado e formal; e prosperidade e fortalecimento de comunidades localmente. Para ser aderente a esta condição de país em desenvolvimento, os objetivos ambientais, sociais e econômicos da construção sustentável devem ser integrados na composição das avaliações de edifícios.
• a forma como estes métodos avaliam é inapropriada para o Brasil, porque:
o para prover resultados aderentes ao contexto de avaliação é necessário definir localmente um critério de ponderação; e
o não há dados nacionais de LCA, e é inconsistente avaliar impactos de materiais brasileiros com base em dados estrangeiros.
• o quanto deve ser atingido em cada método é definido pela sinergia de fatores como tecnologias e produtos disponíveis em cada mercado, práticas construtivas, normas vigentes, que, juntos, delineiam níveis de referência e metas que mudam de um contexto a outro.
É fundamental, portanto, desenvolver um método à luz das prioridades, condições e
limitações brasileiras. Deve-se necessariamente passar, no Brasil, por um processo de
amadurecimento semelhante àquele por que passaram os países de origem dos métodos
existentes para avaliação ambiental de edifícios, com o desafio maior de ampliar o escopo
tradicional de avaliação ambiental para avaliação de sustentabilidade de edifícios.
O próximo Capítulo dedica-se à reunião de diretrizes e de uma base metodológica necessária
para o desenvolvimento de um método nacional de avaliação da sustentabilidade de edifícios
de escritórios.