sofia amélia argamassas de auto-limpeza: alencastre … · analisou-se um conjunto de trabalhos de...

167
Sofia Amélia Alencastre Tello e Ferreira ARGAMASSAS DE AUTO-LIMPEZA: DA FORMULAÇÃO ÀS APLICAÇÕES Dissertação de Mestrado em Conservação e Reabilitação de Edifícios Dissertação apresentada para cumprimento dos requisitos necessários à obtenção do grau de Mestre em Conservação e Reabilitação de Edifícios, realizada sob a orientação científica da Professora Cristiana Pereira 17 de Dezembro de 2015

Upload: tranduong

Post on 11-Feb-2019

218 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Sofia Amlia Alencastre Tello e

Ferreira

ARGAMASSAS DE AUTO-LIMPEZA: DA FORMULAO S APLICAES

Dissertao de Mestrado em Conservao e

Reabilitao de Edifcios

Dissertao apresentada para cumprimento dos

requisitos necessrios obteno do grau de Mestre

em Conservao e Reabilitao de Edifcios,

realizada sob a orientao cientfica da Professora

Cristiana Pereira

17 de Dezembro de 2015

I

Study hard what interests you most, in the most undisciplined, irreverent and

original manner possible.

[Richard Feynman]

II

III

AGRADECIMENTOS

Esta dissertao foi de todos os trabalhos que j realizei na minha vida

acadmica o mais desafiante a todos os nveis e, por isso, o apoio e suporte de

todas as pessoas envolvidas foi fundamental para a sua concretizao. Quero,

assim, demonstrar a minha gratido e o meu profundo reconhecimento a todos

aqueles que de alguma forma contriburam, direta ou indiretamente, para que

este trabalho chegasse a bom termo:

- Agradeo minha orientadora a Professora Cristiana Nadir Gonilho

Pereira, que se revelou um slido apoio ao longo do meu percurso acadmico.

Estou grata pela escolha do tema, pela sua orientao e disponibilidade.

- Agradeo s equipas de apoio tcnico das empresas de

comercializao de revestimentos fotocatalticos, nomeadamente ao Sr.

Reinhard Liu da empresa chinesa TiPE, aos senhores Lutz Gradewald e Martin

Eisen da empresa alem Nadico, ao senhor Eng. Ricardo Pedroni parceiro da

Nadico em Portugal e fundador da empresa Nin9, e, por fim, aos senhores

Tony Watling e Peter Gibson da empresa australiana Photocatalyst Coatings.

Agradeo por toda a ateno despendida, pela disponibilidade demonstrada

em ajudar em responder a todas as questes, pelo enriquecedor suporte

tcnico e informao tcnica enviada sempre com a maior brevidade possvel.

Agradeo em especial ao Sr Eng. Ricardo Pedroni por todo esclarecimento de

dvidas sobre nanomateriais.

- Agradeo sobretudo aos meus pais pelo apoio incondicional que

sempre me deram. Estou grata pela possibilidade de ter estudado e me

formado em Arquitetura de Planeamento Urbano e Territorial e de,

posteriormente, realizar o presente Mestrado. Agradeo por todo o profundo

amor, por tudo que sempre fizeram por mim e por acreditarem nas minhas

capacidades. Agradeo a toda a minha restante famlia e amigos por todo o

carinho e apoio demonstrados.

- Quero ainda agradecer e dedicar esta dissertao memria da minha

querida av Maria Amlia e do meu querido tio Gilberto Raul Figueira

Alencastre Tello.

IV

V

Resumo

Atualmente assiste-se a um grave problema de salubridade visual das

cidades, designadamente no espao edificado/ construdo. A sujidade uma

ameaa que, junto com os graffitis, tem contribudo para a degradao precoce

dos espaos urbanos.

A fim de se enfrentar este problema, que tem vindo a proliferar nas

cidades, um pouco por todo o mundo, a presente dissertao de mestrado

ambiciona contribuir para a sistematizao da informao existente sobre a

produo e caracterizao de argamassas de auto-limpeza. As argamassas de

auto-limpeza so produzidas por uma de duas formas: com a adio de

nanopartculas de dixido de titnio (TiO2) na sua matriz ou com a aplicao de

um filme fino base de TiO2 na sua superfcie. Esta segunda apontada como

a tcnica mais eficaz e econmica. Salienta-se o facto do TiO2 ser um dos

nanomateriais mais utilizados na construo pelas suas propriedades

fotocatalticas que o capacitam como um dos mais exmios fotocatalisadores,

aquando da fotocatlise heterognea. graas ao processo de fotodegradao

qumica da fotocatlise, que na presena de luz solar e da ao da gua, que o

TiO2 ativado, desencadeando reaes qumicas que aumentam a eficcia e

eficincia fotocataltica.

Analisou-se um conjunto de trabalhos de investigao recentes que

comprovam que o uso das argamassas de auto-limpeza adequado e benfico

em intervenes em edifcios novos como em obras de conservao e

reabilitao de edifcios antigos. Alm de reduzirem os investimentos em obras

de limpeza, manuteno/conservao e reabilitao, prolongam a conservao

das fachadas e melhoram os nveis da qualidade do ar. Apesar do crescente

nmero de patentes pedidas e concedidas nesta rea, as normas aplicveis

ainda no se encontram uniformizadas. Nesse sentido, a experincia do Japo

deve ser tida como exemplo para que os restantes pases desenvolvam de

forma consensual as suas prprias normas e patentes, permitindo,

futuramente, conferir maior credibilidade, segurana no uso dos nanomateriais

e uma maior permeabilidade no setor da construo.

VI

Elencam-se alguns nano-produtos base de nano TiO2 comercializados

que tm vindo a ser aplicados sobretudo na China, Japo e na Alemanha.

Palavras-chave: argamassas, nanomateriais, Nanotecnologia,

argamassas de auto-limpeza, argamassas fotocatalticas, dixido de titnio,

fotocatlise heterognea, custos de manuteno, conservao e reabilitao.

VII

Abstract

Currently we are witnessing a serious problem of visual health of cities,

particularly in the built/ constructed space. The dirt is a threat that, along with

the graffiti, have contributed to premature deterioration of urban areas.

In order to tackle this problem, which has been proliferating in cities all

over the world, this master thesis aims to contribute to the systematization of

existing information about the production and characterization of self-cleaning

mortars. The self-cleaning mortars are produced by one of two ways: with the

addition of titanium dioxide (TiO2) nanoparticles in the matrix or with the

application of a thin film based on TiO2 on its surface. The second is considered

the most effective and economical technique. It should be noted that the TiO2 is

one of the most used nanomaterials in construction due to its photocatalytic

properties which also enable one of the most eximious photocatalysts, when

heterogeneous photocatalysis. It is thanks to chemical photodegradation

process of photocatalysis, in the presence of sunlight and water action, the TiO2

is activated, triggering chemical reactions that increase efficiency and

photocatalytic efficacy.

A number of recent research were analyzed, showing that the use of

self-cleaning mortars is suitable and beneficial in interventions in new buildings

as in conservation and rehabilitation works of old buildings. In addition to

reducing investment in cleaning works, maintenance/ conservation and

rehabilitation, these mortars extend the facades conservation and improve air

quality levels. Despite the growing number of requested and granted patents in

this area, applicable rules are not yet standardized. In this regard, Japan's

experience should be taken as an example for other countries to develop by

consensus its own standards and patents, allowing in the future give more

credibility, safety in the use of nanomaterials and increased its permeability in

the construction sector.

Some commercial nano-TiO2 based products are listed and applications

are presented (in China, Japan and in Germany).

VIII

Keywords: mortar, nanomaterials, Nanotechnology, self-cleaning

mortars, photocatalytic mortars, titanium dioxide, heterogeneous photocatalysis,

maintenance costs, conservation and rehabilitation works.

IX

ndice Geral

AGRADECIMENTOS ........................................................................................ III

RESUMO............................................................................................................ V

ABSTRACT ...................................................................................................... VII

NDICE GERAL ................................................................................................. IX

NDICE DE FIGURAS ....................................................................................... XI

NDICE DE TABELAS .................................................................................... XIII

SMBOLOS E ABREVIATURAS .................................................................... XV

1. INTRODUO ............................................................................................... 1

1.1. Enquadramento conjuntural do tema ............................................................. 1

1.2. Objetivos ........................................................................................................... 3

1.3. Organizao da dissertao ............................................................................ 4

2. ARGAMASSAS ............................................................................................. 7

2.1. Introduo ......................................................................................................... 7

2.2. Definio e conceito ......................................................................................... 8

2.3. Constituintes das argamassas ...................................................................... 10

2.3.1. Agregados ................................................................................................. 10

2.3.2. Ligantes ..................................................................................................... 13

2.3.3. Adjuvantes ................................................................................................. 15

2.3.4. Adies ...................................................................................................... 17

2.3.5. gua de amassadura ................................................................................. 18

2.4. Propriedades gerais ....................................................................................... 19

2.5. Tipos de argamassas correntes .................................................................... 21

2.5.1. Argamassas de cal area .......................................................................... 22

2.5.2. Argamassas de cal hidrulica .................................................................... 23

2.5.3. Argamassas de cimento ............................................................................. 25

2.5.4. Argamassas bastardas .............................................................................. 26

2.6. Sntese ............................................................................................................ 27

3. NANOMATERIAIS ....................................................................................... 29

3.1. Introduo ....................................................................................................... 29

3.2. Definio e conceito ....................................................................................... 30

3.3. Tipos de nanomateriais aplicados na construo ....................................... 32

3.3.1. Tipos de nanomateriais .............................................................................. 32

X

3.3.2. Propriedades gerais ................................................................................... 39

3.3.3. Aplicaes gerais ....................................................................................... 41

3.4. Sntese ............................................................................................................ 46

4. DIXIDO DE TITNIO (TIO2) ...................................................................... 47

4.1. Introduo ....................................................................................................... 47

4.2. Definio e conceito (TiO2) ............................................................................ 47

4.3. Fotocatlise heterognea .............................................................................. 49

4.4. Fatores que influenciam a Fotocatlise heterognea .................................. 52

4.4.1. Radiao ultra-violeta (UV) ........................................................................ 52

4.4.2. Intensidade luminosa ................................................................................. 53

4.4.3. Temperatura .............................................................................................. 53

4.4.4. Humidade .................................................................................................. 54

4.4.5. Influncia do caudal do gs poluente ......................................................... 54

4.4.6. Influncia da quantidade do fotocatalisador ............................................... 54

4.5. Semi-condutores com propriedades fotocatalticas .................................... 55

4.6. TiO2 como fotocatalisador ............................................................................. 56

4.7. Caractersticas e propriedades gerais do TiO2 ............................................. 57

4.8. Mtodos de sntese de nanopartculas ......................................................... 60

4.9. Aplicaes no contexto da construo ........................................................ 62

4.10. Sntese .......................................................................................................... 70

5. ARGAMASSAS DE AUTO-LIMPEZA.......................................................... 73

5.1. Introduo ....................................................................................................... 73

5.2. Definio e conceito ....................................................................................... 75

5.3. Anlise de campanhas experimentais realizadas com TiO2 ........................ 76

5.4. Enquadramento Normativo e patentes ....................................................... 100

5.4.1. Normas para fotocatlise do TiO2 ............................................................ 100

5.4.2. Patentes .................................................................................................. 108

5.5. Nano produtos comerciais com nano TiO2 .............................................. 110

5.6. Custos de aplicao de nano dixido de titnio (nano TiO2) .................... 119

5.7. Sntese .......................................................................................................... 122

6. CONCLUSO E TRABALHOS FUTUROS ............................................... 123

7. REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS .......................................................... 131

XI

ndice de Figuras

Figura 1: Richard Feynman dando as suas famosas conferncias em Caltech, em 1962......... 29

Figura 2: Escala nanomtrica (nm) ............................................................................................. 31

Figura 3: Nanopartculas ............................................................................................................. 33

Figura 4: Nanofios, foto de MEV (Microscpio eletrnico de varrimento)................................... 34

Figura 5: Trs formas de se enrolar folhas de grafeno e estruturas dos CNT (a: armchair, b: zig-

zag, c: quiral), respectivamente .................................................................................................. 35

Figura 6: Nanocristais ................................................................................................................. 36

Figura 7: Estrutura das nanofitas ................................................................................................ 37

Figura 8: Nanocompsito polimrico ........................................................................................... 38

Figura 9: Aplicaes de nanomateriais na Construo .............................................................. 43

Figura 10: Tinta repelente de urina ............................................................................................. 44

Figura 11: Ilustrao da decomposio de poluentes (NO e COV) por oxidao/ reduo da

gua com oxignio, onde b+ (lacuna oxidante de valncia), e- (eletro redutor da banda de

conduo) .................................................................................................................................... 51

Figura 12: Degradao x radiao UV-A ................................................................................... 53

Figura 13: Esquema representativo de semi-condutor .............................................................. 55

Figura 14: Esquema representativo da activao de um semicondutor ..................................... 56

Figura 11: Formas de cristalizao do TiO2 ............................................................................... 59

Figura 16: Ilustrao dos mtodos de sntese ............................................................................ 60

Figura 17: Vistas da Igreja do Jubileu em Roma ........................................................................ 64

Figura 18: Vista geral do hospital Manuel Gea Gonzalez ........................................................... 66

Figura 19: Peas cermicas Prosolve370e ................................................................................. 67

Figura 20: Revestimento hidroflico, TOTO Hydrotect ................................................................ 68

Figura 21: Pavimento fotocataltico ............................................................................................. 69

Figura 22: Clulas solares Gratzel .............................................................................................. 70

Figura 23: Instalao da rua piloto .............................................................................................. 78

Figura 24: Ensaio de auto-limpeza.............................................................................................. 85

Figura 25: Laboratrio ................................................................................................................. 88

Figura 26: Ensaio de degradao do NOx .................................................................................. 89

XII

Figura 27: Teste da durabilidade fotocataltica ........................................................................... 94

Figura 28: Patentes de hidrofilicidade do grupo TOTO............................................................. 109

Figura 29: Esquema de funcionamento do revestimento fotocataltico .................................... 113

Figura 30: Edifcio Kasagewa Dam, Northern Kyushu, Japo .................................................. 114

Figura 31: Edifcio Medical Corporation Yanagilku-kai Willow Hospital, Japo ........................ 115

Figura 32: Muro, na China ......................................................................................................... 117

Figura 33: Edifcio residencial e de escritrios em Viena, ustria. A aplicao foi feita no piso

trreo em 2010 .......................................................................................................................... 118

Figura 34: Edifcio residencial em Leverkusen, Alemanha. A aplicao foi feita em 2012 ...... 118

XIII

ndice de Tabelas

Tabela 1: Divises da radiao UV ............................................................................................ 52

Tabela 2: Propriedades fsicas do TiO2 ...................................................................................... 59

Tabela 3: Correspondncia entre normas JIS e ISO ................................................................ 102

Tabela 4: Normas ISO para fotocatlise ................................................................................... 103

Tabela 5: Algumas empresas de comercializao de nano produtos com TiO2 ...................... 111

XIV

XV

Smbolos e abreviaturas

AML rea Metropolitana de Lisboa

APA Agncia Portuguesa do Ambiente

b+ Lacuna oxidante de valncia

BET rea de superfcie especfica determinada pelo mtodo Brunauer-Emmett-Teller

Bc Banda de conduo

BS British Standards/ Normas inglesas

Bv Banda de valncia

.C Graus centgrados

CEN - European Standards Organisation

CdSe Seleneto de cdmio

CDV Chemical vapor deposition/ deposio qumica de vapor

CNT Carbon Nanotubes/ Nanotubos de carbono

CO2 Dixido de carbono

COV Compostos Orgnicos Volteis

DIN Deutsches Institut fr Normung/ Normas alems

e- Electro

EEA Environmental european agency / Agncia Europeia do Ambiente

EUA Estados Unidos da Amrica

ESTBarreiro/ IPS Escola Superior de Tecnologia do Barreiro do Instituto Politcnico de Setbal

eV Eletro volt (unidade do band gap)

FeO xidos ferrosos

FEUP Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto

Fe2 O3 xido de ferro

Fe(OH)2 Hidrxido de ferro

g/ mol Grama por mol (unidade de massa molar)

h+ Lacuna

H2O gua

hv Fotes de energia

IPQ Instituto Portugus da Qualidade

IPS International Photocatalyst Standards testing center

XVI

ISO International Organization for Standardization

ISO TC - International Organization for Standardization, Technical Committee

JIS Japanese Industrial Standards/ Normas internacionais japonesas

Kg/ m Quilograma por metro cbico

kW/ m - Quilowatt por metro quadrado

LEDs Dodos emissores de luz

m Metro

m - Metro quadrado

MB Metileno azul

MEV Microscpio electrnico de varrimento

MPa Mega Pascal (unidade de resistncia do beto compresso)

MWCNT Multi walled carbon nanotubes/ Nanotubos de carbono multiparede

NCs Nanocrystals/ Nanocristais

NEC Nippon Electric Company

NO Monxido de nitrognio

NO2 Dixido de nitrognio

NOx Oxido de nitrognio

NP Nanoparticles/ Nanopartculas

NR Nanoribbons/ Nanofitas

NW Nanowires/ Nanofios

O3 - Ozono

OH Radical hidroxila

PCM Phase change materials/ materiais de mudana de fase

PIAJ Photocatalysis Industry Association of Japan

PICADA Photo-catalytic innovative coverings applications for de-pollution assessement

PM10 Partculas em suspenso inalveis

POA Processos de oxidao avanada

ppm Partes por milho

PVD Physical vapor deposition/ deposio fsica de vapor

REACH CA Registration, Evaluation and Authorisation of Chemicals, Competent Authority

RhB Rodamina B

XVII

Rilem Runion Internationale des Laboratoires et Experts des Matriaux, Systmes de construction et Ouvrages

SENIHR Scientific Committee on Emerging and Newly Identified Heath Risks

SI Sistema Internacional de Unidades

SO2 Dixido de enxofre

SOx xido sulfrico

SPD Spray pyrolisis deposition/ spray pirlise

STCSM Science and Technology Commission of Shanghai Municipality

SWNT Single wall carbon nanotubes

Ti Titnio

TiCl4 Tetracloreto de titnio

TiO2 Dixido de titnio

TiPE Titan Photo Energy

TOTO Ty Tki

UE Unio Europeia

UFSC Universidade Federal de Santa Catarina

UNI Italian Organization for Standardization/ Organizao italiana de normalizao

US United States Patent/ Patente americana

UV Radiao ultravioleta

UV A Radiao ultravioleta A

UV B Radiao ultravioleta B

UV C Radiao ultravioleta C

UV Vcuo Radiao ultravioleta de Vcuo

VOCs - Volatile Organic Compounds/ Composto Orgnico Voltil

WO3 Trixido de tungstnio

ZnO xido de zinco

XVIII

ARGAMASSAS DE AUTO-LIMPEZA: DA FORMULAO AS APLICAES

1

1. INTRODUO

1.1. Enquadramento conjuntural do tema

No contexto atual deparamo-nos com um grave problema de sujidade

que em muito afeta a salubridade visual das cidades, bem como os nveis de

qualidade de vida das mesmas. No espao edificado, a sujidade apresenta-se

sob a forma de manchas escuras que descaracterizam e desvalorizam a

imagem dos edifcios, sobretudo dos antigos, revestidos muitas vezes com

pedra porosa, seja natural ou artificial, na sua construo. Esta ocorrncia tem

origem nas crescentes emisses de gases poluentes provenientes dos

automveis e das indstrias, entre outros, responsveis pela poluio

atmosfrica. Alm disso, tambm se destacam os atos de vandalismo (graffitis)

que cada vez mais proliferam pelas cidades. Entenda-se que os graffitis

mencionados referem-se aos que incidem em atos feitos com a inteno de

vandalizar o espao e que degradam as superfcies dos edifcios. Devido

sujidade assiste-se a uma degradao precoce dos espaos urbanos. As

autarquias e os donos de obra no tm mos a medir face s despesas

exorbitantes que estas obras de limpeza, conservao e recuperao

acarretam.

Como forma de cessar o impacte econmico e ambiental na construo

tm vindo a ser desenvolvidos novos materiais de construo com o objetivo de

ultrapassar as limitaes que os materiais convencionais apresentam. Em

muitas situaes, tal desenvolvimento faz-se custa da utilizao de adies

que conferem aos materiais convencionais caractersticas diferentes das

habituais e lhes permitem responder a necessidades especficas. Fala-se

especificamente dos nanomateriais.

Existem vrios tipos de nanomateriais, que foram descobertos nos

ltimos tempos, de entre os quais destaca-se o dixido de titnio (TiO2), o mais

usado em construo pelas suas propriedades nicas, baixa toxicidade, custo

reduzido.

As argamassas de auto-limpeza, so um revestimento que contm na

sua composio, ou na sua superfcie, o referido nanomaterial (TiO2) que,

1. INTRODUO

2

2

devido s suas propriedades fotocatalticas, quando ativado pela radiao solar

e pela ao da gua, permite a eliminao de todo o tipo de sujidade

superfcie (inclusive os graffitis) assim como a purificao do ar da envolvente.

O mecanismo chave da eficincia deste tipo de argamassas designa-se por

fotocatlise heterognea. Consiste num mecanismo que transforma

substncias txicas em substncias puras: dixido de carbono (CO2) e gua

(H2O). As argamassas de auto-limpeza ou argamassas fotocatalticas, devido a

estas caractersticas, alm de contriburem para uma melhoria e manuteno

da salubridade das cidades, permitem ainda uma reduo dos custos com

obras de limpeza, manuteno e conservao de edifcios.

De acordo com os estudos realizados em diferentes tipos de argamassa

(cimento e areia; cal hidratada e metacaulino) e com diversas percentagens de

TiO2, concluiu-se que o melhor desempenho atingido em argamassas de

cimento, com teor de 2% de TiO2 ao trao 1:3 [PEREIRA et al., 2010], apesar

de em poucos estudos tambm se obter bons resultados noutro de tipo de

argamassas, tais como argamassas de cal area, cimento e gesso [LUCAS et

al., 2013]. Alm disso, estudos [PICADA PROJECT, 2005; PACHECO et al.,

2013; KRISHNAN et al., 2013; GUO & POON, 2013; VASCONCELOS et al.,

2014] comprovam que existe uma forma ainda mais eficaz de se produzir

argamassas de auto-limpeza, sem ser por meio da adio de TiO2 na matriz da

argamassa. Tal forma consiste na aplicao de um filme fino ou pelcula de

revestimento fotocataltica, base de TiO2, na superfcie da argamassa.

No entanto, a aplicao comercial de argamassas com TiO2 em Portugal

inexistente justificada parte pelo desconhecimento, desconfiana em torno da

possvel toxicidade deste tipo de materiais e sobretudo pelo custo inicial muito

elevado que implica. Alm disso, a ausncia de documentos normativos para a

formulao de argamassas de auto-limpeza, que permitam inserir estes novos

materiais de construo no mercado, dando-lhes maior credibilidade e

salvaguardando a segurana no seu manuseio e aplicao, bem como

garantindo a segurana da sade pblica e ambiental, igualmente impeditiva

para a disseminao deste material inovador.

ARGAMASSAS DE AUTO-LIMPEZA: DA FORMULAO S APLICAES

3

1.2. Objetivos

A presente dissertao de mestrado tem como principal objetivo

sistematizar a informao existente sobre argamassas com propriedades de

auto-limpeza, desde a sua formulao at s suas aplicaes. Pretende ser

uma fonte de divulgao do conhecimento sobre as argamassas com

propriedades de auto-limpeza, um avano tecnolgico no campo dos materiais

de construo que visa a despoluio das superfcies das fachadas e a

reduo da poluio atmosfrica. Assim sendo, pretende tambm desmistificar

a razo pela qual o uso deste tipo de argamassas ainda no uma prtica

corrente. Ao apresentar as suas vantagens, limitaes e custos, ambiciona

prestar o seu contributo no sentido de incentivar o uso corrente destas

argamassas inovadoras, que recorrem a uma tecnologia limpa (fotocatlise),

para que as cidades estejam repletas de edifcios em bom estado de

conservao e se tornem mais sustentveis e menos poludas.

Deste modo, parte-se de uma abordagem geral onde se estuda na

generalidade o tema das argamassas, passando depois para uma abordagem

mais particular que incide nos diferentes tipos de argamassas mais utilizados

no setor da construo, incluindo na rea da conservao e reabilitao de

edifcios.

Atendendo complexidade que envolve as argamassas de auto-limpeza

importante estudar os nanomateriais existentes, enquadrando-os na

Nanotecnologia. Conhecer as suas caractersticas e propriedades nicas, bem

como identificar quais as suas aplicaes na construo.

Por conseguinte, fundamental estudar e compreender o dixido de

titnio (TiO2), um nanomaterial de grande potencial que, quando transformado

escala nanomtrica, confere propriedades fotocatalticas s argamassas de

auto-limpeza. imprescindvel estudar e analisar os processos de oxidao

avanada (POA), nos quais se insere o complexo mecanismo fotodegradador

da fotocatlise heterognea (responsvel pela degradao de poluentes

orgnicos), inerente ao TiO2. Para esta avaliao estudam-se quais os fatores

que influenciam o seu desempenho e compreende-se a razo que justifica a

1. INTRODUO

4

4

preferncia do TiO2 como um dos fotocatalisadores mais utilizados nas

argamassas de auto-limpeza. preciso investigar a gnese do TiO2, as

matrias-primas, formas de cristalizao e mtodos de sntese. Para esta

avaliao apresentam-se alguns casos prticos que ilustram o modo como

utilizado no setor da construo.

Para dar cumprimento aos objetivos deste trabalho, fulcral estudar o

conceito geral das argamassas de auto-limpeza, compreender a sua funo e

identificar as condies propcias ao seu correto funcionamento. Para tal,

apresenta-se o levantamento de um conjunto de trabalhos de investigao que

permitem entender como que este tipo de argamassas produzido, qual o

desempenho, em termos de auto-limpeza e degradao dos poluentes

atmosfricos, e a sua viabilidade.

Investiga-se o atual panorama das normas e das patentes, a nvel

nacional e internacional, de forma a compreender a razo que justifica a sua

aplicao ainda pouco generalizada em Portugal.

ainda do interesse deste trabalho, investigar a existncia de nano-

produtos base de nano TiO2 que sejam atualmente comercializados,

descobrir o seu potencial e viabilidade. Para tal, apresenta-se informao

comercial relativa ao material em estudo.

1.3. Organizao da dissertao

A presente dissertao encontra-se dividida em sete captulos. Os

fundamentos desta dissertao resultam de uma exaustiva pesquisa

bibliogrfica cujo objetivo foi reunir e compilar a informao que concerne ao

tema em estudo: argamassas de auto-limpeza.

No captulo 1 efetua-se o enquadramento conjuntural do tema, onde se

apresenta sinteticamente o tema alvo do estudo e descrevem-se os principais

objetivos preconizados.

No captulo 2 apresenta-se o material de construo argamassas.

ARGAMASSAS DE AUTO-LIMPEZA: DA FORMULAO S APLICAES

5

Caracterizam-se os vrios elementos constituintes das argamassas, bem como

as suas propriedades e funes. Por fim, realiza-se uma caracterizao dos

vrios tipos de argamassas existentes em termos da sua composio, funo e

aplicao corrente.

No captulo 3 faz-se uma reflexo sobre os vrios tipos de nanomateriais

e o seu enquadramento na Nanotecnologia. Explica-se a noo de escala

nano, faz-se o enquadramento em termos histricos incidindo na investigao

que tem sido feita ao longo dos anos aps a sua descoberta e o financiamento

que tem sido investido para desenvolver novos nanomateriais, nas mais

variadas reas. Apresentam-se os vrios tipos de nanomateriais existentes, as

propriedades e, por fim, abordam-se as aplicaes mais correntes destes

materiais inovadores no setor da construo.

No captulo 4 aborda-se o dixido de titnio (TiO2) em detalhe. Explica-

se, no geral, os processos oxidativos avanados (POA) onde se enquadra o

mecanismo de fotodegradao da fotocatlise heterognea implcito no TiO2,

como um dos fotocatalisadores mais utilizados. Descrevem-se ainda as

caractersticas e propriedades gerais do TiO2, formas de cristalizao e de

extrao, passando pelos mtodos de sntese das suas nanopartculas. Por

ltimo, faz-se uma sntese das suas aplicaes no setor da construo.

O captulo 5 divide-se em trs partes:

Numa primeira parte enquadra-se, de modo global, a situao das

argamassas de auto-limpeza e explica-se o conceito. Depois

efetua-se um levantamento e anlise dos resultados de trabalhos

experimentais realizados sobre o tema;

Aborda-se o atual panorama das normas e patentes existentes

sobre argamassas de auto-limpeza, analisando o seu contexto, a

nvel nacional e internacional;

Com base nas pesquisas realizadas mencionam-se algumas das

principais empresas de produo e comercializao de nano

produtos base de TiO2, onde so apresentados alguns casos de

1. INTRODUO

6

6

estudo e so referidos valores de referncia, aquando da

aplicao deste tipo de materiais.

No captulo 6 sumarizam-se as principais concluses do tema

desenvolvido ao longo da presente dissertao e sugerem-se trabalhos futuros

que dem seguimento e complementem o tema em questo.

No ltimo captulo renem-se todas as referncias bibliogrficas

consultadas.

ARGAMASSAS DE AUTO-LIMPEZA: DA FORMULAO AS APLICAES

7

2. ARGAMASSAS

2.1. Introduo

Desde h milhares de anos que as argamassas se encontram

associadas arquitetura e construo de edifcios. Utilizavam-se sobretudo

para a construo de muros e paredes bem como para o seu revestimento.

Nos primrdios, as construes eram dbeis mas com a evoluo do

conhecimento de materiais converteram-se em algo mais slido e

progressivamente mais resistente.

Factos histricos demonstram que as primeiras argamassas remontam

h cerca de 10 000 anos na Galileia, atual estado de Israel. O fabrico de gesso

e cal era habitual para a maioria dos povos das antigas civilizaes (chineses,

egpcios, etruscos, fencios, gregos, incas e romanos) sendo utilizado na

consolidao dos elementos de alvenaria ou na confeo de rebocos pintados.

Com o intuito de melhorar a sua qualidade de vida e assegurar a sua proteo,

os povos das antigas civilizaes, baseando-se nos recursos naturais

disponveis, comearam a erguer abrigos [BRANCO, 1981; OLIVEIRA, 1959;

SOUSA, 2009].

Desde a Antiguidade e da Idade Mdia que a mistura de aditivos e

adjuvantes (exemplo banha, sangue, cinzas), onde se adicionavam ligantes e

agregados, era utilizada com o objetivo de melhorar o desempenho das

argamassas [MARZO, 1997; SOUSA 2009]. Estudos recentes mostram que os

adjuvantes utilizados na poca funcionavam como introdutores de ar,

melhoravam a distribuio de vazios e aumentavam a resistncias aos ciclos

de gelo/ degelo, o que contribua para aumentar a durabilidade das edificaes

[BAYER & LUTZ, 2003].

Foi a partir de 1824 que se observou uma grande mudana no

panorama das argamassas aquando do surgimento do cimento Portland, por

Joseph Aspdin, substituindo na grande parte das obras de construo civil, o

uso da cal hidrulica e da cal area. O cimento Portland torna-se assim o

2. ARGAMASSAS

8

8

ligante hidrulico mais empregue na produo de rebocos de enchimento e

acabamento [OHARE, 1995].

O uso de um nico ligante, assim como de um nico tipo de agregado,

nas argamassas produzidas em obra, no conduziu a um bom desempenho do

reboco que com frequncia foi apresentando fenmenos de retrao e por

conseguinte fissuraes. Tal deveu-se ao uso constante de argamassas

demasiado rgidas, com elevadas resistncias mecnicas (no compatveis

para o fim a que se destinavam), motivadas pela presso do cumprimento de

prazos muito exigentes. Para resolver esta situao, surgem as argamassas

industriais, permitindo assim melhorar a qualidade destas, a sua rapidez de

execuo assim como a disponibilizao de uma vasta gama de produtos com

um grau de especializao superior. Alm das argamassas de reboco e de

alvenaria, apareceram novos produtos: argamassas para pavimento

(betonilhas) e de regularizao. Em meados do sculo XX observou-se um

forte crescimento deste tipo de argamassas justificado tambm pela evoluo

do transporte, com a sistematizao do transporte a granel e com a

mecanizao dos sistemas de mistura [ASHURST, 1997; NERO, 2001;

RIBEIRO, 2004-2005; SOUSA 2009].

Atualmente, a maioria do conhecimento sobre a produo e aplicao de

argamassas de cal tem-se vindo a perder ou precisa de ser sujeito a uma

reviso e aprofundamento para se adaptar s novas exigncias dos edifcios

atuais [VIEIRA, 2013].

2.2. Definio e conceito

As argamassas correspondem a uma mistura homognea de agregados

(areias, gravilhas), agentes ligantes e gua. s mesmas podem adicionar-se

substncias que pretendem melhorar o desempenho especfico e que so os

aditivos e as adies, sob a forma de adjuvantes e pozolanas, respetivamente

[MARGALHA, 2011].

ARGAMASSAS DE AUTO-LIMPEZA: DA FORMULAO S APLICAES

9

Tal como o beto, as argamassas tambm adquirem plasticidade nas

primeiras horas de produo e endurecem com o tempo, alcanando elevada

resistncia e durabilidade [MIRANDA, 2009].

Nos dias de hoje, existe um vasto campo de aplicao deste material

que vai desde o assentamento de alvenarias, impermeabilizao/

regularizao de superfcies, bem como aos revestimentos e acabamentos.

As argamassas aplicadas como revestimentos tm de ser apropriadas

para que possam aderir corretamente ao suporte, acompanhando os

movimentos internos resultantes da secagem e do processo de endurecimento,

bem como as solicitaes exteriores. Devem tambm permitir as trocas de

vapor entre o interior e o exterior dos edifcios, fundamentais para expulsar a

gua infiltrada. Os fenmenos atrs referidos relacionam-se entre si, uma vez

que fundamental uma escolha correta das quantidades das matrias-primas

para cumprir os requisitos pr-definidos [MARGALHA, 2011].

Margalha [MARGALHA, 2011] refere que as argamassas de

revestimento (sistema tradicional) so aplicadas segundo trs camadas

distintas (prevenindo assim a fissurao e sua propagao):

Salpico (chapisco, crespido ou camada de aderncia) primeira camada

de todas, mais fina e rugosa, bastante fluda, com maior quantidade de

ligante. Tem a funo de homogeneizar a absoro do suporte e fazer a

ligao com a alvenaria;

Base (reboco) segunda camada aplicada sobre o salpico, uma

camada mais espessa, permite a regularizao e impermeabilizao do

suporte. Pode ser constituda por mais do que uma camada. O

acabamento no deve ser muito liso de modo a conferir aderncia

camada de acabamento;

Acabamento (esboo, emboo) decide o aspeto do suporte em termos

de cor e textura. Apresenta uma areia com granulometria mais fina e/ou

menor quantidade de ligante.

2. ARGAMASSAS

10

10

Alm do mtodo tradicional referido existe tambm a monocamada.

Tratam-se de argamassas no tradicionais, pr-doseadas e industrializadas.

So constitudas por ligantes e cargas minerais selecionadas, enriquecidas

com aditivos/ adjuvantes. A sua aplicao consiste numa s camada,

substituindo assim o sistema tradicional de reboco mais pintura. Para alm

disto, conferem proteo, impermeabilizao e decorao s fachadas

[SOUSA, 2009].

2.3. Constituintes das argamassas

O presente subcaptulo versa sobre os constituintes das argamassas,

sendo estas o resultado de uma mistura de agregados com ligantes orgnicos

ou inorgnicos, aditivos e/ou adjuvantes. Cada um dos constituintes das

argamassas ser apresentado em termos de conceito geral, composio,

classificao e respetivas funes/ papel integrante.

2.3.1. Agregados

Designa-se por agregado o material particulado, incoesivo, de atividade

qumica praticamente nula, composto por misturas de partculas cobrindo uma

extensa gama de tamanhos [FALCO BAUER, 1994].

Segundo Faria Rodrigues [FARIA RODRIGUES, 2004], os agregados

classificam-se em grossos e finos e so o esqueleto das argamassas.

Nascimento Paulo [NASCIMENTO PAULO, 2006] refere que os

agregados tambm podem ser classificados pela origem, dimenso das

partculas e pela massa volmica aparente.

Em termos da origem podem ser:

Naturais agregados que se encontram na natureza, exemplo areia e

cascalho;

ARGAMASSAS DE AUTO-LIMPEZA: DA FORMULAO S APLICAES

11

Industrializados possuem composio particulada proveniente de

processos industriais, exemplo escria de alto forno;

Reciclados resultantes de processamento inorgnico utilizado na

construo.

Quanto dimenso das partculas:

Finos consistem em areias que podem ser recicladas ou britadas, com

partculas de dimenses reduzidas;

Grossos trata-se do godo, com origem sedimentar, calhau ou seixo e

das britas.

Quanto massa volmica aparente:

De acordo com a densidade do material que compe as partculas, os

agregados designam-se por leves, mdios/ normal e pesados.

Em termos qumicos, os agregados finos naturais resultam da

desagregao de rochas podendo, por isso, subdividir-se essencialmente em

dois grupos: areias siliciosas (quartzozas e granticas, provenientes de rios ou

de areeiro) e areias calcrias (oriundas da britagem de material de pedreiras).

Podem incluir maior ou menor percentagem de argila, o que devido a isso,

podem conferir s argamassas maior trabalhabilidade e resistncia. No

entanto, podem ainda diminuir a coeso agregado-ligante, sendo necessrio

uma maior adio de gua, o que pode provocar o desenvolvimento dos

fenmenos de retrao [FARIA RODRIGUES, 2004; RATO, 2006].

Os agregados interferem na compacidade da argamassa devido sua

granulometria e forma das partculas que, por conseguinte, influencia o volume

de vazios. O uso de agregados tem o objetivo de reduzir a retrao, aumentar

a porosidade melhorando assim a permeabilidade ao vapor de gua, reduzir o

teor de ligante, aumentar a resistncia ao gelo e a resistncia compresso

[CAVACO, 2005].

Grilo [GRILO, 2013] refere no seu trabalho que, no caso de Portugal, os

agregados finos naturais so maioritariamente provenientes de areeiros,

2. ARGAMASSAS

12

12

jazidas ou de leitos de rio mas tambm da fragmentao de rochas. No

contexto da sua constituio mineralgica, de um modo geral, as areias so

siliciosas formadas sobretudo por quartzo [RATO, 2006; CARNEIRO, 2012].

Cavaco [CAVACO, 2005] refere que na escolha dos agregados a utilizar

na produo de argamassas deve ser tido em conta o tipo de argamassa (uso

a que se destina) e qual o desempenho pretendido. Alm disso, devem-se

observar as seguintes caractersticas no agregado: granulometria; forma da

partcula; inalterabilidade ao ar; gua e outros agentes; compatibilidade

qumica com os componentes da argamassa; resistncia mecnica e eroso;

ausncia de substncias nocivas (matria orgnica, partculas moles, entre

outras). Sousa [SOUSA, 2009] refere que as areias empregues na produo de

argamassas devem apresentar-se limpas, secas, e no podem conter matria

orgnica.

A forma dos gros e respetiva curva granulomtrica interferem no

aspeto, na cor, na porosidade e na trabalhabilidade da argamassa. Ou seja,

quanto menor for o mdulo de finura dos agregados, menos compacta ser a

argamassa, e por conseguinte maior ser a dimenso dos vazios, tornando-se

assim mais trabalhvel [GASPAR, 2002; SOUSA 2009].

Os autores [AGOSTINHO, 2008; MARTINS, 2008; FONTES, 2011]

referem que a granulometria e a forma das partculas interfere na porosidade

da argamassa. Isto , quanto mais extensa for a granulometria, recomendando-

se 2/3 de partculas grossas e 1/3 de partculas finas, e quanto mais angulosas

forem as partculas, menor ser a percentagem de vazios e, por conseguinte,

menor a percentagem de gua e a dosagem de ligante necessrios,

proporcionando uma reduo no fenmeno de retrao. Por outro lado, as

partculas angulosas conferem melhor compacidade e atrito entre si,

aumentando a resistncia do revestimento.

De um modo geral, pode-se concluir que os agregados so um material

particulado que estrutura as argamassas. Classificam-se quanto origem,

dimenso das partculas e massa volmica aparente. Em Portugal, a sua

ARGAMASSAS DE AUTO-LIMPEZA: DA FORMULAO S APLICAES

13

origem sobretudo de areeiros, jazidas ou de fragmentao de rochas.

2.3.2. Ligantes

Designam-se por ligantes os materiais que apresentam o poder de

aglutinar outros materiais e que tm papel ativo no estabelecimento da unio

entre os demais constituintes das argamassas [CAVACO, 2005].

Gomes e colaboradores [GOMES et al., 2013] dividem os ligantes

segundo dois tipos: inorgnicos e orgnicos.

Os ligantes inorgnicos existem sob a forma de um p de grande finura,

o seu uso implica a mistura com gua para assegurar a adequada mistura e

conexo das partculas a unir. Ao serem misturados com gua, este tipo de

ligantes gera pastas com fluidez e plasticidade variveis, com a capacidade de

alterarem a forma pretendida e de criarem superfcies lisas. Subdividem-se

ainda em dois tipos: areos e hidrulicos [GOMES et al., 2013].

Ligantes inorgnicos areos s apresentam capacidade de fazer presa,

endurecer e se manterem mecanicamente resistentes se conservados ao ar.

Exemplos: cal area e gesso [GOMES et al., 2013].

Cais areas: designam-se por cais areas todas as cais compostas

nomeadamente por xido ou hidrxido de clcio, que endurecem de

forma lenta ao ar por influncia do dixido de carbono atmosfrico. Por

norma no fazem presa dentro de gua, dado que no so dotadas de

propriedades hidrulicas. Traduzem-se em cais vivas ou cais hidratadas.

As cais vivas so cais areas compostas sobretudo por xido de clcio e

por xido de magnsio fabricadas por calcinao de rocha calcria e/ou

de dolomite. Aquando da sua presena na gua verificam uma reao

exotrmica. Por outro lado, as cais hidratadas consistem em cais

clcicas ou dolomticas e resultam do processo de extino das cais

vivas. Apresentam-se na forma de um p seco, uma pasta, ou ento de

uma calda (leite de cal) [NASCIMENTO PAULO, 2006];

2. ARGAMASSAS

14

14

Gesso: produzido com base na matria-prima rica em gipsita, existente

em vrios locais, e apresenta muitas aplicaes, justificadas pela sua

capacidade de desidratao e de re-hidratao [GOMES et al., 2013]. O

gesso constitudo por sulfato de clcio, que existe na natureza de

modo hidratado. O gesso apresenta uma capacidade de fazer presa

rpida, possui fcil obteno e as suas baixas temperaturas em

produo, garantiram, durante muito tempo, o seu uso como constituinte

preferido no fabrico de argamassas. A sua aplicao direcionada para

climas secos e para o interior de edifcios. Apresenta dois grandes

pontos negativos: uma baixa resistncia mecnica e solubilidade em

guas pluviais, sendo contrariados com a mistura com cal. A sua

vantagem consiste em expandir ligeiramente durante a presa,

prevenindo assim problemas associados retrao. aplicado no

fabrico de cimentos com o objetivo de retardar a presa do clnquer. Com

o tempo, o gesso foi caindo em desuso [MARQUES, 2005].

Os ligantes inorgnicos hidrulicos quando misturados com gua,

adquirem a capacidade de fazer presa, endurecer e assegurar a resistncia ao

longo do tempo, quer conservados ao ar, quer em gua. Exemplos: cal

hidrulica e cimento Portland [GOMES et al., 2013].

Cal hidrulica natural: cais criadas atravs de calcinao de calcrios

mais ou menos argilosos com reduo a p por extino, com ou sem

moagem. Todas as cais deste gnero tm a vantagem de fazer presa e

endurecer debaixo de gua, dada a sua componente hidrulica

[NASCIMENTO PAULO, 2006].

Cimento Portland: trata-se de um dos ligantes mais aplicados no fabrico

de argamassas e tambm de betes. Tem a caracterstica de ganhar

presa e endurecer atravs da hidratao, no ar ou ento em gua. Alm

disto, o cimento tem tambm poder aglomerante, que se observa

sempre que adicionado aos agregados [NASCIMENTO PAULO, 2006].

ARGAMASSAS DE AUTO-LIMPEZA: DA FORMULAO S APLICAES

15

No que diz respeito aos ligantes orgnicos, salienta-se os ligantes

betuminosos, empregues no fabrico de betes betuminosos para os

pavimentos rodovirios, assim como alguns materiais polimricos (exemplo:

resinas sintticas acrlicas, epoxdicas, fenlicas entre outras) [GOMES et al.,

2013].

A capacidade que os ligantes tm de desenvolver o processo de

endurecimento e assegurar, ou no, as suas propriedades na presena da

gua influenciada pelo ndice de hidraulicidade das matrias-primas

empregues no seu fabrico [CAVACO, 2005; FARIA RODRIGUES, 2004;

AGOSTINHO, 2008].

De um modo geral, conclui-se que os ligantes permitem aglutinar os

vrios constituintes das argamassas. Podem dividir-se em ligantes inorgnicos

e orgnicos.

Os ligantes inorgnicos encontram-se sob a forma de p e apresentam

elevada finura. Ao serem misturados com gua originam pastas muito fluidas e

plsticas. Os ligantes inorgnicos subdividem-se em: areos (cal area, gesso)

e hidrulicos (cal hidrulica natural, cimento Porland).

Relativamente aos ligantes orgnicos, referem-se os ligantes

betuminosos, utilizados na produo de beto betuminoso empregue em pisos

rodovirios, e os materiais polimricos como por exemplo as resinas.

2.3.3. Adjuvantes

Segundo Coutinho [COUTINHO, 1988] designa-se por adjuvante a

substncia utilizada em percentagem inferior a 5% da massa do ligante,

adicionada durante a amassadura aos componentes normais das argamassas,

com a funo de alterar determinadas propriedades destes materiais, tanto no

estado fresco como no estado endurecido, e tambm durante a passagem de

um estado para outro.

2. ARGAMASSAS

16

16

De acordo com os vrios autores [BOTELHO, 2003; CAVACO, 2005;

COUTINHO, 1988; VEIGA, 1998; FONTES, 2011; NASCIMENTO PAULO,

2006] enunciam-se os adjuvantes aplicados na produo de argamassas:

Hidrfugos diminuem a permeabilidade gua no revestimento e

reduzem a capilaridade. Contudo, devem ser usados com algum cuidado

sobretudo em argamassas de cal area devido ao facto de conduzirem a

uma diminuio da permeabilidade do vapor de gua;

Aceleradores de presa aumentam a presa e, por conseguinte,

melhoram substancialmente a resistncia da argamassa. So

aconselhveis para situaes urgentes e climas frios e hmidos, pois

diminuem drasticamente o tempo e a trabalhabilidade da massa. Tm

contudo, o problema de reduzir as resistncias aos ciclos de gelo e

degelo;

Retardadores de presa prolongam as reaes de hidratao durante

um perodo mais extenso do que o normal. Assim, a diminuio da

viscosidade da massa mais demorada enquanto que o tempo de

trabalhabilidade da massa em estado fresco superior;

Introdutores de ar transformam a reologia da massa fresca com a

introduo de pequenas bolhas. Resultam da formao de um grande

nmero de bolhas de ar que se distribuem homogeneamente pela

argamassa, mantendo-se aps o seu emprego e fase endurecida. Essas

bolhas assumem a funo de corte na capilaridade, obtendo-se assim

um aumento da resistncia nos ciclos gelo/ degelo, das caractersticas

trmicas da argamassa e a diminuio do fenmeno da retrao;

Expansivos opem-se ao fenmeno de retrao, provocando uma

ligeira expanso sem afetar, posteriori, a estabilidade da argamassa

no estado endurecido;

Plastificantes aumentam a trabalhabilidade da argamassa e reduzem a

segregao, conduzindo a uma diminuio da quantidade de gua

ARGAMASSAS DE AUTO-LIMPEZA: DA FORMULAO S APLICAES

17

usada na amassadura, e eventualmente a quantidade do ligante,

permitindo assim menor risco de retrao. Apresentam o inconveniente

de poder retardar a presa e diminuir as resistncias iniciais;

Fungicidas previnem a possvel fixao de organismos (musgo, bolor)

na superfcie da argamassa.

De um modo geral, conclui-se que os adjuvantes consistem em

substncias que se adicionam em pequenas quantidades s argamassas no

ato da amassadura a fim de se modificar determinadas propriedades, em

estado fresco ou ento em estado endurecido.

2.3.4. Adies

As adies so materiais inorgnicos finamente divididos (modos ou

no) que podem ser adicionados s argamassas com o objetivo de obter ou

melhorar propriedades especficas [COSTA & APPLETON, 2002].

Classificam-se segundo dois tipos: adies do tipo I praticamente

inertes e adies do tipo II pozolnicas ou hidrulicas.

Nas adies do tipo I praticamente inertes - existem:

Cargas ou filers minerais: so materiais inorgnicos, naturais ou

artificiais, selecionados com base na distribuio granulomtrica,

permitem aperfeioar as propriedades das argamassas, como o caso

da trabalhabilidade ou da reteno de gua. So quase inertes e no

possuem propriedades hidrulicas nem propriedades pozolnicas.

Exemplo: filer calcrio [NASCIMENTO PAULO, 2006; COUTINHO, 1988;

COSTA & APPLETON, 2002].

Pigmentos inorgnicos: traduzem-se em ps de cor determinada,

extremamente finos cuja funo conferir cor argamassa. Tm

sobretudo aplicao em argamassas de revestimentos com teor esttico

[VEIGA, 1998; COUTINHO, 1988; NASCIMENTO PAULO, 2006].

2. ARGAMASSAS

18

18

Nas adies do tipo II pozolnicas e hidrulicas existem:

Adies com propriedades hidrulicas latentes: possuem por si s

caractersticas hidrulicas, apresentam a capacidade de reagir

diretamente com a gua e endurecer. Exemplo: escria de alto forno

[GOMES et al., 2013a];

Adies pozolnicas: ao contrrio das anteriores, estas adies no

reagem diretamente com a gua pelo que precisam da presena de

hidrxido de clcio para reagir. Exemplo: pozolana natural, cinza volante

e slica de fumo [GOMES et al., 2013a].

A utilizao de adies nas argamassas em Portugal ainda reduzida,

por isso, aconselhvel ser antecedida pela realizao de ensaios a fim de se

verificar a sua compatibilidade [MARTINS, 2008; VEIGA, 1998].

2.3.5. gua de amassadura

A quantidade de gua utilizada na produo das argamassas condiciona

a sua consistncia, o processo de endurecimento, a aderncia ao suporte, as

caractersticas no estado endurecido e a qualidade final dos revestimentos

[AGOSTINHO, 2008; CAVACO, 2005].

A gua adicionada na amassadura das argamassas deve ser isenta de

substncias impuras em quantidades que possam prejudicar as propriedades

das argamassas.

Deve-se evitar particularmente o uso da gua do mar dado que contm

grande teor em sais. Alm disto, as guas minerais, mesmo as potveis,

tambm no devem ser utilizadas devido ao facto de no conseguirem obter a

saturao, atrasando assim o processo de presa [CAVACO, 2005; BOTELHO,

2003].

No trabalho de Agostinho [AGOSTINHO, 2008] este identifica a

temperatura da gua como sendo outro fator importante a ter em ateno pois

ARGAMASSAS DE AUTO-LIMPEZA: DA FORMULAO S APLICAES

19

influencia o tempo de endurecimento. Rojas [ROJAS, 2002] refere que caso a

temperatura seja superior a 30.C o processo de endurecimento aumenta

enquanto que com temperaturas menores do que 7.C o processo retardado.

Uma vez que preciso saber dosear a quantidade de gua deve-se, por

isso, aplicar o volume mnimo de gua para garantir a consistncia fundamental

de modo a que argamassa possa ser aplicada em condies adequadas

[CAVACO, 2005].

De um modo geral, conclui-se que a gua de amassadura deve ser

isenta de sais e ser doseada na quantidade mnima para no pr em risco a

trabalhabilidade, e se obter uma trabalhabilidade tima para a aplicao em

vista. Alm disso, a temperatura interfere no processo de endurecimento.

2.4. Propriedades gerais

As argamassas apresentam propriedades diferentes consoante se

apresentam no estado fresco ou estado endurecido.

Em relao ao estado fresco, enunciam-se, como exemplo, as seguintes

propriedades: trabalhabilidade, reteno de gua, consistncia, plasticidade,

aderncia inicial [CRUZ, 2009; AGUIAR, 2007; AZEVEDO, 2011].

Quanto ao estado endurecido, avaliam-se as seguintes propriedades:

aderncia, retrao, capacidade de absorver ou acomodar as deformaes,

resistncia mecnica, permeabilidade, condutibilidade trmica, resistncia ao

ataque de agentes qumicos, resistncia ao fogo, entre outras [CRUZ, 2009;

AGUIAR, 2007; AZEVEDO, 2011].

Segue-se uma breve descrio de algumas das propriedades que

importam nas argamassas de revestimento:

Trabalhabilidade a propriedade de trabalhabilidade relaciona-se com a

consistncia (trata-se do grau de humidade de uma mistura e est

associado com o nvel de plasticidade da massa). Consiste na facilidade

de trabalhar, ou seja, de manusear corretamente e aplicar a argamassa,

2. ARGAMASSAS

20

20

tendo em conta a sua compacidade, rendimento e aderncia ao suporte

[GASPAR, 2002; MIRANDA, 2009].

Resistncia mecnica relaciona-se com o mdulo de elasticidade e

interfere na trabalhabilidade e na resistncia deformao da

argamassa [MIRANDA, 2009]. Indica maior ou menos resistncia a

solicitaes mecnicas.

Compatibilidade com o suporte a compatibilidade entre a argamassa e

o suporte est relacionada com uma srie de parmetros:

compatibilidade geomtrica, compatibilidade fsica, compatibilidade

mecnica, compatibilidade qumica. Tais parmetros devem assegurar

uma boa aderncia entre ambos bem como o equilbrio das trocas

higrotrmicas entre a argamassa e o suporte [GASPAR, 2002;

MIRANDA, 2009].

Resistncia fendilhao com a perda de gua e consequente

reduo do volume, a argamassa depois de aplicada pode registar

fenmenos de retrao acompanhados de fendilhao. A tendncia para

o fenmeno de fendilhao aumenta com o aumento da retrao e

tambm com o aumento da relao de elasticidade/ resistncia trao

[MIRANDA, 2009]. Existem no entanto, fatores que evitam o fenmeno

de fendilhao como o caso de uma boa aderncia ao suporte, poder

de reteno elevado, condies de aplicao, caractersticas do suporte

com os seus movimentos e deformaes e tambm o nvel de exposio

aos agentes atmosfricos [GASPAR, 2002; MIRANDA, 2009].

Permeabilidade gua consiste na capacidade da gua ser absorvida

no suporte, atravs de capilaridade ou de permeabilidade [MIRANDA,

2009].

Durabilidade esta propriedade est associada sua capacidade de

resistncia relativamente aos meios e agentes agressivos, pelo que a

sua integridade dever ser salvaguardada durante a sua aplicao e ao

ARGAMASSAS DE AUTO-LIMPEZA: DA FORMULAO S APLICAES

21

longo do seu perodo de vida til [AZEVEDO, 2011].

Aguiar [AGUIAR, 2007] refere que, ao longo da sua vida til as

argamassas devero manter as suas propriedades essenciais e dar resposta

aos requisitos mnimos de desempenho que lhe so exigidos. Posto isto,

devero manter a unio dos seus constituintes, resistindo assim s intempries

e agentes agressivos. Alm disto, existem determinados fatores que

condicionam as propriedades das argamassas que so nomeadamente:

a dosagem e o tipo de ligante aplicado;

a proporo de gua usada, fundamental para hidratar o ligante e

molhar a areia, em caso de excesso provoca maior volume de vazios

que conduzem a menores resistncias compresso e a uma maior

permeabilidade;

o devido cumprimento das condies de aplicao em obra assim como

a sua conservao.

Em suma, as propriedades das argamassas relacionam-se com o seu

estado de caracterizao, que pode ser estado fresco ou estado endurecido.

As principais propriedades que importam avaliar nas argamassas so a

trabalhabilidade, resistncia mecnica, compatibilidade com o suporte,

resistncia fendilhao, permeabilidade gua e durabilidade. Existe um

conjunto de fatores que exercem influncia nas propriedades das argamassas,

tais como: a dosagem e tipo de ligante utilizado; a quantidade de gua

adicionada na mistura, a salvaguarda das boas normas de aplicao das

argamassas em obra e o cumprimento da sua conservao.

2.5. Tipos de argamassas correntes

Neste subcaptulo abordam-se os vrios tipos de argamassas correntes

no mercado, inclusive na rea da conservao e reabilitao de edifcios

antigos, onde sero apresentados os constituintes, aplicaes e caractersticas.

2. ARGAMASSAS

22

22

2.5.1. Argamassas de cal area

Alm dos constituintes bsicos de uma argamassa, apresentam como

componente principal cal area. Utilizam-se, regra geral, traos volumtricos

fortes em ligante de 1:3, com um ou dois tipos de areia [AGOSTINHO, 2008].

Tm uma absoro capilar elevada, no entanto, apresentam elevada

permeabilidade ao vapor de gua, que proporciona a evaporao de gua que

possa existir no interior dos paramentos [CAVACO, 2005].

Neste tipo de argamassas ocorrem dificuldades ao nvel da presa, em

ambientes hmidos e com pouca presena de dixido de carbono, visto que o

seu endurecimento e desenvolvimento de resistncia mecnica ocorre devido

carbonatao. Alm disto, o desempenho das argamassas de cal area

muitssimo condicionado pela sua aplicao em obra [BOTELHO, 2003; PINTO

& GOMES, 2006/2007].

As argamassas de cal area tm resistncia mecnica baixa, que

contrasta com a sua elevada trabalhabilidade, deformabilidade, capacidade de

absoro de gua, porosidade, associada a uma menor retrao face s

argamassas de cimento [BOTELHO, 2003; PINTO & GOMES, 2006/2007].

Podem ainda produzir solues mais permeveis do que as obtidas com

as argamassas de ligante hidrulico, caracterstica importante sempre que as

argamassas sejam utilizadas como camadas de reboco de edifcios antigos

[AGOSTINHO, 2008].

Agostinho [AGOSTINHO, 2008] refere que o comportamento mecnico

das argamassas de cal area verifica elevado desempenho sempre que o

mdulo de elasticidade da argamassa de revestimento inferior ao do suporte

e similar ao da argamassa preexistente. Ou seja, so asseguradas as

condies de compatibilidade entre a argamassa preexistente e a argamassa

recente permitindo assim, que esta acompanhe as oscilaes do suporte,

tornando as tenses internas mnimas [BOTELHO, 2003].

Este tipo de argamassas apresenta baixa resistncia mecnica, dado

ARGAMASSAS DE AUTO-LIMPEZA: DA FORMULAO S APLICAES

23

que a tenso de rotura flexo muito inferior da compresso. Assim sendo,

quanto maior for esta razo maior ser a ductilidade do material de suporte

[FARIA RODRIGUES, 2004].

Num dos seus trabalhos de investigao Veiga [VEIGA, 2003] refere que

estas argamassas tm demonstrado ter problemas com durabilidade, quando

expostas s intempries (chuva e sobretudo gelo). Todavia, as argamassas de

cal chegaram at aos nossos dias e apresentam adequada resistncia e

coeso face a muitas argamassas atuais. Segundo Agostinho [AGOSTINHO,

2008] este tipo de argamassas considerado o mais adequado para obras de

conservao e reabilitao de edifcios antigos e o mais apropriado para a

produo de revestimentos de alvenarias antigas, onde se verifica uma boa

compatibilidade entre os materiais e opes construtivas.

2.5.2. Argamassas de cal hidrulica

Alm dos constituintes gerais de uma argamassa, as argamassas de cal

hidrulica so assim designadas visto que so produzidas com aglomerantes

hidrulicos, como o caso da cal hidrulica, desenvolvendo presa ao ar e

tambm na presena de gua [MIRANDA, 2009].

Tm propriedades intermdias em relao s argamassas de cimento e

s argamassas de cal area. Em termos de resistncia e retrao, observam-

se inferiores s argamassas de cimento, provocando assim menor tendncia

para fendilhao, contudo verificam-se superiores s argamassas de cal area.

Apresentam um coeficiente de capilaridade mais elevado relativamente ao das

argamassas de cimento, todavia menor do que o das argamassas de cal area

[AGOSTINHO, 2008; BOTELHO, 2003].

Uma vez que as argamassas de cal hidrulica tm resistncias

mecnicas inferiores s do cimento (tanto flexo como compresso),

renem condies propcias formao de cristais no seu interior e, por isso,

apresentam menor tendncia para interferir na degradao mecnica das

2. ARGAMASSAS

24

24

alvenarias. Os cristais arranjam espao suficiente para se desenvolver no

interior dos poros sem criar presses excessivas. Os valores das suas

resistncias devem ser, satisfatrios no caso de situaes onde no se

prevejam situaes muito gravosas de choques, punoamento ou atrito

[PENAS, 2008; VEIGA & CARVALHO, 1994].

So consideradas argamassas muito porosas, pelo que a velocidade de

absoro da gua nos instantes iniciais muito alta, levando a um coeficiente

de capilaridade elevado [PENAS, 2008; VEIGA & CARVALHO, 1994].

Na investigao de Penas [PENAS, 2008] consta-se que este tipo de

argamassas caracteriza-se por mdulos de elasticidade dinmicos baixos,

inferiores aos das argamassas de cimento. Isto indica que estas argamassas

tm elevada deformabilidade, boa capacidade para absorver tenses internas

provocadas pela retrao e pela interao ao suporte. Alm disso, so

argamassas onde se verifica nvel baixo de aderncia a um suporte de

alvenaria de tijolo, pelo que a rotura ocorre na argamassa. No obstante deste

tipo de rotura, tal no implica que a aderncia seja ineficaz mas tem

efetivamente m ligao devido sua porosidade caracterstica [VEIGA &

CARVALHO, 1994; PENAS, 2008].

Este tipo de argamassa garante boa trabalhabilidade, aderncia s

superfcies, bom acabamento, maior rentabilidade de mo-de-obra, melhorando

progressivamente a qualidade da construo [MIRANDA, 2009].

Tem aplicao em revestimentos para reabilitao de edifcios antigos,

visto possurem boas caractersticas (elasticidade, permeabilidade ao vapor de

gua, resistncia aos sais, desenvolvimento moderado da resistncia

mecnica) que se compatibilizam com os suportes antigos, assegurando assim

a preservao do patrimnio histrico. Todavia, as argamassas de cal

hidrulica so tambm adequadas construo nova, tornando-a mais

sustentvel uma vez que so produzidas com pouca energia, por conseguinte

menos emisses de dixido de carbono [SECIL ARGAMASSAS, n. d.].

ARGAMASSAS DE AUTO-LIMPEZA: DA FORMULAO S APLICAES

25

2.5.3. Argamassas de cimento

So constitudas essencialmente por ligantes cimentcios, e adquirem

elevada resistncia mecnica em curto espao de tempo [MIRANDA, 2009].

No caso deste tipo de argamassas terem de responder a exigncias

mecnicas e de grande compacidade, os revestimentos devem ter traos

muito ricos em cimento, por exemplo 1:2 e 1:3, o que exige cuidados especiais

na aplicao e na secagem [MIRANDA, 2009].

Agostinho [AGOSTINHO, 2008] refere no seu estudo que no contexto de

argamassas de substituio de rebocos antigos, as argamassas de cimento ou

as argamassas com trao muito forte neste ligante so desaconselhadas

devido ao facto de serem pouco deformveis e pouco permeveis, muito

resistentes em termos mecnicos, todo um conjunto de caractersticas que ir

conduzir a tenses elevadas e fendilhao provocada pela elevada retrao

[VEIGA & CARVALHO, 1994]. Alm disso, a incompatibilidade com os suportes

antigos tambm justificada pelo seu teor em sais solveis, reduzida

permeabilidade ao vapor de gua e elevada resistncia mecnica [CAVACO,

2005; BOTELHO, 2003; PINTO & GOMES, 2006/2007; VEIGA, 2003].

De acordo com o trabalho de investigao de Veiga [VEIGA, 2003] as

argamassas de cimento verificam um acabamento final bastante diferente das

argamassas antigas, ao nvel da textura da superfcie e da refrao da luz.

Contm na sua composio sais solveis que so conduzidos para o interior

das paredes e a cristalizam, aumentando assim a sua degradao. A rigidez

excessiva e a capacidade limitada de permitir a secagem da parede so

caractersticas que acentuam a incompatibilidade com os suportes antigos.

As argamassas de cimento apresentam fraca compatibilidade com os

suportes antigos [AGOSTINHO, 2008], por isso, so empregues

essencialmente ao nvel da construo recente nomeadamente na construo

de pisos enquanto argamassa armada, na produo de chapisco para

aplicao em paredes de alvenaria e estruturas de beto [MIRANDA, 2009].

2. ARGAMASSAS

26

26

Aquando da adio de cal apagada (ou hidratada) neste tipo de

argamassas, o mdulo de elasticidade diminui substancialmente, sem

prejudicar na mesma proporo a resistncia trao, que por sua vez a

mxima resistncia de aderncia da argamassa e, por isso, tende a aumentar a

vida til do revestimento algo diferente consoante se trate de edifcios correntes

e de edifcios antigos [MIRANDA, 2009].

2.5.4. Argamassas bastardas

De acordo com o autor Agostinho [AGOSTINHO, 2008] devido

incompatibilidade entre as argamassas de cimento e os suportes antigos,

surgem as argamassas bastardas de cimento, cal (area ou hidrulica) e areia,

que visam dar resposta a esta situao pois permitem conciliar as vantagens

do uso da cal com as do cimento. Apresentam bom comportamento em

edifcios antigos [VEIGA, 2003].

As argamassas bastardas consistem em argamassas constitudas por

mais do que um elemento ligante. Podem apresentar, na sua composio

ligantes de cal e gesso ou ento cal e cimento [COSTA, 2008].

Neste tipo de argamassas os traos variam bastante. Aquando da

presena do cimento, este aparece normalmente em menor quantidade em

relao aos demais constituintes devido aos inconvenientes do seu uso

[AGOSTINHO, 2008; BOTELHO, 2003; PINTO & GOMES, 2006/2007].

As argamassas bastardas de cimento e cal area, em relao s de

cimento, possuem melhor comportamento em edifcios antigos devido sua

maior deformabilidade, maior porosidade e menor tendncia para a ocorrncia

de fissuras. Contudo, verifica-se um alto teor de sais solveis [BOTELHO,

2003; VEIGA, 2006; PENAS, 2008].

As argamassas bastardas de cimento e cal hidrulica, tambm

comparadas com as de cimento, provam ter menor resistncia mecnica, maior

coeficiente de capilaridade e menor tendncia para a fendilhao, mas j no

ARGAMASSAS DE AUTO-LIMPEZA: DA FORMULAO S APLICAES

27

so to adequadas para substituio de revestimentos antigos [BOTELHO,

2003; PENAS, 2008].

Magalhes e Veiga [MAGALHES & VEIGA, 2005] concluram no seu

estudo que a argamassa bastarda produzida base de cal area e cal

hidrulica com areia de rio e areia amarela de Corroios efetivamente

adequada para utilizao em edifcios antigos, devido aos inmeros resultados

obtidos em laboratrio onde se destaca: o mdulo de elasticidade dinmico

reduzido, mostrando assim uma argamassa deformvel; as resistncias

compresso e flexo baixas, pelo que podem ser aplicadas tanto no exterior

como no interior; a tenso de aderncia elevada; o coeficiente de

capilaridade elevado, associado a uma boa permeabilidade ao vapor de

gua.

2.6. Sntese

As argamassas so um material comum em construes novas e

antigas. Resultam de uma mistura devidamente proporcionada base de

agregados, ligantes e gua. Sendo tambm possvel trabalhar as suas

propriedades com a adio de adjuvantes e/ ou de adies.

Os agregados so um material particulado, cuja funo estruturar a

argamassa, so proveniente de areeiro, jazidas ou de fragmentao de rochas.

Os ligantes aglutinam os vrios constituintes e dividem-se em ligantes

inorgnicos e orgnicos (ligantes betuminosos). Os ligantes inorgnicos

dividem-se ainda em areos (cal area e gesso) e em hidrulicos (cal hidrulica

natural e cimento Portland).

A gua deve ser isenta de sais e ser bem doseada, no comprometendo

a trabalhabilidade da aplicao em vista da argamassa.

Os adjuvantes adicionam-se em pequenas quantidades (em

percentagem inferior a 5% da massa do ligante) durante a amassadura, com o

2. ARGAMASSAS

28

28

intuito de modificar certas propriedades, em estado fresco ou em estado

endurecido.

As adies consistem em materiais inorgnicos que se juntam na

composio das argamassas com a inteno de obter ou melhorar

determinadas propriedades. Classificam-se segundo dois tipos: tipo I (adies

quase inertes) e tipo II (pozolnicas ou hidrulicas). As adies do tipo I no

apresentam propriedades hidrulicas nem pozolnicas ao contrrio das adies

do tipo II, onde se verificam estas propriedades. O seu uso deve ser feito com o

cuidado, antecedido por ensaios.

Consoante o tipo de argamassa apresentam propriedades distintas, quer

em estado fresco quer em estado endurecido, pelo que dependendo das

situaes aplicam-se em construo nova e em construo antiga.

As argamassas mais aplicadas em obras de conservao e reabilitao

de edifcios antigos so sem dvida as argamassas com ligantes de cal e

tambm as argamassas bastardas, devido sua maior deformabilidade e

permeabilidade ao vapor de gua. Sendo de salientar que as argamassas de

cimento devido sua elevada resistncia mecnica, rigidez excessiva e

tenses elevadas, apenas devero ter aplicao em construo/ reabilitao de

construo nova.

Por um lado, as argamassas tradicionais de cal area apresentam

caractersticas que asseguram a sua compatibilidade com suportes antigos,

visto que diminuem o nmero de tenses. Por outro lado, as argamassas de cal

hidrulica, embora se assemelhem com as anteriores e com as argamassas de

cimento, evidenciam caractersticas intermdias entre estas, pelo que podem

ser aplicadas tanto em construo nova como antiga, alm de que tornam a

construo mais sustentvel.

J as argamassas bastardas renem as vantagens da cal e do cimento,

pelo que apresentam melhor comportamento nas construes antigas graas

sua maior deformabilidade e permeabilidade ao vapor de gua.

ARGAMASSAS DE AUTO-LIMPEZA: DA FORMULAO AS APLICAES

29

3. NANOMATERIAIS

3.1. Introduo

Os nanomateriais so fruto da Nanotecnologia, cincia que estuda a

manipulao das partculas escala nanomtrica (atmica), ento

desenvolvida em 1959 pelo visionrio da poca Richard Feynman, na figura 1

[SANTOS, 2013].

Figura 1: Richard Feynman dando as suas famosas conferncias em Caltech, em 1962

[INVESTIGACION Y CIENCIA, 2014]

No ano de 1965 Richard Feynman foi distinguido com o prmio Nobel da

Fsica. Assim sendo, destacou-se com a apresentao da palestra Theres

plenty of room at the bottom: invitation to enter a new field of Physics. Durante

esta famosa palestra, fez a seguinte questo "Ser que podemos escrever os

24 volumes da Enciclopdia Britnica na cabea de um alfinete?" [HERDEIRO,

2008].

Feynman sustenta que de facto possvel, e justifica que se

aumentasse 25 000 vezes o tamanho linear da cabea do alfinete, este seria

reduzido a uma rea igual de todas as pginas da referida enciclopdia.

3. NANOMATERIAIS

30

30

Logo, bastaria apenas reduzir a escala linear das letras da enciclopdia

Britnica 25 000 vezes. Uma vez que as letras resultam de traos que por sua

vez resultam de uma unio de vrios pontos, cuja escala linear situa-se na

ordem do limite de resoluo do olho humano cerca de 0,2 mm. Ao

diminuirmos 25 000 vezes, cada ponto ficaria com aproximadamente 8

nanmetros 0,000008 mm [HERDEIRO, 2008].

Em suma, Feynman mostra ao mundo a sua viso sob o ponto de vista

da escala nanomtrica alm do mais menciona a possibilidade de produzir

nano-objetos, tomo a tomo ou, ento, molcula a molcula [LUCAS, 2011].

Aps lanados os pilares da Nanotecnologia surgem mais investigaes que s

a partir do sc. XXI que registam os maiores avanos nesta rea [BHUSHAN,

2007].

3.2. Definio e conceito

De acordo com a definio da Comisso Europeia, o nanomaterial

define-se por: Um material natural, incidental ou manufaturado contendo

partculas no ligadas entre si ou em agregados ou formando aglomerados nos

quais a distribuio de tamanho apresenta 50% ou mais dessas partculas com

uma ou mais dimenses externas no intervalo entre 1 nm e 100 nm. Em casos

especficos e justificados por preocupaes ambientais, sade, segurana ou

competitividade, o limiar de 50% na distribuio de tamanho pode ser

substitudo por um limiar entre 1% e 50% [EC, 2011].

Assim sendo, so considerados nanomateriais todas as substncias

cujas dimenses variam entre 1 e 100 nanmetros (nm) (1 nm corresponde a

10-9 m, um milionsimo de milmetro). Quando reduzidos escala nanomtrica

alm do confinamento quntico, responsvel pelas novas propriedades fsicas

e qumicas, outra das principais caractersticas que distingue os nanomateriais

dos demais consiste na relao entre o seu volume e rea de superfcie.

Quanto menor for o seu tamanho, maior ser a rea superficial das suas

partculas pelo que aumenta a sua reatividade e, por conseguinte, ocorrem

ARGAMASSAS DE AUTO-LIMPEZA: DA FORMULAO S APLICAES

31

mais reaes qumicas superfcie [GOSSI & ARCURI, 2013].

Os nanomateriais so os produtos oriundos da Nanotecnologia, que

pode ser definida como sendo:

No ano de 1974, o professor Norio Taniguchi, definiu pela primeira vez

na sua conferncia On the Basic Concept of Nanotechnology que

Nanotecnologia consiste maioritariamente no processo de separao,

consolidao e deformao de materiais por um tomo ou por uma

molcula [TANIGUCHI, 1974; KLUSEK, 2007].

Outro autor, muito resumidamente, define Nanotecnologia como sendo a

capacidade de controlar ou manipular a escala atmica [SANTOS,

2013].

A Nanotecnologia define-se assim, por uma cincia em forte expanso

que se baseia na criao, manipulao e explorao de materiais escala

nanomtrica, ou seja, de tomos e molculas.

Em relao ao conceito de escala dos nanomateriais, estes podem-se

definir por algo impercetvel a olho nu e, por isso, apenas visvel em termos

microscpicos. Na figura 2, pode-se observar a escala dos nanomateriais:

Figura 2: Escala nanomtrica (nm) [adaptado de SHELLZERO, 2012]

3. NANOMATERIAIS

32

32

3.3. Tipos de nanomateriais aplicados na construo

Os autores Brito e Pontes [BRITO & PONTES, 2007] afirmam no seu

trabalho que existem vrios tipos de nanomateriais, a saber: nanopartculas

(NP), nanofios (NW), nanotubos de carbono (CNT), nanocristais (NCs), entre

outros, sendo que cada um possui uma aplicao distinta. Alm disso, os

nanomateriais apresentam dimenses diferentes e podem ser produzidos em

metal, cermica, materiais polimricos, inclusive em materiais compsitos

[POKROPIVNY et al., 2007].

3.3.1. Tipos de nanomateriais

Nanopartculas (Nanoparticles - NP)

Tratam-se de partculas extremamente finas (figura 3), microscpicas,

cujo tamanho est compreendido entre 1 a 100 nm [INOVAO

TECNOLGICA, 2009] o equivalente a mil tomos [ASTRONOO, 2013].

Apresentam uma grande rea de superfcie, propriedades mecnicas, ticas,

magnticas ou qumicas diferentes das substncias macroscpicas [QUINA,

2004]. Existem NP de dixido de titnio (TiO2). Aplicam-se em vrias reas

onde se destaca o caso da construo, de interesse para o presente trabalho:

Em termos ticos, utilizam-se para produzir revestimentos anti-reflexo

[ASTRONOO, 2013];

Ao nvel trmico, permitem aumentar a transferncia de calor atravs de

coletores solares, melhorar a eficcia de fluidos de arrefecimento em

transformadores ou melhorar a vida das baterias [ASTRONOO, 2013].

No caso de NP de TiO2, destaca-se o seu uso na rea de clulas solares

orgnicas [INOVAO TECNOLGICA, 2012b];

No setor ambiental, utilizam-se para limpeza de solos contaminados e

filtrar a gua de forma mais eficiente [ASTRONOO, 2013].

As NP apresentam alguns inconvenientes tais como: m disperso na

ARGAMASSAS DE AUTO-LIMPEZA: DA FORMULAO S APLICAES

33

matriz do material (exemplo: argamassas, beto) que conduz ao seu

desperdcio e a um menor desempenho; custo elevado; ainda no so

produzidas escala industrial; toxicidade (ainda no h uma padronizao

internacional sobre esta questo, pelo que os estudos de nanotoxicologia ainda

so muito controversos [NOGUEIRA et al., 2013]).

Figura 3: Nanopartculas [adaptado de NANO GLOSS, 2009]

Nanofios (Nanowires - NW)

Caracterizam-se por serem semelhantes aos fios eltricos comuns

devido ao facto de tambm serem muito pequenos, possurem um dimetro

que ronda 1 nm, ver figura 4. Podem ser produzidos nos mais variados

materiais condutores e semicondutores (cobre, prata, ouro, ferro, silcio, xido

de zinco e germnio e tambm a partir de nanotubos de carbono). So

referenciados como materiais de uma nica dimenso devido ao rcio que

existe entre a diferena no comprimento e dimetro. Apresentam efeitos

qunticos mecnicos, possuem propriedades eltricas nicas. Quando

produzidos a partir de nanotubos de carbono verificam elevada condutividade.

Podem ser aplicados em circuitos eletrnicos muito pequenos, dispositivos

qunticos e de memria, transstores, materiais compsitos avanados,

nanosensores biomoleculares entre outros [AZONANO, 2013b].

3. NANOMATERIAIS

34

34

Os NW so experimentais, produzem-se segundo processos

dispendiosos escala laboratorial, elevando assim os seus custos

[MANUTENCAO & SUPRIMENTOS, 2012].

Figura 4: Nanofios, foto de MEV (Microscpio eletrnico de varrimento) [NISENET.ORG, n. d.]

Nanotubos de carbono (Carbon nanotubes - CNT)

So materiais recentes do sculo XXI descobertos pelo cientista Sumio

Iijima do NECs Fundamental Research Laboratory [SALES, 2013].

So constitudos por carbono, apresentam dimenses 100 mil vezes

inferiores ao dimetro de um cabelo humano [TOMA, 2004, citado por SALES,

2013]. Em termos morfolgicos, os CNT traduzem-se por pequenas estruturas

ocas e alongadas organizadas por paredes enroladas de grafeno com a

espessura de um tomo de carbono e tm uma forma hexagonal semelhante a

uma rede de galinheiro ou ento dos favos de mel de uma colmeia (figura

5). As ligaes de tomos de carbono encontram-se unidas por ligaes

covalentes, tornando os CNT com propriedades resistentes nicas de grande

potencial de aplicao no campo da engenharia [SALES, 2013].

Consoante o tipo de estrutura, os CNT apresentam-se como condutores

metlicos ou ento como semicondutores, destacam-se ainda pela sua

deformao elstica que 60 vezes superior do ao [SALES, 2013].

ARGAMASSAS DE AUTO-LIMPEZA: DA FORMULAO S APLICAES

35

O autor Bertholdo [BERTHOLDO, 2001; citado por SALES, 2013]

referenciou trs tipos de CNT, com as designaes de zig-zag, armchair e

quiral, como se podem observar na figura 5.

Figura 5: Trs formas de se enrolar folhas de grafeno e estruturas dos CNT (a: armchair, b: zig-

zag, c: quiral), respectivamente [adaptado de MARCONDES, 2012]

Ao nvel estrutural, os CNT caracterizam-se segundo dois tipos [SALES,

2013]: parede simples com uma nica folha de grafeno enrolada sobre si

mesmo a fim de moldar (SWNT) um tubo cilndrico; e parede mltipla

(MWCNT). Estes segundos abrangem um composto de CNT coaxiais, de

vrias folhas de grafeno enroladas de feitio tubular. A utilizao de CNT tem

tido um elevado cres