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APRESENTAÇÃO Este módulo faz parte da coleção intitulada MATERIAL MODULAR, destinada às três séries do Ensino Médio e produzida para atender às necessidades das diferentes rea- lidades brasileiras. Por meio dessa coleção, o professor pode escolher a sequência que melhor se encaixa à organização curricular de sua escola. A metodologia de trabalho dos Modulares auxilia os alunos na construção de argumen- tações; possibilita o diálogo com outras áreas de conhecimento; desenvolve as capaci- dades de raciocínio, de resolução de problemas e de comunicação, bem como o espírito crítico e a criatividade. Trabalha, também, com diferentes gêneros textuais (poemas, histórias em quadrinhos, obras de arte, gráficos, tabelas, reportagens, etc.), a fim de dinamizar o processo educativo, assim como aborda temas contemporâneos com o ob- jetivo de subsidiar e ampliar a compreensão dos assuntos mais debatidos na atualidade. As atividades propostas priorizam a análise, a avaliação e o posicionamento perante situações sistematizadas, assim como aplicam conhecimentos relativos aos conteúdos privilegiados nas unidades de trabalho. Além disso, é apresentada uma diversidade de questões relacionadas ao ENEM e aos vestibulares das principais universidades de cada região brasileira. Desejamos a você, aluno, com a utilização deste material, a aquisição de autonomia intelectual e a você, professor, sucesso nas escolhas pedagógicas para possibilitar o aprofundamento do conhecimento de forma prazerosa e eficaz. Gerente Editorial Sociedade brasileira e Educação

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Page 1: Sociedade brasileira e Educaçãoprepapp.positivoon.com.br/assets/Modular/... · Sérgio Buarque de Holanda e a crítica às raízes rurais brasileiras 25 Gilberto Freyre e as raízes

APRESENTAÇÃO

Este módulo faz parte da coleção intitulada MATERIAL MODULAR, destinada às três

séries do Ensino Médio e produzida para atender às necessidades das diferentes rea-

lidades brasileiras. Por meio dessa coleção, o professor pode escolher a sequência que

melhor se encaixa à organização curricular de sua escola.

A metodologia de trabalho dos Modulares auxilia os alunos na construção de argumen-

tações; possibilita o diálogo com outras áreas de conhecimento; desenvolve as capaci-

dades de raciocínio, de resolução de problemas e de comunicação, bem como o espírito

crítico e a criatividade. Trabalha, também, com diferentes gêneros textuais (poemas,

histórias em quadrinhos, obras de arte, gráficos, tabelas, reportagens, etc.), a fim de

dinamizar o processo educativo, assim como aborda temas contemporâneos com o ob-

jetivo de subsidiar e ampliar a compreensão dos assuntos mais debatidos na atualidade.

As atividades propostas priorizam a análise, a avaliação e o posicionamento perante

situações sistematizadas, assim como aplicam conhecimentos relativos aos conteúdos

privilegiados nas unidades de trabalho. Além disso, é apresentada uma diversidade de

questões relacionadas ao ENEM e aos vestibulares das principais universidades de cada

região brasileira.

Desejamos a você, aluno, com a utilização deste material, a aquisição de autonomia

intelectual e a você, professor, sucesso nas escolhas pedagógicas para possibilitar o

aprofundamento do conhecimento de forma prazerosa e eficaz.

Gerente Editorial

Sociedade brasileira e Educação

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DIRETOR-SUPERINTENDENTE:DIRETOR-GERAL:

DIRETOR EDITORIAL:GERENTE EDITORIAL:

GERENTE DE ARTE E ICONOGRAFIA:AUTORIA:

CONSULTORIA:ORGANIZAÇÃO:

EDIÇÃO DE CONTEÚDO:EDIÇÃO:

ANALISTA DE ARTE:PESQUISA ICONOGRÁFICA:

EDIÇÃO DE ARTE:CARTOGRAFIA:

PROJETO GRÁFICO:EDITORAÇÃO:

CRÉDITO DAS IMAGENS DE ABERTURA E CAPA:

PRODUÇÃO:

IMPRESSÃO E ACABAMENTO:

CONTATO:

Ruben FormighieriEmerson Walter dos SantosJoseph Razouk JuniorMaria Elenice Costa DantasCláudio Espósito GodoyFábia Berlatto / Alexandro Dantas Trindade / Gustavo Biscaia de LacerdaAdriano Nervo CodatoWilma Joseane WünschWilma Joseane WünschRose Marie WünschTatiane Esmanhotto KaminskiAna Claudia DiasAngela Giseli de SouzaLuciano Daniel TulioO

2 Comunicação

Danielli Ferrari Cruz / Sérgio Roberto Gonçalves dos Reis / Arowak© iStockphoto.com/Nick Cowie; © iStockphoto.com/blackred; © iStockphoto.com/Abel Mitja Varela; © Shutterstock/Lane V. Erickson; © Shutterstock/Dmitriy KuzmicheEditora Positivo Ltda.Rua Major Heitor Guimarães, 17480440-120 Curitiba – PRTel.: (0xx41) 3312-3500 Fax: (0xx41) 3312-3599Gráfica Posigraf S.A.Rua Senador Accioly Filho, 50081300-000 Curitiba – PRFax: (0xx41) 3212-5452E-mail: [email protected]@positivo.com.br

© Editora Positivo Ltda., 2013Proibida a reprodução total ou parcial desta obra, por qualquer meio, sem autorização da Editora.

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(Maria Teresa A. Gonzati / CRB 9-1584 / Curitiba, PR, Brasil)

B514 Berlatto, Fábia.Ensino médio : modular : sociologia : sociedade brasileira e educação / Fábia

Berlatto, Alexandro Dantas Trindade, Gustavo Biscaia de Lacerda. – Curitiba : Positivo, 2013.

: il.

ISBN 978-85-385-7449-1 (livro do aluno)ISBN 978-85-385-7450-7 (livro do professor)

1. Sociologia. Ensino médio – Currículos. I. Trindade, Alexandro Dantas. II. Lacerda, Gustavo Biscaia de. III. Título.

CDU 373.33

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SUMÁRIOSociedade brasileira e Educação

Unidade 1: Representações da modernidade no Brasil

Intenso processo de transformação 5

Representações da identidade nacional 6

Sociologia da modernização 8

Modernização conservadora no Brasil 9

Estrada de ferro: símbolo do progresso no século XIX 11

Unidade 2: Modernização na transição do Império para a República

Escravidão: símbolo do atraso 12

Abolicionismo como projeto de modernidade 13

O Rio de Janeiro na passagem do século XIX 15

Cortiço: o atraso em plena Capital Federal 17

Unidade 3: Transição para a modernidade nas grandes

interpretações do Brasil

Euclides da Cunha e as imagens do Brasil: do litoral ao Sertão 22

Oliveira Viana e a defesa da modernização autoritária 24

Sérgio Buarque de Holanda e a crítica às raízes rurais brasileiras 25

Gilberto Freyre e as raízes ibéricas da cultura brasileira 27

Unidade 4: Educação e socialização primária

Educação além da escola 32

Socialização primária 36

Controle social 39

Unidade 5: Educação e socialização secundária

Socialização secundária 40

Controle social na vida adulta 42

Aprendizado em um contexto de mudança 44

Diferentes meios de aprendizagem 46

Unidade 6: Educação, escola e sociedade

Conteúdos escolares 48

Centralidade da escola a partir do século XX 50

Desafios e debates da escolarização no Brasil em

perspectiva comparada 53

Unidade 7: Escola e diferenciação social

Dilemas da diferenciação pelo rendimento escolar 57

Escolarização de homens e mulheres no Brasil 59

Escola, individualização e autonomia 60

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O Brasil não é apenas, como se diz, “um cadinho de raças e culturas”.

Através de escolhas judiciosas, o sociólogo brasileiro pode contribuir

de forma original e criadora para o enriquecimento de ramos da teoria

sociológica que não podem ser cultivados com a mesma facilidade por

seus colegas dos “países desenvolvidos” do mesmo círculo civilizatório.

As sociedades que se afastam do tipo “normal”, inerente a determinada

civilização, representam, em si mesmas, um problema teórico para a

ciência. [...] Desse ângulo, a posição do sociólogo brasileiro é quase

privilegiada, pois poderá propor-se tarefas de grande significação

teórica para a sociologia.

FERNANDES, Florestan. A Sociologia numa era de revolução social. Rio de

Janeiro: Jorge Zahar, 1962. p. 19.

[...] não é possível, quando se é pago para se ocupar do mundo social

e se é minimamente responsável, ficar em silêncio, não tentar dizer

a todos um pouco daquilo que se crê ter aprendido, à custa de todos,

sobre este mundo...

Pierre Bourdieu

Tempo Social, São Paulo, v. 17, n. 1, p. 175-210, jun. 2005. p. 210.

Representações da modernidade no Brasil

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Sociedade brasileira e Educação4

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Pode-se dizer que a reflexão sociológica no Brasil sempre se preocupou com a natureza, o sentido e os desdobramentos da modernização. O pensamento social do século XIX e dos primeiros intérpretes do Brasil já se mostrava completamente absorvido por essa dimensão. E por que, afinal de contas, a preocupação com a modernização mobilizou tantos intelectuais? O tema da modernização ganhou contornos dramáticos no Brasil à medida que, diferentemente dos Estados-Nações europeus que se constituíram no decurso de séculos, o processo de independência política brasileira demandava a construção de um Estado e de uma nação num curto espaço de tempo. Além disso, a ausência de um efetivo processo revolucionário tornou ainda mais problemática a experiência de modernização. Neste módulo, serão abordadas algumas dimensões do complexo tema da modernização, de forma que se possam compreender sociologicamente seus significados.

Intenso processo de transformação

Visualize o Brasil em 1850, na metade do século XIX. Tente imaginar como viviam as pessoas daquele tempo. Pense o que diferenciava brancos, negros, indígenas e imigrantes europeus; ricos e pobres; e escravizados e livres. Imagine como era a vida no meio rural e em cidades, como Rio de Janeiro, Salvador e Recife, seus hábitos alimentares, as conversas ou mesmo as gírias dos jovens daquela época. Difícil? Sem dúvida! Nesses poucos mais de 160 anos de história, o país se transformou radicalmente. Em 1850, por exemplo, ainda não havia sequer dados confiáveis sobre a população, pois o primeiro recenseamento geral do Brasil foi feito em 1872, ano em que o país tinha 9 930 478 habitantes. O crescimento se deu a uma taxa média de 2,91% ao ano a partir de 1900, até chegar a pouco mais de 190 milhões de habitantes em 2010. Até 1960, a maior parte da população vivia no campo (64% em 1950, 55% em 1960). Somente em 1970, a população urbana superou a rural (56% viviam nas cidades, contra 44% no campo), até atingir a marca de 84% da população urbana em 2010. Se a população sofreu tamanha mudança, o mesmo pode ser dito a respeito do processo mais amplo de modernização capitalista. O Brasil deixou de ter uma economia exclusivamente agrária há muito tempo e instaurou um parque industrial moderno e competitivo. Contudo, apesar de avanços consideráveis do ponto de vista econômico, sobrevivem padrões de desigualdade que, em determi-nadas regiões do país, mais se assemelham ao período escravista.

Em cada época histórica, os indivíduos elaboram um conjunto de representações (ideias, valores, conceitos) que lhes fornecem um mapa cognitivo mais ou menos coerente a respeito do seu momento presente. Assim, o que os indivíduos, que vivem no século XXI, pensam a respeito do século XIX não é a mesma coisa que as pessoas que viveram naquele período pensavam. É preciso, então, procurar com-preender – sociologicamente – como foram concebidas, em cada momento histórico, as representações sociais. Por meio delas, as pessoas liam o mundo, identificavam-se e reproduziam, no terreno mental, a realidade social.

É por meio da análise de for-mas discursivas, representações da realidade social e formulações ideológicas, feitas por intelectuais, políticos, escritores, cientistas so-ciais, etc., que se entende o pro-cesso de modernização do Brasil.

No início do século XX, as ferrovias significavam o ideal de modernidade. Fachada principal da oficina de locomotivas

da companhia Mogiana. Década de 1920

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A Missão

Artística

Francesa e a

representação

do Brasil

@SOC721

VASQUEZ, Pedro Karp. Ferrovia e fotografia no Brasil da Primeira República. São Paulo: Metalivros, 2008. p. 182.

Ensino Médio | Modular 5

SOCIOLOGIA

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A imagem paradisíaca do Brasil

Em nenhuma outra região se mostra o céu mais sereno, nem madruga mais bela a aurora; o sol em nenhum

outro hemisfério tem raios tão dourados, nem os reflexos noturnos tão brilhantes; as estrelas são mais benignas

e se mostram sempre alegres; os horizontes, ou nasça o sol, ou se sepulte, estão sempre claros; as águas,

ou se tomem nas fontes pelos campos, ou dentro das povoações nos aquedutos, são as mais puras; é enfim

o Brasil Terreal Paraíso descoberto, onde têm nascimento e curso os maiores rios; domina salutífero clima;

influem benignos astros e respiram auras suavíssimas, que o fazem fértil e povoado de inumeráveis habitadores.

ROCHA PITA, Sebastião da. História da América Portuguesa desde o ano de mil e quinhentos, do seu descobrimento, até o de mil e setecentos e vinte e quatro. Lisboa Occidental, Officina de Joseph Antônio da Silva. In: CARVALHO, José Murilo. O motivo edênico no imaginário social brasileiro. Revista Brasileira de Ciências Sociais, São Paulo, v. 13, n. 38, p. 63-79, out. 1998.

Representações da identidade nacional

Para entender o processo de modernização, é preciso refletir sobre o passado, o presente e o futuro, isto é, sobre o que o Brasil foi no passado e o que ele poderá vir a ser no futuro. Já que essa abordagem se relaciona a uma mudança social intensa e a uma ruptura com os modelos de desen-volvimento, é necessário que se pergunte, antes de tudo: mudança em relação a quê? A fim de buscar uma resposta, é necessário discutir a noção de identidade nacional (ver Conceitos sociológicos no final do módulo).

Em outras palavras, quais foram as distintas repre-sentações produzidas sobre a identidade nacional brasileira? A questão faz todo sentido, já que diferentes imagens, ideias, juízos e conceitos do que era e de como deveria ser o Brasil foram sendo concebidos com o processo de modernização e desenvolvimento nacional. Esse é o tema da questão nacional.

O fascínio pela chamada questão nacional é algo que perpassa a história do pensamento social brasileiro. So-bretudo em épocas de crise, a questão nacional faz com que os intelectuais se voltem para tentar repensar a nação, esboçar-lhe um sentido, dar-lhe alguma coerência.

Sobre os intelectuais, é preciso dizer algumas palavras. Embora constituam uma categoria bem visível na sociedade, nem sempre é fácil estabelecer seus limites. Quem são? Quais as suas funções efetivas? O que fazem?

A própria categoria “intelectual” é recente, teve origem no final do século XIX, na França. No entanto, em todas as socie-dades sempre existiram pessoas que eram reconhecidas como mais sensatas, mais cultas ou mais instruídas do que o grupo a que pertenciam seus compatriotas (letrados, durante a Idade Média; filósofos, durante o Iluminismo, e assim por diante). No Brasil, políticos, engenheiros, médicos, juristas, escritores e outros profissionais também atuaram como intelectuais, isto é, transcenderam os limites de suas profissões e formularam teorias, doutrinas, hipóteses, ideias, ou seja, representações sobre o que era e sobre o que deveria ser o Brasil.

Algumas representações têm sido mais difundidas, como a visão paradisíaca do Brasil. Essa visão, presente desde a carta do escrivão português Pero Vaz de Caminha (Portugal, 1450-Índia, 1500), foi expressa de modo exemplar pelo his-toriador Sebastião da Rocha Pita (Salvador, 1660-1738), em História da América Portuguesa, publicado em 1730.

Faça uma sondagem de opinião entre, no mínimo, três pessoas conhecidas. Pergunte a elas o seguinte: O que faz o Brasil ser o Brasil? Isto é: que imagem elas fazem do que é o Brasil, e por que, na opinião delas, o Brasil é assim? E, ainda, como o Brasil deveria ser?

Anote no seu caderno tudo que lhe disserem e depois debata em aula os seus achados, comparando-os com os dos colegas.

Sociedade brasileira e Educação6

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A ideia de que o Brasil é “gigante pela própria natureza”, terra de um povo pacífico e ordeiro, sem revoluções, terre-motos, catástrofes ou revoltas sociais é parte do grande mito sobre a identidade nacional. Da mesma forma, integra o mito nacional a ideia de que seu povo é formado pela mistura de três raças unidas no mesmo país e que convivem em harmonia graças à democracia racial (ver Conceitos sociológicos).

Entretanto, ao lado dessas representações, houve tam-bém, no decorrer do tempo, diversas outras, que correspon-dem a momentos distintos do processo de formação social.

Uma maneira interessante de acompanhar a trajetória de tais representações é estabelecendo relação entre o pensamento social e a produção artística. Certas ideias, como progresso, modernização e civilização, assim como as suposições quanto aos obstáculos ao seu alcance, como atraso ou barbárie, estiveram presentes tanto nos discursos científicos (de médicos, bacharéis em Direito, sociólogos e historiadores) quanto em outras formas de expressão social.

Os mesmos problemas foram também pensados e representados pela literatura e mais tarde pelo cinema.Questões como sertão versus litoral, ordem e progresso, civilização versus barbárie foram pares de

oposição usados por diversos autores em um sem-número de ensaios histórico-sociológicos, manuais de Sociologia, romances, poemas, roteiros de filmes, etc. Pode-se dizer que essas formas de imaginação histórica, sociológica, literária e cinematográfica sobre a identidade do país foram discursos que tiveram por objetivo estabelecer o que era, bem como o que deveria ser, a nação brasileira.

SCHUTE, E. F. Cachoeira de Paulo Afonso. 1850. 1 óleo sobre tela, color., 116 cm x 152 cm. Museu de Arte de São Paulo, São Paulo.

A questão nacional no pensamento socialA história do pensamento brasileiro está atravessada pelo fascínio da questão nacional. No passado e no presente,

são muitos os que se preocupam em compreender os desafios que compõem e decompõem o Brasil como nação. E

essa preocupação se revela particularmente acentuada nas conjunturas assinaladas e simbolizadas pela Declaração

de Independência em 1822, Abolição da Escravatura (1888) e Proclamação da República (1889) e Revolução

de 1930. Esse tema aparece nas produções de publicistas, cientistas sociais, filósofos, artistas. Em diferentes

gradações, em várias linguagens, uns e outros passam por ele. A questão nacional está sempre presente, como

desafio, obsessão, impasse ou incidente.

IANNI, Octávio. Pensamento social no Brasil. Bauru: EDUSC, 2004. p. 24.

Como foi visto, são várias as representações possíveis a respeito da identidade nacional.

Todas elas ainda são válidas?

Será que aquelas oposições para definir e explicar o Brasil ainda funcionam?

Os contrastes entre sertão e litoral, civilização e barbárie ou a afinidade entre ordem e progresso são vistos da mesma forma na atualidade?

Como experiência, debatam em grupos esse problema. Apresentem os resultados.

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SOCIOLOGIA

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Sociologia da modernização

O que se pode entender, do ponto de vista sociológico, por modernização? Sinteticamente, o termo expressa um processo de mudança econômica, política, social e cultural que ocorreu em países da periferia do sistema capitalista, ou subdesenvolvidos, à medida que esses países se direcionam para padrões mais complexos de organização social e política. Em geral, tais padrões têm como referência as expe-riências europeia e estadunidense. Tomam-se como modelos os processos de democratização, urbanização, industrialização da França, EUA, Inglaterra, Alemanha, etc. Logo, um país seria tanto mais moderno quanto mais seu sistema político fosse democrático, sua economia industrializada e sua população urbana.

As teorias da modernização, sobretudo as desenvolvidas nos Estados Unidos após a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), partem de uma dicotomia entre dois tipos de sociedade: a sociedade tradicional (ou rural, atrasada, subdesenvolvida) e a sociedade moderna (ou urbana, desenvolvida, industrial). Enquanto algumas teorias enfatizam a importância de fatores endógenos no processo de modernização, isto é, o entendem como desenvolvidos no interior da sociedade e dependente dela, outras enfatizam fatores exógenos, isto é, externos, tais como: transferência de valores, tecnologias, especializações e formas de organização social das nações ocidentais avançadas para as nações pobres. De qualquer forma, supõe-se que as sociedades tradicionais sigam o mesmo padrão de mudança por que passaram antes as nações desenvolvidas.

Essa teoria foi, e tem sido, criticada nas Ciências Sociais por não possuir uma perspectiva histórica, isto é, por pressupor, sem contudo demonstrar, que o subdesenvolvimento seja uma situação original universal ou que todas as sociedades tenham que passar, necessaria-mente, pelos mesmos processos e pelas mesmas etapas para alcançar o desenvolvimento.

Essa foto, por mais que aparente ser, não é uma montagem. Trata-se do contraste entre a favela de Paraisópolis e o bairro do Morumbi, em São Paulo. A Sociologia da modernização não com-para apenas sociedades diferentes, mas reflete também sobre as condições e os padrões de desigualdade em um mesmo país, uma mesma região, cidade e, no caso, um mesmo bairro

O atraso econômico em perspectiva histórica

Uma boa parte de nosso entendimento da industrialização dos países atrasados aparece – consciente

ou inconscientemente – dominada pela grande generalização marxista, segundo a qual a história dos

países industriais avançados ou estabelecidos assinala aos atrasados o caminho que têm de seguir

em seu desenvolvimento. “O país que do ponto de vista industrial está mais adiantado proporciona

ao que está menos [avançado] uma imagem do que constituirá seu futuro.” Não há dúvida de que, se

enfocamos o problema de forma ampla, verificamos que essa generalização tem validade. É certo que

durante o período compreendido entre a metade e o final do século XIX a Alemanha seguiu o caminho

que a Inglaterra havia tomado anteriormente, mas, apesar disto, não deveríamos aceitar por completo

essa generalização, já que nos arriscamos a que a meia verdade que a mesma contém oculte a outra

metade; isto é, que pelo mero fato do seu atraso, o desenvolvimento de um país atrasado pode diferir

fundamentalmente, em muitos e importantes aspectos, do seguido por um país avançado.

GERSCHENKRON, Alexander. El atraso económico en su perspectiva histórica. Barcelona: Ediciones Ariel, 1968. p. 16.

Folhapress/Folha Imagem/Tuca Vieira

Sociedade brasileira e Educação8

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Modernização conservadora no Brasil

Os representantes parlamentares dos cafeicultores foram os mais resistentes à aprovação da Lei do Ventre Livre, em 1871, e manti-veram o trabalho escravo em suas fazendas enquanto puderam. Ao perceberem que a transição ao trabalho livre era inevitável, foram os primeiros a requisitarem do governo central subsídios para a imigração subvencionada de trabalhadores europeus, mantendo o ritmo da lavoura cafeeira. O capital excedente da lavoura financiou o processo de industrialização

FERREZ, Marc. Partida para a colheita do café no Vale do Paraíba. [ca. 1885]. Coleção Gilberto Ferrez. Acervo do Instituto Moreira Salles, Rio de Janeiro.

Como a Sociologia brasileira analisou o processo de modernização? Houve diferenças significativas entre o que se verificou no Brasil e em outras nações? Como entender que, a despeito do enorme progresso, as desigualdades sociais sejam tão profundas e persistentes?

Na Sociologia brasileira, há diversos autores que formu-lam a tese segundo a qual o processo de modernização no Brasil se deu de forma incompleta, isto é, mantendo antigas estruturas políticas e sociais do passado e repetindo padrões de desigualdade social. Daí ser comum, no pensamento so-ciológico, a ideia de que o Brasil sofreu um processo de modernização conservadora. O que entender por esse conceito? Segundo o cientista político e sociólogo estaduni-dense Barrington Moore Jr. (1913-2005), o grande exemplo de modernização conservadora ocorreu na Alemanha, no final do século XIX. Naquele país, a transição entre o mundo feudal e o mundo moderno, assim como o processo de industrialização e unificação nacional, se deu a partir do controle de uma camada aristocrática, os junkers, grandes proprietários terri-toriais que mantiveram intactas as relações servis no campo.

Tal fenômeno é radicalmente diferente do que aconteceu, por exemplo, com a Revolução Francesa de 1789, que promoveu uma grande ruptura com o Antigo Regime (ver Conceitos sociológicos) e destruiu as relações servis e os privilégios aristocráticos (BARRINGTON MOORE, 1983).

No Brasil, os grandes proprietários de terra, existentes desde a colonização, continuaram orientando a política regio-nal durante o Império e, ao conseguirem expandir a lavoura cafeeira, particularmente na Região Sudeste, deram impulso à incipiente industrialização. A oligarquia agrária também se fez presente nas fileiras do movimento republicano: ao final do século XIX, com o governo de Campos Sales (1841-1913), a República Oligárquica se firmou por meio da Política dos Governadores, que se baseava em um acordo entre o governo federal, os representantes oligárquicos dos estados e os coronéis nos municípios. É esse aspecto contraditório da transição à modernidade (ver Conceitos sociológicos), isto é, a existência de um importante progresso econômico ao lado da manutenção dos mecanismos sociais de exclusão e das estruturas políticas de dominação, que será analisado por alguns sociólogos e historiadores como exemplo da forma específica de modernização conservadora.

Pesquise sobre os estágios de desenvolvimento econômico e social de pelo menos dois destes quatro países: Brasil, Índia, China e Rússia. Faça um relatório por escrito desses dados e entregue ao professor.

Para o caso do desenvolvimento social, pesquise os seguintes fatores:

a) Taxa de desemprego. b) Distribuição de renda medida pelo Coeficiente de

Gini. c) Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) para os

dois países escolhidos.

Leve em conta, para o caso do desenvolvi-mento econômico, os seguintes fatores:

a) Valor em dólares do Produto Interno Bruto (PIB) dos países escolhidos.

b) Valor em dólares do PIB per capita (que é o valor do PIB dividido pelo número de habitan-tes) desses países que você elegeu.

c) Crescimento em percentual do PIB, ano a ano, nos últimos dez anos.

Ensino Médio | Modular 9

SOCIOLOGIA

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Procuradoria denuncia empresários suspeitos de manter índios em condição de escravidão

O Ministério Público Federal em Joaçaba (SC) denunciou dois empresários suspeitos de manter 60 trabalhadores

indígenas em condições análogas a de escravos no município de Herval do Oeste.

Segundo o Ministério Público, os dois empresários utilizaram um aliciador de mão de obra para atrair vários indí-

genas da terra indígena Chapecó, no município de Ipuaçu.

Os índios eram contratados para trabalhar com corte e desgalho de pínus e eucalipto em uma propriedade rural em

Herval do Oeste. Os trabalhadores não tinham condições mínimas de higiene, segurança e alimentação.

Conforme a denúncia, os índios viviam em um barraco sem energia elétrica, sem camas e com goteiras. Para dor-

mir, alguns utilizavam espumas sobre estrados de madeira e outros dormiam no chão. No inverno passavam muito frio

e no verão precisavam queimar panos dentro do barraco para espantar mosquitos e insetos.

Os índios kaingangs não tinham água tratada, sanitários ou chuveiro. Tomavam banho, lavavam a roupa e bebiam

água do mesmo açude, que ficava próximo ao barraco. A comida era trazida semanalmente pelo aliciador.

Ainda segundo a denúncia, a jornada semanal imposta aos indígenas era de 53 horas. Eles também não possuíam

nenhum equipamento de segurança e até mesmo as botas utilizadas no serviço eram cobradas dos trabalhadores.

De acordo com a Procuradoria, apesar de não serem impedidos de deixar o local, os índios que ficavam por último

na fazenda somente recebiam quando aqueles que foram liberados retornassem ao local. Desta forma, os proprietários

garantiam a permanência de um número mínimo de trabalhadores na propriedade.

Os dois empresários e o aliciador foram denunciados pelo crime de redução de trabalhador à condição semelhante

à de escravo, com o agravante de serem as vítimas integrantes de etnia kaingang. Os dois empresários foram denun-

ciados, ainda, pelo crime de omitir anotação de contrato em Carteira de Trabalho. Juntas, as penas variam de cinco

a 18 anos de prisão.

Os denunciados estão soltos e responderão o processo em liberdade. Os nomes dos acusados não foram divulgados

pelo Ministério Público.

PROCURADORIA denuncia empresários suspeitos de manter índios em condição de escravidão. Folha Online, 14 ago. 2009. Disponível em:

<http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u609919.shtml>. Acesso em: 2 nov. 2009.

P d

A sociedade escravista no BrasilO modo de produção escravista serviu para construir as fortunas das aristocracias agrárias da Colônia e do Impé-rio. Em termos de formação e de expansão do capitalismo como uma realidade histórica interna, ele preencheu as funções de fator de acumulação originária de capital. Quando esse fator se tornou historicamente inoperante e, além disso, passou a ser substituído por formas de acumulação de capital especificamente capitalistas, foi definitivamente condenado ao desaparecimento [...]. Trata-se de um circuito histórico bem conhecido. Apenas no Brasil, ele não se deu de maneira completa. Como o polo senhorial do regime monárquico logrou converter-se no polo oligárquico do regime republicano, graças a certas condições materiais e políticas que permitiram essa rotação histórica, ao desaparecer, o trabalho escravo deixou atrás de si várias formas de trabalho semilivre e de trabalho escravo disfarçado que continuam a existir até hoje, mesmo em economias de plantação tidas como especificamente modernas.

FERNANDES, Florestan. Circuito fechado. São Paulo: Hucitec, 1976. p. 54.

Com base no texto é possível afirmar que o trabalho escravo acabou no Brasil em 1888?

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As estradas de ferro tiveram uma importância fundamental para o processo de modernização capitalista, sobretudo nos países europeus. Com elas, houve também o crescimento de outros ramos da indústria, tanto de forma direta, com a mineração (extração de ferro), a produção siderúrgica (fabricação de trilhos) e a produção de máquinas e motores; quanto indireta, incidindo desde a tecelagem até a construção civil. Sem falar do aspecto essencial do barateamento dos transportes de mercadorias e pessoas. Na Inglaterra,

por exemplo, a construção ferroviária e a exportação de sua tecnologia ao redor do mundo foi o maior estímulo à extração mineira de carvão e a base da própria industrialização pesada. A indústria ferroviária também forçou a transformação do pa-drão de gerenciamento empresarial. A formação de sociedades anônimas (as S/As), e não mais a empresa individual de base familiar, foi o que permitiu a concentração de quantidades exorbitantes de capitais nas mãos de poucos indivíduos. As ferrovias também estão na base do capital financeiro, isto é, dos bancos e do mercado de ações. Em suma, durante o século XIX, na Europa e em vários países subdesenvolvidos, entre eles o Brasil, a expansão ferroviária foi a alavanca do processo de modernização capitalista. Não foi difícil, portanto, fazer da ferrovia o símbolo do progresso e a esperança da superação do atraso. No caso brasileiro, esse mesmo símbolo foi incorporado à lavoura cafeeira e imprimiu nova dinâmica às regiões cafeicultoras.

A construção da Estrada de Ferro D. Pedro II, ligando a Capital Federal ao Vale do Paraíba, representou a consagração tanto da economia cafeeira como do progresso representado pela expan-são ferroviária e da modernização material que o Império queria imprimir. As inaugurações de alguns trechos dessa ferrovia eram acontecimentos de tal importância que contavam com a presença do Imperador

FERREZ, Marc (1843-1923). Imperador D. Pedro II em visita ao Túnel da Mantiqueira, 25 jun. 1882 (lado paulista). Acervo do Instituto Moreira Salles, Rio de Janeiro.

Faça uma pesquisa para descobrir, na sua região, como e quando se deu o desenvolvimento e em torno de qual atividade econômica. Depois disso, converse com, no mínimo, duas pessoas (preferencialmente bem mais velhas que você), para saber se elas vivenciaram esse período, o que faziam na época e quais foram as suas respectivas profissões ou atividades. Peça para que falem livremente. Não se trata de aplicar um questionário. Evite interromper a conversa. Anote essas memórias no seu caderno e exponha essas histórias pessoais para a turma. Preserve a identidade dos entrevistados. No seu relato das histórias, não é preciso dizer quem era a pessoa. (Faça assim para identificá-la: se você entrevistou seu avô, se ele tem, digamos, 65 anos, e lhe disse a(as) profissão(ões) que exerceu, anote dessa forma: A.C. (as iniciais do nome dele), 65 anos, marceneiro.)

Estrada de ferro: símbolo do

progresso no século XIX

Ensino Médio | Modular 11

SOCIOLOGIA

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Modernização na transição do Império para a República

2

A partir de 1850, o Brasil tomou o rumo da modernização capitalista de forma mais acelerada, anunciando também o processo de superação do traba-lho escravo. Naquele ano, importantes medidas foram tomadas no sentido de mudar a fisionomia do país, tais como: a proibição do tráfico de escravizados, a promulgação de uma lei de terras visando regulamentar o acesso à propriedade territorial, a promulgação do primeiro Código Comercial, o fortalecimento do poder central e o surgimento de uma incipiente burocracia estatal. O capital usado, até então, para o tráfico passou a ser utilizado internamente, permitindo o surgimento de bancos, indústrias, empresas de navegação a vapor, etc. Um

dos aspectos mais importantes desse processo foi a melhoria do sistema de transportes, com o início da construção de estradas de ferro, que procurava se adequar à expansão cafeeira no

Oeste Paulista. Entretanto, para que essas iniciativas tivessem poder suficiente para transformar a estrutura social, o país precisou enfrentar uma questão secular: a escravidão. Essa era a condição básica a ser superada para promover a expansão da cidadania.

Escravidão: símbolo do atraso

Os anos de 1870 a 1889 assinalam, simultaneamente, o período de maior modernização no Brasil e o desenrolar da crise do Império. O movimento republicano, os atritos entre a monarquia, o Exército e a Igreja, o desgaste, provocado pelo encaminhamento da questão da escravidão, são fatores que estão relacionados à maior complexificação da sociedade, tornando obsoleto o regime imperial. É preciso esclarecer que a maior controvérsia a respeito da escravidão não foi em 1888, mas anterior, com o debate a respeito da Lei do Ventre Livre, em 1871. Apesar do caráter conservador da medida, que libertava os filhos de escravizadas nascidos a partir daquela data, mas os mantinham sob tutela do senhor até 21 anos, os proprietários de terra, particularmente nas regiões de expansão da lavoura cafeeira, viam no projeto um grave risco de subversão da ordem. Por outro lado, a polêmica em torno da Lei fez recrudescer o movimento abolicionista, que, a partir de 1880, ganhou as ruas, os jornais, montou organizações de defesa e propaganda da ideia, que se fez representar no parlamento, aglutinando a seu favor parte da classe média urbana e os setores menos conservadores das elites.

dos aspe

Em que momento e median-

te quais representações sociais

o Brasil ingressou na moderni-

dade capitalista? Quais foram

as ideias que acompanharam as

transformações econômicas e

sociais do país?

Principais

eventos que

antecederam

a Proclamação

da República

@SOC576

Sociedade brasileira e Educação12

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Ensino Médio | Modular 13

SOCIOLOGIA

A escravidão não é uma forma de exploração superada para sempre. Pesquise sobre as formas de escravidão que existem atualmente no mundo e onde ocorrem. Faça um relatório por escrito.

Abolicionismo como projeto

de modernidade

Desde que tomaram contato com o conhecimento sociológico pro-duzido na Europa, ainda no século XIX, os intelectuais brasileiros se empenharam em compreender as condições de modernização do país. Muitos deles estavam interessados em recriar o país à altura do século XX, compreender as condições e possibilidades de progresso, indus-trialização, urbanização, modernização e europeização. Em suma, eles exploravam as diversas possibilidades de civilizar o país.

Um dos autores que melhor sintetizou o espírito do abolicionismo foi Joaquim Nabuco (1849-1910), que, durante a década de 1880,

fez da análise sobre os efeitos sociais e políticos da escravidão seu principal tema. Em seu livro O abolicionismo, escrito em 1883, Nabuco percebia a

necessidade de um projeto civilizador nos trópicos. A escravidão, segundo ele, operava uma cisão social, política e jurídica entre a “boa sociedade”, assimilada ao modelo europeu e projetada como o que deveria ser a nação ideal, e sua base social real, identificada com a natureza e a barbárie. Mais importante, Nabuco percebeu que a escravidão produzia efeitos perversos não apenas sobre o escravizado, mas, principalmente, sobre as camadas livres da sociedade, resultando com isso a ausência efetiva de cidadania.

Em outras palavras, uma sociedade escravista se define pela desigualdade jurídica entre os indivíduos; o escravizado não era considerado pessoa, mas mercadoria. Logo, não podia haver, nesse tipo de sociedade, algo como cidadania plena, pois, mesmo os indivíduos considerados livres não seriam iguais entre si, uma vez que sua liberdade consistia na necessidade de possuir capitais suficientes para a aquisição de pessoas escravizadas que trabalhassem por eles.

fei i l

Como a ideia de Brasil moder-

no foi elaborada pelos abolicio-

nistas? Bastava o fim do trabalho

escravo para dar início à moder-

nidade no Brasil? Qual a crítica

que esse importante movimento

trouxe à tona?

Consciência

Negra: os

quilombos, a

resistência

negra,

Zumbi e

Palmares

@SOC522

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O abolicionismoEscravidão e indústria são termos que se excluíram sempre [...]. O espírito da primeira, espalhando-se por um país, mata cada uma das faculdades humanas, de que provém a indústria: a iniciativa, a invenção, a energia individual; e cada um dos elementos de que ela precisa: a associação de capitais, a abundância de trabalho, a educação técnica dos operários, a confiança no futuro. No Brasil, a indústria agrícola é a única que tem florescido em mãos de nacionais. O comércio só tem prosperado nas de estrangeiros. Mesmo assim, veja-se qual é o estado da lavoura [...]. Está, pois, singularmente retardado em nosso país o período industrial, no qual vamos apenas agora entrando. [...] A cada passo encontramos e sentimos os vestígios deste sistema que reduz um belo país tropical ao aspecto das regiões onde se esgotou a força criadora da terra [...]. Onde quer que se a estude, a escravidão passou sobre o território e os povos que a acolheram como um sopro de destruição.

NABUCO, Joaquim. O abolicionismo. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999. p. 167, 178.

Releia atentamente Abolicionismo como projeto de modernidade e o texto acima de Joaquim Nabuco. Em seguida, faça uma síntese da argumentação abolicionista sobre a incompatibilidade entre escravidão e industrialização

Nabuco entendia a escravidão como uma instituição es-sencial, que interferia em todos os aspectos da sociedade (Economia, Direito, Cultura, etc.), e tal interpretação era, em si, uma intuição de caráter sociológico. A reflexão de Nabuco, embora buscasse interpretar o país tendo como foco o peso do trabalho escravo, tinha uma conotação política. Ela não pretendia apenas analisar um fato socioeconômico, mas preparar a nação visando à transição para uma sociedade organizada à base do trabalho livre, em classes sociais e que atingisse a cidadania plena.

A sociedade escravista era uma sociedade de castas e estamentos, isto é, uma sociedade em que a hierarquia estava baseada no nascimento e em valores e normas que definiam quem poderia e quem não poderia ascender socialmente. Já numa sociedade baseada em classes sociais, não é o nascimento ou as normas que definem quem é quem, mas o mérito de cada um, isto é, a capacidade individual de seguir a sua própria trajetória, estudar, trabalhar, aperfeiçoar-se e receber um salário por isso. Nesse tipo de sociedade, isto é, na sociedade moderna, juridicamente, todos são iguais e, teoricamente, têm as mesmas condições políticas, são merecedores do mesmo tratamento social, desfrutam das mesmas oportunidades econômicas, etc.

Do ponto de vista político, o abolicionismo propagava a necessidade não só de extinção da escravi-dão, mas propunha também o incremento da urbanização, isto é, a cidade como palco da civilização e do progresso contra a barbárie que representava o mundo rural nas condições então existentes no Brasil.

Para os abolicionistas, era perceptível o quanto a escravidão representava a ilusão da riqueza, quando, na verdade, era a instituição que promovia a destruição em larga escala dos recursos humanos e materiais da nação

RUGENDAS, Johann Moritz. Negro e negra n’uma fazenda. Século XIX. 1 litogravura sobre papel: color.; 38,5 cm x 33 cm. Acervo Artístico-Cultural dos Palácios do Governo, São Paulo.

A escravidão

e suas

implicações

sociais

@SOC842

Sociedade brasileira e Educação14

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O Rio de Janeiro na

passagem do século XIX

Se, no contexto europeu, a passagem do feudalismo para o capitalismo expressou o rompimento da servidão dos camponeses aos senhores, é possível perceber que foi nas cidades que essa liberdade melhor se expressou. Elas, portanto, foram tradicionalmente o lugar de desenvolvimento da cidadania, em que até o vocábulo “burguês” expressava no período do renascimento comercial, na Idade Média,

o habitante da cidade, do burgo. No Brasil, não houve feudalismo, embora a escravidão representasse uma forma compulsória de tra-balho pré-capitalista, cujas consequências al-cançavam não apenas a organização da vida social no campo, mas também nas cidades. Com a Abolição, em 1888, e com a Proclama-ção da República, em 1889, imaginava-se que uma era de prosperidade e desenvolvimento estava começando, e a modernização brasi-leira seria alcançada.

Nenhuma cidade brasileira expressou me-lhor a modernização do que a, então, Capital Federal – o Rio de Janeiro. Nos primeiros anos da República, era a maior cidade do Brasil, com 500 mil habitantes, e o 3.º porto no continente americano em volume de ne-gócios, superado apenas por Nova Iorque e

Buenos Aires. O fim da escravidão e a difusão do trabalho assalariado, o colapso do regime monárquico, a imigração europeia como forma de suprir a mão de obra na lavoura cafeeira, a liberação de recursos para o fortalecimento da agricultura, da indústria e do comércio, entre outros fatores, concorreram para difundir a crença nas conquistas do progresso. Era esse o horizonte da chamada Belle Époque (ver Conceitos sociológicos), cuja maior representante era a cidade do Rio de Janeiro, palco para as ações e os interesses das elites intelectuais e dirigentes, que tentaram fazer dessa cidade um modelo de civilização a ser irradiado para o restante do país.

A experiência da democratização do crédito, entre 1890 e 1892, por meio da política, conhecida como “encilhamento”, fez do Rio de Janeiro a capital da especulação e da jogatina. Fazendeiros de todas as re-giões acorriam ao Rio em busca das últimas novidades importadas e do desejo de enriquecimento a qualquer custo. O romance O encilhamento, de Alfredo Taunay (Rio de Janeiro, 1843-1899), ilustra bem essa euforia, descrita com ceticismo pelo autor.

Cartão-postal que registra as

Docas da Alfân-dega do Rio de Janeiro, 1905.

As Docas da Alfândega eram

fundamentais para as finan-

ças do governo imperial, que

captava a qua-se totalidade

de sua receita na taxação das

importações

GERODETTI, João Emílio; CORNEJO, Carlos. Lembranças do Brasil: as capitais brasileiras nos cartões-postais e álbuns de lembranças. São Paulo: Solaris, 2004. p. 18.

Tumulto em frente à Bolsa de Valores do Rio de Janeiro

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Autoria desconhecida. Encilhamento. [ca. 1890]. Rio de Janeiro

SOCIOLOGIA

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O Rio de Janeiro, na passagem do século XIX, ainda exibia as marcas da herança escravista, representada em antigos costumes, como as quitandeiras, provavelmente formadas por ex-escravizadas. Durante a escravidão, eram comuns, nas cidades, escravos de ganho, quituteiras, verdureiras, etc., que vendiam mercadorias para seus senhores

O encilhamentoPouco, porém, se lhe importava o calor à multidão que enchia, barulhenta e agitada, todo o trecho final

da Rua da Alfândega até à de Primeiro de Março, transbordando pelos dois ramos laterais da apertada e torta viela, mais que rua, chamada da Candelária, nos arredores do edifício do Banco do Brasil. [...]

Terrível o aperto, completos o acotovelamento e a igualdade; todas as classes da sociedade misturadas, confundidas, enoveladas, senadores, deputados, médicos de nota ou sem clínica, advogados bem reputados ou desprestigiosos, magistrados de fama, militares, um mundo de desconhecidos, outros infelizmente de-masiado conhecidos, homens vindos de todos os pontos do Brasil, alguns até das velhas bolsas da Europa, espertos, ativos, de modo ora insinuantes, ora imperiosos como que de fidalgos deslocados do seu meio habitual, afeitos a todos os negócios, prontos para todas as transações havidas e por haver; gente chegada de fresco dos Estados com a feição ainda tímida e acaipirada de provincianos e gestos de quem mal domina surpresas e medos imensos, outros veteranos já naquele fogo de nova espécie, gabolas, farfalhantes, rindo alto, contando proezas e os mais arriscados lances [...].

Era o encilhamento, palavra quase genial do povo, adaptada da linguagem característica do esporte – local em que se dá a última demão aos cavalos de corrida antes de atirá-los à raia da concorrência e forçá--los, ofegantes e em supremos esforços, a pleitearem o prêmio da vitória. [...]

TAUNAY, Visconde de. O encilhamento: cenas contemporâneas da Bolsa do Rio de Janeiro em 1890, 1891 e 1892. Belo Hori-zonte; São Paulo: Itatiaia, 1971. p. 17-18.

O desvario das ruas, descrito por Visconde de Taunay no romance O encilhamento, causado pela experiência da democratização do crédito típica de uma sociedade capitalista, destaca uma mudança de hábitos e de mentalidade em relação à sociedade escravocrata, pré-capitalista. No entanto, as transformações causadas pela transição de um sistema para outro não são apenas econômicas, mas alcançam outras esferas da vida social. Com base nessas transformações, aponte algumas características da mudança de costumes no início da República.

Entretanto, ao lado desse otimismo, o Rio de Janeiro exibia diversas outras faces, outras realidades ou outras cidades inadequadas ao que se imaginava como civilização. A capital so-

freu notáveis alterações em seu perfil demográfico desde o fim do século XIX: começando pela Abolição da Escravatura, que lançou ex-escravizados no mercado de trabalho livre, aumentando, com isso, o contingente de subempregados e desempregados. Além disso, a imigração estrangeira, sobretudo portuguesa, também foi um fenômeno notável, na virada do século, que contribuiu para a mudança do Rio. A cidade praticamente dobrou de tamanho entre 1872 e 1890, passando de 266 mil para 522 mil habitantes.

FERREZ, Marc (1843-1923). Mulheres no mercado. 1895. Acervo do Instituto Moreira Salles, Rio de Janeiro.

Sociedade brasileira e Educação16

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Com esses números, o Rio de Janeiro exibia sinais evidentes de desequilíbrio: desproporção entre os sexos (em 1890 havia 56% de homens, em virtude da natureza da imigração); acúmulo de pessoas em ocupações mal remuneradas ou sem ocupação fixa; agravamento dos problemas de habitação e moradia; e precário abastecimento de água, saneamento e higiene. As ruas estreitas, típicas de cidade colonial, dificultavam a movimentação de mercadorias e pessoas entre o porto, os trens e a rede de armazéns; doenças, como febre tifoide, malária, varíola e febre amarela, eram endêmicas, sobretudo nas regiões pantanosas da cidade; e o déficit habitacional contribuía para a formação de cortiços e submoradias insalubres em pleno centro urbano.

Cortiço: o atraso em plena Capital Federal

Se a cidade era a representação da cidadania e da modernidade, como entender a heterogeneidade de seus habitantes? Em outras palavras, como dar conta da presença “incômoda” da pobreza urbana num contexto de modernização e urbanização aceleradas?

O romance do escritor maranhense Aluísio Azevedo (1857-1913), O cortiço, escrito em 1890, mas retratando o Rio de Janeiro de 1870, é o registro exemplar de uma representação do universo social de precariedade e miséria em que se desenrolava o processo de urbanização. Por um lado, há um tom de denúncia social que reproduz, no romance, a descrença em relação ao progresso como forma de superação da barbárie. Por outro lado, a forma narrativa do romance, escrito numa linguagem naturalista (ver Conceitos sociológicos), acaba reproduzindo um tom fatalista, muito presente na visão da época, que via nas consideradas “raças inferiores” a impossibilidade de ascensão social e superação desse status quo. A raça e o meio social determinavam, sem escapatória, nesse tipo de argumentação, o comportamento dos indivíduos.

João Romão, o herói do romance, era um imigrante português pobre que ascendia socialmente e, em sua trajetória, não titubeava em explorar outras pessoas, a começar por sua própria companheira, a escravizada fugida Bartoleza. Esse acontecimento apresenta um dos eixos narrativos do romance: a exploração econômica feita de forma bruta e impiedosa, típica de um processo de modernização conservadora.

Ao lado da desumanização das pessoas, o cortiço, isto é, a habitação, se comporta, na visão de Aluísio Azevedo, como um verdadeiro personagem ao lado dos outros, que nasce, cresce e se transforma em esta-lagem, parecendo ter vida própria.

O cortiçoEram cinco horas da manhã e o cortiço acordava, abrindo, não os olhos, mas a sua infinidade de portas e

janelas alinhadas.

Um acordar alegre e farto de quem dormiu de uma assentada sete horas de chumbo. [...] Das portas sur-

giam cabeças congestionadas de sono; ouviam-se amplos bocejos, fortes como o marulhar das ondas; pi-

garreava-se grosso por toda a parte; começavam as xícaras a tilintar; [...] daí a pouco, em volta das bicas

era um zunzum crescente; uma aglomeração tumultuosa de machos e fêmeas. Uns, após outros, lavavam

a cara, incomodamente, debaixo do fio de água que escorria da altura de uns cinco palmos. O chão inundava-

-se. As mulheres precisavam já prender as saias entre as coxas para não as molhar; via-se-lhes a tostada nudez dos

braços e do pescoço, que elas despiam, suspendendo o cabelo todo para o alto do casco; [...] as portas das latrinas

não descansavam, era um abrir e fechar de cada instante, um entrar e sair sem tréguas; não se demoravam lá dentro

e vinham ainda amarrando as calças ou as saias; as crianças não se davam ao trabalho de lá ir, despachavam-se ali

mesmo, no capinzal dos fundos, por detrás da estalagem ou no recanto das hortas.

AZEVEDO, Aluísio. O cortiço. Porto Alegre: L&PM, 1998. p. 40-41.

Definição

contemporânea

e condições

de vida num

Quilombo

@SOC535

SOCIOLOGIA

17Ensino Médio | Modular

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Havia cortiços, como o descrito por Aluísio Azevedo, que chega-ram a ter mais de 400 casas e se portavam como pequenas repúbli-cas, com leis, hábitos e formas de comportamento próprios, distintos da imagem que se queria imprimir à cidade moderna.

Em nome do quê, e contra o quê, a representação do moderno no Brasil se constituiu? Quem ou o que eram os inimigos do progresso?

Desde meados do século XIX e particularmente a partir de 1870, um importante movimento intelectual teve ampla repercussão na imprensa e no pensamento social brasileiro. O discurso sanitarista encontrou em engenheiros e em médicos seus porta-vozes mais comprometidos com a transformação urbana. A medicina social formulou um verdadeiro discurso sobre a cidade, cujos argumentos tiveram extensa aceitação entre as camadas dominantes e médias, discurso esse que fazia do médico, do engenheiro e da burocracia estatal os agentes da regeneração social via “limpeza urbana”.

Em 1904, no ano da inauguração da Avenida Central no Rio de Janeiro, que era parte do projeto de remodelação urbana pertencente

à Reforma Pereira Passos, uma lei de vacinação obrigatória contra a varíola foi promulgada. A reação popular não se fez esperar e, durante uma semana, o Rio de Janeiro assistiu à sua maior revolta urbana, mostrando o quão distante o projeto modernizante e autoritário se encontrava do mundo cotidiano.

Faça, em grupo, uma pesquisa sociológica procurando mostrar as semelhanças existentes entre o cortiço, descrito por Aluísio Azevedo no século XIX, e a favela atual, no século XXI. Com base nisso, reflita se, de alguma maneira, o grupo já se percebeu rotulando as pessoas segundo as suas condições de moradia.

Fotografia de um cortiço em pleno centro do Rio de Janeiro. A superlotação e as péssimas condições de higiene eram fatores de proliferação de doenças e, no caso da representação feita pelos intelectuais da época, a própria imagem do atraso e da degradação moral

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Engenheiro sanitarista

Profissão da área tecnológica e que necessita de formação em curso de graduação de cinco anos. O engenheiro sanitário atua em projetos de saneamento de água, esgoto e drenagem fluvial. Profissão em expansão, absorvida basicamente pelo setor público, em consequência da maior complexidade urbana e da necessidade de aliar o saneamento e abastecimento às questões ambientais.

O trabalho do engenheiro sanitário possui grande importância social e ambiental. Dele resulta a melhoria da qualidade de vida e da saúde pública, por meio do abastecimento e tratamento da água, além de evitar prejuízos e impactos ambientais.

18 Sociedade brasileira e Educação

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Caricatura publicada na revista O Malho, em 1904. Em vários periódicos da época,

é possível perceber a ilustração do descontentamento popular em relação

à obrigatoriedade da vacina contra a varíola, particularmente à violência

empregada para efetivá-la. No centro dessa charge, pode-se ver o médico

sanitarista Osvaldo Cruz, montado sobre uma injeção em forma de canhão contra

a população

(UFSJ – MG) Leia o texto a seguir:

[Para] Rui Barbosa, [a] reação contra a vacina era justa, dizia, mas fora deturpada resultando em ‘bodas adulterinas da arruação com o pronunciamento’. O verdadeiro povo ter-se-ia recolhido ao interior dos lares, pois ele é resignado, submisso e fatalista. As massas incultas é que teriam deixado levar à mazorca. Esta é ainda a versão de Olavo Bilac. A revolta, segundo ele, fora obra da ‘matula desenfreada’ e dos ignorantes explorados pelos astutos. A diferença com Rui é que, para Bilac, os ignorantes definiam-se pela alfabetização e, portanto, constituíam a grande massa da população, uma ‘turba-multa’ irresponsável de analfabetos. José Vieira é um pouco mais preciso. Fala em garotos vendedores de jornais, garotos de cortiço, operários desocupados, capangas de políticos e vagabundos da Saúde, todos promovidos a povo pelos conspiradores. No início, diz ter havido também a participação de ‘vagabundos de gravata’, que se aproveitavam da situação para atirar sua pedra e dar seu tiro de revólver.

CARVALHO, José Murilo de. Os bestializados. São Paulo: Companhia das Letras, 1987.

O texto acima é uma referência à chamada República Velha (1889-1930). Esse texto revela a:

a) preocupação de intelectuais do período com os livros subversivos e a organização das massas popula-res em partidos socialistas e anarquistas.

b) infantilidade das massas populares do período, incapazes de compreender as transformações sociais republicanas e manipuladas por políticos.

c) maneira ordeira e legalista dos setores populares na capital da República, fruto de políticas educacio-nais promovidas pela nova forma de governo.

d) concepção elitista e preconceituosa de homens letrados da época em relação às massas populares, negando legitimidade de seus movimentos.

Contexto científico, social, político

e cultural da Revolta da Vacina

@SOC781

Ensino Médio | Modular 19

SOCIOLOGIA

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Transição para a modernidade nas grandes interpretações do Brasil

3

No Brasil, pode-se dizer que, em 1870, grande parte da elite intelec-tual, comprometida com a mudança social, com os padrões modernos e com o avanço da ciência, percebeu a importância da Sociologia. Na Eu-ropa, ela já era uma disciplina a caminho da consolidação. No entanto, a intelectualidade brasileira não era composta por cientistas sociais ou sociólogos, mas por engenheiros, médicos, oficiais militares, escritores, jornalistas, militantes abolicionistas e/ou republicanos, etc., que faziam conexões entre Direito e sociedade, Literatura e vida social, Engenha-ria, Medicina e saúde pública, Biologia e raça, entre outras conexões possíveis. Essas reflexões tomavam a forma de crítica das instituições, sobretudo da monarquia, da escravidão e do atraso secular em que a

sociedade estava mergulhada.Depois, num segundo momento, que

abrangeu a primeira década republicana até meados de 1930, a Sociologia se tornou uma forma de consciência e de explicação das condições histórico-sociais de existên-cia da sociedade brasileira.

Nessa tela, a artista plástica modernista, Tarsila do Amaral, retratou a união das várias etnias que compunham a sociedade brasileira, tendo ao fundo o cenário da modernização capitalista

AMARAL, Tarsila do. Operários. 1933. 1 óleo sobre tela, color.,150 cm x 205 cm. Coleção do Governo do Estado de São Paulo, São Paulo.

O que mudou entre as atitudes e

ações das elites dirigentes no decorrer

do século XIX e as representações

elaboradas pelos intelectuais brasilei-

ros no início do século XX? Como se

alterou a forma de se abordar a questão

nacional? Com o surgimento das

primeiras reflexões de caráter histórico

e sociológico no Brasil, a percepção da

realidade social também mudou?

Sociedade brasileira e Educação20

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SOCIOLOGIA

Vários autores elaboraram uma análise de caráter histórico-geográfico e sociográfico, motivados pela tentativa de intervenção racional no processo social. Buscavam-se, pela Sociologia, maneiras de direcionar a atividade polí-tica e redesenhar as relações sociais. É que a grande expectativa em torno do fim da escravidão – imaginava-se que uma era de prosperidade se abriria e os grandes problemas nacionais se resolveriam naturalmente – foi rapidamente frustrada. A Proclamação da República também não cumpriu integralmente suas promessas. Com isso, surgiu outra convicção social: a de que os desequilíbrios e as desigualdades que caracterizavam a sociedade brasileira possuíam causas mais profundas. Daí o esforço de certos autores, como Euclides da Cunha (1866-1909), Oliveira Vianna (1883-1951), Sérgio Buarque de Holanda (1902-1982), Gilberto Freyre (1900-1987), entre outros, em entender as causas do atraso brasileiro.

Serão vistas, nesta unidade, algumas das interpretações do Brasil que se tornaram clássicas desde o início do século XX até a década de 1930, focando na compreensão da transição para a modernidade.

O pensamento social nos anos 1930

Foi na década de 30 que se formularam as principais interpretações do Brasil Moderno, configurando “uma

compreensão mais exata do país”. Muito do que se pensou antes se polariza e se decanta nesta época. [...]

Mas naquela época formularam-se algumas matrizes do pensamento social brasileiro, no que se refere a ques-

tões básicas: a vocação agrária e as possibilidades de industrialização, o capitalismo nacional e associado, o

federalismo e o centralismo, a democracia e o autoritarismo, a região e a nação, a multiplicidade racial e a

formação do povo, o capitalismo e o socialismo, a modernidade e a tradição.

IANNI, Octávio. Pensamento social no Brasil. Bauru: EDUSC, 2004. p. 26.

Com base no que você leu até aqui e na citação acima de Octávio Ianni, escreva um pequeno comentário sobre as condições sociais que permitiram o florescimento de um novo tipo de interpretação da sociedade nos anos 1930, no Brasil.

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Euclides da Cunha e as imagens

do Brasil: do litoral ao Sertão

Como o imaginário do progresso caracterizava o restante do país? Como se dava a representação do ambiente rural no pensamento social brasileiro na passagem do século XIX?

Como foi visto na unidade anterior, o ideário do progresso, representado pela Belle Époque, enfatizava a sensação do extremo divórcio entre os grupos tradicionais do mundo rural ou mesmo a população pobre, negra e mestiça dos cortiços, de um lado; e a burguesia urbana, tida como cosmopolita, avançada e progressista, de outro.

Entretanto, desde o processo de independência, em 1822, até meados do século XIX, o Romantismo (ver Conceitos sociológicos) havia despertado nas elites a necessidade de uma identificação com os grupos nativos, particularmente os indígenas, vistos como a essência da nação.

Por exemplo, a temática do Indianismo (ver Conceitos sociológicos) presente nos romances O guarani (1857) e Iracema (1865), de José de Alencar (1829-1877), ilustra a presença de uma imagem extremamente positiva, ainda que abstrata e romantizada, dos primeiros habitantes das terras que mais tarde formaram o Brasil. Tais romances, aliás, retratam a fase de formação da própria nacionalidade brasileira. Já na virada do século, contudo, para muitos intelectuais, a imagem a ser valorizada era a que se identificava com os valores da civilização moderna e, particularmente, europeia.

O desejo de ser estrangeiro, cosmopolita, resumia e exprimia a vitória do litoral diante do atraso, que era atribuído ao interior do país, particularmente ao Sertão. O litoral, signo por excelência do mundo urbano no Brasil, aparecia para a imaginação social nacional como algo extremamente positivo, enquanto ao Sertão atribuía-se uma carga negativa. O interior era uma realidade social e cultural a ser renegada. Nada mais ilustrativo desse pensamento do que uma frase do médico e romancista Afrânio Peixoto (1876-1947), dizendo que o Sertão, no Brasil, começava onde terminava a Avenida Central, do Rio de Janeiro.

No decorrer do século XIX, a palavra “sertão” teve vários significados. Etimologicamente, é oriunda de “desertão” e, nos dicionários da época, ilustrava tanto uma ideia espacial, de interior, como de conteúdo social, indicando as regiões pouco povoadas do interior do país. Para José de Alencar, no romance O sertanejo

(1875), o habitante do Sertão é representado de forma análoga à natureza. O sertanejo e a natureza eram vistos como uma essência viva; enquanto a cultura e a civilização, como coisas artificiais, produtos da mente humana.

Essa ideia também está presente em Euclides da Cunha (1866-1909), cujo livro Os sertões, escrito em 1902, representa um marco na constituição de um argumento sociológico sobre o país. Para Euclides da Cunha, que recebeu formação militar e foi influenciado pelo positivismo (ver Conceitos sociológicos), a crença na ciência era uma referência tão importante quanto o era para a maioria daqueles intelectuais que apostavam na modernidade e na modernização do país. Baseado em ideias, como evolucionismo e darwinismo social (ver Conceitos sociológicos), Euclides da Cunha via a sociedade brasileira como resultado da fusão entre as três raças que a haviam habitado desde a colonização: brancos, negros e indígenas. Contudo, o tipo antropológico que resultou dessa fusão, o mestiço, era visto com ressalvas, uma vez que as diferentes raças estavam em estágios desiguais de evolução. Logo, ao se fundirem, seu efeito poderia resultar em um tipo antropológico híbrido, desequilibrado, isto é, num ser degenerado.

Imagem símbolo da civilização, o espaço perfeitamente saneado e limpo no centro do Rio de Janeiro era a consagração dos valores da modernidade. Dizia-se que, tão logo a avenida acabava, começava o Sertão

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Fotografia de Augusto Malta (1864-1957). Avenida Central, Rio de Janeiro, 1906.

Obra completa

Os sertões, de

Euclides da

Cunha

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Sem dúvida, seu diagnóstico quanto à degeneração se aproximava (ainda que não fosse idêntico) daquela imagem feita por Aluísio Azevedo, ao descrever os habi-tantes dos cortiços. Entretanto, o sertanejo representaria, para Euclides da Cunha, não tanto um degenerado, mas um retrógrado. Diferentemente dos mestiços do litoral, os mestiços do Sertão teriam podido se desenvolver, aju-dados por um meio ambiente mais favorável para tal, até alcançarem um tipo antropológico definido. Justamente por terem se livrado de uma cultura de empréstimo, dos hábitos e das maneiras copiadas da Metrópole, eles seriam capazes de uma integração simbiótica com o meio natural. Isso os tornaria mais autênticos, mais verdadeiros que os mestiços do litoral.

Quando esteve em Canudos, como jornalista corres-pondente d’A Província de São Paulo (o atual O Estado de S.Paulo), Euclides da Cunha afirmou que, no Sertão da Bahia, ele estava diante do “cerne de nossa naciona-lidade”, do embrião de uma civilização autenticamente constituída.

AGOSTINI, Ângelo. Antônio Conselheiro rechaça a República. Desenho publicado em A Revista Ilustrada, 1896. Na charge, Antônio Conselheiro é retratado como um obstáculo à República

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O sertanejo em Euclides da Cunha

Este fato [isto é, o processo de constituição dos mestiços do Sertão] destaca fundamentalmente a mestiçagem dos sertões [daquela] do litoral. São formações distintas, senão pelos elementos, pelas condições do meio. O contras-

te entre ambas ressalta ao paralelo mais simples. O sertanejo tomando em larga escala, do selvagem, a intimidade com

o meio físico, que ao invés de deprimir enrija o seu organismo potente, reflete, na índole e nos costumes, das outras

raças formadoras apenas aqueles atributos mais ajustáveis à sua fase social incipiente.

É um retrógrado; não é um degenerado. [...]

A sua evolução psíquica, por mais demorada que esteja destinada a ser, tem, agora, a garantia de um tipo fisica-

mente constituído e forte. Aquela raça cruzada surge autônoma e, de algum modo, original, transfigurando, pela própria

combinação, todos os atributos herdados; de sorte que, despeada afinal da existência selvagem, pode alcançar a vida

civilizada por isto mesmo que não a atingiu de repente. [...]

O sertanejo é, antes de tudo, um forte. Não tem o raquitismo exaustivo dos mestiços neurastênicos do litoral.

CUNHA, Euclides da. Os sertões. São Paulo: Ateliê, 2001. p. 203 e 207.

Pelo fato de ser retrógrado, mas não degenerado, o sertanejo podia, conforme a concepção do jornalista, ser alvo de um efetivo projeto de integração nacional. Ao presenciar a ação do Exército contra Canudos, bem como a propaganda que legitimava o ataque ao messianismo de Antônio Conselheiro em nome do progresso, Euclides da Cunha deplorava o desvirtuamento de uma República que, em nome da civilização, era capaz de cometer tamanho massacre. Ainda que dividido entre a visão do atraso e da barbárie, atribuída aos jagunços, e admirando-os, ao mesmo tempo, por sua força e vigor como “rocha viva de nossa raça”, Euclides da Cunha criticará a fúria com que a expedição militar dizimou Canudos: em nome da tão proclamada modernidade da capital, os oficiais se igualaram em brutalidade aos fanáticos seguidores de Antônio Conselheiro (1839-1897).

Esse episódio permite ilustrar o processo de modernização conservadora que definiu o tipo de progresso brasileiro da época: parte do contingente de soldados que retornou de Canudos para o Rio de Janeiro, depois de cumprida a missão de civilizar o Sertão, só conseguiu se estabelecer na cidade nas submoradias que se formavam nas encostas dos morros e que receberam o nome de favela – uma planta muito comum no povoado do interior da Bahia.

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SOCIOLOGIA

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A guerra de Canudos

Canudos não se rendeu. Exemplo único em toda a

história, resistiu até ao esgotamento completo.

Expugnado palmo a palmo, na precisão integral

do termo, caiu no dia cinco [de abril de 1897], ao

entardecer, quando caíram os seus últimos defen-

sores, que todos morreram. Eram quatro apenas:

um velho, dois homens feitos e uma criança, na

frente dos quais rugiam raivosamente cinco mil

soldados.

CUNHA, Euclides da. Os sertões. São Paulo: Aletiê, 2001.

p. 778.

O início da República, no Brasil, foi um período particularmente conturbado. Pesquise para saber quantas e quais revoltas ocorreram no país entre 1889 e 1920. A partir daí, elabore um trabalho escrito sobre o tema e, com esses dados em mãos, reflita e discuta (em grupos) sobre a natureza violenta de implantação da civilização capitalista no Brasil. Apresente as conclusões de seu grupo, debatendo essas ideias.

Oliveira Viana e a defesa da

modernização autoritária

Oliveira Viana (1883-1951) escreveu, entre os anos 1910 e 1950, sobre a formação social no Brasil. Ficou conhecido por defender a necessidade de soluções autoritárias para manter a ordem social, ao propor que o Estado desempenhasse um papel central na ordem jurídica, social e política do país e não mais as elites regionais e provinciais.

Para Oliveira Viana, havia uma espécie de divórcio entre o Brasil legal e o Brasil real, isto é, entre as instituições políticas e a realidade social, entre a letra da lei e a sociedade, frágil e amorfa. Nesse contexto, fazia sentido esperar da sociedade projetos e iniciativas de mudança ou, ao contrário, cabia ao Estado impor uma nova organização nacional à sociedade brasileira?

Oliveira Viana criticou o universalismo contido nas teorias evolucionistas. Para ele, não havia uma linha evolutiva única para a humanidade, embora acreditasse em superioridade e inferioridade racial e cultural. Desse modo, cada raça era única em sua própria evolução, feita com base em um conjunto complexo de causas, como o espaço geográfico, a história, as instituições, a cultura, além do aspecto propriamente biológico. Assim, não havia por que uma raça, ou determinado agregado humano, simplesmente copiar as instituições de outra raça, por mais civilizada que essa pudesse ser.

O que era possível fazer, no caso brasileiro, era melhorar a raça através da eugenia (ver Conceitos sociológicos): havia, portanto, que se considerar a potencialidade do branqueamento da população via imigração de trabalhadores europeus.

Fotografia de Flávio de Barros. Imagem dos sobreviventes de Canudos, que resistiu a quatro expedições militares, mobilizando 10 mil soldados. A guerra durou um ano, deixando mais de 25 mil mortos. Na foto, os “famigerados” jagunços sobreviventes: mulheres e crianças amedrontadas, cercadas pelo Exército

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Oliveira Viana fez uma interpretação da formação da sociedade brasileira que passava pela valorização do papel do latifúndio. Para o escritor fluminense, o povo brasileiro teria uma essência emi-nentemente rural, e em sua história não havia rupturas profundas, tampouco conflitos ou revoluções. Contudo, essa mesma psicologia política, que tornou o povo pacífico e ordeiro, fazia com que este estivesse predisposto a aceitar determinadas formas de dominação e arranjo político, uma vez que a sociedade não tinha elementos para se auto-organizar. Daí sua crítica à importação de ideias e instituições que não teriam nada a ver com a realidade política brasileira, como a democracia, o liberalismo, o federalismo, etc.

O pintor espanhol Modesto Brocos y Gómez traduziu, nessa tela, os anseios de grande parte dos intelectuais e das elites dirigentes na passagem do século XIX para o XX: a ideia de branqueamento da po-pulação como sinal de progresso, que se daria pela miscigenação. A tela retrata três gerações: a matriarca negra, os pais mulatos e uma criança branca (a esperança louvada pela provável avó materna)

GÓMES, Modesto Brocos y. A redenção de Cam. 1895. 1 óleo sobre tela; color., 199 cm x 166 cm. Museu Nacional de Belas-Artes, Rio de Janeiro.

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Sérgio Buarque de Holanda e a

crítica às raízes rurais brasileiras

Outro autor importante a problematizar a transição para a modernidade foi Sérgio Buarque de Holanda (1902-1982). Em seu livro Raízes do Brasil, publicado em 1936, procurou identificar quais traços arcaicos e tradicionais estavam sendo superados e quais as perspectivas de mudança que se avistavam no horizonte. Sérgio Buarque não reconstruiu historicamente a sociedade brasileira, isto é, ele não fez a sua história; mas examinou, em períodos históricos distintos, formas de sociabilidade, padrões culturais, inquietações intelectuais, instituições e mentalidades, que tiveram continuidade e/ou foram ou estavam sendo superados pelo progresso nacional.

O latifúndio como fator eugênico

O latifúndio cafeeiro, como o latifúndio açucareiro, tem uma organização complexa e exige capitais enormes: pede

também uma administração hábil, prudente e enérgica. É, como o engenho de açúcar, um rigoroso selecionador de

capacidades. Só prosperam, com efeito, na cultura dos cafezais as naturezas solidamente dotadas de aptidões orga-

nizadoras, afeitas à direção de grandes massas operárias e à concepção de grandes planos de conjunto. O tipo social

dela emergente é, por isso, um tipo social superior, tanto no ponto de vista das suas aptidões para a vida privada,

como no ponto de vista das suas aptidões para a vida pública. Daí formar-se, nas regiões onde essa cultura se faz

a base fundamental da atividade econômica, uma elite de homens magnificamente providos de talentos políticos e

capacidades administrativas.

VIANA, Oliveira. Evolução do povo brasileiro. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1933. p. 104.

SOCIOLOGIA

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O método de interpretação de Sérgio Buarque de Holanda, em Raízes do Brasil, se aproximou de uma sociologia weberiana (ver Conceitos sociológicos), do sociólogo alemão Max Weber (1864- -1920). Ele procurou selecionar os traços, as características mais significativas da realidade nacional a fim de construir esquemas de interpretação abstratos que captassem o que fosse mais típico da formação social brasileira. Assim é que, em Raízes do Brasil, o autor tentou compreender a cultura personalista, presente nas sociedades ibéricas (Portugal e Espanha), e como esta foi difundida com a colonização nas Américas. A influência dessa e de outras culturas resultou tanto na ausência de uma ética do trabalho como na difusão de uma ética da aventura entre as relações sociais,

originando com isso formas de associação extremamente frágeis entre os indivíduos. Também contribuiu para a formação social o patriarcalismo (ver Conceitos sociológicos), uma herança rural brasileira. O patriarcalismo gerou um excessivo valor dado às relações pessoais em detrimento de valores burgueses, como o princípio da impessoalidade, do individualismo, etc. Em suma, a sociedade brasileira exibia sinais de que tinha muito pouco a ver com uma sociedade liberal, burguesa e moderna. Nesse sentido, como esperar que essa sociedade pudesse se modernizar na ausência de características modernas? Como supor que essa sociedade pudesse vir a ser democrática sem ter valores demo-cráticos difundidos?

No Brasil, afirma o autor, a democracia foi sempre um mal- -entendido, já que aqui predominaram formas de dominação personalistas, clientelistas, autoritárias e, portanto, ibéricas, isto é, distantes de um padrão ideal democrático e universalista. “Em terra onde todos são barões não é possível acordo coletivo durável, a não ser por uma força exterior respeitável e temida”, (HOLANDA, 2006).

Contudo, apesar desses traços socioculturais que caracteriza-vam a nacionalidade, uma lenta revolução acontecia. Em função da independência política, do contínuo processo de urbanização, da substituição da aristocracia açucareira pela cultura empresarial da cafeicultura e da Abolição da Escravatura, Sérgio Buarque de Holanda percebeu uma nova mentalidade emergindo, deixando para trás as sobrevivências arcaicas.

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O malandro brasileiro, tipicamente carioca, possui muitas características ressaltadas por Sérgio Buarque de Holanda a respeito do homem cordial: simpatia, camaradagem, esperteza, falsa intimidade, malandragem, ética da aventura, desprezo pelo trabalho formal e rotineiro, etc. O malandro brasileiro foi imortalizado pelas letras de samba, e um bom exemplo disso é “Lenço no pescoço”, samba escrito por Wilson Batista e gravado por Silvio Caldas, em 1933. Suas estrofes dizem: “Eu tenho orgulho/Em ser tão vadio./Sei que eles falam/Deste meu proceder/Eu vejo quem trabalha/Andar no miserê/Eu sou vadio/Porque tive inclinação/Eu me lembro, era criança/Tirava samba-canção”. Pode-se também lembrar de outros dois co-nhecidos representantes desse espírito: o primeiro é Zé Carioca, personagem de Walt Disney, inspirado no estereótipo do malandro carioca; e o segundo é João Grilo, personagem típico das narrativas da Região Nordeste brasileira. João Grilo foi popularizado por todo o Brasil na peça teatral O Auto da Compadecida, escrita por Ariano Suassuna.

Biografia de

Max Weber

e suas

contribuições

para a

Sociologia

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26 Sociedade brasileira e Educação

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AS AVENTURAS de Pedro Malasartes. Direção de Amácio Mazzaropi. Brasil: PAM Filmes, 1960. 1 DVD (90 min).

Debatam em classe: a) A percepção que os brasileiros têm sobre si mesmos coincide com o que Sérgio

Buarque diz sobre o homem cordial?b) É possível conciliar a cultura do “jeitinho brasileiro” com o princípio constitucional

de igualdade?

Gilberto Freyre e as raízes ibéricas

da cultura brasileira

Há um autor que se destaca no conjunto dos intérpretes do Brasil por apostar e valorizar justamente a tradição de nossas raízes ibéricas, diferentemente, por exemplo, da atitude de Sérgio Buarque de Holanda: trata-se do pernambucano Gilberto Freyre (1900-1987).

De procedência do folclore medieval português, Pedro Malasartes incorporou-se ao imaginário brasileiro. Assim como nosso malandro, Pedro Malasartes, matuto, pobre, procura obter vantagem das situações e das pessoas mais privilegiadas, buscando algum bem-estar, sem grandes preocupações morais.

Em 1976, uma publicidade imortalizou o espírito da malandragem. Nela, o protagonista era o armador da Seleção Brasileira de Futebol de 1970, Gérson de Oliveira Nunes. Ele dizia que certa marca era a melhor porque era mais barata do que as outras. No final do comercial, ele falava “Gosto de levar vantagem em tudo, certo? Leve vantagem você também”. Após esse reclame, a malandragem ficou também conhecida como “Lei de Gérson”, e diz respeito à ideia de levar vantagem em tudo.

O homem cordial

Já se disse, numa expressão feliz, que a contribuição brasileira para a civilização será de cordialidade – daremos ao

mundo o “homem cordial”. A lhaneza no trato, a hospitalidade, a generosidade, virtudes tão gabadas por estrangeiros que

nos visitam, representam, com efeito, um traço definido do caráter brasileiro, na medida, ao menos, em que permanece

ativa e fecunda a influência ancestral dos padrões de convívio humano, informados no meio rural e patriarcal [...].

Nenhum povo está mais distante dessa noção ritualista da vida do que o brasileiro. Nossa forma ordinária de convívio

social é, no fundo, justamente o contrário da polidez. [...] No domínio da linguística, para citar um exemplo, esse modo

de ser parece refletir-se em nosso pendor acentuado para o emprego dos diminutivos. A terminação “inho”, aposta

às palavras, serve para nos familiarizar mais com as pessoas ou os objetos e, ao mesmo tempo, para lhes dar relevo.

HOLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2006. p. 160-162.

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Em Casa-grande & senzala, escrito em 1933 e que logo se tornou uma referência clássica do pensamento social, sendo inclusive traduzido para diversos idiomas, Gilberto Freyre fez uma longa reflexão sobre a influência da mestiçagem, o papel das culturas e etnias e o valor do patriarcalismo na formação da sociedade brasileira, desde os primeiros anos de colonização. Diferentemente de muitos autores que o antecederam, fez duas importantes inversões de ótica: em vez da raça ou da biologia para caracterizar os comportamentos sociais, pensou-os a partir da cultura; em vez de pensar o Estado como o núcleo da nacionalidade, ele pensou a sociedade.

Em relação à questão racial e à mestiçagem, que muitos autores, em particular Oliveira Viana, percebiam como obstáculo ao progresso, Gilberto Freyre a interpretou de forma extremamente positiva: os africanos teriam sido, na verdade, introdutores de padrões culturais até mais elevados do que os recebidos por nós dos indígenas e dos europeus. Ou seja, para Freyre, o africano foi um agente colonizador ao lado do português. Assim, ao rejeitar o debate em torno do determinismo biológico e ao enfatizar a dimensão cultural, o autor conseguiu neutralizar a imagem negativa que parte da intelectualidade tinha em relação à herança étnica e cultural africana.

Mas será que essa afirmação desmentia, efetivamente, a ideia de culturas superiores e inferiores? Melhor dizendo, a atitude intelectual de Freyre foi realmente antirracista?

Aí é que está! Freyre foi bastante ambíguo em relação a essa questão, pois tinha como pressuposto a ideia de raça histórica, isto é, a ideia de que os grupos étnicos se adaptavam a diferentes espaços e culturas e, ao se aclimatarem, transmitiam aos herdeiros os caracteres adquiridos. Assim foi o caso dos colonizadores portugueses no Brasil: em pouco mais de um século longe da Península Ibérica, já eram “quase outra raça”. Além disso, Freyre supôs, para explicar o Brasil, outra espécie de hierarquia, não mais racial, mas cultural. Os povos seriam inferiores ou superiores em função da complexidade de sua cultura.

A participação dos africanos escravizados, sobretudo das mulheres no espaço doméstico das casas-grandes, tornou possível a seleção dos melhores indivíduos, isto é, daqueles melhor preparados para a ocupação de funções que, mesmo subalternas em relação aos membros da família senhorial, eram superiores às que o restante dos escravizados eram obrigados a exercer. Em outras palavras, o patriarcalismo que predominou no Brasil não distanciou negros e brancos, mas, ao contrário, promoveu uma aproximação que, em outras sociedades escravistas, não ocorreu. Tanto o patriarcalismo, quanto a própria escravidão teriam sido, segundo Gilberto Freyre, mais brandos, menos violentos, e nisso estaria a singularidade da cultura brasileira: uma sociedade sem preconceito racial.

A brandura do regime escravocrata só foi possível em função da ação da família senhorial em con-temporizar dominantes e dominados, brancos e não brancos, reduzindo as distâncias entre a casa-

-grande e a senzala. Assim, a história da formação do povo brasileiro seria a história da própria família patriarcal que teria permitido a miscigenação em larga escala, criando zonas de confraternização entre senhores e escravizados.

A menção ao equilíbrio entre esses extremos (sociais, culturais, econômicos) pode ser lida aqui como a evidência de uma cultura po-lítica da conciliação: ela seria expressão da competência da família senhorial em não permitir que momentos de crise desembocassem em rupturas sociais profundas.

DEBRET, Jean-Baptiste. Um jantar brasileiro. 1827. 1 aquarela sobre papel, color., 15,9 cm x 21,9 cm. Museus Castro Maya, Rio de Janeiro.

Ao analisar quase exclusivamente as relações entre senhores e escravizados no espaço doméstico da casa-grande, Gilberto Freyre interpretou a escravidão no Brasil pela ótica do patriarcalismo. Pelo fato de cada um saber o seu lugar, todos podem conviver em harmonia. A igualdade, fosse ela jurídica, social ou econômi-ca, estava fora de questão

Se tal visão extremamente positiva da colonização foi possível, como imaginar, portanto, o processo de modernização sofrido pela sociedade? Em outras palavras, será que a visão de Gilberto Freyre sobre esse processo foi igualmente positiva?

Na verdade, não. Para Freyre, a Abolição da Escravatura, a República, a urbanização, o progresso, o desenvolvimento, etc., significaram tão somente a decadência dos valores patriarcais e não produziram maior equilíbrio social.

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O complexo Casa- -grande & senzala, segundo Gilberto Freyre, permitia a integração entre senhores e escravi-zados em uma mes-ma unidade familiar e produtiva. Com o avanço da urbani-zação, os sobrados dos senhores se distanciaram dos mucambos dos ex--escravizados, sig-nificando, com isso, a decadência do poder tutelar que a família senhorial exercia sobre as ca-madas subalternas.

DIAS, Cícero. Engenho Noruega: antigo Engenho Dois Bois. 1933. 1 pintura. Acervo Fundação Gilberto Freyre, Recife.

Pelo contrário, aumentaram as distâncias físicas e morais entre ricos e pobres, brancos e não brancos. Essa separação se evidencia em um dos livros de Gilberto Freyre, Sobrados e mucambos. A letra “e”, presente no título, diferentemente do símbolo “&”, utilizado anteriormente em Casa-grande & senzala, significa, na realidade, uma distância, um afastamento.

Por outro lado, embora profundas, tais transformações não chegariam a romper com essa cultura da conciliação, pois para Gilberto Freyre a casa-grande não desapareceu, mas continuou influenciando, como nenhuma outra força, a formação social do brasileiro, agora no espaço urbano.

A (não) importância da alfabetização em massa para Gilberto Freyre

Alguns dos que estudam as culturas modernas têm certa tendência a exagerar a importância da capacidade para ler

e escrever. A leitura e a escrita são meios de comunicação muito úteis para as civilizações industriais e para as formas

puramente políticas de organização democrática. E como tais, estão ao que parece sendo substituídos pelo telefone,

o rádio, a televisão. Países como China, Índia, México e Brasil não terão, provavelmente, a mesma necessidade de

saber ler e escrever, como meio de modernizar-se, que tiveram as vastas massas durante o século XIX e ainda a Rússia

Soviética no começo deste século.

FREYRE, Gilberto. Interpretación del Brasil. México: Fondo de Cultura Económica, 1987. p. 44.

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SOCIOLOGIA

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Dirigindo, o motorista espera que, estando o sinal verde, ele possa seguir sem que outro motorista venha pela transversal e o atinja, provocando um acidente. Se não fosse possível ter essa expectativa, como seria o trânsito? Assim, é a vida social. As pessoas agem em função da expectativa que têm diante de os outros seguirem as mesmas regras.

Aprende-se, desde muito cedo, que algumas atitudes são socialmente aceitas e outras não. Esse processo de entendimento de normas, valores e comportamentos, denominado educação, implica o aprendizado de condutas sociais consideradas adequadas aos valores da civilização. Daí a expressão “comportamento civilizado”, que não quer dizer apenas que o indivíduo é polido, cortês, fino, mas que tem uma atitude adequada às regras próprias da cultura em que está inserido.

É comum as crianças perguntarem ou questionarem os seus pais a respeito da razão por que devem seguir determinadas normas, obedecer a certas regras e cumprir tantas obrigações.

Toda sociedade, para se constituir, depende da existência e do cumpri-mento de normas, regras e padrões de conduta, que devem ser regulares (isto é, não podem mudar todo dia), ser socialmente aceitos e resultar de um

acordo mútuo. Mesmo quando esse acordo, esse “contrato”, não é explícito, a ideia de que existe um pacto entre os indivíduos é o que está na origem, no princípio da vida civilizada.

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Educação e socialização primária

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Padrões de comportamento não são universais (válidos para todas as sociedades) nem naturais (conforme a natureza “humana”). Eles variam no tempo. São, portanto, históricos. E estão de acordo com a geografia, isto é, em cada lugar do mundo, em cada sociedade ou civilização há comportamentos válidos e inválidos, positivos e negativos, aceitáveis ou não.

Toda sociedade possui seus códigos de conduta – mesmo que sejam muito diferentes entre si. Moderna ou tradicional, simples ou complexa, oriental ou ocidental, os padrões de comportamento das sociedades são impostos. Eles são uma precondição para a participação na vida social. Se as regras da vida social não forem seguidas minimamente, corre-se o grande risco de ser punido, repreendido ou até mesmo excluído do grupo a que se pertença.

Nesta unidade, será discutida exclusivamente a socialização primária – etapa de formação do ser social, que acontece ainda na infância. É a absorção das regras mais básicas que garante o sentimento de pertencimento ao grupo social. Essa etapa é fundamental na biografia de um indivíduo, porque o torna capaz de identificar a si e aos outros como parte de um círculo comum de convivência.

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Os fatos sociais são externos a nósMesmo estando de acordo com sentimentos que me são próprios, sentindo-lhes interiormente a realidade, esta não deixa de ser objetiva; pois não fui eu quem os criou, mas recebi-os através da educação. [...] A maioria de nossas ideias e tendências não são elaboradas por nós, mas nos vêm de fora [...] não podem penetrar em nós senão através de uma imposição.

DURKHEIM, Émile. As regras do método sociológico. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1987. p. 1-3.

O que o autor quis dizer com “A maioria de nossas ideias e tendências não são elaboradas por nós, mas nos vêm de fora”? Cite um exemplo relacionado ao seu comportamento que comprove a sua resposta.

Educação além da escola

Do ponto de vista da Sociologia, a educação não consiste apenas na assimilação, por meio do sistema escolar, de conhecimentos formais (como a Trigonometria, a Mecânica, a História da África, etc.). A educação compreende também a assimilação de hábitos que foram trabalhados com muito empenho no decorrer dos primeiros anos da infância, mesmo que pareçam, na juventude e na vida adulta, imperceptíveis, naturais e eternos. As maneiras como as pessoas se sentam, comem, expressam seu afeto são produto de um longo trabalho de educação.

Todavia, é importante notar que, levando-se em conta uma base de valores sociais comuns com os quais todos estão de acordo, cada grupo social ou mesmo cada geração cultiva, reproduz e renova, por meio de numerosos mecanismos, hábitos correspondentes à sua visão particular de mundo e à sua posição no espaço social.

Em equipes, organize uma lista que compreenda o seguinte:

10 ações esperadas e 10 inesperadas de alunos e professores no âmbito da escola. Reflitam so-bre o tipo de reação que atitudes inesperadas poderiam causar no grupo.

Então, respondam à seguinte questão:

De onde provém o aprendizado que leva à acei-tação dessas regras de conduta? ©

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A Sociologia sustenta (e comprova por meio de inúmeras pesquisas) que cada pessoa é o resultado médio do grupo social em que vive. Isso envolve uma série de determinantes relacionados a gênero, idade, cor da pele e classe social. Portanto, ainda que a pessoa faça muitas escolhas individuais (o gênero musical de que mais gosta, a opção por um estilo de roupa e de corte de cabelo, o modo característico de falar, etc.), ela é, em essência, produto da sociedade. Foi burilada para expressar valores e cultivar hábitos que já existiam antes mesmo de nascer e que, portanto, são alheios à sua existência e aos seus desejos. As formas de agir, sentir e pensar são, por isso, externas aos indivíduos e internalizadas por meio de um longo e complexo trabalho educativo.

Assim, a ação educativa, antes de instruir e transmitir conteúdos, conhecimentos, visa impor valores e hábitos da sociedade em que se vive, que, rigorosamente, se encontram fora dos indivíduos.

Para compreender um pouco da natureza desse processo, pense em um esquimó que, tendo nascido e sido criado no Alasca, não terá o paladar preparado para gostar, de imediato, da comida brasileira; não compreenderá prontamente as funções de um advogado ou de um deputado; tampouco captará, em um primeiro olhar, o padrão da relação entre homens e mulheres típico desta sociedade.

Em contrapartida, um brasileiro também estranhará a dieta com a qual eles estão habituados: peixe cru e carne de urso. Achará bizarro o fato de que todos os dilemas das comunidades esquimós (desde a participação nos rituais mágicos até os assuntos de caça e mudança de acampamento) serão decididos por um líder espiritual, que não consultará contratos e códigos formulados com base em preceitos jurídicos. E certamente ficará contrariado com a prática do sacrifício de recém-nascidos do sexo feminino a fim de evitar a predominância de mulheres sobre homens. Os esquimós, com base em uma noção muito própria de equilíbrio, acreditam que essa predominância provocaria desequilíbrio social, decorrente da competição entre as mulheres (MAUSS; BEUCHAT, 2003).

Os esquimós são a população nativa de regiões do Ártico que vivem em partes do Canadá, Groenlândia, Alasca, Sibéria, entre outras terras da área. Existem diferentes grupos, como os Inuit, Alutiit, Yupik e Inupiat, que falam dialetos diferentes.

O termo “esquimó” (eskimo) tem sido usado desde o século XVI pelos europeus e outros povos para designar os indígenas do Ártico.

Por muito tempo, acreditou-se erroneamente que eskimo sig-nificaria “comedor de carne crua”. O termo passou, então, a ser considerado politicamente incorreto, por muitos, no final do século XX. Atualmente, entretanto, acredita-se que a origem do termo está mais relacionada com os calçados usados para neve. [...]

GUIAGEO. Esquimós. Disponível em: <http://www.guiageo-artico.com/esquimos.htm>. Acesso em: 20 jun. 2011.

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Se você tivesse sido, desde bebê, criado entre os esquimós, certamente teria o mesmo gosto, os mesmos hábitos e sentimentos dos membros desse grupo social. O contrário também seria verdadeiro: um bebê esquimó adotado por uma família brasileira teria um comportamento similar ao seu.

Arrebol: vermelhidão do

nascer ou do pôr do sol.

Texto 1

Siksik tinha preparado o chá, servindo-se para isto da lâmpada de cozinhar, feita de pedra-sabão, ou estea tita. Ela encheu uma tigela; e, bamboleando-se, ou seja, caminhando à maneira pela qual se locomovem os pombos – devido às botas de pele anelada de foca, que lhe chegavam até a parte superior da coxa – ofereceu a bebida a Ernenek com um sorriso. O homem e a mulher se vestiam desta mesma maneira. Ambos eram atarracados e musculosos; ambos possuíam o mesmo tipo alegre, largo e achatado, de rosto; pareciam iguais, com exceção dos cabelos; Ernenek usava-os longos e de-sencaracolados, ao passo que os de Siksik se erguiam num arranjo nítido, em forma de torre, no cocoruto da cabeça, rebrilhando de unto feito de óleo de baleia, e alfinetados com espinhas de peixe.

RUESCH, Hans. No país das sombras longas. 4. ed. Rio de Janeiro: Record, 1974. p. 12.

Texto 2

Aquela pequena cúpula de gelo bem que poderia ser uma habitação feliz. O iglu era pequeno, por motivos de facilidade de aquecimento; mas possuía todo o conforto imaginável: a despensa continha abundância de

graxa de óleo de baleia para ser usada como combustível, a fim de se cozinhar e produzir luz; e possuía, além disto, alimento suficiente para durar o inverno todo. Quando, através da espessa parede de gelo, se ouvia o vendaval uivando lá fora, aquela cúpula, aquele iglu, era quente e aconchegante, com a sua luz pálida de arrebol, com a sua fragrância de óleo de baleia quei-mado, e com o seu cheiro de carnes postas para se abrandarem. Coroando tudo, havia aquele destemido caçador que era Ernenek a roncar no saco de dormir.

RUESCH, Hans. No país das sombras longas. 4. ed. Rio de Janeiro: Record, 1974. p. 48.

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1. Com relação ao texto 1:

a) Destaque as características que se referem ao homem e à mulher.

b) Escreva um pequeno texto em que essas carac-terísticas estejam modificadas de acordo com as que predominam em nossa cultura.

2. Com relação ao texto 2:

a) Destaque as características de moradia dos esquimós.

b) Escreva um pequeno texto que descreva o modo de habitação de nossa sociedade.

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Educando para a vida socialToda educação consiste num esforço contínuo para impor às crianças maneiras de ver, de sentir e de agir às quais elas não chegariam espontaneamente. [...] Desde os primeiros anos de vida, são as crianças forçadas a comer, beber, dormir em horas regulares; são constrangidas a terem hábitos higiênicos, a serem calmas e obedientes; mais tarde obrigamo-las a aprender a pensar nos demais, a respeitar usos e conveniências, forçamo-la ao trabalho, etc., etc. [...] A educação tem justamente por objeto formar o ser social. [...] A pressão de todos os instantes que sofre a criança é a própria pressão do meio social tendendo a moldá-la à sua imagem, pressão que tanto os pais quanto os mestres não são senão repre-sentantes e intermediários.

DURKHEIM, Émile. As regras do método sociológico. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1987. p. 17.

1. Há termos, notadamente os verbos, usados pelo autor em relação à educação para tornar-se um ser social que denotam certa pressão. Quais são essas palavras e qual o objetivo do autor ao selecioná-las para a construção do texto?

2. “[...] tanto os pais quanto os mestres não são senão representantes e intermediários.” Se ambos (pais e mestres) são responsáveis pela educação para formar o ser social, em que sentido são apenas representantes e intermediários?

Para Durkheim, portanto, a educação é um artifício abrangente que remete à formação, adequação ou conformação do indivíduo à sociedade a que pertence. Ela não é um fato acabado, mas um processo contínuo que produz nos indivíduos estados, valores e comportamentos os quais são reclamados pelos “outros”, isto é, pela sociedade.

Mesmo que não se tenha uma percepção exata de sua extensão, aqueles pequenos conteúdos cotidianos que os outros (em geral, os adultos) transmitem constituem a essência do processo de trans-formação do indivíduo em “ser social”. Isso quer dizer que os processos (formais e informais) de ensino e aprendizagem instituídos em uma sociedade estão estreitamente relacionados à conservação ou à renovação das regras sociais.

Uma das primeiras reflexões acerca da importância da educação para a sociedade pode ser encontrada nos escritos de Émile Durkheim (1858-1917). Esse autor entende que uma sociedade não perdura, não tem continuidade, se não houver um mínimo de homogeneidade entre seus membros. Ou seja, a sociedade exige, para existir, que se compartilhem valores mais ou menos comuns entre os seus elementos.

Isso significa que a vida em sociedade prevê mais do que o aprendizado intelectual de códigos e normas de conduta por meio do estudo; ela demanda a internalização de padrões básicos de com-portamento. Passa-se, então, a agir como se esses padrões fossem naturais, eternos e simplesmente “corretos”.

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Para compreender os processos de socialização – que são em sua essência nada menos que pro-cessos educativos – é preciso, antes, compreender que há duas formas de socialização: a primária e a secundária.

Socialização primária

No processo de internalização de comportamentos, códigos e modos, o primeiro protagonista é a família. Os pais transmitem à criança os códigos linguísticos, expressões de afeto, modos adequados de agir, vestir- -se, comer, etc. São eles que também lhes ensinam não só as boas maneiras, mas convenções sociais, como, em nossa cultura, usar talheres em vez de comer com as mãos.

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Funções da famíliaA família, átomo da sociedade civil, é a responsável pelo gerenciamento dos “interesses privados”, cujo bom andamento é fundamental para o vigor dos Estados e o progresso da humanidade. Cabe-lhe um sem-número de funções. Elemento essencial da produção, ela assegura o funcionamento econômico e a transmissão dos patrimônios. Como célula reprodutora, ela produz as crianças e proporciona-lhes uma primeira forma de socia-lização. Garantia da espécie, ela zela pela sua pureza e saúde. Cadinho da consciência nacional, ela transmite os valores simbólicos e a memória fundadora. É a criadora da cidadania e da civilidade.

PERROT, Michelle. Funções da família. In: ______ (Org.). História da vida privada. Tradução de Denise Bottmann e Bernardo Joffily. São Paulo: Companhia das Letras, 2009. p. 91.

1. Com base nas informações do texto, enumere as funções da família esperadas pelo Estado.

2. Qual o interesse do Estado no processo educacional, inclusive daquele que se efetiva no âmbito familiar?

Corpos submissosO corpo humano entra numa maquinaria de poder que o esquadrinha, o desarticula e o recompõe. Uma “ana-tomia política”, que é também uma “mecânica de poder”, está nascendo; ela define como se pode ter domínio sobre o corpo dos outros, não simplesmente para que façam o que se quer, mas para que operem como se quer, com as técnicas, segundo a rapidez e a eficácia que se determina. A disciplina fabrica corpos submissos e exercitados, “corpos dóceis”.

FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: a história da violência na prisão. Petrópolis: Vozes, 1987. p. 127.

Com base no texto, elabore um exemplo para demonstrar os modos pelos quais a sociedade “disciplina” os corpos.

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Nesse sentido, a educação é essencial para o que Durkheim chama de socialização metódica: isto é, a ação da geração adulta sobre as crianças e os jovens e que tem por objetivo criar sentimen-tos, ideias e hábitos necessários para a continuidade de uma determinada forma de sociedade.

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Dois tipos de socialização[...] A socialização pode ser definida como a ampla e consistente introdução de um indivíduo no mundo objetivo de

uma sociedade ou de um setor dela. A socialização primária é a primeira socialização que o indivíduo experimenta

na infância e em virtude da qual se torna membro da sociedade. A socialização secundária é qualquer processo

subsequente que introduz o indivíduo já socializado em novos setores do mundo objetivo de sua sociedade.

BERGER, Peter; LUCKMANN, Thomas. A construção social da realidade. Petrópolis: Vozes, 1985. p. 175.

No entanto, é preciso lembrar que o entendimento do que seja uma família varia conforme a época e os grupos sociais. Em cada sociedade e em cada período histórico, há tipos diferentes de organização das relações de parentesco. A família pode estar organizada em torno de um pequeno núcleo formado por pai, mãe, filho e filha ou pode ser uma organização extensa, envolvendo parentes de primeiro grau (tios, tias), agregados, empregados domésticos, padrinhos, madrinhas, etc.

A família colonial brasileira

A estrutura social estabelecida durante o século XVI no Brasil tornou-se, com variações, o padrão para o resto do período colonial. No topo da hierarquia estavam os homens brancos de ascendência portuguesa, tipicamente importantes proprietários de terras. Suas esposas ou filhas brancas estavam estritamente subordinadas a seus maridos ou pais, os patriarcas. Tais famílias foram descritas pelo historiador Capistrano de Abreu como tendo um “pai taciturno, uma esposa obediente e filhos amedrontados”. Desse modo, o Brasil Colonial herdou a posição inferior que a sociedade portuguesa relegara às mulheres excluindo-as de qualquer papel público, estatal ou eclesiástico. Um decreto em particular dava poder ao marido para, no caso de descoberta (ou suspeita) de adultério, matar sua esposa e o adúltero. O que é fascinante é a cláusula desse decreto: “Achando o homem casado sua mulher em adultério, licitamente poderá matar assim a ela como ao adúltero, salvo se o marido for peão e o adúltero Fidalgo, ou nosso Desembargador, ou pessoa de maior qualidade” (Wheling & Wheling, p. 266).

SKIDMORE, Thomas E. Uma história do Brasil. 4. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2003. p. 40.

Lido o texto, responda:

a) Qual era a hierarquia da família formada no Brasil do século XVI?

b) Quem detinha a autoridade absoluta dentro da família?

c) Transcreva um trecho que demonstre a condição de inferioridade da mulher dentro daquela estrutura social.

d) Existe um poder considerado superior ao do chefe da família? Em que parte do texto isso fica evidente?

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Entretanto, não é preciso viajar para algum arquipélago distante para observar diferenças signifi-cativas no sistema de parentesco. Considerando a sociedade e o tempo, também é possível constatar variações na organização familiar entre as diferentes classes sociais e entre os grupos étnicos e religiosos.

Nesse sentido, o papel da família no processo de socialização, ainda que sempre importante, é variável. Depende de condições históricas, culturais, econômicas, políticas e sociais de cada grupo avaliado.

A lei do casamentoEm uma família trobriandesa, a mulher deve permanecer sempre sob a guarda

especial de um homem – um de seus irmãos, ou, se ela não os tiver, do seu parente materno mais próximo. Ela deve obedecer-lhe e cumprir um certo número de deveres, ao passo que ele deve cuidar de seu bem-estar e mantê-la economicamente, mesmo após seu casamento.

O irmão torna-se o guardião natural dos filhos dela, que, portanto, devem considerá-lo – e não ao pai – como chefe legal da família. Em troca, deve cuidar deles e abastecer- -lhes a casa com uma considerável proporção do alimento necessário.

MALINOWSKI, Bronislaw. A lei do casamento. In: ______. Malinowski. São Paulo: Ática, 1986. p. 58-59. (Grandes cientistas sociais).

Considere as informações do texto e estabeleça relações entre a cultura trobriandesa e a cultura brasileira quanto ao casamento.

Um tipo de família não é mais “certo” do que o outro, embora possam ser considerados bons ou maus para os indivíduos que fazem parte de uma dada estrutura familiar. O lugar da mulher, por exemplo, pode ser subordinado e acessório ao marido ou domi-nante e decisivo na hierarquia familiar. Enfim, padrões familiares são específicos a uma dada civilização.

Para ter uma ideia dessas variações, considere as descrições de Bronislaw Malinowski (1884-1942), um antropólogo europeu do início do século XX que, entre os anos de 1914 e 1918, viveu e descreveu a vida social dos habitantes de um conjunto de ilhas da Nova Guiné, as Ilhas Trobriand.

Ele mostrou que, entre os trobriandeses, a mulher, ainda que casada, era mantida sob os cuidados do irmão mais velho. O mesmo acontecia com seus filhos que eram protegidos e sustentados pelo tio materno (e não pelo pai biológico).

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Canoa pertencente à Taunisala, Vila Kadawaga, Ilhas Trobriand

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Responda, oralmente:

Na região em que você reside, são usados figuras/personagens com a finalidade de educar as crianças pela premiação ou punição?

Nas sociedades contemporâneas, o processo de socialização da criança é compartilhado, isto é, dividido entre escola e família. A vida escolar inicia-se cada vez mais cedo e dura cada vez mais tempo. Uma alteração promovida no Ensino Fundamental, em 2006, regulamentou a entrada das crianças na escola já aos seis anos de idade. A partir de então, esse estágio passou a durar nove anos e não mais oito. Qual a consequência disso para esta discussão?

A experiência escolar contemporânea permite que crianças estabeleçam relações sociais intensas fora do círculo familiar. Por vezes, elas passam o dia inteiro na creche ou na escola e travam mais contato com os professores e colegas do que com pais e irmãos. A escola vai, então, assumindo uma responsabilidade maior em relação à educação – no sentido amplo que está sendo dado a esse termo – e se constituindo, progressivamente, em uma das instituições sociais mais fundamentais da vida contemporânea.

O ingresso na adolescência demarca o momento em que crianças e jovens começam a esta-belecer relações de amizade e afinidade mais decisivas e mais duradouras. No grupo de amigos, os jovens desenvolvem sentimentos de pertencimento a uma comunidade. Portanto, compartilham maneiras de ver, sentir e exprimir o mundo, que se manifestam nos gostos musicais, nas roupas e nos adornos, nas leituras, nos heróis e ídolos, etc.

Controle social

Na etapa da socialização primária, a transmissão de valores às crianças ocorre por meio de uma série de mecanismos, que vão das punições às premiações.

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Educação e socialização secundária5

Na sociedade contemporânea, o período correspondente à juventude é o mo-mento de ampliação dos vínculos sociais para além da família e do círculo íntimo de convivência e é também o momento de aquisição de papéis sociais diferentes (ver Conceitos sociológicos). Ou seja, não se é mais apenas filho, irmão, aluno, mas incorporam-se e assumem-se outras identidades. Isso implica que novas obrigações e expectativas sejam formuladas acerca da vida profissional, social e amorosa. Diferentes instituições sociais (ver Conceitos sociológicos), além da família e da escola, passam a ter lugar, e um lugar cada vez mais importante na formação dos indivíduos: grupos de amigos, meios de comunicação de massa, associações esportivas, clubes, comunidades religiosas, etc.

Portanto, é necessário um novo tipo de aprendizado sobre o mundo social. Essa etapa que sucede o aprendizado das noções básicas da vida social é chamada de sociali-zação secundária.

Socialização secundária

A socialização secundária compreende a internalização dos códigos, das regras e normas das dife-rentes instituições que compõem a sociedade. É um processo fundamental que habilita o indivíduo para o desempenho dos diferentes papéis sociais que a sociedade reclamará no decorrer de toda a sua vida.

O sucesso da socialização secundária depende de uma socialização primária com êxito. É a socia-lização primária que oferece fundamentos para que o sujeito reconheça as bases do mundo social e desenvolva a sua capacidade de interpretação dos códigos sociais e de adaptação a eles. Daí que o papel dos pais e professores da infância pode ser considerado crucial para a transmissão de alguns dos valores sociais fundamentais com os quais o jovem e o adulto operarão no decorrer de sua vida, durante o processo de socialização secundária.

Na sociedade ocidental, a socialização secundária é constante. Ocorre continuamente durante toda a vida, porque há muitas mudanças no mundo social, fruto de contínuas redefinições nas instituições e nos papéis sociais. Nas sociedades em que transformações e inovações são intermináveis, os processos de socialização secundária são mais intensos. Veja um exemplo: a emergência de redes sociais, virtuais (Orkut, Facebook) introduziu um padrão de relacionamento que exigiu não apenas o aprendizado de novas ferramentas técnicas, mas também de novos códigos e novas normas que orientam as interações sociais nesses espaços: a reciprocidade na postagem de testemunhos; o domínio de novos símbolos linguísticos, termos e maneiras de redigir próprias desse meio; e a identificação dos assuntos que são permitidos ou não nos diferentes grupos que o compõem.

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Dessa forma, os relacionamentos pela internet demandam uma etiqueta que, ainda que não seja radicalmente distinta das relações face a face, têm muitas especificidades que devem ser reconhecidas, aprendidas e praticadas.

Papéis sociais nas sociedades tradicionais e diferenciadasEm certas sociedades há muitos papéis sociais; em outras, ao contrário, há poucos. Em uma sociedade tra-

dicional, um vilarejo camponês, por exemplo, os papéis essenciais são os de pai de família, mãe de famí-

lia, filho, menino e menina. Os papéis profissionais não são de todo distintos dos papéis familiares, já que

o pai é também empresário agrícola, a mãe trabalha

com exploração agrícola e o filho aprende seu ofício

com o pai. Em consequên cia, o pai é ao mesmo tem-

po pai, empresário e instrutor, e o filho é simulta-

neamente filho, trabalhador e aprendiz. E esses dois

jogos de três papéis que no plano intelectual podem

ser distintos não são de fato, já que sempre coinci-

dem. Além disso, é claro, há outros papéis. O pai de

família pode cantar no coral da igreja, ser membro do

conselho municipal ou caçador emérito. No essencial,

porém, esses papéis são pouco numerosos.

Em contrapartida, em uma sociedade altamente di-

ferenciada e industrializada, os indivíduos exercem

um número muito grande de papéis sociais que são

bastante distintos.

MENDRAS, Henri. O que é Sociologia. Barueri: Manole, 2004. p. 105-106.

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As principais regras de convívio social são passadas pela família e pela escola. Dentro das redes de relacionamento virtual, essas influências não são imediatamente visíveis.

Há regras de convívio no mundo virtual? Quem estabeleceu essas regras? Quais são as sanções ou punições para quem desrespeita tais regras?

Não se pode, porém, esquecer que o surgimento incessante de novos recursos tecnológicos criará sempre novas possibilidades de interação virtual; portanto exigirá também o domínio de novas formas de expressão que demandarão em novos processos de socialização secundária.

Deve-se ainda observar que, quanto mais complexa for a sociedade, mais complexo será o processo de socialização. Em nossa sociedade, há uma trama complicada de instituições e papéis sociais. Em cada situação, são exigidos comportamentos distintos. Isso torna a capacidade de aprendizagem e adaptação um requisito indispensável para a sobrevivência social.

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SOCIOLOGIA

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Com frequência, na organização social, no momento em que o jovem começa a interagir com novas instituições e assumir novos papéis sociais, ele desenvolve percepções de mundo mais amplas, e que podem entrar em confronto com a visão tradicional daquelas instituições a que esteve ligado durante a infância, especialmente a família e a escola.

O processo de socialização secundária se manifesta de forma clara quando se inicia a carreira profissional e o jovem é impelido a agir de acordo com as expectativas da empresa ou da profissão que escolhe. Isso implica identificar novas estruturas hierárquicas, utilizar um vocabulário especializado (que é muito diferente da linguagem usada com amigos e familiares), incorporar estratégias necessárias para desempenhar as tarefas que estão sob sua responsabilidade e, até mesmo, vestir-se da maneira exigida para aquele cargo ou função.

O aprendizado é constante, incorporam-se novas técnicas, novos comportamentos. Muda-se não simplesmente porque se quer mudar, mas porque a sociedade está em constante transformação, e as diferentes instituições e os papéis sociais que a constituem exigem maneiras diferentes de atuar.

Quais os diferentes papéis sociais que você desempenha em seu dia a dia?Lembre-se de que cada papel social pressupõe formas diferentes de se comportar, de

falar, de se vestir, etc.

A ideia básica aqui é a seguinte: o que a sociedade espera do indivíduo é que ele se comporte ade-quadamente em cada situação. Isto é, cada uma das circunstâncias exige um conhecimento específico dos códigos e valores que correspondem àquele papel social; as ações devem estar em conformidade com as ações dos demais membros de uma instituição: empresa, escola e assim por diante.

Controle social na vida adulta

A socialização secundária compreende constante inter-nalização das regras que regulam as diferentes instituições, as quais compõem a experiência na vida jovem e adulta. Para isso, numerosos mecanismos de imposição e controle social são acionados. A complicada trama de controle social denota que há diferentes formas de relacionamento, as quais coexistem na sociedade: na empresa ou na loja, na rua, no tribunal ou no site de relacionamento.

As diversas instituições e esferas da vida social definem as ações consideradas “erradas”, aquilo que não deve ser feito. Tomam-se, então, medidas possíveis para evitar que se faça o que não é permitido dentro daquela esfera institucional específica. Durante um jogo de vôlei com os colegas da escola, certamente você estará seguindo as normas estabelecidas pelo grupo de colegas ou pelo professor de Educação Física para garantir o funcionamento do jogo. Se, por acaso, cometer uma infração a essas regras, será punido pelo juiz ou pelo professor que controla a partida, mas não será punido fora da quadra de vôlei.

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Ora, as regras de etiqueta mostram bem isso. Ainda que falar e mastigar ao mesmo tempo revelem falta de civilidade, as pessoas não são submetidas às leis do sistema penal vigente devido à falta de boas maneiras. Entretanto, o indivíduo que fizer isso será certamente alvo de comentários jocosos e considerado grosseiro ou inconveniente.

Há, pois, mecanismos formais e informais de controle e sanção social. Por exemplo, os órgãos governamentais especializados em vigiar a aplicação das normas de trânsito. As leis são elaboradas por especialistas e definem as infrações e suas correspondentes punições. Esse seria um mecanismo formal de controle. Um exemplo de mecanismo informal de sanção social pode ser a reprovação dos colegas de classe após um comportamento inadequado de um dos indivíduos.

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Mexerico como controle socialO uso comum nos inclina a tomar por “fofocas”, em especial, as informações mais ou menos depreciativas

sobre terceiros, transmitidas por duas ou mais pessoas umas às outras. Estruturalmente, porém, a fofoca de-

preciativa é inseparável da elogiosa, que costuma restringir-se ao próprio indivíduo ou aos grupos com que

ele se identifica.

ELIAS, Nobert. Os estabelecidos e os outsiders: Sociologia das relações de poder a partir de uma pequena comunidade. Rio de

Janeiro: Jorge Zahar, 2000. p. 121.

Qual a forma mais rápida de divulgação de algum acontecimento relacionado a um dos participantes do seu grupo social? Essa rapidez dá legitimidade à informação?

O sociólogo alemão Norbert Elias (1897-1990), ao analisar, nos anos 1950, um bairro operário de uma pequena cidade do interior da Inglaterra (com o nome fictício de Wiston Parva), constatou que até mesmo a fofoca poderia ser um poderoso mecanismo de controle social.

Sabe-se da importância dos comentários maldosos ou elogiosos na vida das pessoas. As comuni-dades virtuais estão recheadas de novidades sobre a vida alheia. Quem namora quem? Onde passam as férias? Nos dias atuais, nada escapa aos olheiros digitais.

Isso mostra, então, que as normas sociais se apoiam em um elaborado sistema de mobilização o qual é constantemente evocado por certo número de indivíduos que assume o papel de “lembrar” a todos qual é a regra do jogo social.

Certamente, a interação entre os indivíduos é fundamental para a fabricação de novas normas, uma vez que a sociedade é dinâmica e produz mudanças nas relações sociais. A aceitação ou não de uma norma está relacionada a uma série de processos sociais complexos.

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Pode-se verificar que as insistentes infrações às regras podem, por vezes, revelar uma tendência de mudança. Há poucas décadas, por exemplo, um garoto que colocasse um brinco na orelha tinha imediatamente a sua masculinidade colocada sob suspeita. Era uma norma social: o brinco era adorno feminino. Mesmo que isso ainda dependa dos grupos sociais que se frequentam, atualmente meninos podem usar brincos sem serem vítimas de constrangimentos. A disseminação do uso de brincos entre eles denota uma transformação social importante na relação do sexo masculino com o seu corpo e na visão da sociedade sobre o corpo do homem.

Aprendizado em um contexto

de mudança

O sociólogo estadunidense Howard Becker (1928-), em seu livro Outsiders (1963), mostrou que os comportamentos desviantes são recorrentes e fazem parte da própria dinâmica da sociedade.

Becker denominou os grupos sociais que se incumbem de disseminar as suas próprias regras de comportamentos aos demais membros da sociedade de empreendedores morais. São personagens e instituições fundamentais para as mudanças sociais.

Como a sociedade está em constante transformação, comportamentos considerados corretos e aprováveis são revistos o tempo todo. Ocasionalmente, há verdadeiras cruzadas pedagógicas dedicadas à condenação científica e moral de certos hábitos “antigos”.

Devido à dinâmica própria da sociedade contemporânea, são sempre crescentes as ofertas de algum tipo de serviço relacionado ao aprendizado, ao treinamento escolar. Especialmente na sociedade ocidental contemporânea, circula e se reproduz um enorme repertório de conhecimentos produzidos coletivamente.

Outsiders

Quando uma regra é imposta, a pessoa que presumivelmente a infringiu pode ser vista como um tipo especial, alguém de quem não se espera viver de acordo com as regras estipuladas pelo grupo. Essa pessoa é encarada

como um outsider. Mas a pessoa assim rotulada pode ter uma opinião diferente sobre a questão. Pode não aceitar a regra pela qual está sendo julgada e pode não encarar aqueles que a julgam competentes ou legitimamente autorizados a fazê-los. Por conseguinte, emerge um segundo significado do termo: aquele que infringe a regra pode pensar que seus juízes são outsiders.

BECKER, Howard. Outsiders. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2008. p. 15.

1. Quais são os dois sentidos expressos pelo autor para a palavra outsider?

2. Na atualidade, como é vista uma pessoa que infringe as regras sociais?

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Outsider : estranho, intruso,

forasteiro.

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Pesquisas feitas com alunos de cursos de informática para a terceira idade mostram que a tecnologia tem um impacto positivo na rotina de idosos e aposentados. Ao aprender a usar o computador e navegar na internet, grande parte dos homens e mulheres com mais de 65 anos se comunica mais com os filhos e netos, faz novos amigos e se sente estimulado intelectualmente e integrado à sociedade. [...] As expectativas dos idosos ao aprenderem a usar o computador vão além da comunicação e do acesso às informações cotidianas: elas estão relacionadas com a inserção no mundo atual, dominado pelos conteúdos digitais, e com a sensação de independência e liberdade.

IWASSO, Simone. Tecnologia ajuda a integrar idosos. O Estado de S.Paulo, São Paulo, 10 jan. 2010. Caderno A, p. 20.

De fato, pode-se constatar que muitas pessoas atualmente dedicam-se a fazer cursos, com finali-dades diversas, tais como hobbies ou alguma formação profissional. Por exemplo: cursos de idiomas, mangás, música, mecânica, culinária, entre tantos outros, sem esquecer das academias de ginástica, onde é possível aprender novos ideais de bem-estar, de cuidado e treinamento do corpo, compatíveis com as exigentes expectativas estéticas e de saúde do mundo atual.

Trata-se, portanto, de uma sociedade em que o aprendizado incessante é uma exigência, necessário tanto para as operações básicas da vida cotidiana como para a aprovação em determinados meios sociais, a manutenção do emprego ou a ascensão profissional ou, até mesmo, para a manutenção de vínculos afetivos e da qualidade de vida.

1. Leia este trecho de uma reportagem jornalística e discuta com seus colegas a seguinte questão: Na sociedade atual, o aprendizado constante é uma prerrogativa dos mais jovens?

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Diferentes meios de aprendizagem

O aprendizado se realiza também pelos mais diferentes meios. Ler revistas e jornais, assistir a filmes e documentários são recursos para instrução e atualização. Isso envolve uma enorme indústria de bens culturais, que se confunde muitas vezes com o lazer.

Responda, oralmente, à seguinte questão:Além do ambiente escolar, qual a sua maior fonte de informação

cultural?

Atualmente a internet é um dos veículos mais poderosos para o acesso a informações e cada vez mais utilizada como ferramenta útil para o ensino à distância. O Brasil é considerado um dos países recordistas em todo o mundo no tempo de navegação na internet. Durante o mês de maio de 2013, segundo mensuração do Ibope, o brasileiro navegou em média 60 horas e 3 minutos na internet. O tempo se refere tanto à navegação doméstica quanto àquela feita no trabalho.

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A internet está trazendo inúmeras possibilidades de pesquisa para professores e alunos, dentro e fora da sala de

aula. A facilidade de, digitando duas ou três palavras nos serviços de busca, encontrar múltiplas respostas para

qualquer tema é deslumbrante, impossível de ser imaginada há bem pouco tempo. Isso traz grandes vantagens e

também alguns problemas.

MORAN, José Manuel. Como utilizar a internet na educação. Ciência da Informação, Bras1ília, v. 26, n. 2, maio/ago. 1997.

Segundo o Ibope, no primeiro trimestre de 2013, havia cerca de 100 milhões de usuários com acesso à internet no país. Constatou-se um significativo crescimento de usuários a partir de 2005 quando políticas públicas, dedicadas à redução de preços e formas de financiamento de computadores pessoais para as camadas com menor poder aquisitivo, tornaram possível o acesso aos equipamentos. Segundo o Comitê Gestor da Internet no Brasil, em fevereiro de 2013, 51% dos domicílios urbanos e 15% dos domicílios rurais estão conectados à rede.

Os dados demonstrados revelam que, no Brasil, aqueles que têm acesso à rede batem recordes mundiais de tempo de navegação. Essa situação apenas revela a cisão social que se traduz na exclusão digital. Um dos desafios para democratizar o acesso às novas tecnologias da informação é, além de manter o acesso aos equipamentos, facilitar e baratear o acesso à banda larga.

Os jovens usam a internet para investigar temas ligados a sexo, drogas, software e para conhecer o mundo em geral. Embora alguns não saibam como distinguir informações falsas das verdadeiras, muitos têm a certeza de que a internet permite conferir a validade das informações transmitidas pela televisão. Vimos jovens que tentam integrar vídeo, MP3, fotos e hipertexto em trabalhos escolares. Eles tentam transmitir seus conhecimentos empregando novas linguagens. [...] Observamos também casos nos quais a internet serve para “desconhecer” o mundo, sobretudo quando os jovens aceitam facilmente os argumentos de pseudociência ou esoterismo. Também jovens que “cortam e colam” informações, recolhidas na internet, em trabalhos es-colares, como se fossem de autoria própria. À medida que os jovens entram em contato com mundos antes relativamente desconhecidos, cresce a necessidade de se formarem adultos capazes de orientar suas buscas e ajudar na interpretação dos resultados.

DWYER, Tom. Jovens e computadores: algumas observações a respeito das transformações no mundo da educação. Com Ciência – Revista Eletrônica de Jornalismo Científico. Disponível em: <http://www.comciencia.br/reportagens/internet/net18.htm>. Acesso em: 3 mar. 2009.

Considerando as informações do texto, responda:

a) As novas tecnologias têm estado a serviço da educação?

b) Por quais modificações a escola teve (ou tem) de passar para acompanhar essa evolução?

c) As novas tecnologias substituem os métodos tradicionais de ensino/aprendizagem?

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SOCIOLOGIA

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Educação, escola e sociedade6

A educação atua no processo de socialização e é parte constitutiva e crucial para a organização e manutenção de qualquer sociedade. É por meio dela que os indivíduos são adaptados à vida social. Ela consiste, essencialmente, na transmissão para as novas gerações não apenas de conhecimentos, informações, mas de valores e convenções.

A educação é um processo demorado, delicado e, por vezes, tenso. Cada sociedade ou grupo social elabora maneiras próprias de transmissão de seus valores fundamentais.

Em sociedades tradicionais (ver Conceitos sociológicos), a educação se realiza, sobretudo, por meio da transmissão oral dos conhecimentos produzidos coletivamente.

Nas sociedades complexas (ver Conceitos sociológicos), há uma trama sofisticada de instituições que se dedicam a propagar valores e condutas comuns. Conforme foi mencionado na unidade anterior, por vezes, até mesmo a indústria de bens culturais colabora com essa tarefa.

Entretanto, pode-se afirmar que, nessas sociedades, embora não seja a única esfera de educação e instrução, a escola é a instituição especializada na prática de ensino e na reprodução

dos conhecimentos. Torna-se, portanto, uma instituição crucial, cujo desempenho é decisivo para o destino das pessoas e das nações. Partindo dessa constatação, nesta unidade, será abordado detalha-damente o papel da escola na vida social atual. Serão apresentados alguns dados que demonstram quando e como ela se constituiu uma instituição central da sociedade contemporânea. Analisando esse fenômeno de maneira panorâmica, o leitor poderá fazer uma reflexão acerca dos desafios e das possibilidades do contexto brasileiro.

Conteúdos escolares

Os conteúdos que se transmitem na escola são aqueles imperativos para o desenvolvimento das habilidades e competências julgadas necessárias para a reprodução de cada grupo social.

De acordo com a época e com a situação social, certos conhecimentos escolares são considera-dos obrigatórios para a formação dos indivíduos. Por isso, de tempos em tempos, com as mudanças ocorridas na vida em comum, eles são alterados, de modo que alguns conhecimentos desaparecem e outros são introduzidos. A escola como instância fundamental de reprodução do conhecimento – bem como suas disciplinas – reflete os valores prezados pela sociedade.

Transmissão oral dos conheci-mentos das gerações mais antigas para as mais jovens é um costume em sociedades tradicionais ou simples

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Um pensador chamado “Novo punho fazedor de martelos”

Esta sátira foi publicada nos Estados Unidos em 1939. Conta a história que, em uma tribo pré- -histórica, o grande teórico e prático da Educação chamado “Novo punho fazedor de martelos” resolveu introduzir uma educação sistemática para as crianças com um currículo que atendesse às suas necessidades de sobrevivência no ambiente em que viviam.

“Novo punho”, que era artesão, havia ganhado prestígio junto à comunidade quando inventou um artefato de grande utilidade para a tribo. Mas, ele não era só um fazedor, era também um pensador, e fora justamente essa qualidade que não só permitiu que ele inventasse um artefato superior, mas também o levou a envolver- -se na prática socialmente desaprovada de pensar. E foi pensando que ele percebeu que a vida na comunidade poderia ser melhor e mais fácil.

Embasou o conceito de educação sistemática, considerando dois aspectos: primeiramente, ao observar os seus filhos brincando constatou que eles o faziam por prazer; e os adultos, quando trabalhavam, faziam-no procurando a segurança e o enriquecimento de suas vidas. Diante disso, pensou que, se conseguisse ensinar as crianças para que mais tarde fizessem coisas que lhes dessem alimento, abrigo, roupas e segurança em maior quantidade, estaria propiciando uma vida melhor à tribo, de modo que, quando adultas, poderiam sentir, no trabalho, o mesmo prazer que sentiam quando brincavam.

Alimentação, vestuário e segurança estavam ligados, respectivamente, à pesca, à caça de cavalos e à proteção contra os tigres dente de sabre. As condições ambientais da época e os aspectos genéticos da fauna local permitiam que a pesca fosse feita à mão, que a caça aos cavalos fosse feita com uma clava e que os tigres fossem afugentados com tochas de fogo. Desse modo, o currículo foi organizado com base em três disciplinas: Agarrar peixes com as mãos, Pegar cavalos com a clava e Espantar tigres dente de sabre com fogo.

A escola foi um sucesso e a tribo prosperou. Mas,... o tempo passou e as condições ambientais mudaram. Com a chegada da idade glacial, a água dos lagos tornou-se turva, e os peixes passaram por uma mutação genética, tornando-se mais ágeis. Os cavalos migraram para planícies mais secas e surgiram os antílopes, que eram muito mais rápidos, não se deixando, portanto, apanhar pela clava. Os tigres dente de sabre não resistiram ao clima frio e, vitimados por doenças, praticamente se extinguiram, mas o frio trouxe os ursos polares, que definitivamente não tinham medo do fogo.

Diante desse quadro, a tribo passou a viver momentos muito difíceis. A comunidade não tinha mais o que comer, passava muito frio e tornara-se presa fácil das garras dos ursos. [...]

Fonte: Disponível em: <http://www.caesp.com.br/novo/html/Tarefas/Concursos/Concurso%20Professores/Historia/O%20Conhecimento%20cient%EDfico%20e%20os%20conte%FAdos%20escolares.ppt#260,5,Slide 5>. Acesso em: 10 mar. 2010. Adaptação.

1. O que a escola deveria fazer diante dessa nova situação? Por quê?

2. Os idiomas latim e francês já foram considerados, nas três primeiras décadas do século passado, línguas estrangeiras fundamentais para a formação escolar dos jovens brasileiros que frequentavam o Ensino Médio. Atualmente, é a língua inglesa (e às vezes o espanhol) que aparece como disciplina obrigatória nos currículos das escolas brasileiras. Quais são os fundamentos dessa mudança curricular ou por que surgiu o interesse pelas línguas inglesa e espanhola em detrimento das outras?

Ensino Médio | Modular 49

SOCIOLOGIA

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O sociólogo André Petitat afirma que a instituição escolar começou a se constituir após a Idade Média nos centros urbanos. A partir do século XVIII, com a consolidação do capitalismo, a sociedade reclamou uma escola capaz de favorecer o desenvolvimento da ciência e da indústria. Como a divisão do trabalho social (ver Conceitos sociológicos) tornava-se mais complexa, foram exigidos conheci-mentos mais sofisticados, fruto de uma formação intelectual e não apenas técnica, transmitida pela tradição. A escola tornou-se então, pouco a pouco, a instância formadora de mão de obra qualificada para as inúmeras atividades requeridas por essa sociedade.

A escola passou, nesse sentido, a valorizar principalmente os conteúdos demandados para a pro-dução de bens e serviços (Matemática Financeira, Mecânica, Química Orgânica, etc.). Os conteúdos ligados à formação artística, religiosa ou filosófica, sem a aplicação prática imediata na nascente sociedade industrial, foram sendo cada vez menos valorizados. Dessa maneira, a hierarquia de prestígio que há entre as diferentes disciplinas não corresponde ao valor intrínseco delas, mas à utilidade de cada uma para a vida econômica contemporânea.

Até muito recentemente, a escola estava destinada a uma pequena parcela da população, pois a promulgação de leis que definiram a obrigatoriedade do ensino básico na maioria dos países europeus é, em termos históricos, mais ou menos recente.

Obrigatoriedade do ensino básico nos principais países europeus – ano

França 1882

Alemanha 1920

Itália 1933

Inglaterra 1942

Fonte: CRAHAY, Marcel. Poderá ser a escola justa e eficaz? Lisboa: Instituto Piaget, 2000. p. 9-10.

A obrigatoriedade do ensino básico exigiu a formação de sistemas escolares públicos. Um bom número de escolas foi então organizado e mantido pelo Estado. Especialmente nas décadas de 1950 e 1960, uma parcela significativa da população dos países europeus teve acesso ao Ensino Fundamental e Médio. No mesmo período, em alguns países, como Estados Unidos, Canadá, França, Alemanha e Itália, o acesso ao Ensino Médio e Superior estendeu-se às classes que, historicamente, só chegavam à educação básica.

Para que se tenha uma ideia da expansão do ensino escolar nos países centrais, basta ver que em 1840 a média de anos de estudos da população francesa era de pouco mais de cinco anos, ao passo que em 1960 os franceses já ficavam na escola por um período de 12 anos (PETITAT, 1994, p. 228).

O aumento considerável da escolaridade no período que vai do fim da Segunda Guerra (1945) até a década de 1960 esteve relacionado às mudanças do contexto socioeconômico. Os países que eram então chamados de Primeiro Mundo viveram nessa época, após a reconstrução das cidades arrasadas pela Segunda Guerra Mundial, grande expansão econômica e demográfica. O crescimento da população e das oportunidades econômicas exigiu uma ampliação jamais vista do sistema de ensino.

Deve-se também lembrar que durante o período de vigência da Guerra Fria (1945-1989), especial-mente na década de 1960, a competição tecnológica e científica entre os países assumiu contornos mais decisivos. Nesse sentido, a sociedade que resultou da destruição produzida pela Segunda Guerra Mundial era uma sociedade em que o conhecimento desempenhava um papel fundamental e estratégico para o destino econômico e político das nações.

Centralidade da escola a partir

do século XX

Os conteúdos

escolares

medievais

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Do laboratório para o cotidiano: as transformações da tecnologia

A experiência de pesquisa do tempo da guerra, em 1939-46, que demonstrou – pelo menos aos anglo-america-nos – que uma esmagadora concentração de recursos podia resolver os mais difíceis problemas tecnológicos num tempo improvavelmente curto, estimulou o pioneirismo científico, independentemente de custos para fins bélicos ou de prestígio nacional (por exemplo, a exploração do espaço cósmico). Isso, por sua vez, ace-lerou a transformação da ciência de laboratório em tecnologia, parte da qual revelou ter um amplo potencial para o uso diário. Os lasers são o exemplo dessa rapidez. Vistos pela primeira vez em laboratório em 1960, tinham em início da década de 1980 chegado ao consumidor em forma de compact disc. A bioctecnologia foi ainda mais rápida. As técnicas de DNA recombinante, ou seja, técnicas para combinar genes de uma espécie com os de outra, foram reconhecidas pela primeira vez como adequadamente praticáveis em 1973. Menos de vinte anos depois, a biotecnologia era uma coisa comum no investimento médico e agrícola.

HOBSBAWM, Eric. Era dos extremos: o breve século XX: 1914-1991. Tradução de Marcos Santarrita. São Paulo: Companhia das Letras, 1995. p. 509.

Nas décadas de 1950 e 1960, o nível de competitividade econômica dos países passou a ser avaliado com base no nível de formação técnica e intelectual de sua mão de obra. O termo capital humano foi então adotado para designar os recursos humanos que, juntamente com os recursos materiais e naturais, compunham o patrimônio de determinado país.natura

Teoria do “capital humano”[...] A teoria do capital humano se desenvolveu nos anos 60. Os economistas não podiam explicar as elevadas taxas de crescimento econômico apenas com base nos fatores tradicionais, como capital e mão de obra. [...] a educação foi considerada investimento, como uma taxa de retorno. Portanto o capital físico seria representado por máquinas, edifícios, etc., enquanto o capital humano seria representado por recursos humanos. A educa-ção, segundo tais autores, aumenta a produtividade e produz o conhecimento técnico exigido pelo acelerado crescimento econômico. Afora isso, a educação é um meio de mobilidade social, uma vez que mais altos níveis de escolaridade conduzem a níveis de renda. Os trabalhadores são detentores de capital, no sentido de que eles têm habilidades e conhecimento que são formas produtivas de investimento em si mesmos. Os países subdesenvolvidos deveriam considerar seriamente as suas deficiências de capital humano como obstáculos ao uso de tecnologia moderna e à industrialização.

GOMES, Cândido Alberto da Costa. A educação em perspectiva sociológica. São Paulo: EPU, 1989. p. 28.

Assinale a única alternativa que não pode ser concluída com base na leitura do texto.

a) Houve um grande desenvolvimento científico entre 1939-1946.

b) O desenvolvimento se deu basicamente na área bélica ou espacial.

c) Os governos passaram a investir em pesquisas científicas ao perceberem que elas produziam prestígio político para a nação.

d) O conhecimento científico permaneceu muito tempo restrito aos laboratórios, sem chegar ao dia a dia dos indivíduos.

e) A origem do compact disc está no desenvolvimento do laser.

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Segundo o texto, a educação deve ser considerada um investimento:

a) por favorecer a mobilidade social e impedir a hierarquização da sociedade;

b) pelo fato de os trabalhadores serem donos de grande capital e poderem remunerar eficientemente o Estado;

c) pela percepção de que os países subdesenvolvidos investem apenas no seu alto desenvolvimento tec-nológico e científico e não em educação;

d) por acelerar o crescimento econômico do Estado;

e) por ser uma forma de acomodação das tensões sociais.

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A expressiva explosão do número de estudantes já sugere uma possível resposta. No fim da Segunda Guerra Mundial havia menos de 100 mil estudantes na França. Em 1960, eram mais de 200 mil e, nos dez anos seguin-tes, esse número triplicou para 651 mil (FLORA, 1983, p. 582; Deux anx, 1990, p. 4). (Durante esses dez anos, o número de estudantes de humanidades multiplicou-se por quase 3,5, e o de ciências sociais, por quatro). A consequência mais imediata e direta foi uma inevitável tensão entre essa massa de estudantes, em sua maioria de primeira geração, despejada nas universidades e instituições que não estavam física, organizacionalmente e intelectualmente preparadas para tal influxo. Além disso, à medida que uma crescente proporção de população em idade escolar tinha oportunidade de estudar – na França era de 4% em 1959, 15,5% em 1970 –, ir para a

Esses foram os fundamentos a partir dos quais, nas décadas de 1950 e 1960, os governos dos países de Primeiro Mundo promoveram reformas educacionais a fim de investir em seu capital hu-mano. A educação passou a ser considerada um recurso decisivo para garantir um futuro promissor. Temas como programas de alfabetização, ampliação da escolarização de jovens e adultos, combate à evasão escolar, acesso à educação superior, entre outros, passaram a compor a agenda política dos governos nacionais.

A medida fundamental para elevar o nível de instrução da população foi a massificação da educa-ção escolar. A partir de meados do século XX, cada vez mais alunos passaram a ir à escola e por mais

tempo (DUBET; MARTUCCELLI, 1997). Por isso, desde esse período a escola passou a se constituir uma instituição fundamental da sociedade ocidental moderna. Uma instituição na qual se define o destino das nações no concerto mundial e na qual os indivíduos passam alguns dos anos mais decisivos de sua vida.

Ao mesmo tempo em que a escola emergiu como uma institui-ção crucial apareceu também um novo personagem demográfico e socialmente significativo: o estudante.

Tornaram-se tão crucial a escola e tão notáveis e ativos os jovens estudantes que houve, nas principais cidades do mundo, uma mobilização sem precedentes para a discussão acerca do papel e do funcionamento do sistema educacional. Os métodos de ensino e avaliação, que continuavam ainda a funcionar nos moldes tradicionais, não pareciam adequados para as novas funções da escola e para as demandas dos novos estudantes que eram originários de classes muito diversas. Discutiu-se então a

hierarquia escolar e universitária, os fundamentos da autoridade, o sistema de avaliação e os rituais acadêmicos. Essa discussão acerca da escola e da universidade acabou por resultar em uma grande revolução cultural. Protestos estudantis assumiram proporções inimagináveis até meados dos anos 1960. Grandes movimentos eclodiram por todo o mundo, sobretudo na França (em particular nas uni-versidades de Nanterre e Sorbonne), no famoso episódio conhecido como Maio de 1968.

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Desafios e debates da escolarização

no Brasil em perspectiva comparada

Na década de 1950, no Brasil, a massificação escolar ainda não era uma realidade. Entretanto, nesse período, especialistas das várias áreas debateram sistematicamente sobre as possibilidades de formação de um novo sistema escolar.

Naquela época, por razões já apontadas, a educação passou a ter relevância também no Brasil. Muitos intelectuais brasileiros entendiam que seria possível construir uma nova sociedade. Assim, o debate nacional enfatizava a importância da educação no contexto de urbanização e secularização da sociedade e de desenvolvimento econômico mundial sem precedentes. Não se pode esquecer que se tratava do período que ficou conhecido como “desenvolvimentista”.

A proposta de organização do sistema escolar brasileiro resultou no projeto da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB). Trata-se de um projeto dedicado à implantação do sistema gratuito de Ensino Fundamental para os primeiros oito anos de formação escolar. O projeto foi elaborado na década de 1940, mas foi aprovado no Congresso Nacional apenas em 1961.

No intervalo de tempo entre sua elaboração e sua aprovação, houve um caloroso debate que opunha dois tipos de interesses e duas visões de mundo bem diferentes entre si.

De um lado, um grupo vinculado ao educador Anísio Teixeira (diretor do Centro Nacional de Estudos Pedagógicos – INEP), que entendia que o Estado deveria ser obrigado a ofertar escolas gratuitas e laicas para os primeiros oito anos de formação escolar; de outro, um grupo, representado pelo então deputado Carlos Lacerda (ligado à UDN – União Democrá-tica Nacional, um partido conservador), que defendia os interesses das escolas católicas, propondo que o ensino fosse privado, mas subvencionado pelo Estado. De acordo com o substitutivo de Carlos Lacerda encaminhado ao Congresso Nacional, a atuação do Estado seria apenas suplementar (caso a rede privada não conseguisse suprir a demanda por vagas).

O resultado desse debate foi a aprovação de uma legislação omissa em relação à obri-gatoriedade do ensino público e gratuito para as etapas fundamentais da formação escolar.

universidade deixou de ser um privilégio especial que já constituía uma recompensa em si e as limitações que isso impunha a jovens adultos (geralmente sem dinheiro) deixavam-nos mais ressentidos. O ressentimento contra um tipo de autoridade, a universidade, ampliava-se facilmente para o ressentimento contra qualquer autoridade e, portanto, (no Ocidente) inclinava os estudantes para a esquerda. Assim, não surpreende de modo algum que a década de 1960 se tenha tornado a década da agitação estudantil par excellence.

HOBSBAWM, Eric. Era dos extremos: o breve século XX: 1914-1991. Tradução de Marcos Santarrita. São Paulo: Companhia das Letras, 1995. p. 295.

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Para o autor, as agitações estudantis de 1968 podem ser entendidas pelo(a):

a) política pública voltada para a melhoria das condições de vida nas universidades;

b) falta de preparo das instituições de ensino que, na década de 1960, eram bastante desorganizadas;

c) falta de uma política do governo francês para o ensino público e pela carência de pelo menos 651 mil vagas;

d) situação caótica da França em fins da Segunda Guerra Mundial;

e) combate à autoridade, primeiro contra a universidade, estendendo-se a qualquer tipo de autoridade.

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Apenas na nova Lei de Diretrizes e Bases, aprovada em 1971, o Estado passou a ser obrigado a ofertar ensino públi-co e gratuito aos jovens dos 7 aos 14 anos de idade. O novo texto também previu um currículo comum para o primeiro e segundo graus e uma parte diversificada de conteúdos e de conhecimentos em função das diferenças regionais.

A lei que regula o sistema educacional atualmente em vigor no Brasil foi aprovada em 1996 e sofreu alterações significativas em 2009, entre as quais a obrigatoriedade do Ensino Médio gratuito.

Uma das mudanças recentes mais importantes na década de 2000 foi a diminuição constante da taxa de analfabetismo de jovens e adultos.

Observa-se, nos últimos anos, um crescimento do acesso ao ensino e dos níveis de escolarização.

Entre os anos de 1998 e 2008, houve um crescimento do acesso ao Ensino Fundamental na ordem de 3,2%. Atualmente, 97,9% dos jovens brasileiros entre 7 e 14 anos frequentam os nove primeiros anos da escolarização. Sobre o Ensino Médio, há os seguintes dados: em 2008, 84,1% dos jovens de 15 a 17 anos frequentaram esse ciclo. Isso representa uma elevação de 8,4% em relação a 1998.

Outra transformação importante no cenário educacional nacional atual é o aumento significativo dos anos de escolarização da população, ainda que a média seja ainda muito inferior à de outros países em desenvolvimento.

Veja uma comparação entre os anos de escolaridade no Brasil e em Taiwan, ilha do leste asiático, que, ao lado de países como Coreia e Japão, ficou conhecida como um dos Novos Países Industriais (NICs) asiáticos.

Escolaridade média

Grupo de idade Brasil Taiwan1979 1992 1979 1992

15-30 4,9 6,0 9,6 11,330-50 3,8 5,6 6,9 9,650-65 2,6 3,4 5,1 5,6

Fonte: BARROS, R. P.; HENRIQUES, R.; MENDONÇA, R. Pelo fim das décadas perdidas: educação e desenvolvimento sustentado no Brasil. Rio de Janeiro: IPEA, 2002.

Taiwan é um país que, não obstante o território exíguo e a escassez de recursos naturais, tem economia bastante próspera. Ficou conhecido pelas medidas notáveis, desde os anos 1960, que visa-ram ao aumento do nível de instrução da população. Suas reformas educacionais foram consideradas fundamentais para o seu êxito econômico.

As medidas tomadas por Taiwan na esfera da educação atingiram ao mesmo tempo diferentes níveis de ensino: obriga-toriedade de nove anos de formação básica, estímulo à formação superior dos funcionários públicos, fundação de centros de tecnologia para qualificação profissional além do desenvol-vimento de pesquisas e financiamento para que taiwaneses se titulassem em pós-graduação nos centros de excelência acadêmica do exterior.

TAXA DE ANALFABETISMO DAS PESSOAS DE 15 ANOS OU MAIS DE IDADE NO BRASIL –

1940-2010

Fonte: IBGE. Censo Demográfico 1940-2010.

O que se pode deduzir pela leitura do gráfico com relação às taxas de analfabetismo?

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O sistema de educação da Coreia

Na Coreia, o sistema nacional de educação produz um altíssimo número de profissionais e cientistas de alto nível e

também envia numerosos estudantes aos Estados Unidos, quase tantos como da China ou da Índia. Segundo os dados

da Organização Mundial da Propriedade Intelectual, a Coreia chegou em 2007 ao quarto lugar mundial no registro de

novas patentes, ainda longe, com certeza, dos Estados Unidos, do Japão e da Alemanha, mas superando já ligeiramen-

te a França e a Grã-Bretanha. São talvez em sua maioria patentes de adaptações de produtos mais do que verdadeiras

inovações tecnológicas, mas ainda assim isso merece ser destacado. Daí a competitividade elevada do país com nu-

merosos produtos industriais emblemáticos, como carros – em janeiro de 2009 um modelo Hyundai foi eleito “carro

do ano” em Detroit –, televisores, barcos e telefones móveis.

SUKUP, Victor. “Tigre” em turbulências, mistérios no norte. Revista Brasileira de Política Internacional, Brasília, v. 52, n. 2, jul./dez. 2009.

Média de anos de estudo da população de 15 anos ou mais de idade, por situação do domicílio – Brasil – 1995, 2001 e 2005 a 2009

Situação do domicílio

ANO1995 2001 2005 2006 2007 2008 2009

BrasilTotal 5,5 6,4 7,0 7,2 7,3 7,4 7,5

Urbana 6,1 6,9 7,5 7,7 7,8 7,9 8,0Rural 2,9 3,4 4,2 4,3 4,5 4,6 4,8

Fonte: IBGE, PNAD, 1995, 2001, 2005, 2006, 2007, 2008 e 2009.

1. Segundo a tabela, qual a tendência no nível de escolarização da população brasileira?

2. Você considera, a partir dos dados apresentados, que o contraste entre as populações rurais e urbanas está sendo eliminado ou está se elevando?

1. Procure, a partir dos dados demonstrados sobre o Brasil, Taiwan e Coreia, estabelecer algumas hipóteses sobre a relação entre os anos de escolaridade de uma população e o desempenho econômico de um país.

2. Você acha que, do mesmo modo que Taiwan e Coreia, o Brasil pode, através de investimentos frequentes e sistemáticos na educação, ter um lugar promissor dentro do panorama econômico mundial? Quais devem ser, a seu ver, as prioridades de investimento na área de educação para que se alcance esse resultado?

No Brasil há uma tendência notável de aumento do nível de escolarização da população nos anos mais recentes. Segundo dados coletados em 2008, a população brasileira já tem, em média, cerca de sete anos de estudos. Porém, é importante destacar que há diferenças regionais significativas que deverão ser superadas.

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Escola e diferenciação social7

Nesta unidade, será abordado que a educação também pro-duz e reproduz a diferenciação dos indivíduos.

A atuação da escola é muito paradigmática desse duplo movi-mento do processo educacional que, a rigor, parece contraditório: a socialização e a diferenciação. De um lado, o sistema escolar impõe padrões comuns de comportamento; de outro, individualiza e hierarquiza os agentes sociais segundo o desempenho e estimula o desenvolvimento de habilidades individuais.

Historicamente, a escola sempre reproduziu de modo notável as diferenças inscritas na sociedade. O ambiente escolar já pro-moveu a separação entre ricos e pobres, mulheres e homens, ca-tólicos e protestantes, negros e brancos. A escola não inventou

essas diferenças, mas o tratamento pedagógico e disciplinar diferenciado, segundo a condição social, sexual, religiosa ou étnica, as reforçava, reproduzia e ampliava.

Entretanto, a massificação da instrução acabou por promo-ver maior diversidade na vivência escolar. As escolas têm hoje alunos de diferentes etnias, religiões, classes sociais e gêneros convivendo durante longas horas do dia.

Assim, a expansão do sistema escolar acena, de um lado, para a igualdade de oportunidades por meio do acesso à ins-trução. De outro, institui uma nova perspectiva em crianças, adolescentes e jovens adultos acerca da diversidade cultural e social das sociedades.

Disjuntiva: cada uma das

proposições relacionadas

por disjunção; proposição alternada.

Ciladas da diferençaSomos todos iguais ou somos todos diferentes? Queremos ser iguais ou queremos ser diferentes? Houve um tempo em que a resposta se abrigava segura de si no pri-meiro termo da disjuntiva. Já faz um quarto de século, porém, que a resposta se des-locou. A começar da segunda metade dos anos 70, passamos a nos ver envoltos numa atmosfera cultural e ideológica inteiramente nova, na qual parece generalizar- -se, em ritmo acelerado e perturbador, a consciência de que nós, os humanos, somos diferentes de fato [...], mas somos também diferentes de direito. É o chamado “direito à diferença”, o direito à diferença cultural, o direito de ser, sendo diferente. The right to be different!, como se diz em inglês, o direito à diferença.

PIERUCCI, Antonio Flavio. Ciladas da diferença. São Paulo: Editora 34, 1999. p. 7.

1. Procure definir qual é o sentido dado ao termo “diferença” nesse fragmento de texto.

2. A noção de diferença aqui apresentada se contrapõe à perspectiva de igualdade social?

Cil d d dif

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A rigor, a escola é uma instituição meritocrática na medida em que classifica o desempenho dos alunos segundo o mérito. De acordo com essa lógica, quanto maior a dedicação do aluno, maiores serão as suas possibilidades de êxito escolar.

Entretanto, estudos sociológicos constataram que por vezes o sucesso nas avaliações escolares está também ligado ao cultivo de certos hábitos que são típicos de famílias socialmente diferencia-das (como a leitura de livros e jornais, frequência a espetáculos de teatro e música, ida a museus e exposições científicas). Observa-se que alunos com acesso a esses bens e serviços culturais têm maiores chances de ter um bom desempenho escolar e uma trajetória profissional exitosa. Quando isso ocorre, as diferenças de classe acabam se traduzindo, através do sistema escolar, em diferenças no rendimento e na “capacidade intelectual”.

Os sociólogos Pierre Bourdieu (1930-2002) e Jean Claude Passeron (1930-) verificaram, a partir de análises desenvolvidas na década de 1960 nas escolas francesas, que alunos com maiores probabilidades de êxito eram originários de famílias cujos membros tinham elevado nível de escolarização e grande acesso a bens culturais. Os autores constataram que a performance escolar está, pois, relacionada não a um dom inato (a inteligência, a curiosidade, a capacidade), mas à posse de capital cultural (ver Conceitos sociológicos).

Contudo, se essa constatação fosse radicalizada (o que os autores em questão não fazem), indiví-duos pertencentes a classes mais pobres estariam sempre mais sujeitos ao fracasso escolar; ao passo que alunos de classes mais ricas teriam invariavelmente mais chances de seguir uma carreira escolar de sucesso. Nesse sentido, a escola não estaria permitindo a democratização das possibilidades de ascensão social (ver Conceitos sociológicos) por meio da instrução.

Por isso mesmo, desafios se impõem aos professores – e também aos alunos – para que a demo-cratização escolar não seja apenas formal, mas efetiva.

Reclama-se na atualidade que a escola assuma o protagonismo no processo de inclusão social das camadas sociais mais pobres, oferecendo a elas o acesso a títulos e a qualificações, bem como a bens e serviços culturais que, de outro modo, lhes seriam negados. Nesse processo, estão contidos grandes dilemas que, no caso do Brasil, são muito debatidos. A reserva de cotas sociais e raciais nas universidades públicas é um exemplo notável desses dilemas.

Dilemas da diferenciação pelo

rendimento escolar

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SOCIOLOGIA

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A escola deve oferecer condições para que os alunos de diversas origens sociais tenham acesso ao conhecimento coletivamente produzido por uma comunidade. Mas isso não depende apenas da escola. Políticas mais amplas de democratização do acesso aos bens e serviços culturais devem ser também um dos objetivos dos setores público e privado. Essa é uma das condições para que se conquiste uma sociedade democrática de fato.

Alunos especiais no ensino regularDurante séculos, o mundo tratou as crianças com deficiência como doentes que precisavam de atendimento médico,

não de Educação. Essa perspectiva começou a mudar na década de 1950. Mas foi só nos anos 1990 que as velhas

ideias assistenciais foram suplantadas pela tese da inclusão. Procurava-se garantir o acesso de todos à Educação. A

nova política nacional para a Educação Especial é taxativa: todas as crianças e jovens com necessidades especiais

devem estudar na escola regular. Desaparecem, portanto, as escolas e classes segregadas. O atendimento especiali-

zado continua existindo apenas no turno oposto. É o que define o Decreto 6.571, de setembro de 2008. O prazo para

que todos os municípios se ajustem às novas regras vai até o fim de 2010. O texto não acaba com as instituições

especializadas no ensino dos que têm deficiência. Em lugar de substituir, elas passam a auxiliar a escola regular,

firmando parcerias para oferecer atendimento especializado no contraturno. Na prática, muda radicalmente a função

do docente dessa área. Antes especialista em uma deficiência, ele agora precisa ter uma formação mais ampla.

VEROTTI, Daniela T.; CALLEGARI, Jeanne. A inclusão que ensina. Nova Escola, Edição Especial, jul. 2009. Disponível em: <http://

revistaescola.abril.com.br/inclusao/inclusao-no-brasil/inclusao-ensina-511186.shtml>. Acesso em: 7 mar. 2010.

Assinale a alternativa correta.

a) O autor declara que as políticas afirmativas promoverão a desigualdade social à medida que se contrapõem a ações universalistas e republicanas, cujos princípios são válidos para todos indistintamente.

b) A abordagem do autor permite considerar que, ao se reforçarem as diferenças raciais e negar o caráter universalista e impessoal das regras de ingresso à universidade, acaba-se, paradoxalmente, denunciando a desigualdade racial existente e reivindicando o igualitarismo.

c) Pode-se dizer que as políticas afirmativas são um testemunho de que a sociedade brasileira é uma sociedade meritocrática e que esse deve ser o ideal perseguido por qualquer sociedade desenvolvida.

d) O autor declara que a valorização das diferenças, tal como ocorre no caso das políticas afirmativas, têm como fundamento pressupostos autoritários.

Cotas: diferenciação e igualdadePodemos considerar as políticas afirmativas (as políticas concretas em relação às minorias como, por exemplo, o sistema de reserva de cotas universitárias aos negros no Brasil) no seu contraponto com as ações mais univer-salistas e republicanas, em princípio dirigidas a todos. Não obstante, não se pode esquecer que a valorização das diferenças se faz em nome de um ideal também universalista: democracia, igualdade e cidadania. Por exemplo, os negros criticam as barreiras existentes na sociedade porque elas não lhes permitem ter o mesmo tratamento que os brancos; a reivindicação repousa, portanto, na denúncia da desigualdade.

ORTIZ, Renato. Anotações sobre o universal e a diversidade. Revista Brasileira de Educação, v. 12, n. 34, p. 15, jan./abr. 2007.

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O texto trata da Política Nacional para Educação Especial que determina que alunos com deficiência têm direito a frequentar as escolas regulares de ensino. Quais são os desafios que essa medida impõe para professores e alunos?

Escolarização de homens

e mulheres no Brasil

A escola pode reproduzir não apenas diferenciação de classe, mas também diferenciação entre sexos. Por outro lado, ela pode também, em determinados contextos, auxiliar a transformar as relações entre homens e mulheres. Um dado interessante é que no Brasil a escolarização das mulheres tem se elevado em relação à dos homens. Isso pode transformar, nos próximos anos, a situação dos sexos no mercado de trabalho. Segundo dados do IBGE de 2008, as mulheres no Brasil permanecem na escola por um período médio de 7,2 anos de estudos, ao passo que os homens têm uma escolarização média de 6,6 anos.de 6,6

Considere atentamente os dois gráficos:

Gráfico 1

TAXAS DE ANALFABETISMO POR IDADE E SEXO NO BRASIL EM 2003

Gráfico 2

ANOS MÉDIOS DE ESTUDOS NO BRASIL

CARVALHO, Marília Pinto. Sucesso e fracasso escolar: uma questão de gênero. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 29, n. 1, jan./jun. 2003.

1. Considerando a leitura do primeiro gráfico, é possível afirmar que no Brasil o analfabetismo afeta de modo mais notável os mais jovens ou os mais velhos?

2. No gráfico 2, compare o tempo médio de estudo entre homens e mulheres em dois momentos.

3. Segundo os dois gráficos, qual é a situação das mulheres em termos de alfabetização?

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Discuta se essa percepção, segundo a qual meninas se adaptam melhor ao ambiente e ao cotidiano escolar do que meninos, é correta ou não. Apresente hipóteses que procurem responder a esse enigma.

Nas sociedades contemporâneas, a escola deve também favorecer o desenvolvimento da individualização (ver Conceitos sociológicos). Deve, pois, preparar os alunos para cultivarem habilidades diferentes, tais como: autonomia e autocontrole.

A individualização é um fenômeno típico de sociedades complexas, como a brasileira. A integração nesta sociedade está ligada à individualização porque sua estrutura ocupacional (empregos, posições no mercado e os diferentes tipos de re-conhecimento daí derivados) depende do desenvolvimento da diferenciação e da independência dos agentes sociais.

Não há dúvida de que as disparidades de condutas, habili-dades e experiências sempre existiram entre os indivíduos. Mas há sociedades que favorecem particularmente a diferenciação.

Na maioria das vezes, o processo de individualização é visto como algo natural, espontâneo. Porém, o ideal de realização indi-vidual e de diferenciação social nos é inculcado desde muito cedo.

Nas sociedades complexas, há mecanismos que esti-mulam esses processos de várias maneiras. Isso ocorre na

família e nas práticas esportivas, por exemplo. A família ela-bora um sistema de diferenciação poderoso entre irmãos ao destacar e estimular características, habilidades e traços de personalidade distintos. Na escola, não é diferente: lembre- -se de que teorias pedagógicas e psicológicas contemporâ-neas enfatizam a autonomia, a criatividade e a expressão individual dos alunos desde crianças. A escola, em parceria com a família, põe-se a ajudar a constituir uma estrutura de personalidade para uma sociedade que preza a liberdade individual. Depois, deve-se aprender a agir com autonomia e responsabilidade em relação às escolhas, sejam elas bem- -sucedidas ou frustradas.

Na vida contemporânea, há uma gama enorme de possi-bilidades e há liberdade para elaborar escolhas com base em aptidões, desejos e propósitos pessoais. Quando crianças, essas possibilidades estão, em sua maior parte, ligadas à posição social dos pais.

Escola, individualização e autonomia

A explicação mais vulgar para o fenômeno de ascensão das mulheres na vida escolar sugere que meninas estão mais adapta-das às exigências da escola por serem mais dedicadas, assíduas, disciplinadas e caprichosas. Meninos seriam indisciplinados e desorganizados. Logo, eles estariam mais facilmente vulneráveis ao fracasso escolar. Essa percepção fundamenta-se na ideia, baseada no senso comum, de que meninas são naturalmente submissas e obedientes, ao passo que os meninos são ousados e irresponsáveis. E que isso é positivo.

Estudos sociológicos procuram compreender e explicar esse fenômeno de maneira mais profunda. Eles consideram algumas hipóteses que podem fornecer uma explicação mais razoável e menos estereotipada.

A primeira hipótese sociológica está relacionada a uma realidade muito comum nas classes populares: a necessidade de ingressar cedo no mercado de trabalho. Dessa perspectiva, leva-se em conta que meninos abandonam mais precocemente a escola devido à necessidade de trabalhar. Essa resposta, porém, não satisfaz completamente os pesquisadores porque meninas da mesma classe social são também submetidas a jornadas

extenuantes de trabalho informal e doméstico que poderiam resultar igualmente no abandono escolar.

Outra hipótese considera que, nas classes populares, as meninas têm uma visão mais positiva da escola do que os meninos. Para elas, a escola é espaço de ampliação da socia-bilidade e de reconhecimento social, contrastando radicalmente com os vínculos apenas domésticos e com a invisibilidade das tarefas cotidianas da casa. Ao contrário, para os meninos, o turno escolar é visto como algo muito negativo, pois os obriga a interromperem atividades de lazer, como o jogo de futebol. Por esse motivo, talvez, meninos teriam uma visão mais des-favorável da vivência escolar, tornando-se mais indisciplinados.

Outra explicação que não pode ser desprezada é a de que meninas das mais diferentes classes sociais creem que seu su-cesso profissional exige uma trajetória escolar de sucesso e uma qualificação mais significativa, pois o mercado de trabalho seria muito mais exigente com as mulheres do que com os homens.

De toda forma, pode-se dizer que as mulheres das novas gerações terão melhor instrução escolar, e uma ins trução mais extensa do que suas mães e avós tiveram.

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ProfessorEsse profissional atua nos mais distintos níveis de ensino, nas Secretarias de Educação, nas editoras,

no Ministério da Educação, nos centros de pesquisa, nas academias, nas aulas virtuais e em outros inúmeros espaços. Para o exercício dessa profissão, é preciso graduar-se em Pedagogia ou em uma das licenciaturas correspondentes a uma área de conhecimento.

E

Antigo Regime: o termo original em francês, L´Ancien Regime, era o regime de governo que existia na França antes da Revolução de 1789. Entretanto, quando interpretado à luz da Sociologia da modernização, é possível referir-se ao Antigo Regime também como um amplo sistema social e político de caráter aristocrático, baseado em privilégios de nascimento e pelo domínio hereditário da terra, símbolo de distinção. Assim, a ideia de que a modernidade se opõe ao Antigo Regime significa que os indivíduos deixam de ser reconhecidos apenas por seus privilégios e passam a ser admitidos em razão de sua competência e escolaridade, independentemente de suas origens.Ascensão social: passagem dos indivíduos para um grupo com maior riqueza e prestígio social. (OUTHWAITE,

W.; BOTTOMORE, Tom. Dicionário do pensamento social do século XX. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1996.)

Belle Époque : foi um período de cultura cosmopolita e moderna que, na Europa, começou por volta de 1870 e durou até a eclosão da Primeira Guerra Mundial, em 1914. Por essa expressão também podemos entender o clima intelectual e artístico do período, marcado por profundas transformações, sobretudo no âmbito da cultura, cuja ênfase recaía na valorização de uma era de beleza, inovação, paz e progresso.Capital cultural: para Pierre Bourdieu, capital cultural refere-se à posse de bens culturais que garantem vanta-gens aos seus proprietários. O termo pode se referir desde o conhecimento de escolas artísticas (artes plásticas, música e obras literárias) até os títulos acadêmicos. (BOURDIEU, Pierre; PASSERON, Jean Claude. A reprodução. Rio de

Janeiro: Francisco Alves, 1992. p. 123.)

Darwinismo social: é uma doutrina filosófica que surgiu no âmbito do evolucionismo do século XIX e sustenta que a organização social, isto é, a sociedade, se assemelha a um organismo vivo. Assim, concebe-se a ideia de que as sociedades sofrem mutações evolutivas, podendo ou não ser progressivas. O darwinismo social difere da teoria darwinista da seleção natural, uma vez que Charles Darwin (1809-1882) rejeitava qualquer noção de progresso na transformação de indivíduos e na origem das espécies, bem como suspeitava das tentativas de se tirarem conclusões de sua obra que fossem aplicáveis às sociedades humanas.Democracia racial: segundo essa teoria, as relações raciais no Brasil seriam harmônicas. Diferentemente de outros países, como os Estados Unidos, em que há uma hostilidade explícita entre raças, o Brasil teria se livrado do racismo e da discriminação racial e, assim sendo, aqui não haveria qualquer tipo de preterimento baseado na “raça”. Divisão do trabalho social: refere-se à diferenciação entre grupos e categorias particulares de indivíduos na produção de bens e serviços de uma sociedade. (OUTHWAITE, W.; BOTTOMORE, Tom. Dicionário do pensamento social

do século XX. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1996.)

Eugenia: era considerada tanto uma ciência aplicada que buscava melhorar a herança genética da raça humana como também um movimento social que buscava popularizar os princípios e as práticas dessa ciência. Antes de sua apropriação pelos nazistas nos anos 1930, a eugenia desfrutou de amplo apoio, tanto em círculos liberais quanto conservadores, em inúmeros países, entre eles o Brasil, entre o final do século XIX e início do XX.Evolucionismo: entende-se por evolucionismo o conjunto de doutrinas filosóficas que veem na evolução a característica fundamental de todos os tipos ou normas de realidade. A característica geral dessas doutrinas filosóficas é a crença no progresso, que é entendido como o processo de complexificação, no caso, da sociedade.

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SOCIOLOGIA

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Identidade nacional: conceito que surgiu no século XIX, expressando o sentimento compartilhado de perten-cimento a um país. Contemporaneamente, atribui-se à noção de identidade nacional a ideia de uma comunidade imaginada, ou seja, a nação entendida como uma entidade capaz de expressar um conjunto de valores e ideais. A identidade nacional difere do nacionalismo, movimento político que visava subordinar outras identidades possíveis (religiões, crenças, origens étnicas, etc.) a um projeto mais amplo.Indianismo: no caso brasileiro, o indianismo esteve ligado ao movimento romântico. Ofereceu, no decorrer do processo de construção do Estado brasileiro, o fundamento ideológico para a construção de símbolos da naciona-lidade, procurando apagar a presença negra e escrava e incluir a contribuição idealizada do indígena.Individualização: trata-se da singularização da estrutura de personalidade, dos gostos, das habilidades, da aparência e da experiência de uma pessoa. (ELIAS, Norbert. Sociedades dos indivíduos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1994. p. 54.)

Instituições sociais: são instâncias que têm por função programar as condutas individuais para a vida em so-ciedade. São instituições sociais: a linguagem, a família, a escola, etc. (BERGER, Peter; BERGER, Brigitte. O que é uma

instituição social? In: FORACCHI, Marialice; MARTINS, José de Souza. Sociologia e sociedade. Rio de Janeiro: LTC, 2000. p. 193.)

Modernidade: pode-se entender a modernidade como uma visão de mundo ou ideário moderno, relacionado às gran-des rupturas sociais, culturais e políticas expressas por processos, como Reforma Protestante, Iluminismo, Revolução Francesa, Revolução Industrial e expansão do sistema capitalista. Em suma, processos que culminaram com a ruptura do padrão de vida de sociedades tradicionais, de base camponesa, bem como relacionadas com o Antigo Regime.Naturalista (linguagem) ou Naturalismo: para o Naturalismo, a obra literária deveria ser essencialmente uma transposição direta da realidade, como se o escritor pudesse ficar diante dela na situação de um sujeito em face de um objeto, registrando as noções e impressões desse mundo real. A grande inspiração de Azevedo foi o escritor francês Émile Zola (1840-1902), cuja obra A taberna (L’Assommoir), de 1876, é também o registro da vida precária dos trabalhadores em seu cotidiano. Em ambos os textos, o elemento central da narrativa é a degradação motivada pela miséria: na França agravada pelo álcool; no Brasil, pelo sexo e pela violência.Papéis sociais: são prescrições acerca das funções e da conduta dos indivíduos nas instituições sociais. (CASTELLS, Manuel. O poder da identidade. São Paulo: Paz e Terra, 1999. p. 22-23.)

Patriarcalismo: o termo é derivado de patriarcado e se refere a um território ou uma jurisdição governados pelo patriarca, ou pelo pai (pater). Genericamente, podemos entender o patriarcalismo como um modo de estruturação e organização da vida coletiva, baseado no poder de um pai, isto é, uma relação de poder em que prevalecem as relações masculinas sobre as femininas; e o poder dos homens mais fortes sobre os outros homens.Positivismo: é o conjunto de ideias filosóficas que tem no francês Auguste Comte (1798-1857) o seu fundador. No Brasil, ganhou terreno nas últimas décadas do século XIX, nas academias militares, médicas, de Engenharia e de Direito. O positivismo tem como pressuposto básico a crença na ciência e na razão e formula uma ideia de história regida por leis imutáveis, científicas, passíveis de apreensão por parte do homem.Romantismo: foi um movimento intelectual, artístico e político que se originou em meio às grandes transformações europeias entre o final do século XVIII e início do século XIX. Embora presente em todo o continente europeu, foi na Alemanha que o movimento romântico se tornou mais forte, como resistência às tendências racionalistas e iluministas da Revolução Francesa. No Brasil, o movimento romântico do século XIX assumiu feições específicas, no sentido de propor a criação de uma cultura própria frente às tradições da antiga Metrópole. Do ponto de vista estético, o Romantismo brasileiro buscou originalidade ao privilegiar a temática indígena, embora o amor, a beleza e a natureza também fossem temas muito caros aos artistas da época.Sociedades complexas: termo utilizado para referir-se às sociedades nas quais o nível de divisão do trabalho é elevado. (DURKHEIM, Émile. Da divisão do trabalho social. São Paulo: Martins Fontes, 2004.)

Sociedades tradicionais ou simples: termo utilizado para referir-se às sociedades nas quais o nível de divisão do trabalho é baixo. (DURKHEIM, Émile. Da divisão do trabalho social. São Paulo: Martins Fontes, 2004.)

Sociologia weberiana: trata-se das teorias do sociólogo alemão Max Weber (1864-1920). Os principais temas dessa Sociologia dizem respeito às origens do capitalismo moderno, aos problemas de interpretação histórica, à relação entre economia e sociedade, à questão das classes sociais e dos grupos de status, o tema da dominação e da legitimidade. Do ponto de vista metodológico, Weber formulou a teoria da Sociologia compreensiva, no sentido de entender a sociedade, baseando-se na compreensão do sentido da ação individual, e propôs uma abordagem considerando os tipos ideais.

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c) o texto e a charge consideram a agricultura brasileira avançada, do ponto de vista tec-nológico;

d) a charge mostra o cotidiano do trabalhador, e o texto defende o fim da mecanização da produção da cana-de-açúcar no setor sucro-alcooleiro;

e) o texto mostra disparidades na agricultura brasileira, na qual convivem alta tecnologia e condições precárias de trabalho, que a charge ironiza.

2. (UEL – PR) Assinale a alternativa que contém a figura que representa o ideal de branqueamento no Brasil no final do século XIX:

a)

Augustus Earle. Negros Lutando. Ca. 1824, aquarela sobre papel: 16,5 cm x 25 cm.

b)

José Maria de Medeiros. Iracema, 1884, óleo sobre tela: 168 cm x 255 cm.

c)

Modesto Brocos. A Redenção de Can. 1895, óleo sobre tela: 199 cm x 166 cm.

1. (ENEM)

Álcool, crescimento e pobreza

O lavrador de Ribeirão Preto recebe em média R$ 2,50 por tonelada de cana cortada. Nos anos 80, esse trabalhador cortava cinco toneladas de cana por dia. A mecanização da colheita o obri-gou a ser mais produtivo. O corta-cana derru-ba agora oito toneladas por dia. O trabalhador deve cortar a cana rente ao chão, encurvado. Usa roupas mal-ajambradas, quentes, que lhe cobrem o corpo, para que não seja lanhado pelas folhas da planta. O excesso de trabalho causa a birola: tontura, desmaio, cãibra, con-vulsão. A fim de aguentar dores e cansaço, esse trabalhador toma drogas e soluções de glicose, quando não farinha mesmo. Tem aumentado o número de mortes por exaustão nos canaviais. O setor da cana produz hoje uns 3,5% do PIB. Exporta US$ 8 bilhões. Gera toda a energia elé-trica que consome e ainda vende excedentes. A indústria de São Paulo contrata cientistas e en-genheiros para desenvolver máquinas e equipa-mentos mais eficientes para as usinas de álcool. As pesquisas, privada e pública, na área agríco-la (cana, laranja, eucalipto etc.) desenvolvem a bioquímica e a genética no país.

Folha de S.Paulo, 11 mar. 2007. Adaptação.

Confrontando-se as informações do texto com as da charge acima, conclui-se que:

a) a charge contradiz o texto ao mostrar que o Bra-sil possui tecnologia avançada no setor agrícola;

b) a charge e o texto abordam, a respeito da cana-de-açúcar brasileira, duas realidades dis-tintas e sem relação entre si;

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(16) Os estudiosos do subdesenvolvimento pre-conizavam que, além da industrialização, o Estado deveria promover reformas sociais para alcançar o desenvolvimento.

4. (UEL – PR)

A falta de coesão em nossa vida social não re-presenta, assim, um fenômeno moderno. E é por isso que erram profundamente aqueles que imaginam na volta à tradição, a certa tradição, a única defesa possível contra nossa desordem. Os mandamentos e as ordenações que elabo-raram esses eruditos são, em verdade, criações engenhosas de espírito, destacadas do mundo e contrárias a ele. Nossa anarquia, nossa incapa-cidade de organização sólida não representam, a seu ver, mais do que uma ausência da única ordem que lhes parece necessária e eficaz. Se a considerarmos bem, a hierarquia que exaltam é que precisa de tal anarquia para se justificar e ganhar prestígio.

HOLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. São Pau-lo: Companhia das Letras, 1995. p. 33.

Caio Prado Júnior, Gilberto Freyre e Sérgio Buar que de Holanda são intelectuais da chama-da Geração de 30, primeiro momento da Socio-logia no Brasil como atividade autônoma, volta-da para o conhecimento sistemático e metódico da sociedade. Sobre as preocupações caracte-rísticas dessa geração, considere as afirmativas a seguir:

I. Critica o processo de modernização e de-fende a preservação das raízes rurais como o caminho mais desejável para a ordem e o progresso da sociedade brasileira.

II. Promove a desmistificação da retórica liberal vigente e a denúncia da visão hierárquica e autoritária das elites brasileiras.

III. Exalta a produção intelectual erudita e esco-lástica dos bacharéis como instrumento de transformação social.

IV. Faz a defesa do cientificismo como instru-mento de compreensão e explicação da so-ciedade brasileira.

Estão corretas apenas as afirmativas:

a) I e III; d) I, II e III;

b) I e IV; e) II, III e IV.

c) II e IV;

d)

Jean-Baptiste Debret. O Jantar. 1835, litografia.

e)

Senhora na liteira com dois escravos. Fotógrafo não identificado/Acervo do Instituto Moreira Salles.

3. (UEM – PR) Nas décadas de 1950 e 1960, os estu-dos da Cepal (Comissão Econômica para a Améri-ca Latina) motivaram um intenso debate sobre a condição subdesenvolvida de países, como o Bra-sil. Sobre esse assunto, assinale o que for correto:

(01) Pesquisadores, como Celso Furtado, afirma-ram que as economias capitalistas não se-guem uma trajetória evolucionista. Assim, o subdesenvolvimento não seria uma etapa anterior ao desenvolvimento, mas resultado de processos históricos autônomos.

(02) No período indicado acima, os estudiosos do subdesenvolvimento defendiam que o Estado deveria intervir na economia como caminho para o desenvolvimento. Esse diag-nóstico influenciou as políticas econômicas implantadas em vários países da América Latina.

(04) A Cepal foi instituída pela ONU (Organiza-ção das Nações Unidas) no final da década de 1940, com o objetivo de formular planos de desenvolvimento para a América Latina.

(08) No período histórico em questão, o Brasil alcançou um grau significativo de industria-lização, a exemplo do setor automobilístico. A geração de emprego nesse e em outros setores da economia nacional foi suficiente para romper as barreiras do subdesenvolvi-mento.

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5. (UEL – PR) Antonio Candido, crítico literário com formação em Sociologia, assim escreve sobre as formas de solidariedade na vida social rural do interior do estado de São Paulo (1948-1954): “Na sociedade caipira a sua manifestação mais importante é o mutirão, cuja origem tem sido objeto de discus-sões. Qualquer que ela seja, todavia, é prática tra-dicional. [...] Consiste essencialmente na reunião de vizinhos, convocados por um deles, a fim de ajudá-lo a efetuar determinado trabalho: derru-bada, roçada, plantio, limpa, colheita, malhação, construção de casa, fiação, etc. Geralmente os vizi-nhos são convocados e o beneficiário lhes oferece alimento e uma festa, que encerra o trabalho. [...] Um velho caipira me contou que no mutirão não há obrigação para com as pessoas, e sim para com Deus, por amor de quem serve o próximo; por isso a ninguém é dado recusar auxílio pedido”.

CANDIDO, Antonio. Os parceiros do Rio Bonito. 9. ed. São Paulo: Livraria Duas Cidades; Editora 34, 2001. p. 87-89.

Com base no texto e nos estudos de Émile Durkheim sobre solidariedade, assinale a alter-nativa que define a forma de solidariedade que prevalece no caso citado:

a) A produção rural desenvolveu o mutirão como forma de solidariedade racional baseada no cálculo econômico do lucro.

b) A solidariedade tradicional que aparece na sociedade caipira, estimulada pelo mutirão, fundamenta-se no modelo de organização do trabalho industrial.

c) A produção rural recorre ao mutirão como uma forma de solidariedade orgânica, sustentada na especialização das tarefas e na remunera-ção equivalente à qualificação profissional.

d) O mutirão pode ser caracterizado como uma forma de solidariedade mecânica, pois se ba-seia na identidade por vizinhança e nos valo-res religiosos do grupo social.

e) O mutirão garante o assalariamento da vizi-nhança, fortalecendo a solidariedade rural.

6. (UEM – PR) Podemos conceituar mudança social como toda inovação ocorrida na sociedade de forma geral ou em um grupo específico. Sobre esse tema, assinale o que for correto:

(01) O filósofo Auguste Comte era favorável à Revolução Francesa, visto que apoiava as mudanças que ela continha. Afirmava, en-tretanto, que as transformações da socieda-

de deveriam ser condicionadas pela manu-tenção da ordem social.

(02) No processo histórico de desenvolvimento das sociedades humanas, as mudanças são inevitáveis. É consenso na Sociologia que elas ocorrem em todas as instituições sociais de modo natural, em circunstâncias seme-lhantes à evolução pela qual passam os ani-mais e os vegetais.

(04) Com a ampliação das suas bases industriais na década de 1950, o Brasil passou por uma grande transformação: sua população, que era rural, tornou-se majoritariamente urbana. Essa mudança foi provocada pelas condições favoráveis oferecidas nas cidades, isto é, ofer-ta de emprego, de moradia, serviços de saú-de e educação suficientes para todos aqueles que imigraram para o espaço urbano.

(08) Vê-se, em nossa sociedade urbana industrial, que as famílias passaram por mudanças. O outrora preponderante tipo familiar patriar-cal sofreu modificações. Hoje, há outras for-mas de organização familiar, como a famí-lia conjugal (com a diluição do poder entre mulheres e homens), a família chefiada por mulheres e a conjugalidade homossexual.

(16) Com base nas consequências produzidas pela Lei Áurea de 1888, no Brasil, podemos concluir que, dependendo do contexto, mu-danças legislativas não são suficientes para alterar prontamente padrões cristalizados de relações sociais.

7. (UEL – PR) Entre 1960 e 1980 o êxodo rural bra-sileiro alcançou um total de 27 milhões de pes-soas. Poucos países conheceram movimentos migratórios tão intensos, quer se considere a proporção ou a quantidade absoluta da popula-ção rural atingida. A importância do êxodo rural é confirmada quando se examinam os dados dos últimos 50 anos: desde 1950, a cada 10 anos, um em cada três brasileiros vivendo no meio ru-ral migrou para as cidades e, na década de 1990, esta tendência se manteve.

Assinale a alternativa que apresenta causas estrutu-rais do êxodo rural, no Brasil, durante esse período:

a) Declínio da produção agrícola nacional, que perde espaço à medida que a industrialização avança nas cidades.

b) Mecanização da agricultura e industrialização do campo, fatores que suprimem mão de obra e transformam as várias formas de propriedade.

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c) Esgotamento do solo em razão da permanên-cia de formas arcaicas de produção, protegi-das pelo Estatuto da Terra.

d) Inexistência de aposentadoria rural para os pequenos produtores, forçando-os, assim, à transferência para os centros urbanos em bus-ca de direitos sociais.

e) Garantia que os agricultores têm de que nas cidades serão assegurados a si e a seus fi-lhos, melhores empregos, principalmente, nos grandes centros urbanos.

8. (UEL – PR) De acordo com Octavio Ianni:

Para melhor compreender o processo de estratifi-cação social, enquanto processo estrutural, con-vém partirmos do princípio. Isto é, precisamos compreender que a maneira pela qual se estra-tifica uma sociedade depende da maneira pela qual os homens se reproduzem socialmente.

IANNI, Octavio. Estrutura e História. In: ______. (Org.). Teorias da estratificação social: leitura de Sociologia. São Paulo: Cia. Editora Nacional, 1978. p. 11.

Com base no texto e nos conhecimentos sobre es-tratificação social, considere as afirmativas a seguir:

I. Os estamentos são formas de estratificação baseadas em categorias socioculturais, como tradição, linhagem, vassalagem, honra e ca-valheirismo.

II. As classes sociais são formas de estratifica-ção baseadas em renda, religião, raça e here-ditariedade.

III. As mudanças sociais estruturais ocorrem quan-do há mudanças significativas na organização da produção e na divisão social do trabalho.

IV. As castas são formas de estratificação social baseadas na propriedade dos meios de pro-dução e da força de trabalho.

A alternativa que contém todas as afirmativas corretas é:

a) I e II. d) I, II e IV.

b) I e III. e) II, III e IV.

c) II e III.

9. (UEL – PR) Em relação ao processo de formação social no Brasil, o sociólogo Florestan Fernandes escreveu:

Lembremo-nos de que da vinda da Família Real, em 1808, da abertura dos portos e da Indepen-

dência, à Abolição em 1888, à Proclamação da República e à “revolução liberal”, em 1930, de-correm 122 anos, um processo de longa dura-ção, que atesta claramente como as coisas se passaram. Esse quadro sugere, desde logo, a resposta à pergunta: a quem beneficia a mu-dança social?

FERNANDES, Florestan. As mudanças sociais no Brasil. In: IANNI, Octavio (Org.). Florestan Fernandes. São Paulo: Ática, 1986. p. 155-156. (Grandes cientistas sociais).

De acordo com o texto e os conhecimentos sobre o tema, em relação à indagação feita pelo autor, é correto afirmar que a mudança social beneficiou:

a) fundamentalmente, os trabalhadores, uma vez que as liberdades políticas e as novas formas de trabalho aumentaram a renda;

b) os grupos sociais que dispunham de capacida-de econômica e poder político para absorver os efeitos construtivos das alterações ocorri-das na estrutura social;

c) a elite monárquica, pois ao monopolizar o po-der político impediu que outros grupos sociais pudessem surgir e ter acesso aos efeitos cons-trutivos das alterações na estrutura social;

d) os grupos sociais marginalizados ou excluídos, pois, em decorrência deste processo, passaram a fazer parte do processo produtivo;

e) a população negra, uma vez que a alteração na estrutura da sociedade criou novas oportu-nidades de inserção social.

10. (UEL – PR)

Socialização significa o processo pelo qual um in-divíduo se torna um membro ativo da sociedade em que nasceu, isto é, comporta-se de acordo com seus folkways e mores [...]. Há pouca dúvida de que a sociedade, por suas exigências sobre os indivíduos determina, em grande parte, o tipo de personalidade que predominará. Naturalmente, numa sociedade complexa como a nossa, com extrema heterogeneidade de padrões, haverá consideráveis variações. Seria, portanto, exage-rado dizer que a cultura produz uma persona-lidade totalmente estereotipada. A sociedade proporciona, antes, os limites dentro dos quais a personalidade se desenvolverá.

KOENIG, S. Elementos de Sociologia. Tradução de Vera Borda. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1967. p. 70-75.

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Com base no texto e nos conhecimentos sobre o tema, é correto afirmar:

a) Existe uma interação entre a cultura e a perso-nalidade, o que faz com que as individualida-des sejam influenciadas de diferentes modos e graus pelo ambiente social.

b) Apesar de os indivíduos se diferenciarem des-de o nascimento por dotes físicos e mentais, desenvolvem personalidades praticamente idênticas por conta da influência da sociedade em que vivem.

c) A sociedade impõe, por suas exigências, apro-vações e desaprovações, o tipo de personali-dade que o indivíduo terá.

d) O indivíduo já nasce com uma personalidade que dificilmente mudará por influência da so-ciedade ou do meio ambiente.

e) São as tendências hereditárias e não a socie-dade que determinam a personalidade do in-divíduo.

11. (ENEM) A falta de espaço para brincar é um pro-blema muito comum nos grandes centros ur-banos. Diversas brincadeiras de rua, tal como o pular corda, o pique-pega e outras têm desapa-recido do cotidiano das crianças, pois desenvol-vem tanto habilidades perceptivo-motoras quan-to habilidades sociais.

Considerando a brincadeira e o jogo como um importante instrumento de interação social, pois por meio deles a criança aprende sobre si, sobre o outro e sobre o mundo ao seu redor, entende--se que:

a) o jogo possibilita a participação de crianças de diferentes idades e níveis de habilidade motora.

b) o jogo desenvolve habilidades competitivas centradas na busca da excelência na execução de atividades do cotidiano.

c) o jogo gera um espaço para vivenciar situa-ções de exclusão que serão negativas para a aprendizagem social.

d) através do jogo é possível entender que as re-gras são constituídas socialmente e que não podemos modificá-las.

e) no jogo, a participação está sempre vinculada à necessidade de aprender um conteúdo novo e de desenvolver habilidades motoras especia-lizadas.

12. (UEM – PR)

Sobre o tema instituições escolares, assinale o que for correto:

(01) Há sociedades que são “desescolarizadas”. Nelas, a herança cultural e os saberes ne-cessários para a sobrevivência e a convivên-cia são transmitidos por meio da educação informal.

(02) Nas sociedades ocidentais modernas, a escola possui, entre outras funções, a de organizar, disciplinar e controlar os indiví-duos.

(04) As instituições escolares oferecem um mo-delo de educação que é fundamental para o processo de socialização dos indivíduos e de manutenção dos grupos.

(08) No Brasil, a educação pública e gratuita é um direito assegurado pela Constituição de 1988, sendo, portanto, uma obrigação do estado oferecer escolas e um dever dos pais ou dos responsáveis matricular e manter seus filhos na escola.

(16) O processo de educação informal exige que os indivíduos permaneçam em período in-tegral nas instituições escolares.

13. (ENEM)

Quatro olhos, quatro mãos e duas cabeças for-mam a dupla de grafiteiros “Os gêmeos”. Eles cresceram pintando muros do bairro Cambuci, em São Paulo, e agora têm suas obras expostas na conceituada Deitch Gallery, em Nova York, prova de que o grafite feito no Brasil é aprecia-do por outras culturas. Muitos lugares abando-nados e sem manutenção pelas prefeituras das cidades tornam-se mais agradáveis e humanos com os grafites pintados nos muros. Atualmen-te, instituições públicas educativas recorrem ao grafite como forma de expressão artística, o que propicia a inclusão social de adolescentes caren-tes, demonstrando que o grafite é considerado

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uma categoria de arte aceita e reconhecida pelo campo da cultura e pela sociedade local e inter-nacional.

Disponível em:<http://www.flickr.com>. Acesso em: 10 set. 2008. Adaptação.

No processo social de reconhecimento de valores culturais, considera-se que:

a) grafite é o mesmo que pichação e suja a cida-de, sendo diferente da obra dos artistas.

b) a população das grandes metrópoles depara--se com muitos problemas sociais, como os grafites e as pichações.

c) atualmente, a arte não pode ser usada para inclusão social, ao contrário do grafite.

d) os grafiteiros podem conseguir projeção inter-nacional, demonstrando que a arte do grafite não tem fronteiras culturais.

e) lugares abandonados e sem manutenção tor-nam-se ainda mais desagradáveis com a apli-cação do grafite.

14. (PUC-Rio – RJ)

As reportagens ilustram uma importante ca-racterística do mundo atual apresentada na opção:

Em maio de 2008, Paul Krueger, um “Sem Teto”, foi preso pela polícia de Atlantic City acusado de dar golpes em mulheres inscritas em um site de relacionamento. Segundo a promotora da cida-de: “Um mendigo com um laptop consegue um tremendo acesso ao mundo exterior”.

Charles Pitt, morador das ruas de São Francisco, possui perfis nos sites MySpace, Facebook e Twitter, além de comandar o fórum SF Homeless, que pos-sui 140 membros. Nele, os participantes podem ser alertados sobre encontros para moradias pú-blicas, entre outras informações. Para Pitt, “Você não precisa de uma TV. Você não precisa de um rádio. Você não precisa nem mesmo de um jornal. Mas você precisa da internet”.

a) Ampliação da inclusão social, consequência do desinteresse das classes mais pobres pelas novas tecnologias da informação.

b) Redução das desigualdades sociais, possibili-tada pelo acesso irrestrito às novas tecnolo-gias de comunicação em todas as partes do mundo.

c) Expansão dos fluxos materiais, resultado da consolidação das redes mundiais de produção que garantem o acesso às redes globais de in-formação.

d) Consolidação de velhas redes sociais, acessí-veis a todos e plenamente no mundo graças à rapidez na troca de informações em escala planetária.

e) Aumento das possibilidades de interativida-de com o mundo, resultado da facilitação do acesso à informação e da intensificação dos fluxos imateriais.

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