sobre leitura e a formação de leitores - katia brakling

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  • SOBRE LEITURA E A FORMAO DE LEITORES: QUAL A CHAVE QUE SE ESPERA?

    1

    Ktia Lomba Brkling

    PARA ENTENDER

    Nas ltimas dcadas a demanda pela leitura e pelo domnio da linguagem escrita

    em nossa sociedade cada vez maior. Basta abrir as pginas dos classificados em

    qualquer jornal para que nos deparemos com as exigncias colocadas para os

    profissionais que esto procura de emprego: exigido do candidato s mais diversas

    funes que demonstre domnio da lngua portuguesa, que seja bom ouvinte, que tenha

    boa comunicao verbal e escrita, portugus fluente, boa redao, facilidade de

    comunicao e um bom texto.

    Sabemos que esta demanda no exclusiva do Brasil, mas uma questo mundial,

    que hoje coloca o domnio da linguagem escrita como condio para a produo e

    acesso ao conhecimento.

    Sobretudo a leitura requerida para que se possa ter acesso a informaes

    veiculadas das mais diversas maneiras: na Internet, na televiso, em outdoors

    espalhados pelas cidades, em cartazes que freqentam, sistematicamente, os muros das

    ruas, nas mais diferentes placas, folders, impressos de propaganda, distribudos

    insistentemente aos transeuntes, e, at mesmo, em receitas mdicas e bulas de remdios.

    No entanto, no apenas para o mundo do trabalho que esse conhecimento

    importante. Para a ampliao da participao social e exerccio efetivo da cidadania, ser

    um usurio competente da linguagem escrita , tambm, condio fundamental.

    decorrente dessa compreenso a necessidade que hoje se coloca para a escola:

    a de possibilitar ao aluno uma formao que lhe permita compreender criticamente as

    realidades sociais e nela agir, sabendo, para tanto, organizar sua ao. Para isso, esse

    aluno precisa apropriar-se do conhecimento e de meios de produo e de divulgao

    desse conhecimento.

    Nas sociedades letradas, como a nossa, esse processo de apropriao est

    estreitamente ligado ao conhecimento da linguagem escrita, sobretudo no que se refere

    leitura.

    1 BRAKLING, Ktia Lomba. Sobre a leitura e a formao de leitores. So Paulo: SEE: Fundao

    Vanzolini, 2004. Texto parcialmente publicado no portal www.educarede.org.br

  • Esse conhecimento, tal como hoje compreendemos, refere-se a um grau ou tipo

    de letramento que inclui tanto saber decifrar o escrito stricto senso , quanto

    ler/escrever com proficincia de leitor/escritor competente, quer dizer, saber utilizar nas

    prticas sociais de leitura e de escrita as estratgias e procedimentos que conferem

    maior fluncia e eficcia ao processo de produo e atribuio de sentidos aos textos

    com os quais se interagir.

    No que se refere especificamente leitura nosso foco neste artigo o que isso

    significa?

    Leitura: uma prtica social

    Significa, inicialmente, compreender que ler uma prtica social, que acontece

    em diferentes espaos, que possuem caractersticas muito especficas: o tipo de

    contedos dos textos que nele circulam, as finalidades colocadas para a leitura, os

    procedimentos mais comuns, decorrentes dessas finalidades, os gneros dos textos. Por

    exemplo, em um consultrio de dentista costumam estar disponveis diferentes tipos de

    revistas, ali disponibilizadas para que os pacientes passem o tempo enquanto esperam

    seu horrio; uma leitura de entretenimento, basicamente. Nessa situao, a leitura

    costuma ser feita em voz baixa, e interrompida to logo a presena do paciente seja

    solicitada pelo dentista. Os textos tero caractersticas bastante diferentes, proporcionais

    variedade de cada revista e sero organizados em gneros tpicos da mdia impressa:

    artigos, reportagens, notcias, notas, classificados, propagandas, editorial, crnicas, por

    exemplo.

    Em uma missa da Igreja catlica, por outro lado, costumam circular os textos

    religiosos que constam da Bblia, de missais e folhetos que orientam a participao no

    ritual. Nessas ocasies, l- se supostamente para retirar do texto algum ensinamento

    j que os textos a serem lidos foram selecionados especificamente com essa finalidade

    , ou para acompanhar o ritual, sabendo quais falas devero ser realizadas. Nessa

    situao, costume realizar leituras em voz alta, individualmente e em coro. A leitura

    que se realiza nesse espao, quando se trata da Bblia, de pequenos trechos, no se

    tratando, dessa forma, de uma leitura exaustiva. Quando se trata dos missais ou dos

    folhetos orientadores, a leitura quase instrucional, dado que orienta as pessoas sobre o

    que devem dizer nos diferentes momentos do ritual.

    Quando se est em casa e se toma um romance para ler, por exemplo, pode ser

    para entretenimento e, dessa forma, a leitura ser sempre extensiva (a obra toda,

    linearmente), ainda que realizada parte a parte.

    Ao se participar de uma leitura dramtica, sabe-se que uma pea de teatro ser

    lida em voz alta e interpretada por atores. A finalidade colocada para a leitura

  • interpretar dramaticamente o texto; para os que assistem, apreciar a leitura que est

    sendo realizada pelos atores. Nessa situao, os textos sero sempre peas de teatro.

    Ao mesmo tempo em que coexistem diferentes prticas sociais em uma mesma

    sociedade, em um nico momento histrico, diferentes sociedades estabeleceram

    diferentes usos para a escrita e a leitura ao longo da sua histria. Como afirma Marisa

    Lajolo,

    Em algumas sociedades, leitura e escrita eram privilgio de sacerdotes ou de governantes. Nas sociedades ocidentais entre elas a nossa embora tivesse nascido e se fortalecido na esteira da administrao governamental e da catequese crist, escrita e leitura

    muito cedo ganharam usos cotidianos.

    Assim, alm de reparties de governo, altares e plpitos de igrejas,

    ambientes domsticos como salas de costura e varandas de fazendas,

    ao lado de ptios de hospedarias pousos de tropeiro e feiras livres

    transformaram-se em cenrios de leitura.

    Nestes espaos ora pblicos ora privados, mas sempre coletivos, se

    liam e se ouviam ler textos muito diferentes daqueles que

    interessavam diretamente ao governo e Igreja. Nestes espaos lia-se

    fico (novelas, crnicas e romances) e ouvia-se poesia.2

    A leitura, enquanto prtica social , portanto, histrica.

    Leitura: processo individual e dialgico

    Significa, tambm, compreender que ler tanto uma experincia individual e

    nica, quanto uma experincia interpessoal e dialgica. E isso nos remete diretamente

    natureza do processo de leitura. Toda leitura individual porque significa um processo

    pessoal e particular de processamento dos sentidos do texto. Mas toda leitura tambm

    interpessoal porque os sentidos no se encontram no texto, exclusivamente, ou no leitor,

    exclusivamente; ao contrrio, os sentidos situam-se no espao intervalar entre texto e

    leitor.

    Um texto sempre produzido em um determinado momento histrico no qual se

    encontra definido um determinado horizonte de expectativas, derivado de um corpo de

    conhecimentos e informaes disponvel e compartilhado em maior ou menor

    medida pelos possveis interlocutores.

    Assim, quando um texto produzido, alguns sentidos so pretendidos pelo autor,

    sentidos que so decorrentes da forma de compreender o mundo constituda naquele

    momento histrico especfico em uma determinada cultura.

    2 LAJOLO, Marisa. Leitura e Literatura na escola e na vida. Capturado da internet no endereo www.p

    roler.bn.br.

  • Uma leitura, igualmente, decorrente do corpo de conhecimentos e informaes

    disponvel no momento scio-histrico em que a leitura se realiza, o qual constitui uma

    determinada forma de ver o mundo. Dessa forma, ao lermos uma obra escrita em

    meados do sculo XVIII, por exemplo, certamente nos depararemos com determinados

    ideais estticos de beleza feminina e masculina, com determinadas referncias de

    educao e cultura que, no necessariamente, correspondem s que hoje circulam na

    nossa sociedade. Por exemplo: uma pele alva, e uma mulher cheia de carnes pode no

    corresponder referncia esttica de beleza feminina de hoje, na sociedade brasileira

    (certamente, no corresponder nunca aos ideais estticos dos pases de cultura

    africana). Da mesma forma, o hbito de a mulher andar sempre protegida por uma

    sombrinha, o significado conferido ao ato de corar diante de uma fala um pouco mais

    atrevida de um homem, o efeito que provocava nos homens a viso de um tornozelo

    feminino, por exemplo, 3 no so os mesmos que circulam hoje, na nossa cultura.

    Assim, o processo de construo dos sentidos de uma obra de tal poca ser

    resultado do que for possvel ao leitor de hoje compreender (e recuperar) sobre os

    valores que circulavam quando a obra foi produzida. Essa compreenso se dar de

    maneira circunscrita num horizonte cultural atual, que pressupe outros valores;

    portanto, os sentidos no sero os mesmos que circulavam no contexto cultural de

    origem da obra, mas aqueles que forem possveis ao leitor hoje, que resultaro

    permeados das nuances dos valores hoje vigentes.

    Um aspecto importante de salientarmos o fato de que as palavras so

    constitudas por um significado que estvel, que recupervel pelos falantes de

    uma determinada lngua em um determinado momento histrico e tambm por um

    conjunto de sentidos que so decorrentes das experincias pessoais de cada um,

    constitudos a partir das referncias particulares de cada falante ao logo da vida.

    Significado e sentidos constituem um amlgama indissolvel, de tal forma que uma

    palavra nunca ser a mesma para diferentes pessoas, embora possa ser compreendida no

    que tem de generalizvel.

    Assim, ainda que lida por sujeitos que coexistem em um mesmo momento

    histrico, uma palavra nunca ser a mesma para diferentes sujeitos. Os sentidos de um

    texto, portanto, ao mesmo tempo em que so resultado de um processo pessoal e

    intransfervel, dialogam, inevitavelmente com o outro: com o autor, com os outros

    presentes no corpo de idias que constitua o horizonte cultural do momento de sua

    produo. A leitura, assim, pessoal e, ao mesmo tempo, dialgica.

    3 Veja-se A pata da gazela de Jos de Alencar.

  • Letramento e leitura

    Alm disso, a leitura deve ser compreendida como parte de um processo mais

    amplo: o letramento. Este configura-se como um processo de apropriao dos usos da

    leitura e da escrita nas diferentes prticas sociais.

    Nessa perspectiva, um leitor competente aquele que usa a linguagem escrita

    e, portanto, a leitura efetivamente, em diferentes circunstncias de comunicao;

    aquele que se apropriou das estratgias e dos procedimentos de leitura caractersticos

    das diferentes prticas sociais das quais participa, de tal forma que os utiliza no

    processo de (re) construo dos sentidos dos textos.

    Estes procedimentos e estratgias de leitura tanto so individuais e

    caracterizados como processos cognitivos de alta complexidade, quanto sociais, sendo

    decorrentes das especificidades das prticas sociais nas quais se realizam.

    Alm disso, tambm os elementos do contexto de produo dos textos devem

    ser considerados no processamento dos sentidos, dado que colocam restries e ao

    mesmo tempo possibilidades que determinam os textos.

    As estratgias de leitura

    Ao lermos, fazemos usos de algumas estratgias que precisam ser consideradas

    no processamento de sentido dos textos. Estas estratgias referem-se capacidade:

    a) de ativarmos o conhecimento prvio que temos sobre todos os aspectos envolvidos

    na leitura conhecimento sobre o assunto, sobre o gnero, sobre o portador onde foi

    publicado o texto (jornal, revista, livro, folder, panfleto, folheto, etc.); sobre o autor do

    texto, sobre a poca em que o texto foi publicado, quer dizer, sobre as condies de

    produo do texto a ser lido para selecionar as informaes que possam criar o

    contexto de produo da leitura, garantindo a fluncia da mesma;

    b) de anteciparmos informaes que podem estar contidas no texto a ser lido;

    c) de realizarmos inferncias quando lemos, quer dizer, lermos para alm do que est

    nas palavras do texto, ler o que as palavras nos sugerem;

    d) de localizarmos informaes presentes no texto;

    e) de conferirmos as inferncias e antecipaes realizadas ao longo do processamento

    do texto, de forma a podermos valid-las ou no;

    f) de irmos sintetizando as informaes dos trechos do texto;

    g) de estabelecermos relaes entre os diferentes segmentos do texto;

  • h) de estabelecermos relaes entre tudo o que o texto nos diz e o que outros textos j

    nos disseram, e o que sabemos da vida, do mundo e das pessoas.

    Os procedimentos de leitura

    Toda leitura que fazemos orientada pelos objetivos e finalidades que temos ao

    realizar a leitura, e estes objetivos determinam a escolha de procedimentos que

    tornaro o processo de leitura mais eficaz. Assim:

    i) se estamos realizando uma pesquisa sobre determinado assunto, investigaremos quais

    obras podem abordar esse assunto, selecionando as que nos parecerem adequadas para

    uma leitura posterior: leremos o ttulo, identificaremos autor, leremos a apresentao da

    obra, procurando antecipar se h alguma possibilidade de aquele portador tratar do

    assunto; procuraremos no ndice se h algum captulo ou seo que aborde o tema, por

    exemplo;

    j) nessa mesma pesquisa, selecionada a obra, procuraremos ler apenas os tpicos

    referentes ao assunto de nosso interesse, e no, necessariamente, a obra toda;

    k) se estivermos estudando determinada questo, leremos o texto intensivamente,

    procurando compreender o mximo do que foi dito pelo autor;

    l) se estivermos selecionando textos que nos possibilitem trabalhar com variedades

    lingsticas, por exemplo, o nosso critrio ser temtico e, dessa forma, buscaremos

    indicaes sobre qual o tema e o assunto que os textos abordam;

    m) se estivermos procurando revisar nosso texto para torn-lo mais adequado,

    buscaremos pr todos os elementos que possam provocar um efeito de sentido diferente

    daquele que pretendemos.

    Como se pode ver, os objetivos que podem orientar a leitura podem ser vrios:

    Ler para:

    Obter uma

    informao

    especfica

    Obter uma

    informao geral

    Seguir instrues (de

    montagem, de

    orientao

    geogrfica...)

    Aprender Revisar um

    texto

    Construir repertrio

    temtico ou de

    linguagem para

    produzir outros

    textos

    Apresentar

    oralmente um texto a

    uma audincia

    (numa conferncia,

    num sarau, num

    jornal...)

    Praticar a leitura em

    voz alta para uma

    situao de leitura

    dramtica, de

    gravao de udio,

    de representao...

    Verificar se

    houve

    compreenso

    (reler)

    Prazer esttico

  • A estes objetivos correspondem tambm vrios procedimentos:

    Uma leitura:

    Integral Leitura sequenciada e extensiva de um texto

    Inspecional Quando se utilizam expedientes de escolha de

    textos para leitura posterior

    Tpica Para identificar informaes pontuais no texto,

    localizar verbetes em um dicionrio ou

    enciclopdia

    De reviso Para identificar e corrigir, num texto dado,

    determinadas inadequaes em relao a uma

    referncia estabelecida

    Item a item Para realizar uma tarefa seguindo comandos

    que pressupem uma ordenao necessria

    Expressiva

    Ter clareza dos objetivos que orientam a nossa leitura nos possibilitar

    selecionarmos os procedimentos mais adequados para realiz-la.

    Ler, como se v, uma atividade complexa. A proficincia leitora envolve o

    domnio dos aspectos discutidos acima.

    Nessa perspectiva, qual a tarefa que cabe escola?

    NA ESCOLA...

    Vimos que a finalidade principal da escola hoje formar alunos capazes de

    exercer a sua cidadania, compreendendo criticamente as realidades sociais e nelas

    agindo, efetivamente. Para tanto, coloca-se como fundamental a construo da

    proficincia leitora desse aluno.

    Ao mesmo tempo que a escola necessita criar pautas interacionais que

    possibilitem aos alunos apropriarem-se dos diferentes aspectos envolvidos no

    processamento dos textos, a prpria proficincia leitora dos alunos condio para

    esse processo de apropriao, dado que a escola uma instncia social de interao

  • verbal que se vale do conhecimento sobre a linguagem escrita para cumprir a sua

    funo, que ensinar.

    Nessa perspectiva, fundamental que todos os educadores em especial os

    professores estejam atentos para essa questo. Conhecer a natureza do processo de

    leitura, assim como o processo pelo qual os sentidos de um texto so construdos,

    condio indispensvel para uma aprendizagem efetiva, quando esta pressupe a leitura

    de textos escritos.

    Um professor de Matemtica, por exemplo assim como de qualquer outra

    rea , tanto necessita ter informaes gerais sobre o processamento dos sentidos de

    um texto quanto informaes especficas sobre as caractersticas dos textos que

    circulam em sua aula as situaes-problema, os enunciados de exerccios, os textos

    expositivos que sistematizam conhecimentos e que so tpicos de sua rea de

    conhecimento. So estas informaes que possibilitaro a ele uma interveno de

    efetiva qualidade.

    Da mesma forma, os professores de Cincias, Histria, Geografia, Artes,

    Educao Fsica, Lngua Estrangeira, entre outras reas. Isso no significa, no entanto,

    que o professor de Lngua Portuguesa dar questo da leitura o mesmo tratamento.

    A ele, evidentemente, caber um tratamento mais aprofundado tanto das

    especificidades dos gneros discursivos que mais circulam nas outras reas do

    conhecimento, quanto queles que no circulam prioritariamente em nenhuma, mas que

    podem e devem ser trabalhados em todas como os da mdia impressa, televisiva e

    radiofnica, entre outros e tambm os literrios.

    Nessa perspectiva, os contedos que o professor de lngua portuguesa dever

    eleger como prioritrios para o trabalho devem constituir-se como conhecimentos dos

    quais os demais professores se utilizaro para realizarem a leitura dos textos que

    selecionarem para trabalho. Mas, como em certa medida conhecimentos especficos e

    procedimentos de leitura so inseparveis, isso no deve eximir o professor de outras

    reas de trabalhar com esses aspectos, sendo que nfases diferentes que constituem as

    especificidades das diversas reas. Para os demais professores, os contedos especficos

    de leitura, em si, devem ser instrumentos, ferramentas a serem utilizadas para se buscar

    a compreenso do contedo especfico de sua rea foco de seu trabalho. Quer dizer,

    se o professor de Lngua Portuguesa dever tematizar as estratgias de leitura, estas

    sero pressupostos dos demais professores no processo de atribuio de sentido aos

    textos que trataro dos contedos especficos de sua rea. De tal forma que, se um aluno

    atribui um sentido equivocado a um texto lido, ele consiga diagnosticar qual o

    problema uma inferncia inadequada, uma antecipao incorreta, por exemplo e

    (re)orientar sua ao para auxiliar o aluno a resolver o problema ler junto, buscando

    descobrir qual o ndice lingustico que o aluno utilizou para atribuir o sentido indesejado

  • e oferecendo a contrapartida, quer dizer, explicitando o equvoco e oferecendo novas

    referncias para a significao.

    O professor de outras reas precisa, dessa forma, saber quais so as estratgias e

    procedimentos que um leitor proficiente utiliza para poder utiliz-los de maneira

    compartilhada com o aluno, de forma que este de aproprie dos mesmos.

    O professor de Lngua Portuguesa deve tomar as estratgias e procedimentos de

    leitura como objeto fundamental de trabalho e aprofundar esse conhecimento no que se

    refere s especificidades dos gneros, de maneira mais sistematizada.

    No ensino de Lngua Portuguesa sobretudo no Ensino Fundamental , os

    contedos, no geral, tm um carter procedimental, considerando que se trata de

    tematizar todos os conhecimentos com os quais se opera na prtica de linguagem. No

    que isso signifique que no haja conceituao no processo de compreenso de tais

    conhecimentos, transformados em contedos de ensino.

    Significa, apenas, que a dimenso procedimental predomina no trabalho com

    linguagem, dado que se trata de aprender a participar de prticas sociais, e no de

    elaborar definies a respeito de tais contedos ou de apenas organiz-los de maneira

    sistematizada.

    A sistematizao/organizao dos conhecimentos processo que ir sendo

    tratado medida que as necessidades e possibilidades de aprendizagem dos alunos

    determinem, e que ir se complexificando medida que avanam os anos de

    escolaridade.

    De maneira geral, os contedos de ensino relacionados leitura so os mesmos

    para os diferentes ciclos e nveis de ensino. O que os diferencia o grau de

    aprofundamento com que iro sendo tratados ao longo do processo de escolaridade, em

    funo do grau de complexidade dos textos e gneros selecionados para trabalho, que

    implicar graus de dificuldade distintos para os alunos.

    Por exemplo, ler um conto policial pode ser uma tarefa que apresente graus de

    dificuldade diversos para os alunos. Para aquele que tiver maior familiaridade com o

    gnero, com o assunto tematizado no texto, com a linguagem utilizada pelo autor,

    poder ser uma tarefa fcil. No entanto, para aquele que desconhece o gnero, por

    exemplo, a dificuldade ser diferente, pressupondo novas aprendizagens.

    Uma charge poltica, por exemplo, supe conhecimento de mundo e experincia poltico social que podem no estar dados para um aluno

    de onze anos. Dessa forma, sua leitura pode diferenciar-se tanto da

    que for realizada por um aluno de 14 anos, quanto da que for feita por

    um de 17. O mesmo raciocnio se aplica a um poema, uma crnica,

    uma notcia, uma carta de solicitao ou uma reportagem. Nesse

    sentido, a interveno do professor e, conseqentemente os aspectos a

  • serem tematizados, tanto podero ser diferentes, quanto podero ser os

    mesmos, tratados com graus diversos de aprofundamento. 4

    Nessa perspectiva, a especificidade das prticas sociais declamar um poema

    em um sarau, fazer uma leitura dramtica de um texto de teatro, ler jornal em casa pela

    manh, ler um texto para estudar, entre outras e dos gneros e textos selecionados

    para trabalho que determinar o tratamento que ser dado aos contedos de leitura, que

    sero os mesmos nos diferentes ciclos e nveis de ensino. Quais sejam:

    ESTRATGIAS DE LEITURA

    Ativao de conhecimento prvio e seleo de

    informaes

    Realizao de inferncias

    Antecipao de informaes

    Localizao de informaes no texto

    Verificao de inferncias e antecipaes realizadas

    Articulao de ndices textuais e contextuais

    Reduo de informao semntica: construo e

    generalizao de informaes

    PROCEDIMENTOS DE LEITURA

    Leitura inspecional

    Leitura tpica

    Leitura de reviso

    Leitura item a item

    Leitura expressiva

    O trabalho com estes contedos deve pressupor uma organizao de atividades

    em algumas modalidades didticas fundamentais:

    4 MEC. Parmetros Curriculares Nacionais de Lngua Portuguesa para o ensino

    Fundamental (5 a 8 srie). Braslia (DF): MEC/SEF; 1998.

  • a) leitura colaborativa: a leitura em que professor e alunos realizam paulatinamente, em

    conjunto, prtica fundamental para a explicitao das estratgias e procedimentos que

    um leitor proficiente utiliza.

    b) leitura programada: a leitura que serve para a ampliao da proficincia leitora,

    sobretudo, no que se refere extenso dos textos trabalhados ou seleo de

    textos/livros mais complexos. Nela, o professor divide o texto em trechos que sero

    lidos um a um, autonomamente e, depois, comentados em classe em discusso coletiva.

    c) Leitura em voz alta feita pelo professor: a leitura recomendada, sobretudo, para as

    classes de alunos no alfabetizados, como possibilidade de aprendizagem da linguagem

    escrita antes mesmo que tenham compreendido o sistema.

    d) leitura autnoma: aquela que o aluno realiza individualmente, a partir de indicao

    de texto do professor. uma modalidade didtica que possibilita ao professor verificar

    qual a aprendizagem j realizada pelo aluno.

    e) leitura de escolha pessoal: a leitura de livre escolha. O aluno seleciona o que quer

    ler, realiza a leitura individualmente e, depois, apresenta sua apreciao para os demais

    colegas. uma leitura que possibilita a construo de critrios de seleo e de

    apreciao esttica pessoais.

    f) projetos de leitura: trata-se de uma forma de organizar o trabalho que prev a

    elaborao de um produto final voltado, necessariamente, para um pblico externo

    sala de aula. As demais modalidades citadas costumam estar articuladas em projetos de

    leitura.

    O fundamental na organizao das atividades procurar organiz-las de forma

    que se aproximem das prticas sociais de leitura no escolares.

    Para finalizar, retomaremos a referncia contida no ttulo do texto: no processo

    de leitura e de ensino da leitura, qual a chave que se espera?

    Para o professor, a chave mltipla: o conhecimento da natureza da leitura; o

    conhecimento dos procedimentos e estratgias de leitura utilizados pelos leitores

    proficientes; o reconhecimento de si como leitor proficiente; o agir como leitor

    proficiente junto aos seus alunos.

    Para o aluno, a chave una, mas no menos complexa: a apropriao das

    estratgias e procedimentos utilizados pelos leitores proficientes, e sua utilizao eficaz

    nas prticas sociais de que participar.

    Estas, as chaves necessrias.