snell
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Esquema dos pontos principais do texto de Bruno Snell, “O homem na
concepção de Homero”
O que Snell pretende demonstrar é que o estudo da língua grega
primitiva permitiria chegar ao significado original das palavras em Homero. No
plano estético, ressaltaria a intensidade da expressão e beleza da língua, no
plano histórico, resultaria num entendimento maior acerca do desenvolvimento
espiritual dos gregos.
Para Snell, a língua primitiva de Homero apresenta formas de abstração
não desenvolvida, mas que em contrapartida, oferece bastante definições de
coisas concretas, experimentáveis pelos sentidos.
Verbo “Ver”
Como resultado do desenvolvimento do grego primitivo para o clássico
caíram em desuso, algumas das formas do verbo “ver”, uma vez consideradas
desnecessárias para a língua nesse estágio de pensamento.
Snell apresenta o modo de representação das formas primitivas do
verbos que caíram em desuso para justificar uma certa evolução que está na
maneira de representação:
dérkhesthai (substituído posteriormente por Blépein) ter um determinado
olhar; lampejo de olhar percebido por outra pessoa; olhar com um olhar
particular. (Demonstra como exemplo o uso desse termo em um episódio em
que Odisseu dá indícios de saudades da terra pelo seu modo de olhar). Usado
para indicar um olhar penetrante com relação a um objeto externo.
papitaínein: indica um olhar que procura algo; um modo de olhar que observa
atos nos outros, sendo sempre dirigido à 3ª pessoa.
leússen: faz referência a algo que brilha. Olhar para algo que brilha.
Predominantemente realizado em primeira pessoa indica modo de olhar ao
longe, olhar altivo, alegre. Aspectos observáveis em si diante de coisas.
óssesthai: olhar algo ameaçador (pressentir)
OBS:
theoreîn: palavra que adquire posteriormente significado de olhar, ou seja,
substituindo as demais formas ao lado de Blépein. Essa palavra derivada de
um substantivo assume como verbo sentido de observar, “ser espectador” de
algo. Enfatiza-se a faculdade que o olho tem de captar um objeto.
Snell concluí que os verbos primitivos revelam um modo intuitivo do ver,
enquanto que os verbos recentes expressam a sua autêntica função.
Corpo e Alma
Snell compartilha da concepção de que Aristarco seria um poeta que, por
estar situado em um tempo posterior à Homero, logo, na Grécia clássica, seria
um poeta que já transmitiria um indício de evolução da língua e do
pensamento grego no que tange a representação do corpo e da alma. Essa
mudança de interpretação do corpo e da alma veio junto com a sua lírica, por
sua vez, meio por meio do qual essas noções foram afirmadas.
Snell retira do léxico os termos que se aproximam de uma representação
de corpo e alma primitiva em Homero, uma vez que não haveria no léxico um
termo que contemplasse a ideia de corpo tal qual possuímos, a de unidade e
de associação à alma, nem de alma em sua plenitude.
soma: esse termo que em Homero indicava cadáver, teria depois o sentido
reconfigurado, assumiria o significado de corpo. Essa reconfiguração de
significado, para Snell, expressa uma reconfiguração também do modo de se
conceber a ideia de corpo como condição tanto do homem vivo quanto do
homem morto.
démas: Homero utiliza esse termo para designar o corpo vivo. Mas é um termo
usado no acusativo de relação, ou seja, sempre numa relação de comparação
entre figuras e estruturas. Em Homero, para se falar em corpo, fala-se de
membros.
Duas formas de se referir aos membros em Homero:
guia: membros movidos pelas articulações
mélea: membros movidos pelos músculos
Há um termo que se refere ao limite do corpo ou pele: khrós
A percepção do corpo, visto como uma divisão de membros em Homero,
reflete na organização da língua, na divisão dos termos para cada membro e
na divisão dos verbos para cada modo de olhar.
Se não há um nome para corpo que dê a ideia de unidade, mas há nomes
para membros, logo não há noção de corpo como unidade. O reconhecimento
da existência das coisas, em Homero, ocorre na medida em são racionalizadas,
tendo como ato da razão a nomeação, pois o nomear já é um gesto de refletir
sobre.
Espírito e alma
Snell diz que em Homero não há palavra correspondente à alma ou
espiríto, mas que apenas no grego tardio o termo psykhé passa a incorporar o
significado de “alma”.
Em Homero:
psykhé: possui o significado daquilo que tem função de manter o homem vivo,
e que o abandona no momento da morte ou quando ele desmaia, ficando
exposta no combate. É uma espécie de anima, ou hálito vital. Sai pela boca
emitida com a respiração ou pelo ferimento. Vai para o Hades e lá torna-se
espectro.
Órgãos da alma:
thymós: espírito que provoca as emoções. Provoca o movimento dos
membros. Sai dos membros. Esse termo é também aplicado a morte dos
animais substituindo psykhé.
nóos: espirito que percebe as imagens, ligado ao intelecto, razão ou
pensamento. Oriundo do termo noiein que significa entender.
Portanto, Snell diz haver em Homero três formas de representação da
alma na língua: psykhé, thimós, nóos.
Snell acredita que todas essas diversas formas verbais, as diversas
formas de referir-se ao corpo por meio dos membros e as três maneiras de
referir-se à alma, não estão na ordem da estilização, mas são características
de uma fase primitiva na evolução do pensamento europeu.
Diante dessas suas demonstrações ele oferece uma esquema de
evolução.
A evolução do significado de soma, deixando de representar cadáver
para representar a ideia de corpo, sugere uma evolução que toca a maneira de
reconhecer o corpo como propriedade tanto do morto quanto do vivo.
Esse mesmo movimento ele transfere para a mudança de significado de
psykhé, que deixa de corresponder a noção de algo finito, que abandona o
homem na morte, e passa obter o significado de algo infinito, cuja existência
transcende a morte.
É com Heráclito que surge as definições mais concretas sobre a alma
segundo a determinação de três “logos” em oposição a Homero:
- profundo e infinito
- comum à todos
- está em desenvolvimento