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SISTEMAS AMBIENTAIS DA REGIÃO COSTA DO DESCOBRIMENTO (BAHIA) Raul Reis Amorim Doutorando em Geografia pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), Instituto de Geociências (IG), Departamento de Geografia (DGEO) e-mail: [email protected] Maria Crizalda Ferreira dos Santos Doutoranda em Geografia pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), Instituto de Geociências (IG), Departamento de Geografia (DGEO) e Professora Assistente da Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC), Departamento de Ciências Agrárias e Ambientais (DCAA) e-mail: [email protected] Regina Célia de Oliveira Professora Doutora da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), Instituto de Geociências (IG), Departamento de Geografia (DGEO) e-mail: [email protected] RESUMO Os estudos ambientais têm revelado sobretudo nas últimas décadas um caráter interdisciplinar nas pesquisas pautadas sobre a dinâmica dos agentes naturais frente à crescente pressão de uso dos espaços, materializadas por conflitos de diversas ordens, sejam esses, históricos, políticos, culturais, religiosos, em fins, relações humanas que se estruturam sobre o território e impõem a esse espaço níveis diversos de interferência no mecanismo natural pré existente. As Unidades de Paisagens se individualizam pelo relevo, clima, cobertura vegetal, solos ou até mesmo pelo arranjo estrutural e o tipo de litologia ou exclusivamente por um desses elementos (ROSS, 1992). O autor ainda afirma que o entendimento do relevo passa, portanto pela compreensão de uma coisa maior que é a paisagem como um todo. O objetivo deste trabalho foi realizar uma análise dos compartimentos geomorfológicos e em especial os atributos morfométricos do relevo, onde os aspectos altimétricos, clinográficos e hidrográficos foram analisados. Para atingir tais objetivos construiu o mapa de compartimentação de relevo, utilizando imagens CBERS pelo método da interpretação visual. As análises morfométricas foram realizadas após a digitalização das cartas topográficas referentes a área de estudo. Após a individualização dos layers de Curva de níveis, pontos cotados e rede de drenagem, elaborou-se os mapas altimétrico e clinográfico no módulo ArcSene do Software ArcGIS 9.3 e a hierarquia de drenagem foi estabelecida utilizando o módulo Hidrology do software ArcGIS 9.3. O mapa geológico e o mapa de cobertura vegetal da Costa do Descobrimento elaborado pela CBPM (2000) foram digitalizados e utilizados para subsidiar as discussões. Verificou-se que a Região Costa do Descobrimento apresenta quatro grandes compartimentos geomorfológicos que apresentam grande influência dos aspectos estruturais e apresentam dinâmica morfogenética totalmente distinta. Palavras-chave: Geomorfologia, abordagem sistêmica, Costa do Descobrimento. ENVIRONMENTAL SYSTEM FROM REGION OF DISCOVERY COAST ABSTRACT The environmental studies have been mainly in the last decades an interdisciplinary character in the ruled of research based on the dynamics of natural agents against the increasing pressure of use of space, that is by several orders of conflicts are those, historical, political, cultural, religious, on purpose, human relationship that are structured on the territory and to impose this space different levels of interference in the natural pre existing mechanism. Units of the Landscape are individualized

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SISTEMAS AMBIENTAIS DA REGIÃO COSTA DO DESCOBRIMENTO (BAHIA)

Raul Reis Amorim Doutorando em Geografia pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), Instituto de

Geociências (IG), Departamento de Geografia (DGEO) e-mail: [email protected]

Maria Crizalda Ferreira dos Santos

Doutoranda em Geografia pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), Instituto de Geociências (IG), Departamento de Geografia (DGEO) e Professora Assistente da Universidade

Estadual de Santa Cruz (UESC), Departamento de Ciências Agrárias e Ambientais (DCAA) e-mail: [email protected]

Regina Célia de Oliveira

Professora Doutora da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), Instituto de Geociências (IG), Departamento de Geografia (DGEO) e-mail: [email protected]

RESUMO

Os estudos ambientais têm revelado sobretudo nas últimas décadas um caráter interdisciplinar nas pesquisas pautadas sobre a dinâmica dos agentes naturais frente à crescente pressão de uso dos espaços, materializadas por conflitos de diversas ordens, sejam esses, históricos, políticos, culturais, religiosos, em fins, relações humanas que se estruturam sobre o território e impõem a esse espaço níveis diversos de interferência no mecanismo natural pré existente. As Unidades de Paisagens se individualizam pelo relevo, clima, cobertura vegetal, solos ou até mesmo pelo arranjo estrutural e o tipo de litologia ou exclusivamente por um desses elementos (ROSS, 1992). O autor ainda afirma que o entendimento do relevo passa, portanto pela compreensão de uma coisa maior que é a paisagem como um todo. O objetivo deste trabalho foi realizar uma análise dos compartimentos geomorfológicos e em especial os atributos morfométricos do relevo, onde os aspectos altimétricos, clinográficos e hidrográficos foram analisados. Para atingir tais objetivos construiu o mapa de compartimentação de relevo, utilizando imagens CBERS pelo método da interpretação visual. As análises morfométricas foram realizadas após a digitalização das cartas topográficas referentes a área de estudo. Após a individualização dos layers de Curva de níveis, pontos cotados e rede de drenagem, elaborou-se os mapas altimétrico e clinográfico no módulo ArcSene do Software ArcGIS 9.3 e a hierarquia de drenagem foi estabelecida utilizando o módulo Hidrology do software ArcGIS 9.3. O mapa geológico e o mapa de cobertura vegetal da Costa do Descobrimento elaborado pela CBPM (2000) foram digitalizados e utilizados para subsidiar as discussões. Verificou-se que a Região Costa do Descobrimento apresenta quatro grandes compartimentos geomorfológicos que apresentam grande influência dos aspectos estruturais e apresentam dinâmica morfogenética totalmente distinta. Palavras-chave: Geomorfologia, abordagem sistêmica, Costa do Descobrimento.

ENVIRONMENTAL SYSTEM FROM REGION OF DISCOVERY COAST

ABSTRACT

The environmental studies have been mainly in the last decades an interdisciplinary character in the ruled of research based on the dynamics of natural agents against the increasing pressure of use of space, that is by several orders of conflicts are those, historical, political, cultural, religious, on purpose, human relationship that are structured on the territory and to impose this space different levels of interference in the natural pre existing mechanism. Units of the Landscape are individualized

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stands out by relief, climate, vegetation, soil or even by the structural arrangement and the type of lithology or exclusively by one of these elements (ROSS, 1992). The author still states that the understanding of relief is therefore the understanding to accomplish of something greater that is the landscape as a whole. The objective of this study was an analysis of geomorphologic compartments and in especially the morphometric attributes of relief, where the altimetric points, hydrographic and slope aspects were analyzed. To achieve such objectives it built the map of partitioning of relief, using images CBERS for the method of visual interpretation. The morphometric analysis was accomplished after digitization of topographic charts for the study area. After the individual layers of the curve levels, quoted points and drainage network, it was elaborated the altimetry and slope maps in module ArcSene Software ArcGIS 9.3 and the hierarchy of drainage was established using the module Hidrology software ArcGIS 9.3. The geological map and map of the vegetation covering of the Discovery Coast prepared by CBPM (2000) were digitized and used to support the discussions. It was found that the Region of the Discovery Coast has four large compartments geomorphologic that present great influence of structural aspects and dynamic morphogenetic have completely different. Key words: Geomorphology, systemic approach, Discovery Coast

Introdução

A compreensão da dinâmica natural na constituição de diversos ambientes e uma meta das

sociedades ao longo de sua historia. Conhecer os ambientes garante ao homem sua sobrevivência, seja

como individuo, ao extrair do meio recursos, seja sujeito na sociedade, ao possibilitar a manutenção do

sistema socioeconômico vigente, no nosso caso o capitalismo.

A apropriação dos recursos naturais pela ação antrópica segue o interesse de cada sociedade.

Tanto que com o processo de sedentarização as sociedades buscaram ocupar áreas com abundancia de

água e alimentos, que são geralmente terrenos mais planos, como as planícies ou áreas planas de

planaltos. Estes terrenos facilitavam a fixação do homem, seja na pratica de atividades agrícolas ou na

instalação de atividades urbanas (AMORIM, 2007).

Os portugueses ao colonizarem o território brasileiro seguiram esta lógica. Apropriaram-se,

inicialmente, das planícies costeiras, porque são áreas que facilitavam não são a comunicação com a

metrópole como também apresentavam abundancia em recursos, tais como o pau brasil - arvore

endêmica da Mata Atlântica altamente explorada. Outro recurso potencial foi à exploração dos solos

para os cultivos de exportação, como a cana-de-açúcar.

A forma que os portugueses encontraram para determinar a posse do litoral brasileiro foi à

divisão do território em capitanias hereditárias. Ao longo da evolução político-administrativa do

Brasil, elas foram desmembradas em províncias e posteriormente em municípios. Ao longo dos

séculos XIX e XX as áreas costeiras tiveram um dinamização de suas atividades socioeconômicas,

levando a uma fragmentação maior do território, e como conseqüência ocorreu à criação de novos

municípios cada vez menores aglomerando em suas sedes um elevado contingente populacional.

A partir da segunda metade do século XX, os municípios situados na zona costeira brasileira se

transformaram socioeconomicamente, ou seja, municípios que tinham como atividades econômicas

principais a pesca, o extrativismo vegetal e o desenvolvimento de agricultura de subsistência passaram

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a se ocupar de atividades econômicas essencialmente urbanas, como o desenvolvimento de atividades

industriais, bem como a exploração turística.

A implantação de novas formas de uso da terra nos ambientes costeiros ocorreu na maioria das

vezes de maneira inadequada, sem o devido estudo das questões ambientais. A fragilidade ambiental

dessas zonas e bastante elevada e as modificações nesses sistemas pela ação antrópica causam danos

irreversíveis.

Exemplos de danos causados nos ambientes costeiros podem ser identificados em todo o

território brasileiro, onde se pode observar o desmatamento e aterro dos biomas costeiros, o

lançamento de efluentes domésticos e industriais nos cursos de água alterando por completo os índices

de qualidade da água, construções nas zonas de praias que alteram a dinâmica da deriva de sedimentos,

resultando em níveis diversos de impactos aos sistemas ambientais.

O uso e a ocupação da terra, a utilização dos recursos naturais e a necessidade dos usuários

levam a uma distribuição desnecessária da natureza no que tange os sistemas ambientais do litoral,

deteriorando as condições de vida e a qualidade do meio ambiente.

Os padrões de uso e ocupação das terras por atividades socioeconômicas, a variedade de

utilizações inadequadas as condições geoambientais mostram a exploração indiscriminada e o

esgotamento e degradação dos recursos naturais. Os cenários ambientais gerados pelas relações entre

os processos de produção da natureza através das atividades como abertura de estradas e infra-estrutura

para o turismo, denuncia a falta de ordenamento do território.

A interação homem-natureza tem na historia características de uso e de posse que variam

segundo épocas e significados econômicos diferentes. E através dos níveis de forca de trabalho e dos

meios de produção que se constrói o espaço geográfico, com identidades de técnicas que revelam os

homens e seu grau de produção e transformação das qualidades naturais da paisagem onde estão

inseridos.

No cenário atual, e necessário efetivar uma investigação cientifica que analise as formas como a

crise ambiental e real, sob o ponto de vista da comunidade envolvida e/ou inserida na região

pesquisada, numa ótica integrada dos fatores naturais e humanos. Neste sentido o homem deve ser

considerado como elemento integrante do meio e esse merece cuidados específicos de conservação,

devendo compor uma paisagem em equilíbrio, em conjunto com o seu apropriador, numa visão de que

e mais viável antecipar os problemas do que reagir a eles, depois de ocorridos.

A delimitação dos Sistemas Ambientais proposta através de uma abordagem sistêmica para a

região Costa do Descobrimento no Estado da Bahia e importante. Primeiro, porque esta região e uma

das áreas de povoamento pioneiro do território nacional, área em que o agente antro pico atua como

ator na configuração da paisagem a mais de cinco séculos; Segundo, pois, a área tem sofrido

transformações no uso e ocupação das terras, não considerando os níveis de fragilidade ambiental da

área em estudo, o que acentua os problemas ambientais; e Terceiro, porque a inexistência de estudos

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que integrem os sistemas naturais aos sistemas antrópicos no planejamento no uso e ocupação da zona

costeira da região Costa do Descobrimento, que nos últimos quarenta anos se tornou uma das regiões

mais dinâmicas economicamente do Estado da Bahia, e também e um dos principais destinos turístico

do Brasil. Analisando como se dá esse processo de ocupação e quais as fragilidades ambientais na área

em estudo, e possível contribuir para a organização de medidas de prevenção ao uso desse espaço, de

forma a minimizar praticas predatórias que possam trazer danos ambientais.

A metodologia proposta para a realização deste trabalho esta fundamentada na proposta de

Rodriguez, Silva e Cavalcanti (2002), que propõem a delimitação de Sistemas Ambientais que se

alicerça em uma avaliação setorial e integrada dos atributos físicos da paisagem permitindo, por

exemplo, a constatação de áreas criticas em relação ao uso e ocupação das terras e, que devem ser

respaldados por mecanismos disciplinadores e técnicas que minimizem a ação dos agentes antrópicos,

ao reconhecer a fragilidade ambiental daquele espaço e ressaltar as belezas cênicas das paisagens.

Procedimentos Metodológicos

O primeiro procedimento de trabalho foi a definição da escala taxonômica a ser adotada.

Rodriguez, Silva e Cavalcanti (2002) fazem algumas considerações sobre as escalas taxonômicas que

abrangem desde uma escala de analise muito geral ate uma muito grande, mais especifica e pontual,

definidas da em cinco categorias distintas. Desse modo, para atender os objetivos propostos por este

trabalho, tornou-se necessária uma representação cartográfica na escala média, ou seja, a escala

1:250.000.

Definida a escala taxionômica de trabalho, foi feito o levantamento das cartas-base que

abrangem os municípios em estudo. Foram utilizadas as Cartas Topográficas Canavieiras, Mascote,

Potiraguá, Salto da Divisa, Porto Seguro, Santo Andre, Guaratinga, Monte Pascoal, Itamaraju e Prado

na escala 1:100.000 produzidas pela SUDENE (1977).

Após a aquisição de tais cartas foram escaneadas e posteriormente, georreferenciadas no

software ambiente Arc GIS 9.3 e digitalização das curvas de nível, da drenagem, limite dos municípios

e das principais vias que perpassavam pelo mesmo. Tal recorte foi feito apos a aquisição da

delimitação dos municípios em ambiente digital e georreferenciada, elaborado pelo IBGE, de forma a

possibilitar a especificação da área dentro das cartas em questão.

Foi elaborada a Carta de Hierarquia de Drenagem segundo a proposta de Strahler das áreas

em estudo utilizando um método automático. Foi utilizado o Software Arc GIS 9.3, o modulo

Hidrology, onde os layes curvas de nível, pontos cotados e rede de drenagem foram processados. As

cartas foram organizadas na escala 1:250.000.

Outra etapa a ser cumprida foi a organização das Cartas Topográficas. Para tal foram utilizadas

os layes “curvas de nível com eqüidistância de 40 m”, “pontos contados”, “áreas de inundação” e

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“limite municipal” já georreferenciados e digitalizados anteriormente. Esses mapas foram

representados na escala 1:250.000.

A partir das Cartas Topográficas foi possível elaborar a Carta de Níveis Altimétricos, com o

uso do software Arc Sene, onde os layes “curvas de nível”, “pontos cotados” e “limites municipais”

que foram interpolados e gerando um modelo em 3D.

Também, a partir da interpolação dos layes “curvas de nível”, “pontos cotados” e “limite

municipais” no software Arc Sene, foi elaboradas a Carta de Classes Declividade das áreas em

estudo, objetivando caracterizar o grau de inclinação das vertentes, metodologia proposta por De Biasi

(1992). Foram adotadas seis classes de declividade distintas, na qual a primeira classe (inferior ou

igual a 2%) representa as áreas sujeitas a inundações; enquanto a segunda classe (2,01%-5%)

enquadra-se dentro do limite urbano industrial, utilizado em trabalhos de planejamento urbanos

efetuados segundo norma do IPT e Empresa Metropolitana de Planejamento da Grande São Paulo. Já a

classe que abrange as faixas de 5,01%-12% define o limite máximo do emprego de mecanização

agricola. O intervalo entre 12,01%-20% e de 20,01%-30% foi criado para determinar maior

detalhamento para o mapeamento. Procurou-se também neste mapa indicar peculiaridades referentes

ao relevo da área. A ultima classe que envolve todas as áreas acima de 30% seguem as diretrizes da lei

6.766/79, conhecida como Lei Lehmann, a qual define esta como o limite máximo para a urbanização

sem restrições, a partir do qual os parcelamentos do solo deverão seguir diretrizes especificas para

ocupação. No entanto, o maior destaque esta nas áreas da primeira classe (inferior a 2%), as quais

segundo Young apud Oliveira (2006) são consideradas as áreas com maior propensão a inundações.

Elaborou-se também elaboradas a Carta de Compartimentação Geomorfológica, resultante

analise visual de imagens de satélite CBERS de 2004 e da analise e interpretação de fotografias aéreas

de 1962 e 1974, com escala de 1:25.000, fornecidas pela CEPLAC – para os municípios do Estado da

Bahia. A proposta deste mapa foi a delimitação dos principais compartimentos geomorfológicos da

área em questão. Os mapas serão digitalizados com o uso do software Arc GIS 9.3 e organizado na

escala 1:250.000.

Outros mapas temáticos foram adaptados como a Carta de Classes de Solos da Região Costa do

Descobrimento, organizado na escala 1:250.000, e baseados nos levantamentos de campo, e a

utilização de informações contidas no Mapa Pedológico da SEI (2004), Santana et. al. (2002) e CBPM

(2000). A Carta Geológica foi adaptada a partir do Mapa Geológico do Quaternário Costeiro da Bahia

(CPRM, 1980) e o levantamento geológico da região Costa do Descobrimento elaborado pela CBPM

(2000).

A Cartas Uso e Ocupação das Terras foi resultante da analise semi-automático de imagens de

satélite CBERS e LANDSAT-5. Estas foram adquiridas no INPE através de solicitação. Os mapas

foram digitalizados no software Arc Gis 9.3 e organizados na escala 1:250.000.

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A analise dos mapas temáticos e a correção das informações neles contidas, aliadas aos trabalhos

de campo, subsidiaram a elaboração das Cartas de Sistemas Ambientais (Figura 01) proposta por

Rodriguez, Silva e Cavalcanti (2002). Tal carta serve como um documento de identificação de áreas

susceptíveis a ocorrência de processos naturais e/ou fragilizadas pela ação, em decorrência das

características físicas da paisagem.

Figura 01: Mapa de Sistemas Ambientais da Região Costa do Descobrimento (Bahia). Elaboração: Raul Reis Amorim (2009)

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Resultados e Discussões

A aplicação da proposta metodológica desenvolvida por Rodriguez, Silva e Cavalcanti (2002)

fundamentou a delimitação dos 24 Sistemas Ambientais, os quais tiveram os quatro domínios

geomorfológicos como parâmetros essenciais na delimitação de tais sistemas. Assim, definiram-se

Sistemas Ambientais na Planície Quaternária, onde situam-se as planícies fluviais, as planícies

marinha e flúvio-marinha, e os terraços marinhos, além dos Tabuleiros Costeiros, Mares de Morro e

Serras e Depressões.

A planície fluvial corresponde a áreas planas ou levemente inclinadas contendo sedimentos

quaternários de textura, permeabilidade e coesão variáveis. A área segundo os trabalhos de Silva

(1975); Brasil (1987); CBPM (2000); CPRM (2000) e SEI (2004), apontam a seguinte composição

litológica: (a) Depósitos de Leques Aluviais, (b) Depósitos Argilo-Orgânicos, (c) Depósitos Areno-

Argilosos Fluviais; e (d) Depósitos de Areias Lagunares e Estuarinas

Os Depósitos de Leques Aluviais na área em estudo ocorrem apenas na Planície Fluvial do Rio

Jequitinhonha. Estes sedimentos são interpretados como resultado da deposição em leques aluviais no

sopé das encostas do Grupo Barreiras em um período de clima mais árido que o atual.

Os Depósitos Argilo-Orgânicos constituem os sedimentos que se acumularam em associação

áreas que são inundadas ou saturadas por água superficial ou água subterrânea, numa freqüência e

duração suficientes para dar suporte a uma vegetação tipicamente adaptada à vida em condições

saturadas.

Os Depósitos Areno-Argilosos Fluviais são constituídos por sedimentos de diques marginais, de

barras de meandros e de canais abandonados que ocorrem em estreita associação com os principais

rios que deságuam na região. As ocorrências mais expressivas destes depósitos são encontradas na

planície fluvial do rio Jequitinhonha.

E os Depósitos de Areias Lagunares e Estuarinas são constituídos por areias médias a finas, mal

selecionadas que ocorrem no interior de alguns dos grandes vales escavados nos tabuleiros costeiros a

exemplo dos vales dos rios Buranhém e dos Frades.

Nos sedimentos que compõem as planícies fluviais instalam-se processos pedogenéticos que dão

origem aos Neossolos Flúvicos de textura arenosa, areno-argilosa e argilosa, além de coluviões de

textura variável incluindo localmente seixos e blocos, que combinados a uma declividade

extremamente fraca (0 a 2°) favorecem o escoamento subsuperficial, que está ligado à variação de

nível do lençol freático, elevado por ocasião das chuvas. O processo morfogenético predominante é o

escoamento superficial, que provoca movimentos de massa localizados, devido à ausência da cobertura

vegetal natural expondo assim as margens dos rios. Este processo aliado ao menor gradiente dos rios,

que implica numa diminuição da sua competência, e à chegada de detritos provenientes das margens

atingidas por desbarrancamentos, faz com que a maioria dos rios transporte grande quantidade desses

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detritos, por ocasião das grandes enchentes, que leva ao transbordamento do leito e conseqüente

deposição nas margens e nas partes baixas dos terraços, fertilizando o solo e dificultando a evolução da

pedogênese (BRASIL, 1987; SANTANA et al, 2002).

A presença da mata ciliar associada a sistemas agroflorestais de produção (cacau) e pastagens

facilitou a delimitação dos Sistemas Naturais situados na Planície Fluvial (Planície Fluvial com

inundação periódica, Planície Fluvial com sistemas agroflorestais e a Planície Fluvial com diferentes

formas de ocupação).

O sistema Planície Fluvial com inundação periódica apresenta uma área de 96,15 km² o que

corresponde a 1,27%da área total em estudo. As terras úmidas situam-se em áreas com declividades

inferiores a 2%, portanto as áreas mais baixas das planícies fluviais particularmente os grandes vales

escavados nos Tabuleiros Costeiros. Nestas áreas se acumularam sedimentos argilosos ricos em

matéria orgânica e por vezes camadas de turfa com espessura decimétrica. Em profundidade estes

depósitos de terras úmidas podem passar para sedimentos lagunares e estuarinos que se acumularam

durante episódios de nível de mar mais alto que o atual. A cobertura vegetal que ocupa a área é

denominada por CBPM (2000) como vegetação de brejo. As áreas inundáveis nem sempre têm sido

considerados como um recurso natural. Pelo contrário, estas áreas têm sido vistas como locais para

serem drenados, aterrados ou dragados. Todavia as áreas inundáveis desempenham importantes

funções ambientais, tanto do ponto de vista físico quanto biológico: (1) desempenham funções

ecológicas críticas na reprodução, alimentação e descanso de aves aquáticas, de um modo geral, sendo

de extrema importância para as aves aquáticas migratórias; (2) retêm água das chuvas, reduzindo a

severidade das inundações nas áreas vizinhas. Elas também servem como tampões hidrológicos para

reservatórios subterrâneos, liberando água nos períodos secos e armazenando-a nos períodos chuvosos.

O sistema Planície Fluvial com sistemas agroflorestais representa 2,15% da área total da Região

Costa do Descobrimento, e apresenta área de 162,7 km². Este Sistema Ambiental tem como principal

característica a correlação entre o plantio de cacau e a cobertura vegetal natural. Tal sistema de

produção agroflorestal é conhecido como “cabruca”. A presença da “cabruca” restringe-se na Costa do

Descobrimento à Planície do Rio Jequitinhonha. Esta Planície por ser mais ampla que as demais,

permitiu o desenvolvimento de um complexo vegetal composto pela Mata Ciliar e pela Floresta

Ombrófila Densa. O desenvolvimento de tal prática agrícola data do século XIX, onde os agricultores

apenas substituem os extratos inferiores da Mata por pés de cacau. Tal prática agrícola possibilita

apenas a preservação dos extratos superiores da Mata Atlântica, substituindo a vegetação herbácea e

arbustiva por pés de cacau.

O sistema Planície Fluvial com diferentes formas de ocupação é um sistema controlado, pois a

ação antrópica alterou a sua dinâmica natural inserindo novos elementos na sua dinâmica. A área deste

sistema é de 24,87 km², o que corresponde a 333 m² da Região Costa do Descobrimento. A principal

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atividade desenvolvida na área em estudo é o desenvolvimento de pastagens para a criação de gado e o

desenvolvimento da agricultura de subsistência.

A Planície Marinha e Flúvio-Marinha correspondem às acumulações marinha e Flúvio-Marinha

que compõem as feições morfológicas características da faixa litorânea e que englobam os Complexos

Deltaicos, Estuarinos e Praiais, em algumas áreas mantendo relação direta com falésias. Na área existe

uma distinção de modelados como restingas e cordões, dunas, marcas de antigos canais e meandros,

lagunas e manguezais (BRASIL, 1987). Os sedimentos inconsolidados de textura arenosa são

encontrados nas restingas e cordões, cobertas por uma vegetação marinha arbórea, arbustiva e

herbácea, onde se pode averiguar a fraca atuação dos processos pedogenéticos, embora existam

condições para a gênese de solos naturalmente carreados pelas enchentes anuais, como os Neossolos

Quartzarênicos e os Espodossolos (SEI, 2004).

A ação das ondas, correntes e marés provocam uma intensa abrasão e inundações nas áreas

deltaicas, enquanto a ação eólica reativa e acumula as dunas. Estes fatores determinam a

predominância dos processos de erosão e acumulação sobre os de alteração e formação dos solos

(BRASIL, 1987).

Os sistemas ambientais individualizados nas Planícies Flúvio-Marinha deram-se através da

distinção entre a vegetação de mangue, vegetação de restinga, mata atlântica, áreas de inundação e

áreas com uso antrópico, sendo assim delimitados seis sistemas ambientais (Planície Flúvio-Marinha

com inundação periódica; Planície Flúvio-Marinha com manguezais; Vales encaixados com Floresta

Ombrófila Densa primária; Vales encaixados com Floresta Ombrófila Densa secundária; Planície

Flúvio-Marinha com diferentes formas de ocupação e os Fundos de Vale com sistemas agroflorestais).

No Sistema Ambiental Planície Flúvio-Marinha com inundação periódica, situada em

declividades inferiores a 2%, instalou-se processos pedogenéticos que formaram os Neossolos

Flúvicos associados aos Gleissolos, solos estes que são ambientes propícios para o desenvolvimento da

vegetação de brejo, espécies adaptadas ao ambiente hidromórfico.

No Sistema Ambiental Planície Flúvio-Marinha com manguezais, a vegetação de Mangue é

caracterizada pelas áreas sob influências das oscilações das marés, normalmente com Gleissolos, que

ocupam o estuário de certo rios. Ai desenvolve-se uma comunidade seral arbórea (Mangue), cujas

espécies mais freqüentes são bastante homogêneas, repetindo-se ao longo de todo o litoral brasileiro. O

mangue-vermelho (Rhizophora mangle) instala-se preferencialmente próximo a desembocadura dos

rios, ou seja, em locais com maior grau de salinidade formando densos povoamentos, cujos indivíduos

mais altos atingem em torno de 13m. Já o mangue-branco (Laguncularia racemosa) e o mangue-

amarelo (Avicennia germinans) estendem-se pelos baixos cursos dos rios, atingindo grandes distâncias,

como no caso do rio Peruípe, onde esta comunidade foi encontrada a 17 km da foz do referido rio

(BRASIL, 1987).

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Nos Sistemas Ambientais Vales encaixados com Floresta Ombrófila Densa primária; Vales

encaixados com Floresta Ombrófila Densa secundária, a formação Florestal se dá nas encostas dos

vales entalhados no Grupo Barreiras pela ação fluvial, que se instalou nas linhas de falhas tectônicas, e

contou com a colaboração do agente marinho nas sucessivas transgressões marinhas que ocorreram

durante o Pleistoceno e o Holoceno. Tal formação florestal desenvolve-se sobre os Argissolos, solos

que se desenvolvem em encostas, em decorrência dos processos de translocação de argila que formam

o horizonte B textural.

Parte da área que abrangia o Sistema Ambiental Vales encaixados com Floresta Ombrófila

Densa primária sofreu com o processo de antropização alterações na sua dinâmica, assim constituindo

três novos Sistemas Ambientais Controlados: a Planície Flúvio-Marinha com diferentes formas de

ocupação; Fundos de Vale com sistemas agroflorestais; e Vales encaixados com Reflorestamento.

No Sistema Ambiental Planície Flúvio-Marinha com diferentes formas de ocupação, a cobertura

vegetal natural foi substituída por pastagens e cultivos agrícolas como o plantio de mamão e o

desenvolvimento de agricultura de subsistência; enquanto no Sistema Ambiental Fundos de Vale com

sistemas agroflorestais, semelhante ao que ocorreu no Sistema Ambiental Planície Fluvial com

sistemas agroflorestais, há o plantio de cacau mantendo os extratos superiores da Mata Atlântica.

Os Terraços Marinhos são áreas formadas por depósitos sedimentares de origem marinha

situados acima do nível médio atual (GUERRA e GUEERA, 2005). Na área em estudo, formaram-se

os Terraços Marinhos Pleistocênicos, situados entre 6 e 8 metros, situados nas mediações das Planícies

Fluviais dos Rio Jequitinhonha, João de Tiba e Corumbaú-Caraíva ou podem ser identificados nas

linhas de “falésias mortas” esculpidas nos sedimentos do Grupo Barreiras. Os Terraços Marinhos

Holocênicos podem estão situados a uma altitude que varia entre 4,5 a 5m, cuja superfície apresenta

uma declividade em direção à praia atual, ocorrendo nas porções externas das planícies quaternárias.

Tais Terraços podem fazer limite com os Terraços Marinhos Pleistocênicos ou acham-se separados

destes por zonas deprimidas antigamente lagunares. Encontram-se também na região de Porto Seguro,

Terraços Marinhos Holocênicos que estão situados diretamente ao sopé das falésias esculpidas nos

sedimentos do Grupo Barreiras.

Nos Terraços Pleistocênicos segundo Suguio e Martin (1976), a origem marinha destes depósitos

pode ser assegurada pela presença de tubos fossilizados de Callichirus, cuja zona de vida, no caso da

espécie encontrada (Callichirus major), corresponde à zona da maré baixa. Esta origem é também

confirmada por estruturas sedimentares singenéticas, tais como as estratificações cruzadas de baixo

ângulo e espinha-de-peixe. Não foram encontradas conchas de moluscos preservadas nesses

sedimentos, em conseqüência da dissolução dessas pelos ácidos húmicos. Tal ataque deu-se em

decorrência da instalação dos processos pedogenéticos responsáveis pela formação dos Espodossolos

encontrados na área. O horizonte superficial do solo apresenta coloração branca na superfície, e o

horizonte subsuperficial, o B espódico, apresentam em profundidade, comumente, cores acastanhadas

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ou pretas, em conseqüência dos processos de translocação dos ácidos húmicos que lhes confere

também uma coesão moderada. Na superfície, existem vestígios de antigos alinhamentos de cristas

praiais (cordões litorâneos) que apresentam características morfológicas muito particulares (Martin et

al., 1981; Santana et al, 2002).

Ao contrário do que acontece nos depósitos pleistocênicos, foram identificados nos depósitos

holocênicos a presença de conchas de moluscos e raramente são impregnados por ácidos húmicos.

Além da presença de conchas de moluscos marinhos, a origem marinha destes depósitos pode ser

assegurada pela existência de tubos fossilizados de Callichirus e por estruturas sedimentares típicas de

ambiente praial. Nas fotografias aéreas, pode-se observar que a superfície destes terraços é coberta de

alinhamentos muito nítidos de antigas cristas praiais cujas características são bastante diferentes das

existentes na superfície dos terraços pleistocênicos (Martin et al., 1981).

Nos Terraços Marinhos foram individualizados dois Sistemas Ambientais: os Terraços Marinhos

com vegetação de Restinga e os Terraços Marinhos com diferentes formas de ocupação.

No sistema Ambiental Terraços Marinhos com vegetação de Restinga, a Restinga apresenta duas

fisionomias: a arbórea e a herbácea. A sua formação florística é relativamente simples, as árvores e

arvoretas com altura em torno de 7m apresentam copas bastante regulares, submata densa e certa

abundância de epífitas. Em segundo plano têm-se os cordões litorâneos propriamente ditos, raramente

atingidos pelas marés, onde se denominam caméfitas e microfanerófitas (arbustos), caracterizando a

Restinga Arbustiva (scrub). A densidade da vegetação é variável e sempre composta de um estrato

herbáceo de espécies com caules estoloníferos, que confere a esses cordões de pequenas dunas certa

estabilidade. Os solos altamente salinos, aliados a uma temperatura elevada, manifestam-se através de

algumas adaptações morfológicas, que influem na ação fisiológica das plantas, como caules

estoloníferos e rizomas (BRASIL, 1987).

Os Tabuleiros Costeiros coincidem com os sedimentos cenozóicos do Grupo Barreiras,

constituídos de areias e argilas variadas com eventuais linhas de pedra, dispostas em camadas com

espessura variável de conformidade com as ondulações do substrato rochoso, que ocasionalmente

aflora influenciando nas formas do modelado (TRICART e SILVA, 1968).

Os processos desencadeadores do Grupo Barreiras datam do fim do Plioceno. Neste período, a

existência de um clima semi-árido, com chuvas esporádicas e violentas associadas a uma fase de

soerguimento continental (GHIGNONE, 1979), favoreceu a erosão do importante manto de

intemperismo que se teria desenvolvido sobre as rochas do embasamento durante um longo período

úmido anterior.

O material erodido, constituído de sedimentos areno-argilosos pobremente selecionados,

acumulou-se no sopé das encostas sob a forma de uma extensa planície aluvial. Nesta época, o nível do

mar estava em abaixamento, o que permitiu a extensão dessa deposição à plataforma continental

(BIGARELLA e ANDRADE, 1964).

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Atualmente, o Grupo Barreiras distribuem-se desde o sopé das elevações cristalinas do Planalto

Pré-Litorâneo até as planícies quaternárias, em contato localmente estabelecido por paleofalésias ou

por falésias atuais quando se estendem até a atual linha de costa, como ocorre ao sul de Porto Seguro e

ao norte de Prado. É caracterizada pela predominância de feições aplainadas parcialmente conservadas

submetidas a retoques e remanejamentos sucessivos. Essas feições resultam de uma dissecação fluvial

em função de diferentes níveis de bases dados por numerosos rios, dentre eles, destacam-se os rios

Buranhém, Caraíva, Curumbaú, que apresentam um padrão de drenagem paralelo e subparalelo

relacionado com o controle tectônico (GONÇALVES, 1976; ROCHA FILHO, 1976).

As formações superficiais são representadas, predominantemente por colúvios pedogeneizados e

materiais de alteração, que correspondem aos Latossolos e Argissolos de textura argilosa e argilo-

arenosa. Sobre este modelado também são encontradas manchas de Espodossolos (SANTANA et al,

2002). Moreau (2002) levanta algumas hipóteses para a ocorrência de Espodossolos associados à

Latossolos Amarelos em Tabuleiros Costeiros, dentre elas, destaca: a) desenvolvimento a partir de

material das fácies de granulometria grosseira do próprio Barreiras; b) deposição de material arenoso

do quaternário sobre o Barreiras; c) acidólise com destruição de argila e erosão do material mais

arenoso para a parte abaciada com posterior formação do Espodossolo.

Os processos morfogenéticos dos Tabuleiros Costeiros estão diretamente relacionados à elevada

umidade do litoral aliada a declividades muito baixas (inferiores a 5º) somadas ao escoamento freático

que permanece em nível mais elevado, e de escoamento superficial lento.

Nestas áreas os processos morfogenéticos atuam com maior intensidade, provocando nas

encostas uma erosão regressiva, facilitada também pelas propriedades do material e quantidade

elevada de chuva. Outro processo morfogenético de ação antrópica é a extração mineral realizada em

túneis nas encostas, cria pontos de fraqueza, nos quais se instalam os processos erosivos que provocam

movimentos de massa. O material retirado em ambos os casos, é remanejado para a colmotagem dos

vales. Assim, a cobertura vegetal, elevada umidade do litoral, a predominância de solos bem

desenvolvidos e um modelado que não representa essencialmente obstáculos à sua utilização são

características indicativas de uma relativa estabilidade morfodinâmica moderada (BRASIL, 1987).

É possível identificar uma transição entre a Floresta Ombrófila Densa e as Restingas. Analisando

estas áreas a partir dos Tabuleiros Costeiros, em direção à linha de maré mais alta, observa-se que à

medida que os solos vão adquirindo uma cobertura arenosa, a Floresta Ombrófila Densa vai perdendo

sua pujança com árvores passando a ter um aspecto mais xeromorfizado, até atingir solos totalmente

arenosos (Neossolos Quartzarênicos), definindo a Formação de Restinga Arbórea (BRASIL, 1987).

Delimitou-se nos Tabuleiros Costeiros quatro sistemas ambientais: Os tabuleiros Costeiros com

diferentes formas de ocupação, onde a cobertura vegetal natural foi substituída por usos diversos como

a instalação de instalações para atender ao turismo crescente na região, áreas de expansão urbana e

desenvolvimento de atividades agrícolas e pecuaristas; Os Tabuleiros Costeiros com Floresta

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Ombrófila Densa primária, no a cobertura vegetal mantém-se com pouco grau de alteração; o sistema

ambiental adjacente, os Tabuleiros Costeiros com Floresta Ombrófila Densa secundária, onde a Mata

Atlântica passa por processo de regeneração; e o ultimo Sistema Ambiental, os Tabuleiros Costeiros

com Reflorestamento, área que apresenta grande expansão, devido a implantação do pólo de celulose

no Sul da Bahia, que demanda de grandes produções de eucalipto para a obtenção de matéria-prima.

Amorim e Oliveira (2007) fazem uma retrospectiva histórica apontando as principais transformações

nos Sistemas Ambientais situados sobre os Tabuleiros Costeiros, principalmente o avanço da

silvicultura do eucalipto.

Os Mares de Morro e as Serras e Depressões constituem uma superfície intensamente dissecada

e rampeada em direção à costa, registrando altitudes médias no entorno de 350m. Estas unidades

encontram-se submetidas às influências de climas predominantemente úmidos que interferem nos

processos de dissecação e na pedogênese do material superficial. Na área encontram-se profundos

mantos de alteração, favoráveis à evolução de solos profundos, desenvolvidos a partir de rochas

proterozoícas constituídas principalmente de metatexistos, granitos, biotita xistos, quartzo-biotita

xistos a gnaisses e também de coberturas detríticas cenozóicas do Grupo Barreiras (BRASIL, 1987;

SEI, 2004).

No domínio dos Mares de Morro predominam rochas do Complexo Gnáissico-Granítico e do

Complexo Kinzigítico, enquanto no domínio das Serras e Depressões predominam rochas do Grupo

Macaúbas e do Grupo Rio Pardo, datadas do proterozóico superior (CBMP, 2000).

As condições morfogenéticas caracterizadas pelas ações químicas e pela intensidade da

dissecação fluvial camuflam os traços estruturais que se refletem na orientação da drenagem, em

direção noroeste-sudeste, sugerindo fraturas e falhas; de segmentos de canais retilíneos ou

eventualmente marcados por angulosidades; de margens posicionadas em diferentes níveis

constituindo vales dissimétricos; de bordas em desniveladas em relação aos Tabuleiros Costeiros; e

também pontões e cristas relacionadas às rochas do embasamento arqueano (GONÇALVES, 1976;

ROCHA FILHO, 1976; BRASIL, 1987).

As encostas mostram-se geralmente convexas apresentando declividades em torno 2 a 11%,

acusando índices mais fortes em torno de 24% e até mais áreas mais elevadas onde os entalhes são

mais profundos. Entremeando-se a estas feições ocorrem formas aguçadas, resultantes de dissecação

diferencial, relacionadas às rochas do embasamento, que ocasionalmente afloram em alguns trechos

próximos das drenagens e nos pontões, linhas de cumeadas e cristas, que se destacam das elevações

residuais. Os topos dessas feições mostram-se geralmente concordantes com relevos da unidade

adjacente. As formas semiconservadas correspondem a restos de coberturas detríticas cenozóicas do

Grupo Barreiras, que constituem topos nivelados dissecados por vales que apresentam controle

estrutural. Essas coberturas alcançam 3 a 4 m de espessura, mostrando-se predominantemente

grosseiras, formando na base cerca de 1 m de conglomerado ferrífero. Sua origem deve-se

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provavelmente a remobilização do material de alteração das rochas do embasamento, cuja deposição é

supostamente anterior ao escavamento dos vales, constituindo ainda colúvios de cor avermelhada

sobre a rocha alterada apresentando geralmente linhas de seixos na base. Observa-se ainda que os

domínios geomorfológicos apresentam elevada susceptibilidade a processos erosivos (BRASIL, 1987).

Sobre as formas abordadas anteriormente encontra-se a Floresta Ombrófila Densa. A mata

formada em grande parte por indivíduos de regeneração arbórea dominante distribui-se

espaçadamente, permitindo até certo ponto uma fácil locomoção no interior da floresta. As lianas e

epífitas não são abundantes e praticamente inexiste um tapete gramíneo-lenhoso baixo (BRASIL,

1987).

Já a Mata Atlântica na área está situada na área onde o clima apresenta duas estações definidas,

uma chuvosa e outra seca. Este clima acarreta uma estacionalidade foliar dos elementos arbóreos

dominantes, os quais têm adaptações à deficiência hídrica. A porcentagem das árvores caducifólias no

conjunto florestal e não das espécies que perdem folhas individualmente deve situar-se em torno de

20% na época desfavorável. A área é caracterizada por um período seco que varia de 90 a 120 dias, em

áreas dissecadas do Pré-Cambriano e umas poucas do Quaternário Recente (aluviais), em altitudes

variáveis entre 200 e 500 m. Via de regra, a classe de solo dominante é Argissolo Vermelho-Amarelo,

com grande capacidade de retenção de água, o que permite em alguns locais uma amplitude maior do

período de estiagem (Figura 04) (BRASIL, 1987).

Delimitou-se nos domínios dos Mares de Morro, três Sistemas Ambientais e no domínio das

Serras e Depressões, quatro Sistemas Ambientais.

No domínio dos Mares de Morros abrangem apenas 4,65% da área total da Região Costa do

Descobrimento. Nestes domínios situam-se os Sistemas Ambientais Mares de Morro com Floresta

Ombrófila Densa Primária e Secundária, onde as encostas encontram-se cobertas pela mata, ou em

estado nativo, como no entorno do Parque Nacional Monte Pascoal ou em estágio de regeneração. Ao

entorno desses Sistemas Ambientais, ocorreram a instalação de práticas agrícolas que alteraram toda a

dinâmica dos Sistemas, formando assim um Sistema Ambiental Controlado denominado de Mares de

Morro com diferentes formas de ocupação.

Nos domínios das Serras e Depressões, situam-se quatro Sistemas Ambientais que abrangem

5,75% da área de Região Costa do Descobrimento. Nas áreas mais rebaixadas de vales encaixados,

encontram-se os Sistemas Ambientais Serras e Depressões com inundações periódicas, que apresentam

baixo potencial de uso econômico, mantendo-se assim um grau de estabilidade bastante significativo.

Adjacentes a esses Sistemas, desenvolvem-se nos setores de encosta e nas áreas de topo os Sistemas

Ambientais Serras e Depressões com Floresta Ombrófila Densa Primária e Secundária. As áreas em

que se instalaram as atividades agrícolas, alterando a dinâmica dos Sistemas Ambientais, formam-se

hoje os Sistemas Ambientais Serras e Depressões com diferentes formas de ocupação.

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Considerações Finais

A Região Costa do Descobrimento apresenta quatro grandes compartimentos geomorfológicos que apresentam grande influência dos aspectos estruturais e apresentam dinâmica morfogenética totalmente distinta.

O processo de ocupação da Região Costa do Descobrimento nos últimos 40 anos vêm alterando a dinâmica dos Sistemas Naturais, principalmente com a retirada da cobertura vegetal para a instalação de diversas atividades econômicas que causam a degradação socioambiental da área. Podem-se identificar algumas conseqüências mais marcantes para a região: a devastação da Mata Atlântica; o uso inadequado do solo; o crescimento acelerado da população; agravamento da fragilidade ambiental; e o crescimento e surgimento de novas cidades, levando a região a atingir o maior índice de urbanização do Estado. A ocupação desordenada da região pela expansão agrícola, consolidação dos empreendimentos industriais e turísticos têm ocasionado uma nova territorialidade regional intensificam as desigualdades socioespaciais e a fragilidade ambiental natural. Referências Bibliográficas AMORIM, R. R. Análise Geoambiental com ênfase aos setores de encosta da área urbana do município de São Vicente-SP. 2007. 194p. (Mestrado em Geografia), Universidade Estadual de Campinas, Campinas. 2007. AMORIM, R. R.; OLIVEIRA, R. C. Degradação ambiental e novas territorialidades no extremo sul da Bahia. Caminhos de Geografia. Uberlândia v. 8, n. 22 set/2007 p. 18 – 37. BIGARELLA, J.J., ANDRADE, G.O. Considerações sobre a estratigrafia dos sedimentos cenozóicos em Pernambuco (Grupo Barreiras). Arquivo do Instituto de Ciências da Terra, Recife, n. 2, p. 2-14, 1964. BRASIL. Folha SE 24 Rio Doce: geologia, geomorfologia, pedologia, vegetação, uso potencial da terra. IBGE. Rio de Janeiro, 1987. CAR. COMPANHIA DE DESENVOLVIMENTO E AÇÃO REGIONAL (BA.) Política de DIAS, N. J. Os impactos da moderna indústria no Extremo Sul da Bahia: expectativas e frustrações. Bahia análise & dados. Salvador. SEI v.10 n.4. p. 320-325. Mar/2001. GHIGNONE, J.I. Geologia dos sedimentos fanerozóicos do estado da Bahia. In: INDA, H. (Ed.). Geologia e recursos minerais do estado da Bahia. Salvador: CPM, 1979. (Textos básicos, v.1). p.24-117. GONÇALVES, E. Geologia e Recursos Minerais. Rio de Janeiro: Cartográfica Cruzeiro do Sul, 1976. 142p. (Diagnóstico sócio-econômico da região cacaueira). LEÃO, S. Espacialização e Expansão da Territorialidade Baiana na Próxima Década. Bahia Análise & Dados. Salvador. SEI. nº02/03. 70-85p. Set/Dez, 1998. MARTIN, L., BITTENCOURT, A.C.S.P., VILAS BOAS, G.S. Differenciation sur photographies aériennes des terrasses sableuses pléistocènes et holocènes de l’État de Bahia (Brésil). Photointerpretation, v.20, n. 3, p. 4.5.1-4.5.10, 1981. RIBEIRO, E. M.; GALIZONI, F. M. Sistemas agrários, recursos naturais e migrações no alto Jequitinhonha, Minas Gerais. In: TORRES, H; COSTA, H. (org) População e meio ambiente: debates e desafios. São Paulo: Editora SENAC, 2000.

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