sequÊncia didÁtica com o gÊnero discursivo … · pela especificidade de uma esfera de...
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SEQUÊNCIA DIDÁTICA COM O GÊNERO DISCURSIVO CRÔNICA: AMPLIANDO
CONHECIMENTOS
Laura Fátima TREMEA1
Terezinha da Conceição COSTA-HUBES2
RESUMO
Tendo em vista a perspectiva de que os gêneros discursivos constituem-se como instrumentos de mediação no ensino-aprendizagem da Língua Portuguesa, torna-se importante encontrar novos caminhos para ensiná-los, buscando atividades interativas em sala de aula, as quais propiciem a valorização da leitura, da oralidade e da escrita, conduzindo os alunos a produzir textos, colocando-se como autores diante daquilo que escrevem. Pautando-se em Bakhtin (1992), Bronckart (1999), Marcuschi (2003), dentre outros, pretende-se apresentar a metodologia da Sequência Didática, conforme Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004), seguindo a adaptação proposta por Costa-Hübes (2008), como um encaminhamento metodológico possível para desenvolver atividades críticas de leitura com o gênero discursivo crônica. Esse gênero foi selecionado pelo fato de apresentar um conteúdo leve, acessível, com uma pitada de humor ou lirismo, crítica ou ironia. Assim, essa proposta de pesquisa tem como objetivo refletir, à luz do sociointeracionismo, a qual reconhece a natureza social da linguagem como produto de uma necessidade histórica do homem de organizar-se socialmente, de trocar experiências com outros indivíduos e de adquirir e produzir novos conhecimentos sobre o trabalho com o gênero em sala de aula, mais especificamente, com alunos da 8ª série do Ensino Fundamental, ampliando seus conhecimentos sobre a função social, o contexto de produção, a estrutura composicional e as marcas linguísticas (ou estilo) do gênero discursivo crônica.
PALAVRAS-CHAVE: Leitura, Gênero Discursivo Crônica, Sequência Didática
1 Professora PDE/2012 do QPM (Quadro Próprio do Magistério) da Rede Pública Estadual do Estado
do Paraná. O texto é resultado da implementação de atividades de conclusão do PDE/2012 – Programa de Desenvolvimento Educacional da SEED – Secretaria Estadual de Educação – realizado na Unioeste, Cascavel/PR. [email protected] 2 Professora Orientadora, Doutora em Estudos da Linguagem pela Universidade Estadual de
Londrina. Docente do Curso de Letras e do Mestrado e Doutorado em Letras da Unioeste – Universidade Estadual do Oeste do Paraná, campus de Cascavel/PR. [email protected]
1 INTRODUÇÃO
Neste artigo, pretendemos apresentar o estudo e as atividades realizadas por
meio do Projeto de Implementação Pedagógica com o tema “Sequência Didática
com o gênero discursivo crônica: ampliando conhecimentos”, desenvolvido com
alunos da 8ª série do Ensino Fundamental do Colégio Estadual Júlio Giongo –
Ensino Fundamental, Médio e Normal do município de Pranchita - PR, como uma
das atividades desenvolvidas dentro do Programa de Desenvolvimento Educacional
do Paraná – PDE. Para isso, traçamos, como objetivo geral, o propósito de propiciar
ao aluno o conhecimento dos gêneros discursivos, buscando uma efetiva
progressão no trabalho com a linguagem oral e escrita, por meio da metodologia da
Sequência Didática, como um encaminhamento possível na efetivação de uma
abordagem prática a partir do gênero crônica.
A concepção de linguagem que orientou esta proposta metodológica de
trabalho com a língua é a do sociointeracionismo, a qual reconhece a natureza
social da linguagem como produto de uma necessidade histórica do homem de
organizar-se socialmente, de trocar experiências com outros indivíduos e de adquirir
e de produzir novos conhecimentos.
Considerar a natureza social da linguagem e o caráter dialógico e interacional
da língua, significa reconhecer os gêneros como a materialização da interação entre
os sujeitos. Nesse sentido, se quisermos realmente garantir aos alunos o verdadeiro
domínio da linguagem, o trabalho com o gênero, no ensino da língua torna-se
essencial. Logo, sabendo que os gêneros discursivos constituem-se como
instrumentos de mediação de toda a estratégia para o ensino de Língua Portuguesa,
procuramos encontrar outros caminhos para ensiná-los, buscando desenvolver
atividades que propiciem a valorização da leitura, da oralidade e da escrita, de forma
que os alunos possam produzir textos, colocando-se como autores diante daquilo
que escrevem.
Partindo desse pressuposto, o gênero crônica foi selecionado, nessa
pesquisa, por tratar-se de um gênero que provoca reflexão, devido a sua função
social de crítica ou ironia perante fatos do cotidiano. Nesse caso, é função também
da escola provocar o aluno a refletir criticamente, ou representar ironicamente os
fatos vivenciados no dia a dia. Mais do que isso: é importante que ele saiba ler e
interpretar esses textos, fazendo inferenciações, lendo os implícitos, reconhecendo a
sua função social, seu contexto de produção, sua estrutura composicional e suas
marcas linguísticas, provocadoras de tais reflexões.
Pautando-nos em Bakhtin (1992), Bronckart (2003), Marcuschi (2003), dentre
outros, elaboramos uma Sequência Didática (doravante, SD), conforme Dolz,
Noverraz e Schneuwly (2004), seguindo a adaptação proposta por Costa-Hübes
(2008), com o gênero discursivo crônica, sobre a qual discorreremos neste texto,
relatando essa experiência de implementação pedagógica. Antes, porém,
apresentaremos uma breve reflexão teórica sobre os gêneros e, mais
especificamente, sobre o gênero crônica para, em seguida, conceituaremos a
metodologia da SD.
2 O QUE SÃO GÊNEROS DO DISCURSO
As Diretrizes Curriculares da Educação Básica do Estado do Paraná (de ora
em diante, DCE) (PARANÁ, 2008) abordam o ato de ler como estabelecedor de
relações dialógicas, de interação, de construção de sentidos, sendo, portanto,
indispensável para qualquer cidadão, uma vez que oportuniza diversas
possibilidades de perceber e analisar o mundo, bem como de identificar o outro. Na
ótica das DCE:
[...] compreende-se a leitura como um ato dialógico, interlocutivo, que envolve demandas sociais, históricas, políticas, econômicas, pedagógicas e ideológicas de determinado momento. Ao ler, o indivíduo busca as suas experiências, os seus conhecimentos prévios, a sua formação familiar, religiosa, cultural, enfim, as várias vozes que o constituem (PARANÁ, 2008, p.56).
Compartilhando dessa ideia, entendemos que por meio da leitura podemos
formar um cidadão reflexivo, crítico, ativo, com consciência e autonomia, capaz de
pensar e interferir no meio onde vive, transformando a realidade que o cerca. A
leitura instrumentaliza o ser humano para a vida, resgatando-o do mundo da
alienação. Sendo assim, ela se torna uma prática imprescindível para promover um
contexto educacional diferenciado e eficiente. Por meio desta prática, é possível
oferecer uma educação que atinja o desenvolvimento integral do aluno, já que a
leitura amplia a dimensão social do homem, contribuindo para a construção de um
conhecimento amplo, profundo, satisfatório, constituindo-se numa ferramenta
necessária para transformar a educação que está acontecendo, na educação que
desejamos ver acontecer.
Todavia para que esta prática de leitura se efetive, é relevante que o
educando esteja em contato com os mais diversos gêneros discursivos, à medida
que cada um deles mostrar-lhe-á um lado novo, um olhar diferente deste
relacionamento texto-mundo. O trabalho com os gêneros, portanto, deverá levar em
conta que a língua é instrumento de poder e que o acesso a ele, ou sua crítica, é
legítimo e é direito de todo cidadão.
Adotar os gêneros textuais/discursivos como objeto de estudo da Língua
Portuguesa implica, primeiramente, em considerar a natureza social da linguagem e
o caráter dialógico e interacional da língua e ter clareza da concepção teórica
norteadora do trabalho com o texto, ou seja, a concepção sociointeracionista. Essa
compreensão de linguagem faz uma abordagem de língua sustentada nos estudos
bakhtinianos que compreendem a interação entre os sujeitos que, por meio da
língua, elaboram enunciados concretos e únicos, sejam eles orais ou escritos que,
segundo Bakhtin (1997), revelam a esfera social à qual pertencem, atendendo a
diferentes necessidades de interlocução.
Cada esfera social tem um discurso específico e que a representa nas
diferentes situações discursivas. Esses discursos concretizam-se nos mais variados
textos socialmente construídos, denominados por Bakhtin (1992) de gêneros do
discurso e por Bronckart (2003) de gêneros textuais.
Para Bakhtin:
[...] cada esfera de utilização da língua elabora seus tipos relativamente estáveis de enunciados, sendo isso que denominamos gêneros do discurso. A riqueza e a variedade dos gêneros do discurso são infinitas, pois a variedade virtual da atividade humana é inesgotável, e cada esfera dessa atividade comporta um repertório de gêneros do discurso que vai diferenciando-se e ampliando-se à medida que a própria esfera se desenvolve e fica mais complexa (BAKHTIN, 1997, p.279).
Diante do exposto, entendemos que os gêneros discursivos são textos que
circulam na sociedade presentes em nosso dia a dia, que nascem da necessidade
de um grupo. Espalhados nos mais diversos lugares, encontraremos um texto de um
determinado gênero, nos informando, instruindo, persuadindo, ensinando, entre
tantas funções sociais que tais discursos exercem.
Os tipos relativamente estáveis de enunciados são denominados gêneros
discursivos. A definição de gênero, compreendendo a mobilidade, a dinâmica, a
fluidez, a imprecisão da linguagem, não aprisiona os textos em determinadas
propriedades formais, conforme explica Bakthin:
O enunciado reflete as condições específicas e as finalidades de cada uma das esferas, não só por seu conteúdo (temático) e por seu estilo verbal, ou seja, para seleção operada nos recursos da língua – recursos lexicais, fraseológicos e gramaticais, mas também, e, sobretudo, por sua construção composicional. Estes três elementos (conteúdo temático, estilo e construção composicional) fundem-se indissoluvelmente no todo do enunciado e todos eles são marcados pela especificidade de uma esfera de comunicação. Qualquer enunciado considerado isoladamente é, claro, individual, mas cada esfera de utilização da língua elabora seus tipos relativamente estáveis de enunciados, sendo isso que denominamos gêneros do discurso (1992, p.279).
Parafraseando esse pressuposto bakhtiniano, os gêneros se constituem
historicamente a partir de novas situações de interação verbal da vida social que vão
se estabilizando, no interior das diferentes esferas sociais, tanto nas circunstâncias
da comunicação verbal espontânea da vida cotidiana, em que se constituem os
gêneros primários, como nas circunstâncias de comunicação cultural mais
complexas e evoluídas, em que se produzem os gêneros secundários. Os gêneros
primários (diálogo entre familiares, bilhete, e-mail entre outro) compreendem os tipos
de interação espontâneas, mais próprias da linguagem do cotidiano. Os gêneros
secundários (romance, a tese acadêmica, o artigo de opinião, a petição judiciária
entre outros) são aqueles que absorvem e transmutam os gêneros primários e para
a sua produção, necessitando de capacidades de linguagem mais complexas.
Para Marcuschi (2003), confirmando os pressupostos bakthinianos, os
gêneros são os textos materializados que encontramos em nosso cotidiano e que
apresentam características sociocomunicativas definidas por conteúdos,
propriedades funcionais, estilo e composição. Marcushi diz ainda, que “é por meio
dos gêneros, ou seja, de um texto, que acontece a comunicação humana, sendo
assim a comunicação verbal só é possível por algum gênero textual” (MARCUSCHI,
2003, p.22).
Bronckart (2003) considera os textos produtos da atividade de linguagem
humana e conceituados em função de seus objetivos. Apoiado em Bakthin,
Bronckart, define os gêneros textuais a partir das sequências “relativamente
estáveis”, que se moldam de acordo com a atividade linguística e discursiva em que
os interlocutores estão inseridos. Desse modo, os gêneros podem ser considerados
como verdadeiras ferramentas no cumprimento de determinadas funções na área da
comunicação humana. Essa ideia é reforçada pelo autor, ao afirmar que:
[...] reconhecemos que há, de fato, claramente, um uso trivial da noção de discurso (discurso publicitário, discurso literário, etc.) e que é de acordo com esse uso que se forjaram os conceitos mais científicos de atividade discursiva, de formação discursiva, de gêneros do discurso, etc. Mas parece, na verdade, que essa acepção do termo designa a atividade de linguagem considerada em seu contexto social, antes de sua realização em formas textuais. (BRONCKART, 2003, p.149).
É possível constatar que há um grande número de gêneros a serviço do
homem; e que é impossível uma situação de interação verbal que não tenha como
instrumento um gênero discursivo. Diante disso, uma vez que o objetivo da atividade
de produção escrita em sala de aula é desenvolver a competência do aluno no uso
da língua, é necessário priorizar essas situações de interação, o que torna o trabalho
com a diversidade de gêneros imprescindível e, por essa razão, não deve ser restrito
apenas às atividades de leitura, de discussão que precede a atividade escrita.
Trabalhar na perspectiva dos gêneros discursivos não parece tarefa fácil,
principalmente se entendemos a infinidade de textos que circulam na sociedade, a
flexibilidade e a dinamicidade em que lhes são inerentes, porém antes de
focalizarmos um possível encaminhamento metodológico de trabalho, abordaremos
o gênero discursivo crônica, objeto deste estudo.
2.1 O Gênero Discursivo Crônica
A origem da palavra crônica está em Krónos, deus grego do tempo, que gera
a ideia de momento, de oportunidade e de atualidade, fatores que vão constituir o
cerne da crônica. Sua estrutura foi se modificando por fazer parte dos jornais, pois
ganhou não apenas uma nova sintaxe como também uma forma mais poética e
literária de ficção, por meio da qual os acontecimentos relatados poderiam ser a
recriação do real ou a imaginação do autor.
Segundo Sá:
[...] o cronista age de maneira mais solta, dando a impressão de que pretende apenas ficar na superfície de seus próprios comentários, sem ter sequer a preocupação de colocar-se na pele de um narrador, que é, principalmente, personagem ficcional (como acontece nos contos, novelas e romances). Assim, quem narra uma crônica é seu autor mesmo, e tudo o que ele diz parece ter acontecido de fato, como se nós, leitores, estivéssemos diante de uma reportagem (1985, p.09).
No entanto é preciso ter bem claro que a crônica, assim como o conto, o
romance, a novela, o poema e o drama, é um texto narrativo e literário e o cronista
utiliza-se da linguagem poética, bem como explora todas as outras potencialidades
da linguagem de modo a proporcionar uma plurissignificação. A habilidade do
cronista consiste em saber driblar a transitoriedade do fato; em trabalhar bem com a
linguística do espaço do jornal; em trabalhar rapidamente, visto que normalmente as
crônicas são publicadas diariamente e, ainda, acompanhar o ritmo extremamente
ágil do cotidiano. Nesse sentido, o texto apresenta-se mais leve, muito próximo da
oralidade e do tom coloquial. Aparentemente simples, o texto precisa ser bem
elaborado, e pode ser crítico, lírico, humorístico, intimista, ou filosófico, desde que
capte os breves instantes importantes da vida diária e os transforme em arte.
Um dos aspectos importantes da crônica moderna é o hibridismo, pois nela
pode apresentar-se o poema; o poema em prosa; a anedota; entre outros,
mesclados à narrativa ou constituindo a própria narrativa, ampliando seu valor
estético à medida do requinte estilístico do seu criador.
No século XIX, com o desenvolvimento da imprensa, a crônica passou a fazer parte dos jornais. Com isso, a crônica jornalística surgiu em 1799 no Journal de Débats, em Paris, onde os textos
faziam o comentário de aspectos importantes que haviam ocorrido durante a semana, os quais eram publicados no rodapé dos jornais, chamados “folhetins” (SÁ,1985, p.06).
Para Sá (1985) a crônica perdeu a extensão da Carta de Caminha, mas
conservou o aspecto do registro do circunstancial, realizado por um “narrador-
repórter” que agora faz o relato para muitos leitores. No Brasil, a condição do
narrador-repórter e a estrutura da crônica se modificaram a partir de João do Rio,
pseudônimo de Paulo Barreto que, em vez de ficar na redação do jornal à espera de
uma notícia, foi buscar os fatos in loco. Com isso, a crônica sofreu uma modificação,
pois ganhou não apenas uma nova sintaxe como também uma forma mais poética e
literária, já que João do Rio, muitas vezes ficcionalizava a história, criando
personagens, onde os acontecimentos relatados poderiam ser a recriação do real,
ou a imaginação do autor.
Candido relata que “no Brasil a crônica chegou na segunda metade do
século XIX e José de Alencar foi um dos autores que produziu este tipo de texto, no
período mencionado por Machado de Assis” (CANDIDO, 1992, p.08). Alguns
registros constam que foi no decênio de 1930 que a crônica moderna se definiu,
quando ser afirmaram Mário de Andrade, Manuel Bandeira, Carlos Drummond de
Andrade, e destacou-se o principal escritor neste gênero, Rubem Braga. Nos anos
40 e 50 surgiram outros cronistas, dentre estes, Fernando Sabino e Paulo Mendes
Campos.
Sendo assim, estudar o gênero crônica para refletir sobre sua função social,
seu contexto de produção e as marcas linguísticas que a constituem, é uma forma
de proporcionar que o estudo da Língua Portuguesa, na sala de aula, volte-se para
questões reais que envolvem o uso da língua. Portanto, torna-se imprescindível na
formação de sujeitos reflexivos, criar situações que favoreçam a leitura-responsiva.
Nesse sentido ressaltamos a importância do estudo e do reconhecimento desse
gênero, por meio da aplicação da metodologia da SD.
3 A METODOLOGIA DA SEQUÊNCIA DIDÁTICA (SD)
Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004), pesquisadores suíços, sugerem a
elaboração de SD como uma das possibilidades metodológicas de trabalho com
determinado gênero. Quanto a esse procedimento, os autores esclarecem que se
trata de “um conjunto de atividades escolares organizadas de maneira sistemática,
em torno de um gênero textual oral ou escrito” (DOLZ, NOVERRAZ e SCHNEUWLY
2004, p.97) e que “a definição dos objetivos de uma SD deve adaptar-se às
capacidades e às dificuldades dos alunos nela engajados” (DOLZ, NOVERRAZ e
SCHNEUWLY 2004, p.53). Para tal concretização, os autores apresentam o
seguinte encaminhamento:
FIGURA 1 – Esquema da Sequência Didática, FONTE: Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p.98)
Conforme explica Costa-Hübes (2009), essa orientação metodológica
organiza-se da seguinte forma: inicia-se normalmente pela apresentação da
situação, detalhando as tarefas que os alunos realizarão para promover uma
situação de interação por meio de um gênero selecionado, seguidas pela produção
de um texto inicial, o qual servirá de referência para diagnosticar as dificuldades
dos alunos e a partir daí, definir os encaminhamentos que o professor deverá seguir.
Após o levantamento das principais dificuldades feitas a partir dos textos dos alunos,
parte-se para os módulos de atividades diversificadas, que contemplarão os
diversos elementos constituintes do gênero em estudo, bem como outras
dificuldades levantadas relacionadas ao domínio da língua. A SD é finalizada com
outra produção, a qual dará ao aluno a oportunidade de expor o que foi trabalhado
nos módulos. A Avaliação, dessa forma, constitui-se de forma contínua e cumulativa,
Módulo
1
Módulo
n
Módulo
2
Produção Final
Produção inicial
Apresentação
da situação
uma vez que leva em consideração todo o processo desenvolvido ao longo da
sequência, a qual é aplicável tanto ao trabalho com a escrita, quanto com a
oralidade.
Se, conforme os próprios autores, a SD não pode ser vista como algo
fechado, ou seja, como um manual pronto e acabado, optamos pela adaptação
desse procedimento teórico-metodológico (fig.2), organizada por Costa-Hübes
(2008) e representado no esquema abaixo:
Nessa proposta de adaptação, a autora insere um módulo de
“reconhecimento do gênero” antes da produção inicial, pois entende que por meio de
pesquisa, leitura e análise de textos do gênero, que já se encontram prontos na
sociedade, o aluno terá melhores condições de produzir seu texto inicial. Esse
módulo, na verdade, cria condições para que o aluno leia e tenha contato com textos
do gênero, possibilitando-lhe maior familiarização com o gênero que está sendo
trabalhado.
Assim, o procedimento adotado orienta-se a partir do seguinte quadro:
A SD, então, define-se como um conjunto de atividades de ensino,
focalizando um gênero específico. É planejada progressivamente, com objetivos
delimitados, elaborados a partir de atividades de linguagem que propiciam a
construção de conhecimento oral ou escrito sobre o gênero abordado.
Para melhor exemplificarmos essa proposta de trabalho, descrevemos, em
seguida, a aplicação de uma SD realizada com alunos do Ensino Fundamental,
focalizando o gênero crônica. Essa metodologia também foi trabalhada com o grupo
de professores participantes do GTR, os quais demonstraram interesse, participando
ativamente de todas as atividades propostas concordando que este é um caminho
possível no trabalho com os gêneros. Ao mesmo tempo em que descrevemos as
atividades, apresentaremos algumas considerações, destacando aspectos
relevantes dessa experiência teórico-metodológica de ensino.
4 UMA EXPERIÊNCIA COM O GÊNERO DISCURSIVO CRÔNICA
Lembramos que o gênero crônica foi selecionado para trabalhar com turmas
de 8ª série do Ensino Fundamental, com o objetivo central de, além do
reconhecimento do gênero quanto a sua função social, seu contexto de produção e
seu estilo, avaliar a sua temática perante os fatos do cotidiano, buscando uma
efetiva progressão no trabalho com a linguagem oral e escrita por meio da SD, como
um encaminhamento possível para desenvolver atividades críticas de leitura com o
gênero crônica.
As atividades com esse gênero obedeceram à seguinte ordem de
planejamento:
A) Apresentação e seleção do gênero textual discursivo crônica: Para envolver
os alunos em uma situação real de interação por meio do gênero crônica, foi
apresentado o Projeto de Intervenção Pedagógica, com a finalidade de motivá-los a
produzirem um texto do gênero, que faria parte de uma Mostra de crônicas nos
murais da escola e que posteriormente seriam reunidos em um livro, o qual ficaria
disponível na biblioteca da escola e na biblioteca pública do município.
B) Reconhecimento do gênero por meio de atividade de pesquisa: O trabalho
com a crônica partiu de um reconhecimento do mesmo, fazendo um levantamento
prévio, por meio de indagações sobre os conhecimentos que os alunos possuíam a
respeito desse gênero. As perguntas direcionadas à turma, as quais serviram
também como motivação e estímulo nessa proposta de trabalho, foram as seguintes:
Vocês sabem o que é uma crônica?
Já leram algumas? (neste momento, listamos o nome das crônicas no quadro,
conforme os alunos iam falando).
Onde e quem lhe proporcionou a leitura?
Quem produz textos desse gênero?
Quais os locais de circulação da crônica?
A qual público se destina?
Quais as características deste gênero?
Os alunos foram ouvidos com atenção, oportunizando, dessa forma, diálogos
e reflexões sobre as respostas apresentadas. As respostas orais demonstraram que
a maioria dos alunos já possuía algum conhecimento sobre o gênero crônica, pois
responderam e participaram ativamente, complementando as respostas,
contribuindo, dessa forma, para um melhor reconhecimento do gênero.
Com o propósito de propiciarmos maior conhecimento do gênero em estudo,
encaminhamos os alunos à biblioteca e à sala de informática para pesquisa e leitura
de crônicas, sempre falando do contexto de produção (autor, data de publicação,
local, editora, etc.). As características mais comuns desse gênero também foram
observadas e identificadas. Além de destacar as características do gênero,
questionamos quanto ao contexto de produção de alguns textos do gênero crônica.
Vejamos as questões:
Quem é o autor deste texto? Alguém conhece este autor? Já leu outro(s)
textos(s) relativo(s) a ele? O que mais sabem sobre este autor?
Quando esses textos foram produzidos? Quem os produziu?
Onde foram publicados?
Com qual objetivo foram publicados?
Quem são, geralmente, os leitores destes textos?
Entendendo que a pesquisa favorece o processo de ensino/aprendizagem,
propiciamos, ainda, outro momento de investigação, quando os alunos foram
orientados a buscarem maiores informações sobre o gênero em estudo, conhecendo
a sua sócio-história, suas características, os diversos tipos de crônicas, os principais
cronistas modernos e contemporâneos com suas respectivas biografias. As
pesquisas foram apresentadas em sala de aula, a partir das quais confeccionaram
painéis para exposição na sala, sociabilizando, dessa forma, o conhecimento. Se
entendemos que a linguagem é um fenômeno social, que se desenvolve a partir da
necessidade de interação entre os homens, cabe à escola criar situações para
promoção da linguagem. Com essa atividade de socialização do conhecimento
apreendido, pretendíamos enfatizar, ainda mais, que a língua é social e, portanto,
para aprendê-la, é preciso interação. Conforme Bakhtin:
A verdadeira substância da língua não é constituída por um sistema abstrato de formas linguísticas nem pela enunciação monológica isolada, nem pelo ato psicofisiológico de sua produção, mas pelo fenômeno social da interação verbal, realizada através da enunciação ou das enunciações. A interação verbal constituí assim a realidade fundamental da língua (1997, p.123).
Dessa forma, defendemos, junto aos alunos que é no processo de interação
que a palavra significa, pois o ato de fala é de natureza social.
C) Reconhecimento do gênero por meio de atividades de leitura: Ainda dentro
do módulo de reconhecimento do gênero, oportunizamos situações de leitura em
que o aluno teve a oportunidade de se familiarizar e conhecer melhor o gênero
crônica, percebendo, com maior clareza, as características principais e o contexto de
produção, pois, segundo as DCE,
É tarefa da escola possibilitar que seus alunos participem de diferentes práticas sociais que utilizem a leitura, a oralidade e a escrita, com a finalidade de inseri-los nas diversas esferas de interação. Se a escola desconsiderar esse papel, o sujeito ficara à margem dos novos letramentos, não conseguindo se constituir no âmbito de uma sociedade letrada (PARANÁ, 2008, p.48).
Sugerimos, então, a leitura de quatro crônicas que circulam socialmente
dentre as amostras existentes:
Textos Títulos Autores Publicação/circulação
01 A última crônica Fernando Sabino Disponível em: CEREJA, William. R. MAGALHÃES, Tereza C. Português Linguagens. Cidade: Editora, 2010, p. 58- 59. v III.
02 A cadeira do dentista Carlos Eduardo
Novaes
Carlos Eduardo Novaes. A cadeira do dentista – Para gostar de ler.8.ed. São Paulo: Ática, 2009. p.53-5.
03 O mar Rubem Braga BRAGA, Rubem. O conde e o passarinho. Rio
de Janeiro: Editora do Autor.
04 Tire fotos, muitas fotos! Deusa Urbana Disponível em:
http://www.recantodasletras.com.b
A título de exemplo, apresentamos algumas das atividades de leitura
desenvolvidas sobre o contexto de produção e sobre as características do gênero:
1. Quais são os autores dessas crônicas? 2. Você conhece outras crônicas ou outras obras desses autores? Cite-as. 3. Quando e onde estas crônicas foram publicadas?
4. Os autores, ao produzirem as crônicas, pensaram em seus possíveis interlocutores. Para quem em especial, foram produzidas?
5. Em quais veículos geralmente as crônicas circulam? 6. Você já leu textos desse gênero? Onde? 7. A partir do que as crônicas são produzidas? 8. O assunto da crônica é, em geral, um fato vivenciado pelo autor, ou fatos
observados no dia a dia que chamam a atenção. Neste sentido, assinale a alternativa correta:
a) A crônica “A última crônica” de Fernando Sabino, relaciona-se com: ( ) Comemoração de um aniversário. ( ) Um jantar em família. ( ) Um fim de tarde no botequim.
b) Após leitura e debate percebemos nessa crônica:
( ) Humor ( ) Drama ( ) Carinho e fraternidade
c) A crônica “O mar”, de Rubem Braga, relaciona-se com:
( ) A importância do mar para os pescadores. ( ) A relação que o autor tem com o mar desde a fase da infância até a fase
adulta. ( ) Os perigos que o mar apresenta.
9. Sobre a crônica “A cadeira do dentista”, de Carlos Eduardo Novaes:
Qual o assunto ou o tema dessa crônica? Que fato deu origem a esse texto?
10. Sobre a crônica “Tire fotos, muitas fotos!”, de Deusa Urbana:
No que ela se difere das outras crônicas?
Que outro título você daria a ela?
D) Seleção de um texto do gênero: Para procedermos a uma análise mais
detalhada com atividades variadas, explorando o contexto de produção, o conteúdo
temático e suas marcas linguísticas, selecionamos o texto: “A última crônica”, de
Fernando Sabino, para melhor compreensão desse gênero. Concordamos que:
[...] o trabalho escolar, no domínio da produção da linguagem, faz-se sobre os gêneros, quer se queira ou não. Eles constituem o instrumento de mediação de toda estratégia de ensino e material de trabalho, necessário e inesgotável, para o ensino da textualidade. A análise de suas características fornecem uma primeira base de modelização instrumental para organizar as atividades de ensino que esses objetos de aprendizagem requerem (DOLZ e SCHNEUWLY, 2004, p.51).
Nesse sentido, se quisermos realmente garantir aos alunos, o verdadeiro
domínio da linguagem, o reconhecimento de um gênero se constitui como algo
essencial, tendo em vista que todas as situações comunicativas só se efetivam por
meio de enunciados nos gêneros discursivos.
Nessa crônica, o autor mostra uma grande sensibilidade ao relatar um fato do
cotidiano. Ele conseguiu, num relato poético, mostrar como se faz uma crônica,
retratar a vida de certos tipos humanos e estabelecer a dimensão desse
acontecimento, aprofundando-o a uma crítica social.
Antes de entregar o texto aos alunos, analisamos o conhecimento prévio
quanto a crônica e procuramos ampliá-lo pela discussão oral, fazendo levantamento
de hipóteses, provocando um debate em sala de aula como motivação, baseado nas
seguintes questões:
Em nossa sociedade, há pessoas que comemoram seus aniversários de
forma pomposa, saem nos jornais, providenciam roupas caras, festas
majestosas. Outras, entretanto, nem se lembram da data que nasceram. E
você, comemora o seu aniversário? De que forma?
Seus pais sempre se lembram de seu aniversário? Já aconteceu deles se
esquecerem?
Se você fizer uma festa, quem não poderia faltar?
O que você escolheria em seu aniversário? Uma festa ou um presente? Por
quê?
O que você mais gosta em uma festa de aniversário?
Vocês já comemoraram um aniversário de forma estranha? Diferente do
tradicional bolo com velinhas?
Discutidas as questões e observadas as respostas, entregamos a cópia do
texto “A última crônica”, propiciando a leitura individual e silenciosa, depois a
leitura oral em grupo, iniciando o processo de caracterização do gênero estudado.
Em um trabalho com gêneros não se pode perder de vista a análise do
contexto de produção de sua função social e das características que o definem
como tal, conforme pressupostos backhtinianos. Nesse sentido, os questionamentos
repassados aos alunos após a leitura da crônica nos deram a possibilidade de
perceber se eles reconheciam o gênero crônica como tal. Questionamos então:
quem produziu a crônica? Quando foi publicada? Onde o cronista procurou o
assunto? Por que e para quem foi produzida? Quais as personagens envolvidas na
história? Onde aconteceu a comemoração? Qual o conteúdo temático da crônica?
Qual o tipo de narrador da crônica? Essa crônica chama a atenção do leitor? Por
quê? Existe alguma relação entre a situação vivida pela família da crônica e a de
nossos dias? Você seria capaz de buscar, num fato do seu dia a dia, momentos de
fraternidade e sensibilidade e descobrir nele suas belezas? Neste texto há ideia de
discriminação? É do autor? Do contexto? Você acha que houve realmente
discriminação?
Nos questionamentos detectamos que os alunos estavam realmente
envolvidos, pois participaram com interesse, respondendo de forma satisfatória e
coerente. Aos que não apresentavam uma resposta adequada, solicitamos aos
alunos que demonstravam maior facilidade que contribuíssem com suas respostas,
e assim, sucessivamente, até que todos pudessem elaborar e registrar suas
respostas, porém quando necessário, como mediadora, auxiliavámos no
complemento das mesmas.
No que se refere à análise linguística, a mesma também não foi esquecida
por nós e várias atividades foram trabalhadas com os alunos, usando o dicionário
para conhecer o significado das palavras, descobrindo o sentido pelo seu contexto,
percebendo que feita a sua substituição pelo significado atribuído pelo dicionário não
alterou o sentido do texto. Como a maioria dos gêneros ficcionais, a crônica poder
ser narrada no presente ou no pretérito, por isso, foram analisados os tempos
verbais presentes na crônica, que efeitos de sentido a escolha desses tempos
conferem ao texto. Para melhor compreensão foram aplicadas atividades como:
1. Como a maioria dos gêneros ficcionais, a crônica pode ser narrada no
presente ou no pretérito. a) Que tipo de tempo verbal predomina na crônica em estudo? b) Que efeito de sentido a escolha desse tempo verbal confere ao texto?
2. Observe o seguinte trecho: “A caminho de casa, entro num botequim da
Gávea para tomar um café junto ao balcão. Na realidade estou adiando ou momento de escrever. A perspectiva me assusta.”
a) As palavras destacadas são verbos, pois revelam ações. Analisando-as, podemos dizer que elas: ( ) Revelam ações totalmente concluídas. ( ) Revelam ações que estão acontecendo no momento. ( ) Revelam ações ou fatos que se realizarão.
Também observamos, no segundo parágrafo da crônica, que ao descrever a
menina, o autor utiliza de adjetivos no diminutivo, os quais foram identificados e
retirados, constatando qual o motivo que levou o autor a fazer essa escolha lexical.
Foi solicitado ainda aos alunos que encontrassem e retirassem outros adjetivos com
seus respectivos substantivos, explicando por que eles foram empregados.
No gênero crônica é bastante comum a utilização de expressões que
funcionam como modalizadores do discurso, principalmente advérbios
modalizadores, ou seja, advérbios de modo, como no caso dessa crônica. Após
explicarmos esse conteúdo e os alunos demonstrarem entendimento, solicitamos
que lessem o terceiro parágrafo, identificando e retirando algumas dessas
expressões, justificando o seu emprego.
Nossa análise pautou-se em Antunes (2003) que reforça e orienta aos
profissionais da Língua Portuguesa quanto a importância do trabalho com análise
linguística em sala de aula. “Mesmo quando se está fazendo análise linguística de
categorias gramaticais, o objeto de estudo é o texto” (apud PARANÁ, 2008, p.80).
Na análise linguística, certamente, muitos elementos poderiam ser analisados
no texto, os quais são tão importantes quanto Àqueles por nós explorados.
Lembramos, portanto, que não esgotamos as possibilidades de análise e sugerimos
a elaboração de outras atividades, porém sem perder de vista o gênero em questão.
E) Produção e Circulação do gênero: Após a realização das atividades, por meio
das quais exploramos o gênero discursivo crônica, consideramos que os alunos
adquiriram um bom conhecimento sobre o gênero. Sendo assim, solicitamos que
produzissem sua própria crônica, para atender a proposta inicial de circulação do
gênero. Lembramos alguns passos importantes no processo de produção escrita
para provocar a atitude de reler o próprio texto, analisando se atendia à situação de
interlocução, tendo em vista os suportes ou veículos de circulação, a estrutura
organizacional do texto, sua estrutura tipológica e suas marcas linguísticas. Nesse
sentido, orientamos para que os mesmos relembrassem de todas as crônicas lidas e
exploradas, bem como, temas ou fatos do seu cotidiano para a escrita do texto,
destacando as principais características do gênero. Para a elaboração do texto,
houve uma abordagem processual, em que etapas inter-relacionadas como
proposição, planejamento, elaboração, revisão e reescrita foram consideradas.
A partir deste conhecimento prévio, o aluno teve melhores condições de
produzir o seu texto, garantindo, assim, maior domínio da língua e do gênero. Como
afirma Bakthin (1997):
Texto, então, envolve não apenas a formalização do discurso oral ou escrito, mas o evento que abrange o antes, isto é, as condições de produção e elaboração; e o depois, ou seja, a leitura ou a resposta
ativa. Todo texto é assim, articulação de discursos, vozes que se materializam, ato humano, é linguagem em uso efetivo. O texto ocorre em interação e, por isso mesmo, não é compreendido apenas em seus limites formais (apud PARANÁ, 2008, p.17).
Após a elaboração dos textos, fizemos uma leitura atenciosa dos mesmos,
analisando se realmente possuíam as características essenciais para que fossem
considerados crônica. Logo após, orientamos para que cada um analisasse e
corrigisse os sinais de pontuação, a ortografia, a concordância nominal e verbal,
enfim, observando todos os aspectos que poderiam comprometer a compreensão do
interlocutor. Na revisão, atuamos como mediadores do processo de criação do texto,
participando ativa e assiduamente como leitor revisor, contribuindo com elogios,
críticas, sugestões de aperfeiçoamento, transformando-se em verdadeiro parceiro na
elaboração do texto.
Após a correção e a revisão dos textos, os alunos fizeram a escrita da versão
final das crônicas produzidas, as quais foram lidas em sala de aula.
Compreendemos, portanto, que a reescrita possibilita ao aluno ver o que antes ele
não via em seu texto. Para Bakthin “a reprodução do texto pelo sujeito [que se dá
num processo de volta ao texto, releitura, nova redação] é um acontecimento novo,
irreproduzível na vida do texto, é um novo elo na cadeia histórica da comunicação
verbal” (BAKHTIN, 1992, p.332).
Para exemplificarmos o resultado de todo esse trabalho, apresentamos, em
seguida, dois dos textos produzidos:
Texto 01
As crônicas produzidas foram expostas nos murais da escola e reunidas em
um livro (conforme capa na página seguinte) para que alunos, professores,
funcionários, pais, enfim, toda a comunidade escolar pudesse lê-las, constatando,
assim, o resultado final desse trabalho.
Naquele momento, foi possível verificar a satisfação dos alunos quanto a
produção e circulação dos textos por eles produzidos. Percebemos assim, que a SD
foi um momento de verdadeira aprendizagem e socialização dos conteúdos
trabalhados. Como educadores, constatamos ao longo de todo processo de
desenvolvimento das atividades, que a metodologia da SD pode ser um dos
caminhos possíveis para se trabalhar os gêneros textuais/discursivos em nossas
escolas.
Texto 02
Depois de se trabalhar o gênero, partindo da análise de vários textos, ficou
evidente a compreensão dos alunos quanto as características, a estrutura
composicional, e as marcas linguísticas dos mesmos, facilitando e assegurando ao
aluno, um maior domínio sobre a Língua Portuguesa, seja na modalidade escrita ou
oral.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Durante a aplicação desta proposta pedagógica com gênero discursivo
crônica, com turmas da 8ª série do Ensino Fundamental, utilizando a metodologia da
SD, foram proporcionadas práticas de leitura, oralidade e escrita, criando, dessa
forma, condições para que todos pudessem desenvolver sua capacidade leitora e de
Capa do livro
escrita. Constatamos que os alunos envolvidos apresentaram uma excelente
participação, demonstrando interesse, realizando todas as atividades, fazendo
questionamentos, intervindo com respostas e argumentos positivos e bem
elaborados, de forma crítica e consciente, atingindo assim, os objetivos propostos.
A proposta realizada nos fez compreender a importância do trabalho com os
gêneros no ensino da Língua Portuguesa, propiciando uma visão da linguagem
como instrumento de transformação social. A elaboração de atividades
contemplando a função social, o contexto de produção, a estrutura composicional e
as marcas linguísticas do gênero em estudo, por meio da metodologia da SD, exige
tanto do professor, quanto do aluno maior trabalho, envolvimento, por meio da
leitura, pesquisa, provocando reflexões sobre as normas linguísticas utilizadas nas
situações de uso da linguagem. Esse processo, de forma interativa e dialógica,
possibilitou maior companheirismo e solidariedade, pois o professor não foi visto
apenas como um transmissor de conhecimentos, mas como um estimulador,
observador e mediador, criando uma articulação entre a teoria e a prática, havendo
uma maior efetivação no processo de ensino/aprendizagem.
Em relação ao gênero trabalhado, percebemos que houve uma boa
compreensão, que possibilitou não só ampliar os conhecimentos sobre a crônica
(função social, contexto de produção, estrutura, estilo, suportes), como também por
meio desse gênero, conhecer diferentes textos, reconhecer ensinamentos e, a partir
da observação de fatos do cotidiano, passar a refletir sobre as virtudes humanas,
sem perder de vista, no entanto, os conteúdos relacionados à leitura, à oralidade e à
escrita.
Ficou evidente que, apesar de seus traços simples, graciosos e breves, as
crônicas são um veículo privilegiado para mostrar de modo persuasivo vários atos e
sentimentos, que divertindo atraem e fazem refletir, amadurecendo nossa visão de
mundo. Por meio de uma aparente conversa fiada, a crônica pode dizer as
proposições mais sérias, como as descrições da vida, o relato caprichoso dos fatos,
o desenho de certos tipos humanos, o registro de algo inesperado. Enfim, ficou
constatado, que esse gênero é uma somatória de pesquisa, seleção e inspiração,
cumprindo o princípio de informar, ensinar, comover e deleitar.
Todas as atividades envolvidas com o gênero crônica foram selecionadas,
adaptadas em função das necessidades dos alunos, e isso reforçou nossa
conclusão de que independentemente da realidade escolar, como foi o caso do
grupo envolvido no GTR, a SD apresentou bons resultados em todas as etapas
trabalhadas, e cada professor fez as adequações à sua realidade sem alterar as
atividades propostas pelo professor-tutor.
Durante o processo, percebemos a evolução dos alunos não apenas em
relação à leitura e à escrita, como também no posicionamento e tomada de atitudes
diante de sua produção, no interesse e envolvimento que demonstraram durante
todas as etapas da SD, pois estavam cientes que aprenderiam algo e que o produto
disso, seria utilizado para estabelecer uma relação de comunicação entre eles e
toda a comunidade escolar.
Sendo assim, defendemos que a utilização da metodologia da SD como um
dos caminhos possíveis para a abordagem dos gêneros pode assegurar, ao aluno,
um maior domínio sobre a Língua Portuguesa, a fim de garantir o uso efetivo da
língua, nas diferentes situações de interlocução.
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