sentença - beto perin - falsificação holerite

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ANGELA MARIA ROMEIRO VICENTE está sendo processada como incursa no art. 299, caput e parágrafo único do Código Penal porque, nas circunstâncias de tempo e local descritas na denúncia, teria inserido declaração falsa em documento público, qual seja, “recibo de pagamento de salário”, com o fim de alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante. JOSÉ ROBERTO PERIN está sendo processado como incurso no art. 299, caput e parágrafo único c/c art. 29, caput, ambos do Código Penal, porque, nas mesmas condições de tempo e local, teria concorrido para a prática do crime de falsidade ideológica. JOSÉ ROBERTO PERIN está ainda sendo processado como incurso no art. 299, caput e parágrafo único do Código Penal porque, nas circunstâncias de tempo e local descritas na denúncia, teria inserido declaração falsa em documento público, qual seja, “solicitação de empréstimo e autorização para débito”, com o fim de alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante. JOSÉ RODRIGUES DOS SANTOS está sendo processado como incurso no art. 304 c/c preceito secundário e parágrafo único do art. 299, todos do Código Penal, porque, nas condições de tempo e local acima, teria feito uso dos documentos públicos falsos. Segundo a denúncia, José Rodrigues dos Santos era funcionário público municipal e, passando por dificuldades financeiras procurou José Roberto Perin, então prefeito, solicitando-lhe um empréstimo mediante desconto em folha, ocasião em que este, informando que a prefeitura não fornecia empréstimos diretamente, sugeriu a emissão de um falso recibo de salário, constando remuneração superior à real, a ser utilizado na obtenção de empréstimo junto ao Banco Nossa Caixa. José Rodrigues dos Santos, aceitando a sugestão, foi ao departamento pessoal, onde Angela Maria Romeiro Vicente inseriu declaração falsa, emitindo comprovante de pagamento com valor superior ao verdadeiro, o qual foi entregue a José Rodrigues dos Santos, que o levou ao gabinete do prefeito, ocasião em que José Roberto Perin firmou declaração falsa na solicitação de empréstimo e autorização para débito, atestando que a renda mensal de José Rodrigues dos Santos perfazia R$ 990,00, montante inferior ao real. José Rodrigues dos Santos então dirigiu-se à agência bancária, onde utilizou ambos os documentos falsos para contrair o empréstimo em questão. O fato ocorreu em 03.06.08. Ultimado o inquérito policial, o Ministério Público pugnou pelo arquivamento do inquérito policial (fls. 75/76), arquivamento com o qual discordou este juízo, remetendo os autos ao Procurador Geral de Justiça (fls. 77), que por sua vez deliberou pelo oferecimento da denúncia, fato ocorrido em 02.06.10 por substituto automático. A denúncia foi recebida aos 11.06.10 (fls. 92/93) e os acusados, citados, apresentaram a resposta do art. 396-A do CPP (fls. 135/138, 157/178, 199/201), dando-se prosseguimento ao feito (fls. 219), ouvindo-se, ao longo da instrução, 13 testemunhas (fls. 284, 288/289, 290/291, 292/293, 294/295, 296/297, 319, 357/359, 382, 418/419, 440, 452/453), e interrogando-se os acusados (CD, fls. 382). As partes apresentaram memoriais, pugnando o Ministério Público (fls. 464/468), a Defesa de José Rodrigues dos Santos (fls. 475/480) pela absolvição tendo em vista que agiu desconhecendo que o fato cometido era criminoso, fazendo-o por orientação de José Roberto Perin, a Defesa de Angela Maria Romeiro Vicente (fls. 481/485) pela absolvição ou, subsidiariamente, pela

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JOSÉ RODRIGUES DOS SANTOS como incurso no art. 299, caput e parágrafo único c/c art. 304, ambos do Código Penal, aplicando-lhe, em consequencia, as penas de(i) reclusão de um 01 ano em regime aberto, SUBSTITUÍDA por uma pena de prestação de serviços à comunidade e uma de prestação pecuniária no valor de um salário mínimo (ii) multa de 10 dias-multa, valendo cada qual 1/30 do saláriomínimo.

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ANGELA MARIA ROMEIRO VICENTE está sendo processada como incursano art. 299, caput e parágrafo único do Código Penal porque, nas circunstânciasde tempo e local descritas na denúncia, teria inserido declaração falsa emdocumento público, qual seja, “recibo de pagamento de salário”, com o fim dealterar a verdade sobre fato juridicamente relevante. JOSÉ ROBERTO PERINestá sendo processado como incurso no art. 299, caput e parágrafo único c/c art.29, caput, ambos do Código Penal, porque, nas mesmas condições de tempo elocal, teria concorrido para a prática do crime de falsidade ideológica. JOSÉROBERTO PERIN está ainda sendo processado como incurso no art. 299, capute parágrafo único do Código Penal porque, nas circunstâncias de tempo e localdescritas na denúncia, teria inserido declaração falsa em documento público, qualseja, “solicitação de empréstimo e autorização para débito”, com o fim de alterara verdade sobre fato juridicamente relevante. JOSÉ RODRIGUES DOSSANTOS está sendo processado como incurso no art. 304 c/c preceito secundárioe parágrafo único do art. 299, todos do Código Penal, porque, nas condições detempo e local acima, teria feito uso dos documentos públicos falsos. Segundo adenúncia, José Rodrigues dos Santos era funcionário público municipal e,passando por dificuldades financeiras procurou José Roberto Perin, entãoprefeito, solicitando-lhe um empréstimo mediante desconto em folha, ocasião emque este, informando que a prefeitura não fornecia empréstimos diretamente,sugeriu a emissão de um falso recibo de salário, constando remuneração superiorà real, a ser utilizado na obtenção de empréstimo junto ao Banco Nossa Caixa.José Rodrigues dos Santos, aceitando a sugestão, foi ao departamento pessoal,onde Angela Maria Romeiro Vicente inseriu declaração falsa, emitindocomprovante de pagamento com valor superior ao verdadeiro, o qual foi entreguea José Rodrigues dos Santos, que o levou ao gabinete do prefeito, ocasião em queJosé Roberto Perin firmou declaração falsa na solicitação de empréstimo eautorização para débito, atestando que a renda mensal de José Rodrigues dosSantos perfazia R$ 990,00, montante inferior ao real. José Rodrigues dos Santosentão dirigiu-se à agência bancária, onde utilizou ambos os documentos falsospara contrair o empréstimo em questão. O fato ocorreu em 03.06.08. Ultimado oinquérito policial, o Ministério Público pugnou pelo arquivamento do inquéritopolicial (fls. 75/76), arquivamento com o qual discordou este juízo, remetendo osautos ao Procurador Geral de Justiça (fls. 77), que por sua vez deliberou pelooferecimento da denúncia, fato ocorrido em 02.06.10 por substituto automático.A denúncia foi recebida aos 11.06.10 (fls. 92/93) e os acusados, citados,apresentaram a resposta do art. 396-A do CPP (fls. 135/138, 157/178, 199/201),dando-se prosseguimento ao feito (fls. 219), ouvindo-se, ao longo da instrução,13 testemunhas (fls. 284, 288/289, 290/291, 292/293, 294/295, 296/297, 319,357/359, 382, 418/419, 440, 452/453), e interrogando-se os acusados (CD, fls.382). As partes apresentaram memoriais, pugnando o Ministério Público (fls.464/468), a Defesa de José Rodrigues dos Santos (fls. 475/480) pela absolviçãotendo em vista que agiu desconhecendo que o fato cometido era criminoso,fazendo-o por orientação de José Roberto Perin, a Defesa de Angela MariaRomeiro Vicente (fls. 481/485) pela absolvição ou, subsidiariamente, pela

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diminuição da pena na forma do art. 29, § 1º do Código Penal, e a Defesa de JoséRoberto Perin (fls. 493/514) alegando inépcia da inicial, perseguição política porgrupo de oposição no qual insere-se o co-denunciado José Rodrigues dos Santos,ausência de materialidade delitiva uma vez que o comprovante de pagamentooriginal, supostamente falsificado, não está encardado nos autos, insuficiência dasdelações efetuadas pelos co-denunciados para a condenação. O MinistérioPúblico juntou aos autos o comprovante de pagamento original (cf. fls. 515,517/518, 519) sustentando ser dispensável a realização de perícia no documento.Os acusados Angela Maria Romeiro Vicente (fls. 524) e José Rodrigues dosSantos (fls. 526) manifestaram-se pela desnecessidade da perícia e reiteraram osmemoriais anteriormente apresentados. José Roberto Perin (fls. 544/548)requereu a realização de perícia sobre o comprovamente de pagamento original,para apurar se o documento foi impresso na impressora da Prefeitura Municipalou não. O Ministério Público juntou aos autos novas declarações da acusadaAngela Maria Romeiro Vicente bem como documentos (fls. 528/537), dos quaisfoi dada vista às partes, tendo havido manifestação expressa apenas de AngelaMaria Romeiro Vicente (fls. 549) e José Rodrigues dos Santos (fls. 550)reiterando seus memoriais anteriores. É O RELATÓRIO. DECIDO. Apreliminar de inépcia da inicial não deve ser acolhida, uma vez que a denúnciaindividualiza claramente as condutas atribuídas a cada um dos acusados, epreenche os requisitos previstos no art. 41 do Código de Processo Penal.Ingressa-se no mérito. A materialidade delitiva e a autoria estão comprovados. Ooriginal do “recibo de pagamento de salário” ideologicamente falso aportou aosautos (fls. 519), nele constando que o salário líquido do acusado José Rodrigues,no mês de maio/2008, a R$ 1.212,31. Todavia, segundo verificamos às fls. 38 doapenso do inquérito policial, naquele mês o salário líquido efetivamentepercebido por José Rodrigues correspondeu, em realidade, a R$ 509,74, montanteque, de fato, foi o depositado em sua conta corrente a título de pagamento (créditona conta em 23/05, sob a denominação “cred p/c firma 0000709, fls. 11). Taldescompasso comprova a materialidade delitiva da falsidade ideológica do“recibo de pagamento de salário” e do documento “solicitação de empréstimo /autorização para débito” (fls. 31), cujo original está na agência bancária, queencaminhou cópia (cf. fls. 25), materialidade esta confirmada pela prova oralcolhida, como será visto abaixo, especialmente a detalhada confissão de Angela(CD, fls. 382) confirmando que houve manipulação dos dados no que diz respeitoàs horas extras. A este respeito, cabe indeferir o pleito apresentado pela Defesa deJosé Roberto (fls. 544/548) no sentido de ser realizada perícia para verificar seaquele documento foi confeccionado na Prefeitura Municipal de Analândia, umavez que tal prova, na conjuntura dos autos, revela-se irrelevante e protelatória(art. 400, § 1º, Código de Processo Penal). A materialidade da falsidadeideológica não se comprova por exame pericial, conforme doutrina (NUCCI,Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. 6ª Ed. RT. São Paulo: 2006. pp.983) e jurisprudência (STJ: REsp 685.164/RS, Rel. Ministra LAURITA VAZ,5ªT, j. 03/11/2005; HC 35.447/MG, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTATURMA, julgado em 28/09/2004, DJ 25/10/2004, p. 371; REsp 260.562/RS, Rel.Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 13/09/2000, DJ16/10/2000, p. 334). A prova dos autos revela que o “recibo de pagamento de

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salário” foi sim confecionado no setor de departamento pessoal da PrefeituraMunicipal, de modo ser de rigor o indeferimento da prova pericial, pelopermissivo legal já referido. A própria co-ré Angela, a respeito de quem oacusado José Roberto não logrou demonstrar satisfatoriamente a aduzidaperseguição por motivos políticos, trabalhou no setor de departamento pessoal econfirmou que o holerite foi mesmo confeccionado na municipalidade. Alémdisso, a satisfatória demonstração, às fls. 529/537, de que houve a substituição daimpressora do setor de departamento pessoal, evidencia que as conclusões deeventual perícia não viriam revestidas da segurança necessária para auxiliar nasolução da lide penal. A materialidade delitiva do uso dos documentosideologicamente falsos pelo réu José Rodrigues resulta da prova documental dacontratação do empréstimo junto ao Banco Nossa Caixa S/A (fls. 26/34),materialidade esta confirmada pela prova oral colhida, como será visto abaixo,mormente o depoimento de José Valério Simão Carneiro (fls. 288/299, e CD defls. 298). A autoria também está comprovada. Quanto à autoria da falsidadeideológica na “solicitação de empréstimo / autorização para débito”, estácomprovada pela assinatura de José Roberto Perin lançada sobre o documento.Os acusados foram interrogados em juízo. Angela (CD, fls. 382) confessou osfatos, dizendo que trabalhava no setor de departamento pessoal e recebeu umtelefonema do acusado José Roberto, então Prefeito Municipal, determinando aela que fizesse um holerite em valor tal que desse para o co-acusado JoséRodrigues fazer um empréstimo bancário. Viu que José Rodrigues já estava noportão. Não conseguiu fazer o holerite com o mês de maio/2008 porque não davapara fazer retroativo (estavam em junho/2008), telefonou para José Roberto, oqual insistiu, dizendo para darem um jeito. Após ser auxiliada pela sua colega detrabalho Idese Cristina Olímpio (ouvida às fls. 292/293, e CD de fls. 298)conseguiu fazer o documento. Fez também a “carta-margem” (“solicitação deempréstimo / autorização para débito”) e entregou-os a José Rodrigues que levoueste último para ser assinado por José Roberto. Afirma que José Rodrigues sabiaque o holerite continha dado falso e que sabia também que isso estava sendo feitopara viabilizar o empréstimo bancário. Acrescenta que o valor maior do holeriteviabilizava um empréstimo de montante maior no Banco Nossa Caixa S/A.Afirma que tem muito medo, pavor de José Roberto, que em 1994 foi presa emuma sala completamente fechada e escura durante seu horário de expediente,ficou em depressão [emociona-se a partir dos 09min do vídeo]. Sustenta que sabiaque estava cometendo uma ilegalidade mas que temia represálias e perseguiçõespor parte de José Roberto, tendo agido por medo. José Rodrigues (CD, fls. 382)confessou os fatos afirmando que dirigiu-se a José Roberto, que era PrefeitoMunicipal, pedindo um empréstimo a ele. Que José Roberto respondeu que nãopoderia emprestar pessoalmente, mas poderia falsificar um holerite com valoresmaiores. Que sem saber que era um crime aceitou a proposta, e que o holerite foifalsificado pela co-denunciada Angela. Que utilizou o holerite para fazer oempréstimo bancário e inclusive José Roberto o orientou a rasgar o documentodepois de utilizado. Afirma que ficou sabendo que outras pessoas tambémfizeram empréstimos com recibos de pagamento ideologicamente falsos. JoséRoberto (CD, fls. 382) negou a imputação, afirmou que pode ter havido umafalha na digitação do “recibo de pagamento de salário” (holerite) e da “solicitação

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de empréstimo e autorização para débito” (carta-margem), mas enquanto PrefeitoMunicipal seria humanamente impossível detectar tal erro numérico. Alegouainda que está sofrendo perseguição política por parte dos co-réus Angela e JoséRodrigues, salientando que José Rodrigues foi manipulado pelos ferrenhosadversários políticos de José Roberto, e que Angela possui ligação de parentescocom a família “Vivaldini”, sendo um de seus integrantes Presidente de ONG queé politicamente utilizada contra José Roberto e família. José Valério SimãoCarneiro (fls. 288/299, e CD de fls. 298) é gerente da agência bancária, disse quetomou conhecimento dos fatos após convocado pela polícia judiciária. Narra quenormalmente fica com cópia do holerite no banco, mas nesse caso específico, nãosabe o motivo mas não encontrou a cópia. Esclareceu que quanto maior a rendadeclarada, maior o empréstimo que o cliente consegue fazer no banco.Afirmou que não teve notícia de outras falsificações efetuadas para a obtenção deempréstimos no banco. Idese Cristina Olímpio (fls. 292/293, e CD de fls. 298)narrou que trabalha no departamento pessoal da Prefeitura Municipal, junto com aré Angela, e desconhece o fato da falsificação. Afirma que o acusado JoséRoberto nunca solicitou a falsificação de holerite, ou qualquer providência ilícitaou imoral, e que José Rodrigues faz oposição a José Roberto. Verificamos queeste depoimento difere das declarações da acusada Angela e do acusado JoséRodrigues. Todavia, constata-se o interesse pessoal da testemunha em ocultar oilícito, pois teria tido participação pessoal no ilícito, de maneira que suanarrativa deve ser vista com reservas. Antonio Luiz Manieri (fls. 294/295, e CDde fls. 298) asseverou que já deu carona para José Rodrigues e em uma dessascaronas este último relatou que estava chateado com José Roberto porque pediufavores a ele [Prefeito Municipal] e este negou, observando também que JoséRodrigues utilizava um veículo com adesivo do partido político da oposição.Pedro Ferreira da Silva Junior (fls. 296/297, e CD de fls. 298) sustentou quetrabalha no comite eleitoral de Rogério Ulsson (do PMDB, PT, PC DO B) e foiprocurado por José Rodrigues que lhe pedia orientação jurídica porque tinha idoaté a Prefeitura Municipal pedir PDV (Plano de Demissão Voluntária) e depoisconstatou que fora enganado, pois assinara, em verdade, a sua demissão (fora doregime de PDV). Na ocasião José Rodrigues também explicou sobre o holeritefalsificado. Que a testemunha o orientou a procurar o Ministério Público,inclusive a testemunha trouxe o holerite ao Ministério Público. Irineu JoséGonçalves Junior (fls. 284) depôs sobre os antecedentes dos acusados dizendoainda que José Rodrigues faz oposição política a José Roberto. Acacio AparecidoBernardo (fls. 319, e CD de fls. 318) foi gerente do Banco Bradesco e discorreusobre os procedimentos para a concessão de empréstimos consignados. Ezequielde Jesus Vicente (fls. 357/359), Andreia Alexandre Benevides Quadrado (fls.377/378, e CD de fls. 382), Jaldo Edgar Marques Souza (fls. 440), Pedro LuizRamella (fls. 452/453), Fabio Tadeu Moi (fls. 418/419) e Sandra Fontoura Zalla(fls. 290/291, e CD de fls. 298) relataram fatos que não são relevantes para ojulgamento. À luz da prova produzida, forçoso reconhecer que estãocomprovados os fatos descritos na inicial. Verificamos que Angela e JoséRodrigues confessaram os fatos, narrando-os em detalhes, com credibilidade,reforçando a prova documental já analisada. O acusado José Roberto sustenta queestá sendo alvo de perseguição política mas, na hipótese em tela, apesar de ter

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demonstrado o envolvimento político de José Rodrigues com a oposição, tal fatonão torna verossímil ou possível a tese de que Angela e José Rodrigues, com ointuito exclusivo de perseguirem José Roberto, confessariam fatos que osincriminam pessoalmente, colocando-os no banco dos réus. Salvo melhor juízo,se tais pessoas pretendessem inventar fatos com o fito tão-só de incriminar JoséRoberto, narrariam atos criminosos que não contassem com a sua própriaparticipação. Já quanto à absolvição pretendida por José Rodrigues, comfundamento no desconhecimento do caráter criminoso do fato, não deve seracolhida. Segundo o art. 21 do Código Penal: “O desconhecimento da lei éinescusável. O erro sobre a ilicitude do fato, se inevitável, isenta de pena; seevitável, poderá diminuí-la de um sexto a um terço.”. No caso em tela, não secogita de quaisquer dessas modalidades. José Rodrigues não demonstrou odesconhecimento da lei, ou mesmo o erro sobre a ilicitude do fato, tesesinverossímeis pois que qualquer um sabe ser ilegal constar em um documentosalário maior do que o efetivamente percebido. No que concerne à absolviçãoalmejada porAngela, também não há que ser aceita, pois que não obstante o temorreverencial por ela alegado em relação a José Roberto, não se constata aexistência de coação propriamente dita, no momento em que José Roberto lheordenou a confecção do holerite falso, se não receio por conta de fatospretéritos.A coação moral irresistível “é aquela que não pode ser superada pelavítima, não pode por ela ser vencida; sua atuação torna-se inevitável, em razão dasupressão da sua liberdade de agir” (GOMES, Luiz Flávio; MOLINA, AntonioGarcía-Pablos de. Direito Penal. Parte Geral. V. 2. 2ª Ed. RT. São Paulo: 2010.pp. 448). Tal supressão da liberdade de agir não ocorreu, na hipótese emcomento, em relação à ré Angela, que, não estando sendo alvo de efetiva ameaçapor José Roberto, possuía liberdade suficiente, nas circunstâncias, para recusar aordem. Quanto a Angela, também não se faz presente obediência hierárquica, poisa ordem de falsificar um documento público era manifestamente ilegal. Nãoincide o art. 22 do Código Penal. Ao final, observo porém que atribui-se a JoséRoberto o cometimento de dois crimes, no entanto a falsificação do holerite e dacarta-margem deve ser considerada um crime único, tratando-se de falsidadeideológica única empreendida para Jose Rodrigues conseguir um empréstimomaior no Banco Nossa Caixa, ambos os documentos tendo como objeto do falsoo mesmo fato (valor do salário de José Rodrigues). Passo à dosimetria das penas.ANGELA (ART. 299) Na primeira fase, considero como circunstância judicial aconvincente demonstração, pela acusado, em seu interrogatório (ao qual mereporto), a respeito de que agiu por medo do acusado José Roberto, de quemtemia sofrer represálias. Todavia, por circunstâncias judiciais a pena não pode irabaixo do mínimo legal, mantendo-se pois a pena de 01 ano. Na segunda fase, aatenuante do art. 65, III, “c” do Código Penal (pois o crime foi cometido emcumprimento de ordem de autoridade superior) não repercute sobre a pena poisesta não pode ir abaixo do mínimo legal (Súm. 231, STJ). Na terceira fase, incidea majorante do parágrafo único do art. 299 do Código Penal, aumentando-se apena para 01 ano e 02 meses. Torno definitiva a pena de reclusão de 01 ano e 02meses. O regime inicial será o aberto. Nos termos do art. 44 do Código Penal,cabível a substituição por penas alternativas. Aqui, salienta-se que tendo em vistaa circunstância judicial favorável já relatada acima, para fins de adequada

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individualização da pena, evitando-se a pena de prestação de serviços queapresenta maior gravidade, apresenta-se proporcional, para fins de prevenção erepressão, a substituição por uma pena de prestação pecuniária no valor de umsalário mínimo e uma pena de multa vicariante, sendo que a multa é fixada em 10dias-multa, valendo cada dia-multa 1/30 do salário minimo, tendo em vista acondição econômica da ré. A pena de multa cominada será também de 10dias-multa, consideradas as circunstâncias judiciais favoráveis, valendo cada diamulta 1/30 do salário minimo, tendo em vista a condição econômica da ré. JOSERODRIGUES (ART. 304 C/C ART. 299) Na primeira fase, não há circunstânciasjudiciais a considerar. Na segunda fase, não há agravantes ou atenuantes. Naterceira fase, não há majorantes ou minorantes. Torno definitiva a pena dereclusão de um ano. O regime inicial será o aberto. Nos termos do art. 44 doCódigo Penal, cabível a substituição por uma pena de prestação de serviços àcomunidade e uma de prestação pecuniária, no valor de um salário mínimo.Descabido substituir por penas mais brandas, como deu-se com Angela, pois queeste acusado foi quem pessoalmente beneficiou-se pela falsidade, logrando obterempréstimo bancário em valor maior do que aquele a que teria direito. A pena demulta imposta será de 10 dias-multa, consideradas as circunstâncias judiciaisfavoráveis, valendo cada dia multa 1/30 do salário minimo, tendo em vista acondição econômica do réu. JOSE ROBERTO (ART. 299 C/C ART. 29) Naprimeira fase, deve ser considerado o fato de que o acusado era PrefeitoMunicipal na época, o que aumenta a censurabilidade da conduta diante dospadrões éticos exigíveis do detentor de tão especialíssimo mandato. Veja-se queinocorre bis in idem com a majorante do parágrafo único do art. 299 pois que estásendo considerado, aqui, não o fato de o acusado ser funcionário público, massim o atributo especial de ser Prefeito Municipal. Aumenta-se a pena, pois, em1/3. Na segunda fase, incidem duas agravantes, quais sejam, as do art. 62, I e II,pois foi o acusado quem idealizou o delito e coordenou as atividades de Angela eJosé Rodrigues, induzindo ainda Angela a confeccionar o holerite falso.Aumenta-se a pena em mais 1/3. Na terceira fase, incide a majorante do parágrafoúnico do art. 299, como já dito. Aumenta-se a pena em 1/6. Torno definitiva apena de reclusão de 02 anos e 26 dias de reclusão. O regime inicial será o aberto,pois as circunstâncias judiciais negativas não são suficientes para a fixação deregime mais gravoso. Nos termos do art. 44 do Código Penal, cabível asubstituição por uma pena de prestação de serviços à comunidade e uma deprestação pecuniária, no valor de um salário mínimo. A pena de multa impostaserá de 20 dias-multa, considerada a circunstâncias judicial desfavorável, valendocada dia multa 3/30 do salário minimo, tendo em vista a condição econômica doréu. DISPOSITIVO Ante o exposto, acolho em parte a ação penal e CONDENO:a) ANGELA MARIA ROMEIRO VICENTE como incursa no art. 299, caput eparágrafo único do Código Penal, aplicando-lhe, em consequencia, as penas de (i)reclusão de um ano e dois meses em regime aberto, SUBSTITUÍDA por umapena de prestação pecuniária no valor de um salário mínimo e uma pena de multade 10 dias-multa, valendo cada qual 1/30 do salário mínimo (ii) multa de 10dias-multa, valendo cada qual 1/30 do salário mínimo. b) JOSÉ ROBERTOPERIN como incurso no art. 299, caput e parágrafo único do Código Penal,aplicando-lhe, em consequencia, as penas de (i) reclusão de 02 anos e 26 dias em

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regime aberto, SUBSTITUÍDA por uma pena de prestação de serviços àcomunidade e uma de prestação pecuniária no valor de um salário mínimo (ii)multa de 20 dias-multa, valendo cada qual 3/30 do salário mínimo. c) JOSÉRODRIGUES DOS SANTOS como incurso no art. 299, caput e parágrafo únicoc/c art. 304, ambos do Código Penal, aplicando-lhe, em consequencia, as penas de(i) reclusão de um 01 ano em regime aberto, SUBSTITUÍDA por uma pena deprestação de serviços à comunidade e uma de prestação pecuniária no valor deum salário mínimo (ii) multa de 10 dias-multa, valendo cada qual 1/30 do saláriomínimo. Transitada em julgado, expeçam-se as guias de recolhimento elancem-se os nomes dos réus no rol dos culpados. Arbitro os honoráriosproporcionais da dra. Maria Letícia de Andrade (requerimento de fls. 541) em30% pela tabela da Oab-Defensoria. Expeça-se certidão, a ser retirada pelainteressada. P.R.I.