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Page 1: Senso incomum 22 bx

sen so i n com um

JORNAL-LABORATÓRIO DO CURSO DE JORNALISMO - UFU - ANO 05 - Nº 22 - JUNHO/JULHO-201 4

Ser

5.

8.10.

J ornal i sm o pos it i vo é possível

Po lít i ca am b i ental na U FU ?

Volu ntar iad o , v i v ên c i a d e grat i d ão

Pág . 6 e 7

ILUSTRAÇÃO:E

rika

Abr

eu

Page 2: Senso incomum 22 bx

Está tudo certo em recompensar um fi lho por ter sido umaboa criança até que ele desobedeça aos pais. Está tudocerto em dar o brinquedo desejado até que o aluno pare deestudar por não ter ganhado presente ao mostrar a notasatisfatória . Está tudo certo até que alguma si tuação saiado controle. Al i ás, controle é o que menos se tem aorecompensar uma criança por uma ação, convencionada“boa”. Não é ousado d izer que o controle está na mão dacriança. Se ela quer ser recompensada, basta se esforçar paraconseguir o prêmio.

De alguma forma, o ser humano percebe o que é vantajosopara si e como conseguir isso. O caminho até o prêmio ficaclaro após algumas tentativas. O problema é quando a criançanão quer tanto ser premiada ao ponto de encarar o caminhoaté ele. O que acontece quando o brinquedo, celular oudinheiro não é bom o suficiente para compensar o esforço deescovar os dentes, fazer a tarefa de casa ou obedecer aospais? A criança deixa de ganhar dessa vez e na próxima, a boaação compensará tudo.

É claro que todos já foram recompensados alguma vez navida. I sso não significa que o mundo está cheio deinteresseiros e mercenários que agem de acordo com arecompensa. Mas existem obrigações naturais que devem seraprendidas desde cedo. Não é certo pagar pelo respeito e boafé. Caso seja necessário pedir desculpa à criança, peça. Casoseja necessário escutá-la, escute. Quanto mais comuns essasações forem construídas, melhor. Assim, com o tempo, elas setornam espontâneas.

No fim das contas, ninguém quer se relacionar compessoas mimadas que não aceitam menos do que esperam.Ninguém quer aguentar gente desrespeitosa. É bom tomarati tudes sem pensar no que iremos ganhar com isso. É bomrespeitar e ser respeitado por todos, sejam adultos oucrianças. I sso não significa que crianças não podem ganharpresentes, desde que eles não sejam recompensas paraati tudes ditas como virtudes de um bom relacionamentosocial . Porque se for assim, é hipocrisia dizer que os fi lhos dehoje já não respeitam os pais.

Editorial

Procura-se respeito, recompensa-se bem

Marcelo França

2OP IN I ÃO I Nn. 22jun/ju l201 4

RRee ii ttoo rr:: Elmiro Santos Resende / DD i-i-rree ttoo rr ddaa FFAACCEEDD:: Marcelo Soares Perei-ra da Silva / CCoooo rrddeenn aa ddoo rraa ddoo ccuu rrssoo ddeeJJoo rrnn aa ll ii ssmmoo :: Ana Cristina MenegottoSpannenberg / PPrrooffeess ssoo rraa ddaa dd ii ss cc iipp ll i-i-nn aa :: Ingrid Gomes / JJoo rrnn aa ll ii ss ttaa rreessppoon-n-ss áá vvee ll :: Ingrid Gomes MTB 41 . 336 /

EEddii ttoo rreess -- cchh eeffee :: Luisa Ca lefi e MarceloFrança . / PPrroodduuççãã oo ddee aa rrttee :: Erika Abreu/ CCoo ll aa bboo rraa ççãã oo ddee rreeppoo rrttaa ggeemm :: BrunaTarcitano, Leidiane Campos , MarielyDa lmônico e Grupo Cachoeiro / RReeppóó r-r-ttee rreess :: Luisa Ca lefi e Marcelo França /CCrrôônn ii ccaa ss :: Bruna Tarcitano, Caroline de

Camargo Bufelli , Mona lisa França daSilva e Renato Pinheiro / EEddii ttoo rrii aa ll ::Marcelo França / FFoo ttoogg rraa ffii aa :: MariaPaula Martins , Mariana A lmeida , Mi-chael Kea lton Barcelos e Sérgio Da llá-glio / DD iiaa gg rraammaa ççãã oo ee FFiinn aa ll ii zzaa ççãã oo ::Dan ielle Buiatti

Expediente

A iniciativa dos alunos da Universi-dade Federal de Uberlândia (UFU) emdefinir o bem-estar como capa destaedição da publ icação da Faculdade deJornal ismo é positiva em dois aspectos.Primeiro, por estar l igada à tendência depropor pensamentos alternativos quan-to à maneira de enxergar os problemasda vida. O combate à lógica Ocidental ,nesta ótica, significa aprendizado embuscar elementos de raciocínio de outrocontexto cultural para inseri- lo real idadeobjetiva da maioria dos lei tores.

Também é positiva a iniciativa de

aprofundar na opção de vida zen comocontraponto à edição anterior, na qual oestresse e a depressão são colocadoscomo “mal do Século”. Desta forma, osalunos conseguiram fazer uma leiturado próprio material que produz de ma-neira muito propositiva, que, no bom jor-nal ismo, é sempre bastanteaconselhável . A matéria sobre “Jornal is-mo positivo” entra como apêndice damatéria de capa por acrescentar visãoteórica sobre a importância de uma pu-bl icação mais otimista. Apenas deve-setomar cuidado para esta visão menos

sanguinária acerca da profissão nãosignifique “Jornal ismo ingênuo”.

Outro fator relevante da produção é acapacidade de conseguir, ao mesmotempo, dialogar com leitores fora docírculo acadêmico (a matéria de capaconsegue) mas sem perder o olhar crí-tico quanto à comunidade, como no ca-so da discussão ambiental a serapl icada no ambiente universitário. Pro-duzir material jornal ístico precisa ter anoção de se relacionar no plano macro(temas universais) como micro (temaslocais) .

Erich Vallim Vicente – editor chefe da A Tribuna Piracicabana, de Piracicaba (SP)

Ombudsman

»

Educando

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Segunda-feira

Monalisa França da Silva

É ... eu me achei nela

Conversas . . . Ah as conversas, são elas que fazem que umpouco de mim saia e um pouco das pessoas entre em mim eme faça alguém melhor. Pois bem, em uma dessas conversas,uma amiga e daquelas bem queridas, veio me contar um pou-co de suas experiências e um pouco do que ela própria cha-mou de ‘crise dos 20’ .

Eu, claro, parei e dediquei a ela um pouco do meu tempo,dos meus ouvidos e da minha mente, para processar tudo oque deveria ouvir e consequentemente, o que iria falar a ela.Como sempre faço, antes que ela começasse o assunto, en-quanto ela falava de outras coisas, vinha pedindo sabedoria aDeus, não só para ouvi-la, como também para aconselhá-la,humi ldemente, se isso a ajudasse.

Paramos então, à esquina de uma rua na faculdade e elacomeçou a divid ir comigo, al i mesmo, todos os di lemas queestava vivendo, que iam desde seu curso, à sensação de nãopertencimento a ele, até questões que envolviam o coração.Ah, esse tal de coração, sempre pregando peças.

Ela contava, narrava os fatos e eu al i , a ouvindo atenciosa-mente, até que em um momento, parei e a olhei bem e vi que,

naquela pequena pessoa, muito minha amiga, eu havia achadoa Monal isa de alguns anos atrás. Uma Monal isa que havia vi-vido muitos di lemas, assim como ela. Problemas, momentosdolorosos, daqueles onde não sabemos nem quem somos,muito menos o que gostamos.

Percebi que eu, Monal isa, não sou um ser isolado; vi queassim como eu, ela também estava passando por uma crise, oque não é de se estranhar, porque estranho seria se nós, seresimperfeitos, não as tivéssemos.

Enfim, terminei a conversa com ela, com a sensação dedever cumprido, com a sensação de que consegui compreen-dê-la, assim como um dia, alguém me compreendeu e meajudou a superar a minha crise, que não foi bem dos 20, masteve uma certa proporção.

Termino este texto, agradecendo a ela por ter me con-fi ado seus d i l emas, seus problemas, me ter desti nado doseu tempo e com certeza , ped indo a Deus pra que a con-serve na minha vida por mu i tos anos, pra que tenhamosconversas . . . aaah , conversas, daquelas que guardarei prasempre!»

ILUSTRAÇÃO: Pixabay

OP IN I ÃO3

»

Crônicas

Renato Pinheiro

Começa o dia e a ducha fria aindame dói . Às sete o pão com manteiga fei-to na chapa já está no prato, ao lado dacaneca com café e do cinzeiro. As duasmetades do pão são suficientes, meiacaneca de café está ótimo, dois cigar-ros, um após o outro, completam o queestiver faltando. O jornal acompanha ocafé-da-manhã, há tempo para as notí-cias mais importantes.

Dois travestis foram mortos por umgrupo de estudantes na Augusta, algodescri to pelo repórter como “ato homo-fóbico”, mas, sinceramente, não impor-ta. Às oito e meia começa meu horáriona contabi l idade.

O percurso requer apenas uma con-dução, caso raro em São Paulo. O cami-nho até o metrô permite outro cigarro, nofrio o trajeto chega a ser agradável . Naestação gente como eu vai e vem, geral-mente em passos apressados ou corren-do, atrasados. O grande relógio deponteiros no meio do pátio me al ivia, nãoé preciso correr. No trem já não há maisassentos vagos, então me aperto ao ladode um senhor de terno. Logo na primeiraparada um homem vestindo-se com tra-pos, o cabelo sujo e a barba comprida,entra cambaleando e pede dinheiro aos

passageiros. Alguém levanta a mão comuma nota de dois reais, mas o homemrapidamente é colocado para fora antesde o trem partir. O senhor de terno diz-lhealguma injúria e o trem parte.

A empresa espera-me com a grandeporta aberta. Alguns “bom-dia” são diri-gidos a mim no trajeto até minha sala. Ochefe está parado na porta. Estranho.Antes que eu possa entrar, d iz-me queatrasei alguns relatórios e que estes de-verão estar em sua sala em uma hora,digo-lhe que “sim, senhor” e, com umsuspiro, adentro o cubículo. Hoje, emespecial , a desolação incomoda-me umpouco mais, talvez algumas tragadasajudem. Termino os relatórios, pego umcopo de café com a secretária e diri jo-me à saída.

Na grande porta encontro o funcioná-rio que trabalha na sala ao lado da minhacom uma caixa de papelão nas mãoscontendo algumas bugigangas. Foi de-mitido, chora ao me contar que sua fi lhaestá grávida. Conforto-o com algumaspalmadinhas no ombro, dizendo queconseguirá outro emprego, e ele sai . Sin-to-me triste ao pegar o maço e encontrarapenas um cigarro. Fumo, tomo o café e,revigorado, volto ao trabalho.

O ofício ocorre normalmente, a dor decabeça elimino com uma aspirina. Às seteda noite termino os últimos relatórios, tor-cendo para que nada tenha passado de-sapercebido novamente. Deixo a empresacom certo nervosismo, num reflexo apal-po o bolso da calça e deparo-me com omaço vazio, a cabeça volta a doer.

No caminho de volta o tempo parece

passar mais rápido, cochi lo por algunsminutos no banco do metrô, acordandonas paradas de cada estação. Em umadas paradas, reparo no fundo do tremum jovem, sozinho, com os pés no ban-co da frente, tocando gaita. Por um mo-mento a música pop que sai dosauto-falantes do metrô some, e consigoouvir os assovios do jovem perfeita-mente. Causam-me certo desconforto.Somente um desocupado é capaz detocar gaita no metrô às sete e meia danoite. Penso que os jovens são assimmesmo, e cochi lo novamente.

Antes de chegar em casa, passo napadaria do bairro e peço dois maços decigarro. Em casa, l igo a televisão e oBonner encara-me com um olhar sério.Preparo um copo de bourbon barato eouço o afago do âncora sentado no so-fá. O país só cresce, ele diz. Terminado osegundo copo, e o jornal televisivo, en-contro-me sem sono. Me sinto umpouco afl i to, preocupam-me as contasque terei de pagar no fim do mês. Al-canço uma caixa de calmantes e umaoutra de relaxantes musculares na pra-teleira do banheiro, tomo os dois à seco.Em alguns minutos estou melhor, umpouco tonto, mas sonolento.

Procuro meu quarto e encontro acama desfeita, como havia deixado demanhã. Deito e os assovios da gaita dojovem do metrô invadem meus pensa-mentos. Imagens de pássaros engaio-lados surgem como flashes à medidaque as notas tomam forma. Durmo, sa-tisfeito, pois é certo que amanhã viránovamente.

I N n. 22jun/jul201 4

ILUSTRAÇÃO:P

ixab

ay

Page 4: Senso incomum 22 bx

Metástase não é comida francesa

Pai, me assaltaram!

4OP IN I ÃO I Nn. 22jun/ju l201 4

Bruna Tarcitano

"Significa que está tomando o corpo todo, fi lha". Quandominha mãe, há algumas horas, me mandou mensagem semqualquer indício de exclamação ou "emoticon", não imagineique tudo girasse em torno da palavra "metástase". É certo quesempre, ou quase sempre, amei com tanta intensidade aspalavras quanto uma criança a um pirul i to, mas a palavra"metástase" nunca nem chegou perto de mim. Agorabuscando memórias distantes, lembro-me vagamente deduas amigas fazerem menção ao nome, com os olhos nochão e o coração em frangalhos, e eu, que sempre soube l idarmelhor com os problemas alheios, preocupei-me apenas emtrazer aqueles olhos pro céu e o coração pra perto de mim. Atéalgumas horas atrás, o que era "metástase" na minha cabeça?

Orientação de trânsito. "O museu fica logo após ametástase entre a Avenida Kennedy e a Costa Machado". Umtipo de raridade espacial , daquelas que acontecem uma vezem cada século. "Não perca hoje à noite a metástase dosplanetas". Nome de comida fina, talvez. "De entrada aspargosà metástase". "Metástase" podia ser qualquer coisa, até nomede remédio que faz arder.

Mas não, todo mundo deve saber o significado da infel izpalavra. Eu que, provavelmente, vivo andando por aí achandoque as coisas são fáceis e com o céu azul que essa cidadetem, então, piorou. Hoje é domingo, dia de ver fi lme e não fazer

nada, além do mais, comprei minha passagem da tãoesperada volta pra casa e pro colo de gente mais velha, quetem o poder de me fazer sentir segura. Eu estava fel iz, estavade bobeira e tão tranqui la quando a palavra "metástase"chegou, que sua sonoridade de berro histérico fez minhacabeça girar.

"Os médicos da sua avó disseram que é metástase", minhamãe disse. E tudo o que consegui pensar foi "ok, então a vovóou quase foi atropelada na metástase da rua, ou sofreu deintoxicação al imentar pela comida chique, ou ainda desmaioucom tamanha beleza da metástase dos planetas". E emseguida disse "significa que está tomando o corpo todo, fi lha",confundindo mais ainda minha cabeça, que não conseguiufazer l igação com os possíveis significados de "metástase".

Agora sei o que o nome significa, porque minha mãe, commuita dor no coração e uma força quase heróica para nãochorar, foi a que restou para me expl icar como as coisasseriam daqui pra frente. E final izando com "ela não vaiaguentar por muito tempo", fez desmoronar meu sonho de que"metástase" teria alguma coisa a ver com comida francesa.

Estou assustada porque, sempre ou quase sempre amei aspalavras, mas essa não amo e, com toda a sinceridade de umacriança, queria ter o poder de transformá-la em um remédioque arde, mas que pode curar. »

Crônicas

Caroline de Camargo Bufelli

Meu pai já me dizia, em caso de assalto entrega tudo, tudoque tiver e não olha no olho de quem for. Já me dizia e mepreparava para o pior, para o que fosse acontecer no mundo láfora quando eu, sua fi lha indefesa, fosse precisar enfrentar.

E me dizia isso desde pequena, quando sempreacompanhada do mais atencioso cuidado e proteção, eu nãofazia à mínima ideia do que era um assalto. Ter suas coisastiradas, a vida lhe dando um tapa na cara, que isso, rapaz, seinada sobre isso. E me criava, me dando tudo do bom e domelhor, cama quente, escola paga, roupa nova para osaniversários de quinze anos que tinha para ir ao final desemana, levava e buscava de carro nas portas das festas,cheias de seguranças e fi lhos de médicos e, junto de minhamãe, me recomendava para nunca beber no copo de outrapessoa – pode ter droga, podem lhe machucar.

Como obediência, sempre assimi lei tudo o que meensinavam. Ter juízo, não dar ouvido a estranhos, não aceitarcarona de gente que bebeu, não beber se fosse dirig ir e ah!Mãe, corre, passei no vestibular. Vou morar fora, ter mobíl ia,talher novo, amigos, professores, caminhos, bares eexperiências novas. Vou crescer, aprender, seguir meucaminho e fazer trabalhos, muitos trabalhos.

Meu pai também me dizia para sempre correr atrás dosmeus sonhos. Acreditar que eu posso dar meu melhor emtudo, e seguir em frente, sem precisar machucar ninguém paraconquistar meu espaço e meus propósitos. Segui fel iz e vesti acamisa da faculdade. Fazer tudo na mais alta qual idade queeu puder em agradecimento a cama quente, a escola paga, asroupas novas de todos os aniversários de quinze anos que eufui , e as caronas até altas horas da madrugada das festascheias de segurança e fi lhos de médicos.

Aí me assaltaram. Assustaram-me com uma arma, mepediram meu celular e me olharam nos olhos sem que eupudesse desviar a tempo. Provaram-me na pele todos osdebates que participei na universidade, em que eu tentava metransformar, evoluir, entender o mundo, compreender a

sociedade, fazer parte dela, de alguma maneira e entender oporquê certas coisas aconteciam.

Quando eu burlei uma regra que meu pai havia me impostoe olhei bem fundo nos olhos daquele cara, eu entendi como avida funcionava. Entendi que ele nunca teve uma cama quente,uma escola paga, roupas novas nem caronas para as festascheias de seguranças e fi lhos de médicos. Enquanto euaprendia a segurar em lápis e ouvia, quando errava, que eupoderia ser melhor, aquele cara aprendeu a segurar em arma eapanhava quando fazia algo errado. Apanhou quando nasceu,quando cresceu. Apanhou do pai , apanhou do irmão, apanhoudo cara forte da escola, do pol icial . A parte mais triste foiquando apanhou da vida.

Aí eu vi que eu não era vítima. Ele, aquele que me apontouuma arma, é quem era. Ele, com aqueles olhos arregalados,não sabe como será o dia de amanhã. Enquanto para mim oamanhã é sempre um novo dia, ele vive na incerteza do diaseguinte. Enquanto eu sou assaltada e na semana seguinteganho um celular novo, ele precisa assaltar pra que possacontinuar na vida. Ele precisa assaltar para que possacontinuar apanhando e possa continuar vivo.

Entreguei , e poderia ter entregado tênis, relógio, meu medoe minhas questões. Seria a vida de uma pessoa tão ruim,capaz de fazer-lhe provar do mal que lhe pertence e gerartamanho medo em outro alguém, só para poder sobreviver?Será tão ruim esse mundo ao ponto em que eu, menina criadacom cama quente, escola paga, roupa nova e carona parafestas cheias de segurança e fi lhos de médicos, pudesseperder as esperanças?

Suas circunstâncias eu nunca soube. Um celular, em si , ésó um celular, mas a necessidade de tirar de alguém, além demais complexa, traduz o mundo em menos de um minuto enos faz crer que o que necessitamos não é discutir sistemapenal , mas sobre até que ponto você chora pelo seu celular edorme bem com a vida que tiram daqueles que nuncasouberam o que é viver. »

Page 5: Senso incomum 22 bx

Por umapositividadecomunicativa

AT UAL I D AD ESI N n. 22jun/ju l201 4 5

Leidiane Campos

Você provavelmente já ouviu aexpressão “se torcermos o jornal ,sairá sangue”. Acostumou-se a ver eler os noticiários do dia esperandoqual será a tragédia da vez. Foipensando nesta situação que oprojeto Imagens e Vozes deEsperança, o IVE, resolveu planejaruma solução. Coordenado pelaentidade não governamental BrahmaKumaris, o plano tem a proposta deapresentar aos profissionais dacomunicação a possibi l idade detrazer ao públ ico uma visão maispositiva frente aos acontecimentossociais.

A missão proposta pelo projeto éfortalecer e transformar o papel damídia como um agente de benefíciomundial . Os ideal izadores do IVEacreditam que os profissionais dacomunicação sejam capazes degerar conteúdos construtivos, queampl ifiquem a esperança humana eque colaborem com ações quepromovam a vida.

A meta primordial da organizaçãoé trazer à tona o que há de bom nomundo. Para o projeto, osprofissionais da mídia devem seposicionar no papel deinvestigadores de históriasinspiradoras que ainda não tenhamsido comparti lhadas.

E na prática?A estudante do 6º período de

Jornal ismo da UFU, Daniela Malagol i ,acredita que a mídia “já teminfluenciado esse pensamento maispositivo”. Para a estudante, ojornal ismo tem um papelfundamental na vida em sociedade.“A proximidade entre a mídia e nós étanta que nem mesmo percebemos”,ressalta. Daniela destaca que buscarum jornal ismo positivo é, nareal idade, “estimular através daverdade”.

No acordo com Daniela, ajornal ista e docente universitária,Patrícia Amaral , reflete que asmatérias positivas são importantes,pois trazem para as pessoas umpouco mais de esperança. Para ela, asociedade sente a necessidade de se

espelhar em bons exemplos e éneste sentido que projetos como osdo IVE podem ser possíveis e viáveis.A jornal ista expl ica que osprofissionais da mídia têm “quecomeçar a buscar o diferente, buscaro novo”.

E foi buscando bons exemplosque a jornal ista Mônica Cunhaconsti tuiu o exercício de suaprofissão. A editora e apresentadorado programa televisivo Bem Viverconta que está sempre em busca dehistórias de esperança. “No BemViver sempre tentamos levar essamensagem positiva”, destaca ajornal ista. Para Mônica, “os bonsexemplos precisam ser reforçados,ressaltados”, pois esta maneira de sepensar a comunicação desperta oque há de melhor nas pessoas.

A jornal ista acredita que ojornal ismo positivo já está dandoseus sinais à sociedade, trazendo“mais leveza a dias de violênciacrescente, corrupção sem fim einjustiças sociais”. Para ela, não hácomo fugir da real idade que noscerca, mas é possível ao jornal istatransmitir “histórias melhores, queinspiram e recuperam”. O importantepara a apresentadora é “não desistirda beleza da vida”, pois acomunicação positiva é umchamado que se faz semprepresente. “A cada dia essa voz mechama e eu sigo”, reflete.

Aprova a ideia?Mas e agora, cá entre nós: essa

proposta é realmente interessante?Para a assídua lei tora das notícias

diárias, Li l iane Carla, o que se vê hojena mídia é a ênfase nas tragédias. Aestudante não considera a exposiçãodestes fatos algo essencialmenteruim, pois acredita que, apesar detudo, “temos que ser real istas”.Li l iane, no entanto, pontua que atransmissão noticiosa do que há denegativo na sociedade se tornoumassiva. Assim, para ela, esta novamaneira de se pensar a construçãodas notícias pode ser benéfica, poispropicia às pessoas “uma nova visãodo mundo”.

Instituto IVE propõeformas alternativasde produ zircomunicação

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Page 6: Senso incomum 22 bx

No caminho dailuminação...Em busca de outros olhares, Adriana Myoden vêna linhagem Zen Budista equilíbrio, calma interna

e entende que viver é estar em plena conexãocom o todo, por isso o amor a todos os seres.

6 I Nn. 22jun/ju l201 4

Bruna Tarcitano

De óculos redondos, esti lo John Lennon, e os cabelos pretos curtos,Adriana Muniz Retamal, conhecida no Zen como Adriana Myoden, chegadizendo que não é tão importante assim para dar entrevista. Sua expres-são é alegre, seu falar calmo, seu olhar vai além e logo vemos que suamente é sábia. Pede um minuto de silêncio e respiração profunda e – pormais notável que seja o desconforto de todos na coletiva de imprensa –permanece al i , em paz, serena, com o coração e a mente abertos.

Abre os olhos e pega seu Rakusu, explicando aos olhos curiosos que éa miniatura do manto do monge – um documento – que ela desdobracom cuidado e recita “[. . . ] vasto é o manto da libertação, sem forma ocampo de benefícios, uso os ensinamentos do Tatagata para salvar todosos seres”. Afinal , diz “gratidão” e pede um pouco de lenço, explicando “éque assim, quando eu recito um verso que acho bonito eu choro. É um

clássico”. E as lágrimas caem imediatamente pelo sorriso de Myoden.

Menina dos mendigosAdriana nasceu em Santarém, no Pará e quando pergunto quando

decidiu seguir o Zen Budismo, diz apenas que desde pequena foi muitoapaixonada por tudo. Relembra, rindo, das palavras de sua irmã “Adri-ana conversa com mendigo e cachorro todos os dias”.

Ainda jovem, formou-se em Design de Interiores pela UniversidadeFederal de Uberlândia. Foi perto dos 28 anos que “a ficha começou a cair”,encontrando o Via Zen em Porto Alegre. Sua mente é cheia de memóriasde um mundo belo e cheio de Budas.

Myoden escolheu como professora a pau-l istana e roqueira Coen Roshi , por quem de-

monstra muitocarinho. A monja feza ordenação leiga deAdriana, que passoua ser Myoden e, anoque vem, fará suatransição para amonástica. “Foi olhono olho e eu falei ‘éela’ , mas não sabianem onde nemquando”.

A principal práticado Zen Budismo é oZazen, “sentar em zen”. É manter a posturaereta, o olhar na diagonal e os polegares le-vemente encostados, deixando os pensa-mentos passarem. É estar atento àrespiração e, no lugar de deixar sua vida nocomando automático, tomar o controle doseu navio.

Entrevista perfil

"“Myo” significa, numaversão mais ampla, aclaridade do sol e dalua, enquanto “den” é

“dharma”, tudo o que ésagrado ou todo ouniverso. Em umatradução, Myoden

significaria “brilhantetransmissão”.

ILUSTRAÇÃO:P

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No caminho dailuminação...Em busca de outros olhares, Adriana Myoden vêna linhagem Zen Budista equilíbrio, calma interna

e entende que viver é estar em plena conexãocom o todo, por isso o amor a todos os seres.

7I N n. 22jun/jul201 4

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Vendo os Budas no infernoAté pelo fato de Myoden ser do rock sua

prática Zen é outra. Em suas chocantes pala-vras, “eu gosto de ver Budas no inferno, sa-be?”. Ela gosta de mendigos, adictos,prosti tutas e alcoólatras, não só no sentido

de ajudá-los, mas também por sesentir ajudada por eles o tempo to-do. Para ela, todos os seres têm na-tureza Buda e os vícios são apenas“vício da falta de amor”.

Foram várias às vezes nas quaisMyoden mencionou alguma experi-ência fora do comum com mendigos.Ela é extremamente apaixonada pelosseres humanos e vê em cada ser ummestre e um Buda.

A prática Zen Budista conci l iadacom o trabalho no meio corporativofoi desafiadora no início, mas hoje,traz “vantagens sem limites”, expl i-ca. Ela conta que procura tratar to-

dos bem, e gosta de entrar nas obras, mesmoque os pedreiros achem loucura. “Eu quero fi-car suja de terra, quero ajudar pessoas aconstruir casas”.

Em 201 2, participou do Retiro de Rua, fei-to pelo Zen Peacemakers, grupo de Zen Bu-dismo socialmente engajado. Myoden fez

parte da edição paul ista do retiro, vivendodurante quatro dias como sem teto na Praçada Sé, centro de São Paulo,junto com outros Zen budistas.“É interessante ser sem teto,porque a gente vive para terteto”. A ideia é olhar para ascoisas de uma perspectiva di-ferente e mais apaixonada.

Boemia ZenMyoden sempre gostou do

rock e da boemia, o que nãomudou muito desde que co-meçou com suas práticas. Oque gosta é de observar os ce-nários a partir de outro pontode vista, afinal , para a OrdenadaLeiga, os preceitos Zen budis-tas dão total l iberdade.

Tom Jobim, Cássia El ler,Queen, Cazuza, Janis Jopl in eChico Buarque estão por seuFacebook, assim como men-sagens alegres de eventosZen. Adriana ama cerveja es-pecial , tomar vinho, i r a bares e shows e seequi l ibrar no slack l ine. Bater papo com osmoradores de rua, manter sua sala de Zazen,

praticar permacultura e cuidar da plantaçãode hortal iças orgânicas do Sítio Namastê, em

Uberlândia, tambémsão coisas que adoce Myoden faz,com o rosto cheiode alegria.

Ela termina aentrevista com pro-funda gratidão, mearrepiando da cabe-ça aos pés. É umagarota sorridente, decabelos pretos e ócu-los redondos, quepartiu mudando a vi-são não apenas doque é ser Zen, mastambém do que é serum ser humano.

Enfim, repete aspalavras da monjaCoen: “Ser Zen étrocar pneu, asmãos sujas de

graxa. Ser Zen é serpedreiro, fazendo e refazendo casas. É ser arespiração que respira em cada ação. Ser Zené ser tempo, ser Zen é ser existência”.

Prática zen budista é alicerce para a vida, engajado e de abertura de consciência

FOTO: Grupo Fotojornalismo

"“Myo” significa, numaversão mais ampla, aclaridade do sol e dalua, enquanto “den” é

“dharma”, tudo o que ésagrado ou todo ouniverso. Em umatradução, Myoden

significaria “brilhantetransmissão”.

Adriana é apaixonadapor todos os preceitosZen budistas. Segundoa monja, os preceitos

de ouro a condu zem anão fazer o mal, fazer o

bem e fazer o bem atodos os seres, e isso

permeia até mesmo acervejinha com osamigos. Entretanto,

também acredita queviver gera impacto eadmite que é muito

difícil viver assim.

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Com o objetivo de diagnosticar e direcionar corretamente os re-síduos da Universidade Federal de Uberlândia (UFU) criou-se a Co-missão Gestora de Resíduos (CGR), composta a partir daconstatação da necessidade de implantar uma política ambiental nauniversidade. Segundo a coordenadora da CGR,docente Márcia Gonçalves Coelho, a ausência dapolítica que amparasse legalmente os compro-missos que a universidade deveria assumir como meio ambiente era usada como justificativapara o descarte incorreto dos resíduos. A políticaambiental proposta pelo grupo passou por mo-dificações, foi aprovada em 201 2, mas aguardaimplantação.

Gestão e educaçãoEm 2007, um grupo de especial istas iniciou o

trabalho de identificação do direcionamento dosresíduos da universidade e, com isso, foi propostaa criação da Comissão de Gerenciamento de Re-síduos. A partir dela, foi desenvolvida a primeiraversão da política ambiental para a UFU, que in-cluía a criação da Comissão Permanente deGestão Ambiental (CPGA), a qual teria a final idadede gerenciar ambientalmente a universidade coma participação de professores, técnicos e alunos. Com a mudançana política ambiental da UFU, a CPGA foi extinta e criou-se, então, aComissão Institucional de Gestão e Educação Ambiental (CIGEA)com a final idade de supervisionar a Política Ambiental da UFU.

De acordo com Euclídes Honório de Araújo, d iretor de susten-tabi l idade da UFU, a CIGEA ainda não está em funcionamento,mas será composta por cinco técnicos administrativos: dois l iga-dos à educação e três aos hospitais; cinco docentes e cinco alu-nos, sendo dois da pós-graduação. “Só ele (reitor) pode nomear. ACIGEA funcionou extraordinariamente e agora espera para se reu-nir de forma defini tiva. ” A CPGA foi proposta para atuar como umórgão executor que acompanharia de perto os processos ambien-tais e daria respostas, caso necessário. Segundo o professor Mau-ro Marques Burjai l i , a criação da CIGEA divide educação e gestão.O professor afirma que a gestão engloba educação e que o direci-onamento correto dos resíduos deve ser feito de forma sistêmicapor todos da comunidade acadêmica.

Tomando o conceito de universidade interl igada em todas as es-feras, a CGR propôs o compromisso formal que foi consol idado noartigo terceiro da Política Ambiental : “A UFU se compromete a agirem prol da prevenção da poluição e da conservação e restauraçãodo meio ambiente, atendendo aos requisitos legais apl icáveis etranscende-los, como forma de exemplo, quando possível , proporci-onando a melhoria contínua do seu desempenho ambiental , para odesenvolvimento sustentável , em todos os seus espaços de atua-ção”. Contudo, segundo o diretor de sustentabi l idade, a primeiratentativa de implantação da Política Ambiental não deu certo.

Lei FederalDe acordo com a lei 1 2.305, de 2 de agosto de 201 0, o Plano de

Gerenciamento de Resíduos Sól idos (PNRL) deverá ser elaboradopor insti tuições de serviço públ ico de saneamento, indústrias, ser-viços de saúde, mineração e estabelecimentos comerciais ouprestadores de serviço que gerem resíduos perigosos ou em volu-mes desproporcionais aos domici l iares. O plano de gerenciamentodeverá conter exigências mínimas como o diagnóstico dos resídu-os gerados, ações preventivas, além de metas e procedimentospara diminuição dos resíduos sól idos gerados. A lei também intro-duz o conceito de logística reversa, que cria a obrigação do consu-

midor devolver para os fabricantes, importadores, d istribuidoresou comerciantes, independente do serviço públ ico de l impeza, osresíduos de agrotóxicos; pi lhas e baterias; pneus; óleos lubrifican-tes; lâmpadas; e eletroeletrônicos.

De acordo com Araújo, a Universidade optou por contratar em-presas para recolher os resíduos gerados pela instituição. “Tudo

está sendo acumulado. Não está sendo manipulado. Optamos pornão tratar”, afirma. Ainda de acordo com o diretor, a opção pelo nãotratamento na universidade é a falta de condição para executar essatarefa. Na universidade há o Laboratório de Resíduos, onde, segun-do Júl io César Costa, técnico em meio ambiente responsável pelolaboratório, funciona uma unidade de gerenciamento criada em2007 que, por motivos de administração, permaneceu fechada. Deacordo com Araújo, houve a abertura do laboratório, mas ainda há anecessidade de contratação de mais profissionais.

O advogado, Thiago Deienno ressalta a necessidade de a Uni-versidade estar atenta à qual ificação técnica das empresas e seelas possuem autorização pelos órgãos ambientais para real izaresse serviço. Ele afirma ainda que a contratação de empresas ter-ceirizadas não isenta a UFU das responsabi l idades ambientais.“Além da responsabi l idade sol idária por danos ambientais, a Lei deResíduos Sól idos afirma expressamente que todos os que fazemparte da cadeia de manejo e geração do resíduo são responsáveispor ele”, completa Deienno.

UnisinosISO 1 4001 é uma norma conhecida internacionalmente que

estabelece um Sistema de Gestão Ambiental (SGA) com equi l íbrioentre lucratividade e redução do impacto ambiental . A Universida-de do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos) foi a primeira universidadea receber a certificação na América Latina, em 2004. De acordocom a representante do SGA da universidade, Susana Brand, oprocesso de certificação ambiental levou cerca de dois anos e apolítica ambiental usada foi elaborada pela administração da uni-versidade, pelo Sistema de Gestão Ambiental e comissão de pro-fessores e funcionários designada para o processo.

A Universidade real iza coleta seletiva e possui uma estação detratamento de esgoto doméstico e pré-tratamento de efluentesquímicos e biológicos gerados, além de fazer compostagem dosresíduos vegetais. No entanto, ainda de acordo com a represen-tante, em relação à logística reversa, que ainda não é real izada nauniversidade, será feito um projeto pi loto para as lâmpadas fluo-rescentes. “Trabalhamos diariamente com a melhoria contínua dosistema de gestão ambiental”, afirma Susana.

Luísa Calefi e Marcelo França

Política ambiental da UFU: do papelpara a prática?

8AT UAL I D AD ES I Nn. 22jun/ju l201 4

Meio Ambiente

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FOTOS:S

érgioDalláglio

Resíduos Sólidos é pauta primeira da Lei 1 2. 305 de 201 0, sobre impacto ambiental

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Na correria do dia a dia, ao acende-rem lâmpadas ou l igarem aparelhos elé-tricos, poucos param para pensar emcomo a energia elétrica é produzida edistribuída. Os recursos hídricos do Bra-si l garantem para as hidrelétricas umpapel fundamental na produção deenergia. No entanto, os impactos cau-sados pela construção de represas ge-ram alterações ambientais que, nomáximo, são amenizadas por ações in-denizatórias ou pelo deslocamento deexemplares da fauna e flora para outrasregiões.

Antes de represar uma área há o tra-balho de realocação de exemplares deespécies da fauna e da flora, mas a mu-dança no habitat natural das espéciesrompe um sistema que difici lmente serecuperará. O docente do Insti tuto deGeografia, Vicente de Paulo da Si lva,afirma que no caso da Usina de NovaPonte, espécies de peixe deixaram deexistir no local e animais que vivem nasmargens sofreram alterações em seusistema natural . Ele acredita que com aconstrução de seis usinas no rio Ara-

guari , mais de 50% do rio se tornou lago.Ainda de acordo com o professor, aconstrução de hidrelétricas gera impac-to não só ao meio ambiente. “A constru-ção é impactante ao meio ambiente e,principalmente, ao trabalhador. Há aperda de identidade e de cultura”, com-pleta.

Apesar dos impactos, as hidrelétri-cas possuem importância econômica esocial para o País. De acordo com da-dos da Agência Nacional de Energia Elé-trica, 63,03% daenergia elétricaproduzida noBrasi l ocorre em1 .1 33 usinas hi-drelétricas emoperação, por-centagem quepoderá ser au-mentada com aconclusão de 45empreendimentosem construção e1 95 outorgados,mas que não ti-veram as obras

iniciadas.O docente da Faculdade de Enge-

nharia Elétrica, José Rubens Macedo Jr,lembra que a escassez de água podecausar al terações na qual idade daenergia, por meio de interrupções ouracionamento. Ele ainda diz que o usode outras fontes de energia é vantajo-so. “A diversi ficação da matriz energé-tica d iminui os riscos associados àescassez de água nos grandes reserva-tórios”.

Dar a destinação adequada aos resíduos eletroeletrônicosde órgãos públ icos é uma questão que envolve a burocraciada diferenciação entre itens do patrimônio públ ico e materialde consumo, além do envolvimento de resíduos de variadasuti l idades. Na Universidade Federal de Uberlândia (UFU),insti tutos e faculdades ficaram sem cartuchos de impressoradurante um período de aproximadamente dois meses devidoao processo de regularização ambiental em relação àsempresas fornecedoras e à implantação do processo delogística reversa, que foram medidas para viabi l izar a coletados resíduos pelo setor empresarial para que possam serreaproveitados ou receberem destinação final adequada.

De acordo com Eunir Augusto Reis Gonzaga, coordenadorde planejamento de gestão ambiental da Diretoria deSustentabi l idade (Dirsu) da UFU, há uma gama significativa deresíduos que envolvem os produtos eletroeletrônicos emateriais como cartuchos de impressora. Há duas classes deresíduos: os componentes eletrônicos e a tinta. Eucl ídesHonório de Araújo, d iretor de sustentabi l idade da UFU, diz quepor haver objetos considerados patrimônio, o processo delogística reversa se torna mais compl icado visto que odescarte é de procedimento diferenciado.

Cartuchos de impressoraOs cartuchos de impressora apresentam componentes

plásticos, metais e tinta. A classificação desse resíduo, deacordo com a Associação Brasi leira de Normas Técnicas(ABNT), é classe I , ou seja, apresenta riscos à saúde públ ica eao meio ambiente ou características como inflamabi l idade,corrosividade, reatividade, toxicidade e patogenicidade.

Os cartuchos de impressora apresentam metais pesadosem sua composição e segundo o professor Bruno TeixeiraRibeiro, pesquisador na área de manejo e conservação do solo

e água, esses metais, dependendo das condições, podematingir o lençol freático, comprometendo a qual idade da água.

No processo de logística reversa, a responsabi l idade peladestinação adequada dos produtos é comparti lhada. No casoda UFU, segundo o coordenador Gonzaga, a Dirsu abriuprocesso de l ici tação para contratação de empresas quepossuíssem certificação ambiental para o fornecimento decartuchos para a universidade, visto que a empresa que antesfornecia os cartuchos, não possuía a certificação. No períododesse processo de l ici tação, que durou cerca de dois meses,os insti tutos ficaram sem cartuchos.

Gonzaga relata que em 201 3, a universidade chegou a terum estoque de sete mi l cartuchos em um galpão, visto quehavia dificuldades para lei loá-los e nem sempre o processo derecarregá-los dava certo. Foi feita, então, a nova l ici taçãoprocurando uma maneira de diminuir o montante estocado.Assim, de acordo com o coordenador, o contrato estabelecidoentre a empresa ambientalmente certificada e a universidadeestabelece que ao fornecer os cartuchos de impressora para aUFU, a empresa recolherá os usados.

Patrimônio e leilõesOutro problema identificado na gestão de resíduos

eletroeletrônicos em órgãos públ icos é a questão que envolveos patrimônios. Há a necessidade de fazer o descarte dessesresíduos sem que haja prejuízo para o patrimônio públ ico.Gonzaga aponta objetos como teclados, mouses e telefonescomo exemplos de material de consumo e, por outro lado,impressoras como bens patrimoniais. “Quando umequipamento é patrimônio, você não pode simplesmentedescartar. Você tem que dar baixa no patrimônio, tem que terum lei lão, levar isso a públ ico. Existe um procedimentodiferente”, completa.

FOTO:S

érgioDalláglio

Uberabinha. Baixo nível de água nos afluentes dos rios represa-dos afeta produção de energia

AT UAL I D AD ES9I N n. 22jun/ju l201 4

Luísa Calefi e Marcelo França

Lixo correto

Marcelo França

Impactos ambientais das Usinas

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UFU se adapta para gerenciamento de resíduos eletroeletrônicos

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Desde que me entendo por gentemeus pais sempre diziam que todo serhumano tem que fazer o bem ao próxi-mo, independente de ser uma pessoajovem, velha, criança ou até mesmoum animalzinho. Cresci e vi que temgente que realmente leva muito a sériotal aprendizado, realizando todo tipo detrabalho voluntário.

Há três anos minha mãe desco-briu que estava com câncer de ma-ma e eu pude comparti lhar essajornada de sofrimento e muitas ale-grias posteriores, ela sempre meconta várias histórias que acontece-ram com ela no interior do hospital , esobre os voluntários que sempre es-tão com um sorriso no rosto. “Euchegava no hospital para mais umaquimioterapia, aí vinha um voluntárioque se sentava ao meu lado e come-çava a jogar conversa fora, eu nemconhecia a pessoa e ela saía de ondeestava pois me achou ‘pra baixo’”, re-lata minha mãe, Marisa.

Segundo um dos maiores oncolo-gistas do Brasi l , Fernando Coitat Ma-luf, futuramente a doença será amaior causa de morte no mundo na

próxima década, o própriomédico disponibi l iza emseu site especificações so-bre a doença e dicas paralutar contra ela emwww.vencerocancer.com.br.Com tantos índices negati-vos, como um paciente queluta contra uma doença tãoagressiva pode esquecer-sedela por alguns minutos? Ocâncer deve ser enfrentadopor um time, que inclui pro-fissionais de saúde, volun-tários, paciente, fami l iarese amigos.

Há 1 8 anos foi criadoem Uberlândia uma ONGal iada ao Hospital do Cân-cer, o “Grupo Luta Pela Vi-da”, que organiza o corpode voluntários do hospital ,o grupo conta com cercade 450 voluntários, d ivid i-dos em 20 equipes. Além detransbordar sol idariedade, o

grande objetivo dos voluntários é hu-manizar o ambiente hospitalar e pro-porcionar apoio aos pacientes efami l iares. As ações real izadas pelohospital são mantidas por doaçõesda comunidade, sejam roupas, sapa-tos, l ivros e até mesmo algumaquantia em dinheiro, e também apoiodas empresas de Uberlândia e região.

No ano passado foi feita uma ex-posição fotográfica com pacientesdo hospi tal no mês de outubro, queé conhecido como “Outubro Rosa”,época para alertar as mulheres so-bre o perigo do câncer de mama. Aexposição foi nomeada como “Lin-das de Viver”, e minha mãe foi umadas pacientes convidadas a seremfotografadas, “Participar dessa ex-posição foi um marco em minha vi-da, e o Grupo Luta Pela Vida semprefoi mui to acolhedor comigo e comtodos os pacientes do hospi tal , fi -quei surpresa com o convite”, contaMarisa.

Os voluntários praticam ativida-des recreativas no hospi tal , propor-cionando bem-estar físico,psicológico e social ao paciente queestá se tratando. Tive a oportunida-

de de conhecer Fi l ipe Coutinho, de26 anos, que é voluntário há um anono hospi tal , que ele chama carinho-samente de “Hospi tal da Gratidão”.“Eu sou uma pessoa que nasceu prafazer coisas boas para os outros, enão pra mim diretamente”, conta ovoluntário.

Quando um paciente do hospitalfalece, Fi l ipe diz que é algo muito im-pactante, “mas eu fico satisfeito pelossorrisos e obrigados que a gente ga-nha lá, e esse é o nosso pagamento”,comparti lha. Segundo o site do “Insti-tuto Oncoguia”, cerca de 50% dos ca-sos de câncer no mundo têm cura. Ovoluntário ainda diz que “A questãopsicológica que ajuda demais. Eu nãovejo sentido uma pessoa sorrir comum câncer espalhado no corpo inteiro,mas a pessoa sorri , então eu não sei aexpl icação. Pra mim é totalmentegratificante, é uma obrigação do serhumano ajudar o outro”.

Minha mãe sempre diz que “Aspessoas que realizam o voluntariadoprecisam de um grande suporte emo-cional para sempre estarem ajudandoo paciente e garantir uma boa relaçãoentre os dois. E isso eu vejo sempre nohospital , os voluntários tratam todostão bem, não só os pacientes, mastambém os acompanhantes”. Os ser-viços voluntários são e sempre serãotratados como algo enriquecedor parao indivíduo que o pratica.

O Hospital do Câncer de Uberlân-dia recebe todo tipo de contribuição, eultimamente uma diferente doaçãovem chegando com mais frequência,são as doações de cabelo para aconfecção de peruca para as pacien-tes. As irmãs Maria Clara Castro, 1 5 eMarcela Castro, 9, decidiram cortarseus cabelos curtinhos e doar as me-chas ao hospital , a irmã mais velha diz“eu me sensibi l izei , alguém pode pre-cisar bem mais do que eu. Fiquei bememocionada quando eu fui levar o ca-belo no hospital do câncer, é quandorealmente você tem a sensação demissão cumprida”. Marcela acres-centou “eu queria também ver outracriança fel iz, depois de cortar eu deium gritinho e falei : pronto, cortei ! Mesenti fel iz, muito!”.

Filipe Coutinho durante a páscoa no Hospital do Câncer

10cu lt u raesport elaz er I Nn. 22jun/ju l201 4

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Mariely Dalmônica

Ser voluntário é algo enriquecedor, se planta o bem e dinheiro algumconsegue pagar tanta sabedoria colhida

Compartilhando alegrias esomando amor : a importânciado trabalho voluntário

Voluntariado

FOTO:M

ariely

Dalm

ônica

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Proj eto Cachoe i ro apresentarotas d as Cachoe i ras d o

T r iân gu lo M in e i ro

Faci l i tar oacesso da po-pulação deUberlândia eregião àscachoei-ras: esteé o obje-tivo doCacho-eiro, quetembrinca-deira nonome emuitagente aven-tureira no

Triângulo Mi-neiro. Se nossa

cidade é conhecidapor sua logística de

negócios, também mere-ce ser valorizada pelas suas

quedas naturais. Pois bem, aqui nós estamos,seis jornal istas em formação, apresentandouma alternativa barata para tirar qualquer umda zona de conforto. Por detrás de tudo, o pro-jeto apresenta, principalmente, que a natureza émuito mais do que um refúgio das grandes sel-vas de pedras, mas também uma forma de tu-rismo acessível a toda população.

Ao perceber uma ausência de informaçõesentre as possibi l idades turísticas que o cerradomineiro proporciona e a demanda da populaçãopor programas de lazer gratuitos e de qual idade,o projeto se desenvolveu ao longo de oito meses.Unindo “Cachoeira” e “Roteiro”, o Cachoeiro sele-cionou e visitou, inicialmente, cinco cachoeiraspara fazer registros fotográficos, narrar aventu-ras e mostrar as tri lhas e rodovias em vídeosinstrutivos de “como chegar”. Tudo isso apoiadona l inguagem do Jornal ismo Gonzo, técnica quese aprofunda no trabalho antropológico do jor-nal ista, ressaltando, acima de tudo, o envolvi-mento e os olhares do repórter com a situaçãonarrada. O resultado foi um trabalho autoral ,verdadeiro e bem apurado, refletindo as nossas

impressões e vivência durante o processo.A ideia de se jogar no cerrado e tornar isso

um manifesto jornal ístico nasceu em meio adiscussão de criação de um projeto prático finalexigido pela graduação em Comunicação Socialda Universidade Federal de Uberlândia. Desdeoutubro de 201 3, o Cachoeiro tem preservado oseu lado B da situação e é de todo mundo, alémde ser gratuito e colaborativo. Desde sua gêne-se, o grupo buscou a colaboração de váriaspersonal idades, como biólogos, praticantes doreiki , cicl istas e publ ici tários. Queremos mesmoé algo plural , bonito e democrático!

O mais interessante é que, dos seis criadores,nenhum se parece com outro: e isto está pre-sente nas diferentes perspectivas de cada ca-choeira visitada, seja nos vídeos, fotografias outextos – cada um emprega a personal idade forteque tem. Em cada entrevista real izada, perce-beu-se que o Projeto Cachoeiro, além de ser umproduto inovador, considerando que não há ne-nhum similar no mercado, ele é, acima de tudo,necessário, pois também leva em consideraçãoa conscientização de seu públ ico para a preser-vação do meio ambiente e das quedas naturais.

O site está no ar e é o nosso convite aodesconhecido, para sair da zona de conforto.Desde então, já tivemos um feedback bacanaatravés de comentários no site, mensagens nasredes sociais e pessoas que nos procuraram noFacebook para parceria em outros projetos. Ouseja, com pouco tempo de vida, o Cachoeiro éreferência para aqueles que buscam um con-tato mais próximo com a natureza, de uma for-ma simples, acessível e quase sem custofinanceiro. Jorge Amado já dizia que só os ma-landros são fel izes, porque os malandros co-nhecem a cidade com a faci l idade de umsorriso. Nós concordamos com veemência. Oque está por vir “é tudo nosso”.

cu lt u raesport elaz er11I N n. 22jun/jul201 4

Carlos Gabriel Ferreira, Emílio Lins de Sá Vieira, Isley Borges da

Silva Junior, Laís Pinto Ortiz, Lívia Rodrigues Machado e Raissa

Dantas de Sousa

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Trilhas

Desenvolvido por seis alunos docurso de Jornalismo da UFU, o siteé uma opção ecoturística de lazer

SSEERRVVIIÇÇOO::Projeto Cachoeiro – roteiro de cachoeiras de

Uberlândia e região

http://projetocachoeiro.com.br

http://fb.com/projetocachoeiro

http://instagram.com/projetocachoeiro

FOTO: Lívia

Rodrigues

Machado

FOTO: Raissa Dantas de Sousa

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FOTO: Mariana Almeida

Cada an imal , seja pequeno ou grande, seja o bicho homem ou não,é um pequeno motor de tudo que ocorre perto de nós. O mundo émui to maior do que nossa bolha. A gargalhada sincera , a lágrimainesperada, a luz que se acende e a noi te que se vai . Todas elasdotadas de iguais importâncias. Mesmo que a gente não consiga ,infel i zmente, enxergá- las.

I Nn. 22jun/ju l201 412EXPRESSÃO&arT E

Um sorriso, um olhar, um pôr do sol . Cada minúcia do tempo que nãovemos. O d ia a d ia ag i tado, o ciclo vicioso que nós mesmos criamos e arotina impetuosa e incessante que insistimos em cumpri r nos privamdetalhes encantadores que transformariam segundas-fei ras chuvosas.São mi lhares de organ ismos que criam o sistema ún ico no qual vivemos.

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FOTO: Michael Kealton Barcelos FOTO: Sérgio Dalláglio

FOTO: Sérgio Dalláglio

FOTO: Mariana Almeida

FOTO: Maria Paula Martins