santa gema galgani (parte i)

160
■\) O * O o o o o- o o o o o o o o u G , c k) G o c G o o o o o o o r- O i

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ESCUTAR LIVRO COM O PROGRAMA TEXTALOUD

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P* GERMANO DE SANTO ESTANISLAU*

Santa G em a G a lg aniA F L O R D A P A I X Ã O

íroduçÔD do Rcv.° P.* MATOS SOARES

T [ * C t l « A C D I Ç A O

Aurrcnícco e cctoslticdoP t L O

P.« JOSÉ 0 £ OLIVcIRA DIAS. S. J.

S3 * M I L H A R

P O K I O

LIVRARIA APOSTOLADO DA iMrRENSA

EUA Dc CEDOfEirA. 623 * .

JÇíO

N ImI f.bital

Olyi'pcr»*, 3-2-íÇ^O

PAULUS DURÃO. S J.

Pioep. Piov. Lvnl

P ^j* Imprim’#.i^.

Pd:*.0 ió d t F«/.° <£♦ *«940.

f A . A.f SISPO D O FCR TO

Todos os direitos ce piopriedcdo teservatioi

Com p. c l.rp. no f«p. StÇceuo. llmítoda — Poilo

E x p l i c a ç a o que s e im p õ e

S T A nova edição da vida d c Santa O cn u

Galga.ni atendeu-se sobretudo a er.riquccéda

com abundante ilustração— i 2 ião as feto-

gr a r uras que a adornam — . a esclarecera com algumas

notas oportunas, a aetualirã-la c a complctá-h. por.do-a

cm dia com r. ad ição das novos capítulos references à

glorificação da mística Passiflora de /.«ca .

£s tc tiaba lho per err. competia per todes cs titi:!os

ao Rev." P .e h ia tos Scare*, a quem sc deve a tradução

desta encantadora biografia. Com cia teve Sua R cv .' o

merecimento dc to rrar conhecida cm Portuga!. d<: hã 18

anes para cã. esta jói.i autêntica da graça divina, cujo

nome auspicie>i> Jc i a dv jin içâo perfeita da sua alma.

M as. absorvido actualmente por um grande em­

preendimento d a glória dc Deus. r.ão pode o Rcv " ,*r.i

dutor ocupar-sc deste trabalho, para o qua! ninguém

mais do que cie estava naturalmente indicado.

11. o que mãos menos competentes fizeram. Ji.it> o

V I S A N T A G E M A G A L G A N l

fariam. sc não fôsse o que já estava feito. Por isso ainda

sc pode d í;cr que esta nova edição é obra do Sr. P.«

Matos Soares, exceptuando as deficiências que o leitor

nela encontrar.

Creio que a encantadora virgem dc Luca. que tanta

influência, mostrou exercer no coração do D ivino C ru­

cificado. não me levará a ma! que eu aqui lhe diga que

o Rev." P .e Matos Soares, iniciador da sua devoção em

Portugal, tem direito a tódas as bênçãos da Sua pro­

tecção para a grandiosa obra que nesta hora o preocupa.

J. O . D.

L M A G A L G A S I Sar.ta'

S ã o 05 prem id a s auspiciosas cun ; p on íi/ ú .i.fo

<;ui' desponta esperançoso. cr-.bora s o b re : :t- ta J o pels* c la r in s de M a rre . S ã o j s

c/.if/o c r - <ync desabroche:: o secuto X X . <yyf r i.i c. n ftr.jí. c p rit i'e ira santa do nosso século.

Gema santa! Sont.1 . cp.:e c r.::::%!e•

/rioro. que essa foi a fãtna que na u r u daxo:: ,:C ivor

para o céu. V ox popi:!: vo\ Dei. COjí-t-.j d::ee-se. /’- </e-

-facto. Sonto //:c co.T.eça a chamar r-.o;e a If .c .a /:.i jy.i

espie r.d o rosa li tu rijia.

Opero» c::> nirn çrorulcs rr.orovilhos AçucSc <JtC i

poderoso c cu jo nome c sorto. poJro ela ds:er. fa;çr.Jo-so

eco da Virgem dc Naeaeè. Sim. também Gctr.a Gal-

pant tir.ha o seu Magnifico: para cr.rear. l i entcou’o

hoje. sob a majestosa cúpula de S. Pedro. pela i o : de

Cristo repercutida r.os lábios de se.: \'igãrio. entifo-

nciro augusto de tidas a< gerações que lhe hão dc cha-

V III S A N T A G E M A G A L G A N I\

mar beni-avcntuiada. que hoje lhe começam a chamar

santa.

Escuta, leitor, as harmonias disse Magnificat, reco­

lhe o j ecos dessa apoteose que transcende todos os encó-

mios que na terra se podem tributar a unt simples mortal:

«Para honra da Santíssima Trindade t dc cada uma

das Pessoas Divinas, para exaltação da fé católica :

aumento da religião cristã, per autoridade de N . S.

Jesus Cristo c dos bemaventurados Apóstolos Pedro c

Paulo, depois dc madura deliberação c tendo reiteradas

veres implorado o socorro divino e tomado conselho com

os Cardiais da Santa Igreja Romana. Patriarcas. Arce­

bispos e Bispos presentes nesta cidade de Roma. D E ­

C L A R A M O S S A N T A A BEATA G E M A GAL-

G A N I. como tal a definimos c inscrevemos r.o catálogo

dos Santos».

íi a ro : de Cri?to. tornado visirel no seu Pontífice.

a anunciar ao mundo que em Gema Galgani operou dc-

■facto grandes maravilhas Aquêle que c pederoso e cujo

nome c santo.

E queres saber, leitor, que maravilhai foram essas

do poder e da santidade dc Deus?

Abre este Urro. que nele verás a angélica açucena

de I.uca aliando a uma inocência imaculada os santos

excessos duma penitência que nunca puderam saciar os

seus anseios de expiação. Ve-la-is enreredando corajo­

samente pelos caminhos da santidade. Mas a santidade

dc Gema não foi ir.fusa. não. Também ela peccu cm

Adão. e... não foi confirmada enf graça. Nem foi de

rosas o caminho que seus pês trilharam. Os espinhos — .

c dos mais dolorosos — foram a sua herança. Ô rf i

P R E F A C I O IXi

desde menina, viu sôbre a sua. família, afeita a uma vida

desafogada, desabar a ruina e a miséria.

A leitura destes contratempos não fará mais que

aulncntar em ti o interesse que desperta uma vida tá o

clieia de maravilhas.

Abre este livro, leitor: e. r.o meio da tantos vaivéns

da fortuna, verás a jóia primorosa da família Galgani

aureolada de refulgentes carismas. como o* que r:ais

r.os assombram na vida dos maiores sar.tos. Vc-la-ás

em frequentes êxtases que arrebatavam o seu espirito

às alturas luminosas dum mundo sobrenatural e qt:e aca­

baram por fazer de tèda a sua vida cm continuo extase

d : amor c de inefável contacto cem a Divindade.

Abre este livro e dc-pressa experimentarás esse

magnetismo divir.o. essa irresistível atracção que no

mundo das almas r.áo cessa de exercer a gema virginal

de I.uea. «cui r.oiv.cr. orr.cn». dis<c esta manhã o Augusto

Pontífice r.o aureo panegírico engastaJo r.a homilia da

Canor.i: i ;ão.

Verdadeira jóia da graça, esplendorosa pérola do

paraifO. o seu nome foi de-facto o auspicioso preságio

da sua auréola de santa. f\ a atracção da virtude, c a

in«.vjira>'.u' da santidade, são os castos er.levos duma can­

dura que extasu c cativa, começando por te despertar

a admiração c terminando — quem sabe? c oxalá! — por

te arras/ar à imitação.

Folheia éste livro, c ser-te-á dado assistir a inefáveis

ascensões duma alma que sobe de claridade cm claridade

por todos os degraus da vida mística, dcsdc o recolhi- .

ncnlo infuso, c da união extátiea até um inexprimível

çontacto divino, até não sei que transfigurações será­

X S A N T A G E M A G A L G A N I

ficas, deliciosas fruiçccs do amor dirino. que nos dei­

xam a ilusão dc serem já beatíficas.

Observa atra ris destas despretenciosas páginas os

passos da sua rida angelical, sobretudo nos últimos anos.

c verás a grande apaixonada da Paixão do Salvador,

ora bar.hada cm misterioso suor dc sangue, que lhe jorra

copiosamente de todos os poros durante os seus êxtases,

era ferida visivelmente, freqüentemente e dum modo

cruento petos estigmas do Dirino Crucificado, que se lhe

reproduzem nas mãos. nos pés. no lado. eir.quar.to o

espirito, transportado para as regiões Itimincsas dum

mundo superior, se abisma na contemplação dos misté­

rios dc Getsemani. do Pretório, do Gólgota.

N io e tudo. leitor. Para acabar de retratar cm

Gema a fisionomia dolorosa do Salvador, são ainda as

chagas da flagelação que misteriosamente se lhe abrem

por todo o corpo, e nele cicatrizam não menos misterio­

samente: c a agonia mortal: c a cruenta coroação de espi­

nhos que lhe deixa tõda a cabeça cr irada dc inexpli-

eàreis picadas, donde dimana o sangue em fio: são

cmfim lágrimas de sangue que lhe bretam dos olhos e

deslisam pela face. fenómeno inédito nos anais da agio-

grafia mística. Efeitos assombrosos, originados da sim­

ples meditação da Paixão, cm que se abisma a alma

compassiva da mistica P.issiHor.i dc Luca. ou Flor da

P.ii\5o. como hoje mesmo lhe chamara Pio X I I no acto .

da canonização.

\'olta a página, leitor, prossegue na tua leitura.

Peru fut.j j j confidir.cias da santa donzela, as intimida­

d a ,f.i «uj t-íJa angélica: e no santuário augusto dum

rccar.ufo aposento, transformado em celeste mansão

P R E F A ' C I O X I

duma virgem candidissima. terás mil ocasiões dc a veres

perdida na contemplação do Salvador. que. ora em apa­

rições sensíveis, ora em visões extáticas, se lhe apresenta

c a entretém, já com ir.di:iveis comunicações c colóquios

que te convido a saborear, já ccm revelações c caricias

divinas que não te è dado ambicionar.

Nem deixarás de a aJir.ircr também. já sorrindo

extaticamente para a Rainha das Virgens que visivel­

mente lhe serri. e a quem ela com encantadora familia­

ridade chama a sua qucrni.i n.im.V ; j recreada num

esfsontãnco .Vvonuác per alguns bem-ai-enturadot c es­

píritos angélicos que a vim visitar, já trava-.do a ti rela­

ções de fraternal convivência e vivendo, quási diria, de

braço dado com o íc:i bom Anjo. que ser. c do correio

visível para lhe levar a* cartas ao director da sua

alma.

Penetra no santuário do seu espirito e vi-lo-ás com

frequência iluminado de I::: profética descobrindo o fu ­

turo e o longínquo com a clarividência duma perfeita

intuição e lendo r.o interior das almas o* seut mais

recônditos segredos.

E que— se não sentirá extasiado d-ar.te dessa sim­

plicidade infantil, com que tão naturalmente a todos

julgava dotados dot mesmos carismat que ela. a ponto

de um dia pedir ao Senhor escondesse da vi-:a de outros

o semblante demasiado severo do seu An:o Custódio*

Não e-.contrarás. leitor, exemplo de tZo sublime inge­

nuidade. como a que. ao sentir pela primeira ve: em

suas mãos e pis os estigmas da crucifixão, fé: correr a

inocente menina ccm as mãos abertas para sua tia. e

di:cr-lhe: «Olhe o que n c fiz Jesus!»

X I I S A N T A G E M A G A L G A S I0

Não dês ainda por terminada o tua leitura. Tcris

também ensejo dc presenciar episódios duma rida será­

fica. Estende a mâo sôbre esse peito incandescente.

or.de palpita tin coração cm cachões. Bruscamente, ins­

tintivamente. fugindo <i veemência da combustão, terás

de a retirar quasi a arder, como teve dc a retirar q:ien

ousou fa:er a experiência. Labaredas inefáveis do amo:

divino, qttc lhe deixaram o peito marcado Jc queimadura*

bem viuveis e que tJo de-pressa a ca b j ram per lhe con­

sumir a existência'

Auscu’.t.i C' pu lgões inauditas dêsse coração incen­

diado. e vè-la-is sublevar os pesados cobertores que o

abafavam: vè-lo-á< encurvar violentamente as três vér­

tebras da caixa torácica que teimavam cm represar na

sua cavidade natural o fogo dum coração que nenhuma

fõrça humana podia reprimir. Coração dc virgem c cora­

ção de serafim, consumido por misteriosas chamas, que

sujeito a uma autópsia indiscreta quar.do nêlc já não pal­

pitara a vida. deixo:: boquiaberta a ciência medica, ciên­

cia bem limitada que tar.to ambicionava proferir o seu

oráculo e que teve de emudecer diante de maravilhas

parJ ela incompreensíveis!

t\'a< paginas dêste livro te aparecerá cinda a figura

imaculada de Gema Calgani nimbada com a glória do

Apostolado. /:. se o idea! da Acção Católico te sedu:. nela

c nos seus exemplos encontrarás o mais simpático esti­

mulo do :êlo das almas. Vitima dc expiação pelos peca­

dores mais empedernidos, também ela soube dar almas

o Jesus. Mas o Salvador exigiu que ela lhas pagasse

pelo mesmo preço por que P.le as comprara: oração, sacri­

fícios. sangue, h'oram conversões admiráveis, mas custa-

# •» «r •

\

P R E F A C I O X I I I

nm-iíie suores de sangue. custaram-lhe as flagelações do

Pretório, custaram-lhe a agonia do Getscmani. E porque

assim cooperou apaixonada c crucntarr.cnte na ebra da

Redenção, por isso sJo também sem conta as conversões

por meio dela operadas r:.j mu n J .i gloriosa.

• • •

Deva-:eios de fantasia exaltada tvJo o que ac3 bas

de lerí Maravilhas de palácios encantados? Scnb.cs durr.a

ilusa. duma histérica?

Também cu seria tentado a crê-h. se r.io sc tra­

tasse duma rida contemporânea cujos prodígios puderam

see verificados. estudados, testemunhados e sujeitos à

critica mais exigente. Também cu me inclinaria a ver

cn Gema Galgani uma simples figura lendária, se n.íc

estivesse fresca air.da a tinta des seus escritos, retrato

da sua bela alma. fresco o sangue dos seus estigmas e

das suas transpirações, fresca a memória de tantas mar.1 -

vilhas: se durante mais de trinta anos a Igreia não tivesse

intervindo com todo o rigor dos seus exames, sujeitando

ií mais ir:p!ac.ivet j : itica a vida. as virtudes, os milagres

e os escritos dc Gema. sem excluir a sua autobiografia,

as suas i ai:as e os >eus êxtases.

F. depois de tri 'ta c três mos de exame severíssimo

a Igreja acaba por colocá-la r.os altares. E a Igreja na

canonização dos santos empenha rigorosamente a sua

infalibilidade dogmática. E uma Igreja infalível não

canoniza i/usas nem histéricas.

A / r 5 A S T A G E M A G A L G A .V )

Por outro lado não /ui testemunhos que ofereçam

garantia mais sólida que os desta biografia. E la não

podia ter autor mais autorizado do que tece. Dir-se-ia

difinamente predestinado para escrever a vida desta

alma assim cono fera por Deus predestinado para a

dirigir.

O P y Germano de Santo Estanislati era o director

espiritual c .i Santa, cuja alma foi para cie rnr. Urro

aberto. E foi. além disso, testemunha ocular de muitas

maravilhas que conta.

«/Wio me foi preciso, d i; cie. interrogar traduces

antigas. nem referir-me a testemunhos alheios para re­

constituir a vida da Ser\-a de Deus. Também nno corri

0 risco dc apresentar ao leitor, como verdades históricas,

impressões de estranhos. q:ie muitas rezes são menos

justas. Fui eu próprio a testemunha. maior e a me­

lhor parte da vida mística de desenrolou-se sob

os meus olhos, podendo repetir com verdade as palavras

do Evangelista 5 . João vamos anunciar-vos o que vimos,

o que o in iir.es, o cue apnlpàtr.os com as nossas mãos. E o

meu testemunho não c o dum observador ordinário, que

só rò a< cotsas superficialmente. mas C o da testemunha

mais íntima que pede haver: do confessor c director espi­

ritual a quem r.âo pedia escapar nenhum segredo duma

alma tào cândida».

N ão te escandalizem, leitor, estas últimas palavras.

Dos segredos que esse director espiritual revela, uns

foram presenciados por ête. não coir.o confessor, mas

P R E F A C I O . XV

»

como testemunha, outros /er.i«i*//:c eonji.ide< fera :1a

intimidade do fôro sacramental. tudo lhe fei comu­

nicado por escrito — <íc ordinário cm cortcsficndêr.cia

epistolar— . c sobretudo êle recebeu da santa'dirigida

autorização para de iõdas at manifestares de cons­

ciência. f citas de qualquer modo que fôrse. fazer o u<o

que a glória de Deus lhe inspiraste.

Em ccr.ehs.lo. ao autor desta biografia r..':o se pode

assacar ignorância de causa, li fa!:a dc ra—.peter.cia.

para interpretar objectivamente cs fenômenos extraordi­

nários dc que era teatro j ai ma da j dirigida, muito

menos. file foi um dos homens mais eminentes que hon­

raram a Igreja e a benemérita Congregação de S. Paulo

da Cruz.

Arqueólogo ilustre. iniortalizeu-ie pelas excjraeôes

que empreendeu c pelas interessantíssimas descobertas

levadas a cabo no sub-selo da Basilica romana dos San­

tos Mártires João c Paulo. Professor abalisado. ensinou

com brilho quasi tôdas as ciências eclesiásticas, como se

em cada uma se houvesse especializado, sen [alar dos

seus profundos conhecimentos de pir.tura. escultura, ar­

quitectura. epigrafia e literatura. De tudo dâo testemu­

nho as numerosas obras que publicou.

A Ias i? sobretudo cm teologia i?::síh\i que êle te

manifestou mestre consumado e merecedor do elogio que

lhe tributou Pio X . cm carta assinada pelo Cardial Merry

del Vai a i 9 do Seicir.bro de 1907.

A par desse conhecimento das ciências moticas. o

P.e Qermano foi um profundo conhecedor das ciências

medicas, fisiológicas e patológicas.

Este duplo conhecimento, com que dominara a mis-

A í 7 S A N T A G E M A G A L G A M

tic a c a mcdicina. foi o que lhe deu o autoridade c -1

competência cabal dc guia duma alnta que pairara e n

tão cleradas esferas da rida miitica.

M a is do que ninguém habilitado a discernir o fenó­

meno mis tic o dos efeitos do histerismo e do hipnotismo.

o sib io Passior.i<ia. com uma intuição dc mestre que

desde o principio acertou sempre, pede com clhar sereno

fazer a autópsia delicadíssima da alma. cuja direcção

Deus lhe confiara dur:: modo tão m.tra ühoso.

Para defender o seu ponto de rista. publicou três

dissertações que rerelam cs mais sólidos conhecimentos

de patologia e q::e foram tidas em grar.de apreço por

mcdicos eminentes. Nelas ficaram refutadas as r.cscias

interpretações de medicos materialistas, que tanto se «.*.%•

forçaram por atribuir a cautas morbosas de histerismo e

dc hipnotismo o< fenómenos sobrenaturais renficitdos

na rida dc Gema Galgani. l i a Igreja infah.-el. cano­

nizando a mistica pa» si flora dc Lu ca. deixou plenamente

autorizado o P s Germano, porque, digamo-lo outra re:.

a Igreja não põe nos altares histéricas nem ilusas.

M as há também no Autor desta obra uma qualidade

que o preserra dc precipitações e de entusiasmos des­

cabidos.

O s Apóstolos obstinaram-se cm não acreditar na

verdade da Ressurreição, emquanto a não rissem c apal­

passem. O P s Germano principiou por nem querer ir

rer e apalpar, a-pesar-de instantemente solicitado pela

Santa c por seu confessor Mor.s. Volpi. Foi necessário

que seu. Superior Provincial interviesse, dando-lhe ordem

expressa de ir a Luca. ■ t

C. já que me referi a M ons. Volpi. não será inopor-

P R. K F A C I O X V/ l

tuno acrescentar. â guita Je parèntac. q-jc êstc v i r t u e -o

Prelado, confessor dc Gema desde a mais tenra infànci,a.

não sc mostrou menos exigente c céptico. A/as tar.;réni

ele. ccmo 7 'on:e. rc/u a cair Jc jcelhcs d;ar.sc da verdade-

f: no falecer. a 1!) dc Junho dc 1921. quando ;a Üare-a: .i

o.s horizontes do seu espirito a aurora da glorificação !e

Gema Galgani. qi-.is deixar em tc: tamer to tea farte da

sua fortuna para sc levantar um templo A santidade -;j

sua penitente.

• • t

Caro leiter. quando ehegjret ao termo d a ta * pagt-

rtes. não terãs a menor dificuldade ern fazer iu j * j í j-

rras do F.ni.ri • Cárdia! i:r. A. Gau;::ct. O . S f í . a? pre­

faciar a trad::-;.lo inglesa desta í iegraf-.j «Qv:ar.: -> a ~.:m.

não conheço biografia dc santo pcrtcnccntc a qualquer

cpoca da I$re;a que r.mfo tenha j;-ra\ínado do -s.eu

espirro o sch:-:na:i:ral. cono a bicara!;.» dc Cetra Ual-

qan». cscrica pelo P.* Germano. Ccni:dero a v:da dc

G cina cc:r:o um daqueles .*ux*.!ics q .ç dc tftr.pcs a fc~-

pos nos >ào dados p.v. i avijjerar a r.ova t i e m.ií

as nossas almas dc Deus...»

Assim c de-facto. /■ raro er.cer.ttae na ;:a ‘.a

cristã uma rida tão aturada dc sehe-aSura!. L).t■ c a

que Deus quis inundar a <craftca d . do\ ru is

extraordinários carismas, para que o r.o*so scc::\\

c um scculo de naturah-mc e de mater.a pudeste ar.::.':r

o mundo sobrenatural. /: <e cj- .V .i a >arr i /au :-

n .V áo exercida pela nda de Gema em todo o /-ando.

São exemplares da >i:.i c ida que dc ano para ano se têm

esgotado por dezenas de milhar cm edifões sucessivas:

{

u

•'JK ^

A T /// S A N T A G E M A G A L G A N I

sáo traduçòcs que se multiplicam cm tódas as lir.guas

conhecidas. Sáo graças c milagres, são conversões. que

como chuva benéfica de bênçãos não cessam dc procla­

mar que verdadeiramente operou nela grandes maravi•

"ias quem c poderoso c cujo nome c santo.

Ate os leitores sôfregos do sensacional tem encon­

trado nc>tdf páginas o que nem nas páginas tie novela

r.crr. r.os filmes do cinema têm p-ydido saciar essa avide:

de paladares estragados Não c o sensacional mórbido,

produzido por fantasia< ru í* cu menos engenhosas, o

sensacional sempre mentiroso do romar.ee que encon­

trarás nestas páginas. It o sensacional que inspira os

grandes ideais da santidade, c sensacional que eleva ns

r.lrr.a«. que as transfigura e arrasta até ao heroísmo da

virtude, porque e o sensacional inimigo do fantástico,

qtie só se alia com a realidade pura e simples: realidade

empolgante, como as que mais o são. mas antes de tudo.

realidade flagrante, realidade autêntica, realidade pal­

pitante.

Tais são as grandes realidades que sc desenrolam

ne iti biografia e que tio salutares revoluções têm provo­

cado nas alrrjc generosas, desde que o nome de Gema

Galgani começou j ser prenunciado fora de I.u:a.

Na profusão de tão extraordinários carismas, que

enriqueceram a alma de Gema. vê-se que de-facto non

est abbreviate manus Domini.

£ porque o Senhor r.ào encolheu ainda a sua mão

pródiga de dons sobrenaturais, praza ao céu que pela

leitura duma rida que c tfda ela um n o numer.to levan-

tado «i5 maravilhas do Altíssimo e uma epepeia d*s divi­

nas prodigalidades. sc suscitem em Portugal renovado

pelas virtudes dos novos, r.ovas gemas. novas pérolas

de igual quilate. jdias de refulgente sanridade. eomo a

que hoje. -ia apcteóse duma suprem* ik t n j J o , subiu

glorificada ao altar de Deus. Em ve: dsma ónica es­

tréia. serà urr.a esplendorosa ccnstelaçSo a eintdar no

firmamento da lgre;a

S’So te detenho r:ais. le:tcr. Oxalá untas atrai-és

destas paginas palpitar o coração dc Gema Galgani.

comunicando aos seus leitores os ir.cêndtcs de atncr d i-

vir.o que ela experimentei:, comunicando-lhes etsat tuas

instas dc amar. que te le.ario a dizer ta /w : foi uta

ícraíim q-c passou p<!a terra.

Draga. 2 de Maio dc 19i0.

, Feita da Ascensão do Senhor. t

P.e JOSH DE O U V E !RA DIAS. S. J.

C A P í T • U i L o I

Nascimento c infância dc Gem a__Pre­

coces flores dc virtude — Doença e

morte de sua m5i

— i* :s . i«so -

AMIGUANO. pequena povoação virinha da ci-

dadc de Luca. na Toscana, foi o berço da

angélica virgem, cuja vida vou descrever.

Nasceu a 12 de Março de 1S7S. Seu pai tinha fitado

residência com todos os seus. havia j* olguns enos. resta

localidade, or.de exercia a profissão de farmacêutico.

Chamava-se Hcr.rique Galgani e era descendente por

parte da r.ãi. scgur.do sc dir. da famiUa do Beato João

Leonardo.

Sua mãi. Aurélia. pertencia A respective! casa dos

Landi. Eram dois cristãos dc fé antiga. Do seu casa-

r.ento nasceram oito filhos: cinco meninos, um dos quais

morreu ainda no berço, c trés meninas: excepto três

todos morreram no verdor dos anos. Gema era a mais

vélha das meninas.

Segundo o costume de pais verdadeiramente cris­

tãos. os esposos Galgani eram solicitos em r.ão retardar

aos recém-nascidos a graça sacramental. Por isso. no

i

2 S A N T A G E M A G A L G A S i

dia seguinte ao do nascimento. levavam-nos à pia baptis­

mal para serem regenerados cm Cristo. O mesmo acon­

teceu com Gema, baptizada vinte c quatro horas depois

dc nascer, na manhã do dia 13 dc Março, pelo P.f Pedro

Quilici. Pároco de S. Miguel (1).

Não deixa de parecer singularmente providencial o

nome que a menina rcccbcu. Ficava bem o nome de

Gema a uma criança que pelo brilho das suas virtudes,

devia ilustrar a sua familia c resplandecer na Igreja dc

Deus como pccoh brilhantíssima (2). Seus pais escolhe­

ram-no. levados certamente pelo grande aíccto que con-

(1) Eis. por ordem crono!ógka. o r.orc dos filhos da casa

Ga!$ar.l:

Cuido, nascido a 30 dc Maio de 1871: falecido perto de P;sa

< !:a!ia) a 19 de Junho de 1922;

Heitor. nascido a ? ! de Março de 157J; íaleciio no Brasil

em 1927;

Euçtr.io. nascido a 5 de Junho de IS76; falecido em Lu:a a

I I de Setembro de 1S91;

C f f l i — Maria — llmberta —- Pia. r.ascida a 12 de Março ie

1S76. falecida a 11 de Abril de 1903;

Artòr.io. n au (do a H dc Março de ISSO; faleodo em Lu* a

a 21 de Outubro de 1W2:

Ar.$e!a. rasc:ia a 30 de Setembro de ISSl; úr.ica sotievi­

ver, te & data da car.oniraçSo de Gema. Viveu na America do Su!.

Actualmente viúva reside em Luca

Jú!ia. r.ascida a 30 de Outubro de 1SS3; falecida em Luca a

19 de A$ô*to de 1902.

Acfrca do cutro filho, falecido quási ao r.aKcr. r io temos

noticias certas.

(2) Gemma em Italiar.o. do mesmo modo çue em portu^uff.

significa pedra preciosa. (Nota do Revisor).

\

c A P I T u L O 1 3

sagravam a esta filha abençoada. Entre todos os seus

irmâo:inhos Gema era a mais querida. Henrique G al­

gani dizia muitas veses: «só tenho dois filho»: Eugênio

c Goma».

Ainda não era decorrido um mis depois do nas;i-

ir.cnto da querida menina, quando Henrique Galgani.

para ficar em condições dc da: a seus filhos educação

r.a is esmerada, fixou residência em Luca. cem tid s a

sua familia.

Havia nesta cidade um per.s:onato para ac&r.os e

meninas, magistralmente dirigido por duas Irsiis. *s

Senhoras Emilia c Helena Valltai. H. Galgani. q je as

tinha conhecido muito bem r.a sua pequena cidade tatal

quando, ainda jovem, vivia cem seu pai Carlos, deuter

en medicina r.ão hesitou em lhes confiar Eugtmo e

Gema. e depois sucessivamente António. Angela e Ju!»a.

Gema freqüentou éste instituto durante cisco ano*, mdo

para lã de manhã e sò voltando â tarde ao se;o de sua

familia. domiciliada então r.a ve ink i rua dos Bctgh«.

Do-pressa aprendeu as primeiras letras, assim ceno

a prática de pequenos trabalhos manuais, prôprics d 3

seu sexo c da sua idade. Suas belas disposições morais,

não menos que suas qualidades intelectuais, causaraa

grande admiração às mestras que. alguns aros depois

de Gema ter saido de casa. escreviam: «A querida Gema

apenas tinha deis ar.es quando o pai nes conficu a sua

cd^'a;ão. Mostrou desde lego uma inteligência preccce.

parecendo até que a ra:ão ja tires se nela desabrochado.

Si>uda. reflectida, grave en tjda a sua conduta, err.

r.aJa se parecia com as companheiras, mesmo mais

velha i. . - '

*

I, 4 S A S T A G E M A G A L C A N I

Nunca foi vista a chorar r.cm a discutir; a sua fitio.

nomia respirara sempre uma sorridente serenidade. Mos­

trava-se sempre a mesma, quer fôsse elogiada, quer [ósse

repreendida. A sua resposta, cm tais circunstâncias, con­

sistia cm um modesto sorriso, cmquanto que a sua ati­

tude conservava uma calma imperturbável, embora fôsse

dotada de um temperamento viro e ardente. Emquanto

tiremos a felicidade de a possuir, nunca houve precisão

de a castigar. Nas suas pequenas faltas, inevitáveis cm

tão tenra idade, bastava uma ligeira observação para a

fa:cr entrar logo na ordem.

<Deis irmãos e duas irmãs a acompanhavam à nossa

cscola: só uma ve: foi surprendida em discussão com

eles. Á nerenda privava-te cm seu favor da melhor fruta.

A refeição do meio-dia preparada no instituto. Gema

mostrava-se sempre satisfeita: nos lábios nunca lhe mur­

chava o seu perpétuo sorriso.

Aprendeu sem interrupção, e primeiro que os outros,

as orações usadas cm nossa cscola. cuja recitação com­

pleta levava cerca de meia hora. Aos cinco anos lia o

oficio de Nossa Senhora c dos defuntos com tanta faci­

lidade como uma pessoa grande: tal era a diligencia que

tinha empregado no estudo do breviário, que já sabia ser

um tecido de louvores ao Senhor, lira. além disso, assí­

dua no trabalho e dc-pressa compreendia tudo o que sc

lhe queria ensinar, mesmo coisas acima do nivcl de sua

idade. Tais qualidades tão raras cm uma tenra menina,

faziam com que Gema fôsse amada em nosso instituto,

especialmente per suas companheiras que parecia não

poderem saciar-se de sua companhia».

Ainda h j pouco ( i ) tive ocasião dc ver confirmado

pelas duas referidas senhoras tudo o que s« contém resta

relação, a qual termina com o facto seguinte:

*Acérca desta inocente e virtuosa menina diremos

mais que. por suas orações, alcançámos de Deus uma

graça extraordinária. Tmha-se declarado na cidade a

coqueluche, atingindo todos cs mcnbrot da r.ossa lami-

ha. Um consciência nào pcdiarr.es. pelo peripo de con­

tágio. conserrar conr.csco os cinco filhos de 11. Ga!$am.

Nào sabendo que fa:er. aconselha mo-no: con o Pareço

da sua freguesia, o qual no< dnsc que não abtndonisse-

mos .if pobres criancinhas: tar.to mais que sua rr. j i estaia

graremente doente e em perigo de vida. Aceitámos o

conselho e imediatamente, obedecendo aos nos tos dese­

jos. Gema começou a implorar os auxilies de Deus.

desaparecendo a doer.ço sem ter atingido una só

da« nossas educanda?. — Assinado: F.mili* e Helena

Vallin:».

H. Galgani. que contemplava com satisfarão os

rápidos progressos da su.i Gema na virtude e nc estude,

sentia aumentar cada ve: mais a sua ternura paternal

para com ela. Nos dias feriados qucria-a incessante­

mente junto dc si. Sc era obrigado a ausentar-se. à r.c.tc

quando voltava, as suas primeiras palavras exam quáji

sempre estas: «/: Gema. cr.dc estJ ela?». Indx avam-lhc

então o estreito aposento ende a querida eeniaa sc

recolhia habitualmente para estudar, trabalhar cu pedir

C A P I T U L O I í>

»l) O autor t u r t \ e ? o c í o i t p ^ i da isc f* ia S ís : j «A r.ia

h i *ijn if:c j pcrt.«!o « jj poe 1905». (Neta i o Rtvisor).

%a protecção do seu Jesus, passando quási despercebida

na casa.

Era uir.a alegria para H . Galgani levar a passeio a

sua querida filhinha pela cidade ou peto campo. E sc

não era possível, cm (ais circunstâncias, chegar a casa A

hora da refeição, encomendava para ela nos melhores

hot&s as iguarias mais e.vquisitas; para ela também man­

cava vir dos mais céjebres estabelecimentos os vestuá­

rios c enfeites.

Semelhante parcialidade, porém, por muito merecida

que seja. não é para louvar num pai. sabendo-se quantas

invejas c discórdias provoca quáíi sempre. A própria

Gema. cuja rectidão de espirito e de coração se mani­

festou. podemos afirmá-lo. logo ao sair do bctço. cão

agradava este procedimento do pai: e. embora os seus

irmãorinhos não manifestassem sombra de inveja, ela

queixava-se vivamente a seu pai. protestava que não

merecia distinções c que não as queria. Quando r.ào

conseguia impedi-las. chorava dc desgosto.

Algumas veies êste pai afectuoso tomava a encan­

tadora criança sóbre os joelhos para a cumular dc cari­

cias c dc beijos. Encontrou sempre resistência e quási

nunca levava a melhor. Aquéle anjo cm carne pensava,

numa idade tão tenra, que não se deve fa:cr distinção

entre as pessoas no que dir respeito à modéstia, c por

isso. debatendo-se com suas pequenir.as forças, excla­

mava chorando: «iV jo mc toque. Papá.

— Mas cu sou teu pai. replicava êle.

— Sim. Papá. mas cu nJo qjicro .«cr tocada por

ninguen?. Para não a contristar o pai deixava-a logo

em par. E embora ficasse descontente, terminava quási

6 S A N T A G E M A G A L G A N I

c A P I T I ! L O I 7

serr.pre por misturar suas lágrimas com as da filha, admi­

rado de ver tanta virtude em tão tenra idade.

Conhecendo o poder mágico das suas lágrimas, o

pequenina Gema. que foi sempre muito atilada, sabia

tê-las de reserva para casos inocentes em que o seu

efeito era infalível.

A ternura da Sr.* Galgani para com sua filha, não

r.er.os profunda que a do pai. era de outra têmpera.

Era esta senhora uma verdadeira saata c um dos mais

perfeitos modelos dc mãi cristã. Orava incessantemente

ç abeirava-se tòdas as manhãs da mesa eucarística, em­

bora o seu cs:ado dc saúde lhe r.ão permitisse ir & igreja

scr.ão com grar.de dif:culáadc. Era o Pão dos »ajos que

n enchia de fórça e dc coragem para se desempenhar,

com pontualidade c perfeição, de todos os seus deveres.

Amava todos os filhos, mas o seu coração era atraído

para Gema dum modo mais particular, porque nela.

melhor que nos outros, se manifestava a predilecção do

Senhor.

Efectivamente a graça do Altíssimo tinha começado

tem ceio a formar esta alma ainda tenr*: manifesta-

va-íc no seu carácter tão bom e tão dócil, no seu amor ò

solidão e ao silêncio, no desprêzo de diversóes e de futí-

lidades pueris, e numa tal ou qual majestade de porte

que não se costuma encontrar na idade infantil.

Em vez de se expandir em vãs demonstrações de

ternura sensível, a Sr.* Galgani. cônscia do seu dever.

codos os cuidados na cultura dêstes gérmens pre­

coces de virtude c ccn*t!iuiu-jc. sem hesitar, directora

e>pi:i(uj! de sua filha. Gema recordava muitas vezes

com reconhecimento as indústrias incessantes com que

8 S A N T A G E M A . G A L G A N I%

$c exercia éste magistério nntcrn.il. c declarava dever

sobretudo a sua mãi o conhecimento de Deus c o amor

da virtude.

A Sr.* Galgani tomava muitas vezes nos braços a

querida menina e. apertando-a contra o seio que a tinha

nutrido, dava-lhe santos ensinamentos, acompanhados

ir.uitas veres dc lágrimas: «Pedi tanto .1 Jesus. lhe diria

ela. que me desse uma filha: ouriu-me. c certo, mas um

pouco tarde. Estou doente c dentro cm breve terei de te

deixar>.

Explicava-lhe as verdades da nossa santa fé. o

valor da alma. a fealdade do pccado. a dita dc scr tôda

de Deus e a vaidade das coisas déste raundo. Outras

veres mostrava-lhe o crucifixo e diria: «Olha Gema.

este querido Jesus morreu na cru: por r.ós■>: e. adaptan­

do-se à capacidade da menina, procurava farer-lhe com­

preender o mistério do amor de Deus para com os

homens c o modo por que todo o cristão é obrigado a

corrcsponder-lhc. Para lhe incutir o hábito da oração

recitava com ela várias preces, de manhã ao levantar, á

noite antes de se deitar c com freqüência durante o dia.

Todos sabem quanto custa ás crianças ouvir instru­

ções religiosas c recitar orações vocais, incaparcs como

são dc estar atentas muito tempo, c inclinadas á dissi­

pação c aos brinquedos.

Gema nào era assim. A sua felicidade consistia

nestes primeiros ensaios dc piedade cristã. Nunca se

cansava de ouvir e dc orar. E quando sua n ã i a deixava,

por causa dos cuidados doméSticos. a querida ir.enina

agarrava-se-lhe aos vestidos, direndo: «Afam i. fale-me

um pcuco mais de Jesus».

C A P I T U L O I

Esta piedosa mãi. ã ircdtd.i que sc aproximava o

fim da sua vida. com o aumento dej sofrimentos, rodo-

br.iva cíc zelo na educarão re3:g:csa do» filhos queridos.

Todos os sibades acompanhava ou. não podendo, man­

dava acompanhar os ma:s \elhcs i igreja para con­

fessarem.

Deste medo q-jeria hab^tu.S-lcs cedo à frequenoa

dc tão salutar sacramento. Ela mesma c i preparava; e

C a n i j l i j n j - ( . i ' J < n s’ •» *c 'Í J r j v . * .1 ; . v r j J j <f:rci.’J J .l

i t í e ã J ã ) c i i- c s .f i .1 - ' j j / j . v r l c i a

,-cf i%»i r-i

10 S A N T A G E M A G A L C A N Iê

quar.do chegava a ver dc Gema. a vista da sua gravi­

dade. do seu recolhimento e da viva dor que sentia pelas

suas pequeninas faltas, arrancava-lhe muitas Vezes lá ­

grimas.

Um dia disse-lhe a r.3i: «O h! se cu pudesse lerar-tc

comigol Querias rir?

— £ para or.de7 preguntou a menina.

— Pa:j o Paraiso a «Ver com Jesus c com os anjos».

Estas palavras encheram a criança de grar.de alegria, c

dcsdc èsse momento ateou-se em seu coração um ardente

desejo dc ir para o céu. de»cjo que aumentou sempre,

terminando por consumi-la.

«Foi minha ir.ãi. escreveu mais tarde Gema. que

começou, sendo eu ainda pequenina, a fazer-me desejar

o Paraiso>. E acrescentava com sua simplicidade habi­

tual. refcrindo-sc à proibição de pedir a morte: «Agora,

se ainda desejo ir para o céu. c ros peço licença para

isso. respond eis-me com um fortr.al não. Eu tinha dito a

minha mi t que sim. e rccordo-me que. depois de ela me

ter d:to que quer/a lerar-me p<tra o Paraiso. a minha

ro-:tjJe era não a ceixar mais. nem sair do seu quarto».

A doença de D. AurÜia era a tuberculose que h i

cinco anos a ia consumindo. Logo que os médicos re­

conheceram a natureza do mal. foi proibido severamente

aos filhos apro\imarem-sc do leito da pobre enfirtna.

Gema ficou muito aflita por sc ver assim dc-repente

separada daquela que amava duplamente, como mãi e

como mestra. Pediu, chorou e com muito custo obteve

que abrissem para ela utra excepção. E agora imagine o

leitor como é que a fervorosa menina se aproveitaria da

permissão obtida. Aproveitou-a bem: mas. a-pesar-disso.

C A P Í T U L O ! II. >

mais tarde. farendo um cuidadoso exame de consciência,

ficou muito aflita por lhe parecer que tinha desobede­

cido e que se tinha deixado levar pelo capricho. Ela

mesmo nos vai di:cr o que fa:ia junto do leito da en­

ferma:

«7ot/as às r,o:tcs. ar.tcs dc me deitar. u junto

dela para dizer as orações. ajcelhaia á cabeceira do

leito c rezava». Sublime impulso de uma criança que nem

sete anos completos tinha ainda!

Entretanto a tísica multiplicava os seus cvtragos. e

o dia da suprema separação não podia tardar. A piedosa

m ii teve o cuidado de fa:er com que Gena recebesse o

Sacramento da Confirmação ( I ) . «Que melhor poderei

cu fazer, pensava cia. do que ccr.fiar es ta querida fJhi-

fi/u ao Espirito Sar.to antes de dar contas ao meu Deuif

Quando cu lhe faltar, sei a quem fica entregue».

Ela mesmo a tinha jA ido prep.irar.do e afervorando

para receber dignamente aquvle sacramento. Mas. rão

satisfeita com isto. mandava vsr tòdas as tardes a sua

casa uma mestra de doutrina p.ira aperícs-çoar a sua obra.

Depois, na primeira ocasião que se ofereceu, a 26 de

Maio dc ISS5. levaram a criança a basílica dc S. M iguel

in Foro. onde o Sef.hor Arcebispo Nicolau Ghilardi

administrava o Crisma. Um pormenor, que escapou mais

tarde à sua reserva, r.cs da r i uma idea d n graça» de

c!e:ção. dc que o E»p:r»to Santo a cumulou.

Terminada a cerimónia, as pessoas que a tir.han

(t) Na ItAJia. icro cn ir.c.tc» c«:r»t ,'j.k i catfÜcct. as ir.jr.ças f íctlv:n ti:« Sicrsxtr.'.o. ir.'.n pric*;ra co-.r.ur.h.3o.

I

12 S A S T A G E M A G A L C A N I$

acompanhado quiseram ficar na igreja a ouvic missa

em acção dc graças. Gcma alegrou-se com o pensamento

dc poder consagrar êste tempo a Deus. recomendando-

-Ihe sua pobre mái quási moribunda. <Eu ouvis, o melhor

que me era possível. a santa missa, conta ela. e orara

pela mamã: de-repente uma vo: diz-me ao coração: Que­

res dar-me tua mamã?

— Sim. respondi eu. mas com a condição de que

também me levareis.

— Nào. replicou a voz. dá-me de boa vontade tua

mamã. Conduzir-ta-ei ao céu. Dâs-ma dc boa vontade?

Fui obrigaJa a dizer que sim.

Terminada a missa, corri para casa. Meu Deus!

Permanecia junto da mamã e chorava. Não pedia afa«-

tar-me dela».

Foi esta. segundo os apontamentos dc que dispo­

nho. a'primeira comunicação sobrenatural com que Gcma

foi favorecida. A circunstância da descida do Eypirito

Santo pelo Sacramento da Confirmação a uma alma tão

pura c. por si mesma uma prova convincente dc que foi

Ê lí o verdadeiro autor dêste colóquio, facto que os acon­

tecimentos futuros mostraram ser verdadeiro. Gcma

tinha feito a Deus o sacrifício do que no mur.do lhe era

mais querido; no céu lhe ficava certo o mérito.

Dc volta a casa. entra no quarto dc sua mái e cncon-

tra-a quási a expirar. Ajoelhando junto do leito, desata

em soluços. re:a com o coração angustiado e declara que

não sc afastará deste leito, porque quere recolher as últi­

mas palavras de sua mái. Embora conformada com a

vontade divina generosamente aceita junto do altar.

Gema conservava a esperança secreta dc a seguir ao céu.

C A P I T U L O I «3

ft

Entretanto a doente experimentou certas melhoras

efêmeras. Depois tomou a piorar, c perdcram-ie tòdas

as esperanças. O pai. porem, temendo que a presença

duma filha tão amada apressasse o f ia da moribunda,

mandou-a sair c confiou-a. até nova ordem. a uma tia

materna chamada Helena Landi.

Passado pouco tempo, a 19 de Setembro de 1556.

D. Aurélia Galgani expirava santamente na idade dc

trinta c nove anos.

f.cvararr a triste r.ova a Gcma. que a?nda estava

em casa da tia. A resignação desta criança dc oito anos

foi tanto mais admirável, quar.to mais cruelmente a dor

duma tal separação havia de ser sent.da pelo seu cora­

ção tão afectuoso.

£ assim. 6 r::cu Deus. que. para as desprender do

nundo c as purificar sempre mais. Vos cotr.pra:e-.s cm

abandonar ao martírio as almas que Vos são mais que-

ndas c desde os seus mais \erdes anos!

Começa a freqüentar o Instituto Guerra

Primeira Comunhão e retiro preparatório

- i>io - i*»: —

inuito bca c piedeja que físse D . Helena

Landi, não pcdta atenuar em Gema a saudade

dc sua nsii. A «anta menina, que só sent>a

cnconto nos exercícios dc piedade. experimentou bem

dc-prcssa a íalta que lhe lèz sua querida mi». «Fo» entio.

dtssc-mc ela um dia. çue tire ui:dâde$ do tempo en que

a minha rr.ái rr.e fazia orar tanto*.

Desejava ir à igreja dc mar.hâ cedo e nmguírn a

queria acompanhar Aquela hora. Desejava er.conirar-sc

sòrinha para conversar ccm Deus e n io lhe deixavam

u::i momento dc tranqüilidade. Grande p<cadcra como

era. diria, tinha necessidade de se ccnfcssar todos

cs dias: c raras xc:cs lhe concediam esta satisfação; tào

manifesta era aos olhes de tedos a sua cAndtda inocén-

cia. Privada dc director espiritual, ningutm lhe falava

dc Jesus, único amor dc sua alma. A pobre menina sofria

pois c morria de desgôsto cm S. Januário.

Entretanto Helena Landi, que amava muito a sobri­

nha por suas maneiras ingênuas e graves, por sua mo­

déstia c esclarecida piedade, verdadeiramente excepcio­

nal em criaria de tão tenra idade, esperava obter a

permissão de a conservar ainda muito tempo.

Informado deste projecto. Eugênio, irmão de Gema.

i» quem a ausência da irmã. desde alguns neses. parecia

intolerável, fé: valer junto do pai todos os argumentos

próprios para impedir uma separação mais prolongada.

E o S: Galgam não linha menos desejo de conservar

cm casa a sua filhinha predilecta. Depois de madura

reflexão sôbrc o melhor partido a tomar, cm seguida ã

dor cruel que acabava de o ferir, chamou para junto dc

si todos os filhos, dispersos por várias partes, a-fim-de

olhar melhor pela sua instrução. Era nos fir.s de De:cn-

bra de I5S6

Gcma entrou, pois. na casa paterna no meio das

lágrimas dc alegria de tóda a familia e particularmente

de seu irmão Eugênio.

Não devia pcnsar-sc cm interná-la numa casa dc

educação: um novo afastamento custaria muito ao cora­

ção terno de sou pai. Mandaram-na como externa ao

instituto, tão célebre, das Irmãs de Santa Z ita. vulgar­

mente chamado instituto Guerra, do nome de sua fun­

dadora. Excelente lembrança a do Sr. Galgani cm con­

fiar sua filha a estas mestras eminentes que dão is

meninas, juntamente com vastos conhecimentos literá­

rios c artísticos, uma intensa instrução religiosa, forman­

do-as r.uma sólida piedade.

Gcma exprimiu nestes têrmos ao seu director a ale­

gria que lhe causou esta determinação dc seu pai. inspi­

rado muito provávelmcnte por ela: cLogo que comecei a

Exercido de d<»<aho e prova « k h s j (d»tado) de franc i s — extraídos do caderno escolar de Son:a Cerr.a. ç-jar.do a '.u r j do

ír.sJituío C ue n -j

N. B. Neste [ac-sirr.iU a dstiafi-jenj períeitac-.er.se 01 erros de Gesiaiir.ha < ai corrccs®«M da ir.eitra

V

C A P Í T U L O I I 17 ./

[requentar a escola das religiosas. CJÍirá no Paraíso».

Efectivamente sob a direcção de mestras consagradas a

Deu», entre tantos exercícios e prAticas dc piedade, sA-

biamente distnouidas pelo decorrer do dia. com tar.tat

instruções c exortações religiosas, a fervorosa menina,

habituada por sua n á i a viver cais no céu que r.a terra,

devii sem dúvida encontrar-se r.o seu elemento.

Logo que se viu neste instituto. G c=a solicitou o

favor dc fa:er a sua primeira comur.hão JA desde h i

muito, ferida r.o coração por Jesus coa as setas do ma;s

puro amor. como inocento potr.ba soltava gemidos e cor.-

sumia-se com o desejo do se unir a Ê!e pelo Sacramenta

da Eucaristia. Sua m ii querida tinha-lhe descoberto

tòdas as doçuras e dado como que um ante-gâito diste

manjar celcstc. Para intensificar mais e mais os seus

ardores. condu:ia-a muitas veres ao pé do santo taber-

r.iculo. donde o Senhor difunde os raios da sua graça

c as chamas do seu amor sôbre os que O procuram, c

principalmente sôbre as almas sisples e puras.

Excessivamente apaixonada pe!o Amigo Dtvinc.

Goma queria-0 c. todos os. d:as. suplicava com lAgrimas

ao seu confessor, a seu pai e a sua mestra que lhO

dessem. Opunham-lhe o costume de não s< admitirem A

comunhão crianças de tão pouca idade, un to ma:s que

sua pequena estatura c membros dehcados mal aparen­

tavam seis anos. quanto mais nove.

Gema. porém, voltava incessantemente A carga, com

argumentos sempre novos: * Dai-me Jesus e haveis de

ver que serei mais sossegada: não farei nais pecados:

não serei já o mesma. Dai-mo: sinto-me consumir e não

posso ntais>.

s

18 S A N T A G E M A G A L G A N I\

Perante ião extraordinárias instâncias, o confessor,

P .e V o lp i, que veiu a ser bispo de Arezzo, term inou por

cedcr c disse a Henrique G a lgan i que. sc n ão queria ver

a sua fiih a definhar de tristeza, era preciso autorizá-la

sere dem ora a nutrir-se ccm o P ão da rida.

Q uem poderá descrever a alegria dèsse an jo ao

saber desta determ inação? Depo is de ardentes acções de

çraças ao Senhor c à Santíssim a V irgem , procurou o

m elhor m odo dc sc preparar para tão insigne favor, c

tom ou, scir. deliberação cem orada. o partido dc se re­

colher no convento de suas mestras para ai seguir, crc:

pacifica solidão, um curso regular de exercícios espi­

rituais.

N ã o era fácil levar o pai a aceitar este projecto,

pois ju lg ava não poder ficar um s6 dia privado da sua

cuerida G em a. E la porém fo i tão insistente c tantas

lágrim as derramou que a inda desta vez H enrique G a l­

gan i sc v iu obrigado a cedcr. Ouçám o-la: é ela mesmo

que r.os vai contar o resultado:

aQbtU 'c a permissão A far dc, e no dia seguinte de

m anhã fu i sem perda de tempo para o co/:rc/:(o. ende

fique: dez dias. Durante este tempo não r i ninguctn da

minha fam ília . M as como eu estaca bem! que Par also!

Apenas me ri no con rente, ccrri â capela a agradecer a

jesus e a pedir-lhe ardentemente que me preparaste hem

pára a Santa Comunhão. Nesie momento senti nas­

cer em minha alma um grandç desejo de conhecer

circunstanciadamente tôda a vida de Jesus e a sua

Pa ixão >.

)á dissemos que Gem a tinha sido in ic iada na m edi­

tação por sua própria m ãi. M as quem tinha ensinado a

C A P I T U L O ! I ID

f

éste anjo dc nove anos que-o mistério da Paixão do

Salvador está tão intimamente liçado ao mistério da

Eucaristia, que o melhor cam inho para chegar ao se­

cundo 6 passar pelo primeiro? Certamente o mesmo

Cspírito Santo, que a tinha jA snund.ido dc tanta lu : e

inflam ado ce tanto amor para com o Augusto Sacra­

mento do aliar.

«A /an:/e iíe j este deseje a m in.'ij mesit*. continua

G e n a , c c/a começou imediatamente as sr.as r i ^ / i f j f c c í .

U n a noite. era j.i f.irde. /d/ara-me c /j da crucifixão,

d.i coroação de espinhos, de todo* c< supiicios de Jems:

/<*.: um a pintura rã o r:Va q::c uma der inteniJi te apede*

coa de mim, causando-mc r.o mesmo instante uma

febre ardente que mc prendeu ao leito ledo o dia

seguinte.

.As explicações foram-me suprim ida imediatamente.

iSeguia as práticas na capda. Tc-dcs os dias o pre­

gador rjos dizia: cQ uen se r.uíre dc fesus viretá da sua

vida». Estas palavras cnchiam-me de grande cônscia;.ic.

levavam-me a fa :e r este racscvin:'*? *Sendo assim,

quando Jesus estiver comigo, r.jo viverei mais em mim,

l isto que cm mim viverá. Jesus*. £: ard.a em dese ja de

chegar ao momento em que pudesse d i;er com tód j a

verdade: <Jesus vire «.v.t rrirm». Algumas ve:cs. medi­

tando cite pensamento, passava tóds a r.oite a consu-

mir-mc de desejos.

Preparei-me para a confissão gera! que f i: . indo por

t:cs ve:es aos pes do Senhor P / \ 'dp i. terminando-a

no sábado, véspera do ditoso d:a>.

■ fcste dia fe li: foi o d ia 17 de Junho dc ISS7, íesta

do Sagrado C oração de jesus. transferida da sexta-feira

antecedente. Na véspera. Gcma quis cscrev«r a seu pai.

Inspirando-se no seu coração tão chcio dc celestes afec­

tos. fez só por si a carta seguinte, breve, porque, quanto

mais o coração transborda, menos se fala:

«Querido papá. estamos na lêspera do dia dã pri­

meira comunhão, dia pa:a mim duma felicidade extrema.

Resolvi escrever-vos estas poucas linhas para vos certi­

ficar do meu amor c vos di:er que peçais a Jesus a-fim-de

que. na sua primeira vinda à minha alma me encontre

preparada para receber todas as graças que me tem des­

tinadas.

*Peço-vos perdão de tanta? desobediências e de

todos os desgostos que vos causei; suplico-ix><. nesta

tarde. que esqueçais tudo.

• Pedindo a vossa bênção, subscrevo-me vossa filha

muito afectuosa. GEM A *.

Antes de sair do santo retiro. Gema pòs por escrito

as resoluções seguintes: */." Sempre rr.e confessarei e

comungarei como se a morte devesse surpreender-me

imediatamente depois; 2.* Visitarei muitas t ezes n Jesus

Sacramentado sobretudo cm tempo de aflição: 3.* Pre­

parar-me-ei para cada festa da minha M J i celeste com

Jilguma mortificação, c tôdas as noites lhe pedirei a bên­

ção; -iS Quero conscri'ar-mc sempre na presença de

Deus; 5.’ Sempre que derem horas, direi très vezes:

M e u Jesus. Misericórdia

Gcma teria desejado continuar as suas resoluções:

mestra, porém, que a surpreendeu a escrevê-las. r.áo

lh o permitiu, com receio de que. sobrecarregando-se

«nuito. prejudicasse a saúde: pois sabia bem que a terna

m em na. dotada duma grande firmera de carácter c dum

C A P I T U L O I I 21t

fervor extraordinário, ap licaria tò d a s as er.ctg iza s d a sua

alma ao cumprimento dc suas prorr.essas.

Chegou cmfim o dom ingo dc m anh i. c o n t i n u a com

uma fc ardente a adm iráve l c r ia n ça . le r a n ie i - m e com

prontidão c corri a Jesus pe/a prim eira i t ; . . . s\ s m inhas

aspirações foram finalm ente satisfeitas c c c m preend t

então a promessa de Jesus: <Aquc:e que se r-. u r r e de

ir.ini rircrã da minha rida» .

C> meu Pai. escreverá e ’a m a is tarcc ao s e u c isrcc tcr

* • espiritual, o que sc passou nesse m om enta c r : rc~ Je sus e

mim. eu não o poderei exprim ir. Jesus fet-se sen tar- m uito ,

tnaitissimj ã minha ahr.it in d ig n a . E x pe rim en ta r* nesse

instante quanto as delicias c/o ceu diferem d a s d e lic ia s

da terra. Senti-me dom inada p e ie desejo dc t o r r m ^ r con­

tinua c>ta u-.ião com o meu D e u s . Er.ccr.trai.-a -rr-s «r cada

re: mais desprendida do m und o c mais d ispose jm rc-

cdhimcnto.

Gcma quis fazer a s e g u n d a cem ur.hâo r .o d i j se­

guinte. ra igreja paroquial, a insi<?nc hasi!;c.» d e i ? . Frc-

dtano. onde se conserva o p rec ioso tesouro d o * restos

mortais dc Santa Z ita.

As celestes impressões d e su a p u e e ir a c o c i u n h ú o

não sc apagaram nunca. «.*\ que r id a rr.cmns. a t e s t a uma de suas mestras, lembrara-se dèstc belo d ia c o m um

júbilo inexprímircl: nas horas d c recreio fa la r a d j * ptrras

c suares delicias saboreadas nestes diteses mer n-z *rntos.

Todos os anos quando chega ra a época d a p r i rneira

comunhão, sua alegria era ex trem a, c segui* cerrz e j p r i ­

meiros comungantes os exercícios d o re tire p r «rpara-

tório*.

Todos os anos c c n c m o ra v a co m espec ia l d c v o ç i o

02 i ‘ A .V T A O l i \1 A (i A I. G A N I

aquele d ia grande que chamava o d ia da sua festa.

A carta $ci:i:in!r d irig ida act s.-u d im .to r cm 1901 no dia

im edia to a um <lí*sfc.s anivcrsArios. vai-nes c : :c : que sen­

timentos a anim avam então. Tem duas partes: a pri­

meira. ir de p ió logo. fui escrita num desses êxtases

i|-a.' a tom avan muitas veies, mesmo em presença dos

:.eus familiares.

t M eu P<‘i. não sei se já vo< disse que o d ia da festa

d» Sagrado Cors^ão dc Jesux é também o dia da minha

fc^ta. O fifrm r/cr um dia de P ara ;so: esfire sempre com

Jesus, /a/ei sempre dc jesus. fui ,'e/i< corn Jesus e chord

também con2 jesus. O recolhimento interior rdevc-me,

raa ií que de ordinário. unida ao /mcü bem-sm.ido Jesus...

Ú frios pensamentos do mundo. afastai-cos de mim: cu

r.ào quero c.*.'ir senão com Jesus, e jesus só». Ccncen-

(rande-se neste memento cm si mesma para se hutr.iihar,

como costumava, depois dos s c -j s transportes dc amor.

cor.tinna: <Mcu Jesus, c ainda n:c suportais? Q uant0

.•r:ar\v penso em meus deméritos, mais confundida tico. e

só encontro meio dc me tranqüilizar recorrendo pron~

temente à vossa imer.sa misericórdia, ó compassivo

Jesus!»

Depois desla expansão dc alma. G em a recupera os

• ra t idos e vi-sc com uma pena na m ão diante da carta

ii'ii'.eçada. Retoma o seu assunto com a maior scm-ceri-

■ : .ón ia : * P‘ii. para or.de vai agora o meu pensamento?

/ ’. r.i i> belo dia de minha primeira ccniunhão. Ontem.

f»"t. i .Zn ( dc Jesus, experimentei ce novo o júbilo

deste mi f/i.-). O a íe m de novo gozei o Paraíso. Max,

•' j , í o um só dia. quando é cerro que mais tarde

o </xK\ircr)io\ jMr.t ,vrri|irc?

C A P I T u I O I I

i

cQ cia da minha primeira co>r;i:n/i.io /ot. posso .i/ír-

m á - ío , a ç u é f c e/r: q a c o m e t i "co r/ip ão í c c n c o n f r o r j r/sa/s

abrasado de amor por Jesus. Como cu e r a q u a w / o r

possuindo Jesus, p o d i a cxziamur: Ú met: Deus. o vosso

Coração é meu. O çue [az a vossa felicidade potle tam­

bém lazer a minha. Q u e fa ltara cntào i: minha felici­

dade? N ado».

E G cm a entra dz novo ctr. si pata sc hum ilhar:

«Ó P a i Pai. mas r.em todos os dias se parecem: há

elgitns e/r. que ter.h.o vergonha de mim. O h ! Quanta*

rezes tenho cedido aos atractivos do mur.de>! Que J a u s

/•io tome de-pressa o co ra fâo c o guarde para si. sc v

não quere ver ainda bem cedo roubado pelos meus

pecados».

N unca cu term inaria sc quisesse reprodusif por

completo os pensamentos c sentimentos expressos nas

carta* de Gcm a. ccni um a eloqüência sempre nova. sóbre

o assunto da sua prinícir.i comunhão. O pouco que re-

procu=i bastará pnra mostrar em que ahu ra p j.rava .

Jon jc das ba ixelas da terra, o grande cotação deste

ar.jo. desde a idade dos nove anos.

D itosa criança, bem cedo to fei concedido conhccer

os mistérios do reino do Deus. ocultos ã m aicr parte dos

homens, c saborear a suavidade ce !« tc do M .um Li:<.n-

rístico preparado por A quê lc evie disse: « P que úvm :r

a minha carne c beber o meu sangue terá a rida

eterna.

C arácte r de G em a — Seu espírito dc

p iedade — M o rte dc seu pai e dc seu

irm ão Eugên io •• • /

— tíSS - tSCH -

« | ' - *

^\ V E ?o :s das restas da sua primeira comunhão.

Gem o retemou com ardor a vida escolar.

a-----' M estras e alunas, que tinhaci notado desde o

principio as raras disposições da recím-vinda. não sc

cansavam de a adm irar. Entretanto a santa mcnir.a p ro ­

curava dissim ular as suas qualidades para permanecer

desconhecida. N ão o conseguia, de tal modo transpa­

recia a candura cesta bela a 5c»a cm tôda a sua pessea

e sobretudo nos olhos. « G o r a . Gema. lhe disse um dia

urr.a das suas mestras. .<e eu não lesse nos teus olhos

não tc conhecia».

Em bora fõsse das mais novas da aula. inspirava ia l

respeito que (òdas a tratavam como mais v íln a . «E ra a

aí/na da cscola. atesta um a outra mestra, e nada se fazia

ai sem c/a. Tcdas as companheiras a estimai-am c gos-

ía fam de a associar às suas festas e brinquedos; e não

obstante G em a fir/ia uma natureza pouco expansiva.

'_'0 S A S T A G E M A C A L C A S }

I

brevidade dc palavras, acção decidida e mandras per

rezes jparcnlc.T.ctilc rudes*.

A ss im sc manifestava no exterior. M as no exterior

s ò n e n tc . perque o seu temperamento era m uito diferente.

Confessou-m c rnvitas vezes que tomava de propósito

Ca^ipííano ■— Igreja paroquial dc S or.de o Santa foi

baptizodi

rr.ar.eiras um tan to Ásperas com' o fim dc sc ocultar c

com receio de ca ir na d issipação e ofensa dc Deus, cis-

trai ndo-se por causa dos sentidos. Sab ia domir.ar-se a

ponto de ihc tom arem por efeito da nossa pobre natu-

rc:a o que era nela fru to de v irtude . E fo i assim que

alguém , vendo-a tâo grave e tão avara de palavras, a

-tratou de a ltiva e orgulhosa.

*Cor?:o me [alais dc orgulho? respendeu sorrindo:

nc;<t sequer penso nisso. N ào /a /o muito, pcrqve n Jo sei

o q<ie hei-dc d i:e r ; não sei tambem sc ‘t h r i j bem cu

mal, por isso ca /o-m o .

Q uando , sendo já maior. G em a sc lembrar de ter

sido acusada dc o rgu lho , escreverá com impressionante

hum ildade: <Sr/n. era o meu grancc pecado: Jesus ju lgará

sc c.s o tinha, o:: não . sem sai’Cr. fist-.rc muitas ivzcs

para ir pedir perdão a m.:n/ias mestras, a minhas eorr.-

pao.heitãs c .i .Mestra Superiors. Depois â tarde e muttas

cc:cs dc noite chorava em silêncio. N ão ccnhecia c.<tc

pecado cm mim*.

O h ! . . . não tivéssemos r.ós outro que dc**.; só §cr-

tnínaria em nós. com o gcrm ir.ou na v irgcn :inha dc Luca

a encantadora flor da hum ildade .

O íraço dom inan te d o carácter dc G em a era a v iv a ­

cidade. U m observador atento bem dc-prcsM dcs-ccbro

nc!a um tem peram ento ardente, cu jo sangue fàc*lr.:cntc

irritável lhe fervia nas veias. Sem urr.a vio lência continua

sòbrc si. esía criança teria sido. como costum a dircr-sc,

um vivo dem ónio ; ao mesmo tem po que. pelos recursos

dum espirito pronto c pcrspicar. teria cvcrcido sóbre

qua)quer um com ple to com in io .

Q uan tas veres a v i eu aba far , mesmo á custa dc

f

esforços musculares. os primeiros movim entos de c ó ­

lera!

O u tro s form aram dela a mesma op in ião . tEmboea

dc natureza i’ii>a. diz uma testem unha, G em a era paci-

fica, porque triunfava sempre de si mesma. Longe dc se

perturbar, dc discutir. se alguém a provocava. se a m al­

trataram mesmo, a principio vespor.dia por um amável

olhar, depois por um sorriso tão meigo que algumas

rezes a sua adversária, desarmada, se lhe lançava nos

braços para a ;iperfar afectuosamente ao coração».

Q u a n d o lhe atribuiam um a desordem acontecida na

casa. declara um a outra, e a repreendiam por isso emir-

o icamente. G em a ouvia cr.i siiéncio, depois, quer tivesse

quer não tivesse razão, d ir ia com voz ca lm a: *N ão vos

perturbeis, n ão ves encolerizeis: serei obediente, prome­

to-vos, não fare i mais is$or>, E ra assim que ês í^ an jo

sabia dominar-se.

Q u a n to à aparente aspereza de que fala um a das

suas mestras, prcvir.ha ela do na tu ra l franco e sincero

cue particu larm ente d is tingu iu esta bem dita criança.

P ara ela s.:m era sim. e não era nao; b ranco era brar.co

e preto preto.

N ã o havia refolhos em seu coração; fa lava e ag ia se­

gundo o seu pensamento, sem usar de rodeios. Ignorava

tudo o que r.o m undo se cham a cerimónia, etiqueta. C u i ­

dadosa em observar as regras essenciais da delicadeza.

Gem a n ão queria saber de mais n ad a . F a lav a franca­

mente a todos sem d istinção de pessoas, e n ão com preen­

deria quê se pudesse achar que d izer acêrca desta s in ­

ceridade. De-facto. n inguém jam ais se o fendeu com a

sua linguagem ou com as suas m aneiras.

*

^ #1 1-VJ/i A i

1

C A P Í T U L O 1 1 1 29 ‘

>

Por outro lado, quando a cândida m enin3 estava

disposta a prestar-se a um a longa conversa — o que era

raro — de boa vontade ficaria qualquer longas horas sob

o encanto das suas palavras. É o que acontecia no insti­

tu to Guerra, cujas alunas, na sua totalidade, tinham pela

sua Gcir.a uni tal afecto, que haveria ura lu to geral r.o

d ia eiu que a doença a firesse voltar defin itivam ente

para o seio de sua fam ília.

Esta singular parcimónia dc palavras, ju n to com um

hab itua l recolhimento, fizeram com que a lguns a ju lgas­

sem lir.iida por natureza. H ouve até quem a considerasse

quãs i estúpida. Gom a não se preocupava com estas apre­

ciações. e se lhe falavam netas, d ir ia hum ildem ente:

íQí.-c necessidade tenho cu de agradar ao mundo? Es-

í\ipidj. sot:-o muito: teem-me pejro çue sou na realidade;

í>:35. pouco me importa».

Estando doente, veiu um dia o médico v i- la . A d m i­

rado do seu recoihimento. modéstia e repugnância cm

deixar-se tocar, tomou-a por uma dcyota fa n it ic a c no

fim da visita tentou convencê-la dc erro. recorrendo a

argum entos trazidos dos salões m undanos. Gerr.a. até

en tão silenciosa, respondeu imediatamente. Re fu tou um

por um estes mesquinhos argumentos, com ta l prontidão

c tal viger de frase, que o pretencioso vendo-se na im ­

possibilidade de responder. retirou-se con fund ido , com

singu lar adm iração das pessoas presentes.

Eu mesmo, mais de uma ver. usando de certos sofis­

mas quis experimentar alé or.de chegava a sua lógica e

penetração dc ju iro . Devo. porém, confessar que as suas

icspostas subtis e judiciosas lhe deram sempre vantagem.

T an to 6 verdade que os homens ju lgam segundo as-

1

30 S A N T A G E M A G A L G A N I•

aparências. só Deus. porém, conhece perfeitamente os

corações.

Voltemos ao instituto Gucrrn. A admiração das

mestras para com sua discípula é traduzida nos seguintes

térmos extraídos duma longa memória a que temos jà

recorrido: <Tódas as religiosas, inctuir.do a Superiora

que foi sua mestra no curso superior do ano escolar

IS91-1S92. tiveram uma profunda estima e vivo afecto

a esta querida menina. Eu mesma, que escrevo estas

linhas, tive ocasião, em virtude do meu cargo, dc a ver

mais de perto e de admirar particularmente a sua sólida

piedade e a sua ingenuidade infantil. Desde os primei­

ros dias em que a conheci, julguei-a uma alma predilecta

de Deus. mas oculta ao mundo.

<Eu ensinava as alunas a fazer de manhã um pouco

de meditação, e à noite alguns minutos de exame dc

consciência. Observei que Gema. conhecedora já destas

práticas piedosas, as tomava mais a peito. Nunca me foi

possiveí saber dela o tempo preciso que consagrara a

estes exercidos. De suas respostas evasivas conclui que

devia dar-lhes muito, sobretudo à meditação.

* A vida de ouvir a palavra dc Deus. manifestava

uma alegria extraordinária nos dias em que o capelãc

rinha explicar o catecismo. O mesmo acontecia por oca­

sião das pregações que se fazem na capela do instituto

nas dirersas festas do ar.o. Queria tornar-se uma santa

A imitação da venerável Bartoloméa Capitanio. E eu

lembrara-lhe muitas vezes a sua resolução por estas

palavras: <Pensai bem. Gema. vós deveis ser uma gema

dc grar.de preço».

Por sua ver a Reverenda Madre Guerra me escre­

via a respeito de Gema. trere anos depois da sua saida

do instituto: «O meu pobre ccra{ão exulta ao saber que

Vossa Reverencia trabalha err. glorificar uma santa das

minhas alunas. Cena Galgam. Tire-a cerca de dois anos

nas aulas que dava. e posso afirmar que nunca se ofere­

ceu ocasião de me queixar dela. Era muito siltr.ciosa e

muito obediente. — Irmã H ele r. a Gucrt a».

Como tóda a santidade sc forma junto da Cru:.

Deus pôs na alma desta jovem um vivo desejo de conhe­

cer o grande mistírio da nossa Redenção. Ccaeçou a

importunar sua mestra (a mesma que ihc faiava da Pai­

xão durante o seu retiro para a primeira comunhão) e

terminou por obter, à fõrça de instâncias, a prcaessa dc

receber amplas explicações sôbrc este miítério. durante

uma hora. tódas as veres que obtivesse na aula de: valo­

res. isto é óptima, tanto no estudo como nos trabalhos

manuais.

Que melhor recompensa poderia eu esperar? diria

cia a si mesmo: e. redobrando dc diligtncia. ccnsc-

guiu. a partir deste momento, merecer quisi todos cs

dias o óptimo, de modo que a hora do exercício combi­

nado lhe estava ordinariamente assegurada. *Quantas

re:cs. me diria ela um dia. reflectindo r.o amer de Jefus

que tanto sofreu por nós. e na ingratidão com que lhe

pagamos, ambas choráramos, a mestra e eu'»

A piedosa directora indicava-lhe pequenas mortifi­

cações corporais para compensar um pouco esta ingra­

tidão dos homens, c dava-lhe a cor.heccr dnersos instru­

mentos de penitência. A fervorosa criança procurou uns

c fabricou outros. Foi-lhe inútil, porem, insistir, pois não

lhe permitiram farer uso dèles. Por conselho da mesma

*•■. ■* * > v j : •. • \

*32 $ A S T A C E M A G A LG A X I

directora substituiu as m a c e r a is ■ da came por uma

rigorosa mortificação dos olhos, da lingua, de todos os

sentidos, e mais particularmente da vontade: c nisso foi

verdadeiramente admirável durante o resto da vida.

No rr.ês de Março de 1S8S foi Deus servido chamar

a si esta excelente mestra. irmJ Camila Vaglieusi. reli­

giosa de rara santidade, e Gema passou para a direc­

ção da irmã Júlia Sistini. bela alma de não menos vir­

tude. c dotada, dum modo particular, do espirito de

oração.

«5oí> a direcção desta mestra. me contou ela. comecei

.1 yentir i/m.» grande necessidade de orar. Tódas a.< urdes

cepois da aula. logo que chegara a casa. cncerrara-mc

r.un quarto para recitar de joelhos o rosário inteiro: de

r.oite. Icvantara-me muitas vezes durante cérca de um

quarto dc hora. para encomendar a minha pobre alma a

Jesus*.

Foi reste fervor de espirito c na par doméstica que

se passou o resto do ano. Desta criança podia dizer-se o

que do Salvador adolescente atesta o Evangelho: que.

avançando em idade, crescia cm sabedoria c cm uraça

diante de Deus e dos homens.

Mas a passagem dos justos sóbre a terra è ordina­

riamente assinalada mais por tristezas que por alegrias,

mais por trabalhos que por deleites e passatempos: c

muito raro é que o Senhor os não submeta á prova desde

a juventude para os habituar, pouco a pouco. As grandes

lutas da vida espiritual.

Assim aconteceu bem cedo. como vimos, a Gema

que aos sete anos perdeu uma tão tarinhosa e virtuosa

mãi como era a sua. Mas uma tribulação muito mais

C A P I T U 'L O I I I 33• ) .

cruel i.i agora cair sôbre sua alma: a desolação espiri*

tual. chamada pelos doutores ascéticos martírio interior.

Até aqui a piedosa menina só saboreou consolações

celestes e só conheceu atractivos c estimulantes para a

virtude perfeita. Agora. A sua aversão scasivel por tudo

o que é do mundo sucedem o desçósto. a triste:* e a

repugnância pela oração. Quàsi que j* n io sente o seu

Jesus, cujos amorosos amplexos, de-repeote desapare-

cidos. lhe aparecera cor.? sor.hcs longínquos: sofrimento

intoIer.Nvcl é-.tc para o sou cor.ição tão pcueo habituado

a tal abandono, c que sc prclcngari. r.ão por alguns

dias. mas por um ano qu is i inteiro.

Entretanto éste período de extrema aride: não ser*

para ela um tempo dc repoifo r.o caminho da perfeição.

Feio contrário, sentindo ocultar-se éste Deus cujo ataor

era ja o único encanto da-sua vida. lança-se c a Sua

procura com mais ardor ainda, pelo desprendimento pro­

gressivo dos afectos terrestres, pela frequência fervorosa

da santa comunhão c pela prãíica assídua das virtudes

mais sólidas.

K?força-íc por arraigar bem r.o seu coração o

horror ao pecado, que veremos aumentar incessante­

mente com a idade, e uma dor cada ve: mais inter, sa d.u

pequenas faltas, que lhe parecem graves c de que pede

perdão a tedus com receio dc ser objecto de escândalo.

Para melhor purificar a alma quis mesmo recovar a sua

confissão geral, o que o ccnfesscr. bem convencido da

sua candura, não permitiu.

Para di:cr tóda a verdade, éste método dc vida

adoptado pela r.ossa Ccmarinha agradava pouco aos

membros da sua fam:lia. que igr.oravam os altos desi-

s

> r*

$i S A S T A G E M A G A L G A S' Ic

gnios do céu acerca dela: c repreendian-na muitas veres

da sua piedade, que lhes parecia exagerada. Não lhe

permitiam ir à igreja de manhã cedo c freqüentã.Ja

muito. A tarde queriam*na no passeio e preparada como

as irmãs mais novas. etc. Semelhantes contrariedades

enchiam de tristera o coração da pobre criança.

A Providência, porém, veiu era seu auxilio. Em

seguida à morte de seu tio Maurício, que foi a 15 de

Março de 1690. dois anos depois da dc seu avô Carlos,

suas tias Elena e Elisa vieram habitar com o irmão Hen­

rique. pai dc Gema. Eram duas senhoras dc grande pie­

dade c muito afeiçoadas aos sobrinhos. Com a chegada

das tias. Gema. confiada aos seus cuidados, rccupcrou

inteira liberdade.

Tódas as manhãs, antes da aula. assistia ao lado

delas à primeira missa, e A tarde visitava o Santíssimo

Sacramento. Juntas oravam e conversavam piedosa*

mente. A fervorosa criança julgou ter voltado aos fcclos

dias em que vivia sua virtuosa mãi. Dal por diante nunca

mais foi privada da santa comunhão. Comungava infa­

livelmente todos os dias. embora até ai o seu confessor

apenas lho permitisse trés veres por semana.

A medida que progredia na vida espiritual. )csus

tornava-se-lhe reais íntimo. «Faria-sc sentir dc cada ve:

mais à minha pobre alma. confessa ela ingènuamcntc:

di:ia-mc muitas coisas e dara-mc a saborear mais fre­

qüentemente grandes consolações».

Chegou o ano de 1891. Gema. tendo agora 13 anos

de idade, encontra-se elevada a um grau de virtude tal

que outros raramente o atingem (iepois dum longo tempo

dc esforços assíduos. Entretanto ela julga-se quàsi esta-

C A P I T U L O I I I t

cionària. A exemplo do Apóstolo, sen olhar para os

progressos obtidos, tem constantemente os olhos fixos

na perfeição ideal a que o Ser.hor a chama, c trabalha

sem descanso por adquiri-la. Êste ano devia faolitar-lhe

novos progressos.

As irmãs do instituto Guerra costumam dc dois em

dois anos proporcionar às suas alunas um turro de exer­

cícios espirituais: «CcjMra-mc a crer. escreverá ela mais

tarde. que se me oferecesse esta ocasião de me encontrar

de novo com Jesus. Desta ve: deixaram-me só. sem auxi­

liar»: quere e!a d::er. sem o assistência ce suas mestras,

considerada inútil para essa alma de elcjçic.

«Compreendi, continua ela. que Jesus me oferecia

uma ocasião dc bem me conhecer, c dc melhor me puri­

fica: para assim lhe ser mais agradável». No Im o das

suas mais caras lembranças (ornou nota diste retiro cos

seguintes lêrmos: «Exercícios do ano de 1691. durante

os quais Gema deve mudar c dar-se tòJa a Deus». N io

se podiam desejar melhores disposições nuca acam a de

treze anos.

«Lembro-me. escrevei ela que o prigaJe-r r.ct f<;

uma meditação sôbre o pecado. Fci então que <em­

preendi verdadeiramente quanto era digna do dnprè:o

de t:Jos: via-me ir.grata para com o meu Deus e cheia

de pecados. Vciu depcJs a meditação sóbre o inferno:

reconheci tê-lo merecido e tomei a resolução de fa:er

actos dc contrição, mesmo durante o dta. sobretudo

depois de alguma falta». Mesmo durante o dia: estas

palavras deixam perceber que a santa menina consa­

grava a tais actos uma parte das noites.

<Kas últimas praticas dos exercícios, continua ainda.

3ò S A S T À G E M A G A L G A S I

mcditou-sc sóbrc os exemplos de humildade, nansidão.

obediência e paciência de Jesus: c desta meditação tirei

duas resoluções:

1/ — Visitar tedos os dias a Jesus Sacromentado c

falar-lhe mais com o coração do que com os lábios:

2.' — Ter o maior cuidado possirel cm evitar con­

versas indiferentes, c falar de coisas celestes».

Ah! se os cristãos de idade madura levassem aos

exercícios espirituais as mesmas disposições que levava

esta tenra menina, que abundantes frutos dc salvação

não colheriam!

Ur.a tal aplicação às coisas divinas não levava a

angélica menina a negligenciar os exercícios cscolarcj.

Pelo contrário, era apontada entre as mais laboriosas c

obtinha sempre os prémios mais honrosos. No fim do

ano escolar dc 1593-1S94 obteve cm religião o prémio

crandc em ouro que sòmcr.tc sc dá a alunas que. durante

todo o curso dc catecismo, alcançaram a nota mais alta.

Quando chegavam as exposições dc trabalhos es­

colares. cm uso no instituto, as mestras conseguiam algu­

mas veres vcnccr a repugnância que a humilde menina

tinha dc aparcccr. c mandavam-lhe farer poesias, exer­

cícios dc francês, problemas de aritmética, etc.: prova

indiscutível de seus bons êxitos nestas matérias. Con­

ta-se que os seus. vendo-a tâo absorvida no estudo, lhe

diriam algumas veres cm tom dc vitupério: «Para que c

tanto estudar? És já tão sábia c ainda não estás satis-

fcita?>

Entretanto preparava-se uma grande provação para

a querida inenina. Seu irmão Eugênio, que tinha con-

croido o doença da mãi. aproximava-se do fio; da vida.

Eram duas almas cm perfeita comunhão dc ideas c de

sentimentos, dc sentimentos dc piedade sobretudo. *Eu

amava-o mais que todos os outros, d i: Gema. c nos dias

dc ferias estávamos sempre juntos, entretcr.do-nos a armar a!tar;inhos c ú imitar as cerimónias religiosas».

Eugênio tinha obtido dc seu pai autorização para

entrar no Seminário. Já com ordens menores, prepara­

va-se para o subdiacor.ato quando a doença o prostrou.

Em tais circunstâncias poderiam separar-se estes dois

corações? O bom irmão, logo que sabia que sua irmãri-

nha estava cm casa. queria-a imediatamente junto do seu

leito. Sem desconhecer o perigo real do contigio. Gema.

pouco cuidadosa com a própria vida. conservava-se dia e

noite à cabeceira do doente, servia-o. confortava-o. suge­

rindo-lhe piedosos pensamentos a-fim-de o dispor para

uma santa morte. O casto jovem adormeceu r.o Senhor

r.o mês dc Setembro de 1594. com disposições admi­

ráveis.

Atingida por sua ver duma doença grave que a

obrigou a ficar dc cama durante mais de trés meses, a

generosa menina viu a sua vida ameaçada. Foi para a

família uma consternação geral, essa perspectiva dum

novo luto. Recorreram ansiosamente a todos os meios

para arrancar à morte ao menos esta filha, esta irmã.

esta sobrinha tão amada. «iV io pesso exprimir, conta

Gema. os cuidados dc que era objecto por parte de todos,

mas sobretudo de meu pai que eu ria muitas ve:es cho­

rar c oferecer a Jesus a sua vida para salvar a minha*.

Parece que o céu aceitou o sacrifício do pai afec­

tuoso. porque morreu ao cabo de dois anos. como vere-

S Ç yvT fí “ T ' ’ • ' j - - : - •'.--k -

38 S A S T A G E M A G A L G A M

mos no próximo capitulo, emquanto a filha bem de-pressa

escapava dc todo o perigo. Contudo a demora da conva­

lescença obrigou-a a dizer um adeus definitivo ãs suas

queridas mestras do Instituto Guerra. Resignou-se paci­

ficamente com a vontade áo Senhor para viver só no seio

dc sua familia.

Ê assim que Deus semeia de flores c de espinhos

as veredas dos escolhidos. N ão lhes dã felicidade alguma

sem a fazer seguir imediatamente dc alguma tristeza.

Feliz daquele que. como Gema. encara os diversos acon­

tecimentos da vida perfeitamente conformado com a

vontade de Deus.

C A P í T. Ú L O I V•I

V ida dc Gcma cm família — Primeiras

comunicações sobrenaturais — Começa

a provar o cilix da dor — Morte de

seu pai

— n®5. iw r —

OMPLETAVA Gema os seus derassete anos. Livre

daqui err. diante das ocupações do estudo,

entregou-se por completo aos cuidados do

govèrr.o da casa e sobretudo A educaçào de seus

irr.:ão:inhos. os quais sc esforçou por d;rigir r.o ca­

rrinho da virtude por meio do seu próprio exemplo,

por meio de bons conselhos e por uca cuidadosa vigi­

lância. •

Informações precisas sòbre o carácter da sua direc­

ção fraternal, não as temos: ra s o que j i sabemos desta

bendita menina permite conjecturar o que deveria ser.

Compenetrada da importância da sua cissão. cujas con­

tas temia ter dc dar ao Senhor, esforçava-se por cum­

pri-la com um cuidado extremo: e quando a!gum dos

seus educandos caia em qualquer falta, atribula a si a

responsabilidade, por não ter sabido preveni-la com uca

vigilância mais activa. Era solicita em acudir às r.ccessi-

dades de cada um. a-ftm-de evitar os descontentamentos

40 S A S T A G E M A G A L G A S I>

c discussões que tão fàcilmente surgem «ntre rapares c

meninas de tenra idade.

, O seu bom exemplo no seio da família oferecia além

disso um espectáculo raro cm nossos dias; provocava a

admiração dos sr.esmos estranhos que ainda a recordam.

Um criado da casa. Pedro Maggi. ligado mais parti­

cularmente no serviço da bondosa menina, exprimia

assim a sua admiração sempre nova perante a extraordi­

nária virtude de Gema: «Que quereis? Gema não tea

igual».

Motivo particular dc admiração nesta menina era o

seu amor aos pobres, o único bem que lhe restava, se­

gundo a sua opinião, entre tantas faltas e misérias espi­

rituais. « Tòdas as feres que eu saia. conta ela. pedia

dinheiro a meu pai c. se mo recusara, pedia-lhe que r-.e

deixasse levar pão. farinha ou outros comestíveis. Gra­

ças a Deus. encontrara sempre pobres no caminho e ate

três cu quatro. Aos que vinham a ca «a dara rcupa branca

c tudo o que tinha à m2o. ,

Em breve, porém, meu confessor mo proibiu; meu

pai nJo me deu mais dinheiro, e nSo me deixou apoderar

de mais nada. Entretanto, quando saia. não encontrara

senão pobres que corriam para mim. e n io tir.ha que lhes

dar. Chorara continuamente de triste:a e terminei per

não sair mais».

Nem sempre foi permitido a Gema viver ir.?e::3-

ner.te enclausurada no seio da família. Seu pai. saben-

dc-a uma destas natureras ardentes que ten necessi­

dade dc movimento, obrigava-a a sair algumas veres, e

também algumas veres, na falta dc outros, lhe confiava

a vigilância dos irmãos nos p*asscios que davam. A jo-

vem obedecia. Mas. apenas transposto o limiar da porta,

dirigia-se apressadamente por travessas bem conhecidas

para o campo, a-firr.-de go:ar $o mesmo tempo do ar

livre e da solidão, longe das v

habitações. *

Para a contristar, serviu-

-sc o demónio um dia desta

inocente distracção tomada por

obediência c com tantas pre­

cauções práticas. Um jovem

oficial, que a tinha observado,

põs-se a segui-la. A angélica

\irgem. cujos olhos andavam

sempre baixos, não deu por

isso: quando o notou. sua afli­

ção foi extrema: chorou eu:to

c. depois de fervorosas pre^;*:

tomou dc no-.o a resolução 5c

nunca mais sair ser.ão para a

igreja vi:inha de S. Frediano.

Soube cispor tão bom tôdas as

coisas que seu pai quasi a r.ào

contrariou neste ponto.

Tal era cm sua vida fami­

liar a virtude déste anjo: vir­

tude que ela julgava não ter._

csforçar.do-se incessar.ie=epte^

por adquiri-la. <Gcn:j. repena,

cla a todos os instantes, i pre- PiJ Je Cvri.

ciso que mudes c te dês tôda s enj e j s^r.:j [ci

jesus9. ■ f

0 » 0«. '■ Para sc animar ao fervor tirava motivo áe tudo: das

solenidades da Igreja, das belezas da natureza, da suces­

são das estações, e dos próprios jogos em que algumas

vezes tomava parte para se distrair. Num destes, o da

'palhã, a sorte deu-lhe um dia a haste maior. «Eis, disse

ela. um sinal dc que Deus quere de mim uma grande san­

tidade. e eu também a quero».

Findava o ano dc 1S95. e eis que a idea dum ano

novo lhe veiu inspirar novos desejos de vida mais per­

feita. Levantou-se da meditação, tomou o livro das reso­

luções c escreveu: «Nette noro ano proponho começar

. u/na vida nora. O que c/c me resena não o sei: aban­

dono-me a Vôs. ó meu Deus. Tódas as minhas esperan­

ças c todos os meus afectos serão para Vós. Sinfo-mc

fraca, ó Jesus, mas com o rosso auxilio espero c quero

rirer dum modo diferente, isto é. mais próxima de Vós».

O seu regulamento de vida era o seguinte:

Logo ao levantar, sempre cedo. recitação das ora-

CCvS costumadas, em seguida assistência «\ santa missa c

comunhão. Tòdas as tardes. a sua visita tão querida ao

Santíssimo Sacramento, mais ou menos prolongada, se­

gundo o número e urgência dc suas obrigações domés­

ticas.

Ainda à tarde. meditação com outros exercícios dc

piedade e recitação do santo rosário dc joelhos. Dc noite

continuava, a interromper o sono. ao menos uma vez.

durante perto de um quarto de hora, para recomendar a

Jesus a sua pobre alma.

Que vivos sentimentos de amor. dc confiança e dc

arrependimento das suas faltas não brotariam do seu

coração durante estes momentos de prece solitária aos

42 S A S T A G E M A G A L G A S !

pés do seu Jesus! Soube-se da su3 própria bóca que

Deus. desde então, se comunicava à sua alma por suaves

amplexos de amor. e ao seu espirito por vivas ilustra­

ções ou claras lures, segundo a sua expressão. E assim,

noite e dia. mesmo entre as ocupações domésticas, em-

quanto os pis pisavam a terra, o seu espirito pairava nas

regiões celestes.

Tão profundo recolhimento interior, longe de ser

prejudicial às suas ocupações materiais, ajudava-a pelo

contrário a desempenhar-se delas com mais perfeição,

pela lembrança dc assim sc conformar com a Vontade

Divina, cujo cumprimento farã sempre a alegria da ver­

dadeira piedade.

A-fim-de mais desprender ainda das coisas terre­

nas o coração desta virgcnrmha c cnsir.ar-lh.e a n io sc

comprazer com n3da aqui no mundo que não fósse Êle.

o Senhor tinha-se servido, no cecurso do ano dc 1S95.

dum meio extraordinário.

Como oferta dum seu parente, recebeu um dia um

relógio de ouro c uma cru: com a sua cadeia:inha do

mesmo metal precioso. Gema. para ser agradável ao

doador, julgou dever levar estes objectos num dos seus

passeios.

Dc volta a casa. cmquanto tirava estas jóias, pa-

receu-lhc ver o seu Anjo da Guarda. O espirito ce­

leste. olhando-a com aspecto severo, pronunciou pausa­

damente estas palavras: As únicas jóias que embelezam

a cspõíJ dum rei cruci[i<ado 5J 0 os apinhes c a cruz:

c desapareceu.

A impressão produrida r.o espirito da piedosa me­

nina por esta visão sem precedentes e por palavras tão

. . C A P I T U L O I V : 43

44 S A N T A G E M A G A L G A N I

expressivas fácil é adivinhá-la. Atira com desprêio para

longe de si o relógio c a cadeia. tira do dedo um lindo

anel. e prostrada cora o rosto por terra. toma. chorando,

a seguinte resolução: «Por i*osso amor. ó Jesus, e para

nJo agradar senão a Vós. prometo-Vos não mais trazer

objecto que traduza vaidade c n.lo /alar mais nele».

Cumpriu a sua palavra e. a pattir disse dia. não mais

quis saber de modas nem de adornos.

Tal é. segundo as memórias deX ícm a. o primeiro

vestígio dessas aparições angélicas que depois se torna-

raram freqüentes c a t i quotidianas. c<yno veremos.

O próprio Rei dos anjos se dignava desde então

honrá-la com ternas visitas, segundo esta ingénua decla­

ração ao seu Director:

<A-pesar-de eu ser fio rr.i. Jesuf vinka ver-me e

dizia-me muitas coisas*. E continua: <Não sei como não

me aparecia irritado: sô uma ve: o -t'i encolerizado>.

Êstc aspecto severo, duma só ve:, mais uma prova

do que o castigo dc qualquer falta voluntária, visto que

Gema. no decorrer da sua vida. nunca cometeu pecado

algum com plena deliberação.

Ditosa menina, que fóste julgada digna, desde a

idade dos de:assete anos. de ouvir a vo: humana dc

Jesus, de O ver e dc O contemplar com teus olhos

mortais!

Sem dúvida tais favores não constituem a santidade,

pois muitas almas há que, sem os ter çeccbido. merece­

ram. por heróicas virtudes, as honras dos altares. Toda­

via são cm sinal muito certo de santidade, porque nunca

se notam em almas de virtude ordinária.

s

• N ão é de admirar que esta criatura privilegiada,

olhando com desdém para os bens caducos desta pobre

vida. suspirasse ar­

dentemente p e la

pátria celeste.

•Desde o d:3.

escreve ela. cm que

minha mài me ins­

pirou o desejo do

Paraiso íjJo deixct

dc o experimentar.

c. sc o Senhor me

tivesse dado a es-

colhec. cu teria pre­

ferido rer quebra­

rem-se os laços do

meu ccrpo para

voar ao céu. Tàda.*

as rezes que era

acometida de febre

ou dc qualquer cu-

ira doença, experi­

mentara unia doce

esperança, tiiinna

dor porem aumen­

tara quando, afaitar.de-fC a dc<r.ça. scnr.a icltarem-rne

«jj forças.

U m dia. depois c a S a g ra d a C c-.u -.'-.Jo. prcgu-.tet a Jesus porque motivo me r..io .V: j-. j ; j ra o ParaiíO .

— « M inha filha, re jp c r .d cu . quero dar-te r.o deccr- re r da tua existência m uitas cca.-iccs de te enriqueceres

S A S T A GEMA G A L G A S I4

de méritos: avivarei sempre mais o teu desejo do céu. c

continuarás a suportar a vida com paciência v

Com estas incessantes aspirações cresciam rápida-

mente em seu coração as chamas do amor divino. E den­

tro em breve, no ano dc 1S96. despertava nela c nela se

radicava mais e mais um novo desejo que bem revela a

sinceridade do seu amor e o seu grau dc perfeição. Dê­

mos-lhe a palavra:

«L/m outro desejo desabrochou na minha alma. um

ardente desejo dc sofrer e dc acompanhar Jesus nas st:as

dores> (>)•

E continua: «.Vo meio dos meus numerosos peca-

dos» pedia todos os dias a Jesus sofrimento e muito so*

frimento. Sim . meu Jesus, repetia eu. quero sofrer por

\~ós e sofrer muito*.

Um ardente desejo, disse bem: porque lhe bastava

uma palavra, uma lembrança, um olhar sôbrc a imagem

dc Jesus Crucificado, para sc sentir completamente pene­

trada dc compaixão c dc amor. eUm dia. conta ela.

fixando o olhar no crucifixo, fu i possuide de tal dor que

cai desfalecida. Meu pai. que estaca presente, pós-sc a

repreender-me e acusou-me de prejudicar a saúde com a

minha vida retirada e ccm o hábito de ir à igreja muito

cedo.

(*) Mais que urca ver. o Salvador se mostrará 6 sua serva sob o aspecto da dor. cu coco çue suportaedo verdadeiramente os

suplícios da Pa'xSo. ou saturado de tristeza por causa da InçratídSo dos hocens. Todos os santos conhece ran mlstlrlo. e. com esta *.Uo de piedade, rea! ou imaginária. procura/ara condoer-se axroro-

taseote do» sofrimentos do rosso Redentor, embora a U lhes reve- Uue que Êle es:S para sempre çlorloso e lo$asslvcL

• \ * ’ • • i;'? ' ’• . •

C A P Í T U L O I V 47i .

«O que me fa : mal. respondi, c ser obrigada a estar

longe do tabernáculo de Jesus. E fui encerrar-me no

quarto onde. pela primeira ve:, desafoguei a minha der.

só com o Coração de Jesus».

Destas palavras sc dedu: que ati ésse momento,

isto é. ate aos dc;ói:o ar.es. a piedosa ir.cn.r.j tinha aba­

fado na sua altaa a tr;s'.era que ihc ca usa van semelhan­

tes dificuldades. E ccr.tmua amda: «£u disse a Jesus:

quero seguir-Vos. 6 Jesus, .i custa de sofrimentos, sejam

eles quais forem: quero scguir-Vos cem /error. S'io.

meu Jesus, não rr.ais quero cautar-Vcs repugr.Ànoa com

as minhas obras tibias. r.em inspirar-Ves desgisto com

a frouxidão com que Vos tcr.ho procurado até agera*.

E. como sc quisesse garantir as suas presessa».

acrescenta: «Per isso. para o futuro. ora;io mais re­

colhida. comunhão nais fcrccrcsa. Afea Jesus per V is

quero sofrer muito, ter.co sempre a prece nes libios».

Depois, ao cons:dcrar. as suas resoluçí«s. c pensa­

mento da fragilidade Humana leva-a a escrever esta re­

flexão: «Cai muitas vezes quem muitas ve:es fetna bens

propósitos: mas cue sera de quer: só raramente cs

fermah

Gema não era dc modo algum inexperiente r.o cami­

nho da dor. que cia tão ardentemente deseja perccrrer

cm seguimento do seu Divino Mestre. Muito querida dc

]csus desde a ma:s tenra idade, tinha, cm ccnscqütnoa

disso, rcccbido ccdo a sua parte da cru:. • Posso di:er.

descobria cia ao seu Director, que. desde a merte de mi­

nha mài. não parses um só d:a sem sofrer alguma coi-

sinha por Jesus».

Agora, que j i r.ão estava na infância, mas numa

S A X T A G E M A G A L G A S /

idade m adura , c Senhor ia tornar pesada a sua n ã o

d iv in a e aplicar goipes ce mestre.

A princípio veio-lhe u n mal terriveí a um pé. a

necrose, acom panhada de dores muito agudas. À v ir ­

tuosa donzela , ju lg ando não dever ligar im portânc ia ao

m a l. suportava os sofrimentos com unta generosa co ra ­

gem . O mal. porém desprezado, agravou-se. a cárie p ro ­

pagou-se. e foi forçoso recorrer ao cirurg ião . Êste. à

v ista dos estragos d a gangrena. n ão ocultou os seus

receios e declarou que provàvelmente seria necessária a

am pu tação do pé. [.imitando-se a prir.cipio a um a opera­

ção parcia l, descobriu o osso atacado e pós-se a raspá-lo

p ro fundam ente para e lim inar dêle os por.tos cariados.

À paciente, que n ão tinha querido ser cJcroíormi-

zada . suportava heroicamente as torturas da operação:

e. em quanto todos os assistentes estremeciam de horror

c pena. só e!a. imóvel, parecia estar indiferente. N o mais

du ro da operação, scltou alguns suspires invo luntários,

mas. o lh ando im ediatam ente para a imagem ce jesus

C ruc ificado , pediu-lhe perdão desta fraqueza e retomou

a im passib ilidade.

Ê assim que. para empregar a sua própria expres­

são , depo is de tanto ter pedido um pouco dc sofrim ento.

Jesus a tinha consolado! O D iv ino M esíre libertou em

breve a sua am ada serva destes primeiros tormentos cor­

porais. mas para lhe apresentar, no cális de sua paixão,

am argura bem diferente.

H enrique G a lgan i. seu pai. era um homem educado

à an tig a : bem, simples, caridoso, incapaz de enganar

a lguém , incapaz de ju lg a r que o enganassem a êle. M as ,

embora o n ão supusesse, vivia em maus tempos. M u ito s

do ’s que conheciam a sua bondade excessiva procuravam

explorá-la em seu proveito . D e tòca a parte v in h a a ter

com ele. Ê s íe v inha ped ir dinheiro emprestado, aquèle

v inha pedir-lhe que ficasse por seu fiadoc; os seus arren ­

datários e inqu ilinos n ão pagavam as rendas. A lém disso,

longas e con tinuas doenças na fam ília, entre cias as de

sua esposa, c ce dois f:'hos. doenças a que sc seguiu a

morte, e mil outros in fo rtún ios contribuíram para consu­

m ir pouco a pouco o seu rico património.

Q u a n d o chegou o vencim ento das letras, im p ruden ­

temente caucionadas, foi comple'.a a ruíca. T o dos 05

bens móveis e imóveis foram penhorados, e a numerosa

fam ília encontrou-se reduz id a h mais lamentável m iséria.

Pouco depois, o pobre pai caía doente com uca can ­

cro na garcar.ta e n ão tardou a expirar, deixando os seus

queridos íilhes r.a m ais completa penúria. A nova do seu

falecimento, os o fic ia is da justiça e a fôíça púb lica vie­

ram . em nome dos credores, fechar a farmácia e « b r c»

pôucos móveis que a in d a restavam.

Perante a narração dum tal infortúnio. n ão te pa ­

rece. ó leitor, ver passar d iante des oihos as d .íc :e n ic s

cenas das des.jraças de Job? Entre tanto o s qua:s eram

os sentimentos de G em a cm semelhante a fhçáo :

«.Entráramos no a/?o dc 1S97. t3o d c lc rc ic para

tôda a fã m i! ia. S ó cu. sen cora; Jo . //ca ta indiferente a

fa.-ifcs ici'cscs (* )• O f; 1-0 mais afUgia cs ciittos. era

cncOnlrarctn-sc sem recursos e, para cúmulo, rerem

nosso pãi tão doente. Certa m ar.k i ccmprcer.di a $ran*

(1) Sem coroçJo — rr.oJéütJ tr.ar.tidcr» <c~i que cscor.cc

o licrciscro dc v.sa virtude.

OV S A A I A O r, M A u A L U A S' I JOf

de:a do novo sacrifício que Jesus is impor-me: chord

muito. M as o D irino Mestre nestes dias de dor, fazia-se

sentir muito à minha alma. E depois, a visto da edifi-

cante resignação de meu pai em face da morfe inspi- '

rou-me tanta fôrça que recebi o golpe terrível com calmo.

N o dia do seu falecimento, Jesus proibiu-mc derra­

mar lágrimas inúteis. Passei-o em oração. muito resi­

gnada com a vontade de Deus. meu Pa i do céu. que

r.este momento tomou c lugar do meu pai da terra.

Dcpcis desta perda ficávamos sem nada: não tinhamos

com que viver».

Era a 11 dc Novembro de 1S97 que Gem a se via

órfã pela segunda vez. Com q-.ic heroísmo abraçou as

cruzcs. dc cada vez mass pesadas, que o D iv ino Mestre

costuma distribuir prodigamente pelos seus predilectos. *

i

íi

C A P Í T U L O V

Gem a com sua tia cm C am a io re— O seu

pudor v irg ina l — V olta a Luca — Às por­

tas da morte — Aparições celestes e cura

prodigiosa

— tS O M S W —

é sempre grande a desolação numa famiha

depois da morte do pai. para a casa Galgani

foi ela incalculável. O falecido deixava sem o

menor recurso seis filhos e duas irmãs: Helena e Elisa.

i Felizmente. outras tias que viviam fora. comovidas

por um tal abandono, vieram cm auxilio dos seus sobri­

nhos. e Gema. a preferida de entre todos, foi recolhida

por sua tia dc Camaiore. Carolina Lencioni. cujas rique­

zas lhe permitiriam voltar aos dias mais prósperos da

casa paterna.

Mas. assim como a virtuosa donzela se não tinha

afligido com a extrema penúria dc Lu ca. assim tambóm

não sc regozijou com a opulência de Camaiore. A sua

única felicidade devia consistir, como sempre, no traba­

lho. na oração e na un ião intima com Jesus. Retemperada

no amor div ino pela tribulação, esperava poder agora

gozar em paz os seus frutos e levar em casa de sua tia.

como num mosteiro, uma vida túda celeste.

Esta espectativa foi ilud ida . Se no seio de sua farai-

Iia lhe deixavam plena liberdade para se entregar a prá­

ticas de piedade, evitando as distracções mundanas, em

Camaiore. cocno outrora em S. Gennaro, multiplica-

ram-se de dia para dia os entraves ao seu ideal dc san­

tidade. Por um !ado, o seu bom coração sofria era se

subtrair às conveniências da sua condição, por outro

experimentava, em as seguir, escrúpulo e remorsos.

Q ue fazer?

Longe de seu confessor ordinário,. Gema não

podia manifestar-lhe as suas incertezas. Abrir-se com

outro, pouco ao corrente do trabalho interior da graça

em sua aíma. era coisa que lhe repugnava invencivel­

mente. A lém disso, a inda que o quisesse, não poderia

c>:pl:car-sc nem fazer-se compreender.

A todos estes motivos de amargura vieram juntar-se

ir.úmcras dificuldades externas contra a Com unhão fre­

qüente. seu único sustento. F-m tal angústia, d irigia ao

seu Jesus súplicas e queixas amorosas. M as Êle. pare­

cendo permanecer surdo, abandonava-a a uma profunda

aridez.

A piedosa menina multiplicava contudo os esforços

para se tornar mais agradável a seus olhos: e. à im itação

de Santa Catarina de Sena. como que tinha levantado

em seu coração um aitar donde incessantemente se ele­

vavam à M ajestade D iv in a humildes adorações e palpi­

tações de amor. Q uando lhe era concedida autorização.

di:igia-ic a tôda a pressa, em companhia de sua prima,

para a igreja da colegiada vizinha, S-fim-de viver alguns

instantes muito cuitos junto do seu am ado Jesus.

A inda hoje os Reverendos Cónegos da Colegiada

62 S A N T A G E M A G A L G A N l

C A P I T U L O V • 53

gostam de indicar aos visitantes o lugar que ocupava

habitualmente a nossa santa nas suas visitas eucarísticas.

O s seus passeios, aliás forçados, tinham quási sem­

pre por meta o santuário da Abadia em que se vcr.íra

uma antiga imagem da V irgem Santíssima. Com que

felicidade expandia ai a sua terna devoção para com sua

querida M am ã. como costumava chamar-lhe! Recomen­

dava-lhe com lágrimas a alma dc seu falecido pai e dali

só se retirava ao sinal de obediência.

Bem de-pressa um acontecimento doutra natureza a

vciit perturbar profundamente. A modestíssima virgem,

nos seus vinte anos. era dotada dc rara beleza. Dum

porte nobre e gracioso, em seu modo de vestir, pôsto que

dos mais simples, apresentava-se encantadora. O s seus

olhos, difíceis dc ver. porque os trazia constantemente

baixos, brilhavam como o meigo scir.tilar das estrelas; e a

estes atractivos externos, a piedade, o recolhimento e a

modéstia, que transpareciam em toda a sua pessoa,

acrescentavam r.ovo encanto.

O ra . aconteceu, peia segunda ve:, que um jovem da

terra, dc muito honrada família, só com vc-la se enamo­

rou dela: c, sem tirar muitas informaçòcs. pediu a sua

mão. Era uma ocasião favorável para levantar da ruir.a

a fam ília Galgani. A angélica donzela, porém, nem

sequer quis ouvir falar cm casamento, c para sc subtrair

a inúteis vexames tomou a resolução dc abandonar Ca-

maiorc-

V endo que êste motivo não seria fàcilmente adm i­

tido por sua tia. implorou de novo com a mais v iva con­

fiança o auxilio do Senhor: c Êle para livrar a sua serva

de todo o perigo, permitiu que logo se lhe declarassem

S A N T A G E M A C A L G AN I\

dores agudas na cspinha dorsal e nos rins. Animando-se

então c se n se preocupar com a perspectiva das priva­

ções que a esperam cm Luca. Gem a pretexta o seu estàdo

de saúde para solicitar a partida. A fôrça de instâncias

c de lágrim as obtém a permissão de entrar novamente

na casa paterna que ela ia encontrar, como a tinha dei­

xado. sepultada na miséria.

Conta-se que no .m om ento da despedida todos os

membros da fam ilia Lencioni sentiram despedaçar-se-

-Ihcs o coração, tanto os tinha atraido por suas belas

qua lidades a cativante menina. Viu-se o próprio tio.

carácter rude e d ifíc il dc comover, lançar-se irresistivel­

mente nes braços desta querida sobrinha, derramando

abundantes lágrimas.

M a l chegara a Luca. sentiu Gem a agravar-se o seu

estado. A s dores dos rins e da espinha dorsal vieram

juntar-se o desvio da coluna vertebral, criscs terríveis

da meningite, perda total do ouvir, queda do cabelo e

por ú ltim o a paralisia dos membros. A principio, na espe­

rança de evitar o exame médico, temido pelo seu pudor,

d issim ulou ela a agudeza dos sofrimentos, particular­

mente excessivos na região dos rins. Como se deixaria

exam inar c tocar por um estranho, ela que nem sequer

se perm itia dirig ir um olhar para os membros dolorosos,

nem mesmo aproximar deles a m ão para verificar a exis-

tcr.cia do mal?

Perante o agravamento assustador dos sintomas, a

sua perplexidade tornou-se extrema. Teria certamente

preferido suportar torturas dez ypzes mais cruéis a rece­

ber um a visita médica, porque, lembrando-se sempre das

palavras de sua mãi — o nosso corpo é o templo do Espí­

C A P I T U f. O V 55

rito Santo — . queria a lodo o custo fazê-lo respeitar

como tal.

Urr.a tarde. porém, um médico, cham ado pela fam í­

lia sem ela o saber, entrou-lhe subitam ente no quarto, e,

a-pesar-da sua recusa inacessível a qualquer argumento,

quis a tõda a fôrça examiná-la. Perante a ordem formal

de suas tias. Gem a teve de oferecer a D eus o inevitável

sacrifício.

O exame revelou na região lom bar um grande

abcesso, parecendo comunicar com um dos rins. O mé­

dico. assustado, reüniu uma jun ta de outros clínicos que

declararam unanimemente a jovem ating ida dum a afec­

ção vertebral de natureza m uito grave e dificilmente

curável (1 ). Receitaram alguns medicamentos cu jo efeito

foi nulo. Bem de-pressa os progressos incessantes do

mal obrigaram a enferma ao leito incapacitada já de mo­

vimento. • ••

Em quanto se consumia o frág il corpo d3 inocente

menina, a sua alm a expandia-se cm ternos gemidos,

nesses gemidos de amor que consolam e aliviam , e que

ninguém trocaria pelos efémeros prazeres mundanos.

Seu pensamento voava constantemente para Jesus que

lhe satisfazia emfim os ardentes desejos de sofrer para

Lhe agradar. Poc outro lado. como o confessor estava

agora ao seu alcance, a sua alm a permanecia cm paz; e

o Senhor, em sinal de particular estima, fazia-lhe sentir

um a dor intensa e um horror sempre m aior ao pecado.

Dores fisicas c arrependimento purificador dum

• • •

" • •'(!) Mal de Por- ÍM * * *•

66 S A N T A G E M A G A L G A N 1

passado menos peifcito uniam-se para activar a obra de

sua santificação.

Impossibilitada de se mover por si mesma, a doente,

no seu leito de sofrimento, permaneceria em perpétua

imobilidade, sc braços caridosos lhe r.ão viessem trazer o

alivio duma mudança de posição. E assim sc lhe iam

passando os dias c as noites, sem outras consolações

interiores além das que lhe davam a oração e a confor­

m idade com as disposições da Providência D iv ina.

A lgum as veres, quando se queixava amorosamente

ao Salvador de nem mesmo poder já orar. rcccbia por

intermédio do seu A n jo da G ua rda fortificantes exorta­

ções. «Se Jesus te aflige no feu corpo, dizia o Espirito ce­

leste. c para melhor purificar a tua alma: tem paciência*.

A lud indo mais tarde a esta fam iliaridade sempre

crc^ccnte com o seu bem A n jo . cscrcveu G em a: « O hl

quantas ve:es. durante a minha longa doença, me disse

ao coração palavras consoladores!*

O s membros da fam ília Galgani faziam o impossí­

vel para valer à sua querida Gema. A-pesar-de redu­

zidos a uma penúria extrema, com nenhum cuidado lhe

faltavam , diante de nenhum sacrifício recuavam para

obter a sua cura. até que por fim, desesperando dos

meios hutcar.cs, se voltaram coníiadamente para o céu.

Comovida por tantos testemunhos de afecto, a jo ­

vem sofria ao lembrar-se que era para todos um motivo

de embaraço por causa da sua longa e fastidiosa doença.

A tristeza to:nou-se-lhe tão intensa que o Senhor, quer

para a humilhar quer para a cogfortar, se dignou vir

pessoalmente repreende-la por isso.

«Cer/a nanhS. conta Gema. depois de me ferem

C A P I T I I % c O * V 57

trazido a Sagrada Ccmunhào. Jesus cerr. voz muito forte,

dirigiu-me una grande censuta: <A!ma pusilânime, me

C&jjelit in terior cf-n / r r r l j dc /£>.* j . <--n / fin-Vyra (ju e e r.J

disse, c o teu amor-próprio que recalcitra for r.io poder

tomar parte r.a vida ordinária dc ; que te cercam; ou

antes c a necessidade inevitável dos cuidados dou trem

qué te causa umà excessiva confusãc. M a is morta para

ti mesma, não experimentarias semelhante inquietação>.

T ão consolada com o esclarecida por estas palavras,

a piedosa donzela recuperou a par, e; desde então, ficou

indiferente tanto às vicissitudes do seu estado, como aos

incidentes da fam ília . , -

• " r Entretanto a notícia da sua cruel doença tiDha-se

espalhado pela c idade , e numerosas am igas vinham

adm ira r de perto o que elas próprias cham avam um pro­

d íg io de paciência em tão tenra donzela. G em a, acolhen­

do-as com amável sorriso e provas dc gratidão , trocava

'com ctas palavras edificantes, as únicas que sabia, tirar

d o seu coração. Era-lhe indiferente, d iz ia ela. voar ao

céu imediatamente ou ficar a inda nesta pobre terra para

sofrer tanto quanto aprouvesse a Deus.

Essas boas am igas vendo o inu tilidade dos cuidados

médicos, esforçavam-se por lhe fazer esperar um mi!a-

:grc. umas vezes por intercessão dum santo , outras por

intercessão doutro, segundo a sua deveção particular.

U m a destas visitantes, querendo excitar a sua con­

fiança em um novo intercessor, ou ao menos amenizar

por um a edificante le itura as longas horas do dia, trou­

xe-lhe a vida de S . G abrie l de Nossa Senhora das Dores,

d a Congregação dos Passionistas. então somente V ene ­

rável. Gerr.a núr.ca tinha ouv ido falar d?sse Santo jovem

r.eir. dc seus numerosos m ilagres, cu ja nom eada enchia

já tôda a Itália. T am bém não m anifestou nenhum entu­

siasmo a seu respeito, embora a fam ília começasse a d ir i­

gir-lhe ardentes súplicas.

t:is como o Senhor acendeu no coração da sua serva

um a centelha de devoção, de confiança e dc amor para

C A P I T U L O V 59

. 1

com êstc Santo , cente lha que de-pressa se devia trans­

form ar em incêndio .

E m um a das suas. horas de so lidão , a pobre pa ­

ciente sentiu-se de-repcnte invadida por sombrios pen­

samentos dc m elancolia e por uma tristeza imensa.

C ansada , enfraquecida , impotente para encontrar cm

motivos dc fé o menor conforto, apodcrou-sc dela um-

desalento p ro fundo c a v id a parecia-lhe insuportável.

N a d a parcce mais na tu ra l que semelhante crise num a

rapariga doente e reduzida a tão lamentável estado.

1 odavia isto n ão era mais do que um a tentação

habilm ente d iss im ulada , do astucioso in im igo , que assim

procurava insir.uar-sc-lhe pela calada na alma para

mais seguramente conseguir perdê-la. Q u a n d o por

seu artific io ju lgou tê-la completamente perturbada,

tirando dc súbito a mascara, manifcsta-sc e diz-lhe: «Sc

í7;c ourires eu te livrarei dos teus tormentos: dar-te-ei

com certe:a a saúde, c ccm a saúde tudo o çise te puder

agradar».

Pela prirr.eira vez vemos Gerr.a face a face com

Satanás que vem abertamente travar a lu ta . N ão sabe­

mos se esta tentação foi produzida por m eio dc aparição

real. se. como parecem dar a entender as palavras da

serva dc Deus. por meio dc simples sugestão. Fôssc o

que fôssc. o resultado foi bem claro.

A um a forte ag itação e grande perturbação in te­

rior, até a í desconhecida, a piedosa m enina, a-pesar-da

sua inexperiência em casos desta natureza, reconheceu

im ediatamente a presença do dem ônio . Lembra-se de

S . G abrie l, inveca-o confiadam cnte e exclama: primeiro

a a/m a, e só dep-ois o corpo.

€0 S A N T A G E M A G A L G A X Ii

O tentador foi repelido; mas não tardou a vo itar

para um segur.do assalto. N o v a invocação ao santo e o

sinal da crus pusecam-no defin itivam ente em fuga.

Depois da vitória . G em a recuperou a ca lm a e u n a

un ião mais in tim a com D eus , que a recompensou gene­

rosamente da sua enérgica resistência.

T endo assim experim entado a eficaz protecção do

San to jovem , sentiu nascer cm sua a lm a sentimentos dc

g ra tidão c um princip io de afecto para com éle. N o fim

do combate, o seu p dm c iro pensam ento foi procurar o

livro da sua v ida que tinha co locado sóbre o travesseiro.

«i\'cssa mesma tarde. d iz cia , pus-me a ler a Vida do

Irmão Gabriel, li-a muitas rezes: não me podia saciar

dc a ler e de admirar suas virtudes e exemples. Desde o

dia em que o zioi'o protector me tinha salvado a alma

senti uma devoção particular para com è/e; de noite não

conciliava o sono se a sua imagem não estivesse sôbre o

meu travesseiro. Tinha sempre junto de mim o irmão

Gabriel,

Neste ponto não me sei explicar: mas sentia a

sua presença e em cada um dos meus actos me vinha

êle à lembrança>.

A senhora que tinha em prestado à enferma a V id a

do Santo veiu para a levar. M a s , quan to n ão diferi3tn

agora os sentimentos da donze la , prestes a perder o livro,

daqueles com que o tinha recebido! O seu coração entris­

teceu-se e as lágrim as brotaram-lhe dos olhos. A se­

nhora , comovida, deixou-lho por m ais a lgum tempo.

T odav ia» G em a teve fina lm ente que separar-se dêle.

«Este Santo do céu. escreveu ela. quis dentro em

breve recompensar-mc dèste pequeno sacrifício, porque

• *

C A P I T U L O V 61

na noite seguinte ■ me apareceu, envolvido num manto

branco. Não o conheci. Mas ê/e. percebendo isso. abriu

o manto c deixou ver o hábito dos Passionistas. Não

tardei cm o rcccnhecer. Preguntou-me porque tinha eu

chorado, ao entregar o livro da sua vida. NSo sei qual

foi a minha resposta. £le. porém. disse-me: Sè vir-

tuosã; voltarei a vcr~tc>.

Esta curta v is ita de S . Gabrid.- cncherdo de de li­

ciosa paz e suav idade a alrr.3 da santa, reavivou forte­

mente o seu an tigo desejo do céu: tVamos a Jesus

ouviam-na m uitas vezes exclamar, sim, vamos a Jesus

para ficar sempre com ê !c>. M as Jesus n áo tencionava

ouvi-la a inda , c c!a, sufocando no coração a q u é k ardeste

desejo, permanecia tranqü ila no seu leito de dor. p lena­

mente resignada corn a vontade divina.

A lém dos membros da fam ília, as caridosas irmãs

dc S . C am ilo , cham adas Barbantinas. prestavam-lhe

assiduamente seus cu idados, levadas a isso certam er'e

não só pela caridade heróica de que. fazem profissão,

mas tam bém pelo m uito que veneravam a querida en­

ferma.

P or vezes traziam a lgum a das suas noviças para

que se edificasse com o espectáculo de tan to fervor c

virtude. V ir .ham igualm ente com o fim de sc cdificarem

as irmãs de Santa Z ita . que conservavam um vivo afecto

à sua antiga a luna e que recordam a inda os belíssimos

exemplos de v irtude , de que ío ra n testemunhas cu ran tc

a sua longa doer.ça.

Entre tanto os meses iam correndo sem trazer m elho­

ras à dolorosa s ituação da padecente. A miséria da fam í­

lia aum entava com as dívidas ocasionadas por tantos

62 S A N T A C E M A C A L C A N It

médicos e remédios, chegando a ponto de ninguém lhe

querer emprestar um úcico ceitil. À s almas caridosas que

v inham ver a santa enferma teriam certamente, por q u a l­

quer maneira, dado remédio a esta pobreza, mas os

infelizes filhos de H enrique G a lg an i. lembrando-se da

sua prosperidade de outrora abstinham-se cu idadosa­

mente dc a revelar. E assim acontecia que muitas vezes

nem dispunham dum centavo para procurar a esta que ­

ridíssima irm à o mais ligeiro alív io.

Chegou a véspera da Im acu lada Conceição. 7 de

Dezem bro de IS9S. A s irmãs Barbantinas apresenta-

ram-se para a sua visita hab itua l, acom panhadas dum a

postulante a quem a pouca idade im pedia de vestir o

háb ito religioso. A vista deste an jo despertou em Gem a

o desejo de a im itar. C rendo ser uraa inspiração div ina,

faz voto a N ossa Senhora dc entrar para a Congregação

das Darbar.tinas; se chegar a convalescer.

«£sfe peoiJ.-nenfo consolou-n:e. escreveu ela: falei

nèle à irmã Leor.ilda que tomou o compromisso, se cu

chegasse a sarar, de me adm itir à profissão na mesma

época que a jovem postulante».

M u ito feliz, a-pesar-dos sofrimentos fisicos. a bon ­

dosa enfêrma manifestou a sua in tenção ao confessor,

que veiu nesse mesmo d ia trazer-lhe as graças do Sacra­

mento da Penitência. «Aprovou imediatamente o meu

projecto, continua, e concecícu-me ainda outra consola­

ção. sempre recusada até ai: a de fazer nessa mesma

tarde o voto de virgindade perpétua>.

Gem a atingia e n fim o apogeu dos seus desejos.

A gora já pode proclamar-se tôda de Jpsus. e de jesus só.

Nessa noite uma paz celestial desceu à sua a lm a, e o seu

C A P I T U L O V 63

am or esperou com impaciência a alvorada do d ia se­

guinte que dev ia pela primeira vez depois do voto de

v irg indade perpétua , uni-la a Jesus na Santa C om unhão ,

c dar-lhe ao mesmo tempo a alegria de oferecer à sua

M á» celeste, na festa da Im acu lada Conceição, a bela

promessa de tom ar o véu.

Tendo-se abandonado a éstes doces pensamentos,

veiu um tranqü ilo sono cerrar-lhe as pálpebras e pôr em

repouso os seus doridos membros. Apareceu-lhe então

de novo o seu querido protector, S . Gabriel, que lhe

disse: «G em a. [aze dc boa vontade o voto dc entrar cm

religião, mas não lhe acrescentes nada*.

<Porque não lhe acrescentar nada?» pregunta ela.

n ão com preendendo o sentido destas palavras.

Por ún ica resposta ouviu estas duas palavras, acom ­

panhadas pelo San to dum terno olhar e dum delicioso

sorrjso: Sorella mia! M in h a irmã!

cEu nada compreendia de tudo aquilo, continua

G em a . Para lhe agradecer beijei-lhe o hábito. Despren­

deu então do seu peito o corafão (emblema dos Passio­

n is tas ). deu-mo a beijar, e coloccu-o sôbrc o meu. por

cima dos lençóis, dizendo de novo: Sorella mia! E desa­

pareceu» (1 ).

N a m anhã seguinte a santa jovem, recebia Jesus

(3) O Santo queria significar â donzela que formu!asse sir.-

plesrrente o voto dc entrar em rcÜgiSc, sem se ligar a nenhuma con-

çregaçSo. Em seguida dava-lhe ficiJmente a entender que seria

' religiosa passionista. pelo menos de espirito e coraçJo, Isto é, mlstl-

camente transformada em Jesus Crucificado.

S A N T A G E M A G A L G A N I

S acram en tado e pronunciava o seu voto, com a a lm a

‘ in u n d a d a das mais suaves delícias.

Estes íavores espirituais n ão im pediam o en fraque ­

c im ento progressivo de suas fõrças. O s médicos recorre­

ram , com o remédio extremo, à operação d o abcesso dos

rins e à ap licação de pontas.de fogo ao longo da esp inha

dorsa l. E ra a 4 de Janeiro de 1899. A san ta m enina que

antes de tudo sc preocupava sempre com a g uarda do

seu pudo r, n ão sc deixou cloroform izar. Suportou hero i­

cam ente o suplicio, a liás inú til, porque, con tinuando o

m al com os seus estragos, a 28 do mesmo mês lhe apa-

rcccu um tum or na cabeça que causava A pobre cnfêrn ia

dores horrorosas.

O médico, cham ado a tôda a pressa, limitou-se a

verificar a grav idade do perigo. À fraqueza de G em a

n ão perm itia ata lhá- lo com uma operação c irúrg ica .

O u tro s médicos igualm ente declararam o caso desespe­

rado . «.A 2 dc Fevereiro. escreve G em a. confessei-me.

recebi o Sagrado Viático, c esperei o momento de ir para

Jesus. Os médicos, julgando que eu não ouvia, disseram

entre si que não chegaria à meia-noite».

A-pcsar-de tudo . Gem a não dev ia morrer a inda .

E s tava r.os desígnios do Senhor glorificar-se nela pela

e fusão dos mais extraordinários dons sobrenaturais.

A cura exigia um m ilagre; mas D eus fè-!o e d o m odo

m u ito s ingu lar que Gem a nos vai descrever.

«.A minha família, d iz e la, fazia triduos e novenas

pela minha cura. Só eu. confortada pelas doces e fernas

palavras que ouvia da própria bôea de Jesus, esfat>a indi­

ferente. Uma das minhas antiga^ mestras veiu visitar-me

pela última vez. para me dizer adeus até nos vermos no

C A P Í T U L O V «

céu. Insistiu comigo para qtfe c a mesmo fizesse uma

novena à Beata M argarida M aria A lcoque. asseguran-

do-me que obteria a graça duma cora perfeita o a dama

pronta morte que me abriria o céu. Para lhe fazer a von­

tade comecei-a: era a 18 de Fevereiro de 18S9.

/.ui j — Igreja co S. Frcdiano o rde a Sa^Ja ft: a pt-.r-.e-.ta comu-

nh&o a 17 de JurJio dc IS57

Aro dia seguinte, porém, esqueci-me. Comecei de

novo r.o d ia 20. mas de novo a esqueci. Q u e atenção na

reza, meu Padre!

Comecei pela terceira vez no dia 23. A lguns momen­

tos antes da meia-noite senti o mover dum tèrço, senti

uma mão pousar-se-me sôbre a fronte e uma voz começar

nore rezes a seguir um Pater. Ave. G lória . Respondia

com dificuldade, tão fraca eu esfa^a. Esta voz disse-me

cm seguida: Queres sarar? Invoca com fervor tôdas as

noites o Sagrado Coração de Jesus. Virei ter contigo

todos os dias da novena c oraremos juntamente.

Era o Venerável Gabriel, Passionista, que de-facto

voltou tôdas as noites. Colocava-me sempre a mão sôbre

a fronte e recitávamos as preces ao Sagrado Coração de

Jesus: fazia-me acrescentar três Glórias em honra da

Beata Margarida Maria.

A novena terminou na primeira sexta-feira do mês.

Confessei-me e. de manha cedo. recebi a S ag rad a Comu­

nhão. Oh! que momentos deliciosos passei com Jesus1...

Repetia-me: Gema. queres sarar? Eu. de comoção. não

podia responder. No intimo do meu coração disse: Jesus,

como quiserdes. Como Jesus e bom! a graça estava con-

ccdida. eu estava curada (1 ).

Ainda não se tinham passado duas horas depois da.

Comunhão e eu jà de pé. A minha familia chorava de

alegria. Eu também estava contente. não por ter recupe­

rado a saúde, mas porque Jesus me tinha escolhido para

sua filha.

Com efeito, antes de me deixar, nessa manhã.

tinha-me dito ao coração com uma voz penetrante: M i­

nha filha depois da graça que acabas de receber, seguir-

-me-ás com mais ardor ainda. Estarei sempre contigo.

(t) Dois diaj antes deita cura miraculosa tem Geaa uma

cotáve! apariçAo da SaotSjsima Virgem, presenciada também por

Leilcia BeriucceHl. O relato desta aparição feito pela testemunha

ocuiar encontrá-lo-á o leitor maJs adiante, quAsl no fim desta bio­

grafia. (N<Xa do Revisor).

servir^te-ei de pai. c tua mãi, ei-la (mostrava-me a Vir­

gem das Doces)* ( I ) .

A minha assistência paternal não pede [altar àquele

que sc abandona nas minhas mãos; por isso nada te [al-

tará. mesmo quando eu te tirar tôda a consolação e todo

o apoio sôbre a terra».

Fe liz perda! ditoso ganho ! S im . feliz perda de tôdas

as alegrias hum anas, quando é compensada pelo ganho

e pela posse de Jesus! A seqüência desta b iografia vai-

-nos d a r um a prova palpáve l desta afirmação.

(1) O Salvador mostrava « n a estatueta de Nossa Senhora

das Dores, colocada era frente da cabeceira da doeate. Geca tinha-a

recebido de sua mâi moribunda, particularidade que lha tornava

duplamente querida. Gostava de fitar nela muitas vtxei o olhar,

mesmo durante n noite, para se cocdoer das IntfiveLs dorea de rua

M ii Celeste e oferecer-lhe o coraçOo.

C A P í (T U ' L O V I

Sonhos dc v id a c la u s tra !— E xerc idos

espirituais no conven to da V is ita ç ão

M ir ç o - M t io 1800

c u r a de Gem a foi instantânea e perfeita. Logo

que saiu do le ito de dor em que sua alm a se

tinha purificado, como o oiro no crisol, e

abrasado por completo co am or divino, a angélica me­

nina apressou-se a retomar tôdas as práticas de piedade,

principalmente a da com unhão quotid iana. «Nessa oca-

sião. d iz ela. eu não podia viver sc não [ósse a Jesus

tôdas as manhãs>.

Sentia-se devorada por um a fopie intensa da E uca ­

ristia. feme que de m odo a lgum tinbam pod ido m itigar,

durante a sua doença de mais de doze meses, a lgum as

comunhões, concedidas dc longe em longe. Ê no B a n ­

quete sagrado que ela verá realizada a promessa d o

Senhor; «Nada te faltará, mesmo quando eu te tirar

tôda a consolação e ío<fo o apoio sôbre a ferra >. Jesus

Sacramentado suprir-lhe-á tudo .

A penas curada. G em a, que h á muitos anos suspJ- ..

r ã v à p d a v ida claustra], m anifestou & fam ília a in tenção

70 S A N T A G E M A G A L G A N l

de executar o seu projecto e o seu voto. N inguém pensou -

nesse momento cm contrariar um a vocação, a todos tão

m anifesta, tanto mais que não supunham próxima a sua

realização. A serva de Deus, porém , tencionava voar

sem demora para a solidão dum claustro silencioso

a-fim-de a í viver só com Jesus.

D iversas circunstâncias dos -últimos tempos da

doença podiam deixá-la indecisa sõbre a escolha dum a

congregação. Sob a inspiração das irmãs Barbantiaas,

tinha prometido à V irgem Santíssim a, no caso de cura.

entrar para o seu instituto. Por outro lado o Beato G a ­

briel. na aparição já relatada tinha-lhe várias vezes

cham ado irmã, co!ocando-lhe sôbre o peito o emblema

dos Passionistas.

Em fim . uma voz misteriosa parecia tê-la convidado

a tomar o véu na V is itação . G em a inclinava-se mais

para esta últim a O rdem , levada sem dúv ida pelo re­

conhecimento para com a Beata M arg a r id a M aria ( l ) .

cu ja intercessão lhe tinha ob tido a saúde. Seis dias

depois d a sua prodigiosa cura, escrevia: «E u queria voar

quanto antes para onde me quere, a Bem-aventurada

Margarida Maria. O h i como se está mal no mundo!

Desde que deixei o meu leito de enfêrma. sinto uma

inexprimível aversão ao que passa».

Entretanto a noticia da cura espalhava-se pela ci­

dade de Luca. não sem suscitar numerosos comentários.

À s V is itand inas manifestaram desejo de ver a donzela

(l ) Curiosa coLnddénda: os cntSo Beatos t hoje Santos

Gabriel e Margarida Maria vieram a ser canonizado* amboa co

cie^-no dia. p o r Bento X V , a 13 de Maio de 1920.’ (Nota do Revisor).

para ouvir dc Sua própria bóca as particularidades deste

acontecimento. N ão se podia recusar-lhes um a tão legi­

tima satisfação.

A m iraculada foi acolh ida cora alvorôço no mos­

teiro. e as religiosas, na persuasão de a possuírem um

dia definitivamente, m anifestaram todo o seu júbilo . Êste

d ia esperava Gem a certamente vê-lo alvorecer desde

aquele momento da sua cura. em que um a voz celeste

lhe tinha feito ouvir estas palavras: c/?eno:*a a Jesus

tôdas as tuas promessas. e acrescenta que. no mês con?

sagrado ao Seu C ora fáo , irás também consagrar-te

a £U»-

À piedosa m enina tinha interpretado estas palavras

como um chamamento à V is itação , c. r.o Impaciente

desejo de corresponder, esmorecia por ver ainda afas­

tado éste momento. tHoje. escrevia ela, esfamos a 9 de

M arço ; como esperar até ao dia de Junho?» Para

suavizar o seu tormento, as Vvsitandinas prometeram

recebf-la como recolhida pelos princípios de M aio . e um

mês depois como postulante. Passaram-se trinta dias de

espera, durante os quais o Senhor cum ulou a sua serva

de inefáveis consolações.

Nesta época começa para .Gem a uma vida tôda

celesíe e a tal ponto extraordinária que pouco difere da

dos maiores santos.

A té aqui foi sem dúv ida favorecida por luzes inte­

lectuais, colóquios d iv inos, suaves impressões de alma,

aparições celestes, mas sômente por intervalos mais oú

menos longos. H o je abre-se a série das comunicações

div inas quási in interruptas e de ordem tnais elevada;

inspirações luminosas, sublimès atracções, poderosos

T2 S A N T A G E M A G A L G A N l>

O tiaw U flte s qoc r io ràp idam ente v ão conduzir a vir-

tsosM jovem « um a adm irável perfeição.-

£ lo t ia a a sua un ião com D eus . contempla-O sen

^^ fa le c im e n to . sem poder detcr-se em nenhuraa cria-

mt*. Pelo scu absoluto ab andono à Providência, pela

$xu inalterável conform idade com a V o n tade D iv ina ,

conserva a paz e a alegria n o m eio das m ais duras pro­

vas. Num a palavra. G em a n ão v ive senão para Deus.

para D e u i convergem todos os seus desejos, por Deus

clamam tôdas as pa lp itações do seu coração. N êle só se

deleita a sua a lm a e nêle repousa tranqü ila .

Entretanto a Sem ana San ta vínha-se aproxim ando.

G em a esperava-a com im paciência para expandir nesses

dias memoráveis 03 seus ternos sentimentos para com

Jesus C rucificado . A n tes de referir as graças im portan­

tes recebidas nesta g rande sem ana devemos falar da

Hera santa, posta em p rá tica pela san ta donzela, pois foi

durante èste piedoso exerc ido que nela se realizaram ,

nos últimos anos d a sua v ida , os m a is adm iráveis pro­

dígios do am or d iv ino .

Esta piedosa prática de so lidariedade com o D iv ino

Padecente tir.ha-lhe sido sugerida e explicada durante

a doença pela irm ã JúÜa, um a das suas an tigas mestras

do Institu to G uerra , com o fira de fortificar a sua

paciência.

Unir-se dum m odo especial ao d iv ino Redentor

cada quinta-feira, d ia cm que com eçou a dolorosíssima

Pa:xao, dev ia agradar imenso à fervorosa m enina que,

a ^ o obstante o enfraquecim ento ÍÍSico, quis abraçar sem

emera esta devoção. Ped iu o m anua l da Hora sanía.

te opúsculo , dev ido à fundadora d o Ins titu to de Santa

*

c A P 1 T U L : O V I 73

>

Z ita , H e lena G uerra , tem por titu lo : «Uma hera de

. oração com Jesus agonizante em Gethtsemani* t con­

tém quatro m editações m uito piedosas sõbre éste m is­

tério. seguidas de orações e ofertas.

Irutituto Guerra. cm Lxca. regido pç lã) írmÃs de Sanim Zita. onde

a SarJa foi educada

o n *» i n L* ík A U A L 7̂ / i /V /

D epo is de ter dado uma vista de olhos a estas p ág i­

nas , G e m a julgou-sc na posse dum tesoiro e fêz ao C o ra ­

ção de Jesus a promessa de jamais em sua v ida om itir

tão comovente devoção, se chegasse a sarar da sua

doença mortal. Recuperada a saúde m iraculosamente,

apressou-se a cumprir a sua palavra com a aprovação do

confessor. Era em Quinta-feira Santa.

C om o fim de se dispor melhor para o piedoso exer­

cício. a san ta fê-lo preceder dum a confissão geral. Esta

preparação tão séria revela o a lto conceito que o Senhor

lhe tin h a inspirado acerca dum a prática secretamente

ordenada por sua Providência com um fim m isericor­

dioso d c que trataremos em outro cap itu lo . O uçam os

Gem a descrever-nos as operações da graça nesta Quinta-

-íeira S an ta .

«Cor/iecei pela primeira vez a fazer a Hora santa

[ora do leito, segundo a minha promessa ao Sagrado

Coração. O arrependimento de meus pecados atingiu tal

intensidade que sofri um verdadeiro martírio. Em minha

dor imensa restava-me uma fôrça que era ao mesmo

tempo um alívio: a de chorar. Chorei. pois, e orei du­

rante tôda a hora: em seguida sentei-me. Á dor conti\

nuava. ,

Alguns instantes depois senti um grande recolhi­

mento e como que um enfraquecimento repentino de

minhas forças. Quási que não pude levantar-me para

fechar à chave a porta do quarto.

■ Onde me encontrei então? Em presença de Jesus

Crucificado, jorrando sangue de tôdas as partes. Üluitó

perturbada com esta aparição, baixei os olhos e fiz o

••nal da Cru:. A perturbação xucedeu dentro em pouco

C A P I T U L O V I 76

a tranqüilidade dc espirito (1 ); mas a doc dos meus

pecados tornava-se com isto cada vez mais viva. Não

me sentindo com coragem de. nem sequer por um ins­

tante. levantar os olhos para Jesus, prostrei-me com a

fronte em terra e fiquei muitas horas nesta posiçio. Vol­

tei a mim: as chagas de Jesus tinham-se gravado tanto

no meu espirito que não mais se apagaram».

A visão desapareceu. Gem a ardendo no amor dc

Jesus C rucificado , suspirou então pela alvorada dc

Sexta-feira S an ta para contemplar Suas inefáveis dores

c para se un ir às Suas trÍ3 horas dc agonia . Chegada,

porém , a hora dos Santos O fíc ios, a fam ília , por p ru ­

dência. recusou-lhe autorização de ir à igreja, com re­

ceio de que em ta l d ia a vivacidade da sua fé e a ternura

do seu am or lhe despedaçassem o coração.

G em a sentiu profundam ente esta contrariedade e os

seus olhos encheram-se de lágrimas. Dominou-se con­

tudo. pois nos declara: <Fiz resolutamente a Jesus éste

prim eiro sacrifício, c Jesus tão generoso para comigo

quis rccompcnsà-lo».

Para não perder o fruto do exercício que quisera

realirar na igreja, a nossa santa encerrou-se r.o quarto:

e a sós começou as três horas de oração. Q ue digo, a

sós? M a l se havia ajoelhado, vê aproximar-se o seu A n jo

(1) Bi* KQU.-MÍO os teólogo», a diíereaça entre as aparata

celestes e ai apaiiçôes diabólica»; ai primeirai a priccipio inipl-

ram temor e. logo depoli uma suave tranqüilidade, emquanto que ai

segundai para melhor se irulnuarem começam por uma fingida *«gu-

rança. para terminarem por uoa graode perturbação e vivo terror.

Nao i pois difícil ordinàriamente diitingulr umaj das outrai.

76 S A N T A G E M A G A L G A N l

da G u a rd a . O espirito celeste censura-lhe as lágrim as

que acaba d e derramar; dirige-lhe sábias advertências

sóbre a fõ rça de alma que Deus quere em face d o sacri-

fid o ; depois uniu-se ás suas orações e ajudou-a a fazer

com panh ia a Jesus padecente e ò V irgem D olorosa .

C om esta assistência Gem a recebeu em sua contem ­

p lação tão grandes graças que mais tarde poderá dizer

ao seu director: <Foi a primeira vez e a primeira sexta­

-feira em que Jesus se fê: sentir tão fortemente à minha

alma: e embora O não tivesse recebido das mãos do

sacerdote, porque era impossível (1 ), o próprio Jesus

reiu dar-se a mim (2). A nossa união foi tão intima que

fiquei confundida. Como era /mprew iona/ife a vo: de

Jesus».

Estes favores enchendo de consolação a a lm a da

santa donze la , enchiam-na também de confusão e dc

temor, tão ind ig na se ju lgava déles. Quereria , em sua

hum ildade , n ã o os deixar entrever a n inguém . P ara que

sc resolvesse a revelar ao seu próprio confessor a inter-

cecccora aparição dc Sexta-feira Santa , teve o A n jo ,d a

G ua rd a de a exortar muitas vezes e de a repreender até.

A vista do Redentor, todo coberto de sangue» tinha '

excitado no coração dc Gem a dois sentimentos: « O do

amor. nos d iz ia ela. do amor até ao sacrifício, e um vivo

desejo de sofrer alguma coisa por Aquéle que tanto tinha

sofrido por mim».

C om o conseqüência disto, que idea havia ela de ter?

Ern S«ta-fclra Santa n3o M dà a cotnunhSo boj fiéis,

talo X X V líf* <*Ut r"0t,° a Gema, ver-sc-á no capl-

C A P I T U L ò V I 77

% , ■*

Sem ser notada, vai ao poço da casa, desprende a

corda, dá-lhe muitos nós c, com ela assim , aperta a sua

carne.

M as . como chegar ao sonhado grau de amor de

D eus? A fervorosa m enina pregunta-o ao confessor, e

como a resposta lhe parecesse insuficiente, dirigiu-se

directamente ao Senhor. «Eu estava inquieta, escreve,

por não saber amar; Jesus, porém , em sua bondade infi­

nita. dignou-se Jescer até ao ponto de se tornar meu

mestre*.

E ra um dia de A b ril do ano de 1599. duran te a o ra ­

ção da noite. Sòzinha, no seu estreito quarto , a fervo­

rosa virgem tinha o pensamento e o coração abismados

no D iv ino Padecente, quando «efe-repenfe. continua ela.

me senti profundamente recolhida e me encontrei pela

segunda vez em presença de Jesus Crucificado. Mos­

trando-me as suas cinco chagas abertas, disse: Vè. mi­

nha filha, e aprende como se ama. Vês esta crui. estes

espinhos e estes cravos, estas carnes lividas, estas pisa­

duras. estas chagas? Tudo é obra do amer e do amor

infinito. Eis até que pon to te amei. Queres amar-me ver­

dadeiramente? APRENDE PR IM E IR O A SOFRER:

O SOFR IM EN TO ENSINA A AM AR*.

D ian te desta visão e ao ouv ir tais palavras, a terna

m enina experimentou uma dor tão intensa que. abando ­

n ada de suas fôrças, caiu desm aiada e ficou m uitas horas

estendida no chão. •

Predestinada menina, agora já sabes da própria

bóca do D iv ino Mestre como se am a. Prepara-te. agora,

para a dor que vai farer de ti um ardente serafim .

78 S A N T A G E M A G A L G A N I

Ia-se aproximando o primeiro de M a io . d ia fixado

a G em a pelas religiosas V is itand inas para o comèço

dura turno de exercícios espirituais no convento. A santa

donze la contava as horas que a separavam a inda desta

da ta tão ansiosamente esperada, que bem supunha devia

ser a do seu adeus definitivo ao m undo e a d a sua inteira

doação ao m uito A m ado Jesus. Por seu lado, o Salvador

con tinuava activamente na purificação desta alm a eleita,

com o fim de a preparar para um dom m ístico dos mais

raros.

C hegou emfim o primeiro de M a io . Pelas oito horas

da tarde. G em a dirigiu-se, transbordando de alegria, ao

santo asilo d a V is itação onde lhe pareceu, segundo a sua

expressão, estar no Paraíso. T in h a pro ib ido aos seus

que fõssern visitá-la durante os d ias do retiro, que deviam

ser. lhes disse, «todos para Jesus».

S igam os a fervorosa m enina nestes santos exercí­

cios de que há de conservar a mais preciosa lem­

brança. Dever-lhes-á a ú ltim a preparação para a graça

ex traord inária que va i ser o assunto do cap itu lo se­

guinte .

Recebendo-a cm seu mosteiro, as V is itand inas não

tinham sòm ente a intenção, como já dissemos, de a con­

servar a lguns dias; estavam na esperança de a adquirir,

porque , n ão obstante a sua pobreza e privação bem

conhecidas. Gema, por suas grandes virtudes, constituía

um verdade iro tesouro. Fo i dec id ido também , de acôrdo

com o seu confessor, que n ão faria os exercícios espiri­

tuais em particular, como um a pessoa estranha, mas

seguiria em tudo o horário da com unidade . Tom aria

parte no oficio do côro, na m ed itação comum , nas re-

C A P I T U L O V I 79

I *

feições e nos outros exercícios da regra, como uma ver­

dadeira noviça. ’

• A hum ilde virgenzinha preferiria permanecer soli^

tária e passar despercebida, mas. sabendo que a obe­

diência e a abnegação da vontade própria agradam mais

ao Senhor, abandonou-se coafiadam ente à direcção" da

mestra de noviças, como se fôsse um a delas. C on fir­

madas como estavam em sua grande estima a esta me­

n ina por M g r. V o lp i. seu confessor e grande protector

do mosteiro, as V is itand inas intentavam assim exami­

ná-la de perto e ao mesmo tempo proporcionar às Jovens

recolhidas um grande proveito espiritual pela edificação

de seus bons exemplos.

Prevenidas em seu favor, noviças e professas puse-

ram-se a cercar de atenções a recém-chegada. Sobretudo

a Superiora prodigalizava-lhe sinais particulares dé

afecto. N o refeitório queria que estivesse a seu lado. no

lugar de honra. Sua ategria era faiar muitas vezes com

ela de coisas divinas, durante o recreio da tarde. ou no

seu quarto, durante os momentos que a fervorosa exer-

citante não passava no cõro. a sós com Deus.

A s luzes e comunicações celestes recebidas nestes

santos dias. Gem a no-las deixa entrever por estas pa la ­

vras: € Jesus, sem olhar para a minha miséria, trazia-mt

as suas consolações c fazia-se sentir cada vez mais

à minha alma». Isto quere dizer, para quem conhece

a sua linguagem , que o céu se derramava em sua

alma para a excitar ao bem e arrebatar todos os seus

afectos.

• Gem a sentia-se realmente feliz no convento da V i ­

sitação.- Entretanto não se encontrava no seu verdadeiro

elem ento. A regra parecia m uito pouco severa ao seu

fervor. Para o seu desejo de oferecer a Jesus grandes

penitências, êsie género de v ida parecia-lhe demasiado

suave, e o próprio D iv in o M estre lho teria dado a eoten-

dcr. «Muitas vezes... conta ela, Jesus me disse interior-

nente: Minha filha, quero para ti uma regra mais aus­

tera».

M as. enifim, ela ficaria de boa vontade no mosteiro:

só a atemorizava a idea de v jr a deixá-lo para de novo

se recolher à sua fam ília . E por isso não cessava de pedir

ao seu confessor lhe obtivesse da au toridade eclesiástica

perm issão para ali ficar defin itivam ente.

Foram ter com o Arcebispo. O santo prelado — era

M onsenhor G h ila rd i — já tinha ouv ido fa la r de Gem a:

e tinham-lha representado como um a pessoa de saúde

delicada, a-pesar-do m ilagre da sua cura. e de consti­

tu ição fraca, trazendo além disso a inda o espartilho de

ferro imposto pelos médicos no princip io da doença, para

suspende: o desvio vertebral. Nestas condições houve

po : bem o prudente A rcebispo recusar a autorização

pedida.

A esta noticia, a Superiora, v ivam ente desejosa de

suprim ir todo o obstáculo, ordenou à jovem que deixasse

o espartilho de ferro. G em a n ão se fêz rogad3. N o

mesmo instante se despo jou do m a lfadado aparelho e

nunca mais o retomou, sem que tivesse por form3 algum a

sentido a falta dèle..

T udo. porém, foi inútil.

O Arcebispo, insp irado certamente por Deus, pec-

t in e c e u inflexível e proib iu que adm itissem a aspirante

â o noviciado no més de Junho , ío m o estava projectado.

» ' • . .

A tssüaá dc Ar.é «S.* dz3 Dcrcs quc s Sir.:* rcccbcra dc svâ m ii moribnrdj c «I tmhj gcdrdc afciç&c.

«Ah! r::nha quer.ca M<m3. hei-dc a.xa/-Vos sc.T.prc. scir.pro.

%

A u to r izou som ente a conservassem no mosteiro até vinte

de M a io , para lhe dar a alegria de assistir à profissão

dc a lgum as nov iças, fixada para esta da ta .

•N ão com un icaram logo a G em a a decisão arquie-

p iscopal. N a m a n h ã do d ia vinte de M a io e durante a

cerim ón ia da p ro ­

fissão, com que

tam bém ela espe­

rava ser mais tarde

benefic iada , viram-

-na tôda rad ian te

de alegria.’ «Jesus.

d iz ela. errferaeceu

o meti coração mais

que de costume»;

sem dúv id a com o

fim de a preparar

para a partida im i­

nente. E stava num

l u g a r i s o l a d o ,

absorv ida em d o ­

ce contem plação .

«.Chorei, chorei muito», acrescenta: lágrim as de amor e

de celestial a legria .

Conta-se que neste d ia , cm quanto tôda a com un i­

d ade festejava as novas professas. G em a. ficara era o ra ­

ção tôda a m a n h ã na capela, sem que ninguém tivesse

no tado a sua ausênc ia ao alm ôço nem ao jan tar. E ela

em sua u n ião ín t im a com D eus. a inda menos tinha pen ­

sado nisso.

M as depo is d o meio-dia a fraqueza natural traiu-a.

e

O Sr. Henrique Gatgártí, pai dc Santa Ccmã •

62 S A N T A C E M A G A L G A N I*

Logo que as religiosas conheceram a causa d a . ind ispo ­

sição, apressaram-se a conduzi-la ao refeitório.

Êste incóm odo porém nada era, em com paração

do que ia experimentar essa mesma (arde: ter que sair

d o mosteiro e vo ltar para a sua fam ília . Fo i extrema a

dor da nossa santa e só a póde suavizar a sua heróica

subm issão às disposições da Providência. «F o i ás cinco

horas da manhã, no dia 21 dc Maio de 1899, que tive

dc partir, escreveu ela; pedi. chorando, a benção à Supe­

riora. saüdci as religiosas e saí. Meu Deus, que dor!*

A pobre m enina entrou consternadíssima em sua

casa, a qual tão d iferente lhe pareceu do convento que

ju lgou não poder viver nela. C om o eram diferentes as

ocupações, as pessoas, as conversas. T odav ia , para cum ­

prir a vontade de D eus. acomodou-se e entregou-se aos

cuidados domésticos com o ardor dc antes. V ia por outro

lado que estes cu idados não lhe desviavam a atenção

das coisas celestes, as únicas que apaixonavam o seu

coração.

A ba fando na a lm a as suas tristezas e a sua dor.

aspirava ao cum prim ento perfeito dos seus deveres para

com as tias e os irm ãozinhos. Conservava-se inteiramente

ao seu serviço, e com o exemplo animava-os à paciência

no ne io da penúria sempre crescente da sua tão p ro ­

vada fam ília .

Entre as piedosas práticas da santa donzela nesta

época, conta-se a que vamos descrever.

Sabemos quão ternamente am ava seu pai. a quem

«n-.pre ccrcora de atenções filiais até ao ú ltim o suspiro.

tpois da sua morte, êste afectcv traduziu-se por contí­

nuos sufrágios pelo repouso de sua a lm a. D uran te a

C A P I T U L O V I S3

< i

estada em casa da tia de Cam alore . la m uitas-vezes;

acom panhada de sua prim a, à igreja da A b ad ia , como

que em devota rom agem , para lá recomendar à V irgem

Santíssim a a alm a de seu pai. D c vo lta a Luca , n ão dei­

xou passar nenhum d ia de festa sem ix ao cemitério

com sua irm ã Jú lia orar sôbre as campas de seus queridos

pais.

E agora,, de volta do convento da V is itação . Gem a

retoma com mais fervor a mesma prática de piedade

filial. D epo is de ouv ir missa e de receber o P ão E u ­

carístico, dirige-se com a sua querida com panheira

para o cem itério, s ituado fora da c idade . A í perm a­

necem am bas até ao meio-dia, hora a que se fecham as

portas.

E n tre tan to a sua piedade não está a inda satisfeita,

e esperam fora a reabertura do cemitério, silenciosas,

recolhidas e sem se importarem nem com chuva nem com

frio ou calor.

U m dia um a v izinha pobre v iu do seu casebre as

duas m eninas expostas no cam inho público às in tem pé­

ries da estação. Convidou-as a abrigarem-se. e sabendo

que estavam em je jum , ofereceu-lhes uma pequena refei­

ção . V e n d o de perto as duas irm ãs, não tardou a ganhar-

-Ihes a fe ição e arrancou-lhes a promessa de virem sem­

pre repousar em sua hum ilde choupana . •

Depo is d isto aconteceu muitas vezes às piedosas

meninas encontrarem ausente a caridosa hospedeira;

m uito tím idas para irem bater a outra porta , ficavam

sem alim ento até ao fim do dia. E quando se retiravam

não iam a inda directamente para casa. O u v in d o os sinos

da cidade cham ar os fiéis às cerimónias da tarde. deti-

S4 ; S A N T A G E M A G A L G A N I\

nhaa-sc na lgum a igreja para assistirem à bênção do

Santíssimo Sacramento. . .

Assim acabavam de santificar o d ia estes dois an jos,

depois de terem dado uma inte ira satisfação aos seus

sentimentos de piedade filial.*

Despedindo Gem a, a 21 de M a io déste ano , as Visi-

tandinas n ão lhe tinham tirado tôd a a esperança de a

tornar a receber, quando as d ificu ldades que sobrevieram

fóssem ap lanadas . A santa por sua v iz , embora não

encontrasse o seu ideal neste convento, a êle vo ltaria de

boa vontade, a inda que fósse sòm ente para fug ir à vida

secular.

A consagração ao Sagrado C oração , de que o Se­

nhor lhe tinha fa lado no m om ento da sua cura m ira ­

culosa. interpretara-a ela no sentido de consagração

religiosa num mosteiro da V is itação . A f in a l era simples­

mente um meio de apressar a sua tota l transform ação

cm Deus pela dor e pelo amor. G em a . porém , tom ando

á letra as palavras do Salvador, suspirava a inda e sus­

pirava ardentemente, pôsto que com resignação, pela

vida claiistral e renovava sem se cansar o ped ido de

adm issão ao noviciado.

Entre tanto as dificuldades longe de desaparecer,

iam-se m ultip licando. Exig iam agora certificados do m é­

dico e não sei que outros atestados difíceis de obter.

A lém disso, como todo o seu dote consistia única-

mente na sua grande virtude e em seus modestos vestuá­

rio*. as V isitandinas, como no princ ip io não tivessem

txJo lito em consideração, ju lg a r ^ n encontrar agora

co n o tem po e com novas reflexões, um obstáculo insu­

perável.

A santa m enina de-pressa com preendeu a hesitação

dessas boas religiosas» m as sem se perturbar. C om a sua

confiança hab itua l voltou-se de novo para o Senhor, que

lhe deu claramente a entender desta vez que a m isteriosa

consagração n ão d iz ia respeito à v id a religiosa, pelo

menos na ordem da V is itação . G em a deixou im ediata­

mente de instar e esperou no seio de sua fam ilia , com

resignação e calma, que se manifestasse m elhor a von ­

tade do céu acêrca do seu futuro .

r .> • >• , «-* ■» • < •• • . :> J *•

P rod íg io s de cstigm atixaçáo

— 8 ác JunKo i c tS^J’—

EPRODUZIR em sua pessoa um a perfeita im agem

de Jesus, ta l era a suprema asp iração de

G em a ; e como o F ilh o de Deus para resgatar

as nossas a lm as e ganhar m ais eficazmente os nossos

corações apareceu no m undo, sob a form a d a dor, sua

fiel serva n ão queria conhecer senão a Jesus C ruc ificado .

O s m istérios das grandezas d iv inas pareciam p reo ­

cupar pouco o seu espírito. < A h l o meu Bem-Amado.

d iz ia e!a com a Espôsa dos Cantares, i para m im

um feixe de m irra: não quero considerar nêle outra

coisa, porque fo i a parfe que escolheu. V i quem quiser

contemplà-lO no Tabor. eu fico no Calvário, em com*

panhia de m inha querida M ã i das Dores*. G em a n ão

queria outras im agens de devoção além das que repre­

sentavam a Jesus sofrendo por nós.

P equen ina a inda , ouvia-se d izer muitas vezes a sua

piedosa m ã i: « M a m ã , falai-me da PaixSo de Jesus*: e

às mestras d o institu to G u e rra : tlrm ãs . cxplical-me

___ . . _ ------ -- - - - W « I 4* u n *1 Ir

a lgum ponto dos mistérios dolorosos de Jesus*. E bem sc

recordam das que era preciso ter um a grande prudência

n a satisfação dêstes.santos desejos, com receio dc que a

v iv a emoção, sempre provocada nesta a lm a terna pela

n arra tiv a dos sofrimentos de seu Bem -Am ado Jesus, lhe

causasse qualquer perturbação de saúde.

T a is princípios, longe de se desmentirem , pela v ida

ad ian te , de-pressa foram seguidos de adm iráveis prod í­

g ios. que vieram revelar dum m odo evidente e coroar,

a com ple ta transform ação dc G em a e n Jesus C ru c i­

ficado.

V im os como o Salvador, a-fim-de in flam ar a devo­

ção dc sua serva para com sua do lorosa Paixão, lhe

aparecia a lgum as veres todo coberto de sangue e pela

v is ta surpreendente das suas chagas abertas a estimulava

a arná- lO e a sofrer por Êle.

Essas visões sobrenaturais e ine fáve is entrevistas

d ispostas com um a providência m u ito particular, iam

p reparando gradualm ente a sua a lm a para o dom in a ­

preciável que lhe reservava o S ag rado Coração.

Depo is de ter saido do convento da V is itação .

G em a ouviu uma voz misteriosa dizer-lhe com fòrça ao

o uv id o : «V am os, íom a coragem; esquece tôdas as cria-

turas: abandona-te sem reserva a D eus. A m a-0 muito,

não oponhas nenhum obstáculo aos seus desígnios, e

verás o caminho que em pouco fem po fe fará percorrer,

sem tu mesmo o notares. A fasta todo o temor; o Coração

de Jesus é o trono da misericórdia, em que ós miseráveis

são os mais bem acolhidos».

Reconfortada por estas palavras, a santa, voltan-

do- jc para uma imagem do Sagrado C oração , exclama:

■ C A P I T U L O ' . ‘ V 1 1 89• » . %

* * . * l *

< ó meu Jesus, queria amar-Vos. muito. muito: mas

' r.ão sei*. . . • - .

c E a voz sobrenatura l continuou: «Q ue res amar

v sempre a Jesus? N S ó deixes um momenío de sofrer por

Êle. A cruz é o trono dos verdadeiros amantes; a cruz é.

nesta vida, o patrimônio dos escolhidos».

F inalm ente, um d ia ouviu depo is da San ta C om u ­

n h ão o próprio Jesus dizer-lhe: «G em a , coragem! espe-

ro-te no Calvário, sòbre esta montanha para a qual te

d irig i>.

Ê realmente para éste nobre pon to de reüniâo

que a Providência a tinha encam inhado pelas multíplices

provas da vida doméstica, pelas atrozes dores de sua

longa doença, e recentemente por um retiro de trés sema­

nas na V is itação , por um arrependim ento extraordinário

de suas faltas, por um a confissão geral acom panhada de

muitas lágrimas, pela recusa das mesmas V is itand inas

em a receber no noviciado, numa palavra , pelas graças

extraordinárias prod igalizadas à v irgenzinha dc Luca.

desde a sua cura prodig iosa até êste d ia . A go ra que sua

a lm a brilha com uma pureza ideal. Jesus convida-a ao

Calvário .

Cocxesponde. sim, ao seu convite, predestinada me­

n ina . e deixa-te transform ar em teu Espôso C rucificado.

A & de Junho de 1899. véspera da grande festa do

Sagrado Coração, a lguns momentos depois de com un­

gar, deu o Senhor a entender à sua priv ileg iada serva

que. nessa mesma tarde, um favor insigne lhe seria con­

cedido. Sem perda de tempo, corre a in fo rm ar disto o seu

confessor e pede-lhe m ais um a absolvição de suas faltas.

D epo is , com o espírito cheio de santos pensamentos, o

Coração a transbordar de paz e dum a alegria fora do

costume, entrou em casa. \ •

' r ’ • ' C A P. I. T U l O • V I 1 91.’

* ' ' -« A tarde, conta ela. fu i tomada subitamente, e mais' j

de-pressa que de costume, dum uivo arrependimento dos

meus pecados, mas dum arrependimento tão vivo que

não mais experimentei semelhante, julgando-me a ponto

de morrer.

<Pcuco depois, tódas as potências de m inha alma

entraram num misterioso recolhimento: a inteligência

somente via os meus pecados e o horror da ofensa de

Deus: a memória recordava-mos todos, assim com o os

tormentos suportados por Jesus para me salvar; a von­

tade detestava-os, prometendo sofrer tudo para os

expiar. O ndas de sentimentos se com prim iam no meu

coração: sentimentos de dor, de amor. de esperança, de

coragem , de temor.

<A éste recolhimento interior sucedeu cm breve a

perda dos sentidos, e encontrei-me cm presença dc minha

A íõ i celeste. T inha à sua direita o meu A n jo , que antes

dc tudo me ordenou que recitasse o acto de contrição.

« Q uando terminei, minha M â i d irig iu-me estas pa-

lavrat: «M in h a filha . Jesus quere fazer-te um a graça:

saberás tornar-te d ig na de la?»

*A minha miscria não sabia que responder.

«M ar ia continuou ; «Serei para ti um a n ã i ; mostrar-

-te-ás para com igo um a verdadeira f ilh a ?»

Estendendo então o manto cobriu-me com èle. N o

mesmo insíanfe apareceu Jesus: suas chagas estavam

abertas, mas n ão saia sangue: saiam chamas ardentes.

D e súbito estas chamas tocaram m inhas mãos. meus pés

e o meu coração. Senti-me morrer e ia a cair. quando

minha M ã i me sustentou, conservando-me sempre sob o

seu m anío . Fiquei muitas horas nesta posição: cm se-

/-VI X J C M A ' . G T I X G Í 7 Í 7

< .

gu ida m inha A /át beijou-mc na fron te ,'e tudo dcsapa-

receu. Encontrei-me ajoelhada no meu quarto.

* U m a forte dor persistia nas mãos, nos pés. no

coração, e notei, ao levantar-me. que destes lugares

corria sangue. Cobri o melhor possível as partes do lo­

rosas: depois, a judada pelo meu A n jo , pude subir para

0 leito*.

Assim adornada com as jó ias d iv inas dos d iv inos

estigmas. G e m a tomava lugar jun to da c ru : entre as

mais belas e elevadas a lm as, ao lado de S . Francisco de

Assis, de S an ta C atarina de Sena, de S an ta V erón ica

G iu lia n i, igualm ente favorecidos com éste dom . Podia

ap licar a si estas palavras de S . P au lo : «N inguém me

seja molesto, porque trago cm meu corpo os estigmas do

meu Senhor Jesus» (1 ).

Q u a n d o o Seráfico Patriarca de Assis, recebeu a

impressão dos sagrados estigmas, sentiu-se com pleta­

mente transform ado em D eus pelo am or, mas o seu em ­

baraço r.ão foi pequeno ao lembrar-se que n ão poderia

ocultar aos o lhos profanos estas chagas misteriosas. Por

conselho de seus discípulos do A lverne (2 ). o Santo

'resolveu dissimulá-las o m elhor possível.

Poderia G em a tom ar semelhante atitude , ela que

ivivia. não sôbre um monte solitário , mas no meio do

m undo e cercada de pessoas curiosas? N ã o pod ia pri-

1 _

t1) O prodígio da esttgraatízaç5o deu-se. na casa n.* 13 da

^ua BiscJooe onde Gema vivia eat3o com os seus.

(3) Moo te dos Aper.lr.os or.de S. Francisco recebeu o mira- Woso favor. '

c A P t T u L Ô V I I * 98/

. var-se dc ir à igre ja, de m anhã pàra a S an ta C om unhão

c de taede para a visita ao Santíssim o Sacram ento . O r a .

os seus estigmas derram avam .sangue em abundânc ia .*

Q u e deverá fazer? T ôd a a noite sc in terrogou a st

mesma sôbre èste ponto.

Q uand o , ao romper do d ia . sc quis levan tar, mal os

seus pés tocaram no chão, experimentou um a dor in to ­

lerável de que ju lgava morrer a cada instante.

C onsegu indo emfim ter-se de pé. a jovem calçou as

luvas para esconder as chagas das mãos c arrastou-se

atè à igreja.

D e voka a casa viu-se duplam ente perplexa: por

um lado não pod ia continuar a encobrir o prodig io. por

outro não conhecia a sua s ign ificação precisa, nem sabia

- se era fenóm eno raro. se freqüente entre as pessoas

piedosas.

Supondo que tôdas as alm as desposadas com Cristo

pelos votos de re lig ião recebiam estes sinais, foi pregun-

tar a uma c a outra, com um constrang im ento cheio dc

candura , se a lgum as vezes lhes r.ão tinham sobrevindo

feridas de tal e de ta l forma. N enhum a resposta a firm a­

tiva . O u nada compreendem do motivo de suas pregun-

tas ingénuas, ou se riem da sua s im plic idade. •

Entre tanto o sangue corria sempre por debaixo das

luvas e G em a decide-se a revelar o fenóm eno a um a de

suas tias. A presentando os braços estendidos e as mãos

cobertas pelo m antelcte , d iz : <M inha tia. vêde o que me

f è : Jesus*. A tais palavras e à vista das p rofundas im ­

pressões sangrentas, a boa senhora ficou estupefacta,

tã o longe estava de explicar, como mais tarde o fará . .

tão estranho m istério.

94 S A N T A G E M A G A L G A N I\

O leitor espera certamente por particu laridades

sóbre a natureza dos estigmas na serva de Deus, como é

que apareceram, como evolucionavam e por que tempo

permaneciam . É o que passo a expor, no tando antes de

tudo que êste fenóm eno místico, embora raro, não é novo

na vida dos Santos. .

E m diferentes séculos foi 'éle adm irado em m uitos

dos maiores vultos da Igre ja , a lguns dos quais, como os

já referidos, estão canonizados. Fo i verificado dum

modo particular no -último século por m ilhares de teste­

munhas na pessoa da virgem be lga , Luíza Lateau, a

quem exam inaram , sob o ponto de vista fisiológico, sá­

bios médicos católicos e racionalistas e, sob o ponto de

vista teológico, doutores igualm ente d istintos por sisa

ciência e virtude, que publicaram sóbre éste caso parti­

cular volumes inteiros.

N a virgem de Luca a estigm atização. depois de se

ter m anifestado a primeira vez pelo modo que acabamos

de ler. reproduziu-se. duran te dois anos, tõdas as sem a­

nas. em dia e hora fixos, isto é. na quinta-feira pelas oito

horps da noite, para desaparecer na sexta às três horas

depois do meio-dia.

Exceptuando o recolhimento precursor do êxtase,

nenhum sintoma físico, nenhum a impressão dolorosa

anunciava a sua aproximação. M a s de-repente. com o

êxtase, via-se aparecer r.as costas das mãos e no centro

das palm as uma mancha vermelha; progressivamente

abria-se sob a epiderme e no vivo da carne um a fenda,

irregularm ente circular nas palma$ e ob longa na face

oposta. Em fim a epiderme rasgava-se, pondo a des­

coberto um a chaga viva duns bons dez m ilímetros de

largo por v in te de com prido na pa lm a, e sómente com

dois m ilímetros de largo nas costas da m ão.

Esta. fenda, a lgum as vez.es m uito superficial e

mesmo quás i invisível a õ lho nu , a ting ia de ord inário

uma grande profund idade , parecendo até atravessar tòda

a espessura da mão. que se diria trespassada de lado a

lado. D izem os parecendo até atravessar, porque, ver­

tendo as feridas sangue em parte coagu lado e fechan­

do-se logo que o sangue parava, seria preciso, para ter

a certeza, sondá- las'com aux ilio dum estilete médico, o

que nunca se ousou, pelo temor reverenciai que inspirava

a extática neste estado misterioso.

A lém disso a operação seria d ifíc il: as mãos intei-

riçavam-se convulsivam ente sob a opressão da dor, e a

abertura das chagas ficava coberta. na face palmar, por

um a protuberância que à primeira vista se ju lgaria ser

um a re iin ião de grum os de sangue, mas que na realidade

era carnuda e dura; levantava-se nos bordos, inteira­

mente livres, afectando a forma dum a cabeça de prego

de dois centímetros e meio de diâm etro.

O s estigmas dos pés, maiores e ceccados de côres

lívidas, apresentavam , ao contrário dos das mãos. no

peito do pé um d iâm etro maior do que na p lanta . A lém

disso, o d o pé esquerdo era tão largo na face superior,

como o do pé direito na p lan ta , o que é na tu ra l se os pés

do Redentor foram pregados à cruz por um só cravo,

tendo o d ire ito sobreposto ao esquerdo.

A lgum as vezes, em lugar de se forrqarem pouco a

pouco no espaço de cinco a seis m inutos, começando sob

a pele ou epiderme, as feridas abriam-se instantânea-

mente. com eçando d o exterior, como sob o im pulso vio-

S A N T A G E M A G A L G A N I

len to de cravos invisíveis. Era en tão um suplic io ver a

querida mártir, assim ferida de improviso, tremer de

dor em todos os músculos dos braços, das pernas, de

todo o corpo.

À abertura do lado raramente foi observada e por

poucas pessoas. N inguém ousava descobrir, para uma

simples satisfação de curiosidade, a sua carne virg inal.

F o i por isso que eu mesmo me privei da consolação de a

ver. M a s . a ju lgar pela agudeza do sofrim ento, que pene­

trava até ao mais intimo do coração, devia êle ating ir

tam bém esta viscera. Dem ais, sc o fim d o Senhor na

rea lização de tais prodígios é traçar em a lguns dos seus

servos privilegiados uma viva c perfeita im agem de Jesus

C ruc ificado , não há motivo para supor que a reprodução

n ão seja completa.

F azendo a autópsia dum a serva de D eus igualmente

estigm atizada, Joana da C ruz . os cirurgiões notaram ,

com espanto, qúe a ferida do lado atravessava o pulm ão

para a ting ir em cheio o coração. O mesmo teria sido

verificado em Gem a. se o prod íg io não tivesse cessado

por completo dois anos antes da sua morte.

N esta santa donzela, o estigma do lado apresentava

a form a dum crescente, com as extrem idades voltadas

para c im a. O seu comprimento em linha recta era de

seis centímetros: a largura, no meio. dc três milímetros:

e a curvatura igualava a dum arco do mesmo tamar.ho.

tendo um a flecha de meio centímetro.

A forma de crescente, nova entre os estigm atizados

conhecidos, causava-me espanto, em quanto n ão vim a

saber. pela leitura da vida da V eneráve l D iom ira A lle ­

gri. florcntina, do século' xvit, que esta serva de Deus

C A P t T U L Ò V J I 97

tinha recebido um estigma de aspecto idêntico, segundo

a declaração, certificada por juram ento , dos médicos

encarregados de a exam inar c de m uitas outras teste­

m unhas oculares.

Aó.icí.j efe Cem jíore. O exterior da igreja

U m a forma tão bem de fin ida , reaparecendo três

séculos depois, permite acreditar em um a conformação

correspondente do ferro da lança que atravessou o lado

d o Salvador.

Esta ferida produzia-se cm G em a . um a veres ins­

tantaneam ente e do exterior, como se fôsse aberta por

um a lançada, outras pouco a pouco e começando do in te­

rior. N o últim o caso viam-sc a p rinc ip io aparecer, era

núm ero sempre crescente, pequeninos orificics verme-

98 S A N T A G E M A G A L G A N I*

lhos ; depois a pele rasga'va-se, de ixando ver a chaga tão

im pressionante jà descrita.

O sangue corria em ta l ab undânc ia que os vestidos

in teriores ficavam ensopados. A hum ilde virgem esfor­

çava-se o mais possivel por encobri-lo: aplicava sôbre o

pe ito um pano dobrado m u itas vezes que lhe era preciso

renovar freqüentemente e que ela lavava em segredo.

T odav ia a fluênc ia do sangue n ão era contínua.

Recom eçava com intervalos, m ais ou menos longos,

d u ran te os quais a chaga secava a lgum as vezes, a ponto

d c . sendo lavada, parecer em via de cura . M as . como não

se tratava dum fenóm eno natu ra l, ao primeiro incêndio

<io fogo misterioso que se m an tinha n o interior, a ferida

inflamava-se de novo e o sangue corria em grande q uan ­

tidade .

E m muitas de suas cartas G e m a fala d a chaga do

la d o : «Esfa manhã. pelas dez horas, d iz ela. o meu cora­

ção batia, batia ... Sentia-me enfraquecer... A dor do

coração sucedeu urr.a dor muito forte cm todos os mem­

bros; mas o que precedia e ultrapassara tudo era a dor

dos meus pecados. Com o é intensa esta dor! Se aumen­

tasse não poderia sobreriver-lhe. como não poderia

sobreriver ao golpe violento que experimentei ( • ) •

O m eu pobre coração, não podendo por mais tempo per­

manecer fechado, começou a expelir sangue cm grande

abundância*. E num a ou tra carta ; « Jesus fêz-se sentir

m uito à minha alma. e não podendo o meu coração con­

ter-se. a chaga do lado abriu-se e deu sangue».

(1) Êste golpe violento é a invisível lançada que lhe abria

a chaga do lado.

C A P I T U L O V I I M€

N ã o sabemos quan tas vezes se produziu éste feflé-

raenò m arav ilhoso fora dos d ias habitua is , nem tamb^m

podemos precisar a q u an tid ad e de sangue que perdi* a

santa v itim a durante as v in te horas, pouco mais ou

menos, que duravam os estigm as. M as. segundo o testc '

m unho das pessoas que m ais sc aprox im avam dela. era

considerável.

U m a destas pessoas a firm ou , sob juram ento , qu* 0

fluxo de sangue d o lado chegava até à terra, se nãc se

lhe opusesse obstácu lo . A m esm a declaração foi feic* a

respeito do fluxo das m ãos e dos pés.

O sangue era v ivo. de cór bela e d a mesma r.3tu'

reza que o que sai dusr.a ferida recentemente ab« 'ta-

com o q u a l se parecia a in d a depois da sua completa dfe-

secação sôbre a pele. sôbre os vestidos ou sôbre o soalho-

•O m odo por que desapareciam os estigm as não cra

menos m aravilhoso que o da sua form ação.

D epo is d o êxtase de sexta-feira a fluência do 5l1n*

gue cessava de fin itivam ente , as fibras dos tecidos focc"

rados tornavam a soldar-se pouco a pouco, e no ^ ia

seguinte ou. o mais tardar, no dom ingo nenhum vesti9‘°

ficava destas p ro fundas feridas .1 cobertas já dum a

nova. semelhante à das outras partes contíguas. Apenas

um a m ancha esbranqu içada ind icava o lugar que tinhatri

ocupado e que ocupariam de novo. para se tornarei1 a

fechar sempre do m esm o m odo.

D o is anos depo is d o desaparecimento defin itivo ^ as

chagas, esta m ancha persistia e pôde ser observada à

vontade por ocasião d a morte de Gem a. sobretudo oos

pés. os quais , em quan to v iva . era muito d ific il desnü^ar

du ran te os êxtases.

100 S A N T A G E M A G A L G A N />

A ntes de seus directores, por d isposição manifesta—.»

mente insp irada, lhe proibirem sujeitar-se aos estigmas,

o fenóm eno renovava-se invariávelm ente tódas as sema­

nas. dc q u in ta para sexta-feira e nunca em outros dias.

a-pesar-da sua solenidade ou da form a extraordinária

dc certos êxtases da san ta donze la . D igam os já tudo:

houve apenas uma excepção que nos será referida mais

ad iante pelo P.* Pedro Pau lo , passionista. que foi oca­

s ião e testemunha dela.

O favor dos estigm as é evidentemente dos mais

raros. M as quem pode negar ao Senhor o direito de o

conceder a certas a lm as priv ileg iadas como foi, sem

d úv id a a lgum a , a virgem de Luca? O que se mostrasse

escanda lizado , sòmente por ouv ir fa la r nisto, daria prova

dum a com pleta ignorânc ia das leis da Prov idência na

santificação das alm as, e mesmo de fé pouco só lid a .'

C A P Í T U L O V I I I«

P rim e iro contacto cora os Padres Pa&sionistas

— D ific u ld ade s com que tropeça no seio da

sua fam ília — N a benem érita fam ília G ia n n in i

encontra um a segunda m5i — C on trad ições c

hum ilhações que suscita o exame ind iscre to

dos estigmas

— 1800-1000 —

DIVLSHA-SE quão seráfica teria sido a com unhão

de 9 de Junho, depois do m isterioso aconte­

cim ento da véspera. Pela prim eira ve r Gem a

apresentava-se ao Salvador com as m ãos e os pés dc

lado a lado atravessados como os seus, e o p róp r io lado

aberto por um a la rga ferida. Q u e sentim entos de g ra ­

tidão e dê am or! Q u e celestes doçuras a suavizarem a

dor dos estigmas! Q uan tas vezes neste feliz estado não

terá ela repetido com tòda a efusão .da sua a lm a : « O meu

Bem-Amado é para mim e eu sou para Êle. Estou verda­

deiramente crucificada com Jesus. V ivo. mas n ão sou eu.

c Jesus que vive em mim».

E ntre tan to a hum ilde virgem n ão tardou em experi­

m entar um a verdade ira perplexidade com a lem brança de

ter que dar conta d a operação d iv ina ao seu confessor,

a quem na véspera tinha av isado do seu pressentimento

sõbre a im inênc ia dum a graça extraord inária .

Reservada em extremo quando a necessidade a obri-

102 S A N T A G E M A G A L G A N I ,

>

gava a fa lar dc si, e além disso não se ab rindo senão

com um a grande repugnância , e rubor a té , como iria ela

desvendar um favor tão insólito , tão m isterioso? «Que

pensará o meu confessor, d iz ia a si mesma, ao ouvir a

narração dêste favor celeste, é/e que conhece perfeita­

mente quanto sou ind igna? E se chegasse a divulgar-se.

como todos me conhecem cheia de pecados, não me tor­

narei eu antes pedra de escândalo?» --

A estes sentimentos de hum ildade acrescia talvez,

para ag ravar a repugnância da santa, a fa lta de cora­

gem . ou uma tentação do demónio.

O facto é que o A n jo da G ua rda instou com ela

m u itas vezes para que se vencesse, e com vivas repreen­

sões. T o d o o mês dc Junho sc passou nesta perplexidade,

setn que Gema pudesse resolver-se a cum prir o seu

dever. M a s o m isericordioso Salvador veiu em seu auxi­

lio. encam inhando-a por sua adm irável prov idência na

v ia traçada por seus eternos desígnios.

Estava-se no ano dc 1899. Por ordem de Leão xiil.

dev iam prègar-se missões cm tôdas as c idades da Itália ,

para afervorar os fiéis por ocasião do jub ileu que come­

m orava o final do século x ix e o coméço d o século xx.

O s Padres Passionistas foram enviados pelos fins dc

Ju n h o à igreja catedral de Luca, onde os seus trabalhos

apostó licos produziram frutos extraordinários de sal­

vação .

G em a segui3 então num a outra ig re ja as pregações

d o mês d o Sagrado C oração .

N o coméço de Ju lho , m ovida por um im pu lso div ino,

correu aos exercícios da m issão na catedral. Q u a l não foi

a sua a legria ao reconhecer no háb ito dos m issionários o

ir.esmo que trazia em suas aparições S . G abrie l, seu que­

rido protector?! c<4 im pressão*/o i tal. d iz ela. que não

pode descrevec-se. A primeira vez que vi estes Padres,

senti-me possuida por èles dum afecto especial c não

perdi uma só das suas pregações* ( l ) .

N ão se estranhe que a jovem , cuja v ida inteira se

tinha passado cm Luca or.de cs Padres Passionistaa

v inham muitas vezes exercer o santo ministério, não

conhecesse a inda de vista nenhum dêles, tan to mais

que a poucos quilóm etros da cidade se eleva um dos

(1) P ijjíO r t iiía i assim se chamam os religiosos da Coagre-

çjçSo de Clérigos Descalços da Santíssima Cruz e Paixão de N . S.

Jesus Cristo, fundada em Itália por Sáo Paulo da Crus em 1735

e aprovada pelos Pontífices Bento xiv (1746). Clemente xtv (1769).

Pio vi (17/5> e P io v« ( 1S01). O r.ome é Justificado por u a 4.*

voto especial que fazem os seus membros de promover a devoçJo

e memória da PaixSo c Morte de Jesus Cristo. Tém por escudo,

pregado ao próprio hábito, ura coraçáo encimado por uma crus e

teado r.o centro, sôbre fundo negro, a legend» leni Xpi Pãszio. e na

parte Inferior trés cravos. O coraçSo é clrrur.dado per um ramo de

palma e cutro de oliveira entrelaçados.

A Congregação, em 2 séculos de existência, propagou-se por

quási todos os países do véiho e novo mundo. Em Espanha muitos

de seus filhos, nos calamitosos anos q u í acabam de decorrer, glo­

rificaram a Deus com um heróico raartirio. D u a s foram as vitimas

imoladas em 1934 duraate a RevoluçSo das Astúriaj e cérca de

30 os que em 1936. duraate o domfrJo do* comunistas ateus, de ran -

o sangue generoso e a vida por Jesus Cristo.

A perseguição religiosa, que á naçío vlricha trouxera o

advento da 2.* República, já antes obrigar» algvms dé«es benemé­

ritos relJgiosos a refugiarem-se em Portugal, oede actualmente

desenvolvem o seu zélo apostólico, por melo de missóes rurais,

depois dc fundarem entre nós duas residências, uma em Braga, outra

em Barrosetas. província do M inho. (Nota do Revisor 1.

104 S A N T A G E M A G A L G A 'V /

seus conventos, muito freqüentado pelos habitantes de

Luca. é que a v ida muito retirada da serva de Deus e

a sua singular m ortificação afastava-a de tõda a curio­

sidade, mesmo da mais inocente.

O uçám os a angélica Gem a continuar a narração do

seu primeiro encontro com os Passionistas:

«Estávamos no último dia du santa missão. Todo o

povo se encontrava reiinido na igreja para a comunhão

geral em que tomei parte, misturada com a multidão.

Jesus agradou-se do meu acto. porque se fêz sentir inten­

samente à minha alma e me fêz esta pregunta: G em a

agrada-te o h áb ito de que éste padre está vestido? E in­

dicava-me um Passionista próximo de mim.

«Nenhum a palavra me vinha par a responder a Je­

sus. O meu coração porém melhor que os lábios, falava

por meio das suas palpitações.

«G ostarias , continuou Jesus, de vestir tam bém èste

mesmo hábito?

«M eu D eus! exclamei...

* E acrescentou: Serás um a filha da m inha Pa ixáo

e um a filh a predilecta. U m dêsses será teu pai. V a i e

revela tudo».

Gem a tomou à letra estas palavras, susceptíveis

contudo dum a dup la interpretação; e a lembrança de

vestir um dia a libré da Paixão inundou sua alm a da

mais doce alegria. A o mesmo tempo, tôda a repugnância

era se abrir tinha desaparecido.

Para obedecer sem dem ora à ordem do Salvador

correu a lançar-se aos pés dum dos m issionários, o

P.* C ae tano do M en ino Jesus, e descobriu-lhe com in ­

teira liberdade os seus mais íntimos segredos. Depois

C A P t T l l L O V I 1 1 105

falou-lhe dos estigmas c da d ificu ldade que sentia em

os descobrir ao seu confessor.

M arav ilhado dc tais confidências, não menos que

da ingenuidade da confidente, o Padre animou-a e exor­

tou-a a conscrvar-se hum ilde e reconhecida pelos bene-

ficios divinos. M as. antes de se pronunciar sôbre a ori-

L u c a — j V / o s r c i r o d à s V i s i f n n d i r u 15 .

106 S A N T A G Ç t y A G A L G A N I

gem dos factos extraordinários subm etidos ao seu juízo,

declarou querer reflectir m aduramente.

Prometendo-lhe ayv^Ja de novo sôbre este assunto

logo que voltasse a L j j£ u .o prudente religioso impôs-

-lhe a ordem form al <^,ijcvelar tudo ao seu confessor

ord inário . ^ ,

H ã muito tempo que a pobre m enina, convencida de

ter sido chamada por Jesus à v ida religiosa entre as F i­

lhas de S . Paulo da C »uz. desejava fazer, por devoção

particu lar, voto dc po& eza, castidade e obediência. Ju l­

gou pois propicio o nttféknto de obter êste favor dum

m issionário passion ist^V ' -}-

O P.* Caetano coj&edeú-lho. m as por pouco tempo,

c com a condição de rif> renovar êsses votos sem o con­

sentimento do confesâw’ ord inário . Mostrou-se. porém,

pouco conde scenden te ^ respeito dos instrumentos de

penitência fabricados pclá jovem com o fim de macerar •

a carne. Proíbiu-lhoskeonvencido de que o confessor

o rd inário não teria pç& edido dc m odo diferente.

Com quc alegria « fe rv o ro sa m enina se não ligou a

primeira vez pelos trêJ^o toS Í E la mesmo no-lo vai dizer:

*«£fu tinha tido sempre gràndç desejo de os fazer; apro­

veitei a ocasião. O Padre fêz-mos pronunciar a cinco dc

Junho; deviam durar eié à solene festa de oito de Setem­

bro. F iquei muito co> (finfe;' foi mesmo uma das minhas

■maiores consolações>

. . Ju lgará talvez o'

franca com o seu con

.não .estava em condi ■

quemo-nos: •

M ons . V o lp i cxercia.um m in istério muito laborioso

tór.vque G e m a não foi bastante

if-ordinário. N a d a disso. G em a

e ag ir .d e ou tro modo. Expli-

C A P I T U L O V I I I 107

. > • .

cm condições difíceis. A lém dos multíplices cuidados do

seu cargo (1) c das absorventes obras dc zélo, tinha

recorrido à sua d irecção espiritual tal número dc almas

que lhe era impossível ocupar-se dc tôdas.

O seu confessionário , onde passava todos os dias

m uitas horas, via-sc literalmente ccrcado. Em bora não

repelisse nenhum penitente que lhe parecesse ter real

necessidade do seu m inistério, muitos todavia podiam

desejar mais tempo do que as circunstâncias permitiam

conceder-lhes.

Para almas, com o G em a, conduzidas pelos cam i­

nhos extraordinários d a graça d iv ina, esta pressa tem os

seus inconvenientes. A pobre menina sofria em silêncio.

M u itas vezes, na im possib ilidade dc sc aproximar de

M ons. V o lp i, pedia-lhe por escrito um a regra de conduta

a-propósito de a lgum a graça recebida ou dc qualquer

d ificu ldade: a resposta nunca era dada senão a seu

tempo no .confessionário, onde a necessidade de sc não

demorar, mal se conform ava com as suas precições.

É evidente que isto n ão bastava para a direcção desta

alma.

A lém disso, logo que voltou a Luca. o P.* Caetano,

dc acôrdo com a santa , resolveu cncarregar-sc élc mesmo

dc manifestar a M o ns . V o lp i as últim as operações da

graça, de que G em a fora favorecida.

O m issionário foi ter com Sua Ex.4 Rev.m\ seguido

logo depois por G em a que lhe abriu inteiramente o seu

coração.

(1) Mor.s. Volpi exercia entio as funções de coadjutor do

Arcebispo dc Luca.

S A N T A G E M A G A L G A N I< '

O Pre lado reccbcu-os a am bos com afab ilidade e

g rande benevolência. A provou a obra do confessor

ex traord inário ; mas a respeito dos estigm as, levado pela

responsabilidade que tinha d iante de D e u s e d iante dos

hom ens, com o confessor e como bispo, n ão ousou pro-

nundac-se sôbre a sua origem . «Q u e se dirá . pensava êle,

dum / acto tão insólito neste século incrédulo?»

P o ; um lado tem ia para a sua pen itente as conse­

qüências lastim osas sofridas por outras pessoas por

causa de sem elhantes factos extraord inários, em que n ão

se reconheceu depois a in tervenção d iv ina .

Por outro lado. perfeitamente convencido da c a n ­

du ra de G em a . da beleza de sua a lm a, da p ro fund idade

ce sua v irtude que nunca tinha s ido a tin g id a peio m enor

desfalecim ento, d o seu ardente am or dc Deus. c das

com piacências do Senhor para com ela, repugnava-lhe

supô-la v itim a da ilusão, dum a doença, ou da m alícia

de Satanás .

A-pesar-disso, n ão queria de m odo a lgum , sem p ro ­

vas convincentes, pronunciar-se a favor de qua lquer

in tervenção sobrenatural. S egundo o conselho do E sp i­

rito S an to : <Nolite ornni spiritid credere, omnia autem

probate», resolveu estudar m aduram en te o fenóm eno.

E n tre tan to , em v irtude de c ircunstâncias diversas c

por causa destas manifestações m ísticas, a v id a da don-

zcia no sc;'o da sua fam ília era das mais penosas, sobre­

tudo depois da partida de seu irm ão H e ito r para o ser­

viço n ::ita r , e de seu outro irm ão , G u id o , para a A m érica .

O b r ig a d a a sujeitar-se a ocupáções, pouco ou n ad a

era harm on ia com os seus gostos de v id a interior, sofria

C A P I T U L O V' / / / 109

>

por nao poder à sua vontade pcxmaccccr no quarto

a-fim- de se entregar à oração ou a um trabalho soli­

tário.

Aconteceu um a vez ter certa pessoa d a fam iüa . no

ardor dum a a ltercação , proferido palavras irreverentes

contra a M a je s tad e d iv in a . T an ta foi a do r de G em a

que o sangue transudou de todo o seu corpo , cc rrcndc

a té â terra. In ú t il lhe fo i procurar encobrir este facto

prod;gioso.

H av ia a lgum tem po já quc os seus. tendo obser­

v ad o r.ela coisas novas e misteriosas, p re g u n ta v a a entre

si com ccrta in qu ie tação : Q u c será isto? C ertos e itos,

v indos de fora tin ham con tr ibu ído para lhes desperta- a

atenção , sobre tudo na tia C avo lina , a quem a c ând id a

donze la revelara a im pressão dos estigmas.

U m a cena v io lenta seguiu o ú ltim o fenóm eno d o

suor de S3ngue.

D êm os a G em a a pa lav ra : «jEx .™ Senhor, escreveu

a seu confessor, quereis saber o que ontem me [êz i:ma

das minhas tias? Q u a n d o entrei no qvarto aprcximou-sc

de mim muito enco/eriracía c disse-me: <Esta noite n ã o

tens tua irm ã Ju lia para te defender.. M ostra-m e donde

saiu todo êsse sangue , scr.ão acabo contigo à fórça de

pancadas».

«Ca/ewne. E n tão agarrando-me com uma das m ãos

pelo pescoço, com a outra quis-me tirar os vestidos. N o

mesmo instante bateram à porta e retirou-se.

M as não tinha acabado a inda: à hora dc deitar vo l­

tou e disse-me quc era tempo de acabar com éstes f in g i­

mentos c que eu jà tinha espantado demais o povo. O uve .

continuou, se me n ã o dizes conde saiu ésse sangue.

110 S A N T A G E M A G A L G A N I(

nunca mais te deixo sair de casa sem com panh ia , e nunca

m ais te m ando a nenhum a p a r to .

<! m aginai a nunna a c r (1 ), A tais pa/auras pus-me

a cnorar, n áo sabendo que fazec. Em fim decidi-me a sa-

lisfazer minha tia. S ão as b lasfêm ias, respondi; q uando

ouço b lasfem ar vejo a Jesus sofrer m u ito c so fro com

É Ic; sofro no co ração e o sangue sai. Encão pareceu

sossegar um pouco e deixou-me tranqüila».

N ã o foi esta a única vez que a santa donze la teve

que sofrer por parte dos seus. que não com preend iam as

obras m aravilhosas da graça. N ã o podendo a ou tra sua

tia. a boa H e lena, de saúde delicada, acom panhá- la sem­

pre ã igreja, C avo lm a não queria deixá-la ir só.

U rna curiosidade indiscreta de a lguns membros da

fam ília v inha a afligi- la mais a inda.

Q u a n d o se retirava ao quarto , espiavam-na espe­

rando ver produzir-se nela a ígum facto ex traord inário .

Se a surpreend iam em êxtase, com unicavam entre si as

suas impressões, mais ou menos favoráveis, e corriam a

conv idar pessoas am igas para este desusado especcáculo.

A pobre m enina lamentava-se disto ao seu confes­

sor e mesmo a Jesus, dc quem tinha 'receb ido a recom en­

dação de subtra ir tudo a oihos profanos.

O D iv in o M estre ouv iu as queixas de sua fiel serva.

V iv ia então e vive a inda na c idade de Luca um a

dessas fam ílias patriarcais, para quem o temor de D eus

e as v irtudes cristãs constituem o princ ipa l tesouro. Com-

í 1) F.ra o rcccio cJe qut a tia nSo mais a autorizasse a Ir à

xr.issa c comungar.

C A P I T U L O V I I I 111

* i

põe-se de pai, m ãi. dum a irm ã e doze filhos* Seu nome

é tão querido a todos os seus concidadãos quanto é

grande a estima de que estão cercados. É a fam:I:a do

Senhor M ateus G ia n n in i. Semfeitora dos hum ildes íiihcs

de S . P au lo da C ru z , c ã hospitalidade aos que o exer-

cicio do m inistério apostólico obriga freqüentemente a

passar por I.uca.

A referida irm ã. Cecilia G iann in i. é senhora de

grande p iedade, totalmente dedicada a obras dc :c lo .

Som ente conhecia G em a de vista.

O P.* C ae tano talou-lhc nela loco que voltou a

Luca e. querendo cum prir a promessa de tornar a ver a

santa , pediu k boa senhora que a fõsse procurar. Esta .

desejando relacionar-se com uma alma tão privilegiada,

não se fêz rogada. De-pressa a descobriu; trouxc-3 para

sua casa e em breve se felicitou por ter encontrado um

tesouro.

A ausência da fam ília G iann in i. que tinha ido

durante èste mês de A gósto para a estância balnear de

V iaregg io , perm itiu-lhe convidar a santa donrela a vir

passar todos cs d ias algum as horas com ela. Dentro em

breve, pretextando a sua solidão, quis tê-la consigo tam ­

bém de noite.

A tendendo à bem reconhecida honradez da fam ilia,

perm itiram a Gem a satisfazê-la também neste ponte, a

princípio de tem pos a tempos, depois quási hab itua l­

mente. Fo i um a alegria para a santa rnenina.

N esta hab itação de santos, em que nada pertur­

bava a sua un ião com Deus, respirava eía um ar mais

puro; e ju n to dc D . Ceciüa. cuja caridade sólida e m ás ­

cula v irtude, a tinham impressionado, sua alm a dilata-

X

• •112 S A N T A G E M A G A L G A N I

va-sc à vontade, em quanto que o seu coração pressentia

nela um a segunda mãi.

P e r seu lado a excelente senhora, cada vez mais

encan tada com a rara bondade, sim plic idade in fan til, e

s in gu la r modéstia dc G em a, tinha por ela um vivo afecto.

Experim entou , logo no principio , um a certa perp lex idade

em face dos fenóm enos maravilhosos que se verificaram

r.esca sua am iga. Para melhor se inte irar cêles não dei­

xou um m om ento de o observar, ce a espiar, a té nos

m enores movimentos.

G em a , por certo rcca'.o natural, e não m enos pcc

h um ild ade , em pregava tôda a sua indústr ia pa ra os sub-

trair à in tu ição de sua bca am iga. Julgando-se p ro fu n ­

dam ente ind igna dos favores d iv inos, tem ia tornar-se

um ob jecto de escândalo para a sua protectora no dia

em que esta viesse a descobri-los.

O Senhor, porém , cueria manifestar, para g ló r ia sua

e bem das alm as, os dons da ycaça; e tôda a c ircuns­

pecção da sua serva de nada servia.

E is como ela conta ao confessor um a dessas c ir­

cunstâncias em que as suas precauções mais ponderadas

foram inúteis e que ela mesma cham a suas desventuras:

cO ntem Jesus /éz-me sofrer muito. Sue i sangue

tedo o d ia: não estava em minha casa. mas em casa de

D . Cecilia. Jesus recomenda-me continuamente que nada

deixe suspeitar: se eu fa lto a isso, castiga-me. Diz-me

repefiefas rezes que devo tec vergonha de me deixar ver.

sejã por quem fôr. porque a minha alm a está cheia de

imperfeições*. \

D . Cecília, para n ão contristar a serva de Deus,

n enhum a adm iração manifestava perante factos tão pro-

c A P ! T U L Q V I I I 113e

dig iosos. Qemdizia ao Senhor, redobrando de veneração

e de am or para com o sua hóspeda . <Vtc-a Jesus! d iz ia

D. C iz ilia Giannini o bondosa Scnhcra q-~c foi /t

2.' er.ji ria Santa •: confrJcnfc r ij sva i ’>da núilica

ela. temos cn; casa um anjo. Corr.o corresponder a tão

grande graça?*

Entre tan to , depois do P.* C ae tano , o P .e Pedro

Pauto, en tão provincial des P ass ion isus . e depois arce-

114 S A N T A G E M A G A L G A N I

i

b ispo de Cam erm o, M o n s . M oresch in i. teve ocasião dc

verificar, a 29 cie A gosto de 1899, n3 casa dos G iann in i,

o fenóm eno dos estigmas. C om o notei no cap itu lo sétimo,

fo i a ún ica vez que a estig m atiz ação. se p roduz iu fora dos

c ia s habitua is da qu in ta e scxt3-fei'ra.

C edam os a pa lavra à em inente te s tem unha :'

* Eu tinha, d iz cie, ouvido contar acerca da jovem

coisas maravilhosas. Suspeitar,do que fossem puras ilu '

sões, assaz freqüentes no seu sexo. formei o projecto dc

me inteirar bem de tudo por mini mesmo.

* Dirigi-me pois para casa da fam ilia G iann in i. Era

um a terça-feira. Depcis 'de a ter visto senti-me inspirado

a pedir a Deus algum sinai palpável da origem divina

destes factos prodigiosos, e, sem nada d izer a ninguém,

especifiquei dois: um suor ce sangue e a form ação dos

estigmas.

cA hora de vésperas, <t jovejn fo i só para diante do

grande crucifixo da sala dc jan ta r a-fim-de fazer as suas

orações costumadas. M inu to s depois, abri a porta e vi-a

cm êxtase, transfigurada per com pkto. Embora abis­

m ada cm uma dor imensa, parecia verdadeiramente um

an jo . ■

<AprOximci-me: do rosto, da cabeça, dás mãos c

sem dúvida de tôdas as partes do corpo, corria um san­

gue vermelho que sc dcssecaoa ar.tcs dc chegar ã terra

e que nãc parara senão depois de meia hora. pouco mais

ou mer.es. Rctirei-me vivamente comovido.

<Saida do êxtase, G e m a disse confidencialmente a

D . Cecilia: O P adre ped iu do is sinais a Jesus, c Jesus

deu-lhe um; dar-lhe-á tam b ém "o outro.

«Q u e sinais serão estes? Sabe i- lo?...

C A P I T U L o ' V I I t 115

t

«Chegada a noite, fo i esta Senhora ter-comigo. o fe­

gante de emoção: <Padre, me disse. n ã o seriam os esti­

gm as o segundo s ina l que esperáveis?»

<Fiquei fora de m im . c ela continuou: cPregunto-

-vos isto. porque se 6 assim , G em a já cs tem abertos;

v inde ver».

«C o rr i e encontrei esta bendita m enina em êxtase.

Con:o da primeira ce;. suas mãos estacam traspassadas:

traspassadas, afirmo-o, de lado a lado: tinham n a carne

viva uma larga chaga donde o sangue corria cm abun­

dância. O comovente espectáculo durou cinco minutos.

A q u i :az o venerando p re lado u a ia descrição m in u ­

ciosa que om ito por concordar perfe itam ente com a que

atrás íicou já feita.

«N o fim do êxtase o de rram a m ento de sangue ces­

sou. as feridas fecharam, a pele rasgada retomou subita­

mente o estado prim itivo, e. logo que a serva de Deus

laveu as mãos. nenhum vestígio do fenóm eno se notou.

<Jesus tinha-se d ignado ouvir a m inha prece. D a n ­

do-lhe i 'ã ’as acfõcs de graças, abandonei tóda a dúvida

desfavorável, firmemente convencido de que estava ali

o dedo de Deus*.

Esta narração , env iada pelo au tor q M o ns . V o ip i a

3 de Setembro dc 1S99, term inava pelas seguintes p a la ­

vras: * V i corn os m eus próprios olhos as chagas das

mãos. tanto as das cosias com o as da face palmar, e eram

verdadeiras feridas. N o fim do êxtase tinham-se fechado

íòdas. ficando somente as cicatrizes. O ra , como e posst-

vel que uma chaga se feche assim naturalmente? Q uan to

a mini reconheço a í a acção d iv ina*.

Por seu lado o Padce C ae tano tin h a subscrito a

declaração seguinte: *H u ; abaixo assinado, atesto ter

visto no mês dc Ju lho do ano de 1899, nas mãos da

jovem Gema Galgani. certas chagas que nada tinham de

comum com as que SC observam ordinàriam ente nu natu­

reza. Via-se na parte inferior exactamente nas palmas,

como que um bocado de carne salier.te semelhante A

cabeça de um prego, com a superfície de um sôldo (1 ).

jNas ccstas de ambas as mãos aparecia uma abertura um

pouco profunda. O que faltava de carne dava a impres­

são dc ter sido levado por um prego rombo quc se tivesse

enterrado pela palma.

*N ão hesito em itir a opinião, conform e à da teste­

munha ocular que mc acompanhou, de q ue a origem dês-

tes estigmas de m odo algv.m podia atribuir-se a uma

causa natural; porque, tendo observado as mãos da jo ­

vem na quinta-feira â tarde, não notámos s inal de nada;

r.a sexta-feira de m anhã apresentavam o estado descrito,

e no sábado apenas uma pequena cicatriz avermelhada

se notavav.

T ais testemunhas fizerarr. sentir m ais a M ens . V c lp i

a dc licacera do sua posição. Ju lg ando obrigação sua

procede: corn extrema reserva, resolveu, depo is de m a­

du ra de liberate ), tentar um a experiência quc supunha

ser decisiva. Sem nada dizer à santa donze la , pediu a um

. m éc ico de confiança, tão piedoso ccrr.o sáb io , o favor

dc verificar e estudar o fenómeno.

G em a conta na sua auto-biografia com o o Senhor

316 S A N T A G E M A C A L G A N J

t 1) Moeda de 5 cíntimcs da lira de cccSo. cujo deâmeCro é

ser.slvdnrnte igual oo da ROvsa rr.otda hodierna de 20 centavos.

(N ota do Revisor).

C A P I T U L O . V 1 I I 117

«

a in form ou dèste projecto . <fvionscr.hor, d iz ela. ju lgou

que era bem fazer-me visitar por um m éd ico sem eu o

saber; mas fu i avisada pelo peôpcio Jesus que mc disse:

«D ize «o confessor que cm presença d o m éd ico n áo

farei n ad a do que êle dese ja». Por ordem de Jesus

adverti o confesso:».

Com efeito G em a escreveu a Sua Ex.* Rcv.mJ:

«Onfe.Ti à noite Jesus dirigiu-me estas palavras: Deves

dizer ao teu confessor que, se êle quere um sinal de mim.

lho darei e à sua escclha. contar,:o que esteja só. Q ue

sossegue: hão há doença como suposeram*.

Q u e resolução de fin itiva iria tom ar S ua Ex.*

Rev.n,‘ ? Fiar-se na sua própria observação? M a s assim

a responsabilidade que êle queria evitar cabia-lhe por

completo: e se êle suspeitava que estes factos singulares

eram o resultado de um a dcença ou. d içâm o-lo , de auto-

-sugestáo. ccmo ê que. só por suas lures e sem compe­

tência médica, poderia d iss ipar as dúvidas?

M anteve pois a sua decisão c in form ou disso a

D . Cecília que o conservava ao corrente dos menores

incidentes relativos à piedosa jovem . O exame médico

foi marcado para sexta-feira. 8 de Setembro de 1899.

festa da N ativ id ade dc N ossa Senhora.

Nesse dia. peias 10 horas da m anhã. G em a . retirada

no seu quarto , entrou em êxtase. Pelas I I horas retomou

os sentidos e escreveu a M onsenhor, dizendo-lhe que

pocia vir, mas só. sem o. quê jesus. descontente, naca

ihe daria a ver. <Entretanto, acrescentou cia, fa :e i como

bem vos parecer: de qualquer modo ficarei contente».

Entregou o bilhete a D . Cecilia ; e esta. depois dc *IT

o ler. apressou-se a cnv:5-Io ao seu destino.

118 S A N T A G E M A G A L G A N l

> ' .

À uma hora da tarde G em a , de novo no seu quarto ,

• to rnou a cair em êxtase. D . C ecília , que n ão ta rdou a ir

ter com ela. v iu o sangue correr-lhe da fronte e das m ãos

«bertas, m arcadas ccra os estigm as. V ie ram contemplá-la

neste estado, com religioso respeito, o cava lhe iro M ateus

G ia n n in i. que tinha checado das águas, sua espôsa Jus-

tina e a lguns outros m em bros da fam ília . • •

Pelas duas horas, M o n s . V o lp i e o m édico foram

• an u nc iad o s ' D . C ecília correu ao seu encontro: «V inde ,

-vinde, lhes disse, rad ian te de a legria , estamos no mo­

mento m ais òe ío»; e in troduziu-os no qua rto onde a inda

se encontravam as pessoas já m enc ionadas. O m édico

tom a um pano, molha-o em ág u a e lim pa as m ãos e a

fronte da jovem em êxtase. Sub itam en te o sangue pára

e*a pele aparece sem chaga , sem a m enor arranhadura

• ou p icadela . Imagine-se a estupefacção e o desaponta-

. o e n to de tedos os espectadores. O médico. ier.do ficado

-<5f> com D . Cecilia , qu is exam inar tam bém os pés e o

c.oração, mas nada descobriu de ano rm al.

D ês íe m odo o Senhor, cu jos desígnios são muitas

veres im penetráveis para nós. co n fund ia a ciência h u ­

m ana . náo lhe perm itindo verificar um facto ce orcem

sobrenatura l. G em a diz-nos na sua au to-bioçrafia com

sim p lic idade ingénua : « O confesser procedeu a seu

77:0do . mas as coisas passaram-se como Jesus tinha

ar.unciadc-t.

: E nessa mesma tarde escrevia ao Pre lado: «Se tivés­

seis vindo sd, Jesus ter-oos-ia persuadido bem».

O êxtase tinha d u rad o tçdo o tem po d o examê.

' P or isso G em a nada advertiu . Recuperando porém os

sentidos, notou certa m udança nas pessoas que a cerca-

C A P I T U L O V I I 1 m

vam , vendo-as desconcertadas, m ortificadas. co n fun ­

d idas .

D . C cc ilia pa ra a d istrair, e a fas tar dèste meio Lccó-

m odo . propôs-lhe q u e saísse. N o cam inho diz-ihe G em a:

*Conduzis-me a Jesus? 7'enho necessidade de Jesus*.

À p iedosa Senhora concordou em a acom panhar à igre ja

de S . S im ão , bastan te a fa s tada . A visita ao Santíssim o

Sacram en to prolongou-se cêrca de um a hora.

A o sair da ig re ja a san ía m enina disse à sua pro­

tectora: <Eu queria comunicar-vos uma coisa, mas sinto

r.isso m uita vergonha». A n im a d a a fa lar, m ostrou as

m ãos d o nde o sangue corria. D . Cecilia teve a iem brança

ce as fazer ver neste estado a M o ns . V o lp i, e encarre­

gou um a pessoa de con fiança de lhe conduz ir Gem a.

O P re lado pôde verificar com seus próprios olhos,

não o sangue, é ve rdade , mas a pequena ferida donde

tinha corrico . N e n h u m a adm iração m anifestou com re­

ceio de expor a dor.ze la o qualquer perigo dc vaidade,

mas. depo is dum a s im p les observaçao das mãos, apres­

sou-se a m andá- la em bora.

O Senhor em sua m isericórd ia, atenuava assim c.

h um ilh ação da sua serva, levan tando um pouco a cora­

gem de seu m in istro e das o u tra i testemunhas do in ú t il e

desairoso exame m éd ico .

t1 \—i ' —J 1 j\.

• * .• ■ • * — . * «I. • % - .»

i • • -

Jesus acode em favor de Gema humilhada —

Novas intervenções que comprovam a vera­

cidade da estigmatização— Portentosos fenó­

menos místicos (suor de sangue, flagelação,

coroação de espinhos, agonia mortal)

— 18Q9-S000 —

a lg u m a s ve zes D e u s a f l ig e os seus se rvos , n ã o

os a b a n d o n a n u n c a . À P ro v id ê n c ia , sem pre

a d m ir á v e l err. seus c a m in h o s , s ab e c o n so ­

lá- los e de fe ndê- lo s n o s casos m a is d e se spe rad o s . G e m a ,

n ó s o verem os, :a d e c a ir m u ito n a o p in iã o d e a lg u n s

ce po is d o ex am e m é d ic o e. h u m a n a m e n te f a la n d o , n ã o

pod e r ia m a is le v an ta r- se . M a s n e la se r e a liz a r ã o as

p a la v ra s d o E c le s iá s t ic o : F ac ile est in ocu lis D c : sub ito

h o n e s ta ce p a u p e r e m .

D e- fac to , a v ir tu o s a m e n in a escreve n a su a auto-

- b iog ra fia : « D e sd e o d ia d a visita d o m ed ico com eçou

para m im um a v id a n o v a * . T eve um a v id a de in t im o

so fr im e n to . N ã o só o s m em b ros d3 fa m ília G ia n n in i ,

m as a té o p r ó p r io c o n fe s s o r conse rv avam su a s d ú v id a s

in q u ie ta d o ra s , e ês te ú l t im o , a-pesar-da v e r if ic a ç ã o pes­

so a l dos e s t ig m as . « O confessor , d iz G e m a . d e novo me

p ro ib iu tôdas as cc isas ex trao rd in árias da q u in ta e sex ta-

122 S A N T A G E M A G A L G A N I

voltou como era costume, e até com mais intensidade que

antes».♦

À serva de D eus. posta por Jesus ao corrente das

incertezas de seu pai esp iritual, afliçia-se por êle.

Pessoalmente alegrava-se com esta hum ilhação

<a mais bela. são pa lavras suas. que me deu o meu

amado Jesus». Mas, n ão pod ia deixar de se compadecer

do estado de alma dc quem desde a sua ir.fânc ia am ava

c venerava como-pai. A lém disso era ag itada pelo temor

de perder éste bom gu ia . seu ún ico sustentácu lo nas con­

tinuas provas . A b ando nada por êle. a quem havia de

recorrer ?

O S enho r veiu em aux ilio de sua serva nestes m o ­

mentos de prostração. * M in h a filha, lhe disse, em tôdas

as tuas incertezas, nas tuas aflições, n a adversidade,

lembra-te menos dos outros qite de m im ; procura mais

em mim que nêles aiiu io e conforto». P or outros tênnos,

por m ais ju s ta e ra :o áve l que íôsse a sua afe ição ao

m in istro sagrado, por m ais santa que fòsse' a sua con ­

fiança nêle. r.ão devia lamentar-se, a in d a que viesse a

perdê-lo sem culpa sua: ficar-lhe-ia Jesus, r.ão necessi­

tava dc mais.

G e m a com preenceu estas pa lavras d iv in as que res-

ü tu ír a m im ediatam ente a paz ao seu coração aflito , aca­

bando de o despo ja : de todo o sentim ento hum ano.

O seu abandono a D eus tornou-se completo: e como

eram som ente os p rinc ip ies da v irtude que inspiravam

•as menores particu laridades da sua condu ta , os receios

de que o bom Pre lado tivesse conceb ido a seu respeito

ideas desfavoráveis cm n a d a ’d im inu ir iam a sua con ­

fiança nêle . . • . ■ ‘ : .

ir .L .

4 :CfliJ cm quc vive*t n «Sa*ííã con í j j fàttiUj. r.j R‘j& Siscicr.c,

cn Lvcj

* * * 5 A /V / A & t> M A ( J A L G A S Ir

r. E m m uitas das suas cartas, d ir ig idas ao próprio

M o n se n h o r V o lp i e a outras pessoas in tim as, declara ela

que ped ia constantemente a Jesus o ilum inasse e conso-=

lasse; A t é r.os colóquios de seus êxtases, n o meio das

expansões da sua alma cansada e do lo rida , a lembrança

d o confessor apresentava-sc muitas vezes ao seu espí­

rito . « Ó Jesus, ide consolar M onsenhor que é muito infe­

liz . U m ju lga uma coisa, outro ju lga outra. M as prefe- *

ris V ós que assim seja? Agora que todos me chamam

louca tendes-me mais am or que r.o tempo em que me ju l­

gavam santa? O h ! Agora, r.ão é verdade?*

O s escritos, que só a fòrça da obed iênc ia conse­

g u ira a rrancar à hum ildade de G em a . projectava Sua

E x .J R cv .',,■, subcncte-los a outro r;iéd:cc. M as a santa

cle-pressa soube, por meio do seu d iv ino Espõso. do pro­

jecto cio confessor. Eis com que c ând id a sim plicidade

exp rim ia o seu descontentam ento num cos êxtases:

<Ó Jesus, querem mostrar os escri:os ate ao c/ou/or?

Q u e isto não sconteça. Ó Jesus. mcteni-Vo$ a ridí­

culo. S e quiserem ler os escritos que não vejam mzis

do que pape l em branco. !de, Jesus, ide ter com Mor\se­

nhor e tranqi':izai-o. consolai-o

A lg u m a s vezes julgou-se ela ab ando nad a do Pre­

lado . o q u a l. em virtude de suas ausências e ocupaçòes

absorventes , ou simplesmente para se aux ilia r com as

lu zes de entrem , a m andava umas vezes a um confessor,

o u tras a outro. •

M a s nem poc isso deixou de lhe coijnervar tôda a

sua a fe i;ã o e de continuar até à 'm o rte a confessar-se'.a

êle. n ã o cessando de o venerar como a uin pai. O h !

q u a n to nos não ensina a adm irável condu ta de Gem a

\ . ' C A P Í T U L O - í X 125

no meio d c tantas provas! E como são verdadeiras as

palavras dc Jesus à sua serva: Sofrendo aprende-se a

amar. -

N este mesmo iv.c.s de Setem bro dc 1S99, motivos

dc saúde levaram a Luca o P .* C aetano . Sabendo o

resultado d o exame m édico e a sua in fluênc ia desfavo ­

rável sôbre o espírilo dc M o n s . V o lp i. êle mesmo sentiu

m uito a b a lad a a su3 prim itiva convicção, O Senhor,

poréir., d ig non-sc seguir a seu respeito o mesmo processo

que seguiu para com o apósto lo S . Tom é. «M e ie aqu i o

dedo. considera as m inhas n ão s . e n ão sejas ir.crcdulo

mas fie!».

D u ran te os dois meses da sua residência na cidade

o P .c C ae tano v iu ce novo e à vontade o ‘ fenóm eno da

estigm aíiraçào . observou, ap a lpou e de-pressa lhe desa­

pareceram as dúv idas.

N u m a carta a M ens . V o lp i apressava-se a a n u n ­

ciar çuc . tendo procurado repetir a experiência do me-

cicp. fizera lavar por três ou quatro veres as chagas das

mãos. de aparência p ro funda . F.stas não desapareceram

e o sangue, de tido por um instante , outras tantas vezes

tornava a brotar.

O R cv . P.® Pedro Pau lo , a quem as funçòes dc

P rov inc ia l trariam freqüentem ente a Luca, M ateus

G ia n n in i. sua esposa, seu filho mais vê lho c especial­

mente sua irm ã Cecília. Iodos pessoas m uito honradas e

abso lu tam ente d ignas dc crédito, tiveram muitíssimos

veres ocas ião dc verificar por espaço de ano e meio.

tan to depo is como anlcs da visita do médico, os estigmas

e os ou tros sinais da Paixão de que se tratará no fim

J r . * . ------

“ * \ * . - t •. •

J2b S A S T A G E M A G A L G A N I

O testemunhe do P.* Pedro Pau lo é particu larm ente

au torizado . Sua doutrina, seu 2 êlo e sua prudência no

governo, no ministério apostólico e na d irecção das alm as

são conhecidos c apreciados em Itá lia . Depo is que exer­

ceu per algurr. tempo o cargo de Superior G era l da C o n ­

gregação dos Passionistas. o 'S a n to Padre P io x con-

fiou-lhe a visita apostólica de des dioceses im portantes

c acabou por elevá-lo à cadeira arquiep iscopal de C a ­

in erino.

A os testemunhos precedentes seja-me perm itido

ju n ta : o meu. porque tive tôdas 'as fac ilidades de veri­

ficar e exam inar rigorosamente os factos prodigiosos que

aprouve a Deus operar em sua serva.

Tem os, ê vercade. relativamente aos estigm as,-a

in frutuosa prova do médico, mas o depoim ento de muitos

mem bros da família G iann in i. confirm ando a realidade

das chagas antes do exame, a predição m iraculosa dêste

exame e da sua inutilidade. depois o súb ito desapareci-

ur.ento. sob as mãos dc doutor, das chagas ou feridas na

rea lidade existentis. visto que o sangue corria , consti­

tuem um a prova evidente do carácter sobrenatura l do

fenóm eno.

T ud o se passara a fina l como Gem a tinha anunc iado

da parte de Jesus. No coso contrário é que haveria m o­

tivo para suspeitar da realidade das suas com un ica­

ções com o Salvado: e portanto da origem d iv in a dos

estigm as.

Adm i;err.os aqui as disposições da Providencia-

A san ta m enina nào vivia na so lidão dum claustro

fechado à curiosidade pública, mas « io m eio d o m undo.

À necessidade de ir a casa dos G ian n in i. ou à igreja

)

a-fim-de ouv ir a santa missa, rccebcr a sagrada comu­

nh ão e v isitar o Santíssim o Sacramento obrigava-a a sair

•muitas vezes ao dia. S òn e n te algumas pessoas Sr.tLmas

da fam ília G iann in i conheciam os factos extraordiná­

rios dc que se trata, c guardavam tão bem o segrêdo que

na reaiidade estes factcs eram ignorados - na cidade

de Luca.

M as o que teria acontecido, se o médico e outros

estranhos tivessem verificado a existência dos estigmas

e de semelhantes sinais maravilhosos? Q uan tas provas e

contraprovas para o futuro ! Q uantos curiosos espreitando

as saídas de Gem a ou a sua chegada à igreja! A hum ilde

virgem tornar-se-ia assunto das conversas de tôda a

cidade e das zombarias dum grande número. O Senhor,

subtra indo aos olhares do m édico e de outros profanos

o prodig ioso fenómeno, hum ilhou a sua serva e conser­

vou escondida esta gema preciosa.

D c resto, a prudência, a discreção. a ciência e hon ­

radez das pessoas oue observaram esíes prodígios, sem

excluir o próprio M ons . V o lp i, podem suprir bem o insu­

cesso do exame médico.

A ciência não pode ter a pretenção de explicar o

sobrenatural, deve limitar-se a verificar os factos. O tes­

temunho dos sábios não é indispensável para que um

facto seja adm itido . T o d o aquêle que tem mãos para

apalpar e o lhos par3 ver pode atestar a verdade. E como

neste caso o fenómeno, sem ser permanente, sc m an i­

festava por diversas vezes, o sábio só poderia afirmar

que no m om ento do seu exame não se produziu . M as.

para o tornar indub itável, deve bastar a palavra de tes­

temunhas d ignas de íé que o observaram muitas vezes.

C A P I T U L O I X 127

o n t* J s \ \ j l , n KJ / 1 1* \ j A t i I

O s outros sinais da Paixão de que vou falar peia

ordem cronológica, m encionando apenas alguns, r.ão

fo ram menos severamente verificados r.a serva de

D eus .

O s tan tos favorecidos com os cinco estigmas ao

mesmo tempo são raros. O Espirito sopra cnc/c quere e

com o quere, a ting indo sempre os seus altíssimos fins.

Aprouve-lhe d irig ir dum moco particu lar sôhre a ditosa

G em a a torrente cos seus favores, e torná-la partic i­

pan te . n ão só das cinco chagas sim ultâneas co d iv ino

C ruc ificado , mas também ce tedos os suplicios da

Paixão .

O prodigioso suor de sangue. mencionado em sua

narração por M ons . M oreschini e que eu tive já ocasião

de assinalar, foi verificado freqüentemente na angélica

m en ina durante as suas meditações sôbre a agonia no

Jard im das O live iras e sôbre outros mistérios da Paixão .

N ã o aparecia, entretanto, nos êxtases periódicos da

q u in ta e sexta-feira, mas cm outros sim , e. mesmo a lg u ­

m as vezes, quando esta%-a no uso pleno dos sentidos.

C om prim ido no coração e nas artérias peia veemência da

sua com paixão dolorosa, o sangue saia por todos os

poros, especialmente pelos do lado esquerdo do peito

que encerra o coração, c Gem a ficava literalmente b a ­

nh ad a cm sangue.

Com que respeito não recolheriam os an jos êste san ­

gue c o apresentariam ao Senhor, a-fim-de apaziguar a

sua justiça pelos méritos da inocente vitima quc o espa­

lhava tão generosamente, a exemplo do div ino S u p li­

c iado do C alvário !

P«sr.o air.da manchado de jongue corn que a Sar.ra «s::^:njn:ada cosíunava tittpaj a chaça do lad«.

C A P f T U ' l O I X m

A o suor ce sang ue d o G etesem an i, seguiu-se pouco

d e p o is a f la g e la ç ão d o R eden to r . A inocente v irg e m de

L u c a , con tem p lava

sem pre êste d o lo ­

roso m is tério com

u m sen tim en to es­

p e c ia l de devoção .

C o n ta n d o um a por

u m a as p ro fu ndas

c h a g a s abertas p e ­

los a ço u te s no corpo

s a g r a d o d o ceieste

E s p ô so , d iz ia : «7'ò-

das são obras do

am o r» . E era c o n ­

s u m id a pe lo dese jo

de as ver ig u a l­

m en te im pressas em

sua p ró p r ia carne.

O s êxtases nos

c u a is o S enho r se•

m o s tra v a coberto

d e ch a g a s , que G e ­

m a e ra co n v id ad a a

to c a r e a be ija r ,

n ã o e ram d e s tin a ­

do s a d im in u ir o fo g o de seus desejos.

N a prim e ira sexta-feira de M a rç o de 1901, d u ran te

o ês tase h ab itu a l, fo i o uv id a a súplica que ela com lá g r i­

m as d ir ig ir a ao seu E spôso par3 que a tornasse dc a l^ u m

m o d o p a r tic ip an te d o m artír io da flaoe lacáo . c . V * ç o rC * -

ò\ G j Í t í c l d ; .V.* S .’ das Doces.

pàSiior.isía quc tar.in j vc:e.i aparzçtu à

r.oaa SzrJà

330 S A > ( T A G E M A G A L G A N I' " >

-feira; pelas-duas horas. escrevia-me ela. Jesüs fez-me

sentir alguns pequenos açoutes, fiquei tôda em chagas,

meu Pa:, e sefro com cias um poucochinho. V iva Jesus!>

^7*-" E s tás chagas esiavatn longe dc ser im ag inárias.* * • •

D . Cecília , que muitas vezes as exam inou atentamente,

faz delas a seguinte descrição: '

«AfTa primeira sexta-feira de M arço, notei que Gem a

sofria mais que dc costume durante o êxtase. Tomei-lhe

um ò ra fo ; tinha grandes sulcos vermelhos. Aproximei

deles um lenço; ficou tinto dc sangue. Ccm o a santa me­

nina parccia sofrer muito c cu lhe c.uvisse dizer: <Seriam

estes os vossos açoutes, ó Jesus?» pensei numa invisível

flagelação. '■

h to renovou-se nas 'outras três sextas-feiras de

M arço, com agravamento progressivo. N a segunda

sexta-feira, 6. corpo da extática ficava dilacerado: na

terceira, quási se viam os ossos: na quarta, era uma ccisa

indiscritiue/:‘ chagas por tôdas as partes c. nalguns sítios,

da profundidade dum centímetro. Depois de dois ou três

dias. desapareciam sem deixar vestígios.

U m a vez quis ligar duas destas chagas. E las porém

agravaram-se cm vez dc sc fecharem, e não pude tirar o

penso sem produzir as mais vivas dores: a cura efec­

tuou s e por si pouco a pouco. As outras chagas tinham-se

cicatrizado sc/n demora.

Estas chagas estavam dispostas do medo seguinte:

duas cm cada braço, do comprimento de quatro a cinco

centímetros e muito profundas: uma r.o peito, bem no

meio c na direcção da garganta: duas a cima do joelho,

as mais consideráveis c mais oblongas: duas nes joelhos

c duas nos cotovelos que quási descobriam o osso; duas

C A P i t T Ú . L O i X 131/ • .

cm cada «m a das panturrilhas.-redondas c maiores que

uma moeda de duas /íras ( l ) ; ou/ras dúas na-frente

da perna, ao longo do 6 sso; finalm ente um a profunda e

mats ou menos circular no peito dos pés. H av ia outras

sôbre o tronco, que n ão pude notar bem. • .

N a primeira sexta-feira sòmente se notaram, como

já dissemos, sulcos sanguinolentos; mas depois apare­

ceram profundos rasgões, e preguntando eu a Gema a

razão, respor.deu-me: «a principio eram as var3s: agora

São os.azorragucs».

Para vos dar uma idea do seu estado lamentável,

imaginai o grande crucifixo da nossa sala de jantar, aos

pês do qual ela tanto gostava de orar. A semelhança era

perfeita: as mesmas pisaduras, as mesmas lacerações da

pele e da carne, nas mesmas paries do corpo, o mesmo

aspecío comovente. O sangue corna por sulcos, alguns

des quais mediam quarenta a cinquenta centímetros de

comprimento per cinco de largo; descia ate à terra, se

ela estava de pé. e, quando estaca deitada, ensangilen-

tava os lençóis do leito, molhando por completo o col­

chão».

O s quc puderam ver estas chagas vivas, fizeram

delas a mesma descrição. A sua origem sobrenatural não

sc pode contestar, porque seria impossivcl à jovern d ila ­

cerar-se assim com disciplinas ou outros instrumentos

de penitèr.cia.

0 ) A mocd.-i dc 2 liras, ir.ocda de prata ectfo conecte ca j .

Itália era um pouco neoor que a r.ossa actuat mocoa de de; escudos.

cNoía do Revisor). . ■ • . . •

■' P o r outro lado estas horríveis feridas íorm àvac-se

mesmo durante o êxtase. em presença de testemunhas,

c aesápaicciam com um a rapidez hum anam ente ioex-

p lic áv e i. , ‘ • • '• ........• ‘ • ’•

Adivinhava-se pela atitude da querida vitima

quaDto devia sofrer sob os golpes invisíveis que abriam

tais chagas na carne v iva.

cDurante a flagelação, d iz um a testemunha, mcj-

tra-se possuída de terríveis sofrimentos, mas nãõ se

move. Algumas vezes sobreveen: ligeiras convulsões, c

05 òra^os tremem. P, evidente que possue então teda a'

sensibilidade. Pobre menina! como sc nos confrange o

coração ao vê-la sofrer assim1 E quereis saber o que ela

me disse no meio destas torturas? cRccomendai-me muito

a Jesus». E acrescentou: « ó m inha celeste M ã i! 0 eterno

P a i!» Depois do êxtase sentiu fraqueza, mus pe r pouco

tempo. Notei que conservava perfeitamente a lembrança

de tudo o que se passnra».

N ã o sabemos se êste fenómeno m ístico se repetiu

cm outros dias além das sextas-feiras de M arço de 1901.

Poderia acontecer, porque a hum ilde virgem tir.ha uma

hab ilidade sem igual para ocultar cs dons de Deus.

U m c ia cm que-pedira a D . Cecília perm issão para

tom ar um banho, porque sentia, segundo afirmava, cs

vestidos colados à carne, encontrou-lhe esta Senho.*?, o

corpo v irg ina l sulcado etr. iodos os sentidos de grandes

chagas jà s Zc ò s às qua is a cam isa, em vários sities, se

tinha pegado. Para a arrancar das costas foi preciso

reabrir as feridas, n ão sem atrozes dores.

C on tudo , todos estes tormentos, d iz ia ela, consis­

tiam somente «em alguns golpes pequenos que Jesus lhe

C A P I T U L O I X 133é

fazia sentir>, para lhe dar a graça de sofrer <um poc-

cochinko*.

Depois da flage lação d o Salvador, a so’dadesca do

Pretório, entre outras mostras de escárr.eo apoderac-

do-se do D iv in o Padecente, coroou-o de espinhos, cujas

pontas cruéis se enterravam na cabcça.

Coroa adorável! Q u e cristão poderia recusar-te o

seu amor, e não consideraria um a suprema honra cingir

contigo a fronte, ao lembrar-sc conio tu cingiste a p ró ­

pria fronte do Hom em -Deus?

A %'irgen: de Luca tinha ap ro fundado muito os mis­

térios da in fin ita grandeza de Jesus-Padecente; e isto a

levou a apaixonar-se bem cedo pelo seu doloroso d ia ­

dema como por um a incom paráve l jó ia . Por outro lado o

Redentor aparecia-lhe m uitas vezes, tendo na fronte a

coroa sangrenta c p re g u n ta n d o lh e se ela não a queria.

Q u an d o a santa donze la adqu iriu , por seus desejos

e purificações místicas, a ú lt im a preparação para êste

dom extraordinário, os actos sucederam às palavras, a

realidade à visão.

«Finalmente esta noite, escrevia ela a 19 de Junho

de 1900, depois dc ter sofrido por seis dias o afasta-

mento dc Jesus, fiz esforços para me recolher. Comecei

a orar, como em tôdas as quintas-feiras: meditei na cru­

cifixão de Jesus. ' . ■

A principio nenhum sentimento experimentei; alguns

- momentos depois, sobreveio um pouco de recolhimento;

Jesus estava próximo. N es íe recolhimento peedi a ca­

beça, como das outras vezes e encontrei-me diante de

Jesus que sofria penas terríveis. Será possível ver sofrer

134 S A N T A G E M A " C A L C A N 1*. 1

>

Jesus/e não procurar ãliviâ-lo? Senti-me penetrada‘dum

grande desejo de sofrer e pedi instantemente a Jesus que

o satisfizesse. Ouviu-me imediatamente.

: . Aproximando-se de mim, tirou d a cabeça a coroa

de espinhos para a colocar sôbre a m inha, comprimin­

do-a com suas divinas mãos contra as m inhas fontes.

Foram momentos dolorosos, mas felizes. F ique i uma

hora a sofrer assim como Jesus*.

*'*• U m pouco mais tarde Gem a, tornava a escrever:

«O n te m , às fres horas depois do meio-dia, cansada e

esgotada, experimentei, para dizer a verdade, uma

grande repugnância, quar.do dc novo n:e encontrei

diante de Jesus. Êle porém, jà não estava triste, como

em a noite p3ssada.

Depcis de rr,e ter feito algumas caricias, tirou-me

da cabeça, com um aspecto muito alegre, a coroa de espi­

nhos (sofri um pcuco neste'momento, mas menos) e tor­

nou-a a cclocar na sua. Tôda a cor desapareceu; recupe­

rei de súbito as fòrças e senti-me melhor que antes dc

sofrers.

O s efeitos palpáveis destas aparições demostraram

que cias n ão eram o produto dum a im ag inação doente.

A cabeça da angélica don:c !a aparecia, ao mesmo tempo,

crivada de picadelas donde corria um sangue vivo, não

sòm entc em volta, mas tam bém cm tòda a sua superfície

por debaixo do cabelo; e isto d á crédito à op in ião dc

a lguns santos contemplativos, segundo os qua is a coroa

dc espinhos cobriu tõda a cabeça co Sa lvador.

A lg u m as vezes as picadelas, quósi invisíveis a õlho

nu . adivinhavam-se sòmcr.te pelo sangue que derram a­

vam . O u tras veies, no d irer co Rev- P ad re Lourenço

Ç A - P t T U XL O ■■ 1 X 325

A g r ia o n t i. e de outras testemunhas oculares, distia-

guiam-se perfeitamente na fronte c n o couro cabeludo

buracos de espinhos, triangulares, em cada um dos quais

brilhava, como péro la , uma grande gota dc sangue.

O . prod íg io renovou-se regularmente,-sempre d u ­

rante o mesmo espaço de tempo, dc qu in ta paxa sexta:

-feira de cada semana, mesmo cepois d o desapareci­

mento defin itivo dos outros estigmas. Çcm eçava muitas

vezes antes do êxtase habitual dc quinta-feirs à tarde.

D uran te a refe ição fam iliar, viam-se aparecer sôbre

a fronte de G em a , em núm ero sempre crescente, gotns

de sangue que desciam ao longo das faces, co pcsccço.

dos vestidos. « C a c a cabdo. a firm a um a testemunha,

tinha uma gcta, de sorte que o sangue corria até à

terra >.

Era ura espectáculo comovedor, capaz de enterne­

cer um coração de gelo. Estava-se d ian te da rr.3is bela

reprodução do Eccc Homo. «Se vós vísseis. Padre, escre­

viam-me. o sangue corrç-the dos olhos, dos ouvidos c

dã testa! Nêle molhei dois lanços. E que efervescência

cm seu peito* ( l ) .

U m d ia , em que eu mesmo fui testemunha dèste

facto prodig ioso, mandei-a enxugar e lavar tôdas as

pequenas chagas d a cabeça. M as , depois dc alguns m i­

nutos. o sangue tornava a correr dos mesraçs pontos

para de novo lhe b anh a : o rosto v irg ina l. Saía cçm v iva­

cidade. como sob urna forte pressão, corri3 ao longo das

faces e não dem orava a secar sôbre a pele. ;

( !) A tcjfixunha fa i aJus3c> palpitações víolict.u aes-

clocadaj enj cutri> lugar. ' ■' . '