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    Copyright 2008-2009 - Leo Rugero Todos os direitos reservados.

    A sanfona de oito baixos na msica instrumental brasileira

    Por Leonardo Rugero Peres (Leo Rugero)

    A verdadeira sanfona aquele instrumento menor, de oito baixos,onde abrindo o fole uma nota e fechando outra, ensinada de paipara filho, conhecido no interior do nordeste como p-de-bode ouconcertina, e no sul como gaita-ponto.Oswaldinho do Acordeonwww.oswaldinhodoacordeon.com/

    A sanfona a cachaa dos nordestinos e o chimarro dos

    gachosHermeto Pascoal

    O gacho at ento conhecera a viola, quase exclusivamente, e arabeca. Embora rica em harmonias, a viola era um instrumentofraqussimo em sonoridade, trabalhosa de afinar, e relativamentedifcil de conduzir a cavalo porque logo se desarranjava ao contato

    com a chuva e a umidade. Agora o italiano oferecia ao gacho umnovo instrumento [a gaita-ponto], de afinao permanente,resistente umidade, fcil de conduzir. As limitaes desses modelosmodestos impunham exclusivamente o uso do modo maior,empobrecendo a expresso musical; mas, em contrapartida, o ar que

    se expelia do fole proporcionava um som forte, animado, capaz de seouvir em toda uma sala de baile.

    Barbosa Lessa e Cortes

    Lus Gonzaga e o seu pai, Janurio.

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    A Sanfona de 8 Baixos e a Msica Instrumental

    Por Leo Rugero

    Ensaio elaborado especialmente para o projeto Msicos do Brasil: Uma Enciclopdia,

    patrocinado pela Petrobras atravs da Lei Rouanet

    A Sanfona de 8 baixos

    No sul do Brasil conhecida como gaita-ponto, gaita de duas conversas ou cordeona de oito

    baixos. J no nordeste, atende por fole de oito baixos, concertina, realejo, harmnica ou p-de-bode. Na

    regio sudeste, sobretudo em Minas Gerais, popularmente conhecida como cabea-de-gua. No Esprito

    Santo, pode ser chamada de bandona, e no interior do Rio de Janeiro, muitas vezes denominada como testa

    de ferro ouconcertina. E por a afora ainda pode carregar outros apelidos como botoneira,gaita de colher ouverduleira;Enfim, tantas denominaes diferentes para um mesmo instrumento, o acordeom diatnico, que no

    Brasil mais popularmente conhecido por sanfona.

    Na Europa, onde surgiu no sculo XIX, a sanfona de 8 baixos tambm atende por muitos nomes.

    Na Itlia, a fisiarmonica diatonica, popularmente conhecida como Organetto. No Pas Basco, trikitixa.

    Tanto na Inglaterra, como Irlanda e Esccia, chamada de melodeon. Em Portugal, atende pelo nome de

    concertina. Mas entre tantos nomes que foi adquirindo com a sua insero em vrios pases, a Sanfona recebe

    seu nome de batismo, Acordeom em 1829, pelo construtor vienense Cyrill Demian.1

    Acordeom de Cyrill Demian sheng

    Este inventor teve a idia de colocar uma gaita dentro de uma caixa, impulsionada por um fole,

    concretizando um longo estgio de aperfeioamento desta idia. Mais tarde, em 1831, Isoard Mathieu,

    1

    Muito se escreve sobre a origem remota do acordeom sendo o Sheng, instrumento chins descoberto por viajanteseuropeus por volta de 1770. Este instrumento de palhetas livres vibratrias teria sido uma das principais fontes deinspirao para o construtor Cyrill Demian.

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    desenvolveria o instrumento. Seria o nascimento do acordeom diatnico, nome este pelo qual a sanfona

    ainda conhecida em muitos pases do mundo, como a Frana, (accordeon diatonique), Alemanha,

    (diatonische handharmonika) e Espanha (acordeon diatonico).

    Instrumento aerfono, pertence famliados acordeons.

    Trata-se de Aerfono, qualquer instrumento musical que produza som pela vibrao de uma

    coluna de ar em seu interior. No caso dos acordeons, a produo de som ocorre da seguinte maneira: o fluxo

    de ar impulsionado pelo fole, fazendo vibrar as palhetas dispostas nos castelos (caixas de madeira) dentro do

    instrumento, que so acionadas pelas vlvulas de ar, como mostram as fotos seguintes2;

    sanfona de 8 baixos, caixas de palhetas ( castelos) vlvula de ar acionada por um boto

    A caracterstica marcante da sanfona de 8 baixos a bi sonoridade3: abrindo o fole, o boto corresponde a

    uma nota; fechando, outra. Ou, como dizem os sulistas, a sanfona de oito baixos funciona pelo sistema

    chamado de voz trocada ou gaita de duas conversas. isto que, basicamente, diferencia a sanfona em

    relao ao acordeom de teclado, onde cada tecla ou boto corresponde a uma nica nota, independentemente

    do movimento do fole.

    Neste instrumento, as melodias so executadas pela mo direita em uma, duas ou trs fileiras de botes. Os

    baixos e acompanhamentos so tocados pela mo esquerda, onde os botes produzem notas graves (baixos) eacordes.

    2Sobre a organologia do acordeom,recomendamos o site espanhol:http://personales.ya.com/diatonico/3Em lngua portuguesa, no encontramosnenhum termo para designar esta

    caracterstica da sanfona de 8 baixos.Assim, nos apropriamos da expressoespanhola, bisonoro, isto , instrumento

    que possui duas notas diferentes para omesmo boto ou chave.

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    No Brasil, bem como na Europa, uma forma muito propagada de sanfona foi a de oito botes, ou oito baixos

    para a mo esquerda, e duas carreiras (ou fileiras) de botes para a mo direita, conforme o modelo acima,

    onde se podem observar duas filas de quatro botes que correspondem aos oito baixos, na parte inferior da

    foto.

    Em todo o mundo, e no Brasil no foi diferente, a sanfona sempre esteve associada festa e a dana,

    atendendo s expectativas de Cyrill Demian, que nos deixou os seguintes dizeres:

    ... O acordeom convm, por seu tamanho, aos viajantes.Permite uma cmoda interpretao das rias da moda, inclusive paraos que no conhecem a teoria musical: emite acordes preparados. Amelodia e suas harmonias esto unidas como na gaita...

    Os imigrantes

    A sanfona desembarcou em terras brasileiras pelas mos dos imigrantes europeus, sobretudo

    italianos e alemes, em meados do sculo XIX.

    Segundo o maestro Tasso Bangel em seu livro O estilo gacho na msica brasileira foi em 1875

    que a gaita-ponto (sanfona) de 8 baixos foi introduzida no sul do Brasil pelos ento recm chegados colonositalianos.

    A gaita que os italianos trouxeram j era bem desenvolvidae chegou com botes (gaita ponto, de voz trocada, de dois carreiros,etc.).(BANGEL, 1989, pg.20)

    Mais adiante o maestro ressalta que a aceitao da gaita-ponto foi enorme, propiciando o

    aparecimento da indstria nacional de acordeons, sobretudo no Rio Grande do Sul.

    Segundo outras fontes, a sanfona teria desembarcado um pouco antes, junto com os imigrantes

    alemes, que chegaram ao sul a partir de 1845. Em 1851, desembarcam no Brasil os brummer, como eram

    chamados os cerca de dois mil soldados alemes, que foram contratados para a guerra contra o ditador

    argentino Manoel Rozas. Desde esta poca at as primeiras dcadas do sculo XX, era muito comum entre os

    militares alemes o uso de sanfonas.

    (http://www.casadagaitaponto.com.br)

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    Site http://jeanluc.matte.free.fr

    Finda a guerra, muitos destes soldados teriam permanecido no Brasil, aonde passam a

    desempenhar a funo de gaiteiros(sanfoneiros), animando bailes e tocando em festas de casamento e

    batismo.

    O fato, que, aos poucos a sanfona, que os sulistas batizaram de gaita-ponto, se impe como

    instrumento solista e acompanhador da msica gacha, substituindo gradualmente a rabeca e a viola. Uma

    antiga quadra gacha comenta esta transio que ocorre no final do sculo XIX, sobretudo na rea fronteiria.

    A gaitamatou a viola/ o fosforo, o isqueiro/ a bomabacha, o chirip/ a moda, o uso campeiro.

    Esta gnese da gaita-ponto no Brasil bem explicada por Barbosa Lessa e Paixo Cortes no livro

    Paixo, danas e andanas:

    O gacho at ento conhecera a viola, quase exclusivamente, e a

    rabeca. Embora rica em harmonias, a viola era um instrumento fraqussimoem sonoridade, trabalhosa de afinar, e relativamente difcil de conduzir acavalo porque logo se desarranjava ao contato com a chuva e a umidade.

    Agora o italiano oferecia ao gacho um novo instrumento [a gaita-ponto], deafinao permanente, resistente umidade, fcil de conduzir. As limitaesdesses modelos modestos impunham exclusivamente o uso do modo maior,empobrecendo a expresso musical; mas, em contrapartida, o ar que seexpelia do fole proporcionava um som forte, animado, capaz de se ouvir emtoda uma sala de baile. (Lessa e Cortes, 1975, 62)

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    Foi tambm no sul que surgiram os primeiros construtores brasileiros, na maioria

    descendentes de italianos, como Tlio Veronese e o casal Cesare Arpini e Maria Savoia.

    Em 1923, o imigrante alemo Alfred Hering cria as Gaitas Heringem Blumenau Santa

    Catarina, que, aos poucos, alm de gaitas, passa a produzir diversos tipos de acordeons, entre os quais as

    sanfonas de 8 baixos, que sero muito difundidas em todo o Brasil. Em 1960, com o falecimento de seu

    fundador, a Hering comprada pela companhia alem Hohner.

    No dia 28 de Abril de 1939, surge em Bento Gonalves, a Todeschini & Cia. Fundada por Luis

    Matheus Todeschini. Em 1947, com a ampliao de seu ptio industrial, a empresa rebatizada como

    Acordees Todeschini.

    Ptio industrial da Todeschini foto da dcada de 60

    Chamada carinhosamente de Rainha do fandango, at hoje a Todeschini uma referncia

    qualitativa em relao a sanfonas de oito baixos nacionais, embora um incndio tenha destrudo seu parque

    industrial em 1971, quando interrompida a sua fabricao. .

    http://www.paginadogaucho.com.br/musi/gaita.htm

    Segundo o acordeonista e pesquisador Lauro Valrio, durante a dcada de 50, perodo ureo do

    acordeom no Brasil, chegam a funcionar cerca de trinta e duas fbricas espalhadas entre o sul e o sudeste.

    http://www.valerio.com.br

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    No entanto, em pleno auge de sua produo, em 1965, ao passo que a Todeschini exportava seus

    instrumentos para diversos pases, como Uruguai, Argentina, Mxico e Estados Unidos, comea a enfrentar

    uma forte crise devido revoluo da eletrnica, e o

    fascnio que os novos instrumentos como as guitarras

    eltricas e os teclados passam a exercer com a ascenso

    do rock. Nem mesmo a multinacional Hohner resiste, e

    deixa o Brasil em 1979, atestando um novo tempo, onde

    a indstria nacional de acordeons, outrora imponente, j

    anuncia inevitvel declnio..

    Embora ainda exista uma tmida produo

    nacional, atualmente o mercado de sanfonas de 8 baixos e acordees se restringe principalmente aos

    instrumentos nacionais usados e/ou importados.

    A sanfona brasileira

    A sanfona de 8 baixos, desde que desembarcou no Brasil, passou por grandes transformaes,

    adquirindo ao longo do tempo, caractersticas prprias de afinao e tcnicas peculiares de interpretao.

    Desenvolve-se em um repertrio tipicamente brasileiro, ganhando estilos e recursos novos, sobretudo naregio sul, que lhe acolheu; nas regies sudeste e centro-oeste, por onde se espalhou, e no nordeste, onde

    adquiriu caractersticas peculiares de afinao e interpretao.

    O ensino da Sanfona de 8 baixos

    O ensino da sanfona brasileira, de norte a sul do pas, eminentemente oral. O aprendizado

    normalmente transmitido de pai para filho, e os sanfoneiros so em sua maior parte msicos que tocam de

    ouvido, isto , msicos que no tiveram uma instruo terica ou educao musical formal. Deste modo, a

    msica da Sanfona de 8 baixos brasileira tem sido registrada atravs da memria dos instrumentistas e das

    gravaes existentes.

    O sanfoneiro pernambucano Arlindo dos oito baixos um dos poucos mestres da sanfona de 8

    baixos que tm trabalhado na rea da educao musical. Sobre a importncia na transmisso de seusconhecimentos Arlindo comenta:

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    Se no fizermos isso, vai acabar a sanfona de oito baixos. Temque ensinar. Eu tenho o maior gosto, o maior prazer de ensinar.

    http://video.globo.com/Videos/Player/Noticias/0,,GIM785525-7823-SANFONA+DE+OITO+BAIXOS,00.html

    . Porm com a atual legislao brasileira de ensino, um msico, ainda que tenha o pleno domnio

    tcnico da sua arte no pode lecionar em escolas de nvel tcnico e superior por no possuir formao

    acadmica, como o caso de Arlindo dos 8 baixos.

    No sul do Brasil, podemos destacar o papel de Sadi Cardoso, que alm de gaiteiro, foi tambm

    professor. Seu discpulo, Orlandinho Rocha, hoje um dos maiores responsveis pela divulgao da tcnica

    da gaita-ponto sulista.J na Europa, a sanfona um instrumento que gradualmente adquire certa respeitabilidade

    acadmica. Na Itlia e Frana, por exemplos, h diversas academias especializadas no ensino de sanfonas,

    entre as quais a de oito baixos. Isto sem contar na grande profuso de livros tcnicos publicados, sobretudo na

    Frana, Itlia, Alemanha, Espanha, Irlanda, Inglaterra, Estados Unidos, Repblica Dominicana, entre outros

    pases onde se destaca. At mesmo cursos on-line j existem como o da Academia de Mantice na Itlia.

    No entanto, duas coisas podem se constatar em todas estas fontes: primeiramente, a ausncia de

    informaes a respeito da Sanfona Brasileira: suas tcnicas, sua msica, seus estilos e interpretes. Em segundo

    lugar, tais fontes no constam de informao a respeito da fabricao das sanfonas brasileiras que por sua vez,no seguem o mesmo padro de construo e afinao das sanfonas europias e americanas.

    Dado a escassez literria em relao sanfona de 8 baixos no Brasil, tanto o estudante srio como

    o pesquisador e mesmo o leigo curioso, so obrigados a recorrer a uma bibliografia estrangeira, na maior parte

    das vezes inapropriada.

    Exceo regra, so as apostilas lanadas pela Editora Canto Sul, preciosos

    trabalhos que possibilitam a msicos e curiosos uma referncia em relao gaita-ponto de8 baixos no estilo gacho.

    A sanfona no sul

    Nesta parte, dedicada regio sul, chamaremos sempre asanfona de 8 baixosporgaita-ponto de 8

    baixos, em respeito terminologia adotada pelos sulistas.No sul, os acordeons de botes so

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    chamados genericamente degaita-ponto, enquanto os acordees de teclado so chamados de gaita-

    piano.

    A msica instrumental da gaita-ponto:

    No sul do Brasil, especialmente no Rio Grande, a gaita-ponto est indissociavelmente relacionada

    interpretao de temas musicais que acompanham as danas tradicionais gachas. Atravs de selos musicais

    regionais como a Casa A eltrica, a msica da gaita ponto comea a ser registrada ainda no segundo

    decenio do sculo XX.

    provavel que a gravao original de Boi barroso, em 1914, por Moiss Mondadori, seja o marco

    zero da histria oficial da gaita-ponto brasileira. Tambm conhecido por Maestro Cavalheiro Mois

    Mondadori, foi indubitavelmente um percursor na discografia da gaita-ponto de 8 baixos nvel nacional,

    tendo regravado esta msica em 1974 convite de Marcus Pereira para a coleo Musica Popular do Sul.

    (exemplo 1)

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    Nesta interpretao, podemos observar o uso sistemtico de teras paralelas, o falsobordo. De

    acordo com o maestro Guerra-Peixe, foi um recurso musical introduzido pelos ingleses, sob o nome de gymel.

    (GUERRA-PEIXE, 1968, P.242)

    Mais tarde, esta tcnica se estendeu Pennsula Ibrica, acabando por se tornar um artifcio

    muito comum de harmonizao a duas vozes na msica tradicional brasileira, e tambm influenciando a

    tcnica de outros instrumentos populares tradicionais tais como a viola e a rabeca, alm da msica vocal.

    A afinao da gaita-ponto

    Embora o termo gacho seja utilizado como gentlico para os nascidos no Estado do Rio Grandedo Sul, originalmente esta palavra designa pessoas ligadas pecuria nos campos naturais do Vale do Rio da

    Prata, os famosos pampas. Nesta regio, outrora sede de fortes conflitos, cuja histria remonta s misses

    jesuticas do sculo XVI e geograficamente tambm inclui a Argentina, Uruguai e Paraguai.

    Nesta regio, fruto de um amlgama de ndios com europeus, sobretudo portugueses aorianos e

    espanhis, e mais tarde imigrantes italianos e alemes, onde se desenvolve uma cultura caracterstica e

    consequentemente uma msica de estilo prprio, na qual a Sanfona de oito baixos (gaita-ponto) possui um

    papel de destaque.

    De acordo com o maestro gacho Tasso Bangel,

    A gaita de botes, com sua escala diatnica no modo maior, destacou-sena msica gacha, assim como o encadeamento tonal do baixo. (BANGEL, 1989, 30)

    J na dcada de 1940, o musiclogo Paulo Luis Viana Guedes, citado por Lessa e Cortes, afirma

    que a influncia da gaita-ponto na msica gacha era de tal modo marcante, que muitas caractersticas

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    melodicas da msica tradicional dos pampas s poderiam ser explicadas pelo uso da gaita ponto. Em suas

    palavras,

    a msica do Rio Grande do Sul, tal como a conhecemos hoje, um

    prolongamento da gaita. ( LESSA E CORTES, 1975, p.64)

    A comear pela ausncia de linha cromtica-- j que a gaita sulista de 8 baixos e duas carreiras,

    eminentemente diatnica, ou seja, como se fosse um piano que no possuisse sustenidos e bemois, isto ,

    sem as teclas pretas. Sendo assim, a escolha de acordes, os movimentos meldicos e muitos outros traos da

    musical tradicional gacha teriam se desenvolvido sob a influncia da afinao diatnica brasileira, que a

    mais difundida na gaita-ponto de 8 baixos sulista. Esta afinao tambm popularmente denominada de

    natural, e possui duas variantes, pequenas diferenas entre os modelos Hering e os modelos Todeschini,

    conforme pode-se examinar na planta abaixo.

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    Hohner Club com duascarreiras e meia tbua de afinao da Honer Club

    confeccionado por

    Jax Delaguerre

    http://www.hohnerusa.com/

    http://www.delaguerre.com/delaguerre/pedagogy/club/scales.html

    OITO BAIXOS (mo esquerda)

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    Acima, as notas foram dispostas da direita para a esquerda, conforme o sentido dos baixos, com a

    carreira interna (primeiro sistema) e a carreira externa (segundo sistema).

    Repare que os baixos da sanfona so, na verdade, uma disposio alternada de baixos e acordes.

    O sistema de escrita que adotamos coincide com o sistema de grafia aprovado pela Conveno Internacional

    de Milo, de 1950. Neste sistema, o baixo escrito em sua oitava real enquanto os acordes so escritos apenas

    com a nota fundamental, uma oitava acima. Trata-se de um sistema de certa praticidade, que facilita tanto o

    trabalho de grafia musical quanto a leitura. No caso especfico da sanfona de 8 baixos, trata-se de um

    instrumento que se desenvolveu ao largo da grafia musical, num universo onde predomina a transmisso oral,

    no s no Brasil, bem como no exterior. Portanto no h uma notao universal aplicada ao instrumento.

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    Os sinais de arcadas foram utilizados para representar a alternncia entre a abertura e o

    fechamento do fole que no caso da sanfona de 8 baixos, algo que modifica a sonoridade, por esta utilizar o

    sistema de voz trocada ou sistema bissonoro, isto , ao abrir o fole, produz-se uma nota, e, ao fechar, outra.

    A gaita em versos

    O amor do povo do Rio Grande do Sul Gaita-ponto est presente de forma intensa no

    cancioneiro gacho. Em Gaitinha mimosa de Berenice Azambuja e Paulina Seltzer, ouvimos os seguintes

    versos: Esta minha gaita velha, toda cheia de remendo/No alugo e no empresto/morro de velho e no

    vendo/Quando chego nos Fandangos/abro a gaitae j me acho/saio tocando a Vanera, puxando a minha

    oito baixo/Todo mundo est notando/que ela est desafinada/torniquete no tem mais/e as gaiteiras esto

    quebradas/A gaita do tempo antigo/causou muito sofrimento/ j fez muita prenda linda/desmanchar seu

    casamento/No dia que eu morrer, me faa um favor buenacho/eu quero um caixo bem grande/pra levar

    minhaoito baixo.(exemplo 2)

    Na cano Gaita velha do meu pai de Teixeirinha, a reverncia gaita tambm est presente:

    "ouo o tinido daoitobaixos/Da gaita velha do seu Ary/Fazendo eco dentro da noite/O som mais belo que j

    ouvi. (exemplo 3)

    Ou ainda, em O negro da gaita, composio de Gilberto Carvalho e Airton Pimentel sobre um

    poema de Dante Ramon Ledesma: Mata o silncio dos mates, Acordeona voz trocada/ E a mo campeira do

    negro, passeando aveludada/Quando o negro abre essa gaita/Abre o livro da sua vida/ Marcado de poeira e

    pampa/Em cada nota sentida. (exemplo 4)

    Tio Bilia e a msica da gaita-ponto:

    Tio Bilia, (5 de Agosto de 1906 19 de Agosto de 1991) foi, alm de interprete notvel da gaita-

    ponto de 8 baixos, um compositor influente, cuja obra se faz presente de forma incisiva no repertrio da gaita

    sulista. Conforme explicam os Irmos Bertussi, importante dupla da gaita gacha, Tio Bilia

    traz na 8 baixos o estilo guapo da regio missioneira.(Bertussi, 1968, contracapa)

    Natural de Santo ngelo, cidade na qual aps sua morte foi erguido

    um busto em sua homenagem com os seguintes dizeres:

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    Homenagem ao gaiteiro santoangelense Tio Bilia que se projetounacional e internacionalmente no mundo da msica, sendo conhecido como omestre da gaita-ponto.

    Nas palavras de Valter Portalete,Tio Bilia um autodidata que fez escola.Frase bem acertada,

    j que sua obra tornou-se importante referncia de repertrio do estudioso da msica gacha instrumental,

    sobretudo aquele que quer aprofundar-se na msica da gaita-ponto. Muitas de suas composies so

    estilizaes ou adaptaes de temas instrumentais que acompanham as danas tradicionais gachas, e a gaita

    se desenvolve em estilo solista, como instrumento principal do baile gacho.

    Poucos gneros musicais gachos so autctones, sendo quase em sua totalidade adaptaes de

    danas centro-europeias do sculo XIX, perodo de forte atividade colonizadora nesta regio.

    Entre os ritmos de compasso ternrio (trs tempos) podemos destacar a Valsa, a Mazurca, a

    Rancheira e o chamam.

    A Valsa, de origem austraca, um ritmo muito difundido, que se espalhou por muitas culturas.

    Como exemplo de Valsa gacha composta para gaita-ponto, podemos citar a Valsa dos Imigrantes de Tio

    Bilia.

    (exemplo 5)

    A rancheira, de origem argentina, outro gnero que assim como a Valsae aMazurca, ultrapassa

    fronteiras territoriais. Surgida nos bailes de fandango que os pees organizavam nos ranchos nas beiras de

    estrada, uma variante mais acelerada e recortada da Mazurca. Segundo o violonista gacho Maurcio

    Marques,

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    a rancheira, uma mazurca executada nos ranchos para queseja danado. Isto vai aumentando o andamento e tem a rancheira que nsconhecemos.

    O toque bsico de Rancheira pode ser ouvido no tema tradicional Serra de Cima adaptado por

    Tio Bilia. (exemplo 6)

    Mais tarde, Tio Bilia compe a rancheira de muito sucesso, 5 de Agosto, dia do meu aniversrio,

    tambm gravada por Borguetti. A primeira parte desta pea consiste em uma variao meldica sobre Serra

    de Cima, pois conforme afirmamos anteriormente, o dilogo com a msica tradicional gacha uma

    constante em sua obra.

    (exemplo 7)

    A maior parte das gravaes de Tio Bilia foi realizada numa Todeschini de 8 baixos modelo

    nico 300, afinada em Eb/Ab, conforme mostra a foto seguinte. Foi um modelo de gaita-ponto de 8 baixomuito apreciado pelos profissionais por possuir um som forte (trs palhetas ou gaitas por nota) e bem definido.

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    Na dcada de 60, utilizavam este modelo, alm de Tio Bilia, diversos gaiteiros de norte a sul do pas como

    Virgilio Nunes, Z Alves, Gerson Filho, Negro dos 8 baixos e Z Calixto.

    Chapu e sanfona Todeschini que pertenceram a Tio Bilia

    Entre os ritmos de compasso binrio, esto alguns dos gneros mais interpretados pelos gaiteiros

    sulistas, tais como a Vanera, o Vanero, a polca, o contrapasso, o xote, o bugio e a milonga.

    Vanera, segundo alguns pesquisadores, seria uma corruptela de habanera. Este gnero de dana

    se origina em Cuba, atravs dos escravos africanos, e da atravessa o mar e chega Espanha, onde ganha

    popularidade. Muitos compositores eruditos do sculo XIX se inspiraram na habanera. Talvez o exemplo mais

    difundido seja a Habanera da pera Carmen do compositor francs Georges Bizet.

    A habanera se caracteriza pelo movimento moderado, compasso binrio e a tpica figura de

    colcheia pontuada seguida de semicolcheia e duas colcheias, a qual a vanera gacha manteve intacta.

    A vanera era um dos gneros favoritos de Tio Bilia, conforme atestam diversas obras deste

    gaiteiro como Vanera da era de 24, Vanera pro mundo inteiro, entre tantas. Na espirituosa A volta da

    vanera grossa, o grosso do ttulo uma aluso regio grave da gaita-ponto, amplamente utilizada nesta

    msica, criando um efeito inusitado.

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    (exemplo 8)

    Afinao: natural Eb/Ab

    Derivado da Vanera, s que em andamento mais rpido e em ritmo mais acentuado o Vanero,

    que talvez seja o mais divulgado dos ritmos gachos, chegando at a influenciar o forr moderno, com o

    surgimento do gnero forronero, acasalamento do forr com o vanero.

    Muito divulgado entre os gaiteiros, quase um hino da gaita-ponto sulista o Vanero gacho

    de Tio Bilia.

    (exemplo 9)

    Outro gnero europeu que foi muito influente em todo o Brasil, foi a Schottisch. A princpio,

    uma dana dos sales aristocrticos do segundo reinado, sendo aos poucos difundida atravs do povo, gerando

    no Brasil trs variantes distintas. O chote gacho, o xtis carioca e o xote nordestino, cada qual com

    caractersticas diferentes, mas derivados do original scottish. Como contribuio de Tio Bilia ao xote gacho,

    podemos citar o Chote correntino

    .

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    (exemplo10)

    .

    J o bugio, um curioso toque de sanfona inspirado no ronco do macaco guariba, mais conhecido

    no sul como bugio. De efeito onomatopaico, todo executado nos baixos, produzindo um som estrondoso que

    remete ao ronco do bugio, outrora muito presente nos pampas. Diz um antigo ditado popular que: Guariba

    que ronca na serra, chuva que cai na terra.

    Tio Bilia soube se valer deste inusitado motivo do folclore gacho para compor seu bugio das

    oito baixos.

    (exemplo 11)

    Muitos msicos gachos j renderam tributos e homenagens Tio Bilia, como Renato Borghetti

    em seu lbum Ao ritmo do Tio Bilia de 1999, baseado em composies do gaiteiro.

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    Capa de Ao ritmo de Tio Bilia de Renato Borguetti

    Virgilio Nunes Pinheiro e o limpa-banco.

    J Virgilio Nunes Pinheiro, um representante dos pagos de Cima-da-Serra, e foi porta-voz de

    outro gnero caracterstico da msica gacha, o limpa-banco. Muito semelhante ao vanero, para muitos

    especialistas da msica gacha, nada mais do que um outro nome desta mesma dana. J uma outra vertente

    de pesquisadores associa a limpa-banco a uma variante da polca, a polca limpa-banco. O fato que o nome

    deste gnero seria derivado de limpar o banco, sendo uma dana de tal modo envolvente, que no permitiria

    a ningum ficar sentado no salo, como neste exemplo, Galpo dourado de Virgilio Pinheiro, onde neste

    caso a marcao rtmica sugere algo mais prximo do vanero.

    (exemplo 12)

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    Tendo sua msica menos documentada que a de Tio Bilia, Virglio Pinheiro acabou por no

    tornar-se referncia to marcante para os jovens intrpretes da arte da gaita-ponto. Importante registro

    histrico o lbum Baile Gacho Tio Bilia e Virgilio Pinheiro com conjunto, discos Copacabana, de

    1968. Neste documento valioso da msica gacha tradicional pode-se ouvir a arte deste gaiteiro tocando,

    alm de limpa-bancos, polcas, e as j mencionadas rancheiras, valsas e ainda schottischies, mais tarde

    rebatizadas como chotes.

    A polca foi, a exemplo da valsa, outro gnero muito influente do sculo XIX. De origem tcheca,

    se espalha por toda a Europa, no tardando em chegar s colnias. Com o ritmo de dois tempos bem marcado,

    est presente at hoje na msica folclrica europia. De tal modo a Polca contagiou os sales europeus que

    no tardaria a chegar aos sales brasileiros, diluindo-se posteriormente na msica nacional. Virgilio Pinheiro

    recolheu e adaptou a Polca tradicional Lembrana do morro negro.

    ( exemplo13 )

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    Sendo um instrumento amplamente difundido na Regio Sul, ainda podemos destacar como

    interpretes da gaita-ponto em estilo tradicional, Eurides Nunes, Beto Caetano, Valdir Santos e Sadi Cardoso,

    entre outros.

    A influncia Aoriana:

    Renato Borguetti, em depoimento registrado na srie A msica brasileira deste sculo por seus

    compositores e interpretes defende a importncia dos historiadores Barbossa Lessa e Paixo Crtes , e

    ressalta que a influncia aoriana

    se caracteriza muito na dana, por exemplo, Cana-verde, Balaio,Pezinho, so msicas muito singelas(...) msicas de roda, msicas dedana.(BORGUETTI,2000)

    parte destas danas integram o Fandango, que para o sulista, seria um conjunto de vrias danas. No

    acompanhamento dos fandangos, a Gaita-ponto ou a gaita-piano, desde a sua insero na msica gacha,

    passa a constituir parte imprescindvel.

    A forte colonizao aoriana que se irradia nesta regio sobretudo a partir de fins do sec XVIII.

    Os aorianos chegaram em grande nmero e deram um toque especial na futurapersonalidade do estilo gacho com seu fandango insular, cantado e danado nosgalpes e ramadas. (BANGEL, p.18)

    Enfim, dentro do vasto manancial da msica sulista, a gaita ponto, sobretudo a de oito baixos se

    expressa, sendo talvez, o instrumento mais caracterstico, ao lado do violo, e eventualmente acompanhado

    pela percusso, onde o bombo legero se junta aos palmeados e sapateados.

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    A sanfona no nordeste

    O forr instrumental

    Esse cabra quando toca osoito baixos/ que o povo gosta, que o povo gosta/maso roncado dos baixo que

    o fole dele faz/ que o povo gosta, que o povo gosta/ neste pagode, todo mundo se sacode/ um forr pra ser

    do bom/ tem que ter ump-de-bode.

    (Sussuanil / J. B. de Aquino)

    (exemplo 14)

    Assim como no Sul, o pequeno acordeom de 8 baixos, que nesta regio atende pelo nome de

    Sanfona de 8 baixos ou fole de 8 baixos, (embora outras denominaes possam ocorrer), tambm surge de

    forma freqente na literatura oral, sobretudo em letras de msica, e ser um dos instrumentos mais

    caractersticos da msica nordestina tradicional.

    A sanfona nordestina apresenta um estilo que lhe peculiar, do qual poderamos apontar algumas

    caractersticas.

    A mo direita tem um papel preponderante na execuo de melodias geis, lembrando, por vezes,

    a tcnica de instrumentos de sopro, e se distinguindo em muito do estilo sulista, onde as mos direita e

    esquerda formam um todo intrnseco. Dificilmente os baixos da mo esquerda so menos utilizados como

    acompanhamento marcado, ao contrrio do estilo sulista, onde o baixo marcado da mo esquerda quase

    imprescindvel.

    O uso do fole mais contido, contrastando com o estilo sulista, onde os sons so tocados, de

    modo geral, com o fole mais aberto.

    Tambm podemos notar o uso de harmonias e melodias intrincadas devido particularidade da

    afinaotransportada, que veremos mais adiante.

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    Notem no exemplo seguinte, o solo Variaes de Z Calixto, que retrata bem estas

    caractersticas diferenciadas da sanfona de 8 baixos no estilo nordestino.

    (exemplo 15)

    Por outro lado, o uso dos baixos pode ser muito ativo melodicamente, como em Recordando Macara de

    Joo Silva e Raymundo Evangelista, na interpretao de Bastinho Calixto, que se utiliza de um interessante

    efeito de chamada-e-resposta, entre as mos direita e esquerda, muito utilizado por sanfoneirosde 8 baixos

    nordestinos.

    (exemplo 16)

    Muito pouco se tem escrito sobre a origem da sanfona no nordeste. Hiptese corrente entre muitos

    musicos, que nos foi apontada pelo acordeonista Guilherme Maravilhas (Mar), de que a Sanfona teria sido

    introduzida nesta regio atravs dos soldados nordestinos que haviam travado lutas na Guerra do Paraguai, no

    final do sculo XIX. De fato, festas tradicionais nordestinas como Os Bacamarteiros aludem Guerra do

    Paraguai e seus Voluntrios da Ptria . Nestas festas, a sanfona se faz muitas vezes presente, acompanhada

    de tringulo e zabumba. A regio aonde havia se travado a guerra cisplatina, era uma rea onde a sanfona j se

    impunha com instrumento influente entre os gachos.Como observa Z Calixto, no nordeste h muitos

    sanfonas antigas sobretudo de procedncia italiana e alem, que sobreviveram at os dias de hoje. Assim, de

    marcas como a alem Koch, que no so mais confeccionadas em seus pases de origem, h exemplares

    espalhados por todo o Nordeste.

    A sanfona de 8 baixos em disco

    Com o seu grande sucesso, entre o final dos anos 40 e incio dos anos 50, Luiz Gonzaga pde

    abrir caminho para muitos msicos nordestinos de talento. Entre eles, os sanfoneiros de 8 baixos, modalidade

    que sempre incentivou. A comear por sua prpria formao musical estar associada ao instrumento, sendoseu pai, Janurio, seu irmo mais velho, Severino Janurio, e sua irm caula, Chiquinha Gonzaga, ilustres

    representantes da arte do fole de 8 baixos.

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    Luiz Gonzaga e Janurio Chiquinha Gonzaga Severino Janurio

    Em 1952, Luiz Gonzaga lana a msica Respeita Janurio, talvez a primeira cano popular quetenha o fole de 8 baixos como foco principal, verdadeira declarao de amor de Luiz Gonzaga e Humberto

    Teixeira por suas origens musicais.

    Quando eu voltei l do serto/eu quis mangar de Janurio/com meufole prateado/s de baixo cento e vinte/boto preto bem juntinho/como negoimpariado/mas antes de fazer bonito/de passagem por Granito/foram logo medizendo: De Itaboca Rancharia/de Salgueiro Bodoc/Januario o maior/ e foia que falou/ mei zangado Seu Jac: Luiz, respeita Janurio/ tu pode ser o mais

    famoso/mas teu pai mais tinhoso/e com ele ningum vai, Luiz/Luiz, respeita os oito

    baixos do teu pai. (GONZAGA, 1968)Exemplo 17

    Janurio, embora no tenha se profissionalizado, foi, tal como prega a letra de Respeita Janurio, um grande

    sanfoneiro. Grava algumas de suas composies em 78 rotaes no incio dos anos 50. Entre elas, Janurio

    vai tocar, faixa gravada em 1954, que traz em sua letra o clebre refro:

    Ai, ai, sanfona de oito baixos, do tempo que eu tocava l na beira doriacho, Ai, ai, sanfona de oito baixos, a cidade te acha ruim, mas eu no acho.

    (JANURIO, 1954)Exemplo 18

    Mas provavelmente o grande precursor do fole de 8 baixos nordestino em carreira profissional foi

    Gerson Filho. Nascido em Penedo, Alagoas, em 1928, e radicado ainda jovem no Rio de Janeiro, Gerson

    Argolo Filho foi discpulo de Z Moreno, famoso tocador de fole alagoano. Suas primeiras gravaes datam

    de 1953 pela gravadora Todamerica, e se estendem at quando veio a falecer, nos anos 80.

    Entre meados dos anos 50 e comeo dos anos 60, o fole de 8 baixos, ter seu momento histricomais glorioso. Neste perodo, surgem muitos sanfoneiros nordestinos que se profissionalizam e adquiriram

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    prestigio como Severino Janurio, Pedro Sertanejo, Manoel Mauricio, Abdias, Geraldo Correia, Camaro7e

    Z Calixto.

    Afinao Transportada- o segredo da sanfona nordestina

    . Os sanfoneiros de 8 baixos nordestinos podem ser divididos entre duas vertentes, a natural,

    ou arrasta-p, com os adeptos da afinao diatnica ou natural, e a transportada ou chorada com os

    adeptos da afinao cromtica ou transportada. A afinao natural, tambm denominada diatnica a

    afinao que os instrumentos j trazem de fbrica e corresponde utilizada nas regies sul e sudeste. J a

    transportada uma modificao da afinao natural que tpica da regio nordeste, conforme veremos

    adiante.Entre os representantes da sanfona em afinao transportada poderamos citar a maior parte dos

    sanfoneiros nordestinos tais como Abdias, Manuel Maurcio, Geraldo Corra, Adolfinho, Negro dos 8

    baixos, Heleno dos 8 baixos e Z Calixto.

    J no gnero nordestino diatnico, menos utilizado, um grande representante e divulgador desta

    modalidade ser Gerson Filho, que ser fiel esta afinao durante toda a sua carreira. Alm de Gerson Filho,

    podemos citar ainda o tambm alagoano Hermeto Pascoal, Betinho, Janurio (pai de Luiz Gonzaga), Landinho

    P-de-bode e Baianinho dos Oito Baixos.

    Se na afinao diatnica tradicional, as melodias tinham que transitar apenas entre sete notas (do,

    re, mi, fa, sol,, la, si, do), agora, com o uso do cromatismo entre os sanfoneiros nordestinos, a sanfona de oitobaixos e duas carreiras passava a contar com sustenidos e bemois. Se antes a sanfona era um piano s com as

    teclas brancas, agora se acrescentariam as teclas pretas8.

    7Mais tarde se tornaria uma referncia do acordeom de 120 baixos, abdicando dos 8 baixos.8 O uso da afinao natural tambm foi muito expandido na Regio Nordeste, no se restringindo unicamente ao modomaior (jnio), predominante na Regio Sul. Gerson Filho ser um grande explorador da potencialidade modal da sanfona

    de 8 baixos, como podem atestar os exemplos 22 e 23 (modo mixolidio) e o exemplo 25 (modo elio). No entanto, norepertrio sulista moderno, o modo menor tambm passa a ser utilizado como em Milonga para as misses de GilbertoMonteiro, exemplo 41.

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    A afinao transportada, bem como a afinao natural, possui duas tonalidades principais. Ao

    fechar o fole, d maior e l menor, as tonalidades principais. Ao abrir o fole, teramos f maior e r menor

    (relativo), tonalidades secundrias. Seriam as tonalidades mais fceis de serem utilizadas. Esta afinao, que

    poderamos chamar de padro, ou d/f.

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    Detalhes sobre a mo esquerda:

    Notas reais:

    9

    Notas escritas:

    Acima, as notas foram dispostas da direita para a esquerda, conforme o sentido dos baixos, com a

    carreira interna (primeiro sistema) e a carreira externa (segundo sistema).

    Assim como na afinao natural, a afinao de uma sanfona transportada pode estar situada em

    diferentes alturas. Muito utilizada nos anos 60 e 70, era a afinao transportada em l bemol r bemol,

    porm mantendo a mesma relao interna demonstrada na tabela acima. Eventualmente tambm se utiliza

    9Em alguns exemplares, o 1 boto ao fechar emite um acorde de r menor, ao invs de r maior, conforme o escrito..

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    afinaes em r/l e mi/l, mi/l, bem como fa/si bemol. Segundo Z Calixto esta ltima variante costuma ser

    chamada de cromtica ou si bemol. (CALIXTO, 2009)

    O transporte costuma ser feito por sanfoneiros que possuem grande percia manual, e um

    trabalho onde podem durar at meses. Entre os afinadores mais requisitados podemos para esta finalidade

    podemos citar Arlindo dos 8 baixos, Heleno dos 8 baixos e o prprio Z Calixto, que afina e cuida da

    manuteno de suas prprias sanfonas desde o comeo de sua carreira profissional at os dias de hoje.

    Isso possibilituou um alargamento do repertrio e a possibilidade de interpretar msicas que no

    tenham sido compostas originalmente para a sanfona de oito baixos. Como exemplo, choros como

    Brasileirinho de Waldir Azevedo, Espinha de Bacalhau de Severino Arajo e Escadaria de Pedro

    Raimundo ganham transcries nas mos de Z Calixto, que inclusive, ser o sanfoneiro que abrir caminho

    para esta tendncia na 8 baixos no final dos anos 50. (exemplo 19) Chorinhos como Apanhei-te cavaquinho

    de Ernesto Nazareth, ou Camundongo de Waldir Azevdo, alm de Marchas-rancho como Abre-alas de

    Chiquinha Gonzaga so recriadas por Abdias dos Oito Baixos.(exemplo 20)

    Com a afinao cromtica tambm surge uma nova modalidade de composio para a sanfona de 8

    baixos, explorando toda a exteno da escala cromtica, e cujo destaque estar nos forrs e choros. Ttulos

    como Benedito no choro de Adolfinho, ou Fala violo de Z Calixto, traduzem bem o clima da sanfona

    no choro. O choro Rato molhado de Pedro Sertanejo, se tornou uma das mais emblemticas composies da

    sanfona nordestina, e que j teve diversas gravaes como a de Z Mamede e sua gente esquentada, no disco

    Forr do Rato Molhado editado pela Copacabana em 1981.

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    ( exemplo

    21)

    Entre outros sanfoneiros que adotariam a afinao cromtica podemos destacar Luizinho

    Calixto(irmo caula de Z Calixto), Z Mamede, Arlindo dos Oito Baixos, Z do Xis, Truvinca, Negrinho

    dos 8 baixos e Z Honrio.

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    Poderamos supor de que a afinao cromtica na sanfona de oito baixos nordestina seja um

    resduo de influncia inglesa, j que entre ingleses, escoceses e sobretudo irlandeses comum o uso da

    afinao cromtica na sanfona de oito baixos, por eles chamada de melodeon.O mesmo no se d entre

    italianos e alemes, que usualmente utilizam os modelos diatnicos, mais prximos da afinao das sanfonas

    fabricadas no sul do Brasil. Na Frana, as sanfonas de 8 baixos pertencem categoria que os franceses

    denominam acordion diatonique(acordeon diatnico), assim como na Itlia (fisiarmonica diatnica) e

    Alemanha (diatonische handharmonika).

    No entanto, a afinao cromtica nordestina nos parece autctone, pois at o presente momento,

    s a encontramos no nordeste brasileiro. Em depoimento concedido por Z Calixto, este afirma que seu pai,

    Joo de Deus Calixto, tambm sanfoneiro, falava sobre uma outra afinao, anterior afinao transportada.

    Levantamos, portanto a suposio de que caso no seria esta, a afinao irlandesa (irish stile), ainda

    remanescente no serto paraibano? No entanto, ainda paira uma grande dvida quanto esta questo, j que

    todos os sanfoneiros que abordamos at o momento, ignoram a origem da afinao transportada e por sua vez,

    a bibliografia sobre este assunto em particular ainda desconhecida ou inexistente.

    A sanfona de 8 baixos e o forr p-de-serra

    Entre os primeiros a assumir a profisso de

    sanfoneiro, Pedro Sertanejo trabalhou por toda a vida no s

    como sanfoneiro mas tambm como afinador de sanfonas.

    Filho de Mestre Aureliano, lendrio sanfoneiro da

    Bahia, e pai de Osvaldinho do Acordeon, indubitavelmente Pedro

    Sertanejo apontado por msicos e historiadores como um pioneiro

    na divulgao desta modalidade da msica nordestina no Sudeste.

    Fundou a primeira casa de forr de So Paulo, o Forr do Pedro

    Sertanejo. Mais tarde, em 1964, criou o selo Cantagalo,

    especializado em msica nordestina.

    Em seu repertrio, arrasta-ps, polcas, rancheiras, mazurcas, baies, xotes e chros,entre outros

    gneros, sempre tocados com o sotaque tpico dos forros de p-de-serra, pois o forr antes de tornar-se um

    gnero musical definido era uma designao para o baile popular nordestino.Como bem exemplifica

    Oswaldinho do Acordeon,

    O Forr mais rpido que o Baio, semelhana s no compasso 2/4na pauta musical. O que conhecemos como Forr tem influncia do baio, xote,

    xaxado, do maracatu, do samba de roda, do arrasta - p e da ciranda. Meu paipopularizou os gneros musicais nordestinos intitulando como sendo Forr por

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    ser uma palavra fcil de falar e que identificava o encontro de nordestinos nosbailes populares. Quem divulgou o Baio foi Gonzaga, Forr foi Jackson doPandeiro e o Forr P de Serra foi Pedro Sertanejo. O Baio lento, forrsuingado e o P de serra ou arrasta p acelerado.

    http://www.ritmomelodia.mus.br/entrevistas/entrev%202003/09%20oswaldinho_acordeon/oswaldinhos_do_acordeon.htm

    .Para alguns pesquisadores, como o folclorista Cmara Cascudo, o nome forr seria derivado do

    termo forrobod. Esta expresso, de origem portuguesa, significa balbrdia, confuso. Forrobod ento

    passaria a ser entendido no Brasil, como uma gria para designar os festivos encontros populares do

    nordestino.

    Outra verso, recusada pelos historiadores, embora tenha sido divulgada por msicos do porte deLuiz Gonzaga e Sivuca, a de que a palavra forr seria derivada do ingls for all(para todos). Esta

    expresso teria surgido no incio do sculo XX, durante a construo da ferrovia Great Western em

    Pernambuco, Paraiba e Alagoas. Nesta ocasio muitos engenheiros e operrios ingleses se instalaram na

    localidade, para a construo da malha ferroviria nordestina.Quando os festejos ou celebraes eram

    populares, isto , abertas a todos os funcionrios da ferrovia e moradores das redondezas, fixava-se uma placa

    com os dizeres, for all. Obviamente, nessas festas tocavam-se danas da poca, sendo que boa parte dessas

    danas foram as fontes nutrientes do forr.

    Fato consumado ou no, mazurcas, valsas, schottishes (rebatizadas de xotes), polcas e tantos

    outros gneros de dana centro europeias de final do sculo XIX foram absorvidos e reinterpretados,

    formando um carter sonoro peculiar. Fenmeno parecido ocorreu no Rio de Janeiro no final do sculo XIX,

    quando surge o choro. Desse modo, tanto o choro como o forr seriam , ao menos inicialmente, mais um

    estilo interpretativo, uma forma de tocar danas de poca por um determinado conjunto instrumental

    tpico, do que um gnero musical especfico.

    AS DANAS DO FORR

    Entre os gneros que compe o repertrio de forr instrumental, o baio talvez, o mais

    difundido. Introduzido no Sudeste por Luiz Gonzaga, no incio dos anos 40, se caracteriza pelo ritmo

    sincopado e pela utilizao dos antigos modos eclesiasticos, conferindo um sabor peculiar s melodias deste

    gnero. Entre as origens mais provveis do termo baio, duas delas so as mais aceitas, conforme esclarece o

    musiclogo Baptista Siqueira: oBaio de- viola, um certo jeito de acompanhar a cantoria nordestina atravs

    da viola de arame, e o bahiano, dana saracoteada j descrito por Silvio Romero e Euclides da Cunha ainda

    no sculo XIX.(SIQUEIRA, 1978,p.60)

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    Gerson Filho foi um precursor da sanfona de 8 baixos no Baio, gravando, j em 1953, pelo selo

    Todamerica, no Rio de Janeiro, o baio Catingueira do serto.

    . .

    Toque bsico de baio

    Como exemplo ilustrativo de Baio tocado na sanfona, podemos citar a msica Corao do

    norte de Pedro Sertanejo lanada originalmente em 1962. Vale notar, alm das teras e sextas paralelas (falso

    bordo), a melodia construda sobre o modo de r mixoldio (modo maior com a stima abaixada).

    Na interpretao de Pedro Sertanejo, nota-se tambm a preciso e velocidade caracterstica dos

    sanfoneiros nordestinos

    ( exemplo 22)

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    Ainda nos anos 50, o forr se delinearia nos seus contornos, em composies como Forr de

    Man Vito e Forr de Limoeiro.O ritmo bsico do forr enquanto gnero musical definido10 pode ser

    traduzido por este toque de zabumba:

    O forr tornar-se-ia um dos mais fortes meios de expresso do sanfoneiro de 8 baixos nordestino.

    Gnero sincopado, com maior flexibilidade rtmica que o baio, e melodias muito adornadas, construdas

    normalmente em grupos de semicolcheias, constituiriam um estilo muito particular de interpretao, como

    mostra o forr Solte o bode do sanfoneiro alagoano Gerson Filho.

    (exemplo 23)

    10

    Ressaltando que a palavra forr, como j salientamos anteriormente, tem um sentido duplo de gnero musicalespecfico e estilo, maneira de interpretar danas por certo conjunto instrumental tpico.Deste modo, considera-se forr,um gnero, assim como o Baio, o xaxado, a valsa, o frevo e o choro. Juntos, estes gneros compe o estilo forr.

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    Outro gnero importante no forr instrumental, o xote, que em sua variante nordestina possui o

    acento no segundo tempo mais marcado. O xote em f de Z Calixto, exemplifica bem o sotaque que o povo

    nordestino imprimiu este gnero, conferindo-lhe uma acentuao distinta do Chote gacho, e uma forte

    tendncia a subdiviso ternria. Neste exemplo, a presena de dualismo modal (mixolidio/jnio) retrata um

    colorido meldico prprio nas melodias tipicamente nordestinas.

    ( exemplo 24)

    Tambm originariamente europia, a quadrilha tornou-se no Brasil parte indissocivel da

    comemorao das festas juninas. Introduzida no Brasil na monarquia, esta dana de origem francesa(quadrille) fez sucesso nos sales da corte, caindo mais tarde no gosto popular.Tambm conhecida por

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    Arrasta-p, se caracteriza pelo ritmo binrio com acento no segundo tempo. Sua dana possui uma srie de

    evolues, normalmente orientadas por um animador, o marcador de quadrilha.

    comum em todo o Brasil, no sendo portanto, um legado exclusivo da Regio Nordeste. Entre

    os sanfoneiros de oito baixos desta regio, um gnero obrigatrio.

    Muito identificado com o gnero devido ao lbum Quadrilha brasileira, lanado originalmente

    pela RCA em 1967, Gerson Filho chegou a receber a alcunha de rei das oito baixos nas quadrilhas. Este

    disco se encontra em catlogo permanente e um dos grandes xitos comerciais da sanfona de 8 baixos

    brasileira. Vale notar como detalhe desta capa, que embora o instrumento da ilustrao um acordeom de

    teclado, na gravao do disco prevalece o uso da sanfona de botes. Pequenos descuidos da indstria

    fonogrfica.

    Um bom exemplo de quadrilha na sanfona de 8 baixos A pisada esta de Gerson Filho,

    registrada no disco Oito baixos brasileiros de 1971.

    ( exemplo 25)

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    O frevo, embora no seja um gnero normalmente ligado ao forr, sempre fez parte do repertrio

    dos sanfoneiros nordestinos. Espcie de Marcha - Rancho em andamento extremamente acelerado, o Frevo

    foi uma modalidade de canto e dana surgida no Carnaval de Recife, nos fins do sculo XIX.De acordo com o

    Vocabulrio

    Pernambucano de Pereira da Costa, o termo frevo teria sua origem em frever, corruptela de ferver, dado

    efervescncia natural provocado pelo passo, a dana caracterstica que acompanha a msica. Dado a

    dificuldade tcnica apresentada pelo gnero, consiste numa verdadeira prova de fogo para o sanfoneiro.

    Arlindo dos 8 baixos, um aclamado sanfoneiro pernambuco que tem dedicado parte do seu repertrio aos

    frevos. E entre os que gravou, est o emblemtico ( e obrigatrio) Vassourinhas de Matias da Rocha e Joana

    Batista Ramos.

    ( exemplo 27)

    Outro gnero fundamental o samba. Apesar de antigo termo utilizado no Nordeste como

    sinnimo de forr, a palavra samba tambm designa o gnero musical, um pouco diferenciado de sua forma

    mais difundida, a carioca. Conforme explica opesquisador e crtico Jos Teles sobre o samba:

    No Nordeste, entretanto, ele (N.A. o samba)foi adaptado para a sanfona, o tringulo, azabumba, mais violes, banjo, instrumentos de sopro. Era chamado samba de matuto, ou sambade latada. A latada, no caso, era uma extenso da casa, ou "puxada", coberta por folhas de

    flandres, onde aconteciam os forrs, ou sambas. O samba de latada teve como um dos maioresintrpretes o sanfoneiro Abdias, seguido pelo paraense Osvaldo Oliveira. (TELES, 2007)

    J o samba-matuto, um subgnero do samba, aparentado com o lundu e o maxixe.

    Um bom exemplo de samba matuto a msica Oito baixos fofoqueiros de autoria de Z

    Mamede e Dunga, em verso gravada por Baianinho da Sanfona no lbum Forr sem briga vol.2, de 1978.

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    ( exemplo 28)

    Menos freqente no repertrio dos sanfoneiros nordestinos so os gneros em compasso ternrio.

    Ainda assim, rancheiras e mazurcas aparecem eventualmente e sempre com uma abordagem ritmica prpria.

    Estas danas austeras ganham entre os nordestinos um ritmo sincopado com forte percussividade afro-

    indgena, tornando os mais saltitantes que as suas matrizas europias e das suas adaptaes sulistas. Isto

    pode ser notado no acompanhamento rtmico de Raposa Magra do sanfoneiro Francisco Abdias, na

    interpretao de seu filho, Abdias, no disco Abdias no Forr lanado em 1960 pela Columbia.

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    ( exemplo 29)

    A valsa, embora raramente, tambm aparece no repertrio dos sanfoneiros nordestinos, ainda que

    no fizesse parte dos forrs. Como afirma Z Calixto em entrevista,

    Se um sujeito pedisse uma valsa era at capaz de ter imbuana 11 no

    salo.(CALIXTO, 2007)No entanto, bailes parte, Z Calixto um interprete notvel de valsas-choro Assim, temas

    identificados com a valsa-choro 12como Rosa de Pixinguinha e Saudade de Janete de Joo Batista dos

    Santos foram gravados por Calixto.Gerson Filho tambm foi um esmerado interprete de temas valseados, s

    que mais simples, prximos sensibilidade da msica rural. Mariazinha e Minha boneca, ambas de

    Gerson Filho, so exemplos representativos. Em termos gerais, a valsa nordestina se aparenta mais valsa da

    regio sudeste.

    11Imbuana confuso; briga; expresso tpica da Paraba.12Modalidade de valsa tpica do Rio de Janeiro e que compe o repertrio dos choros.

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    Exemplo 30

    Enfim, sanfona frente, somada forte massa percussiva de zabumba, tringulo e agog

    constituem a formao bsica do grupo regional que normalmente acompanha a sanfona. Muitas vezes, a

    instrumentao se faz completa por um violo de 7 cordas fazendo as baixarias e o cavaquinho ajudando na

    marcao ritmica. Este conjunto chamado regional seria a instrumentao bsica do que hoje chamamos

    forr instrumental, vertente doforr p-de-serra, que chegou a ser muito popularizada, devido a refinada

    qualidade musical de seus intrpretes, entre o princpio dos anos 60 e fins dos anos 70.

    Novas danas

    O forr instrumental foi absorvendo, ao longo das decadas de 70 e 80, os modismos passageiros e

    as tendncias mercadolgicas. Entre as novas danas que so incorporadas ao forr instrumental, esto o

    merengue e o carimb.

    Em 1970, Abdias lana o disco Na ginga do merengue, introduzindo definitivamente no

    universo da sanfona de 8 baixos nordestina esta dana de origem dominicana13. Aos poucos, com a boa

    aceitao do pblico, o merengue passa a fazer parte do reportrio de grande parte dos sanfoneirosnordestinos. O ento menino Luizinho Calixto, irmo caula de Z Calixto, grava em seu disco de estria

    Vamos danar forr de 1975, a quase anedtica Forr merengue de Bastinho Calixto, cuja letra mostra

    um leve tom de crtica j eminente transformao do forr: Chamei minha nega, pra danar comigo o

    merengue, mas t sentindo que no forr ela bem melhor.

    O carimb, diretamente do norte do pas, tambm passa, pouco a pouco, a integrar o repertrio

    dos sanfoneiros. Novamente Abdias um ponta de lana. Em seu disco Tem fusu, lanado em 74, grava a

    13Vale citar que na Repblica Dominicana, a sanfona de 8 baixos um instrumento de grande relevncia. Referncias domerengue tpico como Ttico Henrquez e Arsnio de la Rosa so grandes sanfoneiros de 8 baixos.

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    msica Carimb, onde divulga para o pblico dos forrs, a chegada da tradicional dana paraense aos

    ps-de-serra.

    Migrao Nordestina no Sudeste ponte entre a sanfona nordestina e a msica urbana carioca

    O alagoano Hermeto Pascoal, assumiu sua primeira funo de msico profissional tocando

    sanfona de oito baixos nas festas de p-de-pau, ainda menino, nas imediaes de Lagoa da Canoa, sua terra

    natal. Mais tarde, j emigrado para o sudeste, Hermeto substituiria a sanfona pelo acordeom de 120 baixos. O

    acordeom de teclado, com mais recusos do que a sanfona, era capaz de tocar em todas as tonalidades, alm de

    ser instrumento mais cultuado nas capitais, e permitiria a Hermeto uma maior expanso profissional.O mesmo

    que teria feito, uma dcada antes, no incio dos anos 40, Luiz Gonzaga, o Rei do Baio. Filho de Janurio

    Gonzaga, sanfoneiro de oito baixos, Luiz Gonzaga acabou adotando o acordeom de 120 baixos, que embora

    mais pesado, possua o rendimento mais fcil. Nas palavras de Osvaldinho do Acordeon,

    Nos cassinos da dcada 40 os sanfoneiros tocavam tango, polca e valsa. At ento Gonzagas tocava sanfona com influncia nordestina para estudantes nordestinos que tinham saudade dasua origem.

    Segundo Z do Norte, foi atravs do programa Papel Carbono, de Renato Murce, na Radio Clube

    do Brasil, que Luiz Gonzaga conquista o prmio com a msica chamego que definitivamente lhe

    consagraria e abriria espao para o jeito nordestino de tocar sanfona, ainda no comeo da dcada de 40.

    Na primeira leva da sanfona de 8 baixos nordestina no Rio de Janeiro, destaca-se, alm da famlia

    Gonzaga, o j citado sanfoneiro alagoano Gerson Filho. Nascido em 1928, no municpio de Penedo, em

    Alagoas, Gerson Filho radicou-se ainda jovem no Rio de Janeiro. Em 1954, vence o concurso de calouros da

    Radio Guanabara, onde passa a trabalhar. Seu Baio em Caxias, parceria com Estanislau Silva, gravado em

    1954, narra uma festa onde se tocava o Baio no municpio fluminense de Duque de Caxias onde, alis, a

    famlia Gonzaga possuia um famoso stio, outrora sede de muitos forrs.L vem o trem, vou pra Duque de

    Caxias/cantar Baio no terreiro do Matias/l tem sanfona e tem mul/os home bom no Arrasta-p.

    (exemplo 31)

    At o final dos anos 70, a exceo de poucos selos como Mocambo e Rosenblit, em Pernambuco,

    boa parte da indstria fonogrfica brasileira se concentrava no eixo Rio-So Paulo. Deste modo, quase a

    totalidade dos sanfoneiros nordestinos so gravados em disco nas capitais do sudeste, sobretudo no estdio

    Hawai no Rio de Janeiro que prestava servio para diversos selos, tais como; Esquema, Somil, Copacabana,

    Som, Itamaraty, Cid, Continental, etc. Estas gravaes atendiam basicamente ao pblico nordestino, tanto nas

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    capitais do sudeste quanto como nas capitais do nordeste, e eram embaladas em discos que traziam apenas o

    nome do artista principal, se caracterizando pela ausncia completa de detalhes sobre as gravaes, como

    nome dos msicos participantes ou arranjadores, tornando o trabalho de documentao muito dificultado.

    Durante esse perodo era comum que os bailes de forr ainda fossem animados por sanfoneiros de

    oito ou cento e vinte baixos em temas instrumentais, que segundo Osvaldinho do Acordeon, eram chamados

    por Luiz Gonzaga de sambas de fole.Foi este fato, inclusive, que permitiu que muitos sanfoneiros como

    Gerson Filho, Abdias, Z Calixto e Geraldo Correa, entre outros, tenham gravado regularmente ao longo de

    suas carreiras.

    Z CALIXTO

    Jos Calixto da Silva, (11-8-35) nascido em Stio de Araticum, no municpio de Campina Grande,

    ter um papel histrico de grande relevncia na valorizao da Sanfona de 8 baixos nordestina. Alm de ser

    um dos interpretes pioneiros na divulgao deste instrumento, sempre se destacou por seu virtuosismo,

    tornando-se, ao lado de Abdias, um dos maiores nomes do fole de 8 baixos.

    Contando sobre a sua infncia no serto paraibano, Z Calixto afirma que

    - naquela poca nem rdio existia na minha casa.Escutava pela boca do povo,msica naquela poca eram mais msicas de Carnaval, marchinhas,sambinhas.Quando tinha meus treze, quatorze anos (...) a surgia j msicas de LuizGonzaga.(CALIXTO, 2007)

    Seu pai, Joo de Deus Calixto, (Seu Dideu), se torna sanfoneiro, e passa a tocar nos bailes dalocalidade. Z Calixto, o filho mais velho, acompanha o pai tocando um instrumento de percusso, o reco-reco

    .J aos doze anos, Z Calixto passa a tocar a sanfona em bailes, normalmente acompanhado apenas por um

    pandeirista.

    O dinheiro era bem curtinho, e s dava pra dois.(CALIXTO,

    2006)

    A formao musical de Calixto se deu, assim como todos os sanfoneiros de 8 baixos que hojeconhecemos, atravs da educao informal, aprendendo a partir da observao dos mais velhos ou experientes,

    tendo como escola a prtica profissional.

    No caso de Z Calixto, foi seu pai, Seu Dideu, que lhe ensinou as primeiras lies. Algumas

    escalas, acordes e arpejos, que Z Calixto chama de variaes. Esta base tcnica e mecnica, somada

    prtica diria dos bailes, onde se tocava um repertrio extenso de duas ou trs horas a fio, foram aquilo que

    poderamos chamar da escola pela qual passou Z Calixto.

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    Seu Dideu, por sua vez, aprendeu a arte do fole de 8 baixos, com um amigo de Campina Grande,

    chamado Z Tempero. Dideo, que tambm tocava reco-reco, acompanhava este afamado tocador no final dos

    anos 20.

    Por sua vez, os irmos mais novos de Calixto, Bastinho e Luizinho, tambm se tornam

    profissionais destacveis deste instrumento, perpetuando assim, a tradio musical da famlia Calixto.

    Influncias

    Ao contrrio do que se pode pressupor, as primeiras influncias musicais de Calixto no so

    gneros considerados genuinamente nordestinos, e sim, gneros musicais identificados com a msica popular

    urbana. Recordando a sua infncia na Paraba, Calixto afirma que

    Naquela poca no existia forr.(...)a msica que se tocava erasamba, valsa, marcha,at mesmo o xote. (CALIXTO, 2006)

    O instrumental que acompanhava a sanfona no era, na ocasio, aquele que consagraria a

    formao tpica do trio nordestino, isto sanfona, tringulo e zabumba.Em depoimento de Z Calixto, este

    afirma que o instrumental bsico da poca era Sanfona, reco-reco, tamborim feito de couro de gato ou de

    bode, e pandeiro. Ao menos, na sua regio, a mudana dos instrumentos de acompanhamento teria se

    originado, segundo Calixto, por influncia do Baio de Luiz Gonzaga.

    Z Calixto sustenta a hiptese de que o Baio seria uma estilizao de Luiz Gonzaga a partir de

    contedos nordestinos. O uso do acordeom, acompanhado pelos instrumentos de percusso como o tringulo e

    zabumba teriam se definido a partir do sucesso de Luiz Gonzaga, e no, o contrrio.14

    O tringulo veio a ser mais explorado, depois que surgiu o

    Baio. Pois o Baio se identificou com o Zabumba e o tringulo. (CALIXTO,

    2006)

    14Em torno desta discusso, poderamos supor que os gneros radiofnicos estabelecem, aos poucos, identidades para regies muitodiversas culturalmente, espcie de unificao cultural.

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    O sucesso estrondoso de Luiz Gonzaga no fica restrito apenas s capitais, e se dirige ao prprio

    Nordeste. Assim, o autntico nordeste de Gonzaga, talvez em parte idealizado na Guanabara chegue

    Campina Grande nos anos 40, constituindo uma nova influncia na formao musical no s de Z Calixto

    bem como, arriscaramos a dizer, de todo sanfoneiro nordestino desde ento.

    Outra influncia marcante na formao musical de Z Calixto foi o Choro. Este gnero de difcil

    execuo encontraria no sanfoneiro paraibano um interprete fiel e dedicado. Em parte esta aproximao se

    intensifica em sua adolescncia, quando Calixto passa a se dedicar ao violo e ao cavaquinho, instrumentos

    tradicionalmente identificados com o choro.

    Entre os sanfoneiros de 8 baixos, talvez Calixto seja o que mais tenha gravado choros, inclusive a

    msica que o teria consagrado definitivamente, o chorinho Escadaria do acordeonista gacho Pedro

    Raimundo.

    Em Agosto de 1959, Z Calixto receberia uma carta de Antnio Barros, convidando-lhe para ir ao

    Rio de Janeiro. Na ocasio, Calixto, recm casado, passava srias dificuldades financeiras. Prontamente,

    aceitou a proposta, e sozinho, dirigiu-se ao Rio de Janeiro, aonde chegou depois de oito dias de viagem.

    A chegada ao Rio de Janeiro e o contrato com a Phillips

    Sua primeira moradia no Rio de Janeiro, foi na residncia de um tio, em Ribeiro dos Lages, e sua

    profisso inicial foi a de afinador de sanfonas. Pois Calixto, dono de um ouvido absoluto, e por sua grande

    percia manual, torna-se alm de instrumentista, um sensvel arteso, a ponto de arrancar os mais

    entusiasmados elogios de msicos como o acordeonista Sivuca:

    Z um cavaleiro rstico. fiel a um instrumento que s dele.

    um arteso no fole de oito baixos. (RAMALHO, 2008)

    Mais uma vez, a convite de Antnio Barros, surge a primeira oportunidade para uma gravao.

    Calixto relembra deste dia como se fosse hoje. Saiu com uma sanfona de 8 baixos emprestada de um amigo,

    embrulhada numa toalha de banho, pois no tinha estojo, pegou o trem de Ricardo de Albuquerque Central,

    para ento se dirigir aos estdios da Philips, que ento se localizava no centro do Rio de Janeiro.

    Ao que parece, a audio de Z Calixto foi muito apreciada pelos produtores que desconheciam

    que um instrumento aparentemente frgil e de poucos recursos como a sanfona de 8 baixos, poderia produzir

    msica daquela maneira.

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    (...) s se conhecia Sanfona de 8 baixos tocando CalangoMineiro, e eu tocava qualquer chorinho(...)qualquer Frevo, Samba, qualquertipo de msica eu sabia tocar no clima, como tinha que ser. E ele (N.A Lusde Bittencourt, na ocasio diretor artstico da Gravadora Philips) seimpressionou e me contratou imediatamente. Uma semana aps eu entravano estdio da Philips. (CALIXTO, s/d.)

    As primeiras gravaes

    No mesmo ano de 1959, Calixto principia a gravar. Na poca, se gravava ainda discos de 78

    rotaes, com duas faixas, uma de cada lado. Conforme explica Calixto:

    Gravei oito msicas. Estas musiquinhas que eu gravei eram

    musiquinhas que meu pai tocava no Norte como chorinho, mas que aqui me

    orientaram a chamar de forr. (CALIXTO, s/d.)

    Finalmente, em 1960 lanado o long-play Z Calixto e sua sanfona de oito baixos, lbum

    histrico que deflagraria um estilo diferenciado na interpretao do fole de oito baixos, unindo as faixas

    gravadas anteriormente em 78 rotaes. Outros lbuns de sanfoneiros interpretes em afinao transportada j

    tivessem sido lanados, como o excelente La vai brasa de Camaro, sanfoneiro pernambucano, lanado em

    1958 pela Mocambo, que era um selo sediado em Recife. No entanto, no Rio de Janeiro, ento capital cultural

    do Brasil, e atravs de uma companhia multinacional, estaria certo que o alarde seria maior em torno da

    novidade.

    Poderamos afirmar que este LP abriria espao para que surgissem outros sanfoneiros na arte dos

    8 baixos em afinao transportada. Em 1960, Abdias assinaria contrato com a Columbia, consolidando a nova

    vertente que ento surgia ao pblico.

    Alm de choros j consagrados como Brasileirinho de Waldir Azevedo e Espinha de

    Bacalhau, de Severino Arajo, Calixto gravaria musicas que seu pai tocava no Nordeste como chorinhos. No

    entanto, na ocasio, os produtores orientaram Z Calixto que passasse a chamar tais choros como Forrs, por

    uma questo comercial. Entre estes choros rebatizados por forrs, estava o Forr de Seu Dideu. Seu Dideu,

    era apelido de Joo de Deus Calixto, pai de Z Calixto. Alm desses temas, Calixto gravaria composies

    prprias.

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    Entre estas composies estava a arrojada Bossa-nova em 8 baixos, que, ao contrrio do que

    pretende o ttulo, no propriamente um samba estilo bossa-nova, e sim, um choro moderno escrito em duas

    partes. No entanto, em sua coda (quatro compassos finais), Z Calixto se utiliza de uma cadncia harmnica

    moderna com ritmo sincopado que alude convenes caractersticas da bossa-nova, que na poca estava

    em pleno auge. Podemos hoje, afirmar sem receio, que em quatro compassos, Calixto redimensiona a

    harmonia do fole de 8 baixos, inserindo o instrumento na modernidade harmnica de sua poca. (ex.3)

    Ex.3 coda de Bossa-nova em oito baixos.

    Nesta gravao, Z Calixto foi acompanhado por figuras emblemticas do Choro praticado no Rio

    de Janeiro da poca, como Z Menezes (violo) e Indio do Cavaquinho, ambos msicos tambm nordestinos

    de origem.

    Exemplo 32

    Sudeste

    Embora tambm seja um instrumento muito apreciado na regio sudeste, sobretudo nas reas

    rurais e na periferia urbana, a sanfona de oito baixos jamais gozou do mesmo prestgio que nas regies sul e

    nordeste.

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    Nesta regio, apesar de uma tradio significativa, nunca houve um grande interesse da indstria

    cultural em promover os representantes de determinadas extratos da cultura popular, e na verdade, a sanfona

    de oito baixos esteve associada a gneros musicais hoje esquecidos, embora ainda sejam praticados, sobretudo

    nas regies interioranas, como a folia-de-reis e o calango.

    Ao contrrio do sul e nordeste, a sanfona de oito baixos na regio sudeste vista como uma

    prima pobre do acordeom como um instrumento que, embora gracioso, seria parco de recursos. Esse

    preconceito isolou a sanfona de oito baixos, no permitindo que avanasse muito alm das reas limtrofes da

    zona rural e periferia urbana, impedindo aos sanfoneiros, de modo geral, de profissionalizarem-se.

    Mesmo exmios sanfoneiros acabaram abdicando dos oito baixos pelo acordeom. Um dos

    exemplos mais notrios o de Antengenes Silva; mineiro de Uberaba, radicado no Rio de Janeiro, chega a

    ser reconhecido como O mago do acordeone, embora tenha vencido um festival alemo em 1957, promovido

    pela fbrica de acordeons Hohner, com sua interpretao numa sanfona de oito baixos, foi no acordeo de 120

    baixos que conquistou sua respeitabilidade na ento capital brasileira, a Guanabara.

    A moda do acordeom nas capitais da regio sudeste entre meados da dcada de 40 e meados de

    50, fez com que surgissem diversas academias empenhadas no ensino do acordeom de 120 baixos, sobretudo

    no Rio de Janeiro e So Paulo, na figura de professores como Mario Mascarenhas, Alencar Terra e ngelo

    Rielli. At mesmo a fbrica de acordeons Todeschini criou uma escola em So Paulo.

    Porm, a viso que predominava em relao s sanfonas de botes, fosse diatnicas ou

    cromticas, era a de um instrumento rstico que alm da dificuldade tcnica, perderia inevitavelmente para

    o acordeom quanto aos recursos e possibilidades.

    Mrio Mascarenhas, em seu Metodo de Acordeon escrito ainda na dcada de 50, confirma esta

    opinio freqente, escrevendo a certa altura do prefcio de seu livro:

    Desde 1928, aos doze anos de idade, eu tinha nas mos umasanfona.Era de botes (...) Troquei por outra, de teclado e encontrei muito maisencanto.(MASCARENHAS, p.6, s/d)

    Ou na apresentao do disco Bucho com bucho do sanfoneiro Ba dos oito baixos, escrita pelo

    crtico Matias Jos Ribeiro, em 1982:

    Porque ele toca um instrumento limitadocomo a sanfoninha de oito baixos(...) Que ningum espere encontrar em Bucho com bucho mais do que ele tem a dar.

    Nele no h lugar para harmonias sofisticadas ou virtuosismo instrumental. Soapenas ps-de-serra, xotes, forrs (...) executados por um msico que tem comoobjetivo maior levar ao povo diverso e alegria.

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    Podemos confrontar estas opinies com as observaes do etnomusiclogo americano John

    Murphy, que tem desenvolvido um trabalho analtico sobre a sanfona brasileira:

    A sanfona de oito baixos tem menos recursos do que o acordeom, masessas limitaes se tornam vantagens. (...) O fato de que cadabotocontrola duasnotas significa que h mais notas no alcance da mo direita. Uma vez que otocador se acostuma a essa diferena, fica mais fcil tocar temas complicados. 15

    Mais fcil ou no, o fato que a sanfona de oito baixos um instrumento que difere consideravelmente do

    acordeom, possuindo recursos prprios, com suas vantagens e desvantagens.

    15Texto indito gentilmente cedido pelo autor

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    Capa de um lbum do inicio dos anos 60. A ilustrao denta o desafio entre Orlandinho

    (acordeon de 120 baixos) e Z Cupido (sanfona de 8 baixos). Quem sair vencedor?

    Os raros profissionais da sanfona no Sudeste:

    Entre os poucos sanfoneiros de oito baixos desta regio que construram uma carreira profissional,

    encontra um lugar de privilgio, o sanfoneiro Z Cupido.

    Jos Idelmiro Cupido, nascido a 18/11/36, natural de Taubat SP, desde menino j despertava a

    ateno tocando gaita-de-boca e sanfona de oito baixos nas quermesses e festas. No comeo dos anos 50,

    comea a sua carreira profissional, j na grande So Paulo, atuando no Radio. Embora, ao longo do tempo,

    tenha alternado a sanfona de oito baixos com o acordeom de 120 baixos, consegue em muitos momentos

    empunhar a bandeira da sanfona, tornando-a instrumento importante em seu trabalho musical. Conviveu

    intimamente com a msica caipira paulista, sendo parceiro constante de Capito Furtado, um dos principais

    divulgadores da cultura do interior de So Paulo. Isto reflete em suas obras, que sero muito influenciadas

    pelos gneros da msica popular de sua regio, como arrasta-ps, quadrilhas, mazurcas e calangos. Gravou

    tambm sob pseudnimos, tais como Chico Manguau e Z do fole.

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    Podemos citar ainda como sanfoneiros representativos desta regio, os mineiros Z Alves, Rei

    do Calango e Luiz Andrade e Mangabinha.

    O calango & a sanfona

    Nos estados de Minas, Rio, Esprito Santo e parte de So Paulo, a sanfona era a estrela que

    reinava nos bailes de calango. Gnero musical ainda muito praticado, o Calango, ou Calango mineiro, tal asua importncia nesta regio, sobretudo nos estados de Minas Gerais e Rio de Janeiro, ter um papel anlogo

    ao do forr nordestino ou do vanero gacho.

    O sanfoneiro Carmindo Alves da Silva, nascido em 24/05/46 em Rochedo MG, fala sobre a

    forte presena do Calango nos tempos de sua infncia, onde teve o seu aprendizado musical na sanfona de 8

    baixos:

    - foi naquela poca, naqueles bailes de roa, na folha de bananeira, olhando ostocadores nos bailes decalango. Naquela poca no existiaforr,pelo menos na minhaterra. Era Calango, Calango mineiro que eles falavam.(CARMINDO, 2008)

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    Carmindo

    Assim com o Forr e o Pagode, o Calango, como bem define Rosa Maria Barbosa Zamith,

    Designa no somente gnero musical, como ainda baile rural, formapotica, dana e canto de trabalho.(ZAMITH, 1987)

    Enquanto gnero musical, o calango, de possvel origem mineira, se caracteriza pelo ritmo

    binrio, com motivo sincopado tipicamente brasileiro.

    Pode ser tocado de forma recortada, chegando a lembrar a atmosfera da musica carioca dos fins do

    sculo XIX, como na introduo do Calango da canela do saudoso sanfoneiro petropolitano Joo Torquato.

    Nascido no Sitio Taquara em 20 de Outubro de 1947, vindo a falecer em 13 de Maio de 2006, foi um legtimo

    herdeiro de uma tradio musical de calangueiros oriundos de Minas Gerais radicados na regio serrana do

    Rio de Janeiro.

    Exemplo 33

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    Joo Torquato

    . No Calango, se alterna a msica cantada em versos improvisados, que seria o calango-de-

    desafio, ou calango-de-bico, e msicas instrumentais, que seriam divididas em duas formas bsicas, o

    Calango de ponto virado e o de ponto liso, tendo quase invariavelmente a sanfona de oito baixos como

    instrumento solista e acompanhador. No calango-de-bico ou de desafio, conforme explica o sanfoneiro

    Carmindo.

    (...) tem os calangos cantados e os de bico. Eu olhar para voc, falar do seu cabelo, vocfalar at do meu, mas no fim nos damos a mo e somos amigos.

    Do vasto repertrio de Calango instrumental em sanfona de 8 baixos, podemos citar o Calango Mineiro,

    tema de domnio pblico, adaptado por Carmindo e tocado no estiloponto virado, que como pode se notar,

    apresenta complexo trabalho de mo esquerda na conduo dos baixos.

    Exemplo 34

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    J o Calango no estilo ponto liso,menos sincopado e mais corrido, normalmente explorando a

    primeira carreira da sanfona,pode ser bem exemplificado no calango Candangolndia de Capito Furtado e

    Z Cupido.

    Exemplo 35.

    Os ritmos ternrios tambm so muito estimados pelos sanfoneiros do Sudeste. O valseado ou

    valsa caipira uma adaptao da valsa ao contexto rural, onde muitas vezes a sanfona faz o papel de

    ponteado semelhante ao da viola caipira. Tambm fazem parte do repertrio dos sanfoneiros do Sudeste,

    Rancheiras eMazurcas, muito prximas ao estilo sulista, como no valseadoZ Largadode Arlindo Pinto,

    gravado por Z Cupido.

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    Exemplo 37

    O Xote, bem como no Sul e nordeste, uma dana muito apreciada pelos sanfoneiros do Sudeste.

    Se, por um lado herda o balano e acento nordestino, por outro, caracterizado pelas teras paralelas tpicas

    do sul e sudeste. Z Alves, alm de reconhecido calangueiro, tambm era conceituado intrprete de xotes

    como prova este Xote do Teto, registrado no lbum Z Alves O rei do calango editado pelo selo

    Unacam em 1983.

    (exemplo 38)

    Na Regio Sudeste, o destaque em termos de repertorio tambm se presencia na quadrilha e a

    sanfona menos como solista, mais utilizada como acompanhante da cantoria na folia de reis e noMoambique. Entre o sul e o nordeste, a regio Sudeste ir absorver influncias das duas regies vizinhas,

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    embora encontre um caminho individual devido a forte influncia da cultura afro-brasileira e o sotaque tpico

    da msica caipira. O predomnio da afinao natural ou diatnica brasileira conduz a tcnica

    interpretativa, de modo geral, mais prxima ao gacho do que ao nordestino.

    Panorama atual

    A retrao mercadolgica em relao a musica regional,

    se agrava a partir do incio da dcada de 70. Nesta poca, a Fontana,

    por exemplo, dissolve todo o seu elenco nordestino, que inclua artistas

    como Z Calixto, Jackson do Pandeiro e Genival Lacerda. Calixto nos

    descreve que at 1964, ele vivia custa de direitos autorais e vendas

    de discos. Segundo ele, o golpe militar de 1964 teria um efeito

    avassalador sobre a msica regional.

    O acordeonista e compositor Z do Gato16, afirma que os militares logo aps o golpe, passam a

    coibir a feira, que interditada inmeras vezes. Os feirantes so chamados de camels e o forr p de serrapassa a ser depreciado e perseguido. Z Calixto, por exemplo, comenta que nesta poca, deixa de fazer shows

    e as viagens se tornam difceis.

    Neste nterim, surgem selos menores que

    continuam a gravar a msica nordestina, como Tropicana e Cantagalo, que

    16Z do Gato, pseudnimo de Nilson Amaral, irmo de Z da Ona, um dos fundadores da Feira de So Cristvo,importante reduto das tradies nordestinas no Rio de Janeiro, criada em 1945.

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    sero responsveis pela maior parte do catlogo de sanfona de oito baixos e forr instrumental neste perodo.

    Z do Gato feira de So Cristovo

    No final dos anos 70, os selos musicais que costumavam investir no forr instrumental,

    comeam a perder fora. Novas tendncias, como o forr de duplo sentido e a preferncia esmagadora da

    mdia pela msica cantada e por instrumentos modernos, restringem pouco a pouco a atuao destes

    sanfoneiros, que se tornam cada vez mais raros. Com a chegada dos anos 80 e o processo de descaracterizao

    (ou recaracterizao) da msica de cunho regional, a sanfona gradualmente passa a sair dos palcos, substituda

    pelo acordeom de 120 baixos, ou pelos versteis teclados eletrnicos, que, em muitos casos, substituem o

    prprio acordeom.

    Se at ento os discos de 8 baixos nordestinos eram predominantemente instrumentais, os temas

    cantados passam a disputar o papel principal com a sanfona.

    Muitos sanfoneiros tentam acompanhar o bonde da histria, adaptando suas carreiras para as

    novas exigncias mercadolgicas, e a consequente mudana no gosto das audincias. Em meados da dcada

    de 70, Negro dos 8 baixos, que at ento se destacava como eximio solista do instrumento, passa a se dedicar

    um repertrio predominantemente cantado, tendo nfase nas letras de duplo sentido, de forte apelo popular.

    Mesmo icones como Gerson Filho,Abdias e Z Calixto se unem interpretes e compositores de

    msica vocal. Abdias grava discos com a participao de cantores como Sussanil, Elino Julio e Z Matias. Z

    Calixto trabalha em parceria com Messias de Hollanda e, mais tarde, Joo Silva e Z Ramos. Gerson Filho

    recorre a parceria com a esposa, a cantora Clemilda.No caso de todos estes sanfoneiros, este recurso garantiria

    maior difuso de suas msicas, e uma facilidade no agenciamento com as casas de shows, onde a demanda de

    msica vocal passa a ser algo cada vez mais solicitado.

    Forrock

    O predomnio de uma nova esttica, em boa parte derivada do rock, gera um interesse no

    instrumental eltrico de guitarras, baixos, teclados e baterias. Na msica nordestina da poca, isto notrio

    nos trabalhos de Alceu Valena, Amelinha, Z Ramalho, Ednardo e Fagner, que substituem o tradicional trio

    nordestino (sanfona, tringulo e zabumba) pelo power-trio do rock: guitarra, baixo e bateria. Com isso

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    conseguem tambm se integrar nos grandes centros, a uma sociedade mais urbana do que agrria, onde a

    sanfona, assim como a viola, aparecem como relicrios de um Brasil profundo, sertanejo, arcaico.

    Em seu disco S no costurado (Copacabana 1977), Negro dos 8 baixos lana a msica

    Forrock onde combina ecos do rockabily com o autntico forr p-de-serra. Outro bom demonstrativo deste

    conflito que tambm se irradia na msica instrumental, o lbum Forr gostoso assim do sanfoneiro Luis

    Sergio, lanado pela Gravadora Itamaraty em 1977, onde a sanfona dialoga e faz um duelo com uma guitarra

    ensandecida, gerando um curioso efeito esttico, algo tropicalista, entre o regional e o pop contemporneo da

    poca, uma espcie de mix entre Jimi Hendrix e Luiz Gonzaga, na recriao do clssico Sebastiana de

    Edgar Ferreira.

    (exemplo 39)

    Recentemente, a partir de meados dos anos 90, com o processo de revalorizao da msicatradicional e o surgimento de novas platias para o forr, a exemplo do fenmeno do Forr Universitrio, aos

    poucos a sanfona de oito baixos nordestina ressurge. Sanfoneiros ilustres, j h muito tempo distante dos

    grandes palcos e estdios, voltam a tona, como Z Calixto, que atravs do esforo da produtora Baluarte e d