samira da conceiÇÃo sabadini · 2014-01-22 · tabela 7 - dados morfométricos dos ecossistemas...

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E NATURAIS DEPARTAMENTO DE OCEANOGRAFIA E ECOLOGIA CURSO DE GRADUAÇÃO EM OCEANOGRAFIA SAMIRA DA CONCEIÇÃO SABADINI AVALIAÇÃO DOS DÉFICITS REAL E RELATIVO DE OXIGÊNIO NA LAGOA PALMINHAS (LINHARES, ES) VITÓRIA 2013

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E NATURAIS

DEPARTAMENTO DE OCEANOGRAFIA E ECOLOGIA

CURSO DE GRADUAÇÃO EM OCEANOGRAFIA

SAMIRA DA CONCEIÇÃO SABADINI

AVALIAÇÃO DOS DÉFICITS REAL E RELATIVO DE OXIGÊNIO NA

LAGOA PALMINHAS (LINHARES, ES)

VITÓRIA

2013

SAMIRA DA CONCEIÇÃO SABADINI

AVALIAÇÃO DOS DÉFICITS REAL E RELATIVO DE OXIGÊNIO NA LAGOA

PALMINHAS (LINHARES, ES)

Trabalho de Conclusão de Curso

apresentado ao Curso de Graduação em

Oceanografia da Universidade Federal

do Espírito Santo, como requisito parcial

para obtenção do título de Bacharel em

Oceanografia.

Orientador: Prof. Dr. Gilberto Fonseca

Barroso

VITÓRIA

2013

SAMIRA DA CONCEIÇÃO SABADINI

AVALIAÇÃO DOS DÉFICITS REAL E RELATIVO DE OXIGÊNIO NA LAGOA

PALMINHAS (LINHARES, ES)

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Graduação em

Oceanografia da Universidade Federal do Espírito Santo, como requisito parcial para

obtenção do título de Bacharel em Oceanografia.

Aprovado em 26 de abril de 2013.

COMISSÃO EXAMINADORA

______________________________________________

Prof. Dr. Gilberto Fonseca Barroso

Universidade Federal do Espírito Santo

______________________________________________

MSc. Mônica Amorim Gonçalves

Universidade Federal do Espírito Santo

______________________________________________

Prof. Dr. Camilo Dias Júnior

Universidade Federal do Espírito Santo

Avaliação dos déficits real e relativo de oxigênio na lagoa Palminhas (Linhares, ES)

por

Samira da Conceição Sabadini

Submetido como requisito parcial para a obtenção de grau de

Oceanógrafo

na

Universidade Federal do Espírito Santo

Abril de 2013

© Samira da Conceição Sabadini

Por meio deste, o autor confere ao Colegiado do Curso de Oceanografia e ao Departamento de

Oceanografia e Ecologia da UFES permissão para reproduzir e distribuir cópias parciais ou totais

deste documento de monografia para fins não comerciais.

Assinatura do autor...................................................................................................................................

Curso de graduação em Oceanografia

Universidade Federal do Espírito Santo

26 de abril de 2013

Certificado por...........................................................................................................................................

Gilberto Fonseca Barroso

Prof. Adjunto / Orientador

CCHN/DOC/UFES

Certificado por...........................................................................................................................................

MSc. Mônica Amorim Gonçalves

Co-orientadora

CCHN/DOC/UFES

Certificado por...........................................................................................................................................

Prof.Dr. Camilo Dias Júnior

Prof. Associado /Examinador interno

CCHN/DOC/UFES

Aceito por...................................................................................................................................................

Ângelo Fraga Bernardino

Prof. Adjunto / Coordenador do Curso de Oceanografia

Universidade Federal do Espírito Santo

CCHN/DOC/UFES

Dedico este trabalho aos meus avós, Judite e Antônio Sabadini.

“Diz-se que, mesmo antes de um rio cair no oceano ele treme de medo.

Olha pra trás, para toda a jornada, os cumes, as montanhas, o longo caminho sinuoso através das

florestas, através dos povoados, e vê a sua frente um oceano tão vasto que entrar nele nada mais é do que

desaparecer para sempre.

Mas não há outra maneira.

O rio não pode voltar.

Ninguém pode voltar.

Voltar é impossível na existência.

Você pode apenas ir em frente.

O rio precisa se arriscar e entrar no oceano.

E somente quando ele entra no oceano é que o medo desaparece.

Porque apenas então, o rio saberá que não se trata de desaparecer no oceano...

...mas tornar-se oceano.”

Autor desconhecido

AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente, a Deus, que me permitiu chegar aonde cheguei.

Ao meu pai, por acreditar em mim e me dar a oportunidade de realizar este sonho. À

minha mãe, pela empolgação e paciência para ouvir meus problemas.

Aos meus irmãos, Luiza, Gabriela e Frederico, por serem sempre meu porto seguro.

Ao meu cunhado Zolder, pelo apoio e amizade.

Aos meus avós, tios e primos, pela torcida e pelo carinho.

À Sônia e ao Marcos, por terem me auxiliado quando precisei.

Ao professor Gilberto, pela forma sempre paciente e tranquila de transmitir

conhecimento. À Mônica e ao Fábio, pelo aprendizado tanto em campo quanto no

Limnolab.

As minhas amigas, Larissa Bertoldi, que de forma tão doce e paciente me ensinou

muito no laboratório. Annanda, por ser tão amiga e divertida. Jéssica, por sempre

estar por perto nos meus momentos de desespero. Larissa Neves, por se mostrar

uma grande amiga sempre que precisei. Larissa Marques, por ser sempre tão alegre

e companheira. E a todos os amigos não citados, porém, muito especiais que

encontrei durante todos estes anos.

RESUMO

Os déficits real e relativo de oxigênio foram calculados para a lagoa Palminhas

(Linhares-ES) a partir de perfis de oxigênio dissolvido e temperatura de amostragens

na coluna d’água realizadas em 2011 e 2012. Foram detectados déficits reais de

oxigênio na coluna d’água em todas as amostragens, além de anoxia no hipolímnio

da lagoa durante o período de estratificação térmica. A lagoa Palminhas apresentou

estratificação térmica em janeiro, março, novembro e dezembro e perfil isotérmico

com presença de termoclinas temporárias em julho de 2011 e 2012. A estabilidade e

susceptibilidade da coluna d’água à atuação do vento também foram avaliadas a

partir da máxima resistência térmica relativa que variou de 9,45 em julho de 2011 a

45,10 em março e do número de Wedderburn que variou de 3,11 a 304,84 em julho

de 2012 e março, respectivamente. O déficit real de oxigênio variou de 2.022,869 a

4.532,421 toneladas de oxigênio em julho de 2011 e 2012, respectivamente. Já o

déficit relativo de oxigênio variou de 0,061 mgO2.cm-2.dia-1 em janeiro e março a

0,104 mgO2.cm-2.dia-1 em novembro. Comparações entre os déficits de oxigênio

obtidos para a lagoa Palminhas e outros 5 ecossistemas lênticos tropicais revelaram

que esta possui os mais elevados déficits real e relativo de oxigênio.

Palavras-chave: Déficit, Oxigênio dissolvido, Estratificação térmica.

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Lagoa Palminhas e sua bacia hidrográfica ............................................... 24

Figura 2 - Série histórica de pluviosidade (1947-1978) e pluviosidade total registrada

no ano de 2012 em Linhares (ES) ............................................................................. 25

Figura 3 – Lagoa Palminhas e o rio Doce ................................................................. 26

Figura 4 - Tabuleiros da Formação Barreiras e planície costeira no Baixo Rio

Doce .......................................................................................................................... 27

Figura 5 - Mapa batimétrico da lagoa Palminhas ..................................................... 28

Figura 6 - Distribuição das direções e velocidades do vento de 2007 a 2009 em

Linhares .................................................................................................................... 29

Figura 7 - Piscicultura em tanques-rede na lagoa Palminhas. ................................. 30

Figura 8 - Mapa com a localização da estação pluviométrica Linhares 01940004 da

ANA utilizada na série histórica ................................................................................ 33

Figura 9 - Distribuição das concentrações de clorofila a (μg.L-1) em cada

amostragem na lagoa Palminhas. ............................................................................. 45

Figura 10 - Perfis obtidos na estação amostral da lagoa Palminhas em cada mês

amostrado ................................................................................................................ 48

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - Pluviosidade e radiação térmica incidente .............................................. 42

Tabela 2 - Dados morfométricos da lagoa Palminhas .............................................. 43

Tabela 3 - Valores de máxima resistência térmica relativa (RTR), número de

Wedderburn, profundidade do hipolímnio e intensidade e direção do vento

......................................................................................... .........................................44

Tabela 4 - Estatística descritiva dos dados de temperatura e oxigênio dissolvido nos

perfis amostrais ................................ ........................................................................46

Tabela 5 - Déficits real total (AOD) e relativo (AHOD e VHOD) de oxigênio dissolvido

na lagoa Palminhas ........................................................ ..........................................51

Tabela 6 - Correlações de Spearman para as variáveis estudadas

.......................................................... ........................................................................52

Tabela 7 - Dados morfométricos dos ecossistemas lacustres no Brasil para

comparação com a lagoa Palminhas ........................................................................58

Tabela 8 - Déficits real e relativo de oxigênio de 6 ecossistemas lacustres

........................................................................................ ..........................................59

LISTA DE SIGLAS

ES – Espírito Santo

mgO2.cm-2dia-1 – Miligrama de oxigênio por centímetro quadrado por dia

Km² – Quilômetro quadrado

°C – Grau Celsius

AOD – Déficit real de oxigênio

AHOD – Déficit relativo de oxigênio

mg.cm-².mês-1 – Miligrama por centímetro quadrado por mês

ton O2 – Tonelada de oxigênio

H1 – Hipótese alternativa

H0 – Hipótese nula

mm – Milímetro

NNO-SSE – Direção norte noroeste – sul sudeste

NO/SE – Direção noroeste – sudeste

m – Metro

LIMNOLAB – Laboratório de Limnologia e Planejamento Ambiental

INMET – Instituto Nacional de Meteorologia

m.s-1 – Metro por segundo

µm – Micrômetro

mg.L-1 – Miligrama por litro

nm Namômetro

N – Normal

RTR – Resistência térmica relativa

ANA – Agência Nacional das Águas

eufZ – Profundidade da zona eufótica

DS – Transparência do disco de Secchi

IDM – Índice de desenvolvimento da margem

P – Perímetro da lagoa

sA – Área superficial da lagoa

IDV – Índice de desenvolvimento de volume

maxZ – Profundidade máxima da lagoa

mZ – Profundidade média da lagoa

1d – Massa específica no estrato mais superficial

g.cm-³ – Grama por centímetro cúbico

2d – Massa específica no estrato mais profundo

atm – Atmosfera

W – Número de Wedderburn

'g – Massa específica diferencial através da termoclina superficial

h – Profundidade da termoclina

L – Comprimento efetivo da lagoa

*u – Velocidade friccional do vento junto à superfície

1 – Massa específica no estrato mais superficial da termoclina

kg.m-3 – Quilograma por metro cúbico

2 – Massa específica no estrato mais profundo da termoclina

g – Aceleração da gravidade

m.s-2 – Metro por segundo ao quadrado

ar – Massa específica do ar

sup – Massa específica na superfície da lagoa

CD – Coeficiente de arrasto

– Velocidade do vento

iG – Média dos déficits reais de oxigênio medidos nos limites superior e inferior de

cada estrato da lagoa

mg.cm-3 – Miligrama por centímetro cúbico

iV – Volume de cada estrato da lagoa

cm3 – Centímetro cúbico

1M – Conteúdo de oxigênio no hipolímnio durante a máxima circulação da coluna

d’água

2M –Conteúdo de oxigênio encontrado no hipolímnio em dada época do ano

t – Intervalo de tempo

iG – Média dos teores de oxigênio medidos nos limites superior e inferior de cada

estrato do hipolímnio

iV – Volume de cada estrato do hipolímnio

H – Plano fronteiriço entre o metalímnio e o hipolímnio

VHOD – Taxa de consumo de oxigênio por unidade de volume e tempo

nZ – Espessura do hipolímnio da lagoa

kJ.m-² – Quilojoule por metro quadrado

m² – Metro quadrado

m³ – Metro cúbico

V – Volume do ecossistema lacustre

Zhipol. – Profundidade do hipolímnio

S – Superfície

F – Fundo

mgO2.cm-³.dia-1 – Miligrama de oxigênio por centímetro cúbico por dia

Sumário

1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 17

2 JUSTIFICATIVA ..................................................................................................... 21

3 OBJETIVOS ........................................................................................................... 22

3.1 OBJETIVO GERAL ............................................................................................. 22

3.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ............................................................................... 22

4 ÁREA DE ESTUDO ............................................................................................... 24

5 METODOLOGIA .................................................................................................... 31

5.1 AMOSTRAGEM EM CAMPO .............................................................................. 31

5.2 ANÁLISE DE CLOROFILA A E FEOPIGMENTOS ............................................. 32

5.3 SÉRIE HISTÓRICA DE PLUVIOSIDADE EM LINHARES (ES) .......................... 32

5.4 DELIMITAÇÃO DA ZONA EUFÓTICA ................................................................ 33

5.5 DELIMITAÇÃO DO EPILÍMNIO, METALÍMNIO E HIPOLÍMNIO ......................... 34

5.6 CÁLCULO DO ÍNDICE DE DESENVOLVIMENTO DE MARGEM (IDM) ............ 34

5.7 CÁLCULO DO ÍNDICE DE DESENVOLVIMENTO DE VOLUME (IDV) .............. 34

5.8 CÁLCULO DA RESISTÊNCIA TÉRMICA RELATIVA (RTR) ............................... 35

5.9 CÁLCULO DO NÚMERO DE WEDDERBURN (W) ............................................ 36

5.10 CÁLCULO DOS DÉFICTS DE OXIGÊNIO ........................................................ 37

5.10.1 Cálculo do déficit real de oxigênio (AOD) ....................................................... 37

5.10.2 Cálculo do déficit relativo de oxigênio dissolvido (AHOD) .............................. 38

5.10.3 Cálculo da taxa de consumo de oxigênio por unidade de volume e tempo

(VHOD) ..................................................................................................................... 39

5.11 ANÁLISE ESTATÍSTICA ................................................................................... 41

5.11.1 Estatística descritiva ....................................................................................... 41

5.11.2 Correlações entre variáveis ............................................................................ 41

6 RESULTADOS ....................................................................................................... 42

6.1 FATORES CLIMÁTICOS..................................................................................... 42

6.2 FATORES MORFOMÉTRICOS .......................................................................... 43

6.3 FATORES FÍSICOS ............................................................................................ 43

6.4 FATORES BIOLÓGICOS .................................................................................... 44

6.5 PERFIS VERTICAIS DE TEMPERATURA, OXIGÊNIO DISSOLVIDO E DÉFICIT

REAL DE OXIGÊNIO ............................................................................................... 45

6.6 DÉFICITS REAL E RELATIVO NA LAGOA PALMINHAS .................................. 50

6.7 CORRELAÇÕES ENTRE OS DÉFICITS DE OXIGÊNIO E AS VARIÁVEIS

ESTUDADAS ........................................................................................................... 51

7 DISCUSSÃO .......................................................................................................... 54

8 CONCLUSÃO ........................................................................................................ 63

9 REFERÊNCIAS ...................................................................................................... 65

17

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1. INTRODUÇÃO

Os ecossistemas lacustres são corpos d’água continentais que quando situados nas

planícies costeiras podem apresentar conexão com o mar. Devido à hidrodinâmica

restrita, os sistemas lacustres diferem dos fluviais e por isso são considerados como

sistemas lênticos (TUNDISI; MATSUMURA-TUNDISI, 2008).

O complexo lacustre costeiro do Baixo Rio Doce, um dos mais importantes do Brasil,

compreende 90 lagoas totalizando 165 km2 de área (BARROSO, 2007). A maioria

das lagoas tem sua gênese ligada aos processos flúvio-marinhos da época

holocênica (MARTIN et al., 1996). A lagoa Palminhas, localizada entre os vales da

Formação Barreiras (Tabuleiros), teve sua formação a partir da sedimentação da foz

de antigos tributários do rio Doce por processos fluvial e marinho (SUGUIO,

MARTIN, DOMINGUEZ 1982). O formato dendrítico da lagoa (índice de

desenvolvimento de margem de 8,1) é decorrente da gênese deste ecossistema a

partir do represamento dos vales da Formação Barreiras (BARROSO et al., 2012).

Amostragens feitas por Bozelli et al. (1992) e Barroso et al. (2012) na lagoa

Palminhas indicam que esta apresenta tendência de padrão térmico monomítico

quente. Uma lagoa monomítica quente apresenta circulação da coluna d’água

durante o período de inverno com temperatura da água superior a 4 ºC. A

estratificação térmica na lagoa se dá a partir do aquecimento termal da superfície da

coluna d’água (TUNDISI; MATSUMURA-TUNDISI, 2008). Ao longo do ano, as

variações da radiação solar e sua seletiva penetração em relação à profundidade

são responsáveis pelas modificações na estrutura térmica dos ambientes aquáticos

(HENRY, 1995).

A distribuição das concentrações de oxigênio dissolvido na coluna d’água,

geralmente, apresenta semelhança com o padrão de estratificação térmica lacustre.

Normalmente, a condição de anoxia no hipolímnio acontece ao longo do período de

18

18

intensa estratificação e estabilidade da coluna d’água (MATSUMURA-TUNDISI;

TUNDISI, 1995).

O oxigênio é um elemento químico de grande importância no processo de

decomposição da matéria orgânica e na respiração de organismos aquáticos

(HENRY; PONTES; TUNDISI, 1997). O potencial oxi-redutor da água é responsável

pela especiação química dos nutrientes dissolvidos a partir da redução (na ausência

de oxigênio) de compostos oxidantes ou oxidação (na presença de oxigênio) de

compostos redutores (ESTEVES, 1998). Dessa forma, o processo da oxidação da

matéria orgânica ao longo da coluna d’água pode favorecer a ocorrência de déficit

de oxigênio em ecossistemas lacustres (HENRY; PONTES; TUNDISI, 1997). Nas

fases iniciais do processo de estratificação, a decomposição aeróbia da matéria

orgânica e a respiração de organismos são os principais responsáveis pelas perdas

de oxigênio. Os processos de origem anaeróbica tornam-se os de maior importância

quando o teor de oxigênio dissolvido na água atinge níveis reduzidos (ESTEVES,

1998).

O processo de desestratificação da coluna d’água permite a mistura entre a água

mais oxigenada proveniente do epilímnio com a água de reduzido teor de oxigênio

do hipolímnio. Na camada do epilímnio, a produção de oxigênio a partir do processo

de fotossíntese e por difusão atmosférica é superior às perdas pela respiração

(ESTEVES, 1998).

A elevada temperatura da água que implica em menor solubilidade dos gases

dissolvidos na água e intensa atividade metabólica das lagoas tropicais são os

principais fatores determinantes do tipo de perfil vertical de oxigênio (ESTEVES,

1988). Como resultado das altas taxas de decomposição de matéria orgânica em

lagoas tropicais, a taxa de consumo de oxigênio nestas é de 4 a 9 vezes mais

elevada que em lagoas temperadas e os perfis de oxigênio na maioria das lagoas é

do tipo clinogrado (ESTEVES, 1988). As características morfométricas da lagoa,

como por exemplo, profundidade média moderada e o formato dendrítico, atuam

19

19

dificultando a atuação do vento que desempenha a importante função de distribuição

de oxigênio na coluna d’água. Como resultado, os ecossistemas lacustres de

regiões tropicais, frequentemente, apresentam déficits significativos de oxigênio

dissolvido na coluna d’água, principalmente, na porção inferior (ESTEVES, 1998).

Considerando a importância desta variável físico-química, bem como sua dinâmica,

tem sido feitas estimativas da desoxigenação dos ecossistemas lacustres. O déficit

real de oxigênio (AOD) de uma lagoa consiste na diferença entre o teor de oxigênio

existente em dada profundidade e aquele que seria observado caso houvesse

saturação de oxigênio na água sob a mesma pressão e temperatura (COLE, 1975,

apud HENRY; PONTES; TUNDISI, 1989, p. 253). Já o déficit relativo de oxigênio

(Areal Hypolimnetic Oxygen Deficit ou Areal Hypolimnetic Oxygen Depletion Rate -

AHOD) é calculado para todo o hipolímnio, sendo este obtido a partir da diferença

entre a concentração de oxigênio dissolvido na água durante o período de máxima

estratificação e durante o período de máxima circulação (TUNDISI; MATSUMURA-

TUNDISI, 2008).

A lagoa Palminhas apresenta perfil vertical de oxigênio do tipo clinogrado sob

condição de estratificação térmica e perfil ortogrado sob condição de isotermia

(BOZELLI et al., 1992; BARROSO et al., 2012). O lago Dom Helvécio, localizado no

Médio Rio Doce (Minas Gerais), apresenta o mesmo tipo de perfil vertical de

oxigênio (PONTES, 1980 apud ESTEVES, 1998, p. 43). Este lago foi estudado por

HENRY; PONTES; TUNDISI (1997) que observaram a ocorrência do processo de

anoxia. Dados de 1978, publicados por estes autores, revelaram o AHOD variando

de 0,56 em janeiro a 1,30 mg.cm-2.mês-1 em maio, enquanto o AOD variou entre

119,07 em setembro e 163,28 ton O2 em maio. Foi detectado AOD no lago Dom

Helvécio mesmo sob condição de isotermia. Segundo os autores, o déficit de

oxigênio no lago é em grande parte devido à decomposição da matéria orgânica na

coluna d’água. Estudos sobre os déficits de oxigênio, real e relativo, foram também

realizados em ambientes lacustres tropicais como na lagoa do Nado e nos

reservatórios de Jurumirim e das Garças (BEZERRA-NETO; PINTO-COELHO,

2001).

20

20

Os cálculos do AHOD e AOD para a lagoa Palminhas (Linhares, ES) podem

contribuir para o entendimento da dinâmica do oxigênio em um sistema lacustre

onde é desenvolvida a atividade piscicultura em tanques-rede e que já apresenta

indícios de eutrofização da água. A piscicultura pode contribuir para a intensificação

da condição eutrófica e anóxica da lagoa, visto que os resíduos orgânicos de rações

e excrementos dos peixes podem aumentar a carga orgânica e, consequentemente,

o consumo de oxigênio.

21

21

2. JUSTIFICATIVA

A lagoa Palminhas é um ecossistema lacustre de origem fluvial e costeira carente de

estudos científicos e sob consideráveis pressões ambientais, embora possua

importância ecológica, social e econômica. Dessa forma, torna-se fundamental a

realização de estudos limnológicos com a finalidade de construir um diagnóstico

inicial da atual condição deste ecossistema.

O estudo da variação temporal do oxigênio dissolvido, bem como seus déficits neste

ecossistema lacustre é de fundamental importância devido a sua relevância

biológica no processo de respiração e decomposição da matéria orgânica, bem

como de especiação química por processos de oxidação e redução na água.

O monitoramento da detecção de condição anóxica é de fundamental importância

para a recuperação e manutenção de bens e serviços ecossistêmicos fornecidos

pela lagoa.

22

22

3. OBJETIVOS

3.1 OBJETIVO GERAL

Avaliar a ocorrência dos déficits de oxigênio, real e relativo, na lagoa Palminhas

(Linhares, ES).

3.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS

• Analisar possíveis padrões de distribuição temporal da variável estudada

(oxigênio dissolvido) na lagoa Palminhas.

H1: Ocorre déficit de oxigênio na lagoa Palminhas durante todo o ano;

H2: Só ocorre déficit de oxigênio na lagoa Palminhas durante o período de

estratificação térmica;

H0: Não ocorre déficit de oxigênio na lagoa Palminhas.

• Correlacionar a ocorrência dos déficits de oxigênio com a estratificação

térmica e circulação da coluna d’água na lagoa Palminhas.

H1: Quanto mais intensa a estratificação térmica da coluna d’água, maior será o

déficit de oxigênio;

H0: Não existe relação entre a intensidade da estratificação térmica e o déficit de

oxigênio.

• Analisar a possível correlação entre déficits de oxigênio e as concentrações

de clorofila a na lagoa Palminhas;

H1: Fatores biológicos influenciam a variação do déficit de oxigênio na lagoa

Palminhas ao longo do ano;

H0: Outros fatores determinam a variação do déficit de oxigênio na lagoa Palminhas.

23

23

• Correlacionar a ocorrência dos déficits de oxigênio com a intensidade de

radiação e pluviosidade.

H1: Fatores climáticos determinam a variação do déficit de oxigênio na lagoa

Palminhas;

H0: Outros fatores determinam a variação do déficit de oxigênio na lagoa Palminhas.

• Comparar os déficits de oxigênio detectados na lagoa Palminhas com os já

conhecidos déficits de 5 outros ambientes lacustres tropicais.

H1: A lagoa Palminhas apresenta o mais elevado déficit de oxigênio;

H0: Outro ecossistema apresenta o maior déficit de oxigênio.

24

24

4 ÁREA DE ESTUDO

A lagoa Palminhas (Figura 1) faz parte da bacia hidrográfica do rio Doce que está

situada na região sudeste do Brasil. Esta bacia é de domínio federal por fazer parte

dos estados de Minas Gerais e Espírito Santo, totalizando área de drenagem de

83.465 km2, sendo 14% pertencentes ao estado do Espírito Santo (COELHO, 2009).

Figura 1 – Lagoa Palminhas e sua bacia hidrográfica. Em destaque, a estação amostral localizada na região mais profunda da lagoa.

A região do Baixo Rio Doce apresenta clima tropical úmido, porém, sem

uniformidade climática. Essa heterogeneidade é função de vários fatores como a

posição geográfica, relevo e encontro de massas de ar como no caso do Sistema

Tropical Atlântico e do Sistema Equatorial Continental, resultando em chuvas

intensas com aproximadamente 60% do total anual. A estação chuvosa tem início,

geralmente, no mês de novembro e se estende até maio com uma distribuição

heterogênea na bacia (COELHO, 2009). A precipitação anual em Linhares é de

aproximadamente 1.200 mm, sendo novembro e dezembro os meses de maior

precipitação e agosto o mês de menor precipitação (Figura 2). Segundo Coelho

25

25

(2009) a maior parte da bacia apresenta temperaturas médias anuais elevadas

durante significativa parte do ano, sendo estas superiores a 18 ºC mesmo nos

meses mais frios. Já no litoral, apresentam-se superiores a 24 ºC.

Figura 2 – Série histórica de pluviosidade (1947-1978) e pluviosidade total registrada no ano de 2012 em Linhares (ES).

O rio Doce (Figura 3) possui regime fluvial perene e, de modo geral, comporta-se de

acordo com a pluviosidade. As maiores cheias acontecem nos meses de dezembro,

janeiro e março; enquanto as maiores vazantes, nos meses de agosto e setembro

(COELHO, 2007). Com base em dados de vazão do rio Doce durante o período

compreendido entre 1987 e 2009, Campos (2011) afirma que este rio apresentou

vazão mais intensa de outubro/novembro a março/abril e menos intensa entre maio

e setembro, sendo a vazão média equivalente a 822 m³.s-1.

0

100

200

300

400

500

600

jan fev mar abr mai jun jul ago set out nov dez

Plu

vio

sid

ade

(m

m)

Meses

2012

Série histórica

26

26

Figura 3 – Lagoa Palminhas e o rio Doce.

Fonte: Laboratório de Limnologia e Planejamento Ambiental – LIMNOLAB (2012).

A região do Baixo Rio Doce compreende a porção do Espírito Santo caracterizada

por morfologia variada alterando-se de colinas, tabuleiros e planície costeira do

sentido Oeste para Leste. É limitada a oeste pelas colinas baixas adjacentes ao

município de Colatina e por um importante falhamento com direção NNO-SSE, que

influencia a direção principal dos fluxos de água nessa área (COELHO, 2009).

As lagoas da região do Baixo Rio Doce tiveram sua formação a partir das oscilações

do nível relativo do mar durante o holoceno recente. O afogamento dos grandes

vales entalhados na Formação Barreiras e posterior sedimentação fluvio-marinha na

foz de antigos tributários formaram as lagoas (SUGUIO; MARTIN; DOMINGUEZ,

1982). Nos tabuleiros terciários da Formação Barreiras estão localizadas várias

lagoas de barragem natural (Figura 4) dispostas na direção NO/SE como a lagoa

Palminhas. Este trecho é caracterizado ainda por ampla planície costeira

desenvolvida no Período Quaternário (COELHO, 2007).

27

27

Figura 4 – Tabuleiros da Formação Barreiras e planície costeira no Baixo Rio Doce (baseado em Suguio et al., 1992).

A lagoa Palminhas, situada no município de Linhares (ES), apresenta área

superficial de 8,8 km2 e profundidade máxima de 31,6 metros (BARROSO et al.,

2012). Este ecossistema lacustre está localizado a 20 m acima do nível do mar. A

Figura 5 mostra o resultado da batimetria realizada na lagoa Palminhas em 2011.

28

28

Figura 5 – Mapa batimétrico da lagoa Palminhas.

Fonte: Laboratório de Limnologia e Planejamento Ambiental – LIMNOLAB (2012).

29

29

De acordo com os dados de vento da estação meteorológica automática Linhares

(A614) do Instituto Nacional de Meteorologia (INMET) a direção predominante dos

ventos atuantes na área de estudo é 78° e a intensidade do vento varia de 0,5 a 11,1

m.s-1 (Figura 6). A presença de vegetação circundando o corpo d’água limita a

atuação do vento e a circulação da coluna d’água da lagoa. A bacia hidrográfica da

lagoa Palminhas além de vegetação nativa, possui também cultura agrícola e

pastagens que alteram sua paisagem natural (BARROSO et al., 2012).

Figura 6: Distribuição das direções e velocidades do vento de 2007 a 2009 em Linhares. Fonte: Laboratório de Limnologia e Planejamento Ambiental – LIMNOLAB (2012).

Na lagoa Palminhas é desenvolvida a atividade de piscicultura de tilápias em

tanque-rede. A figura 7 mostra um dos cultivos de peixes.

30

30

Figura 7: Piscicultura em tanques-rede na lagoa Palminhas. 2012

31

31

5. METODOLOGIA

5.1. AMOSTRAGEM EM CAMPO

O estudo foi desenvolvido na lagoa Palminhas (Linhares), na região do Baixo Rio

Doce. As amostragens da coluna d’água foram realizadas nos dias 27/07/2011,

25/01/2012, 07/03/2012, 24/07/2012, 13/11/2012 e 18/12/2012. Os dados são

referentes a uma única estação amostral localizada na região mais profunda da

lagoa (30 m) (Figura 5). A amostragem de clorofila a e feopigmentos foram obtidas

utilizando-se uma garrafa de Niskin com capacidade de 2 L nas profundidades de

subsuperfície, 1% de luz e fundo.

As amostras destinadas à análise de clorofila a e feofitina foram filtradas in situ em

filtros de fibra de vidro (Whatman 934-AH, 24 mm e 1,2 µm de porosidade), sendo

então armazenados em papel alumínio e mantidos em frascos (contendo sílica gel)

refrigerados.

Para obtenção das medições das variáveis físico-químicas resistência térmica

relativo (RTR), temperatura em °C e oxigênio dissolvido em mg.L-1 foram feitos perfis

verticais com intervalos de 1 metro de profundidade utilizando-se uma sonda

multiparâmetro Horiba U-53G com cabo de 30m. Os dados de oxigênio obtidos pelo

multiparâmetro foram calibrados pelo método de Winkler para determinação de

oxigênio dissolvido. A profundidade de 1 % de penetração da luz foi estimada

utilizando-se disco de Secchi de 30 cm de diâmetro, sendo que a estimativa da

profundidade da zona eufótica foi feita multiplicando a profundidade do disco de

Secchi por 3,00 conforme Cole (1994).

32

32

5.2. ANÁLISE DE CLOROFILA A E FEOPIGMENTOS

A determinação da clorofila a foi realizada pelo método fluorimétrico de Strickland e

Parsons (1972) e modificada por Barroso e Littlepage (1998). Foi realizada a

extração a frio dos pigmentos com acetona 90% durante 24 horas. Após este

período, os extratos foram filtrados novamente para que os resíduos do filtro fossem

eliminados. Em fluorímetro Turner TD-700, foi realizada a excitação do extrato de

clorofila em comprimento de onda de 460 nm e a leitura da fluorescência em 760

nm. Em seguida, foram adicionadas à amostra 2 gotas de ácido clorídrico (0,1N)

para que a clorofila a fosse degradada em feopigmentos e, então, a leitura das

absorbâncias foi feita novamente para a determinação da concentração de

feopigmentos (BARROSO; LITTLEPAGE, 1998). A concentração de clorofila a e dos

feopigmentos foi expressa em µg.L-1.

5.3. SÉRIE HISTÓRICA DE PLUVIOSIDADE EM LINHARES (ES)

A série histórica com registro da pluviosidade em Linhares (ES) foi feita a partir de

dados obtidos no website da Agência Nacional das Águas (ANA). Os dados foram

manipulados de forma a se obter valores médios de chuva por mês. Para a série

histórica foram utilizados dados da estação pluviométrica Linhares 01940004 da

ANA (Figura 8) localizada na região de Linhares. Devido à ausência de dados de

pluviosidade nos anos de 2011 e 2012 na estação pluviométrica utilizada para a

confecção da série histórica, foram então utilizados os dados da estação

pluviométrica LINHARES-A614 do INMET. Esta estação está distante da lagoa

Palminhas cerca de 15,2 km.

33

33

Figura 8 – Mapa com a localização da estação pluviométrica Linhares 01940004 da ANA utilizada na série histórica.

5.4. DELIMITAÇÃO DA ZONA EUFÓTICA

A profundidade da zona eufótica foi determinada a partir da seguinte relação

(COLE, 1994):

DSZeuf 3

Sendo:

eufZ = Profundidade da zona eufótica, expressa em m;

DS = Transparência do disco de Secchi, expressa em m.

34

34

5.5. DELIMITAÇÃO DO EPILÍMNIO, METALÍMNIO E HIPOLÍMNIO

O limite superior do metalímnio ou termoclina foi determinado como a profundidade

em que foi detectada a maior variação da resistência térmica relativa (RTR) e

temperatura. Conforme feito por Henry; Pontes; Tundisi (1989) o limite inferior foi

determinado pela observação de variação de temperatura menor que 0,3°C, por

metro, a partir do início do metalímnio. O plano fronteiriço foi tomado no estrato

superior em que foi detectada a variação. Consequentemente, foram determinados

como epilímnio todos os estratos localizados acima do metalímnio e como o

hipolímnio todos os estratos localizados abaixo.

5.6. CÁLCULO DO ÍNDICE DE DESENVOLVIMENTO DE MARGEM ( IDM )

Segundo Cole (1994) este índice compara o comprimento da margem da lagoa com

a circunferência de um círculo de mesma área desta. Este índice pode ser calculado

a partir da seguinte fórmula:

sA

PIDM

2

Sendo:

P = Perímetro da lagoa, expresso em m;

sA = Área superficial da lagoa, expressa em m².

5.7. CÁLCULO DO ÍNDICE DE DESENVOLVIMENTO DE VOLUME ( IDV )

35

35

Este índice compara a forma da bacia da lagoa com um cone invertido de altura

igual a maxZ e base igual à área superficial da lagoa. Para volume da lagoa igual ao

volume do cone invertido, 0,1IDV . Para volume da lagoa maior que o volume do

cone, 0,1IDV . Para volume da lagoa menor que o volume do cone, 0,1IDV

(COLE, 1994).

max

3Z

ZIDV m

Sendo:

maxZ = Profundidade máxima da lagoa, expressa em m;

mZ = Profundidade média da lagoa, expressa em m.

5.8. CÁLCULO DA RESISTÊNCIA TÉRMICA RELATIVA (RTR)

Segundo Tundisi; Matsumura-Tundisi (2008) a resistência térmica relativa significa a

resistência da água à circulação gerada pela ação do vento. Para o cálculo do perfil

RTR foi utilizada a seguinte fórmula (DADON, 1995):

8

10*)( 6

12 ddRTR

Sendo:

1d = Massa específica no estrato mais superficial, expressa em g.cm-³;

2d = Massa específica no estrato mais profundo, expressa em g.cm-³;

8 = Relacionado à diferença da massa específica da água nas temperaturas de 4 e

5°C.

Os valores de massa específica foram obtidos a partir da consulta da tabela de

massa específica da água em função da temperatura na pressão de 1 atm.

36

36

5.9. CÁLCULO DO NÚMERO DE WEDDERBURN (W)

A estabilidade da estrutura térmica foi avaliada através do número de Wedderburn

que relaciona o comprimento efetivo da lagoa, a profundidade da camada de

mistura, as massas específicas da água nos estratos superiores e inferiores da

termoclina e a velocidade do vento (IMBERGER; HAMBLIN, 1982 apud DELAZARI-

BARROSO, 2007, p. 14). Segundo Tundisi; Matsumura-Tundisi (2008) o cálculo do

número de Wedderburn torna possível a determinação da resposta do estrato

superficial da lagoa à atuação do vento. Para o cálculo do número de Wedderburn

(W), introduzido por Thompson & Imberger em 1980, foi utilizada a seguinte fórmula

(FRANZEN, 2009):

Lu

hgW

2

*

2'

Sendo:

'g = Massa específica diferencial através da termoclina superficial, expressa em

m.s-2;

h = Profundidade da termoclina, expressa em m;

L = Comprimento efetivo da lagoa, expresso em m;

*u = Velocidade friccional do vento junto à superfície, expresso em m.s-1;

Onde:

gg

1

12'

Sendo:

1 = Massa específica no estrato mais superficial da termoclina, expressa em kg.m-

3;

37

37

2 = Massa específica no estrato mais profundo da termoclina, expressa em kg.m-3;

g = Aceleração da gravidade, expressa em m.s-2;

e,

2

1

2

sup

*

CDu ar

Sendo:

ar = Massa específica do ar, expressa em kg.m-3;

sup = Massa específica na superfície da lagoa, expressa em kg.m-3;

CD = Coeficiente de arrasto constante igual a 0,0014;

= Velocidade do vento, expressa em m.s-1.

5.10. CÁLCULOS DOS DÉFICITS DE OXIGÊNIO

5.10.1. Cálculo do déficit real de oxigênio (AOD)

Os valores de déficit real de oxigênio por estrato foram tomados a partir da diferença

entre a concentração de oxigênio presente no estrato e aquela que seria encontrada

caso houvesse saturação de oxigênio sob mesmas condições de temperatura e

pressão (COLE, 1975, apud HENRY; PONTES; TUNDISI, 1989, p. 253).

Segundo Henry; Pontes; Tundisi (1989) o déficit real total de oxigênio (AOD) pode

ser calculado a partir da seguinte fórmula:

38

38

n

i

ii VGAOD1

*

Sendo:

iG = O valor médio dos déficits reais de oxigênio, expresso em mg.cm-3,

determinados nos limites superior e inferior de cada estrato da lagoa;

iV = O volume, expresso em cm3, de cada estrato da lagoa. Foi determinado a partir

da base de dados georreferenciada da morfometria lacustre da lagoa Palminhas

utilizando o sistema de informações geográficas ESRI ArcGIS 9.3, módulo 3D

Analyst com os dados expressos em m3 e posteriormente convertidos para cm3.

Os perfis de déficit real de oxigênio dissolvido ao longo da coluna d’água foram

confeccionados no software Sigma Plot 10.0.

5.10.2. Cálculo do déficit relativo de oxigênio dissolvido (AHOD)

Segundo Henry; Pontes; Tundisi (1989) o déficit relativo de oxigênio dissolvido

(AHOD), calculado para todo o hipolímnio, é expresso por unidade de área. Este

déficit pode ser obtido a partir da fórmula:

t

MMAHOD

21

Sendo:

1M = O conteúdo de oxigênio, durante a máxima circulação (no caso da lagoa

Palminhas, em julho), num volume igual ao volume do hipolímnio em 2M ;

2M = O conteúdo de oxigênio encontrado no hipolímnio em dada época do ano;

t = É o intervalo de tempo, expresso em dias, entre 1M e 2M

39

39

1M e 2M podem ser obtidos a partir da seguinte fórmula:

HVGeMMn

i

ii /)*(1

21

Sendo:

iG = A média dos teores de oxigênio medidos nos limites superior e inferior de cada

estrato do hipolímnio, expressa em mg.cm-3;

iV = O volume, expresso em cm3, de cada estrato do hipolímnio;

H = O plano fronteiriço, expresso em cm2, entre o metalímnio e o hipolímnio.

Determinado pela observação de variação inferior a 0,3°C a partir do início do

metalímnio. O plano foi tomado no estrato superior em que foi detectada a variação.

Os volumes e áreas dos estratos foram determinados a partir da base de dados

georreferenciada da morfometria lacustre da lagoa Palminhas utilizando o sistema

de informações geográficas ESRI ArcGIS 9.3.

5.10.3. Cálculo da taxa de consumo de oxigênio por unidade de volume e

tempo (VHOD)

Segundo Charlton (1980, apud Henry; Pontes; Tundisi, 1989, p. 253) o cálculo da

taxa de consumo de oxigênio por unidade de volume e tempo (VHOD) permite

considerar a influência dos efeitos morfométricos no déficit relativo de oxigênio. Esta

taxa pode ser calculada através da seguinte fórmula:

nZ

AHODVHOD

Sendo:

40

40

AHOD: Déficit relativo de oxigênio dissolvido, expresso em mgO2.cm-2.dia-1;

nZ : Espessura do hipolímnio da lagoa em dada amostragem, expressa em cm.

41

41

5.11. ANÁLISE ESTATÍSTICA

5.11.1. Estatística descritiva

Foi realizada a análise descritiva das variáveis temperatura, oxigênio dissolvido,

pluviosidade, radiação, profundidade do hipolímnio, temperatura média do

hipolímnio, oxigênio dissolvido médio no hipolímnio, concentração de clorofila a na

zona eufótica, resistência térmica relativa, número de Wedderburn e déficits real e

relativo de oxigênio a partir de dados de valores médios, mínimos, máximos,

medianas, amplitude.

5.11.2. Correlações entre variáveis

Para avaliar a existência ou não de influência significativa entre variáveis foram

feitas correlações de Spearman no software Statistica 8.0.550. Segundo Rodrigues

(2010), “as correlações de Spearman são indicadas para análises de dados obtidos

em campo, geralmente não paramétricos”. Optou-se então, por este tipo de

correlação devido à impossibilidade de aplicação do teste de normalidade, visto que

os dados trabalhados apresentavam apenas um valor por amostragem.

42

42

6. RESULTADOS

6.1. FATORES CLIMÁTICOS

Na tabela 1 são mostrados os totais acumulados de pluviosidade e radiação

registrados em cada amostragem.

TABELA 1 – PLUVIOSIDADE E RADIAÇÃO SOLAR INCIDENTE

Amostragem Pluviosidade (mm)

Radiação (kJ.m-²)

Jul 2011 - - Jan 2012 28,60 129.455,39 Mar 2012 23,60 132.892,14 Jul 2012 3,00 88.060,45 Nov 2012 82,80 113.073,14 Dez 2012 0,00 183.151,85

Média 27,60 129.326,60 Mínimo 0,00 88.060,45 Máximo 82,80 183.151,85 Mediana 23,60 129.455,39 Amplitude 82,80 95.091,40

Nota do autor: A pluviosidade e a radiação não foram calculadas para julho de 2011 devido à ausência de dados completos.

O maior volume pluviométrico, referente aos 7 dias anteriores às amostragens, foi

registrado em novembro (82,80 mm). Os menores valores pluviométricos foram

registrados em julho de 2012 (3,00 mm) e dezembro (0,00 mm).

A radiação solar foi mais intensa em dezembro (183.151,85 kJ.m-²) e menos intensa

em julho de 2012 (88.060,45 kJ.m-²), sendo esta menos que a metade da registrada

em dezembro. A intensidade da radiação variou pouco entre os meses de janeiro

(129.455,39 kJ.m-²) e março (132.892,14 kJ.m-²).

43

43

6.2. FATORES MORFOMÉTRICOS

Na Tabela 2 são mostrados os dados morfométricos primários (área superficial e

profundidade máxima) e secundários (profundidade média, volume, índice de

desenvolvimento da margem e índice de desenvolvimento de volume) da lagoa

Palminhas.

TABELA 2 – DADOS MORFOMÉTRICOS DA LAGOA PALMINHAS (BARROSO ET AL., 2012)

Área superficial (m²) 88.000.000 Profundidade máxima (m) 31,6 Profundidade média (m) 14,22 Volume (m³) 966.790.644 IDM 8,1 IDV 1,35

IDM: Índice de desenvolvimento de margem; IDV: Índice de desenvolvimento de volume.

O elevado IDM da lagoa Palminhas (8,1) reflete um padrão alongado e dendrítico de

sua margem. Já o IDV, também elevado (IDV>1), sugere que a lagoa pode ser

considerada como relativamente profunda.

6.3. FATORES FÍSICOS

Na tabela 3 são mostrados os valores de máxima resistência térmica relativa (RTR),

o número de Wedderburn (W), profundidade do hipolímnio ou base do metalímnio

(Zhipol.), intensidade e a direção do vento para cada amostragem realizada.

44

44

TABELA 3 – VALORES DE MÁXIMA RESISTÊNCIA TÉRMICA RELATIVA (RTR), NÚMERO DE WEDDERBURN, PROFUNDIDADE DO HIPOLÍMNIO E INTENSIDADE E DIREÇÃO DO VENTO

Amostragem RTR W Zhipol. Intensidade do vento (m.s-1)

Direção do vento

Jul 2011 9,45 - 2,00 - - Jan 2012 41,30 140,21 11,00 2,70 O-NO Mar 2012 45,10 304,84 14,00 1,70 S Jul 2012 25,65 3,11 4,00 3,90 NE Nov 2012 33,00 13,16 10,00 7,10 E-NE Dez 2012 43,34 17,47 11,00 6,80 E-NE

Média 32,97 95,76 8,67 4,4 - Mínimo 9,45 3,11 2,00 1,70 - Máximo 45,1 304,84 14,00 7,10 - Mediana 37,15 17,47 10,50 3,90 - Amplitude 35,65 301,73 12,00 5,40 - Nota do autor: O número de Wedderburn, intensidade e direção do vento de julho de 2011 não foram calculados devido à ausência de dados. RTR: Resistência térmica relativa; W: Número de Wedderburn; Zhipol: Profundidade do hipolímnio.

A menor RTR (9,45) foi registrada na amostragem de julho de 2011 e a maior RTR

(45,10) em março. O menor número de Wedderburn foi registrado em julho de 2012

(W = 3,11) e o maior em março (W = 304,84). Dentre os meses caracterizados por

estratificação térmica, janeiro e março apresentaram os maiores números de

Wedderburn e, portanto, menor susceptibilidade à atuação do vento.

A direção do vento mais frequente durante as amostragens foi de nordeste. O vento

mais intenso (7,1 m.s-1) foi registrado no mês de novembro, concomitantemente a

um número de Wedderburn (13,16) e RTR (33,00) relativamente baixos quando

comparados aos outros meses de estratificação térmica.

6.4. FATORES BIOLÓGICOS

A figura 9 mostra a variação das concentrações de Clorofila a na superfície,

profundidade de 1% de luz e fundo durante os meses amostrados.

45

45

Figura 9: Distribuição das concentrações de clorofila a (μg.L-1

) em cada amostragem na lagoa Palminhas nas seguintes profundidades: Superfície (S), 1% de luz (1%) e fundo (F).

A Figura 9 mostra que as maiores concentrações de clorofila a foram obtidas na

profundidade de 1% de penetração de luz. O máximo de clorofila a nesta

profundidade foi detectado nas amostragens de março e novembro (acima de 8,00

µg.L-1). Já a mínima concentração foi encontrada em julho de 2012 (0,00 µg.L-1). As

concentrações de clorofila a na superfície da lagoa foram sempre menores do que

aquelas encontradas na profundidade de 1% de penetração de luz, exceto em julho

de 2012 e dezembro. A concentração de clorofila a no fundo foi reduzida em todas

as amostragens, próxima a zero devido à ausência de luz.

6.5. PERFIS VERTICAIS DE TEMPERATURA, OXIGÊNIO DISSOLVIDO E

DÉFICIT REAL DE OXIGÊNIO

Os perfis de déficit real de oxigênio foram construídos a partir de dados de

temperatura e oxigênio dissolvido em cada estrato da lagoa. Na Tabela 4 é

apresentado o sumário estatístico descritivo das variáveis temperatura e oxigênio

dissolvido para cada amostragem realizada.

0

1

2

3

4

5

6

7

8

9

S 1% F

Clo

rofi

la a

g/L)

Profundidade

jul/11

jan/12

mar/12

jul/12

nov/12

dez/12

46

46

TABELA 4 – ESTATÍSTICA DESCRITIVA DOS DADOS DE TEMPERATURA E OXIGÊNIO DISSOLVIDO NOS PERFIS AMOSTRAIS

Amostragem Temperatura (°C)

Oxigênio dissolvido (mg.L-1)

Média 23,90 5,20 Jul 2011

Mínimo 23,68 3,27 Máximo 24,69 9,63 Mediana 23,87 5,10 Amplitude 1,01 6,36

Média 26,11 2,48 Jan 2012

Mínimo 24,13 0,32 Máximo 29,75 7,92 Mediana 24,69 0,41 Amplitude 5,62 7,60

Média 26,45 2,44 Mar 2012

Mínimo 24,14 0,32 Máximo 29,98 8,36 Mediana 25,04 0,42 Amplitude 5,84 8,04

Média 24,46 3,16 Jul 2012

Mínimo 24,17 2,55 Máximo 25,54 4,81 Mediana 24,28 2,84 Amplitude 1,37 2,26

Nov 2012

Média Mínimo Máximo

25,70 24,42 28,11

2,93 0,32 8,71

Mediana 24,85 0,39 Amplitude 3,69 8,39

Média 26,52 2,38 Dez 2012

Mínimo 24,43 0,31 Máximo 30,90 8,23 Mediana 25,21 0,42 Amplitude 6,47 7,92

A Tabela 4 mostra que a amplitude de teor de oxigênio ao longo da coluna d’água foi

maior nos meses de estratificação térmica (janeiro, março, novembro e dezembro)

atingindo o seu máximo no mês de novembro (8,39 mg.L-1). Já no período de

circulação da coluna d’água (julho), foi detectada a menor amplitude de

concentração de oxigênio dissolvido ao longo da coluna d’água (2,26 mg.L-1) em

julho de 2012.

47

47

O mês de julho de 2011 apresentou elevada amplitude de concentração de oxigênio

(6,30 mg.L-1), ainda que menor do que os meses caracterizados por estratificação

térmica, indicando que a coluna d’água não apresentava condições homogêneas de

distribuição vertical de oxigênio.

Os valores mínimos de oxigênio dissolvido foram detectados nos meses de

estratificação térmica, ocorrendo em todos estes o processo de anoxia no hipolímnio

da lagoa. O valor mínimo de oxigênio dissolvido (0,31 mg.L-1) foi detectado na

amostragem de dezembro de 2012.

A termoclina sazonal esteve presente ao longo de todas as amostragens realizadas

em meses do período chuvoso, sendo a maior amplitude de variação da temperatura

detectada no mês de dezembro (6,47 °C). A temperatura variou pouco durante os

meses de circulação da coluna d’água. Em julho de 2011 a variação de temperatura

atingiu sua menor amplitude (1,01 °C) e em julho de 2012 atingiu 1,37 °C. O mês de

novembro apresentou a menor amplitude de variação de temperatura (3,69 °C)

dentre os meses de estratificação térmica.

A seguir são mostrados os perfis verticais de temperatura (°C), oxigênio dissolvido

(mg.L-1) e déficit real de oxigênio (mg.L-1) da lagoa Palminhas (Figura 10). São

também representadas a transparência do disco de Secchi (DS) e as profundidades

de delimitação entre epilímnio - metalímnio e metalímnio - hipolímnio.

48

48

Figura 10. Perfis obtidos na estação amostral da lagoa Palminhas em cada mês amostrado. Linha tracejada azul ( - ) representa oxigênio dissolvido, linha contínua vermelha ( __ ) representa

temperatura e linha pontilhada verde (...) representa o déficit real de oxigênio. Linhas horizontais contínuas representam os limites entre epilímnio - metalímnio e metalímnio - hipolímnio.

49

49

Como mostra a Figura 10, a transparência de Secchi não ultrapassou 2,80 m em

todas as amostragens.

A lagoa Palminhas apresentou perfil vertical de oxigênio do tipo clinogrado durante

os meses de estratificação térmica e ortogrado durante os meses de circulação da

coluna d’água. O perfil vertical clinogrado positivo ficou bem demarcado na

amostragem realizada em dezembro, com concentrações de oxigênio dissolvido no

metalímnio superiores àquelas encontradas no epilímnio e hipolímnio. A ausência de

déficit real de oxigênio dissolvido entre 3 e 6 metros de profundidade acontece

concomitantemente a um máximo de concentração de oxigênio de 8,23 mg.L-1 na

profundidade de 5 metros.

Os perfis de déficit real de oxigênio dissolvido, construídos a partir de dados de

temperatura e oxigênio, revelaram a ocorrência de déficit deste gás durante todo o

ano na lagoa Palminhas. Mesmo nos meses de mistura da coluna d’água (julho de

2011 e 2012), o déficit real de oxigênio foi detectado ao longo da coluna d’água,

apesar de atingir menores valores (aproximadamente 4 mg.L-1 no hipolímnio) em

relação ao período de estratificação da coluna d’água (cerca de 8 mg.L-1 no

hipolímnio).

O perfil de déficit real de oxigênio da amostragem de julho de 2011 apresentou

saturação de oxigênio dissolvido em sub-superfície (até 1 m) e déficit real de

oxigênio a partir desta profundidade até o fundo da lagoa. Foi detectada a formação

de uma termoclina temporária que atinge 2 m de profundidade. As concentrações de

oxigênio dissolvido estiveram sempre acima de 3,27 mg.L-1.

Na amostragem de janeiro de 2012 o gradiente de temperatura pode ser visualizado

como uma termoclina sazonal (de 6 a 11 m) que é formada a partir da radiação

solar. Foi detectado déficit real de oxigênio atingindo valores próximos a 8 mg.L-1 e

ocorrência de anoxia (0,32 mg.L-1) no hipolímnio da lagoa.

Na amostragem de março é possível observar o início do afundamento da termoclina

(de 6 a 14 m) que se mostra mais desenvolvida do que em janeiro. Também foi

50

50

detectado déficit real de oxigênio atingindo valores próximos a 8 mg.L-1 e ocorrência

de anoxia (0,32 mg.L-1) no hipolímnio da lagoa.

Em julho de 2012 ocorre então, novamente, a circulação da coluna d’água. Foi

detectada apenas a formação da termoclina temporária que atingiu 4 m de

profundidade. As concentrações de oxigênio dissolvido ao longo da coluna d’água

foram superiores a 2,55 mg.L-1 e o déficit real de oxigênio não ultrapassou 5,77

mg.L-1.

Em novembro, a espessura da termoclina sazonal sofreu redução (de 7 a 10 m). Foi

detectada também a formação de uma termoclina temporária que atingiu 4 m de

profundidade. Foi detectado déficit real de oxigênio atingindo valores próximos a 8

mg.L-1 e ocorrência de anoxia (0,32 mg.L-1) no hipolímnio da lagoa. Houve saturação

de oxigênio dissolvido entre 3 e 7 m de profundidade.

Em dezembro a termoclina sazonal volta a afundar, sendo detectada (de 5 a 11 m).

Também ocorreu saturação de oxigênio na zona eufótica entre 3 e 6 metros de

profundidade. Foi detectado déficit real de oxigênio atingindo valores próximos a 8

mg.L-1 e ocorrência de anoxia (0,31 mg.L-1) no hipolímnio da lagoa.

6.6. DÉFICITS REAL E RELATIVO NA LAGOA PALMINHAS

Abaixo é apresentada a Tabela 5 com dados de déficit real de oxigênio (em

toneladas e em miligrama por unidade de área) e déficit relativo de oxigênio

dissolvido (em miligrama por unidade de área e tempo e por unidade de volume e

tempo) para cada campanha amostral realizada na lagoa Palminhas.

51

51

TABELA 5 – DÉFICIT REAL TOTAL (AOD) E RELATIVO (AHOD E VHOD) DE OXIGÊNIO DISSOLVIDO NA LAGOA PALMINHAS

Amostragem AOD (ton. O2)

AOD (mgO2.cm-2)

AHOD (mgO2.cm-2.dia-1)

VHOD (mgO2.cm-³.dia-1)

Jul 2011 2.022,869 22,987 - - Jan 2012 3.079,516 34,994 0,061 4,07 x 10-5 Mar 2012 3.012,885 34,237 0,061 5,08 x 10-5 Jul 2012 4.532,421 51,505 - - Nov 2012 2.757,574 31,336 0,104 6,93 x 10-5 Dez 2012 3.237,639 36,791 0,075 5,00 x 10-5

Média 3.107,151 35,308 0,075 5,27 x 10-5 Mínimo 2.022,869 22,987 0,061 4,07 x 10-5 Máximo 4.532,421 51,505 0,104 6,93 x 10-5 Mediana 3.046,201 34,616 0,068 5,04 x 10-5

Amplitude 2.509,552 28,518 0,043 2,87 x 10-5 Nota do autor: Os cálculos para os déficits relativos foram feitos em relação a julho de 2012. AOD:

Déficit real de oxigênio; AHOD: Déficit relativo de oxigênio; VHOD: Taxa de consumo de oxigênio por

unidade de volume e tempo.

O valor máximo do déficit real total de oxigênio na lagoa Palminhas (4.532,421

toneladas de O2) foi detectado em julho de 2012 e o valor mínimo (2.022,869

toneladas de O2) foi detectado em julho de 2011. O déficit real total de oxigênio foi

bastante reduzido no mês de novembro (2.757,574 toneladas de O2), o que não

seria esperado para uma amostragem realizada durante um mês típico de

estratificação térmica da coluna d’água. A pluviosidade registrada durante esta

amostragem (82,80 mm) pode ter influenciado a ocorrência deste reduzido déficit

real total de oxigênio.

Apesar de apresentarem o mesmo valor de AHOD, os meses de janeiro e março

apresentam diferentes VHOD. Em janeiro foi detectado o menor VHOD (4,07 x 10-5)

e em novembro o maior VHOD (6,93 x 10-5).

6.7. CORRELAÇÕES ENTRE OS DÉFICITS DE OXIGÊNIO E AS VARIÁVEIS

ESTUDADAS

52

TABELA 6: CORRELAÇÕES DE SPEARMAN PARA AS VARIÁVEIS ESTUDADAS

Nota do autor: Os valores de W, radiação e pluviosidade de julho de 2011 não foram incluídos na correlação de Spearman devido à ausência de dados. AOD: Déficit real de oxigênio; AHOD: Déficit relativo de oxigênio; RTR: Resistência térmica relativa; W: Número de Wedderburn; DS: Transparência do disco de Secchi.

53

53

Como mostra a Tabela 6, o AOD apresentou correlação negativa significativa com a

concentração de clorofila a (r= -0,942). O AOD apresentou correlação positiva com a

RTR, profundidade do hipolímnio, temperatura média do hipolímnio, profundidade o

disco de Secchi e amplitude de temperatura da coluna d’água e negativa com W,

radiação, pluviosidade, e oxigênio médio dissolvido no hipolímnio, embora não

significativa.

O AHOD apresentou correlação negativa com a concentração de clorofila a, RTR,

W, radiação, profundidade do hipolímnio, transparência do disco de Secchi e

amplitude de temperatura da coluna d’água e positiva com a pluviosidade,

temperatura média do hipolímnio e oxigênio dissolvido médio no hipolímnio, embora

não significativa.

54

54

7. DISCUSSÃO

As mudanças na intensidade da radiação solar ao longo do ano e a significativa

atenuação desta com a profundidade são responsáveis pelas alterações na estrutura

térmica de ecossistemas lacustres (HENRY, 1995). Correlações feitas entre a

radiação acumulada durante os 7 dias anteriores às amostragens e os déficits real e

relativo de oxigênio mostram que embora não sejam significativas, possuem

comportamento inverso.

A correlação significativa positiva encontrada entre a radiação e o RTR sugere que o

aumento da incidência solar ocasiona estratificação térmica que resulta em maior

estabilidade da coluna d’água. A intensificação da estabilidade isola o hipolímnio das

camadas superiores e, consequentemente, favorece o aumento de AOD (correlação

positiva não significativa) na lagoa.

Segundo Dussart (1966, apud HENRY, 1995, p. 351), “fatores geográficos como a

latitude e morfométricos como a área superficial, profundidade e o formato da lagoa

também influenciam no regime térmico do corpo d’água”. Fatores morfométricos

como o IDM = 8,1 que reflete um padrão alongado e dendrítico, além da

considerável profundidade média (14,22 m) dificultam a atuação do vento e

favorecem a formação de uma termoclina sazonal durante a maior parte do ano na

lagoa Palminhas. O declive de cerca de 50 m entre as vertentes da Formação

Barreiras e a superfície da Lagoa também dificultam a atuação do vento (i.e., fetch)

e, consequentemente, a mistura vertical da coluna d’água.

Segundo Franzen (2009), “o número de Wedderburn pode ser considerado como

uma resposta da coluna d’água do ecossistema lacustre à ação do vento”.

Thompson e Imberger (1980, apud Franzen, 2009, p. 16) relacionam valores de W

menores do que 1 a maior susceptibilidade da coluna d’água à mistura e,

consequentemente, ascensão da termoclina à superfície”. Sendo assim, é provável

55

55

que apesar de ter sido detectado (W = 3,00) na amostragem de julho de 2012, a

coluna d’água da lagoa Palminhas tenha estado em condição de mistura completa

durante o período noturno. Essa resposta da coluna d’água à ação do vento, durante

o dia, pode estar relacionada à elevada RTR (25,65) resultante da formação de

termoclinas temporárias diurnas (Figura 10). Segundo Delazari-Barroso (2007), “um

maior número de Wedderburn implica em maior estabilidade da estrutura térmica e

menor turbulência gerada pelo vento”. A variável W mostrou correlação positiva

significativa com a RTR, logo, a coluna d’água estava fisicamente mais estável e

menos susceptível à circulação durante a amostragem de março quando apresentou

elevados W (304,84) e RTR (45,10), além de menor intensidade de vento (1,70 m.s-

1). Em janeiro e março o W foi elevado indicando alta estabilidade física da coluna

d’água (Tabela 3).

A lagoa Palminhas apresentou elevada resistência térmica relativa à mistura (Tabela

3) nos meses caracterizados por estratificação térmica e perfil de temperatura

praticamente isotérmico durante o período de circulação da coluna d’água. A

variação de temperatura ao longo da coluna d’água foi maior nos meses de

estratificação térmica atingindo a maior amplitude no mês de dezembro (6,47°C)

(Tabela 4). Essa variação é devida à elevada intensidade de radiação que incide na

superfície do ecossistema aquático e aquece os estratos superiores elevando a RTR

(correlação positiva não significativa) e, consequentemente, a amplitude térmica na

coluna d’água (correlação positiva significativa). Como já mencionado, a significativa

absorção da radiação térmica nas camadas superficiais impede que esta atinja os

estratos inferiores da lagoa e ocasione homogeneidade de temperatura. Já no

período de circulação da coluna d’água, foi detectada a menor variação de

temperatura ao longo da coluna d’água (1,01°C) em julho de 2011. Segundo Henry;

Pontes; Tundisi (1997), “essa reduzida amplitude de temperatura é decorrente da

perda de calor que ocorre no inverno devido ao resfriamento das camadas

superiores”.

Foram observadas termoclinas temporárias de formação diurna nos estratos

superiores do epilímnio da lagoa nas amostragens de novembro, julho de 2011 e

56

56

julho de 2012 (Figura 10). Segundo Henry (1995), “as termoclinas sazonais são

observadas nas zonas profundas do ecossistema lacustre, enquanto que

microestratificação temporárias ocorrem no epilímnio”.

Segundo Tundisi; Matsumura-Tundisi (2008), “o perfil vertical de oxigênio de um

ecossistema lêntico é dependente do padrão de estratificação térmica e circulação

da coluna d’água, bem como da distribuição vertical e atividade de organismos”. A

lagoa Palminhas apresentou perfil vertical de oxigênio do tipo clinogrado durante os

meses de estratificação térmica. Esteves (1998) também classificou o tipo de perfil

vertical de oxigênio nesta lagoa como clinogrado. Bozelli et al. (1992) destacaram

que a lagoa Palminhas possui perfil de oxigênio do tipo clinogrado positivo e que

este está relacionado a um aumento da produção fitoplânctônica no metalímnio a

partir do avanço da camada trofogênica até o mesmo. A produtividade primária

metalimnética seria favorecida também pela reduzida herbivoria e elevada

concentração de nutrientes existentes neste estrato da coluna d’água.

Segundo Matsumura-Tundisi; Tundisi (1995), “durante períodos de intensa

estratificação e estabilidade da coluna d’água é comum a ocorrência de anoxia no

hipolímnio de ecossistemas lênticos”. Durante o período de estratificação térmica da

coluna d’água foi detectada reduzida concentração de oxigênio no hipolímnio da

lagoa (0,31 a 0,32 mg.L-1), o que caracteriza o processo de anoxia. Este processo

também foi observado por Henry; Pontes; Tundisi (1997) no lago Dom Helvécio,

localizado no Médio Rio Doce (MG). A concentração média de oxigênio dissolvido no

hipolímnio apresentou correlação negativa significativa com o W, RTR, profundidade

do hipolímnio e amplitude de temperatura na coluna d’água. Estas correlações

sugerem que a intensificação da estratificação ocasiona maior estabilidade da

coluna d’água (W, RTR) que dificulta a difusão de oxigênio do epilímnio para o

hipolímnio.

O maior AOD total foi detectado na amostragem de julho de 2012 (4.532,421

toneladas de O2). A correlação negativa significativa entre concentração de clorofila

57

57

a e AOD total sugere que esse valor elevado, não esperado em amostragens de

períodos de circulação da coluna d’água, possivelmente é resultado da baixa

produtividade primária (Figura 9). Segundo Henry; Pontes; Tundisi (1989), “a

magnitude da difusão atmosférica de oxigênio para o ecossistema lacustre é

praticamente irrelevante quando comparada com aquela do subproduto da

fotossíntese”. Dessa forma, é possível que a lagoa tenha sido afetada pela redução

do aporte de oxigênio mais relevante para a coluna d’água, o que ocasionou o

elevado déficit real de oxigênio desde a superfície (valores próximos a 4,00 mg.L-1)

até o hipolímnio (valores próximos a 6,00 mg.L-1) da lagoa, situação bem distinta da

encontrada em julho de 2011.

O menor AOD total de oxigênio (2.022,869 toneladas de O2) foi detectado em julho

de 2011. Provavelmente, a elevada produção primária foi a responsável pelo

reduzido déficit quando comparado com as outras amostragens. A concentração de

clorofila a nesta amostragem foi a mais elevada em superfície e apresentou valores

consideráveis na profundidade de 1 % de luz (6, 76 µg.L-1) (Figura 9).

O AOD total foi bastante reduzido no mês de novembro (2.757,574 toneladas de O2),

o que não seria esperado para uma amostragem realizada durante um mês típico de

estratificação térmica da coluna d’água. Porém, é possível que a elevada produção

primária na profundidade de 1 % de luz seja a responsável pela renovação de

oxigênio e diminuição da depleção deste na lagoa. É provável que apesar de não ter

sido detectada concentração de clorofila a em superfície, tenha ocorrido uma

compensação da produção no metalímnio como mostra a Figura 9.

Em estudo realizado em 18 lagoas por Bozelli et al. (1992) entre o período de 26 de

fevereiro a 06 de março de 1986, os autores encontraram a maior transparência de

Secchi (9,00 m) na lagoa Palminhas. Segundo Bozelli et al. (1992), “esta elevada

penetração da luz era resultado do reduzido teor de material em suspensão e

dissolvido na coluna d’água”. Já os resultados de transparência de Secchi obtidos

nas amostragens de janeiro e março de 2012 revelam que após 26 anos este

58

58

ecossistema lacustre encontra-se bastante alterado e apresenta transparência de

Secchi de no máximo 2,80 m (Figura 10). A relevante atenuação da luz na coluna

d’água desta lagoa pode estar relacionada ao processo de eutrofização artificial que

já ocorre neste ecossistema e, provavelmente, tem se agravado pelo aporte de

matéria orgânica oriunda dos cultivos de piscicultura. Bezerra Neto; Pinto-Coelho

(2001) encontraram correlação negativa significativa entre o AHOD e a

transparência do disco de Secchi na lagoa do Nado. A correlação feita para a lagoa

Palminhas também foi negativa, porém não significativa. Henry (1992) também não

encontrou correlação significativa entre o AHOD e a transparência do disco de

Secchi no reservatório Jurumirim. Essa correlação negativa provavelmente é devido

ao aumento da profundidade da zona eufótica, com consequente aumento de

produtividade primária e redução da depleção de oxigênio.

A fim de se fazer uma comparação entre os déficits real e relativo de oxigênio na

lagoa Palminhas e de 5 ecossistemas lacustres tropicais é apresentada a Tabela 7

com os dados morfométricos destes ambientes.

TABELA 7 – DADOS MORFOMÉTRICOS DOS ECOSSISTEMAS LACUSTRES NO BRASIL PARA COMPARAÇÃO COM A LAGOA PALMINHAS

Ecossistema lacustre

A (m2)

Zmax (m)

Zm (m)

V (m3)

IDM IDV Referência

Lagoa Palminhas

8,80 x 107 31,6 14,2 9,67 x 108 8,1 1,35 Barroso et al. (2012)

Lago Dom Helvécio

6,87 x 106 32,5 12,1 8,31 x 106 4,84 1,12 Henry; Pontes; Tundisi (1997)

Lagoa do Nado

1,50 x 104 7,6 2,7 4,06 x 104 2,75 1,07 Bezerra-Neto; Pinto Coelho (2001)

Reservatório de Jurumirim

4,46 x 108 40 12,9 7,01 x 109 14,90 0,97 Henry (1992)

Reservatório das Garças

8,82 x 104 4,7 2,04 1,89 x 105 1,46 1,30 Tucci et al. (2006)

Área superficial [As], profundidades máxima [Zmax], média [Zm], volume [V], índice de desenvolvimento de margem [IDM] e índice de desenvolvimento de volume [IDV]. Nota do autor: Os valores de IDM e IDV da lagoa Palminhas, reservatório de Jurumirim, lago Dom Helvécio e reservatório das Garças foram calculados pelo autor deste trabalho, a partir de dados morfométricos das referências citadas na Tabela 7.

Dentre os ecossistemas comparados, o reservatório Jurumirim detém a maior área

superficial (446,0 km2), profundidade máxima (40m), o maior volume (7,0 km3) e o

59

59

maior IDM (14,90). A lagoa Palminhas apresenta a maior profundidade média (14,22

m) e IDV (1,35). A lagoa do Nado e o reservatório das Garças são os ecossistemas

que apresentam as menores dimensões morfométricas dentre os 5 estudados.

A tabela 8 mostra que o déficit de oxigênio na Lagoa Palminhas é cerca de 27 vezes

superior ao registrado na lagoa do Nado, 71 vezes superior ao registrado no

reservatório de Jurumirim, 33 vezes superior ao registrado no reservatório das

Garças e 5 vezes superior ao registrado no reservatório Kariba.

TABELA 8: DÉFICITS REAL E RELATIVO DE OXIGÊNIO DE 6 ECOSSISTEMAS LACUSTRES

Ambiente lacustre AOD (mgO2.cm-2)

AHOD (mgO2.cm-2.dia-1)

Referência

Lagoa Palminhas (ES)

22,99 – 51,51 0,061-0,104 Presente estudo

Lago Dom Helvécio (MG)

1,73 – 2,37 0,019 – 0,043 Henry; Pontes; Tundisi (1989)

Lagoa do Nado (MG)

0,53 – 1,86 0,001 – 0,007 Bezerra-Neto; Pinto-Coelho (2001)

Reservatório de Jurumirim (SP)

0,03 – 1,52 0,013 – 0,032 Henry (1992)

Reservatório das Garças (SP)

0,40 – 1,52 - Henry (1999)

Reservatório Kariba (África)

10,14 0,083 Coche (1974, apud Henry, 1992, p.382)

Fonte: Bezerra-Neto; Pinto-Coelho (2001). Nota: Dados adaptados pelo autor.

Conforme mostra a Tabela 8, o lago Dom Helvécio, localizado no médio Rio Doce,

apresentou déficit real de oxigênio máximo igual a 2,37 mgO2.cm-2, o que equivale a

163,28 toneladas de oxigênio (Henry; Pontes; Tundisi, 1997). A profundidade

máxima deste lago na época do estudo sobre o déficit de oxigênio era conhecida

como 32,5 metros. Estudos posteriores realizados por Bezerra-Neto; Pinto-Coelho

(2008) revelam profundidade máxima de 39,2 m, área superficial de 5.270.000 m2 e

volume equivalente a 59.600.000 m³. Henry; Pontes; Tundisi (1989) atribuíram o

déficit de oxigênio neste lago ao processo de decomposição biológica da matéria

orgânica ao longo da coluna d’água.

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60

O AOD total no reservatório das Garças (Tabela 8), semelhante ao detectado na

lagoa do Nado, foi baixo, provavelmente devido à maior atuação do vento, já que

essa possui profundidade um pouco menor e maior área superficial quando

comparada com a Lagoa do Nado (NOGUEIRA; RAMIREZ, 1998 apud BEZERRA-

NETO; PINTO COELHO, 2001, p. 114). Henry (1999, apud Bezerra-Neto; Pinto-

Coelho, 2001, p. 114), atribuiu a variação sazonal do déficit real de oxigênio no

reservatório das Garças ao consumo deste gás após a senescência da população

de Microcystis aeruginosa.

O reservatório Jurumirim, detentor do maior volume, área e profundidade máxima

dentre os 5 ecossistemas lênticos brasileiros comparados, apresentou os menores

AOD totais variando de 0,03 a 1,52 mgO2.cm-2 em abril e junho, respectivamente

(Tabela 8). Henry (1992) atribuiu a variação do déficit relativo deste reservatório à

amplitude de temperatura entre a superfície e o fundo (correlação negativa

significativa) e a outros fatores não estudados. O autor também destaca que as

fontes de oxigênio para este ecossistema são a fotossíntese fitoplanctônica, a

difusão atmosférica (baixa relevância) e o input deste gás pelos tributários.

A lagoa Palminhas, situada no baixo Rio Doce, apresentou AOD total máximo

equivalente a 51,505 mgO2.cm-2 (Tabela 8), o que equivale a 4.532,421 toneladas de

oxigênio. Este elevado déficit de oxigênio dissolvido é provavelmente resultado de

um conjunto de fatores como o formato dentrítico da lagoa (IDM= 8,1) e a

considerável profundidade média (14,22 m) que dificultam a atuação do vento, além

da elevada carga orgânica oriunda da piscicultura. Segundo Bezerra-Neto; Pinto-

Coelho (2001), “ecossistemas lênticos que detém hipolímnio espesso estão sujeitos

a déficits de oxigênio devido à oxidação da matéria orgânica ao longo da coluna

d’água”. Sendo assim, o consumo de oxigênio na decomposição da matéria orgânica

oriunda da piscicultura também contribui para a depleção de oxigênio na lagoa, visto

que esta possui profundidade média moderada e pontos aonde a profundidade

61

61

chega a atingir 31,6 m. A lagoa Palminhas apresentou condição mesotrófica quando

aplicado o Índice de estado trófico médio por Sabadini (2012).

Sendo o AOD total no lago Dom Helvécio cerca de 21 vezes menor que o

apresentado pela Lagoa Palminhas, é provável que o formato mais dendrítico e o

maior volume desta (116 vezes maior) sejam alguns dos principais fatores

determinantes para o elevado déficit real de oxigênio na lagoa Palminhas.

É importante ressaltar que o déficit de oxigênio da Lagoa Palminhas já é muito

superior aos dos outros 4 ecossistemas lacustres brasileiros estudados

anteriormente por outros pesquisadores (Figura 8). Provavelmente, a carga orgânica

oriunda dos cultivos de piscicultura contribui para a magnitude do déficit de oxigênio

nesta, já que os outros ecossistemas comparados são reservatórios (Nado, Garças

e Jurumirim) ou área protegida (lago Dom Helvécio) em que não é desenvolvida esta

atividade. O lago Kariba, localizado na África, apresenta elevado AOD (10,14 mg.cm-

2) quando comparado com estes 4 ecossistemas brasileiros, no entanto, é cerca de 5

vezes menor do que o registrado na lagoa Palminhas. Considerando-se a magnitude

dos déficits de oxigênio, a lagoa Palminhas assemelha-se mais ao lago Kariba do

que aos ecossistemas lacustres brasileiros citados.

Em relação à primeira hipótese proposta, foi aceita a hipótese alternativa H1, pois

foram detectados déficits de oxigênio ao longo da coluna d’água durante todas as

amostragens realizadas na lagoa Palminhas.

As hipóteses 2 e 4 foram negadas e aceitas as hipóteses nulas, pois não foram os

fatores físicos ou climáticos que determinaram a variação de oxigênio ao longo do

ano na lagoa, e sim um fator biológico, no caso, a produção fitoplanctônica.

62

62

A hipótese 3 foi aceita, pois a concentração de clorofila a influenciou negativamente

a ocorrência de AOD, porém é importante destacar que outros fatores biológicos

como a oxidação da matéria orgânica oriunda dos cultivos de peixes em tanque-rede

provavelmente contribuem para a magnitude deste déficit. Seria de grande utilidade

a realização futura da análise da Demanda Bioquímica de Oxigênio (DBO) para que

fosse analisada a demanda de oxigênio para a decomposição de matéria orgânica e

respiração dos organismos aquáticos presentes na lagoa.

A hipótese 5 também foi aceita, já que os déficits de oxigênio calculados para a

lagoa Palminhas foram superiores àqueles encontrados anteriormente, por outros

pesquisadores.

63

63

8. CONCLUSÕES

A lagoa Palminhas apresentou estratificação térmica durante a maior parte do ano e

isotermia durante o período de circulação da coluna d’água.

A lagoa Palminhas apresentou perfil vertical de oxigênio do tipo clinogrado durante o

período de estratificação térmica, com ocorrência do processo de anoxia no

hipolímnio desta. Já, durante o período de circulação da coluna d’água, a lagoa

apresentou perfil aproximadamente ortogrado.

Dentre as correlações feitas entre os vários parâmetros estudados, a concentração

de clorofila a foi associada à variação de AOD durante as amostragens neste

ecossistema lêntico. Elevadas concentrações de clorofila a, provavelmente, estão

relacionadas à maior produção fitoplanctônica e, consequentemente, maior

renovação de oxigênio e menor AOD no ecossistema.

Como a variação do déficit relativo de oxigênio na lagoa Palminhas não foi explicada

pela correlação com a concentração de clorofila a na zona eufótica ou outras

variáveis, é provável que outros fatores também influenciem na magnitude do déficit

neste ecossistema. É necessário um estudo da influência de outros fatores

biológicos como a decomposição da matéria orgânica na determinação do déficit de

oxigênio na lagoa Palminhas. A atividade de piscicultura em tanque-rede,

desenvolvida nesta lagoa, provavelmente contribui para esta suposição, já que os

resíduos de ração e a excreção dos peixes sofrem oxidação durante a sedimentação

e contribuem para a depleção de oxigênio.

Os déficits de oxigênio encontrados na lagoa Palminhas são elevados quando

comparados com outros ecossistemas lacustres tropicais. É provável que além de

fatores morfométricos (profundidade moderada e IDM elevado), o consumo de

64

64

oxigênio na decomposição de matéria orgânica exerça grande influência na

magnitude do déficit de oxigênio, já que esta lagoa já sofre processo de eutrofização

artificial e foi classificada como mesotrófica por SABADINI (2012). A magnitude dos

déficits de oxigênio encontrada na lagoa Palminhas provavelmente possuem relação

com a atual condição mesotrófica desta, que já apresenta reduzida transparência do

disco de Secchi e produção de sulfeto no fundo.

65

65

9. REFERÊNCIAS

ANA. Agência Nacional das Águas. Disponível

em:<http://hidroweb.ana.gov.br/Estacao.asp?Codigo=1940004 >. Acesso em: 15

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Ambiental. Vitória. 1998.

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conservação. In: MENEZES, L. F. T.; PIRES, F. R.; PEREIRA, O. J. (orgs.).

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