morfoanatomia de espécies lacustres de monocotiledôneas do

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Universidade Estadual de Feira de Santana Departamento de Ciências Biológicas Programa de Pós-Graduação em Botânica Morfoanatomia de Espécies Lacustres de Monocotiledôneas do Semi-árido da Bahia, Brasil Kelly Regina Batista Leite FEIRA DE SANTANA – BA 2008

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Universidade Estadual de Feira de Santana Departamento de Ciências Biológicas

Programa de Pós-Graduação em Botânica

Morfoanatomia de Espécies Lacustres de

Monocotiledôneas do Semi-árido da Bahia, Brasil

Kelly Regina Batista Leite

FEIRA DE SANTANA – BA 2008

ii

Universidade Estadual de Feira de Santana Departamento de Ciências Biológicas

Programa de Pós-Graduação em Botânica

Morfoanatomia de Espécies Lacustres de

Monocotiledôneas do Semi-árido da Bahia, Brasil

Kelly Regina Batista Leite

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Botânica da Universidade Estadual de Feira de Santana, como parte dos requisitos necessários para obtenção do título de Doutor em Botânica.

Profa. Dra. Vera Lúcia Scatena (UNESP – Rio Claro) Orientadora

Prof. Dr. Flávio França (UEFS)

Co-Orientador

FEIRA DE SANTANA – BA 2008

iii

BANCA EXAMINADORA

Profa. Dra. Vera Lúcia Scatena (UNESP-Rio Claro) Orientadora e Presidente da Banca

Alessandra Ike Coan (UFPR)

Delmira Costa da Silva (UESC)

Cláudia Elena Carneiro (UEFS)

Francisco de Assis Ribeiro dos Santos (UEFS)

iv

...

e aprendi que se depende sempre de tanta muita diferente gente

toda pessoa sempre é as marcas das lições diárias de outras tantas pessoas

e é tão bonito quando a gente entende que a gente é tanta gente onde quer que a gente vá

é tão bonito quando a gente sente que nunca está sozinho

por mais que pense estar

e é tão bonito quando a gente pisa firme nessas linhas que estão

nas palmas de nossas mãos

é tão bonito quando a gente vai à vida nos caminhos onde bate

bem mais forte o coração

...

(Gonzaguinha)

v

À Deus, pois só a Ti devemos toda a honra e toda a glória.

Aos meus pais, João e Airma, aos meus irmãos, Mônica e Lincoln, e por último, mas muito importante, ao meu marido Vlamir, eu dedico.

vi

AGRADECIMENTOS

Ao Senhor Deus, pela coragem que me deu para enfrentar mais este desafio e por

permitir que eu chegasse até o final dele. Obrigada meu Pai por ter me dado uma família e

amigos que me ajudaram em todos os momentos desta jornada.

Ao Programa de Pós-Graduação em Botânica da Universidade Estadual de Feira de

Santana (PPGBot/UEFS) pela oportunidade de realização do curso.

À Profa. Dra. Vera Lúcia Scatena, minha orientadora, pela coragem de ter assumido a

orientação à distância, pela confiança, paciência e estímulo, pelas conversas científicas e

sobre a vida pessoal e profissional, pela segurança e tranqüilidade que sempre me passou

quando eu ligava desesperada e, principalmente, por ter entendido e apoiado todas as

mudanças que aconteceram na minha vida ao longo desses quatro anos (que não foram

poucas). Obrigada não apenas pela orientação, mas pelo seu carinho e amizade.

Ao Prof. Dr. Flávio França por ter me apresentado às plantas aquáticas e por ter

aceitado ser meu co-orientador; pelo incentivo, confiança e apoio em todos os momentos.

Ao Prof. Dr. Francisco de Assis Ribeiro dos Santos. Você foi o responsável pelos

primeiros vôos alçados, por me mostrar como era importante sair e conhecer outras

realidades. Obrigada pela amizade e incentivo desde a graduação.

Ao Prof. Dr. Luciano Paganucci de Queiroz, curador do Herbário HUEFS, onde

trabalhei alguns anos e durante os dois anos e meio do início da tese. Obrigada pelo incentivo

e pelo apoio no curso de doutorado, mesmo quando me ausentava do trabalho.

Ao Prof. Dr. Cássio van den Berg pela GRANDE ajuda na análise de similaridade.

Ao Prof. Dr. Marccus Alves (UFPE) pela atenção dispensada quando da minha estada

em Recife e por ter me ensinado a diferenciar as espécies de Cyperaceae com as quais eu

trabalhava.

Ao estagiários do Laboratório de Morfo-Taxonomia Vegetal da UFPE que me

receberam tão bem, em especial, à Msc. Shirley Martins, por ter cedido sua casa quando

vii

estive em Recife para aprender mais sobre Cyperaceae. Obrigada pelas conversas e pela

amizade que daí surgiu.

À Profa. Dra. Joana Angélica Guimarães da Luz, diretora do Instituto de Ciências

Ambientais e Desenvolvimento Sustentável (ICADS) da Universidade Federal da Bahia, pela

amizade e por ter concedido minhas licenças para poder concluir a tese.

Aos meus colegas de trabalho da UFBA-Barreiras, Prof. Jorge Costa, Profa. Loislene

Brito, Profa. Luci Ribeiro, Profa. Renata Canalle (que agora está na UFPI) e Profa. Agda

Rocha (que está na Infraero), por terem entendido minhas ausências por conta da tese e pela

amizade nesta nova etapa da vida que começamos juntos em Barreiras. Agradeço

principalmente à Luci por ter ficado com minha turma para que eu pudesse me ausentar e a

Jorge Costa, por compreender, aceitar e confiar numa vice-coordenadora de Colegiado que se

ausentava tanto, OBRIGADA PELO INCENTIVO!!!

À Adriana e Gardênia, secretárias do PPGBot/UEFS, pela atenção, paciência e

disponibilidade em atender a todos nós, sempre precisando de muitas coisas.

Aos amigos do Herbário HUEFS, Elaine, Renata, Silvinha, Téo e Zezé. Quero incluir

aqui, Úlvia (Élvia), Andréa Karla, Paty, Dani, Milene, Paula Dib e Cosme. Obrigada pelos

muitos anos de convivência, pelas conversas e alegrias proporcionadas, sinto muita falta de

vocês.

Aos meus GRANDES amigos do Laboratório de Micromorfologia Vegetal – Bárbara,

Cláudia, Hilder, Jaílson, Lázaro, Luciene, Marcos, Mari, Paulino, Ricardo, Rita e Teresa e aos

estagiários com quem convivi trocando informações, idéias, técnicas e é claro, agradáveis

momentos de descontração durante a hora do café ou nos almoços do laboratório. Sinto muita

falta dessa família!!!

Ao meu amigo Paulino, companheiro de longas datas, de conversas e de dúvidas... só

nós dois sabemos como é bom entendermos um ao outro.

À Dione e Adriano, funcionários do Laboratório de Águas e Saneamento do

Departamento de Tecnologia da Universidade Estadual de Feira de Santana, pelas análises de

viii

água proveniente das lagoas. À Alê, Adriana, Aline e Rita, da UNESP de Rio Claro, pela paciência em me ensinar

algumas técnicas e pelas conversas em dias difíceis e de saudade. Agradeço principalmente a

Aline e Alê pelas dicas valiosas sobre a tese.

Ao meu amigo estatístico Marcelo de Paula, colega da UFBA-Barreiras, que tanto me

ajudou. Obrigada Lindinho.

Aos meus queridos alunos da UFBA pelo incentivo e torcida

À Aline, Agda, Maria Antonia e Andria, as meninas do pensionato de Dona Maria (in

memorian) e seu Sebastião. Quando estava em Rio Claro, vocês muito me ajudaram a

diminuir a saudade que sentia de casa.

À Dani pela ajuda na confecção dos mapas e Gisele Rocha pela atenção e paciência na

obtenção das imagens ao MEV.

Agradeço imensamente à Profa. Néa Andrade de Macêdo pela dedicação e paciência

com que me ensinou a gostar da anatomia vegetal.

Aos meus pais João e Airma, aos meus irmãos Mônica e Lincoln e a Aninha. O final

desta jornada significa uma conquista, que sei, também é de vocês. Obrigada por sempre

estarem ao meu lado, mesmo eu estando sempre longe e por terem entendido a minha

ausência e humor algumas vezes instável.

Ao meu querido marido Vlamir, meu amor, meu porto seguro e meu companheiro de

todas as horas. Você não tem noção do quanto me ajudou, me deu coragem, apoio, força,

incentivo, carinho, tranqüilidade e, principalmente, compreendeu a minha ausência, até

mesmo quando eu estava ao seu lado. Sem você tudo teria sido muito mais difícil. Essa

conquista é nossa e para a nossa família, que já está crescendo...

O final desta tese significa apenas que mais uma etapa foi cumprida, não a última;

significa que sentirei saudades de muitas pessoas, coisas, lugares e situações; e se os últimos

quatro anos foram os mais difíceis saibam também, que eles foram os mais felizes.

OBRIGADA A TODOS!!!!

ix

SUMÁRIO

SUMÁRIO ........................................................................................................... ix

LISTA DE FIGURAS ......................................................................................... x

RESUMO .......................................................................................................... xiv

ABSTRACT ....................................................................................................... xv

INTRODUÇÃO GERAL .................................................................................... 1

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................. 6

CAPÍTULO I ....................................................................................................... 8

Anatomia de espécies anfíbias de Cyperaceae de lagoas do semi-árido, Bahia, Brasil ..................................................................................................................... 8

CAPÍTULO II .................................................................................................... 42

Anatomia de espécies emergentes de lagoas temporárias da Bahia, Brasil ........ 42

CAPÍTULO III .................................................................................................. 74

Convergência adaptativa em espécies de monocotiledôneas lacustres do semi-árido da Bahia, Brasil .......................................................................................... 74

CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................... 93

x

LISTA DE FIGURAS INTRODUÇÃO GERAL

Figura 1. Lagoa temporária do semi-árido baiano no período seco ................................................ 5

Figura 2. Lagoa temporária do semi-árido baiano no período alagado ........................................... 5

CAPÍTULO I

Figuras 1-12. Aspectos morfológicos de espécies de Cyperaceae: 1-3: Cyperus odoratus L. 1.

Hábito, 2. Detalhe do sistema subterrâneo. 3. Secção transversal da região mediana do

escapo. 4-6: Oxycaryum cubense (Poep. & Kunth) Lye 4. Hábito. 5. Detalhe do

sistema subterrâneo. 6. Secção transversal da região mediana do escapo. 7-9: Pycreus

macrostachyos (Lam.) Raynal 7. Hábito. 8. Detalhe do sistema subterrâneo. 9. Secção

transversal da região mediana do escapo. .......................................................................... 29 

Figuras 10-19. Fotomicrografias de secções transversais da região mediana de raízes de

espécies de Cyperaceae: 10-12. Cyperus odoratus L. 10. Aspecto geral. 11. Detalhe da

epiderme e exoderme. 12. Detalhe do cilindro vascular. 13-16. Oxycaryum cubense

(Poep. & Kunth) Lye. 13. Aspecto geral - raiz adulta. 14. Detalhe da epiderme e

exoderme. 15. Detalhe do cilindro vascular. 16. Aspecto geral - raiz jovem. 17-19.

Pycreus macrostachyos (Lam.) Raynal. 17. Aspecto geral. 18. Detalhe da epiderme e

exoderme. 19. Detalhe do cilindro vascular.. .................................................................... 30 

Figuras 20-26. Fotomicrografias de secções transversais da região mediana de rizomas de

espécies de Cyperaceae: 20-21. Cyperus odoratus L. 20. Aspecto geral. 21. Detalhe do

cilindro vascular. 22-24: Oxycaryum cubense (Poep. & Kunth) Lye. 22. Aspecto geral

do rizoma. 23. Região do nó do estolão. 24. Região do entrenó do estolão. 25-26.

Pycreus macrostachyos (Lam.) Raynal. 25. Aspecto geral. 26. Detalhe do cilindro

vascular .............................................................................................................................. 32 

Figuras 27-35. Fotomicrografias de secções paradérmicas e transversais de folhas de espécies

de Cyperaceae: 27-32. Vista frontal da epiderme. 27-28. Cyperus odoratus L. 27. Face

adaxial. 285. Face abaxial com estômatos. 29-30. Oxycaryum cubense (Poep. &

Kunth) Lye. 29. Face adaxial. 30. Face abaxial com estômatos. 31-32. Pycreus

xi

macrostachyos (Lam.) Raynal. 31. Face adaxial. 32. Face abaxial com estômatos. 33-

35. Bordo foliar. 33. Cyperus odoratus L. 34. Oxycarium cubense (Poep. & Kunth)

Lye. 35. Pycreus macrostachyos (Lam.) Raynal ............................................................... 34 

Figuras 36-45. Fotomicrografias de secções transversais de folhas de espécies de Cyperaceae:

36-37. Cyperus odoratus L. - nervura central e mesofilo, respectivamente. 38-40.

Oxycarium cubense (Poep. & Kunth) Lye - nervura central na região mediana, na

região apical, e mesofilo na região mediana, respectivamente. 41-44. Pycreus

macrostachyos (Lam.) Raynal – 41-42. nervura central na região mediana e basal,

respectivamente. 43. Detalhe do diafragma. 44. Detalhe do mesofilo. 45. Cyperus

odoratus - detalhe do cristal cônico.. ................................................................................. 36

Figuras 46-56. Fotomicrografias de secções transversais da região mediana de escapos de

espécies de Cyperaceae: 46-48. Cyperus odoratus L. - aspecto geral, detalhe do

córtex e da epiderme, respectivamente. 49-51. Oxycarium cubense (Poep. & Kunth)

Lye - aspecto geral, detalhe do feixe vascular composto e simples, respectivamente.

52-54. Pycreus macrostachyos (Lam.) Raynal - aspecto geral, detalhe dos feixes

vasculares com estrutura Kranz e do feixe vascular colateral, respectivamente. 55-56.

Detalhe da epiderme. 55. Oxycaryum cubense (Poep. & Kunth) Lye. 56. Pycreus

macrostachyos (Lam.) Raynal. Legenda: Cl = clorênquima; Ff = feixe de fibras; Hi

=hipoderme; La = lacuna de ar. ..... ...........................................................................39

CAPÍTULO II

Figuras 1-6. Aspectos morfológicos de espécies de monocotiledôneas: 1-2. Echinodorus

grandiflorus (Alismataceae). 1.Hábito. 2. Detalhe do sistema subterrâneo. 3-4.

Eichhornia paniculata (Pontederiaceae). 3. Hábito. 4. Detalhe do sistema subterrâneo.

5-6: Habenaria repens (Orchidaceae). 5. Hábito. 6. Detalhe do sistema subterrâneo. ..... 62 

Figuras 7-18. Fotomicrografias de aspectos anatômicos de secções transversais de raízes de

espécies de monocotiledôneas: 7-12. Echinodorus grandiflorus (Alismataceae). 7-8.

Aspecto geral da raiz jovem. 9. Raiz adulta. 10. Detalhe da epiderme e exoderme. 11.

Detalhe do cilindro vascular. 12. Detalhe das células braciformes que se rompem e

formam as lacunas de ar - setas. 13-15. Eichhornia paniculata (Pontederiaceae) – raiz

adulta. 13. Aspecto geral. 14. Detalhe da epiderme e exoderme. 15. Detalhe do

cilindro vascular. 16-18. Habenaria repens (Orchidaceae) – raiz adulta. 16. Aspecto

xii

geral. 17. Detalhe da epiderme e córtex. 18. Detalhe da endoderme com estrias de

Caspary e cilindro vascular. ............................................................................................... 63 

Figuras 19-25. Fotomicrografias de aspectos anatômicos de secções transversais da região

mediana do rizoma de espécies de Monocotiledôneas: 19-20. Echinodorus

grandiflorus (Alismataceae): 19. Aspecto geral. 20. Detalhe da região do cilindro

vascular. 21-23: Eichhornia paniculata (Pontederiaceae): 21. Aspecto geral do córtex

com lacunas de ar e raízes intracorticais. 22. Detalhe do córtex e cilindro vascular. 23.

Detalhe da saída de raiz. 24-25: Habenaria repens (Orchidaceae): 24. Aspecto do

córtex com lacunas de ar. 25. Detalhe da endoderme e cilindro vascular. ........................ 66 

Figuras 26-31. Fotomicrografias de aspectos anatômicos da região mediana da epiderme foliar

em vista frontal, de espécies de Monocotiledôneas: 26-27. Echinodorus grandiflorus

(Alismataceae) - Face adaxial e abaxial, respectivamente. 28-29: Eichhornia

paniculata (Pontederiaceae) - Face adaxial e abaxial, respectivamente. 30-31:

Habenaria repens (Orchidaceae) - Face adaxial e abaxial, respectivamente. ................... 67 

Figuras 32-42. Fotomicrografias de aspectos anatômicos da região mediana de secções

transversais de folhas de espécies de Monocotiledôneas: 32-34. Echinodorus

grandiflorus (Alismataceae). 32. Aspecto geral da nervura central. 33. Detalhe do

mesofilo com nervuras menores. 34. Detalhe do diafragma que limita as lacunas de ar.

35-37. Eichhornia paniculata (Pontederiaceae). 35. Aspecto geral da nervura central.

36. Detalhe do mesofilo. 37. Detalhe do mesofilo contendo ráfides. 38-39. Habenaria

repens (Orchidaceae). 38. Aspecto geral da nervura central. 39. Detalhe do mesofilo.

40-43. Bordo foliar. 40. E. grandiflorus. 41. E. paniculata. 42. H. repens. ...................... 69 

Figuras 43-48. Fotomicrografias de aspectos anatômicos da região mediana de secções

transversais de escapos de espécies de Monocotiledôneas: 43-44. Echinodorus

grandiflorus (Alismataceae) - Aspecto geral e detalhe do córtex, respectivamente. 45-

46. Eichhornia paniculata (Pontederiaceae) - Aspecto geral e detalhe do córtex,

respectivamente. 47-48. Habenaria repens Orchidaceae) - Aspecto geral e detalhe do

córtex, respectivamente. .................................................................................................... 71 

CAPÍTULO III

Figuras 1-8. Aspectos anatômicos da exoderme, endoderme e lacunas de ar de raízes e

rizomas de espécies de monocotiledôneas, em secções transversais. 1. Pycreus

xiii

macrostachyos (Cyperaceae) - aspecto geral da raiz. 2. Oxycarium cubense

(Cyperaceae) - detalhe da epiderme e exoderme. 3. Eichhornia paniculata

(Pontederiaceae) - detalhe da epiderme e exoderme. 4. Pycreus macrostachyos

(Cyperaceae) - detalhe da endoderme e cilindro vascular. 5. Eichhornia paniculata

(Pontederiaceae) - detalhe da endoderme. 6. Oxycarium cubense (Cyperaceae)-detalhe

do rizoma com lacunas de ar no córtex. 7-8. Rizoma de Eichhornia paniculata

(Pontederiaceae): 7. Detalhe da endoderme e cilindro vascular. 8. Detalhe do córtex. .... 89 

Figuras 9-19. Aspectos anatômicos de folhas e escapos de espécies de monocotiledôneas da

região mediana, em secções transversais. 9-14. Detalhe do mesofilo. 9. Cyperus

odoratus (Cyperaceae). 10. Oxycaryum cubense (Cyperaceae). 11. Pycreus

macrostachyos (Cyperaceae). 12. Echinodorus grandiflorus (Alismataceae). 13.

Eichhornia paniculata (Pontederiaceae). 14. Habenaria repens (Orchidaceae). 15-19.

Escapo: aspecto geral, detalhe do córtex e cilindro vascular. 15. Cyperus odoratus

(Cyperaceae). 16. Oxycarium cubense (Cyperaceae). 17. Echinodorus grandiflorus

(Alismataceae). 18. Eichhornia paniculata (Pontederiaceae). 19. Habenaria repens

(Orchidaceae). .................................................................................................................... 90 

xiv

RESUMO

Cyperus odoratus L., Oxycaryum cubense (Poepp. & Kunth) Lye and Pycreus

macrostachyos Lam. Raynal (Cyperaceae) apresentam forma de vida anfíbia e Echinodorus

grandiflorus (Cham. & Schltdl.) Micheli (Alismataceae), Eichhornia paniculata (Spreng.)

Solms Laubach (Pontederiacae) e Habenaria repens Nutt. (Orchidaceae) têm forma de vida

emergente e todas as espécies pertencentes a ambas as formas de vida ocorrem nas lagoas

temporárias do semi-árido baiano. Essas lagoas apresentam-se secas no período de estiagem e

inundadas no período de chuvas. Apresentam diversidade de espécies como conseqüência da

variação espacial e temporal do período chuvoso na região. Estudou-se a morfoanatomia dos

órgãos vegetativos dessas macrófitas aquáticas coletadas em diferentes lagoas da região,

considerando-se as formas de vida anfíbia e emergente, para levantar características

anatômicas adaptativas. Também verificou-se quais desses caracteres anatômicos indicam

convergência adaptativa das espécies ao ambiente lacustre temporário. A forma de vida

anfíbia das espécies de Cyperaceae foi caracterizada pela presença de lacunas de ar nos

diferentes órgãos; presença de células buliformes e hipoderme nas folhas; presença; redução

de elementos xilemáticos; e pouca lignificação nas paredes das células dos diferentes órgãos.

As espécies emergentes apresentam maior semelhança anatômica nos órgãos subterrâneos do

que nos órgãos aéreos, e se caracterizam por apresentar células epidérmicas com cutícula fina;

presença de lacunas de ar; idioblastos contendo compostos fenólicos e cristais; redução do

tecido vascular e de sustentação em todos os órgãos. Caracteres anatômicos relacionados ao

sistema dérmico, como epiderme unisseriada, com cutícula fina; fundamental, como presença

de lacunas de ar, diminuição dos tecidos de sustentação, exoderme e endoderme com várias

camadas de células; e vascular, como redução no número e no espessamento de elementos

xilemáticos indicam a convergência adaptativa dessas espécies às lagoas temporárias da

Bahia.

xv

ABSTRACT

Cyperus odoratus L., Oxycaryum cubense (Poepp. & Kunth) Lye and Pycreus

macrostachyos Lam. Raynal (Cyperaceae) present amphibious life form and Echinodorus

grandiflorus (Cham. & Schltdl.) Micheli (Alismataceae), Eichhornia paniculata (Spreng.)

Solms Laubach (Pontederiacae) and Habenaria repens Nutt. (Orchidaceae) are emergent

species that occur in temporary lagoons from semi-arid regions. These lagoons are dry during

the drought season and full of water in wet one. Because of the variation in the rain season

there are a great diversity of species in these lagoons. It was studied the morphoanatomy of

vegetative organs from the aquatic plants collected at different lagoons of semi-arid regions,

from state of Bahia. It was considered the life form to study the anatomic adaptative features,

and which of these features indicate the adaptative convergence of species from the temporary

lagoons environment. The amphibious life form of the species of Cyperaceae had been

characterized by the presence of air canals in the different organs; presence bulliforms cells

and hypoderm on the leaves; reduction of xylem elements; and little lignification in the cell

walls from different organs. The emergent species present more similarity in the

subterraneous organs than in the aerial one and are characterized by presence of epidermal

cells with thin cuticles; presence of air canals; idioblasts conteining phenolic compounds and

crystals; and smaller amounts of vascular and sustentation tissues. Anatomic features related

with dermic system, like uniseriate epidermal, with thin cuticle; fundamental system shows

the presence of air canals, reduction of the amounts sustentation tissue, exoderm and

endoderm with many cell layers; and vascular system show a reduction in the number and

thickening of xylem elements indicated the adaptative convergence of these species of the

temporary lagoons from Bahia state.

1

INTRODUÇÃO GERAL

O semi-árido envolve a região Nordeste do Brasil e norte de Minas Gerais ocupando

cerca de 900.000 km2 incluindo parte dos Estados do Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte,

Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Bahia e Minas Gerais (Queiroz et al. 2006).

A região é caracterizada por clima quente, baixa pluviosidade (entre 250 e 800 mm

anuais) e duas estações bem definidas durante o ano: estação chuvosa (chamada de inverno)

que dura de três a cinco meses, com chuvas irregulares, torrenciais, locais, de pouca duração,

e estação seca (chamada de verão), que dura de sete a nove meses, quase sem chuvas (Maia

2004).

O clima da região é extremo, exigindo que animais e plantas sejam adaptados a longos

períodos de seca e/ou enchentes, apesar da semi-aridez dominante na região (Sandes et al.

2006). Segundo esses autores, ocorre predomínio de rios e de corpos de água temporários,

com biota aquática diversa, e muitas espécies endêmicas, que aponta a caatinga como

portadora de grande heterogeneidade de fauna e flora.

Os limites da caatinga são considerados coincidentes com os da região semi-árida e

ocorre variação na vegetação, tanto do ponto de vista fisionômico, quanto florístico e

morfofuncional, e essa variação se dá em função das condições de relevo, solo, déficit hídrico

e topografia, com reconhecidos tipos vegetacionais: campos rupestres, florestas, cerrados,

brejos e ambientes aquáticos (Queiroz et al. 2006).

Numa região onde as temperaturas são sempre elevadas, as zonas úmidas ou lagoas

temporárias naturais são consideradas essenciais para a população local, constituindo-se

verdadeiras manchas de biodiversidade de fauna e flora aquática. Estas lagoas estão entre os

ambientes mais produtivos no acúmulo de energia, pois o armazenamento de água e a

retenção de nutrientes têm um papel de destaque na biodiversidade e na produtividade

econômica da região (Maltchik 2000).

2

A vegetação aquática do semi-árido nordestino pode ser encontrada nos espelhos

d’água naturais formados por depressão de relevo. Aí acumula a água superficial, resultante

dos poucos períodos chuvosos da região, originando as lagoas temporárias da caatinga

(Maltchik 2000).

Pesquisas científicas sobre áreas alagáveis no Brasil são necessárias e de extrema

urgência, visto que estas estão submetidas a todo tipo de degradação, principalmente pela sua

utilização inadequada através de atividades agropastoris (Esteves 1988).

No caso da flora aquática, muitas espécies apresentam diferenças morfológicas e

adaptações especiais devido à incidência de luz, sazonalidade do regime pluviométrico e

amplitude e duração de cada fase do ciclo hidrológico, cheia e seca (Maltchik et al. 1999).

Dentre as famílias com maior número de representes no ambiente aquático da região semi-

árida, pode-se citar Alismataceae, Araceae, Asteraceae, Cyperaceae, Leguminosae,

Lentibulariaceae, Melastomataceae, Plantaginaceae, Poaceae, Pontederiaceae, Rubiaceae e

Typhaceae(Queiroz et al. 2006).

A readaptação das plantas ao modo de vida aquático ocorreu em função de

modificações anatômicas, como redução do sistema de sustentação, redução do número ou

ausência de estômatos, cloroplastos localizados preferencialmente na parte superior das folhas

e redução do número e grau de lignificação dos elementos condutores do xilema (Pompêo &

Moschini-Carlos 2003).

A partir de estudos com plantas que crescem desde em brejos até ambientes

verdadeiramente aquáticos, surgiu o termo macrófitas aquáticas, aceito e adotado pelo

International Program of Biology (Esteves 1988). As macrófitas aquáticas têm a capacidade

de ocupar vários ambientes em função de apresentarem diferentes graus de plasticidade

morfoanatômica e fisiológica, o que lhes garante vantagem adaptativa, permitindo sua

colonização e sobrevivência sob condições que seriam consideradas adversas para outras

espécies (Bradshaw 1965; Redbo-Torstensoon 1994).

3

Segundo Irgang et al. (1984), a distribuição das macrófitas é variável, ocupando

diversos gradientes de profundidade num perfil aquático e apresentando as seguintes formas

de vida: Anfíbia - vive bem tanto em área alagada como fora da água; Emergente - enraizada

no fundo, parcialmente submersa; Flutuante fixa - enraizada no fundo, com caule e/ou ramos

e/ou folhas flutuantes; Flutuante livre - não enraizada no fundo, podendo ser levada pela

correnteza; Submersa fixa - enraizada no fundo, com caule e folhas submersas, geralmente

com a flor para fora d’água; Submersa livre - não enraizada no fundo, totalmente submersa,

emergindo somente a flor; Epífita - se instala sobre outras plantas aquáticas.

Na literatura, de forma geral, estudos com macrófitas aquáticas de lagoas temporárias

da região semi-árida brasileira apresentam levantamento florístico de determinada área e os

estudos anatômicos são relativamente escassos (Matias et al. 2007, 2008). Na Bahia, mais

especificamente, é pouco conhecida a flora aquática lêntica em se tratando de plantas

vasculares. Para o Estado existem levantamentos florísticos de lagoas (Bezerra & França

1999; França et al. 2003) e de lagoa costeira (Neves et al. 2006).

Buscou-se neste trabalho, dados sobre a anatomia de espécies de macrófitas aquáticas,

especialmente algumas monocotiledôneas, através de sua caracterização morfoanatômica, a

fim de contribuir para o conhecimento de suas formas de vida e da convergência adaptativa

entre elas. Para tanto, escolhemos: a) espécies de diferentes gêneros da mesma família

(Cyperaceae) com a mesma forma de vida (anfíbia) – capítulo 1 da tese; b) espécies de

diferentes famílias com a mesma forma de vida (emergente) – capítulo 2; e c) levantar

características anatômicas que indicassem convergência adaptativa – capítulo 3.

Área de estudo

O Estado da Bahia caracteriza-se por apresentar um balanço hídrico negativo (inferior

a 800 mm), forte insolação, temperaturas relativamente altas e regime de chuvas marcado pela

4

escassez, irregularidade e concentração de precipitações num período de três meses (Eiten &

Goodland 1979). Este Estado faz parte da região semi-árida do Brasil e apresenta rios, riachos

e lagoas temporários com ocorrência de cheia e seca de diferentes freqüências, intensidades e

duração, sendo que o período de cheia é um fator determinante na ocorrência e na composição

da estrutura de macrófitas aquáticas (Fig 1 -2).

As espécies estudadas neste trabalho foram coletadas em períodos sucessivos de cheia,

de março a junho, em algumas lagoas do semi-árido da Bahia, localizadas no município de

Angüera, ao longo da rodovia BA 052 (Estrada do Feijão).

Viagens de coleta

As viagens de coleta foram realizadas mensalmente ao longo dos anos 2005 e 2006.

As coletas foram realizadas no período de cheias. Essas coletas mensais foram feitas

procurando conhecer melhor a área de estudo e acompanhar o desenvolvimento das espécies

escolhidas.

Parte do material coletado, após identificação prévia, foi enviada para identificação

pelos especialistas Dr. Marccus Alves (Cyperaceae), Dra. Lígia Queiroz Matias

(Alismataceae), Dr. Cassio van den Berg (Orchidaceae) e Dr. Flávio França (Pontederiaceae)

e a seguir incorporados ao acervo do Herbário da Universidade Estadual de Feira de Santana

(HUEFS). Outra parte do material foi utilizada para o estudo morfoanatômico.

5

Figura 1. Lagoa temporária do semi-árido baiano no período seco

Figura 2. Lagoa temporária do semi-árido baiano no período alagado

6

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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árido/BA). In. Modelos de Gestão das Águas Superficiais e Subterrâneas. 6:41-53.

8

CAPÍTULO I

Anatomia de espécies anfíbias de Cyperaceae de lagoas do

semi-árido, Bahia, Brasil

9

RESUMO

Foi estudada a anatomia de raízes, rizomas, folhas e escapos de Cyperus odoratus L.,

Oxycaryum cubense (Poep. & Kunth) Lye e Pycreus macrostachyos (Lam.) Raynal

(Cyperaceae-Poales) de lagoas do semi-árido da Bahia visando caracterizar anatomicamente

as espécies e levantar estruturas adaptativas à forma de vida anfíbia. As espécies apresentam

raízes com epiderme unisseriada, córtex com exoderme e lacunas de ar. Os rizomas

apresentam feixes vasculares anfivasais ou colaterais no cilindro vascular. As folhas

apresentam epiderme unisseriada, com células de parede periclinal externa mais espessada

que a interna, estômatos somente na face abaxial, parênquima clorofiliano alternado com

lacunas de ar e feixes vasculares colaterais. Os escapos apresentam epiderme unisseriada,

feixes de fibras distribuídos perifericamente alternados com parênquima clorofiliano, com

lacunas de ar e com feixes vasculares colaterais. Oxycaryum cubense difere de Cyperus

odoratus e Pycreus macrostachyos por apresentar raízes com pelos longos, rizomas e estolões

com feixes vasculares colaterais, folhas com bordo agudo, e ausência de estrutura Kranz nas

folhas e escapos. Características anatômicas como presença de lacunas de ar observadas

principalmente nas raízes, presença de células buliformes na face adaxial da epiderme foliar,

de hipoderme, de redução de elementos xilemáticos e pouca lignificação nas paredes das

células dos tecidos dos diferentes órgãos são consideradas importantes na adaptação dessas

plantas anfíbias às lagoas temporárias do semi-árido da Bahia.

Palavras-chaves: Cyperaceae, Poales, anatomia, semi-árido, lagoas temporárias

10

ABSTRACT

We examined the anatomy of roots, rhizomes, leaves, and scapes of Cyperus odoratus

L., Oxycaryum cubense (Poep. & Kunth) Lye, and Pycreus macrostachyos (Lam.) Raynal

(Cyperaceae-Poales) from temporary lakes in the semi-arid region of Bahia in order to

characterize the anatomy of these species and examine their structural adaptations to

amphibious lifestyle. All species demonstrated roots with uniseriate epidermal cells, cortex

with exoderm and air canals. The rhizomes demonstrated amphivasal or collateral vascular

bundles in the vascular cylinder. The leaves demonstrated uniseriate epidermal cells with

external periclinal cell walls thicker that the inner walls, stomata on abaxial leaf surface,

chlorenchyma alternating with air canals, and collateral vascular bundles. The scapes

demonstrated uniseriate epidermal cells, fibrous groups distributed peripherally and alternated

with chlorenchyma, with air canals, and collateral vascular bundles. Oxycaryum cubense

differs from Cyperus odoratus and Pycreus macrostachyos by having root with long hairs;

rhizomes and stolons with collateral vascular bundles; foliar blades with acute margins, and

lacking Kranz structures in leaves and scapes. Anatomic characters with presence of large air

canals were observed principally in the roots, the presence of bulliform cells on the adaxial

face of the leaf epidermis, and hypodermis, reduction of the numbers of xylem vascular

elements and little lignification of the cell walls of the different plant organs are considered

important features in the adaptation of these amphibious plants that inhabit temporary lakes in

the semi-arid region of Bahia State.

Key-words: Cyperaceae, anatomy, semi-arid, Bahia, temporary lakes

11

INTRODUÇÃO

A família Cyperaceae está incluída na ordem Poales (APG II 2003), no mesmo clado

que agrupa as famílias Bromeliaceae, Eriocaulaceae, Juncaceae, Mayacaceae, Poaceae,

Rapateaceae, Typhaceae e Xyridaceae entre outras. Cyperus odoratus L., Pycreus

macrostachyos (Lam.) Raynal e Oxycaryum cubense (Poep. & Kunth) Lye, selecionadas para

este trabalho pertencem à diferentes gêneros de Cyperoideae e à tribo Cypereae (Goetghebeur

1998), sendo os gêneros Cyperus L. e Pycreus P. Beauv considerados os mais próximos

filogeneticamente.

Cyperaceae é uma família cosmopolita, constituindo a terceira maior família em

diversidade de espécies entre as monocotiledôneas, apresentando cerca de 104 gêneros e mais

de 5000 espécies, de hábito terrestre ou aquático, formando grandes populações em diversos

habitats, principalmente em ambientes abertos e úmidos das regiões tropicais e subtropicais

(Goetghebeur 1998). Cerca de 31 gêneros de Cyperaceae contêm espécies aquáticas que

apresentam variadas formas de vida (Cook 1996) e colonizam principalmente ambientes

lênticos, merecendo especial atenção as espécies encontradas nas lagoas temporárias (França

et al. 2003; Matias et al. 2003).

Os ecossistemas aquáticos temporários, conhecidos como alagados, brejos ou áreas

inundáveis, são típicos da região Nordeste do Brasil, apresentando-se secos nos períodos de

estiagem e retornando ao estado alagado na época das chuvas. São caracterizados por

apresentar grande diversidade vegetacional, com espécies tolerantes e adaptadas a solos que

sazonalmente sofrem inundações (Nielsen & Orcutt 1996).

Estudos com espécies de Cyperaceae de ambiente aquático se restringem à listas

taxonômicas ou aspectos ecológicos, apresentando alta freqüência de espécies da família nas

floras de lagoas temporárias. A alta representatividade dessa família em ambientes aquáticos é

devida à presença de rizomas, tubérculos e estolões, que permite maior eficiência na

12

propagação vegetativa (Pott et al. 1989; Bove et al. 2003; França et al. 2003; Matias et al.

2003).

Estudos anatômicos com espécies de Cyperaceae têm se mostrado úteis na taxonomia

de vários grupos, principalmente com espécies brasileiras de Hypolytrum Rich. (Alves et al.

2002) e Bulbostylis DC. (Prata et al. 2007). Com espécies aquáticas brasileiras foram

desenvolvidos estudos de estruturas anatômicas das brácteas de Cyperus giganteus Vahl

(Rodrigues & Estelita 2003) e estudos sobre a atividade meristemática da endoderme de

Cyperus papyrus L. (Menezes et al. 2005).

Dentre as várias espécies de Cyperaceae aquáticas, ocorrentes nas lagoas temporárias

do semi-árido da Bahia, buscou-se estudar aquelas que apresentam forma de vida anfíbia para

tentar entender quais características podem ser consideradas adaptativas e que permitem o

sucesso das espécies.

Dessa forma, este trabalho objetivou caracterizar anatomicamente os órgãos

vegetativos de Cyperus odoratus L., Pycreus macrostachyos (Lam.) Raynal e Oxycaryum

cubense (Poep. & Kunth) Lye (Cyperaceae) ocorrentes em lagoas do semi-árido da Bahia,

buscando levantar características adaptativas à forma de vida anfíbia.

13

MATERIAL E MÉTODOS

Espécies de Cyperus odoratus L., Oxycaryum cubense (Poep. & Kunth) Lye e Pycreus

macrostachyos (Lam.) Raynal, foram coletadas mensalmente em quatro lagoas diferentes do

semi-árido da Bahia, localizadas entre as coordenadas 12°16’32”S/39°03’22”W e

12°10’00”S/39°12’36”W ao longo da rodovia BA 052 (Estrada do Feijão) no município de

Angüera, em períodos sucessivos de cheia.

As lagoas onde os espécimes foram coletados não apresentam comunicação, são

formadas por depressão do relevo e alimentadas por água da chuva, permanecendo cheias por

um tempo maior que o período das chuvas, sendo este tempo suficiente para o

estabelecimento de uma flora rica e com alta diversidade de espécies vegetais (Maltchik 1999;

França et al. 2003). O critério utilizado para a escolha das espécies de diferentes gêneros de

Cyperaceae foi devida a maior representatividade das espécies nas lagoas temporárias do

semi-árido da Bahia e por apresentarem a mesma forma de vida, anfíbia.

Para a análise anatômica foram utilizadas plantas adultas fixadas em FAA 70℅ e

posteriormente preservadas em álcool etílico a 70℅ (Johansen 1940). O material estudado

encontra-se depositado no Herbário da Universidade Estadual de Feira de Santana (HUEFS):

Cyperus odoratus: Leite et al. 477; Leite 486; Leite & França 495; Leite & França 519; Leite

& França 520. Oxycaryum cubense: Leite et al. 475; Leite & França 522; Leite & França

523; Leite & França 524; Leite & França 525. Pycreus macrostachyos: Leite 486A; Leite

487A; Leite & França 496; Leite & França 500; Leite & Lessa 507.

A partir do material fixado foram feitas secções nas regiões apical, mediana e basal de

raízes, rizomas, estolões, folhas e escapos. Foram utilizados pelo menos três indivíduos de

cada espécie provenientes de diferentes lagoas. As secções transversais e longitudinais dos

diferentes órgãos foram feitos à mão livre, com o auxílio de lâmina de barbear, clarificadas

14

com hipoclorito de sódio a 50% e submetidas ao processo de dupla coloração com azul de

astra e safranina (modificado de Bukatsch 1972 apud Kraus & Arduim 1997).

Para dissociação da epiderme foliar, foi utilizado o método de Jeffrey (Johansen 1940)

cujas porções foram coradas com Safranina aquosa a 1%.

Algumas peças dos diferentes órgãos foram submetidas à desidratação em série etílica

e incluídas em historresina Leica [2-hidroxietil-metacrilato] (Feder & O´Brien 1968). O

material incluído foi seccionado em micrótomo rotativo, com 10 µm de espessura. As secções

anatômicas foram submetidas à coloração com ácido-periódico-reativo de Schiff (PAS) e azul

de toluidina (Feder & O´Brien 1968) e montadas em lâminas permanentes com Entellan.

Todo o material foi fotomicrografado em microscópio Olympus BX40 e as lâminas

depositadas no acervo do Laboratório de Micromorfologia vegetal da Universidade Estadual

de Feira de Santana.

15

RESULTADOS

Os caracteres morfológicos observados nas espécies estudadas podem ser observados

nas figuras 1-9 e os anatômicos nas figuras 10-56.

Cyperus odoratus, Oxycaryum cubense e Pycreus macrostachyos (Cyperaceae) são

plantas herbáceas, anfíbias, tolerantes à seca, com rizoma vertical, folhas lineares, filotaxia

espiralada, formando touceiras (Fig. 1, 4 e 7). O rizoma na porção basal é envolvido por

bainhas de folhas velhas, de onde crescem as raízes adventícias (Fig. 2, 5 e 8), e na porção

apical, por folhas jovens e escapos. Oxycaryum cubense apresenta estolão que cresce a partir

do rizoma (Fig. 4).

Os esquemas das secções transversais da região mediana dos escapos das espécies

estudadas apresentam contorno triangular (Fig. 3, 6 e 9). Internamente à epiderme ocorrem

feixes de fibras de esclerênquima. Em Oxycaryum cubense (Fig. 6), esses feixes estão

localizados próximos entre si e o escapo é fistuloso. Ocorre maior proporção de aerênquima

em Cyperus odoratus e Pycreus macrostachyos (Fig. 3 e 9).

As raízes das espécies estudadas, em secção transversal, apresentam epiderme, córtex

heterogêneo e cilindro vascular (Fig. 10, 13, 17). A epiderme é unisseriada, com células de

paredes finas (Fig. 11, 17, 18). Os pêlos absorventes ocorrem isolados, sendo mais abundantes

e alongados em Oxycaryum cubense (Fig. 14).

O córtex é heterogêneo e apresenta-se dividido em externo, mediano e interno. O

córtex externo é constituído pela exoderme, que apresenta células hexagonais, com paredes

levemente espessadas. (Fig10-11, 13-14, 17-18).

O córtex mediano ocupa a maior porção das raízes. É formado por dois tipos distintos

de células: aquelas arredondadas, pequenas, formando de uma a três fileiras longitudinais,

intercaladas por células maiores, braciformes (Fig. 10, 13, 17).

16

As raízes de todas as espécies apresentam células corticais jovens com redução de

espaços intercelulares e são dispostas em fileiras radiais como evidenciado no estágio inicial

do desenvolvimento de Oxycaryum cubense (Fig. 16). À medida que a raiz se desenvolve as

células do córtex mediano tornam-se braciformes e, na maturidade, suas paredes se rompem

formando lacunas de ar. São observados restos das paredes tangenciais das células rompidas

(Fig. 10, 13, 17). As células arredondadas do córtex mediano permanecem com as paredes

íntegras formando fileiras longitudinais (Fig. 10 e 17).

O córtex interno é formado por células parenquimáticas arredondadas, menores do que

as demais, sem espaços intercelulares (Fig. 10, 12-13, 15, 17, 19). Essas células apresentam

paredes levemente espessadas na maturidade. Observa-se pouca lignificação nas paredes das

células do córtex mediano (Fig. 10, 13, 17). A endoderme é unisseriada, com células de

paredes finas (Fig. 10, 12, 15, 19).

O periciclo é unisseriado e apresenta células de paredes finas (Fig. 10, 12-13, 15, 19).

O cilindro vascular tem estrutura poliarca e pode apresentar vários elementos de metaxilema

(Fig. 12). Observa-se redução no número de elementos xilemáticos em todas as raízes das

espécies estudadas (Fig. 12, 15, 19).

Os rizomas das espécies estudadas apresentam epiderme, córtex e cilindro vascular

(Fig. 20-26). A epiderme é constituída por células de paredes finas (Fig. 20, 25). O córtex

apresenta células parenquimáticas de paredes finas e arredondadas (Fig. 20, 22, 25), podendo

apresentar raízes adventícias intracorticais (Fig. 20, 25). A endoderme é unisseriada, com

células de paredes finas (Fig. 26). O córtex de Oxycaryum cubense (Fig. 22) apresenta amplas

lacunas de ar.

O cilindro vascular é delimitado pelo periciclo (Fig. 20-21, 22, 25-26) e apresenta

distribuição atactostélica (Fig. 20, 22, 25). É constituído por feixes vasculares anfivasais em

Cyperus odoratus (Fig. 21) e Pycreus macrostachyos (Fig. 26) e por feixes vasculares

colaterais em Oxycaryum cubense (Fig. 22). Em todos esses feixes vasculares, é observada a

17

redução do número de elementos xilemáticos quando comparado com os elementos de floema

(Fig. 21-24, 26).

Oxycaryum cubense apresenta estolão além de rizoma. Na região do nó (Fig. 23),

observam-se plexos vasculares, que irão vascularizar folhas e raízes. Na região do entrenó

(Fig. 24), a epiderme é unisseriada, com células de paredes espessadas. O córtex é formado

por células arredondadas, onde estão distribuídos os feixes vasculares colaterais e as lacunas

de ar (Fig. 24). Apenas as células dos feixes vasculares apresentam paredes lignificadas (Fig.

20-26).

As folhas de todas as espécies de Cyperaceae estudadas, em vista frontal, apresentam

células epidérmicas alongadas no sentido longitudinal da lâmina, com paredes levemente

sinuosas (Fig. 27-32). As folhas são hipoestomáticas, com estômatos do tipo paracítico,

distribuídos em fileiras longitudinais (Fig. 28, 30, 32).

Em secção transversal da folha, a epiderme é uniestratificada com células epidérmicas

da face adaxial maiores em relação às da face abaxial (Fig. 33-42, 44) e com paredes

periclinais externas mais espessadas que as internas (Fig. 33-42). O bordo foliar é

arredondado em Cyperus odoratus e Pycreus macrostachyos (Fig. 33, 35) e agudo em

Oxycaryum cubense (Fig. 34) com esclerênquima adjacente à epiderme.

Nas três espécies estudadas, na face adaxial da epiderme, principalmente na altura da

nervura central, ocorrem células buliformes que são maiores do que as demais células

epidérmicas (Fig. 36, 38-39, 41), estando ausentes apenas na região basal das lâminas (Fig.

42). Internamente à epiderme, ocorrem feixes de fibras de esclerênquima distribuídos ao

longo de toda a extensão da lâmina foliar (Fig. 33-42).

O mesofilo apresenta hipoderme voltada à face adaxial (Fig. 33-42), com parênquima

clorofiliano paliçádico voltado à face abaxial em Oxycaryum cubense (Fig. 38-40) e disposto

de forma radiada em torno dos feixes vasculares em Cyperus odoratus (Fig. 36-37) e Pycreus

macrostachyos (Fig. 41-42, 44). Cyperus odoratus e Pycreus macrostachyos apresentam

18

feixes vasculares com anatomia Kranz do tipo “clorociperóide”. No mesofilo de todas as

espécies ocorre parênquima clorofiliano braciforme (Fig. 37, 40-42), que constitui diafragmas

que limitam lacunas de ar (Fig. 43).

Os feixes vasculares das folhas são colaterais (Fig. 33-42, 44), grandes e pequenos,

envolvidos por bainha dupla. A bainha externa, parenquimática, constitui a endoderme e a

interna, de células de paredes espessadas constitui o periciclo. Este último pode envolver

completamente os feixes vasculares e formar calotas de fibras junto ao xilema (Fig. 38-39). A

redução dos elementos xilemáticos pode ser facilmente observada (Fig. 36-42, 44). As lacunas

de ar ocorrem em toda a extensão do limbo foliar, sempre intercaladas com feixes vasculares

ou logo abaixo deles (Fig. 36-42, 44). As células da epiderme e do mesofilo não apresentam

lignificação, com exceção dos feixes de fibras e dos feixes vasculares (Fig. 36-42, 44-45).

Os escapos das espécies de Cyperaceae estudadas, em secção transversal, apresentam

epiderme uniestratificada, com células de paredes finas (Fig. 48, 50, 53, 55-56). Os estômatos

estão situados levemente acima das demais células epidérmicas (Fig. 53, 56). Logo abaixo da

epiderme ocorrem feixes de fibras de esclerênquima distribuídos em toda a extensão do

escapo (Fig. 46-50, 52-53, 55-56).

O parênquima clorofiliano é paliçádico e está situado perifericamente, com três a

quatro camadas de células. Em Cyperus odoratus (Fig. 48) e Pycreus macrostachyos (Fig.

53), o parênquima paliçádico apresenta-se radiado em torno dos feixes vasculares,

constituindo anatomia Kranz.

Os feixes vasculares são colaterais e distribuídos por todo o parênquima, com maior

concentração na periferia. São envolvidos de forma parcial (Fig. 47-48, 52) ou total (Fig. 49-

51) pelo periciclo espessado. Observa-se redução do número de elementos xilemáticos em

comparação com os elementos floemáticos (Fig. 46-54). Logo abaixo do parênquima

clorofiliano ocorrem lacunas de ar (Fig. 46, 49, 52). Apenas as células dos feixes de fibras e

dos feixes vasculares apresentam paredes lignificadas (Fig. 47-56).

19

Corpos silicosos do tipo cônico foram observados na epiderme das folhas (Fig. 45) e

dos escapos (Fig. 55), além de cristais prismáticos e ráfides, formando idioblastos na região

que delimita a lacuna de ar.

20

DISCUSSÃO

As espécies estudadas neste trabalho são macrófitas aquáticas, anfíbias, que ocorrem

em lagoas temporárias, constituindo um grupo interessante de plantas devido à sua facilidade

de crescimento.

Cyperus odoratus, Oxycaryum cubense e Pycreus macrostachyos (Cyperaceae),

mesmo pertencendo a gêneros diferentes, apresentam alguns aspectos morfológicos e

anatômicos semelhantes. São plantas afetadas por contínua condição de estresse, caracterizada

por períodos de chuva e de seca na região. O estresse pode ser induzido por fatores bióticos e

abióticos, traduzindo-se no desenvolvimento de características morfológicas e anatômicas

adaptativas, principalmente nos órgãos de absorção e na presença de aerênquima, conforme

referido por Nielsen & Orcutt (1996).

As diferenças anatômicas observadas entre as espécies estudadas, como raízes com

pêlos longos, presença de estolão com feixes vasculares colaterais, folhas com bordo agudo e

ausência de anatomia Kranz em Oxycaryum cubense podem estar relacionadas com a herança

genética. Essas diferenças podem ser entendidas por ser este um gênero considerado mais

distante filogeneticamente de Cyperus e Pycreus, que já pertenceram ao mesmo gênero,

Cyperus (Goetghebeur 1998).

Acredita-se que o sucesso ecológico das espécies estudadas deva-se ao fato delas

apresentarem sistema subterrâneo com rizoma, que segundo Font Quer (1989), além de

facilitar a propagação vegetativa, protege a planta de rigores ambientais.

Nas raízes de Oxycaryum cubense, ocorrem pêlos absorventes longos e em

abundância. Essa característica provavelmente está relacionada à forma de vida, que no início

do seu desenvolvimento é epífita de outras plantas flutuantes como Salvinia sp., Azzola sp.,

Pistia stratiotes L. e Eichhornia crassipes (Mart.) Solms (Tur 1971; Neves et al. 2006). Na

fase adulta e na época de seca, essa espécie se fixa ao substrato em decomposição que está na

21

margem da lagoa, comportando-se como anfíbia (Pott & Pott 2000). A presença desses pêlos

radiculares longos e abundantes em sua raiz, além de exercer função de absorção, deve

também atuar na estabilidade da planta conforme acontece em outras espécies aquáticas (Tur

1971).

Em todos os órgãos das espécies estudadas observou-se a presença de lacunas de ar,

principalmente nas raízes, que apresentam grande tamanho quando comparadas com a

dimensão do córtex. A sobrevivência de plantas que ocorrem em solos alagados, em geral,

está relacionada à presença de raiz cujo córtex contém grande quantidade de espaços de ar

(Nielsen & Orcutt 1996). Adaptações ao ambiente aquático podem ser consideradas

características genéticas (Davy et al. 1990; Nielsen & Orcutt 1996) ou fisiológicas. Neste

último caso, as raízes das plantas que crescem em ambientes que são inundadas

periodicamente respondem ao estresse com a formação de grande quantidade de raízes

adventícias e de lacunas de ar, como observado nas espécies aqui estudadas. Lacunas de ar

podem ser interpretadas como aerênquima que pode ser lisígeno ou esquizógeno segundo

Nielsen & Orcutt (1996), ou esquizolisígeno segundo Smirnoff & Crawford (1983). Esses

autores relatam que esses aerênquimas irão estocar oxigênio.

Para Luxmoore et al. (1972) e Nielsen & Orcutt (1996), a formação de lacunas de ar

em órgãos vegetativos, principalmente raízes e rizomas, pode estar relacionada à temperatura

e à intensa luminosidade. Na área de coleta das espécies aqui estudadas, a temperatura e a

luminosidade são elevadas. Além desses fatores, acredita-se que essas lacunas de ar também

estão relacionadas à baixa aeração da água da lagoa. A baixa aeração faz com que o etileno se

acumule nas células corticais estimulando a atividade da celulase, que leva à plasmólise e em

seguida à morte celular, formando as lacunas de ar, conforme o que foi apresentado para

outras plantas de ambientes alagados (Kawase & Whitmoyer 1980; Coan et al. 2002).

Observou-se também em todas as espécies a relação entre a endoderme meristemática

e as células que vão formar o aerênquima, pois as células que arredondadas que se mantém

22

íntegras na raiz são provenientes da endoderme enquanto as células braciformes que formam

o aerênquima provavelmente têm origem do meristema fundamental.

Lacunas de ar encontradas também nas folhas e escapos das espécies de Cyperaceae

aqui estudadas, também foram observadas em outras macrófitas aquáticas por Sculthorpe

(1967), Nielsen & Orcutt (1996) e Kawase & Whitmoyer (1980). Essas lacunas promovem a

oxigenação através de difusão entre órgãos aéreos e submersos. São capazes de transportar o

O2 formado durante a fotossíntese nas folhas para outros órgãos da planta, indicando a

continuidade dessas lacunas de ar ao longo de todo o vegetal, corroborando o que foi relatado

para outras espécies aquáticas por Boeger (1994).

A presença de células braciformes limitando as lacunas de ar nos diferentes órgãos das

espécies estudadas, que forma o diafragma, é responsável pela condução de gases além de

atuar de forma mecânica em órgãos submersos conforme o que foi demonstrado em outras

plantas aquáticas por Sculthorpe (1967), Kaul (1971) e Fahn (1990).

Nas folhas, a maior sinuosidade observada nas paredes das células epidérmicas de C.

odoratus e P. macrostachyos em relação à O. cubense possivelmente está relacionada ao local

de coleta e desenvolvimento das espécies, pois O.cubense além de ter seu desenvolvimento

inicial como epífita, foi coletada em local mais próximo à margem da lagoa e as outras duas

espécies em ambiente mais seco.

Nas folhas das espécies estudadas, ocorrem células buliformes que podem estar

relacionadas à abertura e fechamento laterais do limbo durante o dia em função da variação da

intensidade de luz e temperatura, comum na região semi-árida da Bahia. Esta característica de

abertura e fechamento do limbo através de células buliformes foi observada também em

espécies de Poaceae (Beal 1886) e outras Cyperaceae (Mani 1964). Nas espécies anfíbias de

Cyperaceae aqui estudadas, esse movimento do limbo foliar se restringe às regiões mediana e

apical da lâmina, uma vez que a porção basal está em contato direto com a água. Uma

possível interpretação para esta característica é que, como esse movimento foliar, ocorre nas

23

horas mais quentes do dia e de maior intensidade luminosa, certamente leva a uma diminuição

da área da superfície foliar exposta à luz e, assim, reduz a transpiração e a temperatura da

folha, facilitando a fotossíntese.

Nas folhas, logo abaixo da epiderme adaxial, ocorre hipoderme parenquimática,

constituída por células translúcidas, comum a todas as espécies e mais evidente em

Oxycaryum cubense. A hipoderme, conforme já descrita por Koyama (1965), para

Cyperaceae, pode estar relacionada ao acúmulo de água, constituindo-se, portanto, aqüífera,

ajudando na manutenção das espécies em períodos de seca.

Em todas as espécies de Cyperaceae estudadas, foram observados corpos silicosos na

forma de cristais cônicos na epiderme e ráfides nas células que formam as lacunas de ar. Os

cristais cônicos ocorrem sempre na parede periclinal interna das células epidérmicas de folhas

e escapos e juntos aos feixes de fibras que estão associados ou não aos feixes vasculares,

corroborando o que foi apresentado por Metcalfe (1971) para outras espécies da família.

A presença de cristais nas plantas é considerada por Metcalfe (1971), Prychid &

Rudall (1999) e Lucas et al. (2000) como suporte mecânico e atua na proteção contra a

herbivoria, podendo ainda promover a formação de lacunas de ar em plantas aquáticas, além

de se projetar para dentro delas.

Para Prychid & Rudall (1999) os cristais de oxalato de cálcio são o produto final do

metabolismo celular e representam uma forma de estocar cálcio e ácido oxálico, evitando que,

em alta concentração, sejam tóxicos para a célula ou tecido, promovendo o equilíbrio iônico.

Essas autoras relataram que pode haver reabsorção do oxalato de cálcio pelas plantas em

períodos de baixa concentração deste composto no solo.

Para algumas espécies anfíbias, a passagem da forma terrestre para aquática e vice-

versa, envolve ajustes estruturais e fisiológicos, conforme pode ser observado em Cyperus

odoratus e Pycreus macrostachyos, que apresentam feixes vasculares com estrutura Kranz.

Segundo Nielsen & Orcutt (1996), a maioria das plantas terrestres e aquáticas, apresenta

24

fotossíntese C3, sendo encontrados metabolismo C4 ou CAM em espécies sujeitas à altas

temperaturas e baixa disponibilidade de água, constituindo um mecanismo fisiológico de

adaptação ao processo fotossintético.

Nas espécies estudadas, esses feixes estão dispostos ao longo de toda a lâmina foliar e

na região periférica do escapo, sempre intercalados por amplas lacunas de ar, o que pode

indicar a adaptação delas à condição de alagamento. Além disso, elas já estão prontas para

assumir a condição de plantas terrestres quando o ambiente secar. Como apenas Oxycaryum

cubense não apresentou anatomia Kranz, acredita-se que essa característica esteja relacionada

também à sua forma de crescimento, que no início do desenvolvimento é epífita e quando

adulta torna-se anfíbia.

As espécies de Cyperaceae aqui estudadas, quando comparadas às espécies terrestres

de Cyperaceae estudadas por Metcalfe (1971) apresentaram reduzida lignificação,

característica comum de plantas aquáticas, pois a água exerce a função de sustentação em

alguns órgãos. No entanto, por serem anfíbias essas espécies apresentam maior lignificação

nas paredes de suas células do que outras macrófitas aquáticas (Coan et al. 2002; Matias et al.

2007; Rodrigues et al. 2007; Fabbri et al. 2005).

Assim, a forma de vida anfíbia das espécies de Cyperaceae aqui estudadas pode ser

caracterizada anatomicamente pela presença de lacunas de ar nos diferentes órgãos,

principalmente no sistema subterrâneo; pela presença de células buliformes, e hipoderme nas

folhas; além da presença de corpos silicosos; da redução de elementos xilemáticos e da pouca

lignificação nas paredes das células nos diferentes órgãos. Essas características são

consideradas importantes na adaptação dessas espécies ao ambiente aquático.

25

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29

Figuras 1-9. Aspectos morfológicos de espécies de Cyperaceae: 1-3: Cyperus odoratus L. 1.

Hábito, 2. Detalhe do sistema subterrâneo. 3. Secção transversal da região mediana

do escapo. 4-6: Oxycaryum cubense (Poep. & Kunth) Lye 4. Hábito. 5. Detalhe do

sistema subterrâneo. 6. Secção transversal da região mediana do escapo. 7-9: Pycreus

macrostachyos (Lam.) Raynal 7. Hábito. 8. Detalhe do sistema subterrâneo. 9.

Secção transversal da região mediana do escapo. Legenda: ▬ = epiderme, ● = feixe

de fibras, ▓ = feixe vascular, ▒ = lacuna de ar, □ = parênquima.

30

2

3 c m

3 c m

3 cm

5 m

m

400

400

400

1 ,5

cm

1,5

c m

1

4

5

6

7

3

8

9

31

Figuras 10-19. Fotomicrografias de secções transversais da região mediana de raízes de

espécies de Cyperaceae: 10-12. Cyperus odoratus L. 10. Aspecto geral. 11. Detalhe

da epiderme e exoderme. 12. Detalhe do cilindro vascular. 13-16. Oxycaryum

cubense (Poep. & Kunth) Lye. 13. Aspecto geral - raiz adulta. 14. Detalhe da

epiderme e exoderme. 15. Detalhe do cilindro vascular. 16. Aspecto geral - raiz

jovem. 17-19. Pycreus macrostachyos (Lam.) Raynal. 17. Aspecto geral. 18. Detalhe

da epiderme e exoderme. 19. Detalhe do cilindro vascular. Legenda: En =

endoderme; Ex = exoderme; La = lacuna de ar; Mx = metaxilema; Pe = periciclo.

32

100 µm

100 µm

100 µm

100 µm 200 µm

La

LaLa

En

Pe

En

Pe

Ex

La

Ex

Ex

1210

14 15 16

17

13

18 19

11

33

Figuras 20-26. Fotomicrografias de secções transversais da região mediana de rizomas de

espécies de Cyperaceae: 20-21. Cyperus odoratus L. 20. Aspecto geral. 21. Detalhe

do cilindro vascular. 22-24: Oxycaryum cubense (Poep. & Kunth) Lye. 22. Aspecto

geral do rizoma. 23. Região do nó do estolão. 24. Região do entrenó do estolão. 25-

26. Pycreus macrostachyos (Lam.) Raynal. 25. Aspecto geral. 26. Detalhe do

cilindro vascular. Legenda: En = endoderme; Pe = periciclo.

34

200 µm 100 µm

200 µm200 µm 200 µm

300 µm 100 µm

EnPe

En

Pe

Pe

En

Pe

20 21

22 23 24

25 26

35

Figuras 27-35. Fotomicrografias de secções paradérmicas e transversais de folhas de espécies

de Cyperaceae: 27-32. Vista frontal da epiderme. 27-28. Cyperus odoratus L. 27. Face

adaxial. 285. Face abaxial com estômatos. 29-30. Oxycaryum cubense (Poep. & Kunth) Lye.

29. Face adaxial. 30. Face abaxial com estômatos. 31-32. Pycreus macrostachyos (Lam.)

Raynal. 31. Face adaxial. 32. Face abaxial com estômatos. 33-35. Bordo foliar. 33. Cyperus

odoratus L. 34. Oxycarium cubense (Poep. & Kunth) Lye. 35. Pycreus macrostachyos (Lam.)

Raynal. Legenda: Cl = clorênquima; Ff = feixe de fibras; Hi = hipoderme; La= lacuna de ar.

36

HiHi

HiCl

Cl

Cl

FfFfFf

100 µm 100 µm 2827

100 µm 100 µm 3029

100 µm 100 µm31 32

100 µm 100 µm 100 µm3433 35

37

Figuras 36-45. Fotomicrografias de secções transversais de folhas de espécies de Cyperaceae:

36-37. Cyperus odoratus L. - nervura central e mesofilo, respectivamente. 38-40. Oxycarium

cubense (Poep. & Kunth) Lye - nervura central na região mediana, na região apical, e

mesofilo na região mediana, respectivamente. 41-44. Pycreus macrostachyos (Lam.) Raynal –

41-42. nervura central na região mediana e basal, respectivamente. 43. Detalhe do diafragma.

44. Detalhe do mesofilo. 45. Cyperus odoratus - detalhe do cristal cônico. Legenda: Cb =

célula buliforme; Cl = clorênquima; Cs = Corpo silicoso; Ff = feixe de fibras; Hi =

hipoderme; La = lacuna de ar.

38

100 µm 100 µm

100 µm 100 µm 100 µm

100 µm 100 µm

25 µm

Cs

Cb

CbCb

Cb

Hi

Hi

Hi

Hi

Hi

La

LaLa

Ff

Ff

100 µm

Hi

Ff

La La

100 µm

36 37

38 39 40

41 42 43

44 45

La

39

Figuras 46-56. Fotomicrografias de secções transversais da região mediana de escapos de

espécies de Cyperaceae: 46-48. Cyperus odoratus L. - aspecto geral, detalhe do córtex e da

epiderme, respectivamente. 49-51. Oxycarium cubense (Poep. & Kunth) Lye - aspecto geral,

detalhe do feixe vascular composto e simples, respectivamente. 52-54. Pycreus

macrostachyos (Lam.) Raynal - aspecto geral, detalhe dos feixes vasculares com estrutura

Kranz e do feixe vascular colateral, respectivamente. 55-56. Detalhe da epiderme. 55.

Oxycaryum cubense (Poep. & Kunth) Lye. 56. Pycreus macrostachyos (Lam.) Raynal.

Legenda: Cl = clorênquima; Ff = feixe de fibras; Hi =hipoderme; La = lacuna de ar.

40

100 mµ 50 mµ

50 mµ100 mµ

100 mµ200 mµ

100 mµ

200 mµ

200 mµ

50 mµ10 mµ

La

LaLa

La

La

La

Cs

Ff

Ff

FfFf

Ff

Ff

Hi

Cl

Cl

Cl

Cl

Hi

Hi

Hi

46 47 48

49 50 51

52 53

54 55 56

41

42

CAPÍTULO II

Anatomia de espécies emergentes de lagoas temporárias da

Bahia, Brasil

43

RESUMO

Estudou-se anatomia de raízes, rizomas, folhas e escapos de Echinodorus grandiflorus

(Alismataceae), Eichhornia paniculata (Pontederiaceae) e Habenaria repens (Orchidaceae) de

lagoas temporárias, procurando levantar características anatômicas adaptativas à forma de vida

emergente. Todas as espécies apresentam células epidérmicas com cutícula fina em todos os órgãos;

raízes com exoderme e lacunas de ar no córtex; rizomas com lacunas de ar no córtex; epiderme

foliar com células de paredes finas, anfiestomáticas, com mesofilo dorsiventral, e com

esclerênquima associado aos feixes vasculares; exceto Habenaria repens que é hipoestomática, com

mesofilo regular. Todas as espécies apresentam lacunas de ar no mesofilo e feixes vasculares

colaterais; escapos com epiderme unisseriada, córtex com lacunas de ar e feixes vasculares

distribuídos de forma atactostélica. Células epidérmicas com cutícula fina, presença de lacunas de

ar, idioblastos contendo compostos fenólicos e cristais e redução do tecido de sustentação, são

características presentes nos diferentes órgãos das espécies estudadas que permitiram agrupá-las

como emergentes. Como elas pertencem a grupos taxonômicos distintos, acredita-se que essas

estruturas anatômicas se traduzem em convergências adaptativas à forma de vida emergente.

Palavras-chaves: Alismataceae, Pontederiaceae, Orchidaceae, anatomia, lagoas temporárias

44

ABSTRACT

It was studied anatomy of roots, rhizomes, leaves and scapes of Echinodorus grandiflorus

(Alismataceae), Eichhornia paniculata (Pontederiaceae) and Habenaria repens (Orchidaceae) of

temporary lagoons, to achieve the adaptative anatomical characteristics to the emergent form of life.

All the species demonstrated epidermal cells with thin cuticles on all the organs; roots with an

exoderm and air canals in the cortex; rhizomes with air canals in the cortex; foliar epidermis with

cells of thin walls, anphiestomatic, with a dorsiventral mesophyll, and with sclerenchym associated

to the vascular bundle; except in Habenaria repens that is hypoestomatic, with regular mesophyll.

All the species demonstrsted air canals in the mesophyll and collateral vascular bundles; scapes

with uniseriate epiderms, cortex with air canals and vascular bundles distributed of atactostelic

form. Epidermal cells with thin cuticles, presence of air canals, idioblasts containing phenolic

compounds and crystals and reduced amount of sustentation tissue are characteristic present in the

different organs of the species studied here, allowing them to be grouped emergent plants.

Considering that the species are from different taxonomic group, these anatomical similarities

represent adaptative convergence to an emergent plants.

Key words - Alismataceae, Pontederiaceae, Orchidaceae, anatomy, lagoons temporaries

45

INTRODUÇÃO

A presença de rios e lagoas intermitentes é predominante na caatinga durante a estação

chuvosa, sendo catalogadas 7.358 lagoas no Estado da Bahia. Por apresentarem duração da lâmina

d’água efêmera, favorecem o estabelecimento de uma flora diferenciada, com espécies bem

adaptadas a esse ecossistema (Maltchik et al. 1999, Kercher & Zedler 2004).

Nessas áreas alagáveis ocorrem espécies de monocotiledôneas como Cyperaceae, Poaceae,

Araceae, Alismataceae, Pontederiaceae, Nymphaeaceae e Orchidaceae entre outras (França et al.

2003, Matias et al. 2003). Representantes dessas famílias podem apresentar uma ou mais formas de

vida. Neste trabalho estudou-se apenas algumas espécies emergentes, como Echinodorus

grandiflorus (Alismataceae), Eichhornia paniculata (Pontederiaceae) e Habenaria repens

(Orchidaceae), por serem comuns em estudos fitossociológicos de ambientes aquáticos (França et

al. 2003, Matias et al. 2003).

Alismataceae apresenta espécies de hábito aquático, nativas de regiões tropicais e

temperadas, com forma de vida emergente ou flutuante (Matias et al. 2007, 2008). Pontederiaceae

têm representantes amplamente distribuídos nas regiões tropicais e subtropicais, sendo

exclusivamente aquáticos e com forma de vida flutuante ou emergente (Barrett 2004). Orchidaceae

é uma família com distribuição pantropical, com raros representantes aquáticos (Stern 1997).

No Brasil, sob o ponto de vista anatômico, foram estudadas macrófitas aquáticas de

Scrophulariaceae por Bona & Morretes (2003), de Cyperaceae por Rodrigues & Estelita (2003) e de

Alismataceae do semi-árido nordestino por Matias et al. (2007, 2008). Nestes estudos, as estruturas

anatômicas são relacionadas com possíveis adaptações ao ambiente.

O conhecimento da biologia das macrófitas aquáticas de lagoas temporárias do semi-árido

pode fornecer dados importantes sobre a ecologia das formas de vida apresentadas e do

ecossistema, visando sua conservação, uma vez que essas áreas estão sujeitas à utilização

46

inadequada por atividades agropastoris. A maioria das espécies que ocorrem em lagoas temporárias

apresenta ciclo de vida curto em função da pluviometria, facilitando estudos de sucessão ecológica

e de estratégias de resistência morfológica, anatômica e fisiológica (Pimenta et al. 1998, Kercher &

Zedler 2004).

Baseado no exposto, este trabalho visou caracterizar anatomicamente os órgãos vegetativos

de Echinodorus grandiflorus (Alismataceae), Eichhornia paniculata (Pontederiacae) e Habenaria

repens (Orchidaceae). Como essas espécies são freqüentes em lagoas temporárias do semi-árido da

Bahia, procurou-se verificar a existência de adaptações anatômicas à forma de vida emergente, que

indiquem convergências entre elas.

47

MATERIAL E MÉTODOS

Os espécimes de Echinodorus grandiflorus (Cham. & Schltdl.) Micheli (Alismataceae),

Eichhornia paniculata (Spreng.) Solms Laubach (Pontederiaceae) e Habenaria repens Nutt.

(Orchidaceae) foram selecionados para este estudo por apresentarem, nas lagoas temporárias, a

mesma forma de vida, emergente, de acordo com levantamento feito por França et al. (2003). As

coletas foram feitas em quatro diferentes lagoas do semi-árido baiano, no município de Angüera -

BA, e em período chuvoso, sob as coordenadas 12°16’32”S e 39°03’22”W (Lagoa 1), 12°13’24”S e

39°06’59”W (Lagoa 2), 12°11’38”S e 39°09’07”W (Lagoa 3), 12°10’00”S e 39°12’36”W (Lagoa

4).

Esses corpos d’água temporários são comuns no nordeste brasileiro, em função da

sazonalidade de chuvas e depressões de relevo, favorecendo acúmulo de água superficial e não

existindo nenhum tipo de comunicação entre elas. A vegetação aquática desses ambientes é

dinâmica, tem rápido estabelecimento e a sucessão de espécies ocorre em função do regime de

chuvas e do período de estabilidade da água nas lagoas, que se mantêm vivas enquanto houver

umidade no solo (Maltchik et al. 1999).

Para a análise anatômica, utilizou-se plantas adultas fixadas em FAA a 70% e

posteriormente preservadas em álcool etílico a 70% (Johansen 1940). O material estudado encontra-

se depositado no Herbário da Universidade Estadual de Feira de Santana (HUEFS): Echinodorus

grandiflorus: Leite et al. 480; Leite & França 497; Leite & Lessa 508; Leite & França 515; Leite &

França 516; Leite & França 517. Eichhornia paniculata: Leite et al. 482; Leite & França 485; Leite

& França 498; Leite & Lessa 509; Leite & França 518. Habenaria repens: Leite et al. 476; Leite &

França 483; Leite 487; Leite & Lessa 507.

A partir do material fixado foram selecionadas peças de regiões apical, mediana e basal de

raízes, rizomas, folhas e escapos. Nas regiões apical e basal das raízes, as secções foram feitas à

48

uma altura de até cinco milímetros à partir do ápice e da base. Foram utilizados pelo menos três

indivíduos de cada espécie. Secções transversais dos diferentes órgãos foram feitos à mão livre,

com o auxílio de lâmina de barbear e submetidas ao processo de dupla coloração com azul de astra

e safranina (modificado de Bukatsch 1972 apud Kraus & Arduim 1997). Para dissociação da

epiderme foliar, foi utilizado o método de Jeffrey (Johansen 1940) cujas porções foram coradas com

safranina a 1%.

Algumas peças dos diferentes órgãos foram incluídas em historresina (Feder & O´Brien

1968) e posteriormente seccionadas a 5µm de espessura em micrótomo rotativo. O processo de

coloração foi feito com ácido-periódico-reativo de Schiff (PAS) e azul de toluidina (Feder &

O´Brien 1968) e as secções foram montadas em lâminas permanentes com Entellan.

Testes microquímicos foram realizados em material fresco, em secções obtidas à mão livre

de todos os órgãos vegetativos. Para tanto, algumas secções foram submetidas ao tratamento com

cloreto férrico para verificação de compostos fenólicos, fenol para sílica (Johansen 1940) e ácido

clorídrico a 10% para oxalato de cálcio (Kraus & Arduim 1997).

49

RESULTADOS

Echinodorus grandiflorus (Alismataceae), Eichhornia paniculata (Pontederiaceae) e

Habenaria repens (Orchidaceae) têm seus aspectos morfológicos e anatômicos representados

respectivamente através das figuras 1-6 e 7-48.

As espécies estudadas Echinodorus grandiflorus (Alismataceae) (Fig. 1), Eichhornia

paniculata (Pontederiaceae) (Fig. 3) e Habenaria repens (Orchidaceae) (Fig. 5) são macrófitas

aquáticas, emergentes, pois o nível de água chega até a metade do tamanho das plantas. Elas

crescem logo após o período de chuvas e permanecem vivas enquanto houver disponibilidade de

água no solo, desaparecendo no período seco. Apresentam rizoma vertical, envolvido por bainhas

de folhas senescentes, de onde partem as raízes adventícias (Fig. 2, 4, 6).

São herbáceas e apresentam folhas simples. Echinodorus grandiflorus apresenta folhas

ovaladas, filotaxia rosulada e escapo triangular sustentando inflorescência tipo verticilastro (Fig. 1).

Eichhornia paniculata tem folhas cordiformes e filotaxia rosulada. Nesta espécie, algumas folhas

são dissimilares e da região lateral superior do pecíolo cresce o escapo que sustenta inflorescência

em panícula (Fig. 3). Habenaria repens apresenta folhas lanceoladas e filotaxia alterna. O escapo é

cilíndrico e sustenta flores em racemo (Fig. 5).

Levando-se em consideração que as espécies estudadas pertencem a três diferentes famílias

de macrófitas aquáticas, suas descrições anatômicas se referem principalmente ao sucesso delas no

ambiente aquático.

As raízes das espécies estudadas, em secção transversal, apresentam córtex diferenciado

(Fig. 8-9, 13, 16). Na raiz jovem das espécies estudadas, em secção transversal, próximo à região

meristemática, inicia-se a diferenciação dos tecidos, como pode ser observado em Echinodorus

grandiflorus (Fig. 7). Nesta fase de desenvolvimento das raízes jovens, observam-se células

epidérmicas de paredes delgadas, com cutícula fina, alongadas transversalmente ao eixo de

50

crescimento da raiz (Fig. 7-8). Observa-se também o início do desenvolvimento de lacunas de ar no

córtex mediano.

As raízes apresentam córtex externo constituído pela exoderme (hipoderme) formada por

duas a três camadas de células hexagonais e com parede periclinal externa mais espessada que as

demais em Echinodorus grandiflorus (Fig. 10) e Eichhornia paniculata (Fig. 13-14). Em

Habenaria repens essas células são arredondadas e sem espessamento de parede (Fig. 16-17).

O córtex mediano ocupa a maior porção das raízes, e é formado por tipos distintos de células

parenquimáticas: arredondadas em Habenaria repens (Fig. 16-17), alongadas em Eichhornia

paniculata (Fig. 13) e braciformes em Echinodorus grandiflorus (Fig. 9, 12). As paredes das células

do córtex mediano se afastam formando lacunas de ar esquizógenas (Fig. 16-17) e/ou se rompem,

formando lacunas de ar lisígenas (Fig. 8-9, 12, 13).

O córtex interno em Echinodorus grandiflorus (Fig. 7-11) e Eichhornia paniculata (Fig. 13,

15) apresentam várias camadas de células arredondadas de tamanho menor que as demais e com

redução de espaço intercelular. A camada mais interna, a endoderme, é unisseriada, com células de

paredes delgadas, onde se evidenciam estrias de Caspary (Fig. 11, 18 - setas). Em Habenaria

repens, o córtex interno apresenta uma única camada de células, a endoderme (Fig. 16-18). O

cilindro vascular de todas as espécies estudadas apresentam vários elementos de metaxilema

ocupando a região central (Fig. 8, 13, 15-16).

Os rizomas das espécies estudadas apresentaram epiderme unisseriada, com cutícula fina, e

córtex diferenciado, com células parenquimáticas de paredes finas e arredondadas (Fig. 21, 24). A

presença de amplas lacunas de ar no córtex dos rizomas é marcante nas três espécies (Fig. 19, 21-

22, 24). Observam-se raízes intracorticais (Fig. 19, 21, 23). Em Eichhornia paniculata (Fig. 23),

observa-se a saída de uma raiz adventícia e a conexão dos tecidos dessa nova raiz com aqueles do

rizoma. Todas as espécies apresentam rizoma com córtex interno constituído de várias camadas de

51

células de paredes levemente espessadas (Fig. 20, 21, 24) e endoderme e periciclo unisseriados (Fig.

20, 22, 25).

As folhas de Echinodorus grandiflorus e Eichhornia paniculata são anfiestomáticas e as de

Habenaria repens são hipoestomáticas. Em vista frontal, Echinodorus grandiflorus (Fig. 26-27)

apresenta células epidérmicas com paredes sinuosas e, em Eichhornia paniculata (Fig. 28-29) e

Habenaria repens (Fig. 30-31), as células epidérmicas apresentam paredes retas em ambas as faces.

Echinodorus grandiflorus e Eichhornia paniculata apresentam estômatos paracíticos (Fig. 26-29) e

Habenaria repens estômatos anomocíticos (Fig. 31).

Em secção transversal da folha, a epiderme de todas as espécies é uniestratificada, com a

parede periclinal externa mais espessada que a interna e com cutícula fina (Fig. 32-33, 35-42).

Habenaria repens apresenta células epidérmicas da face adaxial maiores do que as da face abaxial

(Fig. 38-39).

O mesofilo é do tipo dorsiventral em Echinodorus grandiflorus e Eichhornia paniculata

(Fig. 33, 36 respectivamente) e homogêneo em Habenaria repens com redução dos espaços

intercelulares (Fig. 39). Nas espécies com mesofilo dorsiventral, o parênquima clorofiliano

paliçádico apresenta de duas a três camadas de células voltadas à face adaxial da lâmina foliar (Fig.

33, 36-37). Em Echinodorus grandiflorus, o parênquima lacunoso apresenta cerca de cinco camadas

de células, com redução dos espaços intercelulares (Fig. 33) e em Eichhornia paniculata logo

abaixo do parênquima paliçádico podem ser observadas amplas lacunas de ar (Fig. 35-36).

O mesofilo das espécies estudadas apresenta feixes vasculares colaterais dispostos em uma

única fileira central (Fig. 33) em Echinodorus grandiflorus e Habenaria repens, e em duas fileiras,

alternando os menores com os maiores, em Eichhornia paniculata (Fig. 35-36). Os feixes

vasculares apresentam fibras pericíclicas, exceto em Habenaria repens (Orchidaceae), que é

destituída de tecido de sustentação.

52

A nervura central da folha de Habenaria repens (Fig. 38) apresenta apenas um feixe

vascular central enquanto que Echinodorus grandiflorus (Fig. 32) e Eichhornia paniculata (Fig. 35)

apresentam um feixe vascular maior nas posições adaxial e abaxial respectivamente, e de dois a seis

feixes vasculares menores. Logo abaixo da epiderme ocorre colênquima lacunar. Os feixes

vasculares apresentam periciclo espessado (Fig. 32, 35).

O bordo foliar é obtuso em Echinodorus grandiflorus e Eichhornia paniculata (Fig. 40-41,

respectivamente) e agudo em Habenaria repens (Fig. 42). Nessa região, logo abaixo da epiderme,

ocorrem células de parênquima em Echinodorus grandiflorus e Habenaria repens (Fig. 40, 42,

respectivamente) e parênquima clorofiliano em Eichhornia paniculata (Fig. 41).

As lacunas de ar presentes no mesofilo das espécies estudadas são maiores em Eichhornia

paniculata (Fig. 35-36). Elas são delimitadas por diafragmas constituídos de células braciformes

(Fig. 34-seta).

Os escapos das espécies estudadas, em secção transversal, apresentam epiderme com

cutícula fina, córtex e cilindro vascular distintos (Fig. 43-48, respectivamente). A epiderme é

uniestratificada, com células de paredes finas em Echinodorus grandiflorus e Eichhornia paniculata

(Fig. 44, 46) e parede periclinal externa levemente mais espessada que a interna em Habenaria

repens (Fig. 48).

O córtex é constituído por células parenquimáticas arredondadas, intercaladas por lacunas de

ar e feixes vasculares em Echinodorus grandiflorus (Fig. 43-44) e Eichhonia paniculata (Fig. 45-

46) e intercaladas apenas por lacunas de ar em Habenaria repens (Fig. 47-48). A endoderme, que

limita o cilindro vascular, é cilíndrica e constitui-se de células de paredes finas (fig. 43-44, 46-48).

O periciclo é constituído por uma a duas camadas de células de paredes levemente espessadas nas

três espécies estudadas (Fig. 43-44, 46-48). Os feixes vasculares do cilindro vascular são colaterais

e apresentam distribuição atactostélica (Fig. 43-48). Nesta região também ocorrem lacunas de ar

com dimensões variadas (Fig. 43-48).

53

Nas raízes, rizomas, folhas e escapos das espécies estudadas foram observados idioblastos

contendo compostos fenólicos (Fig. 8-seta, 21-24, 32, 40-41) e cristais na forma de ráfides e drusas

(Fig. 22, 37-setas).

54

DISCUSSÃO

Os órgãos vegetativos de Echinodorus grandiflorus (Alismataceae), Eichhornia paniculata

(Pontederiaceae) e Habenaria repens (Orchidaceae), espécies de monocotiledôneas distintas

filogeneticamente, apresentam em comum: cutícula fina, idioblastos contendo cristais e compostos

fenólicos, lacunas de ar e redução do tecido de sustentação. Essas características representam

convergências adaptativas dessas espécies ao ambiente aquático e à forma de vida emergente.

A cutícula que recobre a parede periclinal externa dos órgãos emersos e submersos das

espécies estudadas neste trabalho apresentou-se fina, assim como em outras espécies de

Angiospermas que crescem em locais com disponibilidade de água. Para Sculthorpe (1967), a

dificuldade de obter oxigênio é um dos fatores responsáveis pela presença de cutícula fina,

principalmente, nos órgãos submersos de macrófitas aquáticas e não apenas à disponibilidade de

água. Esse caráter pode favorecer a passagem de gases dissolvidos na água para o interior do órgão.

Nos órgãos emersos das espécies estudadas, a presença de cutícula fina pode estar relacionada à

diminuição da intensidade luminosa durante o período de chuvas, época em que as espécies foram

coletadas, além da constante umidade do solo.

A presença de cutícula mesmo fina nas espécies estudadas além de favorecer a aeração, nos

órgãos emersos e submersos, lhes confere proteção. Nas raízes, pode atuar juntamente com a

exoderme como uma barreira a mais contra ataque de patógenos, conforme o que foi relatado por

Peterson (1992) para outras espécies aquáticas.

A maior densidade estomática nas folhas de E. paniculata seguido de E. grandiflorus em

relação à H. repens pode ser associada ao tipo de mesofilo dorsiventral e homogêneo observado,

respectivamente, nas espécies além de estar associada à mecanismos fisiológicos de trocas gasosas

uma vez que em E. paniculata os estômatos se localizam em ambas as faces epidérmicas estando

mais em contato com as lacunas de ar em E. paniculata.

55

Lacunas de ar estão presentes nos órgãos vegetativos das três espécies estudadas. Nessas

espécies que têm forma de vida emergente, as lacunas ar presentes nas raízes se desenvolvem na

diferenciação dos tecidos, sendo mais freqüentes no córtex das raízes, rizomas e escapos do que nas

folhas. São menores nas folhas de Echinodorus grandiflorus (Alismataceae) e Habenaria repens

(Orchidaceae) que se encontram sempre emersas, mesmo no período chuvoso, ficando submersas

apenas as raízes e rizomas.

Para Peterson (1992), a sobrevivência de plantas que vivem em solos alagados está

diretamente relacionada à presença de espaços de ar. Para Armstrong et al. (1991), estes espaços de

ar favorecem a sobrevivência da raiz em ambientes mais profundos. No caso das plantas emergentes

estudadas, que já crescem sob condição de alagamento, elas apresentam lacunas de ar nas raízes

desde o início de seu desenvolvimento. O mesmo foi observado em raízes adventícias de outras

plantas emergentes, que crescem em solos inundados, por Seago & Marsh (1989) em Typha glauca

Godr. (Typhaceae), por Schussler & Longstreth (1996) em Saggitaria lancifolia L. (Alismataceae) e

por Seago Jr. et al. (2000) em Pontederia cordata L. (Pontederiaceae).

Tanto nas espécies emergentes estudadas neste trabalho como naquelas estudadas por Seago

& Marsh (1989), Schussler & Longstreth (1996) e por Seago Jr. et al. (2000), as espécies

apresentam a característica comum de desenvolvimento de lacunas de ar no ápice da raiz, como

uma convergência adaptativa ao ambiente aquático e à forma de vida.

Provavelmente as lacunas de ar das plantas estudadas neste trabalho são de origem

esquizógena na raiz jovem, rizoma, folha e escapo, e lisígena na região cortical da raiz adulta.

Mesmo não tendo sido realizados estudos ontogenéticos, a partir de análise anatômica das espécies

e por comparação ao que foi apresentado por Pimenta et al. (1998) e por Schussler & Longstreth

(1996), que afirmam que as plantas desenvolvem aerênquima esquizógeno e apenas

secundariamente pode ocorrer formação de aerênquima lisígeno. Esses autores atribuem a formação

de aerênquima, em órgãos subterrâneos, à baixa oxigenação do solo úmido. Segundo Peterson

56

(1992), a hipoxia promove a concentração de etileno em células corticais estimulando a atividade da

celulase e formando as lacunas de ar.

Para Sculthorpe (1967) e Armstrong et al. (1991), a presença de lacunas de ar, tanto de

origem lisígena como esquizógena, é um caráter comum em plantas aquáticas e é uma forma de

assegurar o suprimento de O2 às células ou órgãos com pouco oxigênio.

Acredita-se que o desenvolvimento das lacunas de ar seja anterior ao espessamento da

exoderme e endoderme nas espécies emergentes assim como observado Seago et al. (2000) em

Pontederia cordata. Para estes autores, a relação entre esses tecidos possibilita a ocupação dessas

plantas em áreas específicas no ambiente aquático de água doce e mesmo que haja redução no

espessamento da exoderme e/ou endoderme, a estrutura e função desses tecidos na raiz está

relacionada ao controle da permeabilidade de íons e gases, ao movimento da água no corpo da

planta, ao suporte estrutural oferecido pelo aerênquima, à flexibilidade ou rigidez à flutuação, à

sustentação da raiz no substrato e ao bloqueio da entrada de patógenos.

Delimitando as lacunas de ar presentes nos diferentes órgãos vegetativos das espécies

estudadas, foram observados diafragmas constituídos por células braciformes cujos braços

apresentam comprimentos variados. Concorda-se com Peterson (1992) em que os diafragmas

aumentam a resistência mecânica dos órgãos e impedem a passagem de água sem impedir a

passagem de O2 entre uma lacuna de ar e outra. Segundo Sculthorpe (1967), as lacunas de ar

presentes no mesofilo de folhas e escapos têm a função de facilitar o acúmulo de O2, transportando-

o lacuna a lacuna até os órgãos submersos ou subterrâneos.

A presença de idioblastos contendo compostos fenólicos e cristais na forma de ráfides ou

drusas presentes nos órgãos vegetativos das espécies emergentes estudadas, também ocorre em

outros grupos de Angiospermas, principalmente entre as monocotiledôneas. Acredita-se que a

presença destas estruturas esteja relacionada a mecanismos de defesa das plantas, conferindo-lhes

proteção contra o ataque de patógenos e herbívoros (Metcalfe 1985, Mauseth 1988).

57

Essas substâncias ergásticas podem aparecer isoladas ou combinadas. Apresentam

importância no ambiente aquático, pois servem como proteção para a planta que pode ser

consumida por diversos organismos (Sculthorpe 1967). Além disso, apresenta-se como uma

evidência filogenética, como já observado por Mauseth (1988) e Prychid & Rudall (1999, 2000),

através da presença constante de cristais em espécies de Monocotiledôneas.

Nos diferentes órgãos das espécies estudadas, ocorre redução do tecido de sustentação,

aqueles que ocorrem estão associados aos sistemas vasculares. A redução acentuada de elementos

de sustentação provenientes do meristema fundamental deve estar relacionada ao hábito aquático, à

pouca luminosidade e ao curto tempo de vida dessas plantas, além de não necessitarem de força

mecânica para se sustentarem uma vez que crescem em ambiente lêntico temporário. Esses órgãos

vegetativos têm como elementos de sustentação mecânica os tecidos que formam o sistema vascular

e os que formam as lacunas de ar e diafragmas conforme relatado para outras espécies aquáticas por

Sculthorpe (1967) e Stern (1997). Concorda-se com Sculthorpe (1967) em que os tecidos de

sustentação teriam sofrido redução em algumas formas biológicas em função de a água assumir o

principal papel de sustentação através do aerênquima bastante desenvolvido.

É importante ressaltar a semelhança do parênquima cortical dos órgãos subterrâneos (raiz e

rizoma) de Echinodorus grandiflorus (Alismataceae) e Eichhornia paniculata (Pontederiaceae),

cujos representantes são exclusivamente aquáticos, com Habenaria repens (Orchidaceae). Segundo

Stern (1997), esta última é a única espécie aquática de Habenaria, gênero constituído de plantas

terrestres de locais úmidos e sombreados. Certamente esta é uma característica indicativa de

convergência adaptativa das espécies à forma de vida.

As semelhanças anatômicas nos órgãos subterrâneos e a análise de similaridade realizada

nos leva a acreditar que estes mecanismos estruturais adaptativos foram desenvolvidos devido à sua

forma de vida emergente. A aeração dos órgãos subterrâneos é um mecanismo de sobrevivência que

favorece a reprodução das espécies em função do curto tempo de vida que apresentam. Também,

58

independente do ambiente, lótico ou lêntico, as características observadas nos órgãos submersos das

diferentes espécies representam convergências adaptativas mais evidentes do que aquelas

observadas nos órgãos aéreos.

59

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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62

Figuras 1-6. Aspectos morfológicos de espécies de monocotiledôneas: 1-2. Echinodorus

grandiflorus (Alismataceae). 1.Hábito. 2. Detalhe do sistema subterrâneo. 3-4. Eichhornia

paniculata (Pontederiaceae). 3. Hábito. 4. Detalhe do sistema subterrâneo. 5-6: Habenaria

repens (Orchidaceae). 5. Hábito. 6. Detalhe do sistema subterrâneo.

63

1

5

2

6

3 4

4 cm

2 cm

2,7 cm

2 cm

4 cm

2 cm

64

Figuras 7-18. Fotomicrografias de aspectos anatômicos de secções transversais de raízes de espécies

de monocotiledôneas: 7-12. Echinodorus grandiflorus (Alismataceae). 7-8. Aspecto geral da raiz

jovem. 9. Raiz adulta. 10. Detalhe da epiderme e exoderme. 11. Detalhe do cilindro vascular. 12.

Detalhe das células braciformes que se rompem e formam as lacunas de ar - setas. 13-15.

Eichhornia paniculata (Pontederiaceae) – raiz adulta. 13. Aspecto geral. 14. Detalhe da epiderme e

exoderme. 15. Detalhe do cilindro vascular. 16-18. Habenaria repens (Orchidaceae) – raiz adulta.

16. Aspecto geral. 17. Detalhe da epiderme e córtex. 18. Detalhe da endoderme com estrias de

Caspary e cilindro vascular. Legenda: Co-coifa, En-endoderme, Ex-exoderme, Fl-floema, La-lacuna

de ar, Mx-metaxilema, Pe-priciclo, Xi-xilema.

65

9

11

12

151413

16 17 18

8200 µm

200 µm

100 µm

200 µm

100 µm 100 µm 100 µm

200 µm 200 µm 100 µm

La

La

La

LaLa

La

La

Ex

Ex

Ex

Ex Co

En Pe

PeEn

Pe

EnMx

Mx

XiFl

Ex

Cf

Pe

En

Pe En

Ex

100 µm 10

7100 µm

63

66

Figuras 19-25. Fotomicrografias de aspectos anatômicos de secções transversais da região mediana

do rizoma de espécies de Monocotiledôneas: 19-20. Echinodorus grandiflorus

(Alismataceae): 19. Aspecto geral. 20. Detalhe da região do cilindro vascular. 21-23:

Eichhornia paniculata (Pontederiaceae): 21. Aspecto geral do córtex com lacunas de ar e

raízes intracorticais. 22. Detalhe do córtex e cilindro vascular. 23. Detalhe da saída de raiz.

24-25: Habenaria repens (Orchidaceae): 24. Aspecto do córtex com lacunas de ar. 25.

Detalhe da endoderme e cilindro vascular. Legenda: Cf-composto fenólico, Cr-cristal, En-

endoderme, La-lacuna de ar, Mx-metaxilema, Pe-priciclo.

67

25

21 22 23

24

200 µm 19 200 µm 20

300 µm 200 µm 200 µm

200 µm 200 µm

EnPe

En Pe

En

Pe

La

La

La

Cf

Cr

65

68

Figuras 26-31. Fotomicrografias de aspectos anatômicos da região mediana da epiderme foliar em

vista frontal, de espécies de Monocotiledôneas: 26-27. Echinodorus grandiflorus

(Alismataceae) - Face adaxial e abaxial, respectivamente. 28-29: Eichhornia paniculata

(Pontederiaceae) - Face adaxial e abaxial, respectivamente. 30-31: Habenaria repens

(Orchidaceae) - Face adaxial e abaxial, respectivamente.

69

26 27

2928

3130

200 µm

200 µm200 µm

200 µm200 µm

200 µm

67

70

Figuras 32-42. Fotomicrografias de aspectos anatômicos da região mediana de secções transversais

de folhas de espécies de Monocotiledôneas: 32-34. Echinodorus grandiflorus (Alismataceae). 32.

Aspecto geral da nervura central. 33. Detalhe do mesofilo com nervuras menores. 34. Detalhe do

diafragma que limita as lacunas de ar. 35-37. Eichhornia paniculata (Pontederiaceae). 35. Aspecto

geral da nervura central. 36. Detalhe do mesofilo. 37. Detalhe do mesofilo contendo ráfides. 38-39.

Habenaria repens (Orchidaceae). 38. Aspecto geral da nervura central. 39. Detalhe do mesofilo. 40-

43. Bordo foliar. 40. E. grandiflorus. 41. E. paniculata. 42. H. repens. Legenda: Cf–composto

fenólico, Cr-cristal, Df-diafragma, Es-estômato, La- lacuna de ar.

71

32

33

34

36

35

38

42

39

4140

200 µm

200 µm

200 µm

200 µm

200 µm

La

Es

Es

Es Es

La

LaDf

Df

Es37200 µm

Cr

Cr

La

Es

200 µmEs

200 µm 200 µm 200 µm

400 µm

69

72

Figuras 43-48. Fotomicrografias de aspectos anatômicos da região mediana de secções transversais

de escapos de espécies de Monocotiledôneas: 43-44. Echinodorus grandiflorus (Alismataceae) -

Aspecto geral e detalhe do córtex, respectivamente. 45-46. Eichhornia paniculata (Pontederiaceae)

- Aspecto geral e detalhe do córtex, respectivamente. 47-48. Habenaria repens Orchidaceae) -

Aspecto geral e detalhe do córtex, respectivamente. Legenda: Cf – composto fenólico, Cr-cristal,

Df-diafragma, En-Endoderme, Es-estômato, Fp-fibras pericíclicas, La- lacuna de ar.

73

48

4443

4645 4646464646

200 µm 200 µm

200 µm 200 µm

200 µm400 µm 47

La

La

LaLa

La

La

Df

Pe

Fp

Fp

FpCf

Cf

Cf

Cf

En

La

En

71

74

CAPÍTULO III

Convergência adaptativa em espécies de monocotiledôneas

lacustres do semi-árido da Bahia, Brasil

75

RESUMO

Macrófitas aquáticas podem apresentar formas de vida variadas, o que lhes permite

colonizar diferentes áreas ao longo de um perfil ambiental, inclusive lagoas temporárias do

semi-árido nordestino. A plasticidade apresentada nos tecidos de proteção, fundamental e

vascular dos órgãos vegetativos das macrófitas garante sua sobrevivência sob condição de

alagamento. Com isso, este trabalho buscou levantar caracteres anatômicos que indicassem a

convergência adaptativa, de espécies anfíbias e emergentes de lagoas temporárias da Bahia.

Cyperus odoratus L., Oxycaryum cubense (Poep. & Kunth) Lye e Pycreus macrostachyos

(Lam.) Raynal (Cyperaceae) – anfíbias, e Echinodorus grandiflorus (Cham. & Schltdl.)

Micheli (Alismataceae), Eichhornia paniculata (Spreng.) Solms Laubach (Pontederiacae),

Habenaria repens Nutt. (Orchidaceae) – emergentes, apresentam características anatômicas

que as convergem ao tipo de ambiente aquático no qual são encontradas, considerando que

essas espécies pertencem à grupos taxonômicos distintos. São consideradas características

anatômicas convergentes: presença de lacunas de ar e epiderme unisseriada em todos os

órgãos vegetativos; exoderme e endoderme constituídas de várias camadas de células de

paredes com espessamentos variados nas raízes; redução do tecido de sustentação e de

elementos de transporte do xilema em todos os órgãos, quando comparadas às demais

espécies do gênero que são terrestres. Essas características são adaptativas às espécies de

monocotiledôneas anfíbias e emergentes que ocorrem nas lagoas temporárias da Bahia.

Palavras-chave: Anatomia ecológica, macrófitas aquáticas, convergência adaptativa, lagoas do

semi-árido

76

ABSTRACT

Aquatic plants can present different life forms, that allow the colonization them

different areas along an environmental gradient, including temporary lagoons of the semi-arid

Northeastern Brazil. The plasticity demonstrated in the tissues of the vegetative organs of the

aquatic plants ensure their survival under wetting condition. The anatomic adaptative features

which indicate the adaptative convergence of amphibious and emergent species of temporary

lagoons from State of Bahia were assessed. Cyperus odoratus L., Oxycaryum cubense (Poep.

& Kunth) Lye and Pycreus macrostachyos (Lam.) Raynal (Cyperaceae) - amphibious and

Echinodorus grandiflorus (Cham. & Schltdl.) Micheli (Alismataceae), Eichhornia paniculata

(Spreng.) Solms Laubach (Pontederiacae), Habenaria repens Nutt. (Orchidaceae) – emergent,

demonstrated anatomical characteristics that converge them to the type of aquatic

environment in which they are found, considering that those species belong to different

taxonomic groups. Convergent anatomical characteristics are considered: presence of air

canals and uniseriate epidermis in all the vegetative organs; exoderm and endoderm are

composed of several cells layers with varied cell walls thickness; reduced amounts of tissue of

sustentation and xylem transport elements in all of their organs when compared to terrestrial

species of the same genus. These are the adaptative characteristics of species of amphibious

and emergent monocotyledons inhabiting temporary lagoons in Bahia State.

Key-words: ecologic anatomy, aquatic plants, adaptative convergence, lagoons of semi-arid

77

INTRODUÇÃO

Os processos adaptativos que ocorrem nas diferentes formas de vida de macrófitas

aquáticas são resultantes da informação genética e de adaptações (Davy et al. 1990, Futuyma

1993). Segundo os autores, as adaptações ocorrem em resposta a grande número de fatores

bióticos e abióticos, que individualmente, podem afetar a capacidade de uma espécie

sobreviver e se reproduzir em um determinado local.

As macrófitas aquáticas, das lagoas temporárias do semi-árido brasileiro, variam tanto

na sua estrutura externa quanto interna, o que permite agrupá-las em formas de vida

específicas (Irgang et al. 1984), de acordo com a zonação ecológica.

No semi-árido, a sobrevivência das macrófitas aquáticas depende de sua tolerância aos

extremos ambientais, períodos secos e chuvosos. Essa tolerância adaptativa ao ambiente

aquático temporário ocorre através de um conjunto de respostas plásticas, manifestadas por

características fenológicas, morfológicas, anatômicas e fisiológicas (Wells & Pigliucci 2000).

A estas respostas plásticas dá-se o nome de plasticidade fenotípica (Wells & Pigliucci

2000), que é a propriedade que o genótipo tem de alterar a sua expressão fenotípica em

resposta às mudanças ambientais. A plasticidade fenotípica pode ser entendida também como

a habilidade de um organismo em reagir ao ambiente alterando sua forma, estado, movimento

ou velocidade de reação à determinada condição ambiental (West-Eberhard 2003).

O baixo nível de oxigênio encontrado no ambiente lêntico é um dos maiores

problemas das macrófitas aquáticas (Matthews & Seymour 2006), pois a hipoxia pode levar

ao aumento da produção de íons Fe2+ e Mn2+, tóxicos para as plantas, produzindo danos

irreversíveis aos órgãos subterrâneos. Como resposta, para evitar esses danos essas plantas

apresentam convergência anatômica que pode ser traduzida, principalmente, pela presença de

lacunas de ar, encontradas nos diferentes órgãos vegetativos, formadas pelo espaçamento

entre as células ou pela desintegração delas (Sculthorpe 1967; Keddy 2000).

78

Plantas aquáticas de diferentes grupos taxonômicos podem adaptar-se a uma área com

igual variação temporal e espacial do nível de água do ecossistema, podendo apresentar

características ecológicas, e às vezes morfológicas, semelhantes. Através dessas semelhanças

ecológicas podemos enquadrá-las em diferentes formas de vida sem, no entanto, saber se

ocorres semelhanças também nas estruturas internas.

Desta forma, este trabalho teve como objetivo levantar características anatômicas de

algumas espécies de monocotiledôneas anfíbias e emergentes, de lagoas temporárias da Bahia,

que indicassem convergência adaptativa ao ambiente.

79

MATERIAL E MÉTODOS

Representantes de Cyperus odoratus L., Oxycaryum cubense (Poep. & Kunth) Lye,

Pycreus macrostachyos (Lam.) Raynal (Cyperaceae) - anfíbias, e de Echinodorus

grandiflorus (Cham. & Schltdl.) Micheli (Alismataceae), Eichhornia paniculata (Spreng.)

Solms Laubach (Pontederiaceae) e Habenaria repens Nutt. (Orchidaceae) – emergentes,

foram coletados durante o período chuvoso, em lagoas temporárias do semi-árido nordestino

da Bahia. Essas lagoas foram formadas pelo acúmulo de água superficial, não apresentavam

comunicação entre si, e estavam localizadas ao longo da rodovia BA 052 (Estrada do Feijão).

Todos os indivíduos foram coletados em áreas com semelhantes condições ambientais,

como altitude, condição geológica e temperatura atmosférica, havendo variação de tamanho e

profundidade das lagoas.

Para a análise anatômica foram utilizadas peças dos órgãos vegetativos de plantas

adultas, fixadas em FAA a 70% e posteriormente preservadas em álcool etílico a 70%

(Johansen 1940). As espécies estudadas foram coletadas e incorporadas ao acervo do Herbário

da Universidade Estadual de Feira de Santana (HUEFS): Cyperus odoratus: Leite et al. 477;

Leite 486; Leite & França 495; Leite & França 519; Leite & França 520; Leite & França 521.

Oxycaryum cubense: Leite et al. 475; Leite & França 522; Leite & França 523; Leite &

França 524; Leite & França 525. Pycreus macrostachyos: Leite 486A; Leite 487A; Leite &

França 496; Leite & França 500; Leite & Lessa 507. Echinodorus grandiflorus: Leite et al.

480; Leite 528; Leite & França 495; Leite & Lessa 508; Leite & França 515; Leite & França

516; Leite & França 517. Eichhornia paniculata: Leite et al. 482; Leite & França 485; Leite

& França 498; Leite & Lessa 509; Leite & França 518. Habenaria repens: Leite et al. 476;

Leite & França 483; Leite 487; Leite & Lessa 507.

Foram seccionadas regiões medianas de raízes, rizomas, folhas e escapos, de pelo

menos três indivíduos diferentes de cada espécie. Secções transversais foram feitas à mão

livre, com auxílio de lâmina de barbear, coradas com azul de astra e safranina (modificado de

Bukatsch 1972 apud Kraus & Arduim 1997) e montadas em lâminas semi-permantes com

gelatina glicerinada.

80

Algumas peças dos órgãos vegetativos foram incluídas em historresina (Feder &

O´Brien 1968) e seccionadas em micrótomo rotativo. O processo de coloração foi feito com

ácido-periódico-reativo de Schiff (PAS) e azul de toluidina (Feder & O´Brien 1968) e as

secções foram montadas em lâminas permanentes com Entellan.

81

RESULTADOS

Presença de lacunas de ar, exoderme e endoderme com uma ou várias camadas de

células de espessamento variado e redução de elementos xilemáticos e de sustentação podem

ser observados através das figuras 1-19.

Nas macrófitas aquáticas aqui estudadas a aeração ao longo do corpo vegetal, é uma

evidência observada através da presença de lacunas de ar presentes em todos os órgãos. Nas

raízes e rizomas, as lacunas de ar são amplas em todas as espécies e ocupam a região mediana

do córtex (Fig. 1, 6, 8). O córtex mediano é maior em extensão quando comparado com o

córtex externo e interno (Fig. 1, 6, 8).

Nas folhas e escapos as lacunas de ar são amplamente desenvolvidas na maioria das

espécies (Fig 9-11, 16-17), com exceção de Eichhornia paniculata (Fig. 13) e Habenaria

repens (Fig. 14), que são pequenas.

Todas as espécies estudadas apresentam epiderme revestindo todos os órgãos

vegetativos. Esta se apresenta unisseriada, constituída de células isodiamétricas, na sua

maioria, sem espessamento de parede (Fig. 1-3, 6, 8-19). Apenas os órgãos aéreos apresentam

variação no espessamento da cutícula, que é maior especialmente na folha e escapo de

Cyperus odoratus, Oxycaryum cubense e Pycreus macrostachyos (Fig. 9-11, 15-16).

Nas raízes e rizomas de todas as espécies estudadas ocorre córtex diferenciado, com

exoderme formada por várias camadas de células com paredes espessadas (Fig. 1-3, 6, 8). O

espessamento das células da exoderme pode apresentar-se regular (Fig. 1), mais intenso na

primeira camada (Fig. 2), ou na parede periclinal externa que é mais espessada que a interna

(Fig. 3). Nas raízes e rizomas as células da endoderme também apresentam paredes com

espessamentos variados, conforme a espécie (Fig. 1, 4-7), com exceção de Habenaria repens

que não apresenta endoderme com células de paredes espessadas.

82

As espécies estudadas neste trabalho, apresentam redução nos tecidos de sustentação

em todos os órgãos vegetativos. Quando presente, os tecidos de sustentação ocorrem apenas

nos órgãos aéreos como folhas e escapos, na forma de feixes de fibras esclerenquimáticas

(Fig.9-11, 15, 16) e na forma de fibras pericíclicas que envolvem os feixes vasculares (Fig. 9-

19).

Nas folhas de algumas espécies os feixes de fibras esclerenquimáticas ocupam posição

logo abaixo da epiderme (Fig. 9-11). As células que formam o periciclo são espessadas e

envolvem total (Fig. 10, 15) ou parcialmente (Fig. 12) os feixes vasculares de folhas e

escapos, além do cordão pericíclico dos escapos (Fig. 17-19). Apenas Habenaria repens não

apresentou tecido de sustentação nas folhas.

Em todas as espécies estudadas foi observada redução no número de elementos

xilemáticos tanto nos órgãos subterrâneos quanto nos aéreos, quando comparadas essas

espécies com as demais espécies terrestres do mesmo gênero, disponíveis na literatura. Essa

redução pode ser traduzida na menor quantidade de xilema quando comparada com floema

(Fig. 4, 6, 9-19).

83

DISCUSSÃO

As lacunas de ar presentes em todos os órgãos vegetativos das espécies anfíbias e

emergentes estão ligadas ao sistema de condução de oxigênio por todo o corpo da planta e são

consideradas de extrema importância no sucesso adaptativo dessas macrófitas aquáticas.

Segundo Matthews & Seymour (2006), nas plantas aquáticas, a condução de oxigênio ocorre

250.000 vezes mais rápido do que a da água graças ao eficiente sistema de distribuição de ar

pelas lacunas.

Apesar de não termos realizado estudos ontogenéticos, as lacunas de ar das raízes e

rizomas das espécies estudadas parecem ser do tipo lisígenas, e aquelas das folhas e escapos,

do tipo esquizógenas, de acordo com a estrutura anatômica observada nos órgãos adultos. De

acordo com Sculthorpe (1967) a incidência de luz nos órgãos aéreos está diretamente

relacionada à formação de lacunas de ar esquizógenas.

As espécies anfíbias e emergentes estudadas se enquadram na definição de Levitt

(1980), no que diz respeito à resistência ao estresse hídrico, sendo classificadas como plantas

que evitam o estresse produzindo aerênquima. Segundo o autor, a falta de oxigênio nas raízes

é o principal fator que induz a formação de lacunas de ar.

Por outro lado, nos órgãos aéreos das espécies estudadas, a formação de lacunas de ar

pode ser devida à produção do oxigênio produzido pela fotossíntese, conforme observado por

Sculthorpe (1967). Segundo o autor, todo o gás produzido na fotossíntese que não é

transportado para os órgãos subterrâneos se acumula nos espaços intercelulares dos órgãos

aéreos favorecendo sua distensão.

A presença de apenas uma camada de células epidérmicas, com fina camada de

cutícula nos órgãos subterrâneos e de espessura variável nos órgãos aéreos das espécies

estudadas, corrobora o que foi observado por Sculthorpe (1967) e Matias et al. (2008) para

outras macrófitas aquáticas. De acordo com os autores, a presença de uma camada de células

84

epidérmicas com cutícula fina ou espessa, vai depender da condição ambiental a que essas

plantas estão submetidas.

O número de camadas de células da exoderme das raízes e rizomas das espécies

estudadas foi maior quando comparado com outras espécies anfíbias de Cyperaceae como

Cyperus giganteus Vahl. (Rodrigues & Estelita 2003) e de Scrophulariaceae como Bacopa

salzmanii (Benth.) Wettst. ex Edwall e Bacopa monnierioides B.L.Rob. (Bona e Morretes

2003). Concorda-se com Enstone & Peterson (2005) que afirmam que a hipoxia induz ao

maior desenvolvimento de exoderme e do espessamento de suas paredes. Também concorda-

se com Hose et al. (2001) que afirmam que o espessamento e o aumento do número de

camadas de células da exoderme é comum em plantas aquáticas.

A grande maioria das espécies de macrófitas aquáticas estudadas apresenta endoderme

na raiz e rizoma, constituídas de várias camadas de células com paredes espessadas. Segundo

Sculthorpe (1967), Mauseth (1988) e Seago et al. (2000), raízes e rizomas de macrófitas

aquáticas que vivem em locais sujeitos ao estresse hídrico apresentam endoderme reforçada

primeiramente com suberina e em menor quantidade com lignina, além de mais de uma

camada de células. Assim como a endoderme, a exoderme, também constituída por células de

paredes espessadas e com várias camadas de células, atua seletivamente na passagem de

diferentes substâncias para o interior do órgão.

A redução de tecidos de sustentação nos diferentes órgãos das espécies estudadas é

comum, pois essas espécies ocorrem em ambiente de água parada, lêntico. De acordo com

Sculthorpe (1967), o tecido de sustentação nessas plantas, quando comparadas às espécies

terrestres, é extremamente reduzido, pois essas espécies não necessitam de força mecânica

para se sustentar.

Nas espécies estudadas, acredita-se que a maior proporção de tecidos de sustentação

nos representantes de Cyperaceae deve-se ao grupo taxonômico ao qual as espécies pertencem

e talvez esse caráter seja resultante da informação genética do grupo. Além disso, apresentam

85

forma de vida anfíbia, capaz de suportar períodos de cheia e seca das lagoas temporárias do

semi-árido. Por outro lado, Echinodorus grandiflorus (Alismataceae), Eichhornia paniculata

(Pontederiaceae) e Habenaria repens (Orchidaceae) mesmo pertencendo a grupos

taxonômicos distintos, apresentam redução nos tecidos de sustentação, como resposta

adaptativa.

A redução do tecido vascular nas espécies estudadas, relacionada principalmente à

diminuição do número e lignificação dos elementos xilemáticos, é uma característica de

plantas aquáticas reconhecida por vários autores (Sculthorpe 1967, Bristow 1975, Mauseth

1988, Bona & Morretes 2003). Segundo Bristow (1975), principalmente em

monocotiledôneas, o sistema vascular é reduzido e pobremente lignificado, o que leva a

degeneração de alguns elementos condutores do xilema, mas não afeta a função de transporte.

Em Habenaria repens a reduzida quantidade de tecido protetor, fundamental e

vascular não lhe permite suportar a falta de água, o que foi observado também por Stern

(1997) para esta espécie e para outras Habenariinae (Orchidaceae). Esta característica não foi

observada nas demais espécies estudadas e, ao menor sinal de aumento de temperatura do

local, Habenaria repens desapareceu completamente. Essa característica, de acordo com

Lewitt (1980), indica que esta planta apresenta resistência à adaptação, diferindo das demais

espécies que apresentam capacidade de adaptação.

Acredita-se que características anatômicas relacionadas ao sistema dérmico como:

apenas uma camada de células epidérmicas e a presença de espessura reduzida de cutícula; ao

sistema fundamental como: presença de lacunas de ar em todos os órgãos vegetativos e

diminuição nos tecidos de sustentação, exoderme e endoderme com várias camadas de células

com espessamento de parede variado; e vascular como: diminuição no número e no

espessamento dos elementos xilemáticos confirma a convergência adaptativa das plantas

estudadas ao ambiente lacustre temporário. Essas características indicam convergência ao

86

ambiente aquático e apresentam variação plástica na forma de vida anfíbia e emergente das

macrófitas lacustres estudadas.

87

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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89

Figuras 1-8. Aspectos anatômicos da exoderme, endoderme e lacunas de ar de raízes e

rizomas de espécies de monocotiledôneas, em secções transversais. 1. Pycreus

macrostachyos (Cyperaceae) - aspecto geral da raiz. 2. Oxycarium cubense

(Cyperaceae) - detalhe da epiderme e exoderme. 3. Eichhornia paniculata

(Pontederiaceae) - detalhe da epiderme e exoderme. 4. Pycreus macrostachyos

(Cyperaceae) - detalhe da endoderme e cilindro vascular. 5. Eichhornia paniculata

(Pontederiaceae) - detalhe da endoderme. 6. Oxycarium cubense (Cyperaceae)-

detalhe do rizoma com lacunas de ar no córtex. 7-8. Rizoma de Eichhornia

paniculata (Pontederiaceae): 7. Detalhe da endoderme e cilindro vascular. 8. Detalhe

do córtex. (Barras - Fig. 1-5, 8 = 50µm; Fig. 6-7 = 100 µm). Legenda: En-

endoderme; Ep–epiderme; Ex–Exoderme; La–lacuna de ar.

90

1

3

2

4

5

7 8

La

La

La

La

En

En En

En

Pe

Pe

Ex Ex

Ex

6

En

La

Ep Ep

Ep

88

91

Figuras 9-19. Aspectos anatômicos de folhas e escapos de espécies de monocotiledôneas da

região mediana, em secções transversais. 9-14. Detalhe do mesofilo. 9. Cyperus odoratus

(Cyperaceae). 10. Oxycaryum cubense (Cyperaceae). 11. Pycreus macrostachyos

(Cyperaceae). 12. Echinodorus grandiflorus (Alismataceae). 13. Eichhornia paniculata

(Pontederiaceae). 14. Habenaria repens (Orchidaceae). 15-19. Escapo: aspecto geral, detalhe

do córtex e cilindro vascular. 15. Cyperus odoratus (Cyperaceae). 16. Oxycarium cubense

(Cyperaceae). 17. Echinodorus grandiflorus (Alismataceae). 18. Eichhornia paniculata

(Pontederiaceae). 19. Habenaria repens (Orchidaceae). (Barras - Fig. 9-14 = 100 µm; Fig. 15-

19 = 200 µm). Legenda: Ep–epiderme; Ff-feixe de fibras esclerenquimáticas; Fl–floema; Fp-

fibra pericíclica; La–lacuna de ar; Pe-periciclo.

92

9 10

11 12 13

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

- Cyperus odoratus, Oxycaryum cubense, Pycreus macrostachyos (Cyperaceae) –

anfíbias; Echinodorus grandiflorus (Alismataceae), Eichhornia paniculata (Pontederiaceae) e

Habenaria repens (Orchidaceae) – emergentes, estão bem adaptadas aos solos inundáveis das

lagoas temporárias da Bahia. As variações plásticas observadas nos diferentes tecidos dos

diferentes órgãos vegetativos dessas espécies ocorrem em função das formas de vida por elas

apresentadas.

- O estudo morfoanatômico dos órgãos vegetativos dessas espécies de

monocotiledôneas, pertencentes a diferentes famílias e gêneros, apresentaram características

comuns às demais plantas aquáticas. Sobretudo, este estudo indica que características como

presença de epiderme com apenas uma camada de células com cutícula fina e lacunas de ar

em todos os órgãos vegetativos, exoderme e endoderme multisseriadas com células de paredes

espessadas nas raízes e rizomas, redução no número de tecidos vasculares e de tecidos de

sustentação nos diferentes órgãos são comuns e convergentes ao ambiente aquático.

- Verificou-se em todos os órgãos vegetativos de Cyperus odoratus, Oxycaryum

cubense e Pycreus macrostachyos, espécies anfíbias de Cyperaceae, que embora pertencentes

a diferentes gêneros, apresentam características anatômicas comuns. Cutícula com

espessamento variado nas células epidérmicas; espessamento das paredes das células da

exoderme e endoderme de raízes e rizomas; presença de folhas anfiestomáticas, com células

buliformes e hipoderme; lacunas de ar, redução do número de elementos xilemáticos e de

tecidos de sustentação em todos os órgãos são características que convergem estas plantas ao

ambiente aquático e à forma de vida anfíbia.

- As espécies Echinodorus grandiflorus (Alismataceae), Eichhornia paniculata

(Pontederiaceae) e Habenaria repens (Orchidaceae) embora pertençam a grupos taxonômicos

diferentes (famílias distintas), apresentaram características comuns à forma de vida

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emergente. Todos os órgãos vegetativos apresentam epiderme com apenas uma camada de

células, recoberta por cutícula fina, exoderme e endoderme multisseriada com células de

paredes espessadas nas raízes e rizomas; presença de lacunas de ar, idioblastos com

compostos fenólicos e cristais e ausência de esclerênquima.

- Com os dados gerados a partir deste trabalho com macrófitas aquáticas anfíbias e

emergentes e unindo-os futuramente com os de outras formas de vida que se pretende estudar,

procura-se contribuir para o conhecimento de suas adaptações ao ambiente aquático, mesmo

que temporário. Esses dados poderão contribuir para a compreensão dos processos ecológicos,

além de subsidiar estudos taxonômicos, filogenéticos e fisiológicos.